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Resumo
Este artigo almeja analisar, de forma figurativo-argumentativa, a
capa e um editorial da edição de 3 de abril de 2013 da revista
Veja, publicada depois da aprovação da “PEC das domésticas”.
Para a investigação do corpus, recorreu-se aos fatores de
textualidade de Beaugrande e Dressler (apud COSTA VAL,
1991) enquanto conceitos basilares. Na fundamentação da
figurativização, destaca-se o trabalho de Barros (2004). Por fim,
quanto à argumentatividade, notabilizam-se os textos de Mendes
(2010) e de Valente (2019).
Rio de Janeiro – RJ
2022
Introdução
Tendo-se como base o editorial “Preparem os aventais” de 2013 da revista Veja, muito
se tem a discutir. Nenhuma das escolhas feitas para elaborar esse texto foi por acaso ou para
simplesmente o deixar mais rebuscado. Tudo o que está presente ali foi colocado no intuito de
persuadir ou convencer o leitor a concordar com a ideia trazida pelo redator, isto é, diversas
estratégias foram utilizadas para que a opinião do escritor sobre a “PEC das domésticas” fosse
aceita como algo verídico. Tudo isso pode ser comprovado através da teórica Costa Val (1991),
mais especificamente em seu texto “Redação e textualidade”. Nele, defende que todo texto
possui unidade sociocomunicativa, semântica e formal, além de definir, com base em
Beaugrand e Dressler, quais são os fatores de textualidade: intencionalidade, aceitabilidade,
situacionalidade, coerência, informatividade e intertextualidade.
A primeira marca que todo texto deve ter é a intencionalidade, isto é, todo discurso deve
ser constituído de forma coesa e coerente (ou seja, de forma coerente com o conhecimento de
mundo daquele que recepta o texto) e que seja capaz de estar de acordo com os objetivos da
situação comunicativa.
A segunda marca que temos é a aceitabilidade, que abrange a expectativa do leitor, ou
seja, o que ele espera é um texto coerente, coeso, útil e relevante e que, com tudo isso, ele
aprenda algo ou que suas ideias estejam ali presentes. Outra questão que devemos ter em mente
nesta parte é a implicatura conversacional que defende, de acordo com Grice (apud COSTA
VAL, 1991), que existem máximas conversacionais, sendo elas a cooperação, a qualidade,
quantidade e a pertinência da informação que é apresentada e que o produtor do texto só pode
desrespeitá-las se for de maneira a manter uma interação com o seu leitor.
Já a terceira marca é a situacionalidade. É possível notar aqui se um texto está de acordo
com o contexto em que está inserido. Sendo isso, se é pertinente, relevante e adequado à
situação sociocomunicativa. Como consequência disso temos a origem da coerência
pragmática, que é o uso da linguagem normal dentro do contexto em que o leitor possa
reconhecer aquele texto. Toda essa ideia vem da importância de que o autor conheça o
recebedor de suas produções para saber o que deve ou não explicar ou usar.
De certa forma, dando seguimento a anterior, a quarta marca é a informatividade. De
acordo com Costa Val, M.G. (1991) “À medida na qual as ocorrências de um texto são
esperadas ou não, conhecidas ou não, no plano conceitual ou no formal.” é o que define essa
marca. Além disso, ressalta que um texto menos previsível e mais informativo, apesar de
trabalhoso, é bem mais aceito, pois do contrário o seu processamento será impossibilitado.
Costa Val ainda menciona que mais um requisito se enquadra nesse tópico: a suficiência de
dados. Em suas palavras:
“Isso significa que o texto tem que apresentar todas as informações necessárias para
que seja compreendido com o sentido que o produtor pretende. Não é possível nem
desejável que o discurso explicite todas as informações necessárias ao seu
processamento, mas é preciso que ele deixe inequívocos todos os dados necessários à
sua compreensão aos quais o recebedor não conseguirá chegar sozinho.” Costa Val,
M.G. (1991)
É possível complementar ambas as ideias com os textos dos teóricos Mônica Mendes
Silva Rocha (2010) e André Crim Valente (2019). Nestes, é possível ter uma noção do que é a
argumentatividade e como ela se faz presente nas mais variadas formas de texto, com ressalva
de ambos os autores de que não se faz necessário estar em uma estrutura de texto argumentativo
para se ter a argumentatividade como uma característica do texto.
