Você está na página 1de 13

Psicologia:

Henry Wallon e o
desenvolvimento
infantil
Silva, Vitor Lima da
SST Psicologia: Henry Wallon e o desenvolvimento infantil /
Vitor Lima da Silva
Ano: 2020
nº de p.: 13

Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados.


Psicologia: Henry Wallon e
o desenvolvimento infantil

Apresentação
Neste momento trataremos sobre os fundamentos da Psicologia do
desenvolvimento humano e da educação e os fatores e aspectos do
desenvolvimento humano.

Veremos os estudos do teórico do desenvolvimento infantil Henri Wallon que trouxe


importante sistematização de informações sobre o desenvolvimento infantil.

Psicologia do desenvolvimento e a
educação
A psicologia do desenvolvimento é uma área de pesquisa da Psicologia que busca
compreender o desenvolvimento do ser humano de maneira global, considerando
o processo de maturação do indivíduo em seus diferentes aspectos: físico-motor,
intelectual, afetivo-emocional e social.

O desenvolvimento é observado e estudado desde o nascimento do indivíduo até


a idade adulta, período no qual estes aspectos devem chegar a nível máximo de
maturação e equilíbrio.

Trata-se de um campo de estudo que utiliza pesquisas empíricas como meio


para produzir e sistematizar o conhecimento a partir de observações e pesquisas
realizadas com grupos de indivíduos com diferentes influências culturais, faixas
etárias e contextos sociais, além de estudos de casos clínicos.

O desenvolvimento humano, em geral, é considerado a partir de duas dimensões: a


física-orgânica e a mental-psicológica.

3
O desenvolvimento físico-orgânico busca
descrever as características básicas da
transformação do corpo e do organismo do
indivíduo.

O desenvolvimento mental-psicológico refere-se


à contínua maturação dos processos psicológicos
que vão ocorrendo gradativamente a partir do
surgimento de novas estruturas mentais.

Estas estruturas mentais geram novas possibilidades de organização da atividade


mental, que estão em constante desenvolvimento nos âmbitos da inteligência, da
vida afetiva e das relações sociais.

Neste contexto, por muito tempo, a criança foi vista e tratada como um adulto
em miniatura. Os estudos sobre o desenvolvimento humano contribuíram
para demarcar características próprias a cada etapa da vida do ser humano e,
assim, permitiu distinguir necessidades e possibilidades de cada faixa etária. A
generalização de características comuns em cada faixa etária contribuiu para o
entendimento das individualidades e para a interpretação dos comportamentos em
diferentes períodos da vida.

O avanço dos estudos do desenvolvimento humano repercutiu diretamente


no campo da Educação. Conhecer as necessidades e possibilidades de cada
faixa etária possibilitou a adequação de metodologias compatíveis com a fase
de desenvolvimento do indivíduo. Assim, o planejamento pedagógico do que e
como ensinar passou a ser feito de acordo com a maturidade do indivíduo e sua
capacidade de assimilação de novas informações e experiências.

4
Fatores e aspectos do
desenvolvimento humano
Podemos dizer que o desenvolvimento humano é resultado de um conjunto de
fatores que interagem entre si. Destacaremos para estudo os seguintes fatores:

1.Hereditariedade:

Refere-se à herança genética adquirida diretamente dos pais biológicos e


indica o potencial e pré-disponibilidade de desenvolvimento de determinadas
características e habilidades.

2. Crescimento orgânico:

Diz respeito ao desenvolvimento biológico do corpo. O crescimento e a


estabilização do esqueleto ampliam as possibilidades do indivíduo e de suas
ações no mundo.

3. Maturação neurofisiológica:

Refere-se ao desenvolvimento do sistema nervoso. O amadurecimento


do sistema neuronal possibilita novos padrões comportamentais e de
aprendizagem. O desenvolvimento cognitivo está muito ligado a este aspecto.

4. Meio:

Fator ligado às condições sociais e ambientais que influenciam no


desenvolvimento do indivíduo. Os estímulos externos auxiliam e intensificam
o desenvolvimento de certas habilidades e capacidades da pessoa e
influenciam diretamente nos demais aspectos do desenvolvimento humano.

