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A bolha e a folha: estrutura e inventdrio Silviano Santiago “[..41 Qui vous dit Que la bulle d’azur que mon souffle aggrandit A leur souffle indiscret s'écroule?”! Victor Hugo, Les feuilles d'automne, xv “Mas inspecione um pouco mais de perto esses seres viventes, os tinicos dignos de consideracio. Como sio hostis e destrutivos entre si! Como sio insuficientes, todos eles, para sua propria felicidade! Como séo despre- ziveis ou odiosos aos olhos do espectador! David Hume, Didlagos sobre a religiéo natural Nis contos de Lygia Fagundes Telles, a sensualidade cultivada pelo nar- rador obscurece 0 conhecimento que possa ter do mundo e favorece o conheci- mento que venha ater de si mesmo. Como tarefa proposta pela escrta, a dramati- zagfo da sensualidade tomna o exerecio litedtio pouco rentvel para as indagagées ditas metafisicas, quest6es sobre a esséncia dos seres, ou a condigao do homem no planeta terra ¢ sua situagéo na histéri Torna 0 exercicio literdrio mais propicio para o melhor conhecimento das sucessivas percepgdes que abrem caminho e pe- netram com forga e violéncia na mente humana, Acomodam-se na consciéncia do narrador, reordenando ¢ aprimorando o insuficiente saber que ele ¢ o leitor tem, que nés temos sobre as vontades e fraquezas do espirito humano. Guiada por dedos, labios, olhos, ouvidos ¢ nariz, que vio A luta e se engrandecem ou se frustram diante de obstéculos intransponiveis, a caligrafia 98 Digitalizado com CamScanner firme do narrador dos contos de Lygia ciceroneia, por sua ver, 0 leitor pelos diversos caminhos ¢ encruzithadas por onde cle circula ¢ circulam os seres humanos. Com humildade ¢ paciéncia de colecionador, o narrador elabora para 0 Ieitor 0 inventario das sensagdes, emogées e paixses dos personagens, tudo jsso com 0 fim de dar a conhecer a Pequena, a infima multidao de seres com quem convive © que o cercam, cujo comportamento imprevisivel e cadtico define ¢ limita, pela cumplicidade, 6 horizonte do Nosso saber. Tao entretida est4 a voz narrativa com corpo sensual se entrega nos embates do cotidia evanescent ¢ do apagado 0 cenério césmico, os homens. O convite feito & mulher amada do-sol no cemitério abandonado da cidade citime cujo resultado mesquinho é 0 desejo g0. Qual serd a sua visio do mundo? Ricardo diz & ex-namorada, depois de enclausuré-la: “Uma réstia de sol vai entrar pela frincha da porta [...]. Depois, vai se afastando devagarinho, bem devagarinho. Voct terd 0 pér-de-sol mais belo do mundo”. Outro conto, “Eu era mudo e s6”, termina de maneira a suprimir qualquer resquicio do cenétio grandioso da natureza que porventura vies a aflorar na superficie da narrativa, Destas palavras se vale o narrador para colocar um ponto final no conto: “Através do vidro as estrelas me parecem incrivelmente distantes. Fecho a cortina”. © jogo de cabra-cega a que 0 no, que ela deixa sob a aura do majestoso ¢ infinito, que recobre pelo ex-namorado para ver 0 por- € parte de um plano armado pelo de encerré-la para sempre num jazi- Analista atento e privilegiado dos “seres viventes” e microscépicos, o nar- rador dos contos de Lygia é germe de narrativas e protétipo de personagens. Estabelece a si seja como modelo de observador da experiéncia humana, seja como pedra de toque na avaliagio dessa experiéncia, Ele também pode, por um sistema narcisico de espelhos, circunscrever e apreender a sensualidade dos miiltiplos personagens em que se desdobra ou dos numerosos ¢ déceis inter- locutores que inventa gracas a um jogo infind4vel de dobras. A cada milésimo de segundo, o narrador dos contos de Lygia deixa-se impregnar pela escrita minuciosa e detalhista do mundo. Ble é uma espécie nobre de papel mata-bor- rao que se encharca, primeiro, com a esctita dos acontecimentos mitidos da realidade cotidiana para, em seguida, reapresenté-los de uma perspectiva muito pessoal. Se nio Ihe fslcam episédios para conta, sobram-lhe qualidades estlis- ticas de um pros: ficiente, econdmico e vital. 