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História do Brasil Império:

Aspectos Formativos
Cotidiano e Vida Material no Império (1822 – 1889)

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dra. Milena Fernandes Maranho

Revisão Textual:
Prof.ª Dra. Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Cotidiano e Vida Material
no Império (1822 – 1889)

• Transformações da Arquitetura Urbana e Seus Reflexos no Mundo Rural;


• Inventários e Testamentos: Registros dos Significados Sociais
dos Objetos;
• A Cultura Alimentar e seus Múltiplos Significados Culturais;
• A Fotografia e a Pintura do Cotidiano: Retratos de Historicidade.


OBJETIVOS

DE APRENDIZADO
• Apresentar as questões do cotidiano e da vida material do período do Império, Primeiro e
Segundo Reinados, no intuito de analisar questões mais abrangentes para melhor compre-
ender a sociedade da época e suas transformações;
• Apresentar a cultura material, as alterações urbanas e arquitetônicas identificando mudanças
históricas advindas com as novas possibilidades econômicas e políticas do Império;
• Apresentar a vida cotidiana, no que diz respeito aos bens identificados nos inventários, estes
também apresentam sentidos diversos, conforme o período da sociedade e suas necessidades
de representação e sociabilidade;
• Apresentar a história da alimentação, entender o que se come e como se come em uma
sociedade, consistindo no entendimento mais profundo sobre as questões culturais;
• Apresentar a representação desta sociedade, tal como realizada por artistas e fotógrafos
do século XIX, indentificando olhares externos sobre a mesma, de descrições e críticas, que
auxiliam a elaborar uma interpretação mais reflexiva sobre o Império e o entendimento que
os seus protagonistas tinham de si mesmos e de sua história.
UNIDADE Cotidiano e Vida Material no Império (1822 – 1889)

Transformações da Arquitetura Urbana


e Seus Reflexos no Mundo Rural
A maioria das descrições sobre o Rio de Janeiro do início do século XIX, indicava que
a cidade era semelhante a certos bairros de Lisboa que não haviam passado por reformu-
lações após o terremoto de 1755, principalmente no que diz respeito às características dos
“distritos mais porcos e imundos”. O Rio, na época, era mesmo uma cidade pequena, com
um espaço urbano que compreendia apenas quatro freguesias: Sé, Candelária, São José e
Santa Rita. Mas o termo da cidade era muito mais vasto e compreendia diversas freguesias
rurais. Nesses locais, as casas eram dispersas, não havia arruamento e a chegada a esses
lugares se fazia por caminhos que cortavam mato e mangues (CARVALHO, 2008).

O Rio de Janeiro não possuía grandes problemas com a regularidade do traçado de


muitas de suas ruas, uma vez que a expansão para a várzea, ainda no século XVIII, ocorrera
a partir da adoção de um traçado retilíneo. Entretanto, como nas outras cidades coloniais,
várias ruas eram estreitas e havia, dentro da urbe, diversos espaços sem nenhuma cons-
trução, áreas de tamanho considerável. Havia igualmente muitos alagadiços e mangues,
concentrados principalmente na região situada após o campo de Santana. Além de tudo
isso, havia também a ideia da inferioridade colonial, a partir de comparações com as feições
de cidades europeias. Era a imagem invertida da metrópole. Mas muitos desses aspectos já
haviam sido discutidos após o terremoto, quando as cidades coloniais deveriam passar por
transformações. Mas elas não foram suficientes para uma alteração radical das estruturas da
cidade, e os problemas continuaram (CARVALHO, 2008).

O Rio de Janeiro, a partir de 1808, tornou-se a sede do Império português e estava


sujeito ao constante desejo de “progresso”, presente no pensamento iluminista refor-
mado da época que reflete uma ideia de cidade que perpassa toda a discussão sobre
as transformações do Rio de Janeiro àquela época e que incluem três conceitos-chave:
beleza, higiene e circulação. Mas a chegada de cerca de 10.000 pessoas à cidade nas
frotas daquele ano, impôs o problema da instalação imediata daqueles recém-chegados,
para os quais os moradores tiveram de ceder suas próprias casas. Novas edificações logo
tiveram de ser realizadas (CARVALHO, 2008).

O hábito citadino de construir casas térreas em grande quantidade era considerado


inconveniente e insalubre, devido à ausência de luminosidade, pouca ventilação e pro-
ximidade ao chão úmido (aumentando a propagação de epidemias). Outro fator nocivo
à expansão da nova corte, na visão contemporânea, eram os morros do Castelo e de
Santo Antônio, posicionados na região central da cidade do Rio de Janeiro. A ideia era
arrasar os morros para tornar a cidade mais plana, entulhando os charcos, os lugares
baixos fazendo o ar circular mais facilmente pela cidade, e também para equilibrar o ex-
cessivo calor. Mas a efetiva demolição desses morros apenas ocorreu, respectivamente,
nas décadas de 1920 e 1950.

A dimensão civilizadora que envolvia a transformação da cidade do Rio de Janeiro em


uma nova corte também passava pela organização das ruas, já que a ampliação da largura
das ruas tornou-se uma necessidade após a chegada da corte, o que era justificado para

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retirar o “abafamento” das ruas, deixando entrar “grandes colunas de ar”, além de facilitar
a circulação das pessoas.

O Rio de Janeiro é uma cidade que passou por vários períodos de transformação, resgatados
e apresentados em pranchas digitalizadas que nos mostram as profundas mudanças que
a cidade vivenciou desde o período colonial até a Republica. Confira no link a seguir mais
sobre o trabalho do artista gráfico Carlos Augusto Nunes Pereira, o Guta!
Disponível em: https://youtu.be/whz-NltoUX8

Enfim, a construção de praças também foi um fator característico daquelas trans-


formações, elas deveriam existir enquanto elemento estruturador do traçado urbano,
e deveria abrigar funções de centro, funcional ou formal. Deveriam conter também
edificações nobres e chafarizes, construídos em pedra, sobre degraus e ornamentados
com estátuas ao estilo parisiense. Assim, civilizar o espaço urbano da cidade do Rio de
Janeiro significava implementar novas propostas estéticas correlacionadas às vigentes
na Europa, ou seja, à civilização (CARVALHO, 2008).

No Brasil, a tradição clássica não surgiu após a chegada da Família Real ou com a de-
nominada “missão francesa” de 1816. Tais fatos foram certamente agentes catalizadores
do processo de implantação desse repertório arquitetônico que, significativamente, só se
difundiu após a independência. No entanto, desde o período colonial existiram exemplares
com clara concepção neoclássica, entre eles a Casa de Câmara e Cadeia de Ouro Preto,
como vimos, a Igreja de Nossa Senhora da Candelária e o Real Teatro São João, ambos
no Rio de Janeiro. A Candelária, reconstruída a partir de projeto do engenheiro militar
Francisco João Roscio apresenta filiação direta com o Convento de Mafra (1717 – 1720),
de João Frederico Ludovice, que já revelava a transição do barroco ao neoclassicismo em
Portugal (MENDES et al., 2011).

Figura 1 – Igreja Nossa Senhora da Candelária RJ, 1811


Fonte: Wikimedia Commons

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Uma série de artistas (pintores, escultores, gravadores e arquitetos) formados na Aca-


demia de Artes de Paris, no mais estrito estilo neoclássico, “se auto convidaram” para
a função de representar oficialmente a nova condição do Brasil, e não chegaram como
grupo. Mas tiveram o incentivo de muitas personalidades importantes no projeto de
criar uma academia de belas artes, fundada dez anos após a sua chegada, em 1826,
com muitas dificuldades.

O Neoclassicismo no Brasil, entretanto, apenas a partir do Primeiro Reinado, sob a


égide de D. Pedro I, definiu-se como arquitetura oficial, assim como já havia ocorrido em
alguns países da Europa, como França e Inglaterra. Afinal, após a Revolução Industrial,
diversificaram-se os programas arquitetônicos, atendendo a funções específicas para abrigar
entidades públicas, que privilegiavam o novo estilo como forma de representação. Os novos
edifícios deveriam simbolizar dignidade, imponência, austeridade, verdadeiros símbolos de
uma nova forma de poder para a qual o repertório clássico revisitado incorporava essas
qualidades. Durante o período joanino, nenhum edifício residencial foi construído utilizando
esse repertório erudito.

A maioria das obras, já que foram ocupadas em regime de urgência, foram adaptadas,
por vezes, tentando introduzir algum novo elemento decorativo modernizador, como uma
platibanda, ornatos de ferro coroando a fachada, entre outros. A arquitetura produzida
para o governo e a nobreza foi basicamente influenciada por dois arquitetos franceses:
Grandjean de Montigny, da Escola de Belas Artes e Pierre Pézerat, da Politécnica de Paris.
O método utilizado por Montigny era inspirado na composição de grandes obras clássicas
do passado. Mas muitas dessas edificações eram criticadas pelos contemporâneos que já
tinham como preocupação os problemas de estabilidade, setorização e iluminação detec-
tados nos edifícios. Além disso, havia a maior valorização de aspectos relacionados à fun-
cionalidade e construção do que questões compositivas e estilísticas (CARVALHO, 2008).

Na Corte, a presença dos franceses e as novas influências iriam favorecer o emprego


de construções mais refinadas, a partir de um novo tipo de residência: a casa de porão
alto, representava uma transição entre os velhos sobrados e as casas térreas. Eram os es-
forços de adaptação às condições de ingresso do Brasil no mundo contemporâneo, sendo
que, à princípio, essas casas eram feitas tendo em vista o mesmo partido arquitetônico do
período anterior, com tímidas modificações de fachada. Mas a própria integração do país
no mercado mundial, conseguida com a abertura dos portos, iria possibilitar a implantação
de equipamentos que contribuiriam para a alteração da aparência das construções dos
centros maiores do litoral. Além disso, a própria existência das obras de maior destaque,
como as anteriormente citadas, fazia com que elas se tornassem exemplos para as demais.
Mas a marca, no caso, seriam as platibandas e os porões altos (LEMOS, 1999).

A questão da sociabilidade alterou-se muito após a vinda da Corte e com a ocorrência


do Império. O hábito de receber e promover festas dentro das residências foi o grande
responsável pela extinção das varandas como espaço social. A setorização da casa neo-
clássica no Brasil aprimorou-se desde o Solar da Marquesa de Santos até o Palacete Nova
Friburgo. O setor de serviços que, na casa da Marquesa, colocava a cozinha fora do perí-
metro da edificação, no Catete, volta a juntar-se ao perímetro da edificação através de uma
passagem coberta, que unia a casa à área de serviço. Os setores social e íntimo que, na
casa da Marquesa, no Paço de São Cristóvão, estavam juntos, no palacete Nova Friburgo,
dispunham-se separadamente, em andares distintos (MENDES et al., 2011).

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Figura 2 – Palácio da Marquesa de Santos em São Cristóvão, RJ
Fonte: Wikimedia Commons

A essas transformações no campo da arquitetura correspondiam modificações signifi-


cativas nos centros urbanos. Nas cidades de maior importância, como São Paulo, multipli-
cavam-se ruas calçadas e apareciam os primeiros passeios junto às casas. Construíram-se
também jardins, ao gosto europeu, imitando o passeio público do Rio de Janeiro, cercados
por altas grades de ferro, reservando seu uso para as camadas mais abastadas. Mas usos,
moradas e cidades alteravam-se lentamente. Seria preciso a substituição da escravidão
pela imigração para que modificações de maior importância nessa arquitetura citadina
ocorressem (LEMOS, 1999).

