Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2
CENÁRIOS
PÓS-PANDEMIA
Reflexões sobre o Sul
Global e outros
territórios.
3
Capa e diagramação
Ana Cláudia Magalhães Azevedo
Conselho Editorial
Alexandre Queiroz Pereira
Universidade Federal do Ceará
Anatália Dejane Silva de Oliveira
Universidade Federal do Oeste da Bahia
Jânio Roque Castro de Barros
Universidade do Estado da Bahia
José Yure Gomes dos Santos
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Ínia Franco de Novaes
Universidade Federal de Uberlândia
Marcelo de Oliveira Latuf
Universidade Federal de Alfenas
Roberto Bagattini Portella
Universidade Federal do Oeste da Bahia
Ricardo Abrate Luigi Júnior
Universidade Federal Fluminense
Terezinha Oliveira Santos
Universidade Federal do Oeste da Bahia
4
CENÁRIOS
PÓS-PANDEMIA
Reflexões sobre o Sul
Global e outros
territórios.
Paulo Roberto Baqueiro Brandão
(Org.)
5
São Paulo – 2021
©2021- Paulo Roberto Baqueiro Brandão
CULTURA ACADÊMICA EDITORA
Praça da Sé, 108
01001-900 – São Paulo (SP)
Tel.: (11) 3242-7171
www.culturaacademica.com.br
______________________________________________
6
SUMÁRIO
Apresentação 9
Perversidade do território-recurso,
acontecimento das pandemias e território-abrigo
como possibilidade do bem viver 287
Cláudio Jorge Moura de Castilho
Autores 387
8
APRESENTAÇÃO
Em escala planetária, a Covid-19 converteu-se, até
então, no maior desafio do século XXI, tanto no âmbito da
saúde coletiva, quanto no que diz respeito à economia,
política, meio ambiente e cultura, impondo à sociedade
global a necessidade de uma rigorosa reflexão-ação quanto
ao seu futuro comum.
China, Coréia do Sul, países da Europa e os Estados
Unidos foram os primeiros territórios da Terra a vivenciarem
de modo mais intenso as ameaças diretas relacionadas ao
contágio pelo chamado novo coronavírus. Contudo, há que
se considerar que, se o Sul Global – a exceção do Brasil e
Índia – não é o epicentro da pandemia, com números de
contágio e mortes inferiores aos de alguns dos ditos países
do Norte, trata-se de uma região extremamente susceptível
aos efeitos vindouros de ajuste ao novo quadro de realidade,
em especial àqueles de caráter geopolítico, geoeconômico,
ambiental, demográfico e cultural.
Passada a fase mais aguda da pandemia, a tendência
mais óbvia é a de que a reconstrução do Capitalismo dar-se-
á, entre outras estratégias já conhecidas, pela intensificação
do neoextrativismo e de políticas neoliberais, tudo isso como
causa e produto do recrudescimento das formas
contemporâneas de colonialismo.
Além dos temas principais, mencionados
anteriormente, suscitam atenção debates de interesse sobre
questões como segurança e soberania alimentares, relação
sociedade-natureza em territórios urbanos e rurais, minorias
sociais, comunidades, projetos alternativos ao modo de
produção capitalista e o papel dos movimentos sociais no
enfrentamento às consequências da pandemia.
9
A obra coletiva tem o objetivo de refletir sobre as
tendências, perspectivas e desafios no contexto do pós-
pandemia, aludindo sobre questões as quais, direta e
indiretamente, serão afetadas por tal conjuntura. Para tanto,
buscou-se estabelecer uma firme abordagem interdisciplinar
no âmbito de uma visão o quanto mais alargada dos diversos
territórios sob influência de tal processo, na perspectiva de
se imaginar outros mundos possíveis.
São, no total, doze textos que abordam temas os mais
diversos, mas centrados no debate sobre possíveis cenários
pós-pandemia da Covid-19. Além disso, tais contribuições
estão situadas em contextos nacionais ou infranacionais do
Sul Global. A exceção fica por conta de dois escritos que
aportam questões relativas à pandemia em contextos de
países europeus, fundamentais por permitirem ao leitor
lançar olhares para outros territórios.
Para manter o sentido de diversidade já presente nos
temas e objetos de empiricização, decidiu-se pela
manutenção do idioma original de cada um dos textos. Por
tal motivo, as contribuições estão escritas em português,
espanhol e inglês.
Importa salientar que não se vislumbra a priori uma
postura de alinhamento do pensamento entre as autoras e
autores, visto que a riqueza da obra coletiva acha-se
justamente na pluralidade que pretende conter. Contudo, os
escritos buscam expor uma postura crítico-reflexiva que
possa compelir o leitor a lançar questionamentos sobre a
realidade e as perspectivas descortinadas em suas linhas.
Além disso – como um desafio maior – deseja-se motivá-lo
a assumir-se como um agente protagonista da transformação
social.
O compartilhamento de ideias e experiências criadas
e desenvolvidas nos diferentes territórios do Planeta
10
constitui uma ação fundamental à construção de um mundo
em que os homens e as mulheres vivam, para o que se faz
crucial o fortalecimento de uma contra-racionalidade visando
combater a racionalidade técnico-instrumental capitalista.
11
12
CAPÍTULO 1
Introducción
Junto a las zozobras, las tragedias sanitarias
individuales y colectivas, el impacto económico para países,
empresas y ciudadanos, entre otras calamidades, la epidemia
de Covid-19 va dejando enseñanzas para todos. “Tras la
pandemia, nada será igual”, reza el apotegma de moda, que
ya ha pasado a ser un lugar común. Muchos males estaban
delante de nuestros ojos, como lo estaban realidades que nos
llenan de orgullo, pero tuvo que producirse este cataclismo
para que la humanidad esté captando con más claridad tanto
aquellos como estas. Lamentablemente, los males son la regla
mientras las fuentes de satisfacción excepcionales.
El presente texto no procura exponer detalladamente
estas realidades, no solo porque sería una tarea ímproba, sino
porque han sido y seguirán siendo abordadas con lucidez por
analistas de mucho más calibre. Sin embargo, algunos males
no necesitan de grandes disquisiciones académicas para
emerger con trágica elocuencia. La fragilidad del modelo
neoliberal, vertebrado en torno a oprobiosas desigualdades,
la endeblez de los sistemas sanitarios en la mayoría de los
países y la incapacidad que se hallaba más o menos oculta en
la médula de influyentes políticos (Trump, Bolsonaro, Piñera
a la cabeza), son solo algunos ejemplos.
En cambio, nos proponemos examinar con cierto
detalle el caso de Cuba, cuyos éxitos resultan difíciles de
13
ocultar si se quiere hacer un análisis medianamente objetivo,
ajeno a pasiones políticas de uno u otro signo. Cuba también
deja importantes enseñanzas y mi propósito es exponerlas.
17
salud. Siendo así, los datos expuestos constituyen una clave
para aquilatar la extensión del problema y no una
caracterización cabal de su magnitud. Esta limitación,
obviamente, afecta a todos los países -marcadamente en los
que tienen vastas zonas de difícil acceso por razones sociales
o étnicas- de modo que resultan relativamente razonables las
comparaciones entre países, aunque se basen en datos que
padecen tal subregistro.
El primero registra el comportamiento del número
de “casos activos” detectados desde el primer día de la
epidemia hasta la actualidad: tales casos son aquellos que se
habían detectados como infectados cada día según una
prueba PCR (todos hospitalizados, ya que en Cuba se
ingresan a todos aquellos con Covid confirmada mediante
esa prueba). Su variación diaria se debe a la detección de
nuevos casos confirmados de los que se restan los fallecidos
y los recuperados.
Gráfico 1. Número de “casos activos” (sujetos infectados
y por ende ingresados) detectados según días desde el
comienzo de la epidemia.
18
Como puede apreciarse, a pesar de la aparición
ocasional de brotes, típicos y virtualmente inevitables, el
número de sujetos detectados como afectados por la Covid-
19 se ha mantenido siempre inferior a 500 “casos activos”
una vez superado el pico de la epidemia.
19
coloca a Cuba dentro de límites comparativamente muy
favorables1.
20
sesgadas que genera estados de zozobra o de falsa seguridad,
según convenga.
En esa línea, las grandes corporaciones informativas
han hecho todo lo posible por ocultar o minimizar los éxitos
de Cuba. Muchas veces, sublimando los logros de otras
naciones cuyos resultados pueden ser similares, pero en el
marco de un muy probable subregistro de enfermos o
fallecidos. Otras, insinuando cínicamente que los datos
cubanos son falsos, cuando este país ha dado pruebas de
máxima transparencia informativa.
Las llamadas redes sociales (especialmente Facebook,
Instagram, LinkedIn, Twitter o WhatsApp), consolidadas
como los medios dominantes de información al alcance de
todos, se han sumado como vehículos orientados a la
invasiva difusión de falsedades y noticias distractoras sobre
Cuba.
Sin embargo, debe consignarse que, desde hace unos
cinco años, el acceso a Internet, y por tanto a las redes
sociales, ha pasado de ser poco menos que marginal a estar
al alcance de más de la mitad de los 11 millones de
ciudadanos. Siendo así, la ecología digital ha experimentado
un cambio notable; no sin limitaciones se han abierto nuevas
posibilidades de gravitación para quienes actúan desde el
exterior, pero también con nuevos “actores digitales” dentro
del país, unos y otros en función de examinar la realidad
cubana en torno a la epidemia e influir sobre la opinión
pública.
Once años atrás, escribí la siguiente advertencia, que
retrata la situación actual:
Al aceptar acríticamente una tecnología estamos firmando
un contrato social implícito cuyas condiciones sólo
advertimos a menudo mucho después de haberse
consumado. Este «sonambulismo tecnológico» permite que
se vayan remodelando las condiciones de vida humanas de
21
modos no deseados y con consecuencias negativas para
amplias capas de la población y para el futuro del planeta.
Lo que aparentemente son elecciones instrumentales
(elección de técnicas) se revelan en realidad como opciones
hacia formas de vida social y política que van construyendo
la sociedad y configurando a las personas (SILVA, 2009, p.
5).
com/watch?v=GNrNCtdqhwY
29
colaborar con sus autoridades pueden explicar resultados de
este calibre, acaso únicos en el mundo.
La banalización de la cultura, el amarillismo noticioso
y el bombardeo de productos orientados a sublimar el
individualismo extremo y el consumo como meta suprema
de la vida, están simplemente ausentes de la prensa plana,
radial y televisiva cubana. Por ejemplo, en este país no se
accede a cientos de canales de TV sino a menos de una
decena. Ello puede no ser una ventaja per se y, si bien esa
estrategia comunicacional no consiente que se dibuje una
imagen idílica en esa materia, menos en el mundo
hiperconectado de hoy, sin duda dejan una impronta que
favorece que los mensajes sanitarios y la convocatoria a las
conductas responsables calen en la población sin
interferencias significativas en el contexto de esta emergencia
sanitaria.
30
Según comunica Monreal (2017), en 1986, poco antes
del “período especial”, Cuba registró un privilegiado lugar en
materia de distribución equitativa del ingreso: Coeficiente de
Gini (CG) de 0,220, entre los más favorables del planeta. En
1999, última medición conocida de dicho coeficiente en
Cuba, la situación había empeorado sensiblemente: el CG
ascendió a 0,407. Es verosímil que en años sucesivos se haya
mantenido más o menos en el mismo nivel. Sin embargo, esa
cifra puede considerarse “muy buena” en el ámbito regional;
de hecho, la mejor de América Latina y el Caribe junto con
la de Uruguay (CG=0,416), notablemente más baja que la de
naciones como Chile (IG=0,505) o Brasil (IG=515).
Sin embargo, a los efectos de una emergencia
sanitaria como la que plantea la epidemia de Covid-19, las
inequidades más devastadoras no quedan abarcadas por el
IG. La naturaleza de cobertura universal y gratuita del
sistema de salud cubano coloca a Cuba a la cabeza de la
región en la esfera de la equidad en salud.
Es obvio que, sobre los barrios más empobrecidos y
los sectores más vulnerables en países donde la salud es un
componente del mercado, por residir en zonas con
estructuras de salud más frágiles y con mayor precariedad en
el acceso a servicios básicos, el impacto será inexorablemente
más brutal. Estos grupos sociales discriminados quedan
mucho más expuestos a los efectos de la infección. Cuba no
padece de ese mal en términos estructurales.
Sin duda, se producirán estudios detallados cuando la
crisis epidemiológica supere su etapa más aguda, pero desde
ya se dispone de datos que denuncian que, si bien la
enfermedad puede afectar a cualquier ser humano, la
epidemia (que no es lo mismo que la enfermedad) castiga de
manera muy diferente a los grupos según su lugar en el
mundo de la inequidad.
31
Según señala Ramonet (2020), por ejemplo, en
Brasil, país con los peores indicadores relacionados con la
pandemia, la población afrodescendiente asciende al 9% de
la población total, aunque este grupo ha aportado el 32,8%
de las muertes. Y en Estados Unidos algunas minorías
étnicas -afroestadounidenses e hispanos- están presentando
un índice de mortalidad frente al coronavirus muy superior
al del resto de la población. En Nueva York, por ejemplo,
afroamericanos y latinos abarcan el 51% de la población,
pero acumulan un 62% de los decesos por COVID-19. En
el estado de Michigan, los afrodescendientes representa el
14% de la población, pero constituyen el 33% de los
infectados y el 41% de los fallecidos, mientras que en
Chicago, son el 30% de la población, pero aportan el 72% de
los fallecimientos.
La insularidad
La naturaleza insular del archipiélago cubano ha
obrado en favor de la lucha contra la epidemia. El país no
tiene kilométricas fronteras porosas que operan como
puertas de entrada para narcotraficantes y otros males, y
como vasos comunicantes para quienes buscan refugio en
entornos menos agredidos por la epidemia. Esto ha sido
provechoso. Sin embargo, el catastrófico ejemplo del Reino
Unido pone en entredicho que tal condición geográfica haya
sido determinante.
34
Los gestores de ese poder afirman -y quieren
convencernos- de que el mundo pertenece a los vencedores
en el combate por la supremacía económica y que, quienes
sobreviven precariamente, merecen ese destino, como ocurre
con cualquier otro competidor que fracasa. Tarde o
temprano, apelarán a criterios propios del “darwinismo
social” para sacudirse la responsabilidad implícita en las
desgracias de los menos favorecidos.
El proyecto cubano ha estado sitiado por un bloqueo
económico, financiero y comercial concebido por Estados
Unidos desde hace 60 años para “provocar hambre,
desesperación y el derrocamiento del gobierno”, así como
promover” desengaño y desaliento mediante la insatisfacción
económica y la penuria”. Así consta en el desvergonzado
memorándum de Subsecretario Adjunto de Estado para los
asuntos interamericanos, Lester D. Mallory, del 6 de abril de
1960 (BLUM, 2014). Sistemáticas medidas coercitivas
unilaterales se han sumado desde el comienzo de la
pandemia. En ese hostil contexto, esta nación ha dado una
muestra de su vocación solidaria real. El país ha prestado su
ayuda altruista mediante el envío de brigadas conformadas
por miles de profesionales sanitarios especializados a decenas
de países de cuatro continentes: pueblos de países ricos como
Italia, Andorra o Qatar, y de países muy pobres como Haití,
Honduras o Cabo Verde, han reconocido con estupor y
admiración esa operación. Se trata de contingentes de la
llamada Brigada Internacional que lleva el nombre “Henry
Reeve”, un joven estadounidense quien, con diecinueve
años, dejó Brooklyn para incorporarse al ejército libertador
que luchaba por la independencia cubana. Reeve alcanzó el
grado de General de Brigada en 1872 y poco después murió
en combate.
35
No se trata de un accionar coyuntural ante la tragedia
provocada por el nuevo coronavirus. Asentada en una
política sostenida ininterrumpidamente desde que, en 1963,
un primer contingente de sanitarios cubanos se desplazara a
Argelia para mitigar la partida de los franceses luego de la
independencia. 29 médicos, 4 estomatólogos, 14 enfermeros
y 7 técnicos de la salud permanecieron en Argelia dos años y
dos meses apoyando a los pocos médicos con que contaba
entonces el país africano. Actualmente, más de 30 mil
médicos y enfermeros prestan sus servicios en 66 naciones
(ABAD, 2020).
Tal desempeño ha sido invisibilizado, pero más difícil
ha resultado hacer lo propio en relación a la ayuda cubana en
el mundo en relación con la Covid-19. Después de que los
profesionales cubanos acudieran a Lombardía, la zona más
infectada de Italia, más de 1.450 especialistas de este país se
han desplazado en los últimos meses a otras veintiuna
naciones5.
Desde mayo de 2020, se ha desplegado una iniciativa
para nominar a la Brigada con vistas a que se le conceda el
Premio Nobel de la Paz del presente año 20206. Un
movimiento para conseguir ese reconocimiento está
teniendo lugar. Ojalá tenga éxito, pues son sobrados los
Referencias
ABAD, F. Semiótica de la pandemia. In: Granma, La
Habana, 26 marzo 2020.
BBC. Coronavirus en Uruguay: la emocionante evacuación
del crucero con Covid-19 en Montevideo. In: BBC News,
Mundo, London, 27 abril 2020. Disponible en:
<www.bbc.com>. Aceso en: 29 abr. 2020.
BILAL, U. et al. Inequalities in life expectancy in six large
Latin American cities from the SALURBAL study: an
ecological analysis. Lancet Planet Health, v. 3, n. 12,
2019, p. 503-510.
BLUM, W. The Punishment of Cuba. In: Counter Punch,
Humboldt, 21 noviembre 2014. Disponible en:
<www.counterpunch.org>. Aceso en: 28 oct. 2020.
CASTELL, P.; GISPERT, E. Intersectorialidad en el
contexto socio-económico cubano y sus implicaciones en la
salud de la población. Revista Cubana de Salud Pública,
v. 38, Suplemento, 2012.
37
COLUSSI, M. Coronavirus, ¿fin de la globalización
neoliberal? In: Rebelión, Madrid, 8 abril 2020. Disponible
en <www.rebelion.org>. Aceso en: 18 abr. 2020.
GRAY, J. Adiós globalización, empieza un mundo nuevo.
O por qué esta crisis es un punto de inflexión en la historia.
In: El País, Madrid, 12 abril 2020. Disponible en:
<www.elpais.com>. Aceso en: 18 may. 2020.
GUTERRES, A. Mensaje del Secretario General de las
Naciones Unidas, António Guterres, en ocasión del Día
Internacional Nelson Mandela. In: United Nations Office
on Drugs and Crime, Viena, 18 julio 2020. Disponible en:
<www.unodc.org>. Aceso en: 12 ago. 2020.
HEALTH CANADA. Salud de la población: conceptos y
estrategias para políticas públicas saludables. La perspectiva
canadiense. Washington: OPS/OMS, 2000.
ILLICH, I. Némesis médica: la expropiación de la salud.
Ciudad de México: Joaquín Mortiz, 1978.
LEE, A. Obama warned of pandemic threat in 2014, but
Republicans blocked funding. In: AJC News, Atlanta, 15
abril 2020. Disponible en: <www.ajc.com>. Aceso en: 12
mar. 2020.
KLIPPENSTEIN, K. Military knew years ago that a
coronavirus was coming. In: The Nation, Coronavirus,
New York, 1 abril 2020. Disponible en:
<www.thenation.com>. Aceso en: 12 may. 2020.
KUCHARSKI, A. The Rules of Contagion: why things
spread and why they stop. New York: Basic Books, 2020.
MARX K. El Capital. Tomo 1, Vol 3. Libro primero.
Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores, 2004 [1867].
38
MINREX – MINISTÉRIO DE LAS RELACIONES
EXTERIORES DE CUBA. Cuba recibirá y brindará
atención a viajeros con coronavirus del crucero británico
MS Braemar. In: Granma, Especial Covid-19, La Habana,
16 marzo 2020. Disponible en: <www.granma.cu>. Aceso
en: 18 mar. 2020.
MONREAL P. Desigualdad global: ¿Dónde se ubica Cuba?
In: El Estado Como Tal, La Habana, 29 abril 2017.
Disponible en: <www.elestadocomotal.com>. Aceso en: 24
ene. 2020.
OPS – ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA
SALUD. Cuba frente a la COVID-19. Boletín de la
OPS/OMS en Cuba, v. 24, n. 2, 2020, p. 1-48.
PORTER, D. Health, Civilization and the State
Health, Civilization, and the State: A history of
Public Health from ancient to modern times. New York:
Routledge, 1999.
RAMONET, I. La pandemia y el sistema-mundo. In: Le
Monde Diplomatique, París, 25 abril 2020. Disponible
en: <www.mondiplo.com>. Aceso en: 26 abr. 2020.
RÓVERE, M. La pandemia desde el sanitarismo.
[Entrevista concedida a: Santiago Toffoli. In: Sistesis
Mundial, Buenos Aires, 23 mayo 2020. Disponible en:
<www.sintesismundial.wordpress.com>. Aceso en: 24 may.
2020.
SANDEL M. Lo que el dinero no puede comprar: los
límites morales del mercado. Madrid: Penguin Random
House, 2013.
39
________. Are We All in This Together? In: The New
York Times, New York, 13 abril 2020. Disponible en:
<www.nytimes.com>. Aceso en: 15 abr. 2020.
SEPÚLVEDA N.; MIRANDA B. Coronavirus: tasa de
mortalidad de los hospitales públicos metropolitanos
duplica la de las clínicas. In: Ciper, Santiago de Chile, 21
junio 2020. Disponible en: <www.ciperchile.cl>. Aceso en:
4 jul. 2020.
SILVA, L. Los laberintos de la investigación
biomédica. En defensa de la racionalidad para la ciencia
del siglo XXI. Madrid: Editorial Díaz de Santos, 2009.
WHO – WORLD HEALTH ORGANIZATION.
Population-based age-stratified seroepidemiological
investigation protocol for COVID-19 virus infection
[Internet]. World Health Organization. Report No.:
WHO/2019-CoV/Seroepidemiology/2020.1, 2020.
40
CAPÍTULO 2
PERSPECTIVA HERMENÉUTICA DE LA
PANDEMIA: COMPRENSIÓN SOCIAL DESDE UN
LUGAR DE AMÉRICA LATINA
Introducción
Resuena, en las distintas capas del pensamiento y los
sentidos, el mes de diciembre del año 2019 como período de
emergencia y ebullición, en China, del nuevo SARS-Cov-2,
capaz de originar la pandemia por la enfermedad Covid-19
para este siglo XXI. De esta manera, el pasado 11 de marzo
del año en curso la Organización Mundial de la Salud (OMS)
declaró al Coronavirus como calamidad mundial. Esto es,
una nueva muestra de los impases de la globalización, con el
hándicap de que todos los avances en investigación y
tecnología no son suficientes para mitigar la magnitud e
intensidad de esta desgracia social.
La pandemia, como muchas otras, interpela a la
sociedad como un acontecimiento cuyos efectos perturban
sus diversas facetas, institucionalidades y dinámicas. Nos
recuerda Nietzsche, rebasando a los estoicos, que el
acontecer trae consigo el cambio tras la perturbación, refleja
quizá una movilidad sin móvil alguno, pues precede a la cosa
y a lo imaginable (ROMANO, 2008, p. 26). Por eso, nos
sobrellevó como un rayo súbito alterando los órdenes de
nuestra historia, que se traduce en un presente azaroso e
incierto.
Eso se ve en los intentos epidemiológicos,
gubernamentales, científicos o cotidianos, donde ha primado
41
ensayo y error. Todo aquello, tal vez, como expresión del
desmontaje que lo acontecido vino a provocar en la ritualidad
neoliberal de un mundo que, hasta ahí, nacía y moría en la
voracidad del mercado y que hoy expone las figuras más
desiguales y agraviantes de la modernización.
Hablamos de un espacio donde las relaciones sociales
se equiparan con formas de producción, las ciudadanías se
constituyen en masas de consumo, disciplinando las
subjetividades. Allí se instala, lo que Gastón Saublette (2007)
llama el “mito del paraíso”, aunque en realidad en él,
únicamente, somos la reserva, ya que en sí mismo no nos
pertenece, aunque nos atrapa y nos enreda.
Estamos viviendo un fenómeno colectivo e histórico
que no sólo interpela prácticas, también, lógicas. Que, junto
con un Estado más fuerte, nos exige asumir mejores nexos
entre diferentes campos del saber y de la intervención social,
resinificado los alcances y deudas del mundo
contemporáneo, sobre todo en nuestra América Latina, aun
cargada de opresiones, clasismos, abusos, racismos,
acuñados por más de 500 años de colonialismos
(CARBALLEDA, 2020).
57
vivencias, incorporando “la sabiduría práctica” de las
palabras, como una forma de saber, que enriquece el
conocimiento teórico de [la comprensión y] la intervención,
tanto como su ejercicio (CORDERO, 2011, p. 88).
59
La reinvención de lo público: hacia una nueva relación
Estado y ciudadanía.
El Coronavirus puede servirnos para recordar que en
la trama de la vida en la Tierra lo minúsculo es concluyente,
incluso, para desmantelar andamiajes societarios mantenidos
por múltiples generaciones humanas. Somos sociedades
vulnerables, el tiempo y la urgencia nos pasa la cuenta.
Nuestros cuerpos declinan y perecen sin poder impedirlo. El
antropocentrismo se desmorona, y donde la destrucción del
ecosistema es una práctica rutinizada.
De hecho, el historiador Walter Scheidel (2017)
concibe las epidemias como uno de los cuatro jinetes del
apocalipsis, junto a aquellos colapsos civilizadores que han
afectado violentamente distintos períodos, aparejados de
vicisitudes políticas y bélicas. En este momento nadie, tiene
el número real de infectados. Tampoco se sabe la tasa de
portadores asintomáticos, tal vez debamos esperar el cierre
del proceso para poder contar con datos totales. Además, la
detección tiene relación con las capacidades económicas y del
sistema de salud de cada país.
Lo indiscutible es que el discurso dominante avala
que el propio comportamiento social y colectivo, ha abierto
paso al estado de excepción, objetivado en muchos países
latinoamericanos, por ahora al menos, a través del toque de
queda y el confinamiento obligado. Al respecto, nos
preguntamos si ¿esto corresponde, también, a una cuestión
axiológica o socio-cultural?, pues sin duda acuña un lenguaje
político afianzado constitucionalmente, que afecta derechos
y garantías ciudadanas, a consecuencia de enfrentar eventos
extraordinarios para el normal desenvolvimiento de las
instituciones del Estado.
60
La catástrofe o “calamidad pública”, como exalta
Agamben (2020, p. 19), junto con fundar un estado de miedo,
trae consigo restricción a la libertad humana, prohibiendo,
suspendiendo y vigilando. Son relaciones confinadas, o, al
menos, relativamente, basadas en que durante antiguas
pandemias se observó que el riesgo de enfermar aumenta al
aproximarse a los contagiados, lo que en el siglo XI llamaban
contagio aéreo. Sobre eso ya se hablaba en el Decamerón de
Giovanni Bocaccio (1353), en el contexto de la peste
bubónica, que fue piso de los cordones sanitarios desde el
siglo XIV. En términos fácticos confinar es una pena de
encierro temporal, ahora, en nuestros propios hogares,
donde nos recluimos tensionando lo social, política y
legalmente permitido. Es un tipo de confinamiento
“inercial”7, que persigue las condiciones necesarias para que
la curva sanitaria logre controlar contagios y efectos más
negativos, pero, a ratos, descuidando la fusión de
dimensiones que hacen del fenómeno una cuestión múltiple
en sus efectos individuales, colectivos y territoriales.
La forma de asumir los impactos Covid-19 implica
ser socialmente responsables, lo que, a su vez, se expresa en
compromiso político de nuestras decisiones y acciones, no
univocas sino abiertas, como plantea Hans Jonas (2014).
Toda responsabilidad es abstracción, esencia humana que,
éticamente, se asume como promesa, por lo que no basta con
su identificación conceptual, jurídica o coercitiva. Es
necesario replantearnos la educación cívica.
Esta medida de emergencia altera no sólo
desplazamientos, además, el ocio, recreación, la educación,
lo laboral, lo asistencial; en sí la experiencia de lo cotidiano.
Transgrede las topografías, el domicilio, la calle. Entonces,
65
a cualquier forma de discriminación, abuso y violencia que
sostenga la brecha entre amos y esclavos. Atenderlos es
prioridad absoluta, aunque las cortes hagan jurisprudencia, lo
legal es derivativo. Lo fundamental está en la ética, cimiento
de transformaciones políticas influidas por el respeto y
revalorización a la esencia de lo humano.
José Ortega y Gasset (2007) plantea que “mientras el
tigre no puede dejar de ser tigre, no puede destigrarse, el
hombre vive en riesgo permanente de deshumanizarse” (p.
69). Evitarlo es una cuestión de integridad, para hacer
práctica todo aquello que pensamos como bueno y valioso,
maximizando la coherencia entre idea, valor y acción, en
referencia a principios democráticos de igualdad, justicia y
probidad. No olvidemos que el Estado, en sí mismo, cumple
un fin ético. Para Hegel es la más alta expresión de eticidad
ejercida como poder político, territorial y constitucional. “Un
Dios concreto que ha entrado en el mundo” (HEGEL, 2006,
p. 38), mediante instituciones reales e históricas (familia,
sociedad civil, gobierno).
La ética pública promueve el comportamiento
virtuoso del Estado, la concordancia entre declaraciones y
realizaciones de pueblos y gobiernos, para cumplir de forma
óptima las exigencias de la “vida buena” (ALEJANDRO,
2013), un estilo de convivencia honesta y prudente,
comprometida con la frugalidad en el consumo, la
solidaridad con los congéneres y el medio ambiente.
Reinventar lo público recupera el mundo en común que, por
definición, es plural. Allí, emana la libertad como
fundamento de la política pues, con la natalidad, los
ciudadanos acreditan como interlocutores válidos, cuyo
poder se afianza en el intercambio horizontal de discursos,
argumentos y acciones, no en su instrumentalización que
sólo llama a la violencia (ARENDT, 1993). Nos posibilita
66
imaginar la sociedad como algo nuevo, recreándola una y otra
vez, en pro de un futuro más digno.
Reflexiones finales
Desde una visión optimista, Aristóteles establece que
somos seres sociales por la garantía que nos ofrece el
lenguaje, la comunicación y la capacidad de tomar la palabra
para hacer política, es decir, crear y recrear la convivencia
pública, en la construcción de identidad colectiva como
pueblos, países y sociedades. Para eso, es indispensable
promover valores familiares, cívicos y democráticos que
fortalezcan el compromiso por una “vida buena”, en un
presente donde lo social se define por, lo que Rawls (1997)
llama, un principio de “pluralismo razonable”, donde la
diversidad no es requisito de desigualdad.
En tiempos de crisis, eso acrecienta las exigencias de
reformular tradicionales formas de organizar prácticas
políticas y ciudadanas, cultivando capitales relacionales
donde primen las virtudes, asumiendo nuevos modelos de
comprensión al bienestar, no sólo desde medidas de ingreso
y consumo per-cápita o de producto interno bruto. Los
índices tendrían que revisarse en términos de felicidades,
pobrezas y oportunidades, donde se van despertando la
aceptación y no discriminación de diversos géneros y formas
de vida.
Esto no es menor, sobre todo pues el temor a la
infección del virus movilizó dispositivos normativos y
políticos que han fracturado la interacción social. Si bien, es
fundamental la prevención, esas medidas más bien son
estrategias de control y respuesta oportuna que permitan, por
una parte, aplanar la curva de contagio y, por otra, nivelar la
curva de la economía, lo que nos pone el desafío de “mapear”
67
las disonancias entre crecimiento económico y desarrollo
social.
Sin desconocer la recesión económica, salir del
confinamiento ha de responder a otros criterios que cada país
sopese, por idiosincrasias o por capacidad para gestionar
soluciones óptimas. Incluso, la protesta social debe avanzar
en el análisis del contenido de la democracia, reclamando una
ciudadana responsablemente concertada para reinventar lo
público, que es fundamento del Estado, como interlocutor
válido ante la vorágine del mercado.
Comprender lo que el fenómeno deja para nuestra
Latinoamérica, es tarea obligada que viene permeada por
condiciones de contexto. Allí radica la experiencia del límite,
espacios trágicos que debemos traducir para trasformar la
desigualdad social. En ellas subyacen experiencias que están,
necesariamente, mediadas por los lenguajes de la
socialización como por los significados que los sujetos les
otorgan. No descuidemos que “[…] a través del lenguaje
amanece el mundo” (GADAMER, 1998, p. 11).
Por eso, son las preguntas de Nuestra América de
esta segunda década del siglo XXI las que nos han de permitir
encontrar las fallas, faltas y obstáculos en el conjunto de
elementos éticos, políticos y teóricos que le definen y
orientan. Se requiere identificar y trabajar, en serio, sobre los
intereses comunes, en tanto fundamento para construir la
integración política y no sólo diseñar políticas o mecanismos
para el orden social.