9 Digitalizado com CamScanner O conto de Lygia se passa num lugar entre: entre as garatujas inscritas ao avesso pela realidade mundana na folha do papel mata-borrio e a re- encenagio (e ndo cépia, como veremos) dessas garatujas pela linguagem imaginosa ¢ enxuta do narrador na folha de papel em branco. O narrador, a0 subscrever e endossar as garatujas do mata-borrdo, reinventa-as e as trans- forma através da invengio de personagens ¢ coadjuvantes em que ama des- dobrar-se. Ele sobrecarrega de energia simbdlica a linguagem empirica das garatujas, desprezando por um lado o contar direito e, pelo outro, se entre- gando ao processo que ele chama corretamente de contar mentiroso, Em entrevista concedida a Edla van Steen, Lygia pergunta: “A invengio fica sendo verdade quando se acredita nela?” A ficgio curta de Lygia inaugura, pelo viés propriamente artistico do jogo entre o contar diteito ¢ o contar mentiroso, a técnica narrativa de um género menor (e, de sobra, minuscula- mente memorioso) que terd grande fortuna entre nds a partir dos anos 50 — a crénica didria, no estilo de Nelson Rodrigues ou de Fernando Sabino. Na criacio literdria de Lygia, a escrita da meméria € o texto da literatu- ra confluem aflitivamente para o lugar entre, aberto pelo contar dircito ¢ o con tar mentiroso, para a brecha ficcional, abrigo e esconderijo do narrador’. Em depoimento feito em 1993 na Sorbonne, em Paris, a ficcionista esclarece: “Vejo minha vida ¢ obra seguindo trilhos tao paralelos ¢ tio préximos e que podem (ou nao) se juntar 4 adiante”. E acrescenta: “Mas quando me estendo demais nessas respostas, pulo de um trilho para outro, misturo a realidade com o ima- gindrio ¢ acabo por fazer ficgéo em cima da fic¢io”. Mais recentemente, decla- rou ao jornalista Paulo Roberto Pires: “Talvez nem eu perceba quando a eméria vira imaginagao”. Voltemos &s nossas palavras. Nos contos de Lygia, m a verdade sobre 0 mundo exigida pela filosofia e o pensamento cléssicos, 1em a mentira sobre © comportamento dos seres humanos oferecida pelo ima- gindrio moderno. Como no melhor da literatura brasileira modernista, a nar- rativa curta de Lygia se constréi e se impée como objeto hibrido. A voz narrativa ganha peso ao oscilar entre a verdade e a mentira, a meméria e a imaginag’o, o feminino e o masculino, a sanidade ¢ a loucura, 0 humano ¢ o animal’, Ela muitas vezes se deixa contaminar por uma segunda narrativa, exterior a ela, como a estéria interna a tapecatia que o narrador/per- sonagem admira no conto “A cagada”, Na contaminagao, perfazem as duas 100 Digitalizado com CamScanner bie narrativas uma tinica. Tudo o que é uno é duplo, do que é duplo é uno, ae Lonebees. Soom Nes conto, o narrador abandona a contem- l y campestre, que tanto o persegue ¢ fascina, e “penetra nela, ¢ logo esté vivendo, nio no cendrio sombrio do interior da loja de antigiiidades, mas “dentro do bosque, os pés pesados de lama, os cabelos empastados de orvalho". No interior da narrativa da tapegaria, 0 narrador jd é um outro e, ao ser um outro sendo cle préprio, ainda pergunta sobre seu ‘papel, levando até as tiltimas conseqiiéncias as motivagdes do hibrido: “Era 0 cacador? Ou a caga? Nao importava, nao importava”. O hibrido ¢ sempre fascinante. Lygia dirt: sedutor’, estilete que espicaga ¢ fa que atrai a atengio do outro. O hibrido é mais fascinante poraiey diante do exame mais exigente do leitor, no 0 conduz a yerdade do mundo, nao 0 conduz 3 mentira dos seres ficticios. Lygia ensina que a incriga ficcional tem de samente derrapante na troca com 0 leitor. Ela é gesto de disponi- ficcional se entregar a0 leitor exclusivamente mentira, ela morte. Ao convidar 0 ‘a narrativa hibrida de Lygia leva-o po do ser engenho bilidade e de oferta. Se a intriga de ou exclusivamente como ivar-se da verdade e da mentira, ‘ea derrapar para a anlise do co ura da sua pele’ ha que coleta folhas vegetais para 0 tempo na sua casa, & uma narradora por dois motives. E ao mesmo jetos aparentemente como verda leitor a esqu a perder o sentido da diregio univoca narrador e dos personagens, para a lei No conto “Herbarium”, a mocin primo botinico que se hospeda por curt Upica dos contos de Lygia. Ela 0 6: inicialmens tempo uma espécie de cientista, colecionadora de folhas (obj s sempre diferentes, que tém de ser distinguidos para que se chegue c uma mentrosa, mente sobre tudo © para todos. sa assim dizer primeito Lito das narrativas ria po eee ascinada por et mesmay qe & ida, com um objetivo certo” Esclarece ela: sree fantasia para obrigilo a se emorar ‘Acrescenta em seguida, mostran- do botinico da folha para ela em que [0 primo] se detinha idénticos, ma a “alguma folha rara’), Diante do primo desconhecidos P que inventa, ela descobre, enamor sua “mentira comegou a ser ditigi “Loud diante dele [...] tinha de inven em mim como se demorava agora 1 verbena”. A ero exo da atenga0 render o instante posta ee lado como as flhas sem inteese Freava perigos, exagerava dificuldades, do como, pela mentira, deslo propria: “[...] era preciso faze! em mim, ocupé-lo antes de s¢! amontoadas no cesto, Entio [eu] ™! 