FICHAMENTO: DOS ANTECEDENTES AO TRÁFICO NEGREIRO E AS
RELAÇÕES ENTRE PORTUGAL E ÁFRICA A construção do escravismo no novo mundo – Robin Blackburn BREVE INTRODUÇÃO AO ESCRAVISMO Então, nessa obra o Blackburn vai abordar a constituição dos sistemas europeus de escravidão colonial que foram instaurados nas américas e vai buscar esclarecer o papel desses sistemas no advento da modernidade. A obra tem quase 800 páginas, então a gente separou alguns capítulos que abordavam de forma mais direta esse tema, embora os outros também sejam importantes porque contextualizam justamente as influências que a cultura europeia exerceu na construção desse novo sistema escravista que vigorou na américa. Autor vai resgatar alguns antecedentes sobre o a pratica da escravidão em algumas sociedades do velho mundo europeu. O Blackburn vai dizer que a escravidão no velho mundo foi muito mais diversificada em termos técnicos de organização, nisso ele vai dar bastante ênfase no sistema plantation de produção como um fator diferencial no modelo de escravidão implantado na américa como também em relação à composição étnica que no velho mundo era muito variada: escravos gregos, egípcios, ingleses, alemães, poucos africanos. Nisso ele vai reconstituir a forma de escravidão romana que na idade média a igreja, a cristandade medieval em várias sociedades europeias vai endossar a necessidade de se possuir escravos justificando por meio dos textos bíblicos e vai dar continuidade ao sistema não só possuindo escravos, mas também permitindo que alguns cristãos pudessem possuir alguns cativos trabalhando em suas propriedades. Mesmo durante o período feudal, a escravidão sobreviveu e foi fundamental para o crescimento do sistema feudal, isso na Inglaterra, na França, países baixos e posteriormente nos reinos ibéricos. De modo geral, Blackburn vai dizer que, embora os status de escravo fosse algo transmitido por herança no velho mundo e em outras sociedades escravocratas havia 2 importantes restrições na forma de reprodução de mão de obra escrava: 1º os escravos tinham poucos filhos 2º os filhos geralmente não eram submetidos ao mesmo sistema escravo que seus pais, ou seja, havia uma melhora gradual na condição de vida. Ou seja, as gerações posteriores adquiriam certos direitos ou mesmo conseguiam alforria. Certo que nas colônias do novo mundo também haviam alforrias, porém onde se desenvolviam as plantations, o número de alforriados era muito pequeno. No novo mundo, a maldição da escravidão era passada de pai pra filho para netos, era muito difícil escapa desse destino. Nesse sentido, embora tenha adquirido outros contornos por influência da modernidade e das transformações sociais e políticas e, principalmente econômicas, a escravidão colonial do novo mundo herdou também muitos traços da cultura europeia do período da idade média. E, tendo em vista a influência do mundo medieval, sobre o modelo de escravidão que irá se consolidar nas américas, o Blackburn vai dizer que todas as principais sociedades do velho mundo demonstraram algumas características em comum como certa: Tendência à intolerância e à perseguição étnico-religiosas, Busca por expansão territorial, criação de colônias de povoamento nos locais conquistados para consolidar o domínio Procuraram justificar, teologicamente a escravidão e a exclusão racial O europeu do final da idade média tendia quase sempre a estigmatizar o infiel e o pagão caracterizando aqueles que não pertenciam a sua cultura como povos selvagens, bárbaros, a exemplo dos romanos em relação aos germânicos. Porém, a escravidão na américa apresentou várias características inéditas e criou um sistema bem mais cruel e difícil de se escapar/libertar. Até então, não só na Europa medieval, mas no oriente médio os escravos geralmente pertenciam a várias etnias. Então ao mesmo tempo em que ele vai ressaltar que a escravidão é algo inerente ao desenvolvimento das civilizações e que a cultura europeia do velho mundo tenha contribuído, por assim dizer, para algumas das principais características, sobretudo do ponto de vista da exclusão social e