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Teologia do Novo

Testamento
Prof. Rafael Carvalho Silva
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Prof. Rafael Carvalho Silva


Bacharel em Teologia pelo STBC

Especialista em Teologia do Novo Testamento
Aplicada, pela FABAPAR

Professor de Matemática

Estudante de Física na UFRJ

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Programa

1. O desenvolvimento Histórico da TBNT


2. A metodologia do NT
3. O centro e a unidade do NT
4. A relação do AT-NT
5.
6.

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1. O desenvolvimento
histórico da TBNT
Nosso curso começa pelo desenvolvimento
histórico do Novo Testamento.
Nem sempre houve uma disciplina de Novo
Testamento, tampouco existe hoje uma única
forma de abordar os documentos que o
compõem.
Nesse capítulo apreciaremos o
surgimento das ideias, das tendências
principais e seus métodos de trabalho.

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1.1. A Teologia Bíblica do Novo
Testamento nas luzes da
Modernidade

A Teologia Bíblica tem sua semente plantada


na Reforma Protestante. Alcançando a
libertação da tradição eclesiástica e da
teologia escolástica, o brado da “sola
scriptura” fez a Escritura suplantar essas
autoridades constituídas, dando ocasião ao
conceito de sui ipsis interpres, a auto-
interpretação da Escritura, fonte da Teologia
Bíblica.
É originária, portanto, do Protestantismo.
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1.1. A Teologia Bíblica do Novo
Testamento nas luzes da
Modernidade

Tivemos em Lutero uma ideia que marcou


decisivamente o estudo da Teologia do Novo
Testamento nos séculos que o sucederam,
objeto de reflexão de muitos teólogos: a
unidade da Bíblia.
A ideia de que a escritura manifesta o Cristo
acaba por conferir um fator de unidade aos
testamentos.

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1.1. A Teologia Bíblica do Novo
Testamento nas luzes da
Modernidade

Porém, Lutero e os reformadores não


desenvolveram o que se tornou conhecido
como a disciplina “Teologia Bíblica”, que pode
ser ambígua, podendo significar:
(1) uma teologia que tem suas origens nos
ensinamentos da Escritura e sua base nela ou
(2) uma teologia que a Bíblia, em si, contém.

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1.1. A Teologia Bíblica do Novo
Testamento nas luzes da
Modernidade

A menção ao termo teologia bíblica é do século


XVII e provém da obra “Deutsche Biblische
Theologie”, do alemão Wolfgang Jacob
Christmann, publicado em 1629. Esse trabalho,
no entanto, não existe mais.
O termo, no entanto, pode ser encontrado em
outra obra daquela época, a “Theologia
Biblica”, Henricus A. Diest, bem como as
características dessa área emergente.

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1.1. A Teologia Bíblica do Novo
Testamento nas luzes da
Modernidade

A “Teologia Bíblica” nos séculos XVI e XVII


consistia de “textos-prova” da Bíblia, que eram
retirados indiscriminadamente de ambos os
Testamentos, com o objetivo de salvaguardar
os tradicionais “sistemas de doutrina” da
antiga ortodoxia protestante.
Amparava, portanto, o que conhecemos por
Teologia Sistemática.

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1.1. A Teologia Bíblica do Novo
Testamento nas luzes da
Modernidade

Sua emancipação desse papel subsidiário veio


no movimento pietista, com sua ênfase na volta
às Escrituras. Nesse momento, a Teologia
Bíblica se tornou instrumento de reação contra
a ortodoxia protestante.
Philipp Jacob Spener (1635-1705), um dos
fundadores do pietismo, fazia uma oposição
entre o escolasticismo protestante e a “teologia
bíblica”. Outros pietistas reforçaram o uso
independente da Teologia Bíblica e por volta de
1745 os sinais de separação já eram claros.
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1.1. A Teologia Bíblica do Novo
Testamento nas luzes da
Modernidade

Há, no entanto, outro movimento em curso em


solo europeu nesse mesmo período: O
Iluminismo. Seu espírito revolucionário trouxe
novos contornos, novos elementos, também ao
pensamento teológico, em especial, à Teologia
Bíblica do Novo Testamento.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

Convém fazer algumas breves considerações


sobre os condicionantes do pensamento desse
período (séc XVIII):
a) Racionalismo se destaca com críticas
ferrenhas a qualquer forma de sobrenatural.
b) A razão tornou-se critério final e fonte
principal de conhecimento, o que trouxe críticas
à autoridade da Bíblia como o registro infalível
e inspirado da revelação divina.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

Nesse ambiente é que surgiu nova forma de


interpretar a Bíblia: o método histórico-
crítico, cuja influência atravessará séculos,
sobrevivendo vigorosamente até nossos dias.
A crítica literária também é empregada nesse
período e leva a Bíblia a ser estudada como
qualquer outro documento antigo. São alguns
teóricos desenvolvedores dessa perspectiva: J.
J. Griesbach (1776), G. E. Lessing (1776) e J.E.
Eichhorn (1794).
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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

