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PSICOLOGIA

APLICADA
AO CUIDADO

Fernanda Egger Barbosa


A psicologia da saúde:
aspectos teóricos e
campo de atuação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Caracterizar a psicologia da saúde com base no seu campo de atuação.


„„ Definir o modelo de Urie Bronfenbrenner como alternativa ao processo
de saúde-doença.
„„ Explicar as principais tendências nos estudos, no debate e na prática
em psicologia da saúde.

Introdução
A psicologia é um campo de estudo muito antigo, a qual existia mesmo
quando o conjunto de processos psíquicos eram considerados alma,
espírito e mundo das ideias. Em épocas remotas, é provável que o caráter
psicológico, como o descrevemos hoje, não tenha sido atribuído aos estu-
dos e práticas do pensamento e dos ânimos relacionados ao ser humano
em virtude de fazer parte das crenças e dos assuntos filosóficos. Por ser
difícil a apreensão de sua totalidade e materialidade, a psicologia tornou-
-se, aos poucos, um campo vasto, obscuro, diversificado e divergente.
No entanto, apesar de a história da psicologia remontar à Antiguidade
em diversos tipos de culturas, autores modernos consideram o início da
psicologia como ciência a partir da inauguração do primeiro Instituto de
Psicologia, em 1879, em Leipzig, na Alemanha, por Wilhelm Wundt. De lá
para cá, várias correntes de pensamento, teorias e metodologias surgiram
para tentar dar conta de explicar os fenômenos desse amplo campo de
estudos, indo das mais tradicionais, como a psicologia experimental,
a psicologia cognitiva e a psicanálise, até as mais modernas, como a
psicolinguística, a psicopedagogia e a psicologia da saúde, senda esta
última o tema deste capítulo.
2 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Neste capítulo, você conhecerá diversos modelos teórico-metodoló-


gicos na área da psicologia da saúde. Além disso, conhecerá o conceito
de desenvolvimento ecológico de Urie Bronfenbrenner. Por fim, estudará
a psicologia da saúde a partir de seu campo de atuação.

1 Psicologia da saúde: modelos e


campos de atuação
Nesta seção, serão apresentadas algumas concepções e modelos teórico-meto-
dológicos que influenciaram ou que participam das práticas dos profissionais
de psicologia na área da saúde.
Contudo, não se pode falar de psicologia da saúde sem retomar a ideologia
de pensamento e de ação que surgiu no início do século XV, que se preocu-
pava com o valor do ser humano e como compreendê-lo em seu mundo. Essa
corrente de pensamento foi chamada por Sartre de Humanismo (JACÓ-
-VILELLA; FERREIRA; PORTUGAL, 2013), a qual visava a compreender
o homem em sua própria existência. Nesse movimento humanista, havia o
resgate da filosofia sofista, baseada na Antiguidade Clássica: o homem é a
medida de todas as coisas. Assim, o Humanismo surge como um pensamento
que buscava educar o homem por meio do conhecimento acerca de si mesmo
e sobre a sua civilização.
No decorrer da história da humanidade, múltiplos sentidos foram atribuídos
ao Humanismo. Na Idade Média, prevaleceu o Humanismo cristão, ao passo
que, no Renascimento, tomou-se por base o realismo aristotélico, que via o
conhecimento como uma criação do homem. Por meio dos descobrimentos
de Copérnico e Galileu, houve transformações do pensamento do homem a
respeito de si mesmo e do mundo. Na Era Moderna, novas transformações
do pensamento tiveram como base a filosofia de Descartes (o homem como
o dono de seu conhecimento), Rousseau (cada homem é indivisível do todo
social) e Kant (o homem como ser autônomo que cria suas próprias leis).
Além disso, foram priorizados os valores morais e éticos para orientar a vida
do ser humano em suas comunidades. Por fim, a contemporaneidade trouxe
a valorização da humanidade e sua capacidade de autonomia (BUYS, 2006).
O movimento humanista influenciou o campo da psicologia, inaugurando
um novo saber a respeito das práticas psicológicas, conhecido primeiramente
como psicologia humanista. Por meio do desenvolvimento de estudos e práticas
humanistas em psicologia, outras correntes surgiram, integrando seus saberes
àquela que hoje chamamos de psicologia da saúde.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 3

A psicologia humanista
A psicologia humanista surgiu no século XX (GOMES; HOLANDA; GAUER,
2004), amparada por um movimento social mundial de valorização da vida
de cada ser humano, que culminou na redação da Declaração Universal dos
Direitos do Homem e na criação da Organização das Nações Unidas (ONU),
em 1948, concretizando, juridicamente, o Humanismo enquanto campo que
toma o homem como um ser autônomo e consciente de si.
Nos Estados Unidos, entre 1930 e 1950, vários estudiosos das mais célebres
universidades, como Maslow, Allport, Murphy e Rogers, abriram espaço para
a definição de uma humanização do saber sobre o homem, a saúde e o bem-
-estar, criticando o modelo determinista biológico. Nessa época, a psicologia
humanista acreditava que o desenvolvimento era possível por meio das rela-
ções interpessoais que os seres humanos apresentam durante a vida. Maslow
destacava a importância da re-humanização da ciência; Murphy apelava
para um direcionamento do enfoque para as questões biossociais do homem;
Allport via o homem como um organismo ativo e acreditava no conceito de
motivos fundamentais, que orientam o homem para o futuro; e Rogers definiu
três níveis de intervenção do psicólogo humanista: na educação, no trabalho
organizacional e na psicoterapia. Este último inaugurou a psicoterapia centrada
na pessoa, destacando a importância central da terapia no cliente, e não na
figura do analista, não mais dando destaque à transferência psicanalítica.
No Brasil, a psicologia humanista foi inaugurada em 1970, com base nas
traduções dos estudos de Carl Rogers, na definição do aconselhamento psi-
cológico e na psicologia humanista existencial.

