Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Filosofia antiga
Material Teórico
O nascimento da filosofia
Revisão Textual:
Profa. Dra. Patrícia Silvestre Leite
O nascimento da filosofia
• O nascimento da filosofia
• Do mito à Filosofia
• Tales de Mileto
Nessa unidade, iremos definir sucintamente a origem da Filosofia como ciência, explicando
seus princípios e as diferentes formas de explicar a origem do mundo físico. Além disso, vocês
terão uma ampla visão das primeiras escolas filosóficas, seus representantes e princípios.
Vocês irão assistir aos vídeos e será disponibilizado o material teórico para melhor elucidar
os conceitos que envolvem a cartografia.
No Fórum de Discussão, vocês terão a oportunidade de discutir sobre o tema com seus
colegas e tutor. É muito importante fazer as leituras e expor sua opinião no Fórum, pois é o
momento de aprofundarmos mais sobre o tema.
No Material Complementar, como sugestão de leitura, há a indicação de links relacionados
à filosofia.
Fiquem atentos aos prazos de encerramento dessa unidade e procurem participar de todas
as atividades.
5
Unidade: O nascimento da filosofia
Contextualização
Disponível em : http://veele.wordpress.com/filosofos-pre-socraticos-em-quadrinhos/presocraticospag7/
6
O nascimento da filosofia
Você Sabia ?
Logia vem da palavra logos, que significa pensamento racional, discurso, estudo. A palavra
cosmos significa ordenação do mundo e da natureza.
7
Unidade: O nascimento da filosofia
Do mito à Filosofia
A característica da humanização dos deuses merece uma atenção especial. Tal antropomorfismo
dos deuses possui um ponto negativo e outro positivo para a racionalização do mundo.
Positivamente, tanto aproxima os deuses da compreensão humana, como valoriza as ações
humanas virtuosas na medida em que os personagens mitológicos simbolizavam as virtudes
morais. Negativamente, como havia intervenção divina no curso da vida, conforme as paixões
dos deuses, isto é, o arbítrio dos deuses, podia-se alterar repentinamente o curso da vida dos
homens, isso limitava a racionalização. Em contrapartida, a filosofia exigirá uma legalidade
universal, exercida impessoal e logicamente.
Enfim, de modo geral, podemos concluir que essas três características afastavam o monstruoso e
traziam racionalidade e clareza, o que conduzirá à visão filosófica do universo governado pela razão.
Vamos traçar agora algumas diferenças entre mito e logos?
Primeiramente, coloquemos a seguinte questão: o mito pertence a culturas inferiores,
primitivas ou atrasadas, enquanto o pensamento lógico ou racional pertence a culturas
superiores, civilizadas e adiantadas?
A partir do século XVIII, com a filosofia da Ilustração e do século XIX, com o positivismo de
Comte, o mito era considerado uma fase de um processo evolutivo do espírito humano e da
civilização anterior ao pensamento lógico e, portanto, próprio ao raciocínio primitivo e atrasado.
Atualmente, porém, em contraposição a essa concepção evolutiva, acredita-se que mito e
logos coexistem, mas são distintos e, muitas vezes, opostos. Enquanto o pensamento mítico
pertence ao campo do pensamento e da linguagem simbólicos, o pensamento lógico pertence
ao campo do pensamento e da linguagem conceituais. Enquanto a imaginação cria mitos,
o pensamento elabora conceitos. Enquanto o mito possui um caráter mágico-maravilhoso e
simbólico, o que é manifesto nas artes, logos possui um caráter conceitual, o que é próprio das
ciências. Enfim, podemos concluir que o pensamento mítico não é próprio de uma civilização
atrasada e primitiva, mas uma característica inerente à imaginação humana e existe atualmente.
Segundo o antropólogo Claude Levi-Strauss, que procurou mostrar que os chamados “povos
selvagens” não eram atrasados por operarem com o pensamento mítico, mitificar é como fazer
bricolage, isto é, produzir um objeto novo a partir de pedaços e fragmentos de outros objetos.
