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DEPARTAMENTO DA CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO, SOCIAIS

E HUMANAS
LICENCIATURA EM DIREITO

TRABALHO EM GRUPO DE DIREITOS REIAS

TEMA:
DIREITO DE PROPRIEDADE
E
DIREITOS REAIS LIMITADOS

GRUPO E
3º ANO / MANHÃ

DOCENTE
____________________________
EDUARDO KUPIA AMADO

BENGUELA, 2022

2|P á gi na
DEPARTAMENTO DA CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO, SOCIAIS
E HUMANAS
LICENCIATURA EM DIREITO

TRABALHO EM GRUPO DE DIREITOS REIAS

TEMA:
DIREITO DE PROPRIEDADE
E
DIREITOS REAIS LIMITADOS

ELABORADO POR:
 ADJEOVANY CATANHA
 ANGELINO BRITO
 ANTÓNIO JAMBA DIAS
 ARLINDA MASSIVANGUE
 CILÍZIA TAVARES
 LAISON CACHIQUASI
 MÁRCIO PAULINO
 OSLER SALVADOR
 YOLA ÁLVARO

BENGUELA, 2022

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PENSAMENTO

“Duvidar de tudo ou crer em tudo são duas soluções bastante cómodas, que nos
dispensam ambas de reflectir.”
Heinri Poincaré

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradecemos muito a Deus que nos ajudou na elaboração


deste trabalho, por nos conceber a vida e força para que diligentemente
trabalhássemos neste projecto.
E em segundo lugar, aos nossos queridos pais que desde a nossa infância
têm feito parte de nossa vida académica e profissional, isto é, por investir
financiamento e ter um acompanhamento dos nossos estudos.
De igual modo, damos os nossos respectivos agradecimentos aos
professores, por terem de maneira directa ou indirecta trabalhado árdua e
honestamente para o aperfeiçoamento do nosso conhecimento, habilidades e atitudes.

O nosso muito obrigado!

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RESUMO

O trabalho que agora apresentamos parte da relação entre a Propriedade e os


Direitos Reais Limitados. Embora esta ligação nos tenha sido sugerida há longo
tempo por vários filósofos, só nos últimos anos se verificou um aprofundamento da
investigação ao nível das ciências sociais sobre este tema, e a experiência empírica
veio confirmar o que já há muito se intuía.
O presente trabalho com o título “Direitos de Propriedade e Direitos Reais
Limitados”, objectiva-se apontar a questão da estrutura e funcionamento dos mesmos
no âmbito do nosso ordenamento jurídico. Assim, iniciaremos com um percurso pela
sua história partindo das noções teóricas sobre “Propriedade Horizontal,
Compropriedade, Direitos Reais de Gozo Limitado, Direitos Reais de Garantia e
Direitos Reais de Aquisição.

Palavras-Chave: Propriedade Horizontal, Compropriedade, Direitos Reais de Gozo


Limitado, Direitos Reais de Garantia e Direitos Reais de Aquisição.

Siglas: CRA- Constituição da República de Angola


C.C.- Código Civil
ML- Menezes Leitão
PL- Pilares de Lima
AV- Antunes Varela
JAV- José Alberto Viera
AO- Oliveira Ascensão

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ABSTRACT

The work we now present is part of the relationship between Property and Limited
Royal Rights. Although this connection has been suggested to us for a long time by
several philosophers, only in recent years has there been a deepening of research at the
level of the social sciences on this subject, and the empirical experience has confirmed
what has long been intitude.
The present work with the title "Property Rights and Limited Real Rights", aims
to point out the question of the structure and functioning of them within the scope of our
legal system. Thus, we will start with a journey through its history starting from the
theoretical conceptions about "Horizontal Property, Comproperty, Real Rights of
Limited Jouissance, Real Warranty Rights and Real Rights of Acquisition.

Keywords: Horizontal Property, Property, Limited Jouissance Royal Rights, Real


Warranty Rights and Real Acquisition Rights.

Siglas: CRA- Constitution of the Republic of Angola


C.C.- Civil Code
ML- Menezes Leitão
PL- Pilares de Lima
AV- Antunes Varela
JAV- José Alberto Viera
AO- Oliveira Ascensão

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CAPÍTULO# I: ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO

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INTRODUÇÃO

Somos advertidos por uma longa tradição filosófica de que os objectos


são determinantes no desenvolvimento do indivíduo.
O objecto dos direitos reais incide sobre coisas corpóreas, em
determinados termos, sendo estes termos ditos de reais.
JOSÉ ALBERTO VIEIRA define o direito real como o que atribui ao seu
titular um determinado aproveitamento de uma coisa corpórea. Esse aproveitamento
pode ser muito variado, desde os direitos reais que concedem o gozo da coisa, até aos
direitos reais de aquisição e de garantia que se limitam a assegurar a aquisição de
outro direito ou a possibilidade de realização de dinheiro com a venda da coisa.
Aproveitamento este que pode ser material (direitos reais de gozo) ou jurídico
(direitos reais de garantia e de aquisição).

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OBJECTIVOS

Geral:

 Compreender os Direitos de Propriedade e os Direitos Reais Limitados.

Específicos:
 Apresentar noções sobre:
Propriedade Horizontal;
Compropriedade;
Direitos Reais de Gozo Limitado;
Direitos Reais de Garantia;
Direitos Reais de Aquisição.

PROBLEMA DE INVESTIGAÇÃO

O problema consiste nas situações da vida humana valoradas pelo Direito


– aquelas situações da vida às quais o Direito confere relevância para os fins próprios
do Direito, e que é potencialmente regulada pelo Direito das Coisas

PERGUNTAS DE INVESTIGAÇÃO

1. O que são Direitos de Propriedade?


2. Quais são os Direitos Reais Limitados?
3. Por quê são eles limitados?

OBJECTO DE ESTUDO

 Direitos de Propriedade e Modalidades dos Direitos Reais

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CAPÍTULO #II: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

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I- DIREITO DE PROPRIEDADE

1- GENERALIDADE

Tendo sido avisados pela sábia máxima romana que diz “omnis definition in iure
civile periculosa est” (Toda a definição em direito civil é perigosa),1 na qualidade de
aspirantes em mergulhar nos meandros dos Direitos Reais para mitigar a inocência que
o tempo nos acarreta, os investigadores do tema em pauta, para melhor e maior lucidez,
cavalgamos para outros autores da temática em referência, das quais nos asseguram com
variadíssimas definições das quais fizemos a cofra dos abaixos a seguir:
A Propriedade é o pertence a alguém, como pedaço de terra; imóvel pertence á
um indivíduo ou instituição.2
Direito real máximo – direito real com o maior conteúdo possível e mais
importante dos direitos reais.
➢ É o paradigma, não apenas dos direitos reais como também dos direitos
subjectivos em geral.

2- CONTEÚDO DO DIREITO DE PROPRIEDADE (ART. 1305º, C.C.)

Faculdades de:
• Uso – todas as modalidades de aplicação direta da coisa, determinando o
aproveitamento da coisa para os fins que entender, sem prejudicar essa mesma coisa;
• Fruição – percepção de todos os frutos e produtos de uma coisa, sem prejuízo da
sua substância, permitindo ao proprietário obter determinado rendimento da coisa,
melhorando a sua condição económica;
• Disposição – compreende a transformação da coisa (alteração de forma ou
substância), a alienação (transmissão da coisa para terceiros) ou oneração (constituição
de direitos reais limitados sobre a coisa) e a extinção do direito sobre ela (através do
abandono ou destruição).
Este conteúdo não é ilimitado e está sujeito aos limites e restrições da lei, que são
genéricos para os Direitos Reais.3

3-CARACTERÍSTICA DO DIREITO DE PROPRIEDADE

Trata-se de características específicas ou particularmente intensas no


direito de propriedade:
• Plenitude: O direito de propriedade tende a abranger todos os direitos

1
Vide A. Santo Justo ( Direitos Reais, p. 229, 5 Edicção , 2017)
2 Vide Mini dicionário da Língua portuguesa houaiss, Pág. 634, 2010
3 LEITÃO, Luíz Menezes, Direitos Reais, Faculdade de Direitos de Lisboa, 2017, pág. 81

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que podem existir sobre uma coisa. Esta plenitude é tendencial, na medida em que
existem limites e restrições aos poderes compreendidos na propriedade.
• Elasticidade: É uma característica geral dos direitos reais que se
manifesta de forma mais intensa no direito de propriedade do que nos demais
direitos reais. O direito de propriedade tende a expandir-se ao máximo das
faculdades que pode comportar.
• Perpetuidade: Em princípio, o direito de propriedade é perpétuo: não
cessa pelo decurso do tempo. Ainda assim, o direito de propriedade, assim como os
direitos menores que o acompanham (“usufruto, uso e habitação, enfiteuse,
superfície e servidão”) podem extinguir-se. É também possível que existam casos
de propriedade temporária (artigo 1307º/2).
• Transmissibilidade: O direito de propriedade é transmissível na medida em
que é possível doar, vender, fazer o que quer que seja para transmitir a propriedade. Esta
característica é partilhada com a maioria dos direitos reais e privados patrimoniais. Por
exemplo, para além da minha propriedade eu posso transmitir as minhas acções, o meu
crédito, etc,. Nem todos os direitos reais são transmissíveis, como é o caso do direito de
uso e habitação (artigo 1488º).

4-FORMAS DE AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE

Os meios de aquisição da propriedade são definidos no artigo 1316º. São eles o


contrato, a sucessão por morte, a usucapião, a ocupação, a acessão, existindo ainda
demais modos previstos na lei.
• Contrato: aquisição por força dos efeitos de um contrato. • Sucessão mortis
causa: aquisição mortis causa.
• Usucapião: aquisição (de móveis ou imóveis) resultante da manutenção da
posse por determinado período de tempo. Trata-se de uma aquisição originária por força
da lei.
• Ocupação: apropriação de uma coisa sem dono com a intenção de a adquirir. Só
podem ser ocupadas coisas sem dono, isto é, ou que nunca tiveram dono, ou que foram
abandonadas. A ocupação está limitada às coisas móveis (artigo 1318º). As coisas
imóveis sem dono pertencem ao estado (Artigo 1345º).
• Achamento (artigos 1323º e 1324º): O achamento é uma modalidade da

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ocupação que, em rigor, não se traduz bem na ocupação.
Quando se tratem de animais ou coisas aparentemente perdidas:
 O legislador impede a apropriação por parte do achador, impondo-lhe em
caso de a identidade do dono ser do seu conhecimento, o dever de
restituição ou, pelo menos, o dever de aviso;
 O legislador impõe ao achador o dever de anúncio do achado ou de aviso
às autoridades;
 Tendo o anúncio sido feito, se o dono não reclamar a coisa no prazo de
um ano a contar do mesmo, o achador pode fazer sua a coisa perdida;
Quando se tratem de coisas escondidas:
 Impõe-se o dever de restituição ou anúncio e aviso às autoridades, exceto
quando for evidente que a coisa foi escondida há mais de 20 anos;
 A sanção para a inobservância de tais deveres é a perda, em detrimento
do estado, da coisa escondida;
 Cumpridos os deveres em causa sem efeito, o achador torna-se
proprietário de metade do achado, cabendo a outra metade ao
proprietário da coisa onde o tesouro estava escondido;
• Acessão (1325º e ss.): aquisição por incorporação de coisa pertencente a terceiro
em coisa própria. Temos a acessão natural e a acessão industrial. A acessão natural é
resultante de fenómenos naturais, enquanto a acessão industrial resulta de factos
humanos.
Exemplo: o acréscimo de terreno movimentado pela água (acessão natural).
Temos ainda acessão mobiliária, se incidir em coisas móveis, e imobiliária, se incidir
em coisas imóveis. Estão reguladas no CC figuras que, em rigor, não são acessão.
Nomeadamente, a especificação e boa-fé (1336º), o aluvião (1328º) e a avulsão (1329º).

5. MODOS DE EXTINÇÃO DE PROPRIEDADE

O direito de propriedade, apesar da sua já referida tendencial perpetuidade, pode


extinguir-se. São causas de extinção do direito de propriedade a perda da coisa, o
abandono e a renúncia.
• Perda da coisa: destruição física da coisa. Com a perda da coisa o direito real
de propriedade extingue-se, inda que com a extinção surja um direito sucedâneo (ver
artigo 1480º como exemplo).

