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ISSN 1679-5520
CORPO EDITORIAL
Anna Stegh Camati, Brunilda T. Reichmann
Sigrid Renaux, Mail Marques de Azevedo
CONSELHO CONSULTIVO
Prof. Dra. Maria Sílvia Betti (USP), Prof. Dra. Anelise Corseuil (UFSC), Prof. Dr. Carlos
Dahglian (UNESP), Prof. Dra. Laura Izarra (USP), Prof. Dra. Clarissa Menezes Jordão
(UFPR), Prof. Dra. Munira Mutran (USP), Prof. Dr. Miguel Sanches Neto (UEPG),
Prof. Dra. Thaïs Flores Nogueira Diniz (UFMG), Prof. Dra. Beatriz Kopschitz Xavier
(USP), Prof. Dr. Graham Huggan (Leeds University), Prof. Dra. Solange Ribeiro de
Oliveira (UFMG), Prof. Dr. Hans Ulrich Gumbrecht (Stanford University), Prof. Dra.
Aimara da Cunha Resende (UFMG), Prof. Dra. Célia Arns de Miranda (UFPR), Prof.
Dra. Simone Regina Dias (UNIVALI), Prof. Dra. Claus Clüver (Indiana University),
Prof. Dra. Helena Bonito Couto Pereira (Universidade Presbiteriana Mackenzie).
Publicação semestral
ISSN 1679-5520
Apresentação 05
O sensível cinemático: notas sobre eles eram muitos cavalos, de Luiz Ruffato 67
João Guilherme Dayrell
As editoras
Paulo Leminski
Enquanto se considerar que a distinção entre “arte” e “não arte” ainda tem
alguma função, o melhor será definir uma “obra de arte” como um texto,
composto de acordo com um determinado sistema sígnico, que a
comunidade interpretativa autoriza ou nos obriga a ler como uma “obra de
arte”. Esta concepção é uma aplicação mais ampla da consciência de que o
estatuto de “literário” não é inerente a certos textos ou classes de textos
verbais, mas lhes é conferido pelos seus leitores. Uma das peças de arte mais
discutidas no nosso século é o urinol, datado, “assinado” (com o nome do
fabricante) e exibido por Marcel Duchamp em 1917 como Fountain. Depois
da fase inicial de ridicularização e rejeição, a discussão em torno do objeto
tem sido dominada pela questão do que realmente faz dela uma obra de
arte: o próprio objecto exibido, (...) o gesto de seleccionar, assinar e exibir o
objecto numa mostra de arte, ou a proposta e aceitação do próprio conceito
de “ready-made”. Um discurso sobre (as) arte(s) só pode ser viável e vital se
for capaz de acomodar, também, fenômenos contemporâneos. A existência
de “textos achados”, oferecidos e aceites como “arte” demonstra como se
tornou difícil definir o objecto de tal discurso.
(...) um bombom que é obra de arte nem precisa ser especialmente bom.
Basta ter sido produzido com a intenção de constituir arte. É fácil verificar
que, segundo Beuys, a arte nada tem a ver com qualidade. Aquilo a que
almejam as multidões, a que almejamos todos nós, é um sentido – o
sentido outrora oferecido pela religião, pela filosofia, ou pela arte. (...) Que
o bombom gigante seja arte, e não uma simples barra de chocolate, só é
possível após o fim da arte, liberado com esse objetivo por poderosas
teorias políticas que surgiram nos anos 1970, segundo as quais tudo pode
Apesar de ter produzido coisas relevantes no início dos anos 60, Warhol
tem a reputação mais ridiculamente superestimada do século XX. A
influência de Duchamp sobre a arte contemporânea foi libertadora, mas
também catastrófica. (...) [S]em ele não haveria as chamadas instalações,
essas obras tolas em que o espectador é convidado a passar por túneis e
outros recursos infantis. Ou precisa ler uma bula para entender o que o
artista quis dizer. (MARTINS, 2007, p. 14)
Notas
1
Vale lembrar que já no fim do século XIX e início do XX repetia-se a pergunta “Mas
isso é arte?” A propósito, Mônica Sette Lopes (2006, p. 105) rememora o processo
judicial Whistler X Ruskin. O objeto do litígio foi estabelecer se o quadro de Whistler,
Nocturne in bBack and Gold, de 1878, poderia ser considerado arte. No mesmo sentido,
a autora lembra o caso de uma escultura de Brancusi, exportada para os Estados
Unidos em 1926, quando um funcionário da Alfândega questionou sua condição de
obra de arte, isenta de tributação. Transposta para a esfera judicial, a questão foi
encerrada com o veredito contrário ao parecer inicial.
2
Versão em inglês: “What does it mean when artists turn their backs on technique
and embrace incompetence? This course offers a version of the history of modern
and contemporary artistic practices – visual art, music, literature and film – which
reads as a battle between the ‘right’ way and the ‘wrong’ way. (…) The course also
includes discussion of the theoretical underpinnings of approaches which ignore the
instruction manual…. Art and Incompetence.” Disponível em: http://www.tate.org.uk/
modern/. Acesso em: 15 set. 2005. (Nessa, como em todas as citações de textos em
línguas estrangeiras, a tradução é da autora deste artigo.)
3
Versão em inglês: “The work of art cannot be reduced to this ‘work-thing’ (…) since
this work-thing happens to change completely in appearance and internal structure
through temporal or spatial shifts (…) The work-thing functions, then, only as an
external symbol (the signifiant according to Saussure´s terminology) to which
corresponds in the social consciousness a meaning (sometimes called the “aesthetic
object”) consisting of what the subjective states of consciousness in the members of
a certain collectivity have in common” (Mukarovsky, 1977, p. 83).
4
Versão em inglês: “A candy bar that is a work of art need not be a especially good
candy bar. It just has to be a candy bar produced with the intention that it be art (...)