O texto Psicologia Humanista no Brasil (GOMES; HOLANDA; GAUER, 2004), além da história
da psicologia humanista no Brasil, trata da criação da influência da abordagem centrada
na pessoa de Carl Rogers, das vertentes que compunham os estudos e as metodologias
e do que ainda vigora em termos de prática nas diversas áreas aplicadas à psicologia.
4 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Com o pontapé inicial da psicologia humanista, os ideais humanistas


que vigoravam no mundo todo se consolidaram na década de 70 no Brasil.
As lutas e os movimentos antimanicomiais obrigaram os psicólogos a repen-
sarem seus espaços de atuação e suas práticas. Assim, a partir dessa década,
surgiu a psicologia aplicada à saúde, abrindo o leque do campo de forma
polêmica e abrangente, pois confluíam várias correntes teóricas opositoras
em suas formas de abordagem e metodologias.
Os psicólogos, enquanto especialistas em comportamento humano e saúde,
precisaram ampliar seu campo de atuação e voltaram-se para as instituições de
saúde não restritas à saúde mental. Do mesmo modo, a saúde mental também
abria suas portas, deixando, aos poucos, de fomentar a exclusão social dos
pacientes internados.
Segundo Almeida e Malgris (2011), autores como Myazaki, Domingos e
Caballo, em 2001, e Barros, em 2002, definem a psicologia da saúde como um
campo de atuação para os psicólogos que buscam compreender e atuar sobre
a inter-relação comportamento-saúde ou comportamento-doença, além de
aperfeiçoar técnicas de enfrentamento no processo de ajustamento ao adoecer
e a suas consequências.
As autoras determinam, ainda, o surgimento da psicologia da saúde, em
1970, com um grupo de trabalho na American Psychological Association
(APA). Em 1978, foi criada a divisão 38: Health Psychology (Psicologia da
Saúde), com o objetivo de encorajar a integração da informação biomédica
com o conhecimento psicológico:

[...] a Psicologia da Saúde tem crescido rapidamente. A APA publica, desde


1982, a revista Health Psychology, a primeira oficial da área. Seguindo a
tendência, em 1986, formou-se, na Europa, a European Health Psychology
Society (EHPS, 2003), uma organização profissional que visa a promover
a pesquisa teórica e empírica e suas aplicações para a Psicologia da Saúde
europeia. Cada país-membro possui, ainda, sua associação de Psicologia da
Saúde, que realiza atividades como congressos, simpósios, pesquisas, den-
tre outras atividades. Foram criadas várias revistas especializadas: British
Journal of Health Psychology (Reino Unido), Revista de Psicologia de la
Salud (Espanha), Psicologia della Salutte (Itália), entre outras (ALMEIDA;
MALGRIS, 2011, p. 186).
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 5