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• Abandono: modalidade de renúncia especializada por o negócio consistir não
num texto, mas numa conduta.
Exemplo: colocar os móveis numa lixeira.
• Renúncia: negócio jurídico unilateral pelo qual o seu autor extingue um
direito de que é titular.
o Renúncia abdicativa: extinção do direito pura e simples; o
Renúncia liberatória: meio de exoneração de uma obrigação; este
tipo de renúncia é muito mais frequente no regime de direitos
reais menores do que na propriedade. São exemplos a renúncia ao
usufruto e à compropriedade.

6. A TRANSMISSÃO DE PROPRIEDADE INTERVIVOS

O principal meio de transmissão intervivos do direito de propriedade é o


contrato. Porém, existem na totalidade três paradigmas em relação à transmissão de
propriedade:
• Sistema de título: o efeito transmissivo da propriedade resulta do contrato;
• Sistema do modo: o efeito transmissivo resulta de um ato autónomo face ao
contrato. Esse ato autónomo pode ser um de dois: a entrega da coisa ou a inscrição
registral da coisa.
• Sistema misto: a transmissão da propriedade resulta da conjugação do contrato
e do ato autónomo.4

4 NUNES Pedro Caetano, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2016/2017, pág.12 e ss.

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II- A PROPRIEDADE HORIZONTAL

1-DEFINIÇÃO

Uma definição criada a meu ver, propriedade horizontal vai ser direito de
propriedade em que uma mais pessoas (titulares) vão ter sobre uma determinada
fracção autónoma de edifício.
A propósito é um direito de propriedade sobre coisas imóveis e é um regime
especial da mesma.
Dentro da propriedade horizontal congregam-se dois tipos de direitos reais
distintos:
 Propriedade: diz respeito às fracções autónomas, o uso exclusivo da fracção
de um edifício por parte do proprietário aqui denominado de condomínio. É de
salientar que as fracções em propriedade singular devem ser perfeitamente
autónomas.
 Compropriedade: diz respeito às partes comuns, indicadas no artigo 1421º do
C.Civil.

2-BREVE EXPLICAÇÃO DA PROPRIEDADE HORIZONTAL: COMO


ACTUA E COMO FUNCIONA?

Estamos perante a uma situação de propriedade horizontal quando em um


edifício vai pertencer a um conjunto de pessoas, tendo cada uma delas poder sobre
uma partem (fracção autónoma) especificado, e poder sobre as partes em comum que
não são atribuídas especificamente (partes em comum).
OBS: Os proprietários aqui são chamados de condomínios, e os edifícios são
chamados de condomínios.

3- A SITUAÇÃO DA PROPRIEDADE HORIZONTAL EM ANGOLA!

O que é a fracção autónoma?


R: Vai ser um espaço de uso exclusivo do condomínio capazes de afectação
individual à um fim.
 O Título Constitutivo: é um negócio jurídico ou sentença, corporizada em
documento, que especifica as fracções e o seus valor relativo.
 Título Constitutivo: é frequentemente um negócio jurídico, mas também
pode ser uma sentença.
 Título Constitutivo da Propriedade Horizontal: este título será um
documento que corporiza direitos ou situações jurídicas, quando temos um
título do ponto de vista do negócio jurídico, temos a corporização de situações
jurídicas em documentos.
Aqui há um documento que corporiza os negócios jurídicos que criam direitos e
deveres. O regime da propriedade horizontal e caracterizado por um título constitutivo

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que corporiza num documento em rigor mas o negócio jurídico corporizado no
documento.
O título constitutivo pode conter um regulamento do condomínio. Este
regulamento disciplina o uso, fruição e conservação quer das partes comuns, quer das
fracções autónomas.

4-NATUREZA DO DIREITO REAL DE CADA CONDOMÍNIO

A propriedade horizontal implica que haja uma pluralidade de direitos reais


sobre um prédio e este mesmo direito de propriedade incidem isoladamente sobre as
fracções autónomas e em concurso (em comum) sobre as partes comuns.
Segundo a doutrina maioritária, temos um direito de propriedade especial,
para outra o que temos é um tipo autónomo de direitos reais, mas repara-se que o
cerne está no regime real da propriedade.

5- CONSTITUIÇÃO DA PROPRIEDADE HORIZONTAL

A constituição da propriedade horizontal pode dar-se por dois pontos:


1ºNegócio Jurídico;
2ºUsucapião;
3ºDecisão Administrativa;
4º Decisão Judicial;

6- POSIÇÃO JURÍDICA DO CONDOMÍNIO

O principal direito ou posição judicial ou judicial activa é o poder de domínio


sobre a fracção autónoma.C.C. (Limitações ao exercício de direitos) artigo 1422º.
Estas limitações pressupõem a regra do domínio exclusivo sobre a fracção
autónoma. A excepção confirma a regra.

7- O DIREITO QUE ASSISTEM À CADA CONDOMÍNIO:


 Domínio exclusivo sobre a fracção autónoma
 Direito sobre as partes comuns (em registo de contitularidade)
 Direito de participação (nos órgãos do condomínio)
 Direito de promover reparações urgentes e indispensáveis nas partes comuns
.
8- MODIFICAÇÃO DO TÍTULO (ARTIGO 1419º)

Não se deve conferir a modificação do título (artigo 1419º) com a modificação


do regulamento.
 Unanimidade
 Escritura pública ou documento particular autenticado.

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Excepções: junção e divisão de fracções autónomas (artigo 14322º)

9- ADMINISTRAÇÃO DAS PARTES COMUNS

São órgãos Administrativos: o Administrador e a Assembleia de condomínios

Propriedade Horizontal: vai ser o direito que o condómino tem sobre o edifício, aqui
estamos a tratar de um único direito. O direito de propriedade horizontal, o conteúdo
desse direito vai exprimir a duplicidade do seu objecto e o regime jurídico que cada
parte do mesmo se encontra sujeito.

9.1- DUALIDADE DO OBJECTO DA PROPRIEDADE HORIZONTAL

O objecto do direito da propriedade horizontal não reside somente na fracção


autónoma, podemos dizer, por conseguinte, que o objecto do direito da propriedade
horizontal se compõe da fracção autónoma e das partes comuns do edifício.
I-Fracção autónoma: vai ser um espaço de uso exclusivo do condomínio
II- Partes comuns do edifício: aqui podem variar consoante o título constitutivo
da propriedade horizontal.

Partes que a lei considerava sempre comuns (artigo 1421º, nº1)


Partes que a lei presume serem ainda comuns (nº2 do mesmo artigo).

10- O TÍTULO CONSTITUTIVO

A propriedade horizontal constitui uma propriedade que tem por objecto um


edifício dividido em fracções autónomas.
O título constitutivo de um direito real é representado pelo facto ou conjunto de
factos jurídicos dos quais nasce essa situação jurídica.
A lei elenca no seu artigo 1417º, nº1 (os que constituem propriedade horizontal)
requisitos civis propriedade horizontal.

A lei estabelece ainda requisitos de validade do próprio título constitutivo (artigo


1418, nº1)
-As fracções devem ser individualizadas
-Os valores atribuídos a cada fracção devem ser expressos em percentagem ou
permilagem do valor total do prédio.

11- EFEITO DA CONSTITUIÇÃO DA PROPRIEDADE HORIZONTAL

Na propriedade horizontal do direito singular de propriedade singular ou a


propriedade sobre o imóvel extingue-se, deixa de haver um direito de propriedade ou
compropriedade sobre todo imóvel, para passar a haver tantos direitos de propriedade
horizontal quantas as fracções autónomas individualizadas no título constitutivo. Então

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adquirindo o direito da propriedade horizontal sobre a fracção o proprietário pode
exercer qualquer dos poderes conteúdo do seu direito como: vender, doar, onerar
devendo cumprir os deveres que delimitam a extensão do aproveitamento concedido por
ele.
As fontes da propriedade horizontal especial referência ao título constitutivo e ao
registo do condomínio:
1º Fonte de regulamentação do condomínio é naturalmente a lei;
2º Fonte normativa do regulamento do condomínio é o título constitutivo;
3º Fonte normativa do regulamento do condomínio: o regulamento do condomínio,
a elaboração é obrigatória em edifícios com mais de 4 fracções autónomas.
4º As deliberações da Assembleia dos condomínios: elas devem incidir somente
sobre a administração das partes comuns do edifício (artigo 1433º), estas devem
estar conforme a 1, 2 e 3 fontes (artigo 1430º).

12- NATUREZA JURÍDICA DA PROPRIEDADE HORIZONTAL

A combinação singular que surge na propriedade horizontal entre uma propriedade,


sobre a fracção, e uma propriedade, sobre as partes comuns, concedem um novo direito
real (propriedade horizontal).
O conteúdo típico do direito real da propriedade horizontal é o da propriedade o
facto é que existem especificidade na propriedade horizontal tanto no toca ao regime da
propriedade singular como no regime da propriedade, particularmente quanto aos
deveres dos condomínios.
Ao ser um direito real novo seria um direito real menor uma vez que a
propriedade ocupa o lugar de direito real de maior extensão. Se assim é, não
conseguimos ver que haja uma propriedade por cima do direito da propriedade
horizontal.
No fundo a propriedade horizontal não representa uma propriedade comum. As
especificidades do regime não permitem uma recomendação a propriedade singular ou a
compropriedade, permitem porém, a qualificação de propriedade especial.
Portanto, o direito de propriedade horizontal é ainda um direito, não obstante o
seu regime ser o de uma propriedade especial.

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III- COMPROPRIEDADE

1. GENERALIDADES

A compropriedade é-nos definida no artigo 1403.º, n.º1 CC, que estabelece que
existe propriedade em comum ou compropriedade, quando duas ou mais pessoas são
simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa.
Existe assim uma situação de compropriedade sempre que a propriedade seja
atribuída a mais do que um titular. Nesse caso, conforme refere o artigo 1403.º, n.º2 CC,
os direitos dos consortes ou comproprietários sobre a coisa comum são qualitativamente
iguais ainda que possam ser quantitativamente diferentes, presumindo-se, no entanto,
como quantitativamente iguais, se o título constitutivo não referir o contrário.
Tal implica que o direito de cada comproprietário sobre a coisa não tenha
faculdades inferiores ao de outros comproprietários, ainda que possa haver uma
diferente repartição do exercício dessas mesmas faculdades e dos encargos da coisa,
caso o montante das quotas de cada comproprietário seja distinto.
Em conjunto, os comproprietários podem exercer, no entanto, todos os poderes que
competem ao proprietário singular (artigo 1405.º, n.º1 CC).5

1. CONSTITUIÇÃO DA COMPROPRIEDADE

Segundo o Professor Luís Menezes Leitão6, a constituição da compropriedade pode


ser constituída por:
• Negócio Jurídico – sempre que o direito de propriedade sobre uma coisa é
atribuído simultaneamente a vários titulares, por contrato ou testamento.
• Facto jurídico não negocial – usucapião (invocada após situação de composse
em relação à coisa), ocupação (várias pessoas ocupam uma coisa), achamento (sendo
expressamente imposta no caso de tesouros – art. 1324º) e acessão (casos dos art.
1333º/2, 1335º/3, 1340º/2).
• Sentença Judicial – quando é solicitada em tribunal quando às paredes e
muros de meação (art. 1370º)
• Disposição da lei – quando a lei estabelece presunções de comunhão (art.
1358º/1, 1359º/2, 1368º, 1371º)

2.1. Discussão doutrinária sobre a construção jurídica da compropriedade

A professora Inês Carreiro da Universidade de Lisboa elucida tal assunto


dizendo que há três construções possíveis acerca da natureza jurídica da
compropriedade.
A posição maioritária é a daqueles que consideram que há na compropriedade

5 José ALBERTO VIERA e Luíz MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018,
pág.134
6 LEITÃO Luís Menezes, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018

20 | P á g i n a
uma contitularidade de direitos ou, por outras palavras, uma titularidade plural. É esta a
seguida pelo professor Caetano Nunes.

A segunda posição defende que não há um só direito partilhado, mas vários


direitos sobre uma mesma coisa. Por fim, os seguidores da terceira construção falam em
vários direitos não sobre a realidade bruta, mas sobre quotas ideais, intelectuais ou
jurídicas sobre o mesmo objecto7.

2. PODERES DOS COMPROPRIETÁRIOS

Os poderes atribuídos aos comproprietários são os 5 seguintes:


1. Uso da Coisa Comum (art. 1406º) – cada comproprietário tem isoladamente a
faculdade de uso da coisa comum, sujeita a certos limites.
• Restrição Funcional – não poder usar a coisa para fim diverso daquele a
que ela se destina – obriga a respeitar o fim a que a coisa se destina.