It is easy to see that “quality” has nothing to do with being art under Beuysian
considerations (…) What [the millions] thirst for (...) what we all thirst for, is meaning:
the kind of meaning that religion was capable of providing, or philosophy, or,
finally, art (…) That [The Candy of their Dreams] should be a work of art and not a
mere bar of chocolate is possible only after the end of art, enfranchised as such by
REFERÊNCIAS
ADORNO, Theodor. Teoria estética. 2. ed. São Paulo: Editora 70, s/d.
BELTING, Hans O. The End of the History of Art? Chicago, Illinois: The
University of Chicago Press, 1987.
________. O fim da história da arte. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
________. Likeness and Presence: A History of the Image before the Era of
Art. Trans. Edmund Jephcott. Chicago: The University of Chicago Press,
1996.
BRITTO, Paulo Henriques. Entrevista concedida a Walter Sebastião por
ocasião do recebimento do Prêmio Portugal Telecom. Estado de Minas, caderno
Cultura, 14 nov. 2004.
∗
Este texto é resultado parcial do projeto financiado pelo CNPq intitulado “A
intermidialidade em produções contemporâneas”. Uma versão reduzida, em inglês,
foi apresentada oralmente no Ninth Conference of the Nordic Society for Intermedial
Studies, em Aarhus, Dinamarca, em outubro de 2009 e posteriormente, em português,
no II Encontro memorial do ICHS, em Mariana, em novembro de 2009.
III
Fig. 6 – Capa de uma outra edição do livro de Guy de Maupassant, onde aparecem
Sylvia Bataille (Henriette) e Georges D’Arnoux (Henri).
IV
Fig. 10 – Detalhe do tecido usado por Yinka Shonibare em suas obras. À esquerda
e à direita, o logotipo da Chanel.
Notas
1
A tradução deste e de alguns outros textos da obra de Genette é de Luciene Guimarães
e Maria Antônia Ramos Coutinho em GENETTE, Gerard. Palimpsestos: a literatura de
segunda mão. Extratos traduzidos por Luciene Guimarães e Maria Antônia Ramos
Coutinho. Belo Horizonte: Faculdade de Letras, 2006.
2
Um exemplo disto é a estética do futurismo, que foi percebida em diferentes mídias
(texto, pintura, escultura) com os meios formais específicos de cada mídia. A realização
concreta dessa estética é, em cada caso, necessariamente específica da mídia, mas por si
mesma ela não é, contudo, limitada a uma mídia específica. Até certo ponto, ela é
possível e realizável de forma transmidiática, isto é, possível e realizável em um
cruzamento de fronteiras entre as mídias. De forma similar, alguém pode falar em
uma narratologia transmidiática, referindo-se às abordagens narratológicas que podem
ser aplicadas a diferentes mídias, ao invés de apenas a uma única mídia.
3
Aqui estou usando a nomenclatura de Genette, que classifica as transformações em
transformação simples e imitação.
4
Como este termo ainda não está dicionarizado, fica aqui a sugestão.
5
Entre as pinturas e gravuras analisadas por Posner, destacamos The Swing , de
Hubert Hughes; The Swing, The Shepherds e The Pleasures of Summer de Jean-Antoine
Watteau e The Swing, Blindman’s Buff e The Seesaw, de Jean-Honoré Fragonard.
REFERÊNCIAS
ARVIDSON, Jens et al. Changing Borders: Contemporary Positions in Intermediality.
Lund: Intermedia Studies Press, 2007.
BOLTER, Jay David & Richard Grusin. Remediation; Understanding New Media.
Cambridge & London: The MIT Press, 2000.
CLÜVER, Claus. Ekphrasis Reconsidered: On Verbal Representations of non Verbal
Texts. In: LAGERROTH, Ulla-Britta (Ed.). Interarts Poetics: Essays on the
Interpretations of the Arts and Media. Amsterdã-Atlanta: Rodopi, 1997, p. 19-33.
CLÜVER, Claus. Intermidialidade. Pós: Belo Horizonte, n. 2, p. 8-23, 2009.
ELIZ, Obih-Frank.Yinka Shonibare MBE: Where Art meets Post-Colonial African
Artifice . Disponível em: http://www.zimbio.com/Yinka+Shonibare/articles/
0Y54tOsA7DQ/Yinka+Shonibare+MBE+Art+meets+Post+Colonial. Acesso em:
7 jan. 2010.
GENETTE, Gérard. Palimpsests: Literature in the Second Degree. Trad. Channa
Newman & Claude Doubinsky. Lincoln & London: University of Nebraska Press,
1997.
KENT, Rachel; Robert Hobbs; Anthony Downey; Yinka Shonibare MBE (ed). Yinka
Shonibare, MBE. Munich, Berlin, London, New York: Prestel Publishing, 2008.
MAUPASSANT, Guy de. Um passeio ao campo. Trad. Aurora Rosa. Ficções: Revista
de Contos. Portugal: Lisboa, n. 3., p. 7-24, s/d.
PINTO, Alexandre Dias. Movimento pendular: “‘O Balouço’, de Fragonard” de
Jorge de Sena. Disponível em: http://www.portugal-linha.pt/ensaio/en4.html.
Acesso em: 26 jan. 2010.
POSNER, Donald. The Swinging Women of Watteau and Fragonard. The Art Bulletin,
v. 64, n. 1, p. 75-88, Mar. 1982.
À cabeceira, o corpo
O castigo é uma das diversas conotações que recebe a escrita sobre
o corpo no filme O livro de cabeceira (1996), de Peter Greenaway.1 Em
primeiro lugar, é interessante pensar o título: livro de cabeceira é, a priori,
aquele do qual não se separa, o livro que se busca todas as noites antes de
dormir, o livro diário, que acaba por se tornar a marca de uma personalidade.