Eso será posible si logramos devolver el significado
a la cuestión pública y a la política democrática,
descentralizada, participativa y pluralista, fundada en el
respeto a la dignidad humana y la solidaridad, garantizando
seguridad, bienestar, identidad y libertad a tod@s. Es ahí,
68
“[…] donde la memoria y el saber se ponen en común”
(RICOEUR, 2008, p. 369).
Evitemos miradas ingenuas, queda mucho por hacer
y nada volverá a ser como antes. Debemos estar mejor
preparados, no sólo para interactuar con el virus o enfrentar
futuras epidemias, sino para contribuir a reactivar el
desarrollo sostenible y el bien común, mediado por la
redefinición en la eticidad de nuestras sociedades y la
resignificación de relaciones humanas, institucionales y
ambientales, superando individualismos y mezquindades,
ocuparnos de lo que está en deuda, aquello que carece de
palabra. Hoy, es el momento para revisar el esclavismo del
consumo, romper con esa falta de juicio que impide
comprender que la realización humana no está en el éxito,
sino en rebasar la manutención de necesidades falsas y/o
superfluas, que más bien son prescindibles deseos de placer.
Hemos de asumirnos, de modo voluntario y consciente,
socialmente responsables, a través de una conducta ética y un
principio de integridad que se aprenden involucrando el
pensamiento, el juicio y la emocionalidad (LARRAÑAGA,
2000). Para ello, proponemos recobrar la prudencia crítica, el
acto político del ejercicio de interrogarnos, para desmantelar
la kafkiana maquinaria del mundo contemporáneo, que
nosotros mismos contribuimos a hacer multitarea, agitado y
asfixiante, con un carácter trágicamente absurdo.
Preguntémonos, incansablemente, ¿qué pasará cuando todo
esto acabe?, sabiendo hoy, más que nunca, nuestra fragilidad,
falta de control absoluto y necesidad de los otros.
Referencias
AGAMBEN, G. et al. Sopa de Wuhan. Buenos Aires:
ASPO, 2020.
69
ALEJANDRO, R. Hermenéutica, ciudadanía y esfera
pública. Barcelona: Bellatera, 2013.
ARENDT, H. La Condición Humana. Barcelona: Paidós,
1993.
AUTÈS, M. Les Paradoxes du travail social. Paris:
Dunod, 2013.
BELLES, D; ARBÓS, L. 14 maneras de destruir la
humanidad. Pamplona: Next Door Publishers, 2020.
BINET, L. La séptima función del lenguaje. Santiago de
Chile: Seix Barral, 2017.
BLOCH, E. El Principio Esperanza. Madrid: Trotta,
2007.
BOCCACCIO, G. El Decamerón. Buenos Aires: El
Ateneo, 1960.
BREGMAN, R. Utopía para realistas. Barcelona:
Salamandra, 2017.
CALVO, E, ARUGUETE, N. Fake news, trolls y otros
encantos: cómo funcionan (para bien y para mal) las redes
sociales. Tres Cantos: Siglo XXI, 2020.
CARBALLEDA, A. (2020). La pandemia, el lenguaje de la
guerra y la desigualdad. Revista Margen, n. 97, 2020, p. 1.
CAZZANIGA, S. Cuestiones de legitimidad y
legitimación en Trabajo Social. El caso argentino.
Tesis Doctoral (Facultad de Ciencias Sociales). Rosario:
Universidad Nacional de Rosario, 2014.
CORDERO, N. Trabajo Social y Hermenéutica Crítica: una
opción metodológica para desvelar elementos éticos en los
70
orígenes de la profesión en Sevilla, España. Portularia, v.
9, n. 1, 2011, p. 87 -97.
CORTINA, A. ¿Para qué sirve realmente la ética?
Barcelona: Paidós, 2013.
FERNBACH, P.; SLOMAN, S. Noticias falsas. Fake News.
Infodemia, la mentira como peste. Argentina. In: El Clarín,
Revista Ñ, Buenos Aires, 13 noviembre 2017. Disponible
en: <www.clarin.com>. Aceso en: 15 may. 2020.
GADAMER, H. El Giro Hermenéutico. Salamanca:
Cátedra, 1998.
GIANNINI, H. La “reflexión” cotidiana. Hacia una
arqueología de la experiencia. Santiago de Chile: Editorial
Universidad Diego Portales, 2013.
GOTTLIEB BAUMGARTEN, A. Aesthetica. Alemania.
Edit. Traiecti Cis Vaidrvm, 1758.
HABERMAS, J. Teoría de la Acción Comunicativa:
racionalidad de la acción y racionalización social. Tomo I.
Madrid: Taurus, 2001.
HEGEL, G. El sistema de la Eticidad. Buenos Aires:
Quadrata, 2006.
HEIDEGGER, M. Ontología. Hermenéutica de la
Facticidad. Madrid: Alianza, 2000.
________. Ser y Tiempo. Santiago de Chile: Editorial
Universitaria, 1998.
JONAS, H. El principio de responsabilidad. Barcelona:
Herder, 2014.
KARZ, S. Problematizar el Trabajo Social: definición,
figuras, clínica. Barcelona: Gedisa, 2007.
71
LARRAÑAGA, P. El concepto de responsabilidad.
Ciudad de México: Fontamara, 2000.
MARTIN, M. La construcción de la Identidad en
Trabajo Social. Análisis de una trama hilvanada por sus
personajes. Tesis Doctoral (Facultad de Filosofía y
Humanidades). Madrid: Universidad Complutense de
Madrid, 2013.
ORTEGA Y GASSET, J. Obras Completas, Tomo VII.
Madrid: Taurus, 2007.
RAWLS, J. Teoría de la justicia. Ciudad de México:
Fondo de Cultura Económica, 1997.
RICOEUR, P. El conflicto de las interpretaciones.
Ensayos de Hermenéutica. Buenos Aires: Fondo de Cultura
Económica, 2008a.
________. La memoria, la historia, el olvido. Buenos
Aires: Fondo de Cultura Económica, 2008b.
ROBERTS, M. La larga depresión. Barcelona: El Viejo
Topo, 2016.
ROMANO, C. Lo Posible y el Acontecimiento. Santiado
de Chile: Ediciones Universidad Alberto Hurtado, 2008.
STAMPNITZKY, L. Disciplining Terror. How Experts
Invented “Terrorism”, Cambridge: Cambridge University
Press, 2013.
SAUBLETTE, G. La Poética del Acontecer. Santiago de
Chile: Editorial Universitaria, 2007.
VALLÈS, T. La productividad morfológica en un
modelo dinámico basado en el uso y en los usuarios,
72
en Lexic i Neologia. Barcelona: Observatori de Neologia
de la Universitat Pompeu Fabra, 2002.
VATTIMO, G. De la Realidad a la Verdad. Buenos
Aires: Editorial Fedun, 2014.
VOLTAIRE. Cándido o el optimista. Barcelona: Folio,
2011.
YÁÑEZ, V. El potencial de figuras hermenéuticas en
el trabajo social contemporáneo. Modelo de
hermenéutica vacía. Buenos Aires: Espacio Editorial, 2020.
73
74
CAPÍTULO 3
Marcos Mondardo
“O mundo está agora numa suspensão. E não sei se vamos
sair dessa experiência da mesma maneira que entramos. É
como um anzol nos puxando para a consciência. Um tranco
para olharmos para o que realmente importa. (...) Em artigo
que li sobre a pandemia, o sociólogo italiano Domenico De
Masi cita a obra profética A peste, de Albert Camus: ‘a peste
pode vir e ir embora sem que o coração do homem seja
modificado’. (...) Tomara que não voltemos à normalidade,
pois, se voltarmos, é porque não valeu nada a morte de
milhares de pessoas no mundo inteiro. (...) Seria como se
converter ao negacionismo, aceitar que a Terra é plana e que
devemos seguir nos devorando. Aí, sim, teremos provado
que a humanidade é uma mentira” (Krenak, 2020, p. 42-43).
Introdução
A crise planetária que enfrentamos com a pandemia
é uma crise sistêmica que colocou em uma encruzilhada
civilizatória as promessas modernas de humanização: a
teleologia do crescimento, do progresso, do des-
envolvimento e da racionalidade neoliberal, ou seja, a direção
da modernização. Por isso, o reacionarismo moderno, o
negacionismo reacionarista, demonstra os mundos que não
conseguiram se desapegar dessas promessas.
75
O racionalismo promoveu a ruptura entre homem e
natureza. Essa fragmentação é um princípio para a teleologia
do crescimento, progresso e do des-envolvimento. Os povos
indígenas diante da degradação ambiental decidiram não
embarcar na “canoa furada” do progresso, de “se converter
ao negacionismo, aceitar que a Terra é plana e que devemos
seguir nos devorando” como alerta o ambientalista e líder
indígena Ailton Krenak (2020). Os povos originários
decidiram seguir pelas trilhas do envolvimento, como parte
da natureza humana e não-humana e por suas cosmologias
próprias e diferenciadas em que a Terra é a sua mãe.
Em face da doença do mundo, o negacionismo
climático, Latour (2020) propõe que é necessário construir
uma direção terrestre de volta para a casa, que se move em
direção à Terra, mas que também se restringe e se limita à
materialidade da Terra, da singularidade do seu espaço-
tempo, que diz respeito à retomada possível de nossos
vínculos com a Terra, ou seja, um movimento de volta para
a Terra. A casa é a Terra.
Diante desse planeta pandêmico e de degradação
ambiental, o objetivo principal deste texto é fazer uma análise
dos efeitos geográficos da pandemia de Covid-19 nos
territórios dos povos indígenas no Brasil. O Censo do IBGE
de 2010, ainda que defasado, registrou que a população
indígena é composta de 896.917 pessoas, que perfazem 305
povos e falam 274 idiomas; 572.083 residem em áreas rurais
e 324.834 em cidades, o que corresponde a 0,47% da
população total do país.
A Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil)
contabilizava, até o dia 16 de agosto de 2020, 25.415 casos
confirmados da doença e 678 mortes entre indígenas. O
número de povos afetados chegava a 148. A taxa de
mortalidade da Covid-19 entre os indígenas (número de
76
óbitos por 100 mil habitantes) é quatro vezes maior que a
média brasileira. O acompanhamento do avanço da Covid-
19 sobre territórios e povos tem sido realizado pelo Comitê
Nacional pela Vida e Memória Indígena, em um esforço para
o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento da
pandemia.
O Boletim Epidemiológico da SESAI (Secretaria
Especial de Saúde Indígena), do Ministério da Saúde
registrou, por meio dos Distritos Sanitários, 19.573 casos
confirmados de contágio em Terras indígenas e 338 óbitos,
de acordo com os dados atualizados em até o dia 15 de
agosto de 2020. A região norte é que registra o maior
número de casos. O estado do Amazonas foi o primeiro a ter
a confirmação de indígenas contaminados e atualmente
concentra o maior número de mortes entre indígenas. A
Apib chama a atenção para o “fato da SESAI ser um dos
principais vetores de expansão da doença dentro dos
territórios indígenas, alcançando a região com maior número
de povos isolados do mundo: o Vale do Javari”. Essa
discrepância de dados, à escala regional e nacional, evidencia
a negligência do Estado brasileiro com relação à saúde
indígena e o combate à pandemia.
Os idosos são os que mais morrem com o novo
coronavírus (Sars-CoV-2). Com isso extingue-se liberanças
políticas e religiosas, bibliotecas vivas de culturas nativas
seculares, de memórias, mitos, línguas e história indígena.
Assim, a pandemia tem acentuado a situação de
vulnerabilidade dos territórios diante da Covid-19.
As questões indígenas, de ordem geográfica, estão
envolvidas na atual crise planetária e sanitária provocada pela
pandemia da Covid-19. Na América Latina e,
particularmente, no Brasil, povos e comunidades tradicionais
são os mais atingidos – a exemplo dos indígenas e
77
quilombolas. Essa situação é fundamental para verificar as
categorias geográficas devido ao que está acontecendo em
um mundo pandêmico. As reconfigurações territoriais – o
território e os processos de desreterritorialização – nunca
foram tão evidentes e relevantes para os povos indígenas no
combate à expansão e proliferação do vírus. Portanto, nosso
objetivo neste texto é esboçar algumas reflexões geográficas
sobre a situação dos povos indígenas no Brasil, evidenciando
não “só” a importância do espaço como esfera/condição da
multiplicidade (MASSEY, 2005) para entender o processo,
mas como ele também requer a reelaboração dos conceitos
para entender a complexidade atual, suas tendências,
perspectivas e desafios.
O tema do “isolamento social” e medidas de
contenção/confinamento se tornaram centrais em muitas
discussões que envolvem a pandemia. Essa problemática esta
associada à discussão da dimensão biopolítica da sociedade
“de segurança” (FOUCAULT, 2004) ou de “controle”
(DELEUZE, 1992) que vivemos, ainda mais de forma
acentuada, em tempos de Pandemia, mesmo que retomando
características da sociedade disciplinar – como o
confinamento – em um mundo estruturado pela distância.
Nos jornais, nos discursos e práticas dos epidemiologistas e
em parte dos governos, a defesa da vida nem sempre é
prioridade para, por exemplo, a existência de povos
indígenas em seus territórios tradicionais. Com a proliferação
de uma política de exceção por parte do atual governo essas
populações tradicionais tornaram-se ainda mais vulneráveis.
No Brasil, no entanto, essas terras e territórios
indígenas, historicamente tratados pelo Estado como
periferias, reivindicam atualmente por meio de uma agenda
de luta o seu lugar como centro ontológico e epistêmico.
Mesmo com a acentuação da violência, dos conflitos, dos
78
retrocessos democráticos (GUAJAJARA, 2020) e o quadro
pandêmico, os indígenas estão se organizando e adotando
novas estratégias de luta, articuladas às múltiplas escalas
espaciais, e fazendo frente para combater a proliferação do
vírus nas terras e territórios indígenas. Nessa luta são
fundamentais – mas não somente – as barreiras sanitárias
indígenas para a sobrevivência dos povos e para defesa e
proteção dos territórios.
É diante desse contexto que este texto evoca o
“território como categoria da prática” (HAESBAERT, 2018)
e dispositivo de resistência das múltiplas territorialidades
indígenas (MONDARDO, 2019; 2020). Partimos da
Geografia para debater como as ferramentas de análise e as
práticas espaciais podem se tornar armas de luta para
combater a desigualdade alvitante e para fazer justiça social
como propõe Fraser (2008) para o reconhecimento das
minorias étnicas e de redistribuição-demarcação das terras.
Ao longo desse percurso de pesquisa, fomos buscando nos
atualizar no debate em torno das populações indígenas
vulneráveis diante da pandemia da Covid-19, seus territórios
e territorialidades ancestrais, em diferentes condições de r-
existência (resistir para existir), sejam em reservas, aldeias,
terras, acampamentos e bairros periféricos das cidades
brasileiras.
80
chamou epidemia, uma mortandade de milhares e milhares
de seres. Um sujeito que saía da Europa e descia numa praia
tropical largava um rastro de morte por onde passava. O
indivíduo não sabia que era uma peste ambulante, uma
guerra bacteriológica em movimento, um fim de mundo;
tampouco o sabiam as vítimas que eram contaminadas. Para
os povos que receberam aquela visita e morreram, o fim do
mundo foi o século XVI. Não estou liberando a
responsabilidade e a gravidade de toda a máquina que
moveu as conquistas coloniais, estou chamando a atenção
para o fato de que muitos eventos que aconteceram foram
o desastre daquele tempo. Assim como nós estamos hoje
vivendo o desastre do nosso tempo, ao qual algumas seletas
pessoas chamam Antropoceno. A grande maioria está
chamando de caos social, desgoverno geral, perda de
qualidade no cotidiano, nas relações, e estamos todos
jogados neste abismo. (KRENAK, 2019, p. 34).
83
novos patógenos são fruto de mutações e de contágios
oriundos da forma de criação destes animais.
Por isso, segundo Wallace (2020), existe uma relação
direta entre pandemia e agronegócio. O autor afirma que as
origens da Sars, da gripe aviária e da gripe suína, é resultado
da maneira que os seres humanos modificaram criação de
animais para abate. Esses vírus pandêmicos das últimas
décadas não são “infortúnios da natureza”, mas, sim, micro-
organismos reais e letais, e produzidos nas áreas consideradas
biosseguras de operações agroindustriais de monocultivo
genético. Para atender ao imperativo da produtividade essa
forma produção de animais levará humanidade a se defrontar
com formas de vírus cada vez mais mortais. Por isso, é
fundamental fazer uma crítica radical ao modo de produção
capitalista aplicado às atividades agropecuárias que são
estimuladas por governos necropolíticos que acentuam a
vulnerabilidade de comunidades tradicionais como os povos
indígenas.
12No estado do Mato Grosso do Sul, segundo Aty Guasu et al. (2020, p.
1) e o “Plano da equipe Aty Guasu Guarani e Kaiowá diante do avanço
da Covid-19 e ordem de isolamento social”, “em cada barreira sanitária é
envolvida uma equipe voluntária indígena, composta por 15 indígenas
atuando em 3 turnos, no período matutino, vespertino e noturno. Essa
barreira sanitária indígena não recebeu apoio dos órgáos dos municípios,
do Estado e dos órgãos Federal”. É imprescindível assinalar o
protagonismo das mulheres Kaiowá e Guarani na atuação das barreiras
sanitárias e dos jovens que fortaleceram os cuidados com os anciões.
92
tem um modo-espaço de vida comunitário, com famílias
compartilhando o mesmo território, com moradias com
várias pessoas e que bebiam tereré como os Guarani, Kaiowá
e Terena do Mato Grosso do Sul, é a prova de um dos
obstáculos internos à disseminação vírus. A dinâmica de
fechamento/abertura e contenção/barreira, associada à
organização sociopolítica interna dos povos, nunca foi tão
importante para a proteção territorial do ataque severo do
vírus.
A partir das medidas tomadas pelos povos indígenas,
pode-se ver o quanto mais difícil é implementar o controle
territorial com rigidez ou eficácia para os territórios indígenas
em um país periférico (onde a pandemia parece ainda não ter
atingido o seu auge), no contexto latino-americano, de
retrocesso democrático, da acentuação da violência e de crise
sanitária, a luta por direitos, a defesa e a vigilância dos
territórios tradicionais é fundamental.
No caminho geográfico da pandemia pelo mundo,
desde a China, na Ásia, o vírus percorreu e afetou primeiro
os centros econômicos europeu e norte-americano, depois
proliferou pelas periferias, chegando à América Latina e a
África. Essa expansão ocorreu pela rota da globalização,
demonstrando a interdependência das relações, e foi
homogeneizando (e ao mesmo tempo diferenciando) os
espaços pela doença, pelo poder do vírus de matar e não
obviamente pela cura.
O dilema imposto pela pandemia não é novo para a
continuidade dos seres humanos no planeta. É o mesmo
impasse há décadas evidenciado (e negado) pela emergência
climática. Não é a toa que as áreas de desmatamento, de
agronegócio, de agroquímicos – que fazem parte dessa
economia de destruição predatória da Terra – são as
93
possíveis responsáveis da origem destes vírus como o da
Covid-19.
Uma característica primária desta pandemia, que tem
uma importante conotação geográfica, é que, ao se propagar
da China, ela começa no topo da pirâmide socioeconômica,
desde as classes mais abastadas até as classes menos
favorecidas. No caso dos povos indígenas a contaminação
nas aldeias começou muitas vezes em frigoríficos,
abatedouros, usinas sucroalcooleiras e mineradoras.
Ao olhar o mapa do Brasil da propagação da
pandemia em áreas periféricas, como as terras indígenas,
verifica-se que o coronavírus foi levado pela rede urbana e
afetou inicialmente as metrópoles brasileiras (os bairros mais
ricos), onde chegaram os turistas e/ou viajantes
internacionais, os primeiros portadores do vírus, e depois foi
se disseminando para as cidades médias até chegar as
pequenas. Consequentemente, ao chegar às cidades médias e
pequenas, onde estão em grande medida, às terras indígenas
brasileiras, o vírus começou a atingir os territórios ancestrais.
A grande questão é que esse vírus chegou primeiro nos
bairros mais ricos nas cidades, no comércio e na
agroindústria, o que evidencia que às estratégias espaciais de
controle dos territórios indígenas pela contenção/barreiras
sanitárias é um fenômeno complexo na realidade periférica e
colonial de um dos países mais desiguais da América Latina
e do planeta.
Foi assim que a pandemia chegou até os territórios
indígenas. No Mato Grosso do Sul o primeiro caso de
contágio de indígena por Covid-19 parece ser sintomático de
uma sociedade espacialmente desigual: uma mulher indígena
de 35 anos que trabalha em um frigorífico, moradora da
aldeia Bororó, no município de Dourados, foi o primeiro
caso confirmado no dia 13 de maio de 2020. Os dez
94
primeiros casos de contaminação pela Covid-19 na Reserva
Indígena de Dourados vieram de um frigorífico na cidade, de
acordo com liderança Guarani da aldeia Bororó. Os
indígenas contaminados, que transitaram pela aldeia Bororó
em seus horários de folga, trabalham no frigorífico e
começaram a apresentar os sintomas iniciais na primeira
semana de maio. Eles foram testados pela empresa e
obtiveram a confirmação do contágio. Embora os
trabalhadores tenham sido testados pela empresa, seus
familiares não foram. Frigoríficos, abatedouros, usinas
sucroalcooleiras e mineradoras, por exemplo, não
paralisaram as suas atividades de produção durante a
pandemia e tornaram-se espaços de transmissão do novo
coronavírus para trabalhadores indígenas e não indígenas.
Nessa situação distópica que é pandemia, os mais
afligidos são, paradoxalmente, os que mais precisam se
fortalecer com ela. E isso ocorre porque a catástrofe é vista
quase como inevitável pela vulnerabilidade destes povos e
comunidades tradicionais diante de um governo genocida.
Povos indígenas no Brasil estão sendo injustamente os mais
vulneráveis. Diante deste contexto é difícil acreditar que
teremos transformações substanciais no futuro pós-
pandemia, mesmo porque no Brasil às pretensões eleitorais
têm acentuado as mediadas neoliberais de diminuição de
direitos, de espoliação de territórios e rentistas com a terra.
Por sua vez, os povos indígenas e movimentos
sociais, através de suas organizações, criticam as políticas de
austeridade e propõem a necessidade de um retorno ao
Estado social. E isso se justifica num país com altas taxas de
desemprego, pobreza extrema e a precariedade do
atendimento médico hospitalar público – embora nunca foi
tão significativo defender o SUS (Sistema Único de Saúde).
É importante lembrar que uma das primeiras medidas do
95
atual governo, ao assumir o poder, foi o de desmantelar um
programa completo de atendimento médico (Médicos sem
fronteiras), e as tentativas de municipalização da SESAI,
políticas públicas fundamentais para as populações mais
vulneráveis – os povos originários. Por isso esses povos
lutam na justiça para que o Estado implemente um Plano
emergencial para a defesa da vida dos indígenas.
As organizações indígenas em múltiplas escalas
nacionais têm atuado para as medidas de autocontenção
territorial, como o impedimento do acesso às aldeias por
meio das barreiras sanitárias, com todas as dificuldades da
proximidade com cidades, rodovias, rios, dentre outras vias
de acesso ou de abertura a esses territórios originários.
Alguns grupos mais vulneráveis, como os povos isolados na
Amazônia, que só têm seus corpos como um território a ser
defendido, um espaço sobre o qual eles ainda tentam manter
algum controle, já que missionários fundamentalistas e o
atual governo querem estabelecer contato, acentuando o
risco de contágio e extermínio de parcelas que não tem
nenhuma imunidade à Covid-19. Essa ofensiva para os
povos isolados pode impor um triste e perverso destino
diante de um vírus biológico agressivo. Assim, para os povos
indígenas é praticamente impossível fechar completamente
suas aldeias para controlar as entradas quando não há sequer
água e sabão suficientes para a higiene pessoal, como é o caso
de muitas aldeias dos Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do
Sul. Além disso, nesse caminho geográfico, o novo
coronavírus (Sars-CoV-2) afeta também a vida e os
territórios dos povos indígenas transfronteiriços.
96
Povos indígenas transfronteiriços e a pandemia de
Covid-19
No Brasil, ao longo dos 16.886 quilômetros da
fronteira internacional, há uma grande variedade de situações
de território e territorialidades que envolvem indígenas
transfronteiriços. Não se trata simplesmente de indígenas
que residem perto ou na fronteira, mas de populações que
transitam constantemente e cruzam esses limites político-
administrativos do Estado-nação, a exemplo dos Guarani e
Kaiowá na fronteira do Brasil com o Paraguai.
Durante a pandemia esse “ir e vir ou trânsito”13
(MONDARDO, 2018) tornou-se mais complexo na medida
em que os Estados na América latina – embora, alguns, de
forma tardia em relação aos países europeus, norte-
americanos e asiáticos –, fecharam as fronteiras terrestres e
aéreas como de controle dos fluxos de pessoas e, em menor
grau, de mercadorias. A retomada do poder soberano para o
fechamento das fronteiras política e administrativa dos
Estados-nacionais tornou-se um dispositivo para o controle
zonal da difusão da pandemia no mundo e na América
Latina.
No entanto, o mecanismo da fronteira fechada não
tem garantido aos Estados uma eficácia no combate à Covid-
19. Isso porque muitas populações transitam pelos limites
internacionais, como os moradores de cidades gêmeas (os
Considerações finais
Essa crise sanitária e planetária, por um lado, nos
força a imaginar um futuro sombrio, muito em breve. Os
povos indígenas vêm lutando e denunciando, cada vez mais
em múltiplas escalas espaciais, a falta de quase tudo para o
atendimento nos hospitais públicos. O governo
necropolítico, por sua vez, nega e continua subestimando a
seriedade da crise mesmo depois de mais de 100 mil mortes
101
de brasileiros, dentre os quais 678 são indígenas, registrados
até o dia 16 de agosto de 2020. A necropolítica adotada pelo
governo genocída tem priorizado a economia ao invés da
vida, mesmo em um sistema econômico fracassado, com
efeitos sociais nefastos (a desigualdade socioespacial foi
escancarada com a pandemia) e ecológicos perversos. Assim
o coronavírus nos alerta sobre este padrão perverso de
extração de riqueza da Terra, esgotando os recursos naturais
pelo neoextrativismo em países da América Latina como o
Brasil, e levando até a banalização ou desumanização das
mortes.
Ao fechar de forma malograda as fronteiras com
outros países, o Estado brasileiro não adotou medidas para
controlar o contágio ou evitar a entrada de pessoas infectadas
em terras indígenas. Isso demonstra que a luta para os povos
indígenas devem ser transterritorial e transfronteiriça na
medida em que se faz necessária a articulação entre povos
indígenas que vivem nas fronteiras de países latino-
americanos, num diálogo, intervenções e protocolos que
devem envolver diversos atores institucionais, desde as
organizações até os órgãos dos respectivos Estados. Isso se
deve aos diferentes níveis de contágio dos povos indígenas
que habitam as fronteiras dos países do Mercosul, e devido
ao aumento mais rápido da pandemia no Brasil, esse ir e vir
ou trânsito, coloca em risco diversos grupos de indígenas, a
exemplo dos Guarani.
Por isso, a pandemia desmascara que não há nada de
democrático sobre o coronavírus. No Brasil, o vírus
desencadeia efeitos perversos sobre as populações mais
frágeis, a exemplo dos indígenas, e dentre estes os idosos, os
doentes, as mulheres e as crianças. Além disso, a
autocontenção é um processo extremamente complexo para
esses povos, seja pelas invasões, ameaças e violências sofridas
102
em seus corpos-terras-territórios, seja em função das
condições mínimas para o distanciamento social (afinal, só
os mais ricos têm as condições econômicas para isso), seja
devido ao seu modo de vida comunitário.
Uma das lições geográficas dessa pandemia é que
para os povos indígenas defender o território é defender a
vida. Num mundo tão desigual da intensificação da
informação e com tanta tecnologia, além dos diferentes
dispositivos de contenção territorial, cada vez mais é
importante defender a vida, e o corpo-terra-território é a
condição permanente para essa r-existência (existir para
resistir). É imprescindível construir por meio das lutas
anticoloniais outra biopolítica que seja centrada no
comunitário, no afeto e no cuidado.
Contra o crescimento econômico desenfreado, como
o padrão sino-americano da globalização neoliberal que
impõe novas dependências à América Latina, do
neoextrativismo e da reprimarização, o mundo pandêmico
pode ajudar a construir ou fortalecer utopias. Mesmo diante
da distopia do espaço-tempo que é a pandemia, faz
necessário pensar em horizontes de decrescimento e pós-
extrativistas (ACOSTA e BRAND, 2018), de alternativas ao
desenvolvimento para frear o consumo frente aos “limites
do modelo civilizatório ocidental” (LANDER, 2016), da
finitude material do planeta pela forma hegemônica adotada
de existência humana (NODARI, 2004), para reconhecer
outras formas de vida, de convívio e de relação
pluriontológica com a natureza, de “sentir e pensar com a
terra” (ESCOBAR, 2018), como nas perspectivas de “Bem
viver”, “Bien Vivir Sumak Kawsay/Vivir Bien” (ACOSTA,
2016), mãe Terra, Pachamama, teko porã, nhandereko, uma
oportunidade para imaginar outros mundos como fazem os
povos indígenas latino-americanos.
103
A insaciabilidade do uso dos “recursos” naturais
afeta negativamente a cosmologia de cada povo e também a
vida de não indígenas. Por isso é fundamental construir
horizontes em que a mãe Terra é um ser vivo com direitos,
um mundo onde caibam muitos mundos (o pluriverso),
como na visão ecofeminista indígena latino-americana, ou
como afirma o líder indígena, ambientalista e pensador
Ailton Krenak (2019), para que tenhamos ideias para adiar o
fim de um mundo.
Referências
ACOSTA, A. O Bem Viver: uma oportunidade para
imaginar outros mundos. São Paulo: Autonomia
Literária/Elefante, 2016.
ACOSTA, A.; BRAND, U. Pós-extrativismo e
descrescimento: saídas do labirinto capitalista. São Paulo:
Elefante, 2018.
APIB – ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS
DO BRASIL. Disponível em:
http://quarentenaindigena.info/casos-indigenas/ - acesso
em 16/08/2020.
ATY GUASU et al. Carta emergencial dos conselhos
Guarani e Kaiowá frente a pandemia da Covid-19. APIB
Oficial, Brasília, 17 maio 2020. Disponível em:
<www.apib.info>. Acesso em: 18 de jun. 2020.
ATY GUASU. Plano da equipe Aty Guasu Guarani e
Kaiowa diante do avanço da Covid-19 e ordem de
isolamento social. APIB Oficial, Brasília, julho 2020.
Disponível em: <www.emergenciaindigena.apib.info>.
Acesso em: 10 de dez. 2020.
104
BARNSLEY, J. El cuerpo como territorio de la rebeldía.
Caracas: Unearte, 2006.
CABNAL, L. Acercamiento a la construcción de la
propuesta de pensamiento epistémico de las mujeres
indígenas feministas comunitarias de Abya Yala. In:
Feminismos diversos: el feminismo comunitario. Madrid:
Acsur Las Segovias, 2010, pp. 11-25.
DELEUZE, G. Post-scriptum sobre as sociedades de
controle. DELEUZE, G. Conversações: 1972-1990. Rio
de Janeiro: Editora 34, 1992, p. 219-226.
ESCOBAR, A. Otro posible es posible: caminando hacia
las transiciones desde Abya Ayala/Afro/Latino-América.
Bogotá: Ediciones Desde Abajo, 2018.
FOUCAULT, M. Naissance de la Biopolitique. Paris:
Gallimard-Seuil, 2004.
FRASER, N. Scales of justice: reimagine political space in
a globalizing world. New York: Columbia University Press,
2008.
GUAJAJARA, S. Governo Bolsonaro: o retrato da
barbárie contra os povos indígenas e a vida. Conflitos no
campo: Brasil 2019. Goiânia: CPT Nacional, 2020, p. 182-
189.
HAESBAERT, R. De categoria de análise a categoria da
prática: a multiplicidade do território numa perspectiva
latino-americana. FRIDMAN, F.; GENNARI, L. A.;
LENCIONI, S. (Org.). Políticas públicas e territórios:
onze estudos latino-americanos. Buenos Aires: CLACSO,
2018. p. 267-288.
105
________. Do corpo-território ao território-corpo (da
Terra): contribuições decoloniais. GEOgraphia, v. 22, n.
48, 2020, p. 75-90.
________. Viver no limite: território e
multi/transterritorialidade em tempos de in-segurança e
contenção. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2014.
