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LOGÍSTICA

REVERSA

Charlene Bitencourt
Soster Luz
Fator logístico na
organização das cadeias
reversas de pós-consumo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Analisar a importância da logística nas cadeias reversas de pós-consumo.


 Prever a rede de distribuição reversa de pós-consumo.
 Descrever os aspectos estratégicos na rede de distribuição reversa.

Introdução
A sustentabilidade e a responsabilidade social vêm se tornando valores
organizacionais cada vez mais importantes. Nesse sentido, a exigência
por produtos limpos e que, após o término da sua vida útil, não causem
impactos ao meio ambiente faz parte do cotidiano de uma considerável
fatia do mercado consumidor. Em contrapartida, a diversidade de produtos
e os avanços tecnológicos fazem os produtos eletroeletrônicos ficarem
ultrapassados em pouco tempo.
A média de produção de lixo no Brasil é de 1 kg diário por pessoa. As-
sim, a preocupação com o reaproveitamento desses materiais ultrapassa
o limite das questões ambientais, criando um mercado econômico que
proporciona fonte de renda para milhares de pessoas.
Neste capítulo, você descobrirá a importância da logística nas cadeias
reversas de pós-consumo, identificará a rede de distribuição reserva
de pós-consumo e verá quais são os aspectos estratégicos na rede de
distribuição diversa.
2 Fator logístico na organização das cadeias reversas de pós-consumo

Logística nas cadeias reversas de pós-consumo


A preocupação com o impacto ambiental causado pelo descarte incontrolado
de lixo fez vários países assinarem protocolos e criarem legislações próprias
a fim de:

 intervir, orientar, controlar e disciplinar as empresas quanto à impor-


tância de se obter um equilíbrio ambiental;
 reduzir a exploração de matéria-prima;
 aumentar a oferta de produtos reutilizáveis ou recicláveis.

A legislação também permite pesadas punições pelo descumprimento das


normas (Quadro1).

Quadro 1. Resumo das principais legislações brasileiras

Programa Brasileiro de Política sobre resíduos sólidos.


Reciclagem (1998)

Coleta seletiva domiciliar Coleta seletiva domiciliar


obrigatória em municípios com
mais de 150 mil habitantes.

Agroveterinários e pneumáticos Obrigatoriedade por parte dos


fabricantes e distribuidores
de produtos agroveterinários
e pneumáticos pela coleta
de embalagens e produtos
de pós-consumo.

Tributação diferenciada Incentivos com tributação


diferenciada para as atividades
de reciclagem de materiais.

Fonte: Adaptado de Leite (2003).


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A cadeia reversa de pós-consumo é composta pelas seguintes fases:

 coleta;
 seleção e separação;
 consolidação;
 destinação para desmanche — reciclagem industrial;
 destinação para remanufatura — mercado secundário de componentes;
 disposição final.

A coleta dos resíduos pode ser realizada em qualquer fase da logística de


distribuição. Nesse momento, os produtos são classificados e separados em
lotes de bens de pós-consumo e destinados ao desmanche, à remanufatura ou
à reciclagem. Segundo Leite (2003), os principais tipos de coleta são:

 Coleta domiciliar de lixo — nesse caso, o lixo sem separação é coletado


nas residências, em dias preestabelecidos. Embora seja uma obrigação legal
do Poder Público, percebemos que uma boa quantidade de lares ainda não é
coberta por esse serviço, assim, a população descarta seu lixo em terrenos
baldios, córregos e ruas.
 Aterros sanitários e lixões — o lixo recolhido é destinado a locais
apropriados, como o aterro sanitário, em que o lixo é disposto em ca-
madas e coberto por algum tipo de material, como terra, por exemplo.
Esse processo gera gases e líquidos decorrentes da decomposição dos
resíduos orgânicos, assim, o piso onde o material é depositado recebe
impermeabilização, evitando a contaminação do solo e lençol freático.
Já nos lixões, os materiais são depositados de qualquer forma, gerando
grandes danos ao meio ambiente e à saúde. Os lixões também são fonte
de renda para famílias que vivem em extrema pobreza, pois homens,
mulheres e até crianças passam o dia revirando o amontoado de lixo
em busca de materiais recicláveis que possam ser vendidos.
 Coleta seletiva domiciliar — nesse tipo de coleta, o lixo é recolhido já
selecionado em função do tipo de material, contribuindo com o fluxo
logístico e otimizando o processo de reciclagem.
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 Coleta informal — caracteriza-se pela coleta dos produtos pós-consumo


em menor quantidade feitas por catadores, carroceiros, entre outros, que
vendem esses materiais a sucateiros. Esse tipo de coleta é predominante
em grandes centros e, em muitos casos, é organizada por associações
de catadores.

Existe ainda a coleta realizada por meio de pontos de devolução de um


determinado grupo de produto, como:

 pilhas;
 lâmpadas fluorescentes;
 baterias;
 embalagens de agrotóxico.