E é justamente de uma espécie de diário íntimo que parte o cineasta
britânico: trata-se de um clássico da literatura japonesa do século X, O livro
de cabeceira, de Sei Shonagon. Composto de 164 listas de coisas agradáveis,
irritantes, esplêndidas, o livro, precursor de um gênero tipicamente japonês
conhecido como zuihitsu (escritos ocasionais), apresenta também observações
sobre plantas, pássaros, insetos, etc., em uma prosa ágil, que observa e
registra o transitório, o circunstancial. É o que observa Maria Esther Maciel
(2004):
Pode-se dizer que Greenaway aproveitou toda essa atmosfera em seu filme,
não apenas ao inserir a personagem principal, de nome Nagiko (não por
acaso o mesmo primeiro nome da escritora japonesa) no mundo up to date
das passarelas da moda e dos centros urbanos de Tóquio e Hong Kong no
fim do século XX, mas sobretudo ao potencializar visualmente – através de
citações de trechos ou páginas inteiras do diário – as listas líricas e insólitas
de Shonagon. Os ideogramas da escrita oriental são apresentados na tela
como metáforas vivas, corporais, seja através da reprodução do texto sobre/
sob as imagens desdobradas em diferentes planos, seja a partir da exploração
da analogia (convertida em imagem concreta) entre corpo e livro, pele e
papel. Tudo, com a finalidade de evocar visualmente o que no seu diário
Shonagon elege como sendo os dois princípios fundamentais da vida: os
prazeres do corpo e os deleites da poesia, experimentados a um só tempo.
(p. 213)
Rasgando a pele
Notas
1
O trecho do ensaio desenvolve ideias já debatidas por Maria Ester Maciel, em “São
Jerônimo em tradução: Júlio Bressane, Peter Greenaway e Haroldo de Campos” e
“Poesia à flor da tela”.
2
Greenaway admite, em entrevista, que a beleza da tradução feita por Waley muito
influiu na composição do filme (GREENAWAY, 1997, p. 81).
REFERÊNCIAS
ARBEX, Márcia. “Poéticas do visível: uma breve introdução”. In: ARBEX, Márcia
(org.). Poéticas do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo Horizonte: Faculdade
de Letras da UFMG, Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários,
2006, p. 17-62.
BARTHES, Roland. Variations sur l´écriture. Paris: Seuil, 1994.
CHRISTIN, Anne-Marie. “A imagem enformada pela escrita.” In: ARBEX, Márcia
(org.). Poéticas do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo Horizonte: Faculdade
de Letras da UFMG, Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários,
2006, p. 63-105.
CLÜVER, Claus. “Da transposição intersemiótica”. In: ARBEX, Márcia (org.). Poéticas
do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da
UFMG, Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários, 2006, p. 107-
166.
FREUD, Sigmund. “Gradiva” de Jensen e outros trabalhos. Trad. Jayme Salomão. Rio de
Janeiro: Imago Editora, 1996.
GREENAWAY, Peter. The Pillow Book. Paris: DisVoir, 1996.
GREENAWAY, Peter; CIMENT, Michel. “Une femme émancipéé comme beaucoup
de mes heroines – entretien.” Positif, Paris, n. 431, jan. 1997, p. 80-85.
HOEK, Leo H. “A transposição intersemiótica: por uma classificação pragmática”.
In: ARBEX, Márcia (org.). Poéticas do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo
Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, Programa de Pós-Graduação em Letras:
Estudos Literários, 2006, p. 167-189.
JENSEN, Wilhelm. Gradiva. Trad. Ângela Melim. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora,
1987.
KAFKA, Franz. Na colônia penal. São Paulo: Cia. das Letras, 2011.
MACIEL, Maria Esther. “São Jerônimo em tradução: Júlio Bressane, Peter Greenaway
e Haroldo de Campos”. A memória das coisas: ensaios de literatura, cinema e artes
plásticas. Rio de Janeiro: Lamparina Editora, 2004, p. 61-70.
________. “Poesia à flor da tela”. SELDMAYER, Sabrina; MACIEL, Maria Esther
(orgs.). Textos à flor da tela: relações entre literatura e cinema. Belo Horizonte: Faculdade
Um roteiro fictício
Se ele (o enunciado) não está inscrito em uma réplica, não tem direito à
existência; não tem, por assim dizer, nenhum valor cinematográfico. O
roteirista deve então buscar alternativas se quiser expressar o sentimento
exterior de uma personagem: pode recorrer à voz em off, ao flashback ou ao
flashforward. (GAUTHIER, 1999, p. 42, minha tradução)
Considerações finais
REFERÊNCIAS
BAETENS, Jan. La novellisation contemporaine en langue française. In: « Ce que le
cinéma fait à la littérature (et réciproquement) ». Fabula LHT (Littérature, histoire, théorie),
n°2, 1 décembre 2006. Disponível em: http://www.fabula.org/lht/2/Baetens.html.
Acesso em: 23 abr. 2011.
CALVINO, Italo. Seis propostas para o próximo milênio. Trad. Ivo Barroso. São Paulo:
Companhia das Letras, 2002.
GAUTHIER, Christophe. Le scénario dans le roman: Changement de décor, de
David Lodge. CINéMAS, “Les Scénarios Fictifs”, vol. 9, nº 2-3, printemps, 1999.
LODGE, David. Invertendo os papéis. Trad. Lídia Cavalcante-Luther. São Paulo: Scipione,
1998.
______. A arte da ficção. Trad. Guilherme da Silva Braga. Porto Alegre: L&PM Editores,
2009.
Notas
1
ANDRADE, 2005. Texto publicado pela primeira vez em 1934.
2
ANDRADE, 2005. Texto de 1937. Coadunando-se à peça O rei da vela, ambos os
texto de Oswald destacados aqui compõe a “Trilogia da devoração”, composta por
Oswald para o teatro.
