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ENTENDENDO O LIVRO DE EZEQUIEL

Há três sequências básicas de visões que Deus dá a Ezequiel, e, se você as entender, pode
dizer que conhece o livro. A primeira sequência acontece nos capítulos I— 3, em que Ezequiel, já
na Babilônia, vê pela primeira vez Deus vindo a ele em uma visão. A segunda sequência ocorre nos
capítulos 8— 11. Por assim dizer, é uma lembrança repentina em que Deus mostra a Ezequiel como
sua presença deixou Jerusalém por causa da adoração idólatra praticada no Templo. A seguir, o
livro termina com a sequência de uma longa visão, apresentada nos capítulos 40— 48, em que Deus
vem, de novo, ao seu povo em um Templo reconstruído.

PRIMEIRA SEQUÊNCIA VISÕES: UMA VISÃO DE DEUS, O REI

A primeira visão de Ezequiel é a de Deus, o Rei. Esse livro, como outros grandes livros da
Bíblia, inicia com Deus em sua corte celestial. A cena também é uma reminiscência da aparição do
Senhor para Moisés, no monte Sinai, e para Isaías, quando o chamou a ser profeta.

Deus aparece para Ezequiel em uma visão de abertura extraordinária que se inicia com as
palavras: “E aconteceu, no trigésimo ano, no quarto mês, no dia quinto do mês, que, estando eu no
meio dos cativos, junto ao rio Quebar, se abriram os céus, e eu vi visões de Deus” (1.1). A seguir,
Ezequiel, nos primeiros capítulos, descreve essa visão.

Depois de ler Jeremias, acho maravilhoso e muito relevante Ezequiel ter essa visão.
Jeremias, que estava de volta a Jerusalém, falava ao povo de Judá: “Rendam-se aos caldeus. Se
tentarem ficar aqui, o Senhor promete que não permanecerá com vocês e não os abençoará. Vocês
devem ir com eles e serão abençoados”. Portanto, o simples fato de Deus revelar-se a Ezequiel
(também a Daniel) na Babilônia, confirma as palavras de Jeremias. O “profeta chorão” previu esse
fato em uma visão de dois cestos de figos em que as frutas de um cesto estavam boas e as do
outro, não (Jr 24). O Senhor rogava para continuar a abençoar os que estavam separados do
Templo de Salomão, do trono de Davi e da terra de Abraão.

Você já viu uma criança fazer uma coisa errada e, por isso, receber como castigo ter que
passar “um tempo” no quarto ou sentada em uma cadeira em um canto? O exílio, para o povo de
Deus, foi como ficar de castigo por um grande tempo. O Senhor deixou-os um período no cativeiro,
onde, estando fora da terra, do trono e do Templo, poderiam entender o que fizeram de errado e
deixariam de idolatrar esses elementos. A Terra Prometida, a linhagem davídica de reis e o Templo,
que simbolizavam a presença de Deus, eram bons presentes que Ele lhes dera. Todavia, o povo
começou a usá-los mal. Os presentes tornaram-se importantes demais. Por isso, o Senhor levou-os
embora ao chamá-los para a Babilônia. Ele deixou-os de lado por setenta anos para que se
concentrassem de novo no que era especial e a razão por que isso é importante. Contudo, a
fidelidade dEle acompanhou-os no exílio, e é assim que se inicia a visão de Ezequiel, com Deus indo
a seu povo que está distante do Templo, da linhagem de Davi e da terra de Israel.
A própria visão começa com um vento poderoso: (1.4-6).

Á medida que a visão prossegue, vemos algumas criaturas muito bizarras ao redor do trono
de Deus: (1.15-19).

Depois de descrições adicionais dessas criaturas, uma voz soa acima do firmamento. E, a
seguir, o próprio trono aparece: (1.25-28).

DEUS NÃO É COMO NÓS

Muitas pessoas tentaram desenhar — literalmente, ilustrar — como Ezequiel viu essa visão.
Contudo, é provável que essa seja uma tarefa impossível. O que Ezequiel pôde ver nessa visão é
que Deus não é como nós. Ele é outra pessoa, notável e diferente de nós. Muitas vezes, assumimos
que Deus é exatamente como nós. Todavia, a visão de Ezequiel deixa-nos ver como Deus é um ser
totalmente diferente de nós. Não podemos simplesmente fazê-lo à nossa imagem. Ele é
extraordinário e incomum.