A seleção consiste em separar e classificar os materiais em categorias ou


classes em função do tipo de material, cor e tamanho. É possível otimizar
o fluxo dessa etapa realizando a coleta seletiva, porém esse conceito ainda
não se tornou obrigatório nos municípios com população menor do que 150
mil habitantes. Mesmo nos municípios em que a população supera esse
número, é comum observar dificuldades na separação do lixo doméstico.
Após coletados, separados e classificados, os resíduos pós-consumo são
destinados ao processo de remanufatura, em que os materiais são novamente
transformados em matéria-prima e retornam ao ciclo produtivo. Há ainda
casos em que os materiais são compostos por vários tipos de materiais, como,
por exemplo:

 embalagens Tetra Pak;


 produtos eletrônicos;
 eletrodomésticos.

Assim, esses produtos são desmontados ou passam por processos tec-


nológicos de separação de material para depois retornar à indústria como
matéria-prima.
Para Leite (2003), o objetivo econômico na logística reversa de pós-consumo
visa a resultados financeiros possibilitados pelas economias obtidas em ope-
rações industriais com o aproveitamento de matérias-primas secundárias
oriundas dos canais reversos de reciclagem ou da revalorização do bem nos
canais reversos de reúso e de remanufatura.
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De acordo com Lacerda (2011), as iniciativas relacionadas à logística reversa


têm trazido consideráveis retornos para as empresas. A economia com a utili-
zação de embalagens retornáveis ou com o reaproveitamento de materiais para
produção tem trazido ganhos que estimulam cada vez mais novas iniciativas.

Rede de distribuição reversa de pós-consumo


Materiais, peças, acessórios e componentes retornam para a indústria após o
consumo para serem reciclados ou reutilizados, substituindo a matéria-prima
na fabricação de novos produtos semelhantes ou similares.
Leite (2003) classifica as categorias de ciclos reversos de retorno ao ciclo
produtivo em:

 Rede de distribuição reversa de ciclo aberto — esse tipo de canal é


definido pelo retorno de materiais como metal, papel, plástico e vidro
à indústria para serem usados como matéria-prima na fabricação de
diferentes tipos de produto. Podemos usar, como exemplo, o processo
de embalagens Tetra Pak, que utiliza as camadas de plástico e alumínio
para fabricação de telhas, ou seja, embalagens de alimentos são trans-
formadas em material da construção civil.
 Rede de distribuição reversa de ciclo fechado — no caso de ciclo
fechado, o material descartado retorna à indústria para ser utilizado na
fabricação de produtos similares. Como exemplo, temos o processo de
reutilização de óleos lubrificantes, em que as impurezas são removidas,
adicionando-se aditivos para a produção de novos óleos.

Existem ainda as redes de distribuição reversa de pós-consumo de bens


duráveis e semiduráveis. Nesse caso, os produtos são descartados por:

 obsolescência;
 pequenos danos;
 desempenho;
 modernização.

Dependendo do estado do produto, este pode retornar ao ciclo produtivo


ou voltar para a revenda de produtos segunda mão (Figura 1).
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Indústria de
reciclagem

Mercados de
reciclados Disposição
final

Fornecedores
Fábrica de
de matéria-
bens duráveis
-prima Mercado de
componentes
de segunda mão
Mercado Mercado
primário secundário

Bens de
pós-consumo Remanufatura

Materiais
residuais
Bens duráveis Bens de Componentes
comerciais
descartados pós-venda substituídos

Resíduos

Componentes
Bens em Bens sem
íntegros
condições de condições de
reutilização reutilização
Desmanche
Processadores de (linha de
sucata (sucata montagem
Mercado de
obsoleta) reversa)
bens de
segunda mão

Figura 1. Fluxo dos canais de distribuição reversos de pós-consumo de bens duráveis.


Fonte: Adaptado de Leite (2003).

Existem também as redes de distribuição reversa de reúso, desmanche e


reciclagem. Para as redes de distribuição de reúso, a coleta e a seleção devem
ser realizadas de forma criteriosa para que o produto seja encaminhado para o
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mercado de segunda mão. Os setores de autopeças e de eletrônicos representam


uma considerável fatia do mercado brasileiro e mundial.
A rede de reciclagem começa quando o produto ou material descartado
necessita ser processado ou transformado para voltar à indústria como matéria-
-prima. O uso de tecnologia é muito importante, tendo em vista que muitos
produtos são compostos por diferentes tipos de materiais, muitas vezes fun-
didos, o que torna difícil a separação.
Já a rede de distribuição de desmanche pode ser utilizada tanto pela rede
de reúso — quando o produto é desmontado e as peças e os componentes em
condições de uso retornam ao mercado — quanto pela rede de reciclagem,
que, nesse caso, separa os componentes dos produtos em função do tipo de
material e os destina para a reciclagem.
Há ainda a rede de distribuição de produtos descartáveis — em que os
produtos são usados uma única vez e depois retornam para a reciclagem — e a
rede de produtos retornáveis — em que as embalagens do produto retornam
para a empresa fabricante para serem novamente usadas.
Leite (2000) também classifica as redes de distribuição reversa pós-consumo
quanto ao nível de integração empresarial e participação como:

 Redes integradas — quando a empresa se responsabiliza por todas as


etapas de distribuição reversa, ou seja, desde a coleta até o reaprovei-
tamento dos materiais no ciclo produtivo.
 Redes não integradas — quando as empresas utilizam outras organi-
zações para reaproveitar os bens pós-consumo, ou seja, nesse caso, a
empresa utiliza os serviços ofertados, como, por exemplo, compra de
matéria-prima reciclada.