• Restrição Quantitativa – não poder privar os outros consortes do uso a


que igualmente têm direito – corresponde à dimensão quantitativa da quota
de cada um.
2. Reivindicação da Coisa Comum (art. 1405º/2) – comproprietário pode
solicitar o reconhecimento da compropriedade e a consequente restituição da
coisa, sempre que esta se encontre na posse ou detenção de terceiro.

3. Disposição e Oneração da própria quota (art. 1408º) – comproprietário tem


posição no direito comum que tem valor económico em virtude das faculdades
que atribui ao seu titular, podendo este pô-la no comércio jurídico.

4. Direito de Preferência (art. 1409º e ss.) – lei atribui a cada um dos


comproprietários o direito de preferência na venda ou dação em cumprimento da
quota do seu consorte, em ordem a evitar que terceiros estranhos se imiscuam na
titularidade do direito sobre a coisa.

5. Direito de exigir a divisão da coisa comum (art. 1412º e ss.) – divisão da coia
depende de a mesma poder ser fraccionada sem alteração da sua substância,
diminuição de valor ou prejuízo para o uso a que se destina (art. 209º).

4-OBRIGAÇÕES DOS COMPROPRIETÁRIOS


Segundo a lógica do “ubi commoda ibi incommoda”
Art. 1405º/1 impõe aos comproprietários participar nos encargos da coisa, na
medida das suas quotas -> art. 1411º/1
• Regra da repartição dos encargos da coisa por todos os

7 CARREIRO Inês Mota, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág. 22

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comproprietários em termos proporcionais às respetivas quotas. As partes podem
acordar outro critério.
Renúncia Liberatória – comproprietário pode extinguir o direito que tem sobre a
coisa (a sua quota) de maneira a que não tenha encargos nem obrigações.
• A renúncia não é válida sem o consentimento dos restantes consortes quando a
despesa tenha sido previamente aprovada pelo interessado.8
• Art. 1411º/2
• Art. 1411º/3

5-A ADMINISTRAÇÃO DA COISA COMUM (art. 1407.º CC)

Em relação ao regime da administração, o artigo 1407.º CC remete, com as


necessárias adaptações, para os sistemas de administração da sociedade civil, previstos
no artigo 985.º CC, pelo que haverá que aplicar as respectivas regras. O artigo 985.º CC
deixa à disponibilidade das partes a estipulação da mobilidade de exercício da
administração. Esse artigo estabelece, no entanto, com caráter supletivo, o regime da
administração disjuntiva, havendo referências exemplificativas aos sistemas de
administração conjunta e maioritária.
a. No sistema de administração disjuntiva (artigo 985.º CC): os poderes de
administração concentram-se integralmente em cada um dos comproprietários, podendo
estes individualmente praticar todos os atos de administração, sem necessidade do
consentimento nem sujeição às diretivas dos outros
b. Nos sistemas de administração conjunta e maioritária: os comproprietários
podem ainda estabelecer nos termos do artigo 985.º, n.ºs3 e 4, estes sistemas.
i. No sistema de administração conjunta: a realização de atos de administração
necessita do consenso de todos os comproprietários.
ii. No sistema de administração maioritária: exige-se apenas uma deliberação da
maioria, a qual, como se referiu, é formada com base no valor das quotas.
Em qualquer destes dois sistemas, os comproprietários isoladamente possuem,
porém, competência para praticar os actos urgentes, destinados a evitar um dano
iminente que a coisa possa sofrer (artigo 985.º, n.º5 CC).9

6-DISPOSIÇÃO DA COISA COMUM

Art. 1408º - Só podem haver atos de disposição da coisa comum com o consentimento
de todos os comproprietários: alienação, transformação ou destruição.
Art. 1408º/2 – Considera como venda de bem alheio a alienação sem a autorização
(parte especificada ou toda a coisa comum, por maioria de razão41), sendo nulo todo o
negócio (art. 894º) salvo se vier a adquirir as quotas dos restantes consortes (art. 895º).
➢ Aplicação do regime de venda bens alheios é apenas em relação às partes no
negócio, sendo em relação aos outros consortes considerado o negócio como ineficaz.

8LEITÃO Luís Menezes, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 55
9José ALBERTO VIERA e Luíz MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade de Direito, Lisboa, 2017/2018, pág
128

22 | P á g i n a
7-EXTINÇÃO DA COMPROPRIEDADE

Sempre que cessar a situação de contitularidade do direito em relação à coisa.


Cessação pode resultar:
• Da aquisição derivada ou originária, por parte de um dos consortes ou
terceiro, da propriedade sobre toda a coisa – pode resultar de negócio jurídico ou de
usucapião42 da propriedade exclusiva (por um dos consortes ou por um terceiro)
• Da divisão da coisa em fracções, com atribuição da propriedade
(horizontal) exclusiva sobre essas fracções a cada um dos consortes – cuja forma
está sujeita à forma exigida para a alienação onerosa da coisa (art. 1413º/2).

8-NATUREZA JURÍDICA DA COMPROPRIEDADE

A. Teoria do Direito Sobre Quotas – Guilherme Moreira, Mota Pinto – cada


proprietário tem direito a uma quota ideal ou intelectual do objeto da propriedade.
Explica a possibilidade de alienação separada da quota e o facto de cada consorte ter
possibilidade de uso e administração de toda a coisa comum não seria obstáculo pois
esta quota é ideal e não sobre parte especificada, pelo que os direitos de cada
comproprietário se estendem sobre toda a coisa.
➢ Direitos reais incidem sobre coisas corpóreas, necessariamente, não sobre
direitos (incorpóreos – sendo contrários à natureza do direito real).

B. Teoria da Pluralidade de Direitos sobre a Mesma Coisa – Pinto Coelho,


OA, MC, Carvalho Fernandes, JAV – pluralidade de direitos da mesma espécie, que
recaem sobre a mesma coisa, o que determina a limitação mútua ao respetivo exercício.
➢ Confunde as situações de contitularidade de direitos com as do concurso de
direitos. Não faz sentido considerar que o direito de propriedade, enquanto pleno e
exclusivo, possa concorrer com direitos idênticos de outros titulares.
➢ Não explica a maior parte dos poderes dever ser exercida conjuntamente.

C. Teoria do Direito Único com Pluralidade de Titulares – PL / AV, Henrique


Mesquita – referência legal a quotas refere-se a partes do direito e não a partes ideias da
coisa; todos os consortes são cotitulares do mesmo direito, no qual possuem uma quota.
Explica o regime da compropriedade.
➢ ML: na compropriedade, o direito de propriedade mantém-se com todas as
suas características, sendo apenas atribuído conjuntamente a mais do que uma pessoa.
➢ Explica o facto de, em conjunto, os comproprietários poderem sempre
exercer todos os poderes relativos à coisa, bem como a circunstância de a posição de
cada comproprietário poder ser alienada ou onerada.
➢ Explica o facto de o uso da coisa comum pelo comproprietário não lhe

23 | P á g i n a
atribuir posse exclusiva, nem superior à sua quota, uma vez que ele se limita a exercer o
direito comum.

D. Teoria da Compropriedade como Pessoa Coletiva – doutrina italiana – a pessoa


coletiva, formada pelos comproprietários é que era a proprietária da coisa. Direito real
seria pertença da coletividade dos consortes, considerada como ente distinto dos sujeitos
que a compõe.
➢ Lei não personifica a compropriedade e não há autonomia patrimonial, o que
constitui o substrato indispensável a qualquer personificação. 10

10 LEITÃO Luís Menezes, Direitos Reais, Faculdade de Direito, Lisboa, 2017/2018, pág.56 e ss.

24 | P á g i n a
IV- DIREITOS REAIS LIMITADOS

GENERALIDADES
É de conhecimento geral que dos Direitos das Coisas dividem-se em:
a) Direito real ilimitado: é o chamado “jus in re propria”, ou direito na coisa
própria, que é a propriedade, o mais amplo, complexo e importante direito real.
b)Direitos reais limitados: são os chamados “jura in re aliena”, ou direitos nas
coisas alheias, ou seja, nas coisas de propriedade dos outros.11

Por um lado o direito real ilimitado é também denominado de direito real


maior, ao passo que os direitos reais limitados são também chamados de direitos reais
menores.
O direito real maior é aquele que atribui ao titular todas as faculdades relativas
a coisa; já os direitos reais menores são aqueles que não atribuem todas essas
faculdades. Conferem apenas a possibilidade de exercer certos poderes correspondentes
à clássica tripartição- jus utendi, jus fruendie jus abutendi.
São direitos que pressupõem, assim concorrência de direitos. Quando elas
existem, incide também sobre a mesma coisa uma propriedade que é restringida por este
direito limitado.12
Quanto à relação do direito real maior com os direitos reais menores, têm sido
admitidas duas teorias:
1. Teoria do Desmembramento – nos direitos reais menores ocorre uma
divisão da propriedade em vários direitos distintos. Fragmentação da propriedade em 2
direitos diferentes, sendo uma parte do conteúdo da propriedade transferida para o
direito real menor e ficando esta privada desse mesmo conteúdo;
2. Teoria da Oneração – na constituição de um direito real menor não se
verifica qualquer desmembramento do direito da propriedade, nem o direito real menor
recebe uma parte dos direitos que a lei atribui ao proprietário.13
Segundo Professores como José Alberto Vieira e o Luís Menezes Leitão, a teoria
correta é a teoria da oneração. Efectivamente, os direitos reais menores não podem ser
vistos como desmembramentos da propriedade, até porque possuem aspectos novos do
regime, como determinadas obrigações e causas próprias de extinção, que não existem
na propriedade. Por outro lado, a teoria do desmembramento implicaria que a
recuperação da totalidade do domínio só se pudesse fazer com um ato de retransmissão
do direito real menor ao proprietário, quando essa recuperação se verifica
automaticamente sempre que ocorra a extinção do direito real menor.14
Dentro dos Direitos reais limitados distinguimos os direitos reais de gozo, de
garantia e de aquisição, sobre os quais abordaremos mais a frente.

11 Aula 10 - Direitos Reais Limitados: Professor VILMAR


12 Direitos reais limitados (direitomozeam.blogspot.com)
13 LEITÃO Luís Menezes, Sebenta de Direitos Reais, Faculdade de Direito, Lisboa, 2018, pág. 22
14 José ALBERTO VIEIRA e o Luís MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade de Direito, Lisboa

pág. 124

25 | P á g i n a
1-DIREITOS REAIS DE GOZO

GENERALIDADES

Antes de nos aprofundarmos na temática em apreço, é imprescindível que todos


se conscientizem das controvérsias existentes entre os direitos pessoais de gozo e os
direitos reais de gozo, discussão esta que sempre criou dificuldades. Proporcionar o
gozo implica que seja concedido um direito de desfrute sobre a coisa. A figura dos
direitos pessoais de gozo, aparece, por influência de um autor italiano (Giorgianni)15 no
Código Civil, para além da referência genérica constante dos artigos 407.º e 574.º do
CC, não se encontra qualquer outra qualificação de figuras integrando Direitos Pessoais
de Gozo.

Portanto, os direitos pessoais de gozo são direitos de natureza obrigacional que


possibilitam ao seu titular o gozo directo e autónomo de determinada coisa, o qual,
porém, diversamente do que sucede com os Direitos Reais de Gozo, têm sempre por
fundamento uma relação obrigacional, de que nunca se desprende16. Não se trata,
portanto, duma mera categoria doutrinária, embora não é fácil, porém, a sua definição.
Os direitos pessoais de gozo são actualmente concebidos, cada vez mais, como um
tertium genus17 entre as duas categorias principais de direitos subjectivos privados
(direitos de crédito/direitos reais)18.