Segundo Almeida e Malgris (2011), outros autores trouxeram importantes


contribuições para a definição da psicologia da saúde de acordo com o campo
de atuação do psicólogo. De Marco (2003 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011)
considerava a psicologia da saúde como um conjunto de atividades exercidas por
profissionais da área de psicologia que atuam no campo da saúde. Já Trindade
e Teixeira (1998, 2002 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011) reafirmaram o
campo da psicologia como ciência e profissão, incluindo saúde física e mental
em seu objeto de estudo, em virtude da importância do saber médico, mas
ultrapassando-a, ao considerar não apenas os aspectos físico-biológicos, mas
também os aspectos sociais, culturais, ambientais, econômicos, de gênero,
entre outros, como influenciadores do processo saúde-doença. Os autores
defendem que o psicólogo, ao atuar nesse campo, deve trabalhar com foco na
promoção e manutenção da saúde e na prevenção da doença.
Mas de que forma o psicólogo deve intervir e contribuir para melhorar o
bem-estar e a qualidade de vida dos sujeitos e das comunidades? Ele deve
ampliar suas práticas para não apenas as instituições de saúde mental, mas
também para as instituições de saúde em geral, como clínicas médicas, hos-
pitais, centros de pesquisa científicas, formando-se nos moldes do conceito
mais amplo de saúde.
Matarazzo (1990 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011) define psicologia
da saúde como um conjunto de contribuições educacionais, científicas e
profissionais específicas do campo da psicologia que devem ser utilizadas
para a promoção e a manutenção da saúde, a prevenção e o tratamento das
doenças, identificando a etiologia e o diagnóstico relacionados a saúde, bem
como doenças e disfunções para serem analisadas pelo sistema de atenção à
saúde e para a formação de políticas de saúde.
Assim, como campo de atuação, a psicologia da saúde deve considerar o
sujeito em todos os seus determinantes biopsicossociais, econômicos, culturais
e ecossistêmicos, em prol da qualidade de vida dos sujeitos e da comunidade
em que vivem. Já o psicólogo pode trabalhar nas instituições de saúde que
abarcam as atenções primárias, secundárias e terciárias, atendendo às necessi-
dades do paciente, da família e de outros profissionais de saúde em uma prática
interdisciplinar. Além disso, enquanto profissional da ciência, o psicólogo da
saúde se insere em instituições de pesquisa e de formação acadêmica, podendo
realizar especializações tanto em relação à sua área como a outras áreas da
saúde, como enfermagem, fisioterapia, fonoaudiologia, pedagogia, técnico
de enfermagem, entre outras.
6 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Como visto, a partir da década de 70, houve uma grande expansão teórico-
-metodológica no campo da psicologia voltada para a área da saúde. A me-
dicina social, que vigorava desde a época inicial da Revolução Industrial, e
outras correntes que configuram o abrangente e polêmico campo de atuação
em psicologia aplicada à saúde apresentavam características comuns, no
sentido de serem tentativas de romper com o antigo modelo mecanicista
hegemônico da concepção de saúde, mas também apontavam divergências
de posicionamento, terapêuticas, concepções teóricas e práticas de atuação
nas instituições de saúde.
A medicina social surgiu como uma forma de controle da população, com
base na articulação entre medicina e estado, com o capitalismo em plena as-
censão. Estava estritamente articulada com a medicina do trabalho. Segundo
Foucault (1988 apud MONTAGNER, 2008), a medicina social seria resultado
do desenvolvimento de técnicas, maneiras e saberes cujo objeto é o mundo
social. Assim, como tecnologia aplicada às sociedades, ela surgiu como controle
dos modos de viver dos indivíduos, uma espécie de vigilância que atrelava o
saber médico ao social. Segundo Montagner (2008, p. 195), a aplicação dessa
ideia seguiu várias direções, adaptando-se “[...] às condições políticas, sociais
e econômicas de cada país onde tomava corpo [...]”.
No Brasil, a psicologia social se dividiu em diversos tipos de abordagem,
como a epidemiologia, a vigilância em saúde e a saúde coletiva. Além da ex-
pansão da medicina social, que abriu espaços para a concepção e a construção
de práticas psicológicas no campo da saúde, pode-se destacar outras principais
linhas de pesquisa da psicologia que influenciaram modelos e campos de
atuação em saúde: psicologia social, psicologia comportamental, psicologia
fenomenológica existencial e psicanálise.
Orientados por esses campos mais amplos da psicologia, novos movimentos
e tendências nas áreas médicas e de psicologia surgiram. É possível identificar
quatro modelos teórico-metodológicos de atuação em psicologia da saúde a
partir da década de 70: medicina comportamental, medicina psicossomática,
psicologia médica e psicologia hospitalar. Além disso, na prática, são utili-
zados diversos métodos aplicáveis aos estudos e práticas em psicologia da
saúde, métodos estes oriundos da sociologia, da filosofia, da antropologia,
da medicina, da psiquiatria, entre outros.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 7

O trabalho do psicólogo no campo da psicologia da saúde não é homogêneo nem


possui uma única forma ou modelo de aplicação. Neste capítulos, foram fornecidas
algumas correntes que demarcaram o início do movimento da psicologia aplicada à
saúde, levando em consideração principalmente a realidade brasileira. No entanto, as
práticas do psicólogo da saúde estão sempre se atualizando e dependem muito da
influência da formação do profissional, bem como de características como comunidade,
região e instituição onde o profissional atua.

A teoria dos sistemas ecológicos do desenvolvimento humano, de Urie


Bronfenbrenner, é um importante modelo que vem sendo utilizado com
frequência em estudos sobre crianças, famílias, sociedade e idosos, por con-
siderar o indivíduo de forma ampla e intrinsecamente constituído em uma
rede de ambientes, que influenciam diretamente o desenvolvimento humano
e, consequentemente, seu estado de saúde, doença, bem-estar e qualidade de
vida (MARTINS; SZYMANSKI, 2004).

2 O modelo ecossistêmico de Urie


Bronfenbrenner
Urie Bronfenbrenner foi um psicólogo norte-americano que passou grande
parte de sua vida dedicando seus estudos ao desenvolvimento humano. Nascido
na Rússia, em 1917, e falecido em Nova Iorque, aos 88 anos, ele ficou famoso
por sua teoria ecológica e sistêmica, que analisava os aspectos da pessoa em
desenvolvimento, dentro do próprio contexto em que vive, valorizando, assim,
todos as atividades interativas que influenciam o desenvolvimento de uma
criança durante determinados períodos de tempo.
Senna e Dessen (2012) explicam o modelo de Bronfenbrenner conforme ele
o descreveu na obra de 1979, a qual foi revisada e complementada em 1999.
Os autores apontam que, para compreender o desenvolvimento humano, é
preciso pensar as habilidades motoras, cognitivas e perceptuais em correlação
com suas interações e padrões relacionais, que se estabelecem em contextos
distintos ao longo do tempo, o que Bronfenbrenner chamou de influências
múltiplas dos ambientes.
8 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Martins e Szymanski (2004) afirmam que Bronfenbrenner formulou sua