religiosa, o modelo de escravidão na américa foi algo novo e adaptado à demanda produtiva. ESCRAVIDÃO DOMÉSTICA NA ÁFRICA Na África havia vários sistemas escravistas, que claro a gente não vai pontuar aqui porque não vem ao caso, vamos focar no que estiver ligado ao início do tráfico negreiro. No continente africano já havia escravidão interna, embora fosse muito diferente do tráfico de escravos que passou a vigorar no continente após a conquista dos territórios africanos pelos portugueses e demais povos europeus a partir do século XV e XVI. Sem querer aprofundar nessa parte, mas só para gente ter uma ideia um dos sistemas que existiam na África negra era o Jonya (que se origina do termo Jon, que significa cativo) e era bastante difundido no Sudão Ocidental e outras regiões do continente. Um JON era um escravo cativo ligado a uma linhagem e que não podia ser cedido tampouco vendido e ainda tinha direito a maior parte do que produzia. Nas sociedades em que reinava esse sistema, o escravo pertencia a uma categoria sociopolítica integrada a uma classe dominante, esse escravo era considerado um cidadão, mas, ao mesmo tempo estava submisso ao Estado ou aos impérios e deveria estar sempre às ordens quando fosse solicitado. Ele possuía propriedades e até mesmo pequenas fortunas, além de também ter direito de possuir escravos, que por sua vez eram exclusivos de sua linhagem e também não poderiam ser vendidos. Claro que a escravidão no continente africano também se dava por meio das guerras, em que um vilarejo vencido em uma batalha tinha parte de sua população escravizada. A transformação de prisioneiros de guerra em escravos não distinguia gênero nem faixa etária, porque era o grupo inteiro que era dominado, quer dizer, a aldeia ou tribo. Na escravidão doméstica, essas pessoas seriam aprisionadas e eram colocados para cultivar a terra, porque para algumas culturas africanas a riqueza se media pela quantidade de pessoas disponíveis para cultivar a terra de um determinado território. Os dois principais grupos escravizados eram as mulheres por se rebelarem menos e por garantirem a continuidade da linhagem, possibilitava o aumento da população daquela sociedade além de ajudar no trabalho agrícola e as crianças por poderem ser ensinadas desde cedo os ofícios e a cultura, ou seja, passavam a ser educadas nas tradições da nova cultura e muitas vezes se tornando aliadas e defensoras das famílias que as criou. Nessa modalidade de escravidão, a reprodução e a assimilação dos escravos era importante, porque as mulheres escravizadas se tornavam concubinas de seus senhores e os filhos delas eram integrados na comunidade, quer dizer, nasciam livres e garantiam a continuidade da linhagem daquele povo. Outra forma de se obter escravos era pela punição por delitos considerados graves como roubo, adultério ou homicídio, mas segundo algumas fontes, esse tipo de sentença passou a ser mais comum após o início do tráfico negreiro. Na escravidão doméstica africana, o escravo tinha certo grau de autonomia, apesar de não ter a sua liberdade, pois continuava cativo ao seu senhor, ele poderia se casar com pessoas livres poderia também possuir um lote de terra para cultivar sua subsistência. INFLUÊNCIA DA ESCRAVIDÃO ÁRABE NA ÁFRICA Até o por volta do século VIII, a escravidão em grande parte do território africano era doméstica e a venda de escravos praticamente não acontecia, apenas alguns povos que, tendo em vista a sobrevivência da comunidade dependiam de recursos que eram obtidos com o comércio, por exemplo Moçambique que nas épocas de seca não restava mais nada para fazer comércio e obter o alimento, a não ser escravos. Com a expansão Árabe datada desse período o comércio de escravos na África começa a se tornar uma atividade econômica comum e muito lucrativa entre os árabes e os povos subsaarianos, viviam ao sul do deserto do Saara. Então os laços comerciais entre esses dois povos apenas se fortaleceram já que alguns povos que haviam se convertido ao islamismo realizavam algumas caravanas que cruzavam o Saara e iam por diversas regiões da África subsaariana e