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Cândida Tereza Lima Leite1*, Victoria Gouvea Nubile Pacheco1, Vania Cristina dos Reis
Miranda2, Keyleytonn Sthil Ribeiro3, Elaine Cristina Martinez Teodoro2
1
Graduadas pelo Curso de Fisioterapia do UniFUNVIC, Centro Universitário – FUNVIC, Pindamonhangaba – SP.
2
Doutor, Docente do Curso de Fisioterapia do UniFUNVIC, Centro Universitário – FUNVIC, Pindamonhangaba – SP.
3
Mestre, Docente do Curso de Fisioterapia do UniFUNVIC, Centro Universitário – FUNVIC, Pindamonhangaba – SP.
*Correspondência: teodoro.elaine18@gmail.com
_______________________________________
RECEBIMENTO: 08/02/21 - ACEITE: 22/04/21
Resumo
A Síncope Vasovagal (SVV) é a perda súbita de consciência, associada a uma incapacidade de manutenção do tônus
postural. O presente trabalho tem por objetivo revisar sistematicamente a efetividade da abordagem fisioterapêutica na
SVV. Trata-se de um estudo de revisão sistemática, para o qual foi consultado o banco de dados PubMed, utilizados
artigos científicos em português e inglês, publicados entre os anos de 2005 e 2018, avaliados de acordo com a qualidade
metodológica por meio da Escala de Qualidade de JADAD. Para confecção do trabalho, foram incluídos artigos que
estivessem disponíveis na íntegra, cujos sujeitos da pesquisa apresentassem diagnóstico de síncope, recorrente ou não,
de ambos os sexos, positivados no Teste de Inclinação e que incluíssem no protocolo de tratamento um programa de
treinamento físico. A fisioterapia atua integrando a equipe multidisciplinar, de maneira a aumentar a tolerância
ortostática e o volume sanguíneo, reduzindo os níveis de vasopressina circulantes, promovendo um aumento de massa
muscular e melhorando o retorno venoso pelo mecanismo de bomba muscular. Atualmente, o padrão ouro para o
tratamento da SVV inclui uma equipe multidisciplinar onde médicos, fisioterapeutas, nutricionistas e psicólogos
atuando de forma conjunta para melhorar a qualidade de vida dos pacientes. A fisioterapia é considerada uma opção
chave para a substituição do tratamento farmacológico da SVV.
Abstract
Vasovagal syncope (VVS) is the sudden loss of consciousness, associated with an inability to maintain postural tone.
The present work aims to systematically review the effectiveness of the physical therapeutic approach in VVS. This is a
systematic review study, in which the PubMed database was consulted using scientific articles in Portuguese and
English, published between 2005 and 2018, evaluated according to the methodological quality through the JADAD
scale. For the preparation of this work were included articles available in full, whose research subjects had a diagnosis
of recurrent syncope or not, of both genders, that got a positive on the Inclination Test and that included in physical
training program in the treatment protocol. Physical Therapy works by integrating a multidisciplinary team, in order to
increase orthostatic tolerance and blood volume, reducing circulating vasopressin levels, promoting an increase in
muscle mass and improving venous return through the muscle pump mechanism. Currently, the gold standard for the
treatment of VVS includes a multidisciplinary team where doctors, physical therapists, nutritionists and psychologists
work together to improve the quality of life of patients. Physical therapy is considered a key option to replace the
pharmacological treatment of VVS.
Resultados
As características dos estudos que preencheram os critérios de inclusão, assim como as intervenções
e resultados estão sumarizadas no Quadro 1.
AUTOR/ ESCORE
MÉTODO OBJETIVO INTERVENÇÃO CONCLUSÃO
ANO JADAD
Gardenghi et 3 Ensaio Observar os efeitos 70 pacientes divididos O treinamento
al.19 Clínico do treinamento em quatro grupos: físico melhorou a
Randomizado físico, treinamento treinamento físico com 5 sensibilidade
2007 de inclinação e minutos de exercícios de arterial
terapia alongamento, 40 minutos barorreflexa em
farmacológica sobre de bicicleta ergométrica, pacientes com
a sensibilidade 10 minutos de exercícios SVV e poderia ser
arterial barorreflexa de fortalecimento e 5 aplicado como
e a atividade minutos de resfriamento uma alternativa
nervosa simpática com exercícios de terapêutica não
muscular em alongamento; farmacológica
pacientes com SVV. treinamento de para estes
inclinação, terapia pacientes.
farmacológica e um
grupo controle.