teoria de desenvolvimento humano, publicada no fim da década de 70, para
expor ao campo científico importantes premissas para o planejamento e o
desenvolvimento de pesquisas em ambientes naturais, criticando os trabalhos de
pesquisa “fora do contexto” e defendendo que essas investigações focalizavam
somente a pessoa, sem a devida consideração das múltiplas influências dos
contextos/ambientes em que os sujeitos vivem.
As autoras apontam, ainda, que diversos estudos na área de saúde de
desenvolvimento infantil e da família vêm utilizando como referencial teórico-
-metodológico o modelo de Bronfenbrenner, como Cecconello (1999, 2003),
De Antoni (2000) e Yunes (2001) (apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004).
Em suma, essa teoria defende que, desde que nasce, a criança está inserida
em contextos de desenvolvimento e aprendizagem, desenvolvendo-se de acordo
com as inter-relações que estabelece com o ambiente à sua volta. Por isso,
o desenvolvimento não seria possível se a criança fosse isolada do meio em
que vive. Martins e Szymanski (2004) definem o modelo de Bronfenbrenner
como uma abordagem ecológica que privilegia os estudos em desenvolvimento
humano nos seus contextos e ambientes naturais, e não em laboratórios, a fim de
aprender a realidade de forma mais abrangente. Muitos autores, como Haddad
(1977), Fleury (1999) e Yunes (2001) (apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004),
utilizam esse modelo para diferenciar as várias camadas proximais do ambiente:

O ambiente ecológico [...] deve ser concebido topologicamente como uma or-
ganização de estruturas concêntricas, cada uma contida na seguinte” (BRON-
FENBRENNER, 1996 p.18). Esse conjunto de estruturas, que no dizer do autor
parece lembrar um jogo de bonecas russas encaixadas uma dentro da outra,
interferem mutuamente entre si e afetam conjuntamente o desenvolvimento
da pessoa. Cada uma das estruturas é chamada pelo autor de: micro-, meso-,
exo- e macrossistema (MARTINS; SZYMANSKI, 2004, p. 64–65).

Ao pensar na boneca russa e no esquema ecológico de Bronfenbrenner tal


como ele projetou, pode-se ver claramente a criança no centro e as esferas
das outras bonecas representando os diversos contextos dos esquemas micro
ao macro (Figura 1).
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 9

Macrossistema

Exossistema

Mesossistema

Microssistema

Figura 1. Bonecas russas e esquema de contextos bioecológicos de Bronfenbrenner.


Fonte: ruigsantos/Shutterstock.com e A Mente é Maravilhosa (2018, documento on-line).

Mas como Bronfenbrenner definiu esses ambientes? A seguir, são definidos


cada um deles com exemplos.

„„ Microssistema: as pessoas em desenvolvimento experienciam um pa-


drão de atividades, papéis e relações interpessoais em um dado ambiente,
com características físicas e materiais específicas (BRONFENBREN-
NER, 1996 apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004). Abrange o próprio
indivíduo e suas principais características (sexo, idade, peso, altura,
saúde, etc.) e a forma como ela se relaciona com algumas instituições
que estão diretamente à sua volta (face a face) e o constituem como
pessoa (família, escola, igreja, etc.).
„„ Mesossistema: refere-se às inter-relações entre dois ou mais ambientes
dos quais um indivíduo participa ativamente, o qual pode ser formado
ou ampliado quando ele fizer parte de novos ambientes (MARTINS;
SZYMANSKI, 2004). Abrange as instituições que interagem direta-
mente com o sujeito e as relações entre elas. Por exemplo: a relação dos
pais com a igreja (crença), que influenciam como a criança estruturará
a sua própria crença.
10 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

„„ Exossistema: abarca instituições maiores e fora de um padrão mais


familiar, cujas inter-relações sujeito-família-instituições contribuem
para o desenvolvimento do sujeito. Segundo Martins e Szymanski
(2004), diferentemente do mesossistema, aqui, a pessoa em desenvol-
vimento não participa ativamente desse processo, porém podem ocorrer
eventos que a afetem ou mesmo esses eventos podem ser afetados por
acontecimentos do ambiente imediato em que ela se encontra. Essas
instituições podem ser a vizinhança, os serviços de saúde, o trabalho
dos pais, as indústrias, as mídias sociais, entre outras.
„„ Macrossistema: representa a cultura em que o sujeito está inserido, as
atitudes e ideologias de uma determinada sociedade e a relação que o
sujeito tem com elas. As interconexões feitas para um sujeito de uma
determinada cultura são diferentes das de outras culturas.

A partir de 1998, Bronfenbrenner reformulou o termo ecológico e passou


a designá-lo bioecológico, reforçando as características biopsicológicas do ser
humano em desenvolvimento. Para Senna e Dessen (2012), compreender o
desenvolvimento humano com base nesse modelo implica identificar quatro
elementos básicos, inter-relacionados e dinâmicos: o processo (P), a pessoa
(P), o contexto (C) e o tempo (T) (BRONFENBRENNER; MORRIS, 1998
apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004). As autoras afirmam que, ao longo
do desenvolvimento, a pessoa (P) se envolve em processos (P) de interações
recíprocas com outras pessoas, objetos ou símbolos. Essas interações podem
variar de acordo com as características das pessoas, dos contextos e do mo-
mento em que elas acontecem, podendo produzir tanto competências como
disfunções no desenvolvimento (BRONFENBRENNER; EVANS, 2000 apud
SENNA; DESSEN, 2012).
Ainda sobre o novo modelo bioecológico, Martins e Szymanski (2004)
apontam outro aspecto proposto: o do construto teórico “processos proxi-
mais”, entendido como “[...] formas particulares de interação entre organismo
e ambiente, que operam ao longo do tempo e compreendem os primeiros
mecanismos que produzem o desenvolvimento humano [...]” (BRONFEN-
BRENNER; MORRIS, 1998 apud MARTINS, SZYMANSKI, 2004, p. 65).
Segundo as autoras, no modelo bioecológico, são reapresentados quatro
aspectos multidirecionais inter-relacionados, designados como modelo PPCT
— “pessoa, processo, contexto e tempo” — e definidos da seguinte forma
(MARTINS; SZYMANSKI, 2004):
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 11

