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Não importa quantos livros você

Uma virtude do livro é


tenha lido para melhorar seu
seu absoluto realismo...
relacionamento, leia este e siga os
Oferece uma série de
princípios baseados em pesquisa
ferramentas que os casais
que ele apresenta! Os autores são
podem usar para reconciliar
cientistas internacionalmente
suas diferenças sem a
conhecidos que produziram um
ajuda de um terapeuta.
livro que todos os casais precisam
ler. Não são as diferenças entre
você e seu parceiro que JANE BRODY, The New York Times
importam, mas como você lida
com elas, e este livro mostra
exatamente como e por quê.

HOWARDJ MARKMAN, PhD,


coautor de Fighting for Your Marriage Quando os parceiros brigam, eles
frequentemente pressionam um ao
outro para a mudança. Mas ver os
conflitos pela perspectiva do outro
ajuda o casal a se afastar da raiva
e da culpa. Este valioso livro fornece
estratégias concretas para fazer
Este livro enganosamente simples
exatamente isso. Com uma
pode mudar vidas... A genialidade
compreensão mais profunda das
do livro é que essas técnicas não
vulnerabilidades emocionais do seu
são difíceis, e elas podem ajudar a
parceiro, você pode criar confiança
pôr fim a um eterno conflito.
e intimidade, e talvez, até mesmo,
suscitar as mudanças que mais
PEPPER SCHWARTZ, PhD, importam para você.
coautora de The Normal Bar:
The Surprising Secrets ofHappy Couples
JANIS ABRAHMS SPRING, PhD,
and What They Reveal about Creating a
autora de After theAffair
New Normal in Your Relationship
Diferenças
Reconciliáveis
C544d Christensen, Andrew
Diferenças reconciliáveis: reconstruindo seu relacionamento
ao redescobrir o parceiro que você ama, sem se perder / Andrew
Christensen, Brian D. Doss e Neil S. Jacobson ; tradução Mara
Regina S. W. Lins e Marisa Rozman — 2.ed. — Novo Hamburgo :
Sinopsys, 2018.
478p. ; 16 x23cm.

ISBN 978-85-9501-067-3

1. Psicologia — Relacionamento — Casal. I. Doss, Brian D.


II. Jacobson, Neil. S. III. Lins, Mara Regina S W. IV. Rozman,
Marisa. V. Título.

CDU 159.922

Catalogação na publicação: Mônica Ballejo Canto — CRB 10/1023


Diferenças
Reconciliáveis
Reconstruindo seu relacionamento
ao redescobrir o parceiro que você ama, sem se perder

2a
edição

Andrew Christensen
Brian D. Doss
Neil S. Jacobson

Tradução
Mara Regina S. W. Lins e Marisa Rozman

2018
© Sinopsys Editora e Sistemas Ltda., 2018
Diferenças reconciliáveis — Reconstruindo seu relacionamento
ao redescobrir o parceiro que você ama, sem se perder
Andrew Christensen, Brian D. Doss e Neil S. Jacobson

Capa: Fabiana Franck


Imagem da capa: Shutterstock — Foto Zamurovic Photography
Supervisão editorial: Mônica Ballejo Canto
Assistente editorial: Jade Arbo
Editoração: Formato Artes Gráficas

Todos os direitos reservados à


Sinopsys Editora
Fone: (51) 3066-3690
E-mail: atendimento@sinopsyseditora.com.br
Site: www.sinopsyseditora.com.br
Sobre os autores
Andrew Christensen, Ph.D., é Professor de Psicologia na Universidade da
Califórnia, Los Angeles. Tem estudado relacionamentos íntimos e trabalhado
com casais em terapia há mais de 30 anos. Também tem conduzido pesquisa
extensiva sobre o impacto da terapia de casal, incluindo a abordagem que
embasa este livro, a qual foi desenvolvida com o falecido Neil S. Jacobson. Dr.
Christensen e sua esposa vivem em Los Angeles e têm dois filhos adultos.

Brian D. Doss, Ph.D., é Professor Adjunto de Psicologia na Universidade


de Miami, onde ensina e conduz pesquisas sobre terapia de casal e relações
amorosas. Dr. Doss vive em Miami com sua esposa e dois filhos.

Neil S. Jacobson, Ph.D., foi Professor de Psicologia na Universidade de


Washington até sua morte em 1999.
Agradecimentos
Há aqueles que influenciaram minhas ideias, aqueles que me ajudaram a
articulá-las neste livro, aqueles que me ajudaram a implementar essas ideias com
casais e aqueles que me ajudaram a viver a realidade dessas ideias. Todos merecem
agradecimento.
Certamente, meus coautores, Neil S. Jacobson e Brian D. Doss, foram a
principal influência em meu pensamento sobre terapia de casal. Ao longo de anos
de discussão produtiva, projetos de escrita conjunta e supervisão conjunta de nossos
terapeutas, o falecido Neil Jacobson e eu desenvolvemos e refinamos nossa aborda­
gem de terapia de casal. Cada um de nós poderia ter sido capaz de desenvolver essa
abordagem sozinho, mas não tão bem e não tão prazerosamente. Meu ex-aluno de
graduação e agora colega e coautor Brian Doss trouxe grande entusiasmo na disse­
minação do nosso trabalho e criatividade na adaptação da terapia comportamental
integrativa de casal (IBCT) para um público maior. De sua pesquisa inicial sobre o
que leva as pessoas a buscar terapia de casal para seu gigantesco esforço atual, o qual
é traduzir IBCT em um programa on-line acessível a todos, ele demonstrou não
apenas uma capacidade de pensar grande, mas também energia e tenacidade para
seguir adiante. Além de Neil e Brian, outras influências importantes nas minhas re­
flexões foram Robert Weiss, um dos pais da terapia de casal comportamental e meu
primeiro supervisor de terapia conjugal; Gayla Margolin, com quem eu realizei meu
primeiro estudo clínico de terapia conjugal; o falecido Harold Kelley, um influente
psicólogo social com quem trabalhei no início de minha carreira; e Dan Wile, cujos
escritos clínicos, embora vindos de uma perspectiva teórica totalmente diferente, in­
fluenciaram diretamente meu próprio trabalho com casais. E, finalmente, os casais
com quem trabalhei, diretamente na minha clínica particular ou indiretamente, as­
sistindo horas de suas sessões de terapia em vídeo, foram um desafio contínuo ao
viii Agradecimentos

meu raciocínio e um lembrete repetido de que a realidade feia e terna do conflito e


o amor é sempre mais complicado do que nossas teorias imaginam.
Minha editora da The Guilford Press, Christine Benton, foi uma enorme
ajuda para traduzir minhas ideias em material impresso. Ela entendeu o que eu
estava tentando dizer sobre a aceitação nos relacionamentos, e manteve o leme
deste livro claramente em seu curso em duas edições. Ela me ajudou a dizer o que
eu queria dizer — que é tudo o que qualquer pessoa pode pedir de um editor. Eu
também quero agradecer Melissa Fu e Betty Horng por sua ajuda de secretariado
com este livro. Elas trabalharam alegremente no manuscrito enquanto eu lhes pas­
sava vários rascunhos.
Os terapeutas do nosso projeto, tanto em Los Angeles como em Seattle,
incorporaram as ideias de nossa abordagem de tratamento para dar suporte às vi­
das de nossos casais em conflito. Alfredo Crespo, Shelly Harrell, Megan Sullaway
e Anthony Zamudio, em Los Angeles, e Peter Fehrenbach, Carol Henry, Christo-
pher Martel e Debra Wilk, em Seattle, são talentosos terapeutas que demonstra­
ram a especial habilidade de atender às demandas de pesquisa de nosso projeto, ao
mesmo tempo em que prestaram atendimento de qualidade a cada um de seus ca­
sais. Agradeço aos esforços do professor Bill George, que assumiu a administração
do projeto na Universidade de Washington após a morte prematura de Neil Jaco-
bson. Os estudantes de pós-graduação da UCLA e da Universidade de Washington,
agora todos são Ph.D., exceto um deles, foram avaliadores clínicos e pesquisado­
res extraordinariamente capacitados que conduziaram as atividades do dia a dia
desse grande projeto de pesquisa. Brian Baucom, Katherine Williams Baucom,
Lisa Benson, Brian Doss, Kathleen Eldridge, Krista Gattis, Amanda Jensen, Janice
Jones, Meghan McGinn, Felicia De La Garza Mercer, Mia Sevier e Lorelei Simpson
foram estudantes de pós-graduação no projeto na UCLA; David Atkins, Sara
Berns, Jean Yi e Jennifer Wheeler foram estudantes de pós-graduação no projeto
na universidade de Washington. Além disso, as habilidades metodológicas e esta­
tísticas de David Atkins foram essenciais para este projeto. Finalmente, desejo
agradecer aos competentes coordenadores de projetos da UCLA, com quem tra­
balhei de perto: Nancy Chen, Nikki Frousakis, Cindy Heng, Betty Horng, Melissa
McElrea, Adam Rico, Marietta Watson, Mike Wong e Wai-Ling Wu. Eles ajuda­
ram que o projeto fluísse bem.
E, finalmente, quero agradecer àqueles que me ajudaram a viver minhas
ideias sobre conflito, aceitação e intimidade num verdadeiro laboratório de aprendi­
zado de amor, nosso lar: minha esposa Louise, nossa filha Lisa e nosso filho Sean.

Andrew Christensen
Agradecimentos ix

Fiquei honrado por ter sido convidado a participar da segunda edição de Di­
ferenças reconciliáveis. A primeira edição que Andy e Neil escreveram foi um exce­
lente exemplo de sua capacidade de conectar e integrar três áreas de especialização:
conhecimento da literatura de pesquisa sobre terapia de casal, habilidades de tera­
peuta aprimoradas ao trabalhar com centenas de casais em dificuldades e uma capa­
cidade de traduzir os conceitos em um formato que os casais poderiam aplicar por
conta própria nos seus relacionamentos.
As minhas contribuições para a segunda edição são o resultado das inúmeras
oportunidades de orientação e colaboração que tive ao longo dos anos. Meu coau-
tor, Andy, era meu mentor do Ph.D. e o catedrático de dissertação na UCLA. Ele,
mais do que ninguém, ajudou a moldar minhas ideias sobre sofrimento e interven­
ção em casais. Igualmente importante, ele forneceu um exemplo brilhante de como
se pode ser bem-sucedido tanto pessoal como profissionalmente.
Tenho a sorte de ter outros mentores importantes no campo da terapia de
casal, incluindo Doug Snyder, que foi meu colega no Texas A&M por 5 anos; Scott
Stanley e Howard Markman, que ajudaram a moldar minhas ideias sobre prevenção
e Julian Libet no Charleston VA Medical Center, que me auxiliou no esforço para
adaptar minhas abordagens para terapia de casal com casais desfavorecidos. Também
me beneficiei imensamente das inúmeras colaborações com meus colegas Galena
Rhoades e Lorelei Simpson, que me proporcionaram tanto o desafio como a opor­
tunidade de novas perspectivas.
Algumas das novas ideias que introduzimos na segunda edição foram criadas
e testadas como parte de nosso subsídio dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH)
dos Estados Unidos da América para desenvolver um programa baseado na web
para casais que enfrentam dificuldades em seu relacionamento (www.OurRela-
tionship.com). Assim, eu gostaria de agradecer ao NIH pelo apoio a esse trabalho e
às pessoas que fizeram esse projeto possível. Em particular, Emily Georgia, Larisa
Cicila e Judith Biesen que desempenharam papéis centrais na concepção e imple­
mentação do programa baseado na web. Kelly Koerner, Cammy Bean e Mark Har-
rison ajudaram a me orientar na tradução de nossa abordagem de terapia em um
formato de autoajuda, e essas lições foram essenciais na formulação de muitas das
revisões desta edição. Nossos editores da Guilford, Christine Benton e Kitty Moore,
foram também extremamente prestativas a esse respeito. E Cherelle Carrington me­
rece uma forte dose de apreço pela preparação do índice para este livro.
Finalmente, gostaria de agradecer o incalculável apoio que recebi de minha
esposa, Mandy, e nossos dois filhos, Abby e Matthew. Embora eu possa dizer muito
mais do que isso, uma das lições mais importantes que aprendi com eles é a impor­
tância de separar minha vida profissional de minha vida pessoal. Assim, fico por
aqui — agradeço a vocês!

Brian D. Doss
Sumário

Prefácio ............................................................................................................ 13

Parte I - Os Lados Conflitantes do Conflito


1 Três lados para cada história ................................................................. 23

2 “Você está errado!” — Problemas de relacionamento


como falhas do outro............................................................................. 54

Pa II - Uma Compreensão Deep(Profunda)


r t e
do Conflito: O Terceiro Lado da História
3 “Como você pode ser assim?” — Problemas
de relacionamento como diferenças .................................................... 77

4 “Você sabe como me machucar” — Problemas de


relacionamento como sensibilidades emocionais.............................. 104

5 “Você não vê que estou estressado?” — Problemas de


relacionamento como circunstâncias externas ................................... 134

6 Uma cura pior do que a doença — Problemas de


relacionamento como padrões de comunicação ............................... 153
xii Sumário

Par te III - Da Discussão à Aceitação


7 O delicado equilíbrio: Aceitação e mudança ...................................... 185

8 Nossa própria história: Aceitação pela compreensão ........................ 210

9 Caminhando com os sapatos do outro: Aceitação pela compaixão..... 231

10 Ganhando alguma perspectiva no conflito:


Aceitação por meio de distância emocional que
promove tolerância................................................................................. 260

Pa r t e IV - Mudança Deliberada Por Meio da Aceitação


11 Os dilemas da mudança estabelecida ................................................ 285

12 Mudança estabelecida por meio da atenção plena


(Mindfulness) — Mudança personalizada para sua relação.............. 312

13 Mudança estabelecida por meio da comunicação — Seguindo


bons conselhos sobre como falar e escutar
com cuidado e atenção plena................................................................ 335

14 A peça-chave para a mudança estabelecida — Responsabilizando-se


pela mudança, mesmo quando as coisas vão mal ............................. 366

Pa r t e V - Quando Aceitação Não é Suficiente


15 “Não faça isso comigo” — Violência, abuso verbal e infidelidade 399

16 Buscando profissionais — Terapia de casal e individual................... 430

Recursos ........................................................................................................... 459

Referências ....................................................................................................... 463

Índice remissivo ............................................................................................. 467


Prefácio
Não importa o quanto temos em comum com aquele que
amamos, cada um de nós permanece um ser humano único. E não
importa o quanto nos amamos, as diferenças entre nós acabarão por
causar conflito. Sentimo-nos magoados ou ignorados, ressentidos ou
zangados, e as nossas discussões, frequentemente, agravam o proble­
ma. Algo tem de ser feito, e nós, geralmente, responsabilizamos nos­
sos parceiros.
Soa familiar? Se sim, você não está sozinho. Tentar fazer com que
seu parceiro mude quando um conflito parece estar acabando com seu
relacionamento é da natureza humana. É fácil entender seu próprio
ponto de vista, é muito mais difícil olhar para o contexto daquele que
você ama. Sua relação melhoraria significativamente se somente ele ou
ela visse as coisas da sua maneira e fizesse algumas alterações pequenas
no seu comportamento. Isto parece uma conclusão óbvia.
No entanto, como você, sem dúvida sabe, tentar mudar outra
pessoa, mesmo aquela que está motivada pelo amor e lealdade para
com você, é uma tarefa difícil. Obter a mudança de seu parceiro sem
demonstrar a aceitação de quem ele é, uma pessoa única, fica difícil,
muitas vezes impossível, como aprendemos ao longo de décadas de
prática clínica e pesquisa no campo da terapia de casal.
14 Prefácio

Quando Neil S. Jacobson e eu nos conhecemos no início de


nossas carreiras, fomos ambos proponentes da abordagem compor-
tamental da terapia de casal em que fomos treinados. Este tipo de
terapia ensina a comunicação entre os casais e habilidades de resolu­
ção de problemas para que os parceiros possam fazer mudanças po­
sitivas em seu comportamento em relação um ao outro. Em estudos
realizados na América do Norte, na Alemanha, na Austrália e em
outros lugares, a abordagem comportamental mostrou-se superior
ao ajudar os casais a melhorar seu grau de satisfação e a reduzir o
conflito em relação a casais que não receberam nenhum tratamento.
A eficácia da abordagem comportamental é apoiada por mais pes­
quisas do que qualquer outra terapia para casais. Neil tornou-se um
expoente líder deste tipo de terapia de casal e produziu alguns dos
melhores estudos de pesquisa mostrando sua eficácia. No entanto,
seus estudos e os de outros mostraram as limitações desta aborda­
gem: um terço dos casais não respondeu ao tratamento, e mesmo
entre aqueles que responderam positivamente, um número substan­
cial recaiu nos anos seguintes após o tratamento. Do ponto de vista
científico, o melhor disponível não era tão bom.
Em 1991, quando Neil me convidou para falar na Universidade
de Washington, descobrimos que tínhamos, separadamente e simulta­
neamente, começado a experimentar uma abordagem diferente para ca­
sais em conflito. Embora não fossem idênticas, nossas intervenções ti­
nham uma coisa em comum: promover a aceitação ao invés da mudan­
ça. Havíamos desenvolvido maneiras pelas quais os parceiros podiam
experimentar e aceitar as vulnerabilidades normais que todos nós temos
e as incompatibilidades muito naturais que surgem entre dois indivídu­
os únicos. Com essa aceitação, ocorreu algo paradoxal: muitas das ne­
cessidades e demandas de mudança se evaporaram, e cada parceiro se
tornou mais receptivo a fazer as mudanças que eram verdadeiramente
importantes para o outro.
Decidimos combinar forças no desenvolvimento de nosso no­
vo tratamento e na busca de auxílio financeiro que nos permitisse
Diferenças Reconciliáveis 15

testar sua eficácia. Em 1993, obtivemos um subsídio de três anos do


Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos para reali­
zar um pequeno estudo piloto comparando nosso tratamento com a
terapia de casal comportamental tradicional (Traditional Behavioral
Couple Therapy - TBCT). Como parte de nosso estudo piloto, trei­
namos cinco terapeutas em nossa nova abordagem, que chamamos
de terapia comportamental integrativa de casal (Integrative Behavio-
ral Couple Therapy-IBCT), bem como na abordagem comporta-
mental tradicional. Vinte e um casais com conflitos foram aleatoria­
mente designados para uma das duas abordagens e receberam até 25
sessões de terapia. Com base em avaliações extensivas desses casais
antes do tratamento, imediatamente após e nos períodos de segui­
mento, os casais em nosso tratamento integrativo apresentaram re­
sultados substancialmente melhores do que aqueles no tratamento
tradicional, embora, como esperado, os da terapia tradicional tam­
bém apresentaram melhora.
Encorajados por esses resultados, sabíamos que apenas um es­
tudo maior com uma amostra mais diversificada de casais e uma
avaliação e acompanhamento mais extensos forneceriam evidência
definitiva do resultado relativo do nosso novo tratamento, IBCT.
Em 1997, recebemos financiamento do Instituto Nacional de Saúde
Mental dos Estados Unidos para um estudo de cinco anos com 134
casais, que, no nosso conhecimento, é a maior e mais extensa avalia­
ção de terapia de casal realizada até esta data. Selecionamos casais
em Los Angeles e Seattle que tinham séria e crônica discórdia conju­
gal. Todos foram aleatoriamente designados para um dos dois trata­
mentos e receberam até 26 sessões de terapia de casal durante cerca
de oito meses. Os casais foram acompanhados durante dois anos
após o tratamento.
Em 1998, Brian Doss se juntou ao projeto como um estudante
de pós-graduação na UCLA (University of California, Los Angeles).
Em 1999, com apenas dois anos do projeto, Neil sofreu um súbito ata­
que cardíaco e morreu aos 50 anos. Uma tragédia pessoal para todos
16 Prefácio

aqueles que o conheciam e que lhe estimavam, e também foi um gran­


de revés para nossa pesquisa. Felizmente, professores e estudantes de
pós-graduação da Universidade de Washington, bem como estudantes
de pós-graduação na UCLA seguiram em frente com o desafio de traba­
lhar sem Neil, e o projeto continuou. Nós ainda obtivemos financia­
mento adicional em 2003 para continuar com os casais por cinco anos
após o término da terapia.
Apesar de estarem com conflitos sérios e crônicos, os casais em
ambos os tratamentos mostraram melhora substancial que foi man­
tida em grande medida ao longo de dois anos de acompanhamento.
O projeto do estudo, entretanto, proibiu qualquer terapia adicional
para esses casais após o término do tratamento. Em cada uma das
avaliações de seis meses ao longo dos dois primeiros anos de segui­
mento, os casais que receberam IBCT mostraram uma manutenção
da mudança significativamente maior do que os casais que recebe­
ram TBCT. No segundo ano após o término do tratamento, 69%
dos casais em IBCT e 60% dos casais em TBCT evidenciaram me­
lhora clinicamente significativa em relação ao seu funcionamento
inicial. Durante o terceiro ao quinto ano de seguimento, os casais
mostraram alguma deterioração, e as diferenças entre os dois trata­
mentos se dissiparam. No entanto, 50% dos casais ainda apresenta­
ram melhora clínica significativa em relação ao seu funcionamento
inicial na avaliação final do quinto ano. Concluímos que com estes
casais com conflito sério e crônico, provavelmente seriam necessárias
sessões de reforço adicionais para manter os ganhos do tratamento,
bem como o resultado superior da IBCT. Para obter mais informa­
ções sobre esta pesquisa, incluindo cópias de alguns de nossos arti­
gos, consulte nosso site: http://ibct.psych.ucla.edu.
Todos os casais que participaram da IBCT receberam a primei­
ra edição deste livro como um guia complementar para seu tratamen­
to. Embora você não esteja recebendo um atendimento com um dos
terapeutas que treinamos, acreditamos que você pode usar este livro
para diminuir o conflito e aumentar a intimidade em seu relaciona­
Diferenças Reconciliáveis 17

mento. Alguns de vocês podem querer usar o livro à medida que bus­
cam ajuda profissional de um terapeuta de casal (ver Capítulo 16).
Outros podem achar o livro suficiente.
Após a conclusão do nosso estudo, temos nos empenhado em
dois grandes esforços de divulgação. Primeiro, o Departamento de As­
suntos de Veteranos dos EUA escolheu a IBCT como um dos trata­
mentos baseados em evidências para disponibilizar aos casais de vetera­
nos com necessidade de terapia de casal. Desde 2010, tenho estado for­
temente envolvido na formação de terapeutas e consultores. Em segun­
do lugar, Brian encabeçou um esforço para adaptar IBCT para acesso
on-line. Agora, como professor da Universidade de Miami, Brian obte­
ve financiamento do Instituto Nacional de Saúde Infantil e Desenvolvi­
mento Humano dos Estados Unidos para desenvolver e testar este siste­
ma on-line. Desde 2009, Brian e eu trabalhamos juntos, cada um com
seus alunos de pós-graduação, para desenvolver e testar este programa.
Ambos os projetos obrigaram-nos a repensar a IBCT e a desenvolver
maneiras de torná-lo mais acessível. Nós quisemos incorporar estas me­
lhorias em nosso livro e decidimos, então, revisar a primeira edição do
Reconcilable diferences (Diferenças reconciliáveis).
Esta edição revisada é diferente da primeira edição em cinco
maneiras importantes. Em primeiro lugar, ajudamos os leitores a de­
finir um problema central no qual eles se concentrarão na medida
em que trabalharem no livro. Embora os casais, frequentemente, te­
nham uma série de preocupações, geralmente estas se centram em
torno de um ou dois temas. Por exemplo, um casal pode constante­
mente brigar sobre as responsabilidades (quem deve fazer o quê em
relação aos cuidados infantis e da casa e conforme o padrão de cada
um). Outro casal pode brigar sobre questões de intimidade (quão
perto devemos estar fisica e emocionalmente). Acreditamos que isso
ajuda a focalizar em profundidade uma questão central. Após obter
sucesso com esta questão central, você pode se concentrar em outras
questões. Em segundo lugar, fornecemos uma série de questionários
baseados em evidências com instruções sobre pontuação e interpre­
18 Prefácio

tação para que você possa avaliar o seu relacionamento e proceder


com base em conhecimentos sólidos. Em terceiro lugar, introduzi­
mos um acrônimo, a análise DEEP (profunda), para ajudá-lo a en­
tender suas lutas. D representa Diferenças de personalidade e inte­
resses que podem contribuir para o conflito. O primeiro E represen­
ta sensibilidade Emocional que pode tornar as diferenças mais difí­
ceis de lidar. O segundo E representa estressores Externos que po­
dem complicar a resolução do problema. E, finalmente, o P repre­
senta Padrões de comunicação. Os casais interagem em torno de
suas dificuldades como uma maneira de resolvê-las, mas, com frequ­
ência, esta forma de comunicação não só não resolve o problema,
mas, na verdade, o torna pior. No início do livro, há capítulos dedi­
cados a cada um desses aspectos de uma análise DEEP (profunda),
com questionários para ajudar os leitores a avaliar essas áreas. Em
quarto lugar, reduzimos partes do livro e tentamos simplificar e tor­
ná-lo mais legível. Finalmente, tentamos ser mais inclusivos com
esta edição. Embora tenhamos sugerido na primeira edição que o
IBCT poderia funcionar bem com casais gays e lésbicas, os nossos
exemplos centraram-se exclusivamente em casais heterossexuais.
Nesta revisão, incluímos exemplos de casais homoafetivos. Acredita­
mos que essas alterações tornam o livro muito mais útil para facilitar
as mudanças em seu relacionamento.
Se há uma coisa que descobrimos em nossos anos de trabalho
com casais, é que o conselho é fácil de dar, difícil de receber e ainda
mais difícil de implementar. Embora este livro tenha o propósito de le­
var você e seu parceiro a uma compreensão de como os casais intera­
gem, o que causa o conflito, e como você pode diminuir o seu, ele pro-
positadamente evita conselhos do tipo "isto parece bom", "algo que ser­
ve para todo mundo". Em vez disso, orienta para uma compreensão de
sua própria relação, única, e sugere maneiras de promover a aceitação.
Para apresentar as questões discutidas, preenchemos as páginas com his­
tórias de casais enfrentando problemas muito parecidos com os seus.
Como o autor principal deste livro, eu gerei estes exemplos de minha
Diferenças Reconciliáveis 19

própria prática, minha supervisão da terapia de casal, e minha experiên­


cia pessoal, mas cada um é um amálgama construído para proteger a
confidencialidade de qualquer casal real.
Como o conflito é uma janela para as vulnerabilidades e sensi­
bilidades dos parceiros em guerra, ele oferece a promessa de uma
maior conexão, bem como a ameaça de distanciamento. Acredita­
mos que, ao compreender seus conflitos e aceitar emocionalmente
suas posições no conflito, vocês dois podem alcançar uma genuína
intimidade. Você pode, no final, reconciliar as diferenças que os man­
têm separados.
Andrew Christensen
University of California, Los Angeles
Parte I
Os Lados Conflitantes
do Conflito
1

Três lados para cada história

• Débora acha que Frank é emocionalmente empobrecido. Frank pen­


sa que ela é insegura.
• Frank pensa que Débora vive numa montanha russa emocional sem
fim. Débora pensa que Frank esconde seus sentimentos.
• Débora quer conversar sobre o que a está incomodando. Frank quer
se desestressar ao não falar sobre o que está o incomodando.
• Frank pensa: Débora é insistente. Ela pensa: Frank simplesmente
não se importa.

Como esse casal veio a se sentir como adversários quando o que


os uniu, há uma década, era o amor? Como veremos, há três lados
para todas as histórias. Vamos ouvir cada um deles.

A HistóriA de déborA

Quanto tempo você pode ficar casado com um estranho? Parece


que eu estou prestes a estabelecer um tipo de recorde.
24 Três lados para cada história

Depois de 8 anos de casamento - 10 anos juntos, eu ainda não


consigo me comunicar com Frank. O problema é que ele não me es­
cuta. Ele nunca compartilha seus sentimentos comigo, só se desliga e
se retira. Eu quase nunca consigo descobrir o que está acontecendo
com ele.
Chega ao ponto em que eu me sinto mais perto de minha ami­
ga Joana, uma mulher com quem trabalho há apenas um ano. Pelo
menos eu nunca tenho que adivinhar o que ela está pensando ou sen­
tindo, ela me fala. Ah, comunicação - imagine só! Eu juro, eu acho
que Joana sabe mais sobre o que está acontecendo comigo, depois de
uma pausa de 5 minutos para o café, do que Frank depois de um fim
de semana inteiro juntos.
Frank e eu somos íntimos de algumas maneiras, é claro. Eu
conheço seu corpo muito bem, depois de anos acariciando-o e ex­
plorando-o. A partir dos seus grunhidos e gemidos, eu descobri suas
preferências sexuais muito bem. Eu poderia escrever um livro sobre
seus hábitos pessoais: a maneira obsessiva que ele passa fio dental
nos dentes, a maneira cuidadosa que ele seca seu cabelo com secador
para cobrir a careca, a maneira meticulosa que ele alinha suas roupas
no armário.
Mas tenho certeza que não sei o que ele está pensando e sentin­
do a maior parte do tempo. Ele fica com um olhar que é parte cansa­
ço, parte aflito, parte preocupado. Mas quando eu lhe pergunto se há
algo de errado, ele diz: “Não”. Quando eu pergunto o que ele está
sentindo, ele diz “Cansaço”. Quando eu pergunto o que ele está pen­
sando, ele diz “Trabalho”. Se eu pergunto o que se passa no trabalho,
ele diz: “Apenas alguns problemas”. Todas as suas respostas parecem
mecânicas e por obrigação, como se ele não quisesse me dizer, mas
tem que. Ele poderia muito bem dizer diretamente: “Eu não quero
mais falar sobre isso”. Ele prefere assistir a um show idiota na televisão
do que se conectar com sua própria esposa.
Às vezes me pergunto se ele ainda tem quaisquer outros senti­
mentos além da fadiga. (Isto é realmente um sentimento?) Ele só se ar­
Diferenças Reconciliáveis 25

rasta pela vida, sempre cuidando dos negócios, preocupado em ter seu
trabalho feito, mas nunca mostrando muito entusiasmo ou dor. Ele diz
que seu estilo mostra o quão emocionalmente estável ele é. Eu digo que
isto mostra, justamente, como ele é passivo e entediado.
De muitas maneiras eu sou exatamente o contrário: eu tenho
muitos altos e baixos. Mas na maior parte do tempo eu sou cheia de
energia, otimista, espontânea. É claro que, às vezes, eu fico chatea­
da, irritada e frustrada. Ele diz que isso mostra que sou emocional­
mente imatura, que “eu tenho muito que aprender pra amadurecer”.
Eu acho que isto mostra que sou humana. É ele que é emocional­
mente incapaz.
Eu realmente compartilho a maioria dos meus pensamentos e
sentimentos com ele: meus problemas no trabalho, minhas reações
com meus amigos, meus altos e baixos emocionais. Sua resposta?
Uma espécie de tolerância morna, às vezes interessado, às vezes não,
às vezes apenas por hábito, às vezes... Eu realmente não sei. Como
eu poderia saber, quando ele não me fala o que está se passando
com ele? Então, eu só divago, sentindo-me cada vez mais como se
eu estivesse falando comigo mesma. A esposa tagarela com o mari­
do entediado.
Não era assim no começo. Ele nunca foi muito expressivo, mas
ele gostava de me escutar. E me contava coisas sobre si mesmo. No
início, embora a comunicação entre nós nunca tenha sido equilibrada,
era, pelo menos, recíproca. Eu pensava que ele iria, um dia, ficar mais
confortável comigo e confiar mais em mim, mas ele realmente confia
menos agora do que quando nos conhecemos!
Sua dificuldade de comunicação me incomoda mais quando dis­
cordamos sobre algo. Eu quero discutir nossas diferenças e tentar en­
contrar uma solução. Sei que existe conflito numa relação íntima; eu
não me sinto ameaçada por isto, e eu quero lidar com o probelma aber­
tamente. Mas Frank não quer nem pensar em discutir o assunto. Ao
primeiro sinal de tensão, ele corre. Frequentemente ele responde com
um clichê banal “As coisas vão se resolver por si só”.
26 Três lados para cada história

Eu acho que a raiz do nosso problema é a sensibilidade de


Frank à crítica. Ele não suporta qualquer insinuação de que poderia
ter feito algo errado, especialmente se eu mostrar que eu estou brava
com isso. É como se ele quisesse que a nossa relação fosse como músi­
ca instrumental de fundo - tão chata, insignificante e totalmente des­
necessária que se dissipa no ambiente. Bem, sabe o quê Frank? Esta é
a vida real! Ele não é perfeito, eu sou não sou perfeita - nós somos di­
ferentes, com necessidades diferentes. Então, é claro que vamos ficar
com raiva às vezes. Isso não significa que não amamos um ao outro,
na verdade, isto provavelmente significa que nós nos amamos. No en­
tanto, sempre quando eu fico crítica ou brava, ele age como se eu ti­
vesse violado alguma lei sagrada da natureza. E então ele fica ainda
mais crítico e com mais raiva de mim (por estar crítica e com raiva
dele) do que eu estava num primeiro momento.
Lembro-me de um incidente que resume a maneira como eu
vejo Frank. Nós saímos para jantar com um casal que tinha acabado
de se mudar para nossa cidade. O marido era um amigo de um dos
colegas da faculdade de Frank, e a noite começou ótima. Eles eram
um casal encantador, e como nós não havíamos nos conhecido antes e
eles eram novos na cidade, tínhamos muito para conversar. À medida
que a noite avançava, eu me tornava mais e mais consciente de quão
maravilhosa sua vida era. Eles pareciam genuinamente apaixonados,
embora estivessem casados há mais tempo do que nós. Não importava
o quanto o homem falava com a gente, ele sempre mantinha contato
com sua esposa: tocando-a, fazendo contato visual com ela, ou in­
cluindo-a na conversa. E ele usava muito o “nós” para se referir a eles.
Observando-os me fez perceber o quão pouco Frank e eu nos toca­
mos, como raramente olhamos um para o outro e como separada­
mente nós participamos de uma conversa. Eu queria colocar minha
mão no joelho de Frank ou segurar sua mão, só para ter a aparência
de ser um casal. Mas eu estava com medo de que Frank não fosse res­
ponder, ou pior, que me desse esse olhar que diz: “Não agora!”. Às ve­
zes eu acho que ele tem vergonha de estar comigo.
Diferenças Reconciliáveis 27

De qualquer forma, eu admito. Eu estava com inveja desse ca­


sal. E, para piorar a situação, eles tinham dinheiro. Claro, eles eram
muito educados para mencionar algo sobre isso, mas como eles casu­
almente se referiram às escolas privadas de seus filhos e as férias que
tiveram, eu percebi que eles não estavam lutando para sobreviver.
Após o jantar, nós fomos para sua casa, e ela era incrível, sem ostenta­
ção, mas de bom gosto, elegante e cara, com alguns belos móveis anti­
gos e alguns tapetes orientais que eu fiquei tentada a roubar. Uma vez
nós procuramos uma casa neste bairro, mas não podíamos pagar nem
mesmo as menos caras.
Eles pareciam ter tudo: família amorosa, bela casa, lazer, luxo.
Que contraste com Frank e eu: batalhando, ambos com empregos de
tempo integral, tentando poupar dinheiro, por vezes, mal conseguin­
do pagar as contas. Eu não me importaria tanto, se ao menos nós tra­
balhássemos para isso juntos. Mas estamos tão distantes. Mesmo que
tenhamos objetivos semelhantes em mente, não parece que estamos
no mesmo time.
Quando chegamos em casa, eu comecei a expressar esses sentimen­
tos. Eu queria reavaliar nossa vida, como uma maneira de nos aproximar.
Eu não gosto do meu lado materialista, invejar a riqueza de outras pessoas
me faz sentir superficial. Eu pensei que talvez fosse necessário ajustar nos­
sas prioridades, não se esforçar tanto para o todo-poderoso dinheiro. Tal­
vez nós não pudéssemos ser tão ricos como aquelas pessoas, mas não ha­
via nenhuma razão pela qual não conseguíssemos ter a intimidade e aco­
lhimento que tinham.
Como de costume, Frank não queria falar sobre isso. Quando
ele disse que estava cansado e queria ir para a cama, eu fiquei com
raiva. Era sexta-feira à noite, e nenhum de nós tinha que levantar
cedo no dia seguinte. A única coisa que estava nos impedindo de fi­
car juntos era sua teimosia. Isso me deixou louca. Eu estava farta de
ceder à sua necessidade de sono sempre que eu trazia uma questão
para discutir. Eu pensei: por que ele não pode ficar acordado só por
mim, às vezes?
28 Três lados para cada história

Eu não iria deixá-lo dormir. Quando ele desligou as luzes, eu liguei


novamente. Quando ele se virou para ir dormir, eu continuei falando.
Quando ele colocou um travesseiro sobre sua cabeça, eu falei mais alto.
Ele me disse que eu era um bebê. Eu disse que ele era insensível. A coisa
se intensificou e ficou feia. Sem violência, mas muitas palavras que não
deveriam ter sido ditas. Ele finalmente foi para o quarto de hóspedes,
trancou a porta por dentro, e foi dormir.
Na manhã seguinte, ambos estávamos exaustos e distantes. Ele
me criticou por ser tão irracional. O que provavelmente era verdade.
Eu realmente perco a cabeça quando fico desesperada. Mas acho que
ele usa essa acusação como uma forma de se justificar. É mais ou me­
nos como “Se você é irracional, então eu posso descartar todas as suas
queixas e eu não tenho culpa”. Mas eu não protestei muito. Eu apenas
pensei: para quê?

A HistóriA de FrAnk

Débora parece nunca estar satisfeita. Eu nunca estou fazendo o


suficiente, nunca dando o suficiente, nunca amando o suficiente, não
compartilhando o suficiente. Pode dar o nome que quiser, eu não faço
nada o suficiente. Há uma frase de uma velha canção que diz: “muito
não é o suficiente”. Esta é a Débora.
Ou, dito de outra maneira, em alguns momentos penso em
uma velha canção de Bob Dylan “Too Much of Nothing” (Muito é
nada). Débora, às vezes, age como se tudo o que faço para agradá-la
não equivale a nada. Eu não ganho nenhum crédito pelo o que eu
faço por ela.
Às vezes, ela me faz acreditar que eu realmente sou um mau
marido. Começo a sentir como se eu a desapontasse, decepcionan­
do-a, não cumprindo minhas obrigações de marido amoroso, com­
preensivo. Mas então eu me volto para a realidade. O que eu fa­
ço de errado? Eu sou um ser humano, ok. As pessoas geralmente
Diferenças Reconciliáveis 29

gostam de mim e me respeitam. Eu mantenho um trabalho respon­


sável. Eu não traio ou minto para ela. Eu não sou um bêbado ou
um jogador. Sou moderadamente atraente e sou um amante sensí­
vel. Eu até a faço rir muito. No entanto, eu não recebo um pin­
go de aprovação dela - apenas reclamações de que não estou fazen­
do o suficiente.
Eu acho que ela deve ser insegura. Ela quer constante reafir­
mação. Eu disse a ela uma vez num desespero: “Olha. Eu te amo.
Até prova em contrário, você pode ter certeza de que eu ainda te
amo. Eu prometo informar sobre qualquer mudança no status des­
ses sentimentos. Você não precisa ficar sempre conferindo”. Talvez
ela esteja entediada com sua vida e ponha a culpa disto em mim. Ela
está sempre à procura de um grande drama e emoção no relaciona­
mento. É realmente uma visão do amor de novela, na qual tudo tem
que ser pesado e sentimental. Mas o casamento deveria ser um lugar
onde eu possa me retirar dos estresses e exigências da minha vida,
não um acréscimo a eles.
Ela está sempre me perguntando como eu estou me sentindo. A
verdade é que, às vezes, eu não estou sentindo droga nenhuma e sen­
tir-se assim é muito bom! É como se ela presumisse que tenho todas
essas emoções acumuladas dentro de mim e eu estou me recusando a
compartilhar minha vida interior com ela. Mas isso não é o que acon­
tece. Muitas vezes eu estou exausto do trabalho e só quero fazer nada
- ficar na frente televisão, atirado no sofá, com uma cerveja. Não im­
porta o que esteja passando na TV, eu até gosto dos comerciais. Eu
não fico lá para ser estimulado intelectualmente ou ficar a par de papo
furado social. Talvez um dia desses eu vá criar raízes neste sofá, como
Débora sugere. Mas, para mim, é relaxante. Agora eu lhe pergunto: O
que eu estou fazendo é moralmente errado? É constitucionalmente
proibido? É um sinal definitivo de decadência? Se ouvir Débora, você
certamente pensará assim.
Não me interprete mal. Eu não estou sempre exausto ou es­
tressado. Na verdade, acho que meu ritmo está muito bom, espe­
30 Três lados para cada história

cialmente em comparação com Débora. Eu organizo minha vida,


de maneira a estar preparado para as demandas e pressões que vêm
com o meu trabalho e minha vida em casa. Eu não fico afetado pe­
los acontecimentos da mesma maneira que Débora. Seus sentimen­
tos são como uma montanha-russa: é um passeio divertido, às ve­
zes, mas nunca se sabe se há uma queda de revirar o estômago em
torno da próxima curva. Eu não posso viver dessa maneira. Uma
velocidade constante e agradável de um cruzeiro de navio é mais o
meu estilo.
Mas eu não desqualifico a Débora por ser do jeito que ela é.
Sou, basicamente, uma pessoa tolerante. As pessoas, incluindo os côn­
juges, vêm em todas as formas e tamanhos. Elas não são feitas sob
medida para atender às suas necessidades particulares. Então eu não
me ofendo com pequenos aborrecimentos. Eu não me sinto compeli­
do a falar sobre todas as diferenças ou coisas que não gosto. Eu não
sinto que cada área que tenha um potencial desacordo deva ser explo­
rada em detalhes. Eu só deixo as coisas andarem.
Espero que minha parceira faça o mesmo comigo. Mas quando
Débora me provoca com cada detalhe que não se encaixa com a sua
ideia do que é certo, eu reajo fortemente. Meu lado calmo desaparece
e eu explodo.
Débora me acusa de ser um acumulador emocional, de armaze­
nar sentimentos ruins até um momento oportuno, mas isso não é ver­
dade. Não fico dando voltas pensando em todas injustiças ou irrita­
ções que tive que aturar. Eu não as reúno em segredo até que eu possa
revelá-las numa exibição dramática. Mas quando eu sou criticado por
alguma coisa pequena, de repente eu lembro do que sofri sem uma
palavra, e fico furioso com a injustiça da situação.
Consigo lidar com a maioria dos meus problemas sozinho.
Eu não os coloco em outras pessoas, e não acho que os outros
sejam responsáveis por resolver meus problemas. Débora parece
que não consegue entender que há certas coisas que só consigo re­
solver sozinho.
Diferenças Reconciliáveis 31

Lembro-me de uma noite com ela, quando estava dirigindo


para casa, depois de termos conhecido um casal. O marido era um
amigo do meu colega de faculdade, Gui. Era um casal atraente, im­
pressionante. Ele tinha vindo para a cidade para gerenciar um dos
nossos bancos, ela se uniu a um dos nossos escritórios de advocacia da
família. Fiquei surpreso que o velho Gui, a quem eu considerava um
tipo superficial, tivesse amigos tão interessantes e refinados.
No caminho de casa eu fiquei me perguntando qual seria a
impressão que eles tiveram de mim. Eu me sentia cansado naquela
noite e não estava no meu melhor momento. Às vezes, eu posso ser
espirituoso e engraçado num pequeno grupo, mas não naquela noi­
te. Talvez eu estivesse me esforçando demais para isso. Às vezes, eu
fico me exigindo um padrão de comportamento superior e me criti­
co quando não consigo. Mas este outro casal não era particularmen­
te espirituoso também. Talvez nós todos estivéssemos nos medindo
uns aos outros, como num primeiro encontro de namorados. Eu
nunca gostei muito desses primeiros encontros, sempre quis passar
por eles para chegar no estágio confortável.
Débora interrompeu minhas ruminações com uma pergunta
aparentemente inocente: “Você notou quão afinados esses dois eram
um com o outro?”. Agora eu sei o que está por trás desse tipo de per­
gunta, ou pelo menos, aonde esse tipo de pergunta vai levar. Sempre
leva de volta para nós, especialmente para mim. E no final, o ponto se
torna: “Nós não estamos em sintonia um com o outro”, o que é um
código para “Você não está em sintonia comigo”.
Eu tenho pavor dessas conversas que ficam em torno do que há
de errado com a gente como um casal, porque a verdadeira questão,
que não fica declarada nas conversas civilizadas, mas que se declara
sem rodeios nas conversas não civilizadas, é: “O que há de errado com
Frank?”. Então eu tentei evitar uma briga desnecessária, respondendo
que eles eram um casal simpático.
Mas Débora ficou me pressionando. Ela insistiu em compará­
-los conosco. Eles tinham dinheiro e intimidade. Nós não tínhamos
32 Três lados para cada história

nenhum dos dois. Talvez a gente não pudesse ser rico, mas podería-
mos, pelo menos, ter mais intimidade. Por que não poderíamos ser
mais próximos? O que significava: Por que eu não poderia ser mais
íntimo? Tentei tornar a conversa mais leve, brincando que talvez a
gente não tivesse um gene da intimidade. Ela não gostou.
Quando chegamos em casa, tentei diluir a tensão, dizendo que
eu estava cansado e sugerindo que a gente fosse para a cama. Eu re­
almente estava cansado, e a última coisa que eu queria era entrar na
velha briga de sempre, novamente. Mas Débora estava irredutível.
Ela argumentou que não havia nenhuma razão para não ficar acor­
dados e discutir isso. Eu queria dizer que não tinha motivos para
discutir porque não seria uma discussão e sim um julgamento. Mas
eu não fiz, porque isso seria apenas mais uma evidência que ela usa­
ria para me condenar.
Eu segui com a minha rotina de antes de dormir, dando-lhe o
mínimo de respostas. Se ela não vai respeitar meus sentimentos, por
que eu deveria respeitar os dela? Ela continuou falando, enquanto eu
colocava meu pijama e escovava os dentes, nem mesmo me deixou so­
zinho no banheiro. Quando eu finalmente fui para a cama e apaguei a
luz, ela a ligou novamente. Eu virei para o lado para dormir, mas ela
continuou falando. Você pensaria que ela teria entendido a mensagem
quando eu coloquei o travesseiro sobre minha cabeça, mas não, ela o
puxou. Naquele momento eu joguei a toalha. Eu disse que ela era um
bebê, uma louca - Não me lembro de tudo o que eu disse. Finalmen­
te, em desespero, eu fui para o quarto de hóspedes e tranquei a porta.
Eu estava muito perturbado para adormecer imediatamente, e não
dormi nada bem.
E de manhã eu ainda estava zangado com ela. Eu disse que ela
era irracional. Pela primeira vez, ela não tinha muito a dizer. A verda­
de é que nós dois estávamos exaustos.
Diferenças Reconciliáveis 33

o terceiro LAdo: UmA HistóriA objetivA

As diferenças que Frank e Débora acham tão perturbadoras um


no outro estavam lá desde o início. Ela era emotiva e extrovertida, for­
mava laços estreitos com as pessoas e recebia apoio emocional e estí­
mulo dessas relações. Seu estilo era falar o que lhe viesse à mente e ser
franca sobre seus sentimentos.
Frank, por outro lado, era reservado e tímido. Como filho úni­
co, ele havia crescido mais retraído, com poucos amigos. Ele não gos­
tava de socializar muito e, frequentemente, se sentia desconfortável na
presença dos outros. Ele buscava segurança, não tanto na companhia
de outras pessoas, mas numa vida estável, organizada e racional. Você
sempre poderia contar com Frank. O talão de cheques foi sempre
equilibrado, literal e figurativamente. Sua vida era uma lição sobre
como evitar excessos.
Frank e Débora tinham muito em comum: formação semelhan­
te, valores quase idênticos e alguns interesses em comum no esporte.
Eles se achavam fisicamente atraentes, e até mesmo as diferenças entre
eles eram uma fonte de atração. A maneira calma de Frank dava um
bom equilíbrio para as mudanças de humor de Débora, enquanto que a
desenvoltura dela em situações sociais permitia a ele ficar reservado, mas
ainda participar da conversa. A tendência de Frank para a organização
ajudava Débora a viver num ritmo menos frenético, enquanto ela, com
seu otimismo e entusiasmo adicionava uma energia ao estilo lento e me­
tódico de Frank.
Num plano ideal, essas diferenças os teriam levado a um meio
termo feliz. Frank poderia ter aprendido a ser mais aberto sobre como
ele se sentia, enquanto Débora poderia aprender a se sentir melhor fi­
cando mais reservada e sozinha. Ele poderia ter desenvolvido uma
maneira mais entusiasmada, espontânea para a vida, enquanto ela po-
deria ter aprendido a ser mais moderada. Ele poderia ficar mais à von­
tade em situações sociais, enquanto ela poderia valorizar a paz e tran­
quilidade da solidão.
34 Três lados para cada história

