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Instituto Politécnico de Lisboa

Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa

Dietética e Nutrição 2021/2022

Obesidade e dislipidemia

UC Patologia Aplicada em Dietética I

2º Ano - 1º Semestre

Discentes: Docente:
Alba Sciacca nº 2020683 Prof. José Silva Nunes
Diana Veríssimo nº 2020242
Filipa Bernardo nº2020250
Inês Carretas nº 20202244
Mafalda Proença nº2019406
Mariana Caldinhas nº2020256
Sara Alves nº2020273
Tânia Arraiolos nº2020105
dezembro de 2021
Índice

1. Introdução ............................................................................................................................ 1

2. Obesidade e dislipidemia ..................................................................................................... 2

2. Hipertrigliceridemia e hipercolesterolemia na dislipidemia ............................................ 4

3. Efeito da insulina na produção de VLDL no fígado ......................................................... 7

3.1. Produção Hepática VLDL ............................................................................................ 7

3.2. Insulina na Produção de VLDL ................................................................................... 7

4. Diminuição do colesterol HDL ............................................................................................ 8

5. Papel das adipocinas produzidas pelo tecido adiposo na dislipidemia ........................... 9

6. Vitamina D na dislipidemia............................................................................................... 11

7. Tratamentos e fármacos para dislipidemia no paciente obeso ...................................... 13

8. Epidemiologia/estatísticas ................................................................................................ 15

9. Referências Bibliográficas ................................................................................................. 17

ii
1. Introdução
No âmbito da unidade curricular de Patologia aplicada à dietética I, foi-nos proposta a
realização de um trabalho cujo tema é a relação entre a obesidade e a dislipidemia.
Ao longo deste trabalho serão abordados diversos fatores que relacionam a
fisiopatologia da obesidade com a dislipidemia, será primeiramente apresentado um breve
resumo acerca desta relação. De seguida, serão esclarecidos os conceitos de
hipertrigliceridemia e de hipercolesterolemia na dislipidemia, será também explicado o efeito
da insulina na produção de lipoproteínas de densidade muito baixa (VLDL) no fígado,
explorando o mecanismo de produção hepática de VLDL e o papel da insulina na produção de
VLDL.
De seguida, será abordado o tema da hipolipidemia que leva à diminuição do colesterol
de lipoproteínas de alta densidade (HDL-c), esta relação surgirá mais detalhada ao longo do
trabalho.
Um fator de realce que contribui para a dislipidemia é o tamanho dos adipócitos, por
isso, será abordado o papel das adipocinas produzidas pelo tecido adiposo e a sua influência na
dislipidemia. Também a Vitamina D está relacionada com a dislipidemia, razão pela qual está
mencionada no trabalho.
No paciente obeso com dislipidemia são aplicados vários tipos de tratamentos e são
utilizados diversos fármacos, estes serão também abordados ao longo do trabalho, assim como
as várias opções na fase de tratamento.
Por fim, serão apresentados dados epidemiológicos e os resultados de alguns estudos
que estabelecem uma relação entre a obesidade e a dislipidemia.

1
2. Obesidade e dislipidemia
A obesidade é o distúrbio nutricional mais comum em todo o mundo e é um dos
principais fatores de risco para a doença cardiovascular aterosclerótica (1). Segundo a
Organização Mundial da Saúde (OMS), esta patologia é considerada o quinto fator de morte
em todo o mundo, uma vez que é um fator de risco para o desenvolvimento de várias doenças
crónicas (2). Em todos os países do mundo, a incidência da obesidade está a aumentar
continuamente e, portanto, espera-se que a morbidade, mortalidade, custos médicos e
económicos também aumentem (3). A maioria dessas complicações está relacionada a
condições comórbidas que incluem a doença arterial coronária, hipertensão, diabetes mellitus
tipo 2, distúrbios respiratórios e dislipidemia (3). A obesidade é considerada uma patologia
relacionada à etiologia da dislipidemia uma vez que ambas partem da mesma fonte de fatores
de risco, maioritariamente originados por uma dieta pobre em nutrientes e rica em gorduras e
açúcares (2).