Na capital do Império, os engenheiros militares Joaquim Cândido Guillobel e José Jacin-


to Rebelo, ambos diplomados no Rio de Janeiro, e arquitetos como Araújo Porto-Alegre e
Bethencourt da Silva, ex-alunos e professores da Academia, desenvolviam vários projetos.
Mas, a partir de 1884, a formação de engenheiros apenas deveria ocorrer a partir da Es-
cola Politécnica (criada em 1810 com o nome de Academia Real Militar) e não mais pela
Academia de Belas Artes (criada em1826 a partir da Missão Francesa). Nesse momento, a
eficiência técnica deveria superar as formas. A arquitetura passa a ser impregnada de racio-
nalismo, economia e austeridade estética. Assim, a arquitetura oficial do Império nos seus
últimos anos incorporou uma série de novas tendências presentes na Europa, indicando,
inclusive, a influência do Neogótico e do Ecletismo nesta arquitetura (MENDES et al., 2011).

As características culturais e arquitetônicas das cidades começaram a influenciar a


área rural no período do café, que teve seu período de expansão relacionado à trans-
ferência da corte portuguesa ao Brasil em 1808 e com a Independência em 1822. As
elites que comandaram esse processo originaram-se, em sua maior parte, na região
Centro-Sul. Elas viram no novo produto uma taboa de salvação, principalmente tendo
em vista a estagnação ou o declínio das vendas internacionais do açúcar, algodão e ta-
baco. Assiste-se então à conversão à grande produção cafeeira, por parte de numerosos
fazendeiros, comerciantes ou mesmo burocratas (MENDES et al., 2011).

Após algumas experiências com o café no século XVIII, a planta que dá origem aos
preciosos grãos foi plantada na Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, mas ainda não apre-
sentando resultados satisfatórios. Apenas em meados do século XIX, com a ocupação do

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Vale do Paraíba, a cultura do café tornou-se expressiva, farta na produção e nos lucros ela
foi um dos símbolos mais importantes do Império. O “ciclo cafeeiro” firmou-se e muitas
fazendas de café foram construídas. Muitas vilas e cidades surgiram enquanto pontos de
reunião daquele novo segmento aristocrático que despontava: os “barões do café”. Em
conjunto com essas transformações econômicas e sociais, era preciso viabilizar o trans-
porte da produção cafeeira aos portos, além da necessidade de interligar o vasto território
nacional recém-consolidado a partir da Independência (MENDES et al., 2011).

Os primeiros agricultores do Vale do Paraíba, na maioria das vezes, eram homens rudes,
ex-garimpeiros, pequenos comerciantes oriundos das Minas Gerais, e construíam simples
abrigos rudimentares, anexos a depósitos e plantações, numa empírica ocupação diante das
incertezas dos resultados. À medida que os lucros chegaram e delineava-se o sucesso desse
investimento, o agenciamento de novas construções e de reformas das antigas se fazia ne-
cessário e iniciavam-se os modelos que seriam consagrados, posteriormente, nessa arquite-
tura de fazendas de café do século XIX. Dos primeiros abrigos junto às tulhas e às reduzidas
plantações, evoluiu-se para uma implantação que se tornou definitiva: ao fundo de um vale
de grandes dimensões, com edificações dispostas em quadras retangulares em torno de um
grande pátio, espaço de lavagem e secagem dos grãos (MENDES et al., 2011).

Havia a casa-grande ou sede, de um ou dois pavimentos, capela, senzala em galeria, ca-


sas dos capatazes, depósitos e o local do beneficiamento, onde os grãos seriam descascados,
separados e torrados. Esses edifícios dispunham-se no mesmo plano, em nível inferior às
colinas arredondadas e circunvizinhas, onde os cafezais se avistavam por toda a paisagem.
Nos primeiros tempos, a inspiração foi das casas dos engenhos litorâneos do século XVIII.
Mas logo após a chegada da Corte portuguesa no Brasil, em 1808, gradativamente, as
novas fazendas apropriaram-se das inovações da corte, incluindo a perda das varandas de
entrada, tão características das edificações agrícolas rurais antecedentes. Surgiu um neo-
classicismo adaptado à mão de obra e aos materiais locais, acrescentando cada vez mais
itens importados.

No auge do ciclo do café, durante o Segundo Reinado, era possível encontrar muitas
fazendas em condições de luxo e conforto que superavam as casas mais ricas das cidades.
Tudo o que pudesse ser transportado, faria parte de seu repertório construtivo e decorati-
vo: papéis de parede, mobiliário requintado, cristal, louças, pinturas que traziam a Europa
para o Brasil, que simulavam janelas abertas para outras paisagens que não as das pró-
prias fazendas (MENDES et al., 2011).

Figura 3 – Fazenda Resgate, Bananal-SP (1855)


Fonte: Wikimedia Commons

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As plantas das fazendas diferiam em números de aposentos, porém, mantinham a
setorização básica herdada dos moldes coloniais, o partido aberto, que separava o traba-
lho da habitação, e que agora incluía uma questão a mais: o social. Dessa forma, havia
uma área para receber, associada diretamente ao exterior, às vezes, por uma generosa
varanda que aos poucos foi perdendo espaço, ou um setor íntimo, mais aconchegante.
Mas a tradição das alcovas foi mantida, e o setor de serviços, com a cozinha aos fundos.
À medida que o proprietário enriquecia e a família aumentava, o espaço de moradia
servia para refletir essa opulência, e ia sendo modificado, com mais salas, biblioteca,
escritórios, dormitórios com camarinhas e saletas, grandes cozinhas e despensas, apo-
sentos de escravos (MENDES et al., 2011)

O segundo andar era destinado às atividades mais nobres, sociais e de habitação, enquan-
to o térreo era destinado aos serviços. Em muitos exemplares, podiam ser verificados pátios
internos, cercados de galerias e corredores envidraçados, ou mesmo confortáveis varandas
alpendradas fechadas, além de jardins de inverno, que vieram com a europeização dos cos-
tumes. As antigas paredes brancas agora recebiam cores, amarelo, azul, rosa e enquadra-
mento dos vãos em pedra ou argamassa pintada e esquadrias com cores combinadas. Papéis
de parede revestiam a taipa ou o adobe dos salões. Em alguns exemplares do final do século
XIX, é possível encontrar estruturas metálicas, criando varandas e alpendres.

Sobre as fachadas, não é possível estabelecer um padrão adotado pelas diversas se-
des, distribuídas geograficamente por cenários tão distintos. A maioria herdou, em seus
primórdios, elementos utilizados pelas fazendas e engenhos coloniais: pavimento térreo
destinado ao serviço, composto de vãos rasgados na alvenaria, que suportava o peso
de uma varanda superior para onde convergiam os acessos à moradia. A edificação era
arrematada por generosos beirais a escoar a água constante das chuvas tropicais. Gra-
dativamente, esses partidos se alteraram, incluindo inovações estilísticas, encomendadas
a arquitetos (MENDES et al., 2011).

Varandas foram fechadas, tornando festas e reuniões mais privativas, platibandas


escondiam os telhados, e até mesmo frontões surgiriam para marcar entradas. Era a as-
sociação ao poder por meio da arquitetura, tão comum naquele período e que também
havia no campo, tanto quanto nas cidades.

Os primeiros exemplares mantinham os padrões construtivos tradicionais presentes


desde o período colonial, calcados em três materiais básicos: pedra, madeira e barro,
alterando-se à medida em que os laços se estreitavam as relações com a Europa. Se-
guindo as lições dos mestres construtores portugueses, as fundações em pedra e barro
continuaram, paredes autoportantes no mesmo material ou em taipa de pilão, raramen-
te utilizando tijolos na primeira fase. Paredes internas em pau a pique, pisos em tabuado
corrido apoiados em barrotes de madeira, forros em estuque, ou madeira, esquadrias
em madeira maciça pintada, associadas a janelas em guilhotina e caixilhos miúdos em
vidro (MENDES et al., 2011).

Na preparação do terreno para receber as edificações, há presença de tradições dos


paulistas e dos mineiros ao mesmo tempo, pois se observam, na mesma fazenda, tanto
o uso do terrapleno, com cortes e aterros, uma influência dos paulistas, quanto a cons-
trução de algumas edificações acompanhando o declive do terreno, uma técnica mais
associada aos mineiros (BENINCASA, 2003).

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O “modo mineiro” foi mais utilizado nas casas-grandes, nas quais aproveitava-se o
espaço resultante sob o piso – o porão – como depósito ou moradia de escravos. O
modo paulista foi mais utilizado nas demais edificações, como senzalas, casas dos ad-
ministradores, entre outros. Para a implantação do núcleo central das fazendas, faziam-
-se grandes platôs, seguros por sólidos muros de arrimo de pedras ou tijolos, em toda
a área destinada à locação dos edifícios, que apresentava uma lógica própria: moradia
dos proprietários, edificações de beneficiamento de café, tulhas, terreiros, habitação dos
trabalhadores (BENINCASA, 2003).

A partir do final do século XIX, as fazendas cafeeiras do centro-oeste paulista pas-


saram a apresentar uma distribuição mais lógica e racional de suas edificações, devido
às influências do pensamento moderno. A lógica da escolha dos terrenos ainda era a
mesma de tempos anteriores, apenas com a escolha mais frequente da meia encosta
(declinação suave) para a implantação das edificações, além da presença da água, já que
as máquinas ainda utilizavam a roda d´água (BENINCASA, 2003).

A questão é que, em São Paulo, também é possível encontrar fazendas nas quais a
água não estava disponível próximo às áreas das edificações, já que canais de irrigação,
a céu aberto ou subterrâneos, eram construídos para atender essa demanda. Geral-
mente, os canais terminavam em um grande reservatório construído em alvenaria de
pedra ou de tijolos, situado em cota mais alta que as demais edificações, possibilitando
a criação e o abastecimento de vários canais secundários que seguiam em direção às
moradias principais, terreiros, pomar, hortas, moinhos, monjolos, currais, estábulos, e
outras instalações (BENINCASA, 2003).

Mesmo depois da chegada das ferrovias, quando se tornou mais cômoda a aquisição
de alimentos por via das cidades, não se abandonou de todo a sua produção nas fazen-
das. A tradição da horta e do pomar manteve-se, revestindo-se, porém, de um caráter
mais refinado e culto. No pomar, os fazendeiros plantavam mudas de variedades de fru-
tas e plantas exóticas, obtidas em suas viagens, exibidas com orgulho, enquanto prova
de ilustração (BENINCASA, 2003).

Ainda hoje, em algumas fazendas, exibem-se espécimes incomuns na região. Os po-


mares eram protegidos por muros, delimitando um espaço de acesso restrito. Situados
atrás das casas-grandes, em um nível mais elevado, com vários canais que irrigavam a
área. O pomar, a horta e os jardins eram responsabilidade das mulheres. A partir dos
últimos anos da década de 1880, os jardins começaram a ter um desenho mais elabora-
do, e passam a ser projetados junto com as casas de fazenda. Antes desse período, havia
“jardins espontâneos” (BENINCASA, 2003).

