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“Procura apresentar-te
a Deus aprovado...
que maneja bem
a palavra da verdade”
(2 Timóteo 2:15)
1
“Que Maneja Bem a Palavra da Verdade”1
(2 Timóteo 2:15)
2
Distinguir entre um Interesse Casual pela Vontade de Deus e a
Real Busca da Verdade
Mateus 7:7 diz: “Buscai e achareis” - mas isto se refere a
uma busca séria. “Bem-aventurados os que têm fome e sede de
justiça, pois serão satisfeitos” (Mateus 5:6; NVI), mas esta é
uma fome desesperada. Por que não aprendemos? Geralmente, porque
não nos empenhamos o suficiente para tentar aprender.
Muitas pessoas não chegam a um conhecimento da verdade que
as leve à salvação, porque realmente não estão interessadas.
Quando se deparam com uma pergunta que não conseguem responder,
a tendência delas é descartar uma resposta dada por outra pessoa
- mesmo que esta venha diretamente da Bíblia -, dizendo: “Essa é
a sua interpretação”. São como o líder de uma nação a quem
disseram: “A análise microscópica mostrou que a água ingerida
pelo povo está cheia de germes”. E ele respondeu: “Quebre o
microscópio!”
3
ainda estão tentando invalidar a Palavra de Deus impondo suas
tradições.
Como identificar um falso mestre? Devemos julgar seus
ensinamentos pela Palavra de Deus (Atos 17:11). Não há nada de
errado em observar as tradições; mas se o que esse mestre ensina
contradiz as Escrituras, então ele está ensinando tradições de
homens que devem ser rejeitadas. Devemos rejeitar qualquer
ensino para a qual não há autoridade bíblica, ou que resulte na
anulação das exigências de Deus.
4
A Segunda Carta de Paulo a Timóteo
“Sê forte”
(2 Timóteo 2:1–13)
5
2 E o que de minha parte ouviste através de muitas
testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e também
idôneos para instruir a outros.
2
Walter L. Liefeld, 1 & 2 Timothy, Titus, The NIV Application Commentary. Grand Rapids, Mich.: Zondervan, 1999, p.
251 .
3
“Homens” é a tradução de uma forma plural da palavra (anthropos), a qual pode incluir mulheres. As mulheres
cristãs também precisam ser instruídas.
4
Walter Bauer, A Greek-English Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature, 3a ed., rev. e ed.
Frederick William Danker. Chicago: University of Chicago Press, 2000, p. 820.
5
Ibid., p. 472; W. E. Vine, Merrill F. Unger e William White Jr., Dicionário Vine. 7a. ed. Trad. Luís Aron de Macedo.
Rio de Janeiro: CPAD, 2007, p. 450.
6
No texto original grego, “apto para ensinar” em 1 Timóteo 3:2 difere da expressão traduzida por “idôneos para
instruir”, em 2 Timóteo 2:2.
6
Palavra a esse grupo de homens; mas a aptidão para ensinar não
se limita aos presbíteros.
Os comentaristas não são unânimes quanto ao significado de
“através de muitas testemunhas”7 (“na presença de muitas
testemunhas”; NVI). A preposição (dia) geralmente é traduzida
por “através de”. Segundo alguns defensores da tradução “através
de muitas testemunhas”, havia os que podiam dar testemunho da
exatidão do ensino de Paulo. No entanto, a expressão também pode
ter o sentido de estar “na presença de”8. À luz do contexto,
esta opção parece preferível. Paulo não alegou ter uma “mensagem
secreta” compartilhada com alguns poucos escolhidos (como os
falsos mestres diziam)9; ele pregou aberta e publicamente, “na
presença de muitas testemunhas” (NVI).
Alguns tentam usar este versículo para ensinar que existe
uma “sucessão apostólica”. John R. W. Stott observou:
7
“Testemunhas” vem do termo grego para “mártir” ( ,martus). Alguns, portanto, sugerem que Paulo estava
dizendo que havia pregado a muitos que vieram a ser mártires.
8
Bauer, p. 225.
9
Hoje também há quem alegue que alguns dos ensinos dos apóstolos foram transmitidos a um grupo escolhido de
membros da igreja e não a todos.
10
John R. Stott, Tu, porém - A Mensagem de 2 Timóteo. Série A Bíblia Fala Hoje. Trad. Alfredo dal Bello. São Paulo:
ABU editora, 1982, p. 23.
11
“Comigo” foi acrescentado pelos tradutores. A palavra grega traduzida por “sofre comigo” nesta passagem é
traduzida por “participa comigo dos sofrimentos” em 1:8.
12
Veja Romanos 6:13; 7:23; 1 Coríntios 9:7; 2 Coríntios 6:7; 10:3, 4; Efésios 6:11-17; 1 Timóteo 1:18.
7
Vários anos atrás, houve uma controvérsia em uma
importante denominação protestante sobre a seleção de
hinos em um novo hinário. Um grupo pedia que todos os
hinos com imagens militares fossem retirados da nova
edição. Esse hinos, argumentava um dos grupos, violavam
os princípios do Príncipe da Paz e criavam a impressão
errada da missão da igreja. Quando lemos o conselho de
Paulo em 2 Timóteo, no entanto, não temos dúvidas de que
Paulo viu utilidade nas figuras militares.13
O Soldado (2:4)
4 Nenhum soldado em serviço se envolve em negócios desta
vida, porque o seu objetivo é satisfazer àquele que o
arregimentou.
8
“ocupação”16. Os tradutores acrescentaram “desta” à “vida”,
esclarecendo que se trata dos negócios da vida cotidiana. A NVI
optou por “vida civil” e a BJC, por “assuntos civis”.
A palavra-chave do versículo 4 é “envolver-se”. Nenhum
cristão – pregador ou membro comum - deve se “emaranhar” em
qualquer atividade da vida que substitua seu principal
“negócio”, que é ser um soldado de Cristo. Minha mente remonta a
Floyd Schubert, um dos presbíteros da igreja em Muskogee,
Oklahoma. O irmão Schubert era dono de uma empresa de suprimento
escolar bem-sucedida que atendia a maior parte do leste de
Oklahoma. Em sua mesa, havia uma placa que dizia algo assim:
“Meu negócio é servir ao Senhor. Vendo lápis para ganhar a
vida”. A lição do versículo 4 é manter nossas prioridades em
ordem. Essa mensagem reproduz basicamente Mateus 6:33: “Buscai,
pois, em primeiro lugar o Seu reino [de Deus] e a Sua justiça”.
Um soldado deve manter suas prioridades em ordem “para
agradar àquele que o arregimentou” (2:4c). A terminologia pode
nos parecer estranha. Por que um soldado estaria interessado em
agradar àquele que o recrutou? Ao lermos o versículo 4, não
devemos pensar em um processo moderno de recrutamento. “Ser
arregimentado como soldado” ( , stratologeō) indica que
alguém estava escolhendo soldados e nesta passagem refere-se a
17
O Atleta (2:5)
5 Igualmente, o atleta não é coroado se não lutar segundo
as normas.
9
competição”19; o termo não especifica o tipo de competição
esportiva envolvida. Muitos pensam no atletismo porque esta era
um modalidade favorita de Paulo20. No entanto, poderia se tratar
de qualquer modalidade esportiva. Alfred Marshall traduziu a
palavra por “lutas”21.
Independentemente da modalidade, o candidato precisava ter
um treinamento pesado para ser um concorrente sério. O atleta
tinha de renunciar a muitos prazeres pessoais para estar pronto
para competir. Ele estava disposto a fazer tudo isso para “ser
coroado”. Essa expressão traduz um verbo relacionado com
(stephanos), a coroa da vitória22. Nos jogos antigos, geralmente
se colocava uma coroa de flores (feita de oliveira, louro, aipo
silvestre ou pinho) na cabeça do vencedor.
Paulo estava enfatizando que o atleta não iria “ser
coroado”, a menos que competisse “segundo as normas”. “Segundo
as normas” traduz uma flexão de (nomimōs), termo relacionado
com “lei” ( , nomos). Nomimōs significa “legalmente”. Os
comentaristas se dividem quanto às normas ou regras que Paulo
tinha em mente: as regras de preparação (ser um cidadão de boa
reputação no país representado e ter sido treinado por um
período específico) ou as regras do próprio jogo. Essa distinção
faz pouca diferença para a ideia principal exposta pelo
apóstolo. Quaisquer que fossem essas normas ou regras, elas
precisavam ser seguidas, para que o atleta vencesse. Nos dias de
hoje, às vezes vemos o triste espetáculo de um atleta ser
desqualificado por não ter seguido as normas do comitê
olímpico23.
O Agricultor (2:6)
19
Ibid., p. 24.
20
Veja 1 Coríntios 9:24, 26; Gálatas 2:2; Filipenses 2:16; 3:13 e 14.
21
Alfred Marshall, The Interlinear NASB/NIV Parallel New Testament in Greek and English. Grand Rapids, Mich.:
Zondervan Publishing House, 1993, p. 614.
22
Stephanos é a palavra traduzida por “coroa” em 4:8.
23
Por exemplo, alguns atletas violam a proibição contra o uso de drogas para melhorar o desempenho e,
consequentemente, são desclassificados.
24
Liefeld, p. 248.
10
agricultor levava uma vida “totalmente desprovida de emoção,
distante de todo o glamour dos perigos e aplausos”25.
A palavra chave no versículo 6 é aquele “que trabalha”, do
verbo (kopiaō, “trabalhar ao ponto de exaustão”26), usada por
Paulo para descrever seus próprios esforços. A vida de um
agricultor nunca foi fácil. “O sucesso da exploração agrícola
dependia tanto de suor como de habilidade.”27 Ele tinha de arar
os campos, plantar a semente e manter longe as ervas daninhas e
as pragas, enquanto esperava (e orava) para que Deus mandasse
chuva. Em alguns anos, havia colheita; em outros, não. Num bom
ano em que o agricultor tivesse tido colheitas bem-sucedidas,
Paulo disse que era justo que ele fosse “o primeiro a participar
dos frutos”. Ele era responsável pelos insumos e serviços
recebidos desde a última colheita, mas primeiramente convinha
que ele participasse dos frutos do seu labor.
Alguns comentaristas acreditam que aqui Paulo
estava expondo a mesma ideia exposta em 1 Coríntios 9:10: o que
lavra a terra (o pregador) tem direito à colheita (isto é, tem
o direito de ser sustentado financeiramente). Outros fazem uma
aplicação espiritual: é o pregador/professor que mais se
beneficia de sua preparação para o ensino. Ambas as observações
são verdadeiras, mas não parecem se encaixar no contexto do
versículo 6. A ênfase está no lavrador que trabalha28. Faça chuva
ou faça sol, ele continua a trabalhar. Se o primeiro plantio der
frutos ou se ele tiver de plantar novamente, ele continua a
trabalhar. Ainda que insetos ataquem a plantação, ele continua a
trabalhar. Em todas as estações do ano, ele continua a
trabalhar. Nos bons e nos maus momentos, ele continua a
trabalhar. Ele nunca desiste. Quando finalmente colhe a safra,
ele merece “a sua parte na colheita” (NTLH).
25
H. C. G. Moule, Studies in II Timothy, Kregel Popular Commentary Series. Grand Rapids, Mich.: Kregel Publications,
1977, p. 77.
26
A mesma palavra é usada em 1 Timóteo 4:10 e 5:17.
27
Stott, p. 24.
28
Veja as declarações contrárias sobre o preguiçoso em Provérbios 10:5; 20:4; 24:30, 31.
11
“Ponderar” ( , noeō) é “perceber com a mente”29, “pensar
com cuidado” . Essencialmente, Paulo estava dizendo: “Não só
30
12
(minhas e de outros) à luz da Palavra tem tornado as passagens
mais significativas. Também obtive compreensão ouvindo um
sermão, uma aula ou um pensamento expresso por um amigo cristão.
Enquanto estudo, sempre oro. “Se, porém, algum de vós
necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá
liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida”
(Tiago 1:5). Oro pedindo compreensão; e, acima de tudo, oro para
eu ter um coração sincero que ouça – que, de fato, escute - o
que Deus está dizendo para mim em Sua Palavra. Todo estudante da
Palavra de Deus deve fazer a oração do salmista: “Desvenda os
meus olhos, para que eu contemple as maravilhas da tua lei”
(Salmos 119:18). A oração fervorosa de um justo ainda realiza
muito (Tiago 5:16).
13
Uma observação adicional precisa ser feita em relação à
expressão “ressuscitado de entre os mortos”. A palavra traduzida
por “ressuscitado” é um particípio passivo perfeito de
(egeirō) e indica que Ele “ainda [está] ressuscitado”34. A
expressão não significa “foi ressuscitado”, mas “está
ressuscitado”. Cristo é O Ressuscitado, Aquele que vive, o
Sempre-Presente, Aquele que está à destra de Deus intercedendo
por nós (Romanos 8:34; Hebreus 7:25).
Em tempos de obscuridade, precisamos nos lembrar de Jesus,
fixando os olhos nEle:
14
(sol , “com”). Literalmente, é “sofrer adversidade”35. “Até
algemas” vem de (desmos), derivado de (deō, “ligar,
amarrar”) e se refere a ser amarrado, preso ou confinado 36. No
caso de Paulo, essa restrição incluía algemas37. Roma não dava
oportunidade para seus presos escaparem.
O aspecto mais severo das circunstâncias nas quais Paulo se
encontrava era que ele fora preso “como [um] malfeitor”.
“Malfeitor” traduz uma flexão de (kakourgos), formado por
(kakos, “mal”) e (ergon, “trabalho”). Significa literalmente
“malfeitor”38 e era a palavra contemporânea para um criminoso
comum. A outra ocorrência do termo no Novo Testamento é na
designação dos “malfeitores” crucificados com Jesus (Lucas
23:32, 33, 39). No que dizia respeito a Roma, Paulo era membro
de uma religião ilegal e líder da seita odiada responsável pela
destruição da cidade. Jesus sofreu e morreu como um criminoso
comum, e agora Paulo faria o mesmo.
A essa altura, Paulo inseriu uma nota positiva: contudo, a
palavra de Deus não está algemada [deō]39. Os inimigos do
evangelho podiam algemar ou prender o mensageiro, mas não podiam
algemar ou prender a mensagem. Ela fora proclamada a muitas
testemunhas (2:2). Cartas inspiradas circulavam. Relatos do
Evangelho haviam sido escritos. Com certeza Paulo estava
transmitindo o evangelho mesmo durante seus julgamentos em
Roma. Agora, Timóteo transmitiria a Palavra a outros, iniciando
uma progressão sem fim (2:2). A chama tinha sido acesa e todos
os esforços dos homens não conseguiriam apagá-la. Se o esforço
humano pudesse ter apagado o evangelho, ele teria se extinguido
há muito tempo; mas a Palavra permanece “viva e eficaz” (Hebreus
4:12). “O céu e a terra passarão”, disse Jesus, “mas as Minhas
palavras não passarão” (Mateus 24:35). Dois mil anos depois,
ainda estamos lendo e estudando essa Palavra!
Versículo 10. Por que Paulo estava disposto a sofrer? Este
versículo nos diz por quê: Por esta razão, tudo suporto.
“Suporto” traduz uma flexão do verbo (hupomenō), formado por
(hupo, “sob”) e (menō, “permanecer”). É “manter uma crença
ou curso de ação em face de oposição, manter a posição,
aguentar, suportar”40. William Hendriksen disse: “Significa
seguir em frente (crendo, testificando, exortando), mesmo quando
o fardo sob o qual alguém está viajando pelas sendas da vida se
torna muitíssimo pesado”41. “Tudo” incluía todas as dificuldades
que o apóstolo sofrera. Ele foi odiado, apedrejado, espancado
35
Vine, Unger e White Jr., p. 377.
36
Ibid., p. 442; Bauer, p. 219.
37
Paulo mencionou suas “algemas” também em 1:16.
38
Vine, Unger e White Jr., p. 644, 767.
39
Novamente, deo significa “amarrado”, ou “algemado”. Muitas traduções optaram por “presa” (ARC; ARIB; ACF;
NVI; BJC; NVT).
40
Bauer, p. 1039. Uma palavra relacionada, (hupomone), aparece em 1 Timóteo 6:11.
41
William Hendriksen, 1, 2 Timóteo e Tito. Comentário do Novo Testamento. São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2001, 2a.
ed., pp. 310-11.
15
com chicotes e varas, vítima de naufrágio e muito mais (2
Coríntios 11:23-28); mas, naquele momento, sua prisão e morte
iminente ocupavam especialmente a sua mente.
Por qual razão Paulo estava disposto a continuar, apesar de
seus fardos pesados? Aqui está a sua resposta: por causa dos
eleitos. O termo grego para “eleitos” ( , eklektos) também
pode ser traduzido por “selecionados” e muitas vezes é vertido
42
42
Bauer, p. 306. O mesmo termo é usado em 1 Timóteo 5:21 e Tito 1:1.
43
Moule, p. 84.