A dislipidemia pode ser definida como um quadro clínico assinalado por concentrações
anormais de lípidos ou lipoproteínas no sangue, determinadas por fatores genéticos e/ou
ambientais (2). Como tal, esta patologia pode ser classificada como dislipidemia primária ou
secundária. A dislipidemia primária é de origem genética e hereditária (poligénica ou
oligogénica) à qual se podem associar fatores ambientais e comportamentais. Já a dislipidemia
secundária é a consequência da coexistência de outras doenças como a diabetes mellitus,
obesidade, hipotiroidismo entre outras patologias e ainda a estilos de vida desequilibrados (4).
Dessa forma, analisando a definição de dislipidemia, é possível afirmar que a obesidade é um
fator de risco para o desenvolvimento da mesma, pois promove o aumento do colesterol,
triglicéridos e redução de HDL-c (2).

O excesso de tecido adiposo parece ser a origem direta da dislipidemia associada à


obesidade abdominal, fazendo com que mais ácidos gordos livres sejam encaminhados para o
fígado contribuindo para a resistência à insulina (5). Como sabemos, o tecido adiposo é um
órgão metabolicamente dinâmico, servindo como tampão para controlar o metabolismo
energético e regulador da função endócrina relacionada às doenças cardiovasculares (1). Na
obesidade há um excesso de tecido adiposo, onde os adipócitos sofrem hipertrofia e manifestam
várias propriedades metabólicas alteradas que podem desempenhar um papel fundamental nas
alterações de lipoproteínas de alta densidade (HDL) relacionadas à obesidade (1).

2
Os pacientes obesos apresentam alterações lipídicas classificadas como “dislipidemias
aterogénicas”(6). Esta patologia possui um espetro de anomalias lipídicas qualitativas, que
refletem perturbações na estrutura, metabolismo e atividade biológica das lipoproteínas, que
são ocasionadas pela resistência à ação da insulina(6). Esta doença é caracterizada por um
número elevado de partículas provenientes do colesterol de lipoproteínas de baixa densidade
(LDL-c), níveis baixos de colesterol HDL e um número elevado de triglicéridos (6).

3
2. Hipertrigliceridemia e hipercolesterolemia na dislipidemia
A obesidade central é a principal causa de resistência à insulina e hiperinsulinemia
compensatória, que por sua vez são responsáveis por quase todos os distúrbios associados a
lipoproteínas, podendo resultar na ocorrência da dislipidemia secundária à obesidade. Existem
três componentes principais da dislipidemia que ocorre na obesidade: aumento das
lipoproteínas ricas em triglicéridos (TG), diminuição do colesterol HDL e aumento de
partículas pequenas e densas de LDL.(7)

Os lípidos são insolúveis no plasma sanguíneo, portanto, circulam no sangue ligados a


proteínas na forma de lipoproteínas. Na superfície das lipoproteínas encontram-se os lípidos
anfipáticos e as apolipoproteínas, as quais exercem funções específicas na regulação do
metabolismo lipídico como cofatores enzimáticos, ligantes para os receptores nas células e
tecidos pelo organismo, ou através da manutenção estrutural das partículas de lipoproteínas.
No núcleo da lipoproteína estão os lípidos apolares, como colesterol esterificado (EC) e TG. A
densidade das lipoproteínas é devido à proporção relativa de lípidos e proteínas. As
lipoproteínas mais ricas em lípidos são os quilomícrons e as mais ricas em proteínas são as
HDL. As VLDL transportam TGs sintetizados no fígado, ou seja, de origem endógena, à
medida que vão sendo hidrolisadas, as VLDL podem dar origem às lipoproteínas de densidade
intermédia (IDL) e às LDL. Na dislipidemia da obesidade existe uma hipertrigliceridemia
(triglicéridos elevados), em parte devido ao aumento do fluxo de FFA para o fígado, o que leva
à acumulação hepática de TG 3. Isto leva a um aumento da síntese hepática de VLDL, o que
dificulta a lipólise dos quilomícrons devido à competição principalmente ao nível da lipase de
lipoproteína (LPL).(8)

O mecanismo de ação da dislipidemia é muito complexo e o presente trabalho não tem


como objetivo centrar-se na parte bioquímica, no entanto vão ser explicados os mecanismos
envolvidos na hipertrigliceridemia e hipercolesterolemia de maneira resumida e pontual.

