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MULTIDÃO E PODER CONSTITUINTE: APONTAMENTOS PARA UMA

PERSPECTIVA CRÍTICA DO ESTADO DE EXCEÇÃO 

MULTITUDE AND CONSTITUENT POWER: A CRITICAL VIEW OF THE


STATE OF EXCEPTION

Jorge Gomes de Souza Chaloub

RESUMO

Agamben procura na obra de Carl Schmitt, jurista e cientista social alemão,


questionamentos que o permitam aprofundar suas reflexões sobre a democracia. A partir
do conceito schmittiano de estado de exceção, o filósofo italiano explicita a atual
estruturação dos países ditos democráticos, ressaltando o aspecto por vezes meramente
formal do princípio democrático e o núcleo autoritário presente nas ações estatais. Deste
modo, Agamben identifica a vigência de um estado de exceção permanente, que
perpassa as dinâmicas políticas do mundo contemporâneo. Todavia, não obstante sua
penetrante análise, emergem restrições ante sua formulação teórica. O presente artigo
propõe uma revisão crítica do pensamento agambeniano a partir das categorias teóricas
de Antônio Negri, pensador com o qual Agamben compartilha diversas referências
teóricas. Negri nunca tratou largamente da construção agambeniana sobre o estado de
exceção. Entretanto, mesmo sem amplas referências expressas, sua obra confronta
permanentemente os temas abordados por Agamben, a partir de suas definições
amplamente heterodoxas sobre a democracia, o constitucionalismo e o poder político.
Deste modo, busca-se delinear, a partir do diálogo entre estes dois pensadores, uma
nova perspectiva do conceito de democracia.

PALAVRAS-CHAVES: GIORGIO AGAMBEN, ANTONIO NEGRI, ESTADO DE


EXCEÇÃO, PODER CONSTITUINTE, MULTIDÃO, DEMOCRACIA

ABSTRACT

Agamben demands in the Carl Schmitt’s work, german jurist and social cientist,
questions that allows him to improve his thoughts on democracy. From the schmittian
concept state of exception, the Italian philosopher explains the current structure of so
call democratic countries, highlighting the sometimes purely formal aspect of the
democratic principle and authoritarian core of its actions. Thus, Agamben identifies the
current existence of a permanent state of exception, which defines the political
dynamics of the contemporary world. However, despite this penetrating analysis, some
restrictions may be placed before his theoretical formulation. This article proposes, thus,
a critical review of agambenian thought from the theoretical categories of Antonio


Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF
nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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Negri, who shares several intellectual references with Agamben. Negri never intensively
dealt with the agambenian construction of the state of exception. However, even without
many express references, his work confronts the issues proposed by Agamben, with his
definitions widely heterodox of democracy, constitutionalism and political power.
Therefore, this text aims, with focus on the dialogue between these two thinkers, a new
vision of concept of democracy.

KEYWORDS: GIORGIO AGAMBEN, ANTONIO NEGRI, STATE OF


EXCEPTION, CONSTITUENT POWER, MULTITUDE, DEMOCRACY.

Introdução

Pensadores com referências teóricas diversas, Antonio Negri e Giorgio Agamben


compartilham uma perspectiva incessantemente crítica sobre o direito e a política. Mais
do que construir respostas bem acabadas, seus objetivos são, a todo tempo, desnaturar e
refletir sobre problemas muitas vezes esquecidos e subestimados pelo debate
acadêmico. A partir de um vasto campo de referências, que contem autores como Marx,
Benjamin, Spinoza, Heidegger, Maquiavel, Foucault e Deleuze, os pensadores italianos
constroem uma obra que dialoga e confronta as principais questões do nosso tempo.

O Direito Constitucional não pode restar indiferente às reformulações, por eles


engendradas, de dois temas centrais da teoria da constituição: o estado de exceção e o
poder constituinte. Pontos nevrálgicos dos debates jurídico e político, por
problematizarem a complexa e tortuosa relação entre direito e política, estes conceitos
são amplamente reinterpretados pelos dois autores, de modo a explicitarem as questões
centrais do mundo contemporâneo.

O presente artigo almeja contribuir para uma mais acurada análise do pensamento
agambeniano, a partir das consonâncias e dissonâncias existentes entre ele e Negri. De
fato, busca-se, com base no confronto de idéias, a construção de conceitos mais precisos
para a intervenção e compreensão da realidade.