44
Paulo usou a mesma palavra ( , aiōn; eterno) em 1 Timóteo 1:16, 17.
45
É verdade que Deus, sendo onisciente, pode detectar os corações sinceros que responderão ao evangelho se este
lhes for pregado (veja Atos 18:9, 10); mas isto não quer dizer que Deus arbitrariamente os escolheu para serem
salvos na eternidade.
16
11 Fiel é esta palavra:
Se já morremos com Ele, também viveremos com Ele;
12 se perseveramos, também com Ele reinaremos; se O
negamos, Ele, por sua vez, nos negará;
13 se somos infiéis, Ele permanece fiel, pois de maneira
nenhuma pode negar-Se a Si mesmo.
46
As outras ocorrências de “palavra fiel” encontram-se em 1 Timóteo 1:15; 3:1; 4:7–9; Tito 3:4–8a.
47
Também pode haver um jogo de palavras que não é óbvio em português. As palavras chaves traduzidas por
“morremos”, “viveremos” e “reinaremos” começam com (sol, “com”), enquanto “negar” (três vezes) e “infiéis”
traduzem palavras que começam com o elemento de negação (a).
48
Alguns apontam para a palavra “pois” ( , gar) [presente no texto original] no início da primeira frase. Via de regra,
essa palavra serve de elo para o que foi dito anes. “Isto indica”, dizem eles, “que havia outros versos (de um hino)
que iam antes”; porém, “pois” pode simplesmente estar apontando para a “glória eterna” no encerramento do
versículo anterior.
49
Carl Spain, The Letters of Paul to Timothy and Titus, The Living Word Commentary. Austin, Tex.: R. B. Sweet Co.,
1970, p. 127.
50
Esta é uma “oração condicional de primeira classe”; ou seja, presume-se que a declaração seja verdadeira. Em
outras palavras, entende-se esse “se” por “uma vez que”.
51
O texto grego diz apenas “morremos com” e “vivemos com”. “Ele” é subentendido, sendo um acréscimo dos
tradutores.
17
os mártires52. Ainda que esse trecho não tenha sido escrito
originalmente para os que iriam enfrentar o martírio, é fácil
perceber como essa “palavra fiel” é uma fonte de consolação para
os que se deparam com a morte por causa da fé.
Verso 2: “Se perseveramos, também com Ele
reinaremos” (2:12a). “Perseverar” vem da mesma palavra usada em
2:10, onde Paulo disse: “Tudo suporto [hupomenō]”. Suportar a
perseguição é não deixar que ela nos desencoraje a ponto de
abandonarmos a fé. Quem for fiel até o fim, “reinará com Ele”.
Esse “reinado” é outra bênção que começa agora e atinge o clímax
no céu. Os cristãos reinam agora porque fazem parte da família
real (1 Pedro 2:9; Apocalipse 5:10). Somos filhos do rei
(Romanos 8:16, 17), o que nos torna príncipes e princesas. No
céu, Cristo nos dará a honra de nos sentarmos com Ele no Seu
trono (Apocalipse 3:21; veja 5:10). Reinamos agora e também
“reinaremos com Ele” nesse dia (Apocalipse 20:6)53. Os cristãos
martirizados por Roma eram tratados como se nada fossem – ou até
menos que nada - mas, na realidade, pertenciam à realeza.
Verso 3: “Se O negamos, Ele, por sua vez, nos
negará” (2:12b). Jesus disse: “Mas aquele que Me negar diante
dos homens, também eu o negarei diante de Meu Pai, que está nos
céus” (Mateus 10:33). “Negar” no grego é uma palavra forte,
(arneomai), que significa “repudiar, renegar”54. Isto nos remete
a Mateus 7:21-23, quando Jesus declarou que no dia do juízo Ele
dirá aos que não tiverem obedecido a Deus: “Não vos conheço”. Na
passagem em questão, a NVI optou por: “Ele também nos negará”.
Verso 4: “Se somos infiéis, Ele permanece fiel, pois de
maneira nenhuma pode negar-Se a Si mesmo” (2:13). “Infiéis”
traduz uma flexão do verbo (apisteō), formado de
(pisteuō, “crer”) acrescido do elemento de negação (a). “Fiel”
traduz o adjetivo correlato (pistos) . Apisteo poderia ser
55
52
Durante os dias da perseguição romana, alguns cristãos acreditavam que se alguém morresse como um mártir,
iria diretamente para o céu. Esta convicção se reflete em Atos dos Mártires de Cili 15.
53
Essas passagens do livro do Apocalipse são comentadas por David L. Roper, na série “Apocalipse”, A Verdade para
Hoje, disponível no site www.biblecourses.com/Portuguese.
54
Bauer, pp. 132-33. Flexões do verbo arneomai (“negar”) são usadas em 1 Timóteo 5:8 e Tito 2:12.
55
Pistos é a palavra para os homens “fiéis” mencionada em 2 Timóteo 2:2.
18
infiéis”. Também coloca “Ele... nos negará” em paralelo a “Ele
permanece fiel”. E, portanto, “Ele permanece fiel” equivale a
“Ele será fiel em Sua ameaça de nos negar”56. Hendriksen
observou:
19
intermédio de dons milagrosos ou poderes como profecia e
línguas. A preservação do evangelho passou a depender de
homens fiéis treinados para o passarem adiante.60
60
J. W. Roberts, Letters to Timothy, The Living Word. Austin, Tex.: R. B. Sweet Co., 1964, p. 79.
61
A maioria dos comentaristas menciona a vitória como recompensa, mas a recompensa no texto é o fato de o
soldado agradar o seu comandante.
62
Isto acontecia com os soldados do exército romano.
63
Nos jogos antigos (assim como hoje), muitos concorrentes obedeciam às normas, mas nem por isso eram
vencedores. Não é assim no cristianismo. Todos que terminarem o percurso receberão a coroa (4:7, 8).
20
regra a ser seguida. Até Paulo falou de combater o bom combate e
completar a carreira antes de mencionar a coroa da vitória (4:7,
8).
64
Lenski, p. 795.
21
Sempre que negarmos o Senhor Jesus, devemos ter em mente a
possibilidade de nos arrependermos como Pedro fez, para que no
dia do julgamento Cristo não nos negue. Além disso, devemos
estar conscientes da terrível possibilidade de sermos condenados
por nosso Senhor. “Se negarmos a Ele, Ele também nos negará.”
65
Gary W. Demarest, 1, 2 Thessalonians, 1, 2 Timothy, Titus, The Communicator’s Commentary, vol. 9. Waco, Tex.:
Word Books, 1984, p. 263.
22
A Segunda Carta de Paulo a Timóteo
“Apresenta-te a Deus Aprovado”
(2 Timóteo 2:14–26)
66
Diamarturomai é traduzido em 2 Timóteo 4:1 por “conjuro-te perante Deus” (ARA).
67
Alguns manuscritos têm “Senhor” em vez de “Deus”. Ambos os termos “são apoiados por fortes evidências”
(Bruce M. Metzger, A Textual Commentary on the Greek New Testament, 2a ed. Stuttgart, Germany: German Bible
Society, 1994, p. 579). O sentido do texto não é afetado por qualquer uma dessas palavras.
68
O substantivo correlato, (logomachia), ocorre em 1 Timóteo 6:4, onde também é traduzido por “contendas de
palavras”.
69
Walter Bauer, A Greek-English Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature, 3a ed., rev. e
ed. Frederick William Danker. Chicago: University of Chicago Press, 2000, p. 598.
70
J. B. Phillips, Cartas para Hoje. Trad. Márcio Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova, 1984, p. 161.
23
Não devemos concluir com base neste versículo que palavras
não são importantes. Paulo disse que devemos “manter o padrão
das sãs palavras” (1:13; grifo meu). “Nosso Senhor defendeu a
imortalidade e a ressurreição fundamentando Seu argumento numa
única frase - EU SOU - e no tempo verbal empregado”71. É através
das palavras que transmitimos ideias; em geral, quanto mais
exatas forem as palavras, mais clara será a ideia. Não é
coincidência que a revelação de Deus para nós seja chamada “a
palavra de Deus ”(veja 1 Timóteo 4:5; 2 Timóteo 2:9; Tito 2:5).
Paulo não era contra o cuidado com as palavras ou o debate
sobre o significado exato das palavras. Ele se referia a perder
tempo com as bizarras teorias dos falsos mestres - identificadas
neste capítulo como “falatórios inúteis” (2:16) e “questões
insensatas e absurdas” (2:23), e em outros textos como “mitos e
genealogias sem fim” (1 Timóteo 1:4) e “fábulas de velhas” (1
Timóteo 4:7). Perder tempo com essas “questões tolas” (Tito 3:9)
era desperdiçar energia que poderia ser mais proveitosa se usada
para pregar e ensinar o evangelho72.
Paulo salientou que contendas sobre palavras para nada
aproveitam. A expressão ( , ep' ouden chrēsimon) é
literalmente “útil para nada”. E acrescentou que elas só geram
a subversão dos ouvintes. “Subversão” traduz (katastrofe),
equivalente ao grego transliterado para “catástrofe”. O termo é
formado de (kata, “para baixo”) e (estrofe, “virada”), e,
basicamente, denota o ato de virar tudo de cabeça para
baixo73. Fisicamente, descreve tamanha destruição que nada fica
como antes. Espiritualmente, é um “descontentamento intelectual
em nível devastador”74. Brigas e discussões nunca edificaram
ninguém, mas já destruíram muitos. Conflitos mesquinhos são
desanimadores para todos que os ouvem. Podem levar os ouvintes a
se questionarem: “Se esses indivíduos versados não entram em
acordo quanto a esta questão, como é que eu vou saber emitir uma
opinião?”
A preocupação de Paulo era com os falsos mestres
infiltrados em Éfeso, mas algumas observações gerais sobre
“contendas de palavras” podem ser úteis aqui. Primeiramente, se
alguém insistir em discutir verbalmente conosco, devemos nos
recusar a nos rebaixarmos a esse nível (veja Provérbios 17:27;
26:4). Mesmo quando consideramos necessário expor o erro,
“contender” não é a maneira de fazê-lo. Em 2:24 e 25, notaremos
que entre as características do “servo do Senhor” consta esta
qualidade: “Ora, é necessário que o servo do Senhor não viva a
71
James Burton Coffman, Commentary on 1 & 2 Thessalonians, 1 & 2 Timothy, Titus & Philemon. Austin, Tex.: Firm
Foundation Publishing House, 1978, p. 289. Coffman fazia alusão a João 8:58.
72
Tito 3:9 também se aplica ao desperdício de tempo com outras questões sem importância.
73
W. E. Vine, Merrill F. Unger e William White Jr., Dicionário Vine. 7a. ed. Trad. Luís Aron de Macedo. Rio de Janeiro:
CPAD, 2007, p. 1004.
74
Bauer, p. 528.
24
contender, e sim deve ser brando para com todos... disciplinando
com mansidão os que se opõem” (grifo meu).
Versículo 15. Isso nos leva a um dos versículos mais
conhecidos no Novo Testamento: Procura apresentar-te a Deus
aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que
maneja bem a palavra da verdade. “Procura” traduz (spoudazō),
que significa “ser especialmente consciencioso no cumprimento de
uma obrigação, ser zeloso/ávido, esforçar-se, investir todo o
empenho”75. Uma possível tradução seria “faça o máximo possível”.
Não bastaria aqui um esforço casual ou tímido.
“Faça o máximo possível”, dizia Paulo, “para se apresentar
a Deus aprovado”. “Aprovado” traduz (dokimos), que é “ser
autêntico com base em provas... testado e comprovado,
genuíno” . Quando nos “apresentarmos” a Deus, precisaremos da
76
75
Ibid., p. 939. A mesma palavra (spoudazo) ocorre também em 2 Timóteo 4:9 e 21 e Tito 3:12. Termos correlatos
também aparecem em 2 Timóteo 1:17 (“de poder”) e Tito 3:13 (“com diligência”).
76
Ibid., p. 256. O antônimo de dokimos é traduzido por “reprovado” em Tito 1:16.
77
Vine, Unger e White Jr., p. 827. Bauer, p. 390.
78
Vine, Unger e White Jr., pp. 772-73.
25
direção reta”, para que o viajante vá diretamente para o
seu destino.
evangelho.
O bom e correto manuseio de uma ferramenta exige treino;
precisamos usá-la. Assim é com a Palavra. Podemos empregá-la
para guiar os outros, mas especialmente precisamos usá-la em
nossas próprias vidas. Certamente, nenhum de nós gostaria de ser
um obreiro que tem do que se envergonhar:
79
Bauer, p. 722.
80
Vine, Unger e White Jr., p. 773.
81
Em Efésios 1:13, a NTLH traduz essa mesma expressão por “a verdadeira mensagem”.
26
Envergonhado porque não pode responder quando suas crenças
e práticas são questionadas:
“Santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração,
estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos
pedir razão da esperança que há em vós” (1 Pedro 3:15).
Envergonhado porque seu estilo de vida repele as pessoas:
“Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para
que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que
está nos céus” (Mateus 5:16).
27
frente”) e (koptō, “cortar”) e refere-se a cortar o
caminho, como se árvores e arbustos fossem cortados para se
avançar rapidamente85. Paulo usou o termo aqui num sentido
irônico: falatórios inúteis e profanos “avançam” na direção
errada!86
Versículo 17. Agora a atenção se volta dos falatórios
inúteis para os faladores inúteis - os falsos mestres. Ele
advertiu: Além disso, a linguagem deles corrói como câncer.
“Câncer” é uma transliteração da palavra grega (gangraina); a
ideia é algo de fato igual a um “câncer” . A palavra traduzida
87
28
viesse dos filósofos gregos. De um modo geral, esses indivíduos
acreditavam na imortalidade, mas não em uma ressurreição do
corpo. Ensinaram que todas as coisas materiais eram más,
incluindo o corpo. A ideia de uma ressurreição do corpo era
abominável para eles.
Ensinar que a ressurreição já tinha acontecido podia não
soar excessivamente grave para alguns; mas, no que dizia
respeito a Paulo, isso atingia o coração do evangelho e destruía
a esperança do mártir. Algo semelhante fora ensinado em Corinto
alguns anos antes92, e horrorizou Paulo:
92
E parece que também em Tessalônica (2 Tessalonicenses 2:2).
93
Vine, Unger e White Jr., p. 1004.
94
Bauer, p. 74.
29
Versículo 19. Este versículo começa com a conjunção
adversativa no entanto, (mentoi)95, enfatizando a certeza do
contraste implícito neste versículo: as pessoas são instáveis,
mas Deus não. Havia algo inabalável com que Timóteo podia (e nós
também podemos) contar. Usando a metáfora de um edifício, Paulo
escreveu: o firme fundamento de Deus permanece.
“Fundamento” traduz (themelios). Usado literalmente,
themelios é “a base de apoio para uma estrutura”.
Metaforicamente, representa “a base para [algo] acontecer ou vir
a existir”96. A imagem de um fundamento ou alicerce é usada de
várias maneiras no Novo Testamento. Por exemplo, Paulo disse que
“ninguém pode lançar outro fundamento, além do que foi posto, o
qual é Jesus Cristo” (1 Coríntios 3:11). Em outra passagem, ele
disse que, como cristãos, nossas vidas são “edificad[a]s sobre o
fundamento dos apóstolos e profetas97, sendo Ele mesmo, Cristo
Jesus, a pedra angular” (Efésios 2:20). Em 1 Timóteo 3:15, Paulo
falou da igreja como “coluna e baluarte da verdade”98.
Neste versículo, podemos pensar no “fundamento” como tudo o
que Deus fez por nós ao viabilizar a salvação, incluindo o envio
de Jesus para morrer por nós, estabelecendo a igreja, e nos
dando a Bíblia. Este é o fundamento/base para tudo em que
cremos, tudo o que fazemos e tudo o que somos.
Paulo usou o verbo num tempo perfeito ( , hestēken) em
sua declaração, o qual aparece num tempo presente na tradução:
“o firme fundamento de Deus permanece”. O tempo perfeito indica
ação iniciada no passado, que continua no presente e continuará
no futuro. O tempo não pode destruir os planos e propósitos de
Deus. O tempo não pode destruir a Palavra de Deus. O tempo não
pode destruir a igreja de Deus. Nunca devemos duvidar: o
fundamento estabelecido por Deus é sólido como uma rocha.
Este fundamento tem um selo ( , sfragis; 2:19b). Um selo
servia a três propósitos: confirmava o proprietário, assegurava
a autenticidade e protegia o conteúdo do objeto selado99. Os
conceitos enfatizados aqui comprovam a propriedade e a
autenticidade. Sfragis era geralmente usado no contexto de se
pressionar um anel de sinete sobre uma porção de cera num
documento; mas como a figura é a de um edifício, devemos pensar
em uma inscrição100. Era comum naquela época prédios conterem
inscrições em homenagem a certos indivíduos. Ainda hoje, muitos
edifícios contêm placas que exibem informações sobre: o
95
Ibid., p. 630.
96
Ibid., pp. 448-49.