A capacidade de armazenamento de triglicéridos no tecido adiposo é determinada


geneticamente em função das possibilidades que os adipócitos têm de sofrer processos de
hiperplasia e hipertrofia. Na obesidade, o adipócito sofre sobrecarga excessiva de triglicéridos,
sofrendo hipertrofia com mudanças morfológicas e funcionais.(9)

Devido à alteração do adipócito, este vai gerar uma proteína que atrai monócitos e
macrófagos (MCP -1), uma vez que está a ocorrer uma alteração de uma célula. Estes

4
macrófagos libertam citocinas pró-inflamatórias, nomeadamente interleucinas (IL-6), fator de
necrose tumoral alfa (α-TNF) entre outras. É por isto que os doentes obesos se encontram num
estado de inflamação crónica. (10)

O aumento do fator de necrose tumoral alfa (α-TNF) provoca uma resistência à insulina
e consequentemente comorbilidades associadas, tais como dislipidemia e DM2. (10)

A hipertrigliceridemia é causada por um aumento na formação hepática de VLDL,


principalmente devido ao excesso de gordura visceral ou deficiência na eliminação dessas
partículas devido à redução da atividade do LPL. O aumento dos TG também está associado
com a síntese de pequenas partículas densas de LDL, que são altamente aterogénicas. (7)

A produção hepática excessiva de VLDL parece ser o defeito principal e crucial do


estado de resistência à insulina acompanhado da obesidade e hiperinsulinemia compensatória.
(7)

Para além da superprodução hepática de VLDL, a resistência à insulina na obesidade é


caracterizada por uma diminuição na remoção de lípidos ricos em TG. A insulina estimula a
atividade das LPL, aumentando o mRNA das LPL e, assim, aumentando a sua taxa de síntese.
A atividade das LPL no músculo esquelético de indivíduos com resistência à insulina tem
mostrado ser inferior, sugerindo uma desregulação das LPL pela insulina. Assim, a diminuição
da atividade das LPL e a sua massa na resistência à insulina retarda a cascata metabólica normal
das lipoproteínas, resultando numa diminuição na depuração de VLDL e aumento de TG
livres.(7)

Outra alteração lipídica presente na dislipidemia é a hipercolesterolemia. A


hipercolesterolemia é o aumento do colesterol no sangue associado a um incremento das LDL
na circulação.

No estado de resistência à insulina, a composição e distribuição das partículas de LDL


é alterada com um aumento na concentração de partículas densas e pequenas de LDL. A
partícula LDL é caracterizada por um centro lipídico formado principalmente de ésteres de
colesterol e pela apolipoproteína B-100 (Apo B-100) que permite o reconhecimento celular
mediante recetores LDL das células. Nos estados de resistência à insulina, o incremento na
concentração e diminuição na excreção das VLDL induz o aumento da troca entre os ésteres
de colesterol LDL e triglicéridos VLDL (TG-VLDL), processo mediado pela proteína de

5
transferência de ésteres de colesterol (CETP). Esta troca produz partículas LDL ricas em
triglicéridos as quais são hidrolisadas rapidamente pela lipase hepática (LH), ficando assim
partículas LDL mais densas e pequenas, ricas em colesterol. O aumento destas partículas no
sangue favorece o depósito de placas de ateroma no interior de artérias e explica grande parte
do risco cardiovascular (CV) (7)

6
3. Efeito da insulina na produção de VLDL no fígado

3.1. Produção Hepática VLDL

A diminuição dos níveis de lípidos hepáticos leva à degradação,no interior das células,
da maioria da apoB sintetizada. Por sua vez, o aumento dos TG hepáticos conduz à diminuição
da degregadação da apoB e a produção de VLDL é facilitada.