101 Digitalizado com CamScanner i inventava hist6rias que encompridavam 4 mentir#”. O moo, cientise de jy magao ¢ ainda aprendiz de leitor, no se sente bem na condicao de vitina de un engodo ¢ the pede para “contar diteito™ as suas histétas: [...] mais de wy, me falou no horror que tinha por tudo quanto cheieava filsidade, emp. teagio". Ela nfo concorda com o primo ¢ renta Ihe explicar que a verdade rs, banal quanto a folha de uma roseira. Aos olhos da ciéncia, a verdade nunca é banal. O cientista¢ aprendis de leitor abre a folha na palma da mao ¢ dé uma lupa 3 prima e sua asistente og coleta de material. Pede-lhe que examine a folha com olho clinico. A mocinh, desvia o olhar da folha (deixa de oferecer a narrativa fantasiosa 20 primo, ein, a exigéncia de verdade por parte dele) redireciona os olhos por detris da lupa para inventar uma histéria que é hibrida. Aparentemente esquecida due préprias invengées, também nao quer examinar com olho clinico a folha vege. tal, como recomenda o borinico. Detém 0 olho numa outna folha, a da palma da mao do boranico e primo, daquele que estd exigindo a anilise do espécime, Enxerga-a como “pele ligeitamente timida, branca como papel com seu miste. rioso emaranhado de linhas, estourando aqui e ali em estrelas”. Vai ‘percorren- do as cristas e depressdes, onde era 0 comeco? Ou o fim?” Demora “a lupa num terreno de linhas tao disciplinadas que por elas devia passat o arado, ih! von- tade de deitar minha cabega nesse chao,” A folha da imaginagao da moca, tendo se esquivado da verdade da folha vegetal, tendo se esquiivado da banalidade de folha de roseira, jd que desprovida das artimanhas retéricas do contar men- tiroso, se sobrepée a folha da palma da mo do mogo. Sob a lupa, e para quem souber ler, a folha da palma da mio do moso se confunde com a folha de papel € seu emaranhado de linhas. Sob o olhar elfnico da nartadora, a mio do moso, a pele do mogo acaba por ser um convite sensual para que ela ali deite a sua cabega, confundindo cabega e caminhos da experitncia, cabea e cristas do prazer, cabeca ¢ depresses sentimentais, Nos contos de Lygia, o cultivo da sensualidade serve, pois, para consti- tuir um lugar ficcional hibrido e espacoso onde se desenrola a experiencia de mundo do narrador e dos personagens, onde se narra a vivencia cotidiana deles. Nesse lugar hibrido, egoista ¢ auto-suficiente, ao mesmo tempo papel mata- borrio ¢ folha de papel em branco, é que o narrador articula a sua escrita literdria, “um emaranhado de linhas”, centrando 0 foco de luz seja nos objetos, 102 Digitalizado com CamScanner seja no seu outro, em desejo exasperante ¢ desesperado de estabelecer lagos afe- tivos a qualquer custo. Uma definicio curta ¢ sucinta dos contos de Lygia diré que a caracterfstica mais saliente deles ¢ a dificuldade que tém os seres humanos de estabelecer esses lacos. Por serem os lagos afetivos alvo ¢ barreira para os per- sonagens, nesses contos se desenham complicagaes sentimentais que envolyem casal € amante, este ou esta em geral mais jovem, acarretando combinagées de seres humanos que sio produto do acaso, substituigdes egoistas de parceiros, repetig6es narcéticas de experiéncia, tudo composto dentro dum clima de com- peticao em que personagens adultos ¢ de idades distintas digladiam pelo dese- jo de se afirmarem ou de se autodestruirem definitivamente. Na gramitica da ficcio curta de Lygia, lagos, complicagées, combi- nacoes, substituicGes, repetigdes e competicées sio algumas e muitas das figuras retdricas que se transformam em matéria efetiva do conhecimento da vida sen- sual humana. Conhecimento da vida no que