Há também as empresas que não conseguem reaproveitar seus próprios


resíduos, porém dão o destino correto aos bens de pós-consumo, fornecendo
gratuitamente ou até vendendo para empresas que utilizaram esses rejeitos
como matéria-prima ou insumos.

Aspectos estratégicos na rede


de distribuição reversa
A logística reversa se tornou uma grande ferramenta utilizada pelas empresas
para se manter competitivas e melhorar a imagem perante o consumidor. Hoje é
comum as empresas se dedicaram ao chamado marketing ambiental, também
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conhecido como marketing verde, com o objetivo estratégico de vincular o


produto ou serviço de uma empresa a uma imagem ecologicamente correta.
Além do aspecto ambiental, o aspecto econômico também vem chamando
a atenção das empresas para desenvolver a logística reversa, tendo em vista
que, muitas vezes, o custo da matéria-prima reciclada é menor do que o custo
da matéria-prima virgem (Quadro 2).

Quadro 2. Motivos para as empresas operarem os canais reversos

Motivo estratégico Percentual

Aumento da competitividade 65

Limpeza de canal — estoque 33

Respeito à legislação 29

Revalorização econômica 28

Recuperação de ativos 27

Fonte: Adaptado de Leite (2003).

De acordo com Leite (2000) A redução do ciclo de vida mercadológica dos


produtos, a introdução de novas tecnologias e materiais na constituição dos
mesmos, a obsolescência precoce dos produtos, a vertiginosa febre de novos
lançamentos de produtos, o alto custo de reparos face ao preço do bem, entre
outros motivos, tem aumentado as quantidades de bens descartados.
Leite (2000) diz que “Dentre suas principais ações estratégicas neste sentido
incentiva as diversas áreas especializadas na concepção e operação de redes
de distribuição reversas, de sistemas de reciclagens internos e em parcerias
nas cadeias reversas, além de outras atividades relacionadas”. As empresas
que apresentaram essa visão estratégica são as de melhor desempenho e
normalmente apresentam líderes em seus setores de negócios, tendo como
principais metas:
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 criação de imagem diferenciada e de novas oportunidades de lucros


por meio da introdução das preocupações ambientais em sua reflexão
estratégica corporativa;
 busca constante por produtos e processos de menor impacto ao meio
ambiente de acordo com os princípios do desenvolvimento sustentado;
 avaliação dos produtos e processos por meio da análise de ciclo de
vida ambiental;
 concepção dos produtos visando reduzir impactos ao meio ambiente
e facilitando o ciclo reverso do pós-consumo (design for recycling);
 criação de vantagem competitiva por meio da distribuição reversa;
 extensão dos conceitos de responsabilidade ambiental.

Podemos observar que a estratégia na concepção de uma rede de lo-


gística reversa deve ser criteriosamente analisada. Existem vantagens e
desvantagens em cada etapa do processo de retorno de bens pós-consumo.
Os objetivos da rede de logística reversa poderão se basear em um ou mais
dos exemplos a seguir.

Objetivo econômico — quando a empresa recebe ganhos com o reaproveitamento


de materiais, seja por redução no custo com matéria-prima, seja com a comercialização
de resíduos.
Objetivo mercadológico — quando a empresa se mostra mais competitiva em
relação às outras, devido ao serviço diferencial pós-vendas e pós-consumo, e agrega
valor ao seu produto.
Objetivo legal — quando a empresa busca cumprir uma determinada legislação.
Objetivo ambiental — quando a empresa melhora a imagem corporativa, diminuindo
o impacto ambiental decorrente do descarte de produtos, peças e acessórios.
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LACERDA, L. Logística reversa uma visão sobre os conceitos básicos e as práticas


operacionais. EcoD, 1 nov. 2011. Disponível em: <http://www.ecodesenvolvimento.
org/biblioteca/artigos/logistica-reversa-uma-visao-sobre-os-conceitos>. Acesso em:
15 out. 2018.
LEITE, P. R. Canais de distribuição reversos. Revista Tecnologística, São Paulo, ano VI, n.
61, p. 60-67, dez. 2000.
LEITE, P. R. Logística reversa: meio ambiente e competitividade. São Paulo: Prentice
Hall, 2003.

Leitura recomendada
TADEU, H. F. B. Logística reversa e sustentabilidade. São Paulo: Cengage Learning, 2013.
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