A arquitetura urbana já estava definida em moldes muito semelhantes, mas exemplos


personalizados de arquitetura neoclássica passaram a ficar cada vez mais numerosos,
era um “desejo modernizador” que impulsionava a arquitetura, consolidando as casas
fornidas de coisas supérfluas, indicando uma nova ambientação, suplantando hábitos
antigos (LEMOS, 1999).

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Faça um tour virtual pelo Museu do Café! Localizado em Santos – SP no prédio da antiga
Bolsa Oficial do Café, o Museu possui um acervo museológico, bibliográfico e arquivístico
que conta a história do café no Brasil a partir de objetos, fotografias e documentos, entre
muitos outros vestígios. Conheça o lugar onde muitas decisões importantes sobre o comér-
cio do café foram realizadas, no link, disponível em: https://bit.ly/3CUMXHW

Inventários e Testamentos: Registros


dos Significados Sociais dos Objetos
Fernand Braudel afirmou certa vez que a economia das civilizações possui duas di-
mensões que se confrontam, combinam e se contradizem. Uma delas, segundo o autor,
costuma ser preferencialmente descrita, é a chamada “economia de mercado”, ou dos
mecanismos da produção e da troca. Essa economia corresponderia a realidades bem
nítidas, facilmente compreensíveis.

A outra dimensão foi considerada por Braudel como uma “zona de opacidade”, difícil
de se observar por falta de documentação histórica; ela seria a “outra metade informal da
atividade econômica, a da autossuficiência, da troca dos produtos e dos serviços num raio
muito curto”. Essa atividade econômica foi denominada por Braudel como civilização ou
vida material (BRAUDEL, 1995, p. 12). Durante muito tempo, essa “atividade de base”
que se encontra por toda a parte e se estende pelo mercado apresentando um “volume
fantástico”, nas palavras de Braudel, obteve do estudo da história um interesse limitado.

Porém, a partir de 1929 com a École des Annales e sua revista Annales d’Histoire
Économique et Sociale, o domínio do historiador foi amplamente aberto, e nele intro-
duzido a cultura material. Fernand Braudel, membro da segunda geração dos Annales,
foi o autor da primeira grande síntese sobre a história da cultura material, “Civilização
Material, Economia e Capitalismo – séculos. XV a XVIII”, escrita entre 1967 e 1979
(PESEZ, 1993).

Contudo, segundo Jean-Marie Pesez, é preciso admitir que a vida material fez um in-
gresso ainda bastante tímido na história, pois ela ainda não soube forjar seus conceitos,
nem desenvolver todas as suas implicações. Ainda segundo o autor, as únicas premissas
que podemos reter dos estudos realizados sobre a história da civilização material, são
aquelas relacionadas com as ideias sobre a cultura material enquanto uma história da
maioria. Além disso, a história da civilização material permite a compreensão da rela-
ção entre vida material e vida econômica, “intimamente ligadas e nitidamente distintas”
(PESEZ, 1993, p. 184).

Para Peter Burke, ao apresentar os pontos fortes e fracos da Nova História – a terceira
geração dos Annales – certos problemas são identificados quando se trata do estudo de

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novas fontes e novos métodos para as análises históricas. Segundo o autor, as novas pergun-
tas elaboradas buscavam outros tipos de fontes até o momento não explorados. Especifica-
mente no caso da cultura material, Burke considerou que seu estudo é baseado menos nos
artefatos do que nas fontes literárias. Podemos citar como exemplo, os relatos dos viajantes
e os inventários de propriedades, os quais ainda precisam de uma sofisticação crítica para
sua leitura que tem sido praticada também pelos estudiosos dos testemunhos orais e icono-
gráficos (BURKE, 1992).

Todavia, para Peter Burke, apesar das dificuldades encontradas com a documenta-
ção, as descrições oferecidas pelos viajantes ou pelos inventários podem esclarecer pon-
tos sobre “a vida social dos objetos – ou mais exatamente [...] a vida social dos grupos,
revelada por seu uso dos objetos” (BURKE, 1992, p. 29). Dessa forma, como esclareceu
Pesez, apesar dos estudos relacionados aos usos dos objetos serem considerados muitas
vezes como “retórica da curiosidade”, nem por isso a cultura material se mostrará me-
nos necessária, “porque apresenta o interesse de reintroduzir o homem na história por
intermédio da vivência material” (PESEZ, 1993, p. 210).

De acordo com o debate sobre as novas formas da história e do estudo da vida mate-
rial a partir de novas fontes, estudar a “vida social dos objetos” e “reintroduzir o homem
na história por intermédio da vivência material”, constituem elementos indispensáveis
para compreensão do significado dos bens materiais. Os Inventários e Testamentos
constituíram documentos essenciais para a realização de uma análise dos padrões de
vida devido ao caráter descritivo da vida material que eles encerram. Além disso, por
meio do caráter serial dessa documentação, é possível recuperar vários personagens que
em conjunto formam grupos sociais (FRAGOSO; PILTZER, 1988).

A descrição dos bens presente nas avaliações nos possibilita “compreender e distin-
guir a condição de vida dos inventariados e de seus familiares”. Também possibilita a
análise e o estudo das condições da vida social e econômica da época, além de oferecer
“material precioso para o estudo [...] da composição da família [...] e da evolução do nível
de vida daqueles nossos antepassados” (RIBEIRO, 1948, p. 19). Essa documentação
apresenta duas partes: o testamento e o inventário. O testamento, elaborado antes da
morte do inventariado, correspondia às últimas designações em vida sobre o destino de
seus bens, de seus índios, a enumeração de alguns bens e dívidas, e o principal: suas
disposições após a morte – número de missas e preferências para o acompanhamento
e sepultamento do corpo. A partir do estudo dos testamentos, podemos analisar alguns
aspectos da percepção de mundo do testador.

O inventário, por sua vez, correspondia ao levantamento dos bens de uma pessoa
após a sua morte, visando a “uma exata demonstração da situação econômica [...] a fim
de serem apurados os resultados que irão ser objeto da partilha”. No inventário, os bens
são discriminados em móveis – os utensílios – e imóveis, ou de raiz – as casas, terrenos
e roças. Os bens móveis em especial permitem precisar a diferença social no interior da
sociedade, e os bens imóveis indicam as atividades desenvolvidas pelos indivíduos e as
possibilidades de rendimento ao serem avaliados no local em que se situam. Os inven-
tários e testamentos também constituem o “testemunho de uma realidade complexa”
e permitem, através de sua análise, “compreender as mudanças nas formas de riqueza
social” (CREDDO, 1996, p. 11).

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Vale lembrar que, nos inventários, também encontramos quitações de dívidas, leilões
de bens, questões de tutoria de órfãos e averiguações acerca do cumprimento dos le-
gados. O formato dessa documentação sofreu poucas transformações no correr de três
séculos, entre o XVII e o XIX, proporcionando o mesmo tipo de informação e a pos-
sibilidade de detectar mudanças no cotidiano do uso dos objetos. O uso dos bens para
dotes de casamentos também foi um item muito presente nos inventários e testamentos,
que sofreu alterações com o passar dos séculos, o que demonstra alteração da mesma
forma no conceito de propriedade e no modo como se adquirem e conservam os bens
(NAZZARI, 2001).

As mudanças sofridas pela sociedade brasileira que ajudam a explicar a


decadência e o desaparecimento do dote são muitas das mesmas trans-
formações que têm sido observadas nas regiões mais centrais do mun-
do ocidental. Passando por um longo processo que se iniciou no século
XVIII e continuou até o início do século XX, o Brasil mudou, de uma
sociedade hierárquica, tipo ancien régime, na qual eram primordiais a
posição social, a família e as relações clientelistas, para uma sociedade
mais individualista, em que, cada vez mais, passaram a dominar o contra-
to e o mercado. (NAZZARI, 2001, p. 22)

Era uma sociedade verticalmente repartida em clãs familiares que se transformou


gradativamente em uma sociedade dividida horizontalmente em classes. Dessa forma,
entre o século XVII e o final do XIX, desenvolveu-se um novo conceito de propriedade
privada. A família deixou de ser a protagonista da produção e consumo, para se tornar
principalmente o foco do consumo, ao mesmo tempo em que o poder da família exten-
sa entrou em decadência e a família conjugal tornou-se mais importante e o casamento
transformou-se, de questão predominantemente de propriedade, em relacionamento re-
conhecido como “de amor”, cujos esteios econômicos já não eram mais explicitados.
Essas transformações tiveram lugar no Brasil de maneira gradual e complexa, de tal
modo que tanto as características antigas quanto as novas muitas vezes coexistiram em
determinados momentos, por vezes, até dentro da mesma família. À medida que essas
mudanças ocorreram, a prática do dote se alterou (NAZZARI, 2001).

Na segunda metade do século XIX, quando ocorreu um repúdio ideológico ao dote, a


sua prática já havia declinado drasticamente, fazendo prever seu desaparecimento final.
No início do século XVII, nenhuma filha de proprietários ia para o casamento sem uma
contribuição em bens para o sustento do novo casal. A maioria das filhas recebia um
dote. As poucas que se casavam sem dote já haviam perdido um dos genitores e, por-
tanto, levavam sua herança para o casamento. Um século depois, quase três quartos das
mulheres da classe proprietária iam para o casamento sem levar bens consigo. Mesmo
que fossem herdar mais tarde, já não contribuíam com um dote para o sustento inicial
da família. Embora os bens ainda pudessem ter um papel importante a desempenhar no
casamento dos indivíduos, já não constituíam a pedra fundamental para que o casamen-
to se concretizasse, negócios e família passaram a ser coisas distintas. Mudou também o
significado dos bens nas relações não apenas familiares, mas sociais (NAZZARI, 2001).

Durante o período colonial, em todos os aspectos, os brancos procuraram impor


a sua cultura material, muito embora num ou noutro detalhe se deixassem também

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influenciar pelas populações indígenas e africanas (SILVA, 1993). As vestimentas eram


um dos itens mais valiosos nos inventários, já que a sociedade do Antigo Regime, tan-
to em Portugal como no Brasil, manteve-se sempre vigilante para que o exercício de
determinadas funções e a representação das posições sociais fossem simbolizados por
práticas vestimentárias próprias. Os principais adereços nesse sentido eram constituídos
pelas joias, ou enfeites da moda francesa feitos em plumas e penas arranjadas como se
fossem flores em ramos e guirlandas enfeitando os vestidos no início do século XIX (SIL-
VA, 1993). Tecidos de algodão, seda, casimira, cetins e veludos, tafetás de várias cores,
galões de ouro e de prata, meias compunham trajes que tentavam ao máximo copiar as
modas europeias.