HAN, B. Sociedade do cansaço. Petrópolis: Vozes, 2017.
HARVEY, D. O novo imperialismo. São Paulo: Loyola,
2004.
IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA
E ESTATÍSTICA. Os indígenas no Censo Demográfico
2010: primeiras considerações com base no quesito cor ou
raça. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.
KOPENAWA, D.; ALBERT, B. A queda do céu: palavras
de um xamã yanomami. São Paulo: Companhia das Letras,
2015.
KRENAK, A. A vida não é útil. São Paulo: Companhia
das Letras, 2020.
________. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo:
Companhia das Letras, 2019.
LANDER, E. Com o tempo contado: crise civilizatória,
limites do planeta, ataques à democracia e povos em
resistência. In: DILGER, G.; LANG, M.; PEREIRA
FILHO, J. (Org.). Descolonizar o Imaginário. São Paulo:
Elefante, 2016, p. 214-255.
LATOUR, B. Onde aterrar? Como se orientar
politicamente no Antropoceno. Bazar do Tempo: Rio de
Janeiro, 2020.
106
MASSEY, D. For Space. London: Sage, 2005.
MBEMBE, A. Necropolítica. Tenerife: Melusina, 2011.
MONDARDO, M. O local, o regional e o nacional como
escalas geográficas das práticas, lutas e direitos:
territorialidades indígenas latino-americanas. Revista da
ANPEGE. v. 16. n. 30, 2020, p. 148-169.
________. Tekoha: lutas indígenas pelo território. Boa
Vista: Editora da UFRR, 2019.
________. Territórios de trânsito: dos conflitos entre
Guarani e Kaiowa, paraguaios e “gaúchos” à produção de
multi/transterritorialidades na fronteira. Rio de Janeiro:
Consequência, 2018.
NODARI, A. Limitar o limite: modos de subsistência. Os
mil nomes de Gaia: do Antropoceno à Idade da Terra,
São Paulo, setembro de 2014. Disponível em
<www.osmilnomesdegaia.files.wordpress.com>. Acesso
em: 21 ago. 2020.
RAFFESTIN, C. Pour une Géographie du Pouvoir.
Paris: LITEC, 1980.
SANTOS, M. A natureza do espaço: técnica e tempo,
razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996.
SESAI – SECRETARIA ESPECIAL DE SAÚDE
INDÍGENA. Boletim epidemiológico da SESAI.
Disponível em: <www.saudeindigena.net.br>. Acesso em:
16 ago. 2020.
SVAMPA, M. Neo-extractivism in Latin America:
socio-environmental conflicts, the territorial turn, and
new political narratives. New York: Cambridge University
Press, 2019.
107
VIVEIROS DE CASTRO, E. “Ce qui se passe au Brésil
relève d’un génocide”. [Entrevista concedida a] Martin
Legros. In: Philosophie Magazine, Paris, 19 maio 2020.
Disponível em: <www.philomag.com>. Acesso em: 20 jul.
2020.
________. A inconstância da alma selvagem (e outros
ensaios de antropologia). São Paulo: Cosac & Naify,
2002.
WALLACE, R. Pandemia e agronegócio: doenças
infecciosas, capitalismo e ciência. Editora Elefante e Igrá
Kniga, São Paulo, 2020.
ZARAGOCIN, S. La Geopolítica del útero: hacia una
geopolítica feminista decolonial en espacios de muerte
lenta. CRUZ, D.; BAYON, M. (Org.). Cuerpos, territorios
y feminismos. Quito: Abya Yala y Estudios Ecologistas del
Tercer Mundo, 2018.
108
CAPÍTULO 4
Introdução
O conceito de imigração é multivariado e depende de
quem fazemos a pergunta, variações que se podem observar
desde o cidadão comum até o cidadão mais letrado quer no
campo das ciências sociais, como das humanas e naturais.
Apesar de existirem diferenças nessas definições, a
percepção do conceito é a mesma, a medida em que se
encontrarem alguns aspectos comuns em todas elas como é
o caso do movimento ou deslocação de pessoas, e também
o facto de que nenhum país pode viver em autarcia, ou seja,
nenhuma sociedade pode prosperar por si, sem precisar do
auxílio de outra(s). Por exemplo, não produzimos tudo o que
necessitamos, não consumimos tudo o que produzimos e
nem temos tudo que precisamos para produzir. Por outras
palavras, podemos afirmar que, no geral, todos os países
importam o que não produzem e, exportam o que os outros
necessitam. É neste binómio importação e exportação que
encontramos o fenómeno de imigrantes e emigrantes, da
existência de países mais atrativos e menos atrativos e
também a questão de oportunidades.
109
Referindo-se a migração internacional Castles e Miler
(2009) afirmam não se tratar somente de uma acção
individual de procura de oportunidades de continuar a viver
ou de conseguir ter melhores condições de vida, mas sim,
como uma acção colectiva que surge fora da mudança social
de toda a sociedade receptora e emissora de migrantes. Além
disto, estes autores constataram que no âmbito de estudos da
migração internacional ela pode ser abordada em dois
domínios de investigação nas ciências sociais: o primeiro
domínio tem a ver com os motivos, processos e padrões de
migração, e o segundo, com a integração dos mesmos na(s)
sociedade(s) receptora(s).
Ravenstein foi o primeiro a apresentar explicações
científicas sobre teorias das migrações, baseadas numa
realidade específica encontrada na Inglaterra (PEIXOTO,
2004). Depois dele, outros teóricos se sucederam baseando
as suas teorias em realidades específicas particularmente da
Europa. Por exemplo, o trabalho de Ferreira et al. (2016) é
um dos que explicam que a epistemologia dos estudos sobre
a migração baseia-se nas posições ocidentalistas, construídas
na base de um quadro teórico e empírico, olhando somente
para fluxos que ocorrem dentro e para os países ocidentais.
Estamos, portanto, no contexto da ocidentalização do
conhecimento desafiado por Sousa Santos (2018) e Nola
(2007) que aconselham os cientistas do Sul a lutarem para a
descolonização do conhecimento. Por exemplo, quando
olhamos para o continente africano nos apercebemos que
algumas destas teorias só têm cabimento para explicações
relacionadas com a emigração e muito pouco para
compreender a migração que acontece nos países africanos,
os fluxos da Europa, Ásia e América para África.
É importante lembrar que conhecimento primário
sobre migração internacional tem a ver com o facto da África
110
ser o continente de emigração devido a escravatura e de
imigração devido a colonização, desvalorizando quase que
totalmente a migração bantu, migração àrabe em África e a
imigração pós-colonial.
A respeito da imigração pós-colonial, estatísticas
demográficas africanas têm demonstrado um crescimento
populacional quase exponencial, num contexto cheio de
desafios, provocando por consequência uma emigração sem
precedentes para a Europa, através do Mar Mediterrâneo.
Notícias veiculadas pelo canal de televisão
Euronews, dão-nos conta da brutalidade em que ocorre essa
travessia, bem como as condições em que viajam. A título de
exemplo, podemos apresentar o caso de Lampedusa na Itália
cujo Governo tentou impedir a entrada de imigrantes,
originando por consequência movimentos de solidariedade
de alguns cidadãos europeus, defensores dos direitos
humanos.
Com este trabalho pretendemos desmistificar o
fenómeno da imigração africana em particular aquela que
acontece em Moçambique motivada pela necessidade de
cooperação e investimento europeu, e também mostrar a
continuidade da migração portuguesa, chinesa e indiana bem
como o contínuo e tradicional movimento migratório bantu
iniciado há muitos séculos e responsável pela dinâmica do
povoamento da África Austral (Raimundo e Raimundo
2015).
A nossa visão de análise baseou-se na perspectiva de
Castles e Miller (2009), que se preocuparam com a maneira
como os imigrantes se integram nas sociedades receptoras.
111
Questões metodológicas
114
acordo com Raimundo (2020)14, podem ser identificados
quatro tipos de portugueses migrantes no período pós-
colonial: 1) Portugueses que permaneceram em Moçambique
depois da independência com visitas regualares à Portugal; 2)
Portugueses que emigraram para África do Sul e retornaram
para Portugal como consequência da Directiva 24/20; 3) Os
retornados da África do Sul e de Portgual em Moçambique
que o fizeram na tentativa de recuperação das propriedades
que foram confiscadas no contexto das Nacionalizações; e 4)
Portugueses que nunca conheceram nem tiveram contacto
anterior com Moçambique.
O estudo desenvolvido por Ferreira et al. (opus cit.),
aponta como principais razões da vinda de portugueses em
Moçambique no período pós-colonial, cujo pico se registou
em 2014, fundamentalmente as seguintes: oportunidades de
trabalho, perspetivas económicas positivas de Moçambique,
conhecimento da língua portuguesa, existência de redes
familiares e de amigos residentes em Moçambique e a
perspetiva de uma boa qualidade de vida em Moçambique.
Estes resultados não nos surpreendem uma vez que a
abertura de Moçambique para investimentos estrangeiros e o
boom das descobertas dos seus recursos minerais foram, por
si sós, motivos fortes para se interessarem pelo país,
principalmente aqueles que com quem tinham ligações
históricas muitos fortes (portugueses, indianos e chineses),
bem como outros provenientes de outros espaços
geográficos, tais com cidadãos da África, Ocidental, Oriental
e Central.
Moçambique.
17 Op cit.
117
Mapa 1. População portuguesa em Moçambique entre os períodos
censitários.
118
“africanos”, Leite e Khouri, por sua vez, falam de uma
comunidade específica de indianos os ismailis ou ismaelitas
originários do meio rural indiano do Estado de Gujarate.
Segundo estas autoras, a comunidade Ismail iniciou a
imigração para Moçambique a partir dos anos 1890 e, entre
1910 e 1920 se fixaram na região que hoje se chama Cidade
de Maputo (antigo Lourenço Marques) e nos actuais distritos
da Manhiça e no Posto Administrativo de Sábiè (actual
Distrito de Moamba, Província de Maputo). Dentre eles, uns
eram portugueses e outros eram ingleses e pertenciam a duas
religiões islâmicas (Chiitas e Sunitas) como é indicado na
Tabela 2.
126
Análise da imigração africana em Moçambique
A imigração africana em Moçambique pode ser vista
como sendo a continuidade dos movimentos migratórios
bantu, tal como explica Matusse (2009) e Raimundo e
Raimundo (2017). Se no passado ela teve a ver com o
processo do povoamento da África Austral e as guerras de
ocupação, mais recentemente estas migrações estão no geral
associadas aos conflitos militares (em algumas regiões de
África), a pobreza (que assola a grande maioria dos países da
África sub-sahariana), a fatalidade do destino, ao aumento do
sentimento xenófobo e também a existência de rotas de
garimpo nas províncias do Centro e Norte de Moçambique.
Importa observar que os europeus, os asiáticos e os
americanos que se encontram em Moçambique não são
regidos por uma Política de migração específica, se não pela
Lei 5/93 regulamentado pelo Decreto n. 108/2014 que
aprova o Regulamento da Lei n. 5/93, de 28 de Dezembro e
as respectivas normas de entrada, permanência e saída do
país, os direitos, deveres e garantias assim como o regime
legal da permanência de cidadãos estrangeiros em
Moçambique (Boletim da República 2014, I Série, 31 de
Dezembro n. 105). Em relação ao regime de contratação
laboral, os referidos cidadãos são regidos pela Lei n.
23/2007, de 1 de Agosto, que define os mecanismos de
contratação de mão-de-obra estrangeira.
No que se refere à imigração africana no geral, alguns
estudiosos tais como Raimundo e Raimundo (2015), Neto
(2012), Liesegang e Cumbe (2012) e Matusse (2009)
concordam que as migrações actuais constituem
continuidade das migrações iniciadas pelos povos bantu da
região central de África e que foram apenas perturbadas e
interrompidas, com a delimitação de fronteiras e o início da
colonização do continente africano. Porém, com as
127
independências dos países africanos a partir dos anos 1950 e
os subsequentes conflitos armados, desastres naturais,
pobreza, desemprego e perseguições políticas assiste-se ao
início de um novo movimento de migrações em África, com
características bem diferentes do período anterior à
dominação colonial. De forma legal ou ilegal, obedecendo as
rotas tradicionais de trânsito e outras novas, os africanos
saem dos seus países para outros países incluindo
Moçambique. Apesar da falta de estudos sistemáticos sobre
a imigração africana em Moçambique, é fácil constatar
algumas mudanças a vários níveis nas cidades
moçambicanas, em particular na Cidade de Maputo. A título
de exemplo, podemo-nos referir sobre a popularização da
capulana como tecido para confecção de vestuário feminino
e masculino, o surgimento de religões pentecostais, e o
aumento de escolas internacionais que recrutam professores
zimbaweanos e nigerianos por causa do conhecimento da
língua inglesa. Estas realidades por si só, revelam mudanças
que de certa maneira resultam da presença significativa de
cidadãos africanos em Moçambique. Um outro exemplo que
podemos acrescentar, é a existência de um campo de
refugiados na Cidade de Nampula no norte de Moçambique
que em 2017 albergava cerca de 14 mil refugiados e
requerentes de asilo, na sua maioria provenientes da África
dos Grandes Lagos (SENAMI, 2017)19.
São vários os factores que facilitam a entrada de
cidadãos africanos em Moçambique. A título de exemplo,
segundo Seda (2017) e podemo-nos referir sobre a existência
de fronteiras relativamente menos protegidas (que facilitam
130
Quantas pessoas foram contadas no IV Recenseamento
Geral da População e Habitação de 2017 na Cidade de
Maputo?
O IV Recenseamento Geral da População e
Habitação realizado em 2017 registou para a Cidade de
Maputo 1.066.881 habitantes, dos quais 513.705 homens e
553.176 mulheres. Deste número, os estrangeiros incluídos
são de nacionalidade sul-africana (2.350), zimbabweana (
443), tanzaniana (228), malawiana (327), zambiana (61),
burundesa (738), ruandesa (579), chinesa (371), portuguesa
(2.277), indiana (987), paquistanesa (600), outras da África
Austral (215), outras africanas (2420), outras europeias (816)
outras do resto do mundo (481).
Estas estatísticas mostram que na data do censo na
Cidade de Maputo foram 12.893 estrangeiros
correspondente a 1,2% da população total. Isto significa que
em 10 anos a população estrangeira nesta cidade teve um
aumento de 1278, uma vez que no no III Recenseamento
Geral da População em 2007 foram registados 11.615
estrangeiros. Importa lembrar que recensear estrangeiros
com base na nacionalidade é um exercício muito complexo,
se considerarmos que existem portugueses e indianos que
por altura do censo não se consideravam moçambicano
preferindo declarar que fazem parte de uma outra
nacionalidade. A título de exemplo, tal como atrás nos
referimos, dificilmente se chega a conhecer a real
nacionalidade de um indiano, uma vez que, em alguns casos,
eles se identificam como indo-moçambicanos, luso-indiano
e indo-britânicos. Para testemunhar este facto, um dos
nossos entrevistados afirmou que “Os indianos dependem
de onde têm vantagens. São moçambicanos para facilidades
de negócios e outra regalias.Porém, acabam adoptando uma
131
outra nacionalidade pelas facilidades de vistos para Inglaterra
ou União Europeia”. (Entrevista com um consultor
moçambico na Cidade de Maputo, 8 de Julho de 2020).
Amostra
Como foi explicado anteriormente, o inquérito não
obedeceu a cálculos estatísticos complexos. Foram cálculos
simples dos quais cada um dos 56 estudante deveria realizar
20 inquéritos. Deste modo, foram inquiridas 1120 pessoas
das quais 945 são moçambicanos e 175 são de nacionalidade
estrangeira (Gráfico 1). A determinação das pessoas a inquirir
foi aleatória.
Gráfico 1. Amostra dos inquiridos
1000
800
600
400
200
0
Moçambicanos Estrangeiros
Fonte: elaboração própria.
135
População inquirida por sexo
No total foram inquiridos 613 indivíduos do sexo
masculino dos quais 118 de nacionalidade estrangeira e 507
do sexo feminino dos quais 57 de nacionalidade estrangeira,
de acordo com o Gráfico 2.
600
500
400
300
200
100
0
Moçambicano Estrangeiro Moçambicana Estrangeira
Homem Mulher
Fonte: elaboração própria.
137
Casado/união Divorciado
Nacionalidade Solteiro de facto ou Viúvo Total
separado
Estrangeira 82 79 8 3 172
Moçambicana 568 316 35 28 947
Total 650 395 33 31 1109
138
Esta análise, ao ser feita por países de origem
constata-se que dos que possuem o grau de bacharel 3 são
burundeses e 3 são congoleses, e dos que disseram possuir a
licenciatura no total são 20, dos quais 6 são de nacionlaidade
burundesa, 4 nigerianos, 4 tanzaninos, 3 congoleses, 2
portugueses e 1 sul-africano. Em relação ao nível de
mestrado foram identificados 2 brasilleiros e 1
zimbabweano, e, a nível de doutoramento foram
identificados 2 cidadãos de nacionalidade zambiana, 1 de
nacionalidade zimbabweana e 1 de nacionalidade
portuguesa.
Importa observar que o IV Recenseamento geral da
População e Habitação de 2017 (Tabela 7) revela que a
maioria dos citadinos de Maputo possui o Primário do 1º
Grau (46.940 hab.), seguida por aqueles que possuem o
Primário do 2º grau (44.483 hab.), Secundário Geral do 2º
Ciclo (30.854 hab.) e Secundário Geral do 1º Ciclo (28.840
hab.). É de referir que a Cidade de Maputo registou um
número bastante significativo de pessoas com grau superior
universitário. A tabela mostra que possuem o grau de
Licenciatura (18.243 hab.), seguidos por aqueles que fizeram
Mestrado (3.847 hab.), Bacharelato (1.802 hab.) e o
Doutoramento (809 hab.).
Além dos dados acima apresentados, a tabela
também nos trás informações sobre os que concluiram o
Ensino Técnico Médio (6.375 hab.), Ensino Técnico básico
(1963 hab.), nível de Alfabetização (5.214 hab.), Ensino Pré-
escolar (2.219 hab.), EnsinoTécnico elementar (739 hab.) e
o Curso de Formação de Professores (488 hab.).
139
Tabela 7. Escolaridade dos residentes da Cidade de Maputo
Qualificações Homem Mulher Total
académicas
Doutor (PhD) 692 117 809
Mestrado 3.094 753 3.847
Licenciatura 14.247 3.996 18.243
Bacharelato 1.424 378 1.802
Curso Formação de 328 160 488
Professores
Técnico médio 5.247 1.128 6.375
Técnico básico 1.599 364 1.963
Técnico elementar 586 153 739
Secundário Geral do 23.667 7.108 30.854
2º Ciclo
Secundário Geral 1º 21.653 7.187 28.840
Ciclo
Primário do 2º Grau 31.806 12.677 44.483
Primário do 1º Grau 28.956 17.984 46.940
Pré-Escolar 1.122 1.097 2.219
Alfabetização 2.562 2.652 5.214
Total 157.558 78.192 235.750
Fonte: INE (2019).
141
Gráfico 3. Origem da população inquirida por continente ou
região
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Moçambique África Europa América Ásia e
Latina Oceania
142
Tabela 8. Tempo de residência na Cidade de Maputo por
nacionalidade
Nasceu 7 a 11 12 a 59 Mais
Nacionalidade aqui 0a6 meses meses de 60 Total
meses meses
Estrangeira 6 13 17 80 59 175
Moçambicana 294 28 67 241 315 945
Total 300 41 84 321 374 1120
Fonte: elaboração própria.
143
Tabela 9. Tipo de documento usado para entrar em Moçambique
por nacionalidade
Documento
Nacionalidade Total
Passaporte Salvo-conduto
Angolana 2 0 2
Brasileira 6 0 6
Burundesa 20 0 20
Camaronesa 1 0 1
Congolesa 12 0 12
Espanhola 1 0 1
Indiana 3 0 3
Malawiana 4 1 5
Mexicana 1 0 1
Nigeriana 28 1 29
Portuguesa 12 0 12
Queniana 1 0 1
Ruandesa 2 0 2
Russa 1 0 1
Senegalesa 2 0 2
Somaliana 4 0 4
Sul-africana 29 0 29
Tanzaniana 11 0 11
Venezuelana 1 0 1
Zambiana 4 0 4
Zimbabweana 7 1 8
Total 152 3 155
Fonte: elaboração própria.
Brasileiro 4 1 0 0 0 2 0 6
Burundês 3 0 2 0 0 13 2 20
Congolês 3 0 0 0 0 6 2 11
Indiano 0 1 0 0 0 0 1 2
Malawiano 3 0 0 0 0 0 1 4
Nigerianos 10 2 0 0 0 9 1 22
Portuguesa 1 1 0 1 0 0 0 3
Ruandesa 1 1 0 0 0 1 0 3
Somaliana 1 0 0 0 0 2 1 4
Sul-africana 22 3 0 0 0 0 0 25
Tanzaniana 1 0 3 0 2 2 0 8
Zambiana 3 0 0 0 0 1 0 4
Zimbabweana 1 0 0 0 2 1 0 4
Total 53 9 5 1 4 37 8 116
145
Estatuto de residência em Moçambique
Segundo a Lei 3/95, na República de Moçambique é
considerado estrangeiro todo o cidadão que não tenha a
nacionaldiade moçambicana em conformidade com o
ordenamento jurídico vigente. Porém, de acordo com a
mesma lei, esse estrangeiro pode ser concedido o estatuto de
cidadão residente com direito de residir em Moçambique,
concedido pela autoridade competente. Para o efeito, é-lhe
emitido o DIRE- Documento de Identificação e Residência
para o Estrangeiro.
A Tabela 11 dá-nos informações sobre as respostas
concedidas pelos inquiridos relacionadas com o estatuto de
residência em Moçambique. Neste contexto, dos (151)
respondentes, a maioria (82) revelou ter o estatuto de
residente enquanto que (69) disseram ter residência
temporária. É importante observar que o tempo de
residência temporária em Moçambique é regido pela Lei
5/93 que estabelece três tipos de DIRE: i) Que estabelece
uma residência precária (que varia de 90 dias a 5 anos); ii)
Que concede uma residência temporária (a um cidadão
estrangeiro que tenha residência precária há mais de 5 anos);
e iii) Que prevê uma residência permanente (concedida a um
estrangeiro que tenha residência temporária há mais de 10
anos consecutivos).
146
Tabela 11. Estatuto de residência
Estatuto de residência
Nacionalidade Total
Permanente Temporário
Angolana 2 0 2
Argentina 1 0 1
Australiana 1 0 1
Brasileira 2 0 2
Burundesa 9 12 21
Camaronesa 0 1 1
Congolesa 10 4 14
Espanhola 1 0 1
Indiana 1 0 1
Italiana 0 1 1
Malawiana 2 1 3
Mexicana 0 1 1
Nigeriana 11 16 27
Portuguesa 10 2 12
Queniana 1 0 1
Ruandesa 2 1 3
Russa 1 0 1
Senegalesa 0 1 1
Somaliana 3 1 0
Sul-africana 16 14 30
Tanzaniana 1 0 1
Venezuelana 1 9 10
Zambiana 4 0 4
Zimbabweana 3 5 8
Total 82 69 151
Fonte: elaboração própria.
147
(90), motivos familiares (70), emprego e fome (45), guerra
(26), negócio (10), fome (8) e condições climáticas (6).
Além dos motivos acima apresentados, foram
também identificados outros motivos que tiveram apenas
duas respostas de cada, tais como gravidez, guerra e fome,
ideologia da casa, casamento, missão de serviço, Serviço
Militar, trabalho e escola, escola e casamento, seguir minha
missão divina, viuvez, divórcio ou separação, o pai vendeu a
casa e novo casamento da mãe, discussões com os vizinhos,
injeva, gostar da cidade, entre outras não especificadas.
Ao analisarmos as respostas sobre os motivos que
originaram a mudança do local de residência dadas pelos
estrangeiros, o emprego é foi o principal motivo apontado
pela (44), seguido da guerra (22), feitiço (22), casamento (16),
escola (15), motivos familiares (14), emprego e fome (12),
negócio (10) e fome (3).
151
Tabela 14. Sabe falar a língua portuguesa, por nacionalidade.
Nacionalidade Sabe Não Total
Burundesa 21 0 21
Brasileira 2 0 2
Congolesa 14 0 14
Indiana 3 0 3
Nigeriana 30 0 30
Portuguesa 11 0 11
Ruandesa 3 0 3
Sul-africana 29 0 29
Tanzaniana 1 0 1
Zambiana 4 0 4
Zimbabweana 9 0 9
Moçambicana 935 10 945
Total 1062 10 1072
Fonte: elaboração própria.
152
Tabela 15. Actividade que exerce na actualidade.
Nacionalidade
Actividade Estrangeira %
Professor 2 1.7
Jurista 2 1.7
Consultor 2 1.7
Modista 4 3.4
Funcionário bancário 2 1.7
Comerciante 86 74.1
Cabeleireiro 7 6.0
Construtor civil 2 1.7
Engenheiro de obras 3 2.5
Pastor de igreja/obreiro 2 1.7
Empregada doméstica/balcão 2 1.7
Cozinheiro 3 2.5
Total 116 98.7
Fonte: elaboração própria.
Conclusões
Estudar migrações ou pessoas em movimento é um
dos assuntos demográficos de difícil mensuração. Mais difícil
ainda, é estudar pessoas que por alguma razão não possuem
documentos, ou se encontram no país hospedeiro como
consequência de fuga por temer a sua vida e que dificilmente
declaram quem são e, por consequência, se mostram
indisponíveis para participar em estudos desta natureza.
Existe, também, dificuldade em identificar algumas
nacinalidades tais como portuguesa e indiana que, por
natureza histórica se apresentam com dupla ou tripla
nacionalidade, situação que nos coloca em desafio para
identificá-los como imigrantes internacionais. Aliada a esta
situação temos a grande dificuldade de encontrar dados
estatísticos fiáveis que possam suportar os nossos
argumentos. A título de exemplo, apresentar IV
Recenseamento Geral da População e Habitação em
153
Moçambique que, apesar de ter sido realizado em 2017 e a
publicação dos seus dados definitivos ter ocorrido em 2019,
ainda não é possivel ter acesso a base de dados que nos possa
auxiliar a fazer uma mensuração indirecta da migração. Por
essa razão, este trabalho pode estar inferido de algumas
incosistências estatísticas que provavelmente foram
colmatadas por entrevistas e diversa literatura existente sobre
a temática analisada.
No geral, constata-se que as migrações internacionais
em Moçambique têm sido ignoradas, particularmente aquelas
que dizem respeito à Cidade de Maputo. Como residentes
nesta Cidade, observamos algumas transformações espaciais
resultantes da presença de imigrantes que outrora não faziam
parte do cenário geográfico da Cidade de Maputo, na sua
maioria resultantes do fim da guerra dos 16 anos (1976-1992)
e da abertura do País aos investimentos estrangeiros como
resultado da chamada ‘descoberta’ dos recursos naturais que
transformaram Moçambique num destino final de
imigrantes, deixando por consequência de ser um país de
trânsito de migrantes.
Ao longo do estudo usamos de forma propositada a
expressão nacionalidade estrangeira, para a distinguir da
expressão migrantes moçambicanos.
Com este estudo pretendemos compreender a
migração internacional nas últimas duas décadas e avaliar as
transformações espaciais resultantes das migrações. Para o
efeito, foi incontornável a análise de dados dos censos de
2007 e 2017, consubstanciada por informações obtidas nas
entrevistas e inquérito realizadas para o efeito, bem como
pela informação bibliográfica. Assim, a conclusão a que
chegamos, se circunscreve nos seguintes aspectos:
1. A globalização, o avanço das comunicações, as
guerras que se alastraram em todo os
154
continentes, os desastres ambientais, as doenças
globais, a internacionalização da economia e os
problemas ambientais exigem uma reflexão mais
profunda sobre as migrações internacionais do
mundo contemporâneo;
2. A imigração portuguesa e indiana continua ainda
presente na Cidade de Maputo. Porém, a
determinação estatística destes cidadãos tem sido
um exercício difícil, uma vez que muitos deles
têm uma dupla nacionalidade ou tripla
nacionalidade ficando por consequência, muitas
vezes, fora das estatísticas nacionais de
Moçambique;
3. A Cidade de Maputo tem sido nos últimos anos
palco de encontro de imigrantes oriundos de
países que, até há duas décadas, não faziam parte
das estatísticas do país, tais como cidadãos
australianos, argentinos, brasileiros, burundeses,
congoleses, ruandeses, nigerianos e somalianos;
4. Os inquéritos e as entrevistas realizadas serviram
para desmistificar a imigração portuguesa que
tem sido vista apenas como resultado da
cooperação bilateral, mas que no fundo é
também consequência da necessidade de
melhoria das suas condições de vida que Portugal
já não as pode garantir;
5. Existe uma nova geografia de imigração na
Cidade de Maputo resultante da vinda de muitos
africanos, portugueses, asiáticos que vêm
Moçambique, em particular a Cidade de Maputo
como um espaço hospitaleiro para novas
155
oportunidades da vida social, económica e
políticas;
6. Na Cidade de Maputo existe uma nítida Divisão
Geográfica do Trabalho, onde os portugueses, os
indianos e os chineses se encontram envolvidos
em grandes negócios, como é o caso do controlo
de grandes armazéns (indianos e chineses),
aluguer de estabelecimentos comerciais para os
africanos (indianos), hotelaria e restauração
(portugueses) e construção de infraestruturas de
transporte, habitacionais, escolares e hotéis
(portugueses e chineses), enquanto que os
africanos se encontram envolvidos em pequenos
negócios, como é o caso da venda de peças de
viaturas (nigerianos), pequenas mercearias
(burundeses, ruandeses e nigerianos),
cabeleireiros (congoleses, burundeses e
ruandeses), venda de bebidas (ruandeses)
confecção de roupa e venda de roupa importada
da China (senegaleses). No geral, os
moçambicanos são meros consumidores
envolvidos em actividade comerciail de fraca
expressão em volume e vendas, venda de roupa
de segunda-mão, de gestão político-
administrativa na função;
7. Os imigrantes de forma geral se sentem
integrados, porque se comunicam em língua
portuguesa, têm trabalho (negócio) e são bem
aceites por moçambicanos. Muitos deles pensam
em voltar para o país de origem logo que forem
satisfeitas as motivações que os levaram a migrar.
156
Referências
AKESSON, L. Postcolonial portuguese migration to
Angola: migrants or masters? London: Palgrave Macmillan,
2018.
________. 2020, European migration to Africa and the
coloniality of knowledge: the Portuguese in Maputo. Third
World Quarterly, v. 41, n. 7, 2020, p. 1-17.
ALLEN, N. Indo-Mozambicans in Maputo: oral
narratives on identity and migration from 1947-1992. PhD
thesis (African Centre for Migration and Society),
Johannesburg: University of Witwatersrand, 2019.
CABAÇO, J. Moçambique: identidades, colonialismo e
libertação. Tese de Doutoramento (Faculdade de Filosofia ,
Letras e Ciências Humanas). São Paulo: Universidade de
São Paulo, 2007.
CASTLES, S.; MILLER, M. The age of migration:
international population movements in the modern world.
New York: Palgrave Macmillan, 2009.
CANDEAIS, P.; MALHEIROS, J.; MARQUES, J.;
LIBERATO, E. A nova emigração para Angola: integração
diferenciada e forte ligação a Portugal. VALENTE, G.
(Org.). Regresso ao futuro: a nova emigração e a
sociedade portuguesa. Lisboa: Gradiva, 2016, p. 199-233.
CHEMANE, V. Pareceria Moçambique-China: cruzamento
de estratégias seeking em contexto de globalização
financeira (um olhar aos resultados do período 2001-2016).
Conjuntura Austral, v. 10, n. 49, 2019, p. 62-80.
157
CHICHAVA, S. Moçambique na Rota da China:
desafios para Moçambique. Maputo: Instituto de Estudos
Sociais e Económicos, 2010.
CONSELHO MUNICIPAL DE MAPUTO. Pelouro de
Saúde e Acção Social. Plano Director 2015-2019. Maputo:
Conselho Municipal de Maputo, 2019.
DIOGO, Z. Moçambique e o comércio internacional
das oleaginosas (1855 C. – 1890 C.). Dissertação de
Mestrado (Departamento de História). Lisboa:
Universidade de Lisboa, 2011.
FERREIRA, B.; SANTANA, E.; MALHEIROS, J.;
RAIMUNDO, I. A atual emigração portuguesa para
Moçambique: identidades complexas no quadro de um
movimento Norte-Sul em contexto pós-colonial.
VALENTE, G. (Ed.). Regresso ao futuro: a nova
emigração e a sociedade portuguesa. Lisboa: Gradiva, 2016,
p. 236-271.