8
O pensamento mítico faz exatamente a mesma coisa, ou seja, vai reunindo as experiências,
as narrativas, os relatos até compor um mito geral. Para o antropólogo, são três as funções do
mito: a) explicativa: o presente é explicado por alguma ação passada; b) organizativa: organiza
as relações sociais (o mito do Édipo, por exemplo, tem a função de garantir a proibição do
incesto); c) compensatória: os erros passados foram corrigidos no presente. Em resumo, o mito
organiza a realidade dando às coisas um sentido analógico, metafórico, e, portanto, simbólico.
Os símbolos formados a partir de analogias e metáforas são imagens com sentidos múltiplos
que encarnam a própria coisa, ou seja, o símbolo mítico encarna o objeto simbolizado, portanto,
ele não o representa, mas é o próprio objeto. Por exemplo, a luz pode simbolizar o fogo, o
calor, a paixão, o divino e até o próprio conhecimento, na medida em que este ilumina a
verdade. Como dissemos, o símbolo mítico encarna o simbolizado, ou seja, a luz não representa
a coisa simbolizada, mas é a própria coisa, é o fogo, é o calor, é a paixão, é o divino e é o
próprio conhecimento. Enfim, o pensamento mítico é um pensamento no qual as palavras dão
existência ou morte às próprias coisas. Ele opera por bricolage, enquanto o pensamento lógico é
por método, isto é, pela articulação racional de elementos. Um conceito ou ideia não simboliza
algo, mas descreve, explica ou define seu objeto. Ele não encarna a própria coisa, mas exprime
uma apreensão intelectual.
O raciocínio que concebe o conceito ou organiza a experiência ou formula uma síntese lógica
a partir dela, buscando as causas universais e essenciais e, portanto, de modo geral, distinguindo
o modo como a realidade aparece do que ela é em si mesma. O pensamento lógico não opera
acrescentando ou agrupando elementos, como na bricolage, mas a partir de procedimentos
metódicos, opera segundo princípios lógicos, tais quais os princípios de identidade, contradição,
terceiro excluído, razão suficiente e causalidade. Tal distinção entre pensamento mítico e
lógico torna-se evidente a partir da distinção entre pensamento cosmogônico e pensamento
cosmológico elaborados na Grécia Antiga.
O primeiro busca explicar a origem da Natureza através de narrativas mitológicas sobre
as relações sexuais entre as forças naturais divinas, como entre Urano -o céu - e Gaia - a
terra -, primeira geração divina que deu origem a todas as outras, bem como a todas as
coisas naturais. O segundo, o cosmológico, próprio dos filósofos pré-socráticos, buscava
explicar a origem da natureza a partir das relações e transformações entre os elementos
naturais (terra, fogo, água e ar).
Os primeiros filósofos explicavam a origem e a organização de todas as coisas a partir de tais
elementos, considerando-os como forças divinas, mas não mais deuses ou heróis. Antes, com
os mitos, tínhamos, por um lado, vontades divinas divergentes, por outro, Zeus como unificador,
como soberano que impunha certa ordenação e unificação da ação. Depois, com o nascimento
da filosofia, temos por um lado a multiplicidade dos particulares, por outro, a arqué, princípio
neutro divino imparcial constituintes dos seres.
Vemos, portanto, que apesar das distinções fundamentais entre pensamento mítico
e lógico, há um paralelo que nos permite inferir certa continuidade entre as narrativas
míticas e a estrutura do pensamento sistemático filosófico nascente. Podemos concluir
que o nascimento da filosofia se constitui pela busca de um princípio ordenador da
realidade; busca que se traduz pela pergunta: o que é a realidade? Pergunta que se dirige
ao objeto do conhecimento e não ao sujeito que conhece. Não se trata, portanto, de se
perguntar como podemos conhecer a realidade. As coisas nos são dadas, basta conhecê-las.