A Teologia Bíblica passou a ser rival da


Sistemática e ataca suas “especulações vazias
e teorias inertes”.
O alemão Johann Solomo Semler(1725-1791),
cujos textos são um dos primeiros a apresentar
a expressão “teologia liberal”, chega a dizer em
“Treatise on the Investigation of the Canon"
(1771-75) que a Palavra de Deus e a Escritura
Sagrada não são absolutamente idênticas. Um
desprezo claro à inspiração canônica.
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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

Para Semler, a Bíblia é um documento


puramente histórico, devendo ser examinada
enquanto tal, com um a metodologia
puramente histórica e, por isso, crítica.
Em outras palavras, a teologia não pode ser
outra coisa senão uma disciplina histórica, em
antítese em relação à dogmática tradicional.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

No entanto, nem todos tem a mesma opinião. É


o exemplo de Gotthilf Traugott Zacharia (1729-
1777), que não via choque entre a perspectiva
histórica e o entendimento canônico da
Escritura: “o aspecto histórico é uma questão
de importância secundária na teologia”, mas
não dispensável.
Seu objetivo era limpar o sistema dogmático,
sem abandonar a parte histórica.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

Para Zacharia (1729-1777):


I) Cada livro das Escrituras tem sua própria
época, lugar e intenção.
II) Não há distinção entre Teologia Bíblica do AT
e a do NT, que eram ligadas.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

A mais decisiva e abrangente contribuição ao


desenvolvimento dessa nova disciplina veio de
Johann Philipp Gabler (1753-1826)
Foi em sua aula inaugural na Universidade de
Altdorf(!), em 31 de março de 1787 que marcou
o início do papel da teologia bíblica como
uma disciplina puramente histórica e
completamente independente da
dogmática.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

Ficou famosa sua colocação:


“A teologia bíblica possui um caráter histórico,
que transmite o que os escritores sagrados
pensavam a respeito das questões divinas; a
teologia dogmática, pelo contrário, possuí um
caráter didático, ensinando o que determinado
teólogo filosofa sobre as questões divinas, de
acordo com sua capacidade, época, idade,
lugar, doutrina ou escola, e outras coisas do
gênero”.
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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

O enfoque dessa, agora disciplina, é indutivo,


histórico e descritivo, baseado em três
considerações metodológicas essenciais:
(1) A inspiração não deve ser levada em conta,
porque o “Espírito de Deus não destruiu em
nenhum homem santo sua habilidade própria
de entender nem a medida do discernimento
das coisas”. O que conta não é a “autoridade
divina", mas “só o que eles [os escritores
bíblicos] pensaram”.
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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

(2) A teologia bíblica tem a tarefa de reunir


cuidadosamente, com métodos críticos, os
conceitos e ideias dos escritores bíblicos
individualmente, pois a Bíblia não contém as
ideias de apenas um homem. Logo, as opiniões
dos escritores da Bíblia precisam ser
“cuidadosamente recolhidas da Bíblia,
devidamente organizadas, relacionadas aos
conceitos gerais e cuidadosamente comparadas
entre si”.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

(3) A teologia bíblica como disciplina histórica


está, por definição, obrigada a “distinguir entre
vários períodos da velha e da nova religião”. A
tarefa principal é investigar quais são as ideias
de importância para a doutrina cristã, a saber,
quais “se aplicam hoje” e quais não tem
“validade para o nosso tempo”.
Como se percebe, há avanço e limitações
significativas no programa de Gabler.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

Como Glaber não publicou uma Teologia Bíblica


do Novo Testamento, coube a Georg Lorenz
Bauer (1755-1806), seu aluno, tal intento. São
eles os fundadores dessa disciplina.
Mas, ele avança significativamente além de seu
mestre para os problemas das questões
filosóficas.

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1.2. A Teologia Bíblica na era do
Iluminismo

Para Bauer, a teologia bíblica


“deve ser um desenvolvimento — purificado de
todos os conceitos estranhos — da teoria
religiosa dos judeus anteriores a Cristo e de
Jesus e seus apóstolos, um desenvolvimento
traçado a partir dos escritos dos autores
sagrados e apresentado em termos dos vários
pontos de vista e níveis de entendimento que
refletem”.

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1.3. A percurso até o século XX

As mudanças ocasionadas no período iluminista


não poderiam deixar de causar reações em
diversas direções. Daí, outras escolas,
começaram a surgir, enriquecendo o debate
para a jovem disciplina.
Houve abertura ao diálogo com correntes da
filosofia (kantiana, positivista, hegeliana…),
influenciando o pensamento.