3
AGAMBEN, 2009, p. 41. Giorgio Agamben nos conceitua o termo: “(...) chamarei
literalmente de dispositivo qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de
capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as
condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes. Não somente, portanto, as
prisões, os manicômios, o Panóptico, as escolas, a confissão, as fábricas, as disciplinas,
as medidas jurídicas etc., cuja conexão com o poder é num certo sentido evidente, mas
também a caneta, a escritura, a literatura, a filosofia, a agricultura, o cigarro, a navegação,
os computadores, os telefones celulares e – por que não – a própria linguagem, que
talvez é o mais antigo dos dispositivos, em que há milhares e milhares de anos um
primata – provavelmente sem se dar conta das conseqüências que se seguiram – teve
a inconsciência de se deixar capturar. Recapitulando, temos assim duas grandes classes,
os seres viventes (ou as substâncias) e os dispositivos. E, entre os dois, como terceiro,
os sujeitos. Chamo de sujeito o que resulta da relação e, por assim dizer, do corpo a
corpo entre os viventes e os dispositivos.”
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Oswald. Memórias sentimentais de João Miramar. Rio de Janeiro: Editora
Civilização Brasileira, 1973.
______. Obras completas: panorama do fascismo. O homem e o cavalo. A morta. São
Paulo: Editora Globo, 2005.
FILMOGRAFIA
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. 1973. Produção: França, 88 min. / p&b
HANEKE, Michel. O sétimo continente. Produção: Austria. 120 min/ color
TARKOVSKY, Andrei. O sacrifício, 1986.
Flávio Barbeitas
flaviobarbeitas@ufmg.br
O arranjo rítmico e o ornato (quase musical) da rima são para o poeta meios
de assegurar ao verso, à frase, um poder que cativa como que por encanto e
governa à sua vontade o sentimento. Essencial ao poeta, essa tendência o
conduz até o limite de sua arte, limite que toca imediatamente a música, e,
por conseqüência, a obra mais completa do poeta deveria ser aquela que, no
seu último acabamento, fosse uma perfeita música. (Citado em
BAUDELAIRE, 1995, p. 922)
– Batat’assat’ô furnn!...
– Batat’assat’ô furnn!...
Arlequinal! Arlequinal!
As nuvens baixas muito grossas,
– Batat’assat’ô furnn!...
Notas
1
O exemplo dado por Mário de Andrade para verso melódico é de Olavo Bilac:
“Mnezarete, a divina, a pálida Phrynea/ Comparece ante a austera e rígida assembléia/
Do Areópago supremo...” (ANDRADE, 1972, p. 23).
2
Com um exemplo do próprio autor, vemos que o verso harmônico é formado por
palavras que não se ligam diretamente, formando, cada uma, uma frase, um “período
elíptico, reduzido ao mínimo telegráfico”: “Arroubos... Lutas... Setas... Cantigas... Povoar!...”
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Mário de. Obra imatura. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes; Brasília: INL,
1972a.
______. Poesias completas. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes; Brasília: INL, 1972b.
BAUDELAIRE, Charles. Poesia e prosa. Org. Ivo Barroso. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
1995.
CAMPOS, Augusto de. Música de invenção. São Paulo: Perspectiva, 1998. (Signos/
Música, 5)
Flavio BARBEITAS
Bacharel e Mestre em Música (UFRJ). Doutor em Estudos Literários (UFMG/UNIBO).
Professor da Escola de Música da UFMG.
Beatriz Lopes
beatrizlopes@ibest.com.br
Resumo: O presente trabalho tem como Abstract: This paper aims to study the
objetivo o estudo das interações culturais cultural interactions between literature
entre a literatura e outras linguagens and other artistic forms, from critical
artísticas, a partir de textos críticos, texts, annotations and journalistic
anotações e crônicas jornalísticas de Mário chronicles by Mário de Andrade, which
de Andrade que se fundaram não só nas originated not only in relations between
relações entre Cultura e Espaço, ou seja, culture and space of his close interaction
de sua íntima interação com a cidade de with the city of São Paulo and its
São Paulo 1 e com o processo de modernization at the beginning of the
modernização no início do século, bem century, but also in his unique, critical and
como em sua “escuta aberta”2, singular e “open listening” of the several artistic
crítica das diversas manifestações artísticas expressions of the time, particularly
da época, em particular, da música Brazilian popular music, in his research
popular brasileira, em suas pesquisas e, and especially in his phonograph.
sobretudo, em sua vitrola. Para tanto, à According to this perspective, in light of
luz das contribuições teóricas de Mikhail the theoretical contributions of Mikhail
Bakhtin e de Solange Ribeiro de Oliveira, Bakhtin and Solange Ribeiro de Oliveira,
o recorte em estudo se propõe a the study aims to identify and analyze, in
identificar e a analisar, nos referidos the texts mentioned, based on possible
textos, com base nos possíveis e criativos and creative literary-musical processes,
processos lítero-musicais – a melopoética such as melopoetics and polyphony, the
e a polifonia–, as marcas desses diálogos, markers of these dialogues, which
que compõem a polifonia cultural em constitute Mário de Andrade’s cultural
Mário de Andrade. poliphony.
[...] Com a peça sonorizada, Schoenberg criou uma das obras mais
importantes da atualidade, o ‘Pierrot Lunaire’ [...] Instrumentos novos
tentam aparecer também. Os futuristas lançaram os Barulhadores... [...] o
Serrote, sai da mão do serralheiro vai para o jazz, surge nos concertos... [...]
Emanuel Moor, lançou um piano com dois teclados... [...] por outro lado
Hope Jones modernizou o Órgão [...] Diante dos progressos do Gramofone
e das possibilidades reais de expansão, a música tem atualmente nele e na
Mas o que há de mais glorioso para nós é o novo estilo neocolonial, que um
grupo de arquitetos nacionais e portugueses, com o Sr. Ricardo Severo à
frente, procura lançar. [...] O neocolonial que aqui se discute é infinitamente
mais audaz e de maior alcance. [...] São Paulo será fonte dum estilo brasileiro.
Estou convencido de que não, mas creio firme e gostosamente que sim. [...]