Figura 4 – Trajes femininos do início do século XIX (Roque Gameiro, Quadros da História de Portugal, 1917)
Fonte: Wikimedia Commons

Uma multidão de caixeiros viajantes passou a percorrer várias áreas para levar as
novidades europeias, que haviam se consagrado na Corte do Rio de Janeiro. Sedas
espessas francesas, cambraias finíssimas de linho ou algodão e incontáveis casemiras
de lã inglesa, rendas e bordados de Flandres e da Irlanda, chapéus de feltro e seda, fitas
e pentes para cabelos, cintos, sapatos, botas e botinas eram consumidos com avidez e
compunham os artigos mais luxuosos que passaram a percorrer as estradas do interior,
em direção às ricas fazendas de café ou engenhos de açúcar (SETÚBAL, 2008).

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No canal do Youtube “A modista do Desterro”, a moda brasileira do século XIX é desvendada
a partir de exemplares de revistas de moda e jornais femininos, que republicavam no Brasil
as tendências da moda europeia. No entanto, o tão comentado atraso da moda brasileira
com relação aos costumes da moda na Europa não era tão grande assim... Descubra o por-
quê no link, disponível em: https://youtu.be/IoV-DuSD9nk

A moda napoleônica masculina que também dominava Portugal daria espaço aos
padrões ingleses mais sóbrios rígidos e inspirados em roupas militares ou de montaria,
lãs cada vez mais escuras, chapéus contidos, sapatos escuros e sóbrios. Os excessos de
cor, plumas e perucas caíram em desuso com o passar do século, quanto às mulheres,
a moda dos vestidos leves e acinturados sob o busto, mais simples, ornados com rendas
e com muitas joias. A partir das décadas de 1860, as imensas saias balão, armadas com
hastes de metal para deixar as saias rodadas. A partir de 1880, a silhueta feminina vol-
ta a ser esguia, com espartilhos e corpetes muito justos, acentuando o busto, bastante
comuns até a Primeira Guerra Mundial. Influências trazidas de Portugal para o Brasil
(SETÚBAL, 2008).

A partir do início do XIX, muitos brasileiros viajam e estudam na Corte, principalmente


os filhos dos grandes latifundiários, e, quando eles retornam, trazem as influências da Corte
portuguesa em todos os âmbitos da vida privada. No latifúndio e na cidade, aos poucos,
vai se introduzindo uma transformação nos modos de vida e visão do mundo (SETÚBAL,
2008). Modificam-se o mobiliário, os móveis suntuosos dos salões das elites, como as me-
sas de pés torneados, chamados bufetes, e os de sentar, como as cadeiras de jacarandá ou
vinhático, estavam ao alcance apenas das famílias mais ricas. Durante o século XVII e parte
do XVIII, eram especialmente cobiçadas as chamadas cadeiras de estado, com assento e es-
paldar de couro lavrado, chamado também de sola ou tamboretes. Os encostos podiam ser
assim adornados com gravações de motivos vegetais, arabescos e brasões, ostentados por
poucos. Caixas, baús, canastras e arcas compunham o mobiliário de guardar até a vulgari-
zação dos armários, já na segunda metade do século XIX (SETÚBAL, 2008).

A fabricação de redes foi apreendida com os indígenas, sendo realizada normalmente


por mulheres, ditas rendeiras, que teciam em teares verticais igualmente nativos. Sua
produção tradicional manteve-se em diversos locais até meados do século XX, princi-
palmente no Sudeste, como resíduo do grande consumo associado às feiras de tropas
de muares, alguns de linho e a maioria de algodão, e também colchas e cobertores de
lã, embora, com exceção desses últimos, devem ter sido próprios apenas das famílias
mais ricas, devido ao seu alto valor. À rouparia da casa somavam-se também diversos
outros objetos, de prata ou metais como o cobre e o ferro, cerâmica, além da madeira
(SETÚBAL, 2008).

Os objetos mais comuns nas residências eram as salvas (espécie de prato ou bacia
amplo e raso), pratos e talheres lisos ou com ornamentação barroca. Já as camadas po-
pulares se contentavam com objetos de estanho e madeira. Porcelanas orientais e louças
europeias, praticamente inexistentes no período colonial, tornam-se abundantes no XIX.
Nas cozinhas, eram comuns os tachos, caçarolas, caldeiras, caldeirões e frigideiras de me-
tais como o cobre e o ferro, além de muitos recipientes de cerâmica (SETÚBAL, 2008).

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Algumas novidades começam a parecer nos Oitocentos: relógios de parede, louças


de Macau, serviços de cristal, espelhos e peças com assentos e encosto de palhinha,
destronando os móveis de jacarandá. Tanto nas fazendas como nas moradas urbanas,
as salas receberam móveis neoclássicos tardios: cadeiras, poltronas e sofás de palhinha,
com assentos e encostos de medalhão oval com as finas tiras de palha trançada, sendo
essa a tendência de maior impacto no mobiliário oitocentista. Eram móveis leves em um
padrão que se repetia nas ricas moradias, tal como os móveis de madeira encurvada
chamados Thonet, produzidos na Áustria e posteriormente no Rio de Janeiro, tiveram
grande popularidade no Brasil. Cadeiras desse padrão, algumas delas com enfeites flo-
rais entalhados presos no alto do encosto, eram frequentemente encontradas nas áreas
cafeicultoras (SETÚBAL 2008).

Figura 5 – Acervo do Museu Visconde de Mauá: liteira, cama, cristaleira e relógio


Fonte: Wikimedia Commons

O aumento das atividades econômicas decorrentes do café nas cidades, o crescente


número de emigrados europeus e a regularização das viagens marítimas saídas de Santos
ou do Rio de Janeiro em direção à Inglaterra intensificaram as mudanças nas práticas e
costumes. Ao observarmos as transformações ocorridas nos interiores das residências
no século XIX a partir da cultura material, compreendemos de que forma o aumento na
oferta e no consumo do mobiliário, de objetos de decoração de estilo europeu e de utensí-
lios domésticos, estava relacionado com a modernização cultural, social e econômica das
sociedades (ABRAHÃO, 2010).

As casas bem cuidadas e luxuosas procuravam individualizar-se, expressando o êxito


econômico, o gosto, as preferências culturais de seu proprietário, transformando-se em
um cartão de visita de seus moradores sendo as salas os espaços de representação so-
cial, iluminados por lustres de cristais Baccarat. A altivez dos salões dos sobrados, suas
suntuosas residências urbanas, era exibida à nata da sociedade nos jantares, saraus e
bailes a partir da sedução pela projeção social possibilitada por ter salas bem decoradas
(ABRAHÃO, 2010).

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Nas casas aristocráticas, a sala de visitas era o espaço onde os anfitriões re-
cepcionavam seus amigos. Construída na parte frontal da residência, nesse
cômodo eram expostos os móveis mais luxuosos e elegantes. A forma de
disposição das cadeiras e dos sofás induzia implicitamente a um caráter
de distinção e hierarquia. O arranjo dos móveis formava um U, ficando a
poltrona de encosto alto e com braços de uso do chefe da casa em uma das
extremidades, ladeado por um sofá, canapé ou cadeiras de palhinha sem
braços. A esposa sentava-se à direita de seu marido [...] havia cadeiras para
todos os convidados e familiares. (ABRAHÃO, 2010, pp. 105-106)

Nas salas, cristaleiras e aparadores-guarda-louça eram dispostos nas salas de jantar, guar-
necendo as paredes que cercavam as longas mesas para mais de uma dúzia de pessoas.
Pelos vidros nas portas desses móveis, muitas vezes lapidados com delicados motivos florais
ou com o monograma do proprietário, as famílias podiam ostentar a louça e as porcelanas,
bem como os cristais e serviços de chá em prata. A antiga primazia mantida pela porcelana
asiática na Época Moderna, quando era importada com enorme custo pelo Ocidente, foi
profundamente abalada pela fabricação de louça e também de porcelana na Europa, com-
pradas abundantemente pelos fazendeiros de café (SETÚBAL, 2008).

É preciso diferenciar a louça da porcelana, aquela geralmente uma faiança de mate-


rial de cor terrosa revestida de uma capa de material vitrificado, pode ser com facilidade
identificada virando-se a peça para baixo, o ponto onde esta toca no forno revela o
material interno. O tipo mais comum procurava imitar a chamada porcelana de Macau,
isto é, tinha seu revestimento externo nas cores azul e branca, tentando reproduzir os
motivos orientais do produto chinês. O padrão decorativo mais usual foi aquele no Brasil
chamado de “azul-pombinha”, pois traz no centro a figura das aves voando sobre uma
paisagem litorânea na qual se passa uma lenda chinesa (SETÚBAL, 2008, p. 149).

Muito mais cara do que a louça, a porcelana era feita de uma mistura de caulim, uma
substância terrosa esbranquiçada, mais quartzo e feldspato, que endurece quando cozida
e se torna translúcida. Difere, portanto, da faiança, que é opaca. Os fazendeiros de café
paulistas estiveram entre os grandes consumidores brasileiros da porcelana francesa;
muito disputadas, essas porcelanas indicam claramente a rápida sintonia entre os hábi-
tos que se queria implantar nas fazendas e sobrados ou palacetes urbanos com aqueles
costumes das elites europeias do Oitocentos. A nova sociabilidade dos salões, que a
projeção econômica e social exigia de muitos rudes produtores de café, era alimentada
por um rol de consumo sofisticado das elites sociais que existiu antes da Primeira Guerra
Mundial (SETÚBAL, 2008).

Os artefatos funcionavam como elementos de diferenciação social nas residências,


já que as casas deveriam corresponder à riqueza de seus proprietários e as atividades
sociais constituíam momentos de consolidação das posições na sociedade e nas famílias.
Nos jantares cerimoniosos, os anfitriões posicionavam-se nas cabeceiras das mesas e os
convidados acomodavam-se nas laterais, de acordo com o grau de amizade ou afinida-
des políticas mantidas entre convidados e anfitriões. Nos jantares em família, a senhora
posicionava à direita de seu marido, mas, em todas as ocasiões, as mulheres possuíam
papel fundamental e dominavam esse ambiente. Não apenas na decoração da mesa,
com “delicados arranjos [...] toalhas de linho crivadas impecavelmente engomadas e os

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guardanapos dobrados em forma de leques” (ABRAHÃO, 2010, p. 107), mas também


na escolha do cardápio para os jantares e festas, acompanhando de perto todos os pro-
cessos realizados nas cozinhas amplas e espaçosas das casas da elite.

No “Dicionário da Língua Portuguesa”, em uma edição publicada em 1832, a palavra rouparia


significa um baú ou armário no qual se guardam as roupas. No entanto, dois séculos antes, rou-
paria significava a roupa de cama e mesa, encontrada comumente nos inventários. A filologia
identifica tais transformações no sentido das palavras, conforme transformavam-se também
os hábitos das famílias e a quantidade de peças de vestimentas.

Nas cozinhas das famílias abastadas, amplas e espaçosas, circulavam apenas os mem-
bros das famílias e os serviçais. Tachos de cobre, pilão de mão, gamelas, raladores, penei-
ras, colheres de pau, alguidares, pratos e talheres de uso diário eram utensílios indispensá-
veis nas cozinhas. Além do fogão a lenha e, em algumas residências, também era utilizado
o forno de barro para torrar grãos e para os assados, pães e biscoitos. Entre o final do
século XIX e o início do XX, as cozinhas deixariam de ser mal cheirosas e feias para se
tornarem belas, limpas e claras. Ocorreram modificações nos utensílios, passou a receber
louças vidradas, faianças portuguesas e inglesas, além de utensílios como batedeira de
ovos e de manteiga manuais e o moinho de café substituindo o pilão (ABRAHÃO, 2010).

