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1
Felipe Souza Dreger Nerya
https://orcid.org/0000-0003-2858-4469
Tendência temporal dos anos potenciais de vida
Ionara Magalhães de Souzab
perdidos por acidentes de trabalho fatais segundo
https://orcid.org/0000-0001-8481-0227
raça/cor da pele na Bahia, 2000-2019
Edna Maria de Araújoc
https://orcid.org/0000-0003-1643-2054
Time trend of potential years of life lost due to fatal occupational
Nelson Fernandes de Oliveirac accidents according to race/skin color in Bahia, 2000-2019
https://orcid.org/0000-0003-0667-0841
Tabela 2 Frequência dos óbitos por acidentes de trabalho, segundo faixa etária e raça/cor da pele, Bahia,
2000 a 2019
Raça/cor da pele*
Total
Faixa etária Branca Preta Parda
n % n % n % n %
16 a 19 anos 12 3,7 11 4,6 54 3,4 77 3,6
20 a 24 anos 37 11,5 21 8,8 163 10,3 221 10,3
25 a 29 anos 33 10,2 32 13,3 205 13,0 270 12,6
30 a 39 anos 77 23,9 60 25 446 28,3 583 27,3
40 a 49 anos 77 23,9 64 26,7 363 23,0 504 23,6
50 a 59 anos 64 19,9 37 15,4 242 15,4 343 16,1
60 a 69 anos 21 6,5 14 5,8 98 6,2 133 6,2
70 anos 1 0,3 1 0,4 4 0,3 6 0,3
Total 322 100 240 100 1.575 100 2.137 100
*Os registros de raça/cor da pele amarela (nenhuma ocorrência) e indígena (dois casos) foram excluídos devido ao baixo número de ocorrências de
acidentes de trabalho entre essas categorias.
No período de 2000 a 2019, verificou-se que, no pardos. De 2000 a 2019, os trabalhadores brancos apre-
estado da Bahia, foram perdidos 64.791,5 anos poten- sentaram, em média, TAPVP de 22,6 anos potenciais de
ciais de vida em decorrência de acidentes de trabalho, vida perdidos para cada 100.000 habitantes, enquanto
dos quais 74,2% (48.068 anos) foram representados os trabalhadores pardos apresentaram 40,7, e pretos
por trabalhadores pardos. Ao se considerar a junção de apresentaram 19,7 (Tabela 3).
pardos e pretos (negros), houve uma perda de 55.322,5 Apesar dos trabalhadores pretos apresentarem
anos potenciais de vida, 85,4% do total (Tabela 3). menor perda de anos potenciais de vida quando com-
Os trabalhadores pretos tiveram a menor perda parados aos brancos, eles morreram mais precoce-
média anual de anos potenciais de vida (362,7 anos). mente (idade média do óbito para pretos de 39,4 anos),
Os trabalhadores brancos tiveram uma perda média assim como os trabalhadores pardos (38,9 anos) em
anual de 473,5 anos, quantitativo um pouco maior que relação aos brancos (40,6 anos) (Tabela 3).
a população preta e bem menor se comparado aos tra- Entre 2000 e 2019, apenas as categorias parda e
balhadores pardos, que apresentaram uma perda média negra apresentaram tendência de aumento com signi-
anual de 2.403,4 anos. A perda média anual de APVP ficância estatística, com VPA de 7,5% (IC95% 0,9% –
para a categoria negros foi de 2.766,1 anos (Tabela 3). 14,6%) e 9,5% (IC95% 5,5% – 13,7%) (Tabela 4).
Em relação à média das TAPVP, foram observa- Entre os trabalhadores brancos, observou-se
das diferenças entre brancos e pardos e entre pretos e tendência crescente e estatisticamente significativa
Tabela 3 Anos Potenciais de Vida Perdidos (APVP) e Taxas de Anos Potenciais de Vida Perdidos (TAPVP)
expressos para 100.000 habitantes e idade na qual, em média, os óbitos ocorreram (IMO) em
decorrência de acidentes de trabalho, segundo raça/cor da pele, Bahia, 2000 a 2019
ANOS
Raça/
cor da TOTAL MÉDIA DP***
pele 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
APVP* 135 305 135 220 445 635 619,5 647 692 299 577,5 717,5 548,5 984 607 422,5 285 157,5 605,0 432,0 9.469,0 473,5 228,3
Branca
TAPVP** 6,4 14,5 6,4 10,5 21,3 30,4 29,7 31 33,1 14,3 27,6 34,3 26,2 46,9 28,9 20 13,5 7,4 29,1 20,8 - 22,6 10,9
IMO*** 36,3 39,5 43 38,6 38,2 41,1 37,4 39,2 41,2 40,1 37,9 41,3 42,6 37,2 43,6 41,8 41,5 47,5 42,5 41,2 - 40,6 2,7
APVP* 67,5 137 90 199,5 244,5 215 267,5 299,5 460 435 407,5 642 622,5 634 719 370 342,5 345 262,5 494,0 7.254,5 362,7 189,0
Preta
TAPVP** 5,7 11,2 7,1 15 17,7 14,9 17,8 19,1 28,2 25,5 22,9 34,6 32,1 31,4 34 16,8 14,9 14,3 10,6 19,2 - 19,7 8,8
IMO*** 36,3 35,8 47,5 41,5 35,1 39,3 40,3 32,6 31,7 36,5 40,9 39,4 37,2 41,2 40 43,6 45,5 43,5 46,1 34,7 - 39,4 4,4
APVP* 677,5 482 277,5 337,5 1.020,0 1.491,0 2.058,0 2.153,0 1.888,5 3.300,5 3.050,5 3.524,0 3.663,5 3.552,5 4.481,5 3.150,5 3.235,5 2.982,0 3.170,5 3.572,0 48.068,0 2.403,4 1.295,7
Parda
TAPVP** 13,6 9,6 5,4 6,5 19,4 28 38,2 39,3 34 58,5 53,3 60,6 62 59,1 73,4 50,7 51,2 46,4 49,5 55,0 - 40,7 20,6
IMO*** 36,1 37,9 35,3 41,9 40,9 34,5 38,8 36,9 38,5 35,6 40,1 39,1 38,1 40,9 40,1 41,9 41,1 39,6 40,6 40,0 - 38,9 2,2
*APVP – Anos Potenciais de Vida Perdidos. **TAPVP – Taxas de Anos Potenciais de Vida Perdidos, segundo composição etária e raça/cor do Brasil,
nos referidos anos. ***IMO – idade média em que o óbito ocorreu. ****Desvio-padrão.
