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A encenação do poder: a corte régia

Não foi o Absolutismo que inventou a corte, mas foi ele que a transformou no espelho
do poder. O rei era o centro da corte- o luxo da corte arruinara a nobreza que
rivalizava no traje, nas cabeleiras, na ostentação, assim se esquecendo de que a sua
influência política se esvaíra nas mãos do soberano.
Tal como Luís XIV é o paradigma do rei absoluto, Versalhes é o paradigma da corte
real. É construído durante o seu reinado, portanto, um dos palácios que viria a ser a
mais sumptuosa residência real da Europa, num local rodeado de pântanos pútridos e
de florestas, que teria sido o espaço de caça do seu “bem-amado pai” (Luís XIII) e
onde tinham felizes recordações.
O grande palácio foi construído à imagem do Rei-Sol, cuja intenção era mostrar a
todas as pessoas que frequentassem e visitassem o poder de França e do seu
monarca. Tal como Luís XIV era grandioso o palácio que com tanto sonhava também
é. Preenchido de decorações exaltantes e com um toque “de uma arte mais francesa”,
realizadas principalmente pelo antigo mobiliário de Fouquet; com telhados decorados
com chumbo dourado e os seus jardins; obras de arte que divinizavam o poder do rei,
como a pintura de tela de Le Brun e as demais características, causavam espanto a
qualquer um/a. A ostentação era tanta que fazia com que o ministro do rei (Colbert) e
seus companheiros mais próximos, se preocupassem com a economia e as finanças
do reino, pois os impostos teriam sido aumentados e os cofres encontravam-se vazios.
Apesar dessas preocupações que se tornavam uma realidade, Luís XIV decide a
manutenção das obras, ordenando a bastantes reconstruções de vários espaços (“é
impossível não nos perdermos, não há um local que não tenha sido modificado dez
vezes”).
Por de trás de tanta beleza escondia-se um trabalho árduo, essencialmente por parte
do Terceiro Estado (26:14 até 27:25). Com condições de segurança precárias, à noite
eram transportadas várias pessoas mortas que teriam sido vítimas de um acidente.
Até ao domingo trabalhavam, mesmo sendo o dia do senhor, emboras as obras só
pudessem ser iniciadas após a realização da missa.
Com a construção deste palácio e, na prática, tomando o lugar do Estado, coloca os
membros dos primeiro e segundo Estados dependentes de si mesmo. Põe, portanto, o
clero e a nobreza, que anteriormente, exerciam cargos de alto relevo, na sua
dependência, obrigando-os a vender rapidamente as suas terras, indo mais tarde
frequentar a corte de Versalhes. Somente ao participar ativamente na vida quotidiana
do rei e da corte é que lhes eram atribuídos magnanimamente as honras, privilégios e
o dinheiro. Para os seduzir com ainda maior facilidade eram organizadas festas e
banquetes únicos (onde eram exibidos apresentações e espetáculos como os do
grande artista Lully e foguetes das maiores variedades) e os preços mais acessíveis (o
que mais tarde, tornar-se-ia algo inútil, devido às exigências da etiqueta). “Tendo em
particular consideração o burgo de Versalhes, desejando torná-lo o mais florescente e
o mais frequentado possível, oferecem-se lugares a bom preço e com promessa de
privilégio e todas as pessoas que quiserem construir, com encargo de cuidar dos
edifícios tal como estão, e da mesma simetria em que serão construídos.” Como já
proferido, construir Versalhes torna-se um meio de fazer a sua corte. Aproveitando a
oferta, não só nobres mandaram construir, Versalhes também atrai da mesma forma
comerciantes e industriais, contentes por poderem conservar as casas mesmo em
caso de falência. Mesmo não havendo apartamentos suficientes era exigido a sua
construção, pois desejava-se que a nobreza ficasse toda lá. Com a quantidade
exuberante de pessoas que lá habitavam, todos estavam amontoados em
apartamentos, por vezes demasiado pequenos e alguns com uma cozinha apenas.
(45:25 min). Para além disso, o palácio estava aberto para o público, podendo entrar
qualquer pessoa independentemente da sua nacionalidade, credo e classe.
Nobres, conselheiros, “privados do rei”, funcionários viviam na corte, seguindo uma
hierarquia rígida e uma etiqueta minuciosa. A etiqueta é o que rege a vida dos