9
Unidade: O nascimento da filosofia
Não se põe a questão se somos capazes de conhecer, se tal conhecimento é possível. Não se
coloca a pergunta: é possível conhecer x? Se é possível, como conhecemos x? A pergunta
que se coloca no nascimento da filosofia é: o que é x? O que existe? Por que existe? Como é
que existe? Responder a tais questões é buscar pelo princípio que causa e ordena tudo o que
existe na natureza. Por isso eram denominados os primeiros filósofos, filósofos da natureza
ou físicos, os que buscavam a physis, isto é, o movimento originário de todas as coisas.
• tem como pressuposto o fato de que “nada vem do nada”, isto é, de que a realidade é imortal,
é uma força material ou imaterial que origina todas as coisas ao sofrer transformações
visíveis e conforme um sistema interno de compensações ou proporções que asseguram a
ordem estável do mundo;
10
• tal força material ou imaterial de onde tudo brota e para onde tudo regressa é a physis,
princípio primordial constituinte de todos os seres;
• a partir da distinção entre ser e devir, entre uno e múltiplo, alguns dos pré-socráticos
começaram a distinguir realidade e aparência, os seres percebidos pelos nossos sentidos, e
a verdade ou essência invisível aos olhos e visível apenas ao pensamento, desse modo, a
physis, embora manifesta em todas coisas na medida em que as constitui, será visível aos
olhos do espírito e invisível para apercepção sensorial.
Tais filósofos que buscam conceber a physis oculta, desvelando assim a verdade em suas
filosofias, podem ser divididos segundo quatro grandes escolas que, em geral, coexistem:
1. Escola Jônica (Ásia Menor), cujos principais representantes são Tales de Mileto,
Anaximandro de Mileto, Anaxímenes de Mileto e Heráclito de Éfeso;
2. Escola Pitagórica ou Itálica (Magna Grécia), cujos principais representantes são Pitágoras
de Samos, Alcmeão de Crotona, Filolau de Crotona e Árquitas de Tarento;
3. Escola Eleata (Magna Grécia), cujos principais representantes são Xenofanes de Colofão,
Parmênides de Eléia, Zenão de Eléia e Melissos de Samos;
4. Escola Atomista (Trácia), cujos principais representantes são Leucipo de Abdera e Demócrito
de Abdera. Além dos atomistas e, diferentemente das três primeiras escolas que concebiam
a physis como unitária, Empédocles de Agrigeto e Anaxágoras de Clazómena tratavam a
physis como pluralidade. Tem-se, então, uma quarta escola, a Escola da Pluralidade, que
inclui além dos atomistas Leucipo e Demócirto, Empédocles e Anaxágoras.
11
Unidade: O nascimento da filosofia
Tales de Mileto
Tales de Mileto viveu no período entre o final do século VII e meados do século VI a.C. e
parece ter sido um político atuante que pretendeu unir as cidades-Estados da Ásia Menor no
intuito de formar uma confederação contra as ameaças de invasões persas.
Você Sabia ?
Mesmo segundo a tradição dos próprios gregos antigos, Tales foi considerado o primeiro
filósofo por ter afirmado ser a água a origem de todas as coisas. Na verdade, ao afirmar que «tudo
é água», afirma-se que «tudo é um» e isto, mesmo diante da multiplicidade percebida por nossos
sentidos, é o que é o verdadeiro, a essência oculta.
A afirmação é filosófica de Tales, por ser absolutamente sintética, por conceber algo o mais
universal, por apreender pelo pensamento que apenas um é.
E, se do um emerge todo o resto, então este universal está
em relação aos particulares, esta unidade permanece mesmo
determinando causalmente toda multiplicidade existente no
mundo, esta que nos aparece aos sentidos. Não há, portanto,
imagens ou fabulações mitológicas, mas apenas a síntese que
concebe universalmente a realidade, que a explica racionalmente.