A coisa é afecta à satisfação dos interesses do usuário/proprietário através do


uso, fruição ou apropriação de frutos. A coisa é afecta à retirada de utilidade. Usar é,
por exemplo, dormir no prédio ou passear pela propriedade rústica da qual se é
proprietário. Apropriar-se dos frutos pode ser apanhar maçãs das árvores (fruto
natural) ou recolher as rendas da casa que arrendamos (fruto civil). Exemplos de
direitos reais de gozo são a propriedade e o usufruto.19

Assim sendo, pudemos definir os Direitos Reais de Gozo como «o direito real
que proporciona o uso e fruição de certa coisa».20
No âmbito do nosso ordenamento jurídico, são direitos reais de gozo a
propriedade, o usufruto, o uso e a habitação, o direito de superfície e as servidões
prediais.21

15MESQUITA. José Andrade. Direitos Pessoais de Gozo, Coimbra, Almedina1999.P.124


16 Cfr. Acórdão SJ200404270001926 do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal.
17 Signififa do latim "nem pessoa nem coisa" muito difundida quando se discutia no Brasil a

natureza jurídica dos animais, pois a tendência do legislador era a de descaracterizar o animal como
coisa, sem, entretanto, atribuir-lhe personalidade jurídica. cá entre nós o terus genus, pressupõe
que se discute se os direitos pessoais de gozo são direitos que incide sobre coisas ou sobre a
prestação (Real ou obrigacional)
18 DUARTE. Rui Pinto. Curso de Direitos Reais, Editora Principia, 3ª edição, 2013. P. 28
19 Inês MOTA CARREIRO, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág. 6
20 PRATA Ana, Dicionário jurídico, Volume I, 5º edição, Almedina, Lisboa, 2008
21 Não mencionamos a enfiteuse e o direito real de habitação periódica pelo simples facto de estes já

26 | P á g i n a
SECÇÃO I- USUFRUTO

1- GENERALIDADES

O artigo 1439º define usufruto como o direito de gozar temporariamente e


plenamente de uma coisa ou direito, sem alterar a sua forma ou substância.
Importa, antes de mais, evidenciar que o usufruto é um direito real menor que coexiste
com o direito de propriedade, isto é, não existe direito de usufruto sem existir direito
de propriedade.
Quando existe um direito de usufruto, é comum usar-se a expressão “nua
propriedade”, porque o usufruto implica direitos e faculdades que contraem o
direito de propriedade de tal forma que se considera que o proprietário está nu,
despido..22

2- CARACTERÍSTICAS DO USUFRUTO

Da definição constante do artigo 1439.º CC resultam logo as seguintes


características do usufruto:
 É um direito que atribui o gozo pleno de uma coisa: o usufruto é, em
primeiro lugar, um direito que atribui o gozo pleno de uma coisa, ou seja, o usufrutuário
tem, assim, a possibilidade de servir-se da coisa e receber os respectivos frutos, sejam
eles naturais ou civis, podendo trespassar o usufruto ou onerá-lo (artigo 1444.º CC).

 É um direito não exclusivo: o usufruto é, em segundo lugar, um direito


não exclusivo, uma vez que tem limites máximos de duração, que não podem
ultrapassar a vida do seu titular ou, no caso de pessoa coletiva, a duração de trinta anos
(artigo 1443.º CC).
 É um direito temporário (artigo 1433º): ao contrário do direito de
propriedade que, por regra, é perpétuo, o usufruto é temporário.

 Encontra-se limitado pela proibição de alteração da forma ou


substância da coisa: por último, o usufruto encontra-se limitado pela proibição de
alterar a forma ou substância da coisa (artigo 1439.º CC).

3-OBJECTO DO USUFRUTO (ART. 1439º)

A coisa objecto do usufruto pode ser móvel ou imóvel e é sempre uma coisa

se acharem em desuso não possuindo relevância ou aplicação alguma em nosso actual


ordenamento jurídico. Assim, podem existir direitos reais abolidos na legislação actual que figuram
desde tempos anteriores.
22 CARREIRO Inês Mota, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág. 68

27 | P á g i n a
corpórea.
A coisa, no entanto, pode sofrer alterações: se a coisa sofre de
união/transformação, o usufruto estende-se a ela por direito de acrescer (art. 1449º).
José Alberto Vieira, em virtude da teoria sobre o objecto dos direitos reais –
coisas corpóreas – rejeita a remissão ao usufruto de direitos. O usufruto só poderá
referir à coisa que seja objecto do direito e não ao próprio direito.23

4-CONSTITUIÇÃO DO USUFRUTO (ART. 1440º)

O artigo 1440.º CC refere que o usufruto pode ser constituído por:

 Contrato: em relação à constituição por contrato, o usufruto pode


resultar de qualquer contrato de alienação (compra e venda, doação ou permuta), de
uma entrada em sociedade, ou de um contrato de renda perpétua ou vitalícia.

 Testamento: o usufruto pode igualmente resultar de testamento, o qual


pode da mesma forma estabelecer uma atribuição ou uma reserva de usufruto. É de
notar que o usufrutuário é sempre havido como legatário, mesmo que o seu direito
incida sobre a totalidade da herança (artigo 2030.º, n.º4 CC).

 Usucapião: o usufruto pode igualmente ser constituído por usucapião,


nos termos gerais (artigos 1287.º e seguintes CC), bastando para tal que a respetiva
posse não seja exercida em termos de propriedade, mas apenas em termos de usufruto
(artigo 1251.º CC).

 Disposição da lei: a constituição do usufruto por disposição da lei não se


encontra actualmente prevista em nenhuma disposição legal.24

5-PODERES DO USUFRUTO (ART. 1446º)

Faculdade de usar a coisa: poder de vasta amplitude de usar a coisa e equipara-


se ao do proprietário, tendo apenas a limitação do respeito pela substância e pela forma
e supletivamente pelo destino económico.25
Faculdade de fruir a coisa: poder de perceber os frutos da coisa, nos termos
amplos deste conceito (art. 212º).
Faculdade de disposição: há alguns poderes de disposição por parte do
usufrutuário (art. 1444º/1, 1444º/1 do C.C.)

23 MALÓ Mafalda, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 62


24 José ALBERTO VIERA Luís MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa,
2017/2018, pág. 382
25 Se o usufrutuário infringir estes direitos é responsável perante o proprietário nos termos da

responsabilidade civil delitual (art. 483º).

28 | P á g i n a
NOTA: não é possível alterar a forma ou a substância da coisa. Em contraponto,
porém, admitem-se transformações. O usufrutuário não pode alterar a forma ou a
substância da coisa, apesar de a poder transformar.

6-OBRIGAÇÕES DO USUFRUTUÁRIO

• Relacionar bens (artigo 1468º/1, a), declarando o estado em que os bens se


encontram e mencionando o seu valor quando de moveis se trate;
• Prestar caução (artigo 1468º/1, b) para garantia que da restituição dos bens, quer de
eventuais deveres de indemnizar por danos provocados aos mesmos.
• Fazer bom uso da coisa ou direito (artigo 1446º)
• Suportar as despesas de administração (artigo 1472º/1) - a lei estabelece que o
usufrutuário se pode eximir desta obrigação por meio da renúncia ao usufruto;
• Realizar as obrigações ordinárias (artigo 1472º):
• Consentir na realização de obras ou melhoramentos (artigo 1471º);
• Informar o proprietário de raiz da necessidade de reparações extraordinárias e
de quaisquer factos de terceiros de que possam resultar danos para o
proprietário (artigos 1473º e 1475º) - sendo que o incumprimento destes deveres de
informação é sancionado com o dever de indemnizar os danos daí resultantes.
• Suportar impostos e outros encargos anuais sobre os rendimentos (artigo 1474º),
sendo que tal está de acordo com a legislação fiscal.
• Dever de restituir a coisa findo o usufruto (artigo 1483º): quando o usufruto é
vitalício não existe este dever.26

7- DIREITOS DO NU PROPRIETÁRIO

No que concerne ao lado ativo, ou seja, aos direitos:


 Fazer melhoramentos na coisa (art. 1471º), inovações que se destinam a
aumentar o valor da coisa; tem um limite de não introdução de desvalorização
do usufruto (art. 1471º/1).
 Poder de constituir servições passivas sobre a coisa objecto do usufruto,
contando que não haja desvalorização (art. 1460º);
 O mesmo relativamente a servidões ativas, desde que não impliquem
desvalorização, sendo que o usufrutuária beneficiará delas (art. 1449º);

No que concerne ao lado passivo, ou seja, obrigações:


 Dever de respeito pelo usufruto: clausula geral, se violada, pode haver lugar a
reacção pelo usufrutuário (ex.: acção de reivindicação ou acção possessória);
 Dever de realizar as obras extraordinárias de conservação da coisa (art.
1473º);

26 NUNES Pedro Caetano, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2016/2017, pág. 94

29 | P á g i n a
 Dever de indemnizar o usufrutuário pelo realização de obras
extraordinárias de conservação da coisa que não caibam àquele suportar (art.
1473º/2);
 Dever de indemnizar o usufrutuário por benfeitorias feitas na coisa (art.
1450º/2).27

8- EXTINÇÃO DO USUFRUTO- (ART. 1476º)

 Morte do usufrutuário: uma vez que o usufruto não é um direito transmissível


mortis causa (art. 2025º/1).28
 Termo do Prazo: usufruto extingue-se na data estabelecida.
o Se usufrutuário morrer antes desta data, extingue-se usufruto.
o Se se estabelecer usufruto até idade de um terceiro, usufruto durará pelos
anos prefixos, mesmo que a pessoa venha a falecer sem atingir essa idade
(art. 1477º).
 Reunião do usufruto e da propriedade na mesma pessoa: extingue-se o
usufruto por confusão
 Não uso por 20 anos: compatível com o art. 298º/3.
 Perda total da coisa usufruída: perecimento do objeto de um direito real
implica naturalmente a extinção desse direito.
 Renúncia do usufrutuário: não implica a aceitação do proprietário (art.
1476º/2), que recupera a propriedade plena.
o Não é declaração recetícia e produz efeitos logo que é manifestada de
forma adequada.29

9- TIPOS ESPECIAIS DE USUFRUTO


 Usufruto de coisas consumíveis – (art. 1451º)
 Usufruto de coisas deterioráveis – (art.1452º)
 Usufruto de árvores e arbustos – (art. 1453º, 1454º)
 Usufruto de matas e árvores de corte – (art. 1455º)
 Usufruto de plantas de viveiro – (art. 1456º)
 Usufruto de minas – art. 1457º
 Usufruto de pedreiras – (art. 1458º)
 Usufruto sobre universalidade de animais – (art. 1462º)
 Usufruto de créditos – (art. 1463º, 1464º, 1465º, 1466º)

27 MALÓ Mafalda, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág.63


28 Se adquirente do trespasse falecer antes do alienante:
• Carvalho Fernandes – extingue-se o usufruto. Atenta ao art. 1444º/2
• Oliveira Ascensão – direito de usufruto transmite-se aos sucessores do adquirente até à
morte do alienante
29 LEITÃO Luís Menezes, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 95

30 | P á g i n a
10- NATUREZA DO USUFRUTO

Em relação à natureza do usufruto, apresentam-se as seguintes teorias:


1. Teoria do desmembramento: para essa tese, no usufruto ocorre uma
fragmentação do direito de propriedade em dois direitos distintos, o direito de usar e
fruir a coisa (usufruto) e o direito de dispor ou transmitir a coisa a outrem (propriedade
de raiz ou nua propriedade). Esta é a tese clássica sobre a natureza do usufruto, tendo
sido defendida entre nós por José Tavares e por Pires de Lima e Antunes Varela.
Crítica: A teoria do desmembramento é inaceitável pois parte da concepção e
que todos os direitos reais menores são figuras parcelares da propriedade, o que já
tivermos ocasião de rejeitar. A propriedade não é desmembrada, antes se comprime, em
virtude da elasticidade que a caracteriza, se sobre a mesma coisa vem a ser constituído
um usufruto.

2. Teoria da propriedade temporária: formulada em Itália por Allara,


considera que, embora a propriedade seja tendencialmente perpétua, pode em certos
casos ser objecto de um limite temporal, o que corresponderia precisamente à situação
do usufruto, uma vez que os poderes do usufrutuário coincidem com os do proprietário,
sendo idênticos os deveres de não ingerência por parte de terceiros, que são, no entender
do autor, o elemento característico do direito real.
Crítica: A teoria da propriedade temporária é igualmente incorrecta, uma vez
que a posição do usufrutuário é manifestamente inferior à do proprietário, não sendo os
dois direitos distinguíveis apenas pela limitação temporal.

3. Teoria do direito real de gozo típico: defendida entre nós por Oliveira
Ascensão, Menezes Cordeiro, Carvalho Fernandes, Santos Justo e José Alberto
Vieira, esta teoria considera o usufruto como um direito real de gozo distinto da
propriedade, não constituindo por isso nem um seu desmantelamento nem uma
propriedade especial. A autonomia do usufruto em relação à propriedade seria
demonstrada pelo facto de, embora sendo um direito de gozo pleno, não atribuir a
plenitude das faculdades relativa à coisa, atento os poderes de disposição do
usufrutuário serem limitados. Por outro lado, enquanto a propriedade é um direito
exclusivo, o direito do usufrutuário coincide sempre com outro direito, habitualmente a
propriedade de raiz.30
4. Aderimos, pois, à teoria do direito real de gozo típico.

30José ALBERTO VIERA e Luís MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa,
2017/2018, pág. 393 e ss.

31 | P á g i n a
SECÇÃO II. O USO E A HABITAÇÃO.

