Você está na página 1de 9

CCE 1529 – Sistemas Estruturais de Concreto

Professora: M.Sc. Rebecca Mansur de Castro Silva

Dimensionamento de Vigas de Concreto Armado à Flexão

1. Equacionamento da Solicitação Resistente

No dimensionamento à flexão simples de vigas de concreto armado, as seguintes hipóteses


são consideradas:

• Perfeita aderência entre as armaduras e o concreto, de forma que a deformação


específica de cada barra da armadura é igual à do concreto adjacente;
• A resistência à tração do concreto é desprezada;
• Seções planas permanecem planas, e com isso as deformações específicas
longitudinais em cada ponto da seção transversal são proporcionais à distância até
a linha neutra.

Seja a seção retangular abaixo submetida a momento fletor positivo (fibras superiores
comprimidas), com suas correspondentes deformações de ruptura (nos domínios 2, 3 ou
4), tensões e resultantes conforme indicado:

Figura 1 - Seção, Deformada e Binário interno para o Diagrama Simplificado.

Sendo, Rc a resultante no concreto, Rs a resultante na armadura de aço, c a deformação


no concreto e s a deformação na armadura de aço.
Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva
2022.2
Fazendo o equilíbrio de momentos em torno do ponto p, obtém-se:

∑𝑀 = 0 (1)

𝑀𝑑 = 𝑅𝑐 . 𝑧 (2)

Do equilíbrio das forças normais, têm-se:

∑𝑁 = 0 (3)

𝑅𝑑 = 𝑅𝑆 (4)

Portanto, a equação (2) pode ser estendida para:

𝑀𝑠𝑑 = 𝑅𝑐 . 𝑧 = 𝑅𝑠 . 𝑧 (5)

No dimensionamento de elementos de concreto armado pelo Método dos Estados Limites


(MEL), a seção deve resistir a uma solicitação Rd equivalente à solicitação de
dimensionamento Sd aplicada. Assim, o 2º e 3º termos de (5) representam Mrd, que é o
momento resistente do elemento.

A análise do 2º termo da igualdade (5) resulta no equacionamento de um conjunto de


parâmetros que servirão de base para a construção da ferramenta de cálculo utilizada no
dimensionamento de seções retangulares fletidas de concreto armado pelo MEL. Esta
ferramenta, denominada Tabela para Dimensionamento à Flexão Simples (TDFS), tem
como finalidade determinar as variáveis que equilibram o binário interno que produz o
momento resistente Mrd.

No 2º termo da equação (5), a resultante no concreto (Rc) é obtida pelo produto entre a
sua área comprimida e a sua tensão de dimensionamento, conforme a equação (6).

𝑅𝑐 = 𝐴𝑐 . 𝜎𝑐 (6)

Em princípio, a área comprimida de concreto equivale a área do diagrama de tensões


parábola-retângulo (Figura 1.c). Para simplificar o cálculo, a NBR 6118:2014, permite a
simplificação do diagrama de tensões parábola-retângulo para um diagrama de tensões
retangular, com a mesma tensão máxima e altura y conforme indicado na Figura 1.d, sendo:

Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva


2022.2
𝑦 = 0,8 . 𝑥 (7)

onde x é a profundidade da linha neutra.

A Figura 2 indica a compensação de áreas que leva à simplificação do diagrama de

tensões.
Figura 2 - Simplificação do diagrama de tensões parábola-retângulo.

Assim, a equação (6) pode ser reescrita como:

𝑅𝑐 = (𝑏𝑤 . 𝑦) . 0,85𝑓𝑐𝑑 = 𝑏𝑤 . 0,8 . 𝑥 . 0,85𝑓𝑐𝑑 (8)

𝑅𝑐 = 0,68 . 𝑏𝑤 . 𝑥 . 𝑓𝑐𝑑 (9)

Substituindo a equação (9) nos dois termos iniciais da equação (5), tem-se:

𝑀𝑠𝑑 = (0,68 . 𝑏𝑤 . 𝑥 . 𝑓𝑐𝑑 ). 𝑧 (10)

Analisando-se os fatores da equação (10), tem-se que 3 fatores representam valores


conhecidos no dimensionamento à flexão, sendo eles o momento de dimensionamento
Msd, a largura comprimida bw e a resistência à compressão de dimensionamento do
concreto fcd. Os outros 2 fatores, a profundidade da linha neutra x e o braço de alavanca
do binário interno resistente z, representam as incógnitas do problema. Estas duas
incógnitas por sua vez representam dimensões verticais que estarão sempre contidas
dentro da altura total h da seção.