As principais fontes de TG em jejum no fígado são ácidos gordos derivados do tecido


adiposo e entram no fígado; ácidos gordos derivados de quilomicrons e VLDL absorvidos pelo
fígado e ácidos gordos produzidos pela lipogénese hepática de novo (DNL). Entre eles, o FFA
circulante é a principal fonte de VLDL-TG. (11)

3.2. Insulina na Produção de VLDL


A insulina suprime a produção de VLDL-TG pela redução do FFA, ou diretamente,
independentemente da disponibilidade de substrato.

Uma das etapas limitantes na produção hepática de VLDL passa pela transferência de
lípidos neutros para a apoB, realizada pela proteína de transferência de triglicérido microssoma
(MTP). A expressão da MTP é regulada negativamente pela insulina, ou seja, a resistência à
insulina estimula a atividade da MTP e, assim, aumenta a síntese do VLDL.

No entanto, há possibilidade de que hiperinsulinemia a longo prazo cause obesidade, o


que fornece FFA suficientes para superar o efeito supressor da insulina na produção de VLDL.

Estudos demonstram que a administração de insulina, em humanos, reduziu a produção


de VLDL-TG. Este efeito supressor direto não se refletiu em indivíduos obesos com resistência
à insulina. (11)

7
4. Diminuição do colesterol HDL

As HDL têm a função de transportar o LDL-c, das artérias e corrente sanguínea até ao
fígado, para posterior deposição/metabolização, sendo conhecidas como o “bom” colesterol.

Vários estudos demonstram que o perfil lipídico em obesos metabolicamente não


saudáveis revela uma redução do colesterol da lipoproteína de alta densidade. Sendo as altas
concentrações TG acompanhadas de concentrações diminuídas de HDL-C as principais
características da dislipidemia.

Esta redução ocorre uma vez que a obesidade influencia todo o metabolismo dos
esfingolipídios. Os investigadores descobriram um aumento na quantidade de esfingolipídios
múltiplos, incluindo S1P em adipócitos de indivíduos obesos. Além disso, os níveis
plasmáticos de S1P em humanos obesos, foram relatados como elevados.

S1P é uma molécula bioativa que pertence à família dos esfingolípidos produzidos no
corpo, com uma ampla gama de funções fisiológicas, no qual se forma a partir de eritrócitos,
plaquetas e células endoteliais na circulação. A maior parte da S1P no plasma está ligada às
partículas de HDL e a restante à albumina e outras lipoproteínas plasmáticas. Portanto, a
interação de S1P com lípidos séricos está predominantemente relacionada com a estrutura e
função de HDL. (TECO) O transporte da S1P dentro de partículas de HDL ocorre devido à
apolipoproteína M (apoM), sendo que esta transporta o excesso do colesterol das células
periféricas de volta para o fígado num processo referido como transporte reverso do colesterol.
(12) Essa apolipoproteína contribui para os efeitos ateroprotetores das HDL, aumentando o
fluxo do colesterol e as propriedades antioxidantes das HDL, mas também serve como parceiro
da S1P. A evidência científica defende que as ações ateroprotetoras das HDL dependem
fortemente da presença de S1P, bem como que os efeitos de S1P são mediados por associações
com as partículas das HDL.

A capacidade das HDL de atuarem contra a apoptose depende da presença de S1P e


apoM. Por outro lado, os efeitos antiapoptóticos de S1P foram mais proeminentes no complexo
com apoM e HDL, em comparação com S1P livre ou seu complexo com albumina. Também
existem evidências que comprovam as propriedades anti-inflamatórias e vasodilatadoras do
S1P. (13)

8
5. Papel das adipocinas produzidas pelo tecido adiposo na
dislipidemia
Um fator importante para determinar o grau em que o tecido adiposo contribui para a
dislipidemia é o tamanho dos adipócitos. Existe uma relação de proporcionalidade direta entre
a lipólise, os adipócitos e os níveis de ácidos gordos livres, tal como já referido quando um
destes de encontra aumentado, o mesmo acontece com os outros fatores.