cortesões em Versalhes. Qualquer falta pode fazer atirar o cortesão para o nada. Um
lugar, um privilégio, são outorgados por uma palavra, um olhar, que eles levavam, por
vezes, anos a obter. (1:06:18 min). Por onde o rei passava o respeito se instaurava,
ele era reconhecido publicamente. Dando em público a imagem de uma força da
natureza, sendo que por vezes teatralizava o seu poder e a sua própria figura
relacionando- o com o próprio Sol (10: 00 min), todos o saudavam, todos o
procuravam imitar, todos o aplaudiam, todos procuravam satisfazer os prazeres do
mesmo como sinal de glorificação da sua imagem e quem denegrisse a sua imagem
ou tentasse superiorizar seria punido severamente como Fouquet, pois “ninguém deve
pensar que pode insultar o rei imponentemente” (35:21 min). Para exemplificar um
momento em que a etiqueta era evidenciada, como no filme demonstrou, quando
passava nos seus jardins à hora em que passeava os operários eram avisados para
ligar as fontes que gastavam quantidades exorbitantes de água, sendo esta outra
propriedade que destaca a magnificência do Palácio de Versalhes, e os seus súbditos
deveriam prestar continência. Outro exemplo que pode ser usado é o momento em
que o monarca, juntamente com os elementos de maior estatuto entram na Galeria,
apelidada de Galeria dos espelhos. Essas pessoas deveriam mostrar agrado ao
soberano pelo seu grandioso projeto, porém o mesmo não se mostrou bastante
admirado como os outros, dado que foi ele próprio que quis que aquele espaço fosse a
representação da grandeza de França e de si mesmo (56:46 min). A sociedade de
corte servia de modelo aos que aspiravam à grandeza, pois representava o cume do
poder e da influência. A influência do monarca era de tal forma gigantesca que após
uma operação da fistula que haveria aparecido no ânus, ordenou-se que rezassem por
todas as igrejas, para que a cura do rei fosse breve.
No que diz respeito à moda e à riqueza dos vestuários, que do mesmo modo pertencia
às regras da etiqueta, os cortesãos viam-se obrigados a imitar, por mais ridículo que
fosse. Foi como o caso da peruca postiça que teve origem após a utilização por parte
do rei (35:43 min). De forma astuta, o rei procurava sempre inovar com vestimentas
cada vez mais caras, para que dessa forma obrigasse os membros da sua corte a
atualizarem constantemente as suas formas de se apresentar. Estrategicamente, o rei
colocava-os cada vez mais dependentes de si, já que precisavam de investir na moda.
Já a moda feminina, da mesma forma tinha constantes alterações, como a utilização
de cabelos que colocavam o rosto da mulher no centro do corpo (38: 51 min). Tal
passaria, então, a ser decidida, não em Paris, mas em Versalhes. Ninguém se ousava
a desafiar esta regulamentação, dado que seria o suficiente para perder honras e sair-
se prejudicado.
Outro aspeto relevante acerca do conjunto de princípios, era o serviço na vida
quotidiana do rei. Para se ascender a nível de honras era necessário participar
ativamente na corte. Àqueles que o monarca não reconhecia não eram dadas as
benesses. Não importa se seja longe ou mais próximo ele gostava de sentir a
presença dos seus súbditos. Assistir o “lever du roi” (1:05: 13) e as várias atividades
executadas, cerimoniosamente e ao mais ínfimo pormenor, ao longo do dia era
considerado um privilégio, apenas para aqueles/as que sejam de extrema relevância
para Luís XIV. Na verdade, as pessoas prestavam este serviço, não por gostarem de
estar com o rei, mas sim com intenções secundárias, como obter mais benefícios.
Em jeito de conclusão, Versalhes tornou-se o centro político de França, inteiramente
organizado em torno do rei. Como que glorificando a essência divina do poder, que
acreditavam possuir, o monarca rodeia-se de uma corte sumptuosa e de um protocolo
rígido, que endeusa a figura régia e a coloca no centro das atenções. Através de tanta
ostentação, a França e Luís XIV, tornaram-se o modelo das cortes europeias, mas que
no fundo fez esvaziar os cofres do país, passando por algumas dificuldades e
aumentando o descontentamento dos mais desfavorecidos.

Rui Miguel de Sá Costa, nº26, 11ºH

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