1. GENERALIDADES.

Uso e Habitação são Direitos Reais bastantes raros do ponto de vista prático,
definidos pelo art.º 1484.º do CC, "Consite na faculdade de se servir de certa coisa
alheia e retirar os frutos, na medida das necessidades do titular e sua família, se o bem
for uma moradia, esse direito chama-se habitação." A semelhança do usufruto, este
direito pressupõe também o uso e a fruição da coisa, mas com relativa limitação em
relação ao usufruto. Daí que o morador usuário está limitado, por exemplo, não pode ele
arrendar, pelo que este direito não abrange o usufruto dos frutos civis, devendo apenas
este limitar-se em habitar nela, ou seja, é um direito de usufruto, limitado apenas a
atender a necessidade do autor e de sua família não podendo- ceder nem trespassar a
terceiros,31 ao contrário do usufruto que o domínio é global e ilimitado, pelo que é um
direito de usufruto com ligeiras limitações, pois as regras aplicáveis ao usufruto também
se aplica ao uso e habitação, com as necessárias adaptações, conforme consagrado no
artigo 1490.º do CC.32

2. CONTEÚDO DOS DIREITOS DE USO E HABITAÇÃO.

Direitos moldados sobre o regime do usufruto, mas em que os poderes de uso e


fruição são mais limitados.
Uso – faculdade de se servir de certa coisa alheia e haver os respetivos frutos,
na medida da necessidades, quer do titular quer da família (art. 1484º/1).
Habitação – quando o uso tem por objeto a casa de morada de família (art.
1484º/2).
Família é dada pelo entendimento do art. 1487º
A diferença no conteúdo do direito é que, diferente do usufruto, limita-se apenas às
necessidades do titular, fixadas de acordo com as condições sociais (art. 1486º).

4. REGIME DOS DIREITOS DE USO E HABITAÇÃO.

Tem o regime do usufruto quanto às causas de constituição e extinção mas com


algumas especificidades:
 Não se podem constituir por usucapião (art. 1293º/b);
 Intransmissíveis e não podem ser onerados (art. 1488º);
 Obrigações inerentes (art. 1489º).

31 9 Cfr. Artigo 1488.º do CC


32 MORREIRA. Alvaro e FRAGA. Carlos. Op. Cit. P. 418.

32 | P á g i n a
5. TIPOS ESPECIAIS DE USO E HABITAÇÃO.

 Direitos de uso e habitação atribuídos ao cônjuge sobrevivo de habitação


da casa de morada de família e de uso do respectivo recheio- ( art. 2103º-a,
b, c)

 Direitos de habitação atribuídos ao membro sobrevivo da união de facto e


em caso de morte de pessoa que viva em economia comum- diploma da
União de Facto e diploma da Economia Comum33

6. NATUREZA DOS DIREITOS DE USO E HABITAÇÃO.

Em relação aos direitos de uso e habitação tem sido discutido na doutrina se eles
constituem apenas modalidades especiais de usufruto, ou direitos reais de gozo distintos
deste.
A tese da integração no usufruto é sustentada por Mota Pinto, Oliveira
Ascensão e Menezes Cordeiro.
A tese da autonomia é defendida por Carvalho Fernandes, Santos Justo e José
Alberto Vieira.
O Código Civil segue claramente a primeira orientação, como se comprova pela
inserção do uso e da habitação no título relativo ao usufruto. Parece-nos, no entanto, ser
preferível a segunda. Efectivamente, a autonomia dos direitos de uso e habitação em
relação ao usufruto é confirmada pelo facto de eles não atribuírem um direito de gozo
pleno sobre a coisa, atentas as limitações estabelecidas ao uso e fruição, sendo o uso
funcionalizado às necessidades do titular e da sua família.34

33LEITÃO Luís Menezes, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 96
34José ALBERTO VIERA e Luís MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa,
2017/2018, pág. 404

33 | P á g i n a
SECÇÃO III. O DIREITO DE SUPERFÍCIE.

1. GENERALIDADES.

Nos termos do artigo 1524.º CC, a superfície consiste na faculdade de construir ou


manter, perpétua ou temporariamente uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou
manter plantações. Esta definição não cobre, no entanto, toda a realidade abrangida pelo
direito de superfície.
Efectivamente, a superfície pode abranger quer obras no subsolo (artigo 1525.º, n.º2
CC), quer o direito de construir sobre edifício alheio (artigo 1526.º CC), e pode
igualmente resultar da alienação separada das árvores em relação à propriedade do solo
(artigo 1528.º CC), sendo que estes casos dificilmente se adequam à definição legal de
superfície.
A definição legal expressa, no entanto, uma configuração específica da superfície
que é o facto de ela se poder subdividir em duas fases distintas:
 O poder de realizar a obra ou a plantação; e
 O poder de as manter no terreno ou no edifício alheio, sem sujeição às
regras da acessão.35

2. OBJECTO DO DIREITO DE SUPERFÍCIE.

O direito de superfície tem sempre por objecto uma coisa imóvel, sendo essa
coisa, com excepção da superfície de sobrelevação, um terreno. Assim o objecto não
pode ser confundido com a obra ou a plantação que eventualmente possa existir no solo.

O superficiário terá assim dois direitos: um direito de superfície, que versa


sobre o solo; um direito de propriedade, que versa sobre um objecto distinto (o
implante, material ou vegetal).36

3. DURAÇÃO DO DIREITO DE SUPERFÍCIE.

A lei admite a possibilidade de a superfície ser temporária ou perpétua. A


opção por qualquer das modalidades resulta naturalmente do título constitutivo. Sendo
temporária, a superfície extingue-se por decurso do prazo (artigo 1536.º, alínea c) CC),
dando-se a reversão para o proprietário do solo (artigo 1538.º, n.º1 CC).

35 José ALBERTO VIERA e Luís MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa,
2017/2018, pág. 418
36 MALÓ Mafalda, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág.68

34 | P á g i n a
4. CONSTITUIÇÃO DO DIREITO DE SUPERFÍCIE.

• Contrato – sempre que o proprietário atribua a outrem o direito de construir ou


realizar plantações no seu terreno.
o Deve revestir a forma de escritura pública –estando sujeito a registo (art.
2º/1/a Cód. RP).
• Testamento
• Usucapião
o Carvalho Fernandes: direito de realizar a construção ou plantação não se
adquire por usucapião, uma vez que não é fácil configurar uma situação de posse
que revista a forma correspondente à faculdade de fazer uma construção ou
plantação em solo alheio. Usucapião é apenas possível em caso de exercício de
uma posse sobre a obra ou plantação já existente, bastando para isso que o
possuidor não estenda a sua posse em relação ao solo.
o Menezes Leitão: teoricamente é possível o exercício de poderes sobre o solo,
correspondentes às faculdades de construção ou plantação, ainda antes de as
mesmas serem realizadas. Assim que comecem a ser exercidas, inicia-se o prazo
para a usucapião do direito de superfície.

• Alienação da obra ou da plantação separadamente da propriedade do solo –


proprietário tem a possibilidade de alienar autonomamente o solo e os implantes nele
existentes.
o Pode alienar a terceiro a obra ou plantação, ficando com a propriedade do solo e
pode aliená-los separadamente a pessoas distintas: dá-se automaticamente a
constituição de um direito de superfície a favor do adquirente do implante,
independentemente de qualquer declaração negocial nesse sentido.

5. PODERES E DIREITOS DO SUPERFICIÁRIO.

 Poder de construir ou plantar em terreno alheio – poder de transformação do


solo ou do subsolo alheios.
 Poder de manter a construção ou plantação em terreno alheio – é titular
dessas obras e não está sujeito às regras da acessão, não podendo o proprietário vir
reivindicar o implante, apesar de estar incorporado no seu terreno.
 Constituição das servidões necessárias ao exercício do direito de superfície –
art. 1529º
 Uso e fruição dos bens implantados – pertence naturalmente ao superficiário,
pelo que pode exercer sobre o implante os mesmos poderes de gozo que
competem ao proprietário.

 Disposição do direito de superfície – art. 1534º - além de poder alienar o seu


direito, pode onerá-lo através da constituição de direitos reais de gozo ou garantia
sobre o mesmo (art. 1539º).

35 | P á g i n a
 Indemnização em caso de aquisição do implante por outrem – hipótese
prevista para o caso de o proprietário adquirir a obra ou as árvores no fim do
prazo, sendo a indemnização correspondente ao enriquecimento sem causa (art.
1538º/2).37

6. PODERES E DIREITOS DO PROPRIETÁRIO DO SOLO.

 Uso e fruição da superfície, antes de o superficiário proceder ao implante –


art. 1532º - fundeiro tem primeiramente esses poderes e enquanto não se iniciar a
obra ou não se fizer a plantação de árvores ele conserva estes poderes,
correspondentes à sua propriedade.

 Uso e fruição do subsolo, ou do solo no caso de a superfície incidir sobre o


subsolo – art. 1533º - direito do superficiário apenas incide sobre a superfície,
pelo que o proprietário tem direito à outra parte.

 Disposição do direito – art. 1534º

 Direito ao Cânon Superficiário – art. 1530º - pagamento de uma quantia quando


se constitui uma superfície, sendo uma obrigação propter rem, que se transmite
para quem adquira o direito de superfície.

 Direito de aquisição do implante, caso a superfície tenha sido constituída


temporariamente – art. 1538º

 Direito de preferência na venda ou dação em cumprimento do direito de


superfície – art. 1535º

7. EXTINÇÃO DA SUPERFÍCIE

As causas de extinção da superfície podem ser:


a) Não realização da obra ou plantação no prazo fixado ou, na falta de fixação, no
prazo de 10 anos
• Não é regido pelas regras da caducidade e sim pelas regras da prescrição – art. 1537º/138

b) Não reconstrução da obra ou não renovação da plantação dentro dos mesmos


prazos, após a sua destruição – a destruição não constitui facto extintivo da superfície
(a menos que assim seja convencionado – art. 1536º/2)
c) Decurso do prazo, sendo constituída por prazo certo – regras da caducidade (art.
298º/2)

37LEITÃO Luís Menezes, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 99
38O que implica a necessidade de invocação (art. 303º), possibilidade de suspensão do respetivo
prazo (art. 318º e ss.) ou da sua interrupção (art. 323º).

36 | P á g i n a
d) Reunião na mesma pessoa do direito de superfície e do direito de propriedade –
aplicação do regime da confusão.

e) Desaparecimento ou inutilização do solo – embora o direito de superfície não incida


sobre o solo, a subsistência e aptidão do terreno para a construção ou plantação são
essenciais para o exercício do direito de superfície.

f) Expropriação por utilidade pública

g) Destruição da obra ou das árvores ou verificação de qualquer outra condição


resolutiva, caso a mesma tenha sido estipulada no título constitutivo

8. NATUREZA DO DIREITO DE SUPERFÍCIE.

• Teoria do Desmembramento – Pires de Lima / Antunes Varela, Oliveira Ascensão –


não é direito sobre coisa alheia e sim sobre coisa própria (o implante), que permanece
em terreno ou prédio alheio, sem sujeição às regras da acessão, constituindo-se uma
propriedade superficiária.
o Menezes Leitão: não pode ser qualificada como propriedade.

• Teoria do Direito Real de Gozo Autónomo – Menezes Cordeiro, Menezes Leitão –


direito real menor que comprime a propriedade do solo, pois não é direito exclusivo e
pleno, coexistindo com o direito do proprietário do solo e não atribui todas as
faculdades. É direito real complexo que inclui faculdades de outros tipos legais.

• Teoria Dualista – Mota Pindo, Carvalho Fernandes – distingue entre as faculdades de


construção e plantação e o direito incidente sobre as construções e plantações, sendo
direitos distintos e de natureza diferente: direito real autónomo que abrange as
faculdades de construção e plantação e direito de propriedade sobre a construção e
plantação.39
o Menezes Leitão: quebra a unidade do direito de superfície pois o direito é
sempre o mesmo, quer abrangendo as faculdades quer abrangendo as
construções em si. Uma vez realizado o implante, a faculdade de transformação
do solo não desaparece.40

39 Conceção de Mota Pinto ≠ CARVALHO FERNANDES  Faculdades de construção e plantação são


direitos reais de aquisição e o direito sobre a obra ou plantações é direito real de gozo autónomo,
que não seria propriedade por não ser exclusivo (não é concebido sem a propriedade do fundeiro)
40 LEITÃO Luís Menezes, Direito Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 98 e ss.

37 | P á g i n a
SECÇÃO IV. AS SERVIDÕES PREDIAIS.

1.GENERALIDADES.

Existem duas noções de servidões prediais: a legal e a doutrinária. A legal é


dada pelo artigo 1534º e é considerada defeituosa em dois sentidos.