97
Este é o fundamento que os apóstolos e profetas (homens inspirados) estabeleceram através da pregação de
Cristo.
98
Em Hebreus 6:1, “fundamento” refere-se a verdades fundamentais.
99
Veja uma exposição sobre “selos” em David L. Roper, “Apocalipse 1 a 11”, A Verdade para Hoje. Disponível no site
www.biblecourses.com/Portuguese.
100
Bauer, p. 980. Várias versões usam “inscrição”, incluindo a NVI. Outras possíveis traduções são “sinal”;
“garantia”, “letreiro” e “certificação”.
30
responsável pelo edifício, a data da construção e assim por
diante.
O firme fundamento de Deus tem uma dupla inscrição, ou
seja, é formado por duas verdades fundamentais. A primeira é
esta: “O Senhor conhece [ , ginosko] os que Lhe pertencem”.
Este é o aspecto divino, o lado secreto e invisível, de saber
quem é aprovado por Ele. As Escrituras afirmam enfaticamente que
Deus “conhece os que são Seus”101. Se você é cristão, você foi
“comprado por preço” (1 Coríntios 6:20); você pertence a Ele e
Ele sabem quem você é.
Só Deus conhece com certeza os que Lhe pertencem.
Precisamos ensinar a Palavra de Deus e precisamos incentivar
todos a segui-la; mas devemos entender que não somos nós que
emitimos o julgamento final sobre quem pertence a Deus. Ele é o
Juiz.
Todavia, há também o aspecto humano, o lado público e
visível, de Deus saber quem é aprovado por Ele. A segunda
verdade fundamental é esta: “Aparte-se da injustiça todo aquele
que professa o nome do Senhor102”. Há muitas maneiras de
“professar o nome do Senhor”. Professamos o Seu nome quando
confessamos que “Jesus é Senhor” (Romanos 10:9). Professamos o
Seu nome quando somos batizados (Mateus 28:19; Atos 8:37).
Invocamos o Seu nome quando oramos (1 Coríntios 1:2; Efésios
5:20). Usamos o Seu nome quando nos declaramos “cristãos”,
aqueles que pertencem a Cristo (Atos 11:26). Todos esses usos
refletem um relacionamento com o Senhor.
Ora, se alegamos ter esse relacionamento, devemos “nos
apartar103 da injustiça”. Pedro escreveu:
101
Veja Êxodo 33:12; Números 16:5; João 10:14; 1 Coríntios 8:3; Gálatas 4:9.
102
A ERC diz “Cristo” no lugar de “Senhor”. As evidências dos manuscritos favorecem “Senhor”, mas ambos os
termos comunicam o significado da passagem.
103
“Aparte-se” traduz (afistemi), “manter-se longe de” ou “abandonar” em decorrência de uma decisão (veja os
comentários sobre 1 Timóteo 4:1).
31
verdade. Podemos verificar se parecem ou não estar levando uma
vida com temor a Deus. Jesus disse que podemos conhecer os
falsos profetas “pelos seus frutos” (Mateus 7:20; veja 12:33).
Muitos escritores acreditam que, ao citar que Deus conhece
os que Lhe pertencem (2:19), Paulo estava fazendo uma alusão a
Números 16 do Antigo Testamento Grego (A Septuaginta). Essa
passagem fala da rebelião de Coré. O grupo formado por Coré e
vários outros se opôs a Moisés e Arão, dizendo: “Basta! Pois que
toda a congregação é santa, cada um deles é santo, e o SENHOR
está no meio deles; por que, pois, vos exaltais sobre a
congregação do SENHOR?” (Números 16:3). Moisés, então,
respondeu: “Amanhã pela manhã, o Senhor fará saber quem é dEle”
(Números 16:5; grifo meu). Então, em uma grande demonstração de
poder, Deus confirmou a liderança de Moisés e Arão 104. Depois
disso, Moisés instruiu o povo: “Desviai-vos, peço-vos, das
tendas destes homens perversos... para que não sejais
arrebatados em todos os seus pecados” (Números 16:26). William
Hendriksen fez esta aplicação:
104
Adaptado de Bruce B. Barton, David R. Veerman e Neil Wilson, 1 Timothy, 2 Timothy, Titus, Life Application Bible
Commentary. Wheaton, Ill.: Tyndale House Publishers, 1993, p. 195.
105
William Hendriksen, 1, 2 Timóteo e Tito. Comentário do Novo Testamento. São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2001,
2a. ed., p. 330.
106
R. C. H. Lenski, The Interpretation of St. Paul’s Epistles to the Colossians, to the Thessalonians, to Timothy, to Titus
and to Philemon. S.c.p.: Lutheran Book Concern, 1937; reimpressão, Columbus, Ohio: Wartburg Press, 1946, p. 807.
32
“qualquer tipo de recipiente”107. O termo pode englobar pratos,
tigelas, copos, potes e panelas, jarros, vasos e outros itens
semelhantes. Na ilustração de Paulo, alguns são feitos de metais
preciosos como “ouro e prata”. Ele especificou uma “casa grande”
- talvez uma imponente mansão ou palácio - porque seria
improvável que uma residência simples tivesse vasos de ouro e
prata. Poderíamos imaginar os inestimáveis vasos de mesa e
utensílios exibidos junto com as joias da coroa na Torre de
Londres. Na ilustração, outros vasos são feitos de materiais
comuns como “madeira” e “barro” (argila cozida). Hoje, a
categoria mais comum seria a dos utensílios feitos de ferro,
estanho, alumínio, plástico e papel. Paulo continuou afirmando
que alguns [são], para honra ( , time); outros, porém, para
desonra ( , atmia) (2:20b).
Muitas aplicações foram feitas com base neste versículo, a
maioria das quais expressa alguma verdade bíblica, mas não
necessariamente a verdade que Paulo tinha em mente. Por exemplo,
uma das sugestões é que o versículo ensina que a igreja contém
uma variedade de pessoas com uma variedade de talentos. Alguns
executam tarefas mais impressionantes (de ouro e prata),
enquanto outros (do ponto de vista do mundo) têm finalidades
menos impressionantes (como a madeira e o barro). Embora isso
seja verdade, essa interpretação implica que “desonra”
signifique algo inferior ao que geralmente significa.
Não devemos perder de vista o contexto. Paulo estava apenas
se referindo a falsos mestres como Himeneu e Fileto (2:16-18). A
primeira parte do versículo 20 simplesmente observa que existem
todos os tipos de pessoas no reino de Deus (veja Mateus 13:24–
30, 36–43, 47, 48), enquanto a última parte do versículo indica
que algumas são para honra (como Timóteo e os “homens fiéis”),
enquanto outras são para desonra (como Himeneu e Fileto)108. É
triste, mas é verdade, que nem todo indivíduo que afirma ser
cristão é uma boa pessoa. Até Jesus teve um Judas. Um dos
maiores desafios enfrentados por cristãos novos e jovens
pregadores é aceitar o fato de que nem todos na igreja são o que
deveriam ser.
107
Bauer, p. 927.
108
Em relação a quais utensílios são “para desonra”, Paulo indicou em 2:21 que os utensílios sujos são para
desonra.
33
Versículo 21. O fato de Paulo não ter a intenção de
enfatizar o material do utensílio é evidenciado nos versículos
21 e 22. A ênfase não está no utensílio ser feito de metais
preciosos ou materiais mais comuns, mas em seu estado de limpeza
ou purificação: Assim, pois [uma vez que alguns utensílios são
para honra e outros, para desonra], se alguém a si mesmo se
purificar destes erros, será utensílio para honra.
O uso do pronome “alguém” nos permite saber que, embora
essas instruções sejam necessariamente para pregadores, a
passagem se aplica a todos. “Purificar-se” ( , ekkathairō)
deriva de uma palavra para “purificar” ( , kathairō) reforçada
por (ek , “de”). A ideia é “purificar-se”, “purificar
completamente”109. “Destes erros”, coletivamente, refere-se a
tudo que é desonroso110. A purificação envolve tanto a atividade
humana como a divina. Timóteo deveria se esforçar ao máximo para
se livrar de toda e qualquer coisa desonrosa; mas, no final, ele
teria de confiar que o sangue de Jesus “nos purifica de todo
pecado” (1 João 1:7).
Todo discípulo que se purifica (com a ajuda de Deus) torna-
se “um utensílio para honra”. Outra possível tradução é “para
fins honrosos” (NVT). Paulo elencou três características
notáveis de “um utensílio para honra”: santificado e útil ao seu
possuidor, estando preparado para toda boa obra. “O possuidor” é
o dono da “casa grande” - uma alusão a Deus. Ser “santificado” (
, hagiazō) é ser “separado”111 para o serviço do “Possuidor”,
“permanentemente separado”112 para o Seu uso. “Útil” traduz
(euchrēstos), formado de (eu, “bom”) mais o verbo
(chraomai, “usar”) . Descreve alguém que é “útil”, “benéfico”,
113
“prestativo”114.
Versículo 22. Este versículo detalha uma limpeza ou
purificação espiritual envolve: Foge, outrossim, das paixões da
mocidade. Segue a justiça, a fé, o amor e a paz com os que, de
coração puro, invocam o Senhor. Timóteo deveria “fugir” (
, feugō115) de alguma coisa. Ele não deveria acostumar-se a
aceitar tal coisa; não deveria negociar; deveria fugir. Deveria
“buscar segurança na fuga”116 - como fez José, quando fugiu da
esposa de Potifar (Gênesis 39:12), como fizeram os filhos de
Israel, quando fugiram da ira de Faraó (Êxodo 12-15), e como
109
Bauer, p. 303; Vine, Unger e White Jr., p. 498.
110
Alguns sugerem que ekkathairo inclui separação de “utensílios para desonra”. A outra única ocorrência desse
termo é em 1 Coríntios 5:7, que fala de excluir da comunhão um irmão não arrependido. Alguns concluem, então,
que algo desse tipo estava na mente de Paulo aqui. Todavia, 2:21 está centrado na autodisciplina, e não na
disciplina da igreja.
111
Uma flexão de hagiazo é traduzida por “santificado” em 1 Timóteo 4:5.
112
John R. W. Stott, A Mensagem de 1 Timóteo. Série A Bíblia Fala Hoje. Trad. Milton A. Andrade. São Paulo: ABU,
2004, p. 32.
113
Vine, Unger e White Jr., p. 1046.
114
Bauer, p. 417.
115
Feugo também pe traduzido por “fugir” numa frase semelhante em 1 Timóteo 6:11.
116
Bauer, p. 1052.
34
fizeram José e Maria ao fugirem de Herodes indo para o Egito
(Mateus 2:19-21). Não deveriam ser como Sansão, que flertava com
maus desejos em vez de fugir deles. Suas ações lhe custaram a
força, a visão e, finalmente, a vida (Juízes 13-16). “Saber
quando correr é tão importante na batalha espiritual, como saber
quando e como lutar.”117
Especificamente, Timóteo deveria “fugir das paixões da
mocidade”. “Paixões” traduz (epithumia), que denota desejos
fortes118. A palavra é geralmente usada – como neste caso - num
sentido mau.
Timóteo não só deveria fugir de algumas coisas, mas também
deveria fugir para algumas coisas: “Segue a justiça, a fé, o
amor e a paz” (2:22b). “Segue” traduz uma flexão do verbo
(diōkō), que significa “seguir apressadamente”119. A palavra foi
usada de forma semelhante na lista de virtudes em 1 Timóteo
6:11. Três qualidades são citadas em 1 Timóteo 6:11 e 2 Timóteo
2:22: justiça, fé e amor. “Justiça” ( , dikaiosune) é “a
conduta correta”120, “fé” ( , pistis) é “a confiança humilde em
Deus”, e “amor” ( , agapē) é “a afeição por todos, buscando
o melhor para todos”121.
Timóteo também deveria ”seguir... a paz”. “Paz” (
, eirēnē) é “um estado de concordância, paz, harmonia” 122. Pode
ser paz com Deus, paz com o próximo ou paz interior consigo
mesmo. Talvez a inclusão desse item aqui tenha a ver com a
ênfase de Paulo em evitar contendas (veja 2:23).
Fugir do que é mau e seguir o que é bom pode ser difícil,
se tentarmos proceder assim sozinhos. Por isso, Paulo
acrescentou: “com os que, de coração puro, invocam o Senhor”
(2:22c). A palavra traduzida por “invocam”, (epikaleō),
formada de (epi, “sobre”) e (kaleō, “chamar”), refere-se a
invocar a Deus em oração “para algum propósito”123. Paulo estava
falando de pessoas que confiavam em Deus e dependiam
dEle. Epikaleō, em especial, envolve invocá-lo “mediante
adoração”124 - isto é, invocar o Seu nome em adoração e louvor.
Timóteo deveria seguir todas as coisas boas “com” outras
pessoas boas. Deus não esperava que ele agisse sozinho. Ele
deveria encontrar alegria e força na comunhão cristã, com os
que, “de coração puro”, invocam a Deus. “Puro” ( , katharos)
está relacionado com a palavra traduzida por “purificar”
(ekkathairō) no versículo 21. Timóteo foi instruído não somente
117
Barton, Veerman e Wilson, p. 199.
118
Outro uso da palavra epithumia ocorre em 1 Timóteo 6:9 (“concupiscências”); Tito 2:12 e 3:3 (“paixões”).
119
Bauer, p. 254.
120
Uma flexão dessa palavra é traduzida por “justo” em 1 Timóteo 1:9.
121
Sobre “fé” e “amor”, veja 1 Timóteo 1:5.
122
Bauer, p. 287. A outra única ocorrência de “paz” nas três cartas é nas saudações iniciais de cada uma.
123
Ibid., p. 373.
124
Vine, Unger e White Jr., p. 463.
35
a se purificar, mas também a interagir com outros que haviam se
purificado.
O SERVO DO SENHOR
(2:23–26)
O Que Evitar (2:23, 24a)
125
O mesmo termo aparece em 1 Timóteo 4:7 (“rejeita”) e em Tito 3:10 ( “evita”).
126
Hendriksen, p. 338.
127
Vine, Unger e White Jr., p. 759 . Moros também aparece em Tito 3:9.
128
Bauer, p. 96.
129
Esse ditado é identificado como um “provérbio árabe” em Isabel Burton, The Life of Captain Sir Richd. F.
Burton, vol. 1. Londres: Chapman & Hall, 1893, p. 548.
36
nos intrigar. Temos muitas perguntas para as quais gostaríamos
de ter respostas. No entanto, devemos entender que quando saímos
do campo da revelação, entramos no campo da especulação. Nesse
território, não há autoridade objetiva; a opinião de uma pessoa
é (teoricamente, pelo menos) tão boa quanto a de
outra. Discórdias e até brigas são inevitáveis. Não é errado
questionar a respeito de “coisas encobertas” e talvez até propor
um ou dois palpites, mas insistir nessas questões e discutir com
os outros sobre elas é (usando as palavras de Paulo) insensato e
indica superficialidade mental.
A preocupação imediata de Paulo com essas questões era que
elas só engendram contendas [de , mache]. Contendas envolve
“brigas... debates”130.
Versículo 24a. A menção de contendas leva à explicação
sobre os atos corretos do servo do Senhor. Paulo começou
dizendo: Ora, é necessário que o servo do Senhor não viva a
contender. “Servo” ( , doulos) é “aquele que é comprometido
unicamente com outro”131. Doulos é a palavra comumente usada
para um “escravo”, mas muitas traduções optaram pelo termo
“servo”. Em relação ao indivíduo em questão, seu “único
compromisso” era com o Senhor. Não há chamado maior do que ser
um “servo do Senhor” (veja Deuteronômio 34:5) 132. Os versículos
24 a 26 descrevem o que é “necessário” que o servo do Senhor
faça ou não faça. “Necessário” traduz (dei), “uma palavra
chave na ética cristã”133. De acordo com 2:24, a primeira coisa
que o servo do Senhor não deve fazer é “viver a contender” (
, machomai), termo derivado de “contenda” (mache), termo citado
no versículo anterior. Significa “envolver-se em debates
acalorados, sem [o] uso de armas [físicas]” . Contendas ou
134
24b e sim deve ser brando para com todos, apto para instruir,
paciente, 25 disciplinando com mansidão os que se opõem, na
expectativa de que Deus lhes conceda não só o arrependimento
para conhecerem plenamente a verdade, 26 mas também o retorno à
sensatez, livrando-se eles dos laços do diabo, tendo sido feitos
cativos por ele para cumprirem a sua vontade.
130
Bauer, p. 622.
131
Ibid., p. 260.
132
Muitos escritores chamam a atenção para as passagens sobre o Servo Sofredor (Jesus) no livro de
Isaías (52:13—53:12).
133
Carl Spain, The Letters of Paul to Timothy and Titus, The Living Word Commentary. Austin, Tex.: R. B. Sweet Co.,
1970, p. 137. Compare o uso de dei nas qualificações dos presbíteros (1 Timóteo 3:2).
134
Bauer, p. 622.
37
a irmandade, especialmente com os que se opõem a ele e com os
que estão cometendo erros.