ela tem de carne. Vale dizer, co- nhecimento que temos da carne da vida e do correr do tempo. Na gramatica da narrativa curta de Lygia, onde paradoxalmente o tempo ¢ as marcas que imprime na carne tém papel de soberano € tortu- rador, a mais trdgica das figuras retéricas (¢ também a mais constante ¢ temivel) éa do corpo humano que est4 saindo fora do foco das lentes do nar- rador. No personagem envelhecido (em poema do livro Farewell, Carlos Drummond faz o jogo entre carne envelhecida ¢ “carne envilecida”), os con- tornos nitidos da figura e o delineamento sutil do comportamento do per- sonagem se dissolvem, se esfumam, tornando-o pega descartivel para a ficcdo. O personagem nao consegue mais impressionar 0 papel mata-borrao com a forca ¢ a violencia necessirias. Em conto intitulado “A chave”, escreve Lygia: “[...] envelhecer ¢ ficar fora de foco: os tragos vao ficando imprecisos 0 contorno do rosto acaba por se decompor como um pedaco de pio a se dissolver na 4gua”. Em contraponto ao envilecimento da carne, veja-se como € quanto a carne rija ¢ jover, que “parece madeira’, impressiona o papel mata-borrao: “Havia nela energia em excesso, ai! a exuberancia dos animais jovens, cabelos demais, dentes demais, gestos demais, tudo em excesso. Eram agressivos até quando respiravam.” Na retérica dos afetos proposta pelos contos de Lygia, o envelheci- mento a dois é uma armadilha fatal, que deve ser evitada a qualquer prego. 103 Digitalizado com CamScanner Quem quiser e quem nao quiser cair na armadilha, cai. Para se escapar pas. sageiramente dela é preciso, primeiro, evitar 0 espelho do casamento, oy seja, deixar de refletir-se no companheiro ou na companheira; abandonar impiedosamente a ele ou a ela e tentar construir, ao lado de alguém mais jovem, um futuro diferente. No conto “A ceia”, a esposa implora a0 ex-mari- do: “[...] a0 menos vocé podia ter esperado um pouco mais para me subs- tituir, néo podia?” O marido rebate seus argumentos de forma fria e caleu- lada: “Temos que nos separar assim mesmo, sem maiores explicagdes, nao adiantam mais explicagdes, no adiantam mais estes encontros que sé te fazem sofrer...” Assumir a prépria idade significa assumir 0 seu préximo desaparecimento no mundo. E preciso, como se fosse possivel, espichar tempo afora a capacidade que a carne humana tem de impressionar. No ji citado conto “A chave”, 0 marido foge de Francisca, a velha companheira, para cair nos bragos da jovem Mago. Num primeiro momento do conto, 0 marido percebe o desaparecimen- to da esposa para dela se distanciar: “Unhas e maos de velha. Incrivel como as mios envelheceram antes. Depois foram os cabelos. Podia ter reagido. Nao reagiut. Parecia mesmo satisfeita em se entregar, pronto, agora vou ficar velha. E ficou.” Num segundo momento, Tom descobre que, mesmo tendo aban- donado a velha esposa, continua igual a ela, sé que a jovem amante o disfarsa pelo que ha de mais artificial e exterior e, por isso, ainda émpressiondvel. Revela 0 velho marido: “[...] os jovens gostam de cores fortes, principalmente os jovens que vivem em companhia de velhos. E que desejam disfargar esses ve- Ihos sob artificios ingénuos como meias de cores berrantes, camisas esportivas, gravatas alegres, alegria, meus velhinhos, alegria!” Nao ha como escapar da armadilha. O marido volta para a companhia de Francisca. A paixéo que envelhece escondida no seu canto, porque abandonada, encontra o seu melhor alimento ¢ razdo de vida no citime. A outta o sente: “Ads poucos o citime foi tomando forma e transbordando espesso como um licor azul-verde, do tom da pintura dos seus olhos”. Encontra o seu pior veneno nas reflexes sobre a idade. “Posso fazer duas mil plisticas e nfo resolve, no fundo €a mesma bosta, s6 existe a juventude”, Na soliddo de ser que se dissolve como Pao n'égua, & beira do abismo, a paixao envilecida ostenta um estandarte Paciente e dado ao vexame, Nele estio estampadas as intiteis artimanhas da Digitalizado com CamScanner experit «cia, Nao ha chave para o ndo-envelhecimento, Se chave howver é jeva o marido prédigo de volta & casa “materna” para aprovetar 0 a i 0 da vida a dois. Como um vampiro fantasiado, aquele que abandona 0 parcero volta fracassado para casa, pois percebe que o sangue nos