Dijk et al.20 5 Ensaio Avaliar a eficácia 117 pacientes foram As manobras
Clínico das manobras randomizados para físicas de
2006 Multicêntrico físicas de terapia convencional contrapressão
Prospectivo contrapressão no padronizada que mostraram-se um
Randomizado dia a dia dos consistiu na explicação método de
pacientes. dos mecanismos tratamento sem
subjacentes a SVV e risco, eficaz e de
conselhos em relação à baixo custo para
modificação do estilo de pacientes com
vida, e 106 pacientes SVV e sintomas
receberam terapia pródromos
convencional mais reconhecíveis, e
treinamento com devem ser
manobra de recomendadas
contrapressão. como o
tratamento de
escolha para estes
pacientes.
Tan et al.21 5 Estudo Detectar possíveis 22 pacientes, sendo que O treinamento
Piloto mudanças 10 fizeram parte do ortostático
2009 Randomizado autonômicas do grupo controle e 12 aumentou o tônus
Controlado treinamento realizaram treinamentos geral autonômico
ortostático físicos compostos pela nos pacientes com
domiciliar e avaliar adoção da posição SVV quando
a viabilidade de um ortostática com as costas comparado com o
estudo maior, superiores contra a grupo controle.
controlado, do parede e seus calcanhares
treinamento afastados a
ortostático em aproximadamente 15
pacientes com SVV. centímetros da mesma.
Gurevitz et 4 Estudo Avaliar o papel do 46 soldados. Grupo de Observou-se que
al.22 Prospectivo treinamento de tratamento - três meses o treinamento
Randomizado inclinação em de treinamento diário de diário de
2007 adultos jovens com inclinação; Grupo inclinação por três
SVV. controle - não realizou meses, associado
treinamento. Pacientes de às modificações
ambos os grupos foram no estilo de vida,
instruídos a aumentarem não melhoraram
a ingestão de líquidos e os resultados no
sal e a se absterem de tratamento de
situações indutoras de adultos jovens
síncope, como o com SVV.
ortostatismo prolongado.
AUTOR/ ESCORE
MÉTODO OBJETIVO INTERVENÇÃO CONCLUSÃO
ANO JADAD
Duygu et al.23 3 Ensaio Investigar a eficácia
Oitenta e dois pacientes O treinamento
Prospectivo do auto treinamento
randomizados em dois de inclinação
2008 Randomizado ortostático repetido
grupos, sendo um não foi capaz de
na prevenção da submetido à terapia influenciar a
síncope convencional constituída recorrência
em
pacientes com SVV
por prevenção da espontânea da
recorrente. desidratação, aumento na síncope nos
ingestão de sal dietético, pacientes com
orientação para dormir de SVV, exceto
cabeça erguida, educação para o tipo
do paciente, tranquilização vasodepressor.
quanto a natureza benigna
da condição e prevenção
de possíveis gatilhos; o
outro grupo foi submetido
a terapia convencional
mais sessões de
treinamento de inclinação
adicionais.
MVM- Manobra de Valsalva Modificada, SVV- Síncope Vasovagal, TI- Teste de Inclinação, SEC- Sociedade Europeia
de Cardiologia, QV- Qualidade de Vida
Já Santos et al.17 optaram por submeter os sopros dos pacientes em um tubo conectado a um
pacientes em uma posição supina com ângulo de 70º esfigmomanômetro. Por fim, o grupo que utilizou a
durante 45 minutos e durante os outros 15 minutos MVM incluiu três etapas: primeiro, a determinação
foi infundido isoproterenol nos mesmos. O exame do nível de limite da MV; segundo, a fase de
foi encerrado com o final da segunda fase que se acomodação e terceiro, a fase de terapia da MVM
retratava com a infusão do medicamento ou quando padronizada com tempo e cronograma de força
se tornou positivo. O teste positivo foi definido fixos. Durante o acompanhamento todos os
como a ocorrência de síncope com hipotensão pacientes foram acompanhados por 12 meses por
arterial, com ou sem bradiarritmias. telefone ou visita domiciliar e ou clínica.