Aquele que serve ao Senhor deve ser brando para com
todos. “Brando” é o equivalente de (ēpios), uma palavra de
difícil tradução. É traduzido por “manso” (ERC) e “amável”
(NVI); sendo “usado frequentemente pelos escritores gregos para
caracterizar a atitude de uma ama com crianças irritadiças ou de
um professor com alunos refratários, ou para aludir a pais em
relação aos seus filhos”135. O servo do Senhor deve ser “afável,
de fácil diálogo, de conduta acessível, não irritável, [nem]
intolerante, [nem] sarcástico, nem burlesco, nem mesmo para com
os que o prejudicam”136.
A passagem instrui a ser “brando para com todos”. Não é uma
ordem simples; é mais fácil ser brando ou amável com algumas
pessoas do que com outras. No entanto, devemos ser amáveis com
quem gostamos e com quem não gostamos. Devemos ser amáveis com
os amigos e com os inimigos. Devemos ser amáveis com as pessoas
próximas a nós e com os estranhos. “Ser amável para com todos”
(grifo meu; NVI).
O próximo requisito é uma repetição de uma das
qualificações dos presbíteros: aptos para instruir . Se um137
homem não sabe instruir ou ensinar, ele não deve ficar à frente
de uma classe ou no púlpito. Essa habilidade é um resultado
natural de um obreiro que aprendeu a manejar bem a palavra da
verdade (veja 2:15).
Paulo citou a seguir paciente. O texto original não contém
um termo grego comum equivalente a “paciente”, mas sim uma
palavra composta, (anexikakos), que significa “suportar
pacientemente [sob] o mal”. É formada de (ana, ”para cima”),
(echo, ”suportar”) e (kakos,”mal”)138. Refere-se a “suportar o
mal sem ressentimento”, sendo “paciente” e “tolerante”139. Essa é
outra ordenança mais fácil de ser dita do que obedecida. Quando
injustiçados, queremos atacar, ferir os outros como eles nos
feriram; mas Paulo instruiu a sermos “pacientes” quando
injustiçados.
Versículo 25. Paulo tratou diretamente do que Timóteo
deveria fazer em relação aos falsos mestres e seus
seguidores. Ele deveria evitar discussões que engendravam
contendas, mas ele não deveria ignorar os indivíduos
envolvidos. Paulo escreveu: disciplinando com mansidão os que se
opõem. “Os que se opõem” é uma tradução de (antidiatithēmi)
– um verbo composto por (anti, “contra”), intensificado pela
preposição (dia) mais (tithemi, “colocar”), que significa
135
Vine, Unger e White Jr., p. 797. Em 1 Tessalonicenses 2:7, epios é traduzido por “carinhosos”.
136
Hendriksen, p. 339.
137
Veja 1 Timóteo 3:2.
138
Vine, Unger e White Jr., p. 1007.
139
Bauer, p. 77.
38
“colocar-se em oposição”140. O texto não informa se esses falsos
mestres opunham-se a Paulo e/ou a Timóteo, mas isso não
importa141. De uma forma ou outra, estavam se opondo à verdade.
Timóteo deveria “disciplinar” os que se opunham.
“Disciplinar” traduz (paideuō), cuja raiz é um equivalente a
“criança” ( , pais)142. Ele deveria corrigir o erro assim como
uma mãe amorosa e dedicada corrige seu filho. Deveria informar
os desinformados, instruir os não instruídos, educar os
ignorantes e disciplinar os indisciplinados143.
Isto deveria ser feito “com mansidão”. “Mansidão” traduz
outro termo quase intraduzível: (prautes)144. “Mansidão” não é
um traço de fraqueza. Jesus era “manso” (Mateus 11:29), mas não
era fraco. “Ele tinha os recursos infinitos de Deus à Sua
disposição.”145 Gary W. Demarest chamou prautēs de “o uso
silencioso da força”146. A ideia pode ser ilustrada pela imagem
de um homem grande e musculoso embalando o filho recém-nascido
nos braços. Toda a sua força está focada em proteger aquele
bebê.
Por que Timóteo devia se preocupar em disciplinar com
mansidão os que se opusessem? Porque Paulo não determinou que a
oposição deles seria permanente e inflexível. Ele disse: na
expectativa de que Deus lhes conceda não só o arrependimento
para conhecerem plenamente a verdade. Deus quer que os perdidos
cheguem ao “conhecimento da verdade” porque só a verdade pode
libertá-los das armadilhas do pecado (veja João 8:32; 17:17).
Esta é a única ocorrência da palavra “arrependimento” nas
cartas a Timóteo e Tito147. “Arrependimento” traduz (metanoia),
um termo composto por (meta, “depois”) e (nous, “mente”). É
“uma mudança de opinião”148. Quando usado em referência a um
pecador, denota mudança de atitude em relação ao pecado gerada
pela tristeza segundo Deus (2 Coríntios 7:10) e seguida por uma
mudança de vida (Atos 3:19). “Na expectativa de” indica que o
arrependimento não é garantido, mas nem por isso, impossível.
A frase “Deus lhes conceda... o arrependimento” não sugere
que Deus force um pecador a se arrepender, independentemente da
vontade deste. Essa declaração reflete a verdade bíblica de que
“todo dom perfeito [é] lá do alto” (Tiago 1:17). Até o
arrependimento pode ser considerado um “dom... lá do alto”. Deus
deu a Paulo e a Timóteo a mensagem que deveriam usar para
140
Vine, Unger e White Jr., p. 944.
141
As pessoas que insistem no erro são as piores inimigas de si mesmas.
142
Tito 2:12 verte paideuo por “educar”.
143
Adaptado de Hendriksen, p. 339.
144
Prautes é traduzido também por mansidão em 1 Timóteo 6:11 e Tito 3:2 usa a expressão “dando provas de toda
cortesia para com todos os homens”.
145
Vine, Uner e White Jr., p. 772.
146
Gary W. Demarest, 1, 2 Thessalonians, 1, 2 Timothy, Titus, The Communicator’s Commentary, vol. 9; Waco, Tex.:
Word Books, 1984, p. 270.
147
O verbo “arrepender-se” não ocorre nessas cartas.
148
Vine, Unger e White Jr., p. 525; Bauer, p. 640.
39
disciplinar ou corrigir os que estivessem difundindo doutrinas
erradas (2 Timóteo 2:15). A Palavra divinamente inspirada fala
da “bondade de Deus” que “conduz [os homens] ao arrependimento”
(Romanos 2:4). Além disso, Deus concede ao pecador tempo para se
arrepender. Todos estes itens são dons do Senhor porque Ele
deseja que “nenhum pereça, mas que todos cheguem ao
arrependimento” (2 Pedro 3:9).
Versículo 26. Paulo acrescentou mais motivos para
disciplinar ou corrigir os que se opusessem. Primeiramente, o
apóstolo disse que poderia haver um retorno à sensatez, da parte
dos oponentes. O termo traduzido por “retorno à sensatez”,
(ananēfō), é constituído de (ana, “de volta” ou “outra vez”)
e do verbo ( , “estar sóbrio, ser cauteloso”) e significa
literalmente “voltar à sobriedade”. Muitos dos que deram ouvidos
aos falsos mestres estavam “intoxicados com o erro”149. Como um
bêbado atrapalhado e cambaleante, eles ficaram confusos com o
pseudoconhecimento (1 Timóteo 6:20). Espiritualmente, começaram
a pender para um lado e para outro, mesmo quando achavam que
estavam andando em linha reta - o tempo todo inconscientes de
seu estado lamentável. Pela graça de Deus, ainda era
possível que “retornassem à sensatez”, assim como o filho
pródigo que, “caindo em si” (Lucas 15:17), voltou para o pai.
Paulo continuou: livrando-se eles dos laços do diabo, tendo
sido feitos cativos por ele para cumprirem a sua vontade. Os
“laços” são uma armadilha para os desavisados150. O diabo tem
muitas armadilhas, e ele personaliza cada uma delas como a isca
mais atraente para sua vítima. O caçador usa um alimento
especial para atrair um animal, e um pescador usa minhocas para
pescar. Semelhantemente, o diabo adequa a sua isca a cada um de
nós. Para alguns, ele usa dinheiro ou bens. Para outros, ele usa
fama, popularidade, orgulho ou paixão sexual. Tiago escreveu que
“cada um é tentado pela sua própria cobiça” (Tiago 1:14; grifo
meu) - seus desejos individuais e particulares. Não devemos
ignorar esse importante contraste: Deus quer dar um presente aos
pecadores (arrependimento), enquanto o diabo quer pegá-los em
uma armadilha!
“Tendo sido feitos cativos por ele para cumprirem a sua
vontade” deriva de uma palavra grega interessante ( ,
zōgreō), formada de (zoos, “vivo”) e (agreuō, “caçar” ou
“capturar”)151. Literalmente, a ideia é “capturar a presa
viva”152. “Satanás não quer, nem tem, nenhum cativo morto” 153;
pelo contrário, ele quer escravos vivos. A outra única
ocorrência de zogreo no Novo Testamento se dá em Lucas 5:10,
onde Jesus disse a Pedro: “Doravante serás pescador de homens
149
Vine, Unger e White Jr., p. 10028.
150
“Laços” traduz (pagis), também usado em 1 Timóteo 3:7 e 6:9.
151
Vine, Unger e White Jr., p. 456.
152
Bauer, pp. 429-30.
153
Don DeWelt, Paul’s Letters to Timothy and Titus, Bible Study Textbook. Joplin, Mo.: College Press, 1961, p. 232.
40
[vivos]”. Aqui está outro contraste: os cristãos tentam capturar
homens e mulheres vivos para salvar suas almas, enquanto o diabo
e seus agentes tentam capturá-los vivos para condenar suas almas
para sempre.
A declaração final do capítulo 2 é ambígua, especialmente a
última frase: “para cumprirem a sua vontade”. “Sua” é uma
tradução de (ekeinos), um pronome que significa
“esse/essa”, relativo a alguém mencionado anteriormente. Há quem
releia o versículo 25 e acredite que as duas últimas frases do
versículo 26 estão falando de Deus: “tendo sido feitos cativos
[vivos] por ele [Deus] para cumprirem a sua [de Deus] vontade”.
Muitos acreditam que “ele” seja uma referência ao diabo, mas que
“sua” se refira a Deus: “tendo sido feitos cativos [vivos] por
ele [o diabo] para cumprirem a sua [de Deus] vontade”. A maneira
mais simples e mais natural de se ler essa frase é entender que
“ele” e “sua” são pronomes relativos ao diabo: “...tendo sido
feitos cativos por ele [o diabo] para cumprirem a sua [do diabo]
vontade”. Todas as três interpretações fazem sentido, e nenhuma
viola outra passagem; de maneira que faz pouca diferença qual
seja usada.
Embora alguns detalhes dos versículos 24 a 26 sejam
ambíguos, a mensagem geral é clara: o homem de Deus não deve
andar brigando [NTLH]. Ele evita brigas inúteis e trata as
pessoas com mansidão e respeito.
O retrato paulino do homem de Deus está agora completo.
Diante de tão grande desafio, não nos surpreende que este
capítulo tenha começado com a incumbência para “fortificar-se na
graça que está em Cristo Jesus”.
APLICAÇÃO
Somos Aprovados por Deus? (2:14–19)
Vejamos algumas perguntas que devemos fazer a nós
mesmos: “Que tipo de obreiro/trabalhador eu sou?”; “Eu conheço a
Palavra de Deus?”; “Estou apto para responder perguntas sobre a
Bíblia?”; “Estou vivendo em conformidade com os padrões da
Palavra, ou tenho me deixado influenciar demais pelos padrões do
mundo?”. O mais importante é perguntarmos a nós mesmos se somos
aprovados por Deus. É tentador esforçar-se para ser aprovado
pelas pessoas que nos cercam.
Podemos encerrar estas perguntas com a oração: “Ó Deus,
ajuda-nos a aprender, a viver e a amar a Sua Palavra para termos
a Tua aprovação. Ansiamos por ouvir-te dizer: ‘Muito bem, servo
bom e fiel’. Em nome do nosso Salvador, Amém”.
41
também pode ser usada incorretamente. Leva tempo e paciência
para aprender a usar uma ferramenta de forma correta e com
eficácia. O mesmo se aplica às Escrituras. Ler alguns versículos
na hora de dormir ou folhear rapidamente alguns capítulos não
transforma ninguém num “obreiro que maneja bem” a Palavra.
Devemos ler, estudar e meditar continuamente na Palavra de Deus
(lembrando-nos de fazê-lo em oração)155. Timóteo aprendeu a
Palavra de Deus primeiramente por intermédio de sua mãe e avó e
depois por Paulo, que foi seu mestre e mentor por quinze
anos. Ainda assim, Paulo insistiu para que ele conhecesse cada
vez mais a Palavra. Não importa o quanto sabemos, sempre há mais
para aprender. Jamais devemos parar de estudar!
155
É importante ter a atitude correta em relação à Palavra enquanto estudamos (veja 3:16).
156
Barclay, p. 180.
42
A Segunda Carta de Paulo a Timóteo
157
Walter Bauer, A Greek-English Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature, 3a ed., rev. e
ed. Frederick William Danker. Chicago: University of Chicago Press, 2000, pp. 1075–76.
43
(Phillips). Seriam dias difíceis de enfrentar, de viver e de
suportar158.
Quando ouvimos a locução “tempos difíceis”, talvez nossos
pensamentos migrem para dias em que não tínhamos dinheiro ou boa
saúde; mas Paulo não tinha em vista dificuldades financeiras nem
físicas. O foco era problemas morais e espirituais.
Sobreviriam tempos difíceis “nos últimos dias”. Alguns
estão convencidos de que “os últimos dias” serão o período
anterior à volta de Cristo. No entanto, Paulo estava falando de
toda a era cristã, “o último período da história do homem” 159. No
dia de Pentecostes, Pedro citou Joel 2: “E acontecerá nos
últimos dias, diz o Senhor, que derramarei do Meu Espírito sobre
toda a carne” (Atos 2:17; grifo meu). Ele enfatizou: “o que
ocorre [o derramamento do Espírito sobre os apóstolos] é o que
foi dito por intermédio do profeta Joel” (Atos 2:16; grifo meu).
Hebreus 1:2 diz: “Nestes últimos dias, [Deus] nos falou pelo
Filho” (grifo meu). É evidente no próprio texto que Paulo não
limitou suas observações a um período distante no futuro. Depois
de descrever como agiriam os homens nos tempos difíceis em 2
Timóteo 3:2-5a, Paulo usou o tempo presente: “Foge também
destes. Pois entre estes se encontram os que penetram
sorrateiramente nas casas” (2 Timóteo 3:5b, 6a; grifo meu). Os
tempos difíceis descritos por Paulo eram bem reais para ele. E
se estenderiam pela vida de Timóteo. Também são evidentes em
nossos dias e ainda o serão quando Cristo voltar160.
Versículo 2. O longo parágrafo de Paulo (3:1-5) contém a
conjunção pois ( , gar) - “que indica causa ou razão”. Ele
estava pronto para detalhar por que os tempos difíceis seriam
tão difíceis.
Comentaristas destacam semelhanças entre a lista de pecados
de 2 Timóteo 3:2-5 e a de Romanos 1, mas também há
diferenças. Romanos 1 descreve o mundo gentio pecaminoso antes
da vinda de Cristo. Segundo Timóteo 3 dá um esboço resumido do
mundo de Paulo, mas (como veremos) a principal preocupação era
com o mundanismo e a impiedade na igreja.
Segundo Timóteo 3:1–5 é, sem dúvida, um “parágrafo
obscuro”161. Wayne Jackson chamou-o de “O Rol da Vergonha” e
depois disse: “É um dos catálogos das condutas mais desprezíveis
das quais o homem é capaz”162. O texto enumera pelo menos dezoito
características negativas de pessoas em “tempos difíceis”.
158
Adaptado de Ronald A. Ward, Commentary on 1 & 2 Timothy & Titus . Waco, Tex.: Word Books, 1974, p. 186.
159
David Lipscomb e J. W. Shepherd, A Commentary on the New Testament Epistles, vol. 5. Nashville: Gospel Ad-
vocate Co., 1942, p. 226.
160
Alguns observam que “tempos” (do plural de , kairos) pode ser traduzido por “estações” e concluem que Paulo
estava dizendo que dias ruins vêm e vão. É verdade que a situação às vezes parece piorar e varia de local para
local; mas, para todos os efeitos práticos, os “tempos difíceis” vieram para ficar.
161
H. C. G. Moule, Studies in II Timothy, Kregel Popular Commentary Series. Grand Rapids, Mich.: Kregel Publica-
tions, 1977, p. 105.
162
Wayne Jackson, Before I Die: Paul’s Letters to Timothy and Titus. Stockton, Calif.: Christian Courier Publications,
2007, p. 254.
44
A lista não apresenta uma sequência organizada, mas pode
ser útil identificar alguns aspectos. Por exemplo, observemos
como a lista começa: “os homens163 serão egoístas”. O fio
condutor que percorre a lista é o egoísmo ou o egocentrismo.