A configuração da deformada da seção, mostrada na Figura 3, permite fixar uma relação


de proporcionalidade geométrica entre a incógnita x e a altura útil d da seção.

Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva


2022.2
Figura 3 - Configuração deformada da seção retangular submetida a momento fletor positivo.

𝑥 𝜀𝑐
= (11)
𝑑 𝜀𝑐 + 𝜀𝑠
𝜀𝑐
𝑥=( )𝑑 (12)
𝜀𝑐 + 𝜀𝑠

Adotando um parâmetro adicional kx que define o percentual da altura útil d que


corresponde à profundidade da linha neutra x, tem-se:

𝜀𝑐
𝑘𝑥 = ( ) (13)
𝜀𝑐 + 𝜀𝑠

Substituindo (13) em (12), tem-se:

𝑥 = 𝑘𝑥 𝑑 (14)

A partir da fixação de x em função de kx, pode-se estabelecer também uma relação para o
braço de alavanca z de acordo com a Figura 4.

Figura 4 - Braço de alavanca z em função da altura da linha neutra.

Assim,

Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva


2022.2
𝑦
𝑧=𝑑− (14)
2
0,8 𝑥
𝑧=𝑑− (15)
2
0,8 (𝑘𝑥 . 𝑑)
𝑧=𝑑− (16)
2

𝑧 = 𝑑 − 0,4 (𝑘𝑥 . 𝑑) (17)

𝑧 = (1 − 0,4𝑘𝑥 ) 𝑑 (18)

Adotando um parâmetro adimensional kz que expressa o percentual da incógnita z em


relação à altura útil d, tem-se:

𝑘𝑧 = (1 − 0,4𝑘𝑥 ) (19)

Substituindo-se (19) em (18), tem-se:

𝑧 = 𝑘𝑧 . 𝑑 (20)

Introduzindo os valores parametrizados de x e z na equação (10), tem-se:

𝑀𝑠𝑑 = (0,68 . 𝑏𝑤 . 𝑥 . 𝑓𝑐𝑑 ). 𝑧 = (0,68 . 𝑏𝑤 . 𝑘𝑥 . 𝑑 . 𝑓𝑐𝑑 ). 𝑘𝑧 . 𝑑 (21)

𝑀𝑠𝑑 = 0,68 . 𝑘𝑥 . 𝑘𝑧 (𝑏𝑤 . 𝑑 2 . 𝑓𝑐𝑑 ) (22)

Adotando um parâmetro adimensional kmd que vincula o momento fletor de


dimensionamento Msd à altura útil d, tem-se:

𝑘𝑚𝑑 = 0,68 . 𝑘𝑥 . 𝑘𝑧 (23)

Substituindo-se (23) em (22), tem-se:

𝑀𝑠𝑑 = 𝑘𝑚𝑑 (𝑏𝑤 . 𝑑 2 . 𝑓𝑐𝑑 ) (24)

Observa-se agora que as duas incógnitas x e z não integram mais diretamente a equação
do momento fletor de dimensionamento. Entretanto, na equação (24), ainda restam duas
incógnitas, o parâmetro kmd e a altura útil d. Analisando cada uma delas, é visto que:

• A altura útil d é em princípio uma incógnita, já que seu valor só poderia ser
determinado após o cálculo da quantidade de barras de armadura junto com o seu
Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva
2022.2
centroide, como visto na Figura 5, e a obtenção desta constitui o objetivo final do
próprio processo dimensionamento.

Figura 5 - Relação entre a altura útil e a quantidade de barras da armadura.

• O parâmetro kmd é função de kx e kz, que por sua vez é função de kx. Assim, a solução
passa então pela determinação de kx.