Todos esses utensílios eram descritos nos inventários, tanto quanto nos séculos ante-
riores, ao final do XIX demonstrando as novidades como chocolateira, fogões de ferro
fundido e toda a “bateria” ou “trem” de cozinha. Ambientes dos cheiros e dos sabores,
as cozinhas desde os tempos coloniais tornaram-se espaços da transmissão das tradi-
ções alimentares, que, no caso brasileiro, contou com o rico entrelaçamento de “saberes,
sabores e paladares de várias culturas” (ABRAHÃO, 2010, p.132).

Os dados dos inventários demonstram que o interior das casas se transformou confor-
me as cidades foram vivenciando crescimento econômico, bem como o significado social
dos bens. Dessa forma, os estratos intermediários da sociedade das sociedades seguiam os
mesmos padrões comportamentais das elites pois desejavam fazer parte dela, frequentar
os seus salões. Tais mudanças na cultura material e nos hábitos não alcançaram todos os
estratos da sociedade, mas é certo que, no século XIX, o cotidiano já havia mudado em
vários sentidos se comparado ao período colonial, mesmo que não tenha ocorrido na
mesma intensidade ou velocidade. O mundo do café produziu seu impacto, sentido em
maior ou menor intensidade pelas pessoas dependendo da sua relação com este mundo.

A Cultura Alimentar e seus


Múltiplos Significados Culturais
Nenhuma cidade alimenta a si mesma. Diferentemente da aldeia ou da vila, uma cida-
de depende de uma grande quantidade de gente de fora para plantar ou cultivar alimen-
tos e, sobretudo, para transportá-los, e de intermediários para comprá-los e revendê-los
aos consumidores. Quando as cidades mais importantes, ao final do século XVIII e início

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do XIX, são examinadas, é notável a variedade de seus moradores, assim como a sua
estreita e multifacetada interconectividade (GRAHAM, 2013).

Os que distribuíam e vendiam alimentos – fossem eles humildes vendedores ambulan-


tes ou substanciais merceeiros, açougueiros ou comerciantes de gado, marujos comuns
ou mestres de embarcações (nas cidades litorâneas) que traziam alimentos de pontos ao
longo da costa atlântica – estavam ligados a quase todos na cidade. Grandes produto-
res, comerciantes internacionais ou de escravos, pessoas de tipo mediano, umas mais
abastadas do que as outras, assim como algumas muito pobres e as escravizadas, todas
elas se dedicando intensamente no trabalho, enchiam a cidade e a faziam funcionar.
Esse ambiente urbano proporcionou a formação de um grande setor intermediário de
comércio (GRAHAM, 2013).

Escravos e livres, negros e brancos, mulheres e homens, pobres e não tão pobres rela-
cionavam-se entre si, simultaneamente exemplificando a ordem hierarquizada da sociedade,
deixando de ver nessas relações apenas a dicotomia exploradores e explorados, a partir da
compreensão de que todos são serem humanos complexos, com múltiplas preocupações e
relações variadas, ainda que alguns fossem privilegiados e muitos severamente oprimidos.
“Essas pessoas ocupavam posições sociais num continuum, e não em grupos separados de
maneira nítida”. Nas práticas reais, há categorias em que as pessoas necessariamente não
viam a si mesmas como pertencentes a elas, o que significa que as relações socias era muito
mais complexas do que imaginado (GRAHAM, 2013, p. 23). No entanto, havia muitas ma-
neiras de diferenciar-se socialmente, uma das mais comuns era pelos bens materiais, o que
inclui a possibilidade financeira de consumir alimentos caros.

O comércio de alimentos se encaixa no contexto mais amplo que ia além de meramente


saber como a comida chegava à mesa das pessoas. Pelo menos, desde os tempos medie-
vais, uma das tarefas do governo de uma cidade na maior parte do mundo ocidental era
assegurar aos moradores urbanos o suprimento adequado e seguro de alimentos, a preços
acessíveis. Ao final do século XVIII, havia críticas a essa visão mais antiga de controle estatal
restringindo a atividade econômica dos comerciantes superprotegendo os compradores. As
instituições públicas que orientavam o comércio de alimentos influenciaram as ações de
muitas pessoas, em relações marcadas por conflitos, negociação e flexibilidade (GRAHAM,
2013). A maior parte dos habitantes tinha a sua dieta dividida principalmente entre a farinha
– de mandioca ou trigo – e a carne, principalmente do gado, mas também os suínos e aves,
entremeadas pelos temperos, frutas e doces vendidos pelos escravos de ganho.

A riqueza proporcionada pelo cultivo do café em vastas áreas do sudeste acabou por
afetar também as práticas alimentares. No que diz respeito às bebidas, o café reinava,
mas também o mate era consumido em muitas regiões. Além da infusão do mate, o chá
oriental também teve seu espaço, a relevância das relações com a Inglaterra no século
XIX também foi responsável pela introdução do chá como prática de sociabilidade em
todo o Ocidente. Outros itens relacionados aos momentos de sociabilidade relativos às
mesas e os momentos de alimentar-se eram os doces.

Alguns vindos dos tempos coloniais continuaram a serem consumidos, doces de fru-
tas como marmelada, goiabada e bananada, doces de tubérculos, como abóbora e bata-
ta-doce, ou doces de origem portuguesa como a ambrosia, feito com gemas queimadas.
Bolos de arroz, bolinhos de chuva, arroz-doce, biscoitos de polvilho, pão de ló, cremes

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de ovos, que permaneceram nas mesas e nos cadernos de receitas do século XIX, só
foram substituídos por produtos industrializados no século XX (SETÚBAL, 2008).

No que diz respeito aos alimentos salgados, o tripé colonial mandioca, carne seca e
feijão continuou a compor a dieta principal da maioria da população, mas também passou
a dividir espaço com muitas novidades que foram introduzidas na culinária tanto pela eu-
ropeização das elites quanto pela imigração. Os pescados de água doce, as carnes secas
ou de caça, o cuscuz, o quibebe (bolo de carne seca e abóbora) e as farinhas tradicionais
passaram a perder espaço nas mesas dos fazendeiros em relação aos produtos importa-
dos, sobretudo, após as ferrovias conectarem o interior com os portos (SETÚBAL, 2008).

Presuntos e outros embutidos, queijos, peixes salgados, lombos de porco e condimen-


tos estiveram entre os alimentos importados que podiam ser comprados nos empórios
espalhados pelas cidades mais ricas. Vinhos, licores e conhaques passaram a frequentar
os copos e cálices de cristal, disputando espaço com os sucos de frutas dos pomares,
como o de jabuticaba e o de carambola (SETÚBAL, 2008).

Em São Paulo, houve uma presença massiva de imigrantes a partir de 1860 que
contribuíram no gosto alimentar dessa região, a partir de uma combinação de gostos
da Itália, Japão, Sírios e Libaneses, em uma demonstração do paladar multiétnico que
acabou por tomar conta das cidades paulistas entre os séculos XIX e XX, dessa forma:

As massas de macarrão, as polentas do Vêneto, as mortadelas e as broas


são as contribuições alimentares mais disseminadas em São Paulo pela
presença dos imigrantes italianos, além das pizzas napolitanas [...] Foram
esses também os responsáveis pelo incremento na produção das hortaliças
como tomates, pimentões e rúculas. [...] Os japoneses difundiram [...] além
do chá [...] as plantações de arroz, sobretudo no Vale do Ribeira, além de
terem se especializado na produção de produtos americanos, como a ba-
tata. [...] Sírios e Libaneses [contribuíram com] [...] esfihas e quibes foram
paulatinamente sendo apropriados – algo semelhante às inúmeras barracas
ambulantes de tapioca nordestina. (SETÚBAL, 2008, p. 137).

Os traços alimentares estão entre as maiores referências culturais oriundas da presença


dos imigrantes em São Paulo. Mantida como na origem ou reelaborada segundo as con-
dições e sugestões locais, a culinária por eles introduzida, justapôs-se à herança vinda do
período colonial, aos alimentos apreendidos da europeização (SETÚBAL, 2008). Mas a
bebida que passou a unir todas as preferências a partir do século XIX foi realmente o café,
acompanhando as transformações na alimentação, imigrantes, paulistas ou brasileiros de
forma geral se renderam e frequentavam estabelecimentos que ofereciam não apenas a
bebida da sociabilidade, mas também bolos e outros quitutes de acompanhamento.

Ainda em São Paulo, havia lugares simples que faziam de maneira artesanal não
apenas o café, mas também os acompanhamentos, tais como quitutes, bolos de fubá,
broinhas de polvilho e bolinhos de tapioca. Esses locais passaram a dividir espaço no
último quartel do século XIX com novas casas mais sofisticadas nas quais eram servidos
junto com o café docinhos franceses, bombons, sorvetes de chocolate, pudins caramela-
dos e pão com manteiga, consumida apenas por aqueles que podiam pagar pelos altos
preços do trigo e da manteiga importada (MONTELEONE, 2010).

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Ouça as histórias dos descendentes de italianos de São Paulo contando sobre as receitas e
costumes alimentares que passaram de geração para geração.
Disponível em: https://youtu.be/SQEaO2hNcL8

Tomar café nesses locais não significava apenas sorver o líquido. O café e o local
onde ele era consumido tornaram-se indissociáveis, estimulando as conversas sobre o
cotidiano e as discussões entre estudantes, políticos, artistas, negociantes e empregados
do comércio. À moda europeia, os estabelecimentos brasileiros adotaram um ar sofisti-
cado, mas continuaram como locais de difusão das notícias e de debates. A introdução
das máquinas já no início do século XIX criou os expressos, a princípio recebidos com
reservas (MONTELEONE, 2010).

Aos poucos, o público se habituou aos estabelecimentos que serviam os expressos,


onde não havia cadeiras nem mesas e todos tinham que se encostar no balcão para
beber seu café. O hábito de tomar café ao final das refeições em casa também inicia
durante o século XIX, em um momento de sociabilidade que finalizava o ato social dos
jantares e almoços (MONTELEONE, 2010).

Na sociedade da época era de bom tom que as anfitriãs cuidassem pessoalmente da


elaboração do cardápio a ser oferecido nos jantares e banquetes, além da sua supervisão
direta na feitura dos pratos e doces que seriam servidos aos convivas. Nas cidades, já
existiam docerias, confeitarias e padarias prontas para atender a demanda das festas da
sociedade (ABRAHÃO, 2010).

A preparação cuidadosa dos cardápios pelas


senhoras deveria considerar o tipo de reunião a
ser oferecida. Isso porque elas poderiam prever
as escolhas alimentares, as combinações de pra-
tos, com o intuito de agradar o maior número
de convivas. Esses cardápios eram enviados aos
convidados em forma de convites e discriminavam
todos os serviços em suas respectivas ordens, da
entrada à sobremesa, as bebidas e, em alguns ca-
sos, constavam cigarros e charutos. Findo o jan-
tar, os anfitriões encaminhavam seus convidados
para outras salas próximas à sala de jantar, locais
onde eram servidos o café e os licores, cerimô-
nias com muitas influências inglesas e francesas
(ABRAHÃO, 2010).