Quero crer que São Paulo será o berço duma fórmula de arte brasileira
porque é bom acreditar em alguma coisa. Não sou crítico, nem filósofo: sou
cronista. Ah! Deixem-me sonhar. Deixem-me crer que, embora perturbado
pela diversidade das raças que nele avultam, pela facilidade de comunicação
com os outros povos, pela vontade de ser atual, europeu e futurista, o meu
estado vai dar um estilo arquitetônico ao meu Brasil. Ah! Deixem-me sonhar!
(ANDRADE citado em LOPEZ, 2004, p. 95-98)
LADO A
PRAZERES, Heitor dos. Vai mesmo: Samba.
Mário Reis com Orquestra Pan American
LADO B
SILVA, J. B. da (Sinhô). Carga de burro.
Samba. Mário Reis com Orquestra Pan American
DISCO ODEON 10387
Notas de Mário de Andrade
Na capa
289= O. B.10387
“O Samba de Sinhô foi célebre um tempo. Aqui, está realizado num ambiente
orquestral muito influenciado de rumba.”
LADO A
VIANA, Alfredo. Vem cá! Não vou!: Choro orquestral.
Orquestra Victor Brasileira.
LADO B
VIANA, Alfredo. Urubatã:
Choro orquestral. Orquestra Victor Brasileira
Considerações finais
Notas
1
Essas relações serão analisadas a partir das indicações e textos presentes nos livros De
São Paulo – cinco crônicas de Mário de Andrade de 1920-1921, organizado por Telê
Ancona Lopes, e A música popular brasileira na vitrola de Mário de Andrade, organizado
por Flávia Camargo Toni.
2
A escuta como um fenômeno psicossocial vem sendo estudada por diversas áreas
do conhecimento, tais como a acústica, a fenomenologia e antropologia sonora. A
expressão “escuta aberta” é utilizada aqui, por transposição para os estudos literários,
como uma postura estética, uma forma criativa e inovadora de agregar sentidos ao
processo de criação artística, a partir de experiências diversas, sonoras ou não,
considerando que a escuta não se reduz a uma capacidade fisiológica e não se dá num
vácuo social. O crítico Theodor W. Adorno foi um dos primeiros autores a discutir a
escuta moderna em trabalhos como “Sobre jazz” (1936) “Sobre o caráter fetichista da
música e a regressão da audição” (1938) e “Sobre música popular” (1940-1941). Além
de Adorno, Murray Shafer em O ouvido pensante (1991) denomina de “paisagem sonora”
o que, em certo sentido, seria o substrato a partir do qual se desenvolvem os imaginários
sonoros de diferentes épocas e sociedades. Virgínia de Almeida Bessa, na introdução
da obra A escuta singular de Pixinguinha: história e música popular dos anos 1920-1930
faz interessantes considerações sobre o tema.
3
Combinação de duas ou mais notas que soam simultaneamente (ANDRADE,
1989, p. 8).
4
Cadência – Procedimento harmônico de encadeamento de acordes para a finalização
de uma obra, seção ou frase (ANDRADE, 1989, p. 79).
REFERÊNCIAS
Obras de Mário de Andrade
ANDRADE, Mário. Macunaíma. São Paulo: Livraria Martins, 1976.
______. A música de feitiçaria no Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; Brasília:
INL, 1983.
______. Pequena história da música. São Paulo: Editora Itatiaia, 1987
______. Dicionário musical brasileiro. Coordenação Oneyda Alvarenga e Flávia
Camargo Toni. Editora Itatiaia Limitada, 1989.
______. De São Paulo: cinco crônicas de Mário de Andrade, 1920-1921.
Organização, introdução e notas de Tele Ancona Lopez. São Paulo: Editora
Senac São Paulo, 2004.
Beatriz LOPES
Mestranda do Departamento de Teoria Literária e Literaturas da Universidade de
Brasília (UnB).
Brunilda T. Reichmann
brunilda9977@gmail.com
Com The Others (2001) [Os outros], primeiro filme em língua inglesa
de Alejandro Amenábar, nascido no Chile em 1972 e radicado na Espanha
desde a infância, o cineasta espanhol projeta-se universalmente como um
dos grandes artistas da contemporaneidade. Amenábar já havia atraído a
atenção de um grande número de espectadores com seus dois primeiros
longa metragens. O primeiro, intitulado Tese, (1996) [Thesis: morte ao vivo], é
um filme de suspense e assassinato; Abre los ojos (1999) [Preso na escuridão], o
segundo, trata de assuntos polêmicos como a realidade virtual e a criogênese.
O quarto filme, dirigido depois de Os outros, é a sensível produção sobre a
eutanásia Mar adentro (2005) [Mar adentro], vencedor do Oscar de Melhor
Filme Estrangeiro em 2005, de dois prêmios no European Film Awards
(2004) e de 14 prêmios no Goya em 2005. Essa breve descrição dos filmes
de Amenábar deixa claro que sua preferência recai sobre assuntos polêmicos,
que vão desde o suspense hitchcockiano até os limites das controvertidas
tecnologia e ciência contemporâneas.
Filme com história, ambientação, atmosfera e tensão semelhantes,
Os outros estabelece um diálogo “intertextual” com The Innocents (1961) [Os
inocentes], adaptação fílmica da novela de Henry James (1843-1916), The
Turn of the Screw (1898) [A volta do parafuso]. Os dois filmes – Os inocentes e Os
outros – possuem características góticas marcantes: subvertem a noção de
realidade empírica ao introduzirem a possibilidade de um mundo
sobrenatural; as histórias são ambientadas em local isolado; em cada história
há duas crianças com capacidade de entrar em contato com o mundo dos
“outros”; as protagonistas femininas vivem situações limítrofes e seus
comportamentos beiram a histeria; a expressão dos olhos dessas
protagonistas é objeto de constante focalização. Em Os outros há, no entanto,
uma potencialização da subversão no que diz respeito ao suspense e ao
final do filme. Essa e outras características serão mencionadas à medida
que as duas cenas e as gravuras usadas como pano de fundo para a abertura
do filme forem discutidas.