Ezequiel não hesita em descrever tudo que viu, mas observe a frequência com que usou as
palavras “semelhança” e “como”. Havia “uma semelhança de trono como de uma safira”, e a figura
sobre ele tinha “como o aspecto do fogo” em seu interior.

A Bíblia chama Deus de “santo”. E isso não quer dizer que Ele tem santidade, mas que Ele é
santo. Por isso, devemos demonstrar reverência por Deus. Ezequiel abaixou sua face mesmo depois
de todo seu treinamento teológico! Seu novo conhecimento de Deus não o fez se sentir de forma
alguma mais casual em relação a Deus. Ele ficou amedrontado com essa visão de Deus, assim
como Jó ficou quando teve uma do Senhor.

Deus não é apenas a pessoa idosa que está lá no alto. Ele não é um mero tipo de avô, com
barba branca, no céu. Também não é um vizinho amigável, um companheiro ou um camarada. A
Bíblia jamais retrata a alegria casual com que, muitas vezes, consideramos o auge da intimidade
espiritual com Deus. Na Bíblia, todas as visões do Senhor são amedrontadoras e inspiram
reverência.

DEUS É TODO-PODEROSO E ONISCIENTE

Aqui, também vemos que Deus é Todo-poderoso e Onisciente. Talvez você tenha percebido
que as cambas das rodas eram cobertas de olhos (I.1 8). E as quatro faces olhavam em todas as
direções (1.6,10,17). Essas coisas mostram a onisciência de Deus — Ele vê, ao mesmo tempo,
todos os lugares. Não há nada que Ele não perceba. O Senhor é onisciente. E o fato de Deus estar
sobre esse carro, que se move em todas as direções, mostra que é Todo-poderoso. Ele pode estar
em qualquer lugar. Ezequiel podia confiar nesse Deus Todo-poderoso e Onisciente!

DEUS NÃO É LIMITADO PELAS CIRCUNSTÂNCIA


Mas o grande ponto para Ezequiel era que, de qualquer forma, ele via Deus. Pois, afinal, não
estava em Jerusalém ou no Templo. Ele estava no exílio quando teve a visão do Deus Altíssimo! O
Senhor não está limitado a Jerusalém. A visão assegurou ao profeta que o Senhor estaria com seu
povo por onde quer que fosse espalhado. Na verdade, Ele não está limitado a nenhum lugar. Deus
preocupa-se com o mundo todo, como nos lembra o arco-íris (Gn 1.28), lembrança da aliança de
Deus com Noé, no mundo todo.

Meu caro amigo, Deus não se limita ao último ponto em que você pensa que o localizou!
Talvez houve um momento em que se sentiu especialmente próximo de Deus. Talvez Ele o tenha
abençoado por intermédio de um escritor ou pregador específico, uma igreja, ou um “estilo de
adoração”, uma boa amizade ou até um emprego específico. Todavia, agora, você está perturbado,
inseguro, temeroso de ter perdido a capacidade de se sentir próximo dEle, porque as circunstâncias
mudaram. Bem, Deus mostra-nos, da mesma forma como mostrou ao profeta Ezequiel e a seu povo
do Antigo Testamento, que Ele não é limitado pelas circunstâncias. É maravilhoso conhecer as
bênçãos do Senhor por meio de qualquer um desses caminhos, mas lembre que Deus trabalha de
muitas maneiras. Ele não está limitado a uma circunstância específica. Ele é o Deus do universo.

DEUS TOMA A INICIATIVA

Observe também que Deus toma a iniciativa. Ele vem a nós. Leia de novo o versículo I: “[...]
se abriram os céus”. Ele escolheu descer. Ezequiel não abriu os céus e foi até Deus. Depois, no
versículo 3: “Veio expressamente a palavra do Senhor”. E no versículo 4: “Olhei, e eis que um vento
tempestuoso vinha do Norte”. A seguir, no versículo 25: “E ouviu-se uma voz”. E, por fim, no
versículo 28: “E ouvi a voz de quem falava”.

Assim como Ele fez com Moisés no episódio da sarça ardente, com Isaías no Templo e com
Paulo na estrada de Damasco. O mesmo aconteceu com Ezequiel. Nenhum desses homens saíra
em busca de Deus ou tentara fazer contato com Ele. Deus toma a iniciativa. Ele vem a nós.