Nessas salas, existiam mesas com tampos de


mármore, ricamente decoradas onde eram colo-
cadas fruteiras de cristal com as frutas de época, Figura 6 – Página do cardápio do último
muitas vezes colhidas dos próprios pomares. Ao Baile da Ilha Fiscal (1889), Arquivo Nacional
Fonte: Wikimedia Commons
redor dessas fruteiras, era disposta uma variedade
de doces secos envoltos em papéis de cores variadas, bolos, cocadas, pudins, compotas e
queijos. A tradição da doçaria e os cuidados com a alimentação eram passados de geração

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para geração, a partir dos cadernos de receitas escritos pelas senhoras. A sociabilidade
praticada pela elite por certo não chegou aos lares dos demais estratos da sociedade. As
festas para as camadas mais pobres resumiam-se às festividades religiosas, aos eventos
políticos, aos enterros de personalidades e às suas reuniões de família (ABRAHÃO, 2010).

No entanto, eram essas pessoas das camadas mais pobres, que, de fato, cozinhavam,
em conjunto com as escravas da elite. Qualquer refeição era resultado de horas de tra-
balho, segundo o relato de alguns viajantes. O mais simples feijão tinha que ser posto a
secar, ser batido, abanado, catado antes de ir ao fogo. O café depois de colhido, tinha que
secar ao sol, ser abanado, limpo e depois torrado e moído. Polvilho e fubá, muito usados
no lugar do trigo, exigiam ralação de mandioca, depuração e secagem do polvilho, ou a
moagem do milho realizada com pesadas mós de pedra. A conservação da carne também
dava trabalho: retalhavam-se as peças que eram postas a secar ao sol, ou fritas. A banha
era recolhida e armazenada para utilização em diversas receitas (PRIORI, 2016).

A produção de queijos, hábito originado de Minas Gerais, também exigia atenção,


sendo virados e revirados para não incharem. O requeijão, por sua vez, nascia da coa-
lhada frita em manteiga, apurada e batida com força sobre o fogo até virar massa elás-
tica e ser lavada com leite. Os doces também consumiam trabalho e tempo, preparos
elaborados tiravam o amargor dos cítricos, a seguir, ferviam-se por horas as frutas até
obterem o ponto certo. Para usar o fogão, eram necessários saberes específicos. O
controle da temperatura, a lenha sempre à mão, o tempo de cada receita, o manuseio
dos utensílios e da matéria-prima, tudo isso requeria os conhecimentos de uma pessoa
em especial: o cozinheiro ou cozinheira. Na transição do trabalho escravo para o livre,
houve muita rotatividade desse tipo de empregado, devido também à falta de regulamen-
tação do tipo de serviço (PRIORI, 2016).

Em Síntese
As novas tecnologias das cozinhas oitocentistas não apenas mudaram os hábitos ali-
mentares, mas também alteraram as características do trabalho doméstico relativo a
esta atividade, que sempre havia pertencido aos escravos].

Na cozinha do século XIX, outros personagens foram o fogão de ferro, a lenha e o


carvão. O fogão de ferro útil não só para cozinhar, mas também para aquecer os am-
bientes, era importado da Inglaterra e dos Estados Unidos. Os imigrantes italianos se
encarregaram de difundi-lo, compacto e econômico, ele utilizava menos lenha do que os
de barro ou tijolos. Nas casas populares e cortiços, a cozinha era coletiva e precária, mas
eram elas que preparavam as refeições da maioria da população, o que era iniciado com
o café da manhã, pães, café, ovos quentes, mungunzá (milho cozido com leite de coco),
cuscuz de milho, farinha de mandioca com rapadura picada e açúcar, jerimum, beiju e
broas de milho. Leite era raro. Na segunda metade do século XIX, os ricos tinham mais
opções, chá, café ou chocolate, e um copinho de licor francês, pães diversos, frutas,
biscoitos e sorvetes (PRIORI, 2016).
Os almoços ocorriam ainda na parte da manhã e poderiam ser realizados apenas
entre homens, os jantares eram mais formais e ainda havia uma ceia ou lanche da noite
com chá, bolos, pão de ló e torradas. Ao contrário de tanto refinamento, nas mesas dos

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mais pobres, modos grosseiros, tais como o comer com as mãos e sonoros arrotos ao
final das refeições, lambuzando-se com a carne seca, o feijão, a farinha de mandioca,
o arroz, o pão o angu, alguns peixes, enquanto alimentação exclusiva de boa parte da
população (PRIORI, 2016).

Em contraste com as elites, pelas quais eram importados muitos produtos e os pratos
eram sofisticados, incluindo “faisão assado”, “línguas de rouxinol”, “perdiz à milanesa”, en-
tre outros acepipes frios e delicados, verduras, cremes e natas, além dos bombons france-
ses, além de muitas regras de etiqueta e manuais de boas maneiras. No almoço, iam para
as mesas todas as comidas, inclusive as compoteiras de doces, os licores, as garrafas de
vinho e as moringas d´água. A refeição tinha início com pratos quentes, assados antes dos
peixes, entradas frias com embutidos apenas após 1870, vinho do porto ou café encerrava
a refeição. As novidades gastronômicas incluíam whisky, gin, presunto, salmão, queijos e
manteiga importados, além de frutas cristalizadas (PRIORI, 2016).

A substituição de produtos in natura pelos industrializados, usados com a mesma fi-


nalidade, indicam mudanças nas relações sociais e econômicas. Por exemplo, deixava-se
de procurar a botica para comprar bicarbonato para ir ao armazém adquirir o fermento
“Royal”. Mas a aquisição dos ingredientes não consistia atividade banal e aleatória, re-
querendo conhecimentos sobre os produtos que se estava adquirindo. Envolvia a ritu-
alidade que foi se perdendo ao longo dos anos. As autoras dos cadernos de receitas e
suas ajudantes, quando iam às compras, com olhares atentos identificavam os legumes
e frutas bons para o produto do consumo (ABRAHÃO, 2019). A alimentação associada
à representação da condição social identifica que o que se comia e as formas de comer
diferenciavam as pessoas, em um mundo no qual essas relações estavam constantemente
se transformando, em conjunto com os hábitos e as novas formas de entender e o mundo.

A Fotografia e a Pintura do
Cotidiano: Retratos de Historicidade
Vivermos em um mundo perpassado por imagens, cercados e dominados por elas.
Imagens nos fascinam, povoam a memória que remete ao passado, elas também ocu-
pam o nosso universo mental quando ativamos nossa capacidade de criar, transformar
e pensar em mundos diferentes daqueles em que vivemos. As imagens são frutos da
ação humana, que interpreta e recria o mundo como representação, elas são visuais e
carregam consigo essa condição especial que se realiza no plano dos sentidos, são, pois,
traços de uma experiência sensorial e emotiva (PESAVENTO, 2008).

Mas, para além da instância das sensações que produzem o efeito visual, as imagens
são mentais, pois são fruto de uma percepção, o que nos remete aos processos da esfera
cognitiva de reconhecimento, identificação, classificação e atribuição de significados. As
imagens apreendidas pela vista recebem uma carga de sentido que as permite perdurar
na memória, podendo ser recuperadas pelo pensamento criando, assim, uma memória
de imagens, constituída pelas representações visuais e mentais do mundo, transmitindo
as tensões, conflitos e a base dos comportamentos sociais (PESAVENTO, 2008).

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UNIDADE Cotidiano e Vida Material no Império (1822 – 1889)

Nesse sentido, a fotografia introduziu um novo tipo de ver e dar a ver a diversidade do
mundo moderno. Ela transformou o modo como as sociedades passaram a perceber e lem-
brar de suas próprias realidades (KOSSOY, 2001). Mas, antes da fotografia, que é um invento
contemporâneo do século XIX, já existiam diversas tentativas de apreensão da realidade por
parte da iconografia, mais especificamente em desenhos e pinturas. Aproximações podem
ser realizadas entre esses dois momentos quando tomamos ciência de que intencionalidades
estão presentes tanto no ato de retratar/pintar, quanto no ato de fotografar.

Com relação aos desenhos e pinturas da era moderna, a história do olhar sobre as
populações fora da Europa começou no continente sul-americano, sendo a obra de Frans
Post a contribuição mais marcante do período colonial para o conhecimento por imagens
da realidade brasileira. Mas é preciso reconhecer que, apesar de Post, durante os primei-
ros séculos dessa exploração, os preconceitos religiosos e culturais dominantes não deixa-
ram muito lugar à investigação precisa, ou seja, a um olhar científico. A partir do século
XVIII, houve um avanço com a multiplicação das viagens de exploração, nas quais havia
se difundido a tradição própria aos marinheiros de longo curso de escrever diários sobre
as populações, lugares, flora e fauna das terras percorridas (LEENHARDT, 2008).

A precisão dessas descrições dá ideia do espírito de curiosidade intelectual difundido na


época das grandes viagens exploratórias da segunda metade do século XVIII. O interesse
pela investigação científica adentrou também o século XIX, dando continuidade às viagens
de exploração e observação científica. A ocorrência de publicações de muitos desses es-
tudos deram um enquadramento intelectual novo às empresas da descoberta que iam ter,
igualmente, influência decisiva no campo das artes, uma vez que se colocavam em face
das exigências de precisão documental ainda inéditas na época (LEENHARDT. 2008)

Além disso, havia uma questão estética que precisava lidar entre a visão tradicional
do ensino acadêmico, ainda sob as regras do neoclassicismo, e a exigência de exatidão
que se tinha desenvolvido por ocasião das expedições. Essas expedições foram, na
verdade, ocasião de feliz encontro entre artistas, formados no desenho e na pintura nas
academias de belas artes e dos desenhistas científicos habituados à disciplina descritiva
da botânica ou da zoologia (LEENHARDT, 2008).

As regras da arte acadêmica encontraram-se, pois, confrontadas com as


exigências não mais da “bela natureza”, como se gostava de dizer, mas sim-
plesmente da natureza, com suas próprias leis de organização. A questão
ultrapassava em muito a única exatidão na relação das formas e das maté-
rias (escamas, peles, cores, tecidos cutâneos). A nova verdade da natureza
exigia uma verdadeira especificação da planta ou animal [...] que substituiria
a “bela paisagem” por “um meio de vida”. Essas exigências, estranhas à
tradição do paisagista clássico, constituem para os pintores uma espécie
de campo contraditório. Durante um longo tempo, entre digamos 1780 e
1860 [...] pode-se dizer que a evolução do desenho documental, e mais ain-
da etnográfico, será determinado pela maneira segundo a qual cada artista
se comportará com relação aos códigos da aprendizagem acadêmica da
arte aos quais se filia. (LEENHARDT, 2008, p.37)

Do mesmo modo que as perspectivas do mundo físico e natural dos trópicos, as ima-
gens que os estrangeiros construíram das gentes do Brasil ganharam os seus contornos

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básicos durante o período colonial. As narrativas oitocentistas, precisamente aquelas fei-
tas depois da abertura do país à visitação e à permanência dos estrangeiros, iniciada em
1808, incluem mais riqueza de detalhes nas descrições sobre as gentes mencionadas.
Entre os que desembarcam pouco depois da abertura dos portos e permanecem longos
períodos em terras brasileiras, é comum a percepção de que, dia após dia, o brasileiro,
graças ao contato cada vez mais próximo com os “civilizados” hábitos e costumes da Eu-
ropa – se tornava mais e mais distante da “selvageria americana” (FRANÇA, 2010, p. 10).