Além disso, devemos notar o uso da palavra “amor”. A lista
começa no texto original com “amantes de si mesmos” (ERC) e
termina com “amantes do prazer e não amantes de Deus”
(3:4). Muitas ações desprezíveis são enumeradas, mas o âmago de
todos os problemas é um problema de coração.
Podemos notar, então, que cerca de metade das
características começa com o que a gramática grega chama de
“alfa privativo”. Ou seja, as palavras derivam de raízes
positivas, mas são acrescidas do prefixo de negação alfa ( , a)
(semelhante ao nosso “a” em “anormal”)164. Uma maneira de resumir
o caráter dos indivíduos retratados é pensar em tudo que é bom,
santo e puro e, então, concluir: “Eles não eram assim”.
Examinemos cada item individualmente mantendo esses
aspectos em mente. Investigar a lista não vai ser uma
experiência divertida, mas estaremos mais protegidos se
entendermos o que Deus considera errado e o por quê disso.
Convém uma última observação antes de iniciarmos esse
exame: ao analisarmos cada ação, seremos tentados a restringir a
aplicação ao mundo ao nosso redor; todavia, para que este
exercício seja valoroso, precisamos usá-lo para examinar nossas
próprias vidas. A maioria de nós é mais influenciada pelo mundo
e seus valores do que gostaríamos de admitir.
Amar a si próprio. Todas as expressões relativas aos
“amantes” empregam palavras compostas que incluem a palavra para
“amor”, (filia)165. Esse era o tipo mais comum de “amor”
mencionado na literatura grega e tem a ver com afeição por
alguém ou algo166. Egoístas ou “amantes de si mesmos” (ERC) vêm
de (filautos), que é uma combinação de (filia, “amor”)
e (autos , “ego”). Num sentido, devemos nos “amar” (Mateus
22:39167) - isto é, devemos cuidar uns dos outros (Efésios 5:28,
29). No entanto, esse nunca deve ser o foco principal de nossas
vidas. Jesus disse que, para segui-lO, é preciso “negar a si
mesmo” (Mateus 16:24).
Amar o dinheiro. A palavra grega para os avarentos, ou
amantes do dinheiro, (hilarguros), une (filia, “amor”) a
(arguros, “prata” ou “dinheiro”) . Aquele que ama a si mesmo
168
163
“Homens” traduz o termo genérico (anthropos), que inclui todos, tanto homens como mulheres.
164
Walter L. Liefeld, 1 & 2 Timothy, Titus, The NIV Application Commentary. Grand Rapids, Mich.: Zondervan, 1999,
p. 270.
165
Philia também compõe a palavra grega traduzida por “inimigos do bem” (3:3; “sem amor para com os bons”,
ERC).
166
Os tipos de amor são comentados com profundidade em David L. Roper, Amor- Um Caso Sério. A Verdade para
Hoje. Disponível no site www.biblecourses.com/Portuguese.
167
“Amar” em Mateus 22:39 é o verbo (agapaō). O substantivo correlato, (agape), aparece em 1
Timóteo 1:5.
168
Os fariseus são exemplos de amantes de dinheiro (Lucas 16:14).
45
amará naturalmente aquilo que pode assegurar tudo o que seu
coração deseja. Anteriormente, vimos uma passagem sobre os
perigos de amar o dinheiro: 1 Timóteo 6:9, 10. Nesse texto,
Paulo observou que “o amor do dinheiro é raiz de todos os
males”.
Os falsos mestres em Éfeso nunca estavam fora dos
pensamentos de Paulo ao redigir a carta. Eles eram amantes de si
mesmos e tinham pouca consideração pelos danos espirituais que
estavam causando. A única preocupação deles era com o que era
melhor para eles. Também eram “avarentos” ou amantes do
dinheiro, convictos de que “a piedade é fonte de lucro” (1
Timóteo 6:5).
“Jactanciosos”. Jactanciosos traduz (alazon), derivado
de (alē, “vagar”) . Originalmente, alazon era um charlatão
169
169
W. E. Vine, Merrill F. Unger e William White Jr., Dicionário Vine. 7a. ed. Trad. Luís Aron de Macedo. Rio de
Janeiro: CPAD, 2007, p. 725.
170
William Barclay, The Letters to Timothy, Titus, and Philemon, rev. ed., The Daily Study Bible. Filadelfia:
Westminster Press, 1975, p. 185.
171
Bauer, p. 41.
172
Joseph Henry Thayer, Greek-English Lexicon of the New Testament. Grand Rapids, Mich.: Zondervan Publishing
House, 1962, p. 25.
173
Vine, Unger e White Jr., p. 996.
174
A mesma tradução é usada em 1 Timóteo 1:13.
46
também. Dizem que “o lar é a pedra angular da sociedade; se
desmoronar, a nação cai”.
Este agrupamento começa com desobedientes aos pais.
“Desobedientes”, (apeithēs), é a primeira das palavras alfa-
privativas (negadas pelo prefixo “a”): (peithō, “persuadir”),
acrescida do prefixo (a). Descreve alguém “pouco disposto a
ser persuadido, [numa] convicção rejeitada com desprezo,
desobediente”175.
O quinto mandamento dado a Israel por intermédio de Moisés
era: “Honra a teu pai e a tua mãe” (Êxodo 20:12). “Honrar os
pais significa falar bem deles e falar educadamente com eles.
Isto... significa agir de uma forma que demonstre cortesia e
respeito. Significa seguir o ensinamento e exemplo deles de
colocar Deus em primeiro lugar”176.
Estava inclusa uma preocupação com o bem-estar deles
(Mateus 15:1–9; 1 Timóteo 5:8). Ninguém era condenado mais
severamente por Deus do que aqueles que não obedeciam a essa
ordem. Debaixo da lei de Moisés, o filho teimoso e rebelde devia
ser apedrejado até a morte (Deuteronômio 21:18-20). O mandamento
de honrar os pais se repete no Novo Testamento (Efésios 6:1-
3). Algumas das mais fortes denúncias de Jesus e Seus apóstolos
foram contra os que falhavam nesse aspecto (Mateus 15:1–9; 1
Timóteo 5:8).
Um grande problema no mundo atual é a desobediência aos
pais. Mike Hixson perguntou: “Se os filhos não aprenderem a
importância da obediência no lar, por que pensaríamos que serão
submissos na escola, no trabalho (Colossenses 3:22-23), às
autoridades civis (Romanos 13:1-7), ou aos presbíteros da igreja
(Hebreus 13:17)?”177
“Ingratos”. Ingratos traduz outro alfa-privativo:
(acharistos). Neste caso, (charis, “agradecido”) é negado por
(a). Em relação a esta palavra, podemos fazer uma aplicação
geral. Paulo disse aos tessalonicenses: “Em tudo dai graças” (1
Tessalonicenses 5:18). No entanto, neste contexto, Paulo
provavelmente tinha em vista especialmente o pecado de ser
ingrato para com os pais. William Shakespeare escreveu: “Mais
incisivo do que o dente de uma serpente é ter um filho
ingrato!”178 William Barclay observou: “É o sinal de uma
civilização extremamente decadente”179.
“Irreverentes.” Da mesma forma, irreverentes ( ,
anosios) traduz uma palavra equivalente a “santo” ( , hosios)
negada por (a)180. Novamente, podemos fazer uma aplicação
175
Vine, Unger e White Jr., p. 552.
176
Bruce B. Barton, David R. Veerman e Neil Wilson, 1 Timothy, 2 Timothy, Titus, Life Application Bible Commentary.
Wheaton, Ill.: Tyndale House Publishers, 1993, p. 205.
177
Mike Hixson, “Perilous Times Shall Come (II Tim. 3:1)”, Spiritual Sword 44, no. 3. Abril de 2013, p. 17.
178
William Shakespeare, Rei Lear I.4.
179
Barclay, p. 187.
180
Anosios também é traduzido por “profano” em 1 Timóteo 1:9, indicando oposição a Deus ou àquilo que é
sagrado.
47
geral. Muitos hoje perderam o respeito por Deus, por Cristo e
pela Bíblia. No entanto, hosios “foi por vezes usado no grego
clássico para o respeito filial [respeito de um filho ou filha
pelos pais]. O contexto sugere que essa pode ser a alusão
aqui”181. Via de regra, quando os filhos não respeitam os pais,
tendem a viver vidas pecaminosas.
Versículo 3. “Desafeiçoados.” A próxima característica
está, definitivamente, relacionada ao tema da
família: desafeiçoados ( , astorgos), formada por uma das
palavras gregas para “amor” negada por (a). O termo usado não é
o amor filia ( ) nem o amor agapē ( ), mas o amor
storgē ( ), que só aparece no Novo Testamento em palavras
compostas. Ele aparece na forma negativa aqui e em Romanos 1:31,
onde é traduzido por “sem afeição natural” e na forma positiva
em Romanos 12:10, que diz “preferindo-vos”. Storgē refere-se ao
amor ou lealdade com base em um relacionamento mais íntimo. Este
tipo de amor não se baseia num compromisso assumido (agapē) nem
decorre do objeto amado ser agradável (filia); ele simplesmente
é consequência da relação de parentesco182.
Storgē é um tipo de amor natural. É natural que os pais
amem seus filhos e que os filhos amem seus pais. É contrário à
natureza que isto não aconteça.
“Implacáveis.” Voltamos agora a uma enumeração mais geral
de qualidades atrozes. Todas, exceto uma, são alfa-privativas.
Em primeiro lugar, neste grupo, consta implacáveis ( ,
aspondos), cuja história é interessante. Formado de (sponde,
“libação”) negado por (a), significa literalmente “sem
libação”. Referia-se a “sem trégua”, visto que “uma libação
acompanhava o feitio de tratados e pactos”183. Por fim, passou a
ser usado para aquele “que... não se dispõe a negociar uma
solução para um problema envolvendo uma segunda pessoa“184. Esse
indivíduo está cheio de amargura e raiva tão intensas que se
recusa a sentar-se com o adversário para resolverem juntos seus
problemas.
A NVI e a ACF dizem “irreconciliáveis” e a NVT diz “não
perdoarão”. Esses indivíduos não conseguem liberar
perdão. Nenhuma afirmação é mais arrepiante do que “eu jamais
te perdoarei!” Quem se sente assim ou se esqueceu ou optou por
ignorar o fato de Jesus ter dito que se não perdoarmos aos
nossos semelhantes, Deus não nos perdoará (Mateus 6:15). A NTLH
diz “serão duros”.
Aspondos também era às vezes usado num sentido secundário
para quem descumpria o que havia sido acordado. Quer entendamos
aspondos como alguém que se recusa a negociar uma trégua ou como
181
John R. W. Stott, Guard the Gospel: The Message of 2 Timothy, The Bible Speaks Today. Downers Grove, Ill.:
InterVarsity Press, 1973, p. 85.
182
Roper, ibid.
183
Vine, Unger e White Jr., p. 724.
184
Bauer, p. 144.
48
alguém que descumpre um acordo de trégua, Paulo estava dizendo:
“Não seja assim!”
“Caluniadores.” Já encontramos o próximo comportamento nos
estudos anteriores sobre 1 Timóteo: os caluniadores (de ,
diabolos)185. A calúnia está intimamente ligada à atitude de um
“implacável” ou “irreconciliável”, citada no versículo
anterior. Diabolos (geralmente traduz “diabo”) é uma das
designações de Satanás. Enquanto espalham suas mentiras, os
assassinos verbais estão fazendo o trabalho do diabo.
“Sem domínio de si”. O próximo item é sem domínio de si,
tradução de (akratēs), composto por (kratos, “força”) e o
elemento de negação (a)186. “Quando usado numa lista de pecados
como esta, akratēs não se refere a questões relativamente
inofensivas como dieta alimentar, mas a questões relativas a
fraqueza moral”187. Estes indivíduos são completa e
descaradamente imorais, não fazendo nenhum esforço para
controlar suas paixões. Esse apelo mundano para dar asas aos
impulsos naturais é típico em certas propagandas midiáticas. O
fato é que seres humanos, diferentemente de animais irracionais,
são providos de uma mente que os capacita a conter seus
instintos.
“Cruéis.” Por falar em animais, a próxima característica
é cruéis. O termo deriva de (anēmeros), uma descrição mais
adequada para animais selvagens do que para seres humanos. A
palavra é formada da negação de (hēmeros, “manso” ou
“domesticado”) com o prefixo (uma). Significa “não
domesticado, selvagem”188 e retrata pessoas que vivem num sentido
como um animal. Barclay disse que anemeros “denota uma
selvageria que não tem sensibilidade nem compaixão” . Depois de
189
185
Diabolos é a palavra vertida para “maldizentes” em 1 Timóteo 3:11.
186
Vine, Unger e White Jr., p. 708.
187
Liefeld, p. 270.
188
Vine, Unger e White Jr., p. 522.
189
Barclay, p. 190.
190
Vine, Unger e White Jr., 395.
191
Na NTLH, Tito 1:8 traduz por “amar o bem”.
49
bom. Eles se opõem a qualquer coisa que os obrigue a se comparar
com os padrões de Deus. Entre outras coisas, odeiam os
cristãos, odeiam a Bíblia e odeiam a igreja.
Versículo 4. Temos um último agrupamento dos pecados graves
cometidos nos últimos dias. Paulo disse que os homens seriam
“traidores, atrevidos, enfatuados, mais amigos dos prazeres que
amigos de Deus”.
“Traidores.” O primeiro termo deste último agrupamento
é traidores, (prodotēs). Está relacionado a (paradidōmi),
uma palavra que significa “entregar”, isto é, trair alguém,
entregando-o às autoridades192. Prodotēs pode ser traduzido por
“traidor”193 e foi usado para Judas Iscariotes (Lucas 6:16). Nos
dias de Paulo, o termo se aplicava especialmente aos que
entregavam cristãos às autoridades romanas. Hoje, pode ser
qualquer pessoa que não seja confiável - indivíduos que fazem de
tudo para prosperar.
“Atrevidos”. Atrevidos traduz (propetēs), formado de
(pro, “para frente”) e (piptō, “cair”), literalmente, “cair
para frente”194 ou “cair de cabeça”195. Figuradamente, traz à
mente aqueles que se apressam em agir sem realmente pensar (e
com pouca preocupação com) nas consequências, especialmente como
outros serão afetados. O léxico de Walter Bauer
define propetēs como “impetuoso, apressado, atrevido,
imprudente, inconsequente”196. Além de falar e agir sem pensar,
essas pessoas são teimosas. Ninguém pode contrariá-las.
“Enfatuados.” Chegando ao fim da lista, voltamos ao pecado
central do egocentrismo presente nos enfatuados (
, tufoō ),
197
orgulhosos e altivos. A NTLH diz “cheios de
orgulho”. Essas pessoas tinham uma visão geral exagerada de sua
inteligência, aparência e importância. Tiago escreveu: “Deus
resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Tiago 4:6).
Amantes mais dos prazeres do que de Deus. Isso nos leva ao
clímax da lista: mais amigos dos prazeres que amigos de Deus. Há
duas palavras compostas nessa descrição. “Amigos dos prazeres”
traduz (filēdonos), palavra composta por (filos,
“amante”) e (hēdonē, “prazer, deleite”) . “Amigos de Deus”
198
192
Vine, Unger e White Jr., p. 102.
193
Bauer, p. 867.
194
Vine, Unger e White, p. 304.
195
Donald Guthrie, The Pastoral Epistles, ed. rev., The Tyndale New Testament Commentaries. Grand Rapids, Mich.:
Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1990, p. 169.
196
Bauer, p. 873.
197
Uma flexão de tufoo é usada para descrever o raciocínio obscurecido dos enfatuados em 1 Timóteo 3:6.
198
Vine, Unger e White Jr., p. 890.
50
nossas expressões de afeto, no nosso uso do tempo, do dinheiro
ou das energias, ele é erradíssimo e prejudicial. Existe uma
palavra para o estilo de vida dos amantes do prazer derivada do
vocábulo grego para “prazer”: “hedonismo”. Vivemos numa
sociedade louca por prazer, e é difícil resistir a essa loucura.
A Bíblia ressalta quais devem ser as prioridades de quem teme a
Deus: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda
a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e
primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o
teu próximo como a ti mesmo” (Mateus 22:37-39).
51
Porque queriam tirar vantagem das reuniões. Isto lhes dava
credibilidade. No caso dos falsos mestres, isso lhes dava acesso
aos lares.
A declaração de Paulo não deve ser interpretada como se
“forma” não fosse importante. J. Glenn Gould escreveu:
204
J. Glenn Gould, “I and II Timothy, Titus,” in Beacon Bible Commentary, vol. 9. Kansas City, Mo.: Beacon Hill Press,
1965, p. 648.
205
Dayton Keesee, “An Appeal to Be on Guard in the Last Days. 2 Timothy 3,” Truth for Today 18. Junho de 1997, p.
4.
206
“Negar” ( , arneomai) é desconhecer, não admitir (vejz 2:12).
207
Bauer, p. 124.