Como os contrastes entre eles, em princípio, pareciam atraentes,


Frank e Débora os apreciavam e estavam abertos à influência mútua e a
mudar no início de seu relacionamento. No entanto, com o tempo, as
necessidades de cada um e a incapacidade do outro para satisfazê-las fez
com que essas diferenças, já existentes, ficassem maiores. O tempo que
Frank precisava para ficar sozinho entrava em conflito com a necessidade
de Débora de ter tempo juntos. Quanto mais ele buscava independência,
mais ela pressionava por proximidade. Quanto mais emotiva ela se torna­
va, mais ele ficava “desligado”.
Estas diferenças eram difíceis para eles lidarem devido às sensi­
bilidades emocionais já existentes que cada um trouxe para o relacio­
namento. Débora percebia o afastamento de Frank como rejeição a
ela, o que às vezes era. Provavelmente o que contribuiu para sua sensi­
bilidade à rejeição foi um período difícil e doloroso da sua adolescên­
cia, quando ela se sentia pouco atraente para qualquer menino. Devi­
do a isto, era especialmente complicado para ela aceitar a necessidade
frequente de Frank de ficar sozinho, a menos que antes ela fosse cer­
cada de proximidade e intimidade. A experiência de Frank como filho
único, cuidadosamente criado por pais protetores que o preservavam
de qualquer crítica, fez com que ele reagisse fortemente a isto quando
adulto, em especial quando a crítica vinha da esposa, a menos que o
julgamento fosse envolvido com elogio e valorização. E as críticas de
Débora eram frequentemente afiadas. Estas sensibilidades forneciam
o combustível emocional que, muitas vezes, desencadeavam o conflito
sobre suas diferenças naturais.
Momentos de estresse, frequentemente, desempenhavam um
papel no agravamento das diferenças entre eles, desencadeando suas
sensibilidades. Quando o trabalho de Frank demandava demais e
não ia bem, colocando sua competência em questão, era o momento
em que ele mais precisava de tempo sozinho e ficava particularmen­
te sensível à crítica. Quando os relacionamentos interpessoais de
Débora, tanto no trabalho quanto com a sua família não estavam
indo bem, era o momento em que ela mais precisava de tempo de
Diferenças Reconciliáveis 35

qualidade com Frank e ficava particularmente sensível à rejeição. As­


sim, o estresse foi um catalisador para desencadear comportamentos
que eram difíceis e dolorosos para cada um deles, uma dor intensifi­
cada exatamente por esses mesmos fatores de estresse.
Suas diferenças, sensibilidades emocionais e tensões, tornavam­
-se, então, a causa de suas discussões, numa dança intrincada de críti­
cas, na qual ficavam defensivos, com momentos de afastamento e
contra-ataque. Eles tinham dançado esta dança muitas vezes antes,
mas nenhum deles sabia como parar. Dado que Débora era mais hábil
com as palavras, especialmente a comunicação negativa, era ela, em
geral, quem iniciava uma conversa sobre suas diferenças, expressando
suas necessidades e sentimentos, especialmente quando Frank estava
distante. Mas Frank se sentia criticado por suas colocações, em parte
porque, muitas vezes, elas eram negativas e em parte porque ele já era
sensível à crítica e se tornou mais ainda ao longo do seu relaciona­
mento com Débora.
Por exemplo, os comentários de Débora sobre o outro casal
no caminho de casa, naquela noite, pareceram a Frank uma coloca­
ção sobre ele, que carregava uma forte implicação de que ele não
estava tão “em sintonia” com Débora como seu novo amigo do sexo
masculino estava com sua esposa. Não surpreende que Frank toma­
ra o comentário como uma crítica, uma vez que ela o tinha censu­
rado muitas vezes por não ser sensível à ela. Débora frequentemen­
te reclamava, com alguma razão, que Frank não ficava atento e en­
volvido o suficiente. Assim, embora a sua observação sobre o outro
casal fosse escutada por Frank como uma reprovação a ele, a crítica
não era o que ela pretendia. Na verdade, o seu sentimento no mo­
mento era mais inveja de seus amigos e de um anseio pela intimi­
dade que pareciam ter, do que uma queixa particular sobre Frank.
No entanto, seus conflitos passados em relação à intimidade e a es­
tar “em sintonia” um com o outro, além da sensibilidade adquirida
por Frank às críticas de Débora, levaram-no a tomar o comentário
dela como algo pessoal.
36 Três lados para cada história

Como Frank temia uma discussão feia com Débora, ele tentou
ignorar o comentário dela. Em alguns momentos desvios como este
funcionavam para Frank porque eles evitavam uma conversa que leva­
ria a uma discussão. No entanto, às vezes - como nesta ocasião - suas
táticas frustram Débora e contribuem exatamente para o conflito que
ele está tentando evitar. Quanto mais ele se afasta, mais irritada ela
fica. Qualquer pequena conversa que eles tenham consiste em ataques
mútuos e manobras defensivas, e a dança continua. Eles ficam tão
presos em seus respectivos papéis que não conseguem perceber os sen­
timentos que têm em comum. E nessa noite em particular, ambos es­
tavam com inveja de seus novos amigos.
Como problemas de Débora e Frank se acumularam, cada um
desenvolveu uma teoria de como as dificuldades do outro prejudi­
cam o relacionamento. Cada um deles acha que a culpa é do outro,
e assim ambos se lembram seletivamente dos momentos de sua vida,
com enfoque naqueles que justificam os seus próprios pontos de vis­
ta. Por exemplo, Débora acha que Frank é socialmente desajeitado e
com medo de intimidade. Ele tem poucos amigos e nenhum é ínti­
mo. Quando ela tenta falar com ele sobre a falta de intimidade dos
dois, tal como após a noite que saíram com seus novos conhecidos,
ele evita a discussão. Esta maneira de agir, na visão de Débora, prova
que o medo dele de intimidade, até com a sua própria esposa, é a
origem de seus problemas.
Por outro lado, Frank acredita que a insegurança e imaturida­
de de Débora são a causa de seus problemas. Ele usa o mesmo inci­
dente, mas interpretado de forma diferente, para apoiar seu ponto
de vista. Para ele, Débora ficou chateada naquela noite apenas por­
que seus amigos tinham mais dinheiro e eram mais carinhosos em
público do que ele e Débora. Frank acha que eles têm problemas,
porque ela não pode aceitar a si mesma e aos outros (mesmo seu
próprio marido) por aquilo que são. Ele vê sua emocionalidade co­
mo imaturidade, seu ritmo agitado como cansativo, e seu desejo de
proximidade como fraqueza.
Diferenças Reconciliáveis 37

À medida que cada um tem estas teorias sobre o outro, tor­


nam-se entrincheirados em suas posições e cegos para as várias ma­
neiras de como se poderia olhar para os seus problemas. Débora ig­
nora qualquer evidência de competência social de Frank, como seu
senso de humor, sua bondade e consideração para com os outros, ou
sua maneira de fazer amor apaixonado. No entanto, essas qualidades
positivas foram as razões pelas quais Débora se sentiu atraída por
Frank. Da mesma forma, Frank não presta atenção aos sinais óbvios
de segurança psicológica de Débora, tais como a sua persistência e
otimismo diante de decepção. Cada um já tem a expectativa de que
o outro será inadequado, e age como se ele ou ela fosse assim, e, ao
fazê-lo contribui com que venha à tona esta característica tão detes­
tada. Débora, assumindo que Frank não vai participar muito de en­
contros sociais, oferece pouca oportunidade ou incentivo para que
ele fale e, assim, estimula a sua timidez e isolamento social. Frank,
assumindo que Débora vai ficar chateada com qualquer má notícia,
não lhe conta as coisas, como por exemplo, seus problemas no tra­
balho, pois ele acha que vão incomodá-la. Quando ela finalmente
descobre, ela fica mais chateada do que ela teria ficado se ele tivesse
contado a ela num primeiro momento. Além disso, agora ela fica
brava com ele por ter escondido dela estas informações.
Todo casal começa, como Frank e Débora, com um número
de diferenças entre eles, diferenças que podem nutrir o relaciona­
mento ou danificá-lo. Quando as diferenças estão ligadas a sensibili­
dades emocionais, já que muitas vezes o são, ou quando o estresse
agrava as diferenças, como costuma acontecer, o palco está montado
para o conflito. Assim como eles, todo casal tem discussões. Cada
parceiro alterna entre criticar o outro por ser diferente e defender-se
das críticas. Ou, em vez de argumentar imediatamente, eles podem
se afastar um do outro, expressando sua insatisfação por meio da
evitação. Mais do que resolver os problemas ou minimizar as dife­
renças, esses ciclos destrutivos pode manter e até intensificar aquelas
diferenças que causaram os problemas em primeiro lugar. O produ­
38 Três lados para cada história

to final deste ciclo vicioso é que, frequentemente, as diferenças pare­


cem irreconciliáveis.

A ProPostA deste Livro: criAndo


AceitAÇÃo e mUdAnÇA nAs reLAÇÕes

Nos últimos 20 anos, temos desenvolvido uma nova abordagem


para a terapia de casal, chamada Terapia Comportamental Integrativa
de Casal (Integrative Behavioral Couple Therapy-IBCT), e pesquisa­
do sobre ela. Reunimos dados extensivos sobre a sua eficácia. Com­
pletamos dois ensaios clínicos randomizados, patrocinados pelo Insti­
tuto Nacional de Saúde Mental (EUA). No mais longo ensaio rando-
mizado de terapia de casal já conduzido, nossa abordagem mostrou
que pode fortalecer as relações e evitar o divórcio na maioria dos ca­
sais, por pelo menos cinco anos (última data em que entramos em
contato com os casais). Mas também sabemos que a terapia não é para
todos, e nós gostaríamos de ajudar as pessoas que estão buscando me­
lhorar ou reforçar as suas relações por si próprias - pessoas justamente
como você. É por isso que escrevemos Diferenças reconciliáveis. Nós
organizamos as melhores e mais importantes partes de nossa terapia
de casal comprovada e as concebemos para que você possa se benefi­
ciar delas em seu próprio tempo, em sua própria casa, sem a necessi­
dade de conversar com um terapeuta. É claro que, falando com um
terapeuta sobre tópicos deste livro também pode ser muito útil e,
como veremos na última seção, talvez necessário em alguns casos.
Desde a primeira edição das Diferenças reconciliáveis, publicada no
ano de 2000, aprendemos muito sobre como disseminar a IBCT, princi­
palmente por meio de dois grandes programas. Em primeiro lugar, este
tratamento foi adotado pelo U.S. Departament of Veterans Affairs - VA
(departamento para as questões dos veteranos de guerra dos Estados Uni­
dos) como um dos seus tratamentos psicológicos baseados em evidências,
e, como resultado, nós passamos muito tempo treinando terapeutas para
Diferenças Reconciliáveis 39

o tratamento destas pessoas. Em segundo lugar, recebemos um subsídio


do Instituto Nacional de Saúde Infantil e Desenvolvimento Humano
para adaptar este tratamento para uma intervenção online. Como resulta­
do destes dois esforços, nós aprendemos maneiras de descrever esta abor­
dagem que a tornam mais fácil para sua compreensão e acompanhamen­
to. As relações humanas são complexas, e os esforços para mudá-las po­
dem ser difíceis. A nossa motivação em fazer a presente revisão do Dife­
renças reconciliáveis era incluir estas formas mais simples de ensinar sobre
relacionamentos e como melhorá-los. Como parte deste esforço para sim­
plificá-lo, nesta edição do livro você deve se concentrar numa questão es­
sencial de seu relacionamento. Ao aplicar cada um dos conceitos do livro
a esta questão central, nós acreditamos que você vai conseguir uma com­
preensão mais profunda de si mesmo e de seu parceiro e ter mais chance
de melhorar seu relacionamento.
O objetivo deste livro é ajudar você a entender os conflitos que
você tem com o seu parceiro e, então, transformá-los em momentos
de maior paz e intimidade. Quando você se envolve num conflito
com seu parceiro, vocês dois podem por a culpa do problema nos de­
feitos do outro. Cada um tenta corrigir essas falhas mudando o par­
ceiro. Mas este resiste à mudança, e então você fica preso numa luta
que desgasta os bons sentimentos que havia um pelo outro. Cada um
de vocês pode se sentir preso, sem saber como lidar com as diferenças
indesejáveis da outra pessoa e recorre à acusação, à crítica, à defensivi-
dade e afastamento. Estas formas de manejo servem apenas para ferir
os sentimentos um do outro. Machucado e ferido por suas tentativas
de resolver suas diferenças, você pode sentir que o abismo se tornou
impossível de ultrapassar.
Neste livro vamos lhe mostrar uma maneira de sair deste im­
passe: ao aceitar o seu parceiro. A inclinação natural é tentar mudar
o outro, mas os esforços direcionados, exclusivamente, à tal mudan­
ça, frequentemente pioram o conflito. Quando você genuinamente
aceitar o seu parceiro, você pode alcançar a paz e, paradoxalmente,
mudá-lo. Este provavelmente quer fazer você feliz. Quando você é
40 Três lados para cada história

capaz de aceitar a experiência de cada um, e por consequência o


comportamento que resulta dessa experiência, ambos podem fazer
mudanças espontâneas para se adaptar um ao outro. A aceitação ofe­
rece uma rota para vocês dois, para avançar em direção a uma união
mais feliz e mais íntima.
Como você pode conseguir a aceitação genuína? E como pode a
aceitação transformar conflitos em intimidade? Embora eles sejam do­
lorosos, os conflitos oferecem uma janela para as emoções de ambos:
suas desilusões, esperanças, pontos fortes e fracos. Se você pode olhar
para esses conflitos não com o objetivo de culpar e apontar defeitos,
mas com o objetivo de compreender as emoções fortes que impulsio­
nam cada um de vocês, você pode aprender mais sobre si mesmo e seu
parceiro individualmente, bem como a maneira como vocês interagem.
Este entendimento permite apreciar um ao outro de forma mais com­
pleta e mais honesta e pode inspirar compaixão para com a posição de
cada um. Por meio deste entendimento, você também pode ganhar al­
guma perspectiva de que irá diminuir seus conflitos, talvez até mesmo
permitindo que vocês riam deles às vezes. Compreensão e compaixão
um pelo outro e uma maior perspectiva sobre seus conflitos podem le­
var a uma aceitação de sentimentos e comportamentos de cada um que,
por sua vez, quebra seus ciclos viciosos de discussão, desentendimento e
afastamento - ou, pelo menos, permite-lhe se recuperar destes ciclos
mais rapidamente. No mínimo, o processo de analisar e discutir suas
diferenças e conflitos em uma atmosfera de aceitação irá promover uma
maior tolerância entre vocês. Na melhor das hipóteses, pode aumentar a
intimidade entre vocês. Conflitos oferecem não só a ameaça de afasta­
mento, mas também a possibilidade de intimidade.
A mudança é irmã da aceitação, mas é a irmã mais nova.
Quando a aceitação vem em primeiro lugar, ela pavimenta o cami­
nho para a mudança. Quando você e seu parceiro experimentam
uma maior aceitação do outro, a sua resistência à mudança, muitas
vezes, se dissolve. Vocês podem ser mais abertos para se adaptar um
ao outro e a se acomodar em maneiras que reduzam o conflito. Vo­
Diferenças Reconciliáveis 41

cês poderão conseguir se comunicar de forma mais clara, negociar e


resolver os problemas de um modo mais eficaz, uma vez que não são
mais adversários. Neste livro vamos também discutir estratégias para
promover mudança nas relações, uma vez que uma maior aceitação
tenha sido alcançada.

como o Livro está orgAnizAdo

Nosso livro é dividido em cinco partes.

Parte I, “Os Lados Conflitantes do Conflito'' que você já ini­


ciou, descreve maneiras comuns de interpretar discussões que só as fa­
zem piorar. Como parte desta seção, você irá completar alguns ques­
tionários sobre o seu relacionamento para entender como ele está fun­
cionando agora. Você também terá a oportunidade de selecionar um
determinado conflito central em curso entre você e seu parceiro e,
desta maneira, colocar em prática um crescente entendimento e capa­
cidade para suavizar essa dificuldade.
Parte II “Uma Compreensão DEEP (profunda) do Conflito: O
terceiro lado da história” introduz uma nova maneira de compreender
os conflitos que pode levar à sua aceitação e resolução. DEEP é um
acrônimo que significa os quatro principais fatores que entram em
jogo nas divergências e têm a chave para a resolução por meio tanto
da aceitação quanto da mudança: D-diferenças naturais entre vocês
dois, sensibilidades E-emocionais em cada um, as circunstâncias E-ex-
ternas que criam estresse para cada um, e os P-padrões de comunica­
ção nos quais vocês ficam presos enquanto tentam resolver o conflito.
Serão fornecidos muitos exemplos de outros casais e será solicitado a
vocês que apliquem este modelo de “compreensão DEEP” no conflito
central entre você e seu parceiro que vocês selecionaram. No momen­
to em que terminar de ler a Parte II, você terá uma base essencial para
a utilização do resto do livro.
42 Três lados para cada história

Parte III, “Da Discussão à Aceitação”, mostra as maneiras que


você e seu parceiro podem estimular a aceitação um do outro, con­
centrando-se primeiro sobre o conflito central identificado. A Aceita­
ção não pode ser exigida ou forçada, e não é um estado passivo. É
fundamental estabelecer algum grau de aceitação se você deseja aliviar
o conflito em seu relacionamento e facilitar as mudanças um no outro
que são realmente importantes para você. Nestes capítulos, você vai
aprender a importante diferença entre a aceitação e resignação e ver
como mesmo pequenos passos em direção à aceitação mútua e com­
paixão podem melhorar seu relacionamento.
Parte IV, “Mudança Deliberada Por Meio da Aceitação”, discute
maneiras pelas quais você pode buscar a mudança diretamente, mas
no contexto da aceitação. Como nas partes anteriores, o conflito cen­
tral selecionado será o foco inicial.
Finalmente, a Parte V, “Quando Aceitação Não é Suficiente”,
considera aqueles casos em que o seu parceiro apresenta desafios espe­
ciais por causa de seu próprio distúrbio, como depressão, ou quando
o seu parceiro lhe maltrata, como por exemplo, ter um caso fora da
relação. Esta parte também discute ajuda profissional para problemas
individuais e de relacionamento.
Cada capítulo do livro baseia-se fortemente em exemplos de ca­
sais. Para preservar a confidencialidade, esses exemplos de casos são uma
amálgama de centenas de casais que temos visto na terapia, de casais
que conhecemos socialmente e até mesmo de nossos próprios relaciona­
mentos. Eles fornecem uma “prova viva” de como as nossas ideias agem
na vida real. Cada capítulo termina com um breve resumo das princi­
pais ideias e um exercício que você vai levar para casa, para fazê-lo no
contexto da sua relação, tão única.
De modo ideal, você e seu parceiro leriam este livro e fariam
os exercícios individualmente. Pode ser útil discutir as ideias e rela­
cioná-las consigo. Mas uma palavra de cautela neste momento: será
mais fácil encontrar o seu parceiro nesses capítulos do que encon­
trar você próprio. Para prevenir que as discussões culpabilizem o ou­
Diferenças Reconciliáveis 43

tro (“Você faz exatamente o que eles falam no capítulo...”), é impor­


tante aplicar o que está sendo visto em si mesmo, em vez de aplicar
no seu parceiro.
Mesmo que seu parceiro não leia o livro, ainda assim pode ser
útil que você o leia. A maioria dos exercícios é concebida para ser
completada sozinho. Alguns dos exercícios posteriores irão prepará-lo
para compartilhar sua compreensão com o seu cônjuge, independen­
temente se ele ou ela leu o livro ou não. Estes exercícios posteriores
também irão prepará-lo para se envolver em ações específicas que po­
dem levar você e seu parceiro a resolver o conflito. Inicialmente você
se concentrará no conflito central selecionado, porém, as mesmas es­
tratégias podem ser utilizadas para outras dificuldades.

RECAPITULANDO
Este capítulo descreveu um caso de um conflito de um casal e apresentou
três lados: a opinião da esposa, a opinião do marido e uma visão mais objeti­
va que incorporou as posições dos dois cônjuges. Este ponto de vista dos três
lados do conflito dá um gostinho do que está por vir no próximo capítulo,
no qual o explicamos a partir da perspectiva dos participantes.
Este capítulo também deu uma visão geral do foco do livro, com sua ênfa­
se na aceitação como um caminho para a resolução de conflitos, e uma vi­
são geral do formato do livro.

exercício: sua satisfação atual como um casal

O primeiro passo é avaliar como o seu relacionamento está


funcionando agora. Por favor, preencha o questionário com 16 itens
a seguir, que foi desenvolvido por Janette Funk e Ronald Rogge na
Universidade de Rochester, em 2007, com base numa análise apro­
fundada dos itens, a partir de uma variedade de questionários des­
tinados a avaliar a qualidade do relacionamento. A partir da coleta
de dados de milhares de casais, eles puderam mostrar que os itens
44 Três lados para cada história

discriminam melhor os diferentes níveis de satisfação com o rela­


cionamento. Como uma baixa satisfação com a relação pode resul­
tar da ausência de qualidades positivas, da presença de qualidades
negativas, ou por uma combinação das duas. Em seguida vamos pe­
dir para que você complete os breves questionários “Qualidade do
Relacionamento Positivo” e “Qualidade do Relacionamento Negati­
vo”, desenvolvido por Frank Fincham, da Florida, State University e
Ronald Rogge em 2010. Após concluir estes três breves questioná­
rios, vamos lhe mostrar como pontuar e interpretá-los para que
você saiba como o seu relacionamento está atualmente. Para este
exercício e para cada um dos exercícios restantes no livro, seu par­
ceiro pode responder às perguntas separadamente, se ele ou ela
está lendo o livro também, e vocês dois podem voltar a estes ques­
tionários depois de trabalhar por meio do livro para ver como seu
relacionamento tem mudado.

QUestionário de sAtisFAÇÃo conjUgAL

1. Por favor, indique o grau de felicidade, considerando todas as


questões do seu relacionamento:
Extremamente Bastante Um pouco Muito Extremamente
Feliz Perfeito
Infeliz Infeliz Infeliz Feliz Feliz

0 1 2 3 4 5 6

2. Em geral, qual frequência que você acha que as coisas estão indo
bem entre você e seu parceiro/a?
A maior parte Mais vezes sim
Todo tempo Ocasionalmente Raramente Nunca
do tempo do que não

5 4 3 2 1 0

3. A nossa relação é sólida?


De jeito Bem De alguma Na maioria Quase
Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5
Diferenças Reconciliáveis 45

4. Nossa relação me faz feliz?


De jeito Bem De alguma Na maioria Quase
Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5

5. Tenho uma relação quente e confortável com meu parceio/a?


De jeito Bem De alguma Na maioria Quase
Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5

6. Eu realmente sinto que somos parceiros?


De jeito Bem De alguma Na maioria Quase
Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5

7. Nosso relacionamento é gratificante?


De jeito Bem De alguma Na maioria Quase
Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5

8. Meu parceiro/a atende bem às minhas necessidades?


De jeito Bem De alguma Na maioria Quase
Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5

9. Nosso relacionamento foi ao encontro de minhas expectativas


originais?
De jeito Bem De alguma Na maioria Quase
Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5
46 Três lados para cada história

10. Em geral, estou satisfeito/a com nosso relacionamento?

De jeito Bem De alguma Na maioria Quase


Totalmente
nenhum é pouco maneira das vezes sempre é
verdadeiro
verdade é verdade é verdade é verdade verdade

0 1 2 3 4 5

Para cada um dos seguintes itens, selecione a resposta que me­


lhor descreve como você se sente com o seu relacionamento. Baseie
suas respostas em suas primeiras impressões e sentimentos imedia­
tos sobre cada item.

11. Estimulante 5 4 3 2 1 0 Chato

12. Ruim 0 1 2 3 4 5 Bom

13. Pleno 5 4 3 2 1 0 Esvaziado

14. Sólido 5 4 3 2 1 0 Frágil

15. Desanimador 0 1 2 3 4 5 Com esperança

16. Prazeroso 5 4 3 2 1 0 Infeliz

PontUAÇÃo e interPretAÇÃo do
QUestionário de sAtisFAÇÃo conjUgAL

Pontuar o Questionário de Satisfação é simples. Você apenas


soma os pontos indicados para cada resposta de cada pergunta. Os
escores variam de O a 81. Quanto maior a pontuação, mais satisfa­
tório é seu relacionamento. Com base em pesquisas realizadas com
esta medida, oferecemos as seguintes interpretações de três gran­
des faixas de pontuação, indicando uma “zona verde” - positiva,
uma “zona amarela” - mista e uma “zona vermelha” - problemáti­
ca. Veja em que zona seu relacionamento se encontra.
Diferenças Reconciliáveis 47

zona verde (pontuação superior a 68)

Sua pontuação indica que, em geral, você está feliz com seu
relacionamento. Estar muito feliz com a sua relação como um todo
é uma boa perspectiva! Embora você ainda possa ter algumas ques­
tões especiais que deseja trabalhar com este livro, parece que você
tem muitos pontos fortes que poderá aprimorar quando resolver es­
sas questões. É ótimo que você esteja dedicando tempo para refor­
çar um relacionamento que já é sólido e abordar os problemas an­
tes que fiquem maiores.

zona Amarela (pontuação entre 52 e 68)

Sua pontuação indica que você está de alguma maneira feliz


com seu relacionamento, mas ainda há certo sofrimento. O fato de
você não estar muito perturbado (ou seja, na faixa “vermelha”) é
realmente uma boa notícia, porque você e seu parceiro serão ca­
pazes de trabalhar com as partes de seu relacionamento que são
satisfatórias, assim como com as questões que incomodam. É mui­
to mais fácil lidar com problemas de relacionamento antes de se
tornarem demasiado graves. No entanto, sua pontuação na satisfa­
ção geral também sugere que, embora haja algumas questões que
você gosta no seu relacionamento, você ainda desejaria ver as coi­
sas melhorarem. As pessoas podem pontuar na faixa “amarela” por
muitas razões diferentes, por exemplo, sentindo-se como se tivesse
perdido aquela chama ou emoção no seu relacionamento ou sen­
tindo como se alguns problemas estivessem prejudicando a sua fe­
licidade na relação. Suas pontuações nas dimensões positiva e ne­
gativa irão lhe fornecer alguma orientação sobre o que pode ser
verdadeiro para você.

zona vermelha (pontuação abaixo de 52)

Sua pontuação indica que você está, de alguma maneira, mui­


to infeliz com seu relacionamento. Suas avaliações da sua satis­
fação geral com sua relação lhe colocam na mesma faixa que
os cônjuges que, frequentemente, procuram ajuda externa, tal
48 Três lados para cada história

como terapia de casal. Como muitos desses casais, você pode até
estar se sentindo frustrado ou sem esperança com o relaciona­
mento. No entanto, é realmente muito bom que você esteja pro­
curando maneiras de investir na sua relação, como trabalhar com
este livro. Provavelmente, você tem pontos positivos como indiví­
duo, assim como o casal também tem e isto irá ajudá-lo a melho­
rar a sua relação. Nós voltaremos aos pontos positivos ao lon­
go do livro. Esperamos que a leitura e a execução dos exercícios
possam ser úteis para seu relacionamento. Além disso, vamos re­
comendar mais recursos no final do livro, se você decidir buscar
ajuda adicional.

classificação positiva da qualidade do relacionamento

Considerando-se apenas as qualidades positivas da sua relação


e ignorando as negativas, avalie o seu relacionamento com as se­
guintes qualidades:
de na maior
muito Um Algumas extrema­
maneira parte das muito
pouco pouco vezes mente
alguma vezes

1. A nossa relação
0 1 2 3 4 5 6
é sólida
2. Nossa relação
0 1 2 3 4 5 6
me faz feliz

3. Tenho uma
relação quente
e confortável 0 1 2 3 4 5 6
com meu
parceiro/a

4. Eu realmente
0 1 2 3 4
sinto que somos 5 6
parceiros

classificação negativa da qualidade do relacionamento


Considerando-se apenas as qualidades negativas da sua relação
e ignorando as positivas, avalie o seu relacionamento com as se­
guintes qualidades:
Diferenças Reconciliáveis 49

de na maior
muito Um Algumas extrema­
maneira parte das muito
pouco pouco vezes mente
alguma vezes

1. Ruim 0 1 2 3 4 5 6

2. Infeliz 0 1 2 3 4 5 6

3. Esvaziado 0 1 2 3 4 5 6

0 1 2 3 4
4. Sem vida 5 6

PontUAÇÃo e interPretAÇÃo dAs medidAs PositivA


e negAtivA dA QUALidAde do reLAcionAmento

A pontuação das duas medidas de qualidade do relacionamen­


to também é simples. Você apenas soma os pontos indicados sepa­
radamente para os dois questionários. Os escores variam de O a 24
para cada medida. Quanto maior a pontuação para Qualidade do
Relacionamento Positiva, haverá mais características positivas na
interação do casal; quanto maior a pontuação para Qualidade do
Relacionamento Negativa, haverá mais características negativas. A
partir de pesquisas com estas medidas, indicamos algumas zonas
verdes, amarelas e vermelhas conforme suas pontuações e interpre­
tamos algumas combinações das diferentes zonas. Com base nestes
escores, também oferecemos algumas sugestões para selecionar a
questão central de seu conflito conjugal, o que você vai fazer no
próximo capítulo.

Qualidade Positiva zona verde (superior a 19);


Qualidade negativa zona verde (menos de 4)

Parabéns! Suas pontuações indicam que você experimenta as­


pectos negativos no seu relacionamento (como crítica ou conflitos)
com menos frequência. Além disso, você relatou que também expe­
rimenta frequentes aspectos positivos. Enquanto possa haver pro­
blemas isolados ou ocasionais, eles não parecem estar afetando a
50 Três lados para cada história

forma como você se sente sobre o seu relacionamento de um modo


geral. Tendo em conta estes pontos fortes, a “questão central” que
você seleciona para trabalhar neste livro, provavelmente, vai se cen­
trar em problemas específicos ou que estão apenas começando. Isso
é ótimo porque estes tipos de problemas são, geralmente, muito
mais fáceis de resolver!

Qualidade Positiva zona verde (superior a 19);


Qualidade negativa zona Amarela (4-6)

Sua pontuação sugere que você experimenta em seu rela­


cionamento aspectos negativos de forma moderada. Felizmente,
você experimenta aspectos positivos na sua relação, tanto quan­
to, ou mais do que a uma típica relação conjugal. Estes aspectos
positivos podem ajudar a compensar alguns dos negativos. Por
exemplo, os casais que frequentemente discutem ainda podem
ser extremamente felizes se eles também se sentirem emocional­
mente ou sexualmente conectados aos seus parceiros. Dado seu
escore “verde” para aspectos positivos, faz sentido selecionar
uma “questão central” para trabalhar neste livro que se concen­
tre na redução de um aspecto negativo (por exemplo, o conflito)
mais do que fortalecer um positivo.

Qualidade Positiva zona verde (superior a 19); Qualidade


negativa zona vermelha (superior a 6)
Sua pontuação sugere que você experimenta muitos pontos
negativos em seu relacionamento. Felizmente, você também parece
experimentar aspectos positivos frequentes na relação. Estes aspec­
tos positivos podem ajudar a compensar alguns dos negativos. Por
exemplo, os casais que discutem muito ainda podem ser felizes em
seu relacionamento, se eles também se sentem emocionalmente ou
sexualmente conectados aos seus parceiros. Dada sua pontuação
mais alta para aspectos positivos, pode fazer sentido selecionar uma
“questão central” para trabalhar neste livro que se concentra na re­
dução de um aspecto negativo (por exemplo, o conflito) em vez de
fortalecer um positivo.
Diferenças Reconciliáveis 51

Qualidade Positiva zona Amarela (17-19); Qualidade


negativa zona verde (menos de 4)
Parabéns! Suas pontuações indicam que você experimenta as­
pectos negativos em seu relacionamento com menos frequência.
Embora possa ser algo isolado ou problemas ocasionais, eles não
parecem estar afetando a forma como você se sente sobre o seu
relacionamento de uma maneira mais geral. Este é um ponto forte
porque vai permitir que você se concentre em fortalecer os aspec­
tos positivos da sua relação, mais do que remediar os negati­
vos. Você também indicou que experimenta aspectos positivos de
relacionamento mais do que as pessoas que relataram estar infeli­
zes em seu relacionamento de modo geral. Dado que você não
experimenta muitos pontos negativos na sua relação, pode ser
mais útil, na leitura deste livro, focar na melhoria dos aspectos
positivos.

Qualidade Positiva zona Amarela (17-19);


Qualidade negativa zona Amarela (4-6)
Sua pontuação sugere que você experimenta, de forma mo­
derada, aspectos negativos em seu relacionamento. Você também
indicou que experimenta aspectos positivos mais do que as pes­
soas que relataram estar infelizes em seu relacionamento de
modo geral. A combinação desses dois resultados sugere que você
está lidando com problemas moderados - mas não graves - tanto
com a ausência de aspectos positivos, quanto com a presença de
negativos.

Qualidade Positiva zona Amarela (17-19);


Qualidade negativa zona vermelha (superior a 6)
Sua pontuação sugere que você experimenta muitos aspectos
negativos em seu relacionamento. Você também indicou que experi­
menta aspectos positivos mais do que as pessoas que relataram estar
infelizes em seu relacionamento de modo geral. Os aspectos positivos
da sua relação podem ajudar a compensar alguns dos negativos. Por
exemplo, os casais que discutem muito ainda podem ser felizes em
52 Três lados para cada história

seu relacionamento, se eles também se sentem emocionalmente ou


sexualmente conectados aos seus parceiros. Embora haja, provavel­
mente, alguns aspectos positivos de relacionamento que poderiam ser
melhorados, pode fazer sentido selecionar uma “questão central” para
trabalhar neste livro que se concentre na redução de um aspecto ne­
gativo (por exemplo, o conflito).

Qualidade Positiva zona vermelha (menos de 17);


Qualidade negativa zona verde (menos de 4)
Sua pontuação indica que você experimenta aspectos nega­
tivos em seu relacionamento. No entanto, você também indicou
que estava infeliz com o nível de aspectos positivos na relação;
suas avaliações indicam insatisfação com essa área, semelhante
a casais que reportaram uma infelicidade geral em sua relação. A
boa notícia é que, dada a sua baixa pontuação de aspectos ne­
gativos, é provável que você seja capaz de se envolver plena­
mente neste livro, evitar brigas e recuperar um pouco da cone­
xão que você perdeu. Como a falta de aspectos positivos parecer
ser o principal problema em seu relacionamento, provavelmente
fará sentido selecionar uma “questão central” para trabalhar
neste livro que se concentre no fortalecimento dos aspectos po­
sitivos da relação.

Qualidade Positiva zona vermelha (menos de 17);


Qualidade negativa zona Amarela (4-6)
Sua pontuação sugere que você experimenta os aspectos negativos
de maneira moderada no seu relacionamento. De acordo com os aspec­
tos positivos, suas avaliações indicam insatisfação com essa área, seme­
lhante a casais que relatam infelicidade geral em sua relação. No entan­
to, a boa notícia é que a pontuação moderada de aspectos negativos de
seu relacionamento sugere que você será capaz de se envolver plena­
mente neste livro, evitar brigas, e recuperar um pouco da conexão que
você perdeu. Como a falta de aspectos positivos parece ser o principal
problema na sua relação, provavelmente fará sentido selecionar uma
“questão central” para trabalhar neste livro que se concentre no fortale­
cimento dos aspectos positivos da relação.
Diferenças Reconciliáveis 53

Qualidade Positiva zona vermelha (menos de 17);


Qualidade negativa zona vermelha (superior a 6)
Sua pontuação sugere que você experimenta muitos pontos ne­
gativos no seu relacionamento. Em relação aos aspectos positivos,
suas avaliações indicam ainda mais insatisfação com essa área, seme­
lhante a casais que reportaram uma infelicidade geral em sua relação.
Tendo em conta que você está infeliz com ambos os aspectos positi­
vos e negativos de seu relacionamento, você vai querer selecionar
cuidadosamente a “questão central” que você trabalhará neste livro.
Por um lado, você vai desejar escolher um tema que, se alterado, irá
melhorar substancialmente a sua relação. Por outro lado, você deve
ter cuidado em não escolher algo que vai ser muito difícil de resolver
- você está, provavelmente, sentindo-se bem esgotado emocional­
mente pelo seu relacionamento e pode não ter a energia, agora, para
lidar com uma grande mudança. E não se preocupe, pois muitos ca­
sais que estavam descontentes com ambos os aspectos positivos e ne­
gativos de seu relacionamento acharam este livro útil!
2

"Você está errado!"


Problemas de relacionamento
como falhas do outro

Como é maravilhoso ter alguém para culpar! Como é


maravilhoso viver com seu próprio castigo! Você pode
ser infeliz, mas você se sente sempre certo. Você pode
estar fragmentado, mas você se sente absolvido de toda
a culpa por isto.
ERICA JONG, How to Save Your Own Life (1977)

Como uma briga inicia? Sobre o que se trata?

QUATRO GATILHOS PARA 0 CONFLITO

Don Peterson (1979), um psicólogo da Universidade Rutgers,


tentou responder a essas perguntas, pedindo a um grupo de casais vo­
luntários para gravar importantes eventos conjugais diários. Ele desco­
briu que havia quatro eventos típicos que iniciavam as brigas.

Crítica: o ataque verbal

Não surpreendentemente, o gatilho mais comum para uma


briga era a crítica. Nós todos sabemos que certos tipos de observa-
Diferenças Reconciliáveis 55

ções, aquelas destinadas a colocar os nossos parceiros para baixo,


provavelmente iniciam um conflito. Carol, por exemplo, que não
gostava de ter a característica de ser uma pessoa esquecida, ficou
um pouco defensiva quando seu marido, Ronaldo, apontou que ele
tinha encontrado a porta destrancada ao chegar em casa. Quando
ele se referiu a ela como uma “cabeça de vento”, no entanto, ela fi­
cou furiosa.
O comentário de Ronaldo é um exemplo de uma crítica eviden­
te e intencional. Mas, às vezes, as críticas não são intencionais. Uma
esposa pode fazer o que ela percebe como uma sugestão construtiva
ou uma observação rápida, mas seu marido reage com sentimentos de
mágoa e se sente injustamente difamado ou culpado por algo que não
é sua culpa. Quando Vivian disse a Stevão, “Você algumas vezes tem
dificuldade em lidar com as crianças”, ela pode ter pretendido dizer
isso apenas para apontar um fato, uma vez que um acesso de raiva da
sua filha de 4 anos de idade, havia, recentemente, quebrado a tranqui­
lidade doméstica da noite. Mas, para Stevão, sua observação foi senti­
da como um ataque injustificado sobre ele como pai. Ele acredita que,
por vezes, todos os pais, incluindo sua esposa, têm dificuldade em li­
dar com as birras de crianças pequenas. Por que ela tem que comentar
isso? O que para ela era simplesmente uma observação, para ele era
uma crítica dolorosa.

Exigências: os pedidos ilegítimos

Um segundo gatilho comum para uma briga era uma exigência


que atingia o destinatário como injusta ou ilegítima. Alice pediu a
Victor para ficar em casa no dia de seu jogo de cartas semanal com
seus amigos, porque ela estava doente, com gripe. Ela pensou que se
sentiría melhor se ele ficasse com ela e a cuidasse. Victor, no entanto,
não viu o seu pedido como algo razoável: “Eu não sou médico, não
posso ajudá-la. Além disso, você não está tão doente. Por que eu deve­
ria desistir de algo que é importante para mim só porque você se sente
mal?”. Da mesma forma, o pedido de Carol para que Ronaldo a aju­
56 "Você está errado!"

dasse a revisar um relatório que estava escrevendo parecia razoável a


ela, pois ela já estava estressada com a tentativa de terminar esta tarefa
para o prazo do dia seguinte, e ainda tinha que preparar algumas ava­
liações que também eram para este prazo. Mas Ronaldo não viu da
mesma maneira que ela: “Você quer que eu seja seu assistente porque
você procrastinou como de costume e criou a confusão que você está.
Por que eu tenho que salvar você agora?”.

"Pela centésima vez...": irritação acumulada

Os conflitos também foram acionados pelo que Peterson (1979)


chamou de “irritação acumulada”. Se Stevão esquece repetidamente
de colocar os pratos na máquina de lavar, Vivian fica irritada, e eles
discutem. Se Carol se atrasa de vez em quando, Ronaldo pode tolerar
isso, mas, quando ela está constantemente atrasada, ele fica brabo. Ele
se pergunta como ela pode ser tão insensível, sempre o fazendo espe­
rar. Carol se dá conta de que ela se atrasa frequentemente, mas ela
também percebe que nunca faltou a um evento importante ou provo­
cou a raiva de alguém que não seja Ronaldo. Seus colegas de trabalho
tratam seu atraso habitual como um ponto fraco perdoável. Por que
ele não pode sentir o mesmo?

Rejeição: invalidando o gesto do outro


O último gatilho comum para o conflito era uma recusa ou uma
rejeição. Por exemplo, Stevão colocou os braços em torno de Vivian como
um gesto de afeto, mas quando Vivian respondeu com “Não agora”, ele
ficou brabo: “Você diz que quer que eu seja carinhoso com você, mas en­
tão você me afasta!”. “Sim, em geral, eu quero que você seja mais carinho­
so,” Vivian respondeu, “mas você não pode aceitar que eu não esteja sem­
pre com o mesmo humor, como você?”.
Ronaldo se sentiu rejeitado quando ele fez um esforço especial
para cozinhar “massa primavera”, o prato favorito de Carol e ela disse:
“Obrigado, mas eu estou mal do estômago. Eu acho que vou tomar
Diferenças Reconciliáveis 57

um pouco de chá e ir para a cama”. Ronaldo perguntou em voz alta:


“Como você pode ser tão insensível?”. Carol respondeu defensiva­
mente: “Eu simplesmente não me sinto bem, e eu não estou com
fome!”. Ela não conseguia entender por que ele teve que ficar tão in­
comodado diante da sua recusa em comer a sua refeição.

A HISTÓRIA QUE SE REPETE

Em cada um desses casos, uma briga começa com as ações ou


omissões de um parceiro. No caso de uma crítica, uma demanda in­
justa, e irritação acumulada, as ações de um dos parceiros ofendem
o outro. Em caso de rejeição, é o fracasso de um parceiro em res­
ponder adequadamente que leva ao conflito. Quando tais eventos
ocorrem repetidamente, no entanto, cada pessoa fica mais sensível
aos gatilhos, de modo que, ao longo do tempo, precisa cada vez me­
nos provocação para iniciar uma briga. Maria não precisa fazer um
comentário crítico, completo, sobre a forma como Sandra lida com
as crianças para provocar uma reação de Sandra. Depois de anos, su­
portando comentários críticos, Sandra pode interpretar o pedido
inocente de Maria “você ajudaria Max com o seu dever de casa?”
como uma crítica, porque isto sugere que Sandra deveria, ter ajudado
Max com sua lição de casa, ou que ela deveria ter notado que Max
precisava de ajuda. Se Sandra reage defensivamente a até mesmo es­
ses comentários relativamente isentos, Maria pode fazer o seu me­
lhor para evitar qualquer coisa que soa culpar ou acusar. No entan­
to, as palavras cuidadosamente escolhidas por Maria, num passeio
em família para a praia, “Lembre-se que Max não nada bem,” po­
dem conter uma sugestão de julgamento (ou seja, Sandra não terá o
cuidado com Max na água) que atravessa a Sandra como crítica.
Da mesma forma, Ana não precisa tentar dar um beijo apaixo­
nado em Gui para experimentar a rejeição dele. Depois de muitas re­
jeições ela raramente faz tais gestos evidentes para excitá-lo. Agora, até
mesmo o olhar distraído dele quando vai cumprimentá-la ou a sua
58 "Você está errado!"

aparente falta de interesse quando ela fala sobre seu dia, é sentido
como rejeição.
Agora, Gui pode estar ciente da sensibilidade dela à rejeição, e
por isso ele pode tentar se “animar” para dar uma resposta mais entu­
siasmada. Mas ela pode perceber estas tentativas forçadas e insinceras
e se sentir rejeitada de qualquer maneira.
Se estivéssemos assistindo a esses encontros, poderiamos nos per­
guntar por que cada pessoa tinha uma reação tão forte a essas ações apa­
rentemente sem importância. Por que Ronaldo se sentiu tão rejeitado
quando a doença de Carol tornou impossível para ela comer o jantar, ele
tinha cozinhado? Por que Sandra se sentiu tão atacada pelas pequenas crí­
ticas de Maria da maneira como ela lidava com as crianças? Nossa confu­
são seria compreensível porque não temos acesso à experiência interior
desses casais, e muito menos estamos a par de todos os últimos incidentes
que levaram a essa experiência. Estaríamos vendo apenas uma pequena
fatia de uma longa história, complicada e dolorosa que explica estas sensi­
bilidades intensificadas por comentários aparentemente inocentes.

"POR QUE ISSO ESTÁ ACONTECENDO CONOSCO?":


A BUSCA POR UMA EXPLICAÇÃO

Quando qualquer evento importante acontece em nossas vidas,


nós procuramos uma explicação. Se o evento for doloroso e ocorre re­
petidamente, tal como uma discussão, nossa busca assume um sentido
de urgência. Precisamos entender o evento para ter algum controle so­
bre ele. Se pudermos determinar com precisão sua causa, poderemos
alterar o que a ocasionou e, assim, evitar uma dor futura. Quando
percebemos que uma crise vai acontecer, então, colocamos nossas ca­
pas de detetives e procuramos o culpado. Quem cometeu este crime?
Há dois suspeitos óbvios em qualquer conflito de relacionamen­
to: você e seu parceiro. Supondo que o conflito não incluiu outras
pessoas, vocês dois foram os agentes da discussão. O culpado tem que
ser um de vocês. Mas qual?
Diferenças Reconciliáveis 59

Os psicólogos têm realizado uma extensa pesquisa sobre os ti­


pos de explicações que as pessoas desenvolvem para dar sentido aos
acontecimentos de suas vidas. Talvez não seja surpresa que nossas aná­
lises tendem a ser diferentes, dependendo se estamos olhando para
nós mesmos ou para os outros. Quando nós explicamos nossa própria
ações menos desejáveis em um conflito, temos a tendência de olhar
para fora de nós mesmos. A pressão de um prazo ou os comentários
maldosos dos outros nos fez agir daquela forma. Nossos olhos e ouvi­
dos são direcionados para o mundo exterior, por isso estamos bem
conscientes das pressões externas que afetam a nós e influenciam o
nosso comportamento. Mas quando vamos explicar as ações dos ou­
tros, nós geralmente olhamos para seus fatores internos, tais como
seus traços de personalidade. Porque os nossos olhos e ouvidos estão
focados neles, então podemos ficar menos cientes dos fatores em seu
próprio mundo que os influenciaram. Nós os vemos, e somente eles,
como a causa do seu próprio comportamento. Você está atrasado por­
que você é imprudente; Eu estou atrasado por causa do tráfego pesa­
do. E como observar as diferenças entre biografia e autobiografia: ao
contar a história de outra pessoa, nós tendemos a atribuir mais res­
ponsabilidade por pecados e erros ao outro, do que atribuir a nós
mesmos quando contamos a nossa própria história.
Estas tendências humanas estão constantemente no trabalho
em relacionamentos íntimos. Se ambos, marido e esposa, concor­
dam que ela deve pedir um aumento para seu chefe mas eia insiste
que agora não é o momento, seu marido pode explicar sua relutân­
cia como covardia, enquanto ela pode culpar o humor do seu chefe
- ela sabe quando seu chefe está aberto a essas solicitações. Da mes­
ma forma, se o marido e a esposa concordaram em limitar suas visi­
tas aos seus pais, mas ele imediatamente aceita outro convite para
jantar com eles, ela pode explicar a resposta dele como fraqueza
pessoal enquanto ele pode explicar como guiado pelos sentimentos
de seus pais
No caso de discussões, estamos bem conscientes das ações que
magoam ou das omissões dos nossos parceiros, mas consideramos o
60 "Você está errado!"

nosso próprio comportamento que machuca como meramente uma


reação aos erros dos nossos parceiros.
Se nos perguntarmos por que uma discussão dolorosa ocorreu,
estamos propensos a apontar um dedo acusador para o nosso parceiro.
E o nosso parceiro que é o culpado, e suas próprias características cau­
saram a situação. E quanto a nós? Não importa o quão fora da linha
foram nossas ações, fomos apenas provocados.