Tal postulado filosófico, tal generalização grandiosa, que de
tantos é possível conceber um único elemento, a água, de onde
toda existência singular parte e para onde retorna. Eis a origem
da filosofia. Porém, há uma falha lógica, já notada por Aristóteles, Hércules e Atena. Cerâmica grega antiga,
o princípio universal para todas as coisas singulares também é, 480–470 a.C.
ele mesmo, o elemento água, singular, material.
Segundo Aristóteles,
A maior parte dos primeiros filósofos considerava como os únicos princípios
de todas as coisas os que são de natureza da matéria. Aquilo de que todos
os seres são constituídos, e de que primeiro são gerados e em que por fim se
dissolvem, enquanto a substância subsiste mudando-se apenas as afecções, tal
é, para eles, o elemento, tal é o princípio dos seres; e por isso julgam que nada
se gera nem se destrói, como se tal natureza subsistisse sempre… Pois deve
haver uma natureza qualquer, ou mais do que uma, donde as outras coisas
se engendram, mas continuando ela mesma. Quanto ao número e à natureza
destes princípios, nem todos dizem o mesmo. Tales, o fundador da filosofia, diz
ser água [o princípio] (é por este motivo também que ele declarou que a terra
está sobre água), levando sem dúvida a esta concepção por ver que o alimento
de todas as coisas é o úmido, e que o próprio quente dele procede e dele vive
(ora aquilo de que as coisas vem e, para todos, o seu princípio. Por tal observar
adotou esta concepção, e pelo fato de as sementes de todas as coisas terem
a natureza úmida; e a água é o princípio da natureza para as coisas úmidas
(…).”ARISTÓTELES. Metafísica, I, 3.983 b6 .
12
Conforme o que diz Aristóteles, temos que Tales, a partir de sua observação dos fenômenos
empíricos, vincula a água às coisas que possuem vida, o que o permite inferir tal generalização
de que a água é o princípio de todas as coisas. Além disso, a água é o princípio do devir, isto é,
da mudança que sofrem todas coisas físicas, na medida ela própria se transforma em todas as
coisas, enfim, tudo é uma modificação da água, todas as coisas não são senão variadas formas
da própria água. É claro que isto parece ser cientificamente assombroso, improvável, mas não
se trata de ciência, e sim de filosofia, portanto, do que é assombroso, difícil, oculto aos olhos do
corpo, mas universal, generalizador, real, desvelado aos olhos do espírito.
E, mesmo que, segundo Aristóteles, já tenham dado explicações mitológicas parecida com a
de Tales, isto é, de que o Oceano é o princípio de todos os outros deuses e de todas as coisas do
mundo, mesmo assim,Tales não procura explicar racionalmente a origem de tudo e para onde
tudo retorna, esta mesma, que subsiste na medida em que ela é todas as coisas, isto é, todas as
coisas são modificações da própria água, do que é eterno, do que subsiste sempre, daquilo que
não tem origem, mas que origina tudo o mais.
13
Unidade: O nascimento da filosofia
Material Complementar
14
Referências
ALVES, R. Filosofia da ciência: introdução ao jogo e suas regras. São Paulo:Brasiliense, 1984.
1983.
1996.
JAGER, W. Paidéia: a formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes, 1986.
__________. A filosofia na idade trágica dos gregos. Lisboa: Edições 70, 1978.
15
Unidade: O nascimento da filosofia
SOUZA, J. C. de. Para ler os fragmentos dos pré-socráticos. In: ______. Os pré-socráticos.
São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Coleção Os Pensadores).
VERNANT, J. P. Mito e pensamento entre os gregos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
__________. Mito e tragédia na Grécia Antiga. São Paulo: Brasiliense, 1988. 2 vols.
16
Anotações
17
www.cruzeirodosulvirtual.com.br
Campus Liberdade
Rua Galvão Bueno, 868
CEP 01506-000
São Paulo SP Brasil
Tel: (55 11) 3385-3000