Os níveis de TNF-alfa são mais elevados no plasma de pacientes com hiperlipidemia


quando comparado com níveis controlados, estando positivamente relacionados com a
concentração das VLDL. O TNF-alfa estabelece uma relação de proporcionalidade direta com
a superprodução das VLDL. Também a IL-6 está associada à hipertrigliceridemia. Assim,
indivíduos com hipertrigliceridemia têm maior capacidade de produção de IL-6 e TNF-alfa, os
níveis elevados de IL-6 estão associados a níveis elevados de triglicéridos séricos.

Quando os níveis de citocinas anti-inflamatórias estão aumentados, os níveis de


triglicéridos plasmáticos também estão aumentados. Em conjunto com o TNF-alfa, as citocinas
pró-inflamatórias, estimulam a síntese de triglicéridos nas células hepáticas e podem ainda
promover a lipólise nos adipócitos. Os níveis séricos de citocinas pró-inflamatórias, como o
TNF-alfa e IL-6, estão negativamente correlacionados com os níveis de colesterol HDL sérico
em indivíduos saudáveis e em pacientes com doenças cardiovasculares. A correlação positiva
estabelece-se, sim, entre os níveis séricos de citocinas anti-inflamatórias e os níveis plasmáticos
de colesterol HDL.

Ao serem administradas citocinas pró-inflamatórias a expressão de Apo A1 fica


reduzida nas células hepáticas e no plasma. Apo A1 é o principal componente proteico das
HDL no plasma, sendo que baixas concentrações de Apo A1 são preditores independentes da
presença e gravidade da doença cardiovascular.

Por oposição ao que acontece com o colesterol HDL, as citocinas pró-inflamatórias


aumentam o colesterol total circulante e os níveis de colesterol LDL.

A SAA é uma apolipoproteína que pode substituir a Apo A1 como principal


apolipoproteína das HDL, esta é encontrada no tecido adiposo e no fígado de humanos, sendo
que a expressão de SAA no tecido adiposo e os níveis circulantes de SAA são mais elevados

9
em indivíduos obesos do que em indivíduos em eutrofia, estes níveis podem ser reduzidos
através da restrição calórica.

O tratamento com SAA aumenta a expressão das citocinas pró-inflamatórias em pré-


adipócitos e adipócitos. O metabolismo do colesterol HDL é afetado pela SAA através de
efeitos inibitórios na ligação das HDL e pela captação seletiva de lípidos mediada pelo recetor
sequestrante, este é um recetor das HDL que intervém na captação celular de ésteres de
colesterol HDL, promovendo o transporte reverso do colesterol da periferia para o fígado.
Sugeriu-se ainda que um potencial contribuinte para a aterosclerose poderia ser o SAA por
mediar a retenção das HDL enriquecido com SAA. Assim, o aumento da expressão de SAA
pode promover dislipidemia por afetar a estrutura e funções das HDL, assim como a
inflamação.

A adiponectina contribui com um efeito benéfico no metabolismo lipídico,


desempenhando também um papel importante como adipocina vasoprotetora. Existe uma
correlação negativa entre os níveis de adiponectina plasmática e os triglicéridos e, por oposição,
uma correlação positiva com o colesterol HDL. Assim, níveis reduzidos de adiponectina estão
associados à dislipidemia e a doenças cardiovasculares.

A adiponectina é responsável pela estimulação da oxidação dos ácidos gordos. A


utilização da glicose através da ativação da AMPK no fígado e no músculo esquelético tem
sido associada a muitos dos efeitos positivos da adiponectina no metabolismo das lipoproteínas,
bem como na sensibilidade à insulina. (14)

10
6. Vitamina D na dislipidemia
A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel necessária para manter a homeostase do
cálcio e do fósforo no organismo e desempenha também um papel importante em vários
processos fisiológicos sendo capaz de exercer uma ação endócrina, parácrina e autócrina. A
maior parte desta vitamina pode ser obtida por via endógena por ação da radiação ultravioleta
da luz solar na pele ou uma pequena parte por via exógena através da alimentação.