0 PAPEL DE SEU PARCEIRO NO CONFLITO

"E tudo culpa sua": acusações e condenações


Mais julgamentos e veredito de culpa ocorrem nas
cabeças dos casais do que em tribunais de justiça.

Quando pensamos sobre as ações dos nossos parceiros, frequen­


temente conduzimos a uma espécie de investigação judicial nas nossas
cabeças. Nós realizamos um julgamento mental para avaliar os seus
crimes emocionais contra nós. Embora limitado em sua jurisdição,
este tribunal lida com as maiores e mais profundas reivindicações: al­
tos crimes de amor e caráter.
Como todo mundo, você, sem dúvida, repassou mentalmente as
evidências dos erros de seu parceiro e analisou o que estes significam.
Cada ação errada sugere que o seu parceiro tenha algum traço ruim. Ele
não escuta o seu ponto de vista, talvez ele seja inensível . Ela fez o que
queria fazer, sem levá-lo em conta, talvez ela seja egoísta. Ele criticou
por coisas que ele também faz, talvez ele seja injusto. Ela, com raiva, in­
terrompeu você e lhe chamou de nomes- talvez ela seja hostil.
Atos ilícitos do seu parceiro podem sugerir a ausência de traços po­
sitivos ao invés de a presença de negativos. Se o seu parceiro ignora seus
sentimentos, talvez ele não se preocupe com você. Se o seu parceiro se es­
quece do que você disse a ela, talvez ela não valorize o que você lhe fala.
Se o seu parceiro não demonstra afeto a você, talvez ele não lhe ame. Se o
seu parceiro parece desinteressado por sexo, talvez ela tenha perdido sua
Diferenças Reconciliáveis 61

atração por você. Se o seu parceiro não passa muito tempo com você, tal­
vez ele não tenha feito você uma prioridade em sua vida.
Enquanto você pensa sobre o comportamento recente de seu
parceiro em relação a você, você se lembra de atos similares no pas­
sado. Um pequeno comportamento de egoísmo recente traz à mente
uma série de ações egoístas anteriores. Indícios recentes de que o seu
parceiro não lhe ama realmente lhe fazem recordar de outras situa­
ções que o remetem à mesma conclusão. Em sua mente, você revisa
estes elementos incriminatórios, atuais e passados. Eles são as provas
que você apresenta no seu tribunal mental. Eles são o testemunho
de acusação sobre o qual seu júri mental delibera. Um veredito de
culpado parece correto.
Mas um veredito é apenas o primeiro passo para alcançar a jus­
tiça. Em seguida, queremos nossos parceiros confessando sua culpa.
Eles precisam admitir que eles são egoístas ou insensíveis ou têm falta
de respeito e amor. No mínimo, eles deveriam pedir desculpas para
nós. Mais importante, eles precisam mudar. Eles devem trabalhar em
seu problema. Eles devem fazer esforços consistentes para serem mais
atenciosos e mais amorosos.

"Você está doente": o diagnóstico


Aqueles de nós que são mais psicologicamente inclinados po­
dem procurar explicações do comportamento dos nossos parceiros na
sua personalidade. Em vez de olhar para o dano moral, nós procura­
mos o prejuízo emocional. Em vez de realizar uma audiência em tri­
bunal, realizamos um exame psiquiátrico. Em vez de exigir acusação e
convicção, buscamos um diagnóstico preciso.
Muitas vezes, esse diagnóstico aponta para problemas emocio­
nais. Se seu parceiro mostra uma necessidade de reafirmação, apreço e
amor que parece excessivo, talvez ele realmente não goste de si mesmo
e, portanto, é inseguro sobre se os outros o amam. Se sua esposa não
confia em você ou não lhe enche de carinho, talvez ela tenha um pro­
fundo medo de intimidade com os outros. Se o seu marido não deseja
62 "Você está errado!”

socializar muito com sua família e amigos, talvez ele tenha uma preo­
cupante falta de confiança em si mesmo. Se o sua parceira é muito
crítica com você, talvez seja porque ela não aceita a si mesma e, por­
tanto, não pode aceitar os outros.
Seu diagnóstico de seu parceiro pode sugerir algo ainda mais
grave do que problemas emocionais: um transtorno mental específico.
Se seu parceiro é temperamental e irritável, você pode concluir que ele
está deprimido. Se suas acusações sobre você parecem selvagens e in­
fundadas, você pode diagnosticá-la como paranóica. Se seu comporta­
mento durante as discussões parece irracional, você pode chamá-lo de
louco. E a sua loucura, não a sua maldade, que causa o comportamen­
to hostil de nossos parceiros em relação a nós.
Em nosso esforço para entender as dificuldades emocionais ou
a doença mental de nossos parceiros, podemos investigar seu passa­
do. Muitas vezes descobrimos pistas no comportamento de nossa fa­
mília de origem. A família dele sempre põe panos quentes nas suas
diferenças e nunca enfrenta os seus conflitos diretamente, por isso
não é de se admirar que ele evite o conflito. Seu pai sempre a trata
como um bebê, então agora ela quer que eu a fique mimando. Os
pais dele nunca o forçaram a ser responsável, então ele é irresponsá­
vel. A mãe dela é apática e, muitas vezes, deprimida, então talvez
isso explique o seu mau humor.
Depois de termos diagnosticado as doenças dos nossos parcei­
ros, nós naturalmente, queremos que eles ouçam a nossa análise cui­
dadosa de seus problemas e admitam que estamos certos. Apesar da
nossa falta de formação profissional, acreditamos genuinamente que
entendemos como nossos parceiros funcionam. Eles deveriam enfren­
tar suas limitações emocionais ou seus transtornos mentais, aceitando
nossos diagnósticos. Uma vez que eles reconheçam abertamente e não
estejam defensivos, presume-se que queiram melhorar. Podemos suge­
rir alguns livros de autoajuda que irão reforçar a nossa perspicácia so­
bre o que está errado com eles. Podemos recomendar alguma terapia
para eles e talvez, até mesmo, para seus pais e irmãos. Se necessário,
poderiamos escolher o terapeuta apropriado para eles, inclusive forne­
Diferenças Reconciliáveis 63

cer o histórico necessário para o terapeuta e até uma tentativa de diag­


nóstico. A psicoterapia intensiva de longo prazo seria, sem dúvida, o
tratamento de escolha. No entanto, o custo e a duração desse trata­
mento podem ser impeditivos. Talvez um antidepressivo ou medica­
ção para ansiedade poderia restaurar a sanidade!

"VOCÊ NÃO É BOM 0 SUFICIENTE":


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO

Podemos poupar nossos parceiros do profundo conhecimento


que temos de suas personalidades e, em vez disso, avaliar o seu desem­
penho como cônjuges, parceiros, pais, provedores ou simplesmente
pessoas. Em vez de procurar um diagnóstico, agora procuramos uma
inadequação potencial. Em vez de avaliar a fraqueza moral, examina­
mos a incompetência. Julgamos nossos parceiros não em sua morali­
dade ou sua saúde mental, mas sim em sua capacidade de ser um bom
amante, cônjuge ou pai.
Nossos padrões de desempenho satisfatório são obtidos ao ob­
servar os outros. Se sua esposa não é fisicamente afetuosa, mas você
já viu outras esposas que enchem seus maridos com abraços e beijos,
você pode concluir que ela não sabe como expressar seu amor ade­
quadamente. Se seu marido fica chateado quando você sai com ami­
gos, mas você sabe que alguns maridos incentivam suas esposas a
sair, então talvez seu marido seja possessivo demais. Se sua parceira é
muito pegajosa e carente, talvez ela não tenha desenvolvido a habili­
dade de estar sozinha ou cultivar amigos como outros têm. Por ou­
tro lado, se o seu parceiro não passar tempo suficiente com você,
talvez ele não tenha realmente percebido que ele está agora casado,
sua vida de solteiro acabou.
Você pode concluir que seu parceiro não está maduro o sufi­
ciente para o casamento. Eia está mal preparada para a intimidade.
Ele nunca aprendeu a escutar atentamente ou dar apoio ou amor ade­
quadamente. De alguma forma, ela não teve treinamento para ter in­
64 "Você está errado!'

timidade ou tolerar a separação, ser sexualmente aberta ou ser sexual­


mente paciente, ter ambição no trabalho ou priorizar a vida em casa,
ter um relacionamento íntimo aberto e honesto, ou mostrar bom sen­
so no que dizer e quando dizê-lo, ou ser espontâneo e livre, ou ser res­
ponsável e ter comprometimento.
Ao apontar a inadequação moral ou diagnósticos de problemas
mentais, o primeiro passo de nossos parceiros para corrigir suas falhas
é admitir que estamos certos. Eles são cônjuges inadequados. Eles de­
veriam reconhecer suas deficiências. Uma vez que eles façam isso, eles
podem conduzir suas inadequações de várias maneiras. Eles podem
olhar para outros casais como modelos de comportamento adequado.
Se conhecemos outros maridos, por exemplo, que não estão preocu­
pados quando suas esposas saem semanalmente com seus amigos, en­
tão por que nossos maridos devem estar preocupados? Se lemos quan­
tas vezes a maioria dos casais nos Estados Unidos têm relações sexuais,
por que nossas esposas não conseguem pelo menos cumprir esse pa­
drão? Ainda mais importante do que olhar para outros casais, nossos
parceiros podem olhar para nós. Afinal de contas, somos modelos do
que um bom cônjuge deve ser: sabemos como priorizar o nosso tem­
po; Não somos carentes; Sabemos como ser fisicamente afetuosos. Po­
demos levá-los de volta à Terra Prometida de um casamento feliz - se
ao menos eles nos escutassem.

SEU PRÓPRIO PAPEL NO CONFLITO

“Pobre de mim": vítimas


Porque acreditamos que estamos apenas reagindo às provoca­
ções dos nossos parceiros, tendemos a nos colocar no papel de vítima
e nossos parceiros no papel de vilão. Se Rogério, que é muito social,
passar muito tempo outras pessoas em uma festa, deixando Sílvio, seu
parceiro que é tímido, se virando sozinho, Sílvio provavelmente ficará
com raiva e se sentirá vítima das ações de Rogério. Sílvio pode se per­
Diferenças Reconciliáveis 65

guntar se Rogério realmente se importa com ele ou se ele é simples­


mente, muito desatencioso. Se Sílvio expressar sua angústia a Rogério
no caminho de casa depois da festa, Rogério, por sua vez, pode se sen­
tir atacado. Ele pode se perguntar sobre a insegurança ou carência de
seu parceiro. Será que ele sempre tem que dar atenção a Sílvio? Tudo
que ele fez foi se divertir na festa. Ele não se embebedou ou flertou
com outros homens nem agiu de forma inadequada. Por que ele está
sendo atacado? Ele também pode se sentir vitimizado.

"Talvez precise dos dois": coconspiradores


Rogério e Sílvio ilustram uma dificuldade comum aos papéis de
vilão e vítima. Se ambos insistirem que são a vítima, não se pode es­
perar que deem o primeiro passo para resolver o conflito. Mas há ou­
tra razão pela qual é difícil manter a visão de que ambos são vítimas
inocentes. Um veredicto sobre o seu parceiro destaca suas transgres­
sões, mas lança uma sombra preocupante sobre você também. Se seu
parceiro é egoísta, desatencioso ou injusto, por que vocês dois estão
juntos? Você fez um mau julgamento? Você foi enganado pelo clássico
truque de ter sido fisgado, enxergando as verdadeiras características de
seu parceiro somente depois que você investiu no relacionamento?
Você foi enganado por atrações superficiais? Você encorajou ou falhou
em desencorajar os defeitos de seu parceiro? Você é um coconspirador
nos crimes de seu parceiro contra você?
Seus diagnósticos e avaliações de desempenho do parceiro
também podem lançar uma luz suspeita sobre você. Por que você es­
colheu uma pessoa tão danificada ou incompetente como parceira?
Você quer ou precisa de uma pessoa tão falha? Se seu parceiro não
tinha problemas emocionais ou inadequações quando os dois se co­
nheceram, você desempenhou algum papel na promoção desses pro­
blemas? Se seu parceiro tinha esses problemas, como você não se deu
por conta desde o início? Você contribuiu para suas dificuldades?
Você compartilha alguma cumplicidade nos problemas de seu par­
ceiro? Você é um “habilitador”, alguém que não tem um problema
66 "Você está errado!"

específico, mas que contribui com isso no outro, “capacitando-o”


para que seu comportamento aconteça?

"0 que diz este problema sobre mim?": vilões secretos


Muitos de nós ocasionalmente paramos de culpar os nossos parcei­
ros o tempo suficiente para nos perguntar se a maneira como eles nos tra­
tam implica em que realmente há algo de errado conosco. Se o seu parcei­
ro é crítico com você, isso significa que você é inadequado? Se o seu par­
ceiro está deprimido, isso significa que você não tem sido gentil e amoro­
so? Se ela parece um naufrágio emocional, isso significa que você não tem
sido paciente e apoiador? Se ele não se sente atraído por você, isso signifi­
ca que você não é atraente? Se ela mostra pouco interesse em você, isso
significa que você é desinteressante? Se ele tem tão pouco amor para dar,
isso significa que você não pode ser amado? Enquanto você pode, em úl­
tima análise, dar um desconto a essas possibilidades, é difícil não se per­
guntar sobre elas. Você pode abrigar um medo persistente de que você,
não seu parceiro, seja o verdadeiro vilão.

"DEIXE-ME EXPLICAR PORQUE TEMOS TANTOS


PROBLEMAS”: A BATALHA DE ACUSAÇÕES

E natural que você queira compartilhar suas conclusões uma vez


que avaliou tão cuidadosamente o mau comportamento de seu parcei­
ro. Se você não fala para seu parceiro sobre as fraquezas morais ou
problemas mentais ou inadequações que você descobriu nele ou nela,
como o seu parceiro vai ficar sabendo? Seu parceiro nunca será capaz de
mudar a menos que alguém que o conheça bem seja honesto o suficiente
para revelar estas falhas. Como ele reage à sua franqueza, no entanto, de­
pende de como e quando você aborda o assunto. Se você está incomoda­
do por uma briga recente, você pode falar com raiva, até mesmo de forma
vingativa. Sua própria mágoa impulsiona suas revelações. Suas explica­
ções, embora expressando o que você acredita ser verdade, soam como
Diferenças Reconeiliáveis 67

culpabilizadoras e acusações. Não surpreende que seu parceiro não reaja


bem a essas acusações, por mais verdadeiras que você acha que elas sejam.
Quando você não está reagindo a uma briga recente, você pode
tentar dizer para seu parceiro as suas conclusões de forma mais calma,
mais gentil, mais respeitosa. Você pode colocar seu veredicto com com­
paixão. Você pode usar a sua maneira mais cuidadosa.Você pode misturar
comentários positivos com negativos em sua avaliação.
Mesmo com esses esforços extras, você provavelmente descobriu que
seu parceiro raramente reage positivamente a suas conclusões sobre suas fa­
lhas. Seus julgamentos não proporcionam o respeito que todo seu cuidado
na formulação deles deveria garantir. Seu parceiro pode interrompê-lo. Ele
ou ela pode negar, indiscriminadamente, todas as suas conclusões. Seu par­
ceiro pode, vigorosamente, defender a si mesmo.
Por mais angustiantes que sejam essas reações, ainda mais an­
gustiantes são as acusações que voltam para você. Seu parceiro passou
por sua própria avaliação moral, avaliação diagnostica e avaliação de
desempenho de você. Ele concluiu que são suas falhas, sua imaturida­
de emocional, e sua inadequação, muito mais do que qualquer coisa
dele, que causa a infelicidade entre vocês. Seu parceiro equipara suas
conclusões com as dele.
O que pode surgir em seguida é uma batalha de explicações que
rapidamente se transforma em uma guerra de acusações. Muitos de
nós começamos querendo compartilhar nossas preocupações com
simpatia ou bondade ou respeito, mas as reações de nossos parceiros
nos colocam na defensiva. Nas acusações e contra-acusações que se se­
guem, nenhuma das partes se atreveria a manifestar qualquer receio
de ter desempenhado um papel no problema. Admitir que nós tam­
bém pudemos ter sido vilões, ou pelo menos coconspiradores, nos
tornaria extremamente vulneráveis.
Para nos proteger, então, qualquer coisa que admitirmos que fa­
zemos errado, pode ficar a serviço de uma acusação. Podemos, por
exemplo, concordar ter sido cegos às falhas de nossos parceiros no iní­
cio. Podemos admitir com o otimismo tolo que se tem no começo de
68 "Você está errado!"

um amor que, com o tempo, o parceiro acabaria por mudar sua per­
sonalidade. Acolher idéias como essas apenas enfatizam as falhas em
nossos parceiros.
Durante a batalha de acusações, certamente não sentimos
muita proximidade e amor por nossos parceiros. Podemos até sentir
a aversão ativa por eles. Se a briga é particularmente acalorada, po­
demos admitir sentimentos e atitudes que uma vez estavam lá, mas
agora estão, lamentavelmente, ausentes. Podemos reconhecer “Os
velhos sentimentos simplesmente já não estão mais lá” ou “Eu não
me importo mais tanto com isso”. As claras referências ao tempo
(“velhos sentimentos” ou “não mais”) sugerem que os sentimentos e
as atitudes já existiram e que “naqueles” dias o comportamento
apropriado seguiu-se com naturalidade. Mas agir de uma maneira
amorosa, dadas as emoções atuais, seria uma mentira. E não vamos
mentir. Afirmações de nossa integridade frequentemente acompa­
nham as confissões de nossa falta de sentimentos: “Eu tenho que
dizer a verdade — eu simplesmente não me importo mais” ou “Eu
não vou mentir para você: os sentimentos simplesmente não estão
lá”. As declarações, muitas vezes, implicam numa pressão para não
falar o que se está sentindo, presumivelmente para proteger o par­
ceiro a curto prazo, mas também querer resistir por um comprome­
timento com a verdade
Assim, o que começa como uma tentativa de explicar nossas
opiniões sobre nosso parceiro pode, facilmente, terminar numa bata­
lha de acusações, em seguida, em admitir questões que colocam as
acusações em evidência, e finalmente, em declarações sobre não cui­
dar ou não amar o outro. Estes últimos comentários podem ser parti­
cularmente prejudiciais e ameaçadores.
O que se perde nessas discussões são as ações ou não agir que
inicialmente desencadearam dor e que nos levaram a nossas tentativas
de compreensão. O fato de que nos sentimos frequentemente rejeita­
dos em nossas tentativas de nos aproximar de nossos parceiros pode
nunca ser expresso. Em vez disso, nossas acusações sobre seu medo de
Diferenças Reconciliáveis 69

intimidade e suas contra-acusações sobre nossa insegurança podem


impedir qualquer discussão sobre o que é que nos magoa. Se a conver­
sa se deteriorar para “o que foi admitido”, que nós já não sentimos
mais da maneira como costumávamos ou que não nos amam mais,
estas discussões podem criar mais dor e feridas do que as que nos con­
duziram à discussão no início.
Raul e Adriana muitas vezes têm conflitos sobre o cuidado de
seu filho pequeno, Joel. Adriana é uma mãe dedicada e preocupada
que leu muito sobre saúde e desenvolvimento infantil. Ela sabe que
sua primeira responsabilidade como mãe é a segurança e saúde de
Joel. Raul leva a paternidade em geral, e a segurança em particular,
de forma muito mais casual. Ele gosta de dizer “As crianças apren­
dem com suas contusões.” Dadas essas diferentes posições em rela­
ção ao cuidado à infância, não é de surpreender que eles tenham
opiniões diferentes sobre como acompanhar de perto Joel e sobre
que tipo de atividades ele deve ser permitido. Em sua frustração por
causa dos pontos de vista de Adriana, Raul, às vezes, diagnostica-a
como irracional: “Você é tão neuroticamente preocupada com tudo,
você o criaria numa redoma de cristal se você pudesse”. Em sua frus­
tração com Raul, Adriana o julga inadequado como pai e desprovi­
do dos valores morais que um pai deveria ter: “Você é tão preocupa­
do com suas próprias coisas, que quase não se importa em prestar
atenção em Joel. Você não se importa com o bem-estar dele. Eu me
sinto aliviada por ele não ter se machucado seriamente quando está
sob o seu cuidado”. Com essas trocas de acusações, ambos se defen­
derão e farão contra-ataques. O que não vai ser discutido ou pelo
menos reconhecido é que Adriana realmente se preocupa quando
Raul é responsável por Joel e que Raul se ressente por estar constan­
temente sob a vigilância da Adriana e quer que ela confie nele. O
que também não é discutido nessas batalhas de acusação é a questão
específica sobre a preocupação que trouxe o primeiro conflito: Joel
poderia brincar sozinho no quintal, com um dos pais olhando oca­
sionalmente, ou deveria um deles estar com o filho em todos os mo­
70 "Você está errado!"

mentos? Joel pode subir as escadas sozinho, ou alguém deveria estar


atrás dele para ajudá-lo? Se a discussão se deteriorar em ‘‘admitir” e
falta de amor ou cuidado com o outro, esses comentários podem ser
mais dolorosos do que a ansiedade e a desconfiança que iniciaram a
discussão em primeiro lugar.

"VOCÊ SEMPRE...": ENTERRANDO 0 CERNE DA VERDADE

O que faz um parceiro em um casal insistir em sua explicação


do problema e o outro insistir na sua? Primeiramente, ambos sabem
que existe alguma verdade nas suas respectivas explicações. Cada um
testemunhou o comportamento do seu parceiro muitas vezes e viu
evidência direta naquela característica que acusa o outro de ter. Em
segundo lugar, a resistência e teimosa de seu parceiro em admitir a va­
lidade da sua colocação somente faz com que você o pressione ainda
mais. Como seu parceiro pode se recusar, obstinadamente, a reconhe­
cer uma verdade tão óbvia?
A menos que você seja louco, isto é, claramente fora da realida­
de, as acusações feitas por ambos têm um cerne de verdade. Mas estas
são verdades exageradas, distorcidas no calor da briga e com a pressão
da resistência de seu parceiro. Quando você aumenta a característica
genuína, tornando-a mais dramática e excessiva do que realmente é, o
seu parceiro naturalmente se sente justificado em negar a caricatura
que você construiu. Por exemplo, a esposa que acusa seu marido de
ter uma reação exagerada, pode, no calor da discussão, afirmar que ele
está sempre fora de controle. Ele pode, veementemente, defender esta
caracterização dada por ela, e talvez, até virar o jogo: “Justamente
quem está fora de controle? E você quem reage exageradamente!”.
Pesquisas em ciências sociais dão alguma sustentação para a ver­
dade de nossas acusações. Estudos nos mostram que parceiros em
maus casamentos têm a tendência de ser mais impulsivos enquanto
que aqueles em casamentos felizes são mais sensatos e conscientes.
Diferenças Reconeiliáveis 71

Evidência ainda mais convincente nos mostra que dificuldades emo­


cionais estão associadas à insatisfação na relação. Por exemplo, ten­
dências neuróticas, alcoolismo e depressão estão ligados à insatisfação
conjugal. Finalmente, existe até evidência implicando em inadequa­
ção individual como um preditor de problemas da relação. Cônjuges
que têm menos habilidades de comunicação e de resolução de proble­
mas são mais propensos a estar em relacionamentos insatisfatórios.
Portanto, o parceiro que acusa o outro de ser mau, louco ou inade­
quado, e coloca estas características como as que contribuem para os
problemas do relacionamento, pode ter razão.
Mas estas acusações são imprecisas de várias formas. Em pri­
meiro lugar, a pesquisa mostra que traços, tais como impulsividade
ou depressão, somente tornam um casamento mais difícil, mas não
impossível. Ser sensato e consciente, provavelmente, faz com que o
casamento seja melhor, mas, de maneira alguma, é garantia disto.
Muitos casais são capazes de sustentar um relacionamento gratifi-
cante apesar de todo tipo de desafios pessoais. Em segundo lugar, a
acusação foca somente nas características negativas do parceiro, e
não nas suas próprias. E, como dissemos antes, a acusação está pro­
pensa a exagerar a característica no parceiro. Em terceiro lugar, e
mais importante, a acusação, a defesa e a contra-acusação - a guerra
de explicações entre os cônjuges - não faz nada para melhorar ou al­
terar aquelas características que estão sendo consideradas, exceto,
talvez, torná-las pior.
Quando tudo que nós fazemos é acusar aquele que amamos
por seus erros e pelas falhas de seu caráter e o censuramos a cada
vez, nós frustramos o exato objetivo a que aspiramos, o qual é mu­
dança em nossos parceiros. Encontrar imperfeições e intensificar as
fraquezas humanas que identificamos nesta pessoa, tão cara a nós,
somente desencoraja a cooperação e desgasta a boa vontade direcio­
nada para conosco. Nós raramente provocamos mudança em outra
pessoa desta maneira. Nós não podemos forçar mudança por meio
de ataques repetitivos e futis. Deve haver uma melhor maneira.
72 "Você está errado!'

RECAPITULANDO
Pela nossa perspectiva, discussões iniciam com ações ou ausência de comportamentos
de nossos parceiros que nos causam dor. Críticas, exigências injustas, aborrecimentos
acumulados e rejeição são os tipos de comportamento e resposta que podem desen­
cadear conflitos. Se estes eventos raramente acontecem, nós podemos ignorá-los.
Quando eles acontecem repetidamente, nós tentamos compreender porque eles
acontecem. Quase sempre iniciamos nossa busca colocando o foco na outra pessoa. O
que há em nossos parceiros que leva a estas ações dolorosas? Nas nossas mentes, po­
demos conduzir um tipo de uma investigação judicial em suas transgressões e con­
cluir que nossos parceiros tem certas deficiências morais e de caráter: eles são egoís­
tas, injustos ou desatenciosos. Se nós temos mais um entendimento psicológico, po­
deremos conduzir uma avaliação diagnostica ao invés de uma investigação judicial,
concluindo que aquele que amamos tem problemas emocionais, tais como imaturida­
de, insegurança neurótica ou depressão clínica. Ou, em vez disso, podemos avaliar a
inadequação de nossos parceiros, determinando a falta de treinamento como pai, a
falta de habilidade em comunicação, ou a inadequação em expressar amor, como a
raiz de seu comportamento nocivo.
Enquanto estamos engajados nesta análise de nossos parceiros, também podemos re­
fletir sobre a nossa própria contribuição com estes problemas. Podemos nos sentir
como vítimas, mas nos perguntar se somos possivelmente coconspiradores. No míni­
mo, nós selecionamos um parceiro com estas imperfeições. Será que também permi­
timos estas falhas, ou mesmo as alimentamos? Poderiamos também nos culpar por
estas inadequações? Embora estas possibilidades podem, persistentemente, incomo­
dar, é comum devolvermos o foco para a culpa de nossos parceiros, mais do que para
a nossa própria.
Quando concluímos nossas análises, naturalmente queremos dividi-las porque acredita­
mos que, informar nossos parceiros de suas falhas, é a melhor maneira de fazê-los tra­
balhar na sua mudança. Mas, mesmo quando acreditamos que estamos agindo a partir
de uma honestidade sincera e apresentamos nossas conclusões com cuidado, nossos
parceiros raramente são receptivos. Sentindo-se acusados, eles provavelmente se de­
fenderão, e o que é ainda mais perturbador, eles devolverão suas próprias conclusões
sobre nós. São os nossos erros, não os deles, que causam os problemas. Na batalha de
explicações que se segue o que somente é admitido é aquilo que serve para intensificar
as acusações. As discussões sobre os eventos concretos que, inicialmente, originaram a
dor, perdem-se. Se a batalha de explicações é, particularmente, acalorada, um ou am­
bos os parceiros, poderão dizer coisas que são mais dolorosas do que as ações originais
que levaram à discussão em primeiro lugar. Mesmo que exista alguma verdade em nos­
sas acusações, embora exageradas, aquela verdade frequentemente se perde no ruído
da batalha. Os conflitos ficam num impasse, se é que não ficam aumentados, e ambos
fincamos o pé e nos recusamos a admitir qualquer necessidade de mudança própria.
Portanto, ações feitas numa tentativa de estimular mudança, acabam por impedi-la.
Diferenças Reconeiliáveis 73

Exercício: Identificando a
área central do conflito

O próximo passo na utilização deste livro para melhorar o seu


próprio relacionamento é selecionar uma área difícil e constante de
conflito, como dinheiro, família, sexo, criação de filhos ou confian­
ça, Ao longo do livro, você vai se concentrar nesta área de dificul­
dade enquanto você sistematicamente aplica seus princípios, por
isso é importante que você a selecione cuidadosamente. Faça esta
seleção escolhendo a área central de conflito que você considera
mais importante em seu relacionamento, conforme a lista abaixo.
Observe que esta não inclui uma preocupação comum entre os ca­
sais, ou seja, a comunicação. Esta é, naturalmente, importante, tal­
vez o aspecto mais importante do relacionamento de um casal, e
discutiremos sobre isso em detalhe mais tarde. No entanto, a comu­
nicação é sempre sobre algo, sobre uma área de um tema. E aqui
nós queremos que você escolha a área sobre a qual você tem mais
dificuldade de se comunicar com sucesso.
Você, provavelmente, tem dificuldade de se comunicar sobre vá­
rios tópicos, mas escolha o tópico mais comum abaixo. Anote sua área
de conflito no espaço fornecido. Em seguida, anote uma breve explica­
ção da área problemática, a explicação que você pode ter dado antes
de olhar para este livro. Sua explicação pode incluir algumas das falhas
discutidas neste capítulo - e está tudo bem. Mais tarde, obteremos
uma compreensão mais completa e complexa desse problema e como
você pode fazer mudanças importantes nela. Passando por todo o livro
focado em um problema central permitirá que você lide de forma mais
efetiva com essa área, mas deve prepará-lo, também, para lidar melhor
com outros problemas de relacionamento, tanto os que você tem ago­
ra, quanto aqueles que podem surgir no futuro.

AREAS COMUNS DE CONFLITOS DE CASAIS


1. Parentalidade, filhos 5. Família do cônjuge, parceiros
2. Finanças 6. Tarefas domésticas
3. Demosntrações de afeto 7. Confiança, ciúmes
8. Empregos, carreira
74 "Você está errado!"

9. Álcool, drogas 13. Objetivos, metas, decisões importantes


10. Religião 14. Comportamento ou aparência apropriados
11. Temperamento, humor 15. Outras:______________________________
12. Tempo livre

Anote sua área de conflito, mas especifique brevemente a posição


de cada um. Por exemplo, você pode escrever "tarefas domésticas" e
indicar que você quer que Leo lave a louça com mais frequência, cozi­
nhe ocasionalmente e ajude com a limpeza para que as tarefas domés­
ticas sejam distribuídas de forma justa; enquanto que Leo acha que seu
trabalho no pátio e no carro compensam o tempo extra que você leva
na cozinha. Em seguida, escreva a sua explicação atual deste problema.
Por exemplo, você pode escrever que Leo não entende o quanto você
faz na casa e como isto é difícil, enquanto seu trabalho lá fora não é
tão demorado e é muito mais divertido para ele.

Minha área centrai de conflito;

Minha explicação deste conflito:


Parte II
Uma Compreensão Deep
(Profunda) do Conflito:
O Terceiro Lado da História

O modelo de formulação de caso é denominado deep, esta palavra em inglês signi


fica “profundo”. Os autores fizeram um trocadilho com as palavras.
3

"Como você podo ser assim?"


Problemas do relacionamento
como diferenças

O casamento é o processo de escolher a mulher certa


com quem ser incompatível.
Evan Esar, 20,000 Quipsand Quotes (1968)

Logo depois de completar 81 anos, meu’ pai descobriu que tinha


câncer de cólon. O câncer foi removido, mas o cirurgião informou que
tinha se espalhado e seria terminal. Seu oncologista previu que sua vida
remanescente seria medida em meses. Felizmente, a cirurgia o deixou li­
vre da dor. Durante uma visita de meus pais à nossa casa, eu preparei
uma câmera de vídeo e entrevistei primeiro somente meu pai, sobre sua
vida e, em seguida, minha mãe e pai juntos sobre seus quase 45 anos
como um casal. Eles falaram abertamente sobre sua vida juntos e seus
muitos altos e baixos. Quase no final da entrevista, meu pai observou
espontaneamente: “Muitas vezes eu fiquei espantado com o quanto so­
mos realmente diferentes”.
Minha mãe e meu pai eram pelo menos tão semelhantes quan­
to a maioria dos casais. Ambos eram imigrantes dinamarqueses e
partilhavam o seu patrimônio dinamarquês-americano, bem como
valores, tais como educação e trabalho duro. Contudo, suas perso­
' Todos os exemplos pessoais e de casos são de Andrew Christensen.
78 “Como você pode ser assim?"

nalidades individuais frequentemente os levavam em sentidos dife­


rentes. Mamãe era prática; Papai era um sonhador. Mamãe era am­
biciosa; Papai era relaxado. Mamãe era realista; Papai era idealista.
Essas diferenças dispararam sua atração, bem como inflamaram suas
controvérsias entre si.

DIFERENÇAS QUE FAZEM A DIFERENÇA

Diferenças — eternas diferenças, plantadas por Deus


em uma única família, de maneira que sempre haja
cor; infortúnio talvez, mas cor no cinza diário.
E. M . FORSTER, Howard's £zzz/(1910)

A expressão francesa “vive la difference” celebra a maneira feliz


em que as diferenças físicas entre homens e mulheres se entrosam, ser­
vindo como uma importante fonte de atração. Mas não são apenas as
diferenças físicas que são uma fonte de atração e prazer. Diferentes
idéias e opiniões podem inspirar a conversa entre as pessoas. Um casal
pode ficar junto por causa de suas discussões animadas sobre suas di­
ferentes opiniões políticas, religiosas ou filosóficas. Diferentes papéis
facilitam a realização das tarefas necessárias à vida. Embora os papéis
sexuais tradicionais tivessem muitos inconvenientes, esses papéis per­
mitiram uma clara divisão do trabalho: ele trabalhou no mundo; Ela
trabalhava em casa. Ele lidou com questões de negócios; Ela cuidava
dos filhos. Ele administrava a manutenção de coisas fora da casa,
como o quintal e o carro; Ela cuidava de coisas dentro da casa, como
cozinhar e lavar roupa.
As diferenças de personalidade também podem nos atrair e in­
teressar. Pesquisas psicológicas, ao longo de muitos anos, sugerem cin­
co dimensões básicas da personalidade: extroversão (buscando estímu­
lo social), reatividade emocional (forte resposta emocional às circuns­
tâncias estressantes), interesse em novas experiências, amabilidade e
organização. Cada um poderia facilmente ser uma fonte de atração.
Um introvertido pode encontrar um extrovertido que lhe atraia, pois
Diferenças Reconeiliáveis 79

há menos pressão para manter a conversa em andamento, enquanto o


extrovertido pode desfrutar das atenções do introvertido. Uma pessoa
emocionalmente reativa pode procurar segurança e calma em outra,
enquanto a pessoa segura pode apreciar o drama emocional da outra.
Uma pessoa convencional pode ser instigada pela criatividade de um
parceiro aventureiro, que, por sua vez, pode desfrutar de levar o con­
vencional a conhecer novas experiências. Um parceiro assertivo e um
cordato podem se perceber como um feito para o outro. Aquele que
planeja e é orientado por metas e um parceiro que vive o momento
presente, podem se sentir atraídos um pelo outro pelos pontos fortes
distintos que cada um deles oferece.
Diferenças que são atraentes, no entanto, também podem mos­
trar um lado mais sombrio. O introvertido pode resistir aos desejos do
extrovertido de sair frequentemente como um casal com outros. Um
parceiro mais estável pode, às vezes, achar que os altos e baixos do ou­
tro lhe esgotam (assim como o parceiro mais emocional acha a regula­
ridade do outro chata). O parceiro convencional pode achar que o
aventureiro passa dos limites. Um parceiro cordato pode se sentir
atropelado, às vezes, pelo assertivo. O planejador organizado pode fi­
car frustrado com o parceiro que, frequentemente, muda os planos.
Na verdade é difícil imaginar que estas diferenças de personalidade
não criem dificuldade em algum ponto para um casal. Isto certamen­
te parece ter acontecido com Débora e Francisco, cujas histórias fo­
ram contadas no Capítulo 1.
Além de diferenças de personalidade, existem outras diferenças
importantes que podem atrair e repelir. Considere o desejo de proxi­
midade e intimidade. Juliana pode querer passar a maior parte de seu
tempo disponível com Leo e compartilhar quase tudo. Leo pode achar
isso atraente no início, um sinal do interesse de Juliana. Mas com o
tempo, Leo pode precisar de mais espaço, para consternação de Julia­
na. Ou considere o desejo sexual. Você pode ter um forte desejo se­
xual e achar o outro sexualmente atraente, um interesse que é, certa­
mente, lisonjeiro para o outro. No entanto, o parceiro com menos de­
sejo pode, vir a achar que as necessidades sexuais do outro são exigen-
80 "Como você pode ser assim?"

X2ATHY© 1997 Cathy Guisewite. Reprinted with permission of Universal Ueliek.


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tes e invasivas. Finalmente, considere uma diferença na expressividade


emocional. Aquele que é sensível pode achar atraente a habilidade de
fazer as coisas daquele que é prático, enquanto que o prático pode
perceber como emocionante a capacidade de articular emoções do
sensível, ajudando o prático a articular alguns de seus próprios senti­
mentos. Mas é fácil imaginar as frustrações do prático com o não agir
do sensível ou a consternação do sensível diante da falta de reflexão
emocional do prático. Assim como nas áreas da personalidade, essas
diferenças, inicialmente, atraentes podem se tornar uma dificuldade.
Muitas diferenças, é claro, não eram fontes originais de atração
nem pomos de discórdia. Elas eram apenas parte do pacote de quali­
dades que compunham cada pessoa. Mas agora elas são uma fonte de
conflito. Beto não percebeu, no início, que era mais sociável do que
Sofia, mas esta diferença desde então lhes causou muitas brigas. Ini­
cialmente Carla não estava particularmente preocupada que Paulo
fosse próximo de sua mãe controladora, mas seu apego, desde então,
levou a muitas discussões.
Diferenças Reconeiliáveis 81

Não importa o quanto selecionamos o leque de possíveis parcei­


ros por meio do namoro, não importa quão cuidadosamente selecio­
namos nossos parceiros potenciais através de sites de encontros on-li­
ne ou “encontros cegos” criados por meio de amigos e familiares, os
parceiros que selecionamos serão diferentes de nós e muitas vezes essas
diferenças acabarão por nos causar dor.
Ted Huston e Renate Houts, psicólogos da Universidade do Te­
xas, tentaram determinar matematicamente a probabilidade de seme­
lhanças e diferenças entre parceiros. Eles estudaram 168 casais e desco­
briram que a probabilidade de que um homem e uma mulher se igua­
lassem em duas dimensões como interesses de lazer e preferências de pa­
péis era de apenas 33%. A probabilidade estimada de correspondência
em uma terceira dimensão hipotética foi de cerca de 17%. Correspon­
dência em mais de três dimensões foi ainda menos provável. Em média,
os casais deste estudo tinham namorado apenas cinco parceiros diferen­
tes, sem compromisso, antes do casamento. Esta exposição limitada,
mais a baixa probabilidade de encontrar uma correspondência em três
ou mais dimensões, significava que os cônjuges eram incompatíveis em
uma variedade de características. A incompatibilidade era uma certeza
matemática.
Um cínico observou certa vez que “o amor é a ilusão de que
uma mulher (ou homem) difere de outra”. Talvez o engano mais co­
mum do amor seja que nossos parceiros são mais semelhantes a nós
do que realmente eles são.

COMO NOSSAS DIFERENÇAS EVOLUEM

Eu sempre vou amar as idéias erradas iniciais que eu


tinha sobre você.
Autor Desconhecido

No início de nossos relacionamentos, podemos estar protegidos


das diferenças que nos tornam incompatíveis. Nossos contatos iniciais
maximizam as oportunidades de prazer e minimizam as chances de
82 "Como você pode ser assim?"

conflito. Nós nos vestimos para ficar com nosso melhor visual. Nós es­
colhemos atividades que ambos acharão agradáveis. Nós investimos
para tentar impressionar e agradar o outro. E somente quando começa­
mos a passar mais tempo juntos, a nos encontrar com os amigos e as fa­
mílias, e vamos morar juntos que, então, ficaremos expostos a possíveis
incompatibilidades. Nossos humores vêm à tona; nossos hábitos são re­
velados; nossas idiossincrasias ficam expostas. E praticamente certo que,
em algumas dessas maneiras, não vamos nos afinar. Quando descobri­
mos que as atrações não são fortes o suficiente ou as incompatibilidades
são muito grandes com uma determinada pessoa, nós terminamos o re­
lacionamento.
Felizmente, com um maior contato nós não somente revelamos
mais incompatibilidades, mas também criamos maior proximidade e atra­
ção. Ficamos mais confortáveis juntos e nos sentimos mais próximos ao
compartilhar mais e mais de nossas vidas. Áreas imprevistas de prazer po­
dem aparecer. Começamos a descobrir que a vida com um parceiro é um
complexo equilíbrio entre aspectos positivos e negativos. Finalmente nos
comprometemos com alguém quando as atrações parecem fortes e as in­
compatibilidades gerenciáveis.
Claro, esperamos uma vida feliz juntos, mas no amor como na vida
a única certeza é a mudança. A atração pode desaparecer ou o amor pode
crescer; as diferenças gerenciáveis podem se transformar, rapidamente, em
incompatibilidades problemáticas ou as grandes questões podem encolher
para minúcias. Talvez você espere passar muito tempo com seus pais
como casal, enquanto seu marido pensa que um jantar ocasional no do­
mingo com seus sogros é suficiente. Com o tempo seu marido pode se
tornar mais afeiçoado a seus pais e desfrutar de passar mais tempo com
eles, ou você pode achar que você precisa de menos contato, e, desta ma­
neira, a diferença entre vocês se dissipa. Mas também pode acontecer que
vocês endureçam em suas posições de maneira que o que era um proble­
ma menor no início se torna um grande problema mais tarde.
Incompatibilidades podem mudar por meio de experiências in­
dividuais, bem como por experiências compartilhadas. Kevin e Jonas
estavam em perfeito acordo sobre quanto tempo eles deveriam passar
Diferenças Reconciliáveis 83

juntos até que Jonas recebeu uma promoção em seu emprego. O de­
safio, a excitação e a pressão do novo trabalho de Jonas fez com que
ele passasse mais e mais tempo trabalhando, e Kevin começou a se
sentir deixado de fora de sua vida.
Se incompatibilidades estão presentes de início ou se desenvol­
vem ao longo do tempo, elas causam dificuldades para os casais porque
significam privação ou dor para um ou ambos. Quando Jonas passa me­
nos tempo com Kevin, Kevin se sente negligenciado e não amado. Ele
se preocupa em não ser uma prioridade na vida de Jonas. Entretanto, se
Jonas negligenciar suas responsabilidades com o trabalho, ele se sentirá
ansioso e preocupado.
Se o seu marido quer menos contato com seus pais e você con­
cordar com seus desejos, você pode perder este contato e se sentir cul­
pado por negligenciá-los. Se o seu marido vai junto com você, ele
pode se sentir entediado com seus pais ou, pior, ressentido com você,
porque você o pressionou a ir. Incompatibilidades têm consequências
para cada um dos parceiros.

0 LADO CLARO E 0 LADO ESCURO DAS SIMILARIDADES

Similaridades são, provavelmente, mais importantes do que di­


ferenças em determinar quem escolhemos como parceiros. Pesquisas
indicam que as pessoas escolhem como parceiros aqueles similares em
idade, origem e valores. Isto não é surpresa, pois nossas similaridades
nos dão uma base comum para as conversas, para o riso, para as pes­
soas que escolhemos como amigos, para as atividades, para tomada de
decisões. Como um bônus, as similaridades geram similaridades. Nos­
sos interesses em comum promovem atividades juntos, as quais, en­
tão, reforçam estes interesses. Se ambos amamos política, nossas dis­
cussões sobre este tema e nossa ida à manifestações serão experiências
compartilhadas que aumentarão nosso interesse nesta área. Da mesma
maneira, se jogamos cartas juntos, poderemos nos tornar mais habili­
dosos nestes jogos e encontrar mais prazer nesta atividade.
84 "Como você pode ser assim?'

Entretanto, similaridades também podem causar conflitos, em­


bora, provavelmente, menos do que diferenças. Vamos considerar par­
ceiros que são similares nas cinco dimensões citadas acima: extrover-
são, reatividade emocional, interesse em novas experiências, amabili-
dade e organização. Dois parceiros, os quais ambos são extrovertidos,
podem concordar que querem muito contato com amigos e família,
mas talvez fiquem competindo na hora de falar tanto um com o ou­
tro, quanto com família e amigos. Mas, também, suas escolhas podem
ser diferentes em relação aos amigos e famílias com quem eles querem
passar seu tempo. Por outro lado, dois introvertidos nunca competem
pela hora de falar, mas podem sentir isolamento devido a ter dificul­
dades em compartilhar um com o outro ou em fazer conexões sociais.
Dois parceiros, os quais ambos são emocionalmente reativos, podem
se beneficiar da empatia e compreensão que o outro pode lhe dar
quando um deles está estressado. No entanto, quando ambos estão es­
tressados, talvez nenhum possa servir como aquele que é o forte, con­
fiante, ou até ter a habilidade de cuidar do outro nestes momentos
mais críticos. Por outro lado, duas pessoas com baixa reatividade emo­
cional, podem manter a calma e ter a capacidade de manejar bem o
estresse, mantendo a relação livre de dramas emocionais. Entretanto,
esta falta de drama pode parecer tanto uma maldição como uma bên­
ção, pois na sua relação pode faltar a chama ou empatia emocional
quando um deles fica descontrolado.
Dois parceiros tradicionais apreciam a estabilidade e previsibili­
dade que a relação oferece, mas podem experimentar tédio e aborreci­
mento porque pouca novidade e excitação acontece em seu relaciona­
mento. Por outro lado, dois artistas ou aventureiros, podem ter uma
vida juntos, criativa e excitante, constantemente explorando o novo e
o diferente. No entanto, mais tarde, podem se sentir angustiados por­
que nenhum cuidou das coisas chatas mas necessárias à manutenção
de sua vida, tais como poupar para o futuro ou investir numa casa ou
planejar a criação dos filhos. Dois parceiros amáveis e atenciosos po­
dem criar um ambiente livre de conflito, pois são sensíveis às inquie­
Diferenças Reconciliáveis 85

tações do outro. No entanto, eles podem, frequentemente, ter dificul­


dade em dar voz aos seus verdadeiros sentimentos, dada sua preocupa­
ção em relação a como o outro reagiría, ou eles podem ficar se per­
guntando sobre o que o outro realmente está pensando ou sentindo.
Este lar tão pacífico custa um preço que exclui qualquer espontanei­
dade ou abertura. Ao contrário, duas pessoas assertivas nunca criam
ambiguidade no outro sobre o que eles estão sentindo ou pensando.
Eles constroem um lar aberto e espontâneo, mas ao custo de paz e
tranquilidade. Finalmente, parceiros que ambos são organizados, pla­
nejadores com metas, podem levar a vida com pulso firme, com suas
contas arquivadas e atendidas prontamente e suas posses todas no de­
vido lugar, mas parece não ter espaço para o prazer, pois os planos
para o amanhã se sobrepujam sobre as alegrias do momento presente.
Em contraste, aqueles parceiros espontâneos que se deliciam nos pra­
zeres do hoje, poderão ficar chocados quando percebem que nenhum
fez o adequado planejamento para o amanhã.
Similaridades em outras áreas cruciais ao relacionamento po­
dem também criar o seu quinhão de problemas, não tanto pelo o que
eles incitam, mas pelo o que eles bloqueiam. Dois parceiros que bus­
cam um relacionamento próximo em que ambos queiram fazer tudo
juntos, podem se achar isolados de outras pessoas ou se perguntarem
se o seu “eu” se perdeu no seu “nós”. Parceiros que temem conflitos e
evitam discussões sobre tópicos difíceis podem limitar suas habilida­
des de resolver seus problemas. Se ambos têm inibição em demonstrar
afeto fisicamente ou para o sexo, eles podem privar a si e ao outro de
prazeres sensuais. Se num casal, ambos são práticos ou sensíveis, eles
podem experimentar um desequilíbrio e ter más decisões que podem
resultar num excesso de confiança num sentimento sem ação ou numa
atividade que não levou em consideração suas consequências emocio­
nais. Em cada um destes casos, se houvesse uma diferença em um dos
parceiros, isto beneficiaria a relação.
86 "Como você pode ser assim?"