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1.3. A percurso até o século XX

As tendências merecedoras de destaque são:


a) histórico-positiva
b) histórico-genética
c) positiva moderna
d) histórico-salvífica
e) história da religião

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1.3. A percurso até o século XX

a) Histórico-positiva
Fundou-se com M.F.A. Lossius e D.L. Cramer.
Consideraram três possibilidades de escrita
uma teologia do NT:
1) Trata-se cada escritor do NT separadamente;
2) Usa-se uma abordagem sistemática dos
“conceitos-de-doutrina”;
3) Combinam-se ambos os métodos.
Emerge a temática unidade e diversidade.
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1.3. A percurso até o século XX

b) Histórico-genética
Representada por August Neander(1830) e
Christian Friedrich Schmid(1853): a diversidade
de mensagens dos escritores bíblicos enfatiza
uma “unidade viva’’ da doutrina de Cristo.
(1) há um a unidade essencial subjacente ao
NT, mesmo com diferentes doutrinas;
(2) o “ histórico-crítico” deve apresentar a
doutrina do NT, ainda que na direção da
sistemática;
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1.3. A percurso até o século XX

c) Positiva moderna
Representada por B. Weiss, cuja opinião era
(1) que a maioria dos escritos do NT é genuína;
(2)João não serve para dar doutrina sobre Jesus;
(3) "a teologia do NT tem que descrever a
multiplicidade das formas de doutrina dos
diferentes escritores do NT”.
(4) Rejeita documentos extracanônicos;
(5) método(histórico-gramatical), sem sistemas
dogmático ou filosófico nem textos paralelos 29 / 39
1.3. A percurso até o século XX

Um dos enunciados programáticos de Weiss é


típico da escola “positiva moderna”:
“A teologia bíblica não pode se preocupar com
as investigações críticas e especializadas a
respeito da origem dos escritos do NT porque é
apenas uma ciência histórico-descritiva”.

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1.3. A percurso até o século XX

d) História da salvação
Konrad von Hofmann representa essa reação
“conservadora”(1810-1877), vendo na Bíblia o
relato de uma história salvífica linear, com Deus
Trino ativo na História, para redimir a
humanidade, em Cristo, primordial do mundo,
desde o AT, mas sem a ideia de textos-provas.
Interessante notar aqui o movimento de
conexão entre os dois testamentos e o
pensamento dos reformadores.
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1.3. A percurso até o século XX

e) História das religiões


Aqui é importante citar o nome William Wrede,
que atuou no final do século XIX, fazendo
afirmações provocadoras:
“A teologia bíblica hoje...não é ainda, no
sentido verdadeiro e estrito, uma disciplina
histórica em absoluto”

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1.3. A percurso até o século XX

Para ele, o nome “Teologia do Novo Testamento


é incorreto, porque não trata de teologia
apenas, mas, na verdade, trata muito mais da
religião. O nome apropriado para a matéria
seria: História da Religião do Cristianismo
Primitivo ou a História da Religião e da Teologia
Cristãs Primitivas.

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1.3. A percurso até o século XX

Ele identifica que a busca é pelo que se


pensava, acreditava, ensinava, esperava, pedia
e lutava no período mais antigo do cristianismo;
não o que certos escritores dizem a respeito de
fé, doutrina, esperança”. E é a matéria de
estudo determina a tarefa.
Logo, TBNT estaria morta!
Só até aqui já é suficiente perceber que TBNT
não é obra de um herói, mas trabalho de muitas
mentes ao longo de séculos.
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1.3. A percurso até o século XX

Eis um resumo do programa de Wrede:


(1) livre de interesses da Igreja e da dogmática;
(2) desinteressado da teologia como tal,
(3) metodologia histórica consistente
(4) apresentar a religião cristã antiga
(5) Usar as fontes fora do cânon,
(6) Investigar e descrever as ideias dos
primeiros cristãos,
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1.3. A percurso até o século XX

Agora, o condicionante histórico inevitável é a I


Grande Guerra:
(1) desconfiança no naturalismo evolucionista.
(2) críticas à “objetividade científica”.
(3) a tendência para um retorno à ideia da
revelação na teologia dialética (neo-ortodoxa),
com renovado interesse

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1.3. A percurso até o século XX

Agora, o condicionante histórico inevitável é a I


Grande Guerra:
(1) desconfiança no naturalismo evolucionista.
(2) críticas à “objetividade científica”.
(3) a tendência para um retorno à ideia da
revelação na teologia dialética (neo-ortodoxa),
com renovado interesse

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1.3. A percurso até o século XX

Barth é um expoente desse novo fazer


teológico, a Teologia Dialética. Expôs seu
pensamento sobre o lado divino do
relacionamento Deus-homem , isto é, Deus
como a fonte da revelação, que se dirige ao
homem por intermédio de sua palavra.
Busca apresentar uma perspectiva pós-
crítica, penetrando no testemunho da
Revelação da Bíblia

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1.3. A percurso até o século XX

Não podemos deixar de falar de uma figura


muito citada, que é Rudolf Bultmann, que
emerge do movimento da história da
religiões e terá bastante destaque ao longo
de seis décadas de produção de pensamento
teológico referente ao Novo Testamento.
Falaremos de sua vida e obra em aula
separada.

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