A herança genética indica predisposições para determinadas características, mas é


na interação com o meio que estas predisposições serão desenvolvidas ou não, em
maior ou menor grau.

Os fatores do desenvolvimento não atuam isoladamente no indivíduo, eles estão


interligados, ou seja, são interdependentes. Cada ser humano possui características

5
próprias e os fatores do desenvolvimento interagem de maneira singular em cada
indivíduo.

Aspectos
O desenvolvimento humano deve ser entendido na sua globalidade, porém, para fins
didáticos, destacam-se quatro aspectos básicos. Conheça-os a seguir.

1. Físico-motor:

Diz respeito ao desenvolvimento orgânico e à maturação do sistema


neurofisiológico, o que permite ao indivíduo um maior controle e uma
coordenação do próprio corpo e facilita manuseio de objetos. À medida que
o corpo vai se desenvolvendo e o sistema nervoso amadurece, a criança
ganha autonomia ao adquirir novas habilidades corporais e motoras. O
desenvolvimento do aspecto físico-motor em um bebê por exemplo, ocorre
aos sete meses aproximadamente, onde ele desenvolve o controle dos braços
e segura objetos.

2. Intelectual:

Refere-se às funções cognitivas do indivíduo, tais como pensar e raciocinar.


À medida que o indivíduo desenvolve o aspecto intelectual, ele vai adquirindo
capacidade de assimilar maior quantidade de informações e conteúdo mais
complexos. O desenvolvimento intelectual está ligado à capacidade de
raciocinar e processar informações e, quanto mais desenvolvido o aspecto
intelectual do indivíduo, maior será sua capacidade de abstração.

3. Afetivo-emocional:

É a maneira particular que cada um tem de sentir e expressar emoções,


afetos e sentimentos. Está relacionado à experiência da pessoa no mundo,
na relação consigo mesma e com os demais. Por exemplo, o carinho que
sentimos por um amigo ou parente, o medo ou a ansiedade diante de uma
situação nova, a estima que a pessoa tem de si mesma, a vergonha quando
se sente exposta etc. A sexualidade está inserida neste aspecto.

6
4. Social:

Refere-se a como o sujeito estabelece relacionamentos interpessoais, ou


seja, como lida com os outros sujeitos ao seu redor. A sociabilidade é a
capacidade de a pessoa estabelecer novos relacionamentos sociais, o que lhe
permite transitar em diferentes meios.

As diferentes teorias do desenvolvimento concordam que esses quatro aspectos


básicos do desenvolvimento humano atuam de maneira interdependente e são
indissociáveis. No entanto, cada teoria dá um enfoque maior a algum destes
aspectos

Henry Wallon (1879 – 1962)


Henry Paul Hyacinthe Wallon nasceu na França. Graduou-se em Filosofia (1902)
e em Medicina (1908). Trabalhou como médico do exército francês na I Guerra
Mundial e sua experiência com ex-combatentes com lesões cerebrais o fez
repensar seus conceitos de neurologia, os quais havia desenvolvido em seu
trabalho anterior com crianças deficientes.

Henry Wallon.

Fonte: Wikimedia Commons

7
Wallon atuou em instituições psiquiátricas e seguiu carreira acadêmica na França,
tendo ministrado conferências sobre a psicologia da criança na Universidade de
Sorbonne e em outras instituições de Ensino Superior. Wallon fundou um laboratório
de pesquisa e atendimento a crianças consideradas deficientes, na cidade de
Paris (1925). Ele viajou à Rússia no ano de 1931, onde foi convidado a integrar
um grupo de intelectuais de diferentes áreas do conhecimento que se propunham
a aprofundar o estudo do materialismo dialético e pesquisar sua aplicação em
diferentes áreas.

Curiosidade
Materialismo dialético: Abordagem formulada por Marx e
Engels, a partir do pensamento dos filósofos Hegel e Feuerbach,
introduzindo a dimensão histórica como fundamento de uma
prática exercida pelo ser humano.