52
mensagem. Ele deveria abster-se de participar do estilo de vida
e do ensino desses falsos mestres. Deveria, especialmente, se
recusar a entrar em discussões inúteis com eles.
Ainda que Paulo tenha usado um tempo verbal futuro em 3:1
(“sobrevirão”), é óbvio que para ele os “tempos difíceis” já
haviam chegado: “Negando-lhe o poder. Foge também destes” (3:5;
grifo meu). Alguns pensam que “fugir” implica retirar-se da
irmandade, se a parte culpada se recusar a se arrepender e
mudar208. Nesse caso, esta passagem seria paralela a Tito 3:10,
11.
208
Lipscomb e Shepherd, p. 230; Barton, Veerman e Wilson, p. 208; Guthrie, p. 170.
209
Vine, Unger e White Jr., p. 719.
210
Bauer, p. 333.
211
Ward, p. 189.
53
uma conotação pejorativa de menosprezo. Poderíamos dizer que
elas eram “espiritualmente imaturas”.
Esta não era uma tentativa da parte de Paulo de descrever
todas as mulheres daquela época nem da nossa
. Naquele tempo, as mulheres piedosas se destacavam nas
obras da igreja212, assim como hoje. Em vez disso, Paulo estava
descrevendo um tipo particular de mulher visada pelos mestres do
erro. Ainda é verdade que certos tipos de pessoas (sejam elas do
sexo masculino ou feminino) são mais suscetíveis à conversa
bajuladora e a seus mensageiros. São frutos maduros prontos para
serem colhidos por indivíduos inescrupulosos.
O objetivo dos falsos mestres era “conseguir cativar” essas
mulheres. “Cativar” ( , aichmalōtizō) era usado no contexto
de prisioneiros de guerra. Formado das palavras (aichmē,
“lança”) e (haltos, “capturado”), o verbo originalmente
significava “ser capturado” com “uma lança”213. Entretanto, neste
texto, o aspecto militar dá lugar ao sentido mais geral de
“obter o controle de”214.
As “mulherinhas” eram suscetíveis à mensagem dos falsos
mestres porque estavam “sobrecarregadas de pecados”.
“Sobrecarregadas”, (sōreuō), denota ter coisas
amontoadas . Essas mulheres tinham pecados empilhados em suas
215
54
pensamento dizia: “Reprimam todos os impulsos” (veja 1 Timóteo
4:3), enquanto outra dizia: “Liberem todos os impulsos! Deixem
que eles fluam livremente!” Os mestres infiltrados poderiam ser
adeptos dessa segunda corrente. Se assim for, eles teriam dito:
“Não se preocupe com seus fortes desejos. Não tente reprimi-
los. Ceda a eles”.
Por fim, Paulo descreve que essas mulheres “aprendem sempre
e jamais podem chegar ao conhecimento da verdade” (3:7). Elas
queriam aprender, o que é bom; mas não tinham discernimento, o
que é ruim. Suas mentes eram como esponjas, que absorviam
algumas informações (verdadeiras ou falsas) daqui, de lá e de
todos os lados. A NVT diz: “mulheres que estão sempre em busca
de novos ensinos”. Elas provavelmente aceitavam o que gostavam e
rejeitavam o que não gostavam (veja 4:3). No fim, chegavam às
suas próprias conclusões tendenciosas, porém, não chegavam “ao
conhecimento da verdade”218. Isto é trágico, visto que só a
verdade liberta (João 8:32). Sem amor à verdade, acreditamos em
mentiras e perecemos (2 Tessalonicenses 2:10-12).
Versículo 8. Neste versículo e no seguinte, Paulo migrou
das vítimas para os vitimizadores. E, do modo por que Janes e
Jambres resistiram a Moisés, também estes resistem à verdade.
Janes e Jambres podem ter sido dois dos magos egípcios que se
opuseram a Moisés quando ele estava na corte do faraó para
comunicar a mensagem de Deus: “Deixa Meu povo ir” (veja Êxodo
5:1).
Embora a Bíblia hebraica não cite pelo nome os magos do
faraó, a tradição judaica aplicou os nomes “Janes” e “Jambres” a
dois deles. O fato de Paulo usar esses nomes pode ser o endosso
do Espírito Santo a essas designações tradicionais219. É possível
que os nomes tenham sido preservados com precisão ao longo dos
séculos por meio das tradições orais até serem transcritos. O
registro mais antigo do nome “Janes” foi encontrado entre os
Manuscritos do Mar Morto, em um documento datado do segundo ou
primeiro século a. C.220 Pode ser que tanto “Janes” quanto
“Jambres” tenham aparecido em um targum aramaico usado por
Paulo. Um targum de um período posterior contém seus nomes em
Êxodo 7:11221.
Outra opção é que os judeus, que gostavam de dar nome aos
anônimos, inventaram as designações “Janes” e “Jambres.” Sabe-se
que eles inventaram várias histórias sobre esses dois magos,
embora não haja uma concordância entre elas222. Nesse caso, Paulo
218
Veja mais sobre “conhecimento da verdade” nos comentários sobre 1 Timóteo 2:4.
219
R. C. H. Lenski, The Interpretation of St. Paul’s Epistles to the Colossians, to the Thessalonians, to Timothy, to Titus
and to Philemon. S.c.p.: Lutheran Book Concern, 1937; reimpressão, Columbus, Ohio: Wartburg Press, 1946), 828.
220
Documento Damasceno 5.17-19.
221
Targum de Pseudo-Jônatas sobre Êxodo 7:11.
222
Carl Edwin Armerding rotulou as história judaicas sobre Janes e Jambres de “lendas confusas”. Ele citou várias
fontes antigas onde se encontram essas lendas. (Carl Edwin Armerding, “Jannes and Jambres”, in The International
Standard Bible Encyclopedia, ed. rev. , ed. Geoffrey W. Bromiley. Grand Rapids, Mich.: Wm. B. Eerdmans Publishing
Co., 1982, 2:966.) Fragmentos do “Livro de Janes e Jambres” também foram descobertos. (James H. Charlesworth,
55
estaria empregando ironia, dizendo com efeito: “Os falsos
mestres amam os mitos judaicos. Deixe-me usar um mito judaico
para denunciá-los”223.
Seja qual for o motivo pelo qual Paulo mencionou estes dois
homens em 3:8, é fácil entender a ideia principal: assim como se
opuseram a Moisés, os falsos mestres se opunham a Paulo e a
outros que ensinavam a verdade de Deus.
Eles eram, disse Paulo, homens de todo corrompidos na
mente. “De todo corrompidos” traduz (kataftheirō), composto
pelo verbo (ftheirō, “corrupto”) intensificado por
(kata)224. A mente é a única coisa capaz de distinguir entre o
que é verdadeiro e o que é falso. Quando a mente está
corrompida, toda a esperança de discernir o erro desaparece!
Esses homens eram réprobos quanto à fé. “A fé” é o conjunto
de ensinos centrados na fé em Jesus. “Réprobo” ( , adokimos)
descreve algo que não passou no teste de utilidade, sendo
descartado como lixo225. Os falsos mestres tinha sido pesados na
balança pelo Senhor e considerados reprovados (veja Daniel
5:27).
ed., The Old Testament Pseudipigrapha. Nova York: Doubleday, 1985, 2:437–42.
223
Também já foi sugerido que Paulo usou a ilustração de dois magos porque os falsos mestres alegaram ser
praticantes de artes mágicas. Visto que Éfeso era o centro ocultista do mundo (veja Atos 19:19), esta é uma
possibilidade.
224
Vine, Unger e White Jr., p. 513.
225
Uma flexão de adokimos é a palavra traduzida por “reprovados” em Tito 1:16.
226
Em 2 Timóteo 2:16, “passarão” (“passarão a impiedade ainda maior”) traduz uma flexão de prokoptō.
227
Vine, Unger e White Jr., p. 556; Bauer, p. 84.
56
(Êxodo 8:18; grifo meu). Eles se retiraram envergonhados. A
insensatez deles ficou evidente.
Embora saibamos que sempre haverá momentos difíceis e
falsos mestres, em última análise, todo falso mestre fracassará,
não terá êxito. Paulo não especificou quando ou como “a
insensatez deles seria a todos evidente”. Poderia ser quando os
discípulos perspicazes enxergassem o engano. Talvez fosse quando
morressem, ou talvez no dia do julgamento. Paulo apenas garantiu
a Timóteo (e a nós) que, mais cedo ou mais tarde, todos iriam
vê-los como realmente são.
O princípio por trás do versículo 9 é que, não importa quão
difíceis sejam os tempos, Deus permanece no controle. Sabendo
disso, não devemos nos desanimar. Ele prometeu que Sua Palavra
não passará (Mateus 24:35) e que a Sua igreja não pode ser
destruída (Mateus 16:18). “O firme fundamento de Deus permanece,
tendo este selo: O Senhor conhece os que Lhe pertencem” (2
Timóteo 2:19).
57
A Segunda Carta de Paulo a Timóteo
“Defende a Fé”
(2 Timóteo 3:10–17)
58
de outro”, ou seguir fisicamente, caminhando atrás de alguém,
seguindo seus passos. Timóteo fizera as duas coisas em relação a
Paulo. Ninguém estava mais perto de Paulo do que Timóteo, que
viajara com ele durante quinze anos.
Uma vez que a implicação do versículo 10 é que o ensino e a
conduta de Paulo eram dignos de serem seguidos, alguns julgam
que o apóstolo agiu aqui com presunção. Walter L. Liefeld
discordou dessa conclusão: “Ele não está se gabando, mas sim
mostrando onde estão seus valores, valores que não são opcionais
ou relativos, mas de absoluta importância na vida do servo do
Senhor”232. O versículo pode ser visto como a declaração de um
velho a um homem mais jovem sobre o que ele aprendeu na
vida. Pode-se ser considerado uma lista oposta à dos pecados
citados nos versículos 2 a 5. Também pode ser usado como uma
lista de coisas com as quais os cristãos (especialmente os
pregadores) deveriam se preocupar.
A lista começa com “meu ensino” 233. Quando Paulo detalhou
que “toda a Escritura” é útil, ele citou primeiramente o
“ensino” (3:16). “Ensino” traduz (didaskalia), sinônimo de
“doutrina”. Uma das principais preocupações de Paulo era a
necessidade de definir a sã doutrina234. Se uma parte de uma
doutrina está errada, faz pouca diferença a parte que está
correta.
No entanto, a doutrina correta, por si só, é estéril e
morta, por isso Paulo acrescentou: “procedimento” ( , agōgē)
ou “minha conduta” (NVI). Paulo instruiu Timóteo a “ter cuidado”
tanto com sua vida quanto com seu ensino em 1 Timóteo 4:16, e o
apóstolo tinha o mesmo cuidado.
Em seguida, a lista de Paulo contém o seu “propósito” ou
objetivo na vida. “Propósito” traduz (prothesis), que se
refere “àquilo que é planejado com antecedência”235. Muitos
passam a vida sem um objetivo ou, na melhor das hipóteses, com
um objetivo superficial: divertir-se, ganhar dinheiro, ou ser
famoso. O objetivo de Paulo na vida era mais sério. Em 1:9, ele
usou prothesis em relação ao propósito de Deus. O propósito de
Paulo era viver uma vida compatível com o propósito de Deus.
Os próximos três itens constituem a lista paulina das “três
maiores” virtudes cristãs. A maneira mais comum de Paulo citá-
las era se referindo a “fé, esperança e amor”; mas aqui ele usou
“longanimidade”, no lugar de “esperança” - talvez porque a
esperança nos permita ser longânimos ou
231
George W. Knight III, The Pastoral Epistles, The New International Greek Testament Commentary. Grand Rapids,
Mich.: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1992, pp. 438–39.
232
Walter L. Liefeld, 1 & 2 Timothy, Titus, The NIV Application Commentary. Grand Rapids, Mich.: Zondervan, 1999,
278.
233
O texto grego diz literalmente “o ensino de mim”. Todos os itens da lista são precedidos de um artigo definido.
Os demais itens poderiam ser traduzidos por “meu procedimento”, “meu propósito”, “minha fé...”.
234
A “sã doutrina” é enfatizada em 1 Timóteo 4:6.
235
Walter Bauer, A Greek-English Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature, 3a ed., rev. e
ed. Frederick William Danker. Chicago: University of Chicago Press, 2000, p. 869.
59
pacientes. “Longanimidade” traduz (makrothumia), que
significa “ânimo longo,” o oposto de “ânimo curto”236. Esta
virtude envolve ser paciente com as pessoas que dificultam ou
põem à prova a nossa paciência.
“Fé” ( , pistis) poderia ser a fidelidade de Paulo, mas
neste contexto provavelmente se refere à sua fé e confiança
pessoais em Deus. “Amor” ( , agapē ) inclui o amor a Deus e ao
ser humano. Quanto ao amor ao próximo, William Barclay escreveu
que o amor “é a atitude que suporta tudo que os homens podem
fazer e se recusa a ficar irado ou amargurado, e que busca
somente o bem maior do outro”237.
A próxima virtude da lista é a “perseverança”, intimamente
ligada a “longanimidade”. “Perseverança” ( , hupomonē) é ser
paciente com as circunstâncias , especialmente as difíceis como
238
60
Versículo 12. Paulo migrou da própria experiência à dos
cristãos em geral: Ora, todos quantos querem viver piedosamente
em Cristo Jesus serão perseguidos. Ter um desejo sincero de
“viver piedosamente” está em oposição a ter apenas “forma
[aparência] de piedade” (3:5). “Perseguidos” traduz uma flexão
de (diōkō), que significa “perseguir”243. Neste versículo, o
termo retrata os seguidores de Cristo “caçados como animais
selvagens”244. Jesus disse a Seus discípulos:
243
W. E. Vine, Merrill F. Unger e William White Jr., Dicionário Vine. 7a. ed. Trad. Luís Aron de Macedo. Rio de
Janeiro: CPAD, 2007, p. 872.
244
Archibald Thomas Robertson, Word Pictures in the New Testament, vol. 4, The Epistles of Paul. Nova York: Harper
& Brothers, 1931, p. 626.
245
“homens” traduz a palavra genérica (anthropos), que inclui as mulheres.
246
Bauer, p. 851.
247
Vine, Unger e White Jr., p. 593.
248
Bauer, p. 204.
249
Prokoptō é traduzido por “passarão a...” em 2 Timóteo 2:16.
250
O texto grego diz literalmente “avançarão para o pior”. “De mal a pior” é uma expressão moderna para se dizer o
mesmo.
61
Eles também estavam “enganando e sendo “enganados”, ambas
as expressões derivam da mesma palavra: (planaō). Na forma
ativa, planao é fazer alguém se desviar - isto é, “levar alguém
para fora do caminho certo”251. Na forma passiva, é ser
desviado. A tradução de Phillips diz que os homens perversos e
enganadores estavam “iludindo os outros e se iludindo”.
É comum a quem propaga o engano perder o controle do que é
real e do que não é. Acha-se inteligente e considera os outros
tolos, não percebendo que está cometendo o cúmulo da
insensatez. Acha que está progredindo quando só está indo de mal
a pior. Pode até mesmo se iludir pensando que o que está fazendo
é correto e agradável a Deus (veja Mateus 7:21–23).
251
Vine, Unger e White Jr., p. 751.
252
Uma forma verbal de manthano, aprender, aparece também em Tito 3:14.
62
“nelas habitar”, não como um visitante ou convidado ocasional,
mas como um residente permanente253.
Timóteo não só aprendeu as verdades da Palavra de Deus, mas
também “foi inteirado” delas. O termo grego traduzido por
“fostes inteirado” ( , pistoō ) significa “ter certeza sobre
[algo] por ser confiável, sentir confiança”254. Timóteo não havia
meramente ouvido ou avaliado o ensino inspirado; ele foi
firmemente convencido de que aquilo era a verdade. “Ele se
apoderou, creu, absorveu, viveu segundo esse ensino”255.
Timóteo precisava continuar nesse caminho. Para encorajá-lo
a fazer isso, Paulo novamente evocou memórias do
passado: sabendo de quem o aprendeste. Alguns questionam se
“quem” no texto original é plural ou não. Manuscritos gregos
mais antigos contêm o plural, enquanto manuscritos posteriores
têm o singular (talvez enfatizando o papel de Paulo no
aprendizado de Timóteo256). O texto grego moderno257 usa o plural,
que incluiria a mãe e a avó de Timóteo. A inclusão de Eunice e
Loide nos pensamentos de Paulo se evidencia na declaração que
vem a seguir: Desde a infância, sabes as sagradas letras.
“Sagradas letras” traduz (hieros, “sagrado” ou “santo”)
e (gramma , “aquilo que está escrito”)258. Neste texto, gramma é
“um conjunto de caracteres escritos na composição de um
documento ou peça escrita”259. Somente os livros do Antigo
Testamento estão incluídos nessa citação de gramma em 3:15, uma
vez que eram essas as “sagradas letras” disponíveis quando
Timóteo era criança.