DEUS COMUNICA-SE

Esse Deus também se comunica. Você percebeu que a visão de Ezequiel atinge seu auge em
uma voz? Em palavras? Se fossemos coreografar essa visão, não faríamos dessa maneira. Hoje,
exigiríamos um espetáculo — uma demonstração para os olhos. Mas aqui, a visão de Deus atinge o
auge não com algo para os olhos, mas com palavras para os ouvidos — “e ouvi a voz de quem
falava” (1.28).

Deus não quer apenas ser adorado a distância. Ele quer um relacionamento pessoal. O
Senhor não quer se encontrar conosco a fim de que desfrutemos de alguma sensação visual, antes,
quer uma aliança de amor. Não se satisfaça com a mera sensação. O fundamento desse livro é esse
tipo de comunicação verbal com Deus, e isso é o fundamento de qualquer relacionamento que
temos com Ele. A comunicação verbal é que constrói os relacionamentos, e Deus, graciosamente,
comunicou-se com seu povo.

Por isso, a Palavra de Deus é vital em nossas reuniões na igreja. Reservamos tempo para
ouvir a Palavra porque Ele fala conosco por intermédio dela. Deus comprometeu-se a conversar com
seu povo, a conhecê-lo e a se fazer conhecido. E também com Ezequiel.

SEGUNDA SEQUÊNCIA DE VISÕES: UMA VISÃO DA PARTIDA DE DEUS

A segunda grande visão apresentada nesse livro é uma lembrança repentina. È a visão da
partida de Deus do Templo de Jerusalém.

Como sou ministro, muitas vezes, perguntam-me sobre o Paraíso. Sempre me surpreendo
com todas as perguntas que as pessoas podem fazer sobre o Paraíso! Muitas vezes, apenas digo
que há muitas coisas que não sei sobre esse lugar. Mas tenho certeza de duas: existe um Paraíso, e
não é este mundo!

Não sei se você já ficou tentado a confundir este mundo com o Paraíso. Meu palpite é que a
maioria de nós tem consciência de que ele não é o Paraíso. Mas talvez você sinta que realmente
tem uma vida boa. Seu emprego, sua saúde, suas amizades, tudo vai muito bem agora mesmo.
Contudo, precisamos lembrar, como Ezequiel recorda-nos, de que estamos longe do Paraíso.

Com certeza, os companheiros de Ezequiel no exílio babilónico sabiam disso. Contudo, a


visão de Ezequiel ensinou-lhes que não apenas a Babilônia não era o Paraíso, mas Jerusalém
igualmente não o era! Eles tinham percorrido uma longa distância para proteger a Cidade de Davi,
achando que se agarrar a ela era algo equivalente a estar com Deus. Todavia, isso estava errado.
Por isso, Ezequiel apresentou-lhes outra visão, ou outra série de visões, em que viu o pecado de
Israel e a partida de Deus em consequência dele. O Senhor transferiu seu povo para o “cuidado” dos
deuses que realmente amavam.

Boa parte dos capítulos 6— 24 é composta de profecias contra Israel por causa de seu
pecado. As profecias contra Israel iniciam-se nos capítulos 6— 7, e o Senhor promete: “E desviarei
deles [meu povo] o rosto” (7.22), da mesma forma que prometeu fazer por intermédio de Jeremias
(“Mostrar-lhes-ei as costas e não o rosto” [Jr 18.17]). No entanto, apenas nos capítulos 8— 11 é
apresentado a Ezequiel o cerne da queixa do Senhor contra seu povo. Deus inicia nos capítulos 8—
9, e dá a Ezequiel uma visão bem específica da idolatria praticada no próprioTemplo. Nos capítulos
10— 11, a visão continua, mas agora Ezequiel vê Deus partir do Templo e da sua área, da mesma
forma como o povo abandonara a adoração ao Senhor. A visão termina no capítulo 11 quando o
Senhor parte da própria cidade. Eis uma amostra dessa visão: (Ez 8.1-3; 10.4,18; 11.22-25).

Se você não ler nenhum outro capítulo essa semana, leia os capítulos 8— 11 de Ezequiel.
Eles contêm uma estranha verdade cinematográfica — ou a mensagem do tipo “você está lá” —
como se Ezequiel, da Babilônia, recebesse uma transmissão divina dos cultos pagãos que
aconteciam no Templo de Jerusalém. Deus passava pela parte externa do Templo — sua casa —
como se desse uma última olhada. A seguir, Ele parte do Santuário e de seu pátio e deixa-o para ser
destruído.