O vídeo da palestra da pesquisadora do Instituto de Artes da UNICAMP, Claudia Valadão. Na


sua fala, as ligações entre a política e a pintura de paisagem no Brasil do século XIX ficam
explicitas nas obras de artistas como Debret, Rugendas e Hércule Florence. Em destaque o
trabalho do pintor Felix Emilie Taunay, ao demonstrar como a pintura de paisagem se rela-
cionava com projetos políticos específicos. Disponível em: https://youtu.be/hhChGN1Krnw

Contudo, já na metade do século XIX, os visitantes estrangeiros passaram a demons-


trar certa impaciência e frustração com a adesão dos habitantes locais aos “regeneradores
e progressistas” hábitos civilizados vindos da Europa. Inúmeras são as narrativas do perío-
do que apontam quão relativa era essa adesão: os indivíduos de posses de fato cultivavam
modos europeus, mas eram todos postiços, desprovidos de “lastro moral”; outros, a maior
parte da população, especialmente o enorme contingente negro que a compunha, viviam
no mais completo “obscurantismo, desconhecendo preceitos básicos de civilidade”, visão
que não seria abandonado até o final dos oitocentos. (FRANÇA, 2010, p. 10)

Mas não são somente descrições e críticas à população do Brasil ou observações


científicas que estão presentes na produção dos viajantes. Durante a época do Reinado,
a corte portuguesa convoca artistas franceses ao Rio de Janeiro, que se reúnem em
torno do Projeto da Academia de Belas Artes e ali sedimentam práticas derivadas do
recente neoclassicismo francês. Entretanto, é a pintura de retratos que fixa a presença
da corte e da aristocracia imperial após a Independência. E é a paisagem histórica, re-
novada pela retórica neoclássica, que qualifica a imagem política da bravura e do grande
feito (BELUZZO, 1994).

Do mesmo modo, surgem novas oportunidades artísticas pela decoração e arqui-


tetura que redefinem o cenário urbano. Se o aparecimento da paisagem histórica no
século XIX conta com tradições paisagísticas herdadas do cerimonial público e de cenas
de luta e ocupação, a pintura paisagística do século XIX se associa a outras tradições,
provenientes, de um lado, dos mitos edênicos e do culto à natureza e, de outro, do
conhecimento da natureza e de sua dessacralização. Muitas vezes, as representações
visam promover a imagem do Brasil no exterior, enquanto alguns artistas movidos pelo
sentimento existencial atingem a mais pura contemplação (BELUZZO, 1994).

Um dos exemplos clássicos e mais conhecidos da produção artística dos viajantes, e


que contém muitas características que foram citadas, é a produção do artista Jean Bap-
tiste Debret, presente na Viagem pitoresca e Histórica ao Brasil, produzido ente 1816
e 1831 (LEENHARDT, 2008). Ainda que voltado sobretudo para a pintura histórica,
Jean Baptiste Debret tinha, sem dúvida, conhecimento dos processos artísticos em voga

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UNIDADE Cotidiano e Vida Material no Império (1822 – 1889)

na Europa antes de partir para o Brasil em 1816. Os desenhos elaborados por Debret,
utilizados na obra Viagem pitoresca foram escolhidos por ele após sua volta à França,
e o texto é redigido a partir das figuras, em linguagem de relatório, para a publicação
em fascículos entre 1827 e 1835.

A obra é proposta a partir do ponto de vista da Missão Artística Francesa no Brasil,


traduzindo, portanto, um projeto civilizador de extensão cultural. Debret trata de centrar
a atenção no estado geral da sociedade, buscando apreendê-la com base no entendi-
mento da transformação da natureza em cultura, do natural em civilizado. A concepção
procede da Ilustração francesa, acrescida do interesse pelas particularidades dos povos
(BELUZZO, 1994).

O discurso histórico construído promove a identificação entre história, nação e civiliza-


ção. Na perspectiva histórica de Debret, a natureza é a base e a cultura o coroamento, sendo
que a obra Viagem pitoresca segue o “traçado lógico da civilização no Brasil”. O primeiro
volume apresenta os “selvagens e os aspectos da floresta”, o segundo volume “detém-se
genericamente nas modalidades de trabalho agrário, na presença do negro escravo e do
pequeno artesão urbano; e o terceiro abrange a esfera pública dos usos e costumes popu-
lares, acontecimentos políticos, práticas culturais e hábitos domésticos do Rio de Janeiro”
(BELUZZO, 1994, p. 84).

Figura 7 – Jean Baptiste Debret – Lavadeiras do Rio das Laranjeiras, 1826 (detalhe)
Fonte: Wikimedia Commons

Existem várias afinidades entre o livro de Debret e o de Johann Moritz Rugendas, in-
titulado Viagem pitoresca ao Brasil (1835), principalmente no que diz respeito ao tema
central: o espetáculo natural vivido pelo viajante e a vida humana em sociedade a partir
de um ponto de vista que pretende ser objetivo. “Não resta dúvida que os artistas reali-
zaram empréstimos da prática científica para a configuração de cenas da vida humana
na floresta, da sociabilidade urbana, das atividades rurais”. Se existe uma diferença entre
as concepções dos artistas, é porque, para Rugendas, “a paisagem natural é a própria
instância particularizadora que define o homem local. Na percepção de Debret, são as
interrelações sociais que constituem o lugar, e o espaço não passa de cenário para o
encontro e o confronto da sociedade” (BELUZZO, 1994, p. 76).

O foco de Debret é a sociedade agindo sobre a natureza e o de Rugendas é a natureza


da sociedade. De qualquer modo, tanto no álbum de Debret como no de Rugendas pre-

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dominam as figuras humanas ambientadas no seu próprio habitat, ou articuladas pela
ação que narra algum costume, lembrando que os textos do Viagem pitoresca não são
de autoria de Rugendas, mas sim baseados em cartas suas reescritas em tom jornalístico
(BELUZZO, 1994, p. 76).

Figura 8 – Johann Moritz Rugendas, A dança do lundu no Brasil (1835)


Fonte: Wikimedia Commons

Rugendas possuía outro diferencial que explica a sua associação mais direta à paisagem
natural; a participação nos preparativos e, nos primeiros meses da expedição do barão
Langsdorff, entre os anos de 1822 e 1825, contando um período de quatro meses em
que o artista deixou o acampamento que ficava em uma fazenda, a dois dias em barco
e a cavalo do Rio de Janeiro para onde se dirigiu e conheceu várias pessoas, incluindo
Debret, com o qual desenvolveu uma sólida amizade. A expedição partiu em 1824, mas
Rugendas a abandonou, pois desentendeu-se com o autoritarismo do barão, apesar de
Langsdorff ter se impressionado com a habilidade do jovem Rugendas. O tempo em que
passou com a expedição conviveu com outros desenhistas, como, por exemplo, Hercule
Florence, que continuou até o final da expedição em 1829, quando Langsdorff adoeceu
(PRADA, 2003).

O grupo foi para Santos de navio e seguiu para a Amazônia pelo interior do país.
De 1826 a 1829, percorreu os atuais Estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Gros-
so, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Amazonas e Pará. Florence realizou uma série de
desenhos e aquarelas, nos quais retratou a fauna, a flora, a paisagem e a população dos
locais visitados. Só em 1849, Hercule Florence retomou suas anotações e começou a
escrever o diário completo sobre a viagem científica. Esse diário, atualmente em posse
de seus descendentes, foi publicado em 1977 sob o título Viagem Fluvial do Tietê ao
Amazonas pelas Províncias Brasileiras de São Paulo, Mato Grosso e Grão-Pará
(1825-1829). Foram 17 mil km percorridos, mas devido aos vários percalços ocorridos
na expedição, só 12 dos 39 integrantes sobreviveram, incluindo Hercule Florence, um
dos desenhistas (PRADA, 2003).

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UNIDADE Cotidiano e Vida Material no Império (1822 – 1889)

Com o fim de seu trabalho como segundo desenhista, o artista radicou-se a partir de
1830, na Vila de São Carlos, atual Campinas, em São Paulo, onde constitui família e
tornou-se fazendeiro, mas sem deixar a arte e as questões científicas de lado. Continuou
registrando a paisagem e as transformações pelas quais passou a região no decorrer do
século XIX. Documentou o incremento da lavoura de cana-de-açúcar e café, o trabalho
escravo nos engenhos, as queimadas e derrubada das matas para plantio e, em menor
número, a capital paulista (ENCICLOPÉDIA, 2021).

Por essa produção, é reconhecido como um dos pioneiros da iconografia paulista.


Hercule Florence é precursor também em outro campo: o dos processos químicos de re-
produção de imagens. Em busca da simplificação dos procedimentos comuns na época
(restritos aos diferentes tipos de gravura, como a litografia e a xilogravura), inventa, em
1830, o que chama de polygraphie [poligrafia], método de impressão em cores seme-
lhante ao atual mimeógrafo (ENCICLOPÉDIA, 2021).

A partir de 1832, começou a investigar as possibilidades de fixação da imagem uti-


lizando a câmera escura por meio de um elemento que mude de cor pela ação da luz.
Com a ajuda do boticário Joaquim Correa de Mello, realiza experiências fotoquímicas
que dão origem a imagens batizadas de photographie [fotografia] em 1833. Ou seja,
na mesma época que Joseph Nicéphore Niépce (1765 – 1833) e Louis Jacques Mandé
Daguerre (1781 – 1851), na França, e William Henry Fox Talbot (1800 – 1877), na In-
glaterra, e sob condições científicas muito diversas, Florence produz cópias fotográficas
de desenhos (ENCICLOPÉDIA, 2021).

De característica autodidata, relatava suas experiências em diários, e lá constava


também a associação realizada entre alguns produtos químicos e os sais de prata para
obtenção e reprodução de imagens pela ação da luz a partir da Câmara escura. Entre es-
sas imagens, estavam rótulos de farmácia e diplomas, mas não fotografias de lugares ou
pessoas. No entanto, suas realizações ficaram à sombra de reconhecimento. Somente a
partir do final do século XIX, Florence começou a ser considerado enquanto desenhista.
E quanto à sua experiência fotográfica, essa teve de esperar cento e quarenta anos, até
o início da década de 1970 e as pesquisas de Boris Kossoy, ao mandar refazer em labo-
ratório as experiências das anotações dos diários, que confirmaram seus feitos, obtendo
reconhecimento mundial. Quando de suas primeiras experiências, em 1833, Florence
tentou contatar diversas autoridades para dar a conhecer o seu invento, mas não obteve
sucesso (KOSSOY, 2006).

A fotografia como um novo meio de conhecimento do mundo possui enorme acei-


tação nas sociedades. O seu consumo crescente traz o aperfeiçoamento da técnica fo-
tográfica e permite o conhecimento mais preciso e amplo de outras sociedades e de si
mesmo. O mundo vai aos poucos sendo substituído por sua imagem fotográfica, o que
inclui as intenções presentes em temas e enquadramentos.