Artigo 1543º: “Servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo
de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão
e dominante o que dela beneficia.

Defeitos:
• Coisificação: é um encargo imposto a um prédio, mas os prédios não têm direitos;
• Enfoque no prédio serviente e não no prédio dominante: O foco deveria ser no
titular do direito do prédio dominante e não no titular do direito passivo; deve primeiro
ver-se o lado ativo e só depois o passivo.
Exemplo: prédios contíguos pertencem a A e a B. o prédio de A dá para a via
pública e o do B não. B terá uma servidão de passagem pelo prédio de A para ter acesso
à via pública.

Noção doutrinária: “Direito do titular de um direito real sobre um prédio a utilizar


um prédio alheio para melhor aproveitamento do prédio dominante.”

2. CARACTERÍSTICAS DAS SERVIDÕES PREDIAIS.

• Inseparabilidade (artigo 1545º): As servidões não podem ser separadas dos


prédios a que pertencem. Se a utilidade de uma passagem ou aproveitamento de águas
passa a ser apropriada por o titular de um terceiro prédio, passa a haver também
servidão por parte desse terceiro.
Exemplo: servidão de A em relação aos prédios de B e de C. A não alarga a sua
servidão ao passar a ter servidão de passagem em relação a dois prédios
dominantes, B e C. Simplesmente passa a ter duas servidões.
• Indivisibilidade (artigo 1546º): Se o prédio serviente se dividir, a servidão nãos e
destrói, simplesmente passa a incidir sobre todas as partes divididas necessárias à
servidão.

3. MODALIDADES DE SERVIDÕES.

Existem três classificações:


• Aparentes e não aparentes (artigo 1548º): são aparentes as que se revelam por
sinais visíveis e aparentes, não são aparentes as contrárias. Uma servidão e passagem é,
normalmente, aparente pois o caminho de passagem será visível.
• Legais ou Voluntárias: consoante estejam estabelecidas por lei ou por força da
autonomia privada.

38 | P á g i n a
• Positivas ou negativas: são positivas as que implicam uma conduta positiva do
titular do prédio serviente, e são negativas as que implicam uma mera abstenção, por
exemplo a não construção.41

4. A CONSTITUIÇÃO DAS SERVIDÕES.

O art. 1547º do C.C. estabelece como podem ser constituídas as servidões prediais:
 Contrato – proprietários acordam em atribuir, por intermédio de um dos prédios
determinadas utilidades ao outro prédio.
➢ Deve ser celebrado por escritura pública (art. 22º/a DL 116/2008) e
sujeito a registo (art. 2º/1/a Cód RP).

 Testamento – legado de prédio a favor de outrem, constituindo


simultaneamente uma servidão a favor de terceiros.
➢ Deve respeitar a forma dos testamentos (art. 2204º).

 Usucapião (art. 1548º) – apenas no caso das servidões aparentes (art. 1548º/1 +
1293º/a).

 Destinação do pai de família (art. 1549º) – ocorre sempre que em dois prédios
do mesmo dono, ou em duas frações de um só prédio, houver sinais visíveis e
permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para
com o outro.

 Sentença judicial ou decisão administrativa – na falta de constituição


voluntária pode ter de se recorrer a esta figura, e sempre que se verifiquem os
pressupostos de uma servidão legal, a mesma deve considerar-se sujeita a esse
regime, mesmo que tenham sido constituídas voluntariamente.
➢ Sentença judicial: sempre que proprietário do prédio sujeito à servidão
legal não decida voluntariamente constituí-la.
➢ Decisão administrativa: como o caso das águas, ligadas a concessões de
águas públicas.42

5. CONTEÚDO DAS SERVIDÕES.

O conteúdo da servidão predial pode ser muito amplo e multifacetado, sendo que,
segundo o artigo 1544º, podem ser objeto da servidão quaisquer utilidades, ainda
que futuras ou eventuais, suscetíveis de serem gozadas por intermédio do prédio
dominante mesmo que não aumentem o seu valor. Os tipos de servidões mais

41NUNES Pedro Caetano, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2016/2017, pág. 53 e ss.
42LEITÃO Luís Menezes, Direito Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 105 e ss.e
ss.

39 | P á g i n a
relevantes encontram-se expressamente regulados na lei, como a servidão de passagem,
a servidão de águas ou a servidão de vistas. Não obstante, o tipo geral é regulado nas
disposições a que já fizemos referência, artigos 1543º e 1544º do Código Civil.43

7. AS SERVIDÕES LEGAIS.

Pode ser constituída sem o consentimento do proprietário do prédio sujeito à servidão.


• Art. 1547º/2 – podem ser objecto de constituição voluntária por negócio jurídico ou
através de sentença judicial ou decisão administrativa.
• Art. 1569º/2, 3 e 4 – causas de extinção particulares.

8. A EXTINÇÃO DAS SERVIDÕES

A extinção das servidões está prevista no artigo 1569º.


• Reunião dos prédios na mesma pessoa- alínea a)-se os prédios passam a
pertencer à mesma pessoa extinguese a servidão, pois da definição legal de servidão faz
parte a exigência de que os prédios pertençam a donos diferentes.

• Pelo não uso durante vinte anos- alínea b). O artigo 298/3 estabelece que os
direitos reais de gozo regulados no código civil na prescrevem, mas anuncia a existência
de casos de extinção dos mesmo por não uso, sendo o prazo para o efeito extintivo de 20
anos.
• Usocapio libertatis- alínea c). é o inverso da usucapião; há uma utilização
analógica da figura da usucapião pois o que se obtém não é a constituição, mas sim a
extinção de um direito; a libertação em causa exige não apenas o não exercício do
direito, mas também a existência de oposição ao mesmo por parte do dono do prédio
serviente (artigo 1574º/1); decorre implicitamente da lei que os prazos necessários à
extinção de servidão se decalcam sobre os da usucapião (artigo 1574º/2).

• Renuncia pelo titular do prédio dominante. A lei estabelece que a renúncia não
requer aceitação do dono do prédio serviente (artigo 1569º/5).

• Decurso do prazo- alínea e), quando constituídas temporalmente.

•Extinção por desnecessidade, que só funciona quanto a servidões legais e


constituídas por usucapião, em protecção do princípio da autonomia privada- artigo
1569º/1,2.

• Remissão: por iniciativa do dono do prédio dominante. Esta causa de extinção


aplica-se a apenas às servidões para aproveitamento de águas e depende da
demonstração pelo dono do prédio serviente de que pretende fazer da água um

43 CARREIRO Inês Mota, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág. 78

40 | P á g i n a
aproveitamento justificado incompatível com a servidão; a remissão não pode ser
exigida antes de decorridos dez anos sobre a constituição da servidão e pode importar a
restituição ao dono do prédio dominante da indemnização que ele tenha pago no
momento da constituição da servidão (artigo 1569º/4).44

NATUREZA

• Teoria do Desmembramento da Propriedade – Teixeira de Abreu, José Tavares –


desmembra-se a propriedade pelo que a servidão é um direito real que incide, não sobre
coisa alheia, mas antes sobre coisa própria, sendo a servidão frações da propriedade.
 ML: teoria ultrapassada pois não há desmembramento da propriedade, apenas a
sua compressão.
• Teoria da Propriedade Especial – Neuner – é faculdade integrante da propriedade
sendo uma parte que foi retirada da extensão do direito de propriedade e que seria
atribuída, como propriedade, em exclusividade a outrem.
 ML: falha pois não é, ao contrário da propriedade um direito exclusivo
• Teoria da Limitação do Exercício do Direito – Windscheid, Guilherme Moreira, PL
/ AV – limitação ao exercício do direito do proprietário do prédio serviente, que não
afecta o seu conteúdo, mas que permite ao titular do prédio dominante aproveitar-se de
certas utilidades proporcionadas por coisa alheia.
 ML: está de alguma forma presente no art. 1543º quando qualifica a servidão
como encargo, mas, só qualifica o lado passivo e a servidão tem um lado
activo.
• Teoria Dualista – próximo de JAV – desmembramento nas servidões positivas e
limitação nas servidões negativas.
 ML: a servidão tem um conceito unitário.
• Teoria do Direito Real Menor – OA, Carvalho Fernandes, ML – direito real de gozo
incidente sobre coisa alheia, ainda que o gozo que a servidão proporciona incida sobre
coisa diferente daquela que constitui o seu objecto.45

44 NUNES Pedro Caetano, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2016/2017, pág.56 e ss.
45 LEITÃO Luís Menezes, Direito Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2017/2018, pág. 108

41 | P á g i n a
2- DIREITOS REAIS DE GARANTIA

GENERALIDADES

Os direitos reais de garantia atribuem ao titular o direito de se fazer ou de


satisfazer o seu crédito à custa do valor ou de rendimentos de um certo, de determinado
bem, com preferência sobre os demais credores que não tenham uma garantia registada.
Qualquer credor que seja titular de um direito real de garantia pode para o efeito,
intentar uma acção executiva que vise à realização do seu crédito.
Álvaro Morena e Carlos Fraga, sustentam que os direitos reais de garantia são
acessórios dos direitos de crédito, mas que têm uma natureza jurídica própria; esta
natureza, referem os autores, é a dos direitos reais pelo facto de apresentarem notas
características destes, como é o caso do direito de sequela e o direito de preferência.
Todavia, os direitos reais de garantia distinguem-se da fiança conforme
estabelecida no artigo 627º, e seguintes de Civil. A fiança é um direito pessoal de
garantia dito de outro modo, do lado do devedor temos o património de uma outra
pessoa que será o gerente da dívida de outrem; nestes termos, faltando o devedor ao
cumprimento, o crédito irá recair sobre o património do fiador.
Uns direitos reais de garantia são:
-Consignação de Rendimentos (artigo 656º);
-Penhor (artigo 666º);
-Hipoteca (artigo 686º)
-Privilégios Creditórios, que podem ser:
 Mobiliários (artigo 738º, C.C)
 Imobiliários (artigo 754º, C.C.)
-Direito de Retenção (artigo 754º, C.C.)

42 | P á g i n a
SECÇÃO I- A CONSIGNAÇÃO DE RENDIMENTOS

1-GENERALIDADES

O ilustre professor Santos Justo, no seu livro “Direitos Reais”, na parte que
retrata dos direitos reias de garantia, define consignação de rendimentos como uma
garantia real que consiste na afectação (ou consignação) dos rendimentos de certos bens
imóveis ou móveis sujeitos a registo ao cumprimento de uma obrigação e ao pagamento
de juras, ao cumprimento apenas da obrigação ou só ao pagamento dos juros.
Estes rendimentos são atribuídos ao credor durante certo prazo e nunca superior
á quinze anos se incidir sobre rendimentos de imóveis ou até ao pagamento da dívida
garantida.
A doutrina do professor supramencionado relaciona-se com o artigo 656.º do
Código Civil Angolano que dá a noção de consignação de rendimento como: “o
cumprimento da obrigação ainda que condicional ou futura, pode ser garantido mediante
a consignação dos rendimentos de certos bens imóveis, ou de certos bens móveis
sujeitos a registo”- a luz deste artigo, a consignação do rendimento do património do
devedor para com seu credor, constitui uma das garantias do cumprimento do crédito;
incide sempre nos bens imóveis ou móveis sujeitos a registo do devedor; nunca sobre
bens móveis não sujeitos a registo. Esta é a ilação do artigo 656.º do Código Civil, nos
seus números 1 e 2.

2-BREVE REFERÊNCIA HISTÓRICA

A consignação de rendimentos remonta aos direitos da antiguidade. O Direito


Romano recebeu-a da Grécia, que a denominava anticrese e onde significava
contrafruição1; permitia ao credor perceber os frutos de uma coisa que o devedor lhe
entregava em compensação dos juros.

No século XVIII a anticrese foi, entre nós, incentivo de para evitar as vendas
judiciais por vezes ruinosos. E foi-se acolhida no Código Civil de 1867 e no Código de
1966 com o nome de consignação de rendimentos.

3-MODALIDADE DE CONSTITUIÇÃO

A consignação de rendimentos pode constituir-se de vários modos:


a)Voluntária: resulta de negócio jurídico inter vivos ou mortis causa feito por quem
puder dispor dos rendimentos consignados. Se o acto for inter vivos, deve revestir a
forma de escritura pública ou de documento particular autenticado se os rendimentos
afectados forem de bens imóveis; e o de documento particular se derivarem de bens
móveis.
Em qualquer caso, a consignação de rendimentos deve ser registada; salvo se
incidir sobre rendimentos de títulos de crédito nominativos, situação em que deve ser
mencionada nos títulos e averbada nos termos da respectiva legislação.