caninos nada mais éd um borto vermelho, mais €o que A crenga naquelas figuras retdricas da gramética narrativa ¢ nestas fi- guras retéricas do afeto sustenta o narrador na sua luta diueurna por acredi- tar na palpabilidade tanto dos objetos que 0 cercam quanto do outro com quem se envolve, incentiva-o 4 invengio de uma intriga sentimental. Esta redunda numa espécie de tdbua de salvagao contra a fatalidade da solidio humana. Nos contos de Lygia, a solidao acaba por solidificar-se sob a forma do ponto final que encerra um conto ¢ abre a possibilidade do seguinte, emprestando ao conjunto da sua ficsio uma coeréncia de propésitos pouco comum nas coletaneas de contos da literatura brasileira contemporanea’, No universo ficcional de Lygia, no existem causas ou razées ocultas para a solidao (ou para o envelhecimento, ou o citime, ou...). Todas as sensagées, emogoes ¢ paixdes esto a nu e a descoberto para todos ¢ qualquer um. Estao a flor da pele, isto é, sto exaustivamente descritas pelo narrador. Existe prin- cipalmente ¢ apenas o intermindvel inventério dos caminhos inventados pela sensualidade, semelhantes &s filigranas de uma folha vegetal, semelhantes as linhas na folha da palma da mao, por onde percorrem ¢ circulam os afetos. Estes, devidamente envelopados pela ficgio curta, seguem com endereco exato ¢ incorreto para o leitor. Em cada conto, 0 ponto final exi Lygia, o olho de vidro é 0 que observa, segue, acompanha, vigia... os persona- gens), exige do olho detetivesco do leitor a reflexio (e nunca a solugio) sobre o emaranhado de afetos tecido pelo narrador. A esse emaranhado, 0 nartador (¢ também a autora, em sucessivos depoimentos) pode ocasionalmente dizer que Tepresenta, na sua generalidade descritiva, o Amor. Para 0 leitor de Lygia, a per- gunta sobre 0 que é Amor corresponde & indagacio do deterive — quando ja sabe tudo a respeito do crime - sobre a arma utilizada pelo criminoso. “Para que serve uma adaga fora do peito?” eis © que pergunta o fururo suicida por amor no conto “Objeros”. Tanto a arma quanto © Amor slo artigo supérfluos diante da evidéncia do corpo sensual, ou seja, diante da inevitabilidade da ige do “olho de vidro” (no universo de 105 Digitalizado com CamScanner solidao humana e do corpo morto. Em eco e exasperada, pergunta a esposa no mesmo conto: “Miguel, onde est a adaga?! Esté me ouvindo, Miguel? A adaga!...” A imitil adaga tinha ganho peso e sentido, cravada que estava no corpo suicida de Miguel, Assim também corpo e corpo confluem para dar sen- tido ao Amor/solidao da esposa, Lorena, ¢ & solidao/Amor de Miguel. No ponto final de cada conto, a consciéncia reflexiva do leitor comunga com a consciéncia reflexiva do narrador, Na mesa de leitura, na mesa de comunhéo da literatura, se da o ritual mais perverso (¢ verdadeiro) do Amor. “6! amor de ritual sem sangue”. O Amor é elucubracao a dois, desprovida de corpo ¢ imantada pela alma. O Amor dé sentido a0 medo da escrita € ao prazer da leitura. Confessa Lygia: “Escrever é um ato de amor que envolve o leitor, que 0 compromete”. Os corpos ausentes esto prescritos pelo fim (meta ¢ termo) da escrita ¢ pelo fim (idem) da leitura — pelo ponto final que fecha ¢ reabre. O Amor é uma idéia, como nenhuma outra, com que o ser humano ama se reves- tir para incitar 0 desejo de viver na morte. Na gravura Os Funerais do amor, ve- se: “um cortejo de bailarinos descalsos, carregando guirlandas de flores, como se estivessem indo para uma festa. Mas nao era uma festa, estavam todos tristes 0s amantes separados ¢ chorosos atrés do amor morto...” A morte se confunde com 0 lastro que, no banco mundial dos afetos humanos, garante o valor su- blime da moeda caprichosa do Amor. “Se vocé me ama mesmo, eu disse, se vocé me ama mesmo entio saia ¢ se mate imediatamente”. No entanto, a sensualidade cultivada pelo narrador obscurece o conhe- cimento que possa ter do mundo. No conto “Objetos”, jé citado, Miguel pousa o olhar num sélido e frégil globo de vidro e se lembra das transparentes ¢ espelhadas bolhas de sabio que, quando crianga, tirava pelo sopro do canudo de mamoeiro’. O interlocutor de Miguel nao é um ser humano, cujas emogdes sao passiveis de ser inventariadas, mas uma esfera indevassdvel que lembra a frigil bolha de