Deste modo, inicialmente, se procederá a uma breve exposição da crítica de Negri ao


constitucionalismo, com ênfase nos aspectos que amparam suas divergências em relação
a Agamben. O ponto central é sua reflexão sobre o conceito de poder constituinte,
estruturada a partir de uma ampla análise histórica acerca de alguns movimentos
revolucionários modernos. Posteriormente, com a exposição das questões e preceitos de
Giorgio Agamben, em especial suas construções teóricas sobre a idéia de estado de
exceção, serão analisados os pontos de convergência e discordância entre os autores.

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1- Negri e a crítica à mistificação constitucionalista

1.1- Modernidades e Imanência

Negri contesta à percepção da modernidade como um devir unitário e a compreende


enquanto crise. O autor destaca a existência de uma modernidade alternativa, que
propõe uma resposta diversa ante o descentramento de mundo, ocasionado pela
Renascença. Não se trata de um recurso a outra transcendência, em substituição à
legitimidade teológica então destronada, mas da afirmação de uma concepção imanente
do mundo. Ele assevera:

“A modernidade não é um conceito unitário, mas aparece, de preferência, em dois


modos. O primeiro modo é o que já definimos, um processo revolucionário radical.(...)
A própria modernidade é definida por crise, uma crise nascida do conflito ininterrupto
entre as forças imanentes, construtivas e criadoras e o poder transcendente que visa
restaurar a ordem.”[1]

Há, portanto, a dicotomia entre a imanência e transcendência, entre a linhagem


intelectual majoritária e a perspectiva marginal do mundo. Negri identifica três
pensadores como os principais expoentes desta perspectiva não hegemônica: Maquiavel,
Espinosa e Marx.

A descoberta do plano de imanência foi o evento central da modernidade, sendo toda a


relevante redefinição das antigas crenças e relações, então transcorrida, vinculada a esta
questão. A imanência compreende o real a partir de um viés não hierarquizado, não se
trata de identificar um ponto fixo ou pressupor um a priori, mas de constituir a partir da
práxis uma teoria que explicite os processos de constituição e reprodução do mundo. A
realidade é causa dela mesma, atual e imanente, não anterior e transcendente. Neste
sentido, a idéia espinosana de Deus como causa sui é bem emblemática, uma vez que
inexiste uma figura divina anterior à gestação do real, Deus é a natureza e causa a si
mesmo. O fora não existe, há somente o plano de imanência.

O plano de imanência outorga ao homem o protagonismo da constituição do mundo, “...


os poderes de criação que anteriormente tinham sido consignados exclusivamente aos
céus são agora trazidos para a terra.” [2]. De fato, nas mais diversas searas como a
política, a ciência e as artes o homem se impõe como categoria central e representa a
natureza como realidade a ser modificada pelo engenho humano.

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As filosofias fundadas na transcendência, por sua vez, compreendem a existência
sempre a partir uma referência externa, que organiza o real. A busca por um centro é
incessante, sempre há um ponto fixo. Michel Serres assevera:

“Ele (o ponto fixo) é o lugar necessário do pensamento, quando este deseja a certeza, o
rigor, a harmonia...O ponto fixo torna-se ponto de vista. Agrupado em torno dele, todo
um sistema de pensamentos se constrói, que permite meditar sobre a aparência e a
realidade, a percepção e a razão, até mesmo sobre a natureza do espírito.”[3]

Vige o primado absoluto da razão. O exemplo mais elucidativo é o “cogito” cartesiano.


Ante a dúvida, a incerteza e o ceticismo, Descartes encontra um ponto fixo para sua
filosofia: o sujeito pensante. Torna-se, então, possível conhecer a totalidade do real,
com a mais absoluta precisão.

O pensamento kantiano é outro paradigma desta tradição teórica. Toda sua filosofia
decorre da busca pelos limites do conhecer, tanto em relação à natureza quanto no que
tange à moralidade. Nesta empreitada o autor determina referências que tornem seu
juízo seguro, tais como o sujeito cognoscente, em relação à razão pura, e a vontade
livre, em relação a razão prática. Estes são os centros que o permitem delinear os
contornos da razão.