O povo causou essa separação não-natural. Esse divórcio entre eles e Deus ao perseguir
outros deuses. Nos capítulos 16, 20 e 23, o Senhor usa a linguagem mais vívida para acusar
Jerusalém de abominável infidelidade.

No início do capítulo 24, depois de todas as acusações espinhosas contra a infidelidade de


Israel, encontramos as seguintes palavras: “E veio a mim a palavra do Senhor, [...]: Filho do homem,
escreve o nome deste dia, deste mesmo dia; porque o rei de Babilônia se aproxima de Jerusalém
neste mesmo dia”. Jerusalém, no cerco, começa a sofrer a punição da deserção de Deus.

Nos capítulos 25— 32 e 35, a atenção de Ezequiel muda dos israelitas para as nações. Como
vimos, em nosso estudo anterior, nos capítulos finais de Jeremias, aqui, também aprendemos que a
justiça de Deus não se limita a seu povo. As nações que pareciam vitoriosas, tanto para si mesmas
como para os israelitas exilados, estavam em dificuldades com Deus. O Senhor também as julgaria.
O povo do Senhor podia ter certeza de que apenas Ele era soberano sobre todas as nações.

A seguir, nos capítulos 33— 34, mais uma vez, Deus repreende seu povo por duas razões.
Primeiro, Ele diz que seus líderes são corruptos e apenas “apascentam a si mesmos” (34.2).
Segundo, o povo mesmo ignorou sua Palavra.

Em suma, o povo de Israel tentava acreditar na prosperidade de sua terra, na estabilidade


política da linha davídica e até no próprio Templo, mas o tempo todo ignorava a Palavra de Deus.
Portanto, nenhuma dessas coisas o salvaria. Que isso seja um aviso para nós!

Hoje, o reavivamento tornou-se um tema comum entre os cristãos. Contudo, os


reavivamentos nunca aconteceram porque o povo falou sobre ele. Os comentaristas sociais podem
dizer que precisamos de reavivamento por diversos motivos. Os líderes cristãos podem nos chamar
a orar por reavivamento, como se isso fosse um objetivo em si mesmo. Todavia, os reavivamentos
verdadeiros aconteceram apenas quando o povo adquiriu a noção certa de Deus, de sua majestade
e de sua santidade. Os reavivamentos aconteceram quando o povo cresceu em seu senso de
responsabilidade diante desse Deus. Cresceu em sua consciência de seus pecados. Desenvolveu-
se na compreensão da obra de Cristo na cruz. Cresceu no entendimento do chamado a crer apenas
em Cristo. Esses são os momentos em que Deus visita sua igreja com reavivamento por intermédio
do derramamento de seu Espírito sobre a terra.

TERCEIRA SEQUÊNCIA DE VISÕES – UM VISÃO DA VINDA DE DEUS E A PROMESSA DO


PARAÍSO.

A última seção da profecia de Ezequiel apresenta as mais famosas visões de esperança. No


capítulo 36, por exemplo, lemos sobre a promessa extraordinária de Deus de reunir um povo de
todas as nações para si mesmo, de purificar esse povo de suas impurezas e de seus ídolos, de
substituir o coração de pedra por um de carne e de garantir-lhe que seu Espírito moverá este povo a
seguir os caminhos dEle e a guardar seus mandamentos (36.24-28).

No capítulo 37, vemos como isso será feito por meio da visão extraordinária de Ezequiel do
vale de ossos secos. Ezequiel prega a Palavra do Senhor, e os ossos voltam à vida!

Os capítulos 40— 48 apresentam a última grande série de visões do livro, nas quais Deus
mostra a Ezequiel o novo Templo. O primeiro Templo fora destruído na invasão babilónica após a
retirada de Deus.

CONCLUSÃO

O propósito do livro de Ezequiel era restaurar a união do povo de Deus com Ele. O Todo-
Poderoso, diversas vezes, manda Ezequiel apresentar essas profecias de que “sabereis que eu sou
o Senhor”. Nesse livro, todos os julgamentos e todas as promessas têm esse propósito. O Senhor
revela-se para Ezequiel. Ele deixa de habitar no Templo cheio de idolatria. Porém, retorna. Tudo isso
para que seu povo o conheça.

BIBLIOGRAFIA

DEVER, Mark. A Mensagem do Antigo Testamento. CPAD

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