lá eles trocavam diversas mercadorias, perfumes, por ouro e por escravos. No território da África ocidental, a que se estendia ao sul do deserto do Saara, conhecida também por África subsaariana (Angola, Congo, Cabo Verde, Etiópia, Moçambique. Sudão, São Tomé e Príncipe) a guerra e a escravização dos derrotados na guerra se atrelava ao sistema de comércio pelo Saara que fornecia escravos as sociedades da religião muçulmana. Neste território, o escravizado era uma das principais mercadorias de comércio, porque de acordo com os preceitos do islamismo era proibida a escravização de muçulmanos. Essa lei obrigava os muçulmanos a serem proprietários de escravos não convertidos. Com os muçulmanos, os escravos cumpriam os trabalhos de carregar as caravanas, trabalhar na agricultura, eram artesãos, alguns domésticos. É importante frisar que a cultura Árabe não permitia a escravização de mulçumanos convertidos, por isso, quando a demanda de trabalho aumentou com a expansão eles tiveram que intensificar a importação de mão de obra externa. Com o passar do tempo, a demanda dos árabes por escravizados transformou a relação dos africanos com a escravidão e contribuiu para o desenvolvimento do comércio de escravos em larga escala para suprir outros territórios conquistados. Com a abertura das rotas comerciais no atlântico no contexto das navegações, por volta do século XIV, a ligação comercial do continente africano com a Europa e a América transformou o escravo em um dos principais produtos de exportação, fato que gerou muito lucro para as elites de várias sociedades africanas. PORTUGAL E ÁFRICA: COMÉRCIO E EXPANSÃO ESCRAVISTA A colonização portuguesa na África está ligada as primeiras viagens dos portugueses no período que iniciou as grandes navegações pelo atlântico, a gente sabe que Portugal foi o pioneiro por volta do século XV. O primeiro lugar que os portugueses chegam no continente africano foi na cidade de Ceuta, no Norte da África, por volta de 1415. Que era um lugar onde o poder muçulmano era mais vulnerável, já que eles concentravam mais ao sul, nesse período. E a princípio os portugueses e vão estabelecer comércio com os povos da região. Nisso, os portugueses vão empreender vários embates que ora tinham resultados positivos com a tomada de fortes localizados ao norte da África, ora perdendo o que já tinham conquistado. Nessas investidas, Portugal foi apoiado de várias formas nesses ataques por Castela, Aragão, Genova e Veneza que queria desafiar o pode muçulmano e restringir a ação deles no Norte. Porém, mesmo com todo esse apoio, Portugal não era forte o suficiente para penetrar e dominar o Norte da África, apesar da instabilidade política nesse território que era dominado pelo Marrocos. Portugal nesse período tinha uma população de cerca de 1 milhão de habitantes, enquanto o Marrocos contava com 6 milhões, que poderiam ser mobilizados em uma Jihad (guerra santa contra os cristãos). Portugal, apesar de ostentar a glória de ter conquistado Ceuta, continuava desprovido de recursos financeiros. Porém, em Ceuta, os portugueses aprenderam mais sobre as rotas do ouro no Saara, sobre um grande rio que corria por lá. Um dos filhos do Dom João I, dom Henrique resolve patrocinar algumas expedições atlânticas para o sul de 1419 até a sua morte em 1460. O objetivo principal dessas expedições era justamente o de contornar as forças muçulmanas e descobrir um acesso às rotas do ouro. Uma desvantagem eram os ventos que predominavam e as correntes marítimas da costa oeste africana que faziam com que os barcos perdessem o rumo e muitos navegadores se perdiam e nunca mais voltavam. Essas expedições surtiram resultado no que diz respeito a novas relações comerciais ao longo da costa africana e a colonização de algumas ilhas atlânticas. A colonização dessas ilhas deu aos portugueses além de experiência, alguns pontos de exploração. Uma delas foi a Ilha da Madeira que foi colonizada em 1419, cabo verde em 1460, que nesse período, eram desabitadas, ao contrário das ilhas canárias. Portugal era esperto, parte do custo de colonizar essas ilhas foi