1.2-Poder Constituinte e Constitucionalismo

Negri compreende a dinâmica política a partir do conceito de poder constituinte, termo


característico do pensamento jurídico, que é por ele utilizado de modo dissonante em
relação à tradição. Ao invés de, aos moldes do constitucionalismo, entender o referido
conceito como fator de gestação de uma carta constitucional, que imediatamente, após a
confecção desta, cessa,[4] o autor afirma a expressão contínua do poder constituinte. Ele
é a manifestação da potência democrática, fundando o político ao invés de constituir
mera derivação de um social hipotético. Com efeito, esta concepção não desvincula a
expressão constituinte das condições materiais às quais ela se submete, mas afirma sua
potência de inovação, de mutação da realidade. Ele afirma:

“... o paradigma constitucionalista é sempre o da “constituição mista”, da mediação da


desigualdade e na desigualdade, portanto um paradigma não democrático. O paradigma
do poder constituinte, ao contrário, é aquele de uma força que irrompe, quebra,
interrompe, desfaz todo equilíbrio preexistente e toda continuidade possível. O poder
constituinte está ligado à idéia de democracia, concebida como poder absoluto.

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Portanto, o conceito de poder constituinte, compreendido como força que irrompe e se
faz expansiva, é um conceito ligado à pré-constituição da totalidade democrática.”.[5]

O poder constituinte opõe-se ao princípio constitucionalista de constante limitação da


expressividade democrática. Com efeito, o autor diverge da tradição majoritária do
pensamento jurídico-político ocidental ao questionar a identidade entre
constitucionalismo e democracia. Distintamente do ideário liberal, que almeja pela
constante limitação da potência democrática, ele filia-se a tradição espinosana e clama
por um governo absoluto. Negri assevera: “... de fato, a democracia é teoria do governo
absoluto, ao passo que o constitucionalismo é teoria do governo limitado e, portanto,
prática de limitação da democracia.”[6] Não há um pressuposto constitucionalista ao
governo democrático, mas uma contradição entre as referida teorias.

“Vale a pena, então, utilizar tal oposição para identificar no poder constituinte
(precisamente na medida em que ele é o contrário da idéia constitucionalista de “checks
and balances”) o signo de uma expressão radical da vontade democrática. Com efeito, a
práxis do poder constituinte foi a porta pela qual a vontade da multidão (multitudo) – e
consequentemente a questão social – entrou no sistema político, destruindo o
constitucionalismo, ou pelo menos debilitando-o intensamente.”[7]

O constitucionalismo se vincula, necessariamente, à idéia polibiana de constituição


mista. Políbio enfrenta uma questão central para a filosofia política: como construir
governos estáveis. Com este escopo, o autor tenta constituir um modelo governamental
infenso a anaciclosis, ciclo pelo qual passariam os três tipos puros de governo, no qual
estes arquétipos se degenerariam em três formas alteradas e depois retornariam a outra
forma pura, em uma ordem incessante. Deste modo, a monarquia, a aristocracia e a
democracia, se converteriam em ditadura, oligarquia e olocracia.

Como solução, Políbio prescreve a constituição de um governo que conjugue as três


formas puras, absorvendo suas vantagens e expurgando seus problemas. Tal
perspectiva não se adequa a uma concepção radical da democracia, uma vez que almeja
a contenção do princípio democrático, a partir de sua combinação com elementos das
demais formas de governo.

Negri explicita que a formula constitucionalista da separação de poderes, desenvolvida


por Montesquiou, se enquadra precisamente no supracitado modelo. Deste modo, o
parlamento representaria o princípio democrático, o judiciário o aristocrático e o
executivo o monárquico.

1.3-Multidão

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Insta definir, entretanto, quem é o titular deste poder constituinte, qual é o sujeito
adequado para o procedimento absoluto. Negri refuta as opções historicamente
apresentadas pelo pensamento jurídico, sob o argumento de que todas objetivavam
limitar a expressão do poder constituinte. A nação resta insuficiente em virtude de sua
generalidade, possibilitando uma polissemia que proporciona manipulação. Este
problema pode ser contornado caso o termo seja analisado sob uma perspectiva
histórica, todavia é deste modo bloqueada a potência inovadora do poder constituinte. O
povo também padece da mesma questão no que tange a generalidade, além de restringir
a expressão constituinte condicionando-a a representação. A delimitação jurídica, por
sua vez, retira todo o caráter inovador do fenômeno, ao sempre enquadrá-lo em uma
perspectiva normativa. Destarte, ante os limites do pensamento jurídico tradicional,
Negri almeja formular, a partir da experiência histórica, um novo conceito que se
adeque a esta estrutura.