O prólogo ou incipit insere o espectador imediatamente na diegese
do filme Os outros, pois a “câmera subjetiva” sugere um espectador primeiro
acompanhando, com a câmera na mão, uma mulher que sobe os degraus
Recriação e subversão
Sobre Os outros, [Amenábar] diz que “sempre quis fazer um filme repleto de
corredores longos e escuros, um tributo a estes seres sempre mascarados
que assombram dos meus pesadelos de infância.”
“Minha infância foi povoada por diversos medos – medo do escuro, medo
de portas entreabertas, medo de armários, e de uma maneira mais geral,
medo de qualquer coisa que pudesse esconder alguém ou alguma coisa,”
recorda. “Sendo assim, não é nenhuma surpresa o fato de eu ser avidamente
dedicado ao cinema do oculto.”
REFERÊNCIAS
AMENÁBAR, Alejandro. The Others (2001). Miramax Internacional/Dimension
Films.
ARBEX, Márcia (org.). Poéticas do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo
Horizonte: Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários, Faculdade de
Letras da UFMG, 2006.
CLAYTON, Jack. The Innocents (1961). Twentieth Century Fox Film Corporation.
CLÜVER, Claus. Estudos interartes: introdução crítica. Floresta encantada: novos
caminhos da literatura comparada. Ed. Helena Buescu, João Ferreira Duarte, e Manuel
Gusmão. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2001, p. 333- 362.
HOEK, Leo H. A transposição intersemiótica: por uma classificação pragmática. In:
ARBEX, Márcia (org.). Poéticas do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo
Horizonte: Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários, Faculdade de
Letras da UFMG, 2006, p. 167-189.
Brunilda T. REICHMANN
PhD em Literaturas de Língua Inglesa pela Universidade de Nebraska em Lincoln
(UNL). Professora Titular de Literaturas de Língua Inglesa da Universidade Federal do
Paraná (UFPR – aposentada). Professora do Mestrado em Teoria Literária do Centro
Universitário Campos de Andrade (Uniandrade). Fundadora e editora da revista Scripta
Uniandrade.
Sigrid Renaux
sigridrenaux@terra.com.br
Resumo: A obra Through the Looking Abstract: Lewis Carroll’s Through the
Glass (1871), de Lewis Carroll, foi e Looking Glass (1871) continues to be
continua sendo passível de recepção em open to cross-media transfer: musicals,
várias mídias: versões musicais, teatrais, drama, film, besides opera and television.
fílmicas, além de ópera e televisão. Based on Clüver’s, Moser’s and Genette’s
Partindo das teorias de Clüver, Moser e theories, this work presents an
Genette, este artigo apresenta uma leitura intersemiotic reading of Alice’s jump, as
intersemiótica do salto de Alice, ao ela she passes from the world of reality into
passar do mundo da realidade para the world of the mirror, as described by
dentro do mundo do espelho, como Carroll and illustrated by John Tenniel;
descrito por Carroll e ilustrado por John it then discusses Margaret Atwood’s re-
Tenniel; complementando, discute a reading of the same episode, in
releitura que Margaret Atwood faz do Negotiating with the Dead (2002). The
mesmo episódio, em Negociando com os counterposing of these two distinct arts
mortos (2004). A contraposição dessas and world views confirms the endless
duas artes e visões de mundo confirma a politextuality of the original text, and
inesgotável politextualidade do texto- how the act of interpretation and critical
fonte e como o ato de interpretação e reaction is shaped by current reception
reação crítica é moldado através das conventions.
respectivas convenções de recepção
vigentes.
Introdução
Now, if you’ll only attend, Kitty, and not talk so much, I’ll tell you all my
ideas about Looking-glass House. First, there’s the room you can see through
the glass – that’s just the same as our drawing room, only the things go the
other way. I can see all of it when I get upon a chair – all but the bit behind
the fireplace. Oh! I do so wish I could see that bit! I want so much to know
whether they’ve a fire in the winter: you never can tell, you know, unless our
fire smokes, and then smoke comes up in that room too – but that may be
only pretence, just to make it look as if they had a fire. Well then, the books
are something like our books, only the words go the wrong way; I know
that, because I’ve held up one of our books to the glass, and then they hold
up one in the other room. (p. 180-181)
‘Let’s pretend there’s a way of getting through into it, somehow, Kitty.
Let’s pretend the glass has got all soft like gauze, so that we can get through.’
Why, it’s turning into a sort of mist now, I declare! It’ll be easy enough to
get through – She was up on the chimney-piece while she said this, though
she hardly knew how she had got there. And certainly the glass was beginning
to melt away, just like a bright silvery mist. (p. 181-182)
Pois, ao repetir “let’s pretend there’s a way of getting through into it,
somehow”, “let’s pretend the glass has got all soft like gauze, so that we can
get through”, o vidro amolece como gaze, como névoa fina (gauze = gaze).
Assim, ao dizer “Why, it’s turning into a sort of mist, I declare!”, a gaze já se
transformou em névoa. Simbólica de coisas indeterminadas e do
apagamento dos contornos, a névoa como processo de indeterminação
inicia assim a transição para um outro mundo, pois Alice percebe que “It’ll
be easy to get through” (repetida três vezes, além de remeter ao título).
O narrador ainda compara a liquefação/desintegração do espelho
a “a bright silvery mist” – explicada pela condensação da umidade do ar na
superfície fria do vidro, propiciada pelo calor do fogo –, acrescentando
assim a cor brilhante da prata a essa indeterminação da névoa, o que explicao
espanto de Alice diante dessa transformação (turning into) do vidro em
névoa prateada e brilhante.