43 | P á g i n a
Não sendo registada, não produzirá efeitos em relação a terceiros. Isso tendo têm
como base legal o artigo 657.º, nº 1 do Código Civil, “legitimidade. Consignação
constituída por terceiro”. O artigo 658.º nº2, ”espécies”, e o artigo 660.º, nº1”forma
registo”, todos do Código Civil.

b)Judicial: é constituída por decisão judicial e utiliza-se para evitar a venda (judicial)
ruinosa dos bens. Por isso, deve ser requerida pelo exequente e supõe o acordo do
executado2

4- REGIME JURÍDICO DA CONSIGNAÇÃO DE RENDIMENTOS

O âmbito da consignação de rendimento depende do título constitutivo. As


partes podem estipular que os bens continuem em poder do concedente ou passem para
o do credor ou de terceiro; como o art. 661º, nº1, do C.C faz menção.
Nas primeiras hipóteses, quer o concedente, quer o credor pode exigir a
prestação de contas (respectivamente do credor ao concedente) se a consignação de
rendimentos não incidir sobre uma importância fixa.(Artigo 662º, do C. Civil)
Na última o credor, fica com o direito de receber os respectivos frutos como
preceitua o artigo 661, nº1, al. c.

5- NATUREZA JURÍDICA DA CONSIGNAÇÃO DO RENDIMENTO

Sustenta-se que se trata de um direito real de garantia, embora complexo, porque


compreende poderes de fruição e de uso e faculdades importadas da locação e da
hipoteca.3 O credor ou o terceiro a quem a coisa empenhada pode ser entregue é
equiparado ao locatário. Artigo 661, alínea b) e c).

44 | P á g i n a
SECÇÃO II- O PENHOR

1- NOÇÃO

O penhor é a garantia real que confere ao credor o direito à satisfação do seu


crédito e juros, se os houver com preferência sobre os demais credores pelo valor de
certa coisa móvel, créditos ou outros direitos não susceptíveis de hipoteca pertencentes
ao devedor ou a terceiro. É o que o artigo 666.º, nº1 do Civil preceitua.

2- BREVE REFERÊNCIA HISTÓRICA

O penhor é, no Direito Romano, uma garantia real denominada pignus, vocábulo


que deriva deposito, terá sido criado pela jurisprudência romana para afastar os
inconvenientes da fiducia cum creditore, e caracterizava-se pela transferência da
detenção de uma coisa ao credor, que se averiguava a conservação e a restituí-la após a
satisfação do seu crédito.
Ordinariamente, eram concedidas ao credor faculdades mais amplas, através dos
seguintes factos: pela
Todavia, porque o pacto comissário favorecia práticas usuárias (em regra, o
valor da coisa empenhorada era superior à obrigação garantida e, portanto, o credor
enriquecia-se à custa doutrem), o que o imperador constantino proibiu-se no ano 326).
Por sua vez, a frequência com que os pactos de venda eram feitos, determinou
que se convertessem também a partir de Constantino num elemento natural de pignus.
No entanto o credor devia pedir três vezes o pagamento da dívida antes de proceder a
venda da coisa empenhada. Se não encontrasse comprador, o credor podia pedir
autorização para se tornar proprietário, mas o credor gozava da faculdade de a resgatar
dentro de dois anos.
Ainda no direito Romano, o pignus tinha duas características:
 Acessória: Segundo a qual a existência e a validade do penhor dependiam da
existência e a validade da obrigação garantida;
 Indivisibilidade: que determinava que a extinção parcial da dívida não
extinguia parcialmente o pignus.

3- MODALIDADE DA CONSTITUIÇÃO DO PENHOR

O penhor só produz efeito com a entrega da coisa empenhada ou documento que


confira a sua exclusiva disponibilidade. Como preceitua o artigo 669.º, nº 1 do cc.
A entrega (traditio) publicita o penhor, e por isso imprime a necessária protecção
de terceiros. Entanto porque priva o autor do penhor da possibilidade dispor
materialmente da coisa, a entrega pode em certos casos, consistir na simples atribuição
da com posse ao credor.
Quanto ao penhor de direitos, a sua constituição está sujeita a forma e
publicidade exigida para a transferência. E se o direito estiver sujeito à registo só produz
efeito a partir do registo. Artigo 681.º, nº 2 cc.

45 | P á g i n a
4- OBJECTO DO PENHOR

O penhor pode incidir sobre coisas móveis, créditos ou outros direitos não
susceptíveis de hipoteca, pertencente ao devedor ou a terceiros. art. 666.º nº1 cc.
Portanto não pode incidir sobre coisas móveis registáveis, ou seja, susceptíveis de
hipoteca “os automóveis, as aeronaves, os navios…”; e porque a coisa móvel deve ser
certa, também as universalidades de facto não podem ser dados em penhor.
Do mesmo modo, só podem ser empenhadas direitos que tenham por objectos
bens móveis.

5- REGIME JURÍDICO
Como no direito romano, o penhor é um direito real acessório indivisível: está ao
serviço de um serviço ‘que dita o interesse e sentido da operação’ e por isso, extingue-se
caso desapareça a obrigação garantida em conformidade com o artigo 677 cc. Se a
obrigação garantida se extinguir parcialmente ou se fraccionar, penhor manter-se-á
sobre a totalidade da coisa.
O credor pignoratício é detentor e não possuidor da coisa empenhada art. 1253.º
do C.C alínea a) e c). Embora possa recorrer as acções possessória para a defesa do seu
direito mesmo contra proprietária. Quanto aos deveres, o credor pignoratício é obrigado
a guardar e administrar a coisa empenhada como um proprietário diligente; a não usá-la
sem o consentimento do autor do penhor, salvo se o uso for indispensável a sua
conservação; e a restituí-la depois de a obrigação garantida extinguir.

Da obrigação de administrar resulta o dever de perceber os frutos que devem ser


destinados sucessivamente ao pagamento das despesas, dos juros, e finalmente da
capital vencida a obrigação.
O credor pignoratício tem o direito de se pagar pelo produto da venda da coisa
empenhada, que pode ser feita extrajudicialmente, se assim tiver sido convencionado.
Mas por outro lado não se admite a convenção que afasta a possibilidade da
venda ou adjudicação da coisa empenhada: o penhor é uma garantia real que incide
sobre uma coisa e portanto, seria descaracterizá-lo se a sua venda pudesse ser afastada.
Se o penhor for constituído por terceiro, a sua execução determina a sub-rogação desta
nos direitos do credor.

6- MODO DE EXTINÇÃO DO PENHOR

O penhor extingue-se por diversas causas, algumas comuns a extinção da


hipoteca. Merece, todavia, destaque a restituição da coisa empenhada ou do documento
que confira a sua exclusiva disponibilidade: se a entrega é necessária basta também a
sua restituição para que a garantia fique despojada da sua eficácia.46

46 Vide Menezes Cordeiros (O.C.744)

46 | P á g i n a
7- NATUREZA JURÍDICA DO PENHOR

A natureza jurídica do penhor está longe de ser pacífica. Há quem entenda que
trata de uma figura processual, segundo a doutrina de Carnelutti e de Liebiman, de um
direito de crédito; e para a doutrina de Cosentino de um direito misto, de um direito real
complexo, esta é a doutrina que podemos considerar dominante, embora defendida por
quem tem dos direitos reais diferentes entendimentos.
Também nós entendemos que o penhor é um direito de natureza real que se
revela na faculdade de o credor fazer vender (quer continue a pertencer ao garante ter a
sua propriedade transferida para terceiro), e de se fazer pagar pelo preço com
preferência aos restantes credores sem garantir.

Poder-se-á ver aqui a sequela e a prevalência características dos direitos reais. 47


Há, no entanto um obstáculo, podendo o penhor incidir sobre direitos como artigo 666.º,
nº1 do C.C. faz menção, e tendo os direitos reais por objecto coisas corpóreas,
questiona-se a natureza jurídica desse tipo de penhor; assim Menezes Cordeiro recusa a
sua natureza de direito real porque tem por objecto não uma coisa, mas uma prestação,
embora reconheça que, a semelhança económica que apresenta com penhor em sentido
próprio justifica que se fale de penhor de crédito. É uma posição aceitável em
obediência ao princípio da coisificação.

47 Vide Morta Pinto, (O.C137 )

47 | P á g i n a
SECÇÃO III- A HIPOTECA

1-GENERALIDADES

A hipoteca A hipoteca é uma garantia especial das obrigações que confere ao credor
o direito de ser pago pelo valor decertas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao
devedor ou a terceiro, com preferência sobre os demais credores que não gozem de
privilégio especial ou prioridade de registo (artigo 686º).
 O que distingue a hipoteca do penhor é que esta só pode incidir sobre bens
imóveis ou móveis sujeitas a registo (artigos 686º - 689º). Por sua vez, o penhor
só pode incidir sobre coisas corpóreas móveis, créditos ou outros direitos não
suscetíveis de hipoteca (artigo 666º/1).
 Para além disto a hipoteca também não confere posse ao credor, enquanto o
penhor confere.

2- ESPÉCIES DE HIPOTECA:

• Legais: resultam imediatamente da lei sem dependência da vontade das partes


e podem constituir-se desde que exista a obrigação a que servem de segurança (artigos
704º e 705º). As hipotecas só se constituem com o registo, pelo que afinal não resultam
diretamente da lei.
• Judiciais: também têm a sua fonte na lei. Ao contrário do que o nome poderia
sugerir, não resultam de sentenças que as constituam ou ordem a sua constituição. A
possibilidade de constituição por iniciativa do credor resulta do mero facto de ser
proferida uma sentença, ainda que não transitada em julgado, que condene alguém a
uma prestação. As hipotecas judiciais podem incidir sobre quaisquer bens (hipotecáveis)
dos devedores (artigos 710º e ss).
• Voluntárias: nasce do contrato ou declaração unilateral (artigos 712º e ss.)
Nota: a hipoteca releva do ponto de vista do crédito imobiliário.

4- REGIME ESPECÍFICO

Quanto ao seu regime de constituição:


• A hipoteca pode ser constituída por terceiro (artigo 717º/1).
• A hipoteca pode ser constituída por contrato ou por negócio jurídico unilateral
(artigo 712º)
• O ato de constituição da hipoteca deve constar de escritura pública ou
documento particular autenticado (artigo 714º)
• Proibição do pacto comissório (artigo 694º): é nula a convenção pela qual o
credor fará sua a coisa onerada no caso de o devedor não cumprir.
• É igualmente nula a convenção que proíba o respectivo dono a alienar ou onerar
os bens hipotecados (artigo 695.º)

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5- EXTINÇÃO DA HIPOTECA

O regime da extinção da hipoteca encontra-se nos artigos 730º a 732º. A hipoteca


extingue-se por:
• Extinção da obrigação garantida: as garantias reais são acessórias da
obrigação. Se a obrigação se extingue, extingue-se a obrigação;
• Prescrição/Caducidade: decorridos 20 anos sobre o registo e 5 sobre o
vencimento da obrigação;
• Perecimento da coisa hipotecada: a hipoteca extingue-se com o perecimento,
mas pode sempre haver uma transferência da hipoteca para os créditos indemnizatórios;
• Renúncia pelo credor hipotecário: porque mesmo quando há o pagamento da
dívida por terceiro, ao receber o valor nos termos do artigo 731º/1, há uma extinção da
hipoteca por força do pagamento da dívida por terceiro. Tal renúncia não carece de
aceitação pelo devedor ou do dono dos bens hipotecados e dispõe sobre a forma de
declaração.48

48 NUNES, Pedro Caetano, Direitos Reais, Faculdade de Direitos de Lisboa, 2016/2017, pág. 70

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SECÇÃO IV- PRIVILÉGIOS CREDITÓRIOS

1-GENERALIDADES

De acordo com o Artigo 733.º do Código Civil Angolano, os privilégios


creditórios são faculdades que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos
credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros.

Os privilégios creditórios têm a sua proveniência da lei, e não dos negócios


jurídicos, há que salientar que os privilégios creditórios, não estão sujeitos ao registo, A
lei concede os privilégios creditórios em função da qualidade do credor(Estado,
autarquias locais, pessoas coletivas públicas) ou função da natureza do crédito.

2- ESPÉCIES

São de duas espécies os privilégios creditórios: mobiliários e imobiliários.


 Mobiliários - Incidem sobre móveis (artigo 735º/1).
Os mobiliários podem ser: Gerais e Especiais.