Não se trata, contudo, de um sujeito a ser inferido por de procedimentos racionais, mas
de uma subjetividade constantemente construída a partir da ontologia, da práxis. Negri,
não por acaso, recorre ao conceito espinosano de multidão para caracterizá-la. Ele
refuta, deste modo, a perspectiva necessariamente autoritária do uno, presente no povo e
na nação, em prol do múltiplo, recusando qualquer forma prestabelecida. O uno é o
modus operandi da transcendência, da modernidade hegemônica. O autor ressalta:

“Toda a tradição da teoria política parece concordar acerca de um princípio


fundamental: somente o uno pode governar, seja ele o monarca, o Estado, a nação, o
povo ou o partido (...) Deve ficar claro, no entanto, que este princípio do pensamento
político segundo o qual só o uno pode governar solapa e nega o conceito de democracia.
Neste sentido, a democracia, assim como a aristocracia, é apenas uma fachada, pois na
realidade o poder é monárquico.”[8].

E ainda:

“A multidão é um conjunto de singularidades que produzem uma vida comum; é uma


espécie de carne social que se organiza num novo corpo social(...) O poder constituinte
da multidão, de um ponto de vista ontológico, e portanto a expressão dessa
complexidade é a chave que atravessa o comum biopolítico para expressá-lo de maneira
cada vez mais ampla e efetiva.” [9]

Negri afirma a democracia radical, incompatível com a categoria do uno que recai,
necessariamente, na perspectiva da soberania. Esta se identifica com o poder
constituído, não com o constituinte, com a opressão e não com a resistência. De fato, a
verdadeira democracia se vincula a singularidade e esta só é possível sob o viés

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democrático do poder constituinte. O constitucionalismo liberal opera com a categoria
de indivíduo, incongruente com a perspectiva do singular, já que parte da identidade,
não da diferença.

A multidão pressupõe um comum, que é sua condição e produto. [10] Entretanto,


diversamente do ideário liberal, não há oposição entre o comum e o indivíduo, aqui
entendido como singularidade, uma vez que, como a psicanálise bem assevera, o
singular depende do comum para se constituir. Negri, neste viés, destaca: “Não existe,
portanto, uma singularidade que não seja ela própria estabelecida no comum.”[11]. O
singular não imerge no comum, matéria indistinta, ele continuamente afirma sua
diferença. Com efeito, é intensificando a interação com o comum que o singular
expressa seu mais alto grau de potência. Negri ampara-se claramente na política de
Espinosa, que assevera:

“Se duas pessoas concordam entre si e unem as suas forças, terão mais poder (potentia)
conjuntamente e, consequentemente, um direito superior sobre a natureza que cada uma
delas não possui sozinha e, quanto mais numerosos forem os homens que tenham posto
as suas forças em comum, mais direito terão eles todos.”[12]

De fato, não é a multidão, constituída por uma multiplicidade de singularidades, que


flerta com a anulação do singular ante o todo, mas o pensamento constitucionalista-
liberal, o qual resta vinculado às premissas de identidade e essência individual para
construir seu modelo de indivíduo. Não é a concepção imanente da diferença, mas o
essencialismo transcendental do liberalismo, que subsumindo as existências singulares a
um modelo de indivíduo ou cidadão suprime o princípio de diferença presente em cada
homem, construindo um arquétipo autoritário com aparência democrática.

1.4-Controle do demos e soberania

Todo o pensamento político moderno hegemônico pode ser compreendido, segundo


Negri, como um esforço de contenção do demos, almejando usurpar o poder constituinte
da multidão. Com efeito, os conceitos de Estado e soberania nada mais são do que
aparelhos de captura dessa potência.[13] A soberania, bem caracterizada pela forma
schmittiana de decisão sobre a exceção, sempre remete a uma unidade.

Entretanto, mesmo ante este arquétipo dominante, Negri afirma o papel central da
multidão na dinâmica política. Isto decorre do aspecto necessariamente dual do poder
soberano, que não tem substância autônoma, ele depende da existência da classe
dominada. Com efeito:

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“A teoria da soberania leva muitos a entender o mundo da política como terreno do
próprio soberano, centrando-se por exemplo no Estado, mas esta é uma visão muito
estreita do político. A soberania tem necessariamente dois aspectos. O poder soberano
não é uma substância autônoma e nunca é absoluto, antes consistindo numa relação
entre governantes e governados, entre proteção e obediência, entre direitos e obrigações.
Sempre que tiranos tentaram transformar a soberania em algo unilateral, os governados
acabaram se revoltando e restabelecendo a natureza bipolar da relação. Os que
obedecem não são menos essenciais ao conceito e ao funcionamento da soberania do
que aquele que comanda.”(GRIFOS NOSSOS)[14]

Como lembra Negri, através de Maquiavel, nenhum governo se ampara exclusivamente


na força, fazendo-se necessário um mínimo de obediência. A multidão sempre
determina o governo, nem que seja através dos esforços que este empreende para
dominá-la.