„„ Pessoa: refere-se ao fenômeno de constâncias e mudanças na vida


do ser humano em desenvolvimento no decorrer de sua existência.
A abordagem reformulada ressalta a importância de se considerar as
características do indivíduo em desenvolvimento, como suas convicções,
nível de atividade, temperamento, além de suas metas e motivações.
Isso tudo tem considerável impacto no modo como os contextos são
experienciados pela pessoa, bem como quanto os tipos de contextos
nos quais o sujeito se insere. As características do tipo pessoais, como
gênero ou cor da pele, que podem influenciar a maneira como os outros
lidam com a pessoa em desenvolvimento, e os valores e expectativas
que se têm na relação social devem ser considerados, visto que essas
qualidades pessoais podem nutrir ou romper a operação de processo
de crescimento psicológico. Além disso, nenhuma característica da
pessoa pode existir ou exercer influência sobre o desenvolvimento
isoladamente. No modelo bioecológico proposto por Bronfenbrenner e
Morris (1998 apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004), são descritos três
tipos de características da pessoa que influenciam e moldam o curso
do desenvolvimento humano. O primeiro diz respeito às disposições
que podem colocar os processos proximais em movimento e continuam
sustentando a sua operação. Já o segundo diz respeito aos recursos
bioecológicos de habilidade, experiência e conhecimento para que os
processos proximais sejam efetivos em determinada fase de desenvol-
vimento. Por fim, o último tipo envolve características de demanda,
que convidam ou desencorajam reações do contexto social que podem
nutrir ou romper a operação de processos proximais.
„„ Processo: refere-se às ligações entre os diferentes níveis, sendo consti-
tuído pelos papéis e as atividades diárias da pessoa em desenvolvimento.
Para se desenvolver intelectual, emocional, social e moralmente como
um ser humano, criança ou adulto, faz-se necessária — para todos eles
— a participação ativa em interação progressivamente mais complexa
e recíproca com pessoas, objetos e símbolos no ambiente imediato.
Para ser efetiva, a interação tem de ocorrer em uma base bastante
regular em períodos estendidos de tempo. Essas formas duradouras
de interação no ambiente imediato referem-se a processos proximais
(proximal process). Exemplos de padrões duradouros desses processos
são a relação pais-criança e as atividades de criança-criança em grupo
ou jogo solitário, como ler, aprender novas habilidades, resolver pro-
blemas, executar tarefas complexas e adquirir novos conhecimentos e
experiências (BRONFENBRENNER; CECI, 1994 apud MARTINS;
12 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

SZYMANSKI, 2004). Assim, os processos proximais são como má-


quinas ou motor do desenvolvimento.
„„ Contexto: refere-se ao meio ambiente global em que o indivíduo está
inserido e onde se desenrolam os processos desenvolvimentais. Os
vários ambientes subdivididos no modelo bioecológico abrangem tanto
os ambientes mais imediatos, onde vive a pessoa em desenvolvimento,
como os mais remotos, onde a pessoa nunca esteve, mas que se relacio-
nam e têm o poder de influenciar o curso de desenvolvimento humano.
Esses ambientes são denominados micro, meso, exo e macrossistemas.
„„ Tempo: pode ser entendido como o desenvolvimento no sentido histó-
rico ou, em outras palavras, como ocorrem as mudanças nos eventos
no decorrer do tempo, devido às pressões sofridas pela pessoa em
desenvolvimento. Para Bronfenbrenner e Morris (1998 apud MARTINS;
SZYMANSKI, 2004), os eventos históricos podem alterar o curso de
desenvolvimento humano em qualquer direção, não só para indivíduos,
mas para segmentos grandes da população. A passagem de tempo
em termos históricos tem efeitos profundos em todas as sociedades.
Pequenos episódios da vida familiar, como a entrada da criança na
escola, o nascimento de um irmão ou a mudança de trabalho dos pais,
podem ter significativa influência no desenvolvimento das pessoas da
família em um dado momento de suas vidas. Outro exemplo de como o
tempo influencia o desenvolvimento da pessoa é a diferença na maneira
como os pais criaram seus filhos com relação à década de 40, à década
de 80 e à atualidade.