Os primeiros fotógrafos no Brasil eram homens comuns – desenhistas e gravuristas


autodidatas, caricaturistas e pintores desconhecidos. Não possuíam vínculo direto com
as academias. Focava-se o homem comum, a partir de novos e distintos critérios: olhar
para fazer tomadas de acontecimentos sociais, além de paisagens. Cada indivíduo define
não apenas o que merece ser registrado, mas também sob qual ângulo as ações sociais
de seus cotidianos devem ser apreendidas. O que identifica a marca das intencionalida-

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des. Com a fotografia, passava-se a obter a representação visual de um fragmento do
real, e o congelamento dessa ação foi possível graças à gravação diretamente pela ação
da luz sobre determinada superfície sensibilizada quimicamente (KOSSOY, 2002).

A fotografia representou novas formas de identidade e distinção que estavam de


acordo com as expectativas de grupos sociais em ascensão. O costume de retratar-se a
si mesmo era uma forma de privilégio e distinção social, que passou a ser disseminada
entre um número muito maior de pessoas do que aquelas que tinham as suas fisiono-
mias pintadas por grandes retratistas. Outra forma inicial e de muito sucesso que as
fotografias tiveram em seus primórdios, estava relacionada à retratação de paisagens e
de temas de viagem. Era o conhecimento do mundo por meio da imagem. A produção
dessas vistas era muito lucrativa e utilizada para documentar cidades. A fotografia foi
indicativa de uma paixão especial pela exatidão, já que não era contestado o seu estatuto
de verdade (KOSSOY, 2002).

Boris Kossoy, além de pesquisar sobre a História da fotografia, também é fotógrafo e define
que a fotografia é antes de tudo uma forma de expressão autônoma e permissível aos sonhos
e devaneios da imaginação, sendo ela sempre resultado de uma construção. Leia mais sobre
a produção e o pensamento de Boris Kossoy, no link, disponível em: https://bit.ly/3mdXLep

A partir do resgate do cientificismo no período moderno, houve um interesse cada


vez maior pelo conhecimento visual do mundo e de seus homens em pontos afastados
do globo. Tais regiões passaram a representar um rico filão temático a ser explorado
pelos artistas-viajantes. Desde o final do século XVIII, foi cada vez mais comum a reali-
zação de viagens científicas que pretendiam dar a volta ao mundo, mas o Brasil acabou
sendo um destino proibido, devido à política colonial portuguesa de proteção aos seus
domínios nesse período. Em 16 de janeiro de 1840, a corveta francesa “Oriental” che-
gou ao Brasil em meio à sua viagem de volta ao mundo que deveria durar dois anos, mas
não passou do litoral do Chile, onde naufragou (TURAZZI, 2010).

Mas, por todos os lugares nos quais a corveta passou, levou ao conhecimento das pes-
soas o invento de Daguerre, e fez várias demonstrações para tanto. O daguerreótipo não
estava por acaso na embarcação, já que havia interesses diplomáticos, comerciais e inter-
câmbios científicos envolvidos. Havia a expectativa de ser a primeira expedição ao redor
do mundo utilizando a fotografia. Com apoio oficial e cartas de recomendação do governo
francês, a primeira arribada em Lisboa foi frustrante. Mas, apesar dos percalços no início
e durante o percurso marítimo inicial, ao menos no Brasil, as demonstrações obtiveram
grande êxito, despertando o interesse do Imperador D. Pedro II (TURAZZI, 2010).

é a primeira vez que a nova maravilha se apresenta aos olhos dos bra-
sileiros [em 17 de janeiro de 1840] [...] É preciso ter visto a coisa com
os próprios olhos para se poder fazer ideia da rapidez e do resultado da
operação [...] Em menos de nove minutos, o chafariz do largo do Paço,
a Praça do Peixe, o Mosteiro de São Bento e todos os outros objetos
circunstantes se acharam reproduzidos com tal fidelidade, precisão e mi-
nuciosidade, que bem se via que a coisa tinha sido feita pela própria mão
da natureza e quase sem intervenção do artista” Jornal do Commercio.
(TURAZZI, 2010, p. 22)

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UNIDADE Cotidiano e Vida Material no Império (1822 – 1889)

O monarca foi considerado o primeiro fotógrafo brasileiro, já que adquiriu um daguer-


reótipo em março daquele ano de 1840, ele também é considerado o maior colecionador
de fotografias das Américas. Pedro II se interessava por uma produção visual pautada na
objetividade, e seu interesse fez com que alguns “artistas” fossem nomeados “fotógrafos da
Casa Imperial”, como Marc Ferrez. A fotografia no Brasil do século XIX ajudou a construir
a imagem e a autoimagem da sociedade do Segundo Reinado. A produção fotográfica
desse momento elegeu como referências o retrato e a fotografia de vistas. Quanto aos
retratos, neles os grupos sociais se distinguiam, produzindo a partir de marcas visuais a
sua identidade. Os objetos e trejeitos adotados nos estúdios atuavam como emblemas de
pertencimento social, tendo em vista alguns códigos de comportamento. Já a fotografia
de paisagem prendia-se aos aspectos da pintura romântica e do paisagismo dos grandes
panoramas, buscando um resultado próximo à pintura (TURAZZI, 2010).

0
Figura 9 – Marc Ferrez, Retrato de duas senhoras negras (1885), Museu de Arte Moderna RJ
Fonte: Wikimedia Commons

No Rio de Janeiro de 1870, atuavam na Corte e com endereço fixo e anúncios, 38


fotógrafos que ofereciam serviços diversos concentrando-se basicamente no centro da
cidade. Em outras províncias, alguns estúdios famosos também existiam, como em São
Paulo, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco. A clientela desses estúdios era, além da fa-
mília real, donos de terras e homens nobres, além da população urbana mercante e de
serviços. Mas existiam muitos outros, marcados pela itinerância em visitas ao interior,
eram os pequenos fotógrafos, ambulantes, que exerciam diversos ofícios para sobrevi-
ver, e sua obra também é de grande importância (MAUAD, 1997).

Os fotógrafos integraram-se ao cotidiano das cidades, juntamente com as modistas,


cabeleireiros, joalheiros, entre outros agentes dos modos de vida europeus nos trópicos.
A fotografia brasileira do século XIX também teve como principal espaço de divulgação
as exposições universais, nas quais os participantes faziam propaganda das riquezas e
vastidão do território brasileiro. Ela também foi utilizada como instrumento de documen-
tação em várias áreas de investigação científica, para documentar enfermidades e come-
çou a ser utilizada em documentos de identificação entre 1851 e 1853 (MAUAD, 1997).

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Na atualidade, é possível que alguém seja um bom fotógrafo mesmo não tendo gran-
de conhecimento técnico, em virtude dos múltiplos recursos oferecidos pelas câmeras
modernas. Fotografar é atribuir importância. É uma operação ritual que visa glorificar ou
condenar, nunca deixar indiferente. Circunstância que fez com que a fotografia fosse as-
sociada aos acontecimentos significativos e às coisas julgadas importantes. Durante muito
tempo, tal concepção afastou a fotografia do cotidiano, dos momentos banais (VASQUEZ,
2003), o que indica que cada período registrou seus momentos a partir de perspectivas do
contexto específico da sociedade a qual pertencem, ou seja, da sua historicidade.

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UNIDADE Cotidiano e Vida Material no Império (1822 – 1889)

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Vídeos
Visita guiada com Sergio Burgi | Marc Ferrez: Território e imagem
Na abertura da exposição “Marc Ferrez: Território e imagem” no IMS Paulista em 26/03/19,
o curador Sergio Burgi realizou uma visita guiada. A exposição acompanha a trajetória de
Marc Ferrez entre 1867 e 1923, apresentando mais de 300 itens do acervo do IMS e de
outras instituições. A mostra relembra o excepcional fotógrafo que transitou por todos os
campos da imagem, sempre em estreito diálogo com a ciência e a tecnologia.
https://youtu.be/OCl93gWGMDM
Caminhos da Reportagem | Vale do Café: uma viagem no tempo
O programa Caminhos da Reportagem volta no tempo e faz uma viagem às fazendas de café
do século 19 na região do Vale do Paraíba. Foi lá que as famílias vindas de Minas Gerais por
conta do declínio do ouro e comerciantes da cidade do Rio de Janeiro que queriam investir na
região encontraram as condições ideais para a produção de café. O Programa perpassa por
questões históricas, técnicas, arquitetônicas e da cultura material para oferecer um panorama
sobre as características do Vale do Café, no Rio de Janeiro.
https://youtu.be/Xto0LJWbqj4

 Leitura
Mulheres de paletó: Moda e cultura material no Brasil do século XIX
O artigo em questão apresenta uma visão diferenciada sobre a moda brasileira no século XIX,
a partir de uma investigação sobre a adaptação de itens masculinos à indumentária femini-
na. Para além dos vestidos, [joias e chapéus ornamentados, os jornais dedicados ao público
feminino, a partir da década de 1850 até início do século XX, apresentavam às mulheres a
possibilidade de usar coletes, paletós, gravatas sem perder a elegância. Questiona-se, assim,
se a citação de artefatos originalmente masculinos teria agido como uma estratégia simbólica
e performática feminina de empoderamento em um período que discussões sobre o papel da
mulher ganha fôlego na imprensa.
https://bit.ly/3jSSbLy
A coleção de cardápios do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro: impressos efêmeros como fontes para
os estudos sobre história, política e sociabilidade
O artigo traz à luz documentos da cultura material que – por sua natureza – tantas vezes
foram descartados e desvalorizados pelos historiadores: a coleção de cardápios de almoços
e jantares pertencentes ao Arquivo Histórico do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Datados da segunda metade do século XIX à primeira metade do século XX, esse conjunto
de impressos efêmeros foi apresentado enquanto possibilidade metodológica e de pesquisa
no campo da História Cultural, desvelando aspectos importantes da História, Política e
Sociabilidade no Brasil Império e no início da República.
https://bit.ly/3jWLckN

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Referências
ABRAHÃO, E. M. Morar e viver na cidade. Campinas (1850-1900) Mobiliário e utensílios
domésticos. São Paulo, Alameda, 2010.

ABRAHÃO, E. M. A escrita culinária: permanências e transformações. Campinas (1863-


1940). In: PINHEIRO, J.; SOARES, C. (coords.) Patrimónios Alimentares de Aquém
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BELUZZO, A. M. de M., O Brasil dos viajantes: A Construção da Paisagem. Vol. 3.


São Paulo, Metalivros; Salvador, Fundação Emílio Odebrecht, 1994.

BENINCASA, V. Velhas Fazendas. Arquitetura e cotidiano nos Campos de Araraquara


1830 – 1930. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2003.

BURKE, P. Abertura: A Nova História, seu passado e seu futuro. In: BURKE, P. (org.),
A Escrita da História – Novas Perspectivas. 2. ed. São Paulo: Editora da Unesp, 1992.

BRAUDEL, F. Civilização Material, Economia e Capitalismo Séculos XV – XVIII –


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CARVALHO, M., P. de. Uma ideia ilustrada de cidade. As transformações urbanas no


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