Ademais, em outro aspecto, o Estado nada mais é do que seus cidadãos, é a partir deles
que o organismo estatal se constitui e funda sua autoridade. Deste modo, o poder
soberano sempre encontra um limite na vida dos súditos, não podendo eliminá-los sob
pena de sua própria extinção. Negri destaca: “O poder soberano só se sustenta se
preservar a vida de seus súditos, ou pelo menos sua capacidade de produção e consumo.
Se chegasse a destruir isso, qualquer poder soberano necessariamente destruiria a si
mesmo.”[15]

Dado este caráter fundador da multidão, que sempre constitui o Estado, o autor defende
a tese da anterioridade da resistência ante a opressão, o contrapoder antecede o poder.
De fato, não resta outra alternativa, visto que a fundação e a inovação sempre decorrem
do poder constituinte, em virtude da sua condição de forma formante. O poder
constituído é mera conseqüência deste processo. Todavia, quando o poder constituinte
transmuta-se em constituído, este se vê enredado nas teias do Estado e a multidão resta
subjugada pela máquina de captura da soberania. Toda vez que a expressão constituinte
cessa, que o movimento estanca, a democracia recebe limites. [16]

Evitar esta constante restrição de potência, o recorrente termidor que impede a


manifestação constituinte, impele Negri a pensar acerca de um novo modelo de
institucionalidade, que permita a contínua expressão desta torrente fundadora. Ele
afirma:

“No momento em que a potência se institucionaliza, ela deixa de ser potência, declara
jamais tê-lo sido. Só há uma condição adequada à definição de um conceito de
soberania ligado ao de poder constituinte, mas é paradoxal: que ela exista como práxis
de um ato constitutivo, renovado na liberdade, organizado na continuidade de uma
práxis livre. Entretanto, isto contraria toda a tradição do conceito de soberania e suas
possibilidades explicativas. Em conseqüência há uma contradição absoluta entre o
conceito de soberania e o de poder constituinte. Pode-se então concluir que, se existe

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uma via independente para o desenvolvimento do conceito de poder constituinte, ela
exclui todo recurso ao conceito de soberania: ela está posta, em termos absolutos, na
base do próprio poder constituinte, e tenta resolver a partir dele (e de nada mais) toda
conseqüência constitucional.”[17]

E ainda: “(...)a soberania e a autoridade devem ser destruídas (...) A destruição da


soberania deve ser organizada de tal como a andar de mãos dadas com a constituição de
novas estruturas institucionais democráticas baseadas nas condições vigentes.”[18]

A reconstrução histórica dos mecanismos de contenção do poder constituinte almeja


compilar fundamentos para esta nova institucionalidade democrática. Todavia, deve-se
salientar que não se trata prescrever uma forma prévia ou construir racionalmente um
melhor modelo. O pensamento da imanência se constitui a partir da práxis, as formas
desenvolvem-se em função da empiria e também a conformam. Não se pode confundi-
lo com o supracitado procedimento transcendental, que produz, sob o pretexto de
libertar, nova amarras para a expressão constituinte.

2- Agamben e o Estado de Exceção

2.1- O Estado de Exceção

Carl Schmitt define o soberano como aquele que decide sobre o estado de exceção. Ele
utiliza este termo, que remete ao “estado de sítio” do termidor napoleônico, para afirmar
a soberania enquanto conceito limítrofe entre o direito e a política.

Com efeito, sua construção de soberano se remete ao pensamento de Hobbes, ao derivar


a autoridade da exclusão ao ordenamento jurídico. Assim como a autoridade suprema
hobbesiana era a que não pactuou, resguardando seu direito natural intacto, mas a quem
eram transferidos poderes ilimitados estabelecidos neste pacto, o soberano schmittiano
“... se coloca fora da ordem jurídica normalmente vigente, porém a ela pertence , pois
ele é o competente para a decisão sobre se a constituição pode ser suspensa in
toto.”[19].

A referência ao pensador inglês não é acidental. Mesmo em contextos muitos diversos e


guardando profundas diferenças, como o tratamento da questão religiosa, o escopo de
Hobbes e Schmitt é o mesmo: instaurar uma autoridade transcendente estável. Ante a
primordial preocupação de segurança, ambos defendem uma concepção unitária do
poder, que impediria a emergência dos devires instáveis da multidão. Trata-se de um
exemplar esforço de contenção do demos.