Ainda que se trate de uma variável do equacionamento, a altura útil é em geral, por razões
práticas e normativa, da ordem de 90% da altura h total da seção. Pode-se então atribuir a
d a condição de valor conhecido, sem que esta aproximação prejudique o resultado final.

Assim, a solução depende apenas da variável kx. A Figura 6 mostra que seus valores devem
estar compreendidos nos limites abaixo especificados:

0<𝑥<𝑑 (25)

0 < (𝑘𝑥 . 𝑑) < 𝑑 (26)

0 < 𝑘𝑥 < 1 (27)

Figura 6 - Variação de kx com suas interdependências.

Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva


2022.2
A Tabela de Dimensionamento à Flexão Simples é então construída a partir da variação
gradual de kx dentro dos limites apontados, segundo a sequência abaixo:

i. Faz-se kx variar de seu valor mínimo kx,mín = 0,01 até seu valor máximo kx,máx = 0,99
com incrementos de 0,01 representando 1% da altura útil;
ii. Para cada valor de kx, faz-se o cálculo dos demais parâmetros kz e kmd de acordo
com as equações (19) e (23).

Calculam-se os valores intermediários kx correspondentes às deformadas das mudanças de


domínios 2→3 e 3→4 com yd assumindo os valores correspondentes aos aços CA-25, CA-
50 e CA-60.

Figura 7 - Valores de kx nas mudanças de domínios.

Para cada deformada contida no domínio 2, dispondo-se de kx e de s = 10‰, pode-se então


com a equação (13) obter a deformação no concreto. Para cada deformada contida nos
domínios 3 e 4, dispondo-se de kx e de c = 3,5‰, pode-se então com a equação (13) obter
a deformação no aço.

Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva


2022.2
Figura 8 - Domínios de ruptura.

Portanto, após a construção da Tabela de Dimensionamento à Flexão Simples (TDFS) pode-


se iniciar um dimensionamento à flexão pela equação:

𝑀𝑠𝑑
𝑘𝑚𝑑 = (28)
(𝑏𝑤 . 𝑑 2 . 𝑓𝑐𝑑 )

Para o valor de kmd calculado, é possível extrair da tabela, na ordem abaixo indicada, as
seguintes informações:

• Se os valores pré-dimensionados viabilizam a seção estruturalmente para o


momento de dimensionamento aplicado. Caso não, a seção deve ser
redimensionada;
• O domínio e, consequentemente o tipo de ruptura, em que a seção trabalha. Caso
se trate de ruptura frágil, é possível utilizar de algumas técnicas que imponham a
ruptura dúctil;
• O valor de kz para que se possa prosseguir com o dimensionamento conhecendo-se
o braço de alavanca z.

Os procedimentos desenvolvidos permitiram a solução da equação de equilíbrio de


momentos com o conhecimento da resultante de compressão e do braço de alavanca. O
encerramento do dimensionamento se dá com a análise do último termo da equação (5).

𝑀𝑑 = 𝑅𝑐 . 𝑧 = 𝑅𝑠 . 𝑧 (29)
Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva
2022.2
Portanto,

𝑀𝑑 𝑀𝑑
𝑅𝑠 = = (30)
𝑧 𝑘𝑧 . 𝑑

Sendo também a resultante no aço tracionado expressa por:

𝑅𝑠 = 𝐴𝑠 . 𝜎𝑠𝑑 (31)

Tem-se finalmente a equação abaixo que encerra o processo de dimensionamento


definindo a quantidade de armação necessária:

𝑀𝑠𝑑
𝐴𝑠 . 𝜎𝑠𝑑 = (32)
𝑘𝑧 . 𝑑

𝑀𝑠𝑑
𝐴𝑠 = (33)
𝑘𝑧 . 𝑑 . 𝜎𝑠𝑑

A Tabela 1 indica o procedimento adotado no dimensionamento à flexão de seções de


concreto armado com uso da Tabela de Dimensionamento à Flexão Simples.

Tabela 1 - Procedimento para o dimensionamento à flexão simples em seções retangulares.

Sistemas Estruturais de Concreto – Prof. M.Sc. Rebecca M. C. Silva


2022.2

Você também pode gostar