INE - INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA. II
Recenseamento Geral da População e Habitação:
Maputo cidade - Resultados definitivos. Maputo: INE,
1999.
________. III Recenseamento Geral da População e
Habitação: Maputo cidade-Resultados definitivos. Maputo:
INE, 2009.
________. IV Recenseamento Geral da População e
Habitação: Maputo cidade- Resultados definitivos.
Maputo: INE, 2019.
JAFAR, S. Presença chinesa em Moçambique, 2000-2015:
hetero-identidades, ‘neocolonialimso’ e ‘apartheid’ sócio-
laboral. OLIVIERI, C.; SANTOS, A. (Ed.).
158
Decolonizando identidades: pertenecia y rechazo
de/desde el Sur Global. Chiara Olivieri e Antonio Ortega
Santos (Editores). Granada: Instituto de Migraciones de la
Universidad de Granada, 2017, p. 301-314.
KONIJIN, P. Chinese Resources for Infrastructures
(R41) Swaps: An Escape from the Resource Curse?
Occasional Paper 201. Johannesbourg: South African
Institute of International Affairs, 2014.
LEITE, J.; KHOURI, N. História Social e Económica
dos Ismailis de Moçambique - Século XX. Coleção
Documentos de Trabalho n. 92. Lisboa: Instituto Superior
de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa,
2011.
NGUNGA, A.; SIMBINE, M. Gramática Descritiva da
Língua Changana. Colecção: As Nossas Línguas V.
Maputo: Centro de Estudos Africanos da Universidade
Eduardo Mondlane, 2012.
MATUSSE, R. África Austral: das migrações Bantu à
integração regional. Maputo: Imprensa Universitária, 2009.
MEDEIROS, E. Formação e desagregação das
comunidades de origem chinesa nas cidades moçambicana
da Beira e Lourenço Marques. In: ACTAS... Seminário
Moçambique, Navegação, Comércio e Técnicas.
Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos
Descobrimentos Portugueses, 1998, p. 297-314.
NOLA, R. Knowledge, discourse, power and genealogy in
Foucault. Critical Review & International Social and
Political Philosophy, v.1, n. 2, 2007, p. 1009-1154.
OUCHO, J. African brain drain and gain, diaspora and
remittances: More rhetoric than action. ADEPOJU, A.;
159
NAERSSEN, T.; ZOOMERS, A. (Ed.). International
migration and national development in sub-Saharan
Africa. Boston: Brill, 2008, p. 49-69.
PATEL, H. Oportunidade e desafios para Moçambique na
expansão indiana em África. Revista Brasileira de
Estudos Africanos, v. 2, n. 4, 2017, p. 64-95.
PEIXOTO, J. As teorias explicativas das migrações:
teorias micro e macro-sociológicas. Lisboa: Centro de
Investigação em Sociologia Económica e das Organizações
da Universidade Técnica de Lisboa. Lisboa, 2004.
PEIXOTO, J.; OLIVEIRA, I.; AZEVEDO, J.;
MARQUES, J.; GÓIS, P.; MALHEIROS, J. A nova
emigração para Angola: integração diferenciada e forte
ligação a Portugal. VALENTE, G. (Ed.). Regresso ao
futuro: a nova emigração e a sociedade portuguesa. Lisboa:
Gradiva, 2016, p. 199-233.
PILILÃO, F. Moçambique: evolução da toponímia e da
divisão territorial 1974-1987. Maputo: s/d, 1989.
RAIMUNDO, I. Are not Mozambicans good enough
for Portuguese employers? What is missing in knowledge
exchange? Artigo no prelo. Projecto Portuguese migrants in
Mozambique: Postcolonialism, emotions and exchange of
knowledge, 2020.
RAIMUNDO, I.; RAIMUNDO, J. A migração
moçambicanna na África Austral: povoamento e formação
de famílias transnacionais. In ARROYO, M.; CRUZ, R.
(Org.). Território e circulação: a dinâmica contraditória
da globalização. São Paulo: Annablume, 2015, p. 239-270.
ROCHA-TRINDADE, B. Das migrações às
interculturalidades. Lisboa: Afrontamento, 2015.
160
SEDA, F. Gestão de fronteiras em Moçambique: uma
análise do impacto dos padrões internacionais de segurança
para as regiões fronteiriças. Maputo: Escolar Editora, 2017.
SANTOS, B. The end of the cognitive empire: the
coming of age of epistemologies of the South. London:
Croydon, 2018.
ZAMPARONI, V. Monhés, baeanes, chinas e afro-
mahometanos. Colonialismo e racismo em Lourenço
Marques, Moçambique, 1890-1940. Paris: Karthala, 2000.
161
162
CAPÍTULO 5
Introducción
Cuando la OMS declaró a la Covid-19 una pandemia,
enseguida nos atrapó el fantasma del miedo y la
incertidumbre; noticias, investigaciones y diferentes
versiones sobre esta pandemia nos inundan, abarcando no
solo el espacio público, sino también el privado (familia,
amig@s, vecinos, entre otros).
La pandemia de la Covid-19 no llegó de la misma
manera a todos los grupos sociales: se presentaron grupos
más vulnerables que otros en este escenario de pandemia,
pues la afección a los sujetos sociales con mayor grado de
vulnerabilidad “está íntimamente correlacionada con la
posición socioeconómica […suponiendo que ésta se
interrelaciona además con las vulnerabilidades ligadas a la
edad, sexo, condición etnocultural, etc…] y, por lo general,
los pobres sufren más con los desastres que los ricos”
(BLAIKIE, 1996, p. 30).
Pobres, que se ubican en los paisajes de pobreza e
inequidad y que, de acuerdo a Bauman (2011), son los que
“han sido ya desechos de la sociedad” y tratados como tales;
por lo tanto, son todos aquellos que han recibido los daños
colaterales del denominado desarrollo, estado enmascarado
por la ideología del progreso, que en realidad no es sino “el
163
desarrollo científico-tecnológico, el crecimiento económico,
la modernización capitalista, la expansión mercantil, la
obsesión productivista, etc.[…]” (BENJAMÍN, 1973, p. 6,
citado por SIERRA, 2011, p. 2), objetivos vigentes en el
modelo de acumulación del capital.
Los muertos, especialmente la población vulnerable
socioeconómicamente y políticamente, que se afectaron por
la Covid-19, son solo números que alimentan las estadísticas
o mapas estatales y mundiales que producen “visiones
normalizadas siempre ligadas a las representaciones
dominantes […] que oscurecen las ambigüedades existentes”
(OSLENDER, 2011, p. 145).
El objetivo de este artículo consiste en analizar las
estructuras de poder desde una perspectiva multi escalar
geográfica y temática, que permita reflexionar sobre la
pandemia no como un hecho aislado y desconectado, sino
como expresión de la capitalización de los espacios en el
marco de nuestras relaciones metabólicas con la naturaleza,
en este proceso de acumulación de capital sin límite;
naturaleza que ha sido cosificada, cuantificada e
invisibilizada, desconociendo su valor, y su valor de uso en
el equilibrio de la vida.
En este escenario de diferencias geográficas de
segregación, exclusión, acumulación de riqueza, etc.,
materializadas en diferentes escalas geográficas que se
imbrican y contradicen, y que se decantan en enfermedades,
pandemias y cambios climáticos, entre otros, emerge la
necesidad de replantearnos otras formas de relacionarnos,
tanto como sujetos sociales, como con la naturaleza.
En consecuencia, surge la pregunta de que si, como
sociedad, ¿hemos comprendido la crónica de esta salud-
enfermedad-muerte anunciada? y también, si ¿existe la
164
posibilidad de construir territorios de vida, de libertad o
contra-espacios post Covid-19?
El caso de estudio es Ecuador desde la mirada de la
multi-escalaridad espacial, y el método de aproximación para
la reflexión es el materialismo histórico geográfico, que
permite leer al territorio desde la complejidad, dinamismo y
contradicción, y con el apoyo de la geo-historia como
herramienta teórico – metodológica, articular espacio,
tiempo y sociedad, considerando al espacio como una
construcción social.
169
el cantón Samborondón25 (espacialmente se ubica junto al
cantón Guayaquil) hubo una gran boda26 con decenas de
invitados (autoridades locales, entre otros). Además, el
aeropuerto José Joaquín de Olmedo seguía trabajando […].
Vuelos desde distintos países de Europa y Estados Unidos
siguieron aterrizando (en) Guayaquil” (CELI, 2020, p. 1).
En estas circunstancias, surge la pregunta: ¿qué
hicieron las autoridades locales (alcalde, prefecto, y gobierno
nacional?: lo primero ha sido encontrar al culpable (“caso
0”), segundo: omitir las irregularidades e irresponsabilidades
respecto a los eventos que fueron autorizados por
autoridades locales y, tercero: emitir resoluciones de
emergencia en forma compelida.
El gobierno nacional, el 16 de marzo de 2020, declaró
el Estado de Excepción en todo el territorio ecuatoriano.
Estado de excepción (ya se refiere a las denominaciones
estado de emergencia, estado de sitio, o ley marcial) tiende cada vez
a manifestarse como el paradigma dominante de gobierno en la
política contemporánea. Leyes, decretos y órdenes emitidos en
profusión creciente tienden a borrar de forma radical todo
estatus jurídico del individuo, con lo cual se produce un ser
innombrable e inclasificable (AGAMBEN, 2005, P. 2-4,
citado en BAUMAN, 2011, p. 171).
27 https://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-52116100
171
Gráfico 1. Datos históricos de mortalidad (2018 – 2019) y
durante la pandemia.
Fuente: Mena (2020), basado en datos del Registro Civil del Ecuador.
173
Mapa 1. Tasas de casos Covid-19 confirmados por cantón.
176
(LEFEBVRE, 1970, p. 98, citado en OSLENDER, 2010, p.
10).
Cuando se habla del riesgo de la pandemia de la
Covid-19 y su afectación como un fenómeno aleatorio en la
relación lineal causa – efecto, estamos realizando una
escisión a la realidad, que permite invisibilizar los procesos
malsanos (ejemplificados en el mapa 2) que determinan la
reproducción de capital y condicionan la vulnerabilidad de
los sujetos sociales, así también como la capacidad de
afrontamiento y respuesta por parte de las diversas escalas
espaciales de poder de los diferentes gobiernos (nacional –
local – nacional) que se sobreponen e intersecan en el
territorio ecuatoriano.
El Ecuador bio-geográficamente se divide en 4
regiones: sierra, costa, región amazónica e insular. En la
Amazonía ecuatoriana se asientan muchos pueblos indígenas
que tenían prácticas nómadas, de semi-nomadismo, o se
movían en territorios amplios, inclusive más allá de las
fronteras de los Estados (ZAMORA 2016, 65). Los espacios
de la región amazónica históricamente (ver mapa 2) han sido
“el locus que ha proporcionado materias primas para surtir
al mercado global, la actual pandemia está dejando secuelas,
con el riesgo en muchos casos del declive demográfico, e
inclusive la extinción de pueblos indígenas; todo ello en
medio de la inercia de los gobiernos y de los sistemas de salud
pública, que tiene matices de discriminación étnica”
(VALLEJO y ÁLVAREZ, 2020, p. 96).
Las provincias con mayor afectación al Covid-19 en
la Amazonía son aquellas que tienen imbricaciones con
actividades extractivas, principalmente minería y petróleo,
como son Pastaza, Orellana, Zamora Chinchipe, Morona
Santiago y Sucumbíos (Ver mapas 2 y 3), y que también se
muestran en el sistema de monitoreo de Covid-19 de pueblos
177
y nacionalidades indígenas, implementado por
34
organizaciones sociales
Mapa 3. Registro de Covid 19 en Nacionalidades y Pueblos de la
Amazonía
182
Los datos reportados de Covid-19 por el Ministerio
de Salud Pública y los niveles socioeconómicos (mapa 3), por
el nivel de detalle reportado, y muchos de los cuales han sido
cuestionados por diferentes medios (prensa escrita y digital,
organizaciones sociales), no permiten una representación del
espacio de la pandemia, articulado a la matriz de inequidad
(clase social, raza, género, grupo étnico), que se configura en
el espacio urbano de Guayaquil.
Una mirada de lo sucedido en Guayaquil constituye
la representación de la correlación entre los muertos 42 por
Covid-19 registrados o reportados (del 10 de marzo al 29 de
abril 2020) con la variable hacinamiento, como se visualiza a
continuación.
La incidencia de la Covid-19 en Guayaquil está
relacionada con sitios de aglomeraciones (mercados, centros
comerciales) y con condiciones de hacinamiento, así como
de escaso acceso a servicios de agua potable (zonas de barrios
densamente poblados), entre otros.
184
Mapa 5. Distribución socio-geográfica del Covid-19 según
caracterización socioeconómica: Parroquias urbanas de Quito.
185
Los espacios con mayor incidencia de casos Covid-
19, en el área urbana de Quito, corresponden a las zonas
articuladas con mercados, zonas de venta ambulante, y
parroquias urbanas que incluyen barrios periféricos,
especialmente los que colindan con la zona occidental que
bordea los límite del Guagua Pichincha (volcán en actividad).
El impacto de la Covid-19 en el caso de estudio
analizado (Ecuador), desde la escala global, nacional y local-
urbana (Quito y Guayaquil), permite visualizar la
multiescalaridad espacial jerárquica, articulada y dialéctica, de
los procesos que históricamente configuraron diferencias
espaciales inequitativas, que se expresan en paisajes de
pobreza y de acumulación de riqueza, permitiendo leer los
patrones espaciales que determinan socialmente las formas
diferenciadas de vivir, enfermar y morir en general, y a causa
del Covid-19, en particular.
Por lo tanto, podemos plantear que las megacrisis
mundiales, climática y de pandemias (Covid-10), entre otras,
y visibles en la historicidad en todas las escalas espaciales, son
el resultado de las contradicciones de sobreacumulación que
generaron metabolismos malsanos entre los seres humanos
y la naturaleza, y diferencias espaciales jerárquicas y
dialécticas, donde lo “social y espacial se nutren
mutuamente” (SOJA 2014, p. 133). En consecuencia, las
relaciones sociales de la diferencia “señalan el camino hacia
una política emancipadora, conectando experiencias
específicas de opresión y explotación con las visiones de
futuros alternativos y el sentido de cómo llegan hasta allí”
(SMITH, 2002, p. 140).
186
Contra-espacios post pandemia – Territorios de vida o
de libertad
El proyecto de clase, que hoy conocemos como
neoliberalismo (LEÓN, 2018), fortaleció el proceso de
valorización del valor, donde en su glotonería, se
expandieron los espacios del capital.
El absurdo de la vida moderna está en que “los seres
humanos solo pueden producir y consumir bienes, crear
riqueza y gozarla o disfrutarla, es decir, solo están en
capacidad de autoproducirse, en la medida en que el proceso
de producción y consumo de sus bienes sirve de soporte a
otro proceso diferente a que se le sobrepone y al que Marx
denomina “proceso de valorización de valor” o
“acumulación de capital (ECHEVERRÍA, 1988, p. 9-10).
187
de la vida social con la naturaleza” (BREILH, 2015, p. 973),
principios que determinan socialmente la vida en general y la
salud en particular.
Esta crisis de la supervivencia convoca a plantearnos
modos de pensar y actuar diferentes, que permitan esclarecer
el papel crítico y emancipador, para construir tanto
conceptualmente como realidad espacios de vida, de libertad;
es decir, contra-espacios a la diversidad de formas de
reproducción social malsana materializada en pandemias,
cambios climáticos, segregaciones socio-espaciales entre
otras, en todas las escalas geográficas y espaciales.
En diferentes espacios y tiempos se han suscitado
múltiples luchas de resistencia en contra del orden neoliberal
global, luchas por el espacio para Lefebvre (1974; 1976), o
luchas por el espacio abstracto, que responden a una
búsqueda de contra-espacios (OSLENDER, 2011, p. 142).
Contra-espacios o espacios post Covid-19, que se
deberían plantear desde la búsqueda de espacios de vida
saludable articulados a los tres momentos interconectados
que identifica Lefebvre en la producción del espacio y que
son; prácticas espaciales, representación del espacio y el
espacio representacional (LEFEBVRE, 1974).
El primer momento, las prácticas espaciales deben
replantearse desde el cuestionamiento crítico a nuestras
formas de metabolismo con la naturaleza, que se expresan en
el uso y la forma de percibir al territorio; prácticas espaciales
que están “íntimamente ligadas a las experiencias de la vida
cotidiana y las memorias y residuos de formas de vida más
antiguas y diferentes. Llevan, por lo tanto, un potencial para
resistir la colonización de espacios concretos”
(OSLENDER, 2011, p. 145).
El segundo momento, en que la representación del
espacio debe superar la lógica euclideana, la causalidad
188
(linealidad, pensamiento fragmentado) o la yuxtaposición de
disciplinas (como simples capas de información), que han
devenido en la “creciente abstracción y descorporalización
del espacio que resulta en un ‘espacio abstracto’, y que es
precisamente “el espacio del capitalismo contemporáneo
donde la ley del mercado como lógica dominante del
capitalismo moderno ha llevado a una mayor
mercantilización de la vida social” y que “tiende a la
homogeneidad, a la eliminación de las diferencias […]”
(LEFEBVRE, 1991, citado en OSLENDER, 2011, p. 145-
146)
Por lo tanto, la representación del espacio debe
tratar de ser desde la lectura, comprensión y representación
de la realidad (espacio – tiempo), desde su complejidad,
integralidad, contradicción y totalidad; es decir, plantearlo
desde “un nuevo tipo de espacio, un ‘espacio diferencial’”
(OSLENDER, 2011, p. 145). Este espacio diferencial debe
recoger las luchas de resistencia de los grupos sociales
excluidos-segregados por clase social, género, y sumada a las
luchas ecologistas, de forma que todas estas luchas se
articulen y tejan una mirada de resistencia al pensamiento
monolítico y espacio- homogeneizador del capital.
El tercer momento, en que el espacio
representacional “no necesitan obedecer reglas de
consistencia o cohesión. Rebosantes de elementos
imaginarios y simbólicos, tienen su fuente en la historia de
cada individuo perteneciente a ese pueblo” (LEFEBVRE,
1991, p. 41).
Estos espacios “hallan su articulación en la vida
cotidiana donde encarnan simbolismos complejos. Estos
espacios no son homogéneos ni autónomos. Están
involucrados constantemente en una relación dialéctica
compleja con representaciones dominantes del espacio, que
189
intervienen, penetran e intentan colonizar el mundo vida del
espacio representacional. Éste es, por consiguiente, también
el espacio dominado que la imaginación busca cambiar y
apropiarse” (OSLENDER, 2011, p. 147). Es a la vez sujeto
de dominación y fuente de resistencia, mientras “se niega a
reconocer el poder [dominante]” (LEFEBVRE, 1991, citado
en OSLENDER, 2011, p. 147).
Estos procesos de los momentos que identifica
Lefebvre en la producción del espacio (prácticas espaciales,
representaciones del espacio y el espacio representacional)
no deben entenderse desde una perspectiva teleológica sino
desde la constante interconexión, complejidad y relación
dialéctica, principio del pensamiento crítico.
Estos contra-espacios post Covid-19, deberían
producirse desde estas nuevas lógicas de relacionamiento con
la naturaleza, representadas desde la complejidad y dialéctica
y dotadas de sentidos y significaciones que permitan
cuestionar y fracturar al poder dominante, considerando cada
uno de los momentos interconectados y dialécticos que
conlleven a la producción del espacio de vida, de libertad y
de emancipación.
Libertad, entendiéndose que “como un trascender no
es solamente una especie particular de causas, sino el origen
de toda causa. Libertad es libertad para causar” (M.
Heidegger, Von Wesen des Grundes (1929), Klosterman,
Frankfurt/M., 1995, p. 44, citado en ECHEVERRÍA, 1984,
sp). La libertad no es el problema de un individuo43 sino de
todos los individuos, en tanto que la emancipación no solo
es una lucha de intenciones sino de voluntades y decisiones
(LEÓN, 2018).
Referencias
BAUMAN, Z. Daños colaterales: desigualdades sociales
en la era global. Ciudad de México: Fondo de Cultura
Económica, 2011.
BLAIKIE, P. Vulnerabilidad: el entorno social, político y
económico de los desastres. Lima: Soluciones Prácticas,
1996.
193
BREILH, J. SARS-CoV2: rompiendo el cerco de la ciencia
del poder. Escenario de asedio de la vida, los pueblos y la
ciencia. PRODUCCIÓN COLECTIVA. Posnormales.
Buenos Aires: Editorial ASPO, 2020, p. 31-90.
________. Espacios de capital, territorios de libertad.
Conferencia del Primer Congreso de Geografía. Quito:
Pontificia Universidad Católica del Ecuador, 2018.
________. Epidemiología Crítica: Ciencia Emancipadora
e interculturalidad. Buenos Aires: Lugar Editorial, 2003.
CAMPAÑA, A. Comentario presentado en el
“Conversatorio sobre Crisis Civilizatoria y el Buen vivir
o Vivir Bien” (on line), convocado por la Coordinación
General de ALAMES y su Capítulo de República
Dominicana, miércoles 27 de mayo 2020.
CELI, E. Así se propagó el coronavirus en la província de
Guayas. In: Primicias, Sociedad, Quito, 10 abril 2020.
Disponible en <www.primicias.ec>. Aceso en: 18 ago.
2020.
ECHEVERRÍA, B. La forma natural de la reproducción
social. Cuadernos Políticos, n. 41, 1984, p. 33-46.
FALCONÍ, F.; MONTALVO, J. Economía ecuatoriana.
Quito: Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales, 2004.
HARVEY, D. Sobre reajustes espacio-temporales y
acumulación mediante desposesión. Herramienta, n. 29,
2005, p. 7-21.
KLEIN, N. Decir no no basta: Contra las nuevas políticas
del shock por el mundo que queremos. Bogotá: Editora
Géminis, 2018.
194
LEFÈBVRE, H. La producción del espacio. Papers -
Revista de Sociología, n. 3, 1974, p. 219-229.
LEÓN HERNANDÉZ, E. Espacios de capital,
territorios de libertad. Conferencia del Primer Congreso
de Geografía. Quito: Pontificia Universidad Católica del
Ecuador, 2018.
LE QUANG, M. Interpretaciones y tensiones alrededor del
Buen Vivir en Ecuador. Papeles de relaciones
ecosociales y cambio global, v. 137, 2017, p. 145-158.
MANN, M. The Sources of social Power. A History of
Power from the Beginning to AD, 1760-1986. Cambridge:
Cambridge University Press, 1986.
MENA MENA, P. Coronavirus al día: cifras y mapas del
Ecuador. In: El Universo, Coronavirus, Guayaquil, 2
agosto 2020. Disponible en <www.eluniverso.com>. Aceso
en: 3 ago 2020.
MONCADA, Blanca. Testimonios del COVID-19: “Las
desapariciones de cuerpos son crímenes de Estado”. In:
Expreso, Actualidad, Guayaquil, 19 abril 2020. Disponible
en <www.expreso.ec>. Aceso en: 8 ago. 2020.
MOSCOSO ROSERO, M. Guayaquil, “colonial” vírus. In:
El Rumor de las Multitudes, Coronavirus, Madrid, 4 abril
2020. Disponible en <www.elsaltodiario.com>. Aceso en:
13 jun. 2020.
OSLENDER, U. La búsqueda de un contra-espacio: ¿hacia
Territorialidades alternativas o cooptación por el poder
dominante? Geopolítica: Revista de Estudios sobre
Espacio y Poder, v. 1, n. 1, 2010, p. 95-112.
195
________. La búsqueda por un contra-espacio: ¿Hacia
territorialidades alternativas o co-optación por el poder
dominante? GUERRA DE HOYOS, C.; PÉREZ
HUMANES, M.; TAPIA MARTÍN, C. (Ed.). El Territorio
como “Demo”: demo(a)grafias, demo(a)cracias y
epidemias. Sevilla: Universidad Internacional de Andalucía,
2011, p. 142-163.
PENCHAZADEH, V. La bioética en América Latina.
Conferencia del VI Congreso de la Red bioética San José:
UNESCO, 2017.
RAMÍREZ GALLEGO, Franklin. Ecuador y las colisiones
de clases. In: Nueva Sociedad, n. 284, Conyuntura,
Buenos Aires, noviembre 2019. Disponible en
<www.nuso.org>. Aceso en: 7 abr. 2020.
SÁNCHEZ, P.; ZAMORA, G. Guayaquil: La ficción de
um éxito. El impacto de la pandemia Covid 19.
Plataforma por el Derecho a la Salud/DONUM/FOS.
2020. Disponible em
<www.saludyderechos.fundaciondonum.org>.
SENPLADES (Secretaria Técnica para la Erradicación de la
Pobreza) Secretaria Técnica del Agua – Banco del Estado.
Agua potable y alcantarillado para erradicar la pobreza
en Ecuador. Fuente de información: datos de Encuesta
Nacional de Empleo, Desempleo y Subempleo Urbano y
Rural 2013 del INEC. Quito: SENPLADES, 2014.
SIERRA, Natalia. El progreso una noción terminada.
Inédito. Quito: s/d. Disponible en:
<www.repositorionew.uasb.edu.ec>. Aceso en: 18 ago.
2018.
196
SMITH, N. Geografía, diferencia y las políticas de escala.
Terra Livre, n. 19, 2002, p. 127-146.
SOJA, E. En busca de la justicia espacial. Valencia:
Tirant Humanidades, 2014
SOTELSEK, D.; MARGALEF, L. Reflexiones sobre la
trilogía: pobreza-crecimiento y desigualdad en América
Latina ¿Qué se necesita para la cohesión social? GRANDA
AGUILAR, J. (Ed.). Pobreza, exclusión y desigualdade.
Quito: Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales, 2008,
p. 161-188.
VALLEJO, I.; ÁLVAREZ, K. La pandemia del
Coronavirus en la Amazonía ecuatoriana: vulnerabilidades y
olvido del Estado. Cuadernos de Campo, v. 29, n. 1,
2020, p. 94-110.
ZAMORA ACOSTA, G. La gestión del territorio en un
estado plurinacional: retos de la implementación de las
circunscripciones territoriales indígenas, como regímenes
especiales en el Ecuador. Tesis de Maestría en Estudios
Socioambientales (Departamento de Desarrollo, Ambiente
y Territorio). Quito: Facultad Latinoamericana de Ciencias
Sociales, 2016.
________. La ciencia crítica: geografía, inequidades,
resistencia y representaciones” en Debates de la geografía
latinoamericana: visiones desde el XVII Encuentro de
Geógrafos de América Latina. Quito: ASGE, IPGH, 2019.
ZIBELL, M. Coronavirus en Ecuador: el drama de
Guayaquil, que tiene más muertos por Covid-19 que países
enterros y lucha a contrarreloj para darles un entierro digno.
In: BBC News, Mundo, London, 1 abril 2020. Disponible
en <www.bbc.com>. Aceso en: 2 abr. 2020.
197
198
CAPÍTULO 6
Introdução
A disseminação da Covid-19 desencadeou uma
pandemia que, pela primeira vez na história, assumiu, de fato,
um alcance planetário e multifacetado. Contudo, essa
assertiva não diz respeito apenas aos seus efeitos
epidemiológicos, uma vez que, se em determinados lugares,
houve poucos casos de sujeitos contaminados, o mesmo não
se pode afirmar quanto as consequências de (mais uma) crise
do modo de produção capitalista e, tampouco, no que diz
respeito às transformações no âmbito das relações sociais.
Não seria exagero dizer, por exemplo, que, em alguns
lugares, os efeitos não epidemiológicos sejam mais severos e
prolongados que aqueles ligados diretamente ao contágio.
Nesse contexto, graças à impossibilidade de cumprir-
se a premissa do deslocamento, a prática turística47 foi uma
202
e qualquer espaço que apresente uma “vocação” para atrair
visitantes.
Ao longo do tempo, essa dependência do turismo
acabou por subordinar as economias, ressignificar modos de
vida, transformar natureza (supostamente) intocada em
negócio e acentuar o mal-estar causado nos residentes frente
às assimétricas relações de poder que emergem das práticas
turísticas, fenômeno para o qual Milano (2017) cunhou o
termo pressão turística (overtourism), contrapondo o vocábulo
turismofobia, utilizado pela imprensa de forma pouco
criteriosa e até sensacionalista.
Por conseguinte, a contraditória realização do
turismo segundo as configurações nas quais o capitalismo o
moldou é “uma faca de dois gumes”: se, por um lado, é
inegável que a prática turística gera postos de trabalho (em
sua maioria precarizados) e amplia os ingressos econômicos
nos espaços receptores, por outro lado, produz uma
valoração desigual desses espaços, o que, por sua vez,
promove formas de (des)territorialização que impõem uma
alienação do território (SANTOS, 1996) e acentuam as
desigualdades, ao tempo em que, dialeticamente, evidenciam
singularidades culturais e/ou ambientais, enquanto as
ameaçam por meio da sua transformação em produtos para
consumo massivo.
Não obstante, a pandemia da Covid-19 representou
um golpe implacável na trajetória de expansão do turismo,
colocando a descoberto as fragilidades do setor frente a mais
grave instabilidade planetária do atual milênio. Aliás, como
não poderia deixar de ser, considerando que, em seu formato
hodierno, a atividade turística seja uma das muitas formas de
gerar acumulação de riqueza, tal processo apenas exemplifica
quão susceptível às crises é o próprio modo de produção
capitalista.
203
Segundo reportado pela versão brasileira do jornal El
País (2020), utilizando dados fornecidos pela OMT, em
escala planetária, a retração no setor turístico chegou a cerca
de 97%, enquanto as perdas de faturamento estão estimadas
em mais de 1 trilhão de reais, considerando apenas os meses
de janeiro a abril de 2020. No Brasil, conforme apurado pela
Agência O Globo (2020), a contração do setor atingiu 84%,
o que representa uma queda de 12 bilhões de reais em
faturamento e, como consequência mais perversa de tal
fenômeno, a eliminação de cerca de 295 mil postos de
trabalho.
Alguns fatos – nada pontuais – podem ilustrar, para
além dos números, a dimensão dos impactos da Covid-19 no
turismo. Para tanto, vale a pena rememorar algumas notícias
jornalísticas recentes sobre empresas prestadoras de serviços
aeroviário, hoteleiro e de entretenimento, como, por
exemplo, os pedidos de recuperação judicial e falência de
Latam e Avianca Brasil (OLIVEIRA, 2020;
KAFRUNI,2020), fechamento temporário do icônico
Copacabana Palace (SARAIVA, 2020), cancelamento de
rentáveis eventos anuais, como os festejos de São João, no
Nordeste brasileiro, e a Fórmula 1, em São Paulo (ALOISIO,
2020; RACY, 2020), todos demonstrando exemplarmente as
fragilidades de tais setores frente a queda frenética das
viagens ao longo de 2020.
Evidente que, nos casos das empresas que
encerraram suas atividades, os problemas não foram criados
pela pandemia da Covid-19, afinal, esses empreendimentos
já apresentavam sinais de falta de liquidez bem antes dos
primeiros casos da doença serem reportados em Wuhan.
Contudo, não se pode negar que a pandemia acabou por
acelerar, de forma fatídica, o desfecho da decadência dessas
outrora importantes corporações.
204
A dependência do turismo e a falta de capacidade
financeira para o enfrentamento da crise levaram Estados e
agentes econômicos, em aliança, a provocarem um retorno
precipitado da “normalidade”, engendrando, entre outras
providências de reedificação do capitalismo, a reabertura de
espaços destinados à prática turística e a reativação das
atividades que lhe dão suporte, ainda que sem garantias
elementares de que tais decisões estivessem isentas de uma
segunda onda de contaminações, conforme se viu, por
exemplo, nas tentativas de “salvar” o verão europeu
(ALTARES, 2020; ZAMPRONHO, 2020).
No Brasil, até a finalização deste texto, estavam em
plena operacionalização de protocolos de reabertura alguns
dos principais atrativos turísticos do país, como, por
exemplo, o bondinho do Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro,
o Mercado Modelo e Igreja do Bonfim, em Salvador (O
GLOBO, 2020b; BRANDÃO, 2020; CORDEIRO, 2020).
Tal situação é ainda mais complexa e preocupante que o caso
europeu, uma vez que, dadas as posições negacionistas do
governo federal, o Brasil adotou políticas errantes quanto ao
combate à pandemia, o que acabou por implicar o país como
um dos epicentros da Covid-19, sendo o segundo a registrar
mais casos no mundo.
Há que se considerar que essa atuação oscilante de
flexibilizar restrições pode intensificar ainda mais a
insegurança que ora domina a sociedade, em seu sentido mais
amplo, e os turistas, tratando mais especificamente do objeto
deste escrito. Tal procedimento pode, enfim, resultar em um
alargamento sem precedentes da crise que atualmente assola
o setor turístico.