NÓS HERDAMOS O QUE NOS É DEVIDO

Quando nos deparamos com diferenças ou similaridades que


causam problemas, nosso primeiro impulso talvez seja de encontrar a
culpa em nosso parceiro. “Por que você tem de ser tão diferente de
mim?” ou “Por que você não pode ser diferente de mim?” Como ex­
plicamos no ultimo capítulo, você pode considerar as diferenças pro­
blemáticas (ou similaridades) em termos de moralidade (“E errado
você ser desta maneira”) ou como bem-estar emocional (“é um sinal
de doença mental ou imaturidade que você seja deste modo”) ou de
adequação (“Se você fosse uma pessoa melhor, você não seria deste
jeito”). Você pode tentar mudar o seu parceiro e vice-versa.
No entanto, seu legado genético e suas histórias de aprendiza­
gem se combinaram para fazer de você e de seu parceiro o que cada
um é, e mudar não é fácil.

Está no sangue dele (ou nos gens dela)


A ciência está encontrando mais e mais evidências sobre as in­
fluências genéticas no comportamento humano. Muito do que nós
acreditávamos ter aprendido inteiramente por meio da experiência,
agora parece estar influenciado por nossa herança genética. Uma ma­
neira de estudar os efeitos dos gens é olhar recém-nascidos, que não
viveram tempo suficiente, para que o ambiente os influenciasse. Nós
agora sabemos que recém-nascidos já apresentam temperamentos di­
ferentes. Alguns são bebês difíceis: eles são reativos à nova estimula­
ção, são difíceis de acalmar e não dormem regularmente. Outros são
bebês fáceis: eles não são facilmente perturbados por novos estímulos,
são fáceis de acalmar, e dormem regularmente. Ao observar estas
crianças com temperamentos diferentes, os cientistas mostraram que
estas primeiras tendências são preditivas de comportamentos futuros.
Outra maneira que os cientistas sociais investigam o efeito dos
genes no comportamento é comparar gêmeos idênticos, que têm 100%
de seus genes em comum, com gêmeos fraternos do mesmo sexo, que
Diferenças Reconeiliáveis 87

têm apenas cerca de 50% de seus genes em comum. Eles descobriram


que gêmeos idênticos mostram maior semelhança nos traços de perso­
nalidade do que gêmeos fraternos. Mesmo quando os cientistas são ca­
pazes de encontrar pares de gêmeos que foram separados no nascimento
e adotados, eles são capazes de mostrar maior semelhança entre gêmeos
idênticos do que gêmeos fraternos.
Um grupo de pesquisadores da Universidade de Minnesota
examinou mais de 1.500 pares de gêmeos e descobriu que as taxas
de divórcio eram significativamente maiores para um gêmeo se o
outro era divorciado. A probabilidade de divórcio aumentou quase
duas vezes se houvesse um gêmeo fraterno que fosse divorciado mas
aumentava seis vezes se tivesse um gêmeo idêntico que fosse divor­
ciado. Isso significa que existe um gene de “divórcio”? Dificilmente.
Em um estudo posterior, o grupo mostrou que atributos de perso­
nalidade, como emotividade negativa, podem ser compartilhados
por gêmeos, mas mais por gêmeos idênticos, e, portanto, pode ex­
plicar as diferentes taxas de divórcio.
O que esta pesquisa significa para você é que tanto a sua personalida­
de, quanto a do seu parceiro não pode ser mudada tão facilmente.

Nós somos a nossa história

O passado nunca está morto. Nem sequer é passado.


William Faulkner, Requiem for a Nun (1951)

O passado afeta tanto o presente quanto o futuro. O tipo de casa­


mento que nossos pais tiveram determina, em certa medida, o tipo de ca­
samento que teremos. A maneira como os nossos pais nos trataram como
crianças determina, em certa medida, a forma como trataremos os nossos
cônjuges e os nossos filhos. O contexto cultural em que fomos criados de­
termina, em parte, aquele que tentaremos recriar.
Um exemplo dramático é o que tem sido chamado de “trans­
missão transgeracional da instabilidade conjugal”. O que isto significa
88 "Como você pode ser assim?"

é que os filhos de pais divorciados têm mais probabilidade de se di­


vorciar. Em um estudo baseado em cinco grandes estudos, Hallowell
Pope e Charles Mueller descobriram que as pessoas que tinham pais
divorciados tinham 10% mais chances de se divorciarem do que as
pessoas cujos pais nunca se divorciaram. Embora esta não seja uma
grande diferença, é uma diferença real que tem sido reforçada por es­
tudos posteriores. Presumivelmente, essa tendência tanto vem de fato­
res genéticos- filhos que herdaram os genes de seus pais — quanto de
fatores ambientais: o casamento difícil dos pais afeta o próprio casa­
mento do filho.
A violência nos relacionamentos fornece outro exemplo dramá­
tico dessa transmissão do passado. Os filhos que testemunham violên­
cia física entre seus próprios pais têm mais probabilidade de experi­
mentar violência em seus próprios casamentos do que aqueles que
nunca testemunharam violência entre seus pais. Filhos que foram
abusadas por seus pais são mais propensos a abusar de seus próprios
filhos do que aqueles que nunca foram abusados.
Mas o passado não nos afeta de maneira simples. As experiências
atuais modificam constantemente os efeitos das experiências passadas, de
modo que a previsibilidade do passado é, geralmente, incerta. Muitos filhos
que experimentam abuso infantil não serão abusadores de seus próprios fi­
lhos. Muitos filhos que testemunham a violência entre seus pais não aca­
bam em casamentos violentos. E muitos filhos que testemunham o divór­
cio de seus pais ficam casados com seus cônjuges.
A psicologia freudiana popularizou a noção de que procuramos
parceiros que se assemelham com nossos próprios pais. Muitas vezes
ouvimos comentários como “Ele se casou com sua mãe” e “Ela se ca­
sou com seu pai.” Alguns de nós podemos notar semelhanças inquie-
tantes entre nossos próprios parceiros e nossos pais. Conexões entre
nossos pais e nossos parceiros, no entanto, são sempre complicadas.
Embora possa haver algumas semelhanças impressionantes entre pais
e um cônjuge, geralmente há muitas diferenças importantes. Mesmo
quando uma característica de nossos pais influencia nossa escolha na
busca de um companheiro, essa influência pode ocorrer tanto indire­
Diferenças Reconeiliáveis 89

tamente como diretamente. Considere, por exemplo, um menino que


cresce com uma mãe exigente. Ele pode “aprender” emocionalmente
que, para que coisas sejam feitas, é necessário ter alguém ao seu redor
para lhe pressionar. Ele pode procurar uma esposa exigente e interagir
com ela de maneiras reminiscentes de seu relacionamento com sua
mãe. No entanto, um outro garoto com uma mãe exigente pode ex­
perimentar essas vivências negativas e procurar uma esposa que nunca
faça exigências de forma explícita. Assim, ele interage com sua parcei­
ra de maneiras que comunicam esse seu sentimento, que é melhor ela
não agir assim. Em ambos os casos, as experiências de infância afetam
o relacionamento matrimonial posterior. No primeiro caso ele recria
uma relação de infância em seu casamento, enquanto que no segundo
caso, ele evita, a todo custo, a repetição de qualquer semelhança de
sua relação de infância.
A experiência em sua família de origem afeta mais do que ape­
nas sua escolha de um companheiro. O clima emocional na sua famí­
lia de origem ou o contexto cultural mais amplo em que você foi
criado influencia no que você sente que está adequado para você e,
portanto, no que você tenta criar em sua própria família. Se, por
exemplo, você cresceu em uma casa em que demonstrações de afeto
eram expressas livremente, enquanto que seu marido cresceu em uma
família que raramente expressava abertamente seu amor uns pelos ou­
tros, os dois, provavelmente, terão expectativas diferentes e vão se sen­
tir confortáveis de formas diversas nas suas demonstrações de afeto.
Você pode se sentir negligenciado e machucado se seu marido não co­
locar seu braço em torno de você ou segurar sua mão com mais fre­
quência. Muitas vezes você pode se sentir desconectada de seu marido.
Por sua vez, ele pode se sentir envergonhado com demonstrações pú­
blicas de afeto e desconfortável com frequentes exibições de carinho
num contexto privado. Ele gosta de assistir televisão com você, mas
não quer segurar sua mão o tempo todo.
O nível de conflito explícito é outro aspecto do clima emocio­
nal que tendemos a transferir de nossas famílias de origem para nos­
sas famílias atuais. Na família de Melissa, o conflito aberto foi supri­
90 "Como você pode ser assim?"

mido. O lema de seu pai era: “Se você não pode dizer nada de bom
sobre uma pessoa, não diga nada”. O ponto de vista de sua mãe era
“a maioria dos problemas se resolvem ao longo do tempo”. Ambos
os pais evitavam confronto. Palavras ásperas eram proibidas. O típi­
co resultado quando havia um desentendimento entre os pais era
tensão, em vez de discussões abertas. A família obteve respeito e
consideração uns pelos outros, mas pagando o preço de pouca es­
pontaneidade e abertura.
Em um nítido contraste com Melissa, a família de origem de
Nelson tinha uma abordagem “deixa tudo vir à tona” para o confli­
to. Os membros confrontaram seus conflitos diretamente, expressa­
ram suas opiniões livremente e raramente suprimiam qualquer de
seus sentimentos. Ambos os pais de Nelson eram fortes e obstina­
dos. A família conseguiu uma troca emocional aberta, espontânea,
mas à custa da paz.
Naturalmente, a abertura dogmática e explosiva de Nelson
muitas vezes machuca Melissa emocionalmente e a faz se sentir des­
respeitada e maltratada. Ele, por sua vez, frequentemente se sente
culpado por ferir seus sentimentos. No entanto, ele fica com raiva
porque ela não fala o que está na sua mente, e fica frustrado quando
ela simplesmente se retira diante do primeiro sinal de conflito. Em­
bora suas diferenças sejam enormes e problemáticas, elas poderiam
enriquecer a vida um do outro. Melissa poderia aprender a ter a ex­
pressividade emocional de Nelson, enquanto que ele poderia respei­
tar e ser mais contido como ela.
Forças mais amplas do passado do que nossa história familiar
nos influenciam no presente. O contexto em que fomos criados pode
exercer pressões poderosas sobre nós. Se o marido vem de uma cultura
que valoriza o contato próximo com a família de origem, ele pode en­
tender como uma responsabilidade obrigatória ter sua mãe viúva mo­
rando com ele. Fazer o contrário seria vergonhoso. Se sua esposa vem
de um meio cultural que enfatiza distanciamento entre as gerações,
ela pode insistir na ideia de que casas de idosos poderia ser considera­
da como uma opção. Por que sua sogra deveria invadir a privacidade
Diferenças Reconciliáveis 91

de seu lar? O desafio do casal será atender às necessidades de privaci­


dade da esposa e de preservação de sua família nuclear, enquanto que
permite ao marido cumprir suas responsabilidades familiares.

"EU QUERO, MAS EU NÃO QUERO":


DIFERENÇAS QUE CONFUNDEM

Vá embora e pare de me deixar sozinho.


Anônimo

Até agora temos discutido diferenças claras entre parceiros: um


quer uma coisa; O outro quer outra coisa. A esposa apresenta um
conjunto de valores, o marido outro. Não importa o quão diametral­
mente opostas as posições, essas diferenças mostram metas definidas,
inequívocas para os dois. Eles podem jogar sujo para atingir esses ob­
jetivos, mas os riscos são claros.
Nem todos os conflitos de interesse apresentam escolhas tão cla­
ras. Às vezes pensamos que queremos algo e articulamos nossos dese­
jos claramente, mas nosso comportamento sugere algo mais. Envia­
mos mensagens contraditórias, em uma ocasião pressionando em uma
direção e em outra na direção oposta. Mesmo um parceiro que está
aberto a mudar por nós, não saberá quais mudanças deve fazer.
Sarah diz que quer que Helena participe igualmente na cria­
ção dos filhos. Helena relutantemente concorda e genuinamente ten­
ta se envolver mais com seus filhos. No entanto, as críticas de Sarah so­
bre seus esforços e sua má vontade de cuidar das crianças minam as
tentativas de Helena. Uma parte de Sarah quer que Helena participe
igualmente, uma vez que ela acha difícil assumir o papel principal
na assistência aos filhos e ainda ter sucesso em seu trabalho. Mas ou­
tra parte dela quer ficar encarregada de educar seus filhos porque
sente que pode fazê-lo melhor.
Nessas situações, vemos tanto um conflito dentro de uma pes­
soa quanto um conflito entre duas pessoas. Não só Sarah e Helena
92 "Como você pode ser assim?"

discordam, mas a própria Sarah não tem certeza do que ela quer. A
situação se torna ainda mais frustrante e confusa quando Helena
também se sente ambivalente. Uma parte de Helena sente que de­
veria ter uma participação igual na criação de seus filhos - afinal,
elas são ambas mães, especialmente porque Sarah passa muito tem­
po no trabalho e contribui tanto financeiramente para a família,
quanto Helena. Mas outra parte de Helena se sente despreparada
para a tarefa: ela não teve tanta experiência com crianças quanto
Sarah. E, para dizer a verdade, ela tem menos prazer em atendê-los
do que sua companheira.
Considere outro exemplo de como os conflitos dentro de cada
parceiro complicam os conflitos entre eles. Haroldo quer que Júlia
cuide melhor dele. Quando ele se sente deprimido ou estressado - o
que é frequente — ele quer ser mimado, acarinhado, servido. Júlia,
muitas vezes, resiste à sua pressão, sentindo que ela não deveria ter
que tratá-lo como um “bebê”. Afinal, ele não a trata dessa maneira
quando ela se sente mal. Mas há algo sobre a angústia explícita dele,
sua incapacidade de esconder sua mágoa, sua vulnerabilidade que
Júlia acha atraente. Ela se sente necessária, generosa e forte quando
cuida dele. Mas quando ela está preocupada com suas próprias ques­
tões, ela acha suas demandas irritantes. Assim, ela alterna entre uma
atitude irritada “Oh meu, cresce” e uma atitude reconfortante “Ah,
meu doce, vai dar tudo certo”.
Por seu lado, Haroldo se sente desconfortável com o nível de
apoio que ele quer e precisa da Júlia. Ele não ignora suas idéias sobre
masculinidade e, muitas vezes, isto faz com que ele se sinta “inferior”
no relacionamento. Às vezes, quando ele só quer se afastar de seus
próprios pensamentos, ele considera a maneira como é tratado por ela
insultante e intrusiva. Assim ele alterna entre uma postura petulante
“Você não vai me ajudar?” com uma posição desafiante “Eu não pre­
ciso de você!”.
Dado estes sentimentos contraditórios, não é de surpreender
que o conflito entre eles fique confuso. Não é de se admirar que eles
Diferenças Reconeiliáveis 93

não possam encontrar ou pôr em prática qualquer mudança que


cada um queira.

BÊNÇÃOS CONTRADITÓRIAS

Não há bênção sem maldição.


Provérbio antigo

As qualidades pessoais dos nossos parceiros são frequentemen­


te bênçãos contraditórias para nós. A presença de qualquer boa ca­
racterística está, frequentemente, associada à presença de uma me­
nos desejável.
Por exemplo, é ótimo ter um marido responsável que cuida dos
negócios, que é pontual, elegante e metódico. Você nunca tem que es­
perar por ele, arrumar sua bagunça, fazer suas tarefas, verificar sua
contabilidade, ou se preocupar se ele vai pegar as crianças na hora cer­
ta. Se ele diz que vai fazer isso, você sabe que vai ser feito. Mas muitas
vezes tais maridos, da mesma maneira, exigem altos níveis de respon­
sabilidade de suas esposas e filhos. Eles podem ser rígidos em relação
às regras e inflexíveis quanto à adaptação às circunstâncias que exigem
mudança. Sua insistência no trabalho antes do prazer pode criar uma
atmosfera sem alegria no lar. Levar a vida com “pulso firme” raramen­
te a deixa prazerosa.
Também é maravilhoso ter uma esposa cordata, alguém que lhe
ama pelo que você é. Ela não vai criticar suas inadequações ou pressionar
para que você mude. Suas fraquezas criam poucos problemas para ela.
Mas ela pode ser passiva sobre outros aspectos da vida também. Ela pode
não se juntar tão vigorosamente como você gostaria em busca dos objeti­
vos que você definiu para si e sua família, ela pode deixar as coisas passar,
em vez de tomar medidas corretivas, e sua qualidade folgada às vezes pode
fazer com que você entenda como indiferença.
Algumas características positivas são menos colocadas em evi­
dência devido à sua associação com uma característica negativa, o ou­
94 "Como você pode ser assim?"

tro lado-da-moeda, e por não valorizarmos outras características posi­


tivas que vêm associadas à elas. Por exemplo, é bom ter um marido
que é dedicado a sua família, que gosta de passar horas com as crian­
ças depois da escola e nos fins de semana, praticando esportes e levan­
do-as aos lugares. Ele, prontamente, assume sua parte em levar os fi­
lhos ao médico e a visitas odontológicas e se delicia em ajudá-los,
brincando e conversando com eles. Mas é improvável que tal homem
seja um feroz competidor no trabalho. Ele pode não ter tempo nem
inclinação para se dirigir a maiores conquistas (e salários mais eleva­
dos) em seu trabalho.
Da mesma forma, pode ser ótimo casar com uma mulher de
carreira, cujo trabalho de prestígio acrescenta substancialmente à ren­
da familiar. Sua carreira oferece assuntos interessantes para a conversa,
é uma fonte de orgulho e permite a mobilidade social. No entanto,
ela pode não ter o tempo ou o interesse de fazer certas coisas “de espo­
sa” que seu marido também deseja, como preparar grandes refeições,
tendo um interesse pessoal em levar suas camisas e assumir o papel
principal na criação dos filhos.
Obviamente, é possível ser responsável sem ser rígido, aceitar
sem ser passivo, e combinar carreira, casamento e parentalidade com
sucesso. No entanto, o desenvolvimento de uma característica fre­
quentemente impede ou, pelo menos, limita o desenvolvimento de ou­
tra. Certamente, limitações de tempo e energia nos impedem de ser­
mos bons em tudo. Portanto, as características de nossos parceiros,
embora muitas vezes bênçãos, podem ser contraditórias.
Devido a isso, podemos reclamar que nossos parceiros não aju­
dam o suficiente em casa, mesmo enquanto continuamos a pressioná-
los a ganhar promoções no trabalho. Podemos nos queixar de que eles
sejam controladores, mas mesmo assim, e de bom grado, passar mais
e mais responsabilidades para eles. Nós, certamente, queremos que
eles nos achem sexualmente desejáveis, mas, talvez, suas iniciativas fre­
quentes nos pareçam irritantes.
Diferenças Reconciliáveis 95

SIM E NÃO

Mesmo se as qualidades desejáveis em nossos parceiros vies­


sem desacompanhadas das indesejáveis, nossas incompatibilidades
poderiam causar confusão. Muitas vezes, seus sentimentos sobre
uma única característica são misturados. Você pode sentir-se atraído
pelo seu parceiro por causa de uma determinada característica, mas,
em alguns momentos, achá-la desagradável. Sua ambivalência pode
surgir de seus próprios conflitos internos sobre uma determinada ca­
racterística. Você pode se deparar com certos desejos seus e, ao mes­
mo tempo, achá-los emocionalmente ou moralmente repugnantes.
Lúcia, por exemplo, sempre se sentiu tímida e desconfortável
com sua sexualidade. As discussões de sexo a envergonhavam, e as si­
tuações sexuais a inibiam. Surpreendentemente, ela se viu atraída por
Téo, o qual parecia exatamente o oposto. Adorava contar piadas obs­
cenas, fazia, muitas vezes, comentários provocantes e perseguia Lúcia
sexualmente de forma vigorosa. As reações de Lúcia em relação à fran­
queza sexual de Téo eram misturadas. Às vezes, ela achava seu com­
portamento provocador e excitante, mas em outras ocasiões ela o
achava nojento.
Jorge tem sentimentos mistos sobre a riqueza. Criado na década
de 1960, quando o materialismo era desprezado, ele tentou levar uma
vida simples. Como os valores mudaram durante os anos 70 e 80, ele
manteve sua filosofia, frequentemente lamentando o “consumo exces­
sivo” da sociedade, “soluções tecnológicas” e “materialismo insaciável”.
No entanto, ele também aspirava por certos bens: o mais recente
smartphone, um excelente sistema de áudio e um carro rápido. Quan­
do ele conheceu Wanda, ele se viu desfrutando do condomínio chique
em que ela morava e de seu elegante carro esportivo. Mesmo que ele a
provocasse e criticasse por seu materialismo, ele mesmo tirava muita
vantagem disso.
Nossos desejos podem criar conflitos não porque esses desejos,
em si mesmos, nos repelem, mas porque não se encaixam em nossa
imagem de nós mesmos. Aceitar conscientemente esses anseios pre­
96 "Como você pode ser assim?”

judicaria nossa autoestima. Sheila, que quer ser protegida e cuidada


em um relacionamento, escolheu Benami, em parte porque ele pare­
cia forte e confiável. Ao longo de seu relacionamento, Benami che­
gou a resgatá-la financeiramente, encarregou-se de detalhes práticos,
como reparos de carros, e pressionou-a a planejar em longo prazo
(fazendo investimentos, comprando seguros e fazendo um testamen­
to). Tal relação não se encaixa na visão de Sheila de si mesma como
uma mulher liberada, independente, e, sendo assim, ela o critica por
tratá-la “como uma criança”.
Celso odeia papelada de qualquer tipo. Ele vai trabalhar com
prazer no carro ou no quintal por horas, em vez de gastar 10 minutos
com contas, orçamentos ou extratos bancários. Jessica se encarregou
da papelada em seu relacionamento, em parte porque ela gosta e em
parte porque Celso evita isso. No entanto, estar desinformado sobre
as finanças não se encaixa no ponto de vista de Celso sobre masculini­
dade. Um maior conhecimento e controle de Jessica sobre seu orça­
mento faz com que ele se sinta fraco no relacionamento. Quando ela
o informa sobre sua situação financeira e recomenda que economizem
mais ou gastem menos, ele, frequentemente, resiste, fazendo acusações
vagas sobre a inabilidade dela de controlar o orçamento do casal. As
vezes ele faz compras impulsivas, em parte para demonstrar sua inde­
pendência financeira.
Nossa ambivalência pode se originar menos devido a um conflito
interno sobre uma característica do que de inveja e competitividade.
Podemos buscar nos nossos parceiros aquelas características que nos fal­
tam, mas nos sentirmos irritados por possuírem essas qualidades en­
quanto não as temos. Por exemplo, James sempre teve dificuldade em se
afirmar. Ele seguia o que os outros queriam, raramente expressando seus
próprios desejos, mas muitas vezes se sentindo ressentido por terem ti­
rado vantagem dele. Ele se viu atraído por Darlene em parte por causa
de sua franqueza. Ela falava tudo que vinha à mente e “não levava desa­
foro prá casa.” James invejava essa qualidade nela, mas criticava-a por
ser insensível aos outros e por se aproveitar deles.
Diferenças Reconeiliáveis 97

Renato adorava encontros sociais de qualquer tipo: festas, al-


moços de negócios, jantares com amigos. Um conversador diverti­
do, ele era convidado pelos outros, tanto quanto ele os convidava.
O marido de Renato, Bruno, era mais reservado e se sentia descon­
fortável socialmente. Levava um tempo para Bruno se “descontrair”
com os amigos. Ele invejava a atenção social que Renato recebia,
mas diminuía esta habilidade de seu parceiro, dizendo que era um
“charme superficial”.
A ambivalência pode se desenvolver ao longo do tempo quando
você se torna mais familiarizado com as qualidades do seu parceiro.
Como é ilustrado com o quadrinho de “Cathy”, anteriormente neste
capítulo, com o tempo, as características uma vez atraentes, podem
mostrar um lado mais escuro. O que você viu uma vez como um char­
me descuidado agora parece mais desleixo; o que você viu uma vez
como uma atitude relaxada, numa boa para a vida, agora é vista como
preguiça; o que você já considerou como cuidado amoroso agora parece
um comportamento controlador. Você está encontrando falhas e exigin­
do mudanças, e seu parceiro naturalmente grita “Jogo desleal!”
Qualquer que seja a sua origem, a ambivalência acrescenta confu­
são a qualquer conflito com o seu parceiro. Você gera duplas mensa­
gens, algumas vezes validando uma característica de seu parceiro, outras
reclamando dela. Essas mudanças de respostas causam confusão não só
porque são contraditórias, mas também porque você as apresenta “indi­
retamente”. Se você diretamente disse ao seu parceiro: “Eu não gosto
disso” e depois disse, tão diretamente como antes: “Eu gosto disso”, ele
ou ela poderia comentar a contradição e tentar esclarecer a confusão.
Mas você pode não estar plenamente consciente da ambivalência e apre­
sentar pelo menos um lado da contradição indiretamente.
Lúcia pode criticar a vulgaridade sexual de Téo definindo-a
como mau gosto, mas realmente recompensar seus comentários su­
gestivos e piadas, fazendo protestos ineficazes que chamam a atenção
para suas atitudes grosseiras. Celso pode se queixar sobre a gestão fi­
nanceira e controle de Jessica, mas continuar a forçá-la a assumir o
98 "Como você pode ser assim?"

controle, recusando-se a se envolver com as finanças deles. Bruno


pode minimizar a habilidade social de Renato, rotulando-a de “char­
me superficial”, mas dependendo dele para “quebrar o gelo” e trazê-
lo para o ambiente social. Como esses exemplos ilustram, nós co­
municamos diretamente o lado negativo de nossa ambivalência: não
faça isso ou não seja desta maneira. Mas, ao mesmo tempo, com fre­
quência, comunicamos indiretamente o lado positivo da ambivalên­
cia - agindo de forma a reforçar as características em questão.
A ambivalência em ambos parceiros sobre a mesma questão
cria, ainda, maior confusão. Cada um tem sentimentos ambíguos
sobre uma questão, tem consciência limitada da confusão, e envia
mensagens contraditórias. Não admira que eles não conseguem re­
solver o seu conflito. Considere, por exemplo, a ambivalência de
Sheila sobre ser cuidada por Benami. Ela quer ser uma mulher inde­
pendente, e por isso ela o critica por tratá-la como uma criança. No
entanto, ela toma decisões financeiras impulsivas que a colocam em
situações das quais ela precisa que Benami a salve, evitando o plane­
jamento prático de sua vida, dependendo dele para fazer isso por
ela. Por sua vez, Benami quer que ela precise dele, gosta de cuidar
dela e busca oportunidades para exercer suas consideráveis habilida­
des em atender ao lado prático da vida. No entanto, ele quer que ela
expresse apreço por seus esforços, insiste no controle dessas áreas
práticas, já que tem que assumir a responsabilidade por elas, e espera
que Sheila realize as tarefas que ele lhe atribui sem que ela se opo­
nha. Quando ela lhe dá um “pare!” - o que ela costuma fazer quan­
do o vê lhe atribuindo afazeres para cuidar da vida dela — ele se quei­
xa de sua falta de responsabilidade. Ou, quando ele está sobrecarre­
gado por suas próprias responsabilidades e acha um fardo o acrésci­
mo das dela, Benami pode dizer-lhe para “crescer”. Assim, Sheila
acusa Benami de tratá-la como uma criança e Benami acusa Sheila
de agir como uma criança; ambos ficam genuinamente zangados
com o comportamento um do outro, mas ambos reforçam e man­
têm essas características entre si. Seu conflito é confundido pela am­
bivalência de ambos sobre a questão do cuidado.
Diferenças Reconeiliáveis 99

RECAPITULANDO
Neste capítulo, consideramos os problemas de relacionamento como diferenças. Em­
bora busquemos parceiros que sejam semelhantes a nós de muitas maneiras, também
procuramos parceiros que sejam diferentes de nós. E as coisas que são semelhanças
inicialmente podem vir a ser diferenças, e vice-versa, ao longo do tempo. Todos nós
temos genes únicos e histórias sociais únicas que moldam quem somos. Assim, nunca
podemos encontrar um clone para um parceiro e, mesmo que o fizéssemos, provavel­
mente estaríamos descontentes com esse clone. Inevitavelmente, encontraremos um
parceiro cujas diferenças de nós ou semelhanças conosco causam problemas.
Essas diferenças são o material das brigas. Elas são o conteúdo em que nos envolvemos,
os problemas de relacionamento que enfrentamos. E como as diferenças e as semelhan­
ças, que conduzem às incompatibilidades visíveis são frequentemente o resultado de in­
fluências genéticas e históricas poderosas, não são fáceis de mudar.
Embora algumas diferenças de seu parceiro sejam definidas e nítidas, outras podem ser
mais nebulosas e escorregadias, acrescentando confusão aos seus conflitos. As boas
qualidades que você gosta em seu parceiro podem ser parte de uma constelação natu­
ral que inclui algumas qualidades que você não gosta. A personalidade de seu parceiro
é, inevitavelmente, um "pacote fechado", e você não tem nenhum "poder de veto" pelo
qual você poderia cancelar algumas características, mas manter outras. Mesmo uma
única qualidade em seu parceiro pode evocar reações complexas e ambivalentes, pois,
às vezes, você a considera boa, mas fica incomodado com ela em outros momentos.

Exercício: Diferenças de
personalidade no seu relacionamento
que podem fazer a diferença

No exercício seguinte, você vai pensar sobre sua personalidade


e interesses e considerar qual dessas características é diferente para
você e seu parceiro e se está relacionada ao seu conflito principal.
Os traços de personalidade abaixo são dificilmente as únicas áreas
em que os parceiros são diferentes, mas são áreas comuns. Esse pro­
cesso irá ajudá-lo a começar a fase D (a Diferença ou semelhança
relacionada ao seu problema principal) de uma compreensão DEEP
(profunda) deste problema.
Por favor, preencha os três breves questionários nas próximas
três páginas e marque-os conforme indicado.
100 "Como você pode ser assim?"

CINCO FATORES DE AVALIAÇÃO DA PERSONALIDADE*

Instrução:
Aqui estão alguns traços de personalidade que podem, ou não, se
aplicar a você. Por favor classifique cada item para indicar em que me­
dida concorda ou discorda dessa declaração. Você deve avaliar até que
ponto o par se aplica a você, mesmo se uma característica se aplica
mais fortemente do que a outra.

Eu me vejo como:

1. Extrovertido, empolgado
Discordo Nem
Concordo
Discordo Modera­ Discordo discordo Concordo Concordo
modera­
Inteiramente damente um pouco Nem um pouco plenamente
damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

2. Reservado, quieto
Discordo Nem
Concordo
Discordo Modera­ Discordo discordo Concordo Concordo
modera­
Inteiramente damente um pouco Nem um pouco plenamente
damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

Pontuação de Extroversão: (1 - 2) =____ Escores maiores significam maior extroversão.

3. Simpático, afetuoso
Discordo Nem
Concordo
Discordo Modera­ Discordo discordo Concordo Concordo
modera­
Inteiramente damente um pouco Nem um pouco plenamente
damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

4. Crítico, briguento
Discordo Nem
Concordo
Discordo Modera­ Discordo discordo Concordo Concordo
modera­
Inteiramente damente um pouco Nem um pouco plenamente
damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

Pontuação de Simpatia: (3 - 4) =____ Escores mais altos significam maior simpatia

Adaptado por Gosling, Rentfrow & Swann (2003). Copyright 2003 de Elsevier.
Adaptado com permissão. E no Brasil adaptado por Carvalho, Nunes, Primi.
Diferenças Reconeiliáveis 101

5. Confiável, autodiseiplinado
Nem
Discordo Concordo
Discordo Discordo discordo Concordo Concordo
Modera­ modera­
Inteiramente um pouco Nem um pouco plenamente
damente damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

6. Desorganizado, descuidado
Discordo Nem
Concordo
Discordo Modera­ Discordo discordo Concordo Concordo
modera­
Inteiramente damente um pouco Nem um pouco plenamente
damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

Pontuação de Organização (5 - 6) =____ Escores maiores significam maior organização

7. Calmo, emocionalmente estável


Discordo Nem
Concordo
Discordo Modera­ Discordo discordo Concordo Concordo
modera­
Inteiramente damente um pouco Nem um pouco plenamente
damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

8. Ansioso, descontrola-se com facilidade


Nem
Discordo Concordo
Discordo Discordo discordo Concordo Concordo
Modera­ modera­
Inteiramente um pouco Nem um pouco plenamente
damente damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

Pontuação de Reatividade Emocional (7 - 8) =____ Maior pontuação significa maior calma,


menos reatividade emocional

9. Aberto a novas experiências


Nem
Discordo Concordo
Discordo Discordo discordo Concordo Concordo
Modera­ modera­
Inteiramente um pouco Nem um pouco plenamente
damente damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

10. Convencional, pouco criativo


Discordo Nem
Discordo Concordo
Discordo Modera­ discordo Concordo Concordo
um pouco modera­
Inteiramente damente Nem um pouco plenamente
damente
concordo
1 2 3 4 5 6 7

Pontuação de Interesse em Novas Experiências (9-10) =___ Escores maiores significam maior
interesse em novas experiências
102 "Como você pode ser assim?"

MEDIDA DE EXPRESSIVIDADE EMOCIONAL*


Instrução:
Usando a escala fornecida como um guia, indique o quanto
você concorda ou discorda com cada uma das seguintes afirmações,
selecionando a escolha apropriada.

1. Sou capaz de descrever meus sentimentos claramente


Discordo Discordo um Nem discordo Concordo
Discordo Concordo
Inteiramente pouco Nem concordo plenamente
1 2 3 4 5 7

2. É difícil para mim revelar meus sentimentos mais íntimos, mesmo


para amigos próximos
Discordo Discordo um Nem discordo Concordo
Discordo Concordo
Inteiramente pouco Nem concordo plenamente
1 2 3 4 5 7

Pontuação de Expressividade Emocional (1-2) =____ Escores mais altos indicam maior facili­
dade e interesse em discutir sentimentos

MEDIDA DO DESEJO DE INTIMIDADE**


Instrução:
Por favor, responda as seguintes perguntas sobre o seu relacio­
namento:

1. Em geral, você gostaria de mais independência ou mais intimida­


de no seu relacionamento?
Mais independência Nenhuma mudança Mais intimidade
1 2 3 4 5 7

2. Dada a quantidade limitada de tempo livre que você tem, você


preferiría passar mais tempo com seu parceiro ou mais tempo so­
zinho ou com amigos?
Mais tempo Mais tempo sozinho
Nenhuma mudança
com parceiro ou com amigos
1 2 3 4 5 7

Pontuação de Desejo de Intimidade (1-2) =____ (Maiores pontuações significam maior de­
sejo de intimidade)

Adapted from Bagby, Parker, andTaylor (1993). Copyright 1993 by Elsevier. Adapted
by permission.
Adapted from Christensen et al. (2006). Adapted with permission from the author.
Diferenças Reconciliáveis 103

Você se classificou em dois aspectos de amostra de cada um


dos seguintes traços de personalidade: extroversão, simpatia, orga­
nização, reatividade emocional, interesse em novas experiências,
expressividade emocional e desejo de intimidade. A medida comple­
ta de cada uma dessas características exigiría que você avaliasse
mais itens para fazer uma classificação mais detalhada, mas esta
versão abreviada deve dar uma ideia do que se entende por essas
variáveis. Sua pontuação é importante para nossos propósitos, na
medida em que (1) ele difere de como seu parceiro pode ter respon­
dido estas questões e (2) está relacionada com a questão central
identificada anteriormente. Você acredita que você e seu parceiro
são substancialmente diferentes em uma das variáveis de personali­
dade acima e que essa diferença está basicamente relacionada à
questão central que você identificou? Se não, considere outras va­
riáveis em que os parceiros muitas vezes diferem, como a proximi­
dade com a família de origem, a libido (interesse sexual) e interesses
de lazer. Se nenhum destes parece importante para seu conflito
central, pense sobre qual diferença fundamental entre você e seu
parceiro está relacionada ao conflito principal. Anote essa diferença
abaixo. Se você acha que uma semelhança, em vez de uma diferen­
ça, é a chave para o seu conflito, você pode escrever.
Diferença fundamental (ou semelhança) entre meu parceiro e
eu que está relacionada ao nosso conflito central:

Este é o primeiro passo na sua análise DEEP (profunda) do seu


conflito principal. Voltaremos a essa diferença mais tarde, à medida
que explorarmos seu conflito.
4

"Você sabe como me machucar'*


Problemas de relacionamento
como sensibilidades emocionais

Você sempre machuca a pessoa que você ama

Doris Fisher e Allan Roberts, título de música (1944)

Um romano se divorciou de sua esposa, sendo muito


censurado por seus amigos, que lhe cobravam: “Não
era casta, não era justa, não era fértil?” Segurando seu
sapato, perguntou-lhes se este era novo e bem feito. —
“No entanto” - acrescentou ele - “nenhum de vocês
sabe onde me aperta”.

Plutarco, Parallel Lives: Aemilius Paulus (Circa 100 A.C.)

Não é difícil ver como as diferenças fundamentais (ou seme­


lhanças) entre as pessoas, como seus traços de personalidade, podem
criar problemas de relacionamento. Um casal, no qual um parceiro é
econômico e o outro um gastador precisa desenvolver uma maneira
razoável de gastar dinheiro juntos. Um casal em que um parceiro quer
mais intimidade e o outro mais independência precisa decidir quando
passar o tempo juntos e quando ter tempo afastados. Um casal em
que um parceiro é expansivo, enquanto o outro é reservado precisa
desenvolver maneiras de se comunicar confortavelmente. Um casal
Diferenças Reconeiliáveis 105

em que ambos gostam de estar no controle precisa trabalhar áreas


onde cada um fica no comando. O que não é, imediatamente óbvio, é
o que acontece emocionalmente com os parceiros quando lidam com
esses conflitos. Frequentemente suas reações emocionais são fortes e,
às vezes, confusas. O que mais está ocorrendo além do simples fato de
suas diferenças ou suas semelhanças conflitantes? O que acontece aos
casais que ficam afetados com suas diferenças?

MAIS DO QUE SE PODE VER:


EMOÇÕES SUPERFICIAIS E OCULTAS

O que é óbvio são as emoções que aparecem quando os parcei­


ros debatem-se com essas diferenças - chamamos “emoções superfi­
ciais”. O econômico fica irritado com o que o gastador gastou. Aquele
que busca independência fica contrariado quando o parceiro se queixa
sobre a falta de tempo juntos. O parceiro reservado desliga quando o
outro fica dono da verdade. Os parceiros, os quais os dois querem es­
tar no controle ficam furiosos um com o outro por pressionar para a
mesma coisa que ambos querem. Muitas vezes, essas emoções superfi­
ciais mascaram emoções mais profundas que os parceiros não expres­
sam - o que chamamos de “emoções ocultas”. O econômico pode se
sentir ansioso e preocupado porque terão muito pouco dinheiro e po­
deríam entrar em falência por gastos imprevistos. O gastador pode
achar que sua liberdade está sendo cerceada ou pelo menos desafiada.
Aquele que busca independência pode se sentir sufocado por aquele
que deseja intimidade, que, por sua vez, sente-se decepcionado ou
abandonado. O parceiro reservado pode se sentir esmagado pelo par­
ceiro opiniático, o qual sente que nunca pode obter uma resposta di­
reta. O casal que ambos gostariam de controle, eles podem se sentir
ansiosos por achar que têm pouco ou nenhum poder.
Podemos esconder algumas emoções, nossas emoções ocultas,
porque podemos estar apenas vagamente conscientes delas. As pessoas
que procuram o controle podem ter apenas uma suspeita da ansiedade
106 "Você sabe como me machucar'

que eles sentem quando têm de ceder a outros. Ou podemos encontrar


as emoções escondidas que são vergonhosas. Pessoas que desejam maior
intimidade podem ficar envergonhadas por sua solidão ou medo de
abandono. Ou podemos ter medo de machucar nossos parceiros se re­
velarmos nossas verdadeiras emoções. As pessoas que se sentem sufoca­
das por seus parceiros podem querer protegê-los desse conhecimento.
Ou, talvez, achamos que não tenhamos o direito a certos sentimentos.
Um homem reservado pode achar que não é viril o fato de se sentir in­
timidado diante do seu parceiro opiniático. Por alguma ou todas essas
razões, podemos camuflar algumas emoções ocultas com nossas emo­
ções superficiais. Se nos sentimos inicialmente ameaçados pelo abando­
no, podemos revelar a raiva em vez de medo. Se nos sentimos despreza­
dos ou não reconhecidos, podemos nos afastar em silêncio hostil em vez
de expressar abertamente qualquer mágoa. Se não nos sentimos no con­
trole, podemos agressivamente tentar nos apoderar dele, ao invés de ex­
pressar qualquer ansiedade diante de sua perda. Se nos sentimos invadi­
dos ou que houve muita intromissão, podemos nos distanciar e fechar
emocionalmente, em vez de expressar nossa crescente claustrofobia.
As emoções superficiais são, com frequência, mais duras que as
emoções ocultas. Podemos expressar a raiva em vez da mágoa; ressen­
timento em vez de desapontamento; Irritação em vez de vergonha ou
culpa. As emoções superficiais muitas vezes servem como uma função
protetora, retratando o “Eu” como forte e invulnerável, em vez de
aberto e vulnerável e, portanto, sujeito a lesões futuras. As vezes, as
emoções escondidas são mascaradas não com uma emoção alternativa,
mas sem nenhuma emoção aparente. Mais do que expressar a rejeição
que sentimos, nós nos fechamos; em vez de mostrar nossa inveja ou
ciúme, agimos como se não nos importássemos. Mais do que falar so­
bre a dolorosa solidão que sentimos, nós nos recolhemos. E, por fim,
algumas vezes as emoções ocultas desencadeiam nem uma emoção al­
ternativa, nem um recuo, mas uma ação reativa. Em vez de expressar
qualquer ansiedade para os nossos parceiros, tomamos conta da situa­
ção e dizemos a eles o que fazer ou como fazer. Em vez de mostrar a
nossa desconfiança, interrogamos os nossos parceiros sobre o seu para­
Diferenças Reconciliáveis 107

deiro. Em vez de revelar a negligência que sentimos, exigimos mais


tempo com nossos parceiros.
Infelizmente, as nossas emoções superficiais visíveis, frequente­
mente, enganam os nossos parceiros. Eles não sabem o que está acon­
tecendo conosco. Essas emoções também podem nos enganar. Se nos
sentimos envergonhados com a genuína emoção oculta, podemos sen­
tir alívio em expressar uma emoção alternativa. Se estamos preocupa­
dos que mostrando nossa verdadeira emoção escondida, tal como,
sentir-se sobrecarregado ou violado, pode ferir os nossos parceiros, po­
demos sentir um alívio ao demonstrar uma emoção diferente. Assim,
expressamos emoções que ficam visíveis, as quais parecem mais segu­
ras para todos, mas escondem nossas reações genuínas iniciais, as
quais parecem mais ameaçadoras para nós ou nossos parceiros. A se­
gurança que ganhamos tem um custo elevado de confusão para todos.
Vamos considerar um caso de emoções superficiais e escondidas
detalhadamente. Jacó e Avelina vão para um coquetel com os amigos dela
do trabalho. Sempre mais extrovertida do que Jacó, Avelina imediatamen­
te se envolve na festa e se diverte muito, rindo e brincando com seus co­
legas. Enquanto isso, Jacó, de forma desajeitada, tenta conversar com al­
gumas pessoas que ele não conhece bem e com quem sente que não tem
muito em comum. Ele se sente abandonado por Avelina e com inveja de
sua habilidade social e charme. Avelina observa Jacó e percebe seu descon­
forto, mas não sabe muito bem do que fazer, e fica envolvida na festa. A
caminho de casa, depois da festa, ela se sente ansiosa porque Jacó não gos­
tou da festa e tem medo de que ele possa culpá-la, mas ela não quer abrir
o “baú de lamentações” e, assim, ela diz esperançosa, simplesmente “Eu
achei que a festa foi muito divertida.” Jacó se sente extremamente vulne­
rável para compartilhar sua experiência de incômodo social e abandono,
então ele expressa desaprovação da festa e comenta “Achei chato, com
todo mundo focado no trabalho”. Então Avelina e Jacó entram numa dis­
cussão sobre se a festa foi boa ou não e o quanto as pessoas deveriam falar
de trabalho num evento social. Suas emoções genuínas permanecem es­
condidas, e assim eles estão brigando pela coisa errada, desencadeada por
suas emoções superficiais. Infelizmente, eles acabam discutindo e perdem
108 "Você sabe como me machucar"

uma oportunidade de se entender bem, o que poderia ajudá-los a lidar


melhor com a próxima festa.

UM PONTO DELICADO E SENSÍVEL

Reações emocionais fortes a diferenças ou semelhanças, sejam essas


superficiais ou ocultas, sugerem sensibilidades ou vulnerabilidades em cada
um de nós. A menos que o evento desencadeante seja um que, virtualmen­
te, todas as pessoas teriam uma forte reação emocional, a maneira como re­
agimos aponta para nossos pontos fracos pessoais. Este é especialmente o
caso quando o evento desencadeante é relativamente pequeno, algo que
possa ser facilmente ignorado. No entanto, como reação a este pequeno
evento, que, aparentemente está fora de contexto, nós explodimos emocio­
nalmente, como se houvesse algum material combustível dentro de nós, um
tipo de ‘plutônio da personalidade’, que atingiu a sua massa crítica e explo­
diu. Esses pontos sensíveis fornecem a energia emocional ou estímulo por
trás do conflito sobre nossas diferenças e semelhanças.
Embora a explosão seja uma analogia apropriada para a força de
muitas reações emocionais, a conexão entre a provocação e nossa res­
posta sugere algo mais parecido com uma reação alérgica. O que é
mais uma experiência moderadamente negativa, como uma picada de
abelha, ou um tratamento curativo, como a penicilina, ou mesmo
algo agradável, como os cheiros da primavera ou o sabor de um de­
terminado alimento, pode causar fortes reações alérgicas negativas nos
outros. Seus corpos reagem com ataques de tosse e espirros ou com
erupções cutâneas e coceira, ou muito pior. Uma reação anafilática
pode levar à morte sem intervenção médica rápida. O que é bom para
uma pessoa pode ser, verdadeiramente, terrível para outra.
Percebendo algumas de nossas reações emocionais como “aler­
gias psicológicas” é apropriado pelo menos por duas razões. O evento
provocador é inocente, ou, no máximo, ligeiramente irritante, para
muitas pessoas, enquanto que temos uma sensibilidade especial para
esse tipo de evento. Do mesmo modo, assim como a resposta exagera­
Diferenças Reconciliáveis 109

da e protetora do corpo a uma alergia pode criar dificuldade e, em al­


guns casos, ameaçar a própria vida, nossos esforços para nos defender
e proteger de alergias psicológicas podem criar dificuldades e, em al­
guns casos, ameaçar nossos relacionamentos.
No meio de uma discussão, Heitor menciona que ele e Clarice
deveriam se divorciar. Para ele, essa declaração apenas indica sua raiva na­
quele momento; ele não tem intenção de se divorciar de Clarice. Para
muitos casais, tais comentários seriam desagradáveis e poderiam ser res­
pondidos da mesma forma (“Sim, está bem, por que você simplesmente
não sai?”). No entanto, para Clarice, tal comentário é profundamente
preocupante. Sua sensibilidade ao abandono e à rejeição torna impossível
para ela descartar a observação de Heitor. Ela está magoada e assustada,
mas principalmente furiosa. Sua reação é fazer as malas e sair naquela
mesma noite. Ela se protegerá rejeitando-o. Ela vai implementar seu pla­
no antes que ele possa. Será preciso vários dias difíceis para que Heitor
possa persuadi-la a voltar atrás. Mas a forte reação de Clarice ao comentá­
rio dele, faz com que Heitor questione, genuinamente, seu casamento
muito mais do que a discussão que o levou a sugerir o divórcio.
Nossa reação nessas situações é tão intensa porque tomamos o
evento provocador muito pessoalmente. Como um míssil de busca de ca­
lor que encontra o motor de um avião, o evento aparentemente inocente
encontra nosso ponto fraco. Ele explora nossa vulnerabilidade. Encontra
o ponto fraco em nossas defesas, onde nós permanecemos expostos aber­
tamente. Ironicamente, esperamos que nossos parceiros tenham o cuida­
do de evitar essa sensibilidade, mesmo que possamos ser pegos de surpresa
por nós mesmos. Estamos ofendidos; eles são negligentes.
Por que temos essas sensibilidades emocionais? De onde elas
vêm? Embora a pesquisa psicológica indique que podemos nascer com
certas tendências, como uma tendência à ansiedade ou reatividade
emocional, normalmente requer experiências particulares de vida para
ativar essa tendência e essas experiências de vida moldam esta particu­
lar sensibilidade que teremos. Os tropeços, arranhões e feridas que ex­
perimentamos ao longo da vida deixam suas marcas. Tendo sido ma­
chucados anteriormente, estamos mais vigilantes sobre ser ferido no­
110 "Você sabe como me machucar"

vamente e podemos sentir mais dor se isto acontecer. Fomos molda­


dos pela nossa experiência para sermos sensíveis.
Naturalmente, algumas das sensibilidades emocionais que le­
vam a nossas fortes emoções ocultas e superficiais no relacionamento
provêm da experiência passada com nossos parceiros. Esta vivência
criou lesões que nos alertam para possíveis sofrimentos futuros.