coberto pela introdução da criação de animais que se multiplicassem rapidamente, pela derrubada de árvores para aproveitar a madeira na construção de navios, daí o nome ilha da madeira, como também pela pesca. As primeiras colheitas de trigo foram boas, mas eles queriam descobrir outras culturas lucrativas. Com pouco sucesso, no início, tentaram investir na cana-de-açúcar, ajudados por mercadores italianos que forneceram incentivos e informações técnicas de plantio. Só que os portugueses continuavam investindo também em formas de superar o obstáculo dos ventos e das correntes marítimas do atlântico com o intuito de expandir suas conquistas. Essas ilhas passaram a servir também de base para mais expedições mais ao sul da costa africana. Nesse sentido, os portugueses passaram a investir também em um novo tipo de embarcação, a caravela de três mastros, que com essa estrutura poderia aproveitar melhor os ventos sem perder o controle do barco. A madeira foi retirada da ilha da madeira, troncos gigantescos serviram para construir barcos com mastros maiores. O contato que eles tiveram com os árabes em algumas expedições foi fundamental, somado às experiências em navegação adquiridas pelas expedições. Pelo fato dessas caravelas serem menores e mais leves se tornavam mais fáceis de cortar as águas e ser controlada. Essas caravelas acabaram possibilitando viagens mais seguras às ilhas atlânticas ao sul. Enquanto isso, as viagens eram registradas como conhecimentos e os portugueses continuavam a investir em pesquisas sobre navegação e uso de leituras de instrumentos como astrolábio e fórmulas matemáticas relacionadas à latitude e às distâncias. A medida que chegavam cada vez mais ao sul da costa africana, os portugueses descobriram que poderiam trocar tecidos ou objetos de metal europeus ou norte africanos por ouro, pimenta e marfim. Em 1441, já contornando a costa ocidental da África, os portugueses empreendem um ataque contra um navio que continha um carregamento de escravos incluindo brancos e negros. Os capitães portugueses logo descobriram que era possível com menos dificuldade e despesas, comprar escravos e revendê-los aos envolvidos na colonização das ilhas ou a compradores portugueses ou espanhóis que quisessem adquirir um criado ou trabalhador africano. Nesse período, a África ocidental já era uma fonte tradicional de escravo para o comércio. Desde o século IX, o tráfico de escravos africanos já havia se desenvolvido bastante na exploração das minas de ouro localizadas no Sudão ocidental. O território da África ocidental sofria bastante com a fragmentação territorial decorrente de guerras, fato que favorecia a escravização e o comércio de cativos. Exércitos de Mali, Songai entre outros reinos travaram guerras que resultaram em um grande número de cativos. Os portugueses começaram a ver vantagem nesse tipo de comércio e achavam mais fácil adquirir escravos do que ouro, mesmo que fosse preciso fazer negócio com muçulmanos. Porque com os muçulmanos, era possível trocar tecidos, cobre, utensílios de bronze, sal, cavalos em escravos. E o fato de levar cativos africanos para trabalhar nas ilhas atlânticas ou para a península ibérica estava de acordo com o objetivo da igreja de conquistar almas para cristo. Com emissão de algumas bulas papais concedidas entre 1442 e 1456, como a Romanus Pontifex (Dizia que os cativos poderiam ser comprados, contanto que fossem feitos esforços para conquista-los para cristo, até mesmo de muçulmanos) e Inter cetera, Dom Henrique tinha a tarefa também de disseminar a fé cristã por meio da colonização das ilhas e criação de postos comerciais e missionários na costa africana. Essas bulas influenciaram os relatos oficiais portugueses sobre o que estava sendo feito na costa africana. Com o tempo, os portugueses descobriram sozinhos que os escravos eram um recurso flexível, que poderia assumir algumas das funções do dinheiro e possibilitar a manutenção das áreas conquistadas. Por volta de 1470 e 1480, as ilhas de São Tomé foram colonizadas pelos portugueses para o uso como base comercial e escravista, o trabalho