E, por último, tem-se a quinta marca que é a intertextualidade. Esta é uma relação que
existe no texto com um outro fora dele, ou seja, é mais uma marca que deve contar com o
conhecimento de mundo do leitor. No texto, a autora faz a seguinte citação “um discurso não
vem ao mundo numa inocente solitude, mas constrói-se através de um já-dito em relação ao
qual ele toma posição” (Maigueneau (1976.39), apud Koch (1986. 40), apud COSTA VAL,
1991). Isto é, não existe nenhum texto que tenha sido criado de maneira isenta a outros já
existentes. Para complementar isso, o autor ainda cita que alguns textos só fazem sentido
quando se conhece essa intertextualidade e ainda incrementa a ideia de que o senso comum
também faz parte desse processo, citando que apesar de não ter autoria é algo que todos
conhecem. Apesar disso ele faz um alerta de que isso pode abaixar o grau de informatividade.
Com esses embasamentos tonou-se possível conseguirmos notar algumas características
presentes no editorial “Preparem os aventais” da revista Veja.
Corpus e análise
O corpus é constituído de um editorial, cujo título é “Preparem os aventais”1, e de uma
capa de revista, ambos constantes da edição de 3 de abril de 2013 da Veja. Consoante
evidenciado nas considerações iniciais deste trabalho, a análise enfocará a figurativização do
discurso presente na capa e a argumentatividade do editorial. Para tanto, recorrer-se-á,
sobretudo, ao texto de Diana Barros (2004) acerca da figurativização, aos fatores de
1
Disponível em: https://veja.abril.com.br/brasil/preparem-os-aventais/.
textualidade elencados por Beaugrand e Dressler (apud COSTA VAL, 1991) e aos estudos a
respeito dos modalizadores e de seu papel retórico.
Por questões de situacionalidade, cumpre ressaltar-se que a referida edição da revista
foi publicada um dia depois da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n.° 66,
de 2012, popularmente conhecida por “PEC das domésticas”. Graças à PEC, estabeleceu-se a
igualdade de direitos entre os domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais, resultando
em um aumento no custo aos empregadores (VILAR, 2013).
Diante desse cenário, a Veja decidiu abordar a temática, ressaltando-a, inclusive, logo à
primeira vista do público leitor: na capa.
2
Por exemplo, em 2020, o Brasil apareceu no ranking dos cinco países mais afetados por fraudes digitais no Fraud
& Abuse Report (Arkrose Labs, 2020)
3
“a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo” (RODRIGUES apud
DOS SANTOS, 2019).
Conclusão
Levando-se em conta o que foi observado, o texto é constituído de expressões de
contraposição. Em um primeiro momento, as leis são apresentadas como propostas que não
atendem às expectativas da população brasileira; em seguida, a “PEC das domésticas” é
introduzida como algo que foge desse padrão, embora a custo de possíveis dificuldades que a
classe poderia enfrentar a princípio, mas que seriam superadas eventualmente. Esta relação de
sentido entre os argumentos é expressa na junção do uso de conectivos de coesão e dos fatores
pragmáticos de textualidade presentes no repertório. Partindo-se da intencionalidade do texto,
é possível enxergar elementos de textualidade na tecitura da argumentação por intermédio de
observações sobre:
● o contexto em que a revista e os seus leitores estão inseridos (situacionalidade);
● a preocupação com a compreensão da mensagem pelo público-alvo (aceitabilidade);
● a importância do conhecimento prévio adquirido por meio de outros textos
(intertextualidade); e
● as informações que são apresentadas ao leitor (informatividade).
Referências
ARKROSE LABS. Fraud & Abuse Report. Arkrose Labs, 2020. Disponível em:
<https://www.arkoselabs.com/wp-content/uploads/Fraud-Report-Q2-2020.pdf>. Acesso em:
14 de set. de 2022.
COSTA VAL, M.G. Redação e textualidade. São Paulo – Martins Fontes, 1991.
VILAR, I. Entenda o que muda com a PEC das Domésticas. Agência Senado, 2013. Disponível
em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2013/03/18/entenda-o-que-muda-com-a-
pec-das-domesticas>. Acesso em: 14 de set. de 2022.