“Infância” traduz (brephos), que indica uma criança bem
pequena, ou um bebê260. Os pais judeus consideravam seu dever
sagrado instruir os filhos na Lei (Deuteronômio 4:9; 6:7;
11:19). “Alegavam que seus filhos aprendiam a lei até das faixas
de panos que usavam e do leite da mãe.”261 Alguns judeus
acreditavam que deviam começar a ensinar os filhos aos 5
anos262, mas Eunice e Loide evidentemente começaram muito antes
disso263. Pode-se imaginar Timóteo sentado no colo delas,
ouvindo-as contar as histórias animadas e emocionantes do Antigo
253
Em 1 Timóteo 2:15, Paulo usou a expressão “permanece [meno] em fé, e amor, e santificação”.
254
Bauer, p. 821.
255
Stott, p. 45.
256
Bruce M. Metzger, A Textual Commentary on the Greek New Testament, 2a ed. Stuttgart, Germany: German
Bible Society, 1994, p. 580.
257
The Greek New Testament, ed. Kurt Aland, Matthew Black, Bruce M. Metzger e Allen Wikgren. Stuttgart: United
Bible Societies, 1966.
258
Vine, Unger e White Jr., p. 747.
259
Bauer, p. 205.
260
Vine, Unger e White Jr., p. 431.
261
Barclay, p. 199.
262
Mishná Aboth 5.21.
263
Veja os comentários sobre 1:5.
63
Testamento264. Provavelmente, a todo tempo a Escritura era citada
e demonstrada na casa de Timóteo.
Gramma pode significar apenas “letras”, por isso sugerem
alguns que Timóteo teria aprendido o alfabeto hebraico e também
a ler através do Antigo Testamento. Sabemos de muitas pessoas
que aprenderam a ler com a Bíblia.
Por que é importante conhecer as sagradas letras? Aqui está
a resposta de Paulo: porque elas podem tornar-te sábio para a
salvação. “Tornar-te sábio” traduz (dunamai), a forma verbal
de (dunamis, “poder”). Ao contrário dos “falatórios inúteis”
dos falsos mestres (2:16), a Escritura tem poder para “dar...
sabedoria” ( , sofizō265). Esta não é a “sabedoria do mundo” (1
Coríntios 1:20; veja Tiago 3:15). Não resulta de um estudo da
filosofia humana, mas de uma leitura aprofundada da Palavra de
Deus (veja Provérbios 23:23). Essa sabedoria habilita o crente
“para a salvação”, a maior necessidade do homem.
Visto que as “sagradas letras” mencionadas no versículo 15
designam o Antigo Testamento, devemos enfatizar que, por si
mesmo, o conhecimento do Antigo Testamento não conduz
automaticamente à salvação. Judeus incrédulos são provas
suficientes desse fato. Não devemos, portanto, ignorar a próxima
frase de Paulo: pela fé em Cristo Jesus. Nossa salvação está em
Cristo e somente nEle, quando cremos e confiamos Nele e fazemos
Sua vontade. O principal propósito do Antigo Testamento era
conduzir o povo a Cristo (Gálatas 3:24, 25). Jesus disse que os
escritos do Antigo Testamento falavam dEle (Lucas 24:44-47). Os
oradores e escritores do Novo Testamento recorreram
constantemente ao Antigo Testamento para gerar a fé em Jesus
(veja Atos 2:14–40; 26:22, 23). Para fortalecer a fé de Timóteo
em Jesus, Paulo partiu do conhecimento que o jovem tinha do
Antigo Testamento.
Versículos 16 e 17. A menção de “as sagradas letras” levou
Paulo a escrever “a declaração mais forte da própria Bíblia
sobre si mesma”266. É uma passagem que destaca o valor da Palavra
de Deus: Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o
ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na
justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e
perfeitamente habilitado para toda boa obra.
“Escritura” é a tradução de um equivalente a “escrita” (
, graf), mas o Novo Testamento emprega esse termo exclusivamente
para a “escritura sagrada”267. “Toda”, (pas), pode significar
também “cada”268. Há quem distinga as duas definições, afirmando
264
Eles tinham cópias dos livros do Antigo Testamento ou compartilhavam as partes das quais se lembravam por
terem-nas ouvido nas leituras da sinagoga? Nós não sabemos.
265
O verbo sofizō vem da mesma raiz da palavra (sofia, “sabedoria”), um atributo que Paulo enfatizou em
Colossenses 1:9, 28; 3:16; 4:5.
266
Liefeld, p. 279.
267
Bauer, p. 206.
268
Vine, Unger e White Jr., p. 1023.
64
que “toda a Escritura” pode ser a Bíblia como um todo, enquanto
“toda Escritura” pode especificar suas partes individuais. É uma
distinção com pouco propósito: “Se ‘toda escritura’ é inspirada,
‘toda a escritura’ também é inspirada”269.
“Inspirada por Deus” traduz (theopneustos), formado de
(Theos, “Deus”) e (pneō, “inspirar”); literalmente, “soprada
por Deus”270. Alguns comentaristas acreditam que essa imagem
venha da criação do homem, quando Deus “lhe soprou nas narinas o
fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente” (Gênesis
2:7). Deus “soprou” a Palavra e esta passou a ser “viva e
eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes”
(Hebreus 4:12). Outros preferem a simples imagem de expirar
(como o ar gelado que se exala numa manhã fria). Dale Hartman
falou da Bíblia como “o sopro de Deus impresso” 271.
Independentemente da imagem pretendida, a frase expressa a
atividade criadora de Deus, declarando em termos inequívocos que
as Escrituras são de origem divina.
O agente divino da inspiração foi o Espírito Santo. Quando
se citava uma declaração de Davi, observava-se que ele estava
“no Espírito Santo” quando a proferiu (Marcos 12:36). Jesus
disse a Seus discípulos que enviaria o Espírito Santo para guiá-
los “a toda a verdade” (João 16:13; veja 14:26). Pedro afirmou
que “homens santos falaram da parte de Deus, movidos pelo
Espírito Santo” (2 Pedro 1:20, 21).
As Escrituras não são inspiradas porque um conselho da
igreja decretou que elas são inspiradas. Elas são inspiradas
porque Deus as fez assim. Nenhum outro texto se enquadra na
categoria “inspirado por Deus”. J. W. Roberts escreveu:
269
William Hendriksen, 1, 2 Timóteo e Tito. Comentário do Novo Testamento. São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2001,
2a. ed., p. 370., n. 161.
270
“Inspirar” significa literalmente “respirar, inalar”.
271
Dale Hartman, “Prophecy of Scripture,” sermão pregado na igreja de Cristo Eastside, Midwest City, Oklahoma.
272
J. W. Roberts, Letters to Timothy, The Living Word. Austin, Tex.: R. B. Sweet Co., 1964, pp. 91–93.
65
despeito do fato de que o conceito de “Escritura não inspirada”
inexiste na Bíblia. O termo “’Escritura’ ocorre cinquenta vezes
no Novo Testamento e sempre com a ideia de ‘Escritura’ como um
nome próprio, com ‘significado sagrado’”273. A maneira mais
natural de se ler o versículo 16 é que “toda a Escritura é [em
sua totalidade]274 inspirada por Deus”.
Conforme observado anteriormente, a frase “sagradas letras”
no versículo 15 inclui apenas os Escritos do Antigo
Testamento, uma vez que esses eram os únicos escritos inspirados
disponíveis quando Timóteo era criança. Também é verdade que
quando os primeiros cristãos liam o termo “Escritura” (3:16),
eles provavelmente pensavam primeiramente nos escritos do Antigo
Testamento. Isso não significa, no entanto, que a passagem se
aplique apenas ao Antigo Testamento. Em 2 Pedro 3:15 e 16, Pedro
falou dos escritos de Paulo e os colocou ao lado das “demais
Escrituras”. Em 1 Timóteo 5:18, Paulo falou de uma citação de
Moisés e de uma citação de Lucas como “Escritura” 275. Assim como
no Antigo Testamento, “homens santos falaram da parte de Deus,
movidos pelo Espírito Santo” (2 Pedro 1:21), no Novo Testamento
homens guiados pelo Espírito também falaram e escreveram a
verdade do céu (João 14:26; 16: 13). Quando dizemos que “toda a
Escritura” “é em sua totalidade inspirada por Deus”, temos em
mente tanto o Antigo como o Novo Testamento.
Nada afeta mais a compreensão da Bíblia do que a atitude em
relação a ela. Devemos crer de todo o coração que a Bíblia é
inspirada por Deus e que é tão relevante hoje como era nos dias
de Paulo.
Porque “toda a Escritura” é inspirada, é “útil” ( ,
ofelimus) ou proveitosa . Ela contrasta com o ensino e
276
273
Ibid., p. 91 (grifo meu).
274
Gordon D. Fee, 1 and 2 Timothy, Titus, A Good News Commentary. San Francisco: Harper & Row, 1984, p. 229.
275
Veja 1 Timóteo 5:18.
276
Uma forma de ōphelimos também é traduzida por “proveitosas” em Tito 3:8.
277
Veja 1 Timóteo 6:20; 2 Timóteo 2:14, 16; Tito 3:9.
278
O substantivo “ensino” também aparece em 3:10.
66
forte, censura, reprovação”279. Quando as ações de um indivíduo
colocam em perigo a sua alma, ele precisa ser repreendido - com
mansidão e brandura, em espírito de amor (2:24-26; Efésios
4:15).
A seguir, relacionada com “repreensão” vem a “correção”.
“Correção” traduz uma palavra composta (epanorthōsis),
formada de (epi, “para”), (ana, “para cima” ou “outra vez”)
e (ortoho, “endireitar” ). Significa “uma restauração a um
280
279
Bauer, p. 314. A forma verbal de elegmos é traduzida por “repreender”em 1 Timóteo 5:20 e Tito 2:15.
280
“Ortodontista” é um dentista especializado em endireitar os dentes.
281
Vine, Unger e White Jr., p. 512. Um termo similar é usado em 2:15 ( , orthotomeo), “aprovado”.
282
Formas verbais de (paideuo) aparecem em 1 Timóteo 1:20 (“aprendam”); 2 Timóteo 2:25 (“corrija”) e Tito 2:12
(“ensinando”).
283
Dikaiosune também é traduzido por “justiça” em 1 Timóteo 6:11; 2 Timóteo 2:25 e Tito 3:5.
284
“Homem” traduz a forma genérica (anthropos), que inclui homens e mulheres de Deus. A expressão “homem
de Deu” também aparece em 1 Timóteo 6:11.
285
As “boas obras” ou “ações” são enfatizadas em Tito 2 e 3.
286
Isto não sugere que a Bíblia silencie a respeito de como devemos realizar as tarefas corriqueiras ou
seculares. Devemos sempre fazer o melhor possível, prestando serviço “como ao Senhor e não a homens” (Efésios
6:7).
67
Bíblia para sermos pessoas melhores - para estarmos
“perfeitamente habilitados para toda boa obra”.
“Perfeito” traduz um adjetivo ( , artios) que denota
“estar bem equipado para alguma função; completo, capacitado,
proficiente”287. Essa palavra “descreve um homem perfeitamente
compatível com sua tarefa”288. A BJC diz “plenamente equipado”, e
a NVI, “plenamente preparado”.
“Habilitado” vem de (exartizō), um verbo intensificado
relacionado a “perfeito” (artios). Paulo estava, de fato,
dizendo: “A Palavra equipa o homem para toda boa obra; sim, ela
o equipa completamente”. “Deus nunca nos pede para fazer uma
coisa para a qual Ele não nos habilite.289”
APLICAÇÃO
O Senhor nos Resgata (3:11)
Quando temos problemas, uma fonte de conforto é saber que o
Senhor está conosco (Hebreus 13:5 e 6) e que Ele prometeu
resgatar o Seu povo. Precisamos entender, porém, que, às vezes,
Ele nos salva, removendo a fonte das tribulações e às vezes Ele
nos resgata, dando-nos força para suportá-las.
287
Bauer, p. 136 (grifo meu).
288
Donald Guthrie, The Pastoral Epistles, ed. rev., The Tyndale New Testament Commentaries. Grand Rapids, Mich.:
Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1990, p. 176 (grifo meu).
289
Dale Hartman, sermão pregado na igreja de Cristo em Eastside, Midwest City, Oklahoma, 7 de julho de 2014.
68
Inspiração Bíblica (3:16)
Não devemos pensar em “inspiração” como o mundo faz quando
diz que “Shakespeare foi inspirado”290. Tampouco devemos pensar
em inspiração como um processo que transformou homens em robôs
sem mente, aos quais Deus ditou Sua mensagem. Até um exame
superficial do texto original revela que cada livro da Bíblia
contém características individuais de estilo, sentimento e
percepção291. O que, então, é inspiração bíblica? É o processo
usado por Deus para garantir que cada relato bíblico fosse
precisamente o que Ele planejou. Warren W. Wiersbe expressou
essa ideia assim: “a influência sobrenatural do Espírito Santo
sobre os escritores da Bíblia... garantiu que o que eles
escrevessem fosse exato e fidedigno”292. A terminologia empregada
muitas vezes é “inspiração verbal”293, que enfatiza que as
palavras do texto foram inspiradas por Deus (veja 1 Coríntios
2:13).
290
Warren W. Wiersbe, Comentário Bíblico Expositivo do Novo Testamento, vol. 2. Trad. Susana E. Klassen. Santo
André, SP: Geográfica editora, 2006, p. 328.
291
Lucas até disse que ele fez uma pesquisa pessoal antes de escrever seu relato do Evangelho (Lucas 1:3).
292
Wiersbe, p. 328.
293
Uma expressão usada no passada era “inspiração plenária [completa]”.
69
A Segunda Carta de Paulo a Timóteo
“Prega a Palavra” - Parte 1
(2 Timóteo 4:1–8)
294
Donald Guthrie, The Pastoral Epistles, ed. rev. , The Tyndale New Testament Commentaries. Grand Rapids, Mich.:
Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1990, p. 62.
295
W. E. Vine, Merrill F. Unger e William White Jr., Dicionário Vine. 7a. ed. Trad. Luís Aron de Macedo. Rio de
Janeiro: CPAD, 2007, p. 451.
296
James Hope Moulton e George Milligan, The Vocabulary of the Greek Testament. Grand Rapids, Mich.: Wm. B.
Eerdmans Publishing Co., 1930, p. 152.
70
basicamente a mesma usada no começo de 1 Timóteo 5:21; aqui,
porém, Paulo expandiu a identificação de Jesus: que há de julgar
vivos e mortos. Deus atribuiu a tarefa do julgamento ao Seu
Filho (João 5:22; Atos 17:31; 2 Coríntios 5:10). “Vivos”
descreve os que estiverem vivos quando Cristo voltar, enquanto
“mortos” descreve os que tiverem morrido antes disso (1
Tessalonicenses 4:15-17; veja 1 Coríntios 15:51). Na segunda
vinda, tanto os justos como os maus serão ressuscitados; a
seguir, todos serão julgados (João 5:28, 29).
Convém observarmos o tempo verbal usado nessa declaração
que qualifica Cristo. O texto grego diz literalmente “...estando
prestes a julgar”297. A segunda vinda e o dia do juízo podem ou
não ser imediatos, mas são sempre iminentes - isto é, podem
acontecer a qualquer momento. Devemos estar sempre prontos
(Mateus 24:44).
Paulo intensificou a solenidade da incumbência
acrescentando dois detalhes a respeito de Jesus: pela Sua
manifestação e pelo Seu reino. “Manifestação” traduz
(epifaneia, “brilho à frente”) , podendo se referir à primeira
298
71
Versículo 2. A incumbência propriamente dita encontra-se
neste versículo. A essência da diretriz está na primeira
frase: prega a palavra. É fácil perder de vista esta verdade
básica: os pregadores devem pregar! Via de regra, muito se exige
dos pregadores ou evangelistas. Pode-se esperar que eles atuem
como conselheiros, gerentes de escritório, peritos em relações
públicas e solucionadores de problemas em geral. Essas tarefas
não são necessariamente ruins, mas um pregador ou evangelista
não pode perder de vista sua incumbência número um: pregar.
O verbo traduzido por “pregar” ( , kērussō) está
relacionado ao substantivo traduzido por “pregador” ( , kērux)
e identifica o trabalho de um arauto300. A mensagem de um antigo
arauto não partia dele. Ele era enviado por uma autoridade (por
exemplo, o rei) e deveria anunciar a mensagem em voz alta e
clara para que todos ouvissem.
Paulo afirmou que o arauto de Deus deveria declarar “a
palavra”. Esta é “a palavra da verdade” que deveria ser bem
manejada (2:15). Ela tem outras designações, como “a verdade”,
“a sã doutrina”, “o evangelho” e “as Escrituras”. Esta ordem de
Paulo está relacionada com o fim do capítulo 3. Visto que “a
Escritura é... útil para o ensino, para a repreensão, para a
correção, para a instrução na justiça”, equipando completamente
o homem de Deus “para toda boa obra” (3:16, 17), é imperativo
que nós preguemos essa Escritura!