dos próprios escravos já era utilizado na construção dos fortes, armazéns e igrejas. Com os avanços na ciência marítima, os portugueses podiam controlar melhor o tráfico costeiro de escravos, já que suas caravelas eram mais eficientes e o transporte marítimo era mais rápido e fácil. O tráfico crescente de escravos não só contribuiu para o aumento de lucros da coroa como ajudou a atender a demanda de mão de obra nas ilhas. Em 1480, foi instalada em Lisboa a Casa dos Escravos, sob autoridade real, com o objetivo de organizar o tráfico de escravos para aas ilhas e cobrar algumas taxas sobre o valor dos escravos comercializados. A casa dos escravos organizou o comércio de escravos com a península, não só para Portugal como para a Espanha, já que nos dois países havia uma demanda grande por escravos. Também se acreditava que os cativos africanos eram mais confiáveis que os Mouros (escravizados lá na Espanha) e mais abertos a conversão cristã. Num contexto em que os espanhóis nutriam certa hostilidade e medo pelos Mouros e muçulmanos, os africanos eram vistos como uma mão de obra perfeita. Não faziam objeção ao cristianismo, alguns até foram aculturados e formaram comunidades religiosas. Sem esperança de fuga, poderiam ser forçados a trabalhar. Vendo esse potencial, dom Henrique passa a patrocinar a produção de açúcar na Ilha da Madeira e a conceder grandes extensões de terra a alguns capitães que se encarregavam de atrair colonos, oferecendo um bom pedaço de terra para quem quisesse trabalhar o campo para o cultivo. Após a morte de dom Henrique em 1460, a produção de açúcar começou a se desenvolver muito rápido na ilha da Madeira e nas outras ilhas, financiadas e auxiliadas pelo crescente comercio de escravos. A ajuda de mercadores genoveses e flamengos foi fundamental para a instalação dos engenhos, visto que limpar a terra, irrigar e plantar a cana, utilizando certas técnicas eram bem custoso e trabalhoso. Em 1480, o comércio de açúcar da ilha da madeira passou a atrair navios de comércio e a produção subiu muito. A ilha da madeira já estava superando outras ilhas como a do Chipre que era a maior fornecedora de açúcar daquele período. Para se ter uma ideia a ilha da madeira já fazia comércio diretamente com a Europa e por volta de 1500 já contava com mais de 2000 escravos, a maioria envolvida na fabricação de açúcar, por quase 20 anos, a ilha da madeira manteve certa hegemonia no cultivo da cana e produção do açúcar. Por volta de 1521, a produção começou a cair, afetada pela competição com São Tomé e das ilhas canárias que também eram grandes produtores de cana de açúcar. As ilhas de São Tomé e príncipe, mais ao sul, iriam se transformar em grandes fornecedores de açúcar no século XVI, com suas plantações supridas de escravos vindos do continente africano. As terras de São Tomé, de origem vulcânica, bem irrigada por algumas nascentes, era muito propício para o cultivo da cana e os escravos poderiam ser adquiridos a um baixo custo. A desvantagem era o tempo que os navios levavam para fazer as viagens de 4 a 5 meses. Outra desvantagem era o grande número de escravos brutos com uma grande disposição para fuga e revoltas. Em 1522, São Tomé já contava com mais de 60 engenhos de açúcar com mais de 300 escravos cada, utilizados no cultivo da cana e no seu processamento. Aqui encontramos as primeiras plantations escravistas que seriam as percussoras do modelo mais tarde desenvolvido no caribe e implantado nas Américas, sobretudo no Brasil. A combinação desses fatores fez com que são Tomé perdesse muita força como produtor de açúcar para as plantações brasileiras que estavam começando o cultivo da cana. O cultivo e o processamento da cana no Brasil começaram de forma lenta e hesitante por volta da década de 1540 e, por causa de problemas próprios da organização e de mão de obra, permaneceram se mantendo assim até iniciar um gradativo crescimento por volta de 1570. Segundo Blackburn, Portugal vinha prosperando bastante com o comércio de especiarias e mantinha uma economia forte no mediterrâneo produzindo vinho, azeite, trigo e algumas