O materialismo dialético propõe uma aproximação com a realidade


de caráter científico, realizada por sucessivas afirmações e
contradições.

Em sua passagem pela Rússia, Wallon manteve contato com Lev Vygotsky. Leitor
de Marx, em 1942, filiou-se ao partido comunista, onde atuou na resistência
francesa contra os nazistas no decorrer da II Guerra Mundial. Presidiu a seção
francesa da Liga Internacional da Educação Nova, fundada em 1921 e composta
por pedagogos, psicólogos e filósofos que compartilhavam críticas ao sistema de
ensino tradicional.

Após a II Guerra Mundial, foi convidado pelo governo francês para integrar uma
comissão criada para reestruturar o setor educacional da França. Wallon fez
parceria com o físico Paul Langevin e desenvolveu o projeto que ficou conhecido
como Langevin-Wallon. Esta iniciativa promoveu mudanças substanciais no
sistema educacional francês, tornando-o um dos mais eficientes do mundo. O
projeto visava construir uma educação e uma sociedade mais justas e era pautado
em quatro pilares básicos. Conheça-os a seguir.

8
1. Justiça:

Defendia que toda criança deve ter direito ao pleno desenvolvimento,


independente de origens sociais, étnicas ou familiares.

2. Dignidade:

Devia ser igual para todas as ocupações e profissões, sem discriminação de


importância entre trabalhos manuais e intelectuais.

3. Orientação:

Referia-se à necessidade de formação escolar antes da formação


profissional, e o pilar da cultura geral defendia que não poderia haver
especialização técnica-profissional sem uma boa base de cultura geral, pois
todo trabalhador é, antes, um cidadão, e neste sentido precisa de formação
mais ampla do que a reprodução estrita da técnica.

4. Cultura:

Uma estratégia para a formação do trabalhador não ficar restrita à técnica,


para que ele também pudesse ter compreensão dos processos sociais mais
amplos.

Os estágios do desenvolvimento
infantil segundo Wallon
Diferentemente da psicologia genética de Piaget, Wallon considerava que o sujeito
se constrói predominantemente na interação com seu meio. Dessa maneira, ele
buscou compreender essa relação em cada etapa do desenvolvimento elaborada
por ele.

Destinou especial atenção à alternância entre afetividade e cognição ao colocar


como base de sua teoria a integração afetiva-cognitiva-motora. Considerou
também que o desenvolvimento envolve os fatores orgânicos e os fatores sociais.

9
Fatores orgânicos e os fatores sociais.

Fatores orgânicos Fatores sociais


Os fatores orgânicos são os responsáveis
Os fatores sociais estão presentes na criança
pela sequência fixa que se verifica entre os
desde a aquisição de habilidades motoras
estágios do desenvolvimento. Todavia, não
básicas que possibilitam uma interação ativa
garantem uma homogeneidade no seu tempo
com o seu meio.
de duração.

Fonte: Elaborado pela autora (2020)

Para Wallon, a influência do meio social torna-se muito mais decisiva após a
aquisição de condutas psicológicas superiores, como a inteligência simbólica.

A psicologia walloniana contrapõe-se às concepções que veem o desenvolvimento


de forma linear. O autor defendia que o ritmo do desenvolvimento é descontínuo,
com rupturas, retrocessos e reviravoltas. A passagem de um a outro estágio, para
ele, não é uma simples ampliação, mas uma reformulação.

Estas passagens são marcadas por conflitos e crises, portanto ele dedicou especial
atenção a estudar tais momentos de crise no desenvolvimento infantil e delimitou o
desenvolvimento infantil em cinco fases. Veja quais são elas a seguir.

1. Estágio impulsivo-emocional:

Corresponde ao período de zero a um ano. Neste período, predominam os


impulsos emocionais primários que possibilitam experiências corporais e
sensoriais. No decorrer do estágio é possível reconhecer a expressão de
diferentes emoções da criança, tais como alegria, medo, raiva etc.