Para se tornar ativa e poder desempenhar diversas funções no organismo necessita de 2


hidroxilações, inicialmente no fígado originando o calcidiol e posteriormente no rim
originando o calcitriol. A vitamina D é transportada no sangue por uma glicoproteína, ligando-
se aos vários tecidos alvo através dos receptores da vitamina D presentes em quase todas as
células.

A hipovitaminose D é um problema de saúde pública mundial e está relacionada com o


estilo de vida sedentário, com pouca exposição solar, o uso de protetores solares, a idade
avançada, maus hábitos alimentares, má absorção alimentar, doença renal e hepática. Também
está associada com fatores de risco da síndrome metabólica como a obesidade, resistência à
insulina, dislipidemia, hipertensão. Estes fatores de risco contribuem para desenvolver diabetes
tipo 2 e doenças cardiovasculares, que são as principais causas de morbilidade e mortalidade
em todo o Mundo.

Geralmente em indivíduos obesos encontram-se níveis baixos de vitamina D e por isso


alguns estudos referem uma relação inversa entre o índice de massa corporal ( IMC ) e os níveis
séricos de vitamina D. Também níveis altos de vitamina D foram associados a menor
quantidade de gordura visceral e subcutânea. Como a vitamina D é lipossolúvel tem tendência
para ficar armazenada no tecido adiposo e não estar disponível quando necessário, pois o seu
armazenamento no tecido adiposo permite aumentar consideravelmente a sua semi-vida,
podendo provocar níveis baixos da vitamina(15).

Vários estudos confirmam a alta prevalência de deficiência de vitamina D em


indivíduos obesos. Porém ainda não é conhecido o mecanismo responsável por esta associação,
mas várias hipóteses foram colocadas como a relação da vitamina D com características
antropométricas, fisiológicas e comportamentais da obesidade, a interação entre dislipidemia e
a vitamina D e o papel da inflamação relacionada com a obesidade.

11
Mas o que se torna comum em todas as hipóteses é que a deficiência de vitamina D é
mais o efeito da obesidade do que propriamente a sua causa.

Existem muitas evidências que demonstram que a vitamina D tem ações de apoptose
nos adipócitos. E mais recentemente descobriu-se uma ativação autónoma desta vitamina nos
adipócitos, demonstrada pelo aumento de vitamina D no tecido adiposo que poderá ter efeitos
protetores na prevenção da hiperplasia dos adipócitos.

Até aos dias de hoje vários estudos têm sido feitos para tentar perceber a interação entre
a deficiência de vitamina D e a dislipidemia bem como as suas complicações. Porém, estes
estudos não conseguem chegar a uma conclusão a respeito da relação dos metabólitos de
vitamina D com os lípidos séricos (13).

Não podemos esquecer os efeitos indiretos da vitamina D através da alteração de


concentrações de cálcio, pois maior concentração de cálcio implica um aumento da excreção
de gordura fecal promovendo efeitos benéficos no perfil lipídico. (13)

A maioria dos estudos feitos não conseguem estabelecer uma dose adequada de
vitamina D e o próprio conhecimento da relação entre a hipovitaminose D e o risco de
desenvolver a síndrome metabólica é importante para estabelecer se a suplementação da
vitamina poderá ser usada para prevenção de todas estas patologias.

A síndrome metabólica é caracterizada por obesidade central muito aumentada


(perímetro abdominal > 102 cm no homem e > 88 cm na mulher), hipertensão (tensão arterial
≥ 135/85 mmHG), triglicéridos aumentados (≥ 150 mg/dl), níveis séricos de colesterol HDL
baixos (≤ 40 mg/dl no homem e ≤ 50 mg/dl na mulher) e glicemia em jejum ≥ 100 mg/dl. Estes
são fatores de risco relacionados com as dislipidemias. (16).