Tabela 4 Variação Percentual Anual (VPA) das Taxas de Anos Potenciais de Vida Perdidos (TAPVP) expressos
para cada 100.000 habitantes para os acidentes de trabalho, segundo raça/cor da pele, na Bahia,
de 2000 a 2019
19
19
20 8
20 8
2017
2017
2016
2016
20 5
20 5
20 4
20 4
2013
2013
2012
2012
20 1
20 1
20 0
20 0
2009
2009
2008
2008
20 7
20 7
20 6
20 6
2005
2005
2004
2004
20 3
20 3
20 2
20 2
2001
2001
2000
2000
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
0
0
0
0
0
0
0
0
20
20
Anos Anos
Modelo TAPVP (Branca) Modelo TAPVP (Preta)
C D
80 70
70 60
Taxa de APVP por 100.000
10 10
0
19
19
20 8
20 8
2017
2017
2016
2016
20 5
20 5
20 4
20 4
2013
2013
2012
2012
20 1
20 1
20 0
20 0
2009
2009
2008
2008
20 7
20 7
20 6
20 6
2005
2005
2004
2004
20 3
20 3
20 2
20 2
2001
2001
2000
2000
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
0
0
0
0
0
0
0
0
20
20
Anos Anos
Modelo TAPVP (Parda) Modelo TAPVP (Negra)
Nota: análise de Joinpoint para os trabalhadores de raça/cor branca (A), preta (B), parda (C) e negra (D) apresentando as taxas brutas ( ) e o ajuste do modelo ( ).
Figura 1 Análise de Joinpoint das Taxas de Anos Potenciais de Vida Perdidos (TAPVP) expressos para 100.000
habitantes para os acidentes de trabalho, segundo a raça/cor da pele, Bahia, no período de 2000 a 2019.
Considerando toda a série, destaca-se que a VPA A diferença quantitativa absoluta e relativa de
das TAPVP entre trabalhadores pardos e negros foi APVP entre trabalhadores pardos e brancos pode estar
2,3 e 3,0 vezes a VPA dos trabalhadores brancos, relacionada às iniquidades que integram o regime
respectivamente. produtivo e a organização do trabalho, que produzem
vulnerabilidade para negros. Pretos e pardos apresen-
tam características socioeconômicas similares entre si
Discussão e diferentes daquelas apresentadas pela população de
raça/cor da pele branca. Essa histórica e sistemática
A análise dos APVP decorrentes de acidentes clivagem racial, que reserva o desemprego, o subem-
de trabalho segundo raça/cor da pele, no estado da prego, a informalidade e as piores ocupações na eco-
Bahia, de 2000 a 2019, mostrou que os trabalhado- nomia para a população negra, pode contribuir de
res pardos morreram mais precocemente e tiveram forma importante para a sobremortalidade precoce e,
maior perda de anos potenciais de vida em quanti- consequentemente, maior perda de anos potenciais de
dade e maior velocidade de crescimento da TAPVP. A
vida por acidentes para esta população18.
mortalidade prematura revela o valor social da morte
e expõe as vulnerabilidades, as relações de produção No Brasil, as oportunidades ocupacionais são res-
e a privação do potencial econômico e intelectual. tritas, de modo que a inserção no mercado de trabalho
Contribuições de autoria
Nery FSD, Souza IM, Araújo EM, Oliveira NF e Dreger-Nery MG tiveram contribuição substancial na con-
cepção do estudo, no levantamento, análise e interpretação dos dados, na elaboração de revisões críticas e
na aprovação da versão final publicada. Os autores assumem responsabilidade pública integral pelo trabalho
realizado e o conteúdo aqui publicado.
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