SITUAÇÕES NO RELACIONAMENTO
QUE CRIAM SENSIBILIDADES

Podemos, certamente, compreender as reações que as pessoas


têm em relação a comportamentos graves de seus parceiros. Se uma
esposa trai seu marido ao ter um caso, podemos entender a sensibili­
dade do marido para questões relacionadas com fidelidade, sua ansie­
dade quando ela sai, suas suspeitas quando ela recebe um telefonema
de alguém que ele não conhece. Ou se um marido abusar fisicamente
de sua esposa, podemos entender sua ansiedade quando ela traz um
tema de desacordo, ou sua intimidação quando ele fica com raiva.
Discutiremos esses casos especiais no Capítulo 16.
No entanto, a maioria das nossas sensibilidades se desenvolve a
partir de comportamentos menos graves de nossos parceiros. Os cri­
mes do coração geralmente são contravenções. Embora os parceiros às
vezes façam coisas horríveis, o que normalmente cria conflito nos rela­
cionamentos é uma infração relativamente pequena. No entanto, estes
eventos podem criar sensibilidades que se perpetuam no futuro. Va­
mos considerar três tipos de situações:

"Você não estava lá para celebrar comigo"


Nos primeiros anos de seu casamento, Susana passou a maior
parte de seu tempo criando três filhos. Tomaz estava extremamente
envolvido em seu trabalho como arquiteto. Quando o filho mais novo
tinha 8 anos, Susana começou o curso de direito à noite; 5 anos mais
Diferenças Reconciliáveis 111

tarde ela obteve seu diploma. Ela recebeu uma proposta de emprego
num bom escritório de advocacia e queria assumir o cargo, mas To­
maz pediu-lhe para adiar por um tempo. Ele assumiu responsabilida­
des extras como sócio-chefe e precisava da ajuda dela em casa para re­
ceber seus colegas e clientes. Ela concordou. Abaixo é como ela des­
creve sua reação a essa decisão e eventos subsequentes:

“Eu estava relativamente satisfeita com a minha decisão. Eu era capaz


de ajudar Tomaz e, ao mesmo tempo, fazer interessantes trabalhos na
área do direito. Minha atividade voluntária era bem reconhecida na
comunidade jurídica. Um ano e meio depois, recebi um prêmio espe­
cial por minha contribuição para a Assistência Jurídica. Fiquei muito
feliz e aguardava com expectativa o jantar de premiação, que muitos
advogados que eu respeitava compareceríam. Mas naquela noite, eu
fiquei muito envergonhada porque Tomaz não apareceu no banquete;
a cadeira reservada para ele ao meu lado, perto do centro da mesa, fi­
cou vazia durante toda a noite. Eu fiquei ainda mais braba quando
voltei para casa naquela noite ao vê-lo assistindo televisão e ouvi-lo
dizer que ele estava cansado demais para comparecer ao jantar.
“Esse incidente trouxe questões à tona. Isto me forçou a perceber o
quanto nós dois estávamos nos distanciando. Eu me dei conta do esfor­
ço que agora me levava a perguntar a Tomaz sobre seu trabalho e como
raramente ele perguntava sobre o meu, ou mesmo escutava quando
contava a ele sobre alguma experiência. Também percebi que não havia
mais aquela chama na nossa vida sexual. Comecei realmente a ter pra­
zer com meu ‘espaço’ extra quando Tomaz estava fora viajando. Passei a
sentir-me ressentida em relação ao desequilíbrio em nossas vidas: To­
maz, no auge de sua carreira, esperando que eu continuasse fazendo sa­
crifícios enquanto me dava muito pouco em troca. Eu ficava chateada
por fazer a maior parte do trabalho doméstico e por Tomaz me tomar
por algo garantido, ressentida que, depois todos os anos em que eu ha­
via escutado suas histórias e apoiado sua carreira, Tomaz não se impor­
tava nem um pouco com a minha” (in Levinger, 1983, p. 317-318).

Esse incidente - Tomaz não ter comparecido ao jantar de pre­


miação - desencadeou uma série de eventos que acabaram levando ao
fracasso de seu casamento.
112 "Você sabe como me machucar"

“Finalmente, eu percebi que tinha tido o suficiente. Recebi outra boa


oferta de trabalho e decidi assumi-la sem consultar Tomaz. Também
lhe disse que eu estava pensando em me separar dele. Quando eu lhe
falei, ele ficou atordoado. Disse que eu era a pessoa mais importante
em sua vida e perguntou o que ele poderia fazer para ficar comigo. Fi­
quei tão chocada com a sua insensibilidade que desabafei: ‘Nada. Não
há nada que você possa fazer para que eu fique, pois você não conse­
gue nem perceber o quão infeliz eu estive.’
“Depois de me mudar para meu próprio apartamento, comecei a me
sentir muito melhor fisicamente. As dores de cabeça e dores nas costas
que eu tinha acabaram, e me senti bem em estar sozinha. Ao mesmo
tempo, eu me senti mal pela separação e por nossos filhos. As vezes me
preocupo com meu futuro sozinha. Mas acho que tomei a decisão cer­
ta” (in Levinger, 1983, p.318).

Quando sondado após a separação, Tomaz revelou que no dia


do jantar havia perdido uma disputa importante para um grande con­
trato de design, mas insistiu na época que a única razão pela qual ele
tinha faltado ao jantar era que ele estava cansado. Ele não parecia en­
tender que sua ausência tinha ferido Susana ou que ele poderia ter se
sentido ameaçado por um prêmio para ela num dia de fracasso para
ele. Susana tamém ficou incrédula com a ideia de que Tomaz pudesse
se sentir ameaçado por seu sucesso. Ela via Tomaz como estando tão à
frente dela profissionalmente, sendo ele invulnerável.
Esta história real ilustra de forma dramática como os problemas
de relacionamento e, neste caso, a dissolução de um relacionamento —
são criados quando um parceiro não consegue se abrir para outro.
Esse erro em não estar presente quando o outro conta com isto, causa
vergonha e humilhação e faz com que ele ou ela não se sinta impor­
tante. Nossa história também ilustra como os parceiros podem ter
uma compreensão limitada de suas próprias sensibilidades e emoções
ocultas ou as de seu parceiro, a falta de conhecimento lhes permite
atribuir o comportamento do outro aos piores instintos. Tomaz não
tinha a menor ideia de quão importante era esse jantar de reconheci­
mento para Susana; ela, por sua vez, não imaginava que ele pudesse se
sentir ameaçado pelo seu sucesso.
Diferenças Reconciliáveis 113

Você não estava lá para me apoiar quando eu mais precisei"


E mais provável que precisemos de nossos parceiros durante
momentos de desespero do que durante momentos de glória. Quando
estamos ameaçados por doença, enfrentando a morte de um ente que­
rido ou lidando com um fracasso, nos sentimos mais vulneráveis e
precisamos da ajuda e do apoio de nossos parceiros. Nesses momentos
de crise podemos precisar de suas ações heróicas. O fracasso deles em
estar lá para nós pode nos deixar profundamente feridos e inconsola-
velmente brabos. A experiência pode gravar uma memória que não
será apagada facilmente.
Vanessa teve dores no peito numa noite quando Adélia estava
numa viagem de negócios. Quando Vanessa ligou para Adélia às 3:00
da manhã e falou sobre suas dores, Adélia encorajou-a a ir para uma
emergência, mas assegurou-lhe que a dor era, provavelmente, devido ao
estresse ou possivelmente apenas algo emocional. Lembrando-lhe que
ela, muitas vezes, tinha várias dores, Adélia disse: “Não deixe sua hipo-
condria tomar conta.” Vanessa entendeu a maneira de Adélia de tentar
tranquilizá-la, como ataques velados e afirmou que nunca tinha acorda­
do no meio da noite com dores no peito e nunca havia falado para Adé­
lia sobre isso. Quando desligaram o telefone, Vanessa não tinha certeza
se estava mais chateada com Adélia ou com a ameaça à sua saúde. Im-
pulsivamente, pediu uma ambulância para que alguém levasse a sério
suas dores que a assustavam tanto. Afinal, seu pai morreu de um ataque
cardíaco aos 59 anos. Na ambulância e na sala de emergência, Vanessa
ficou impressionada com a ironia de seus sentimentos: esperando, por
um lado, que suas dores não fossem nada e, por outro, que houvesse
algo errado com ela para que ela pudesse justificar seu chamado para a
emergência e confirmar seu mal estar para Adélia. Ela obteve um pouco
de ambos: os médicos encontraram algumas irregularidades em seu ba­
timento cardíaco que exigiram acompanhamento, mas nenhuma evi­
dência de um ataque cardíaco. Agora Vanessa se sentia justificada em fi­
car furiosa com Adélia: esta não estava lá para ela quando Vanessa real­
mente precisava, quando algo realmente estava errado.
114 "Você sabe como me machucar"

Quando a mãe de Mara morreu, Walter decidiu não ir ao fune­


ral. Ele tinha uma importante reunião de negócios naquele dia que
poderia levar a um grande contrato novo. Explicou a Mara que nunca
havia se dado bem com a sogra, então ir ao funeral seria uma espécie
de hipocrisia. Além disso, odiava funerais. Mara ficou surpresa e ma­
chucada por sua decisão, mas não conseguiu argumentar com ele. A
decisão de Walter de não ir ao funeral foi apenas outra decepção que
se misturou com todo o resto, e foi só no funeral que ela percebeu
claramente que precisava dele lá para ela. Quaisquer que fossem os
sentimentos de Walter em relação à mãe, eram os sentimentos dela
que importavam agora. Ela ficou profundamente ferida por sua au­
sência neste momento difícil para ela.

"Nenhuma coisa grande, mas mil coisas pequenas"


Podemos entender, e talvez desculpar, reações poderosas e dramá­
ticas para eventos intensos, como não aparecer em um jantar de honra
ou um funeral. Felizmente, tais eventos no casamento são raros. Mais
comuns são diferenças diárias, injustiças comuns e desrespeitos rotinei­
ros que nos ferem e nos irritam. Ele não corresponde quando ela pega a
mão dele. Ela mostra pouco interesse quando ele fala sobre seu dia. Seus
beijos parecem superficiais. Ela parece entediada com suas histórias.
Às vezes não manifestamos nenhuma reação explicitamente.
Surpreendidos pela intensidade da nossa resposta, tentamos nos con­
vencer de que estamos exagerando e acabamos sofrendo essas dores
em silêncio. Outras vezes, porém, reagimos fortemente. Fazemos co­
mentários sarcásticos: “Eu não percebi que eu era tão chato para
você.” Acusamos: “Você não se importa comigo, nem sequer pode
chegar perto de mim para me tocar”. Fazemos sugestões de ataque:
“Talvez você deva encontrar alguém que atraia seu interesse melhor
do que eu.” Nós batemos a porta repentinamente: “Eu não quero es­
tar na presença de alguém que não tem interesse ou amor por mim.”
Quando reagimos fortemente, nossos parceiros provavelmente
responderão da mesma maneira, defensivamente ou ofensivamente: “E
Diferenças Reconciliáveis 115

um crime bocejar?” “Olha, eu estou cansada esta noite.” “Nós não so­
mos pombinhos apaixonados.” “Lá vem você outra vez!” “Você é tão
exigente.” “Você não consegue ficar sem ser o centro das atenções.”
Por que tais ações, aparentemente pequenas, podem provocar
reações tão fortes? Isto pode ser explicado por nossa história. Um pa­
drão crônico de negligência diária, no qual cada incidente pode ser
explicado facilmente, pode, eventualmente, criar poderosas reações de
mágoa e raiva. No romance de John Updike S., Sarah Worth deixa
seu marido de mais de duas décadas, que é médico, não por causa de
quaisquer ações graves de sua parte, mas por causa de suas “atrocida­
des educadas de frieza e cegueira em relação a mim”. Em uma carta
para ele, ela descreve os “quase vinte e dois anos de crueldade mental
e emocional que você com sua frieza antisséptica infligiu em mim.”
Em uma carta dirigida à filha adulta, ela tenta justificar sua partida:
“Bem, recentemente fiz uma experiência. Não contei coisa alguma a
seu pai sobre o meu dia. E ele nunca, me perguntou. Nem uma vez, dia
após dia, fazendo força pra ficar calada - ele não percebeu absoluta­
mente nada. Então ficou claro. Estou tão fora de suas percepções, que
eu poderia estar ausente de fato.” Uma longa história de negligência -
de atos desatentos, cada um pequeno e facilmente descartado se con­
siderado isoladamente, mas poderosos em sua totalidade - levou Sa­
rah a deixar seu marido e a vida material luxuosa que eles tinham.

SENSIBILIDADES QUE SE ORIGINAM


EM RELACIONAMENTOS ANTERIORES

Embora possamos nos tornar sensíveis a situações que geram


certas emoções que resultam da maneira como nossos parceiros nos
trataram, mais frequentemente entramos nessas relações com sensibi­
lidades que foram geradas em relacionamentos prévios que tivemos
com nossos pais, nossos pares ou nossos relacionamentos românticos
anteriores. Nossos parceiros fazem algo relativamente trivial, mas isto
tem um impacto significativo sobre nós por causa dos nervos à flor da
116 "Você sabe como me machucar"

pele que foram expostos em encontros anteriores com outras pessoas.


Embora os parceiros, às vezes, ajam de maneira cruel, a maioria dos
eventos que criam conflitos nos relacionamentos são infrações relati­
vamente pequenas. Como já observamos anteriormente, os crimes do
coração são geralmente delitos menores. No entanto, nossa reação
pode ser intensa porque a infração tocou em uma sensibilidade.
A seguir descrevemos uma série de sensibilidades que são co­
muns nas pessoas, o que pode ajudar a explicar suas reações fortes,
suas alergias psicológicas ao comportamento aparentemente insignifi­
cante de seus parceiros. Essas sensibilidades ocorrem em torno de te­
mas universais de segurança, liberdade, admiração, aprovação e con­
trole. Descrevemos essas sensibilidades e possíveis razões para seu de­
senvolvimento nas relações anteriores.

"Nunca me deixe"
Em comparação com os animais, nós, seres humanos, temos
um período excepcionalmente longo de dependência de nossos pais.
Nós nascemos totalmente dependentes, incapazes até de nos virar ou
levantar a cabeça. Mesmo depois de um ano, mal conseguimos cami­
nhar ou nos alimentar sozinhos. Demora quase duas décadas antes de
sermos reconhecidos pela sociedade como adultos capazes de lidar
com nossos próprios assuntos.
Os psicólogos do desenvolvimento estudaram o apego dos be­
bês ao cuidador primário - geralmente a mãe (Bowlby, 1969) Porque
a sobrevivência física dos bebês, bem como seu bem-estar emocional,
depende de seu cuidador, e eles têm uma reação automática à separa­
ção dela. Eles não deixam passar se ela os deixa sozinhos, particular­
mente em um lugar desconhecido. Eles a usam como uma base segura
para explorar o mundo; se algo assustador lhes acontece, eles correm
de volta para seus braços. Os psicólogos especulam que, se o cuidador
é uma pessoa atenta à angústia da criança, se ele lida com a separação
sensivelmente para que o bebê esteja familiarizado com seu novo am­
biente e novos cuidadores antes de sair, então a criança desenvolve
Diferenças Reconciliáveis 117

"apegos seguros”. A criança aprende que os outros podem ser confiá­


veis, que estarão lá quando necessário, que o abandono não é uma
possibilidade.
Por outro lado, se o cuidador não responde à aflição da criança,
se não trata a separação de forma atenta e, especialmente, se a estiver
rejeitando, o bebê não desenvolverá um apego seguro. A criança não
vai aprender que os outros podem ser confiáveis, que os outros estarão
lá para ela, porque, de fato, os cuidadores não estavam disponíveis
emocionalmente. Alguma predisposição genética pode amplificar es­
sas experiências angustiantes para a criança.
Os psicólogos tendem a dar mais peso às primeiras experiências
do que as posteriores, porque são exatamente as primeiras que são o
fundamento da aprendizagem em que a criança constrói seu modelo
de como o mundo é. No entanto, experiências posteriores certamente
modificam as anteriores. Os bebês que conviveram com cuidadores
inadequados no início podem, mais tarde, ser cuidados por pessoas
mais confiáveis e aprender a sentir maior segurança. Infelizmente, as
primeiras experiências tendem a prever as futuras. As crianças não têm
o luxo de “trocar” seus cuidadores. Muitas vezes aquele que era negli­
gente e rejeitou a criança quando esta era pequena, continua com ela
rejeitando-a e negligenciando-a ao longo de sua infância.
Se você vem de uma história de cuidados que não inspiraram
confiança e segurança, e teve, talvez, uma predisposição genética que
ampliou essas experiências infelizes, você pode ser um adulto com
uma vulnerabilidade a sinais de abandono ou rejeição. Afastamentos
de seu parceiro podem ser difíceis para você. A simples viagem de ne­
gócios que leva o seu parceiro para outro estado durante uma semana
pode lhe parecer ser ameaçadora. Os reencontros podem ser mescla­
dos com raiva: “Em primeiro lugar, por que você me deixou?” Você
pode ser especialmente sensível a sinais de amor ou comprometimen­
to. A preocupação temporária de seu parceiro com outros assuntos
pode lhe parecer uma mensagem de rejeição. Você pode sentir como
abandono se seu parceiro deseja ter um tempo sozinho ou com ami­
gos. Você pode ter um radar requintado que detecta o menor interesse
118 "Você sabe como me machucar"

de seu parceiro em rivais em potencial. O flerte suave de seu parceiro


ou olhar de canto para uma pessoa atraente pode lhe parecer uma trai­
ção. Seu parceiro, infelizmente, não teve a mesma história que você e
fica confuso com sua atitude.

"Socorro, estou encurralado"


O problema com o casamento é que há
pouca lua de mel e muita trava.
Christopher Morley

Uma vulnerabilidade aos sentimentos de aprisionamento, como


uma vulnerabilidade aos sentimentos de abandono, torna o amor algo
temível, mas por razões muito diferentes. Aqueles com uma sensibili­
dade ao aprisionamento estão em guarda para os sinais de que seus
parceiros possam sufocar, oprimir ou invadir sua vida.
Esse padrão de vulnerabilidade também pode começar cedo na
vida. Talvez você teve pais que lhe cobriram de amor, mas os abraços e
beijos e expressões amorosas foram devido às necessidades deles, e não
pelas suas. Então, você, muitas vezes, teve abraços e beijos, quer você
quisesse ou não. E se você resistisse, talvez recebesse mensagens que o
fizessem se sentir culpado, como se você não amasse seus pais ou não
fosse uma criança boa e grata. Talvez a reciprocidade do amor fosse
exigida. Assim, suas primeiras experiências mostraram que o amor
tem garras. A intimidade com outro é uma experiência necessária,
mas preocupante.
Além de suas próprias experiências de infância, você pode ter
desenvolvido ou aumentado sua sensibilidade ao aprisionamento por
meio de seus relacionamentos românticos adultos. Através de uma
combinação de acaso e da forma como aconteceu, você teve um par­
ceiro que se intrometeu em seu espaço, exigiu seu amor, dominou
com seus sentimentos e fez comentários indutores de culpa sobre sua
incapacidade de corresponder. A intimidade com o outro levanta si­
nais de perigo mesmo que lhe dê amor e apoio. A proximidade pare­
Diferenças Reconeiliáveis 119

cia oferecer uma prisão luxuosamente decorada, correntes de ouro,


um caixão de veludo.
O amor levanta consistentemente a pergunta: “Quanto de mim
eu tenho que abrir mão para estar com você?”

"Eu sou alguém"


Sinto-me como um ninguém para todo mundo.
Quero ser alguém para alguém.

Como crianças, procuramos o reconhecimento de nossos pais.


Nós buscamos esperançosos ouvir “Boa menina!” e o “Que menino!”
por nossos feitos. Queremos atenção para o que desenhamos, aplausos
pelos gols que fazemos, risos pelas piadas que contamos e elogios pelas
notas que tiramos. Embora a maioria dos pais dê naturalmente este
tipo de reconhecimento aos seus filhos, alguns podem estar tão preo­
cupados com suas próprias vidas que seu filho recebe pouca atenção.
Estes pais podem achar irritante e inconvenientes as tentativas de seus
filhos de chamar atenção. Como resultado, as crianças obtêm pouca
evidência concreta de que suas conquistas realmente importam a qual­
quer um. Não fica claro que eles são especiais aos olhos de alguém.
A presença de mais de uma criança na família complica o re­
conhecimento dos filhos. A atenção dos pais, elogios e aplausos devem
ser compartilhados. As crianças competem inevitavelmente por este
reconhecimento parental. Mas muitas vezes o jogo é desigual. Um fi­
lho pode ser mais verbal ou mais esportivo ou mais humorístico ou
mais social ou mais fisicamente atraente do que o outro e, portanto,
pode ter uma vantagem incorporada para o reconhecimento. Os pais
podem favorecer um dos filhos em particular, porque este se parece ou
age como eles ou tem alguma característica atraente que eles valori­
zam. Como resultado, os pais nunca vão aplicar exatamente igual dose
de reconhecimento a seus filhos. Em algumas famílias, as desigualda­
des podem ser óbvias e dramáticas.
Pouco reconhecimento dos pais na infância, ou pouca valoriza­
ção em relação a um irmão, pode sensibilizá-lo para questões de reco­
120 "Você sabe como me machucar'

nhecimento em relacionamentos adultos. Se a sua experiência durante


a infância foi que outros na família estavam recebendo um excesso de
atenção injusta, você pode ficar armado para ver se o mesmo não
acontece em seu casamento. O oposto é verdadeiro também: uma
overdose da atenção e valorização na infância pode fazer com que você
espere um excesso de atenção e reconhecimento na idade adulta.
A sensibilidade ao reconhecimento pode surgir das relações
adultas, bem como das da infância. Se você esteve com parceiros ne­
gligentes, que não gostavam de elogiar, você já fica armado e toma
como desprezo pessoal. Se o seu parceiro monopolizava a atenção,
você se sentia ferido e com inveja. Se o seu parceiro parecia valorizar
as suas próprias realizações e menosprezar as suas, você pode ter senti­
do como uma competição.
Quaisquer que sejam as origens, alguns de nós serão sensíveis
ao reconhecimento nos relacionamentos. Podemos nos sentir magoa­
dos se nossos parceiros não ficarem entusiasmados com nossos suces­
sos ou colocar em evidência nossos fracassos. Podemos precisar de
nossos parceiros como torcedores para o que quer que consigamos.
Gostaríamos de ser levados em consideração e admirados por nossas
realizações. Queremos que nossos parceiros escutem nossas histórias
sobre o que fizemos e sobre a maneira inteligente como o fizemos.
Buscamos admiração tanto quanto o amor de nossos parceiros, por­
que a admiração parece a evidência mais tangível do amor. Quando
não recebemos, buscamos mudanças em nossos parceiros, um pedido
que pode parecer uma imposição significativa para eles.

"Diga-me que sou legal"


Carl Rogers, um dos primeiros gigantes da psicoterapia, contou
uma história sobre uma menina na pré-escola com quem ele havia tra­
balhado. Para iniciar uma conversa com ela, perguntou qual era seu
nome. Ela respondeu: “Alice Não.” Rogers supôs que lhe tinham dito
“Alice, não!” tantas vezes que ela tinha incorporado essa advertência
parental não só em seu autoconceito, mas em seu próprio nome.
Diferenças Reconciliáveis 121

Um dos principais ensinamentos da teoria de desenvolvi­


mento da personalidade de Rogers foi que as crianças precisam de
validação e aprovação de seus pais. Eles precisam de mensagens
que eles são crianças legais. De acordo com Rogers, se eles rece­
bem muitas mensagens de que eles não são bons, ou se eles têm
que fazer tudo certo para obter aprovação, então seu desenvolvi­
mento será prejudicado.
Quaisquer que sejam os méritos da teoria de Rogers, experiên­
cias de aprovação e desaprovação com nossos pais no início da vida
e em outros relacionamentos mais íntimos futuros, provavelmente
afetarão nossas preocupações em sermos aprovados em nossos rela­
cionamentos românticos adultos. Aqueles de nós preocupados com
aprovação, possivelmente, buscaremos mensagens tranquilizadoras
dos parceiros quanto a ter feito ou dito a coisa certa. Podemos ter
dificuldade em tomar atitudes sem a aprovação dos nossos parceiros.
Podemos nos sentir contrariados se eles não apoiarem nossas ações
ou se eles ficarem irritados com nossa pressão para que expressem
aprovação. Podemos também confundir discordância legítima com
desaprovação. Se nossos parceiros discordam de nossas opiniões ou
nossas atitudes, podemos experimentar tal desacordo como desapro­
vação de nós mesmos.
Se você é vulnerável ao receber a aprovação de outros, você
pode ser especialmente sensível à crítica. Para você, a crítica repre­
senta desaprovação óbvia. Você talvez tenha tudo à flor da pele.
Você pode sentir a crítica implícita mesmo em uma observação inó­
cua. Se o seu parceiro suspira e diz: “Bem, é melhor eu lavar a louça
agora”, você pode ouvir com a conotação de “Você já deveria ter la­
vado.” Se o seu parceiro manifesta frustração porque tem muito a
fazer, você talvez escute como uma sugestão de que você deveria ter
feito mais. Sua antena está sintonizada com a frequência da crítica,
e você pode pegar até o sinal mais fraco. No entanto, se você res­
ponder a uma crítica verbal com uma pergunta como “Por que você
tem que dizer isso?” você pode suscitar ainda outra crítica de “Por
que você é tão sensível?”
122 "Você sabe como me machucar"

"Eu estou no comando"


Um casal mais velho com quem trabalhei descreveu o seguinte
incidente. O marido havia recentemente se aposentado de seu traba­
lho de cerca de 30 anos e estava tendo dificuldade em encontrar ativi­
dades diárias para se manter ocupado e interessado. Um dia, no final
da manhã, ele ficou andando pela cozinha e começou a preparar um
sanduíche de manteiga de amendoim. Sua esposa percebeu o que ele
estava fazendo, correu para a cozinha, e mandou-o para fora. Ainda
não era tempo para o almoço, que ela já tinha planejado. Além disso,
se ele estava com fome agora, ela iria providenciar alguma coisa para
ele. Mas, acima de tudo, ele deveria sair de sua cozinha!
O marido ficou um pouco aturdido pela força de sua resposta.
Afinal, ele estava apenas tentando fazer um simples sanduíche. Ele,
certamente, não estava tentando assumir a preparação de alimentos
em geral ou sua cozinha em particular. No entanto, ela viu na atitude
dele uma incursão no território que ela tinha controlado toda a sua
vida conjugal. Ela também estava ansiosa pela dificuldade dele em en­
contrar uma atividade de aposentadoria significativa e esperava que
ele encontrasse algo em breve, mas não as atividades que eram dela.
Ele podia ter perdido o seu território por causa da aposentadoria, mas
ele não tinha assumir o dela.
Questões em torno de controle vêm de vez em quando para to­
dos nós, especialmente quando uma área de controle que prezamos
parece ameaçada. No entanto, alguns de nós podemos ser especial­
mente sensíveis em relação a poder e controle. Podemos nos sentir
ameaçados mesmo quando o desafio ao nosso controle parece menos
óbvio. Nós não queremos parecer fracos ou sob o domínio de outra
pessoa, particularmente o de nosso cônjuge. Nossas ansiedades sobre a
vida são aliviadas sempre que estamos no controle, mas reacendem
toda vez que outros tomam o comando. Queremos estar no banco do
motorista, literal e figurativamente. Se os nossos parceiros expressam
uma opinião forte, podemos sentir que estão tentando assumir o po­
der. Se eles afirmam seus direitos, podemos ver a imposição como
uma tentativa de diminuir os nossos. Delegar o trabalho a outros
Diferenças Reconciliáveis 123

pode ser difícil porque tememos que eles não o façam como faríamos
- na verdade, muitas vezes não o fazem.
No processo de criação de filhos, os pais devem constantemente
tomar decisões sobre quanto controle manter e quanto ceder. É fun­
ção dos pais proteger seus filhos, tanto física como psicologicamente.
Portanto, eles devem limitar a independência dos filhos até que estes
possam gerenciar situações particulares por conta própria. Quando e
em que situações as crianças pequenas podem brincar ou tomar ba­
nho sozinhas? Quando você pode deixar as crianças caminhar pela a
loja por si só? Quando é que se pode permitir um adolescente pegar o
carro da família para sair à noite?
Mesmo crianças pequenas querem controle. Elas querem as coisas
à sua maneira. Elas querem fazer as coisas sozinhas. Alguma medida
adequada de controle é, certamente, necessária para seu bem-estar e de­
senvolvimento apropriado. É claramente importante para sua satisfação.
Uma vez minha esposa e eu permitimos que nosso filho pequeno tivesse
o controle dos chocolates M & M que compramos para a família. Asse­
guramos a ele que poderia ser o “chefe dos M & Ms.” Ele se encheu de
orgulho por ter propriedade e poder. Cuidadosamente e prudentemen­
te, ele distribuiu os chocolates para os pais e sua irmã. Depois desse
acontecimento, ele ocasionalmente perguntava: “Posso ser o chefe de
...?” Ele queria reexperimentar o poder de ter controle.
Dada a luta entre os pais, que devem proteger seus filhos ao
exercer controle sobre seu comportamento, e as crianças que querem
independência e controle para si, não é de surpreender que algumas
pessoas possam emergir desta luta com uma certa sensibilidade sobre
controle. Talvez pais superprotetores exerceram controle excessivo que
gerou raiva e rebeldia. Talvez pais permissivos fracassaram em exercer
controle, então a criança se acostumou à pouca responsabilidade e
máxima independência. Experiências como essas podem levar alguém
a exercer controle sobre um parceiro ou a temer e rebelar-se contra
esse controle de um parceiro.
Conforme observado anteriormente, esta lista de vulnerabilida-
des psicológicas destina-se simplesmente a ilustrar os tipos de sensibi­
124 "Você sabe como me machucar"

lidades que as pessoas podem trazer ou desenvolver em seus relaciona­


mentos. A lista certamente não pretende ser exaustiva. Tampouco as
categorias se excluem mutuamente. E possível que alguém tenha sen­
sibilidades em mais de uma área. Além disso, há muitas outras sensi­
bilidades específicas que podem incomodar os parceiros nos relaciona­
mentos. Por exemplo, um dos cônjuges pode se sentir envergonhado
com a pouca educação formal que teve, outro pode ser sensível sobre
sua perda de cabelo, outro sobre seu peso e outro sobre o quão mal
seus filhos têm ido na escola.
E impossível passar pela vida sem se tornar sensível a certas ques­
tões. Pessoas que nunca reagiram exageradamente ou nem reagiram a
qualquer evento, que tomaram as vicissitudes da vida numa boa e segui­
ram em frente, e tiverem somente reações que tinham sentido lógico e
pareceram convencionalmente apropriadas, são estranhas para todos nós
que devemos lutar diariamente com os “desígneos do destino”. E esses au­
tômatos provavelmente não seriam muito solidários com nossas lutas.

MANUSEIE COM CUIDADO

As melhores qualidades da nossa natureza, como a flor


nos frutos, só podem ser preservadas pela manipulação
mais delicada.
Henry David Thoreau, Walden (1854)

Em nossas áreas de vulnerabilidade estaremos especialmente


atentos à forma como somos tratados. Nossos sentimentos estão pró­
ximos da superfície e facilmente perturbados. Portanto, estamos vigi­
lantes, para que esses sentimentos não sejam detonados.
Um estudo fascinante por Dartmouth College pesquisadores
Robert Kleck e Ângelo Strenta ilustra como podemos ser hipersensí-
veis ao comportamento dos outros quando nos sentimos vulneráveis.
Eles disseram a um grupo de mulheres que estavam interessadas em
estudar como outras mulheres reagiriam se fossem desfiguradas por
uma cicatriz facial. Com a permissão das mulheres, eles usaram maquia­
Diferenças Reconeiliáveis 125

gem teatral para criar uma cicatriz de aparência autêntica. Em seguida,


eles fizeram as mulheres examinar a cicatriz com um espelho de mão
para que pudessem ver quão autêntica a cicatriz pareceu. Depois que as
mulheres tinham terminado de examinar a cicatriz, o pesquisador apli­
cou um “hidratante” para “manter a maquiagem.” Na verdade, o cha­
mado hidratante realmente removeu a cicatriz, mas sem o conhecimen­
to das mulheres. Então cada uma dessas mulheres, pensando que estava
mostrando uma cicatriz desfigurante, conversou com outra mulher que
não viu o desfiguramento e não tinha ideia do que tinha acontecido an­
tes. As conversas eram comoventes. Pensando que pareciam horríveis,
essas “mulheres com cicatrizes” estavam muito inseguras. Em compara­
ção com um grupo controle de mulheres, que foram levadas a acreditar
que suas parceiras de conversação simplesmente pensavam que tinham
uma alergia, as “mulheres com cicatrizes” classificaram suas parceiras
como mais tensas, distantes e paternalistas. Observadores neutros que
assistiram as fitas de vídeo dessas interações não puderam ver nenhuma
diferença entre como as “mulheres com cicatrizes” e as “mulheres alérgi­
cas” foram tratadas. Claramente uma sensibilidade sobre a cicatriz fez
com que essas mulheres interpretassem o comportamento de suas par­
ceiras de conversação de forma diferente.
Algo semelhante ao que aconteceu neste experimento pode
ocorrer com vulnerabilidades psicológicas. Uma maior sensibilida­
de pode nos levar a interpretar mal a resposta de nossos parceiros
ou a falta de resposta para nós. Se, por exemplo, um marido é sen­
sível sobre o interesse e a atenção que sua esposa dá a suas realiza­
ções, pode reagir irritado se ela não lhe perguntar sobre sua entre­
vista de trabalho assim que chega a casa. Ela pode responder hones­
tamente, embora defensivamente, que ela estava ao mesmo tempo
atenta e preocupada com sua entrevista, mas dada a sua frustrante
volta para casa do trabalho, ela não estava naquele exato momento
pensando em sua entrevista de emprego. Uma briga poderia facil­
mente resultar em que ele afirma que ela realmente não se preocupa
com seus esforços para encontrar um emprego melhor e ela alega
que ele é muito sensível.
126 "Você sabe como me machucar"

Quando somos sensíveis sobre alguma questão, queremos ser


tratados com cuidado. Nossos sentimentos frágeis precisam ser amor­
tecidos dos solavancos e pancadas. Esperamos que aqueles que nos
amam nos tratem com consideração especial.
Nossos parceiros podem achar que estamos pedindo demais. Eles po­
dem recorrer a uma argumentação justa: “Eu não pedi para você me tratar
dessa maneira.” Eles podem listar exemplos em que não fomos tão sensíveis
e eles não ficaram chateados. A esposa que esqueceu de perguntar sobre a
entrevista de emprego do marido pode cobrar, corretamente, que ele muitas
vezes se esqueceu de perguntar sobre eventos importantes em seu emprego
e, certamente, não o fez imediatamente após a sua entrada em casa. Tais re­
ações, embora compreensíveis, não reconhecem que uma pessoa é sensível
em uma área particular enquanto a outra não. É um pouco como alguém
com um tornozelo normal dizendo a alguém com uma entorse no tornoze­
lo: “Eu não tenho que mancar. Por que você deveria?”

QUANDO AS VULNERABILIDADES SE CHOCAM

Lidar com áreas sensíveis pode ser desafiador sob as melhores


circunstâncias. Podemos nos sentir sobrecarregados com as exigências
de lidar com os sentimentos dos nossos parceiros com tal cuidado. Po­
demos nos sentir como pais lidando com uma criança imatura. Pode­
mos temer que, ao nos adaptarmos a eles, suas exigências aumentarão
e então nós, assim como eles, nos tornaremos escravos das suas sensi­
bilidades. Por exemplo, a esposa que foi repreendida por seu marido
por não ter perguntado sobre sua entrevista pode temer que, se ela fi­
zer um esforço para lhe mostrar atenção extra, as necessidades dele de
especial atenção aumentarão, e suas demandas de resposta imediata se
tornarão insaciáveis. No entanto, muitas vezes o cuidado especial que
podemos dar aos nossos parceiros pode suavizar suas vulnerabilidades
e torná-los mais receptivos. Podem se tornar mais generosos conosco
porque se sentem cuidados e querem retribuir. Sua sensibilidade pode,
paradoxalmente, ser menos um problema para eles do que para nós.
Diferenças Reconciliáveis 127

Tão desafiador como é lidar com a área de vulnerabilidade de


um parceiro quando estamos indo bem, torna-se ainda mais terrível
quando nossas próprias sensibilidades entram em jogo. Se um inci­
dente ou questão particular tocar em ambas nossas sensibilidades,
então o conflito é susceptível de acontecer. Considere, por exemplo,
uma esposa, Sylvia, que é sensível em relação a abandono (“Nunca
me deixe”) e seu marido, Geraldo, que é sensível em relação a apri-
sionamento (“Socorro, estou encurralado”). Se cada uma de suas sen­
sibilidades for suscitada pelo mesmo incidente, o conflito provavel­
mente acontecerá. Vamos dizer que as circunstâncias estressantes de
sua vida no trabalho e com Sylvia fizeram Gustavo sentir um forte
desejo de ter espaço, de ficar longe de Sylvia para que ele possa se
acalmar, enquanto que circunstâncias estressantes semelhantes des­
pertaram medo em Sylvia de que seu relacionamento estaria se des­
manchando. Ela precisa ser reassegurada de sua intimidade com Ge­
raldo. Quando Geraldo a informa que ele está planejando passar o
fim de semana fazendo trilhas com seu melhor amigo, ela pode ex­
plodir: “Como você pode sair quando as coisas estão tão ruins entre
nós?” Ele responde: “E exatamente por isso que eu quero ir embo-
ra.” E uma batalha se segue.
Considere um segundo exemplo, mas em que os parceiros
compartilham a mesma sensibilidade. Clayton e Carmen são con­
frontados com uma mudança de estado que deve ser concluída até o
final do mês para que eles possam começar seus novos empregos.
Ambos estão ansiosos sobre se conseguirão realizar tudo o que preci­
sam fazer nesse período de tempo. Clayton, em particular, teme que
os móveis que ele herdou de seus pais possam ficar danificados du­
rante a mudança. Carmen está especialmente preocupada com os ar­
quivos de seu escritório em casa, se vão se perder ou se desorganizar.
Ambos lidam assumindo a responsabilidade, exercendo o controle.
iMas é um comando dividido. Eles discutem sobre qual empresa de
mudança escolher, sobre quem deve fazer o quê, e sobre o motivo
do outro estar sendo tão resistente. O estresse de sua comunicação é
tão ruim quanto o estresse de sua mudança.
128 "Você sabe como me machucar'

PROVOCAÇÃO OU VULNERABILIDADE?

Entre os casos óbvios de ação provocadora que perturbarão a maio­


ria de nós e os casos óbvios de alergias psicológicas em que só os que têm
uma sensibilidade particular ficariam irritados, há um território vasto e
sem fronteiras de ações moderadamente provocantes e vulnerabilidades
bem afinadas. Qual é a causa mais importante da dor e da raiva: a atitude
moderadamente provocativa ou a vulnerabilidade reativa?
Casais, com frequência, brigam sobre esta questão do “conflito
ação-reação.” Você culpa o seu parceiro por um determinado comporta­
mento que provocou um conflito, mas seu parceiro sugere que foi a sua
reação, e não a atitude dele, que foi o problema. Por exemplo, você acusa
seu parceiro de ser “crítico demais”, e ele responde que você é “hipersensí-
vel”. Ou sua parceira acusa você de não ser afetuoso e você responde que
ela é “muito insegura”. Quando um de vocês reclama do outro por ser
descortês, o acusado responde que o acusador é “muito rígido”.
Quem está certo?
Ambos estão. Para um problema interpessoal ocorrer, um par­
ceiro deve fazer algo, ou não fazer nada, que têm o potencial de con­
flito. Mas o outro deve ter alguma susceptibilidade exposta o suficien­
te para reagir. Sem uma ação provocativa (ou não ação), não haveria
problema. No entanto, mesmo se houvesse um ato covarde, se não ti­
vesse nenhuma vulnerabilidade, isto poderia passar naturalmente e
nenhum problema iria ocorrer.
Joana faz uma crítica a Vicente, e com esta afirmação poderia
ser interpretada como uma pessoa crítica. Ela poderia criticá-lo, ob­
viamente em tom irritado, dizendo “Você não faz a sua parte do tra­
balho em casa.” Ou ela poderia dizer algo mais inocente, como “Eu
tenho que limpar toda bagunça que os meninos fizeram”, o que traz a
ideia de que Vicente deveria ter arrumado as coisas. Mas sua coloca­
ção por si só, mesmo obviamente sendo uma crítica, não é suficiente
para Vicente se sentir criticado. Ele poderia responder a isto, não aju­
dar em casa, como se Joana estivesse chateada e simplesmente “soltan­
do fogo pelas ventas.” Vicente pode perceber o comentário dela como
Diferenças Reconeiliáveis 129

"Ela não está realmente me atacando, mas simplesmente expressando


sua frustração”. Ou Vicente poderia concordar que ele, de fato, não
ajuda o suficiente em casa e que ela está apenas afirmando, embora
duramente, o que ambos sabem que é verdade. “Ela está simplesmen­
te apontando uma característica minha,” Vicente diz a si mesmo, “que
eu não passo tempo suficiente fazendo tarefas domésticas e as deixo
para Joana. E ela está realmente frustrada com isso agora.” Ele poderia
até mesmo concordar abertamente com ela e validar sua visão sobre
ele. Se Vicente respondesse de qualquer destas maneiras, poderiamos
dizer que a crítica nem sequer ocorreu entre eles. Pelo menos, o co­
mentário crítico não criou um problema interpessoal.
Se, no entanto, Vicente fosse susceptível em relação à apro­
vação de Joana, ou se o quanto ele a ajuda em casa fosse um tema
delicado para ele, Vicente iria responder de forma muito diferente.
Ele poderia se defender listando todas as coisas que faz em casa ou
descrevendo todas as suas outras responsabilidades. Poderia contra-
atacá-la por tudo o que ela não faz em casa. Mesmo se Joana fizesse
o comentário mais inocente que “eu tenho que limpar toda bagun­
ça que os meninos fizeram”, Vicente poderia responder de forma
defensiva e contra-atacar. Se ele respondesse dessa forma, saberia­
mos que a crítica havia ocorrido. E que um problema interpessoal
tinha sido criado.
Quem é responsável por este conflito entre Vicente e Joana? Clara­
mente, ambos são. A sensibilidade de Vicente à crítica combinada com o
comentário crítico de Joana criaram sua luta. E assim é com a maioria dos
conflitos: eles começam a partir de uma combinação volátil de um com­
portamento provocativo e uma vulnerabilidade exposta.
Mas justamente porque os parceiros compartilham a responsa­
bilidade por um conflito interpessoal não significa, necessariamente,
que eles dividam essa responsabilidade igualmente. A responsabilida­
de mútua não implica, obrigatoriamente, numa responsabilidade
igual. Um problema pode resultar mais da crítica do marido do que
da hipersensibilidade da esposa. Se os amigos, a família e os colegas de
trabalho do marido o percebem como uma pessoa crítica, mas ne­
130 "Você sabe como me machucar'

nhum dos amigos, família e colegas de trabalho da esposa a sente


como hipersensível, nós poderiamos, certamente, atribuir ao marido
maior responsabilidade do conflito.
Os cônjuges não podem, facilmente, obter informações sobre
como a maioria das outras pessoas responde a seus parceiros. Mesmo
que pudessem obter essa informação, nunca seria tão nítida como no
exemplo anterior. Mesmo as pessoas que são críticas em muitos de
seus relacionamentos mostram variabilidade considerável. Com algu­
mas pessoas, elas criticam muito; com outras, criticam muito pouco.
Algumas pessoas lidam bem com suas críticas e não criam problemas;
outras lidam mal, e isso cria sérios problemas. Portanto, aceitar que
ambos são responsáveis por um problema, mas argumentar sobre
quem é mais responsável, é especular sobre uma questão inútil que é
virtualmente impossível responder.

RECAPITULANDO
Nossas sensibilidades são muitas vezes o barril de pólvora para conflitos. Profundos
incidentes de negligência, quando nossos parceiros não estão lá quando precisamos
deles, ou atordoantes exemplos de provocação, quando nossos parceiros fazem algo
que nos envergonha, nos humilha ou nos trai, certamente criarão conflito. Mas os
exemplos mais comuns de negligência e provocação, muitos dos quais são suprimi­
dos ou ignorados, podem eventualmente causar conflitos também. 0 poder desses
eventos não reside apenas nas ações ou não ações de nossos parceiros, mas em
nossas próprias sensibilidades a esses eventos. Podemos ter vulnerabilidades desen­
volvidas por meio de nossa experiência passada que, como as alergias psicológicas,
nos tornam especialmente reativos a possíveis ameaças de abandono ou aprisiona-
mento, falta de reconhecimento ou aprovação ou perda de controle. Discutimos
sobre incompatibilidades que criam força a partir das vulnerabilidades de cada um
de nós. Se nossas sensibilidades colidem com as de nosso parceiro, a dor e conse­
quente briga podem ser ainda maiores. Queremos ser tratados com cuidado em
nossas áreas especiais de vulnerabilidades. No entanto, porque estamos apenas va­
gamente conscientes ou nos sentimos envergonhados delas, não estamos abertos
para as nossas sensibilidades. Quando elas são ativadas, a emoção visível que ex­
pressamos pode camuflar uma emoção escondida que não expressamos, para pro­
teger a nós mesmos ou a nossos parceiros.
Diferenças Reconciliáveis 131

Exercício: Emoções Superficiais e Ocultas

O primeiro passo para sair da armadilha que as emoções superfi­


ciais e ocultas podem criar é identificar nossas próprias emoções,
nossas próprias sensibilidades e a história que pode ter dado forma a
elas. Também pode ser útil pensar sobre as emoções do seu parceiro.
No exercício abaixo, você será solicitado a identificar as emoções su­
perficiais e ocultas que você experimenta quando seu conflito central
ocorre, bem como aquelas que seu parceiro pode vivenciar. Então
você será solicitado a escrever sobre por que este conflito central é
uma questão sensível para você, referindo-se a experiências passadas
que lhe moldaram. Este processo irá ajudá-lo a começar na primeira
fase E (a Sensibilidade Emocional relacionada com a sua questão cen­
tral) de uma compreensão DEEP (profunda) deste problema.
Pense sobre o conflito central que você identificou. Quais são
as emoções superficiais que você costuma revelar? Quais são as
emoções superficiais que seu parceiro geralmente revela? Abaixo
está uma lista de emoções comuns para ajudar na sua seleção.
Embora qualquer emoção possa ser revelada ou escondida, as
emoções à esquerda são as emoções superficiais mais comuns, en­
quanto que as da direita são as emoções ocultas mais comuns.