Nunca é demais salientar a importância da pregação. Eddie
Cloer escreveu: “As Escrituras não registram nenhum outro plano
para o cumprimento do propósito eterno de Deus além da pregação
e do ensino de Seu evangelho por toda a Terra por meio de Seus
servos”301. Paulo disse:
72
urgência”303. A tradução de Phillips diz: “Nunca perca o sentido
de urgência”.
O uso das expressões “quer seja oportuno” e “quer não” cria
um jogo de palavras. Essas duas locuções no grego se baseiam na
palavra “tempo” ( , kairos). “Oportuno” ( , eukairōs) sugere
“um bom momento” (eu [“bom”] acrescido de kairos) para
determinada coisa, enquanto “quer não” ( , akairōs) indica
“fora d[o] tempo” (kairos negado por a). Archibald Thomas
Robertson observou: “Há todo tipo de tempo... alguns difíceis...
outros fáceis”304.
Há momentos em que pregar a verdade é conveniente e há
momentos em que é inconveniente, há tempos favoráveis e tempos
não favoráveis, há momentos oportunos e inoportunos. No passado,
era comum se dizer: “Prega quando quiserem, e prega quando não
quiserem!”305 Emprestando a terminologia de caça, “a temporada de
pregação nunca está fechada”. A temporada está sempre “aberta”
para o evangelho. W. F. Besser escreveu:
303
John R. W. Stott, Tu, porém - A Mensagem de 2 Timóteo. Série A Bíblia Fala Hoje. Trad. Milton A. Andrade. São
Paulo: ABU, 2004, p. 47.
304
Archibald Thomas Robertson, Word Pictures in the New Testament, vol. 4, The Epistles of Paul (New York: Harper
& Brothers, 1931), 629.
305
Alguns acham que a referência não é tanto aos ouvintes quanto ao próprio Timóteo. Independentemente de
como ele se sentisse, deveria pregar. À luz de 4: 3 e 4, parece melhor aplicar essa referência principalmente aos
ouvintes.
306
Citado por David F. Burgess, ed., Encyclopedia of Sermon Illustrations. St. Louis, Mo.: Concordia Publishing
House, 1988, p. 160.
307
Vine, Unger e White Jr., p. 507. Em 1 Timóteo 5:20, elencho é usado no sentido de repreender pecadores para
dissuadir outros de pecarem.
308
Bauer, 384. Epitimaō é composto de (epi, “sobre”) mais (timaō, “honrar”). O significado literal da palavra é
“posto em honra”, mas é consistentemente usado no Novo Testamento para repreensão.
309
Veja outros usos de parakaleō em 1 Timóteo 1:3; 2:1; Tito 2:6; 1 Timóteo 5:1; 6:2; Tito 1:9; 2:15.
73
permanecer na fé; os fracos devem ser encorajados a serem
zelosos e fortes; e os aflitos devem ser consolados”310.
Paulo acrescentou que a nossa pregação deve ser feita com
toda longanimidade e doutrina [ , pas, “toda”] . Essas ideias
erradicam de imediato qualquer indício de aspereza,
insensibilidade ou grosseria no ato da correção, repreensão e
exortação. Essa “longanimidade” ( , makrothumia) é
especificamente a paciência com pessoas . Leva tempo para
311
310
B. C. Goodpasture, Great Preachers of Today: Sermons of B. C. Goodpasture, ed. J. D. Thomas. Abilene, Tex.:
Biblical Research Press, 1967, p. 178.
311
Esse tipo de “paciência” ( makrothumia ) está incluído em 1 Timóteo 1:16 e 2 Timóteo 3:10.
312
Veja Romanos 2:4; 9:22; 1 Timóteo 1:16; 1 Pedro 3:20; 2 Pedro 3:15.
313
Didachē é traduzido por “ensino” em Tito 1:9.
314
Guthrie, p. 178.
315
A respeito da segunda razão, veja os comentários sobre 4:6.
74
Metaforicamente, knēthō refere-se à “curiosidade... que
busca informações interessantes e picantes”316. Os falsos
mestres, com sua mensagem “nova e aperfeiçoada”, estavam à
disposição para satisfazer essa curiosidade. Clemente de
Alexandria escreveu sobre os mestres de sua época que “coçavam e
faziam cócegas... nos ouvidos daqueles que desejam ser
afagados”317.
Os ouvintes descritos por Paulo no versículo 3 tinham um
desejo insaciável pelo que era novo ou diferente. Assim como os
atenienses, eles “de outra coisa não cuidavam senão dizer ou
ouvir as últimas novidades” (Atos 17:21). Hoje, o mundo está
cheio de atenienses modernos, e a terra está repleta de
proclamadores do absurdo que só querem fazer cócegas.
Em seu anseio louco por “uma religião moderna,” os ouvintes
da época de Paulo “se cerca[riam] de mestres segundo as suas
próprias cobiças”. “Cercar-se” é a tradução de (episōreuō),
formado de (sōreuō , “amontoar”) modificado por (epi,
318
75
situação provavelmente iria piorar, mas já havia, nos dias de
Paulo, gente dando ouvidos a “fábulas” divulgadas por mestres do
erro. O mesmo se aplica aos nossos dias. Não é de hoje que os
cristãos fiéis leem estas linhas e percebem que esse “‘tempo’ é
agora!”
Versículo 5. Novamente, Paulo iniciou este versículo
empregando os dois monossílabos tu, porém, (su de) (veja
3:10, 14). Ainda que outros se recusassem a dar ouvidos à
verdade, se entregando a fábulas, Paulo não queria que isso
acontecesse com Timóteo. O restante do versículo 5 completa a
última incumbência de Paulo ao pregador Timóteo, composta por
mais quatro imperativos: sê sóbrio em todas as coisas, suporta
as aflições, faze o trabalho de um evangelista, cumpre
cabalmente o teu ministério.
“Sê sóbrio” vem de (nefho), que se refere a ser “bem
equilibrado, autocontrolado... calmo em todas as
circunstâncias” . Ronald A. Ward entendeu a admoestação desta
324
76
Relacionado a esses equívocos estava a ideia de que um
evangelista não poderia trabalhar com uma congregação com
presbitério - mas Timóteo era evangelista e trabalhava com a
igreja de Éfeso, que tinha presbíteros (veja Atos 20:17).
O termo “evangelista” só enfatiza que no âmago de todo
ensino e pregação devem estar as boas novas sobre Jesus morrer
por nossos pecados e ser ressuscitado ao terceiro dia (veja 1
Coríntios 15:1–4). Sem as “boas novas” do evangelho, nossa
mensagem se torna “más notícias”.
Enquanto analisamos a incumbência para “fazer o trabalho de
um evangelista”, não devemos ignorar a menção da palavra
“trabalho” ( , ergon). Pregar o evangelho não consiste “apenas
em muita conversa”. Sendo feito corretamente, é trabalho.
Paulo, então, acrescentou: “Cumpre cabalmente o teu
ministério”. “Ministério” traduz (diakonia, “serviço”)331.
“Seu” implica que Timóteo não deveria cumprir o ministério de
Paulo ou de qualquer outro cristão. Sua preocupação deveria ser
com sua própria área de serviço a ele confiada por Deus. Cada um
de nós tem talentos e oportunidades únicos que nos foram
generosamente concedidos pelo Senhor (veja Mateus 25:14, 15;
Romanos 12:6; 1 Coríntios 12:5). Devemos usá-los para a Sua
glória.
Uma expressão chave usada nesta admoestação é “cumpre
cabalmente” ( , plēroforeō). Essa palavra grega é uma
combinação de (plēroō, “cumprir”) e (foreō, “trazer”).
Significa “trazer em plena medida” . Não devemos negligenciar
332
331
Paulo usou diakonia para se referir ao seu próprio ministério em 1 Timóteo 1:12.
332
Vine, Unger e White Jr., p. 418.
77
notável (como a terminação “-tor” em “doutor” e “-or” em
“ator”).
78
como “um sacrifício vivo” (Romanos 12:1; cf. 15:16),
considerava a etapa atual de sua vida como o ato
sacrificial final.337
337
William Hendriksen, 1, 2 Timóteo e Tito. Comentário do Novo Testamento. Trad. Valter Graciano Martins. São
Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2001, 1a. ed., p. 385.
338
William Barclay, The Letters to Timothy, Titus, and Philemon, ed. rev. , The Daily Study Bible. Filadelfia:
Westminster Press, 1975, p. 209.
339
Paulo comparou o coro físico a uma tenda (“tabernáculo”) em 2 Coríntios 5:1-8.
340
Barclay, p. 209.
79
7 Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé.
341
Considerando que Paulo já tinha usado a frase “combater o bom combate” como uma metáfora militar (veja 1
Timóteo 6:12), provavelmente ela tem a mesma conotação aqui. No entanto, Paulo talvez tivesse em mente o
esforço atlético intenso, em concordância com a próxima frase.
342
Uma figura semelhante é usada em 2:5.
343
Bauer, p. 1002. Uma flexão do verbo tereo é usada em 1 Timóteo 6:14, onde Paulo disse para “guardar o
mandamento...”
80
fervorosamente ao Senhor que continue comigo enquanto o fim da
minha jornada se aproxima.
81
de folhas que em breve murchará, mas “a imarcescível coroa da
glória” (1 Pedro 5:4; veja 1 Coríntios 9:25).
Os comentaristas não são unanimes quanto ao significado
exato da expressão “coroa da justiça”. Via de regra, “coroa de”
indica “uma coroa composta de”. “A coroa da vida” (Apocalipse
2:10) é “uma coroa que consiste de vida [eterna]” (veja Tiago
1:12). A “coroa de glória” (1 Pedro 5:4) é “uma coroa composta
de glória”. Esta interpretação também é possível aqui. Quando
Paulo se tornou cristão, Deus o considerou justo por causa de
sua fé em Jesus. Quando Cristo voltar, Paulo será
considerado justo por toda a eternidade. George W. Knight III
sugeriu, então, que “deve-se entender a expressão como ‘a coroa,
a saber, justiça’”, referindo-se ao “estado permanente e
perfeito dos justos”348.
No entanto, não podemos ignorar o fato de que alguns
versículos atrás, Paulo usou o termo “justiça” para “viver
correto” (3:16). Uma interpretação mais simples dessa expressão
em 4:8 seria “o prêmio da vitória guardado a todos que vivem
vidas justas [retas]”. Robertson fez uma combinação dessas duas
possibilidades: “a coroa que consiste em justiça e também é a
recompensa pela justiça”349.
Qualquer que seja a interpretação da expressão “coroa da
justiça”, é de consenso geral que se trata de uma metáfora
impressionante para a nossa recompensa eterna no céu, onde Deus
nos “enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá,
já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras
coisas passaram” (Apocalipse 21:4). Quando Paulo contemplou a
morte, ele não a viu como um acontecimento trágico a ser temido,
mas como um momento de partida, sacrifício e recompensa - um
momento esperado e desejado.
Alguns se surpreendem ao ler a afirmação de Paulo: “a coroa
da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto juiz, me dará
naquele Dia”. Classificam essa afirmação como pretensiosa ou
audaciosa. É verdade que não devemos ser tão autoconfiantes em
relação às nossas realizações espirituais (veja 1 Coríntios
10:12), mas a Bíblia ensina que devemos ter certeza da
salvação. João disse: “Estas coisas vos escrevi, a fim de
saberdes que tendes a vida eterna” (1 João 5:13; grifo meu).
Este sentimento de segurança não é um resultado da
autoconfiança, mas da confiança em Deus e na Sua misericórdia e
graça.
“A coroa” não era apenas para Paulo; nem era uma recompensa
especial para os apóstolos, ou um prêmio para os santos
superiores. Antes, “a coroa da justiça” (e tudo que está
implícito no termo) é para todos que fazem a vontade de
Deus. Paulo expressou esse conceito nas palavras: e não somente
348
George W. Knight III, The Pastoral Epistles, The New International Greek Testament Commentary. Grand Rapids,
Mich.: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1992, p. 461.
349
Robertson, p. 631.
82
a mim, mas também a todos quantos amam a Sua vinda. Podemos
imaginar a cena do Senhor colocando uma coroa sobre a cabeça de
cada cristão com suas mãos marcadas pelos cravos! Esta é uma
promessa quase inacreditável, mas Paulo afirmou que ela se
cumprirá.
“Sua vinda” certamente é a segunda vinda de Cristo, como em
4:1 . Amar (
350
, agapaō) a vinda de Cristo é aguardar com
grande expectativa. “Significa um anseio ou desejo que leva o
indivíduo a se esforçar por uma coisa”351. Neste versículo,
agapaō é usado no tempo perfeito, que expressa o resultado
presente e permanente de uma ação realizada no passado. Poderia
ser traduzido por “os que amaram e amam a Sua vinda” 352. A igreja
primitiva - a igreja primitiva perseguida e em combate - ansiava
pela volta de Cristo para salvá-los e justificá-los (Filipenses
3:20). Aqueles cristãos sinceramente oraram: “Vem, Senhor Jesus”
(Apocalipse 22:20; veja 1 Coríntios 16:22).
Antes de deixarmos este ponto culminante da carta de 2
Timóteo, vamos reservar um tempo para uma análise geral desta
seção - 4:1-8. Paulo esperava rever Timóteo antes de morrer
(1:4), mas não tinha certeza de que o faria. O tempo de sua
partida estava próximo (4:6); sua morte era iminente. Era
duplamente importante, então, que Timóteo permanecesse firme em
sua função de porta-voz de Deus. “Prega a palavra”, insistiu
Paulo. “Insta, quer seja oportuno, quer não” (4:2).
APLICAÇÃO
Outras Abordagens a 4:1-8
Pode-se elaborar uma lição baseada em 4:1–8, intitulada “A
Despedida de Paulo”:
350
Alguns acham que a “vinda” em 4:8 é a encarnação (e todos os eventos da vida terrena de Cristo), mas a segunda
vinda é o que se encaixa melhor no contexto.
351
Carl Spain, The Letters of Paul to Timothy and Titus, The Living Word Commentary. Austin, Tex.: R. B. Sweet Co.,
1970, p. 155.
352
James Hastings, ed., The Great Texts of the Bible: Thessalonians to Hebrews. Nova York: Charles Scribner’s Sons,
s.d., p. 246.
353
Paul Southern, “An Old Soldier’s Farewell”, sermão pregado na igreja de Cristo em Macquarie, Sydney, Australia,
22 de maio de 1971.
354
O general Douglas MacArthur fez esta declaração em seu discurso de despedida numa reunião no Congresso dos
Estados Unidos em 19 de abril de 1951. Nessa frase, ele parodiou um hino cantado no quartel de West Point,
83
Um Desafio a Todos (4:1–5)
Devagar e com cuidado, leia 4:1–5 novamente. Pense nos
pregadores do evangelho que você conhece e no desafio que o
Senhor lhes deu. Ore por eles e incentive-os de todas as formas
possíveis. Por último, pense nas partes da exortação de Paulo
que se aplicam a você e admita...
baseado em Abby Hutchinson Patton. “Kinf Words Can Necer Die”, The Sunday School Hymnary, ed. Cary Bonner.
Londres: National Sunday School Union, 1905.
355
Goodpasture, pp. 172-79.
356
Demarest, p. 287.
84
Deus ajude todo pregador do evangelho a ter equilíbrio na
pregação.
357
O julgamento provavelmente foi realizado em uma das grandes basílicas que ficavam no Fórum Romano.
358
Não sabemos com certeza se o último julgamento de Paulo foi perante Nero; no entanto, depois de culpar os
cristãos pelo incêndio notório, podemos imaginar que Nero quisesse garantir que um de dos líderes cristãos fosse
incriminado.
85
Quanto à minha vida, desde a mocidade, como decorreu desde
o princípio entre o meu povo e em Jerusalém, todos os judeus a
conhecem; pois vivi fariseu conforme a seita mais severa da
nossa religião. E, agora, estou sendo julgado por causa da
esperança da promessa que por Deus foi feita a nossos pais.359
359
A abertura da defesa de Paulo conforme aqui apresentada se baseia em sua defensa perante o rei Agripa (veja
Atos 26:2-6).
360
Lembro-me da história de um menino cuja mãe o pegou comendo geleia sem permissão. Ele amava a mãe; mas,
naquele momento em particular, ele não amou a chegada repentina da mãe.
86
versículo não diz “sê infalível”, mas “sê fiel” 361. Que o Senhor
nos ajude a sermos fiéis a Ele, aguardando a Sua volta com todo
o nosso ser.
“Prepare-se” (4:8)
Os cristãos precisam ser lembrados de que, todos os dias,
evangelistas fiéis partem para a sua recompensa celestial, e
outros devem estar prontos para ocupar seus
lugares. Incentivemo-nos mutuamente a encarar esse desafio.
361
Tim Pyles, “Blessed Assurance” [“Bendita Segurança”], sermão pregado na igreja de Cristo em Eastside, Midwest
City, Oklahoma, em 24 de fevereiro de 2013. Pyles usou o contraste entre um marido fiel e um marido infalível.
362
Barton, Veerman e Wilson, p. 220.
363
McInteer, p. 203.
87