205
Conjecturas sobre o turismo e o turista no pós-
pandemia
A pandemia da Covid-19 evidenciou algumas fissuras
no modo de produção capitalista que, durante séculos, seus
agentes tentaram ocultar em uma malfeita Caixa de Pandora
(DAVIS, 2020). Conforme afirma Boaventura de Sousa
Santos (2020), a pandemia não pode ser vista como uma crise
isolada a atacar a suposta normalidade até então vigente, mas
um elemento novo na duradoura crise que o neoliberalismo
impõe a bilhões de pessoas há cerca de quarenta anos.
A recente – e ainda vigente – exacerbação vertiginosa
da crise do capitalismo neoliberal evidenciou, por exemplo,
conforme já abordado alhures, a incapacidade de
corporações até então consideradas inabaláveis em
responder satisfatoriamente à perturbação causada pela
pandemia, mas também que o modelo de sociedade forjado
sob os desígnios da modernidade capitalista serve apenas
para mascarar a grande falácia do discurso do progresso pela
acumulação.
No entanto, do colapso pode emergir o novo,
conforme advoga Rivera (2018), para quem a crise é uma
oportunidade, mas não no sentido organizacional do termo.
O que a socióloga boliviana põe em relevo é a possibilidade
de se ter, nesse quadro de adversidade extrema e por meio
dele, um ponto de inflexão – um evento (SANTOS, 1996)
ou período denso (VASCONCELOS, 1999) – que permita
romper com a “normalidade” vigente e antecipar o
surgimento de um outro mundo.
Em se tratando da prática turística, especialistas em
agenciamentos de viagens vislumbram prognósticos segundo
os quais, a curto e médio prazos, haverá um revigoramento
do turismo interno, em detrimento das visitas ao exterior.
206
Segundo apuração feita por Rebeca Oliveira (2020), em
pesquisa realizada por um buscador virtual de voos, 26% dos
brasileiros pretendem viajar após o término da quarentena,
mas 66% desses mesmos entrevistados creem que não seja
pertinente sair do país.
Há que se considerar também que os destinos pouco
atingidos pelo coronavírus e distantes dos grandes centros
urbanos devam ser valorizados. Ainda segundo Rebeca
Oliveira (Idem, p. 1), “quem se beneficiará são destinos
situados em regiões menos atingidas, se analisados o número
de casos e de vítimas; e aqueles que dispensam
deslocamentos aéreos”. De fato, no auge da pandemia, o
deslocamento de pessoas que podiam realizar trabalho à
distância de cidades maiores para localidades interioranas foi
uma das estratégias empregadas para apartar-se dos perigos
das aglomerações (BENITES, 2020).
Outro aspecto a ser destacado é que, ainda que
forçados pelas exigências impostas por protocolos
governamentais restritivos, as empresas prestadoras de
serviços turísticos têm se adaptado à realização de suas
atividades para grupos diminutos, com efeitos na menor
circulação de pessoas e, por extensão, em uma redução da
pressão pela presença de visitantes em espaços anteriormente
saturados pela turistificação.
As ações anteriormente relatadas não são a
proclamação de uma nova era do turismo, tendo em vista que
todas essas medidas sejam transitórias e sua manutenção
dependa tão somente da volta à “normalidade”, não
havendo, portanto, qualquer vislumbre quanto a uma
mudança duradoura na forma como a prática será conduzida
no longo prazo, afinal, conforme assevera Traoré (2020, p.
1), “A batalha pelo humanismo do século XXI será brutal
207
porque os ganhadores do mundo anterior não querem
renunciar aos seus privilégios”.
De fato, os agentes hegemônicos do turismo colhem
privilégios dos quais não haverão de abnegar facilmente. São
fomentos governamentais, acesso praticamente irrestrito aos
tomadores públicos de decisão, primazia na apropriação e
dominação de territórios, direito de abster-se ao diálogo com
as comunidades afetadas por suas atividades, dentre outras
tantas benesses que lhes foram conferidas ao longo do tempo
e das quais, por certo, não cogitam abrir mão.
Contudo, há, naquelas mudanças transitórias,
pequenas centelhas de esperança que permitem crer no
prenúncio de uma profunda e irreversível transformação na
prática turística. Segundo o dicionário Houaiss da Língua
Portuguesa, o termo “centelha” significa “partícula que salta
de um corpo em brasa; fagulha, faísca”, mas também, por
metáfora, pode indicar uma “intuição ou inspiração súbita”
(HOUAISS e VILLAR, 2009, p. 148). Tais acepções
convergem com a ideia que se quer, aqui, empregar, uma vez
que a palavra “centelha”, conforme anteriormente aplicada,
aponta para pequenas iniciativas ou eventos que, tal e qual
faíscas, podem provocar grandes e duradouros movimentos
rumo a transformações irreversíveis.
Assim, não se pode negar que essas ditas ações
apontam, ao menos durante o período de implementação de
medidas especiais, para um incremento do chamado turismo
de proximidade, induzindo formas não massificadas de
interação turista-lugar-comunidade. Contudo, é fundamental
salientar que a continuidade desse processo a longo prazo
não virá senão pela auto-organização solidária de
comunidades receptoras, mobilizando e articulando
conhecimentos e práticas locais para o desenvolvimento de
propostas de Turismo Comunitário.
208
Um futuro possível para o turismo no pós-pandemia
Muitos cenários de transformação do turismo no
contexto pós-pandemia podem ser imaginados. Por outro
lado, conforme já cogitado, pode não haver nenhuma
mudança significativa, a não ser a acentuação da voracidade
dos agentes hegemônicos em criar formas ainda mais
avassaladoras de produção e consumo dos espaços
destinados a essa prática, com vistas a uma rápida
recuperação dos ganhos econômicos interrompidos.
Contudo, o período hodierno talvez seja extremamente
propício para precipitar verdadeiras e duradouras
transformações qualitativas baseadas na auto-organização
comunitária, na economia social e na práxis territorial, este
último surgindo como amálgama dos anteriores.
Conforme adverte Santos (1996), a
contemporaneidade do capitalismo faz surgir como
tendência uma união vertical dos lugares, por meio de um
crescente processo de hierarquização e subordinação de uns
fragmentos de espaço por outros, reafirmando, assim, a
existência de espaços de comando e espaços de obediência.
Contudo, ainda segundo esse autor, “[...] os lugares também
se podem refortalecer horizontalmente, reconstruindo, a
partir das ações localmente constituídas, uma base de vida
que amplie a coesão da sociedade civil, a serviço do interesse
coletivo” (p. 194).
Em entrevista concedida a Boaventura de Sousa
Santos, Gladys Tzul Tzul (2015a) defende a adoção de
princípios comunitários – ou comunais, conforme o
contexto sobre o qual a socióloga guatemalteca se debruça
em suas análises – de organização como forma de garantir a
reprodução social em condições não-hegemônicas. Para
209
tanto, é fundamental preservar os meios de controle, gestão
e regulação coletivos daquilo que a autora denomina de
meios concretos para a reprodução da vida.
Cuando digo medios concretos para la reproducción de la vida, me
refiero al territorio y a todo lo que lo contiene, a saber: el agua, los
caminos, los bosques, los cementerios, las escuelas, los lugares sagrados,
los rituales, las fiestas; en suma la riqueza concreta y simbólica que las
comunidades producen y gobiernan mediante una serie de estrategias
pautadas desde un espacio concreto y un tiempo específico que se
estructuran desde cada unidad de reproducción (TZUL TZUL,
2015b, p. 129).
212
fundamentais na construção da identidade do e com o lugar,
bem como na construção participativa, debatida, reflexiva e
dialógica do desenvolvimento dos lugares e do desenvolvimento nos
lugares por meio da consciência do lugar (Idem, p. 66, grifos no
original).
Considerações finais
Não se pode negar que o turismo, como atividade
econômica, está em um momento de inflexão. A pandemia
213
afetou sensivelmente esse fazer social que não pode ser
realizado sem deslocamentos e cuja aglomeração é lugar-
comum, tendo sido, portanto, uma das primeiras práticas
interrompidas pelas medidas de isolamento e distanciamento
sociais decretadas por governos mundo afora e estando
fadada a ser uma das últimas a atingir níveis de recuperação
econômica.
Dado tal contexto de crise, talvez inigualável na
história, abre-se uma possibilidade única para uma reflexão-
ação que permita um redimensionamento do turismo com
potência suficiente para incidir não apenas sobre as
consequências do colapso hodierno, mas, de forma definitiva
e irreversível, na sua causa maior: a sujeição ao modo de
produção capitalista. Conforme reportado por Boaventura
de Sousa Santos,
A pandemia e a quarentena estão a revelar que são possíveis
alternativas, que as sociedades se adaptam a novos modos
de viver quando tal é necessário e sentido como
correspondendo ao bem comum. Esta situação torna-se
propícia a que se pense em alternativas ao modo de viver,
de produzir, de consumir e de conviver nestes primeiros
anos do século XXI (SANTOS, 2020, p. 29).
Referências
ALOISIO, D. ‘Dendicasa’: avanço do coronavírus adapta
festejos juninos no interior baiano. In: Correio da Bahia,
Seção Coronavírus, Salvador, 3 de junho de 2020.
Disponível em <correio24horas.com.br>. Acesso em: 3
jun. 2020.
ALTARES, G. Europa recua pelo temor de uma segunda
onda de contágio. In: El País Brasil, Seção Internacional,
São Paulo, 25 julho 2020. Disponível em
<www.brasil.elpais.com>. Acesso em: 25 jul. 2020.
ANSA, Agência. Itália libera fronteiras internas e reabre
para o turismo. In: Época Negócios, Seção Mundo, São
Paulo, 3 junho 2020. Disponível em
<www.epocanegocios.globo.com>. Acesso em: 5 jun. 2020.
BAKOGIANNIS, E.; VLASTOS, T.; ATHANASOPOULOS,
K.; CHRISTODOULOPOULOU, G.; KAROLEMEAS, C.;
KYRIAKIDIS, C.; NOUTSOU, M.; PAPAGERASIMOU-
KLIRONOMOU, T.; SITI, M.; STROUMPOU, I.; VASSI,
A.; TSIGDINOS, S.; TZIKA, E. Development of a Cycle-
Tourism strategy in Greece based on the preferences of
potencial cycle-tourist. Sustainability, v. 12, n. 6, 2020, p.
1-14.
215
BENITES, A. Busca por “ar livre e uma graminha”
provoca fuga rural durante a pandemia. In: El País Brasil,
Seção Coronavírus, São Paulo, 25 julho 2020. Disponível
em <www.elpaisbrasil.com.br>. Acesso em: 27 jul. 2020.
BRANDÃO, J. Mercado Modelo será reaberto na quinta-
feira, garante vice-prefeito. In: Metro1, Seção Cidade,
Salvador, 29 julho 2020. Disponível em
<www.metro1.com.br>. Acesso em: 29 jul. 2020.
CHRISTOFFOLI, P.; NOVAES, H. A economia solidária
e a autogestão no Brasil contemporâneo. Elementos à luz
das teorias de Marx e da Colonialidade do Poder.
MARAÑÓN-PIMENTEL, Boris (Coord). Solidaridad
económica y potencialidades de transformación en
América Latina. Una perspectiva descolonial. Buenos
Aires: Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2012,
p. 59-84.
CORAGGIO, J. Economía Social y Solidaria. El trabajo
antes que el capital. Quito: Abya Yala, 2011.
CORDEIRO, H. Igreja do Bomfim celebra primeira missa
com fiéis após liberação de reabertura. In: Correio da
Bahia, Seção Salvador, Salvador, 24 julho 2020. Disponível
em <www.correio24horas.com.br>. Acesso em: 25 jul.
2020.
DAVIS, M. A crise do coronavírus é um monstro
alimentado pelo capitalismo. In DAVIS, M.; HARVEY, D.;
BIHR, A.; ZIBECHI, R.; BADIOU, A.; ŽIŽEK, S.
Coronavírus e a luta de classes. Teresina: Terra Sem
Amos, 2020, p. 5-12.
HOUAISS, A.; VILLAR, M. Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.
216
KAFRUNI, S. Avianca pede para converter recuperação
judicial em falência. In: Correio Braziliense, Brasília, 6
julho 2020. Disponível em <correiobraziliense.com.br>.
Acesso em: 7 jul. 2020.
MALDIVES. Maldives Fifth tourism master plan. Male:
Ministry of Tourism, 2019.
MILANO, C. Overtourism y turismofobia: tendencias
globales y contextos locales. Barcelona: Ostelea School of
Tourism and Hospitality, 2017.
O GLOBO, Agência. Covid-19: turismo será setor mais
afetado e levará mais tempo para se recuperar. In: Época
Negócios, Seção de Economia, Rio de Janeiro, 12 abril
2020. Disponível em <www.epocanegocios.oglobo.com>.
Acesso em 1 jul 2020a.
________. Pontos turísticos serão reabertos em nova fase
da flexibilização no Rio. In: Valor Econômico, Seção
Brasil, 16 julho 2020. Disponível em
<www.valor.oglobo.com>. Acesso em: 24 jul. 2020b.
OLIVEIRA, R. Qual será o futuro do turismo após a
pandemia de coronavírus? In: Metrópoles, Caderno de
Turismo, 15 maio 2020. Disponível em
<www.metropoles.com>. Acesso em: 19 jun. 2020.
OLIVEIRA, R. Latam Brasil é incorporada ao pedido de
recuperação judicial do grupo nos EUA. In: El País Brasil,
Seção de Economia, São Paulo, 9 julho 2020. Disponível
em <www.brasil.elpais.com>. Acesso em: 9 jul. 2020.
PODHORODECKA, K. Island tourism during the
economic global crisis. Miscellanea Geographica, v. 22,
n. 3, 2018, p. 130-141.
217
RACY, S. Fórmula 1 é cancelada em quase todos os países
das Américas. In: O Estado de S. Paulo, Caderno de
Cultura, São Paulo, 21 julho 2020. Disponível em
<www.cultura.estadao.com.br>. Acesso em: 24 jul. 2020.
RIVERA CUSICANQUI, S. Utopía ch’ixi. [Entrevista
concedida a] Yael Weiss. Revista de la Universidad de
México [Programa de TV], Ciudad de México, 2 nov. 2018.
SANTOS, B. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra:
Almedina, 2020.
SANTOS, M. A natureza do espaço. Técnica e Tempo.
Razão e Emoção. São Paulo: Hucitec, 1996.
SAQUET, M. Por uma Geografia das territorialidades e
das temporalidades: uma concepção multidimensional
voltada para a cooperação e para o desenvolvimento
territorial. Rio de Janeiro: Consequência, 2015.
________. Saber popular, práxis territorial e contra-
hegemonia. Rio de Janeiro: Consequência, 2019.
SARAIVA, A. Com turismo em crise, Hotel Copacabana
Palace fecha as portas pela 1ª vez em 96 anos. In: Valor
Econômico, Seção Empresas, São Paulo, 9 abril 2020.
Disponível em <valor.globo.com>. Acesso em: 15
jun.2020.
TURISMO Internacional caiu 97% em abril no mundo
todo, segundo a OMT. In: El País Brasil, Seção Pandemia
de Coronavírus, São Paulo, 22 junho 2020. Disponível em
<www.brasil.elpais.com>. Acesso em: 18 jul. 2020.
TRAORÉ, A. “Se quisermos um mundo melhor,
precisamos desconfinar o pensamento”. In: El País Brasil,
218
Seção Internacional, 24 julho 2020. Disponível em
<www.brasil.elpais.com>. Acesso em: 29 jul. 2020.
TZUL TZUL, G. Conversación del Mundo VII. [Entrevista
concedida a] Boaventura de Sousa Santos. Conversas do
Mundo [Programa de TV], Coimbra, 21 nov. 2015a.
________. Sistema de gobierno comunal indígena: la
reproducción de la vida. El Apantle, n. 1, 2015b, p. 125-
140.
________. La forma comunal de la resistencia. Revista de
la Universidad de México, Dossier Abya Yala, n. 847,
2019, p. 105-111.
UNWTO (WORLD TOURISM ORGANIZATION).
International tourism highlights. 2019 Edition. Madrid:
United Nations World Tourism Organization, 2019.
VASCONCELOS, P. Questões metodológicas na
Geografia Urbana Histórica. VASCONCELOS, P.; SILVA,
S. (Org.) Novos Estudos de Geografia Urbana
Brasileira. Salvador: Mestrado em Geografia da
Universidade Federal da Bahia, 1999, p. 191-201.
ZAMPRONHO, V. O retorno do turismo. In: Gazeta de
S. Paulo, Caderno de Turismo, 15 junho 2020. Disponível
em <www.gazetasp.com.br>. Acesso em: 18 jul. 2020.
219
220
CAPÍTULO 7
Elisa Magnani
Methodology
It does not seem an easy task to be discussing about
the Covid-19 pandemic, because, being such a fresh global
phenomenon and the grief it has brought all over the planet
so recent, a full objectivity in dealing with it may be hard to
obtain. Nonetheless many scholars have been publishing
about it under many different perspectives since the
beginning of 2020.
Being our aim to reflect upon the intercorrectedness
between climate change and diseases using the global spread
of Covid-19 as a laboratory from which deriving observation,
225
we have been focusing on those publications that could
contribute to give an answer to the following research
questions: which are the main root causes of the spread of
pandemics? Can they include the environmental changes
deriving from the human encroachment on nature and
climate change? Which are the main observable territorial
impacts deriving from a reduced immission of pollutants in
the athmosphere, consequence of the countermeasure taken
nearly globally to contain the diffusion of the pandemic?
And, finally, will our society be able to draw a lesson from
this pandemic? In particular, will we be able to put in place
adaptation measures that tackle not only the recovery from
this health (but also financial and economic) crisis but also
the recovery from the effect of climate change?
We have narrowed our research to some very recent
publicationst that either have been issued by geographers and
researchers of other critical disciplines, or that present
scientific data or analysis that are in line with the purpose of
connecting climate-related issues with diseases, namely
Covid-19. A wide set of scientific publications have thus
been revised, both presenting and analyzing scientific data
collected in many parts of the planet in respect to the victims
of the disease, the amount of pollutants in the air or the
athmospheric temperature, and connecting the virus to other
geographical, economic, political or social phenomena.
Moreover, a wide set of grey literature has
contributed to the analysis of the data: reports from the
IPCC, WHO, NASA, WWF and other global or regional
institutions have offered useful insights not only on datasets
but also in making connections between topics.
Finally, due tue the very recent nature of the
phenomenon here discussed, even more informal sources
have been used to gather both data and critical insights, such
226
as websites and blogs where several geographers or other
scholars have offered their critical readings of different
aspects of this situation.
Our aim is thus to discuss the intertwined knots
between all these factors, by focusing on the connection
between the pandemic and climate change, with a double
approach that analyses on one side the spread of diseases as
a consequence of the human-induced reduction of natural
spaces, on the other the environmental impacts of the
lockdown that many countries have decided to impose as a
reaction to the spread of Covid-19, such as the reduction of
the amount of greenhouse gases in the athmosphere since
mid February in many parts of the planet.
233
The unprecedented reduction in mobility and economic
activity caused by the COVID-19 lockdown represents an
exceptional opportunity for studying the contribution of
different sources of primary pollutant and for understanding
the changes in the atmospheric chemistry under conditions
of reduced primary pollutant emissions in the cities
(SICARD et al., 2020).
Conclusions
Aaron Bernstein (2020), Director of Harvard Chan
C-CHANGE, warns that climate actions are needed not only
to control climate change but also to prevent the
development of future pandemics. He also suggests that
implementing actions that tackle the root causes of climate
change is vital, and that preventing deforestation is a key
action, together with halting air pollution, that threatens the
respiratory health of the global population and weakens their
immune systems. However, putting pollution and
deforestation on a leash does not seem an easy goal to
achieve in our society, as rooted as they are into capitalism,
and with consumerism as a major driver of all economic
policies worldwide (HARVEY, 2020).
We may observe that, at the moment of writing, the
idea that Covi-19 will not be used to steer the climate
adaptation policies towards a greener future is prevailing
worldwide. Rather, it is threatening the very global
commitment toward climate actions, as it has imposed a halt
to climate negotiations that should have taken place in
the November conference in Glasgow, which has been
postponed due to the impossibility to meet in person.
Moreover, another major threat may derive from the
reduced interest of politicians to invest in climate
policies, to favour economic recovery plans in response
to the disruption brought about by Coronavirus, as the
239
Time has cleverly suggested early in March
(WORLAND, 2020).
Coming back to the research questions that had
moved our interest, let’s revise them briefly to draw some
concluding reflections. First of all, we may conclude that
among the root causes of the spread of pandemics
environmental changes deriving from the human
encroachment on nature and climate change may rightly be
included, as it has been widely discussed in scientific
publications and grey literature coming from some among
the key institutions dealing with climate change, health and
the environment. Following, we have discussed about the
observable territorial impacts of the (nearly) global
lockdown, that has implied a reduced immission of
pollutants in the atmosphere: scientific evidence has shown
that there has been a measurable reduction in the presence
of (at least) some greenhouse gases in several very
industrialized areas, such as the Po Valley in Italy, the Hubei
region in China, but also India, Brazil and other EU
countries. However, this reduction include only partially
CO2, which has a longer persistance in the atmoshere than
PMs and Nox, and a much longer lockdown would perhaps
be necessary in order for it to be appreciable.
This last aspect brings us right into the final question,
that was aimed at investigating the possible post-virus
scenarios. Many voices are claiming to start putting in place
adaptation measures that, while addressing the recovery from
this health (but also financial and economic) crisis, tackle at
the same time the effects of climate change. But the reality is
that this seems hardly feasible, as several authors have been
arguing: it is higly possible that the emissions reduction could
be short-lived once the quarantine is over all around the
planet and we start polluting as in a pre-Covid-19 scenario,
240
just like it happened in the aftermath of the 2008-2009
economic crisis.
Bibliographic references
BERNSTEIN, A. Coronavirus, Climate Change, and the
Environment. A Conversation on COVID-19 with Dr.
Aaron Bernstein. In: News From School of Public
Health, Coronavirus and Climate Change, Cambridge,
2020. Available in <www.hsph.harvard.edu>. Acess: 24 jul.
2020.
CHO, R. What Can We Learn From COVID-19 to Help
With Climate Change? In: News From Earth Institute of
Columbia University, Climate and Health, New York,
march26, 2020. Available in <www.blogs.ei.columbia.edu>.
Acess: 29 jul. 2020.
CRAWFORD, V. How COVID-19 might help us win the
fight against climate change. In: World Economic Forum
Agenda, Covid-19 and Climate Change, Geneva, march 31,
2020. Available in <www.weforum.org>. Acess: 24 jul.
2020.
DANTAS, G. The impact of COVID-19 partial lockdown
on the air quality of the city of Rio de Janeiro, Brazil.
Science of the Total Environment, v. 729, 2020, p. 1-11.
DE WAAL, A. New Pathogen, Old Politics. In: Boston
Review, Science & Nature, Boston, april 3, 2020. Available
in <www.bostonreview.net>. Acess: 25 jul. 2020.
ESA (The European Space Agency). Coronavirus lockdown
leading to drop in pollution across Europe. In: The
European SpaceAgency, Applications, Paris, march 27,
2020a. Available in <www.esa.int>. Acess: 24 jul. 2020.
241
________. Air pollution drops in India following
lockdown. In: The European SpaceAgency, Applications,
Paris, april 24, 2020b. Available in <www.esa.int>. Acess:
24 jul. 2020.
FIGUERES, C.; RIVETT-CARNAC, T. Our approach to
covid-19 can also help tackle climate change. In: New
Scientist, Health, London, april 1, 2020. Available in
<www.newscientistcom>. Acess: 24 jul. 2020.
HARVEY, D. Anti-Capitalist Politics in the Time of
COVID-19. In: Reading Marx’s Capital With David
Harvey, New York, march 19, 2020. Available in
<www.davidharvey.org>. Acess: 24 jul. 2020.
HEPBURN, C. et al. COVID-19 fiscal recovery packages
accelerate or retard progress on climate change? Smith
School Working Paper, v. 20, n. 2, 2020, p. 1-48.
IACOVONE, C.; VALZ GRIS, A. Il virus è un prodotto
del Capitalocene. In: Jacobin Italia, Roma, 25 marzo 2020.
Disponibili in <www.jacobinitalia.it>. Accesso in: 26 giu.
2020.
IPCC (Intergovernamental Panel on Climate Change).
Climate Change 2007: Synthesis Report. Contribution of
Working Groups I, II and III to the Fourth Assessment
Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change,
Geneva: IPCC, 2007.
________. Managing the risks of extreme events and
disasters to advance climate change adaptation. A
Special Report of Working Groups I and II of the
Intergovernmental Panel on Climate Change. Cambrigde:
Cambridge University Press, 2012.
242
________. Climate Change 2014: Mitigation of Climate
Change. Contribution of Working Group III to the Fifth
Assessment Report of the Intergovernmental Panel on
Climate Change. Cambrigde: Cambridge University Press,
2014a.
________. Climate Change 2014: Impacts, Adaptation,
and Vulnerability. Part A: Global and Sectoral Aspects.
Contribution of Working Group II to the Fifth Assessment
Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change
Cambrigde: Cambridge University Press, 2014b.
________. Summary for Policymakers. Global Warming
of 1.5°C. An IPCC Special Report on the impacts of global
warming of 1.5°C above pre-industrial levels and related
global greenhouse gas emission pathways, in the context of
strengthening the global response to the threat of climate
change, sustainable development, and efforts to eradicate
povert. Geneva: IPCC, 2018.
________. Summary for Policymakers. Climate Change
and Land: an IPCC special report on climate change,
desertification, land degradation, sustainable land
management, food security, and greenhouse gas fluxes in
terrestrial ecosystems. Geneva: IPCC, 2020.
ISTAT (Instituto Nazionale di Statistica). Annuario
Statistico Italiano 2018. Territorio. Roma: Instituto
Nazionale di Statistica, 2018. Available in <www.istat.it>.
Acess: 24 jul. 2020.
JORDAN, R. How does climate change affect disease? In:
Stanford Earth, Stanford, 15 March, 2019. Available in
<www.earth.stanford.edu>. Acess: 24 jul. 2020.
243
LE QUÉRÉ, C. et al. Temporary reduction in daily global
CO2 emissions during the COVID-19 forced confinement.
Nature Climate Change, v. 10, 2020, p. 647-653.
LIU HELMERSSON, J. et al. Climate Change and Aedes
Vectors: 21st Century Projections for Dengue Transmission
in Europe. EbioMedicine, n. 7, 2016, p. 267-277.
LOZITO, N. Coronavirus e cambiamento climatico. 50
domande per capire le connessioni tra Covid-19 e ambiente.
Roma: Il Colore Verde, 2020.
NASA (National Aeronautics and Space Administration).
Airbone nitrogen dioxide plummets over China. In: NASA
Earth Observatory, Washington, February 2020a.
Available in <www.earthobservatory.nasa.gov>. Acess: 24
jul. 2020.
________. COVID-19: NASA Science keeps the lights on.
In: NASA Global Climate Change, April 6, 2020b.
Available: <www.climate.nasa.gov>. Acess: 24 jul. 2020.
PELLING, M. Adaptation to Climate Change. From
resilience to transformation. London: Routledge, 2010.
ROBBINS, J. The Ecology of Disease. In: The New York
Times, Sunday Review, New York, july 14, 2012. Available
in <www.nytimes.com>. Acess: 24 jul. 2020.
ROHR, J. et all. Frontiers in climate change–disease
research. Trends in Ecology and Evolution, v. 26, n. 6,
2011, p. 270-277.
ROSENTHAL, J. Climate Change and the Geographic
Distribution of Infectious Diseases. EcoHealth, n. 6, 2009,
p. 489–495.
244
RUGANI, B.; CARO, D. Impact of COVID-19 outbreak
measures of lockdown on the Italian Carbon Footprint.
Science of the Total Environment, n. 737, 2020, p. 1-5.
SICARD, P. et al. Amplified ozone pollution in cities during
the COVID-19 lockdown, Science of the Total
Environment, v. 735, 2020, p. 1-7.
SHUMAN, E. Global Climate Change and infectious
diseases. New England Journal of Medicine, n. 362,
2010, p. 1061-1063.
SPRINGMANN, M. et al. Global and regional health eff
ects of future food production under climate change: a
modelling study. Lancet, n. 387, 2016, p. 1937-1946.
WHO (World Health Organization). Climate Change and
Human Health - Risks and Responses. Summary. Geneva:
World Health Organization 2003.
________. Health and climate change survey report:
tracking global progress. Geneva: World Health
Organization, 2019.
WORLAND, J. How coronavirus could set back the fight
against climate change. In: Time, World, New York, march
10, 2020. Available in <www.time.com>. Acess: 24 jul.
2020.
WWF (World Wide Fund for Nature). Quel legame
strettissimo tra pandemie e perdita di natura. In: Italia Che
Cambia, Ambiente, Roma, 17 marzo 2020a. Disponibili in
<www.italiachecambia.org>. Accesso in 24 giu. 2020.
________. Pandemie, l’effetto boomerang della
distruzione degli ecosistemi. Roma: WWF Italia, 2020b.
245
ZHU L. et al. Near-real-time data captured record decline in
global CO2 emissions due to COVID-19. In: General
Economics, Economics, New York, april 28, 2020.
Available in <www.arxiv.org>. Acess: 24 jul. 2020.
ZHONGWEI, H. et al. Optimal temperature zone for the
dispersal of COVID-19. Science of the Total
Environment, v. 736, 2020, p. 2-5.
Websites
https://www.euro.who.int/en/health-topics/health-
emergencies/novel-coronavirus-2019-ncov_old.
Last accessed 24/07/2020.
https://www.who.int/globalchange/climate/summary/en/
index5.html.
Last accessed 24/07/2020.
https://www.who.int/news-room/fact-
sheets/detail/climate-change-and-health. Last accessed
24/07/2020.
https://covid19.who.int/.
Last accessed 24/07/2020.
https://time.com/5795150/coronavirus-climate-change/.
Last accessed 24/07/2020.
246
CAPÍTULO 8
O SUL GLOBAL NAS RELAÇÕES
INTERNACIONAIS PÓS-PANDEMIA:
Fatos, desafios e perspectivas para um mundo em
desalento.
Introdução
A pandemia global de Covid-19 traz a possibilidade
de novas reflexões e novas práticas na seara internacional, de
modo que sejam repensados os modelos utilizados pelos
estados-nação do Sul Global na política externa nos tempos
de globalização pré-pandemia. A onda de ódio xenófobo
(materiais e virtuais) alimenta discursos e políticas
unilateralistas e isolacionistas, havendo uma tensão crescente
entre duas posições a serem tomadas pelos estados-nação na
condução de suas políticas externas: o unilateralismo e o
multilateralismo. Este texto objetiva expor a realidade das
relações internacionais atuais no Sul Global, notadamente no
tocante à África e América Latina; expondo fatos
relacionados à xenofobia e obstruções comerciais
internacionais (turismo, logística, trocas tecnológicas)
havidas no âmbito da pandemia de Covid-19. O texto é
resultado de estudos qualitativos de dados e documentos
disponíveis, com base explicativa; e, quanto aos
procedimentos, fez-se uso de revisão bibliográfica.
247
Alguns fatos enfrentados pelo Sul Global nas Relações
Internacionais num contexto pandêmico: xenofobia e
crise econômica.
A compreensão de analistas sobre as relações
internacionais (R.I.) foi afetada pela pandemia da Covid-19
de formas múltiplas e ambivalentes, conforme a realidade de
cada região geopolítica, tendo em vista que há novas
perspectivas de análise das tradicionais teorias de R.I. num
mundo ligado agora, não apenas pela economia e pelo
mercado financeiro, mas, sobretudo, pelas (in)consequências
de atos sanitários. Se em fins de dezembro de 2019 já eram
anunciados, na China, os primeiros casos da Covid-19, dias
após outras nações asiáticas informavam infecções nativas,
alertando as nações quanto à gravidade do problema e a
possibilidade de real de uma pandemia global, com fortes
interferências nas Relações Internacionais e, ainda mais
graves quanto ao Sul Global. Xenofobia e Relações
Comerciais Internacionais são os dois enfoques escolhidos
para analisarmos como a pandemia de Covid-19 afetou o Sul
Global e este poderá agir em cenários pós-pandemia.
250
também nas predisposições dos cidadãos de todos os tipos
de projetar ansiedades comuns sobre forasteiros. (...)
Enquanto forma de afirmação contra alienígenas, contudo,
a mobilização da autoctonia parece estar crescendo em
proporção direta à hifenização cindida da organização
política soberana, à sua porosidade e impotência,
popularmente percebidas, diante das forças exógenas
(COMAROFF e COMAROFF, 2001, p. 71).