Brabo Solitário
Ofendido Isolado
Frustrado Distante
Furioso Abandonado
Irritado Medroso, Ansioso
Enraivecido Cauteloso
Rancoroso Intimidado
Desrespeitado Oprimido
Insultado Preocupado
Ridicularizado Culpado
Desconsiderado Envergonhado
Inferior Arrependido
Insignificante Sentido
Não confia em si Indigno
132 “Você sabe como me machucar'

Defensivo Triste, Depressivo


Desconfiado Desapontado
Em guarda Ferido
Possessivo Abatido
Fechado Humilhado
Controlado Negligenciado
Controlado Negligenciado
Mandado Rejeitado
Censurado Abandonado
Impotente Mal amado
Reservado Ignorado
Claustrofóbico Omitido
Ciumento / invejoso Enganado

Quando estamos lutando eom a questão central que eu identi­


fiquei, a emoção superficial que eu costumo mostrar é________
____________________ ; a emoção superficial que meu parceiro cos­
tuma a mostrar é______________________ . (Se você ou seu parcei­
ro normalmente não mostram nenhuma emoção, basta escrever
"pouca ou nenhuma emoção").
Agora considere as emoções ocultas que você experimenta. Use
as listas acima para ajudar na sua seleção. Quando estamos nos
confrontando com a questão central que eu identifiquei, o que eu
estou sentindo, tipicamente, dentro de mim é___________________
Embora você não possa saber ao certo o que seu parceiro está
sentindo dentro dele, por que você não tenta adivinhar? Quando
estamos nos confrontando com a questão central que eu identifi­
quei, minha suposição é que a emoção que meu cônjuge está sen­
tindo, tipicamente, dentro de si é________________________
Agora considere o conflito central que você identificou e as
emoções superficiais e ocultas que você experimenta. Que experi­
ências passadas fizeram esta questão se tornar algo importante para
você? Tente se lembrar de uma ou mais experiências em sua família
de origem, sua adolescência ou outros relacionamentos românticos,
bem como quaisquer experiências importantes em seu relaciona­
mento atual. Aqui está um exemplo: sou sensível a respeito de ser
Diferenças Reconciliáveis 133

consultada sobre decisões porque meus pais costumavam tomar to­


das as decisões por mim, mesmo quando adulta. Muitas vezes senti
que eu não era consultada sobre decisões importantes para mim,
por exemplo, quando eu estava entrando na faculdade. No meu re­
lacionamento atual, meu parceiro às vezes tenta me surpreender
com presentes ou viagens, mas então eu sinto que eu não fui con­
sultada sobre isso.
Algumas das experiências passadas que criaram o conflito
central que identifiquei como uma questão importante e sensível
para mim são:

JUNTANDO TUDO

Nós identificamos agora duas partes do quebra-cabeças de seu


conflito central: Diferenças e sensibilidades Emocionais. É impor­
tante notar que, embora estas sejam peças separadas do quebra-ca­
beça, elas influenciam umas às outras. Se não houvesse sensibilida­
des emocionais relevantes, então a diferença seria mais manejável. Se
não houvesse diferenças relevantes, então as sensibilidades emocio­
nais não seriam tão problemáticas. O fato de que as duas coexistam
torna a sua questão central tão difícil.
Até agora, nós nos concentramos em fatores dentro de você e do
seu parceiro. As heranças genéticas de cada um e suas histórias sociais
únicas criaram vocês dois, com suas diferenças e sensibilidades emo­
cionais que agora fazem parte de vocês. Em seguida, vamos olhar para
o ambiente em que ambos funcionam para ver como ele pode in­
fluenciar sua questão central de maneiras tanto boas quanto ruins.
5

"Você não vê que


estou estressado?"
Problemas de relacionamento
como circunstâneias externas

O homem é uma criatura das circunstâncias.


Gilbert Seldes, cited in B. F. Skinner Beyond Freedom and Dignity (1971)

As circunstâncias dos outros parecem boas para nós,


enquanto as nossas parecem boas para os outros.
Publilius Syrus

Eu (Chritensen) uma vez ouvi um psicólogo social dar uma sín­


tese ampla e consisa de duas descobertas principais no campo dizendo
que (1) as situações influenciam o comportamento das pessoas e (2)
as pessoas não estão cientes desse fato. Estudo após estudo mostrou
que as circunstâncias afetam dramaticamente o comportamento das
pessoas, mas as pessoas, muitas vezes, explicam o comportamento dos
outros, referindo-se somente a suas personalidades.
O psicólogo Stanley Milgram forneceu talvez o exemplo mais
dramático de como as situações podem influenciar o comportamen­
to. No contexto de um estudo supostamente projetado para explorar
os efeitos da punição na aprendizagem, os participantes foram soli­
citados a monitorar o desempenho de outro participante em uma
sala diferente e pressionar um botão para dar ao participante um
Diferenças Reconeiliáveis 135

choque elétrico sempre que ele ou ela cometesse um erro. Na reali­


dade, o outro “participante” era um membro do grupo de pesquisa e
nunca recebeu o choque; suas reações foram encenadas. Os partici­
pantes reais encontraram-se numa situação em que um pesquisador
científico estava encorajando-os a aplicar níveis cada vez mais eleva­
dos e aparentemente perigosos de choque elétrico em outros seres
humanos acreditando que era verdade. Apesar de ouvir gritos de dor
na sala ao lado, o que eles pensavam ser gritos do participante em
reação aos choques, a grande maioria, geralmente honrados cida­
dãos americanos, mostrou considerável sofrimento emocional, mas,
no entanto, cumpriu com as diretrizes do pesquisador. Mesmo que

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136 "Você não vê que estou estressado?"

eles não fossem pessoas que normalmente machucariam outras, eles


não se recusaram a dar os choques nem pediram que o estudo fosse
encerrado. Eles se envolveram em comportamento aparentemente
perigoso e agressivo em resposta à situação em que se encontravam.
Felizmente, a maioria de nós não se encontrará em uma situ­
ação em que somos encorajados a nos envolver em tratamentos do­
lorosos aos outros. De fato, mesmo um estudo como o que acaba­
mos de descrever, provavelmente não poderia ser feito hoje por
causa do estresse emocional para os participantes. Mas mesmo que
possamos ser poupados de tal situação, seremos influenciados por
nossas circunstâncias mais profundamente do que podemos acredi­
tar. Qualquer que seja nosso patrimônio genético ou contexto his­
tórico, nossas atuais circunstâncias também afetam, poderosamen­
te, nosso comportamento. Estas circunstâncias atuais podem mini­
mizar ou exacerbar as diferenças pessoais com nossos parceiros e
sensibilidades em relação a eles, sendo diferenças e sensibilidades
que, inicialmente, resultaram de nossos antecedentes genéticos e
histórias pessoais.

CIRCUNSTÂNCIAS EXTERNAS E DIFERENÇAS

As vezes nossas atuais circunstâncias trabalham em nosso fa­


vor, minimizando as diferenças que temos com nossos parceiros.
Considere Daniela e Felícia, por exemplo. Daniela é uma pessoa
mais solitária do que Felícia. Ela veio de uma família pequena, sen-
te-se desconfortável em multidões, e prefere atividades solitárias,
como ler e jogar jogos de computador ou fazer coisas só com Felícia.
Por outro lado, Felícia vem de uma família grande, sente-se confor­
tável em grupo, e gosta de festas barulhentas e esportes em equipe.
Quando terminaram a pós-graduação e ambas encontraram um em­
prego na cidade natal de Felícia, essas diferenças não se tornaram
um problema porque Felícia poderia satisfazer algumas de suas ne-
Diferenças Reconeiliáveis 137

cessidades sociais por meio da grande rede de familiares e amigos da


cidade, sem pressionar ou ameaçar Daniela.
Infelizmente, as circunstâncias atuais podem criar ou exacerbar
mais do que aliviar as diferenças pessoais. Considere a situação estereo­
tipada do marido provedor tradicional e da mãe/dona de casa no final
de um dia de trabalho. Ele, frequentemente, chega em casa superesti-
mulado por um dia de lidar com as pessoas e seus problemas e não quer
nada mais do que se jogar na frente da televisão. Ela está exausta de um
dia de tarefas domésticas e de lidar com seus filhos, mas teve pouco
contato social com adultos. Ela quer conversar com seu marido e falar
sobre os problemas do dia que ela não pôde compartilhar com nin­
guém. Quaisquer que sejam as inclinações pessoais de cada um para fa­
lar sobre as questões no final do dia, suas circunstâncias separadas criam
necessidades diferentes para uma conversa de adultos.
Circunstâncias diárias podem afetar não apenas o quanto quere­
mos conversar com nossos parceiros, mas também como conversamos
com eles. Se o marido provedor de família não passa muito tempo com
seus filhos, ele pode não ser solidário às dificuldades de sua esposa com
as crianças. Ninguém pode dar conselhos sobre como se educa os filhos,
como aqueles que não têm filhos, e ele pode quase cair nessa categoria.
Ele pode descartar os problemas dela com as crianças com simples con­
selhos sobre ser firme e consistente com elas. Mas deixe-o passar um dia
junto delas e ver como ele faz! Da mesma forma, porque ela não tem
um emprego fora de casa, a mãe/dona de casa, provavelmente, será in­
sensível às dificuldades de trabalho do marido. Ela pode expressar frus­
tração porque ele não coloca limites nas exigências de seu chefe. Por que
ele está sempre se queixando de seu chefe? Por que ele não pode se opor
a ele? Se ao menos ela pudesse passar um dia com seu chefe! Nossas di­
ferentes circunstâncias diárias podem nos privar de nossa capacidade de
entender e empatizar com os mundos de nossos parceiros e, consequen­
temente, não levamos suas dificuldades a sério.
Por “circunstâncias atuais” queremos dizer muito mais do que sim­
plesmente os eventos diários na vida de cada pessoa longe da outra. Com
138 "Você não vê que estou estressado?'

isso nos referimos à sua posição atual, habilidades e status também. Ro­
dolfo acredita que a assinatura de um acordo pré-nupcial seria uma decla­
ração de falta de confiança entre ele e Marianne. Ele exige que eles “acre­
ditem em seu amor um pelo outro” e que se vá para o casamento sem
pré-condições ou cláusulas financeiras. Marianne acredita que se deve fa­
zer um acordo pré-nupcial como precaução realista em face das altas taxas
de separação e divórcio de hoje. Ela argumenta que “o amor não é incom­
patível com a realidade”. Embora existam diferenças pessoais no nível do
romantismo e do realismo de Marianne e Rodolfo, suas diferentes situa­
ções financeiras também os levaram a suas posições diferentes. Marianne
vem à relação com significativamente mais bens do que Rodolfo e perde­
ría mais se eles se divorciassem. Rodolfo pode literalmente “dar-se ao
luxo” de ser mais romântico do que Marianne.
Status e capacidade podem afetar não apenas as reações de um
cônjuge para entrar em um relacionamento, mas também o seu
comportamento nessa relação. Juan e Angela têm reações muito di­
ferentes em relação aos pensamentos e à discussão sobre uma possí­
vel separação e divórcio. Juan acha que esses pensamentos e discus­
sões são um exercício realista, diante dos conflitos que os dois estão
tendo. Ele ama Angela e realmente não quer um divórcio, mas acha
insuportável a ideia de ficar em uma relação sem amor e conflituosa
para o resto de sua vida. Angela, por sua vez, acha ameaçadora a dis­
cussão sobre possível separação e divórcio. Para ela, trazer o tema
implica numa falta de amor e compromisso. Ela pergunta: “Por que
estamos discutindo isso com apenas 2 anos do nosso casamento?”
Embora possa haver muitos fatores que explicam essas diferentes re­
ações, a capacidade atual, de ambos, de atrair outras pessoas é uma
delas. Juan é um cara gregário que amava o mundo do namoro e
achava muito fácil conhecer outras pessoas. Se ele e Ângela se divor­
ciassem, rapidamente encontraria relacionamentos alternativos. Em
contraste, Angela é dolorosamente tímida e achou o mundo do na­
moro bastante desagradável. Não poderia substituir facilmente Juan.
Não há nada de reconfortante para ela sobre a ideia de divórcio.
Diferenças Reconciliáveis 139

Porque somos duas pessoas diferentes, viemos de situações dife­


rentes e nos colocamos em situações diferentes das dos nossos parcei­
ros. Essas situações podem minimizar nossas divergências e aumentar
nossa compatibilidade ou acentuar ainda mais nossas diferenças ou até
mesmo criar novas. O que é certo, porém, é que nem nós nem nossos
parceiros permaneceremos estáticos.

CIRCUNSTÂNCIAS EXTERNAS
E SENSIBILIDADES EMOCIONAIS

As circunstâncias externas afetam não só as diferenças entre os


parceiros, mas também cada uma das suas sensibilidades. Considere,
por exemplo, uma sensibilidade sobre confiança e fidelidade. Ter um
parceiro que trabalha em casa pode minimizar o medo de que ele ou
ela vai encontrar outro mais atraente ou sair do relacionamento. Em
contrapartida, ter um parceiro que viaja a trabalho frequentemente
ou que tem contato com muitas pessoas solteiras atraentes poderia
exacerbar essa desconfiança. As circunstâncias externas às vezes po­
dem atenuar as sensibilidades para que elas não interfiram no rela­
cionamento. Parceiros que têm uma forte necessidade de reconheci­
mento, e têm grande sucesso em sua carreira podem ter menos ex­
pectativas de serem valorizados por seus companheiros. No entanto,
se eles experimentam falha ou falta de reconhecimento em suas car­
reiras, eles podem ser particularmente carentes de valorização por
seus parceiros.
As circunstâncias externas não só podem exacerbar as sensi­
bilidades emocionais, mas às vezes criá-las. Ter um parceiro que
não está comprometido com o relacionamento ou aquele cujo
amor é inconsistente pode, ao longo do tempo, criar um medo de
separação ou dúvida sobre sua capacidade de permanecer com ele,
mesmo que você não tenha esta cicatriz na sua história. Ter um
cônjuge que é infiel naturalmente, leva à desconfiança, uma des-
140 "Você não vê que estou estressado?"

confiança que pode crescer exponencialmente com mais incidentes


de infidelidade.
Agora aqui está a complicação - às vezes funciona de outra ma­
neira. As vulnerabilidades existentes, de vez em quando, podem criar
circunstâncias que acionam essa mesma vulnerabilidade. Considere,
por exemplo, uma sensibilidade sobre a rejeição. Ter tal sensibilidade
levaria você a reagir fortemente a leves sinais de rejeição, como um
parceiro que às vezes não é afetuoso ou que está preocupado. Você fica
chateado ou irritado quando seu parceiro não responde a você. No
entanto, essas reações fortes provavelmente criam ou intensificam a
dúvida em seu parceiro sobre se ele ou ela quer continuar a ficar com
você. Como resultado dessa dúvida, seu parceiro pode mostrar menos
comprometimento ou rejeição clara, o que por sua vez realimenta sua
vulnerabilidade. Assim, o processo funciona como um circuito de re­
torno: a menor rejeição por um pode estimular uma vulnerabilidade e
uma forte reação no outro, o que por sua vez pode causar maior rejei­
ção e falta de comprometimento, o que por sua vez desencadeia uma
maior vulnerabilidade e reações mais fortes.
Considere um exemplo. Após os estágios iniciais de seu rela­
cionamento, quando Dilson corria atrás de Simone intensamente,
normalmente era ela a mais envolvida e comprometida. Foi ela
quem pressionou por casamento enquanto ele estava relutante. Ago­
ra, dois anos após o casamento, Dilson está expressando maiores dú­
vidas sobre a relação deles. Ele sente falta da liberdade da vida de
solteiro, sente-se atraído por muitas outras mulheres e está frustrado
com a chatice diária de seu relacionamento. Suas dúvidas verbaliza­
das e seu olhar errante criam ansiedade em Simone, até pânico às
vezes. Ela ama Dilson e passou a depender dele, mas sempre sentiu
alguma insegurança. Em sua ansiedade, ela o força a reassegurá-la de
seu amor. Em alguns momentos ela se torna grudenta, e em outros,
ela o ataca pelo desejo imaturo dele por uma vida de solteiro aos 35
anos. Infelizmente, o comportamento de Simone somente reforça o
sentimento de Dilson de aprisionamento na relação. Ele ama Simo-
Diferenças Reconeiliáveis 141

ne e relutantemente lhe dá algumas garantias, mas elas soam falsas


para ele — e para ela. Ele tolera a carência dela, mas às vezes, sente-se
desconfortável com isto, e também odeia as críticas de Simone, em­
bora receie que elas sejam, em parte, precisas. Todas as reações dela
se combinam para fazê-lo ficar mais em dúvida sobre o relaciona­
mento, e suas dúvidas crescentes, por sua vez, criam uma maior an­
siedade nela.

O PIOR TIPO DE CIRCUNSTÂNCIAS


EXTERNAS: CIRCUNSTÂNCIAS ESTRESSANTES

Pressão e estresse é o resfriado comum da psique.


Andrew Denton

O estresse é o lixo da vida moderna - todos nós o geramos, mas se você


não jogá-lo fora corretamente, ele vai se acumular e tomar conta de sua vida.

Danzae Pace

A hora de relaxar é quando você não tem tempo para isso.

Autor desconhecido

Com frequência falamos sobre nossas vidas sendo “cheias de


estresse” ou de estar “muito estressado”. E importante distinguir en­
tre circunstâncias estressantes (ou estressores) e reações estressantes.
As circunstâncias estressantes são eventos fora de nós, como as de­
mandas de emprego ou escola, problemas legais, dívidas, conflitos
com a família ou amigos, até mesmo o tráfego e ruído. Nós normal­
mente pensamos em circunstâncias estressantes como sendo eventos
negativos, mas também podem ser eventos positivos. Uma promo­
ção pode levar a mais dinheiro e prestígio na empresa, mas acarretar
muito mais responsabilidade e, portanto, mais estresse. Reações es­
tressantes são a forma como respondemos a essas circunstâncias,
tanto física como psicologicamente. Respondemos fisicamente a cir­
cunstâncias estressantes com maior excitação, como maior frequên-
142 "Você não vê que estou estressado?'

cia cardíaca, pressão arterial e transpiração. Esta excitação nos forne­


ce a energia necessária para a conhecida reação “lutar ou fugir”. Res­
pondemos psicologicamente a circunstâncias estressantes com rea­
ções mais rápidas, julgamentos instantâneos e emoções intensifica­
das. Por exemplo, se os nossos parceiros nos pedirem ajuda quando
estamos em circunstâncias de baixo estresse, como em férias, pode­
mos não mostrar aumento na frequência cardíaca ou pressão arterial
e responder graciosamente e generosamente. No entanto, se os nos­
sos parceiros pedirem a mesma ajuda quando estamos em circuns­
tâncias estressantes, como terminar um relatório que tem um prazo
iminente, podemos experimentar um aumento na frequência cardía­
ca e pressão arterial, fazer um julgamento rápido que nossos parcei­
ros estão sendo desrespeitosos, responder de forma irritada ou raivo­
sa, e sumariamente rejeitar o pedido.
Os psicólogos tipicamente dividem o estresse em duas categorias
principais: grandes estressores da vida e estressores diários. Os grandes es­
tressores da vida incluem importantes transições que acontecem com a
maioria de nós: por exemplo, ter um filho, mudar-se, conseguir um novo
emprego, aposentar-se ou lidar com o sofrimento pela morte de um dos
pais. Os grandes estressores da vida igualmente surgem dos eventos nega­
tivos inesperados, tais como uma doença, um acidente, uma deficiência,
um fracasso nos negócios e uma perda financeira. Os estressores diários são
condições crônicas que temos de lidar, como uma criança difícil, um che­
fe controverso, vizinhos barulhentos, recursos financeiros limitados ou
percorrer longos trajetos diários.
Ambos os tipos de estresse costumam treinar nossa atenção so­
bre o estressor e como lidar com ele. Se nos deparamos com um fra­
casso iminente nos negócios, ficamos pensando repetidamente em
nossas mentes sobre o que deu errado, o que vamos fazer em segui­
da, e como vamos fazer para pagar as contas. Se temos um filho difí­
cil, podemos lutar com nossos sentimentos contraditórios de amor e
raiva em relação à ele, pensar sobre como lidar com a situação, e
nos perguntar sobre o que o futuro trará. Essa atenção restrita signi-
Diferenças Reconeiliáveis 143

fica que negligenciamos outros aspectos do nosso mundo. Podemos


ignorar nossos parceiros ou não responder às necessidades de outro
filho. O estressor comanda a maior parte de nossos recursos psicoló­
gicos, por isso temos menos a dar a qualquer outra coisa, mesmo a
nossos parceiros.
Eventos estressantes podem ativar padrões bem aprendidos de
enfrentamento. Se aprendemos a dar conta dos estressores socialmen­
te, provavelmente vamos querer compartilhar nosso problema com os
outros, sermos reassegurados e obter apoio deles e sentir que estamos
acompanhados nisso. Se aprendemos a lidar sozinhos, podemos nos
afastar dos outros e ficar totalmente ocupados com nossos próprios
pensamentos enquanto tentamos resolver a situação. Neste caso, o
contato social é um fardo, não um alívio. Se aprendemos a lidar com
a ansiedade exercendo maiores esforços para ordenar e controlar nossa
vida, podemos mapear planos, escrever listas de coisas para fazer e or­
ganizar a papelada da nossa escrivaninha.
A extensão de nossa reação estressante depende de como nós a
percebemos. Se vemos a situação como algo que temos pouco controle
e que provavelmente acarretará em consequências negativas para nós,
então há grandes chances de nos sentirmos estressados. No entanto, se
percebermos a mesma situação em que temos um controle considerável
sobre as possíveis consequências, é provável que sofreremos menos es­
tresse. Por exemplo, os alunos que enfrentam um exame final de curso
exigido para receber seu diploma, mas que não foram bem e não enten­
deram o conteúdo são susceptíveis de experimentar fortes reações estres­
santes. Eles têm pouco controle sobre um resultado que tem conse­
quências para eles. Em contrapartida, os alunos que enfrentam o mes­
mo exame e se saíram bem em exames anteriores e que entendem bem
o conteúdo, provavelmente sentirão menos estresse.
A intensidade que experimentamos uma reação estressante
tem um impacto interessante, inesperado e não óbvio em nosso
comportamento nos relacionamentos. Naturalmente, quando expe­
rimentamos baixos níveis de estresse, há pouco impacto na nossa re­
144 "Você não vê que estou estressado?"

lação. Em níveis moderados de estresse, como um dia frustrante no


trabalho, podemos nos sentir irritados e impacientes com nossos
parceiros, mas talvez não saibamos por que razão e talvez não consi­
gamos ajustar bem nosso comportamento. Podemos ficar irritados
com nossos parceiros sem qualquer explicação sobre a origem dessa
irritação, levando-os a se perguntar o que eles fizeram de errado ou
o que há de errado conosco. Por outro lado, em altos níveis de cir­
cunstâncias estressantes, como um acidente de automóvel não muito
sério ou perder um documento importante, podemos ter consciên­
cia sobre a fonte de angústia e comunicar isso claramente aos nossos
parceiros. Esse conhecimento sobre a fonte de angústia e mensagem
clara para o parceiro - estou chateado com o acidente de carro -
pode muitas vezes proteger o relacionamento desse estresse. Os par­
ceiros sabem que eles não são o estressor e muitas vezes pode ser
uma fonte de conforto ou ajuda para melhorar a causa do estresse.
Finalmente, em níveis severos de estresse, como perder um emprego,
podemos saber qual é o estressor, sabendo que não é nosso parceiro,
mas mesmo assim ficarmos tão chateados com a situação que, então,
não podemos compartimentar nossas reações ou proteger nossa rela­
ção de seus efeitos.

ESTRESSE E DIFERENÇAS

Quando o estresse é baixo e estamos confortáveis, confiantes e relaxa­


dos, podemos tolerar mais facilmente as diferenças que existem entre nós e
nossos parceiros e, conforme necessário, acomodar essas diferenças. Pessoas
introvertidas quando estão relaxadas e confortáveis são mais compreensivas
com a necessidade de socializar de seus parceiros extrovertidos e podem fi­
car mais dispostas a acompanhá-los. O que não acontece quando estes in­
trovertidos estão experimentando o próprio estresse. Da mesma forma, pes­
soas econômicas são mais tolerantes com seus parceiros gastadores quando
estão relaxadas e confortáveis. Quando sob estresse, estamos mais atentos às
Diferenças Reconciliáveis 145

nossas próprias preocupações e menos atentos às preocupações dos nossos


parceiros. Esta atenção restrita ao problema, associada à impaciência e irrita­
bilidade que muitas vezes vêm com ela, pode complicar qualquer tentativa
de resolver as diferenças ou chegar a acordos aceitáveis.
O estresse não só dificulta o manejo das diferenças, mas tam­
bém pode intensificá-las por meio da privação. Os problemas de di­
nheiro tornarão os econômicos ainda mais incomodados e intoleran­
tes do que os seus parceiros gastadores habitualmente ficariam. Um
declínio no mercado de ações ou um conserto caro que esgota a conta
bancária os priva da reserva financeira que necessitam para se sentirem
confortáveis. Da mesma forma, dias de trabalho estressantes que en­
volvem intenso contato social geralmente fazem os introvertidos ne­
cessitarem de mais tempo sozinhos do que eles normalmente preci­
sam. A grande carga de difícil contato social é remediada para eles
apenas por uma dose extra de tempo sozinho.
Talvez o maior impacto do estresse sobre as diferenças que te­
mos com nossos parceiros é na maneira como lidamos com o estres­
se. Aqueles que precisam falar com uma pessoa de confiança terão
essa saída ainda mais quando o estresse aumenta. Por outro lado,
aqueles que respondem ao estresse retirando-se do contato social
para lamber suas feridas e considerar suas opções podem se retirar
ainda mais com maior estresse. Pode-se facilmente imaginar uma
pessoa falante e outra que fica calada num relacionamento enfren­
tando um estresse conjunto e lidando com ele de maneiras muito
diferentes, as quais intensificam as suas diferenças. Os conversadores
querem compartilhar suas preocupações com seus parceiros íntimos,
intensificando a necessidade daquele que é quieto de ter tempo sozi­
nho. Aqueles que se retiram querem isto para obter o tempo neces­
sário para se recuperar e ter uma perspectiva mais clara, deixando
seus parceiros falantes com uma necessidade ainda mais intensa de
compartilhar seus pensamentos e sentimentos com alguém.
As vezes, o estresse nos leva a buscar alívio em atividades que fa­
zem parte de diferenças importantes que temos com nossos parceiros.
146 "Você não vê que estou estressado?"

O econômico pode encontrar o consolo ao examinar os fundos do


mercado de ações e as contas bancárias, mesmo quando experimenta
um estresse não relacionado a finanças. Uma pessoa altamente organi­
zada pode achar reconfortante organizar o ambiente doméstico quan­
do algum estresse, como um problema no trabalho faz com que se
sinta fora de controle. Se o econômico e o organizado estiverem em
relacionamentos com um gastador e um bagunceiro, respectivamente,
então seus esforços diante das dificuldades poderiam intensificar dife­
renças não relacionadas ao estresse.

ESTRESSE E SENSIBILIDADE EMOCIONAL

Estresse não só pode exacerbar as diferenças, mas também ex­


por sensibilidades emocionais. Quando as coisas estão sob controle
e nos sentimos confortáveis, nossas sensibilidades, frequentemente,
ficam adormecidas. Mesmo que possamos estar vulneráveis a senti­
mentos de abandono, em períodos nos quais ser vulneráveis a senti­
mentos de aprisionamento, podemos desfrutar de intimidade e com­
promisso.
Etresse não só pode intensificar as diferenças, mas também ex­
por sensibilidades emocionais. Quando as coisas estão sob controle e
nos sentimos confortáveis, nossas sensibilidades, frequentemente, fi­
cam adormecidas. Mesmo que possamos estar vulneráveis a sentimen­
tos de abandono, em períodos nos quais está tudo bem, nós podemos
encorajar nossos parceiros em suas buscas individuais. Mesmo que
possamos estar vulneráveis a sentimentos de aprisionamento, pode­
mos desfrutar de intimidade e comprometimento. Mesmo que possa­
mos, muitas vezes, querer estar no controle, podemos pegar mais leve
e ficar mais desprendidos.
Estressores podem afetar nossas sensibilidades emocionais de
duas maneiras. Primeiro, um estressor pode atingir diretamente nos­
sa vulnerabilidade, como uma flecha no calcanhar de Aquiles. Se
Diferenças Reconciliáveis 147

Dora é sensível a sentimentos de abandono e rejeição, e ocorre inci­


dente no trabalho em que um colega a despreza, isto pode se tornar
especialmente difícil para ela. Este fato traz à tona seu grande medo
de que ela não é querida. Se Michael é sensível a questões de contro­
le e tem um chefe que fica no seu cangote e lhe dá pouca autono­
mia, ele pode reagir fortemente porque sente como se não tivesse
noder próprio. Estes eventos para Dora e Michael, embora ocorren­
do em seus locais de trabalho, podem transitar em suas respectivas
relações. Dora pode ficar especialmente carente do apoio de seu par­
ceiro ou reagir de maneira agressiva se ele mostrar qualquer sinal de
rejeição a ela. Da mesma forma, Michael pode tentar exercer um
poder sobre sua vida doméstica que ele não sente ter em sua vida
profissional. E claro, um estressor criará maiores dificuldades de re­
lacionamento quando ocorre dentro da relação. Se o parceiro de
Dora expressar dúvidas sobre seu relacionamento ou o parceiro de
Michael tomar o controle de algo que ele quer assumir, as reações de
ambos criarão maior perturbação em seus relacionamentos do que
estressores semelhantes no trabalho.
Em segundo lugar, um estressor pode afetar nossa sensibilidade
indiretamente. Ele não toca no nosso ponto fraco, mas, ao nos atingir,
enfraquece-nos e nos faz lidar de maneiras associadas à nossa vulnera­
bilidade. Por exemplo, mesmo quando Dora tem um estressor que
nada tem a ver com a rejeição interpessoal, como o estresse pela proxi­
midade do prazo de entrega de uma tarefa, suas necessidades de apoio
interpessoal podem aumentar. Ela pode precisar de mais amor de seu
marido, não porque sua própria sensibilidade à rejeição tenha sido de­
safiada, mas porque ela pode lidar melhor com qualquer desafio, se
receber o apoio daqueles que são próximos a ela. Da mesma forma,
qualquer ansiedade que Michael enfrenta, envolvendo controle ou
não, pode aumentar seus próprios esforços para exercer poder. Um
prazo iminente pode fazê-lo organizar e agendar outras tarefas porque
assim ele reduz a sua própria ansiedade sobre o prazo.
Então, eventos estressantes, particularmente aqueles que nos
atingem em um ponto fraco, aumentam nossas necessidades, mesmo
148 "Você não vê que estou estressado?"

que eles nos deixem menos capazes de acomodar as necessidades da­


queles que nos rodeiam. Esse efeito duplo pode ser gerenciável se ape­
nas um de nós estiver sob estresse. Quando ambos estamos estressa­
dos, o conflito pode ser inevitável. Ao invés de viver de acordo com o
ideal de “elegância, mesmo sob pressão” de Hemingway, sob pressão,
poderemos agredir. E a agressão pode ser com os nossos parceiros, que
são aqueles que nos amam mais e os que poderiam nos apoiar - se eles
também não estivessem tão estressados.

RECAPITULANDO
Embora o que nós e nossos parceiros trazemos para um conflito é altamente influen­
te, as circunstâncias externas em que nos encontramos também interferem nesse
conflito, para o bem e para o mal. Às vezes circunstâncias externas podem servir para
reduzir as diferenças entre nós dois ou para amortecer as sensibilidades emocionais
de um ou outro. No entanto, em alguns momentos as circunstâncias fazem exata­
mente o oposto, acentuando nossas diferenças ou expondo nossas sensibilidades
emocionais. 0 pior tipo de circunstâncias externas são as estressantes, que podem
restringir nossa atenção em nossas próprias preocupações, diminuindo nossa atenção
às preocupações de nosso parceiro. Essas circunstâncias estressantes podem acentuar
nossas diferenças e aumentar nossas sensibilidades emocionais, especialmente quan­
do nossa resposta normal ao estresse é diferente.

Exercício: Qual o papel do estresse?

Este exercício irá ajudá-lo a atingir uma melhor compreensão do


papel que o estresse está desempenhando em sua vida. Abaixo você
será solicitado a completar uma medida de seu estresse, adaptado de
um questionário mais longo desenvolvido por Sheldon Cohen, Tom
Kamarck e Robin Mermelstein, que você pode marcar e interpretar
eom base nas informações que fornecemos. Em seguida, você será so­
licitado a pensar, eom cuidado, sobre as tensões específicas que você
e seu parceiro estão passando e qual seu impacto nas suas diferenças
e emoções. Este processo permitirá que você conclua a segunda fase
Diferenças Reconciliáveis 149

E(os estressores Externos relacionados à sua questão central) de uma


compreensão DEEP (PROFUNDA) deste problema.

ESCALA DE PERCEPÇÃO DE ESTRESSE

As perguntas desta escala lhe questionam sobre seus sentimen­


tos e pensamentos durante o último mês. Em cada caso, indique por
meio de círculos quantas vezes você sentiu ou pensou de uma certa
maneira.
Muito
Nunca Às vezes
frequentemente

1. No último mês, quantas vezes 0 1 2 3 4


você sentiu que era incapaz de
controlar as coisas importantes em
sua vida?

2. No último mês, com que 4 3 2 1 0


frequência você se sentiu
confiante sobre sua capacidade de
lidar com seus problemas pessoais?

3. No último mês, com que 4 3 2 1 0


frequência você sentiu que as
coisas estavam indo do seu modo?

4. No último mês, com que 0 1 2 3 4


frequência você sentiu as
dificuldades se acumulando de
tal maneira que você não poderia
superá-las?

PONTUAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DA
ESCALA DE PERCEPÇÃO DE ESTRESSE

Para determinar seu escore total, basta somar seus pontos em


todos os quatro itens. Em seguida, leia abaixo a interpretação.

Escore de 0-3
Você nos disse que, em geral, você se sente muito confiante e
capaz de lidar com o estresse em sua vida e você se sente no con­
trole de situações estressantes. Isso é uma boa notícia porque suge-
150 "Você não vê que estou estressado?"

re que você não precisa ter que proteger seu relacionamento de seu
estresse muito frequentemente. No entanto, isso, naturalmente, não
significa que você não fique estressado em circunstâncias específi­
cas e, nesses momentos, você precisará considerar as questões dis­
cutidas neste capítulo.

Escore de 4-8
Seus resultados mostram que você sente que é capaz de lidar
com situações estressantes e controlar coisas importantes em sua
vida a maior parte do tempo. No entanto, parece haver certos mo­
mentos em sua vida, quando as coisas começam a parecer fora de
controle, como se você não conseguisse lidar com elas. Embora seja
ótimo que isso não aconteça todo o tempo, ou mesmo na maioria
das vezes, quando você está se sentindo muito estressado, este pode
ter um grande impacto em você e seu relacionamento, como você
aprendeu neste capítulo.

Escore de 9-16

Sua pontuação indica que você está lidando com uma quantida­
de significativa de estresse em sua vida. Portanto, o conteúdo neste
capítulo será espeeialmente importante para você. À medida que
você trabalha para fortalecer seu relacionamento, será importante
prestar atenção ao papel que o estresse tem. Mais tarde, vamos falar
sobre como proteger seu relacionamento do impacto do estresse.

IDENTIFICANDO ESTRESSORES ESPECÍFICOS

Você olhou para o seu nível geral de estresse. Agora vamos


considerar os estressores específicos que mais frequentemente afe­
tam a questão central que você identificou. Qual dos estressores
comuns abaixo é mais susceptível de aumentar as dificuldades em
torno de seu conflito principal? 0 que é mais provável para aumen­
tar as dificuldades em torno de seu conflito principal para o seu
parceiro? Escolha até três em cada coluna. Em seguida, escolha o
estressor mais importante de cada coluna.
Diferenças Reconeiliáveis 151

Estressores que afetam o conflito Estressores que afetam o conflito


principal para mim principal para meu parceiro/a

___ Trabalho / Escola ___ Trabalho / Escola

___ Família extensa ___ Família extensa


Saúde Saúde
Amigos Amigos

___ Problemas legais ___ Problemas legais

___ Transições de vida ___ Transições de vida


(ex: mudanças) (ex: mudanças)

___ Finanças ___ Finanças

_ Outros: ___ Outros:

IMPACTO NAS DIFERENÇAS E EMOÇÕES

Agora que você identificou os principais estressores para você e


seu parceiro, reserve um momento para pensar sobre como o es­
tresse afeta o modo como você lida com as diferenças e emoções.
Por exemplo, o estresse coloca suas diferenças em mais evidência?
Há diferenças em como os dois respondem ao estresse? Além disso,
os estressores identificados acima impactam diretamente nas suas
sensibilidades emocionais ou o estresse somente torna mais difícil
manejar essas sensibilidades?

JUNTANDO TUDO

Você analisou seu nível geral de estresse, bem como os estresso­


res específicos que lhe afetam e que afetam seu parceiro e que, sepa­
radamente ou em conjunto, pode aumentar o esforço em torno da
questão central. Neste ponto, você tem uma boa ideia dos três pri­
152 "Você não vê que estou estressado?"

meiros aspectos de sua análise DEEP (profunda) de seu conflito cen­


tral: como D (Diferenças), E (Emoções) e E (Estressores externos)
afetam o problema. E importante ver como cada parte atinge as ou­
tras duas. O estresse pode exacerbar as diferenças e as sensibilidades
emocionais; as sensibilidades emocionais podem tornar as diferenças
e estresse mais difíceis de lidar; as diferenças podem tornar as sensibi­
lidades emocionais e o estresse mais difíceis de manejar. Uma peça
remanescente e importante é o P — os Padrões de comunicação que
você entra quando você tenta resolver sua luta principal.
6

Uma cura pior do que a doença


Problemas de relacionamento
como padrões de comunicação

Soluções ruins não meramente falham; elas criam um


problema ainda maior.

Tudo o que Anita queria de Ralph era um ouvido amigo. Tudo


o que Ralph queria era terminar de instalar seu novo software antes de
se envolver em uma conversa. Mas quando os dois se separaram na­
quela noite, ambos estavam tão machucados e irritados que nem se­
quer podiam se olhar, muito menos conversar.
Tudo começou quando o casal estava sozinho em sua sala de es­
tar. Anita estava inquieta no sofá, preocupada com um problema que
estava tendo com seu chefe, enquanto Ralph estava debruçado sobre
seu laptop em uma cadeira em frente a ela. Depois de algumas tenta­
tivas de obter sua atenção - profundos suspiros, perguntas como “En­
tão o que está acontecendo com o seu computador?”, e comentários
vagos como “Que dia ...” - que não obtiveram resposta, Anita parou
de pensar no trabalho e começou a ficar indignada, achando quão in­
sensível seu marido era. Ela imaginou duas possibilidades; ficar furiosa
e sair correndo dali ou tentar explicar a ele porque ela estava tão cha­
teada. Ela escolheu a última; “Ralph, se você pudesse apenas olhar
para mim por um segundo, eu realmente preciso falar com você.”
154 Uma cura pior do que a doença

Ralph olhou para cima com uma cara desgostosa e soltou um


grande suspiro. Tendo vários anos de experiência com esse “filme”, ele
sabia que este era o início de um discurso bombástico sobre sua falta
de sensibilidade. Por que ela não podia apenas ver que ele estava preo­
cupado e frustrado e que, uma vez que tivesse resolvido o problema
com o computador, ele estaria muito mais aberto para o que ela qui­
sesse discutir, visto que sua mente estaria livre deste problema? En­
quanto Anita tentava explicar o que a incomodava, ele tentou inter­
rompê-la e explicar que ela se irritava muito facilmente e deveria rela­
xar e aprender a “nadar a favor da correnteza”. “Você sempre me trata
de forma paternal!” Anita respondeu imediatamente. “Por que você é
sempre tão insensível?” Quando Ralph protestou que não era insensí­
vel, isto abriu as comportas para a lista de exemplos de Anita de sua
história juntos: o tempo que a mãe dele ficou chateada com ele por­
que Ralph não tratou devidamente a doença terminal de seu pai, o
tempo que ele a deixou sozinha para lidar com eutanásia do seu cão
porque ele estava no trabalho, o tempo que ele tinha tentado fazer
uma piada por ter esquecido o seu 10° aniversário de casamento...
Ralph contra-atacou com evidências das “exageradas reações” dela, tal
como o incidente do dia anterior, quando ela gritou com as crianças
por causa de nada. Em resposta, ela afirmou que viver com Ralph era
como viver em um deserto emocional. Ele contra-atacou que talvez
ela devesse encontrar outra pessoa e então, saindo da sala, intempesti­
vamente, bateu a porta.
Claramente, ambos os parceiros tiveram uma participação neste
conflito. Da mesma forma, seus esforços para lidar com o problema
inicial da desatenção de Ralph para Anita criaram um problema ainda
maior. De fato, na turbulência que foi gerada durante esta briga, eles
esqueceram temporariamente o problema inicial.
Um slogan da década de 1960, popularizado por um discurso
de Eldridge Cleaver, cobrou “Se você não faz parte da solução, você é
parte do problema”. Nos relacionamentos, é um pouco diferente. Na
tentativa de fazer parte da solução, às vezes você pode acabar, não ape­
nas fazendo parte do problema, mas tornando-o pior.
Diferenças Reconeiliáveis 155

Ao longo das Partes I e II deste livro, vimos que os casais en­


frentam dificuldades, fazem esforços para dar conta delas e, em segui­
da, enfrentam problemas reativos - dificuldades criadas no processo
de tentar resolver o problema inicial. No exemplo anterior, o proble­
ma inicial era uma diferença no desejo de conversa ou conexão, de­
sencadeada em parte pelo foco de Ralph em seu novo software e pelo
desejo de Anita de conversar sobre uma questão difícil de trabalho, o
que levou a sentimentos de mágoa e raiva. Talvez o problema inicial
fosse emocionalmente alimentado pela vulnerabilidade de Anita em
ser abandonada ou negligenciada e a sensibilidade de Ralph à crítica.
O estresse de Anita com os problemas no trabalho naquele dia criou
um senso de urgência nela, enquanto a excitação de Ralph em relação
ao seu novo software contribuiu para sua distração.
Em resposta ao problema inicial, o casal fez esforços para resol­
ver a dificuldade. Anita tentou resolver compartilhando seus senti­
mentos com Ralph e depois apresentando evidências de sua “insensi­
bilidade”; Ralph tentou resolver o problema, apontando para Anita
que suas emoções são intensas demais e, mais tarde, apresentando exem­
plos de sua reatividade excessiva. Esses esforços de manejo da situação
não só foram frustrantes, mas também criaram um problema reativo,
um conflito posterior maior do que o inicial. Agora eles devem lidar
com a dor e a raiva que cada um sente como consequência dos ata­
ques do outro — a sensação de Anita de que Ralph realmente não se
importa com seus sentimentos e a dele de que ela vai lhe lançar acusa­
ções injustificadas à menor provocação. Além disso, há agora um rom­
pimento na relação que esta briga criou - Ralph traz vagas sugestões
de que talvez Anita “devesse encontrar alguém.”
Por que isso acontece? Frequentemente, somos capturados pelo ca­
lor do momento de nossas discussões, as quais parecem que acontecem
conosco ao invés de ser algo em que ativamente participamos. Para enten­
der melhor a anatomia de uma discussão, vamos dividi-la em seus três
componentes principais: o conteúdo do problema inicial, o processo
como lidamos com esse problema inicial e o problema reativo criado por
nossas tentativas fracassadas de resolver o problema inicial.
156 Uma cura pior do que a doença

0 PROBLEMA INICIAL: 0 CONTEÚDO DO CONFLITO

Como já discutimos, nossas diferenças (ou similaridades) e sen­


sibilidades emocionais são como material inflamável. Se mantidos em
um lugar fresco e escuro em recipientes separados, eles não criam pro­
blemas. Mas se essas diferenças e sensibilidades emocionais se encon­
tram em um incidente provocador, particularmente quando expostos
ao calor ou atrito de eventos estressantes, elas acendem. Com Ralph e
Anita, a combinação do novo software dele e os problemas dela no
emprego, bem como o fato de que ambos estavam cansados de um
longo dia de trabalho, desencadeou a combustão. A consequência ime­
diata quando sensibilidades e incompatibilidades são desencadeadas
são sentimentos negativos como dor, decepção e raiva. Primeiro Anita
foi magoada e ficou desapontada por Ralph estar desatento à ela — es­
ses eram seus sentimentos ocultos. O que ela lhe expressou, no entan­
to, era o sentimento superficial: raiva.
O problema inicial que um casal enfrenta - um evento ou cir­
cunstância desencadeante, a diferença ativada e a sensibilidade emo­
cional, e as reações imediatas de cada um - fornece o conteúdo de sua
interação. O problema inicial é o que cada um pensa durante o con­
flito, o que os dois discutem durante a briga. Esses problemas iniciais
estabeleceram a agenda inicial para discussões de conflitos.
Tipicamente, os casais focalizam a situação desencadeante em vez
das amplas diferenças entre eles ou as sensibilidades emocionais dentro de
cada parceiro. Por exemplo, embora Gabriel prefira um estilo de vida des­
contraído, fácil de levar, enquanto Jana é ambiciosa e quer crescer finan­
ceiramente, eles raramente discutem essa ampla diferença entre eles. Em
vez disso, eles são muito mais propensos a discutir incidentes perturbado­
res que refletem essa incompatibilidade. Eles podem discordar sobre se
vão tirar férias em lugares caros, que Gabriel prefere, ou fazer algo mais
econômico e poupar seu dinheiro, o que Jana prefere. Um conflito pode
começar quando Jana se levanta cedo em uma manhã de sábado para
aproveitar o tempo e realizar várias coisas em vez de passar a manhã pre­
guiçosamente na cama com o parceiro. O comentário de Gabriel de que
Diferenças Reconciliáveis 157

seu registro de vendas este ano será menor do que o do ano passado pode
orecipitar uma discussão sobre quanto esforço ele está colocando no tra­
balho. Em cada um desses três casos, Gabriel e Jana estão discutindo um
evento desencadeante, que é uma manifestação de suas abordagens de
vida um tanto incompatíveis.
Nós nos importamos profundamente com o conteúdo de nos­
sos conflitos. Estamos investidos em fazer sexo esta noite, em não ir
à casa dos sogros neste fim de semana, e em obter mais atenção de
nossos parceiros. Queremos a liberdade de tirar o fim de semana
fora para uma caminhada com um amigo ou o poder de comprar o
novo sofá para a sala de estar. Nós nos importamos porque o conte­
údo do conflito representa o problema que enfrentamos: um parcei­
ro que difere de nós em uma questão importante, que não lida devi­
damente nossas sensibilidades emocionais, e que não é atencioso às
nossas circunstâncias estressantes.