Considerando tudo o que foi discutido até aqui sobre o conceito ampliado
de saúde, que não mais restringe a pessoa enferma a um corpo biológico
e às causas físico-patológicas de sua doença, e o modelo bioecológico de
Bronfenbrenner, pode-se compreender por que tantos autores que trabalham
em saúde pública e em psicologia da saúde vêm utilizando cada vez mais esse
modelo para sua prática, suas pesquisas, seus estudos e revisões políticas, até
mesmo na gestão em saúde.
Ao comparar o conceito ampliado de saúde — que defende que o ser
humano tem de ser pensado em uma rede de necessidades básicas humanas
que influenciam diretamente sua saúde e qualidade de vida, como habitação,
transporte público, acesso à cultura, entre outros —, o modelo bioecológico
— que defende que o ser humano se desenvolve em uma rede de inter-relações
que estabelece com os níveis de ambientes (familiar, escolar, estatal e cultural)
— e os processos proximais — que definem suas posturas e ações frente à
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 13

vida —, pode-se entender e fazer novos avanços nas práticas em psicologia


da saúde e na área de saúde de forma geral.

3 Principais modelos teórico-metodológicos


que conformam o campo da
psicologia da saúde
Retomando os modelos expostos, a seguir, são apresentadas algumas correntes
teórico-metodológicas que conformam a psicologia da saúde, com enfoque
nos estudos e práticas do contexto atual.
A medicina social, apesar de ter surgido como controle social, se desenvol-
veu ao longo da história humana e, no século XX, abriu portas para definições
de novas concepções na área de saúde, inaugurando, junto a outras disciplinas,
o que hoje chamamos genericamente de psicologia da saúde.
Segundo Montagner (2008), Foucault indicou a Alemanha, no século XVIII,
como o primeiro lugar do surgimento de uma medicina social: a Medizini-
chepolizei (polícia médica), composta por burocratas, geralmente médicos,
responsáveis pela administração dos saberes sobre a saúde, ainda em uma
lógica prescritiva. Mais tarde, outro modelo surgiu na Inglaterra, no século
XVI: a “Lei dos Pobres”, que pressupunha uma união entre a assistência social
e a intervenção médica, gerenciando, assim, os trabalhadores assalariados. Em
seguida, surgiu, ainda, um 3º modelo, identificado pelo autor como medicina
higienista (urbana), originado na França, na segunda metade do século XVIII,
o qual influenciou profundamente a comunidade médica no Brasil.
Foucault (1988 apud MONTAGNER, 2008) resume os objetivos da medicina
urbana em três pontos: a análise das regiões insalubres no espaço urbano, o
controle da qualidade do ar e da água e o controle da distribuição e da frequ-
ência de fontes necessárias à vida humana.
Apesar do seu início controlador, a medicina social teve, a partir da década
de 70, muitos desdobramentos importantes para a área da saúde. A saúde
coletiva, a epidemiologia e a vigilância em saúde, por exemplo, são teorias
e práticas essenciais para a promoção, prevenção e manutenção da saúde da
população. Além disso, é possível dizer que medicina social constituiu o início
da sociologia e da antropologia aplicadas aos problemas de saúde dos povos,
das massas, das cidades, das sociedades.
14 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Oriundas de diferentes campos do saber da medicina, da psiquiatria e da


psicologia, outras correntes de estudo se voltaram, a partir dos anos 70, para
conformar o campo da psicologia da saúde. As principais propostas de atua-
ção em saúde foram: medicina psicossomática, psicologia médica, medicina
comportamental e psicologia hospitalar.
Castro e Bornholdt (2004), em um estudo comparativo entre psicologia
hospitalar e psicologia da saúde, apontam que a psicologia hospitalar brasileira,
tal como é descrita, estaria incluída na área mais abrangente da psicologia da
saúde. O Quadro 1, a seguir, mostra os resultados comparativos das autoras.

Quadro 1. Diferenças entre psicologia hospitalar e psicologia da saúde

Psicologia hospitalar (Brasil) Psicologia da saúde

Atenção secundária e terciária Atenção primária,


secundária e terciária

Atuação em hospitais Atuação em centros de saúde,


hospitais, ONGs, etc.

Prática profissional no hospital não Prática profissional na área da


exige especialização obrigatória saúde exige especialização
obrigatória em alguns países

Prática interdisciplinar (em Prática interdisciplinar (em


alguns hospitais) alguns hospitais e outras
instituições de saúde)

Distintas teorias psicológicas utilizadas Distintas teorias psicológicas utilizadas

Fonte: Adaptado de Castro e Bornholdt (2004).

Medicina psicossomática
A medicina psicossomática aparece como uma especialidade médica, de-
bruçando-se sobre doenças determinadas por fatores emocionais, mas que
podem ser compreendidas à luz do trabalho analítico. Segundo Eksterman
(1975 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), é possível resumir a medicina
psicossomática em alguns aspectos fundamentais: a doença é estudada em sua
dimensão psicológica, o que pode ser conseguido por meio da interpretação
dos conflitos inconscientes; o médico, psiquiatra, psicanalista ou psicólogo
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 15