251
têm-se alastrado e ocorreram ataques antimuçulmanos
relacionados à Covid19. Migrantes e refugiados foram
acusados de ser a fonte do vírus, tendo-lhes sido depois
negado o acesso a tratamento médico. Com os idosos entre
os mais vulneráveis surgiram memes desprezíveis, sugerindo
que eles também são os mais descartáveis. Jornalistas,
denunciantes, profissionais de saúde, trabalhadores
humanitários e defensores de direitos humanos estão a ser
alvos simplesmente porque fazem o seu trabalho. Devemos
agir agora para fortalecer a imunidade das nossas sociedades
contra o vírus do ódio. E por isso que hoje apelo a um
esforço conjunto para acabar com o discurso de ódio
globalmente (2020).
253
xenofobia no estado pós-colonial e, quase que antevendo os
eventos contemporâneos,
Assim é que estrangeiros – e em particular estrangeiros
negros – tornam-se objeto de consternação e de contestação
em toda esta nova nação, por parte, desde políticos e seus
partidos, passando pela mídia e sindicatos de trabalhadores,
até camelôs e desempregados. [...] A comunidade local tem
atacado regularmente imigrantes e suas propriedades, os
quais são forçados a viverem em ‘guetos’, tornados
criminosos e bodes expiatórios (COMAROFF e
COMAROFF, 2001, p. 93).
254
O Sul Global e a crise econômica internacional
Se a economia do Sul Global tem sofrido graves
consequências, há que se considerar os novos arranjos
geopolíticos e geoeconômicos como sendo intrínsecos à
complexidade dos interesses e cooperações que se dão no
contexto pandêmico atual. Dentre muitos destes novos
rearranjos talvez o mais importante seja o fato da China ser
o centro mundial da produção de fármacos, suprimentos
laboratoriais e de produtos tecnológicos em
telecomunicações e eletrônica. É relevante notar os imensos
esforços empreendidos pelas autoridades chinesas na
tentativa de impedimento de propagação da infecção, ao
limitar ao mínimo possível os direitos civis de locomoção e
a liberdade econômica interna. Se por um lado tais
mitigações severas resultam na menor transmissão possível
do vírus entre a imensa população chinesa, por outro lado,
resultou um imenso impacto na economia global, tendo em
vista a potência de fato que a China é contemporaneamente.
E assim tem-se a segunda grande consequência da
Covid-19 nas Relações Internacionais no Sul Global que nos
propomos a analisar, dentre as múltiplas consequências
existentes: o processo de antiglobalização e retração do
mercado internacional, por meio da reconfiguração das
cadeias globais de valor, do recrudescimento do
protecionismo, o uso da pirataria moderna e de maiores
obstruções no transporte internacional. A pandemia de
Covid 19 resultou na interrupção das cadeias de produção e
fornecimento de produtos tecnológicos, biomédicos e
outros, em escala global. Gibson e Singh (2018)
apresentaram como as empresas chinesas conseguiram a
dominar o mercado mundial substâncias bioquímicas para
produtos fármacos-laboratoriais, controlando quase toda a
cadeia de suprimentos de boa parte de tais produtos. O
255
paradigma criado pela SarsCov2 no sistema econômico, a
partir da China, é o desta nação necessitar interromper toda
uma cadeia interna econômica e assim, resultar num impacto
econômico global que afetou a produção de veículos,
produtos de informática e telecomunicações e,
contraditoriamente, a essencial produção de fármacos e
testes sorológicos. Grande parte da produção industrial
mundial está inserida nalguma cadeia global de valor (CGV)
que tenha alguma empresa chinesa participante em ao menos
numa das fases. No cenário da economia internacional pré -
pandemia houve a expansão das ditas “cadeias globais de
valor” (CGV) onde a produção industrial de certo produto é
dispersa por vários países em desenvolvimento; atuando, de
certa forma, como uma escala mundial do preceito básico de
“divisão do trabalho” de Adam Smith (1996, p. 64-65). Tais
cadeias globais de valor (CGV) expandiram-se na
globalização e a liberação do comércio mundial por acordos
multilaterais e, também, graças às empresas multinacionais
que realocam suas unidades produtivas entre países
(sobretudo periféricos) conforme os ganhos de produção e
valor que venham obter. Aos países em desenvolvimento no
Sul Global as CGVs proporcionam a possibilidade de
participação nalguma das etapas de processos industriais em
rede internacional, de forma a terem acesso à ao menos parte
da tecnologia desenvolvida naquele produto. Na
globalização neoliberal pré-pandemia as CGVs
possibilitaram que tais nações do Sul Global atraíssem
indústrias específicas (filiais de multinacionais) de certas
linhas de produção industrial da cadeia de valor fragmentada,
de tal forma que houvesse um rápido crescimento
econômico e geração de renda e empregos, dependentes da
especialização em certas áreas, sem domínio de toda a cadeia
de valor e de todo processo tecnológico nela existente. As
256
consequências da pandemia nas cadeias globais de valor de
suprimentos anti-Covid-19 (sobretudo nos fármacos e
produtos médico-laboratoriais) foram afetadas quase que
imediatamente, a partir de janeiro de 2020, quando o governo
chinês declara lockdown em grande parte da atividade
econômica interna. Ainda que as empresas farmacêuticas e
laboratoriais não tenham sido alvo de tal medida, dada às
suas essencialidades, a complexa rede de fornecedores e
distribuidores dispersas em países do Sul Global sofreram
sérias restrições, em razão do isolamento social imposto e, de
funcionários afastados para tratamento ou prevenção à
Covid-19. Assim, no início de 2020 ocorreu uma conjunção
de fatores que levaram à escassez global de suprimentos
fármacos-laboratoriais: houve sérias dificuldades de
desembarque de produtos primários nos portos chineses;
simultaneamente ocorreram restrições logísticas internas
combinadas com ausência de mão-de-obra (por afastamento
sanitário); restrições internas nas unidades
produtivas/fábricas (diminuindo produtividade); e
novamente, restrições logísticas entre as fábricas e o
embarque de mercadorias/suprimentos nos portos, rumo
aos mercados globais. A consequência global foi imediata:
falta de produtos laboratoriais, ausência de testes detectores
da Covid19, queda nos estoques de fármacos... tudo isto
aliado ao pânico mundial, com agressivo aumento pela
demanda de tais produtos, ainda que em contextos onde não
eram necessários. Neste contexto, o controle da cadeia
produtiva de fármacos e suprimentos laboratoriais passou a
ser tratado como questão de “segurança e interesse
nacional”, notadamente pelos EUA, Europa, Índia e Japão.
Se no passado recente o poder geopolítico dava-se sobretudo
pelo domínio da cadeia produtiva bélico-nuclear, na
contemporaneidade é a cadeia de suprimentos de fármacos
257
que emerge como indicativo de potência de fato no cenário
internacional.
Outro fato específico quanto ao impacto da
pandemia nas relações comerciais internacionais é o impacto
no sistema logístico mundial, notadamente em nações do Sul
Global, seja no transporte de passageiros quanto de
cargas/mercadorias. Devido ao confinamento de pessoas,
restrições nas fronteiras nacionais e queda brusca em grande
parte da rede de suprimentos, ocorreram impactos altamente
negativos no comércio internacional e no transporte de
mercadorias sobretudo por vias aérea e marítima. Num
mundo pré-pandemia que a mais ampla liberdade de
locomoção humana e a de mercadorias entre nações eram
pressupostos formais de um sistema internacional
globalizado, ainda que a realidade indicasse que tal aforisma
liberal não fosse assim tão verdadeiro, tendo em vistas as
fronteiras constantemente fechadas aos imigrantes, aos
refugiados (ambientais, de guerras, de catástrofes, etc...); bem
como, às constantes limitações impostas por nações ricas aos
produtos de países em desenvolvimento do Sul Global. No
entanto, a realidade das R.I. do Sul Global (como de boa
parte do Norte Global) no mundo pandêmico é o de
mitigação da locomoção humana e da de mercadorias, em
escala global, em virtude de: a) lockdown nos principais
centros logísticos globais, com adaptações à rígidas regras de
inspeção sanitária anti-coronavírus; b) fechamento de
aeroportos, portos, rodoviárias e sistemas ferroviários
internacionais; c) escalada de protecionismo econômico,
com aumento de restrições à importações, em busca de
proteção da economia local face à recessão mundial causada
pela pandemia; d) obstrução de centros de lazer e turismo,
restrições à atividades recreativas, prejudicando o turismo
internacional. Quanto ao turismo mundial e o transporte
258
internacional de passageiros (turismo recreativo e de
negócios), estes têm sofrido um impacto devastador, com
cancelamento maciço de contratos, viagens, compromissos...
resultando em falências empresariais, perda de inúmeros
empregos e queda de arrecadação tributária. Conforme o
relatório da WEF/TTCR,
Os dados disponíveis mostram uma queda de dois dígitos
de 22% no primeiro trimestre de 2020, com as chegadas
caindo 57% em março. Isso resulta em uma perda de 67
milhões de chegadas internacionais e cerca de US $ 80
bilhões em receitas; 100 a 120 milhões de empregos podem
estar em risco (WEF/TTCR, 2020, p. 3).
269
Quanto ao turismo, a OMT tem incentivado seus
estados-membros a repensarem as políticas nacionais para o
setor, sobretudo em nações em desenvolvimento que
tenham o turismo internacional como realidade econômica
relevante ou, cujo o turismo internacional ainda seja um
potencial a ser explorado. Neste sentido, a WEF/TTCR,
O turismo tem potencial para se recuperar e mais uma vez
se estabelecer como parte fundamental das economias
nacionais e da agenda de desenvolvimento sustentável mais
ampla. Essa crise também pode oferecer uma oportunidade
única de moldar o setor para que não apenas cresça, mas que
cresça melhor, priorizando a inclusão, a sustentabilidade e a
responsabilidade. Além disso, para construir para o futuro,
atenção especial deve ser dada à construção de resiliência e
à promoção da sustentabilidade em todos os níveis
(WEF/TTCR, 2020b , p. 33).
270
ativos naturais-ambientais únicos e povos hospitaleiros; o
que beneficiaria a retomada do setor turístico internacional
no Sul Global se souberem construir, conjuntamente, novas
bases para um turismo inclusivo, socialmente justo e
ecologicamente correto.
Quanto às cadeias de produção de bens e oferta de
serviços do Sul Global, estas têm a tendência de se adaptarem
às carências e as novas necessidades/demandas advindas do
contexto pandêmico por meio do redirecionando de suas
linhas de produção e der serviços para uma população global
que tenderá, em grande parte, a preocupar-se cada vez mais
com biossegurança, rastreamento de origem do produto,
certificações e produtos/serviços ambientalmente
sustentáveis. Verifica-se uma tendência de estímulos fiscais e
para- fiscais à substituição de importação de produtos por
produção local, ainda que decorram desajustes nos preços ao
consumidor final (inflação), pois políticos de países
desenvolvidos têm proposto novos modelos de cadeia de
valor e de produção econômica com vistas a evitarem a
dispersão e terceirização destas redes de valor em outras
nações (sobretudo as do Sul Global); elevando assim, os
níveis de resiliência das cadeias de abastecimento (de bens e
serviços essenciais) em nível local/nacional. E se atualmente
os bens-alvos de tais medidas são sobretudo os produtos
hospitalares e os insumos fármacos, é quase certo que o rol
de bens e serviços “essenciais à segurança e ao interesse
nacional” há de expandir-se enormemente para abranger
suprimentos de informática, equipamentos de biossegurança,
etc. Se efetivada tal tendência, poderá agravar a situação
econômica-social de países em desenvolvimento que, por
fatores diversos (recursos naturais, benefícios fiscais, mão de
obra barata etc.) abrigam muitas das unidades produtivas das
empresas transnacionais. Por outro lado, países em
271
desenvolvimento poderão beneficiar-se de tal retração de
investimentos estrangeiros caso invistam maciçamente em
pesquisa e desenvolvimento tecnológico (P&D) locais,
mediante a qualificação de mão –de-obra e investimento em
tecnologias que potencializem a implementação nacional de
uma nova economia baseada na sustentabilidade, na
eficiência e não-desperdício, na biossegurança/segurança
sanitária. Se nações ricas tendem, a partir de agora, a
retirarem investimentos fabris e industriais de países pobres
caberá a estes países periféricos Sul Global estimular que uma
mão-de-obra qualificada nacional (existente ou a ser
formada) reinvente o setor produtivo nacional, como forma
de também trazer independência e autossuficiência
econômica-tecnológica. Em tais hipóteses há o
enfraquecimento das políticas multilaterais em comércio
internacional em favor do fortalecimento de políticas
econômicas internas sobre acordos comerciais externos; bem
como, o fortalecimento de acordos internacionais bilaterais
restritos à bens e serviços cujas trocas sejam essenciais à
“segurança e ao interesse nacional”.
Com a pandemia foram expostas as fragilidades do
sistema multilateralista pré-pandêmico e de base neoliberal e
globalizante, onde as organizações internacionais
multilaterais (ONU, OMS, OMT, OIT, Mercosul, U.E. etc.)
por serem excessivamente burocráticas, não souberam reagir
rapidamente em níveis quantitativo-qualitativos na
simultânea preservação de vidas humanas, do emprego e das
redes de proteção social. Considerado que as nações
subalternas/periféricas do Sul Global são mais dependentes
das O.Is, a crise destas atinge diretamente tais nações,
deixando-as num vácuo, cujo espaço tende a ser preenchido
pelas potências hegemônicas contemporâneas: EUA, U.E.,
Rússia e China. E tais organizações internacionais (O.Is.)
272
também carregam o fardo das críticas advindas dos
neoliberais do Norte Global que condenam o
multilateralismo internacional e, propugnam que o sistema
internacional deva mover-se em bases unilateralistas;
perpetuando-se assim, a hegemonia de poderio entre as
potências atuais. A ausência de uma ação mais prática e
incisiva das OIs junto às nações do Sul Global permitiu que
nações hegemônicas, notadamente China e Rússia,
oferecessem ações de cooperação tecnológica no combate à
pandemia às nações mais dependentes de cooperação
internacional. Se a globalização dos anos 90 do século XX
trouxe a noção de esgarçamento das fronteiras nacionais
frente ao “mercado global”, caberá ao Sul Global propor um
mesmo esgarçamento de tais fronteiras em prol de uma
“cidadania planetária” que supere o xenofobismo, os
nacionalismos exacerbados, o protecionismo excludente e
prejudicial aos mais pobres; e que busque por ações
concretas em prol da biossegurança global, da preservação
ambiental e defesa dignidade humana.
No entanto, há a possibilidade (ainda sem claras
tendências perceptíveis na América Latina, porém, de forma
mais contundente na União Africana) de nações
subalternas/periféricas (Sul Global) tentarem fortalecer o
multilateralismo regional, de forma a implementarem
políticas coordenadas de investimentos em infraestrutura e
reestruturação financeira e comercial internacional, visando
a se manter ou ampliar as trocas tecnológicas, e o complexo
de cadeias produtivas internacionais existentes. Neste
sentido, caso o Sul Global opte pela prática de novos
modelos de trocas internacionais, com bases mais
humanistas, estes modelos tenderiam à diversificação
econômica e à troca tecnológica, mediante cooperação
multilateral ou regional, com a criação de empregos
273
nacionais/locais, sem o abandono do comércio
internacional. Desenvolveriam se o turismo ecológico, o
transporte de cargas e pessoas em padrões sustentáveis, a
redução dos desperdícios industriais e à alocação de mais
recursos para qualificação da mão de obra e a expansão
qualitativa-quantitativa de educação e saúde (rede de
proteção social). Tem-se então uma tensão, entre duas
hipóteses que coexistirão e tentarão sobrepor-se, mas que,
nesta simbiose, tornar-se-ão quase complementares entre si:
a) por um lado uma nacionalização de parte dos fluxos
econômicos internacionais, reduzindo o transporte
de bens e evitando-se a exposição ao risco de futuros
eventos disruptivos globais, ainda que sujeitos à
maiores custos e encargos produtivos e menores
trocas tecnológicas, com pesados sacrifícios
impostos sobretudo aos países mais pobres. Nesta
hipótese básica haveria a redução da relevância do
multilateralismo internacional, a elevação de práticas
acordo bilaterais, bem como o realce de medidas
unilateralistas por parte de potências hegemônicas.
b) um multilateralismo regional, que busque maior
integração de redes de infraestrutura, mercados,
sistema jurídico econômico; e que possibilite que
sejam feitos acordos internacionais mais amplos
quanto aos objetos negociados, ainda que restritos à
um grupo menor de países envolvidos. Ainda que
haja tentativas pontuais de autoctonia de produtos de
“interesse nacional”, os estados-nação tenderiam a se
manterem abertos às relações comerciais
internacionais, sobretudo em âmbito regional e em
acordos entre mercados regionais (Mercosul vs U.A.,
Caricom vs U.E. etc), como forma de obterem
274
tecnologia, divisas e outros suprimentos ainda não-
autóctones.
275
“normalidade melhor”, com maior formalidade, equidade e
diálogo social (OIT, 2020, p. 46).
Referências bibliográficas
BRASIL. A pandemia da COVID-19 e as perspectivas
para o setor agrícola brasileiro no Comércio
Internacional. Brasília: Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento, 2020.
________. Lei 13.993, de 24 de abril de 2020. Dispõe
sobre a proibição de exportações de produtos médicos,
hospitalares e de higiene essenciais ao combate à epidemia
de coronavírus no Brasil. Brasília: Presidência da República,
2020.
CHINAZZI M. et al. The effect of travel restrictions on the
spread of the 2019 novel coronavirus (COVID-19)
outbreak. Science Magazine, v. 368, n. 6489, 2020, p.
395-400.
COMAROFF, J.; COMAROFF, J. Naturalizando a Nação:
Estrangeiros, apocalipse e o Estado pós-colonial.
Horizontes Antropológicos, ano 7, n. 15, 2001, p. 57-106.
_________ . Teoría desde el sur: o como los países
centrales evolucionan hacia África. Buenos Aires: Siglo
Veintiuno, 2013.
EUA. Lei Stafford de Assistência a Desastres e
Emergências (Lei 100-707, Título 42 do Código dos
Estados Unidos, n. 5195. In: United States Government
Publishing Office, Washington, 23 novembro 1988.
Disponível em <www.govinfo.gov>. Acesso em: 11 set.
2020.
282
________. The Defense Production Act of 1950, as
amended [50 U.S.C. § 4501 et seq.] Current through P.L.
113-172, enacted September 26, 2014. In: Federal
Emergency Management Agency, Washington, 26
setembro 2014. Disponível em <www.fema.gov>. Acesso
em: 11 set. 2020.
GEISEL, A. Lieferung von Masken für die Polizei hat
Berlin nicht erreicht. In: Startseite von Berlin,
Coronavirus, Berlim, 03 abril 2020. Disponível em
<www.berlin.de>. Acesso em: 13 mai. 2020.
GIBSON, R.; SINGH, J. China Rx: Exposing the Risks of
America's Dependence on China for Medicine. New York:
Prometheus Books, 2018.
GUTERRES, A. Secretaria Geral da ONU. Apelo global
para lidar e combater o discurso de ódio relacionado com a
COVID-19. In: Secretaria Geral da ONU, Centro
Regional de Informações para a Europa Ocidental, Nova
York, 8 maio 2020. Disponível em <www.unric.org>.
Acesso em: 03 set. 2020.
HARVEY, D. Política anticapitalista em tempos de
COVID-19. DAVIS, M. (Org.). Coronavírus e a luta de
classes. Teresina: Terra sem Amos. 2020, p. 13-23.
HUMAN RIGHTS WATCH. China: Covid-19
Discrimination Against Africans: forced quarantines,
evictions, refused services in Guangzhou. In: Human
Rights Watch, Nova York, 5 maio 2020. Disponível em:
<www.hrw.org>. Acesso em: 12 out. 2020.
LAMPEDUSA, G. O Leopardo. São Paulo: Companhia
das Letras, 2017.
283
LE MAIRE, B. Sur l'impact économique de l'épidémie de
COViD-19 et le recours au 49.3 pour la réforme des
retraites. [Entrevista concedida a] Damien Thevenot e
Caroline Roux. Vie Publique [Web site]. Disponível em
<www.vie-publique.fr>. Paris, 2 mar. 2020.
MORGENTHAU, H. Another Great Debate: The
national interest of the United States. American Political
Science Review, v. 46, n. 4, 1952, p. 961-988.
NUECHTERLEIN, D. America Recommitted: A
Superpower Assesses Its Role in a Turbulent World.
Lexington: The University Press of Kentucky, 2001.
OIT/ECLAC. Employment Situation in Latin America
and the Caribbean Work in times of pandemic: the
challenges of the coronavirus disease (COVID-19).
ECLAC/IOL Bulletin, n. 22 (maio). Genebra: United
Nations, 2020.
ONU. Global Compact for Safe, Orderly and Regular
Migration. Resolution adopted by the General Assembly on
19 December 2018. In: General Assembly, Resolution,
Nova York, 18 dezembro 2018. Disponível
em<www.un.org>. Acesso em: 16 jul. 2020.
SANTOS, B. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra:
Almedina, 2020.
SMITH, A. Uma investigação sobre a natureza e as
causas da riqueza das nações. Volume 1. São Paulo:
Nova Cultural, 1996.
TRUDEAU, Justin. Trudeau warns U.S. against
denying exports of medical supplies to Canada.
https://www.politico.com/news/2020/04/03/3m-warns-
284
of-white-house-order-to-stop-exporting-masks-to-canada-
163060.
UNIÃO AFRICANA. Projeto de posição comum africana
(PCA/CAP) sobre o Pacto Global sobre a Imigração
Segura, Ordeira e Regular. In: African Union News, Adis
Abeba, 30 outubro 2017. Disponível em <www.au.int>.
Acesso em: 27 jun. 2020.
WEF/TT. Latin America and Caribbean Travel &
Tourism Competitiveness Landscape Report: Assessing
Regional Opportunities and Challenges in the Context of
COVID-19. Insight Report Jult 2020. Cologny: The World
Economic Forum’s Travel & Tourism, 2020.
ZANNETTOU, S. et al. Weaponized Information
Outbreak: a case study on Covid-19 Bioweapon Myths, and
the Asian Conspiracy Meme. In: Network Contagion
Research Institute, Contagion and Ideology Report,
Diego Garcia, 1 abril 2020. Disponível em
<www.networkcontagion.us>. Acesso em: 10 ago. 2020.
285
286
CAPÍTULO 9
PERVERSIDADE DO TERRITÓRIO-RECURSO,
ACONTECIMENTO DAS PANDEMIAS E
TERRITÓRIO-ABRIGO COMO POSSIBILIDADE DO
BEM VIVER
Introdução
A geografia é um campo do conhecimento científico
que estuda o território socialmente usado, no âmbito das
histórias de vida que acontecem nos mais diversos lugares da
existência humana. Segundo Santos e Silveira (2001), não é
apenas o território em si que lhe interessa, mas,
simultaneamente, o território usado como recurso e/ou
abrigo, ou seja, o uso que a sociedade faz dos territórios de
que se apropria, como meio e condição, para atender aos seus
propósitos.
O território constitui, segundo Santos (1997), um
conjunto indissociável, solidário e contraditório de sistemas
de objetos e de ações que, formando uma todalidade
complexa, acha-se em permanente processo de totalização,
em algum sentido. Sentido este que se acha intrinsecamente
atrelado à dinâmica das relações sociais que usam o território
e que, por conseguinte, só pode ser apontado pelo seu
próprio acontecer histórico.
Em uma sociedade de classes como a capitalista,
geralmente, o território é usado, preponderantemente, para
atender aos interesses das classes dominantes e opressoras, a
menos que as classes subalternizadas e oprimidas estejam
287
organizadas e mobilizadas, a partir dos seus territórios de
existência, para também fazerem valer os seus interessses,
atrapalhando a lógica hegemônica. Destarte, o território
constitui um mosaico fragmentado e, contraditoriamente,
combinado dos diversos usos e interesses da coletividade
social.
O conflito de classes, portanto, motor da história
social do capitalismo, engendra uma estrutura territorial
fragmentada e segregada, com diferentes graus de articulação
organizacional e orgânica. Esta estrutura compreende, ao
mesmo tempo, resultado e causa de uma série de
desigualdades e injustiças sociais, cujos graus de variação
dempendem da natureza do processo da formação histórico-
territorial dos lugares no mundo.
Ao longo do processo de formação histórico-
territorial do Brasil, as classes dominantes e opressoras
sempre usaram o espaço nacional para atender,
preponderantemente, aos seus interesses patrimonialistas,
privatistas e economicistas, submetendo as classes
subalternizadas e oprimidas às formas mais exacerbadas e
cruéis de exploração, visando garantir os seus privilégios.
A concretização de tais interesses vem acontecendo
há cerca de cinco séculos no Brasil, mesmo que tenha
destruído porções significativas da natureza e da cultura dos
povos autóctones e dos sogredores das cidades e dos campos
(RIBEIRO, 2015; CASTILHO, PONTES e BRANDÃO,
2018), negando e massacrando cruelmente as suas diversas
reações traduzidas por movimentos sociais (RIBEIRO,
2015; CASTILHO, 2020).
Isso tem acontecido sem esconder o ódio e o medo
das classes dominantes e opressoras com relação às classes
subalternizadas e oprimidas, na medida em que estas últimas
são vistas por aquelas, como ameaçadoras da manutenção
288
dos seus privilégios de classe. Essa postura das classes
dominantes e opressoras tem impedido a consolidação do
processo de formação da cidadania no Brasil, tanto que, de
acordo com Santos (1996, p. 7),
[...] lembremos que a cidadania se dá segundo diversos
níveis. Sobretudo deste país, todos não são igualmente
cidadãos, havendo os que nem são cidadãos e havendo os
que não querem ser cidadãos, aqueles que buscam
privilégios e não direitos.
290
Ressalta-se que, para proteger os/as respondentes,
como nos alertara Lacoste (2019), buscou-se omitir qualquer
informação que pudesse revelar as suas respectivas
identidades. Acrescenta-se que o pesquisador usou máscara
facial e manteve o distanciamento necessário de, no mínimo,
um metro e meio de distância com relação aos/às
respondentes, respeitando as recomendações dos governos
estadual e municipal as quais, por sua vez, achavam-se de
acordo com as orientações da OMS (Organização Mundial
da Saúde).
Por último, mas não de menor importância para a
realização do presente ensaio, utilizou-se de figuras
representativas da temática ora abordada; o que aconteceu
com vistas a, principalmente, tornar mais evidentes os seus
principais sentidos e, ao mesmo tempo, vislumbrar
perspectivas concretas visando à superação da perversidade
do território usado como recurso, impedindo seu uso como
abrigo.
O presente capítulo acha-se estruturado da seguinte
forma: o tratamento do acontecer histórico do território-
recurso negando a possibilidade do território-abrigo,
deixando, assim, o espaço geográfico vulnerável à
manifestação dos vários impactos negativos decorrentes das
ações antrópicas (primeira seção); o acontecimento das
pandemias em territórios usados como recurso para atender
aos interesses hegemônicos alienantes e elienígenas (segunda
seção); e o território usado como abrigo enquanto uma
possibilidade concreta diferente em termos de ordenamento
territorial, abrindo outras perspectivas de ser e pensar no
mundo (terceira seção).
291
O território-recurso negando a possibilidade do
território-abrigo
Portanto, não constituindo um epifenômeno, o
território não é somente o espaço onde as ações humanas
acontecem, mas, ao mesmo tempo, é a instância material
produzida e usada para atender os interesses das classes
sociais que necessitam apropriarem-se dele para existirem.
Em se tratando de uma sociedade capitalista como a
brasileira, os interesses predominantes são aqueles que
representam os propósitos das classes dominantes e
opressoras os quais, contraditoriamente, conflitam com os
das classes dominadas, subalternizadas e oprimidas. Santos et
al. (2000, p. 12-13) acentua que
Para os atores hegemonicos o território usado é um recurso,
garantia da realização de seus interesses particulares. [...] o
rebatimento de suas ações conduz a uma constante de
adaptação de seu uso com adição de uma materialidade
funcional ao exercício das atividades exógenas ao lugar,
aprofundando a divisão social e territorial do trabalho,
mediante a seletividade dos investimentos econômicos que
gera um uso corporativo do território. [...] Os distintos
atores não possuem o mesmo poder de comando levando a
uma multiplicação de ações, fruto do convívio com os atores
hegemonizados. Dessa combinação temos o arranjo
singular dos lugares. Os atores hegemonizados
[subalternizados e oprimidos] têm o território como um
abrigo, buscando constantemente se adptar ao meio
geográfico local, ao mesmo tempo que recriam estratégias
que garantam sua sobrevivência nos lugares. É neste jogo
dialético que podemos recuperar a totalidade.
294
A proximidade acima citada não significa que tenha
existido, consequentemente, relações de convivência social
entre as classes sociais dominadas e subalternizadas no
espaço urbano; o que se deve, ao mesmo tempo, à
permanência da dimensão racista e preconceituosa das
primeiras classes com relação às segundas, fazendo com que
estas últimas sempre tenham sido mantidas afastadas das
anteriores.
Por outro lado, nota-se que, após a realização dos
aterros das áreas de manguezais pelas próprias classes
subalternizadas e oprimidas, valorizando-as no curso da
história urbana local; os interesses das classes dominantes e
opressoras, através da sua articulação em um CFICF
(Complexo Fundiário Imobiliário Comercial Financeiro),
buscaram, progressivamente, apropriar-se dos terrenos
tornados terras firmes.
Ações urbanísticas de cunho higienista
implementadas pelo Estado, a exemplo das empreendidas
pela Liga Social Contra os Mocambos, nos anos 1930 e 1940
(MELO, 1985), foram responsáveis pela “limpeza” dos
referidos terrenos, removendo as famílias das classes
subalternizadas e oprimidas para outras áreas da cidade e/ou
da RMR, expulsando-as sem nenhum apoio técnico e
econômico. Todavia, parte delas continuou no espaço
municipal, ocupando áreas disponíveis e adensando-se em
outras áreas de famílias pobres existentes na cidade. (Figura
1)
295
Figura 1. Recife, cadastramento de áreas de interesse social.
297
Os moradores das CIS possuem um cotidiano
sofrido em função, notadamente, da ausência do conjunto
dos serviços públicos sociais fundamentais à concretização
do que Santos (1987) chamou de direito ao entorno os quais,
por seu turno, constituem condição sine qua non à formação
do espaço do cidadão.
Os serviços de saneamento (compreendendo o
abastecimento de água potável, o esgotamento sanitário e a
coleta de lixo) e a provisão da infraestrutura urbana
(compreendendo as vias de acesso, as canaletas, as obras de
drenagem) voltada para uma habitabilidade digna, quando
existem nas referidas áreas, atendem de maneira muito
precária às necessidades vitais dos/das moradores/as,
reduzindo ainda mais a qualidade no que tange à sua
habitabilidade. Vale ressaltar que
[...] a moradia adequada é um direito humano,
reconhecido em diversos tratados internacionais. Os 7
elementos mínimos do direito humano à moradia adequada,
de acordo com o Comentário Geral nº 4 do Comitê de
Direitos Econômicos Sociais e Culturais, são:
1. Segurança de posse, proteção contra remoção ou despejos
e outras ameaças;
2. Disponibilidade de serviços, materiais, facilidades e
infraestrutura, essenciais para a saúde, segurança, conforto
e nutrição, etc.;
3. Custo acessível, que não comprometa a realização de
outras necessidades básicas;
4. Habitabilidade, proporcionando proteção contra frio,
umidade, calor, chuva, vento ou outras amaças à saúde,
riscos etruturais e riscos de doença;
5. Acessibilidade, principalmente para os grupos menos
favorecidos;
6. Localização, que permita acesso a opções de trabalho,
serviços de saúde, escolas, creches e outras facilidades
sociais;
298
7. Adequação cultural, possibilitando a expressão da
identidade e diversidade cultural (LUDERMIR e
COELHO, 2016-2018, p. 13).
299
COVID-19 atinge a todos os lugares, por outro, ela não os
atinge da mesma maneira.
Isto quer dizer que, em lugares nos quais o território
é usado preponderantemente como recurso econômico –
descuidando-se da qualidade da habitação, dos serviços
públicos sociais (de saneamento, atenção à saúde, e
transportes, sobretudo) –, seus habitantes tornam-se mais
vulneráveis aos efeitos negativos das pandemias e,
consequentemente, possuem mais dificultades de enfrentá-
los.