sabao da infincia, que sempre refletia uma janela. Abrir uma janela na bolha equivale a fazé-la explodir. O vidro de que é feito 0 globo é mais firme do que a pelicula de égua ¢ sabio. As maos de Miguel se debarem contra ele como asas de passarinho contra a vidraga. Miguel quer abrir janelas no globo, visitar com os dentes ¢ a lingua o seu interior. Pelo sabor é que se desentranham os verdadeiros sumo ¢ gosto do mundo. Vai contentar-se com as mos que apalpam a superficie lisa pelo exterior? Nao. Tenta “cravar os 106 Digitalizado com CamScanner dentes na bola de vidro. Mas os dentes resvalavam, produzindo 0 som frag- mentado de pequenas castanholas”. Asseu lado, Lorena tem pequenos globos guardados numa caixa aninha- da no colo. Séo contas que esté enfiando com precisa exatidio de gestos num fio comprido ¢ vermelho. Sao esferas perfuradas, penetraveis, titeis e passiveis de serem trabalhadas pelas mos humanas, capazes de serem transformadas por elas em um objeto com sentido, Um colar. Lorena é a esposa amadurecida pela experiéncia, industriosa ¢ masculina no seu fazer cotidiano. Nao se lembra de ter brincado na infincia com bolhas de sabao. Ela teria estourado, isso sim, todas as frageis bolhas de sabao sopradas por Miguel, jé que trabalha com agu- tha ¢ linha, com contas perfuradas, Diz o conto que “a ponta endurecida do fio varou a agulha sem obstéculo”, e mais adiante: “[...] com a ponta da agulha ela tentava desobstruir o furo da conta de coral”. A esfera € um objeto intrigante para a sensualidade adormecida de Miguel ¢ de Lorena, ¢ também para a sensualidade desperta do narrador dos contos de Lygia. Nesse curto esboso ¢ confronto de personagens, comesamos a descortinar pontos complementares da escrita sensual de Lygia Fagundes Telles. O narrador dos contos de Lygia nao é um demiurgo. Se ele nao é semelhante a0 demiurgo que é apresentado por Timeu no didlogo platénico de mesmo nome, nao se pode dizer que a ele nada tenha pedido emprestado. O narrador Ihe pediu emprestado objetos de forma esférica para também representar, & sua maneira, 0 mundo. Lembremo-nos das palavras do didlogo platnico sobre a ctiaggo do mundo: “Quanto a forma, [o demiurgo] concedeu-lhe a mais con- veniente ¢ natural. Ora, a forma mais conveniente ao ser vivo que deveria con- ter em si mesmo todos os seres vivos, s6 poderia ser a que abrangesse todas as formas existentes. Por isso, ele torncou o mundo em forma de esfera, por estarem todas as suas extremidades a igual distancia do centro, a mais perfeita das formas ¢ mais semelhante a si mesma, por acreditar que o semelhante é mil vezes mais belo do que o dessemelhante””, O narrador dos contos de Lygia néo pede emprestado a Timeu a esfera primeira, perfeita e grandiosa, imagem do bem, do bom e da beleza, Ele nem chega a querer imitar Lufs de Camées na grandiosidade épica de Os lustadas. No Canto x deste poema, os deuses dio de presente a Vasco da Gama, pelos grandes feitos alcangados, a “maquina do mundo”. Diz o poema que, de posse 107 Digitalizado com CamScanner ento que os portugueses teriam do do modelo cosmogénico, 0 conhecim “De Cos olhos corporais/ Veres mundo seria superior ao da ciéncia da époc: que nio pode a va ciéncia” (Canto x, 76). Era 0 modo como Camées fazia com que aquele extraordindrio povo ocupasse 0 lugar superior ¢ privilegiado desti- nado aos deuses. Cupido “os deuses faz descer ao vil terreno/ E os humanos subir ao céu sereno” (IX, 20). inte da esfera do mundo, o narrador dos contos tem atitude mais semelhante a do amigo ¢ contemporineo de Lygia, Carlos Drummond, poeta da desilusio e da lucidez, Drummond pediu a Camées de empréstimo a maquina do mundo para escrever belo, desencantado ¢ extraordindrio poema de Claro enigma. Numa estrada de Minas, a maquina do mundo se entreabre para o poeta ¢ Ihe oferece de graga todo 0 conhecimento. Se quiser, o poeta tera a visio inédita ¢ toral do universo. O poeta recusa 0 conhecimento sobre- humano que lhe é ofertado pela imagem e continua a caminhar pela estrada. Qual Carlitos ao final dos filmes, na imagem que Lygia também tanto aprecia, “o poeta segulc] vagaroso, de mios pensas”. Como vimos, 0 narrador dos contos de Lygia pede emprestado ao demiurgo platénico pequenas, mintisculas