tentará explicar os determinantes psicológicos dos sintomas corporais; foco


na relação médico-paciente; a ação terapêutica é voltada para a pessoa do
doente (em uma perspectiva rogeriana).
Capitão e Carvalho (2006, p. 23) afirmam que, por definição, segundo a
origem da Escola de Psicossomática de Chicago (década de 30), “[...] a medicina
psicossomática diz respeito ao diagnóstico e ao tratamento de doenças físicas
que poderiam ser causadas por processos deficientes na mente [...]”.
Hoje, o campo da psicossomática mantém-se amplo e contraditório.
A medicina psicossomática é estudada e praticada com base em diversas
vertentes no Brasil, não se restringindo à essa corrente original. Ela está for-
temente influenciada pela psicanálise, principalmente a freudiana. Capitão e
Carvalho (2006), apoiados por autores como Debray e Volitch, defendem que
Freud estabeleceu um marco entre psique e soma quando estudou a histeria,
cujos sintomas físicos não apresentavam correlação com a fisiologia dos
órgãos afetados, fundando a psicanálise. Por meio dessa técnica, Freud bus-
cava a compreensão de diversas passagens e relações entre as manifestações
psíquicas e corporais, abrindo caminho para que outros estudiosos utilizassem
as suas descobertas sobre os sintomas de conversão e as forças reprimidas e
repressoras na formação do sujeito e na dinâmica das pulsões.
Os autores defendem, ainda, outras correntes importantes no campo da
psicossomática, como a psicossomática da escola francesa de Pierre Marty
(fundada em 1972) e a de Joyce McDougall. Sobre a proposta de Pierre Marty,
as autoras afirmam que ele criou o Instituto de Psicossomática de Paris, em
1972, partindo de concepções afeitas à psicanálise. Marty pensava a patologia
somática como resultado da impossibilidade da elaboração da excitação psí-
quica, em função de uma estrutura deficiente das representações e emoções de
um indivíduo. No entanto, criticava a concepção do saber médico do dualismo
mente-corpo criado por Alexander, afirmando que não só a mente influencia
o corpo a adoecer, mas que o inverso também ocorre de forma determinante
(CAPITÃO; CARVALHO, 2006).
Em relação aos trabalhos de McDougall, Capitão e Carvalho (2006, p. 26)
apontam que “Estudos acerca das manifestações psicossomáticas da primeira
infância a levaram a compreender que seus pacientes adultos, às vezes, fun-
cionavam psiquicamente como bebês que, não podendo utilizar as palavras
como veículo de seu pensamento, só conseguiam reagir psicossomaticamente
a uma emoção dolorosa [...]”. De qualquer forma, ambos os autores defendem
um conceito primordial da psicossomática praticada hoje: de que o indivíduo
psicossomático carece de maiores condições de representar, simbolicamente,
as coisas do mundo.
16 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Portanto, a medicina psicossomática influenciou diversas novas concepções


e formas de atuação no campo da psicologia hospitalar, da psicopatologia
fundamental e da psicologia da saúde no Brasil.

O livro Psicossomática hoje, do autor Mello Filho e Burd (2009), um dos precursores
da corrente no Brasil, contempla reflexões que explicam a formação do campo da
psicossomática no Brasil, bem como o que orienta as práticas dos psicólogos na saúde.

Psicologia médica
A psicologia médica é inaugurada pelo psicanalista húngaro Balint, também
preocupado com a relação médico-paciente. Nessa linha, Schneider (1971
apud ALMEIDA; MALAGRIS, 2011), o médico/psicanalista se preocupa com
a relação médico-paciente. Mello Filho e Burd (2009) afirma que a psicolo-
gia médica desvia o foco da patologia (doença) em direção à terapêutica, à
atuação clínica. O autor afirma, ainda, que esse é um campo de estudo sobre
as relações humanas, visando à compreensão do homem em sua totalidade.
O saber do médico permanece no comando, o qual, por meio da sua terapêutica,
desvelará o diálogo mente-corpo no processo do adoecimento. Nesse sentido,
os demais profissionais de saúde estão apenas assistindo o médico, pois é o
saber médico que determina toda a linha terapêutica.
Segundo Brandt (2009, p. 51), “Balint adotava em sua clínica psicanalítica
um posicionamento de disponibilidade além do que era comum nos analistas
[...]”. Este enfoque também era defendido por Ferenczi: o paciente considerado
“difícil”, regredido, não pode ser alcançado no nível da linguagem adulta, que
prevalece no complexo de Édipo. Essa regressão básica aparece no nível da
linguagem próxima ao mundo das sensações e dos afetivos, ao passo que a
linguagem adulta soa enigmática, uma linguagem comparada com a de um bebê
que busca satisfação e com a da mãe, que também se satisfaz com essa relação.
Segundo o autor, na contramão da clínica individual proposta por Balint,
alguns adeptos criaram trabalhos em grupo. Brandt (2009) defende que o
trabalho grupal, fundamentado na contratransferência da figura do relator
como um terceiro ausente, que possibilita um insight, a compreensão das
formas de relacionamento no grupo.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 17

Assim, o trabalho psicanalítico de Balint com relação ao adoecimento e


ao hospital está baseado na relação transferencial e contratransferencial que
o médico/psicanalista estabelece com o paciente, tanto no nível pessoal como
no grupal.