 Gerais: Abrangem o valor de todos os bens móveis existentes no


património do devedor à data da penhora, ou de acto equivalente.
 Especiais: Compreendem só o valor de determinados bens móveis

 Imobiliários: Encontram-se consagrados no Código Civil Angolano, e os


mesmos encontram-se ligados ou vinculados a categoria especial. Há que frisar
que a lei poderá criar privilégios imobiliários gerais para garantia de
determinados créditos: sucede presentemente com os créditos por contribuições
do regime geral da previdência e dos respectivos juros.

3- EFEITOS E EXTINÇÃO DOS PRIVILÉGIOS

Os privilégios creditórios extinguem-se pelas mesmas causas, por que se


extingue a hipoteca. É um efeito da acessoriedade que caracteriza os direitos reais de
garantia.

4- NATUREZA JURÍDICA

A nossa doutrina considera que os creditórios mobiliários e imobiliários são


verdadeiros direitos reais e de garantia: incidem sobre coisas determinadas e gozam de
prevalência.

De frisar que os privilégios creditórios mobiliários gerais não estão vinculados a


natureza acima mencionada em função da falta de determinação da coisa.

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SECÇÃO V-DIREITO DE RETENÇÃO

1- GENERALIDADES

Segundo o artigo 754.º, o direito de retenção é o direito concedido pela lei a um


credor que detém uma certa coisa do devedor consistente na faculdade de se fazer pagar
por força da sua venda judicial. Página 108 de 143
Quanto à regra geral do artigo 754º, os elementos da previsão legal que
constituem pressupostos são quatro: detenção de um bem alheio; dever de o entregar;
crédito sobre o credor da entrega; conexão entre o crédito do retentor e o do seu
credor. A estatuição desta norma lega é reter a coisa e fazer-se pagar pelo valor dela
com preferência sobre os demais credores.
O professor Caetano Nunes considera que faz todo o sentido aplicar por
analogia a mesma regra para os bens móveis sujeitos a registo, mas diz que esta questão
acaba por não ter relevância social e que não há jurisprudência para esclarecer esta
questão que a lei deixou em aberto. Não é frequente hipotecarmos automóveis ou
aeronaves, já que existem outras garantias mais eficazes para estes bens.

2-PRESSUPOSTOS

Conjugando os artigos 754.º, 755.º, e 756.º CC, verificamos que o direito de


retenção apresenta genericamente como pressupostos:
1. Que o devedor esteja obrigado a entregar uma coisa susceptível de penhora: o
primeiro pressuposto é que o devedor esteja obrigado a entregar certa coisa (artigo 754.º
CC), devendo essa coisa ser susceptível de penhora (artigo 756.º, alínea c) CC).
2. Que seja simultaneamente titular de um crédito sobre a pessoa a quem esteja
obrigado a entregar essa coisa, crédito exigível, ainda que com base na perda do
benefício do prazo, mas não necessariamente líquido
3. Que exista uma conexão causal entre a coisa e o crédito sobre a pessoa que a
deva receber, podendo essa conexão resultar de despesas feitas por causa da coisa ou
danos por ela causados (artigo 754.º CC) ou de uma relação legal ou contratual que
tenha implicado a detenção da coisa, e cuja garantia a lei atribua esse efeito (artigo 755.º
CC)
4. Que nem a aquisição da detenção da coisa tenha resultado de meios ilícitos,
com o conhecimento do adquirente, nem a constituição do crédito tenha resultado de
despesas efectuadas de má-fé;
5. Que a outra parte não preste caução suficiente: o direito de retenção surge
como uma garantia provisória, pelo que cessa se a outra parte prestar caução suficiente
(artigo 756.º, alínea d) CC).

3- DIREITOS DO RETENTOR:

A posição jurídica do retentor é equiparada à do credor pignoratício, quando


recai sobre coisa móvel (artigo 758.º CC), e à do credor hipotecário, quando recai sobre

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coisa imóvel (artigo 759.º CC), sendo aplicável consequente o regime já exposto sobre
estas garantias. Consequentemente, o retentor não pode, em caso algum, apropriar-se da
coisa retida, apenas podendo proceder à sua alienação no âmbito da execução da
garantia.

4-TRANSMISSÃO DO DIREITO DE RETENÇÃO:

Nos termos do artigo 760.º CC, o direito de retenção não é transmissível sem
que seja transmitido o crédito que ele garante. A não admissibilidade de uma
transmissão autónoma do direito de retenção, justifica-se pelo facto de ele ser conferido
por lei, tendo em atenção a particular conexão existente entre o crédito garantido e a
coisa retida, conexão que deixaria de existir se fosse transmitido sem esse crédito.

5-EXTINÇÃO DO DIREITO DE RETENÇÃO:

De acordo com o artigo 761.º do C. Civil, o direito de retenção extingue-se pelas


mesmas causas por que cessa a hipoteca e ainda pela entrega da coisa. Ou seja, o direito de
retenção extingue-se por:
• Extinção da obrigação garantida
• Prescrição • Perecimento da coisa
• Renúncia
• Entrega da coisa

6- NATUREZA DO DIREITO DE RETENÇÃO:

O direito de retenção é moldado sobre o regime do penhor ou da hipoteca,


consoante incida respectivamente sobre coisas móveis (artigo 758.º CC) ou sobre
imóveis (artigo 759.º CC).
O direito de retenção constitui assim um verdadeiro direito real de garantia, na
medida em que, tal como aqueles direitos, possui as características do carácter absoluto,
da inerência, da sequela e da prevalência.

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3- DIREITOS REAIS DE AQUISIÇÃO

GENERALIDADES

Nos direitos reais de aquisição o que está em causa é a possibilidade de


aquisição da coisa com preferência sobre terceiros.
Estes direitos reais não têm lado interno: vou conseguir adquirir o direito, mas
sem adquirir o gozo da coisa.
Eu tenho direito a adquirir com eficácia erga omnes e ninguém pode impedir que
eu adquira. Por exemplo, o direito de preferência com eficácia real (1409º). A e B têm
uma coisa em compropriedade, logo A tem preferência quanto à venda de B da sua parte
em compropriedade. Estas oponibilidades erga omnes fazem sentido não só na aquisição
e uma coisa corpórea, mas num direito de aquisição de uma coisa incorpórea (direito de
crédito, p. ex.).
Um direito de aquisição pode ser absoluto e mesmo assim não ser relativo a uma
coisa corpórea.

A estudar:
• Preferência real
• Contrato-promessa com eficácia real (promessa real de alienação): Há
vozes que apontam no sentido de excluir tais figuras da categoria em causa (Henrique
Mesquita), na medida que os direitos em causa não incidem sobre coisas, apresentando
a estrutura de direitos de crédito - embora com tutela reforçada em virtude da sua
oponibilidade erga omnes.49

Nota: Estes direitos reais não são elencados no artigo 824º/2, o que quer dizer que estes
direitos são imunes à venda judicial.

49 NUNES Pedro Caetano, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág. 79

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SECÇÃO I- A PROMESSA REAL

1-GENERALIDADES

O primeiro dos direitos reais de aquisição corresponde à promessa real. Esta


consiste contrato-promessa (art. 410.º C.C) a que não é atribuída eficácia meramente
obrigacional, a qual se traduz apenas na possibilidade de execução específica (art. 830.º
C.C) e na responsabilidade obrigacional por cumprimento (art.798.º C.C e ss.),mas antes
eficácia real (art. 413.º do C.C),o que permite opor eficazmente a promessa perante
terceiros, sendo por essa via Direito real de aquisição.

2- PRESSUPOSTO DA PROMESSA REAL

A lei permite atribuição de eficácia real ao contrato promessa, no caso da


promessa respeitar os bens imóveis ou moves sujeito a registo, e as partes declarem
expressamente a atribuição de eficácia real e procedem ao seu registo (art. 413.º C.C).
A atribuição da eficácia real tem de constar da declaração expressa, não se
admitindo assim que a mesma seja declarada tacitamente, em excepção à relevância
geral da declaração tácita prevista no (art. 217.º C.C) e tem que ser registada.

3- REGIME DA PROMESSA REAL

A lei não esclarece qual é a forma de obter o cumprimento da promessa com eficácia
real em caso de ocorrer efectivamente a venda do prédio a terceiros.
o Atunes Varela, Almeida e Ribeiro Faria-defendem que deverá estabelecer-
se da mesma forma execução específica contra o obrigado, aplicando em
relação a terceiros o regime de venda de bens alheios, o que permitiria exigir
imediatamente dele a restituição com base a nulidade da venda.
o Dias Marques- defende que devera interpor-se uma acção execução eficácia
contra o terceiro.
o Menezes Cordeiro-Entende que a forma adequada seria uma acção de
reivindicação adaptada contra terceiro (art. 1315.º C.C).

4- NATUREZA JURÍDICA DA PROMESSA REAL

É controvertida a natureza jurídica do direito do beneficiário da promessa com


eficácia real Galvão Telles, Oliveira Ascensão e Menezes Cordeiro, dizem tratar-se de
um verdadeiro direito real de aquisição.
José Alberto Vieira diz que é manifesto que a promessa real embora
pressuponha um direito de caracter relativo, o direito à celebração do contrato
prometido, acaba por extravasar desse direito, na medida em que atribui uma faculdade
absoluta de aquisição da coisa, que a ela inere, beneficando da sequela e prevalência que
caracteriza os direitos reais. Defende consequentemente, que se trata de um direito real
de aquisição.

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SECÇÃO II- DIREITO REAL DE PREFERÊNCIA COM EFICÁCIA REAL

1-GENERALIDADES

Faculdade de adquirir um bem, suportando as mesmas condições de outro


adquirente, que celebrou um contrato relativamente àquele bem.
Pode resultar na atribuição de eficácia real ao pacto de preferência, nos termos do art.
421º do C.C., assim como da concessão legal de direitos de preferência.
Há também preferências legais: direito de preferência do arrendatário urbano,
direito de preferência dos proprietários de terrenos confinantes.
O direito de preferência tem eficácia erga omnes e não está sujeito a registo50,
podendo o titular do direito de preferência opor eficazmente o seu direito não apenas ao
adquirente como a eventuais sub-adquirintes do bem.51

Quando há um incumprimento da obrigação de preferência, o que


acontece? Quando há incumprimento, surge a questão de perceber se o preferente
consegue fazer o seu direito prevalecer ou não. O artigo 1410º é o cerne do regime, já
que é esta norma que estabelece os mecanismos de oponibilidade erga omnes do direito
de preferência. Havendo oponibilidade erga omnes, o comproprietário a quem não se
deu conhecimento da venda pode requerer uma acção judicial de preferência. Segundo
esta norma, há um prazo de 6 meses a contar do conhecimento dos elementos essenciais
da alienação que, se decorrido, faz com que o direito de preferência caduque.52

2- NATUREZA DA PREFERÊNCIA REAL

Em relação a natureza jurídica da preferência real, tem-se colocado da mesma


forma que em relação à promessa real a discussão sobre se a mesma constitui um direito
de crédito oponível a terceiros ou direito real de aquisição, pelas razões acima expostas
preferimos esta última posição.

50 Mas a ação está sujeita a registo: art. 3º/1/a Cód RP


51 LEITÃO Luís Menezes, Sebenta de Direitos Reais, Faculdade de Direito, Lisboa, 2018, pág. 119
52 CARREIRO Inês Mota, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019, pág. 122

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CONCLUSÃO

Em suma, é imprescindível que todos se conscientizem da relevância jurídica


que têm esta temática para a formação e aptidão de um nobre jurista, bem como em
possibilitá-lo a apresentar solução às diversas controvérsias que se verificarem no seu
dia-a-dia!

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

 LEITÃO Luís Menezes, Sebenta de Direitos Reais, Faculdade de Direito,


Lisboa, 2018
 CARREIRO Inês Mota, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa,
2018/2019
 Direitos reais limitados (direitomozeam.blogspot.com)
 NUNES Pedro Caetano, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa,
2018/2019
 José ALBERTO VIERA e Luís MENEZES LEITÃO, Direitos Reais, Faculdade
de Direito de Lisboa, 2017/2018
 MALÓ Mafalda, Direitos Reais, Faculdade de Direito de Lisboa, 2018/2019
 MESQUITA. José Andrade. Direitos Pessoais de Gozo, Coimbra, Almedina
1999
 Acórdão SJ200404270001926 do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal.
 DUARTE. Rui Pinto. Curso de Direitos Reais, Editora Principia, 3ª edição,
2013.
 PRATA Ana, Dicionário jurídico, Volume I, 5º edição, Almedina, Lisboa, 2008
 JUSTO Santos, Direitos Reais, 5 Edição , 2017
 Mini dicionário da Língua portuguesa houaiss, 2010

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