esferas, objetos do dia-a-dia, como bolhas de sabao, globos de vidro, contas de colar, bagos de uva, que passam significativamente pelas méos dos personagens. Cada uma das esferas do cotidiano é esculpida & sua maneira pelo narrador. Nao so iguais. Semelhantes na forma, dessemelhantes no contetido. O narrador se serve dos objetos esféricos para retirar os personagens da imerséo sensual no cotidiano ¢ thes emprestar um trago simbélico que, no processo abstratizante da ca- racterizagdo, torna a cada um protétipo de determinado comportamento humano. A esferas dessemelhantes correspondem protétipos humanos dife- rentes, No caso de Miguel, o globo insensivel & fiiria dos seus dentes ¢ a fragil bolha de sabao. O idealista Miguel — sonhador, louco, impotente, sui- cida. Exprime-se pelo “gesto redondo”. Miguel = homem, nao seria de todo incorreto acrescentar. No caso de Lorena, a conta de colar, perfurada pela iva, sobre- agulha penetrante. A realista Lorena ~ trabalhadora, hicida, agre vivente. Exprime-se pela estocada. Lorena = muther, no seria de todo incor- reto acrescentar. Séo personagens magistralmente hibridos que endossam e, a0 mesmo tempo, questionam os papéis (humanos, sociais, econdmicos...") 108 Digitalizado com CamScanner y quea cada um deles sao cmprestados pela voz da tradigéo. Criados com a mesma VOZ que, NO conto “Apenas um saxofone”, batiza a mulher de Luisiana, Luis-e-Ana. Séo_personagens-péndulos que, no caminhar dos segundos, oscilam entre um lugar ¢ 0 outro, sem pertencerem definitiva- mente a.um ou outro lugar, Em entrevista, Lygia nos relata o episddio em que alguém the per- gunta, na época em que ainda era estudante universitéria, como € que cla tinha a coragem de assumir duas profissdes de homem. Era ao mesmo tempo advogada e escritora. Perguntamos hoje: como é que ela tem a coragem de assumit trés profissées de homem. Advogada, escritora e membro da Academia Brasileira de Letras, reduto tradicional de homens. O lugar femi- nino ocupado por Miguel no conto “Objetos” pode, de repente, ser ocupa- do pela prépria escritora no texto de um depoimento (“As bolhas que eu soprava com 0 fino canudo de mamocito...”) ou pela narradora no conto “A estrutura da bolha de sabao” (“Importante era o quintal da minha meninice com seus verdes canudos de mamociro...”). Esses trés “personagens” se com- plementam no jogo entre o masculino ¢ o feminino, balangando todos na gangorra da meméria e da ilusio. O sopro da menina que inventa a bolha de sabao ¢ o sopro da contista que escreve sobre a estrutura da bolha de sabao ¢ é 0 sopra do saxofonista que, no conto “Apenas um saxofone”, inventa a miisica que, por sua vez, € escuta- da pela narradora (no caso, também leitora) e comparada a uma bolha de sabZo. Eis af uma tautologia inesperada e conseqiiente no universo sensual do narrador da ficgdo curta de Lygia. Retomemos o conto “Apenas um saxofone”. Nele destaca-se uma bela cena de congracamento do homem e da natureza, do macho ¢ da fémea. Na primeira noite de amor, estio deitados na praia. O misico € como a aprendiz de boténico no conto “Herbarium”, sé que repre- senta a outra face do narrador de Lygia. Diante da amada que confessa nunca ter sido batizada, colhe com as maos as 4guas do mar e a batiza. Dé-lhe nome, Luisiana (como vimos, Luis-e-Ana). Esta Ihe pergunta se acredita em Deus. “Tenho paixdo por Deus”, sussurra o misico/demiurgo, “com o olhar perdido no céu”. E continua: “[...] 0 que mais me deixa perplexo ¢ um céu assim como este”. Neste momento é que, encaracolado ¢ nu, como um fauno menino, comega a tirar sons do saxofone. Puro sopro, sua criagio musical transita pelo Digitalizado com CamScanner espago ¢ “forma com o fervilhar das ondas uma melodia terna e quente". O narrador do conto se transforma em leitor da obra de arte alheia, Nao é ele/ela, de batismo, Luis-e-Ana? Luis-e-Ana narra-e-lé a muisica do amado: “Os sons cresciam tremidos como bolhas de sabio, olha esta que grande! olha esta agora mais redonda... ah! estourou.... No conto “Verde lagarto amarelo”, 0 narrador/personagem recebe a visi- ta do irmao, que lhe traz um pacote de uvas roxas. No espago criado pela sensualidade do narrador dos contos de Lygia, a mintiscula ¢ simbdlica esfera, pouco platénica, tem