Schmitt vincula a validade do ordenamento jurídico a sua normalidade, mudadas as


condições não mais vige a norma. Ele assevera:

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“Toda norma geral exige uma configuração normal das condições de vida nas quais ela
deve encontrar aplicação segundo os pressupostos legais, e os quais ela submete à sua
regulação normativa. A normas necessita de um meio homogêneo. Essa normalidade
fática não é somente um “mero pressuposto” que o jurista pode ignorar. Ao contrário
pertence a sua validade imanente. Não existe norma que seja aplicável ao caos. Deve ser
criada uma situação normal...”[20].

O soberano é quem avalia a normalidade das condições, suspendendo o Direito caso


julgue necessário e decidindo sob o estado de exceção. A decisão é sempre inovadora,
Schmitt insere a criação no seu conceito, de modo que não existiriam decisões
meramente declaratórias. Necessariamente, “... a decisão nasce do nada.” [21].

De fato, o autor sempre remete a decisão a uma vontade pessoal, opondo-se às


mistificações empreendidas pelo normativismo. Também a isso se deve o caráter
sempre inovador das decisões, uma vez que o paradigma da personalidade, no qual se
insere a política, não se guia pelas mesmas leis gerais e necessárias da seara das ciências
da natureza.

Agamben identifica na exceção de Schmitt o mecanismo pelo qual o poder atua sobre a
vida. A soberania se funda através da afirmação de uma transcendência, de um fora. O
estado de exceção é esta zona entre o interno e o externo, o direito e o fato. Com efeito,
é a exceção que legitima o sistema, vinculando a norma ao contexto no qual esta se
insere. O autor ressalta:

“Não é a exceção que se subtrai à regra, mas a regra que, suspendendo-se, dá lugar à
exceção e somente deste modo se constitui como regra, mantendo-se em relação com
aquela. O particular “vigor” da lei consiste nessa capacidade de manter-se em relação
com uma exterioridade. Chamemos relação de exceção a essa forma extrema da relação
que inclui alguma coisa unicamente através de sua exclusão.”[22]:

Ele também afirma: “O ‘ordenamento do espaço’, no qual consiste para Schmitt o


Nómos soberano, não é, portanto, apenas tomada de terra, fixação de uma ordem
jurídica e territorial, mas, sobretudo, ‘tomada do fora’, exceção.”[23].

Agamben identifica um processo histórico no qual o poder soberano dirige-se para o


controle total sobre a vida, expressão máxima do biopoder. Não haveria mais fora,
implementando-se a total indistinção entre direito e fato com a vigência do estado de
exceção permanente que atualmente se delineia. Não que a lógica da exceção seja
recente, o autor a remete a Grécia clássica, o que emerge como inédito é o caráter
permanente desta exceção, que passa de medida extraordinária a prática constante do
poder.

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2.2-O soberano , o homo sacer e o campo.

Se a modernidade intensificou a politização da vida, com a transformação da bios em


zoe[24], ou melhor, com a progressiva indiscernibilidade entre a vida política e a vida
biológica, a contemporaneidade aprofunda ainda mais tal processo. A decisão sobre a
vida passa a ser inteiramente política, com a morte biológica sendo substituída pelo
fluido conceito de morte cerebral. Ademais, os conceitos jurídicos indeterminados,
antes considerados marginais para Schmitt, ocupam agora o centro do debate
contemporâneo. Centrais para a compreensão deste novo momento da política
contemporâneos são, ao lado da supracitada idéia de soberania, os conceitos de homo
sacer e campo.

O homo sacer é uma antiga figura do direito romano, representativa do homem que
pode ser impunemente morto por qualquer um da comunidade, mas cujo sacrifício é
terminantemente vedado. A morte somente pode encontrá-lo fora dos limites
ritualísticos. Impõe-se já neste ponto uma discussão sobre o caráter do sacro, à qual
Agamben oferece uma reposta distinta das célebres assertivas de Freud e da
antropologia clássica. O sagrado não seria uma etapa intermediária entre o profano e o
divino, mas um modo de expressão da exceção que caracteriza a vida nua, aquela que
não é zoe ou bios, mas que se encontra desterritorializada sob os moldes do bando
soberano. O homo sacer representa uma dupla exceção, que expressa a própria
estruturação do poder soberano. A ele não se aplica a ordem jurídica, o sacro não se
insere nela. Seu lugar é o fora, espaço em que o ordenamento jurídico não se imiscui, e
do qual ele só pode ser retirado pela ação do soberano, decidindo sobre a exceção. A
relação entre o homo sacer e a ordem estatal ocorre pela exceção soberana, constitui, na
verdade, uma não relação, na qual o ser sacro se inclui em virtude da exclusão.
Reiterando a afirmação supracitada de Agamben: “Chamemos relação de exceção a essa
forma extrema da relação que inclui alguma coisa unicamente através de sua
exclusão.”[25] De fato, soberano e homo sacer são, na verdade, figuras simétricas:

“Aqui a analogia estrutural entre exceção soberana e sacratio mostra todo o seu sentido.
Nos dois limites extremos do ordenamento, soberano e homo sacer apresentam duas
figuras simétricas, que têm a mesma estrutura e são correlatas, no sentido de que o
soberano é aquele em relação ao qual todos os homens são potencialmente homines
sacri e homo sacer é aquele em relação ao qual todos os homens agem como
soberanos”[26]

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Os dois corpos do rei representam, na verdade, mais do que a intuição de
Kantoriwicz[27] apontou. Não se trata somente de um corpo institucional e outro
pessoal, mas da existência, na figura do próprio soberano, da relação que constitui o
centro do poder estatal. O soberano possui, ao lado do seu corpo humano um corpo
sacro. Um corpo público e ritualizado ao extremo, que não mais lhe pertence, e sobre o
qual se funda a relação central da soberania. Mais do que a transcendência da realeza
ante a pessoa do rei, trata-se da afirmação do caráter radical, absoluto e não-humano da
soberania

“Mas, com isso, o sentido da metáfora do corpo político volta-se, de símbolo da


perpetuidade da dignitas a cifra do caráter absoluto e não humano da soberania. As
formulas le mort saisit le vif e le Roi ne meurt jamais devem ser compreendidas de
modo muito mais literal do que se costuma pensar: no momento da morte do soberano é
a vida sacra, na qual se baseava seu poder, que investe a pessoa do sucessor. As duas
fórmulas significam a continuidade do poder soberano somente na medida em que
exprimem, através do obscuro liame com uma vida matável e insacrificável, a sua
absolutez.”[28].

O campo, por sua vez, é para Agamben o paradigma central da política moderna. Mais
do que um evento histórico específico, ele é uma lógica de ordenação da sociedade, que
se vincula à crescente abrangência da vida nua e ao novo conceito de territorialidade
imposto pela onipresença da exceção. O estado de direito, constituído a partir do
controle do território e da concessão de direitos como modo de vinculação dos
indivíduos, não subsiste na lógica desterritorializada do campo. O refugiado é a figura
central da contemporaneidade, um homo sacer sem direitos, uma vez que a validade dos
direito sempre se ateve estritamente relacionada aos limites dos Estados-Nacionais.
Com o progressivo esgarçamento do paradigma nacional ele passa a constituir a regra, o
modelo contemporâneo de cidadania. No campo todos são homines sacri e o estado de
exceção é permanente.

Considerações Finais – Estado de Exceção, Poder Constituinte e Imanência

Emergem, então, as questões: como compreender o estado de exceção sob a perspectiva


da resistência e do poder constituinte? Seria este conceito suficiente para explicitar a
relação dual que constitui a soberania? Negri e Hardt assim se manifestam:

“Como ficará claro adiante, não podemos aceitar em sua generalidade a tese de
Agamben. O estado de exceção ou direito de exceção define apenas os atos dos que têm

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o poder, e não os atos daqueles que o buscam, querem-no ou pretendem destruí-lo ou
derrubá-lo. O poder constituinte provém apenas dessa segunda categoria, e não deve ser
confundido com os atos daqueles que detêm institucionalmente o poder de exceção, o
poder de suspender as garantias legais e o poder da ditadura.” [29].

O estado de exceção não explica, portanto, todo o complexo mecanismo da soberania,


uma vez que, enquanto relação, esta não pode ser compreendida apenas do ponto de
vista dos dominantes. A soberania é uma forma de jugo, que necessita dos cidadãos para
implementar-se. Sem eles, carece de substância. Como já foi anteriormente citado: “Os
que obedecem não são menos essenciais ao conceito e ao funcionamento da soberania
do que aquele que comanda.” [30].

Ademais, a compreensão da política a partir da exceção acaba por restringi-la a uma


dimensão meramente estatal, ignorando as linhas de fuga que a resistência traça para
além do Estado. O horizonte da política identifica-se com o do Estado e a multidão é
compreendida ante um ponto de vista passivo, sempre representada a partir do poder,
como um instrumento deste. Resta olvidado o papel fundador e inovador do poder
constituinte.