frutas e legumes. Nesse mesmo contexto, a demanda por mão de obra fez com que o preço dos escravos subisse de forma constante no século XVI, da média de 12,5 cruzados em 1500, 20 cruzados em 1520, 37, 5 em 1540 e mais de 100 cruzados em 1552, caindo para 37, 5 e 75 cruzados nas décadas seguintes. A partir de 1520, Portugal passou a fornecer um número crescente de escravos para América espanhola, que eram levados pra Sevilha. Em 1570, um escravo africano poderia ser comprado por cerca de 22 ducados na África e ser vendido por 64 ducados na Espanha, em 1595, o custo de um escravo na África subiu para 60 ducados, e o preço de venda na Espanha era de apenas 80 ducados, mas esse mesmo escravo poderia ser vendido no Novo Mundo por 150 ducados. TRÁFICO DE ESCRAVOS A DESINSERÇÃO SOCIAL Segundo Blackburn, o comércio atlântico de escravos realizou um gradativo processo de desinserção, e nesse contexto o escravo africano vai ser inserido em um sistema novo e inesperado de relações sociais. Quer dizer, na África, de um modo geral, fora os sistemas de submissão de linhagens, os escravos eram quase sempre soldados capturados ou guerreiros de tribos, que mesmo em uma posição submissa, ainda eram respeitados em certo sentido pelos seus senhores, mas o novo escravo poderia ser vendido ou trocado por produtos, como se fosse uma mercadoria, e esse fator transformou a escravidão não só nas américas, mas em partes da África também quando o comércio no atlântico se intensificou e o tráfico de escravos passou a fazer parte das transações comerciais. Nesse novo contexto, o escravo africano retirado de suas terras e separado de seus familiares é inserido em uma nova conjuntura social de relações que passa a estigmatiza-lo e passa a regulamentar a sua vida e assim o escravo do novo mundo perde a sua identidade enquanto indivíduo pertencente a um grupo social, a uma tribo, nesse caso, e passa a ser visto e identificado apenas como “negro”, um animal sujo e vulnerável, sem qualquer poder sobre sua própria vida “Na pratica, os escravos eram considerados membros de uma espécie inferior e tratados como bestas de carga a serem guiadas e inventariadas como gado” (pag. 26) Os sistemas que então se instalaram no novo mundo possuíam um caráter completamente novo em relação aos que os antecederam desde a antiguidade. Eles adquiriram uma faceta comercial e transformaram o comércio marítimo pelo atlântico naquele que seria o mais marcante em termos globais do século XVI e XIX, mesmo que o dinheiro em si no sistema de produção plantation não tivesse tanta relevância A produção de certos produtos como tabaco, algodão e o açúcar contribuíram para o nascimento de um novo mundo e um novo mercado consumidor. “A aquisição de cerca de 12 milhões de cativos da costa da África entre 1500 e 1870 possibilitou a construção de um dos maiores sistemas escravistas da história O próprio comercio de escravos foi sem igual, ou seja, diferente de qualquer um outro não só pelos métodos empresariais empregados, mas principalmente pela dimensão e capacidade destrutiva. Nisso o autor vai pontuar que mais de 1 milhão de cativos morreram durante as viagens entre África e o novo mundo. A princípio os indígenas foram submetidos ao trabalho escravo, mas ainda nas primeiras décadas do século XVI milhares de africanos foram trazidos para reforçar o aparato colonial. Segundo o autor, depois que o sistema de plantation começou a se desenvolver, a escravidão no novo mundo passou a adotar a mão-de-obra africana. Os índios foram desalojados e marginalizados, e os escravos africanos passaram a desempenhar as tarefas mais pesadas. A demanda de açúcar na Europa estimulou o surgimento das plantations. Só no século XVII, a plantation vai ser aperfeiçoada e vai necessitar de um novo tipo de mão de obra, que atenda a uma grande demanda produtiva e comercial, mas ao mesmo tempo seja completamente submissa ao seu proprietário. A plantation foi um modelo de organização econômica em que se destacam quatro aspectos principais: latifúndio, monocultura, mão-de-obra escrava e produção voltada para o mercado externo.