também a textura adocicada, apetitosa ¢ sumarenta de um bago de uva. Ao contrério da bolha de sabio, a pelicula que o envolve nao explode em contato com 0 ar. Ao contrério do globo de vidro, a pelicula que 0 envolve nao é insensivel aos dentes. Ao contratio da bolha de sabao ¢ do globo de vidro, ele no é puro ar no seu interior. O bago de uva tem algo, sim, da mistura do globo de vidro com uma conta de colar. Um globo de vidro carnoso que trouxesse dentro uma conta de colar. O miniisculo dentro do maior. A semente dentro do bago. A vida dentro do mundo. O personagem nio perde tempo em contemplar 0 cacho de uvas com os olhos. Sente o cheiro doce ¢ enjoativo que elas exalam. Quer possut-las pela boca, lingua e paladar. Quer alimentar-se delas. Imediatamente. Colhe um bago. © personagem quer romper a polpa cerrada ¢ densa do bago de uva, encaminhar-se para 0 seu interior com voliipia, direto ao centro da esfera, 2 semente. Quer sentir o gosto verdadeiro da uva, triturando-a. Narra: “Com a ponta da lingua pude sentir a semente apontando sob a polpa. Varei-a. O sumo dcido inundou-me a boca. Cuspi a semente: assim queria escrever, indo ao Amago do Amago até atingir a semente resguardada ld no fundo como um feto”. No cuspe do personagem, 0 feto; no sopro do narrador, o évulo. Mineiro da cidade de Formiga, Silviano Santiago & ficcionista, poeta, ensaista e critico literdrio. Doutor em Literatura Francesa pela Sorbonne, onde foi professor visitante entre 1982 ¢ 1984, lecionou Literatura Brasileira na Pontificia Universidade Catdlica do Rio de Janeiro ¢ na Universidade Federal Fluminense, Colunista do suplemento “Idéias-Livros” do Jornal do Brasil, publicou, entre outros, Uma literatura nos trépicos (Sdo Paulo, Perspectiva, 1978, ensaio), Erm liberdade (Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981, romance), Cheito forte (Rio de Janeiro, Rocco, 1995, poesia) e Keith Jarrett no Blue Note (Rio de Janeiro, Rocco, 1996, contos). 10 Digitalizado com CamScanner sores 0 tre Qerm von de! 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Sobre 0 primito dir: A conttante vomade de tedarit exe lows ‘os doe “Quer prowocat[n0 primeio ce sobre os process ds wa cig, cm gerl exudate que gosta do devancia. Do sonhoT Fraga. paral ent or] waa Fanaa, mas agora cle [segundo letr] esd pind cider, quer exlarecimeneos fm depeimentn firma x conta: “Levaneo a pele das perionagens que € ple das alas, quer © mais atmo, 0 mas secre. € A cena do puma épco edo romanc, qe formam um todo qt confunde com o format nr, pcm ico € cont bre _vivem em livro sob a forma, anirquica ou nio, de coletinea. * {ora afim de luzar contra a intolerincia ea favor da emancipasso dos catsicos. Exreve Maurin. na craton fvorne Ge {are des bulls de savon. Assis devant sa porte, muni d'un chalamet, il sullaic avec une ade deoune file grifo nosso] le sphtees parla fails. Dans leurs antiques pllculesbrilene des ties woke, vrteset doves qui egardae change, fond ct apart (i €peouvait un obscur bein de fixer parle rythme et les mots Finsssisble gree de ces jeu de couleurs ([.-] maa Aversio preferda era ade sprar bothas de sabio.Sentado porta da cass, com um canudo,soprava a exer peri eiges com tuidade de moga. Nas peliculas elistcas brilhavam matizes volts, verdes dourados que ele olhava muda, deface « denparceet [-]senia uma espécie de necesidade obscura de fiat 7a desis jogos de cor pel rtm a paar). A respito os veron de Victor Hugo, comentam Jean Chevalier Alain Gheesbrant, no Dicioniio de simbolr:°A bla dear ou de sb0 a ‘eth de acal-clee que men sopra aumeni excreve View Hugo smboliza a erigso lve, efemera atta, que stoura subieamente sem deat vestigi: nada além da dlimiragso arbiters e transiéra de um poco de a 10 Timea, 33, em tradusio de Carlos Alberto Nunes 11 Para Lypi, 2 iberasgo da mulher “se fr através do trabalho remuncrads". Ao mesmo tempo, 0 narismo do ecritor-mulhet, autor 4 coms de feito monologal,intimistas, se explica pelo que ela chama gostosamente da tadigio brasileira da “mulher-goabads [Explcaela:"Um pouco que {a mulher goiabada) se dstrasee o doce pegava no fund. Trancads a vete chavs, sem uma fiesta suet pata expres” Digitalizado com CamScanner

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