TENTATIVAS DE RESOLVER OU LIDAR COM 0


PROBLEMA INICIAL: 0 PROCESSO DE CONFLITO

Qualquer problema particular, de início, pode ser manejado de


várias maneiras. Gabriel e Jana poderíam debater sobre suas escolhas
de férias, apresentando as vantagens de cada ponto de vista. Eles po­
deríam barganhar e negociar suas escolhas, tal como um propor um
tipo de férias para irem este ano e o outro escolher no próximo. Em
contrapartida, Jana ou Gabriel poderíam fazer planos unilateralmente
e informar o outro sobre o que foi feito. Jana poderia criticar Gabriel
por sua irresponsabilidade ao propor gastar todas as suas economias
com umas férias. Gabriel poderia criticar Jana por sua mesquinharia e
incapacidade de aproveitar a vida. Ele poderia ir embora com raiva até
Jana apoiar o ponto de vista dele. Combinações destas maneiras de li­
dar e outras abordagens também são possíveis. O ponto é que o con­
teúdo do conflito, fornecido pelo problema inicial, é distinto do proces­
so de conflito, que é como os casais manejam o problema inicial.
158 Uma cura pior do que a doença

Graça e Josué discordam sobre o serviço doméstico. Graça se


sente confortável apenas quando sua casa está completamente organi­
zada e impecável. Além disso, sua autoestima está atrelada ao estado
de seu lar: se os amigos a visitam e sua casa não está impecável ou está
desorganizada, ela ficaria envergonhada. Mas Graça acredita em igual­
dade, e assim quer que Josué compartilhe das tarefas domésticas. Di­
ferentemente de Graça, Josué acha a bagunça, de alguma maneira, um
pouco reconfortante. Se ele vivesse sozinho, sua casa teria que ser po­
sitivamente insalubre para que ele se sentisse envergonhado quando
outros o visitassem. Embora ele geralmente endossa a ideologia da
igualdade entre homens e mulheres, ele certamente não quer fazer me­
tade do trabalho doméstico, se isso significa fazer este trabalho segun­
do os altos padrões de Graça. Além disso, ele acha que seu envolvi­
mento com os carros da família deve contar na equação do trabalho
doméstico. Todas essas diferenças definem o problema inicial que
Graça e Josué têm sobre este tema.
Graça e Josué poderiam lidar com esse problema através de di­
ferentes padrões de comunicação. Eles poderiam negociar horários de­
talhados de quem tem que fazer o quê e quando. Eles poderiam brin­
car um com o outro sobre a compulsividade de Graça e o desleixo de
Josué. Ou, em um cenário mais complicado, Graça poderia fazer a maior
parte do trabalho doméstico sozinha, mas experimentar um ressentimen­
to crescente que, eventualmente, levaria a uma explosão emocional que
colocaria Josué, já se sentindo culpado, em ação. Ele ajudaria muito
por um tempo, mas depois voltaria a fazer pouco até que Graça assu­
misse completamente e o padrão se repetisse. E importante observar
que o processo de conflito de Graça e Josué não é uma tentativa deli­
berada de punir um ao outro; em vez disso, é uma maneira de tentar
lidar com o conteúdo de seu problema inicial.
Podemos reconhecer, mas ignorar o processo do conflito, ou
podemos não ter consciência disso. Colados em nossos sentimentos
de raiva e mágoa, não consideramos a maneira como lidamos com es­
ses problemas. Dado nossas dificuldades, não podemos imaginar ou­
tras formas de interagir. Carlos não conhece outra maneira de lidar
Diferenças Reconeiliáveis 159

com seu grande apetite sexual do que pressionar Janete. Se ele não
exige, ele teme que não tenham nenhuma vida sexual. Lori não co­
nhece outra maneira de lidar com a falta de envolvimento de Manuel
com as crianças do que criticá-lo quanto a isto e se queixar de ser uma
mãe solteira”. Se ela não se queixar, ela teme que ele vai esquecer
completamente seu papel de pai. E assim o padrão continua.
Vimos como o conteúdo do conflito tipicamente vem das dife­
renças (ou similaridades) entre os parceiros e suas sensibilidades emo­
cionais, muitas vezes como provocado por circunstâncias estressantes. O
processo de conflito é como o casal tenta resolvê-lo por meio da sua in­
teração. Infelizmente, essas “soluções” frequentemente tornam o proble­
ma pior. São curas tóxicas que agravam a doença. Eles são tratamentos
que são piores do que a doença. Sua intenção é criar mudanças para
melhor; seu resultado é criar uma mudança para pior. Abaixo detalha­
mos tipos específicos de curas tóxicas.

Acusar, culpar e coagir movendo-se contra o outro

A cartilha clássica da briga acalorada é acusar, culpar e coagir. Nós


responsabilizamos nossos parceiros pelo problema inicial, e os pressio­
namos para mudar como um meio de reparar o problema. Poderiamos
também adicionar o defender-se. Se nossos parceiros nos acusam de
qualquer participação no problema, nós nos defendemos (e então pro­
vavelmente contra-atacamos quando vemos uma abertura).
Podemos culpar nossos parceiros por uma ação particular, talvez algo
que desencadeou o problema inicial. Ou, em vez de acusá-los de comporta­
mentos específicos, podemos acusá-los de amplas características de persona­
lidade negativas. Nós nos envolvemos em achar um culpado, situação des­
crita no Capítulo 2, analisando nossos problemas e concluindo que eles são
causados pelas fraquezas morais, problemas mentais ou inadequações pes­
soais de nossos cônjuges. Acusamos nossos parceiros de serem maus, cul-
pando-os por instabilidade emocional, ou os castigamos por incompetên­
cia. Claro, eles podem se defender e nos devolver a cobrança.
160 Uma cura pior do que a doença

A coerção vai além do simples ataque aos nossos cônjuges. Com


coerção, nós os forçamos a fazer o que queremos, cercando-os com
um comportamento aversivo. Fazemos exigências, ameaçamos, resmun­
gamos, criticamos, reclamamos e induzimos a culpa até que nossos
parceiros cedam. Então, às vezes conseguimos o que queremos e eles
conseguem a paz. Quando isso acontece, nossos esforços coercitivos
são reforçados porque nossos parceiros cumprem nossas demandas; e
este cumprimento é reforçado porque paramos de ter nossas ações co­
ercitivas. E assim o padrão se torna enraizado.
A coerção tem um apelo sedutor porque produz respostas tão
imediatas. Mas, como uma droga viciante que exige dosagens crescen­
tes para obter o mesmo efeito, níveis mais elevados de coerção são ne­
cessários para obter a resposta desejada. Durante os estágios iniciais
do romance, pequenas indicações de insatisfação podem ter atraído a
atenção de nossos parceiros e levado a tentar corrigir a situação. Mas
com o tempo, eles podem se acostumar com nossas tentativas coerci­
tivas, podem deliberadamente ignorá-las, e, até mesmo, ativamente
resistir a elas. Enquanto elevar um pouco o tom da voz era tudo o que
era necessário no início do relacionamento, agora gritos e berros po­
dem ser necessários para obter uma reação.
As recompensas imediatas da coerção são muitas vezes diminuí­
das pelos custos finais. Embora nossos companheiros obtenham paz
cedendo, eles podem achar nossas demandas cada vez mais onerosas.
Podem ficar chateados consigo mesmos por serem fracos, por cumprir
nossas exigências. E podem ficar cada vez mais irritados e resistentes
quando os pressionamos.
Coerção gera contracoerção e punição. Nossos parceiros não
apenas respondem a nossas tentativas coercitivas; eles iniciam as suas
próprias. E eles punem nossos fracassos para satisfazer suas próprias
necessidades. Um círculo vicioso de coerção mútua e punição rapida­
mente se desenvolve. Por mais bem sucedidos que sejam esses esforços
coercitivos e punitivos no curto prazo, eles corroem os sentimentos
positivos e a atmosfera amorosa no relacionamento.
Diferenças Reconeiliáveis 161

Evitação, negação e distanciamento: afastando-se do outro


Evitação é um método consagrado para lidar com problemas.
Olhe para o outro lado. Envolva-se em outra coisa. Problemas são desa­
gradáveis, por isso não vamos enfrentá-los; eles provavelmente vão se re­
solver por conta própria. Discuti-los diretamente pode piorar as coisas.
A evitação funciona em curto prazo. O que escolhemos fazer
quando evitamos problemas nos dá mais prazer (e é mais fácil) do que
enfrentá-los. Não importa qual programa, assistir televisão vai propor­
cionar mais relaxamento do que discutir incompatibilidades ou tentar
acalmar as sensibilidades emocionais. Entretanto, com frequência,
carregamos conosco uma persistente sensação de incômodo com o
problema quando o evitamos.
Podemos obter os benefícios da evitação e também diminuir o des­
conforto persistente se minimizarmos, rejeitarmos ou mesmo negarmos a
própria existência do problema. Não há nada realmente errado. Tudo está
bem. Portanto, não há nada para discutir. Podemos nos afastar.
Evitação, negação e distanciamento podem funcionar em longo
prazo, bem como em curto prazo. As vezes, os problemas se desenvol­
vem a partir de uma combinação única de circunstâncias; uma discus­
são poderia complicar ou prolongar um problema que desaparecería
com a mudança das circunstâncias. Mirian nota o flerte de Lucas com
outra mulher no piquenique da empresa. Ela se sente magoada com seu
comportamento, mas evita a discussão. Então ela nega a si mesma que
as atitudes dele foram mesmo inadequadas. Ele é apenas um típico ho­
mem americano, bebeu e havia outra mulher bonita na frente dele. A
menos que ele não repita seu comportamento em festas futuras, a evita­
ção e negação de Mirian (e Lucas) não têm maiores consequências. A
discussão poderia ter aumentado a tensão entre eles, embora também
pudesse ter levado a uma maior compreensão e valorização.
As vezes, os problemas de longa data melhoram ao longo do
tempo. Novas circunstâncias e crescimento individual diminuem os
problemas que uma vez foram evitados e negados. David frequente­
mente se ressentia do apego de Leonardo a sua mãe, mas, exceto por
162 Uma cura pior do que a doença

algum sarcasmo e insinuações ocasionais, nenhum dos dois trazia o


assunto para discussão. No entanto, à medida que desenvolveram suas
carreiras individuais e sua própria vida juntos, o apego de Leonardo à
mãe e o ressentimento de David a respeito diminuíram. O problema
evitado melhorou por conta própria.
Esses exemplos são, no entanto, a exceção e não a regra. Evita-
ção e negação são mais propensas a nutrir problemas do que sufocá-
-los, especialmente quando esses tocam em diferenças importantes ou
sensibilidades emocionais. Novas circunstâncias geralmente não são
tão fortuitas ou o crescimento individual não é tão benéfico para apa­
gar as dificuldades crônicas. Mais frequentemente, a tensão e o ressen­
timento aumentam nos dois. Mesmo que eles possam se recusar a dis­
cutir um problema e negar que ele existe, suas emoções forçam uma
discussão de qualquer tipo. Indiretamente, por meio de seus humores
ou através de brigas menores não relacionadas, eles comunicam sua
insatisfação. No entanto, mesmo que não haja uma discussão direta,
os parceiros podem facilmente se comunicar mal, ficarem confusos, e
tornar o problema ainda pior.
Barbara se sente infeliz com seu relacionamento sexual com So-
lón. Ela o vê como um amante egoísta, insensível às necessidades dela,
mas perseguindo vigorosamente as suas próprias. Ela não discute sua
insatisfação diretamente com Solón, mas se retrai da interação sexual
com ele. Ela mostra menos interesse em fazer amor e não se entrega
quando o faz. Solón sente-se angustiado pelo retraimento e desinteresse
dela e se pergunta se Barbara é “frígida”, mas ele também evita a discus­
são. Ele reage com iniciativas e tentativas muito vigorosas, o que, por
sua vez, dá mais evidência para Barbara de que ele é um amante egoísta.
Ela se distancia ainda mais, o que fornece maiores evidências para Solón
que ela é frígida. A evitação do problema o torna pior.

Vigilância, instrusão e violação: grudado no outro


Ao invés de nos movimentarmos contra nossos parceiros com
acusações, culpas e coerção ou nos afastando deles com evitação, ne­
Diferenças Reconeiliáveis 163

gação e distanciamento, podemos nos mover para nossos parceiros,


mas com preocupação e ansiedade. Se temos medo de que eles nos
deixem, podemos vigiá-los de perto, invadir sua privacidade ou violar
seu território. Considere Jane e Nancy. Por causa de sua beleza física,
Jane facilmente atrai atenções de outras mulheres e teve muitas namora­
das antes de Nancy. Ao longo de seu relacionamento, Nancy estava mais
comprometida com a relação e mais interessada em se casar. Sabendo o
quanto Jane atrai outras mulheres e sentindo sua falta de comprometi­
mento equivalente e recíproco a ela, Nancy teme que possa perder Jane.
Quando está fora da cidade, às vezes pede a uma amiga para passar na
frente de sua casa, tarde da noite, para se certificar se Jane está em casa e
não tenha carros estranhos na frente da garagem. Quando ela não está
olhando, Nancy às vezes pega o telefone celular de Jane para ver quem
ligou e ver para quem Jane telefonou. Quando elas saem juntas, Nancy
tenta ficar longe de bares ou outros ambientes públicos onde outras
mulheres olhariam para Jane e se sentiriam atraídas por ela. Quando
Jane quer passar uma noite sozinha ou com amigos, ela questiona sobre
o plano específico para a noite. Assim Nancy resguarda Jane da exposi­
ção a outras mulheres e a mantém sob vigilância para o caso dela se sen­
tir tentada a entrar em contato com elas.
Quando houve uma traição de confiança em um relacionamen­
to, como quando um parceiro tem um caso, a vigilância, a intrusão, e
a violação são frequentemente os resultados. O parceiro traído, com-
preensivelmente, perde a confiança no outro e, para evitar outra trai­
ção, pode se manter, ansiosamente, em alerta. Porque Ricardo teve
um caso em uma das muitas viagens exigidas pelo seu trabalho, Clara
fica preocupada sempre que ele viaja novamente. Liga para ele, fre­
quentemente, enquanto está fora e o questiona sobre suas atividades e
planos. Ricardo protesta dizendo que o ocorrido foi uma insignifican­
te transa de uma noite e que ele revelou a Clara logo depois. Ele diz a
ela que se sente interrogado enquanto ele está fora, mas ela quer se
proteger de outra traição e faz isso investigando o que ele faz.
Ligar-se obsessivamente no outro pode ser causado não somen­
te por traição ou falta de comprometimento, mas por sensibilidades
164 Uma cura pior do que a doença

emocionais. Se Diovana teme o abandono daqueles próximos a ela,


com base em sua própria história pessoal, então ela pode se empenhar
numa ansiosa vigilância de Dante ou violar a privacidade dele, mesmo
que ele nunca tenha traído e esteja totalmente comprometido com
ela. No entanto, algumas características de Dante, tais como seu dese­
jo de passar tempo com seus amigos, longe de Diovana, ou seu desejo
de passar um tempo sozinho, poderiam ativar os medos dela, e, con­
sequentemente, ela obsessivamente se cola nele.
Manter os outros sob vigilância, intrometer-se em suas vidas e
infringir seu território pode dar alguma satisfação temporária. Você
recebe respostas imediatas e seus medos podem ser temporariamente
atenuados. No entanto, seus efeitos em longo prazo são, muitas vezes,
decepcionantes. Há um velho provérbio que diz: “Nunca confie em
um homem que nunca teve a chance de roubar.” Se você limita as li­
berdades dos outros a partir de seus medos do que eles podem fazer,
você nunca terá a experiência de construção de confiança de ver que
eles retornam e que eles não traem. Além disso, suas intrusões podem
ser contraproducentes, criando a própria coisa que pretendiam impe­
dir. Interrogar ansiosamente um parceiros pode levá-lo a compartilhar
cada vez menos, porque a experiência é tão desagradável e porque eles
temem a sua reação se eles compartilham, inclusive, informações inó­
cuas. Em casos extremos, a invasão pode reduzir o compromisso do
parceiro ou desejo de permanecer no relacionamento, desencadeando
assim o abandono que a intrusão se destinava a evitar.

Alianças e coalizões: indo contra o outro com ajuda externa


Rafael achava difícil conversar com Mônica sobre qualquer pro­
blema entre eles. Sentindo-se desconfortável com tais discussões, ele
abordava forma crítica, e ela reagia friamente, mostrando nenhum in­
teresse em prosseguir o assunto. A atitude dela poderia ser resumida
em seu clichê favorito: Deixa as coisas quietas. Como Rafael sempre
teve um relacionamento próximo com sua mãe, ele começou a lhe
contar seus problemas com Mônica. Sua mãe fez algumas sugestões
Diferenças Reconeiliáveis 165

discretas mas bem pontuais para Mônica, que inicialmente respondeu


com tolerância educada. Então, como as sugestões continuavam che­
gando, Mônica ficou cada vez mais fria com ela, finalmente dizendo à
sua sogra para não meter o nariz onde não era chamada. Rafael e Mô­
nica começaram a brigar por causa da mãe dele, com Mônica critican­
do-a e Rafael defendendo-a. Ele e sua mãe preocupavam-se com as la­
mentações sobre os problemas e inadequações de Mônica. Esta se sen­
tiu cercada; a mãe de Rafael se sentiu rechaçada; e Rafael sentiu-se en­
curralado entre sua esposa e sua mãe. O que havia sido um problema
corriqueiro entre Mônica e Rafael se tornou um conflito entre os três.
Quando experimentamos dificuldades de qualquer tipo, mas es­
pecialmente dificuldades interpessoais, procuramos o apoio e o conse­
lho de outros. Queremos um aliado para ouvir o nosso ponto de vista,
para validar a nossa posição, para apoiar os nossos esforços, e talvez para
nos dar conselhos. Esta tendência universal de buscar abrigo pessoal em
uma tempestade pode restaurar a calma para nossas emoções, restabele­
cer nossa confiança abalada, e fornecer orientação e motivação para os
nossos esforços para lidar com a dificuldade. Mas essa aliança diante da
adversidade pode se tornar uma coalizão contra a suposta causa da ad­
versidade. A pessoa que experimenta dificuldade pode, inicialmente,
procurar uma aliança para o apoio individual, mas então ele ou ela arre­
gimenta o novo aliado na luta contra o parceiro romântico.
Infelizmente, a aliança com aquele que está lhe apoiando, com
frequência perturba a aliança com o parceiro romântico. Então, como
esses esforços, compreensíveis para buscar o apoio de outros, vão mal?
Primeiro, os outros podem alimentar o fogo da discórdia. Eles podem
encorajar nossas tendências a culpar e punir nossos parceiros por difi­
culdades que são causadas mutuamente. Se damos voz aos nossos de­
sejos de deixar o relacionamento, eles podem nos encorajar nessa bus­
ca. Se mais tarde nos acertarmos com nossos parceiros, nossos aliados
podem ficar confusos e questionar nossa sabedoria. Antes, apresenta­
mos nossos parceiros como vilões e sonhamos escapar deles. Por que
mudamos tão dramaticamente? Em segundo lugar, os outros podem
interferir ativamente nas nossas relações. Por mais bem-intencionados,
166 Uma cura pior do que a doença

eles podem assumir a responsabilidade de nos ajudar por meio de pa­


lavras ou ações entregues diretamente aos nossos parceiros. Normal­
mente, esses esforços são contraproducentes: nossos parceiros ficam
com raiva de nós e de nossos aliados por “se meterem”. Em terceiro
lugar, outros podem proporcionar benefícios substitutos que enfra­
quecem o nosso relacionamento. O marido que busca compensação
dos problemas com sua esposa tendo conversas íntimas sobre suas di­
ficuldades conjugais com outra mulher pode encontrar consolo tem­
porário e conforto. No entanto, as conversas íntimas com a outra mu­
lher podem levar a uma proximidade que exclui a esposa. Se sua espo­
sa descobre esse outro relacionamento, ela pode ficar furiosa com a
traição da confidencialidade conjugal e suspeitar que algo a mais está
acontecendo. Mesmo que ela nunca descubra este outro relaciona­
mento, o fato de que outra mulher está atendendo suas necessidades
enfraquece a relação com a esposa. Em quarto lugar, o envolvimento
de outros pode criar problemas para esses aliados inocentes. O exem­
plo mais óbvio e frequente ocorre quando os pais usam os filhos como
aliados em suas dificuldades conjugais. A aliança pode colocar as
crianças numa posição de lealdade dividida, o que leva à ansiedade e
estresse. Elas podem sentir que devem “escolher lados” no conflito.
Podem sentir que devem ver um dos pais como bom e o outro como
mau. Se as alianças entre pais e filhos se tornam demasiado intensas, a
proximidade pode inibir o desenvolvimento das crianças. Estas preci­
sam de tempo com os colegas e liberdade emocional para desenvolver
apegos com seus pares. Se as crianças passam a maior parte do seu
tempo com um dos pais ou se se preocupam com um dos pais ou com
o casamento deles, não terão liberdade suficiente para desenvolver a
sua própria independência.
Nossos esforços compreensíveis e humanos para buscar a famí­
lia e amigos em tempos difíceis do relacionamento pode aliviar o nos­
so estresse e nossas dificuldades. Podemos encontrar consolo temporá­
rio de nossos problemas e força para renovar nossos esforços para re­
solvê-los. Podemos obter um alívio emocional da tensão, novas pers­
pectivas sobre os problemas e novas idéias para resolvê-los. No entan­
Diferenças Reconeiliáveis 167

to, se a nossa família e amigos interferem diretamente no nosso rela­


cionamento, se eles promovem visões controversas dos problemas e se
eles oferecem uma fonte contínua de benefícios e satisfações que deve­
riamos receber de nossos parceiros, esses aliados bem-intencionados
podem piorar nossos problemas.

0 PROBLEMA REATIVO: UM PROBLEMA PIOR,


UM PROBLEMA ADICIONAL, UMA FENDA RELACIONAL

Se no início você não tiver sucesso, tente, tente novamente.

Temos discutido a comunicação que ocorre em um único con­


flito ou discussão. Um incidente, por si só, raramente constitui um
problema de relacionamento. Uma única discussão pode ser desagra­
dável, mas não vai levar um casal para o sofá do terapeuta ou enviá-los
para a seção de autoajuda de sua livraria local. É a repetição que trans­
forma as discussões em problemas de relacionamento. Usamos as mes­
mas curas tóxicas para tentar resolver o mesmo problema — uma e ou­
tra vez. A repetição de curas tóxicas cria o problema reativo, que é
normalmente muito mais preocupante do que o conteúdo do proble­
ma original ou o processo de uma única discussão.
A repetição não significa, necessariamente, que nós aplicamos as
mesmas curas tóxicas da mesma maneira. Á medida que nos debate­
mos com o problema, vamos adotar muitas variações em torno da
mesma “solução”. Repetimos a mesma dança, mas com passos dife­
rentes. Considere o problema de ciúme de Valéria e Benício. Ele tenta
lidar com seu ciúme de Valéria de várias maneiras diferentes: às vezes
ele a interroga muito sobre suas ações (“Então, o que você e Billy esta­
vam discutindo na festa?”), ocasionalmente ele solta, grosseiramente,
uma exigência (“eu quero conhecer esses chamados parceiros de negó­
cios antes de você almoçar com eles”), ou às vezes na presença de ou­
tros ele fica rondando-a, tentando resguardá-la de pretendentes imagi­
nários. Estas são suas tentativas de resolver o problema do ciúme. Por
168 Uma cura pior do que a doença

seu lado, Valéria, muitas vezes, contorna as perguntas acusadoras, tenta


escapar da presença dele que a rodeia, e ocasionalmente, por raiva de
Benício, ostenta seu charme e procura a atenção de outros homens de
forma provocante. Por mais variado, o comportamento dele reflete uma
vigilância pesada, severa e cheia de suspeita, enquanto que o comporta­
mento dela varia entre evitando ele e suas perguntas, por um lado, e,
por outro lado, fica irritada, num flerte provocador com outros ho­
mens. Suas tentativas de solucionar o problema do ciúme criaram um
ciclo vicioso de interação que, longe de resolver o problema, o sustenta.
Se percebermos, mesmo que vagamente, que estamos num cír­
culo vicioso de interação, podemos nos concentrar na pergunta
“Quem começou?” Nós dois ficamos presos em um padrão negativo,
mas quem começou a coisa em primeiro lugar?
Naturalmente, discordamos. Cada um de nós se vê como rea­
gindo ao comportamento negativo do outro. Acho que começou
quando você me ignorou; Você acha que começou com minha crítica.
Acho que começou com a sua frieza; Você acha que começou com
minha preocupação. Mas quem está certo?
Nós dois estamos certos e ambos errados. Uma vez que estamos
em um relacionamento, nunca podemos “começar do zero”. Nossas
discussões atuais são afetadas pelas passadas. Podemos decidir que
uma discussão em particular não tem nada a ver com qualquer dispu­
ta do passado, mas isso simplesmente não é verdade. O evento passa­
do que escolhemos como ponto de partida será um tanto arbitrário.

Esposa: Eu venho para casa, eu cumprimento feliz, e você está com


uma cara feia para mim.
Marido: Você não liga o dia inteiro, e então você vem para casa e me
dá esta saudação “inocente”. E você espera que eu responda como?

Neste exemplo, o marido e a esposa veem a discussão começan­


do em diferentes pontos. A esposa acha que a briga começou quando
ela chegou em casa. Ele acha que começou mais cedo, quando ele es­
perava um telefonema. Ela não achou que tinha que ligar. Ela não es-
Diferenças Reeonciliáveis 169

tava tentando apaziguá-lo com uma saudação especialmente alegre. Além


disso, ela não saiu naquela manhã ruminando sobre qualquer problema
não resolvido do passado. Ela não tinha nenhuma ressaca de qualquer in­
teração anterior. Para ela, a discussão realmente começou quando ela che­
gou em casa. Mas para ele a briga começou quando ela deixou de ligar.
Ele esperava que ela ligasse, e quando ela não o fez, ele ficou chateado.
Assim, há dois começos para esta questão: o dele e o dela. A interação ge­
nuinamente começou em diferentes pontos para eles.
Decidir quando uma discussão começa e termina fica ainda mais
complicado quando elas são repetitivas, quando elas fazem pane de ciclos
viciosos de comunicação. O exemplo anterior era uma situação isolada.
Mas considere Phillipe, que muitas vezes resmunga para Jennifer pegar
suas coisas e manter a casa limpa e ordenada. Ela muitas vezes resiste a
seus esforços e se queixa da “reclamação” dele. Ele diz para si mesmo: “Eu
tenho que censurá-la porque ela resiste em fazer o que ela deveria. Se ela
não resistisse, eu não precisaria importuná-la.” Na sua opinião, o proble­
ma começa com a resistência dela e é seguido por sua irritação. E claro
que ela diz a si mesma: “Eu resisto a ele porque ele me censura, se não me
importunasse, eu não resistiría”. Na sua opinião, o problema começa com
a sua irritação dele e é seguido por sua resistência.
Podemos pensar em nosso relacionamento como um filme lon­
go e contínuo. Quando discutimos, mostramos partes do filme. Não
podemos mostrar tudo, então selecionamos partes. Mas essa edição
do filme — essas decisões sobre onde começar e terminar o episódio —
cabe ao editor. Cada editor escolhe um começo diferente e um final
diferente. Nós geralmente começamos o filme com nossos parceiros
fazendo algo para nós e terminamos com nossa reação justificável.
Nós somos bons; eles são maus. Não surpreendentemente, nossos par­
ceiros começam o episódio com nosso comportamento e terminam
com sua reação compreensível. Eles são bons; nós somos maus.
Não importa a maneira como a interação inicia, pois sempre
que o filme começa a rolar podemos entrar em alguma versão do nos­
so círculo vicioso de interação. Estes ciclos viciosos não só sustentam
os nossos problemas e impedem a sua resolução, como podem exacer-
170 Uma cura pior do que a doença

bá-los e criar problemas adicionais. Esta exacerbação do problema


existente e/ou criação de um novo é chamada de problema reativo.
Embora cada ciclo seja único, descobrimos que os problemas reativos
tendem a cair em três grandes padrões negativos: escalada, polarização
e alienação. Ao repetirmos a mesma solução infrutífera aos nossos
problemas, persistindo em querer que nossos parceiros mudem, nos­
sas tensões podem aumentar, nossas posições podem ficar polarizadas
e podemos nos afastar uns dos outros.

Escalada

A medida em que lidamos ineficazmente com o problema ini­


cial, criado quando nossas diferenças e sensibilidades emocionais são
desencadeadas, frequentemente em uma situação estressante, é co­
mum criarmos um problema pior. A discussão intensifica: nossa ten­
são aumenta, nossas vozes se tornam mais duras ou mais altas, nossas
emoções são amplificadas. O volume sobe, literal e figurativamente.
Começamos com um pequeno conflito; agora é um grande conflito.
A escalada geralmente ocorre por meio de uma espécie de “cur­
to-circuito” na interação. À em medida que experimentamos um cír­
culo vicioso de comportamento repetidamente, tendemos a antecipar
sua ocorrência. Então, às vezes, respondemos à nossa expectativa tanto
quanto a nossos parceiros e entramos no círculo mais rápida e inten­
samente do que faríamos de outra forma. Por exemplo, considere um
padrão de crítica e defensividade. Erik é frequentemente crítico com
Alicia, particularmente sobre sua bagunça e falta de organização. Ela
tende a responder com atitude defensiva, tentando convencê-lo de
que ela está muito ocupada para pôr as coisas fora ou tentando lhe
mostrar que ela tem seu próprio sistema de organização. Conforme
esse padrão se repete, Alicia prevê a crítica de Erik e ficará na defensi­
va mesmo antes de ser criticada. Por exemplo, ela pode tentar explicar
por que seus papéis estão no sofá, mesmo antes de ele ter notado. Por
sua parte, Erik já espera que as coisas estarão fora de lugar e ficará irri­
tado com Alicia, mesmo antes dele ter visto qualquer coisa fora de or­
Diferenças Reconeiliáveis 171

dem. Quando suas respostas são ‘curto-circuitadas’ como estas, o casal


estará preparado para reações emocionais. Eles provavelmente terão
um encontro mais intenso do que normalmente teriam, porque suas
expectativas os tinham preparado para isso.
Discussões podem aumentar não apenas verticalmente, com um
aumento na tensão, mas também horizontalmente, com uma expan­
são de foco. Novas questões são levantadas durante o conflito, algu­
mas legitimamente relacionadas com o tema original, algumas trazidas
apenas para “contra-atacar” o outro. Na briga de Anita e Ralph, Anita
mencionou o comportamento de Ralph em relação à doença terminal
de seu pai; Ralph mencionou a forma que Anita educa as crianças. Os
casais entram numa discussão acirrada e falam de tudo, menos do que
realmente deveria ser discutido.
Um rumo comum no qual as discussões escalam é em direção ao
seu próprio processo. Embora os casais estejam frequentemente focados
no conteúdo de suas incompatibilidades e sentimentos feridos, mais do
que no processo pelo qual lidam com esses problemas, em certos mo­
mentos sua interação torna-se tão dolorosa para um ou ambos que ela
vira o foco da discussão. As vezes, quando Lori critica Manuel por não
estar envolvido com seus filhos, ele pode criticá-la por sua crítica: “Tudo
que você faz é reclamar e criticar. Você não consegue pensar em algo
melhor pra fazer?” E ela pode defender seu comportamento - “Não te-
ria que reclamar se você tomasse alguma atitude” — ou ela pode atacá-lo:
“Você não consegue receber qualquer crítica, não é, mesmo quando é
100% merecida?” Neste ponto eles estão discutindo sobre a maneira
que eles discutem. Eles estão criticando um ao outro por serem críticos.
Agora o processo de sua interação, a forma como lidam com seu pro­
blema, tornou-se o conteúdo de sua discussão. Sua solução para o pro­
blema tornou-se o problema. A “cura” tornou-se a doença.

Polarização
Quando lidamos com nossos problemas de forma ineficaz, mui­
tas vezes ficamos polarizados em nossas posições. Ficamos mais rígi-
172 Uma cura pior do que a doença

dos, fixados e radicais em nossos pontos de vista. Embora pudéssemos es­


tar abertos à escuta e tentando compreender a posição de nosso parceiro
antes da discussão, uma vez que a briga está em andamento nós paramos
de escutar. Em vez disso, ficamos mais convencidos de nossas próprias
posições. No calor de uma discussão, nos envolvemos no que o psicólogo
John Gottman chamou de “síndrome da minha síntese”. Reafirmamos
nossas próprias posições ou as declaramos de maneira um pouco diferen­
te, e depois resumimos tudo o que dissemos. A medida que nos escuta­
mos repetindo os argumentos em favor de nossos próprios pontos de vis­
ta, ficamos cada vez mais convencidos de que estão corretos.
Não só ficamos mais convencidos de nossas próprias opiniões,
como também podemos nos tornar mais radicais. Embora no início
da discussão possamos sentir justificadamente que temos um ponto
importante a trazer, à medida que a discussão avança, podemos sentir
que o que pensamos é a única coisa que vale a pena. Nosso ponto é o
óbvio. Só um tolo argumentaria contra isso. Quaisquer outras idéias
são, na melhor das hipóteses, irrelevantes e, na pior das hipóteses,
uma tentativa desonesta de minar a verdade.
Ás vezes, a própria discussão nos fornece evidências que nos tor­
nam mais convencidos da retidão de nossas opiniões. A medida em que
a briga entre Anita e Ralph entrou em escalada, ela ficou mais conven­
cida de que Ralph pouco se importa com ela. Ele certamente não mos­
trou nenhum cuidado durante a discussão; em vez disso, ele rejeitou
completamente as inquietações dela. Por sua parte, Ralph encontrou
provas incontroversas de que Anita reage exageradamente a problemas
pelo fato de sua crescente perturbação durante a discussão. Assim am­
bos encontraram evidência na briga que polarizou suas posições.
A polarização ao longo do tempo também pode ocorrer de ma­
neiras mais sutis. Um conflito repetido e uma pressão sobre determi­
nada questão pode esmagar nosso interesse inerente ou desejo espon­
tâneo. Considere as diferenças de Enrico e Rosa no desejo de contato
sexual. Por causa dessas diferenças, Enrico toma a iniciativa sexual
com Rosa muito mais do que ela faz com ele e mais do que ela gosta­
ria que ele o fizesse. Com frequência Rosa recusa, e ele fica magoado.
Diferenças Reeoneiliáveis 173

o que com faz com que ela se sinta culpada. Ao longo do tempo, ela
fica apreensiva e receosa em relação às aproximações dele. Ela começa
a questionar seu próprio interesse sexual, particularmente seu interesse
por Enrico. Tudo isso reduz qualquer interesse sexual inerente e es­
pontâneo que ela tivesse em relação à ele. Quando ela se força a ter
contato sexual com Enrico, até mesmo quando ela não quer, toda a
experiência torna-se uma vivência emocional negativa para ela. Assim,
em consequência de seu conflito repetido sobre o sexo, o interesse de
Rosa diminui e a incompatibilidade deles aumenta.
A privação também pode desempenhar um papel na polarização
de um casal. Como ambos são incapazes de satisfazer suas necessida­
des, estas podem se intensificar. Por exemplo, se o contato sexual
acontece cada vez menos, Enrico pode achar que seus desejos por sexo
aumentam. Além da simples privação desta experiência em particular,
Enrico pode sentir seus desejos por sexo aumentarem apenas porque
está sendo negado a ele — um prazer negado é um desejo intensificado.
Enquanto isso, Rosa percebe seu desejo sexual diminuindo por causa
da pressão de Enrico. Suas persistentes tentativas de resolver sua in­
compatibilidade sexual tornaram a incompatibilidade maior. Suas so­
luções repetitivas criaram um problema maior.

Afastamento
Depois que os conflitos se intensificam e as posições se tornam po­
larizadas, os parceiros podem eventualmente terminar a discussão em de­
sespero. Eles não conseguem chegar um no outro. O outro não “enten­
deu”. Mais conversas sobre o assunto é impossível. Cada um recua para o
seu próprio canto e se fecha. Outras conversas, se houver alguma, são ten­
sas e artificiais. Os parceiros tornaram-se alienados um do outro.
As vezes, no calor da discussão, são feitas observações que de­
sencadeiam o afastamento. Pouco antes de sair da sala, Ralph sugeriu
que ele e Anita deveriam encontrar outra pessoa. Este comentário ca­
talisou as inquietações dela sobre o comprometimento dele com a re­
lação. Consequentemente, ela se afastou dele por dias.
174 Uma cura pior do que a doença

Embora o afastamento ocorra, frequentemente, após uma esca­


lada e polarização, ele pode ocorrer muito mais cedo no conflito.
Quando os parceiros evitam lidar com um problema importante, eles
com frequência acabam se sentindo distantes um do outro. Ao evitar
que uma discussão aberta exploda, eles não se dão uma chance de
transmitir seus sentimentos ou expressar suas opiniões sobre um as­
sunto importante. Porque a questão é importante para eles, eles pen­
sam sobre ela. Eles fazem conjecturas sobre os motivos e reações do
outro. Eles têm conversas em sua cabeça, em vez de um com o outro.
Sendo assim, qualquer discussão real entre eles, muitas vezes, parece-
ria distante e não genuína.
Na medida em que nossos problemas aumentam e se polarizam
ao longo do tempo, podemos nos sentir aprisionados. Como pode­
mos resolvê-los? Mesmo que nossas “soluções” não criem um proble­
ma maior, sua ineficácia pode criar desespero. Podemos questionar nos­
so relacionamento. Os nossos parceiros são realmente adequados para nós?
Podemos dizer coisas com raiva — uma ameaça de partir, uma acusação
dura — que criam uma fenda na relação. Sentindo-nos encurralados e sem
esperança se em algum momento resolveremos o problema e irritados com
nossos parceiros, ficamos distantes deles. Não é apenas um problema que
temos no relacionamento. A relação em si é agora um problema.

RECAPITULANDO
Neste capítulo, reunimos os componentes do conflito discutidos em capítulos ante­
riores para criar uma análise DEEP (profunda) completa do conflito. Anteriormente,
na Parte II, vimos como nossos problemas com nossos parceiros são, muitas vezes,
prontamente compreensíveis se vistos à luz das Diferenças (D) entre nós, as reações e
sensibilidades Emocionais (E) que trazemos para o relacionamento, e as circunstâncias
Externas (E), particularmente as estressantes. Em nosso esforço para lidar com esses
problemas iniciais, respondemos repetidamente com métodos duvidosos que só cau­
sam mais problemas. Estes métodos tendem a ser reforçados porque todos eles forne­
cem alguns benefícios ocasionais. Mover-se contra o outro com acusação, culpa e
coerção pode liberar sentimentos de raiva ou forçar uma solução temporária; afas­
tando-se do outro com evitação, negação e distanciamento pode fornecer refúgio
Diferenças Reeoneiliáveis 175

temporário do problema; colando no outro com vigilância, intrusão e violação pode


dar tranquilidade temporária; indo contra o outro com ajuda externa por meio de
alianças e coalizões pode fornecer algum apoio imediato. No entanto, longe de resol­
ver o problema inicial, essas estratégias são muitas vezes curas tóxicas que ao longo
do tempo levam a círculos viciosos ou Padrões (P) de interação. Por sua vez, esses pa­
drões ou ciclos de interação podem escalar o conflito, polarizar e distanciar-nos, e
eventualmente nos levar a questionar nosso relacionamento. As soluções que foram
projetadas para "curar" o problema inicial criam problemas reativos que podem aba­
lar nossa própria relação.

Exercício: Qual é o seu Padrão Problemático?

Abaixo você será solicitado a selecionar a estratégia mais co­


mum que seu parceiro usa para resolver o conflito principal que
você identificou anteriormente. Depois você será solicitado a sele­
cionar a estratégia mais comum que você usa para resolver este
conflito central. Finalmente, você colocará essas duas estratégias
juntas para criar o que você acredita ser o padrão de interação en­
tre vocês dois. Este processo irá lhe permitir concluir a fase P (pa­
drões de interação) de uma compreensão DEEP (profunda) da sua
questão (o questionário é baseado em Christensen, 2011).

A. Durante o nosso conflito central, é mais provável que meu


parceiro (circule o número de apenas uma categoria abaixo e
verifique os comportamentos que seu parceiro se envolve
nessa categoria)...

1. Vá contra mim ao...


____ Criticar, culpar, encontrar falhas, atacar, apontar o dedo
____ Exigir, incomodar, pressionar, relembrar, forçar
____ Controlar, competir, mostrar quem está certo
____ Discutir, agravar, exagerar

2. Afaste-se de mim ao...


____ Retirar-se, escapar, evitar-me, distanciar-se, fechar-se
____ Esconder, evadir-se, ter segredos, enganar
176 Uma cura pior do que a doença

____ Rejeitar, minimizar, negar minhas preocupações, resistir aos


meus esforços
____ Defender-se, justificar-se, explicar a si mesmo

3. Cole em mim ao...


____ Perseguir, apegar-se, rodear, não me deixar ir
____ Interferir, invadir, intrometer-se
____ Questionar, investigar, monitorar, vigiar-me

4. Mova-se contra mim com a ajuda de outros ao...


____ Contar coisas sobre mim para a família e amigos que me
faz ficar mal
____ Buscar apoio de outros que não apoiam nossa relação
____ Aliar-se com outros contra mim, fazer com que eles inter-
venham no nosso relacionamento

B. Durante o nosso conflito central, é mais provável que eu (circule


o número de apenas uma categoria abaixo e verifique os com­
portamentos que você se envolve nessa categoria)...

1. Vá contra o meu parceiro ao...


____ Criticar, culpar, encontrar falhas, atacar, apontar o dedo
____ Exigir, irritar, pressionar, relembrar, forçar,
____ Controlar, competir, mostrar quem está certo
____ Argumentar, agravar, exagerar

2. Afaste-me de meu parceiro ao...


____ Retirar-me, escapar, evitar, distanciar-me, fechar-me
____ Esconder, evadir-me, ter segredos, enganar
____ Rejeitar, minimizar, negar suas preocupações, resistir aos
seus esforços
____ Defender-me, justificar-me, explicar a mim mesmo

3. Cole no meu parceiro ao...


____ Perseguir, apegar-me, rodear, não deixar ir
____ Interferir, invadir, intrometer-me
____ Questionar, investigar, monitorar, vigiar
Diferenças Reeoneiliáveis 177

4. Mova-me contra meu parceiro com a ajuda de outros ao...


Contar coisas sobre ele para a família e amigos que lhe faz
ficar mal
____ Buscar apoio de outros que não apoiam nossa relação
____ Aliar-me com outros contra ele, fazer com que eles inter-
venham no nosso relacionamento

C. Agora, junte essas duas respostas e escreva uma breve descrição


do cenário mais provável quando você e seu parceiro enfrentam
seu problema central. Mesmo que o padrão seja cíclico e impos­
sível de saber quem começa, inicie a descrição com seu compor­
tamento. Escreva como se fosse para o seu parceiro, mas não lhe
mostre ainda (por exemplo, "Eu me distancio de você ao me afas­
tar e me defender, enquanto que você se move contra mim me
criticando e me culpando").

D. Agora pense em um exemplo recente desse padrão e escreva uma


breve descrição dele (p. Ex., "Ontem eu me defendi por estar ocu­
pado demais para ter limpado os pratos quando você apontou
que eu os tinha deixado na pia”).

JUNTANDO TUDO

Agora que você completou a análise DEEP (profunda) de um


problema central, seria bom olhar para cada parte dele novamente.
Volte aos exercícios no final dos Capítulos 3, 4 e 5. Você acha que
tem suas diferenças identificadas corretamente, suas reações emocio­
178 Uma cura pior do que a doença

nais e suas sensibilidades direcionadas adequadamente, seus estres-


sores externos relevantes determinados e seu padrão de interação se­
lecionado corretamente? Por favor, faça qualquer revisão que você
achar necessária. Agora escreva uma breve descrição de sua compre­
ensão DEEP (profunda) da sua questão central com suas próprias
palavras, mas como se você fosse mostrá-la ao seu parceiro. Nós não
queremos que você mostre para ele/ela ainda; isto virá mais tarde.
Mas tente estruturá-lo o mais construtivamente possível, evitando
qualquer tipo de culpa unilateral. Aqui está um exemplo do que te­
mos em mente.

Exemplo de uma compreensão DEEP


(profunda) da questão central
A questão central em nosso relacionamento que me perturba
mais é a nossa briga sobre minha mãe (descrição da questão cen­
tral - os principais aspectos estão em negrito). Eu acho que uma
diferença fundamental entre nós que contribui para esta questão são
nossos pontos de vista divergentes e experiências com nossas famí­
lias de origem. Minha família promoveu uma maior proximidade
entre seus membros, enquanto que eu acho que a sua estimulou
maior independência (descrição de D - as diferenças que contri­
buem para a questão central, mas afirmou construtivamente para
ambos os lados, pois são estruturados sob um prisma positivo).
Quando nós brigamos sobre esta questão, eu penso que mostro uma
emoção superficial de frustração ou irritação, mas o que eu, frequen­
temente, estou sentindo no fundo, é frustração por estar perdendo
meu contato mais próximo com minha mãe, pois ela está ficando
mais velha e carente. Eu me preocupo com que ela se machuque ou
se sinta rejeitada, e sinto um pouco de culpa pensando que não sou
um bom filho para ela (descrição de E - a emoção superficial e a
oculta, que quem escreve experimenta). Eu me preocupo em ser
um bom filho e não abandoná-la (elaboração adicional de E, des-
Diferenças Reconciliáveis 179

crevendo a sensibilidade emocional daquele que escreve). Eu


acho que o estresse da minha carreira e da nossa própria família, que
limita o meu tempo disponível, faz disto um problema ainda maior
para mim. E penso que o estresse da sua carreira e da nossa própria
família, que limita seu tempo disponível, faz com que você queira
passar o menor tempo possível com a família extensa (descrição do
segundo E - o fator externo em si mesmo e no outro que podem
contribuir para o problema). Finalmente, acho que nosso padrão
de interação tem sido, muitas vezes, um movimento mútuo de um
contra o outro, tentando convencê-lo das boas qualidades da minha
mãe e criticando você por sua falta de conexão com sua família ex­
tensa e você criticando minha mãe e a forma como ela me criou
(descrição de P - o padrão de comunicação que ocorre durante
esta questão). Mas recentemente, os conflitos têm sido tão frustran­
tes para nós que temos nos afastado um do outro, evitando este tó­
pico tanto quanto possível e não partilhando nossos sentimentos ou
preocupações (elaboração mais aprofundada de P - como o pa­
drão de comunicação mudou ao longo do tempo).