Dijk et al.20 aplicaram o teste com uma Santos et al.17 submeteram seus pacientes a
inclinação passiva de 60° durante 20 minutos, com uma compressão passiva dos membros inferiores
uma inclinação adicional de 15 minutos, ministrando utilizando botas de compressão pneumáticas, a fim
conjuntamente a nitroglicerina de 0,4 mg quando a de promoverem uma compressão contínua ao longo
inclinação passiva não conseguia induzir a síncope. de todo o seu comprimento. A intensidade da
Duygu et al.,23 de maneira semelhante, submeteram compressão utilizada nas pernas e pés equivale às
os pacientes à inclinação de 60º por 20 minutos, meias de alta compressão elástica disponíveis no
contudo, se a síncope não se desenvolvesse durante mercado. A manga da extremidade foi modificada
essa fase, optava-se pelo uso de nitroglicerina para que as oscilações de pressão com o uso do
sublingual em spray de 400 mg, mantendo os compressor fossem suspensas e fossem mantidas
pacientes inclinados por mais 15 minutos. pressões constantes de 40 mmHg para o calcanhar e
Siméon et al.18 e Tan et al.21 relataram pés e 30 mmHg para as pernas, controladas por um
utilizar o TIO para selecionar os pacientes, sendo os esfigmomanômetro aeróbio e um bulbo adaptado ao
positivos participantes do estudo, contudo não sistema. Durante os testes de controle, os pacientes
relataram a metodologia aplicada ao teste. usaram as mesmas botas de compressão modificada
Por outro lado, Gardenghi et al.19 optaram com pressão mínima para a aderência dos membros
por usar o TIO como uma modalidade do plano de inferiores.
tratamento, orientando os seus pacientes a Siméon et al.18 partiram do pressuposto que
realizarem o treinamento de inclinação em casa, se o tratamento da SVV grave recorrente deve incluir o
tolerado, em uma frequência de três vezes por controle simultâneo de parâmetros dietéticos, físicos
semana, mantendo a postura ereta por 30 minutos, e psicológicos por meio de uma equipe
em pé encostando a parte superior das costas contra multidisciplinar. Desse modo, realizaram um estudo
a parede, com os pés afastados cerca de 15 piloto prospectivo randomizado para avaliar a
centímetros da parede. As sessões deveriam ser eficácia da reabilitação multidisciplinar. Os
interrompidas na primeira ocorrência dos sintomas, pacientes foram divididos em dois grupos
quando o paciente foi orientado a assumir a posição separadamente, sendo um de reabilitação e um
supina. controle. No primeiro, um programa abrangente de
A proposta terapêutica de He et al.16 três semanas foi realizado em um centro de
consistiu em randomizar dois grupos de pessoas, reabilitação cardiovascular, incluindo quatro
sendo um grupo de terapia veno-convencional abordagens. A consulta médica incluiu garantias
composto pela conscientização do paciente para a sobre a natureza benigna da SVV, um teste de
fisiopatologia, a natureza benigna da SVV, a estresse limitado por sintomas para avaliar a resposta
importância da ingestão de sal e líquido dietético no do paciente ao exercício e determinar as
dia a dia e a não utilização de medicações que modalidades de treinamento.
poderiam preceder a SVV como diuréticos e O programa de reabilitação incluiu o
vasodilatadores. Já o grupo de tratamento padrão se aprendizado de manobras de contrapressão e
caracterizou por utilizar a MVM. Foi projetado um treinamento físico, os quais não foram descritos
procedimento de MVM para aumentar a tolerância especificadamente pelo autor. O programa dietético
da Manobra de Valsalva (MV) sem aumentar o risco consistia em avaliação nutricional e educação do
da síncope para esses pacientes, classificando a MV paciente sobre hidratação e ingestão elevada de
pela força de expiração, aferida por milímetros de sódio. O atendimento psicológico, primeiro
mercúrio (mmHg) e pelo tempo de retenção da envolveu uma avaliação da Escala de Ansiedade e
respiração, avaliado em segundos. A força de Depressão Hospitalar, a escala de autoestima de
expiração foi dividida em 3 graus (Grau A = 20 Rosenberg e a história pessoal de eventos
mmHg, Grau B = 30 mmHg e Grau C = 40 mmHg) traumáticos. No grupo controle, os pacientes foram
e o tempo de retenção da expiração foi dividido em tratados de acordo com as diretrizes propostas pela
duas extensões (1 = 8 segundos, 2 = 15 segundos). Sociedade Europeia de Cardiologia.18
A força de expiração foi controlada por meio dos
sintomas graves ou síncope. No caso de tontura ou Por outro lado, Dijk et al.20 definiram as
pré-síncope, os pacientes eram orientados a se manobras físicas de contrapressão como um
deitarem com os pés elevados. Todos os pacientes tratamento eficaz e de baixo custo, visto que os
foram encorajados a manterem as modificações no pacientes experimentaram menos episódios
estilo de vida a fim de evitarem eventos sincopais, além do número de pacientes com um
desencadeadores da SVV tanto quanto possível, episódio sincopal recorrente ter reduzido em 36%,
como aumentar a ingestão de líquidos até quatro durante um período médio de acompanhamento de
litros por dia e a ingestão de sal.22 14 meses.