12
7. Tratamentos e fármacos para dislipidemia no paciente obeso

7.1. Tratamento

Uma vez que o excesso de peso, a obesidade e, em particular, a adiposidade abdominal


contribuem muitas vezes para a dislipidemia, as bases para a terapêutica passam pelas
intervenções no estilo de vida, melhorando a dieta (reduzir ingestão calórica) e a prática de
exercício físico (aumento do gasto energético) com consequente perda de peso. No entanto, o
controlo desta dislipidemia aterogénica requer terapêutica com medicamentos para que seja
possível alcançar as metas lipídicas adequadas à redução do risco cardiovascular para o perfil
dos pacientes em causa.(6)

No fígado dos pacientes com resistência à insulina, o fluxo de FFA é elevado, a síntese
e armazenamento de TG está aumentada, sendo o excesso de TG secretado como VLDL . Este
aumento das VLDL caracteriza a dislipidemia aterogénica e está associado ao stress oxidativo
e disfunção endotelial, contribuindo para as vias de natureza pró-inflamatória da doença
aterosclerótica.(6)

7.2. Fármacos

Os objetivos iniciais do tratamento visam reduzir os níveis de colesterol LDL (objetivo


primário) e reduzir o colesterol não-HDL (objetivo secundário). O fármaco escolhido, devido
à elevada validação por estudos clínicos, são as estatinas. As estatinas têm efeitos múltiplos,
nomeadamente, sobre a inflamação, função endotelial e eventos cardiovasculares. Embora as
estatinas sejam bem toleradas, existem efeitos adversos a considerar nos músculos, na
hemostasia da glicose e no acidente vascular cerebral hemorrágico. Fatores como a situação
clínica do doente, medicamentos concomitantes, tolerabilidade farmacológica, tradição da
terapêutica local e custo dos fármacos são tidos em conta na altura de escolher o fármaco e a
dosagem a administrar ao doente. (17)(6)

Para pacientes cuja meta de colesterol LDL não tenha sido alcançada com doses
adequadas de estatinas ou se as estatinas não puderem ser prescritas, a associação com
ezetimiba pode ajudar na redução do colesterol LDL. A ezetimiba é um fármaco inibidor da
absorção do colesterol e a sua adição à terapêutica com estatinas não parece aumentar a

13
incidência de níveis elevados de creatina cinase para além do que é observado na terapêutica
isolada com estatinas.(6) (17)

As estatinas podem também ser associadas com fibratos, de forma segura,


especialmente fenofibrato. Os fibratos são eficazes a diminuir os níveis de triglicéridos em
jejum e na fase pós prandial e das partículas remanescentes das lipoproteínas ricas em TG. Em
relação aos efeitos adversos, os fibratos são geralmente bem tolerados, mas pode haver
alterações GI (5%) e alterações cutâneas (2%). A miopatia, as elevações das enzimas hepáticas
e a colelitíase são os efeitos adversos mais conhecidos associados a esta terapêutica.(6) (16)

Para pacientes com níveis elevados de TG e colesterol HDL baixo, o ácido nicotínico,
se tolerado pelo paciente, pode ser considerado para terapia. (6)

Para pacientes de alto risco com níveis de TG frequentemente elevados, o uso de ácido
gordo ómega-3 eicosapentaenóico (EPA) altamente purificado e em dose elevada, demonstrou
reduzir o risco cardiovascular.(6)

Assim, o tratamento das dislipidemias no paciente obeso é recomendado de acordo com


a evolução do perfil desse paciente e, tendo em conta, múltiplos fatores (fisiológicos,
bioquímicos, etc) que estão relacionados com o aumento do risco de desenvolvimento de
diabetes, doença aterosclerótica e mortalidade. (6)

14
8. Epidemiologia/estatísticas
Segundo o estudo (18) que caracteriza o perfil lipídico da população portuguesa em
2015, de entre os fatores de risco conhecidos para doenças cardiovasculares, destaca-se a
dislipidemia.

A prevalência da hipercolesterolemia na população portuguesa foi de 52% para


CT≥190mg/dl, cerca de metade da população. E de 55% se nos referirmos ao LDL-
C≥115mg/dl (18) (19).