2. Estágio sensório-motor e projetivo:

Designa o período entre doze meses e três anos. Nesta fase, a criança
já possui capacidade motora para explorar seu ambiente e experimentar
os objetos com os sentidos. Possui capacidade comunicativa, pois já há
desenvolvimento da linguagem e da função simbólica. Inicia-se a capacidade
de discriminação de objetos e de separação deles. Nesta fase, criam-se
condições para o desenvolvimento das aptidões afetivas e cognitivas que
serão as principais características deste período.

3. Personalismo:

10
Ocorre dos três aos seis anos. A noção de existência de maneira
independente do outro desenvolve-se pelo processo de oposição (expulsão
do outro) e de sedução (assimilação do outro). Estes dois processos juntos
possibilitam à criança distinguir o seu “eu” do outro.

4. Categorial:

Compreende o período entre seis a onze anos. Nesta fase, o “eu” já está
bem definido e separado do “outro”. Começa a possibilidade de atividades
em grupo, de seriação, classificação e categorização em diferentes níveis.
A capacidade de categorizar ajuda a criança na compreensão de si mesma
como indivíduo.
4. Puberdade e adolescência: Inicia aos onze anos. Neste período, o jovem
dá continuidade à construção do seu ser como sujeito autônomo, enfatiza
seus posicionamentos, acirra os questionamentos ao grupo de adultos,
especialmente aos pais. Ocorrem muitas mudanças e conflitos e uma intensa
identificação com o grupo de amigos, ambiente no qual o adolescente
sente-se seguro e reconhecido. A capacidade de abstração aumenta
progressivamente e possibilita pensamentos mais complexos e críticos.
Nesta fase de mudança e experimentação, o jovem amplia seu conceito de
justiça e liberdade, porém entra em conflito, pois ainda depende dos pais.

Enquanto Piaget priorizou o estudo das estruturas mentais sob um viés biológico,
Henri Wallon se preocupou mais com as relações da criança com o ambiente. Ele
considerava que o sujeito se constrói nas suas interações com o meio e procura
entender, em cada fase do desenvolvimento, o sistema de relações estabelecidas
entre a criança e seu ambiente. Wallon defendia a observação no ambiente
da criança para poder entender o significado real de suas manifestações no
seu próprio contexto. O meio não é uma entidade estática e homogênea, mas
transforma-se juntamente com a criança.

Wallon adota o materialismo dialético como método de análise de sua teoria


psicológica e dessa maneira, propõe o estudo integrado do desenvolvimento.

Ele defende que, para a compreensão da psicologia infantil, não bastam os dados
oferecidos pela psicologia genética, mas é preciso recorrer a dados provenientes de
outros campos de conhecimento.

11
Fechamento
Estudamos aqui como o desenvolvimento humano é focado a partir de duas
dimensões: a física-orgânica e a mental-psicológica, e com os avanços dos
estudos do desenvolvimento humano houve uma repercussão direta no campo
da Educação. Conhecemos as necessidades e possibilidades de cada faixa
etária que possibilitou a adequação de metodologias compatíveis com a fase de
desenvolvimento do indivíduo. Vimos ainda os fatores do desenvolvimento humano
e os quatro aspectos básicos do desenvolvimento humano.

Por fim, compreendemos que Wallon utiliza como base de sua teoria a integração
afetiva-cognitiva-motora e postulou cinco estágios do desenvolvimento: impulsivo-
emocional, sensório-motor e projetivo, personalismo, categorial e puberdade e
adolescência.

12
REFERÊNCIAS
BOCK, A. M. F., TEIXEIRA, M. de L. T. Psicologia: uma introdução ao estudo da
psicologia. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

HOUDÉ, O. Dez lições de psicologia e pedagogia: uma contestação das ideias de


Piaget. São Paulo: Ática, 2009.

OLIVEIRA, Z. R., DAVIS. C. Psicologia na Educação. São Paulo: Cortez 1994.

PIAGET, J. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1998.

13

Você também pode gostar