A narrativa agambeniana aborda a possibilidade de um direito sem força,como


preceituado por Benjamin, mas tacitamente a refuta. Explicita-se um arquétipo, o
campo, no qual a resistência não mais é possível. Passo a passo, todos se tornam
autômatos obedientes.

Negri, por sua vez, não admite a hipótese de uma obediência irrestrita. A resistência
sempre virá, pela própria constituição da natureza humana. Com efeito, a disjunção
entre os autores pode ser remontada a suas referências intelectuais. Enquanto a
representação hobbesiana da soberania feita por Agamben, a partir do filtro de Schmitt,
reconhece a possibilidade de uma renúncia das potências individuais na constituição do
coletivo ou do público, Negri opta por vertente distinta. A partir de Spinoza,
especialmente o do capítulo XVI do Tratado Político, ele recusa a identidade entre
cessão e renuncia, afirmando a impossibilidade ontológica do fim da resistência. A
chave desta tese está no conceito spinozano de conatus. A despeito de suas formulações
racionais, o homem sempre tende a perseverar na existência, a atividade é inerente a
natureza humana, princípio basilar da filosofia spinozana.[31] Deste modo, mesmo
quando sob um regime de obediência e dominação, a resistência traça e traçará linhas de
fuga.

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[1] NEGRI, Antonio e HARDT, Michael, Império, pág. 92-93.

[2] Ibidem, pág. 91.

[3] SERRES, Michel; Le système de Leibniz et sés modeles mathématiques; PUF;


Paris; 1968; tradução do excerto por Maurício Rocha, pág. 1..

[4] “O que é, na perspectiva da ciência jurídica, o poder constituinte? É a fonte de


produção das normas constitucionais, ou seja, o poder de fazer uma constituição e assim
ditar as normas fundamentais que organizam os poderes do Estado. Em outros termos, é
o poder de instaurar um novo ordenamento jurídico e, com isso, regular as relações
jurídicas no seio de uma nova comunidade.” – NEGRI, Antonio, O Poder Constituinte,
pág. 8.

[5] NEGRI, Antônio, O Poder Constituinte, pág. 21.

[6] Ibidem, pág. 8.

[7] Ibidem, O Poder Constituinte, pág. 20-21.

[8] NEGRI, Antônio e HARDT, Michael Multidão, pág. 412.

[9] Ibidem, pág. 436.

[10] “Paradoxalmente, o comum se manifesta nos dois extremos as produção


biopolítica: ele é ao mesmo tempo o produto final e a condição preliminar da
produção.” – Ibidem, pág.416.

7708
[11] Ibidem, pág. 416.

[12] ESPINOSA, Bento, Tratado Político, in Os Pensadores, pág. 310.

[13] DELEUZE, Gilles, Mille Platô, vol.5.

[14] NEGRI, Antônio e HARDT, Michael, Multidão, pág.415.

[15] Ibidem, pág. 43.

[16] “...a transcendência do poder constituinte é a sua negação.” - NEGRI, Antônio, O


Poder Constituinte, pág.14.

[17] Ibidem, pág. 16.

[18] NEGRI, Antônio e HARDT, Michael, Multidão, pág. 442.

[19] SCHMITT, Carl, Teologia Política, pág. 8.

[20] Ibidem, pág. 13.

[21] Ibidem, 30.

[22] AGAMBEN, Giorgio, Homo Sacer, pág. 26.

[23] Ibidem, pág. 26-27.

[24] A referência aqui é a distinção aristotélica entre bios, vida biológica, e zoe, vida
política ou submetida aos padrões culturais, utilizada por Agamben no início do Homo
sacer, com o escopo de afirmar uma nova distinção ontológica fundamental do político.
Mais do que a dicotomia schmittiana entre amigo e inimigo, a disjunção fundamental do
pensamento político ocidental se refere aos conceitos de inclusão e exclusão, presente já
nas referidas construções de Aristóteles e fundamental para compreender a problemática
do Estado de Exceção.

[25] AGAMBEN, Giorgio, Homo Sacer, pág. 26.

[26] Ibidem, pág. 92.

[27] KANTOROWICZ, Ernst Hartwig,. Os dois corpos do rei: um estudo sobre teologia
politica medieval. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. 547 p.

[28] AGAMBEN, Giorgio, Homo Sacer, pág. 108.

[29] NEGRI, Antônio e HARDT, Michael, Multidão, pág. 455.

[30] Ibidem, 415.

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[31] Cabe ressaltar que a existência de um modo singular é para Spinoza sempre ativa e
de acordo com a sua essência que nada mais é do que potência atual. Como ele mesmo
afirma, não é preciso morrer para virar cadáver.

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