AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 798.066 - SP (2015/0262863-3)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
AGRAVANTE : ANDRÉ GOMES NETTO ADVOGADOS : ISADORA A R DE A GIRÃO RENATA SILVA ABDALAD FABIANO LISBOA DE ARAUJO AGRAVADO : JEANE CLEISE BARARDI ADVOGADO : JOSÉ ANTÔNIO CANIZARES JÚNIOR E OUTRO(S) EMENTA
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA.
SERVIÇO NOTARIAL. 1. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. FALTA DE OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA ORIGEM. 2. ARTS. 94 E 100, IV E V, DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 282 E 356 DO STF. 3. SERVIÇO NOTARIAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. PRECEDENTES. 4. AGRAVO IMPROVIDO.
DECISÃO
Cuida-se de agravo em recurso especial interposto por André Gomes Netto
desafiando decisão da Presidência da Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo que não admitiu o processamento do recurso especial, com fundamento no art.105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, em acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 280):
COMPETÊNCIA - RELAÇÃO DE CONSUMO - Pretensão de reforma da
decisão que rejeitou a exceção de incompetência oferecida pelo Tabelião do Cartório do 5º Ofício de Justiça de São João de Meriti - RJ - Descabimento - Hipótese em que há relação de consumo, sendo competente o foro do domicílio do consumidor para o ajuizamento da demanda (CDC, art. 101, I) - Precedente do Colendo Superior Tribunal de Justiça - RECURSO DESPROVIDO.
Não foram opostos embargos de declaração.
Nas razões do recurso especial, o recorrente alegou ofensa aos arts. 91, 94, 100, IV, alínea d, 100, V, alínea a, e 535, II, do CPC. Sustentou que, "ao buscar o cumprimento de obrigação de fazer (cancelamento de protesto) ou gerar a discussão acerca da licitude da obrigação cumprida (lavratura do protesto), origina-se a competência do foro da localidade em que a obrigação foi ou deva ser cumprida" (e-STJ, fl. 295). Apontou a inaplicabilidade do CDC, uma vez que a relação entre as partes não é de consumo. Pleiteou que seja declarado, como competente para julgar a causa, o Juízo da Documento: 53770464 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 09/11/2015 Página 1 de 5 Superior Tribunal de Justiça 3ª Vara Cível de São João de Meriti, no Estado do Rio de Janeiro.
Foram apresentadas contrarrazões (e-STJ, fls. 310-316).
O Tribunal local inadmitiu o processamento do recurso especial pela ausência de demonstração dos artigos mencionados nas razões recursais. Irresignado, o recorrente interpõe agravo refutando os óbices apontados pela Corte estadual.
Contraminuta às fls. 250-252 (e-STJ).
Brevemente relatado, decido. De início, não se pode conhecer da apontada violação do art. 535 do CPC, pois verifica-se que o recorrente deixou de opor os pertinentes embargos de declaração na origem, a fim de sanar o suposto vício de omissão no acórdão estadual, o que impossibilita a análise da questão por esta Corte.
Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. NÃO-OCORRÊNCIA DA ALEGADA OFENSA AO ART. 535 DO CPC. FALTA DE OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTROVÉRSIA SOBRE A TRIBUTAÇÃO DE VERBA PAGA A TÍTULO DE CLÁUSULA PENAL. INADMISSIBILIDADE DO RECURSO POR INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE HERANÇA. PRESSUPOSTOS LEGAIS NÃO DEMONSTRADOS. TRIBUTO DEVIDO PELA MEEIRA E PELA SUCESSORA DO DE CUJUS . AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DOS ARTS. 128, DO CTN, E 791, 792 e 919 DO DECRETO Nº 3.000/99. 1. Consoante consignado pela Sexta Turma do STJ, ao julgar o REsp 174.201/SP (Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 28.9.1998, p. 135), "não cabe alegar vulneração ao art. 535, II, do CPC, a pretexto de omissão no acórdão atacado, se não houve a interposição de embargos declaratórios, visto que essa alegação somente tem pertinência quando o Tribunal 'a quo' rejeita o recurso integrativo, sem suprir aquela mácula (omissão)". [...] 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. (REsp n. 1.216.179/PR, relator o Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 13/8/2013)
Outrossim, o Tribunal local fundamentou sua decisão, nos termos do art.
101, I, do CDC, ao consignar que "havendo relação de consumo, e, visando à proteção do consumidor e a facilitação da defesa dos seus direitos em juízo, deve ser integralmente mantida a r. Decisão agravada, que reconheceu a competência do foro do domicílio do autor, nos termos do artigo 101, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor" (e-STJ, fl. Documento: 53770464 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 09/11/2015 Página 2 de 5 Superior Tribunal de Justiça 282).