Assim, ao subir no consolo da lareira, Alice já está impregnada
pelo simbolismo do fogo, da lareira e da névoa brilhante e prateada em
que se transformou o espelho, sugerindo que o mundo do fantástico está
Then she began looking about, and noticed that what could be seen from
the old room was quite common and uninteresting, but that all the rest
was a different as possible. For instance, the pictures on the wall next the
fire seemed to be all alive, and the very clock on the chimney-piece (you
know you can only see the back of it in the Looking-glass) had got the face
of a little old man, and grinned at her. (p. 185-186)
Considerações finais
Notas
1
As adaptações de No mundo do espelho incluem musicais ao vivo e televisivos, além de
versões animadas: o filme mudo dirigido por Walter Lang, Alice Through the Looking
Glass, 1928; as versões musicais incluem o TV musical de 1966, com canções de
Moose Charlap, e Judi Rolin no papel de Alice; uma adaptação multimedia natalina
de 2007, dirigida por Andy Burden, e a ópera Through the Looking Glass, de Alan
John, de 2008. As versões televisivas incluem um filme de TV da BBC Through the
Looking Glass, de 1974, com Sarah Sutton no papel de Alice; um filme soviético de
1982, dirigido por Yefrem Pruzhanskiy; um filme de TV animado de 1987, e um
filme do Canal 4, de 1988, com Kate Beckinsale no papel de Alice.
2
Processo e técnica de gravura em relevo sobre madeira que permite a impressão
tipográfica de figura(s) ou texto(s), cujos caracteres (não móveis) são entalhados na
prancha de suporte.
3
Em todos seus livros, Dodgson era meticuloso a respeito da diagramação do texto
e das ilustrações e esmerava-se para garantir as melhores combinações possíveis. Em
relação a Looking-Glass, algumas mudanças ocorreram durante a preparação: cinco
ilustrações retratando Alice com a Rainha foram alteradas porque Dodgson não gostara
do estilo de vestido que Tenniel havia dado a ela. Como comenta Collingwood: “O
Sr. Dodgson não era pessoa fácil de se lidar: nenhum detalhe era insignificante demais
para sua crítica minuciosa. ‘Não ponha tanta crinolina na Alice’ ele escrevia, ou ‘O
cavaleiro branco não pode ter costeletas; ele não pode parecer velho’ – eram ordens
que ele dava constantemente.” Tenniel então redesenhou Alice num vestido
tipicamente vitoriano para senhoritas, o que obviamente agradou a Dodgson.
Disponível em: <http://www.squidoo.com/john Tenniel>. Acesso em: 21 set. 2010.
4
Disponível em: www.alice-in-wonderland.net. Acesso em: 21 set. 2010.
5
Todas as conotações simbólicas apresentadas provêm dos dicionários citados nas
referências bibliográficas.
6
Disponível em: http://www.alice-in-wonderland.net. Acesso em: 21 set. 2010.
7
Segundo Martin Gardner, o tema do espelho parece ter sido um acréscimo posterior
à história, segundo depoimento da própria Alice Liddel. Num espelho, todos os
objetos assimétricos vão para o outro lado. Há muitas referências no livro a tais
REFERÊNCIAS
ATWOOD, Margaret. Negociando com os mortos: a escritora fala sobre seus escritos. Rio
de Janeiro: Rocco, 2004.
CARROLL, Lewis. The Annotated Alice. Ed. GARDNER, Martin. Harmondsworth:
Penguin Books, 1975.
CHEVALIER, Jean et GHEERBRANT, Alain. Dictionnaire des symboles. 4 vols. Paris:
Seghers, 1973.
CIRLOT, Juan Eduardo. Diccionario de símbolos. Barcelona: Editorial Labor, 1969.
CLÜVER, Claus. “Da transposição intersemiótica”. In: ARBEX, Marcia. Org. Poéticas
do visível. Belo Horizonte: UFMG, 2006.
GENETTE, Gérard. Palimpsests. Lincoln: University of Nebraska Press, 1997.
HOECK, Leo. “A transposição intersemiótica”. In: ARBEX, Marcia (org.). Poéticas do
visível. Belo Horizonte: UFMG, 2006.
PRAZ, Mario. Literatura e artes visuais. São Paulo: Cultrix, 1982.
STOKER, Gil. Referências de fonte eletrônica. Disponível em < www.alice-in-
wonderland.net> Acesso em: 21 set. 2010.
VRIES, Ad de. Dictionary of Symbols and Imagery. Amsterdam: North Holland, 1976.
Sigrid RENAUX
Pós-Doutora em Literatura Inglesa e Norte-Americana pela Universidade de Chicago,
EUA. Doutora em Língua Inglesa, Literatura Inglesa e Literatura Norte-Americana
pela USP. Professora Titular de Literaturas de Língua Inglesa da UFPR (aposentada).
Professora do Mestrado em Teoria Literária da Uniandrade.
Resumo: Este artigo focaliza as relações Abstract: This article examines the
intermidiáticas entre texto, performance e intermedial relationship among text,
filme na produção Trono de sangue/ performance and film in the production
Macbeth, levada à cena no Centro de Trono de sangue/Macbeth, staged by the
Pesquisa Teatral, em 1993, pelo diretor Brazilian director Antunes Filho, at the
Antunes Filho. A referência óbvia ao Centro de Pesquisa Teatral, in 1993. The
texto-fonte e ao celebrado filme de Akira obvious reference to the Shakespearean
Kurosawa – e, ulteriormente, ao teatro source-text and to Akira Kurosawa’s
Noh japonês – sugeriu a abordagem celebrated film – and ultimately to the
analítica: examinar o produto de mídias Japanese Noh theater – have suggested
diferentes, com base em determinado the analytical approach: the study of the
trabalho individual, de acordo com seus results produced by different media
meios específicos (RAJEWSKY, 2006). based on an individual work, using their
Estabelecem-se paralelismos entre os três own media-specific means (RAJEWSKY,
tipos de mídia quanto a técnicas de 2006). Parallelisms among the three types
ambientação – cenários, figurinos e of media are focused on details of setting
máscaras – e de performance. Enfatiza-se – scenery, costumes, and masks – and
o estreito relacionamento de Antunes performance. Special notice is given to the
Filho com o cinema e, em particular, com director’s close relationship with cinema
a obra de Kurosawa, fruto de sua and, specifically, with Kurosawa’s work,
admiração pela cultura japonesa. due to his admiration for Japanese culture.