305
Prestando mais atenção às contradições acima
referidas, a sociedade se autoconscientiza da relevância das
pautas que têm sido levantadas por entidades sociais críticas
– a exemplo dos sindicatos e dos movimentos sociais – as
quais, aliás, nunca se calaram diante da insensatez no que se
refere à perversidade inerente à lógica de uso do território
como recurso. A este respeito, vale ressaltar
[...] o que os funcionários do hospital da França, lutando ao
longo do ano passado, têm dito repetidamente: que o
hospital público é vítima de políticas de estrangulamento
financeiro, tornando-o cada vez menos capaz de cumprir as
suas tarefas de acolhimento e cuidado dos pacientes; mas
que também é vítima de uma medicina liberal da cidade que,
em grande parte, vira as costas à sua missão, enviando
pacientes para o hospital público que inicialmente estavam
sob seus cuidados; enquanto as clínicas privadas prosperam
com os excessos de taxas que selecionam uma “clientela”
que evita a dupla armadilha anterior. Tanto que, quando o
choque de uma pandemia atinge, é todo este sistema,
deliberadamente dilapidado, que se revela incapaz de lidar
com a situação forçando os prestadores de cuidados a
separar os pacientes de acordo com a sua expectativa de
sobrevivência... e idade. Como os cirurgiões fazem em
tempo de guerra nos hospitais de campanha, na retaguarda
da linha de frente! (BIHR, 2020, p. 26).
306
cidades do que em hospitais devidamente equipados e
laboratórios de pesquisa em saúde pública.
Portanto, mesmo em territórios reconhecidos como
de Primeiro Mundo que possuem – ou possuíram – “Estado
Protetor”, deixou-se de investir, como antes, em serviços de
atenção à saúde, privatizando-os, o que contribuiu para os
atuais cenários trágicos ocorridos em função da propagação
da pandemia da Covid-19.
A situação torna-se ainda pior em territórios onde,
quando muito, houve, em alguns momentos da história,
experiências de um Estado Desenvolvimentista, onde o
direito ao entorno nunca se concretizou e, por sua vez, a
condição de cidadania ainda é um sonho muito distante de
ser conquistado pela coletividade social.
Basta prestar um pouco mais de atenção para a forma
pela qual bens de consumo coletivo como saneamento,
habitação, serviços públicos sociais de atenção à saúde e
transportes são providos para as classes sociais
subalternizadas e oprimidas, que logo se compreende o que
se está colocando.
Acrescenta-se um fato de ordem conjuntural que
complica ainda mais a situação brasileira, trata-se do seu atual
governo federal que, desprovido de espírito republicano, não
consegue enxergar os seus erros e, assim, não aceita, mesmo
diante das evidências trágicas dos efeitos da pandemia,
mudar a sua postura economicista para uma mais humana.
A enorme diferença entre os modelos de uso social
do território implica não somente em processos distintos de
organização territorial, configurando diferentes
territorialidades; mas, ao mesmo tempo, em maneiras
distintas de vulnerabilidade social, de enfrentamento às
adversidades e, por conseguinte, de formas de superar tais
condições. Daí por que, mesmo tendo sofrido muito com a
307
pandemia da Covid-19, justamente por já terem tido uma
experiência de Estado Protetor, as referidas nações europeias
apresentam-se com melhores condições de enfrentamento e
combate da pandemia.
O problema, entretanto, parece difícil de ser
resolvido a curto prazo em função, sobretudo, do peso da
ideologia hegemônica para a qual a celeridade e intensidade
dos processos de urbanização e de expansão do agronegócio
por territórios do mundo constitui uma estratégia fatal que
persiste em continuar. No caso dos territórios que se situam
em regiões tropicais e subtropicais nas quais a pobreza e o
desmatamento expandem-se a todo vapor, sem haver
nenhuma forma de controle das instituições públicas
nacionais, a situação torna-se ainda mais grave.
Em todo o Planeta, a manifestação da pandemia da
Covid-19 inicia-se e propaga-se a partir dos centros mais
dinâmicos do espaço mundial, de grande, média ou pequena
magnitudes. Afinal, Lefèbvre (1974) demonstrara, há
décadas atrás, que os centros – como espaços de encontros
promovedores da centralização e da centralidade –
constituem espaços cruciais do acontecer histórico do
capitalismo e, por sua vez, de tudo que se acha
intrinsecamente relacionado a este modo de produção.
Tais lugares constituem espaços da produção e
reprodução das relações capitalistas de ser e pensar inerentes
ao mundo moderno e, concomitantemente, da manifestação
dos seus impactos perversos. Percebe-se, assim, que os
centros constituem as áreas urbanas, ou seja, os lugares,
segundo Santos e Silveira (2001), de forte densidade do meio
técnico-científico-informacional que propiciam grande
fluidez, capacidade de influência e rapidez, enfim, os espaços
luminosos. Estes constituem, assim, espaços dispersores
308
também da Covid-19, o que é estimulado pelo modo como
se dá o uso do território.
No Brasil, da mesma maneira que acontece na escala
do mundo, são os espaços luminosos que concentram as
mais significativas ocorrências da pandemia da Covid-19, as
quais se vão expandindo pelos seus respectivos entornos à
medida que os contatos sociais se estabelecem, através das
vias de circulação que estruturam o processo de organização
do espaço urbano. (Figura 3).
Fontes: Figuras cedidas por Robson José Alves Brandão, 2020, orientado nosso no
PRODEMA-UFPE.
309
Trata-se do uso dos territórios segundo os interesses
das relações puramente capitalistas de produção-
distribuição-circulação-consumo de maneira mais célere e
intensiva. Contrapostos aos espaços luminosos, têm-se os
espaços opacos, ou seja, os territórios que, segundo ainda
Santos e Silveira (2001), compreendem aqueles que não
possuem as mesmas condições em termos de fluidez,
capacidade de influência e rapidez exigidas pelas relações
capitalistas a exemplo das CIS, mas que não deixam de ser
atingidos pelos fluxos inerentes à dinâmica econômica.
Não dispondo da qualidade devida e exigida em
termos de habitabilidade, saneamento, serviços públicos
sociais de atenção à saúde, de transportes e acesso ao
mercado de trabalho formal, os espaços opacos tornam-se
muito mais vulneráveis aos efeitos perversos do capitalismo,
incluindo os decorrentes das pandemias, o que é facilmente
visível quando se escuta e dá voz às pessoas que as classes
dominantes e opressoras insistem em não enxergar.
De acordo com as falas das pessoas escutadas,
pertencentes às classes subalternizadas e oprimidas,
destacando os conteúdos mais proferidos por elas, ou seja,
aqueles que se repetiram nas falas de quase a totalidade delas:
“[...] não tem água em nossas casas e a gente tá fazendo das
tripas coração pra conseguir água pra lavar as mãos”
(Moradora de uma CIS no bairro Pina); “A falta de água faz
com que muita gente use a água do rio [...], mas ela é suja e
tenho medo de usá-la” (Moradora de uma CIS no bairro Boa
Vista); “As casas aqui na Comunidade são muito pequenas
[...] na minha, eu moro numa casa que só tem uma sala, um
quarto e um banheiro e tenho cinco filhos [...], imagina se um
de nós pegar esse vírus...” (Moradora de uma CIS no bairro
Boa Viagem); “Eu moro numa casa de uma sala, dois
quartos, um banheiro [...] tudo isso pra mim, meu marido,
310
cinco filhos e minha sogra que tem 80 anos de idade”
(Moradora de uma CIS no bairro Boa Viagem); “Nossa casa
é muito pequena e só tem uma janela e uma porta, isso
dificulta a entrada do vento [...], se alguém daqui pega esse
vírus tamos fritos, [...] o senhor tá vendo que somos 7
pessoas morando nesse vão de apenas um quarto e um
banheiro” (Moradora de uma CIS no bairro Santo Amaro);
“Não temos água encanada em casa, estamos usando água
do rio, mas a gente fica com receio porque essas águas não
são limpas” (Moradora de uma CIS do bairro Pina); “[...]
tenho muito medo de sair porque na televisão passa todas
aquelas covas enterrando muita gente junta por dia, mas o
que fazer, né? [...] Preciso pegar o auxílio porque não tenho
nada pra dar a meus filhos que estão em casa...” (Trabalhador
em uma fila da Caixa Econômica Federal-CEF, no bairro
Encruzilhada); “Se eu pudesse não saía de casa porque não
quero pegar a doença e nem levar ela pra meus parentes de
casa, mas tenho necessidade desse dinheirinho pra que minha
família não passe fome” (Trabalhadora em uma fila da CEF,
no bairro Engenho do Meio); “Olhe, a situação dos ônibus é
sempre ruim, os ônibus parece que carrega boi de tão cheio,
e agora com o coronavírus está pior porque a gente corre
risco de pegar esse danado e morrer ou de levar ele para casa
e passar para um parente (Trabalhador no Terminal de
Integração da Macaxeira); “Justamente agora quando devia
ter mais ônibus pra gente viajar sentado e separado, tá assim,
cheio de gente [...] e arriscando a vida da gente todo dia, mas
precisamos ir trabalhar, que fazer né?” (Trabalhadora no
Terminal de Integração Joana Bezerra); “Se eu pudesse ficava
em casa para não arriscar minha vida e a dos meus pais e
filhos [olhos cheios de lágrimas], mas tenho que ir trabalhar,
minha patroa disse que não tem condição de me pagar se eu
não for ao trabalho (Trabalhadora no Terminal de Integração
311
Joana Bezerra); “Era pra tá tudo fechado, o governo até
tentou controlar no início mas depois escutou os donos de
empresas que só pensam neles [...], aí as lojas abriram e a
gente teve que trabalhar nesse risco todo de pegar o vírus”
(Trabalhador em rua comercial do bairro São José); e “Eu
queria tá em casa cuidando pra meu pessoal não pegar esse
bicho [o COVID-19] mas não posso deixar de vir pra loja
senão o patrão me demite (Trabalhadora no em rua
comercial do bairro Santo Antônio).
O conteúdo das falas acima demonstra que os/as
respondentes estão cientes do perigo que pode acometer os
seus lares, porém, dispondo de condições precárias nos seus
diversos territórios de existência, são obrigadas a exporem-
se à Covid-19 com a finalidade principal de conseguirem
sobreviver.
O medo com relação ao uso da água do rio, em
função da poluição, para a higienização pessoal remete-nos a
uma consciência da necessidade de cuidar melhor do meio
ambiente. O medo de não ter acesso aos meios mínimos para
a higienização pessoal e do lar, o medo de terem que tomar
ônibus cheios de gente impedindo a necessidade do
estabelecimento da distância mínima para evitar o contágio e
o medo de ter que sair de casa para não perderem seus postos
de trabalho sob a pressão dos proprietários dos
estabelecimentos comerciais demonstram a grande
vulnerabilidade das classes subalternizadas e oprimidas no
atual momento da pandemia da Covid-19.
Em Recife (Figura 4), nota-se que a concentração dos
infectados pela Covid-19 achava-se, em princípio, nas duas
principais centralidades socioeconômicas locais. Foi a partir
dessas áreas que os casos de ocorrência da doença
espalharam-se, atingindo tragicamente os lugares das classes
subalternizadas e oprimidas, tal como aconteceu em outras
312
cidades brasileiras. Barbosa e Teixeira (2020, p. 69)
reconheceram processo semelhante na cidade do Rio de
Janeiro ao constatarem o movimento da Covid-19 “[...] dos
bairros de classes médias com maior renda econômica,
disponibilidade de equipamentos e valorização imobiliária
[...] para os subúrbios, favelas e periferias cariocas”.
318
Faz-se mister reconhecer as especificidades
concernentes ao território usado que suscitam formas
diferentes de articulação e mobilização sociais em diversos
lugares do mundo, sobretudo naqueles em que se apresenta
maior vulnerabilidade em razão do fato de terem conhecido
modos mais céleres e intensivos de consumismo que
explodiram depois do choque de 2007-8, levando-os a
consequências catastróficas.
A torrente de investimentos em tais formas de consumismo
teve tudo a ver com a máxima absorção de volumes de
capital exponencialmente crescentes em formas de
consumismo que tiveram o menor tempo de rotatividade
possível. O turismo internacional era emblemático. As
visitas internacionais aumentaram de 800 milhões para 1,4
bilhões entre 2010 e 2018. Esta forma de consumismo
instantâneo exigiu investimentos maciços em infra-
estruturas de aeroportos e companhias aéreas, hotéis e
restaurantes, parques temáticos e eventos cultuais, etc.
(HARVEY, 2020, p. 19-20).
320
Considerações finais
A análise das relações dialéticas estabelecidas entre
território usado como recurso, acontecimento de pandemias
e ações sociais voltadas à concretização do território como
abrigo, no contexto de uma sociedade de classes altamente
desigual e injusta, demonstrou que os impactos catastróficos
de qualquer fenômeno acham-se intrinsecamente
relacionados com a natureza das ações que usam o território
para finalidades puramente econômicas.
Para superar os impactos do território usado como
recurso, levados em conta neste escrito, fez-se necessário
recolocar a necessidade de se reverter o atual sistema de
ações fundamentado na lógica de uso puramente capitalista
de ser e pensar em termos de sociedade, eliminando de uma
vez por todas as seculares desigualdades e injustiças sociais
refletidas pelas paisagens como, por exemplo, as dos centros
urbanos.
A opção pelo materialismo histórico-dialético como
método de abordagem foi apropriada para a concretização
do objetivo deste ensaio. O que teve como auxílio os
métodos de procedimentos relativos: à retomada de ideias
sobre o tema ora proposto, à escuta das pessoas que mais
sofrem com o atual processo de uso do território, e ao uso
de imagens representativas da problemática ora tratada.
A principal contribuição científica da reflexão residiu
no fato de se ter recolocado a relevância do entendimento do
território usado como recurso, enquanto uma totalidade
complexa que está em permanente movimento na história da
humanidade, acontecendo em algum sentido.
Com isso, continuou-se a abrir novas possibilidades
de pesquisas e ações capazes de, junto com as classes sociais
subalternizadas e oprimidas, imaginar e buscar possibilidades
321
concretas para implementar formas justas de uso do
território – como abrigo, por exemplo – que concretizem
efetivamente a condição da cidadania para todas as classes
sociais que se acham presentes no território.
Referências bibliográficas
BARBOSA, J.; TEIXEIRA, L. Territórios populares entre
as desigualdades profundas e o direito à vida. In CARLOS,
A. (Org.) COVID-19 e a crise urbana. São Paulo:
FFLCH/USP, 2020, p. 67-77.
BIHR, A. França: pela socialização do aparato de saúde. In
DAVIS, M. (Org.) Coronavírus e a luta de classes.
Teresina: Terra sem Amos, 2020, p. 25-30.
BITOUN, J. Análise dos bairros do Recife através da
distribuição da renda. Revista de Geografia, Edição
Especial, 1996, p. 41-55.
BNB. Informações socioeconômicas municipais para
Recife, Pernambuco, 2019. Disponível em
<www.bnb.gov.br>. Acesso em: 20/04/2020.
CARVALHO, R. Doenças infecciosas emergentes na
fronteira do desmatamento. In YOUNG, C.; MATHIAS, J.
(Org.) Covid-19, meio ambiente e políticas públicas.
São Pauo: Hucitec, 2020, p. 92-100.
CASTILHO, C. Por uma geografia social dos serviços:
articulando pedaços de uma realidade fragmentada para
explicar a natureza das inter-relações espaço-serviços. In
CASTILHO, C. (Org.) Movimentos sociais, academia e
sociedade. Por um espaço do cidadão. Recife: Editora da
Universidade Federal de Pernambuco, 2015, p. 155-292.
322
________. O uso neoliberal do espaço – impactos sobre os
“territórios da vida humana” na cidade. Revista Okara:
Geografia em Debate, n. 13, 2019, p. 597-623.
CASTILHO, C. Territórios violados, resistências e
massacres de povos e pobres na história do Brasil – mas a
luta continua. Boletim Goiano de Geografia, n. 40, 2020,
p. 1-25.
CASTILHO, C. J. M. de, PONTES, B. A. N. M. e
BRANDÃO, R. J. A. (2018). A destruição da natureza em
ambientes rurais e urbanos no Brasil: uma tragédia que
ainda pode ser revista. Ciência e Natura, n. 40, 2018, p. 16-
20.
CASTRO, J. de. A cidade do Recife. Ensaio de geografia
urbana. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1954.
DAVIS, M. A crise do coronavírus é um monstro
alimentado pelo capitalismo. In DAVIS, M. (Org.)
Coronavírus e a luta de classes. Teresina: Terra sem
Amos, 2020, p. 05-12.
GUIMARÃES, E. As pandemias e as populações invisíveis:
do Brasil do século XIX ao Brasil do Covid-19. In
ALMICO, R., GOODWIN Jr., J., SARAIVA, L. (Org.). Na
saúde e na doença: história, crises e epidemias:
reflexões da história econômica na época da covid-19. São
Paulo: Hucitec, 2020, p. 98-106.
FNEM-Fórum Nacional de Entidades Metropolitanas.
Região Metropolitana do Recife, 2019. Disponível em:
<www.fnembrasil.org>. Acesso em: 04/05/2020.
FREYRE, G. Sobrados e mucambos. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1981.
323
LUDERMIR, R.; COELHO, R. Terra e moradia.
Conflitos fundiários urbanos em Pernambuco. Recife:
Habitat para a Humanidade, 2016-2018.
HARVEY, D. Os limites do capital. São Paulo:
Boitempo, 2013.
________. Política anticapitalista em tempos de COVID-
19. In DAVIS, M. (Org.) Coronavírus e a luta de classes.
Teresina: Terra sem Amos, 2020, p. 13-23.
KRENAK, A. O amanhã não está à venda. São Paulo:
Companhia das Letras, 2020.
LAB MORADIA NO CENTRO. Recife: Habitat para a
humanidade/Ibdu/Cities
Alliance/Fase/Interação/Cpdh/Mtst/Caus/Solid
ground/Uhph, 2018.
LACOSTE, Y. A geografia – isso serve, em primeiro lugar,
para fazer a guerra. Campinas: Papirus, 2019.
LEFEBVRE, H. La production de l’espace. Paris:
Éditions Anthropos, 1974.
MELO, M. A cidade dos mocambos: Estado, habitação e
luta de classes no Recife (1920-1960). Espaço e Debates,
n. 14, 1985, p. 45-66.
MELO, M. Metropolização e subdesenvolvimento. O
caso do Recife. Recife: Editora da Universidade Federal de
Pernambuco, 1978.
MENESES, J. “Águas passadas [...] movem moinhos”:
água, abastecimento, higiene e processo saúde-doença na
modernidade. In ALMICO, R., GOODWIN Jr., J.,
SARAIVA, L. (Org.). Na saúde e na doença: história,
324
crises e epidemias: reflexões da história econômica na época
da covid-19. São Paulo: Hucitec, 2020, p. 48-58.
NASCIMENTO, M., CASTILHO, C. Habitação de
interesse social: intencionalidades na realocação de
moradias e reuso do solo no ambiente urbano. Revista
Brasileira de Geografia Física, n. 11, 2018, p. 560-584.
PIKETTY, T. Capital et idéologie. Paris: Éditions du
Seuil, 2019.
RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido
do Brasil. São Paulo: Global, 2015.
Sá, M. A ecologia da doença. 082 Notícias, Maceió, 10
julho 2020. Disponível em: <www.082noticias.com >.
Acesso em: 24/05/2020.
SANTOS, M. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel,
1987.
________. Por uma geografia cidadã: por uma
epistemologia da existência. Boletim Gaúcho de
Geografia, n. 21, 1996, p. 7-14.
________. A natureza do espaço. Técnica e tempo, razão
e emoção. São Paulo: Hucitec, 1997.
________. Por uma outra globalização. Do pensamento
único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2000.
SANTOS, M. et al. O papel ativo da geografia. Um
manifesto. Florianópolis: XII Encontro Nacional de
Geógrafos, 2000.
SANTOS, M.; SILVEIRA, M. O Brasil. Território e
sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Record,
2001.
325
UJVARI, S. A história da humanidade contada pelos
vírus. Bactérias, parasitas e outros microorganismos... São
Paulo: Editora Contexto, 2012.
YOUNG, C. E. F. Covid-19 e cobiça: a importância da vida
humana para a elite brasileira, ontem e hoje. In YOUNG,
C.; MATHIAS, J. (Org.). Covid-19, meio ambiente e
políticas públicas. São Paulo: Hucitec, 2020, p. 144-149.
326
CAPÍTULO 10
María Lois
Silvia González Iturraspe
Introducción
El 14 de marzo de 2020, el Consejo de Ministros del
estado español aprobaba la declaración del estado de alarma
para la gestión de la situación de crisis sanitaria ocasionada
por el virus SARS-CoV-2, más conocido como coronavirus
(Real Decreto 463/2020). Lo hacía solo tres días después de
que la OMS (Organización Mundial de la Salud) declarara el
brote como pandemia, y tras la previa declaración de
emergencia de Salud Pública de Importancia Internacional.
El artículo 7 de esta declaración limitaba la “libertad
de circulación de las personas”, construyendo la
excepcionalidad de la situación a partir de la definición de las
consideradas actividades esenciales, es decir, aquellas para las
cuales era posible la circulación por vía pública. Que serían,
exclusivamente, la adquisición de alimentos, productos
farmacéuticos, asistencia a centros sanitarios,
desplazamiento al lugar de trabajo o asistencia y cuidado a
mayores, menores, dependientes, personas con discapacidad
o personas especialmente vulnerables. Así, se abría un
período de excepcionalidad que duraría hasta el 23 de mayo,
fecha en la que entraron en vigor medidas de relajación del
327
confinamiento; en el caso español, programadas
diferencialmente por espacios y tiempos, por fases.
Casi al mismo tiempo que se decretaba el estado de
alarma, el gobierno municipal de la ciudad de Madrid
promulgaba una serie de “medidas necesarias y adecuadas
por extraordinaria y urgente necesidad en materia de
protección civil” dado el “alto índice de afectación a nivel
poblacional de la ciudad de Madrid” (Decreto 13 de marzo
de 2020). Esta alta afectación se traducía – en la fecha en que
se produjo el pico máximo de comunicación de casos en
España, esto es, el 26 de marzo de 2020 – en que la
Comunidad de Madrid reportaba 17.166 casos, un 30,5% del
total estatal, manteniéndose como el principal espacio de
contagio52. Datos, prácticas sociales y regulaciones políticas
situaban a Madrid como uno de los epicentros de la
pandemia a escala mundial. Hablamos de una ciudad de
3.266.126 habitantes53, la más poblada de España, capital del
país y de la Comunidad Autónoma, principal centro de poder
económico y político. Este escenario, como veremos, es
clave para contextualizar las formas comunitarias populares
desde las que se contesta a la pandemia.
Desde este escenario, entonces, el propósito del texto
es reflexionar sobre las prácticas que han construido la
respuesta social a la pandemia, desde diferentes ángulos. En
primer lugar, describiremos algunas cuestiones teóricas
generales donde contextualizamos las prácticas de apoyo
mutuo y solidaridad en tiempos de pandemia. En segundo
lugar, contaremos nuestro caso, es decir, algunas de las
<www.madrid.org>.
328
acciones desarrolladas en la ciudad de Madrid, básicamente,
desde la conformación de redes vecinales que han re-editado
una respuesta desde lo colectivo y la dignidad a la crisis. A
continuación, propondremos una lectura cruzada entre las
prácticas de estas redes y las zonas más vulnerables de la
ciudad, desde la que enfatizar la importancia de las formas
comunitarias en contextos socioespaciales desiguales, y su
capacidad transformadora. Como idea transversal a todo el
escrito, y desde la consideración de este volumen colectivo
como un material para reflexionar sobre tendencias,
perspectivas y retos sobre los posibles Sures en el contexto
del post-Covid 19, pretendemos señalar la invisibilidad
relativa de estas prácticas en circuitos mediáticos y activistas,
donde, en momentos de excepcionalidad, se han ido
visibilizando otras prácticas, más espectaculares, y que nos
motivan a preguntarnos sobre los espacios de
transformación de la realidad social.
54 Ver,
por ejemplo Requeijo (2020), Hernández (2020) y en periódico El
Independiente (2020).
330
El caso: redes de apoyo mutuo y Covid-19 en Madrid
El 30 de abril de 2020, el Ministerio de Sanidad,
Consumo y Bienestar Social español publicaba un
documento recogiendo “información práctica para el
desarrollo de redes comunitarias locales en respuesta a la
pandemia de Covid-19”55. En él se identificaba a estas redes
como “estructuras de colaboración para gestionar un bien o
problema común, en este caso, la crisis sociosanitaria
provocada por la pandemia de Covid-19, en un territorio
determinado”. Efectivamente, en diversos puntos del
Estado se habían activado redes de solidaridad popular, de
cuidados entre vecinos, y, en general, prácticas y formas
comunitarias desde las que se articuló lo colectivo,
recuperando y actualizando dinámicas de autogestión y
proximidad, más allá del asistencialismo o de un servicio
personalizado de acompañamiento individual. La regulación
de las redes comunitarias locales por parte del Estado ponía
de manifiesto, así, la importancia de estas iniciativas. En un
gráfico de este documento se detallaban específicamente las
acciones que estaban desarrollando las redes comunitarias.
Cuadro 1. Redes comunitarias y Covid-19
55 Disponible en <www.mscbs.gob.es>.
331
Acompañamiento emocional (duelo, prevención de
soledad no deseada y problemas de salud mental,
prevención de la psicopatologización a través de la
elaboración colectiva de los traumas asociados).
Cuidados (de la infancia, personas mayores, enfermas,
con diversidad funcional, cuidadoras, tanto familiares,
como remuneradas, etc.).
Cobertura de necesidades básicas (techo,
alimentación, fármacos, sanidad, medidas de
protección, movilidad, comunicación, educación,
etc.).
Identificación de personas y grupos vulnerables, así
como de las barreras de acceso a la información o a las
medidas aprobadas. En este sentido, dos brechas
importantes detectadas son la brecha digital e
idiomática.
Identificación de recursos y activos para la salud y el
bienestar (grupos de apoyo, asociaciones,
voluntariado, redes vecinales, establecimientos
Colaboradores, servicios sociosanitarios, etc.).
Prevención de la infección, detección de casos y
contactos, cuidados, apoyo en la cuarentena, facilitar
tratamiento.
56Disponible en <www.mscbs.gob.es>.
57 Ver,por ejemplo,
https://twitter.com/sindicatomanter/status/1252892331331764224.
332
Cántabra de Apoyo Mutuo, que organizó cestas solidarias
desde una red con el agro y la ganadería local para dar salida
a productos previamente destinados a mercados y
restaurantes cerrados, pasando por BiziHotsa, una caja de
resistencia creada en el País Vasco para hacer frente a la
profundización de las desigualdades previas que la Covid-19
estaría agravando58.
Figura 1. Redes de apoyo mutuo ante la crisis del Covid-
19 en España.
60 Ver <https://aavvmadrid.org/quienes-somos/historia/>.
335
como la Iniciativa Legislativa Popular por la regulación de la
dación en pago, el alquiler social.61
61 Ver <www.aavvmadrid.org/noticias/el-movimiento-vecinal-con-la-
lucha-stopdesahucios/>.
336
barrio (pequeños puestos de las galerías comerciales o
mercados, pequeñas tiendas de alimentación, pero también
floristerías a pie de calle, kioskos de periódicos etc.) se
dispuso como centro de abastecimiento en el entorno
inmediato, en la proximidad. Sin embargo, en escasas dos
semanas de confinamiento, las redes pasaron a ser ingentes
dispensarios de alimentos, mostrando la crisis social que
visibilizaba la emergencia de salud pública. Las redes
vecinales, como recursos de barrio para el apoyo mutuo
ciudadano, ponían de manifiesto la insuficiencia de
estructuras y recursos públicos de protección social para dar
respuesta a los problemas sociales sobrevenidos. En nuestro
caso, en Madrid, según los datos facilitados por las Redes
Vecinales a la Federación, a la FRAVM, desde el inicio del
Estado de Alarma hasta el 30 de abril, solamente las Redes
circunscritas en el ámbito de la ciudad de Madrid habían
distribuido alimentos a más de 5.800 familias diferentes, más
de 20.000 personas.62 Hasta entonces, la FRAVM había
registrado la creación de 58 redes vecinales y 37 despensas
solidarias en sólo un mes de confinamiento. Con datos del
31 de mayo, la FRAVM cifraba en 63 las redes vecinales en
Madrid (76 en toda la Comunidad Autónoma), y en más de
50.000 personas y unas 15.000 unidades domésticas a quienes
recibían algún tipo de alimento de estas redes vecinales 63.
62 Ver <www.aavvmadrid.org/economia-empleo-y-consumo/benestar-
social/las-redes-vecinales-de-solidaridad-de-la-capital-alimentan-a-mas-
de-5-800-familias-y-mas-de-20-000-personas/>.
63 Ver <www.aavvmadrid.org/economia-empleo-y-consumo/benestar-
social/las-redes-vecinales-distribuyen-alimentos-a-mas-de-50-000-
personas-en-toda-la-region/>.
337
Cuadro 2. Redes de apoyo mutuo en Madrid
64 Ver <www.dinamizatucuarentena.wordpress.com/2020/03/25/listado-de-
las-redes-de-solidaridad-y-apoyo-de-los-distritos-y-barrios-de-madrid/>.
339
excepcionalidad. Y desde aquí, nos gustaría cerrar nuestra
aportación abriendo otra ventana, desde la que señalar la
relación entre las desigualdades territoriales en la ciudad de
Madrid y la fortaleza del apoyo mutuo.
Si la Comunidad de Madrid ha sido el mayor
laboratorio neoliberal del estado español, donde la crisis
económica de 2008 se ha gestionado desde la reducción de
gasto social, y con recortes en sectores clave como sanidad,
educación y servicios sociales, precisamente la desigualdad
territorial pre-existente ha marcado la respuesta a la crisis
social surgida a consecuencia de la pandemia.
Dicho en otras palabras:
La llamada diagonal, o línea de separación entre la ciudad
central y el segmento territorial compuesto por los distritos
de Latina, Carabanchel, Usera, Villaverde, Puente de
Vallecas, Villa de Vallecas, Vicálvaro y San Blas han
conformado durante décadas una periferia segregada de la
ciudad de Madrid. Territorios anejos, antes municipios
próximos que se convierten en distritos de la gran ciudad y
se ponen al servicio del crecimiento urbano madrileño(...)
De espaldas a la ciudad a la que pertenecen, pero de la que
no forman parte. Fuera de cualquier estrategia de
recuperación de unos territorios que han sido dinámicos,
generadores de beneficios a costa de sus propias
condiciones de vida.65
341
201966, y que, justamente, caen fuera de la diagonal de la
desigualdad de la Figura 2, excepto en un caso (Tetuán).
Estos contrastes dentro de la ciudad se reflejan también en
las 175 solicitudes totales de ayuda del distrito de Retiro
frente a las 3089 de Puente de Vallecas (distrito más
vulnerable, según el mismo indicador), y que remarcan cómo
han afrontado el colapso de los servicios sociales aquellos
distritos y barrios con mayor índice de vulnerabilidad social.
En definitiva, como vemos en la Figura 3, entendemos que
esta pandemia también ha puesto en evidencia la
territorialidad de la solidaridad y el apoyo mutuo, y su
vinculación con la desigualdad social en el caso de Madrid.
Figura 3. Madrid. La solidaridad vecinal por distritos.
Referencias bibliográficas
AMANCIO Ortega, Álvarez-Pallete y Botín, ejemplos de
solidaridad empresarial ante el Covid-19. In: El
Independiente, Economía, Madrid, 11 abril 2020.
Disponible en <www.elindependiente.com>. Acceso en 9
jul. 2020.
344
ANGULO, J.; BENGUA, J.; JIMENEZ, A.; MOLINA, J.
Madrid: Barrios 1975. Madrid: Ediciones La Torre, 1976.
AYUDAS mutuas en tiempos de pandemia. In: El Salto
Diario, Saltamontes, Coronavirus, Madrid, 24 abril 2020.
Disponible en <elsaltodiario.com/saltamontes>. Acceso
en: 9 jul. 2020.
HERNÁNDEZ VELASCO, Irene. Coronavirus en
España: las colas del hambre por la crisis de la covid-19
inundan Madrid. In: BBC News, Mundo, Londres, 25
mayo 2020. Disponible en <www.bbc.com>. Acceso em: 9
de jul. 2020.
KROPOTKIN, P. El apoyo mutuo. Un factor de la
evolución. Madrid: Ediciones Madre Tierra, 1989.
LOIS, M. Los Estados cierran sus territorios por
seguridad… pero los virus están emancipados de las
fronteras. Geopolítica(s). Revista de Estudios Sobre
Espacio y Poder, v. 11, n. Especial, 2020, p. 293-302.
LORITE, Álvaro. Las redes de cuidados de Madrid niegan
estar gestionadas por el Ayuntamiento. In: El Salto Diario,
Coronavirus, Madrid, 13 abril 2020. Disponible en
<elsaltodiario.com>. Acceso en: 9 jul. 2020.