Constata-se, portanto, que os arts. 94 e 100, IV e V, do CPC, que justificam o
recurso especial e versam sobre a competência territorial, não foram debatidos pela Corte estadual, carecendo portanto do necessário prequestionamento. Inafastável a incidência dos enunciados n. 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal, aplicados por analogia.
Nesses termos:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ASSUNÇÃO DE DÍVIDA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL VIGENTE AO TEMPO DO CONTRATO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ e NºS 282 E 356/STF. 1. Se o conteúdo normativo contido nos dispositivos apresentados como violados não foi objeto de debate pelo tribunal de origem, evidencia-se a ausência do prequestionamento, pressuposto específico do recurso especial. Incidem, na espécie, os rigores das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 2. Se as conclusões da Corte de origem resultaram da estrita análise das provas carreadas aos autos e das circunstâncias fáticas que permearam a demanda, não há como rever tal posicionamento sem adentrar no reexame das provas. Aplicação das Súmulas nºs 5 e 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 245.951/SP, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 21/10/2014
Quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor no caso em tela,
há jurisprudência nesta Corte no sentido de que, em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do art. 236 da Constituição Federal, os serviços notariais assumem posição semelhante à das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos (§ 6º do artigo 37 também da Carta da República), sendo assim, é aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO ART. 535 DO
CPC NÃO CONFIGURADA. CARTÓRIO NÃO OFICIALIZADO. ATIVIDADE DELEGADA. ART. 22 DA LEI 8.935/1994. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TABELIÃO E SUBSIDIÁRIA DO ESTADO. DESNECESSIDADE DE DENUNCIAÇÃO À LIDE. DANO MORAL. SÚMULA 7/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SÚMULA 83/STJ. 1. Hipótese em que a instância ordinária condenou o ora recorrente ao pagamento de indenização em razão de transferência de imóvel mediante procuração falsa lavrada no cartório de sua titularidade. Foram fixados os valores dos danos morais e materiais,
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Superior Tribunal de Justiça respectivamente, em R$ 10.000,00 e R$ 12.000,00 – estes últimos correspondentes aos gastos com advogado para reverter judicialmente a situação. 2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. Inexiste a omissão apontada, porquanto o Tribunal de origem asseverou de forma expressa e clara a existência de nexo causal entre o dano e a atividade notarial, bem como a ausência de excludente por culpa de terceiro. 3. O exercício de atividade notarial delegada (art. 236, § 1º, da Constituição) deve se dar por conta e risco do delegatário, nos moldes do regime das concessões e permissões de serviço público. 4. Conforme decidido pela Segunda Turma no julgamento do Recurso Especial 1.087.862/AM, em caso de danos resultantes de atividade estatal delegada pelo Poder Público, há responsabilidade objetiva do notário, nos termos do art. 22 da Lei 8.935/1994, e apenas subsidiária do ente estatal. Precedentes do STJ. 5. O Código de Defesa do Consumidor aplica-se à atividade notarial. 6. Em se tratando de atividade notarial e de registro exercida por delegação, tal como in casu, a responsabilidade objetiva por danos é do notário, diferentemente do que ocorre quando se tratar de cartório ainda oficializado. Precedente do STF. 7. Não está configurada violação do art. 70 do CPC, na linha do raciocínio que solidificou a jurisprudência na Primeira Seção do STJ, no sentido de que é desnecessária a denunciação à lide em relação à responsabilidade objetiva do Estado, sem prejuízo do direito de regresso em ação própria. 8. A análise da tese de que não houve dano moral demanda reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, o que esbarra no óbice da Súmula 7/STJ. 9. "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida" (Súmula 83/STJ). 10. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. (REsp n. 1.163.652/PE. Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 1/7/2010).
PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL.
RESPONSABILIDADE CIVIL. TABELIONATO DE NOTAS. FORO COMPETENTE. SERVIÇOS NOTARIAIS. - A atividade notarial não é regida pelo CDC. (Vencidos a Ministra Nancy Andrighi e o Ministro Castro Filho). - O foro competente a ser aplicado em ação de reparação de danos, em que figure no pólo passivo da demanda pessoa jurídica que presta serviço notarial é o do domicílio do autor. - Tal conclusão é possível seja pelo art. 101, I, do CDC, ou pelo art. 100, parágrafo único do CPC, bem como segundo a regra geral de competência prevista no CPC. Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 625.144/SP. Relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ 29/5/2006).
Desse modo, consubstanciada a relação de consumo, há de se reconhecer
a competência do foro do domicílio da agravada para processamento do feito, visando à proteção do direito do consumidor e a facillitação da defesa dos seus direitos.
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Superior Tribunal de Justiça Ante o exposto, nego provimento ao agravo em recurso especial.
Publique-se.
Brasília-DF, 21 de outubro de 2015.
MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator
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