O bem e o mal
Máscaras
Figurino
Espaço cênico
Iluminação
Intermidialidade e performance
Nota
*Este artigo é o resultado da aproximação entre professores universitários e a prática
teatral. Tomamos como ponto de partida cuidadosa análise do vídeo da encenação de
Trono de sangue/Macbeth (Arquivo Digital Brasileiro, MIT), das notas contidas no
programa do espetáculo e das críticas sobre a montagem, generosamente fornecidas
por Rodrigo Audi, do CTP, a quem devemos agradecimentos. Devemos especial
penhor de gratidão a Sebastião Milaré por ter colocado à nossa disposição partes de
sua pesquisa sobre Antunes Filho, ainda não publicada, bem como partilhado ideias
e comentários valiosos sobre a encenação de Trono de sangue/Macbeth.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Fig. 1 – Máscaras tradicionais do teatro Noh e seus correspondentes em Trono de sangue.
Disponível em: http://thestuffyougottawatch.com/tblood.html.
Fig. 2 – Detalhes de figurino na tela. Disponível em: http://cantarapeledelontra.
blogspot.com/2010/02/galeria-akira-kurosawa-trono-manchado_26.html .
Fig. 3 – Detalhes de figurino no palco. Disponível em: http://www.sescsp.org.br/
sesc/hotsites/cpt_novo/areas.cfm?cod=4&esp=11.
Fig. 4 – Samantha Monteiro como a serpente traiçoeira. Disponível em: http://
stephenesherman.com/discussions/throne-of-blood.html.
Fig. 5 – Isuzu Yamada Sakaji-Lady Asaji, a Lady Macbeth de Kurosawa. Disponível
em: http://www.sescsp.org.br/sesc/hotsites/cpt_novo/areas.cfm?cod=4&esp=11.
Fig. 6 – Habitações senhoriais. Imagem do filme. Disponível em: http://
stephenesherman.com/discussions/throne-of-blood.html.
Fig. 7 – Habitações senhoriais. Imagem da montagem. Disponível em: http://
www.sescsp.org.br/sesc/hotsites/cpt_novo/areas.cfm?cod=4&esp=11.
Fig. 8 – Imagem da velha fiandeira em Kurosawa. Disponível em: http://
www.sescsp.org.br/sesc/hotsites/cpt_novo/areas.cfm?cod=4&esp=11.
Fig. 9 – Imagem das três bruxas de Antunes. Disponível em: http://
www.sescsp.org.br/sesc/hotsites/cpt_novo/areas.cfm?cod=4&esp=11.
Fig. 10 – Cena final da derrota de Lord Washizu. Disponível em: http://
www.culturalprofiles.net/japan/Directories/Japan_Cultural_Profile/-13243.html.
Key words: Henrik Ibsen. New subjectivity. Visual arts. Symbolism. Intermediality.
Introdução
RUBEK: Eu era artista, Irene. [...] Artista antes de tudo... Doente pelo
desejo de criar a grande obra de minha vida... (Mergulha nas próprias
recordações.) Devia chamar-se “O Dia da Ressurreição” e revestir o aspecto
de uma mulher moça que desperta do sono da morte. [...] E essa mulher
que se despertava devia reunir em si tudo que há de nobre, de altivo, de ideal
sobre a terra... Encontrei-te. Tinhas tudo do que precisava. E te prestaste
tão completamente, tão alegremente às minhas intenções! E abandonaste a
RUBEK: Eu era moço, ignorava a vida, pensava que não se pudesse dar à
Ressurreição uma aparência mais bela, mais radiosa do que a de uma moça
intacta – Virgem das coisas da Terra – despertando para a luz, para a alegria
triunfal, sem ter de despojar-se de qualquer fealdade, de qualquer impureza
que fosse.
IRENE: (com vivacidade) Sim...? E é assim que eu apareço na nossa obra?
RUBEK: (hesitante) Não completamente, Irene. [...] Aprendi a conhecer a
vida durante os anos que se seguiram à tua partida, Irene. “O Dia da
Ressurreição” tornou-se, no meu espírito, uma coisa mais... complicada. O
pequeno pedestal sobre o qual se erguia a tua imagem esbelta e solitária, esse
pedestal não bastava mais para sustentar o meu novo sonho. [...] Era um
sonho feito do que me impressionava os olhos, no mundo que me cercava.
Eu precisava, Irene, introduzir essas impressões na minha obra. Não podia
me abster disso... Amplei o pedestal. Ficou com uma vasta superfície, sobre
a qual coloquei um fragmento do globo, inflado e entreabrindo-se. Pelas
Considerações finais
REFERÊNCIAS
BRADBURY, Malcolm. O mundo moderno. Dez grandes escritores. Trad. Paulo Henriques
Britto. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
CLÜVER, Claus. Da transposição intersemiótica. In: ARBEX, Márcia (org.). Poéticas
do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo Horizonte: Programa de Pós-
Graduação em Letras: Estudos Literários, Faculdade de Letras da UFMG, 2006, p.
107-166.
______. Ekphrasis Reconsidered: On Verbal Representation of Non-Verbal Texts.
In: LAGERROTH, Ulla-Britta; LUND, Hans; HEDLING, Erik (orgs.). Interart Poetics:
Essays on the Interrelations of the Arts and Media. Amsterdam and London: Rodopi,
1997, p. 19-33.
EIDT, Laura M. Sager. Writing and Filming the Painting: Ekphrasis in Literature and
Film. Amsterdam and New York, Rodopi, 2008.
5 Por via eletrônica, o Conselho Editorial comunicará ao autor a avaliação feita por
membros do Conselho Consultivo.
8 O envio do artigo para publicação implica a aceitação das condições acima citadas.