RAMONET, I. La pandemia y el sistema-mundo. In: Le
Monde Diplomatique en Español, Ante lo desconocido,
Valencia, 25 abril, 2020. Disponible en
<www.mondiplo.com>. Acceso en: j jul. 2020.
REQUEIJO, Alejandro. Miles de personas colapsan Madrid
en coche pediendo la dimisión de Sánchez. In: Voz Populi,
Política, Madrid, 23 mayo 2020. Disponible en
<www.vozpopuli.com>. Acceso em: 9 jul. 2020.
345
SPRINGER, S. Caring geographies: The COVID-19
interregnum and a return to mutual aid. Dialogues in
Human Geography, v. 10, n. 2, 2020, p. 112-115.
346
CAPÍTULO 11
Introdução
Este texto surge de uma leitura ambiental sobre a
mudança da natureza nos últimos acontecimentos
decorrentes da pandemia de Covid-19 e também é fruto de
uma discussão a respeito do modelo de desenvolvimento
vigente que se consolidou em determinado momento da
história no qual pôde-se obter resultados da evolução
técnico-científica, mas uma separação maior do homem e da
natureza, reduzindo essa última ao aproveitamento utilitário
e consumista.
Apesar dos inúmeros problemas de ordem ambiental
o mundo tem conquistado relevantes progressos em várias
áreas da ciência em especial no que tange às tecnologias de
comunicação, na biotecnologia, e na genética. Mas de forma
contrária, tem havido uma interrupção constante dos ciclos
regenerativos da vida quando aumenta a necessidade de
recursos naturais que leva a uma fragilidade ambiental das
mais preocupantes à qualidade de vida das pessoas em todo
o mundo. Nessa preocupação, o retorno de certos cenários
paisagísticos que não haviam sido presenciados há muito
tempo, vem promover ou ressurgir reflexões a respeito da
capacidade de resiliência que a natureza ainda produz.
Para tanto, apresentamos breve discussão sobre o
significado de natureza ao longo do período da história
moderna e contemporânea, as condições para compreender
347
a resiliência e refletir sobre os impactos antropogênicos, e,
por fim, se precisamos apostar no retorno da natureza. Pela
dimensão do tema, já sinalizamos que o debate está apenas
no começo.
Os significados de natureza
Longe de cairmos na visão isolada de natureza de um
lado e homem de outro, mas tentarmos entender nosso papel
nesse novo cenário (pandemia) capaz de revisarmos o
processo de desenvolvimento econômico e social atual,
achamos salutar discutirmos a resiliência da natureza e como
podemos repensar novos valores perante essa oportunidade
que nos é dada, apesar de muitas perdas de vidas humanas.
Nesse sentido, as águas cristalinas, o ar mais puro, as
montanhas e serras, agora visíveis, chamam a atenção do
público em várias regiões como algo quase surreal. A que
devemos isso? É possível perceber sinais da resiliência da
natureza quando diminuem os esforços aplicados sobre seus
componentes?
Esses sinais podem proporcionar o desenvolvimento
de uma reflexão acerca do que entendemos sobre sociedade
de consumo, economia de mercado, degradação ambiental,
progresso e prosperidade, guerras, doenças, pobreza? Os
questionamentos apontam a necessidade de projetar novos
cenários pós Covid-19 que possam dar sentidos e valores
sobre a interação natureza e sociedade capazes de realinhar
posturas, compreender processos e manter à disposição de
todos um mundo saudável.
Em determinado momento da história a noção de
mundo natural se contrapõe ao mundo humano, ou seja,
tratou-se a natureza de forma separada da espécie humana a
partir do método sistemático de classificação próprio das
348
ciências exatas e naturais. Na verdade, a ciência construiu por
meio de leis e teorias uma concepção de natureza passiva e
apartada de uma relação dialógica com o homem ou a
sociedade.
Surgem então os binômios homem-natureza,
sociedade-natureza, homem-meio, objeto-sujeito e outras
divisões forjadas pela experiência cientifica em promover a
taxonomia da vida e das relações. Esse rigor científico se
fortalece nas leis da Física clássica com Isaac Newton, mas
não só ele, Descartes, e o método, contribuem com a
formação de uma sociedade liberal moderna onde as
dicotomias são aceitas e reproduzidas. Gonçalves (2011),
trata dessa questão destacando que a natureza dos gregos
possuía uma compreensão diferente da que se consolidou no
mundo moderno e contemporâneo. Na era pré-socrática as
interpretações atentam para uma natureza única entendida
como totalidade e integrada com os deuses e presente em
todas as formas de vida. Destaca o mesmo:
Pensando a physis, o filósofo pré-socrático pensa o ser e a
partir da physis pode então chegar a uma compreensão da
totalidade do real: do cosmos, dos deuses e das coisas
particulares, do homem e da verdade, do movimento e da
mudança, do animado e do inanimado, do comportamento
humano e da sabedoria, da política e da justiça
(GONÇALVES, 2011, p. 31).
350
matéria e à técnica. As ciências se separam e separam o
homem da natureza.
A busca de uma separação homem-natureza ignora a
sociabilidade entre grupos culturais e a adaptação aos
diferentes ecossistemas posto que o homo sapiens e a sua
evolução se deu a partir dessa coevolução com outros seres.
Assim, a partir do final do feudalismo e inicio do capitalismo
surgiu uma forçada ideia “isso é natural” como sendo algo
para se justificar o status quo, e manter as desigualdades
sociais. O que levou ao homem ser compreendido como
individuo, tal como é dissecado o corpo do animal, o átomo,
a molécula, uma concepção atomístico-individualista
pertence a uma lógica e a uma ordem do Estado que prega a
liberdade individual (GONÇALVES, 2011).
A sociedade evolui de diversas maneiras e a tentativa
de separar natureza (desumanizada) e homem ignora a
subjetividade e paixões, apenas entendida como
propriedades do segundo. A interpretação equivocada da
teoria da evolução de Darwin também promove a concepção
da individualidade, da competição, e da seleção natural na
economia, nas relações e na predação dos recursos naturais.
A partir da segunda metade do século XX, o caráter
mecanicista da Ciência foi mais fortemente questionado
como um problema de ordem ambiental e ético. Essa fase, e
ainda nos dias atuais, é caracterizada pela crítica da
insustentabilidade dos modelos de desenvolvimento a
qualquer custo e sobre a sociedade de consumo. Grupos de
ambientalistas, muitos deles cientistas, como Raquel Carson,
denunciaram a indiscriminada aplicação de agrotóxicos, e o
fizeram também com a poluição, o desmatamento, a caça, ao
mesmo tempo em que se organizaram movimentos
ecológicos e ativistas em busca de outra perspectiva de
351
conservação da natureza contrários a uma ideia de progresso
que tomou corpo no pós-guerra.
A mudança do paradigma reducionista da Ciência
vigente desde o século XVI para um pensamento
ambientalista gerou uma revolução que não ficou somente
na ciência e política mas também na arte e cultura. Com isso,
a crise ambiental oferece uma indicação para a urgência de se
acelerar o processo de construção do novo paradigma
alternativo (MATEO e SILVA, 2009) no qual foram
elaboradas diferentes concepções que fugiam da explicação
fácil e calculada dos fenômenos da natureza e da sociedade.
Com as conferências das Nações Unidas de
Estocolmo em 1972 e a Rio-92 a necessidade de repensar o
modelo de desenvolvimento em curso toma corpo e
inúmeras outras reuniões científicas foram/são realizadas
para ajustar o discurso com uma leitura da
(in)sustentabilidade.
Boff (2008) alerta para a crise ambiental que vivemos
atualmente de maneira crítica e preocupada com as novas
gerações. Seu pensamento é interligado com o holismo onde
todos saberes precisam estar a serviço da vida no planeta.
Chama atenção, que:
É importante desenvolver uma compreensão
interdisciplinar, o que exige também uma atitude de
relacionar tudo para trás: ver as coisas em sua genealogia,
pois elas conhecem uma longa história de bilhões de anos
até chegar à forma atual. Com isso se evitam visões
ingênuas, fixantes e fundamentalistas. Exige-se igualmente
uma visão para a frente: todas as coisas, como tiveram
passado, têm também futuro e direito ao futuro (BOFF,
2008, p. 26).
353
organização e que o todo é sempre maior que a soma de suas
partes, gerando assim, a noção de totalidade, ou seja,
Esses processos estariam relacionados às constantes
dinâmicas de fluxos internos e externos de energia e matéria
a que se submete um sistema aberto, e que interferem no
comportamento interno de seus componentes, levando ou
à manutenção do mesmo por resiliência e resistência, ou à
geração de novos padrões de organização irreversíveis
(CAMARGO, 2005, p. 153).
354
As respostas que esse sistema frente às alterações
antrópicas ou de ordem natural dependerá da resiliência e
capacidade de se auto-organizar. Para isso, leva tempo, grau
de interconectividade dos subsistemas (solo, vertente,
encostas), fragilidades naturais da rocha e vegetação, que
poderão responder mais rapidamente ou mais lentamente
aos distúrbios externos (Figura 1).
O sistema quando afetado por distúrbios externos
pode alcançar a resiliência (auto-organização) ou quando o
sistema permanece sem ser afetado ocorre a resistência.
Determinadas paisagens podem adquirir estabilidade com
essas duas condições que estão dependentes da característica
funcional do conjunto biótico e abiótico e das forças
atuantes/forças controladoras existentes.
Figura 1. Reação de um geossistema perante a imposição de um
esforço ou tensão.
355
Pode-se perceber no exemplo de sistema da figura
anterior que ao aplicar um esforço sobre um geossistema, o
mesmo pode ser eliminado com o tempo, por exemplo, as
consequências de um desmatamento, e posteriormente
ocorrer uma restauração do sistema. Porém, caso o esforço
permaneça sendo aplicado, o sistema tenderá a ultrapassar o
seu limiar e se tornar mais frágil, mais vulnerável e pode
perder sua capacidade de restauração e regeneração. Um
novo equilíbrio dinâmico é restabelecido, todavia, sem a
estabilidade inicial, o que pode gerar paisagens fortemente
instáveis, tal como caracteriza Tricart (1977).
Quando a natureza e a paisagem são modificadas e
perdem sua capacidade original de estabilidade, o mecanismo
natural de autorregulação é alterado (MATEO et al., 2004)
forçando uma diminuição do potencial produtivo. Essas
paisagens dotadas de níveis de estabilidade passam por
prolongados períodos de recuperação quando sujeitas às
pressões tecnogênicas capazes de produzir uma
irreversibilidade devido ao grau de atividade humana
empregada.
Conforme Mateo et al., (Idem):
O homem não modifica as leis da natureza, mas muda de
forma significativa as condições de sua manifestação. A
interação natureza/sociedade tem um caráter complexo,
contraditório, múltiplo e histórico. A organização racional
da atividade produtiva e social exige o conhecimento das leis
naturais (p. 155).
357
Água, ar, animais: o retorno da natureza?
Esse subtítulo pode parecer contraditório pelo que já
apresentamos até aqui. Na verdade, a natureza é uma
invenção humana, estamos convencidos. Acontece que a
pandemia da Covid-19 acendeu uma faísca de esperança
quanto à busca por uma postura ética frente a essa
representação simbólica e ao mesmo tempo material, fonte
de recursos, e de tanta especulação de ordem financeira
característico de um século XXI cujas raízes estão muito
ligadas ainda na ideia de progresso e prosperidade.
As respostas às questões elaboradas na primeira parte
desse texto podem ser encontradas na reflexão de uma
natureza que teima em renascer das cinzas no meio do caos
e da desordem, agora, do ponto de vista político. A pandemia
tem comprovado que não estamos protegidos pelo bem-
estar social que outrora foi defendido por variados países e
políticos e que resulta numa enorme frustração ou sensação
de fracasso.
Santos (2000), ao desenvolver um pensamento sobre
a globalização chega a constatar que esse mundo é daqueles
que pensam com o poder da técnica e da transformação
artificial das coisas. Da democracia do mercado cujo dinheiro
é uma informação indisponível e ainda: “Das promessas que
as técnicas contemporâneas pudessem melhorar a existência
de todos caem por terra e o que se observa é a expansão
acelerada do reino da escassez, atingindo as classes médias e
criando mais pobres” (SANTOS, Idem, p.118).
Layrargues (2006) ao refletir sobre educação
ambiental e reprodução social expressa o efeito generalizante
sobre o causador da crise ambiental ser muitas vezes
atribuído à “humanidade”. Concordamos com essa assertiva
pois ficam de fora, portanto, as grandes corporações que
358
exploram minérios e água potável bem como governos
coniventes e parceiros da desigual distribuição de recursos.
Deixa claro, então que:
Assim, a repartição dos benefícios (a geração de riqueza) e
prejuízos (a geração de danos e riscos ambientais) do acesso,
apropriação, uso e abuso da natureza e recursos ambientais
em geral, através do trabalho na sociedade capitalista, é
sempre mediada por relações produtivas e mercantis, e
como tal, está sujeita à assimetria do poder nas relações
sociais, expondo ao risco ambiental os grupos sociais
vulneráveis às condições ambientais em processo de
degradação (como as populações marginalizadas nos
centros urbanos), ou dependentes de recursos naturais em
processo de exaustão (como as populações indígenas e
extrativistas) agravando a já delicada situação de opressão
social e exploração econômica a que tais grupos sociais são
impostos pelos setores dirigentes (LAYRARGUES, 2006, p.
81).
362
Figura 2. Himalaia visto ao norte da Índia.
363
Figura 3. Canal de Veneza com aves e águas menos poluídas.
Considerações Finais
O tema proposto nessa discussão é um ensaio teórico
quanto aos efeitos da pandemia e envolve certa expectativa
365
quanto a abertura para um novo pensamento sobre o
presente e o futuro da humanidade. O otimismo com pés no
chão deve prevalecer se queremos realmente produzir na
sociedade algo significativo em termos de ética,
solidariedade, respeito à todas as formas de vida. Pois “não
temos o direito de destruir o que nós não criamos” (BOFF,
2008, p. 46). Deve perpassar sempre incialmente por
questionamentos sobre que tipo de cidades queremos, quais
as relações humanas e Ciência podem ser estabelecidas, e
quais serão os modelos de desenvolvimento a seguir, ou não
seguir. A História já nos contemplou com avanços
consideráveis na Ciência, nas comunicações, na medicina,
nos transportes, mesmo assim, esse desenvolvimento foi
gerador de exclusões e principalmente de separação homem
e natureza.
A pandemia trouxe-nos uma possibilidade de
enfrentar esses tabus que se tornaram cristalizados sobre a
dominação da natureza, do progresso e do “vencer” na vida.
Estávamos crentes que a qualidade de vida dos países ricos
se explicava pela sua condição financeira ajustada capaz de
suportar adversidades sociais. O mesmo ocorre quando
olhamos para os crescentes índices econômicos da China
comunista. Seguimos um caminho, modelo e pensamento
errados. Será que podemos corrigí-lo? A natureza é a força
promotora dessa possível mudança utópica, porém essencial
e positiva pois não há outro sentido para a vida na Terra sem
a aliança com o homem.
A resiliência da natureza pode acender uma luz sobre
essa incerteza que paira sobre o futuro da humanidade nessa
fase de isolamento social. Também podemos correr o risco
de incentivar maior exploração já que a natureza se
autorregula e alcança sua estabilidade frente a novos
impactos. Porém, acreditamos que não há lugar para o
366
predomínio da ignorância frente à saúde e do bem estar em
um momento tão grave.
O epicentro da Covid-19 ocorreu na China e tem
causado um desastre humanitário dos mais impactantes na
história mundial. Além disso, o enfrentamento diferenciado
ao coronavírus pelas autoridades é uma das principais causas
para o crescimento de casos de contaminados devido à
supervalorização da economia que não pode parar de crescer
relegando a segundo plano o direito à vida.
Os contextos sociais são diferentes e complexos para
determinados grupos e setores da sociedade que atribuem
valoração à natureza conforme suas necessidades e
condições socioeconômicas. Por isso é necessário ter justiça
social e ambiental que construa uma solidariedade entre os
povos, uma maior igualdade no acesso aos produtos da
natureza e à tecnologia com respeito aos saberes ambientais.
Estaremos, enfim, justificando a razão de nossa existência
nesse mundo.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, M. et al. Paradigmas do Turismo. Goiânia:
Alternativa, 2003.
BOFF, L. Ecologia, mundialização, espiritualidade. Rio
de janeiro: Record, 2008.
CAMARGO, L. A ruptura do meio ambiente:
conhecendo as mudanças ambientais do planeta através de
uma nova percepção da ciência. A Geografia da
Complexidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
DIEGUES, A. O mito moderno da natureza intocada.
São Paulo: HUCITEC, 1996.
367
FIGUEIRÓ, A. Memória, Cultura e Resiliência na
compreensão da paisagem do Pampa: contribuição para
uma Geografia integradora. GOMES, I. (Org.). A
produção do conhecimento geográfico. Ponta Grossa:
Atena, 2018, p. 179-194.
GONÇALVES, C. Os (des)caminhos do meio
ambiente. São Paulo: Contexto, 2011.
HIMALAIA fica visível para Índia após quarentena contr
coronavirus derrubar poluição. In: Folha de S. Paulo,
Coronavírus, São Paulo, 9 abril 2020. Disponível em
<www.folha.uol.com.br>. Acesso em 12 mai.2020.
LAYRARGUES, P. Muito além da natureza: educação
ambiental e reprodução social. LOUREIRO, Carlos
Frederico B. LAYRARGUES, Philippe Pomier; CASTRO,
R. (Org.). Pensamento Complexo, dialética e educação
ambiental. São Paulo: Cortez, 2006, p. 81-99.
LEFF, E. Epistemologia Ambiental. São Paulo: Cortez,
2006.
MATEO RODRIGUEZ, J.; SILVA, E. Educação
Ambiental e desenvolvimento sustentável: problemática,
tendências e desafios. Fortaleza: Edições da Universidade
Federal do Ceará, 2009.
MATEO RODRIGUEZ, J. et al. Geoecologia das
paisagens: uma visão geossistêmica da análise ambiental.
Fortaleza: Edições da Universidade Federal do Ceará, 2004.
QUARENTENA faz vida animal ressurgir nos canais de
Veneza. In: Revista Fórum, Coronavírus, São Paulo, 20
março 2020. Disponível em <www.revistaforum.com.br>.
Acesso em: 12 ma1. 2020.
368
SANTOS, M. Por uma outra globalização: do
pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro:
Record, 2000.
SOUZA, R. Concepções de natureza e tendências do
ambientalismo: contribuições ao debate geográfico entre
ambiente e paisagem no Brasil. Geonordeste, n. 2, ano XX,
2009, p. 133-153.
TRICARD, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro: Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, 1977.
369
370
CAPÍTULO 12
Introducción
La llegada de la Covid-19 a la escena laboral fue en
todos los casos impactantes. Las transformaciones
estresaron tanto el tiempo y el uso de espacio, como las
dinámicas de producción; las jerarquías atravesadas por
espacios físicos. Entre los grandes cambios, se impone lo que
Bifo (2017) denomina como cybertiempo, que implica la
habilidad de la atención social para procesar información y
aplicar labores a tiempo de modo orgánico, cultural y
emocional. En contraposición a la noción infinita de
cyberespacio; el cybertiempo muy limitado.
Las horas frente a pantallas se duplicaron en algunos
casos, con respecto al periodo inmediato y anterior a la
pandemia (WINTHER, 2020). En lo laboral, algunos
empleos pasaron de una semivirtualidad, a la virtualidad total,
como el caso de la docencia en todos los niveles; mientras
que otros mantuvieron sus presencialidades con reducciones
horarias. En el sector de salud, hubo un incremento en las
demandas laborales, que en casos como en el que se
presentamos, se asociaron problemas en el sistema de salud
en relación al pago de salários (TÉLAN, 2020),
371
disponibilidad de recursos y sistematización de la
información.
En Chubut, la figura del Trabajador Comunitario de
Salud en Terreno (ex-agente sanitario), fue profesionalizada
en 2009 (a través de la creación de la Tecnicatura Superior
nn Gestión de Salud Comunitaria) y forma parte del sistema
de salud. Entre las funciones establecidas en sus normas
fundantes se indica que el Trabajador Comunitario de Salud
en Terreno “Debe favorecer la construcción conjunta con la
población del conocimiento sobre cómo se reproduce el
proceso salud-enfermedad en los grupos sociales, qué le
sucede a los individuos de una población, cuándo, dónde y
sobre cuáles son los factores de protección con los que
cuenta la comunidad así como los factores de riesgo a los que
está expuesta. A partir del intercambio de conocimientos
entre la comunidad y el sistema de salud se busca generar
procesos de transformación en ambos sectores que
favorezcan el desarrollo de autocuidado y autogestión por
parte de los sectores comunitarios”67.
En este contexto formal, atravesados por un sistema
de jerarquías, los trabajadores comunitarios de salud en
terreno, abordan una labor de acompañamiento, seguimiento
a través de visitas sistemáticas a las familias, tanto en áreas
urbanas como rurales de la provincia de Chubut. Así, el
conocimiento que poseen sobre las condiciones
poblacionales es esencial, al tiempo que funcionan de nexo
entre otros profesionales de los CAPS (Centros de Atención
Primaria de la Salud), Puestos Sanitarios y Hospitales en las
distintas localidades. Algunas publicaciones respecto a este
espacio profesional pueden encontrarse en Escudero (2013),
Contexto problemático
El escenario de trabajo de las/los trabajadores
comunitarias/os tiene dos puntos clave. El primero es el
“terreno”, que implica la ejecución de las tareas desarrolladas
de relevamiento, monitoreo y acompañamiento, fuera de los
CAPS, Puesto Sanitario u Hospitales. Esto implica que la
tarea se produce escencialmente realizando visitas
presenciales a diferentes viviendas. Por otro lado, el
componente que acompaña esta tarea, es el formulario
denominado “planilla de familia”, que se utiliza para el censo
y/o relevamiento en las llamadas “rondas sanitarias” (4
rondas al año) realizadas por los trabajadores comunitarios
regularmente, en donde se visitan según requiera cada
familia. Estas planillas de familia, están impresas en papel y
373
son parte del registro que engloba la información que cada
trabajadora comunitaria compone. A su vez, en cada
vivienda visitada, los trabajadores comunitarios
censan/relevan cambios en los datos sociodemográficos,
realizan el control de libretas sanitarias para corroborar la
vacunación de todo el grupo familiar, seguimiento de
controles de embarazadas, Controles de salud, etc. Además
de realizar tareas de prevención, promoción y educación para
la salud. Este sistema, como ya hemos mencionado en
(DIEZ TETAMANTI et al., 2018) forma parte de una
instrumentación poco práctica para la gestión de la
información, dado que los datos recabados son
posteriormente informados mediante planillas de síntesis que
producen una pérdida de la información primaria.
Ante esto, entre 2014 y 2016 desde el Grupo de
Investigación Geografía Acción y Territorio estuvimos
abocados al desarrollo del sistema App+Salud. La propuesta
pretendía informatizar la tarea de relevamiento y monitoreo
de modo que la información pudiera ser regionalizada,
localizada y geo-localizada. Este proyecto quedó en fase de
desarrollo beta, pero todo el proceso de creación del sistema
fue acompañado por las trabajadores comunitarios, de modo
que la propia experiencia de los registros quedara implicada
en el acto creativo de la aplicación. Así, como anteriormente
relatábamos, el desarrollo de App+Salud, fue “en sí mismo
un proceso de experiencia implicada y compartida entre
sujetos diferentes, lugares diferentes, prácticas diferentes y
profesiones diferentes. En esencia, desde una perspectiva
deleuziana, es la diferencia puesta en diálogo y sus fuerzas en
resistencia, que se pone a producir elementos nuevos, a partir
de su propia complejidad rica en sí misma, desde la
multiplicidad (DIEZ TETAMANTI, ROCHA et al., 2018, p.
125).
374
A partir de lo anterior, se realizaron varias jornadas
de capacitación y ajustes de la aplicación App+Salud en la
provincia del Chubut. Desde estos espacios, desde el
GIGAT se establecieron fluidos diálogos con las
trabajadoras comunitarias, a partir de los cuales también se
generaron otras propuestas, como la de intercambios de
experiencias de Trabajadores Comunitarios de salud en
Terreno de 2014 y 2019 (DIEZ TETAMANTI y
ARMESTO, 2016; DIEZ TETAMANTI, HEREDIAS et al.,
2019).
Relatamos todo este proceso como antesala de la
reescritura del vínculo entre los trabajadores comunitarios y
el GIGAT que se compone en este texto; la cual a partir del
evento Covid-19 produjo nuevos enfoques para el abordaje
en esquemas de relevamiento, sistematización y transferencia
de la información.
Producción de sentidos
Hasta marzo de 2020 las tareas cotidianas de los
trabajadores comunitarios se desarrollaban con las
singularidades habituales. La llegada de la Covid-19 al país,
inició una escalada de Decretos y Resoluciones, tanto
nacionales como provinciales68 que modificó la dinámica de
todos los aspectos de la vida.
377
El sistema de KoboToolbox, permite realizar
formularios de encuestas que a su vez facilitan registrar el
geoposicionamiento y otros elementos, como fotografías,
líneas y puntos, entre otros. El registro, puede realizarse
tanto desde un link, que puede ser enviado por mensajería
como Whatsapp© o bien mediante la aplicación para Android
KoboCollect. En ambas opciones, existe la posibilidad de
realizar el registro con conexión de internet o bien en modo
“sin conexión” (off-line), para lo cual el sistema prevé la
transferencia en el momento en el que se conecta a la red.
Los últimos días de mayo de 2020 se comenzó
intensamente con el trabajo de levantamiento de información
mediante KoboToolbox (Figura 2), al tiempo que fue
adaptándose el formulario en el curso de los días, a nuevos
requerimientos que irían emergiendo desde diferentes
sectores, como el Área Externa del Hospital Trelew y del
Hospital Subzonal Rawson.
Figura 1. Relevamiento de datos en visitas domiciliarias en
operativos vinculados a la Covid-19.
378
El abordaje de diseño de formularios, plantilla y
sistema de levantamiento de datos, fue realizado
integralmente por las trabajadoras comunitarias, lo que
ponen en evidencia que para ninguno de los procesos: a)
producción del formulario; b) puesta en implementación y
levantamiento; y c) procesamiento de la información; es
necesario tener conocimientos de informática. De este
modo, la transferencia de datos hacia el Ministerio de Salud
se simplificó, en tanto se incrementó la complejidad, el
volumen y la calidad de la información.
Así, además de los datos normalmente registrados en
terreno, se logró sostener un registro georeferenciado que
permite descargas de datos tanto en formato para ser
utilizado en sistemas de información geográfica, como otros
visualizadores cartográficos; elemento que facilitó en gran
medida no sólo la tarea cotidiana, sino la evaluación interna
del proceso de registro y la transferencia a organismos
públicos competentes en relación a la ejecución de políticas
públicas.
A continuación se presentan dos tipos de mapeos.
Los mapas (Figura 3 y 4) han sido desenfocados con el
propósito de conservar la privacidad de la tarea desarrollada
y la singularidad del terreno abordado.
379
Figura 3. Mapeo desenfocado de puntos con despliegue de
etiquetas de información, en función de relevamiento en
Búsqueda Activa.
Conclusiones
El proceso de la experiencia de pandemia ha
facilitado y, en gran medida, forzado el aprendizaje de nuevos
sistemas, métodos y herramientas para la resolución de
problemáticas complejas. Durante años, desde la universidad
pública y el GIGAT se trabajó implicadamente con
trabajadores comunitarios, con el propósito de producir
esquemas y herramientas que faciliten tareas cotidianas. Así,
queda demostrado que los vínculos generaron frutos en la
382
emergencia, a partir de procesos que facilitan el
asesoramiento y acompañamiento, más allá de las etiquetas
institucionales.
El empleo de KoboToolbox por parte de un sector
público en Chubut, inscribe a esta experiencia como la
primera de su tipo, la cual ha demostrado inmediatos
procesos de articulación y expansión de la propuesta. Sólo
para tener en cuenta, al cierre de la redacción de este artículo,
el registro del Plan Detectar dispone de 4.600 entradas,
mientras que el Registro de ingreso de viajeros acusa 20.600
entradas. Si bien el desarrollo tecnológico es externo, la
práctica en la apropiación es local. En este sentido debemos
hacer fuerte énfasis en los procesos de apropiación de las
herramientas a utilizar. En este caso, fueron los propios
trabajadores comunitarios quienes iniciaron la búsqueda de
sistemas propicios. Al mismo tiempo, diseñaron los
esquemas de levantamiento de datos, planillas modos de
transferencia.
En última instancia, es ésta una experiencia simple
que nos enriquece. Que a su vez nos enseña que articulando
mucho es posible, mientras la posibilidad de replicabilidad
transformación se multiplica. Aprendizajes en tiempos de
pandemia...
Referencias bibliográficas
BERARDI “BIFO”, F. Fenomenología del fin.
Sensibilidad y mutación conectiva. Buenos Aires: Caja
Negra, 2017.
PROVINCIA DEL CHUBUT. Organización del trabajo
en terreno. Dirección de Promoción y Prevención.
Documento oficial. Rawson: Secretaría de Salud de Chubut,
2007.
383
ESCUDERO, B. Salud Comunitaria. La construcción de
un campo interdisciplinar. Aproximaciones desde la
formación de Técnicos en Salud. Comodoro Rivadavia:
EDUPA, 2013.
CHANAMPA, M.; DIEZ TETAMANTI, J.; DUARTE, Y.;
JAIMES, M.; GÓMEZ, P.; MARTÍNEZ, N. Accesibilidad
a la salud y estrategias de movilidad. Caso Aldea Beleiro.
Revista Informe Científico Técnico de la Universidad
Nacional de la Patagonia Austral, v. 7, n. 1, 2015, p. 54-
77
BARRIA OYARZO, C. Gestión de políticas públicas en
salud: mujeres migrantes en una ciudad de la Patagonia,
Argentina. Anthropologica del Departamento de
Ciencias Sociales, v. 38, n. 44, 2020, p. 157-185.
DIEZ TETAMANTI, J.; ARMESTO, S. Salud
Comuniatria Territorio de relatos. Comodoro Rivadavia:
EDUPA, 2016.
DIEZ TETAMANTI, J.; AGÜERO, G.; HEREDIAS, T.;
GÓMEZ, P. INTER18 Mundos y experiencias
compartidas en Salud Comunitaria Urbano Rural.
Buenos Aires: Margen, 2020.
DIEZ TETAMANTI, J.; ROCHA, E.; MUNSBERG, G.;
PEIXOTO, J.; SANTOS, A.; JAIME, S.; SCHULER, J.
Desarrollo de un sistema georreferenciado para la gestión,
movilidad y monitoreo de atención primaria de la salud
comunitaria. Salud Colectiva, v. 14, n. 1, 2018, p. 121-137.
TÉLAM, Agencia. Chubut: pese al Covid-19, trabajadores
de la Salud paran por atraso en el pago de salarios. In:
Télam: Agencial Nacional de Noticias, Política, Buenos
384
Aires, 5 octubre 2020. Disponible en <www.telam.com.ar>.
Acceso en: 13/10/2020.
WINTHER, K. Rethinking screen-time in the time of
COVID-19. In: Unicef Global, Office of Global Insight
and Policy, New York, 7 abril 2020. Disponible en
<www.unicef.org>. Acceso en: 13/10/2020.
385
386
AUTORES
Adelaide Macaba Bozagari
Mestre em Sistemas de Informação Geográfica
Aplicadas em Ambiente pela Université d’Orléans
(França) e Doutora em Geografia, Desenvolvimento
Territorial e Geomática Aplicada na Gestão de
Riscos Ambientais Urbanos pela Université de Paris
VIII (Saint-Denis, França). Atua na Escola Nacional
de Estatística do Instituto Nacional de Estatística
(Moçambique).
Elisa Magnani
Graduada em Língua e Literatura Estrangeira pela
Università di Bologna (2001) e Doutora em
Qualidade Ambiental e Desenvolvimento
Econômico Regional pela Università di Bologna
(2005). Docente e Pesquisadora vinculada à Alma
Mater Studiorum Università di Bologna (Itália).
387
Evanildo Santos Cardoso
Graduado em Geografia e mestre em
Desenvolvimento e Meio Ambiente (Universidade
Federal do Ceará) e doutor em Geografia
(Universidade Federal de Goiás). Docente do Curso
de Geografia e do Programa de Pós-graduação em
Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal
do Oeste da Bahia (Brasil).
388
Universidad Nacional de Patagonia San Juan Bosco
(Argentina).
María Lóis
Graduada em Ciências Políticas (Universidad
Complutense de Madrid), diplomada em Geografia
(University of California) e doutora em Ciências
Políticas (Universidad Complutense de Madrid).
Docente do Departamento de História, Teoria e
Geografia Políticas da Universidad Complutense de
Madrid (Espanha).
391
392