Medicina comportamental
Segundo Almeida e Malgris (2011), a medicina comportamental é uma ciência
da saúde que se utiliza de técnicas de modificação de comportamento para a
prevenção, o tratamento e a reabilitação da saúde. Afirma-se que grande parte
das doenças estão associadas a comportamentos disfuncionais (maus hábitos).
Segundo Neves Neto (2004 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), as linhas
de pesquisa da medicina comportamental se aplicam à cognição, à emoção
e ao comportamento humano. O autor defende, ainda, que os métodos das
teorias psicodinâmicas não são pragmáticos (úteis, relevantes e aplicáveis na
realidade), uma vez que os processos saúde e doença são determinados por
múltiplos fatores.
A medicina comportamental aposta na intervenção interdisciplinar nas
práticas em saúde, uma vez que o ser humano é visto como um sujeito biop-
sicossocial, em que o biológico é o somático, o psicológico, o comportamento,
e o social, o ambiente externo. Barletta (2010) caracteriza que o campo da
medicina comportamental surgiu com Schwartz e Weiss, em 1977. Segundo a
autora, a medicina comportamental tem por base “o estudo do comportamento
e foca na avaliação, tratamento e prevenção de doenças físicas e disfunções
fisiológicas”. A autora defende, ainda, que esse pensamento não aceita a di-
cotomia mente e corpo, entendendo o homem como um todo. Vários estudos
em medicina comportamental apontam para a relação entre comportamentos
inadequados, estilos de vida e problemas de saúde.
Matarazzo (1984 apud BARLETTA, 2010) define os comportamentos
de saúde de duas formas: alguns comportamentos são prejudiciais à saúde
(patogênicos); outros como comportamentos são de proteção à saúde. Além
disso, existem duas fontes de respostas psicológicas que influenciam os com-
portamentos saudáveis: uma direta, agindo para aumentar as habilidades de
enfrentar e manejar o estresse, a favor da proteção à saúde; e outra indireta,
a mediação cognitiva, que pode ocorrer nas tomadas de decisão e nos com-
portamentos de aceitação e adesão aos tratamentos.
As práticas em psicologia da saúde com base na medicina comportamental
aumentaram muito nos últimos anos, concorrendo com as práticas psicoterá-
picas de orientação psicanalítica e psicossomática.
18 A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação

Psicologia hospitalar
A psicologia hospitalar é muito praticada no Brasil e possui diversas abor-
dagens. Segundo o Conselho Federal de Psicologia (2010 apud ALMEIDA;
MALGRIS, 2011), o psicólogo hospitalar atua nos níveis secundários e ter-
ciários nas instituições de saúde, realizando atendimento individual ou em
grupo e pronto-atendimento em ambulatório, enfermarias, unidades de terapia
intensiva, psicodiagnóstico, consultoria e interconsulta.
Segundo Simonetti (2004 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), a psi-
cologia hospitalar é considerada um campo científico de intervenção nos
aspectos psicológicos em torno do adoecimento ou da dimensão afetiva/
emocional relacionada a uma enfermidade. Pode ser considerada uma es-
pecialidade que atua segundo sua prática psicológica não só com pacientes,
mas também junto aos familiares e com a equipe multiprofissional. Segundo
Bruscato (2004 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011), o psicólogo que atua no
ambiente hospitalar deve resgatar a singularidade do paciente em situação
de enfermidade.
Mattos (1999) defende que o trabalho do psicólogo clínico no hospital geral
é oferecer escuta à subjetividade do paciente, que se encontra pulsante no
contexto da internação, mas que geralmente é silenciado pelo saber médico,
um saber que se acerca do corpo fisiológico. Além disso, o psicólogo hospitalar
trabalha na recuperação da saúde, em um trabalho interdisciplinar, podendo
oferecer escuta diferenciada também à família.
Romano e Ismael (1999, 2005 apud ALMEIDA; MALGRIS, 2011, p. 195)
afirmam que “[...] o psicólogo ainda deve conhecer a doença do paciente
a quem ele presta atendimento, além de sua evolução e prognóstico [...]”.
De acordo com essa concepção, o profissional deve acompanhar a evolução
do paciente quanto aos aspectos emocionais trazidos pela situação do ado-
ecimento. Além disso, pode atuar educando e conscientizando o paciente
e a família sobre o contexto da doença e as formas de tratamento. Dessa
forma, o trabalho do psicólogo junto a equipe de saúde é facilitar as relações
equipe/paciente/família.
A psicologia hospitalar sofre críticas com relação à sua terminologia,
pois não abrange uma concepção de campo de saber, e sim apenas um local
de atuação. Além disso, muitas linhas de pesquisa confrontam suas teorias e
práticas, não havendo um consenso quanto aos procedimentos terapêuticos e
às abordagens metodológicas.
A psicologia da saúde: aspectos teóricos e campo de atuação 19

O psicólogo da saúde pode trabalhar junto a outros profissionais para identificar


problemas e soluções para a saúde dos trabalhadores em uma instituição de pesquisa e
assistência. Para tanto, pode ser criada uma oficina com a participação dos profissionais
de saúde para questionar e refletir sobre suas práticas, um grupo terapêutico, ou
mesmo instaurando um canal de comunicação. Os resultados desse trabalho podem
ser apresentados em congressos e ser adaptados em artigos na área de saúde. Para
saber mais sobre o assunto, leia o texto Caixa de Comunicação SOS-T: A Reestruturação
do Serviço de Orientação à Saúde dos Trabalhadores do IPEC/FIOCRUZ (BARBOSA; RO-
ZEMBERG; ALVES, 2005).

Assim, o que se pode afirmar sobre a prática do hospitalar é que ela busca
atender os pacientes submetidos a procedimentos médicos, visando à promoção
e à recuperação da saúde física e mental. Além disso, atua em instituições de
ensino superior, centros de estudo e pesquisa, em busco do aperfeiçoamento
de profissionais ou da complementação profissional de quem trabalha na área
da saúde.

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