A prevalência nas mulheres foi de 50% e nos homens de 54%, tendo como valor de
referência CT≥190mg/dl.(18)

De acordo com o 1º Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF 2015),
quando se consideraram também os indivíduos que reportaram tomar medicamentos para
reduzir os níveis de colesterol, este valor aumentou para 63,3%, e não variou substancialmente
de acordo com o sexo (62,8% no sexo feminino e 63,8% no sexo masculino). (19)

Os resultados mostram que a dislipidemia é um fator de risco prevalente na população


portuguesa.

É de referir ainda que 67,6% da população em estudo tinha excesso de peso ou


obesidade (IMC ≥ 25 Kg/m2) e que a prevalência de sedentarismo foi de 44,8%, sendo mais
elevada nas mulheres (48,5%), do que nos homens (40,6%).(18)

Os resultados obtidos podem ser indicativos de mudanças negativas no comportamento


e estilo de vida dos portugueses ou advindos da obesidade, mas não se pode excluir a deficiente
adesão à terapêutica farmacológica.

Ainda assim, a dislipidemia é um fator de risco que pode ser modificável, podendo ser
evitado ou controlado quando diagnosticado. Nomeadamente as mudanças no estilo de vida e
alimentação. (19)

Como exceções, verificaram-se valores mais elevados de prevalência de colesterol total


elevado entre os 55 e os 64 anos (80,1%), sem diferença significativa em relação ao grupo
etário entre os 65 e os 74 anos (79,2%).(18)

15
A nível Europeu as taxas de colesterol sanguíneo total médio padronizadas por idade
diminuíram nos últimos 30 anos em quase todos os países. Os níveis de obesidade são elevados
em toda a Europa, tanto em adultos como em crianças, embora as taxas variem
substancialmente entre países. (20)

A nível mundial, e de acordo com o Observatório de Saúde Global da OMS, 2008, a


prevalência de um nível de colesterol (≥190mg / dl) foi mais alta na Europa (54% para ambos
os sexos), seguida pela América do Norte e América do Sul (48% para ambos sexos), enquanto
a África e o Sudeste Asiático tiveram as prevalências mais baixas (22,6% e 29,0%,
respetivamente)(21)

Globalmente, pouca ou nenhuma mudança foi observada entre 1980 e 2018 nos níveis
de colesterol total plasmático e colesterol não HDL, mas várias regiões sofreram mudanças
significativas em alguns parâmetros lipídicos: países economicamente mais desenvolvidos, que
tinham os níveis mais altos de colesterol plasmático em 1980, sofreram uma redução
substancial nos níveis de colesterol plasmático, enquanto os países menos favorecidos sofreram
um grande aumento nos níveis de colesterol plasmático e triglicerídeos. Estes resultados podem
ser explicados pelo um aumento no uso de medicamentos hipolipemiantes e melhorias no estilo
de vida.(21)

No caso particular das crianças, a obesidade infantil tem vindo a aumentar no mundo
inteiro, em crianças e adolescentes estando associada às dislipidemias, entre outros fatores.

O tratamento da dislipidemia associada à obesidade infantil deve ser direcionado para


a perda de peso, através do aumento do exercício físico e de melhores hábitos alimentares, com
uma redução na ingestão total de calorias e redução da ingestão de ácidos gordos. As mudanças
no estilo de vida melhoram a resistência à insulina e a dislipidemia. A terapia hipolipemiante
deve ser iniciada após pelo menos seis meses de modificação intensa no estilo de vida.(22)

As estatinas são o fármaco de primeira linha de entre todos os fármacos para reduzir o
colesterol LDL. Há ainda alguma falta de estudos para o uso de estatinas no tratamento de
crianças e adolescentes com dislipidemia secundária à obesidade, e que provem a sua eficácia,
face aos tratamentos utilizados na fase adulta, que já estão bem estruturados e aceites. E será
ainda necessário conhecer melhor o comportamento dos parâmetros bioquímicos em crianças
e adolescentes. (22)

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9. Referências Bibliográficas

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