Duygu et al.23 sugeriram que os pacientes Considerando o treinamento de inclinação
fossem randomizados para a terapia convencional, a também como uma proposta de tratamento, Tan et
qual incluía evitar a desidratação, aumentar a al.21 evidenciaram que o treinamento ortostático
ingestão de sal, dormir com a cabeça erguida, educar aumentou o tônus autonômico geral em indivíduos
o paciente, garantir quanto a natureza benigna da com SVV quando comparado ao placebo, podendo
condição e evitar possíveis gatilhos ou realizar a ser uma alternativa terapêutica, ainda que seja
terapia convencional, com sessões adicionais de enfatizada a importância de estudos futuros,
treinamento de inclinação. multicêntricos, randomizados e controlados.
Os pacientes selecionados para o Por outro lado, Gurevitz et al.22 concluíram
treinamento eram instruídos a realizá-lo em casa, que adicionar um treinamento de inclinação diário
permanecendo em posição ortostática contra uma de três meses às modificações no estilo de vida não
parede, com os tornozelos unidos a 20 centímetros melhorou os resultados do tratamento em adultos
da mesma. As sessões eram realizadas em um jovens com SVV. Diante disso, fica evidente a
ambiente confortável e seguro para evitarem o risco necessidade de mais estudos que incluam o
de traumas físicos e eram realizadas sob a treinamento ortostático como terapia para pacientes
supervisão de um familiar. Os pacientes eram com SVV, conforme reforçado nas conclusões do
instruídos a manterem a posição ortostática até o estudo de Tan et al.,21.
aparecimento dos sintomas pré-sincopais e solicitar Gurevitz et al.22 e Duygu et al.23 também
a interrupção precoce ou de outra forma, encerrar a afirmaram que o treinamento de inclinação não foi
sessão em 30 minutos.23 capaz de influenciar a recorrência espontânea da
O programa era realizado duas vezes ao dia SVV, exceto para a SVV vasodepressora.
por até 30 minutos, após um mês, os pacientes foram Diferentemente dos autores citados, para
instruídos a executá-lo em casa em dias alternados e Siméon et al.18 a reabilitação multidisciplinar se
após três meses, foi reduzido para dois dias por mostrou muito eficaz e superior para pacientes com
semana.23 SVV grave recorrente, com relação a qualidade de
Alguns estudos evidenciam resultados vida e redução de recorrência.
satisfatórios com os programas de exercícios O presente trabalho apresentou algumas
propostos; segundo He et al.,16 sua intervenção com limitações como o número pequeno de artigos
o grupo de tratamento padrão mantida por 30 dias referentes ao tema abordado nas bases de dados
mostrou-se segura, viável e eficaz para tratar os disponíveis, bem como o encontro de poucos artigos
pacientes com SVV e reduziu significativamente os recentes com propostas terapêuticas não
resultados positivos dos testes de inclinação o que farmacológicas, além da falta de estudos que
corrobora com os achados de Santos et al.,17 os quais comprovem a eficácia ou não de algumas técnicas
verificaram que a compressão dos membros ainda pouco elucidadas, como forma de tratamento
inferiores promove um aumento do retorno venoso e para a SVV.
da pressão arterial, o que poderia explicar o motivo
do teste de inclinação se tornar negativo e a Conclusão
compressão passiva dos membros inferiores ser
muito eficaz em pacientes com SVV, podendo ser De acordo com os trabalhos analisados foi
adaptada à pratica clínica por meio do uso de meias possível compreender que a intervenção
elásticas de alta compressão, as quais representam fisioterapêutica por meio de programas de exercícios
uma alternativa clínica segura e de baixo custo para aeróbicos, treinamento físico, manobras de
prevenir os episódios. contrapressão e compressão passiva dos membros
Gardenghi et al.19 assim como He et al.16 inferiores associada a um tratamento
concluíram que o treinamento físico melhorou a multidisciplinar, com intervenções psicológicas e
atividade barorreflexa em pacientes com SVV, dietéticas, em pacientes com síncope vasovagal
enquanto os outros tratamentos não obtiveram os grave e ou recorrente foi capaz de promover eficácia
mesmos resultados, o que atualmente evidencia a na recidiva sincopal, além de controlar a sua
prescrição de exercícios no manejo da síncope.