Agora é a sua vez. Escreva sua análise completa de DEEP com


suas próprias palavras:
180 Uma cura pior do que a doença

PRÓXIMOS PASSOS

Você não verá, necessariamente, seu relacionamento transfor­


mado apenas porque você tem uma nova compreensão de seu con­
flito principal. Você pode, no entanto, ver pequenos sinais de mu­
dança entre você e seu parceiro. Talvez você veja as fraquezas do seu
parceiro de forma mais filosófica do que no passado; talvez você te­
nha uma consciência mais nítida de suas próprias vulnerabilidades
emocionais, e também mais consciência de suas manifestações tanto
as explícitas quanto as ocultas. Talvez você veja mais claramente
como o estresse externo pode afetar você e seu parceiro e como cada
um contribui para padrões de interação frustrantes ou dolorosos en­
tre vocês. Talvez você até mesmo se pegue, ocasionalmente, cortan­
do uma discussão na raiz, ou seus pontos fracos não estão tão sensí­
veis como costumavam ser.
O quanto de melhora (se houver) que você já nota no seu re­
lacionamento possivelmente depende se você e seu parceiro têm
lido este livro juntos. Como todo conflito entre parceiros precisa
de dois para acontecer, os progressos podem ser maiores quando
ambos estão alterando sua perspectiva. Se o seu parceiro não está
lendo o livro junto com você, é possível que você queira encorajá-
-lo a ler a Parte I e II antes de passar para a Parte III. No entanto,
Diferenças Reconciliáveis 181

se seu parceiro não está disposto a ler o livro, ainda é útil que você
leia sozinho. Mais tarde, vamos lhe mostrar maneiras que você
pode envolver o seu parceiro, tais como compartilhar construtiva­
mente de sua análise DEEP com ele ou ela, mesmo se ele ou ela
não estiver lendo o livro.
Sabedoria é o primeiro passo para a aceitação nos relacionamen­
tos. Até aqui você deverá ter um maior conhecimento do seu conflito
central a partir da sua análise DEEP (profunda). Na Parte III, mostra­
remos como usar essa compreensão DEEP (profunda) para criar
maior aceitação em seu relacionamento. Ao fazê-lo, você pode dimi­
nuir o conflito que contamina sua relação, particularmente o conflito
reativo. E tão importante quanto isso, é que você poderá aumentar a
intimidade entre vocês dois. Assim, como vantagem adicional, seu
parceiro poderá espontaneamente fazer algumas das mudanças que
você não conseguiu com suas curas tóxicas. Se não, a Parte IV o aju­
dará a criar mudanças específicas na sua relação.
Parte III
Da Discussão à Aceitação
7

O delicado equilíbrio
Aceitação e mudança

Deus me conceda a serenidade para aceitar as coisas


que não posso mudar; Coragem para mudar as coisas
que eu posso; E sabedoria para saber a diferença.
Reinhold Niebuhra. Oração da Serenidade (1943)

No filme Céu Azul (Blue Sky, 1994), pelo qual Jessica Lange
ganhou um Oscar, ela retrata a esposa emocionalmente volúvel de
um especialista em radiação nuclear do exército (interpretado por
Tommy Lee Jones). Em uma cena, eles e suas duas filhas entram na
casa dilapidada que será sua nova casa em uma base militar no Ala-
bama. Perturbada com a mudança e com a péssima condição em
que se encontra a casa, Lange tem uma forte explosão emocional.
Ela rasga as cortinas, sai correndo para fora, pula no carro e fica ber­
rando. Tommy Lee Jones corre atrás dela, e finalmente a resgata e a
leva de volta para casa. Na manhã seguinte, enquanto dorme, as me­
ninas ainda estão chateadas com o incidente. Jones tenta confortar
suas filhas e explicar sua perspectiva a elas. Ele lhes assegura do seu
amor e o de sua mãe por elas. Ele usa a metáfora da água para expli­
car sua mãe. Assim como a água pode ser líquida ou vapor ou gelo,
da mesma forma sua mãe tem várias propriedades que se alternam.
186 0 delicado equilíbrio

Ele diz a elas: “Eu tomei uma decisão há muito tempo que é somen­
te amar suas propriedades básicas.” Jones claramente experimenta a
dor das explosões emocionais de sua esposa, contudo ele é capaz de
tolerar aquela dor, recuperar-se dela e aceitá-la. Ele ainda consegue
ser bem humorado com a situação e fazer um trocadilho usando as
palavras ‘nuclear fishing’ e ‘fission’ (as quais têm uma pronúncia pa­
recida) representando a instabilidade da água, como é a de sua espo­
sa. Ele vê seus comportamentos específicos no contexto mais amplo
de toda vida dela — apenas como uma de suas propriedades mutan-
tes. E ele vê seus comportamentos no contexto de sua vida juntos:
seu dinamismo emocional que faz dela a pessoa provocante, char­
mosa e desafiante que ela é. Ao lidar com sua emotividade, ele nun­
ca parece fraco ou submisso, mas forte e amoroso.
Este filme ilustra dramaticamente o que entendemos por
aceitação. Quando falamos em “aceitar” seu parceiro, queremos
dizer tolerar o que você considera um comportamento desagradá­
vel dele, provavelmente compreender o significado mais profundo
desse comportamento, certamente vê-lo em um contexto mais am­
plo, e talvez até apreciar seu valor e importância no relacionamento
de vocês.
Em forte contraste com este exemplo de aceitação segue um
exemplo de submissão. No filme Cenas de uma Família (Mr. & Mrs
Bridge, 1990), os personagens de Paul Newman e Joanne Woodward
estão jantando juntos em um clube quando um furacão se aproxima.
Todo mundo procura abrigo no porão, exceto Newman e Woodward,
porque Newman quer terminar o jantar. Aflita pelo perigo, ela quer
procurar refúgio, mas espera enquanto seu marido come. Quando o
vento intensifica e colide com o prédio, Newman comenta: “Eles
nunca lhe dão manteiga suficiente”. Woodward procura ansiosamente
em outras mesas, agora abandonadas, por mais manteiga para o pão
de Newman. Finalmente, quando seu medo do tornado supera seu
medo de ofendê-lo, ela questiona hesitante: “Você não acha que nós
poderiamos estar melhor lá embaixo no porão?”
Diferenças Reconciliáveis 187

Newman responde: “Preste atenção, por 20 anos eu tenho lhe


dito quando algo vai ou não acontecer. Agora, eu alguma vez, em qual-
; uer ocasião significativa, provei estar errado?”
O tornado diminui, Newman de novo prova que está certo, e a
uebilidade da voz dela, de protesto hesitante, é abafada ainda mais.
A teimosia de Newman diante do tornado e sua insensibilida­
de à ansiedade de Woodward são dolorosas para ela e perigosas para
ambos. Entretanto, ela se submete a seu controle e sofre expressando
mmente o mais fraco dos protestos. Isto não é aceitação, mas sub­
missão.
Submissão vem de uma posição de fraqueza, a aceitação de uma
posição de força. Submissão significa suportar o comportamento aver-
sivo de seu parceiro porque você não tem ou acredita não ter alterna­
tiva. A aceitação, ao contrário, é tolerar o comportamento aversivo
porque você escolhe fazê-lo - você vê esse comportamento como par­
te de um contexto maior de quem é seu parceiro e quem você é. A
aceitação não significa que você não tem poder para protestar ou tem
medo de protestar. Em vez disso, a aceitação significa que você consi­
dera o comportamento negativo, como fez Jones, como parte das
muitas propriedades mutantes do outro. O vapor escaldante de seu
parceiro e as reconfortantes águas frescas são apenas manifestações di­
ferentes da mesma propriedade que ele ou ela é.
Em sua forma mais elevada, a aceitação pode promover mais do
que apenas a tolerância: ela permite que você veja além das atitudes
negativas de seu parceiro naquele momento para as boas intenções
que delas brotam ou as consequências positivas que às vezes têm. Isso
não significa que você nunca resista ao comportamento aversivo de
seu parceiro, nunca discuta sobre isso, ou nunca tente limitá-lo. Mas
isso quer dizer que você pode ir além.
Sarah quer ser atualizada sobre os empreendimentos impor­
tantes no trabalho de Jaime, um desejo que ele aceitaria, mas ela
também quer expressar sua opinião sobre esses empreendimentos e
incentivar ações que ela julga apropriadas, dois desejos que incomo-
188 0 delicado equilíbrio

dam Jaime. Ela se interessa, particularmente, em como Jaime está


sendo tratado por seus superiores no trabalho, e muitas vezes pega
no pé dele para se posicionar e exigir o que lhe é devido. Seu envol­
vimento com seu trabalho irrita Jaime e causa muitas brigas. Isso
também faz com que Jaime se sinta desvalorizado, como se ele nun­
ca pudesse fazer o suficiente para satisfazer as percepções dela do que
é certo. E ele se retrai diante da ideia de que deveria estar lutando
em seu local de trabalho para atender as expectativas dela quanto ao
emprego dele.
No entanto, ele também sabe que, se não fosse por Sarah, ele
teria aceitado tarefas no trabalho sem insistir no apoio necessário
para realizá-las. Ele teria ficado vários anos sem um aumento salarial
simplesmente porque estava hesitante em pedir um. E ele poderia
até ter perdido o emprego para outra pessoa. Sabe também que, sem
o julgamento discriminatório de Sarah, sua ingênua confiança na
boa vontade dos outros o teria colocado em dificuldades. Então Jai­
me tem sentimentos contraditórios sobre as perguntas críticas de Sa­
rah e suas preocupações irritantes. Ele muitas vezes discorda dos co­
mentários dela e deve tomar cuidado para manter um limite que de­
fine o que Sarah pode e não pode controlar, mas ele aprendeu a ou­
vir suas opiniões obstinadas, porque ele sabe que normalmente ela
tem as melhores intenções, ela entende suas fraquezas e tem uma vi­
são das tentativas dos outros de tirar vantagem dele. Em suma, ele
aceita sua crítica, insistência e pressão sobre seu trabalho.

ACEITAÇÃO VERSUS MUDANÇA

Aceitação e mudança são eventos fundamentalmente diferen­


tes, mas ligados. Um conflito é provocado quando um membro do
casal, o emissor, faz algo indesejável ou não faz algo desejável para o
outro, o receptor. Sarah era o emissor do comportamento problemá­
tico de chatear e pressionar; e Jaime era o receptor dessa atitude. A
Diferenças Reconciliáveis 189

mudança ocorre quando o emissor executa a ação desagradável ou a


não ação com menos frequência ou menos intensidade - por exem­
plo, quando Sarah não insiste ou questiona ou critica o trabalho de
Jaime tanto quanto de costume. Em contraste, a aceitação ocorre
quando o receptor reage de forma menos negativa ao comportamen­
to do emissor, é mais tolerante com ele, e tem maior perspectiva so­
bre ele. Aceitação ocorre se Jaime desenvolve mais tolerância para o
comportamento de Sarah, talvez porque ele vê a sua importância
para a sua relação e para ele pessoalmente. Os papéis do emissor e
do receptor mudam de um lado para outro à medida em que os ca­
sais se envolvem no conflito. Embora Sarah fosse o emissor do com­
portamento problemático de chatear e pressionar, Jaime era o que
acusava Sarah de interferir no seu trabalho, e, então, Jaime seria o
emissor desta acusação e Sarah o receptor.
Aceitação e mudança representam duas maneiras de resolver
problemas de relacionamento. Embora sejam estratégias muito dife­
rentes, elas podem atingir o mesmo objetivo: acabar com o conflito.
Por exemplo, Denise está angustiada porque Franco raramente inicia
qualquer contato físico de afeto. Se ela se sentar ao lado dele no sofá,
ele instintivamente se afastará, como se para proporcionar mais espaço
a ambos. No entanto, o espaço entre eles é precisamente o que Denise
quer transpor. Uma maneira de resolver esse problema seria que Fran­
co se tornasse mais abertamente afetuoso com Denise, segurando sua
mão com mais frequência, beijando-a mais vezes, abraçando-a mais
intensamente e acariciando-a à noite. Todas essas mudanças resolve­
ríam o problema, especialmente para Denise. Se Franco se sentisse
confortável com essas mudanças e se estas perdurassem, então o pro­
blema da falta de sinais físicos de afeto seria verdadeiramente elimina­
do de seu relacionamento. Uma segunda solução possível, Denise po­
dería acolher melhor as dificuldades de Franco com o afeto físico. Ela
poderia ver que ele expressa seu amor por ela de outras maneiras, mais
do que pelo afeto físico: ele trabalha duro para ela e a família, ele está
disponível para ajudá-la em momentos de necessidade, e ele ouve
190 0 delicado equilíbrio

atentamente suas preocupações. Ela poderia compreender que ele foi


criado em uma família pouco expressiva em atitudes de afeto, que ele
nunca foi muito afetuoso com ninguém, e que ele se sente desconfor­
tável dando e recebendo afeto físico. E ela poderia se tranquilizar com
o pensamento de que a falta de afeto físico de Franco não significa
que ele não a ama ou não se sente atraído por ela. Essa maior aceita­
ção certamente resolvería o problema, especialmente para Franco. Se
Denise verdadeiramente aceitasse isto, de modo que a falta de sinais
físicos de afeto de Franco fosse confortável para ela em geral, então o
problema estaria resolvido para ela também.
Se Franco e Denise resolvem o problema da primeira maneira,
então Franco faz uma mudança: ele se torna mais fisicamente afetuo­
so. Se resolvem o problema da segunda maneira, Denise faz uma mu­
dança: ela se torna mais receptiva à falta de afeto físico de Franco. Sua
mudança não é tanto uma mudança comportamental - embora ela
possa responder de maneira diferente quando Franco não é afetuoso -
como é uma mudança de como ela recebe ou reage ao comportamen­
to dele. E uma mudança na atitude dela em relação ao comportamen­
to dele, na reação emocional dela ao comportamento dele, e na inter­
pretação dela do comportamento dele. Chamamos esta mudança sig­
nificativa que ela fez aceitação e reservamos o termo mudança para o
tipo de mudança de comportamento específico que Franco faria se
aumentasse sua demonstração de afeto. E um modo importante per­
ceber que ambas são mudanças, mas usaremos os termos mudança e
aceitação para distingui-las.
Isso nos leva ao princípio número 1 para resolução de proble­
mas: Um conflito de relacionamento pode ser resolvido por meio tanto de
mudança quanto de aceitação.
Mas qual solução que os casais deveríam escolher? Franco, cla­
ro, escolhería que Denise o aceitasse como ele é, e Denise natural­
mente escolhería que Franco se tornasse mais afetuoso. Cada um pre­
feriría que qualquer movimento em direção a uma solução fosse feito
pelo outro.
Diferenças Reconciliáveis 191

A maioria de nós gostaria de ouvir a mensagem “Eu te amo do


jeito que você é” de nossos parceiros. Eles deveriam ver nossas defici­
ências como encantadoras, ou pelo menos, com menos relevância do
cue nossas qualidades, e facilmente perdoáveis. Ao lado da fantasia de
sermos aceitos exatamente como somos, também podemos abrigar a
fantasia de mudar nossos parceiros. Nossas idéias de mudança iriam
melhorá-los e tornar a vida mais fácil para nós. Esta fantasia é captu­
rada numa piada em inglês que pergunta à noiva quais as três coisas
que ela está pensando enquanto se encaminha ao altar, no corredor da
igreja, no dia do seu casamento. A resposta dela é: corredor, altar,
hino, que em inglês seriam, respectivamente, aisle, altar, hymn. Estas
três palavras são pronunciadas de maneira que, seus sons similares,
poderíam formar a seguinte frase: “I’ll alter him”, a qual significa
"Vou alterá-lo”. Portanto, cada um de nós, às vezes, envia a mensagem
"Você deve me aceitar como eu sou, mas você deve mudar para aco­
modar minhas necessidades”. Podemos sentir que esta mensagem é
justificável porque “seus traços negativos são profundamente pertur­
badores, os meus são meramente inconvenientes”.
Vamos supor que Franco e Denise, depois de uma conversa
aberta sobre o seu problema de afeto, concordaram com a mudança
dele ou a aceitação dela. Seria esse o fim da questão? Somente se o
novo comportamento afetivo de Franco fosse confortável para ele
ou a nova aceitação de Denise pudesse ser reconciliada com sua ne­
cessidade de demonstrações claras de afeto. Caso contrário, dada a
história de Franco, ele podería ter dificuldade em manter seu novo
comportamento, e depois de alguns dias ou semanas de esforço re­
cair em seu velho padrão. Da mesma forma, Denise pode inicial­
mente aceitar Franco do jeito que ele é, mas acabar sentindo res­
sentimento e retornando de maneira irritada à sua velha busca por
maior afeição física.
Teoricamente, os problemas de relacionamento podem ser
resolvidos por meio de uma mudança unilateral de uma pessoa
ou aceitação unilateral da outra, mas esse tipo de solução só de um
192 0 delicado equilíbrio

dos lados, frequentemente não funciona. Felizmente, há uma tercei­


ra solução.

A TERCEIRA SOLUÇÃO

A terceira maneira de resolver este problema de afeto e a maio­


ria dos outros problemas de relacionamento humano é por meio de
uma combinação de aceitação e mudança. Franco poderia fazer algu­
mas mudanças em relação a suas demonstrações irregulares de com­
portamento afetuoso e Denise poderia aceitar mais as maneiras de
Franco de mostrar amor, as quais muitas vezes não incluem afeto físi­
co. Esta terceira possibilidade oferece uma série de vantagens. O fardo
para a solução cai sobre ambos os parceiros: ambos dão, mas ambos
também recebem. Suas ações podem criar um ciclo positivo que enco­
raja e motiva cada um. Se Denise vê alguma mudança por parte de
Franco, algum esforço para ser mais abertamente afetuoso, ela pode
achar mais fácil aceitar sua capacidade limitada em geral de dar afeto
físico. A falta de qualquer mudança em um parceiro, no entanto, fre­
quentemente prova ser uma barreira para a aceitação que o outro tem
do comportamento problemático. Da mesma forma, se Franco perce­
be Denise sendo mais receptiva à sua falta de demonstração afeto -
como menos negativa e colocando menos pressão - ele pode achar
mais fácil ser um pouco mais afetuoso. Muitas vezes a pressão do ou­
tro para mudar se torna uma barreira principal à mudança, enquanto
que a aceitação de outro facilita e até incentiva a mudança.
Franco e Denise têm outra grande área de conflito. Franco se
queixa de que Denise o critica demais, que ela constantemente o mo­
nitora e avalia, geralmente negativamente. Claramente Denise poderia
reduzir sua vigilância e crítica, ou Franco poderia se tornar mais re­
ceptivo à crítica de Denise. Uma abordagem unilateral poderia pro­
mover o ressentimento naquele que faz todas as mudanças, sendo as­
sim, a terceira opção pôde ser a melhor: Denise torna-se menos crítica
Diferenças Reconciliáveis 193

e Franco torna-se mais receptivo às críticas dela. A mudança de Deni­


se encorajaria assim a aceitação de Franco, e a aceitação de Franco en­
corajaria a mudança de Denise.
Os benefícios desta solução de via dupla vão além do seu pro­
blema de crítica. Muitas vezes os problemas de relacionamento estão
ligados: o comportamento problemático de uma pessoa está intima­
mente ligado ao comportamento problemático da outra, de tal forma
que resolver um tem efeitos atenuantes sobre o outro. A crítica de De­
nise e a falta de afeto de Franco estão ligadas em um círculo vicioso de
comunicação. Denise frequentemente critica Frank por causa de sua
falta de afeto. Da mesma forma, Franco acha difícil ser abertamente
afetuoso com Denise por causa de sua crítica. Solucionar um proble­
ma poderia contribuir para resolver o outro.
Franco e Denise começaram sua vida juntos com diferenças
em seu desejo e necessidade de afeto físico. Essas diferenças podem
ter sido agravadas pela sensibilidade de um ou ambos — talvez um
medo em Denise de ser negligenciada ou abandonada ou um medo
em Franco de ser sufocado ou oprimido. Às vezes, o estresse pode
ter exacerbado suas diferenças e suas sensibilidades, como quando as
exigências de trabalho de Denise fizeram com que ela desejasse mais
afeto ou quando as exigências de trabalho de Franco fizeram-no bus­
car por isolamento. Denise tentou resolver este problema inicial cri­
ticando Franco, e Franco reagiu sendo ainda menos afetuoso. Este
padrão de comunicação polarizou os dois de modo que suas dife­
renças iniciais na expressão de afeto se tornaram uma incompatibili­
dade maior.
Outra diferença importante caracterizava Franco e Denise. No
início do relacionamento ela era mais extrovertida, mais propensa a
expressar o que gostava ou não, do que Franco. Por causa de sua pró­
pria sensibilidade à crítica, essa diferença era um problema para Fran­
co. Quando Denise estava estressada, ela ficava particularmente pro­
pensa a expressar suas opiniões; quando Franco estava estressado, ele
particularmente não se interessava nos pontos de vista dela. Ele tenta­
194 0 delicado equilíbrio

va resolver o problema afastando-se de Denise, e, enquanto isso lhe


dava, frequentemente, algum alívio temporário, ela, definitivamente,
ficava ainda mais crítica com ele. O padrão de comunicação deles, en­
tão, tornou o problema da crítica ainda pior.
Se Franco e Denise abordassem seus problemas de afeto e crítica
escolhendo a alternativa da terceira solução bilateral, poderiam obter
um benefício maior em ambos os problemas do que poderiam esperar
para o problema de cada um com uma abordagem unilateral. Resolver
o problema da crítica deixará Franco menos “em guarda” com Denise, e
assim ele pode ser mais fisicamente afetivo com ela. Resolver o proble­
ma de afeto neutralizará, pelo menos, grande parte da crítica de Denise.
Isso nos leva ao princípio número 2 para resolver problemas: As
melhores soluções para a maioria dos problemas envolvem aceitação por
um membro e mudança pelo outro. Essa abordagem de duas vertentes
não só faz com que ambos os parceiros façam parte da solução, assim
como serve para motivá-los, como também pode afetar a solução de
outros problemas relacionados.

ACEITAÇÃO E MUDANÇA: 0 OVO OU A GALINHA?

Mesmo em soluções que envolvam aceitação e mudança, uma


questão que os casais frequentemente encontram é “O que vem pri­
meiro?” Devo esperar que meu parceiro mostre alguma evidência de
mudança antes de começar a aceitar o comportamento dele? Ou
devo tentar aceitar o comportamento do meu parceiro, parcialmen­
te, na esperança de que isto vai levá-lo a mudar? Embora existam
certas situações que podem exigir mudanças, vamos introduzir o
princípio número 3 para resolver problemas: Para a maioria dos pro­
blemas, a aceitação é o melhor ponto de partida. A aceitação é impor­
tante por si só porque nos faz sentir confortáveis e “à vontade” com
os nossos parceiros. Somos amados, temos defeitos e tudo mais. Po­
demos deixar cair as máscaras, relaxar, e apenas sermos nós mesmos.
Diferenças Reconciliáveis 195

Um tanto paradoxalmente, no entanto, a aceitação também é im­


portante como um valioso caminho para a mudança. Os tipos de
experiências que promovem a aceitação também estimulam mudan­
ças espontâneas nos casais. Quando nos percebemos aceitos, quando
não nos sentimos na defensiva, somos mais capazes de ouvir as suas
inquietudes e apreciar suas lutas. Podemos mudar para acolher nos­
sos parceiros, não por força ou pressão ou coerção, mas porque os
vemos e experimentamos de forma diferente. Mudamos porque nos
importamos com eles e queremos que eles se sintam melhor. Quan­
do eles se sentem aceitos por nós e ouvem as nossas questões, eles
podem fazer o mesmo por nós.
Como exige menos esforço e vem naturalmente, a mudança es­
pontânea pode ser mais gratificante do que a mudança deliberada.
Você não sente como se estivesse abrindo mão de algo para chegar a
um acordo. Você evita o trabalho da negociação. Mudança espontânea
vem de dentro para fora: você muda porque você está a fim e porque
quer. É uma escolha livre, sem amarras.
Mudança planejada e deliberada pode ser mais complicada. As
vezes, é mais fácil conquistá-la do que a aceitação no curto prazo, por­
que muitos comportamentos estão sob nosso controle voluntário. A
mudança planejada pode ser difícil de sustentar, pois, muitas vezes,
ela vem atada a amarras emocionais. Como discutimos antes, você
pode ser capaz de ver o sentido em fazer uma mudança e apreciar a
equidade proposta por ela, mas se você se sentir demasiadamente pre­
so nas suas características essenciais e sensibilidades arraigadas, você
poderá se ressentir e se arrepender com o tempo. Ou você poderá,
simplesmente, retornar à sua velha maneira de ser.
Sendo assim, defendemos fortemente o trabalho da aceitação
primeiro, não apenas para promovê-la, mas também porque a aceita­
ção pode gerar mudanças espontâneas e assim reduzir a necessidade
de mudança planejada. Mas se esta for necessária, e isto é frequente,
descreveremos na Parte IV como orquestrar mudanças deliberadas de
maneira que, provavelmente, serão mais eficazes.
196 0 delicado equilíbrio

O QUE DEVERIA SER MUDADO, POIS


NÃO DEVERIA SER ACEITO?

Há algo que não deveria ser aceito? Existem comportamen­


tos que deveriam e precisam ser mudados, não importa o quê? A
violência física, especialmente quando resulta em medo ou lesão,
não pode ser aceita em nenhum casal. Mesmo a violência que se
destinava apenas a liberar frustração e não prejudicar o parceiro
pode desencadear uma escalada ou, acidentalmente, resultar em le­
sões físicas e, por vezes, a morte. Mesmo se não causar ferimentos
físicos, o medo resultante que cria pode permanecer, às vezes, por
anos. Portanto, não é de surpreender que até mesmo baixos níveis
de agressão física são preditivos de maiores taxas de angústia nos
relacionamento anos mais tarde - mesmo se os casais não conside­
ram a agressão física um problema.
Embora baixos níveis de agressão física, tais como empurrar ou
jogar objetos, frequentemente são cometidos por ambos os parceiros,
violência severa e agressão para controlar o outro - muitas vezes cha­
mada de espancamento - é tipicamente perpetrada por homens. Acei­
tar esse tipo de agressão física é claramente não aceitação, mas sub­
missão. As mulheres nestas relações frequentemente sentem que não
têm escolha; provavelmente muitas têm pouco poder para deter a vio­
lência que sofrem. Acabar com a violência física, seja deixando a rela­
ção ou impedindo-a de acontecer no relacionamento, não é uma
questão simples.
O capítulo 15 abordará a violência. Por ora, no entanto, como
você determina o que mais é inaceitável?
Muitos colocariam o abuso emocional, psicológico e verbal
junto com o abuso físico como comportamentos inaceitáveis para
qualquer casal. Este tipo de abuso é mais difícil de definir do que o
abuso físico. Certas palavras e expressões, como ameaças e nomes
degradantes, são claramente abusivas. Ninguém deve aceitar comen­
tários como “Você faz isso de novo e eu quebro a tua cara” ou “Sua
Diferenças Reconciliáveis 197

vadia inútil!” Além destes óbvios exemplos de abuso verbal, no en­


tanto, é impossível estabelecer critérios nítidos e universais sobre o
que é abusivo e o que não é. Uma gritaria com palavras ofensivas
pode ser uma situação abusiva para alguns casais, mas pode ser me­
ramente uma discussão acalorada para outros. O “tratamento silen­
cioso” pode ser percebido como abusivo para alguns, mas um alívio
para outros. O que parece crítica para um membro do casal, pode
parecer um abuso para o outro. Para definir abuso emocional, psico­
lógico e verbal, precisamos levar em consideração tanto as ações do
emissor quanto as reações do receptor. Mesmo que essas ações não
causem dano físico, elas são angustiantes para a maioria, mas para
alguns elas são verdadeiramente devastadoras. Devido à importância
do abuso emocional, psicológico e verbal e sua associação com o
abuso físico, discutiremos melhor este tópico no Capítulo 15.
Diferente da violência física e casos óbvios de abuso verbal, é
difícil listar atos específicos que ninguém deveria aceitar. A maioria
pode argumentar que nenhum casal deve aceitar a infidelidade, mas
mesmo esta não é uma regra universal. Alguns casais aceitam aberta­
mente o sexo extraconjugal e outros o aceitam implicitamente. Mui­
tos cônjuges aprenderam a perdoar um parceiro que era infiel. Assim,
a lista de ações inaceitáveis deve ser individualizada. Cada cônjuge
tem o direito de identificar os comportamentos que são totalmente
inaceitáveis para si.
O perigo é que uma lista de atitudes inaceitáveis vai crescer a
ponto de incluir todo e qualquer comportamento negativo ou desa­
gradável. Melinda insiste que desrespeito, estupidez, frieza, humilha­
ção pública, insensibilidade, desonestidade e egoísmo (para citar al­
guns) são todos inaceitáveis para ela. Tal lista mistura o que é verda­
deiramente inaceitável para Melinda com o que é simplesmente desa­
gradável para ela. Este tipo de lista invalida seu próprio propósito: di­
minui a possibilidade de que seu marido faça mudanças em qualquer
categoria da lista. Esta é tão longa que implica que ele é um grande
vilão, talvez o único vilão do relacionamento.
198 0 delicado equilíbrio

A declaração de que alguma ação é inaceitável carrega consigo


uma força moral. Quando Jonas diz a Patrícia que ele não pode mais
aceitar a “humilhação pública” que ela o expõe, ele está dizendo que
suas atitudes são moralmente erradas, que é culpa dela agir desta for­
ma, e ele acha que é só ela quem tem que mudar.
Ele enquadra sua colocação de tal forma que sua reação às atitu­
des dela não é relevante. Tudo o que ele poderia ter feito para provo­
car suas ações é abstrato. Para ele, a maneira como ela o humilha pu­
blicamente é tão pesada que anula qualquer ação negativa dele. Ela
deve parar com isso imediatamente.
A mudança pelo perpetrador é o único antídoto para o assim
chamado comportamento inaceitável. No entanto, este antídoto é
muitas vezes uma cura pior do que a doença. Descrever o comporta­
mento como errado e, portanto, inaceitável, frequentemente, cria bar­
reiras à mudança, mais do que facilitá-la. O perpetrador, com frequ­
ência, não vê o comportamento em questão como errado, resiste a ser
acusado de transgressão, e se rebela contra a ideia de fazer uma mu­
dança unilateral. Um perpetrador que mude pode se ressentir da acu­
sação inicial e da pressão subsequente que forçou a mudança. Além
disso, a comunicação estabelece uma desigualdade, com o parceiro
“no lado certo” ocupando uma posição de superioridade moral e o
parceiro “no lado errado” habitando o pântano moral’. Tal posição
não é confortável para o parceiro que é “menos” e, provavelmente,
não será bem tolerada.
Uma história sobre Abraham Lincoln e sua esposa volúvel,
Mary Todd, ilustra que mesmo o comportamento que pode ser defi­
nido convencionalmente como inaceitável não precisa ser visto de
uma maneira inflexível. Como explicamos, um problema interpessoal
depende não apenas de algum comportamento provocativo, mas tam­
bém de uma vulnerabilidade a esse comportamento. Lincoln estava
fora conversando com um congressista sobre os assuntos políticos im­
portantes do dia. Mary Todd saiu furiosa da casa, xingou impiedosa­
mente Lincoln por alguma coisa que tinha feito, e então, da mesma
Diferenças Reconciliáveis 199

forma intempestiva, entrou de volta. Perplexo porque uma esposa se


comportaria de forma tão vergonhosa em público, o congressista
olhou para ver a reação de Lincoln. Este não se perturbou com o inci­
dente e explicou ao congressista incrédulo que tais explosões faziam
sua esposa se sentir muito melhor e, por isso, ele raramente queria dar
um basta a estas atitudes.
Esse tipo de ação de uma esposa certamente teria sido conside­
rado “humilhação pública” pela maioria dos pares masculinos de Lin­
coln e, portanto, merecedor das sanções mais severas. A maioria dos
homens de hoje também poderia ver este ato como uma humilhação
pública. Lincoln, no entanto, não foi humilhado, nem publicamente
nem em privado. Sua reação fez a ação de Mary Todd algo terapêutico
para ambos, em vez de algo ruim e inaceitável.
Não só as “atitudes negativas” devem ser definidas em termos
da resposta vulnerável do receptor, bem como a ação provocadora
do emissor, mas os comportamentos negativos devem ser considera­
dos no contexto. As pessoas raramente são desrespeitosas, estúpidas,
frias, insensíveis ou egoístas “do nada.” Muitas vezes, sua atitude é
parte de um círculo vicioso de comportamento negativo. Como vi­
mos no último capítulo, os parceiros podem diferir sobre onde eles
definem um ponto de partida para um conflito. A vítima pode sen­
tir que o parceiro “atacou por nada”, enquanto que o cônjuge pode
ver o seu ataque como simplesmente uma reação a um comporta­
mento anterior do outro.
Quando visto deste modo, muito do que os parceiros chamam
de “comportamento inaceitável” uns dos outros pode ser descrito com
mais precisão como componentes dos padrões negativos de comuni­
cação entre eles. Certamente, os cônjuges têm o direito de declarar
que ações específicas de seus parceiros são “inaceitáveis”. Em um capí­
tulo posterior, descreveremos maneiras de criar mudanças na conduta
inaceitável. No entanto, “comportamento inaceitável” é mais difícil de
mudar do que aquele meramente problemático que faz parte de um
círculo vicioso entre os membros de um casal. Os problemas são mais
200 0 delicado equilíbrio

manejáveis, mais solucionáveis e mais mutáveis quando não são mo­


ralmente julgados como comportamento inaceitável.

0 QUE DEVERIA SER ACEITO PORQUE NÃO


PODE OU NÃO DEVERIA SER MUDADO?

Você é obrigado a aceitar certos aspectos do seu parceiro? O


amor cria um imperativo moral para aceitar algumas das característi­
cas dele?
Alguns diriam que para amar, e certamente casar, você deve
aceitar a essência da outra pessoa. Pressionar seu parceiro para mu­
dar alguma característica central seria pedir a ele para ser falso con­
sigo mesmo. Ao escolher amar e casar com essa pessoa, você aceitou
quem ela é. Você perdeu o direito de questionar a essência central de
seu parceiro. Você pode pressionar para a mudança, pelas bordas,
mas não no seu núcleo.
Um conceito relacionado a isto, é que as pessoas não podem
mudar sua essência básica, mesmo que tentem fazê-lo. Se é ou não
moralmente errado que os parceiros pressionem pela mudança,
mesmo assim é inútil fazê-lo. As pessoas não podem alterar o que
está no seu núcleo. Somente aspectos mais superficiais são passíveis
de mudança.
Podemos falar sobre essas duas noções utilizando a metáfora
que se refere à “discussão do leopardo”: você não deve e não pode pe­
dir ao leopardo para mudar suas pintas. E um equívoco solicitar tal
coisa. Mesmo se você pedir, o leopardo não será capaz de mudá-las.
Mesmo que ambos os parceiros aceitem essa posição, há muito
espaço para discordar sobre o que é essência e o que não é, sobre o
que é núcleo e o que é aspecto superficial. Denise pode ver a incapaci­
dade de Franco de fazer gestos afetuosos como apenas um comporta­
mento aprendido que ele pode mudar, enquanto Franco pode ver sua
relutância como uma parte central de si mesmo. Franco pode conside-
Diferenças Reconciliáveis 201

rar a crítica de Denise como simplesmente um hábito irritante dela,


enquanto ela acha que seu alto padrão de exigência é uma característi­
ca essencial (e admirável).
As vezes, tal desacordo pode refletir diferenças genuínas em
como cada um vê o que é essencial e o que não é. Em outros momen­
tos, a questão pode ser levantada simplesmente para desviar um pedi­
do de mudança. Como o leopardo no quadrinho adiante, invoca a
noção de “características essenciais” — você não pode me pedir para
mudar quem eu sou — como uma maneira de frustrar qualquer mu­
dança em tudo.

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202 0 delicado equilíbrio

Nossas características centrais são certamente difíceis de mudar.


De fato, muitas podem ser impossíveis de mudar. No entanto, isso
não significa que é errado pedir uma mudança. Antonio tem sido uma
pessoa que se expõe a riscos toda a sua vida. Ele sempre gostou de es­
portes radicais e perigosos, como asa delta e rappel. Ele escolheu uma
carreira na polícia, parcialmente, devido ao perigo e emoção que pro­
porciona, e regularmente ele se oferece como voluntário para missões
nas áreas mais perigosas da cidade. Boris se sentiu atraído por Anto­
nio em parte porque ele era tão selvagem e imprudente. Longe de ser
algo que ele queria mudar, ele descobriu que os riscos que Antonio
tomava era uma fonte de excitação. Ele até começou a participar de
muitas das arriscadas atividades de lazer de Antonio, como, por exem­
plo, andar de moto em alta velocidade. Mas agora que eles se estabele­
ceram e compraram uma casa que estão reformando, Boris teme pela
vida de Antonio dentro e fora do trabalho. O colega de Antonio foi
morto recentemente por um membro de uma gangue, e Boris quer
que Antonio procure um trabalho seguro na secretaria da polícia ou
mude completamente sua ocupação. Boris também quer que ele de­
sista de seus hobbies perigosos.
Antonio poderia protestar, com razão, que Boris está pedindo
que ele mude quem ele é. Boris sempre soube que ele vive perigosa­
mente. Como pode pedir que ele mude o que é básico e essencial
nele? Se ele o ama, deve aceitá-lo como ele é.
Boris pode responder, também com razão, que ele ama muito An­
tonio, mas agora eles estão em um estágio diferente da vida com respon­
sabilidades diferentes. Seus filhos precisam deles. O amor por Boris e um
compromisso com o seu futuro juntos exigem que ele mude.
E improvável que os apelos à aceitação ou ao amor resolvem o
dilema de Antonio e Boris. Este tem o direito de pedir; Antonio tem
o direito de recusar. Este dilema irá desafiá-los e a seu relacionamento.
Embora os casais possam discordar sobre se uma característi­
ca psicológica particular é um traço essencial, imutável, da persona­
lidade ou simplesmente um hábito irritante, eles provavelmente de­
Diferenças Reconeiliáveis 203

vem concordar que as características físicas são, em grande parte,


inalteráveis. Não é necessário aceitar as características físicas de seu
parceiro porque elas não podem ser alteradas? Mesmo aqui a res­
posta não é claramente um sim. Em primeiro lugar, algumas carac­
terísticas físicas podem ser mudadas. Embora não possamos mudar
nossa idade, podemos tentar perder o peso extra que ganhamos
com a idade. Podemos até mesmo tratar as rugas que vêm com a
idade, quer seja com maquiagem, medicamentos para a pele, Bo-
tox, ou cirurgia plástica. A medida que a medicina avança, o que
parecia ser características físicas imutáveis, estas estão sendo subme­
tidas regularmente à mudança.
Há uma última área em que um parceiro pode argumentar
que existe uma obrigação moral de aceitação. Se os parceiros elabo­
raram, de boa fé, um acordo importante para lidar com suas dife­
renças, pode-se argumentar que ambos são obrigados a aceitar seus
termos, a menos que ambos concordem em mudar. Certamente,
todos esperariam que os casais honrassem seus acordos uns com os
outros. No entanto, podem ocorrer mudanças que tornam difícil
ou impossível para alguém seguir um acordo. Mike e Beth lidam
com suas diferenças religiosas seguindo suas crenças separadamente.
No início de seu casamento ela frequenta missa na igreja católica
esporadicamente, enquanto ele frequenta a sinagoga regularmente.
Eles concordaram, mesmo antes do casamento, que não irão criar
seus filhos como católicos ou judeus. Em vez disso, eles escolhem
expor as crianças à fé de ambos e lhes permitir fazer suas próprias
escolhas. No entanto, ao longo do seu casamento, eles realmente
têm filhos, e a fé religiosa de Beth aumenta. Ela não suporta a ideia
de seus próprios filhos não serem batizados. Mike aponta, repetida­
mente, para o acordo deles: “Isto é o que decidimos, você deve res­
peitá-lo.” Beth reconhece que ela fez o acordo de boa fé. No entan­
to, ela argumenta que o acordo foi feito anos atrás e agora ela mu­
dou. Ela não deveria ter que aceitar as condições de um antigo
acordo que já não funciona para ela.
204 0 delicado equilíbrio

Obviamente, não há uma lista universal sobre que deveria ou


tem que ser aceito nos relacionamentos. Ambos os parceiros podem
solicitar ou exigir que o outro aceite certos aspectos de si mesmos.
Ambos podem certamente recusar-se a fazer quaisquer mudanças
nas características para as quais eles buscam aceitação. No entanto,
se o parceiro realmente aceita essas características é, completamente,
outra questão.
Exigir aceitação, como exigir mudança, pode diminuir a proba­
bilidade de sua ocorrência. Pressões, demandas e imperativos morais
são barreiras à aceitação, assim como são barreiras à mudança. De
fato, podem até ser maiores obstáculos para a aceitação do que para a
mudança. Embora seja possível fazer algumas mudanças a pedido, não
é possível alterar a aceitação da mesma forma. A aceitação é em parte
uma reação emocional que não está sob nosso controle voluntário.
Não se pode gerar aceitação por exigência, assim como não se pode
sentir amor porque alguém exige.

ACEITAÇÃO E MUDANÇA E SUA QUESTÃO CENTRAL

Nas Partes I e II deste livro, você identificou uma questão cen­


tral em sua relação e conduziu uma análise DEEP (profunda) da mes­
ma, visando as Diferenças entre você e seu parceiro, as reações Emo­
cionais e as sensibilidades associadas que tornam este assunto tão im­
portante para você, os estressores Externos que tornam o manejo mais
complicado e o Padrão de comunicação que você e seu parceiro, fre­
quentemente, ficam presos enquanto tentam lidar com esse problema.
Vamos considerar cada componente do DEEP e como a aceitação e a
mudança poderiam ser mobilizadas neles.
Diferenças fundamentais (ou semelhanças) entre parceiros não
costumam mudar muito facilmente ou rapidamente. Elas muitas ve­
zes resultam da composição da personalidade de cada um e são geral­
mente bem marcadas por genes e vivências. Se um é mais extrovertido
Diferenças Reconciliáveis 205

e o outro mais introvertido, então essa diferença, provavelmente, não


será extinguida logo. Da mesma forma, se um é mais econômico e o
outro mais gastador, se um é mais cheio de planos e o outro mais es­
pontâneo, ou se um é mais próximo de sua família de origem e o ou­
tro mais distante, essas diferenças, provavelmente, precederam a rela­
ção e podem persistir durante todo o relacionamento. Não é que es­
sas diferenças sejam imutáveis; é apenas que elas não mudarão facil­
mente. Assim, para a parte das Diferenças da análise DEEP, prova­
velmente a aceitação será mais acionada do que a mudança. Isso não
significa que a mudança não pode ser útil para acomodar as diferen­
ças. Um extrovertido e um introvertido podem elaborar maneiras
para que o extrovertido satisfaça sua necessidade de socialização sem
sempre envolver o introvertido. Mas as próprias diferenças podem
precisar ser aceitas.
As sensibilidades Emocionais que criam fortes emoções superfi­
ciais e ocultas, as quais as pessoas exibem em seus conflitos centrais,
também não são facilmente sujeitas a mudanças. Se alguém é sensível
à crítica, ou se sente abandonado facilmente, ou está ansioso por estar
no controle, ele ou ela não vai rapidamente “superar” essa sensibilida­
de. Tendências genéticas e experiências passadas significativas deixa­
ram sua marca nelas, e essas sensibilidades fazem parte de quem são.
Então aqui também a aceitação é a primeira alternativa. Isso não sig­
nifica que a mudança não pode ajudar um casal a acomodar ou geren­
ciar suas sensibilidades. Por exemplo, talvez um parceiro de alguém
sensível à crítica aprenda quando e como é útil fazer seus comentários
críticos e, mais importante, quando não fazê-lo. Mas as sensibilidades
fundamentais são parte de quem a pessoa é e, possivelmente, apenas
mudarão de maneira gradual.
Ao contrário das Diferenças e das sensibilidades Emocionais, os
estressores Externos não são parte de quem somos. Eles compõem o
ambiente em que vivemos. Muitas vezes temos a capacidade de alterá-
-los, como, por exemplo, não assumir um novo projeto ou decidir
gastar menos em lazer para não entrarmos no limite financeiro. No
206 0 delicado equilíbrio

entanto, com frequência, seria muito custoso mudar um estressor,


criando assim mais desgaste para nós. Poderiamos certamente deixar
um trabalho estressante, mas as consequências poderiam ser terríveis,
levando-nos a ainda mais esgotamento. Poderiamos nos mudar para
um bairro melhor, mas isso pode significar um trajeto de casa para o
trabalho mais longo e estressante. Assim, às vezes, podemos fazer mu­
danças em um estressor, mas outras vezes precisamos aceitá-lo (pelo
menos por um tempo) e podemos alterar apenas a forma como lida­
mos com ele.
Nossos Padrões de comunicação são a área em que temos mais
poder para mudar. Podemos alterar a maneira como conversamos com
nosso parceiro, a forma como lidamos com ele ou ela sobre as ques­
tões que nos importam. Não que seja fácil. Nossas diferenças de per­
sonalidade e sensibilidades emocionais informam como nos comuni­
camos. Entretanto, todos nós falamos de modo razoavelmente cons­
trutivo sobre problemas e todos nós falamos sobre problemas de for­
mas que levaram, provavelmente, a discussões e distância. Portanto,
esta é a área onde a mudança será mais proeminente. Não que a acei­
tação também não seja necessária aqui. Pode ser muito útil, por exem­
plo, que uma pessoa que gosta de conversar perceba e aceite que seu
parceiro tenha menos vontade de ter conversas intensas ou análises re-
veladoras da alma. Mas ajudá-lo a mudar os padrões negativos de co­
municação identificados no Capítulo 6 será um dos principais objeti­
vos da Parte IV deste livro.
Diferenças Reconeiliáveis 207

RECAPITULANDO
Neste capítulo distinguimos entre aceitação e mudança. Mudança ocorre quan­
do o autor de algum comportamento ofensivo (ou o parceiro que não tem algum
comportamento desejado) faz algo diferente. Uma pessoa crítica diminui a fre­
quência ou a intensidade da crítica; um parceiro não afetuoso se torna mais afeti­
vo. Aceitação ocorre quando o destinatário do comportamento ofensivo, ou a fal­
ta do comportamento, responde de forma diferente. 0 receptor da crítica ou o
parceiro de um companheiro não afetuoso é menos tocado pela crítica ou pela
falta de afeto e não é tão ferido pelo comportamento ofensivo (ou falta do com­
portamento).
Problemas nos relacionamentos podem ser resolvidos, pelo menos teoricamente, por
uma mudança completa por parte do emissor, aceitação completa por parte do re­
ceptor, ou uma combinação dos dois. A terceira solução, uma combinação de aceita­
ção e mudança, é claramente o caminho mais viável.
Certos comportamentos, como o abuso físico, nunca deveríam ser aceitos. Além disso,
certas características do outro, como uma característica física imutável ou uma ca­
racterística de personalidade central, podem precisar ser aceitas. No entanto, existem
poucas regras universais, preciosas, que certamente devem ser mudadas ou devem ser
aceitas em todos os casais para um bom relacionamento existir. Na verdade, cada um
de nós deve decidir o que é inaceitável em nossos parceiros e o que somos incapazes
ou não estamos dispostos a mudar em nós mesmos (e, portanto, possivelmente preci­
sam ser aceitos pelos nossos parceiros). O perigo é que a lista do que é inaceitável em
nossos parceiros pode ficar muito longa e a lista do que estamos abertos a mudar em
nós mesmos pode ser curta.
Quando consideramos os quatro aspectos da análise DEEP de um problema central
que descrevemos na Parte I, a aceitação será necessária para as diferenças funda­
mentais entre você e seu parceiro, bem como para as reações emocionais e sensibili­
dades que cada um de vocês traz ao relacionamento. Alguns estressores podem ser
mudados, mas outros simplesmente devem ser aceitos; o que pode ser mudado é
como você responde a eles. 0 padrão de comunicação é a área onde a mudança será
mais necessária. Falar com seu parceiro de forma mais construtiva é algo que todos
nós temos o poder de fazer.
Neste livro, focamos primeiro em promover a aceitação nos relacionamentos, não só
porque é importante por si só, mas também porque muitas vezes pode levar a mu­
danças espontâneas. Quando há maior aceitação em uma relação, ambos os parceiros
serão menos defensivos e mais abertos para ouvir o que o outro precisa e quer. Am­
bos podem responder a essas necessidades e desejos simplesmente porque se impor­
tam com o outro.
208 0 delicado equilíbrio

Exercício: Mudança e Aceitação


e Seu Conflito Central

Pense sobre sua questão central e sua análise DEEP (PROFUN­


DA) dela e responda às seguintes perguntas.

1. Há algo que você está fazendo que é um comportamento ver­


dadeiramente inaceitável? Se sim, o que é e como você pode
mudá-lo?

2. Há algo que seu parceiro está fazendo que é um comportamento


verdadeiramente inaceitável? Se sim, o que é e como você pode
mudá-lo? (Observe que retornaremos ao comportamento inacei­
tável no Capítulo 15.)

3. Há alguma coisa que você tenha tentado mudar sem sucesso e


que seria melhor aceitar, como a maneira em que seu parceiro é
diferente de você ou uma sensibilidade de seu parceiro relacio­
nada à questão central?
Diferenças Reconciliáveis 209

PRÓXIMOS PASSOS

Nos próximos três capítulos discutiremos maneiras pelas quais


você e seu parceiro podem promover a aceitação mútua. Porque
aceitação é em parte uma reação emocional que não está sob contro­
le voluntário, não podemos fornecer receitas ou fórmulas; só pode­
mos descrever o tipo de experiências que podem promover a aceita­
ção e oferecer orientação para gerar essas experiências em seus rela­
cionamentos.
Promover a aceitação nos relacionamentos é um pouco como
promover a confiança. Advertências e súplicas, evidências e discussões
não vão muito longe. Estêvão iniciou o relacionamento com Josi inco­
modado por perguntas sobre a confiabilidade dela, não por qualquer
coisa que Josi tivesse feito, mas porque sua própria história tinha gerado
desconfiança: namoradas anteriores tinham mentido e enganado ele.
Como Estêvão pode aprender a confiar em Josi? Não adiantará muito
que Josi peça ou exija confiança; essas ações meramente criariam resis­
tência ou, pior, suspeita nele. Seria mais producente, em alguns mo­
mentos, que Josi reassegurasse seu amor por Estêvão, mas é provável
que ele ainda fique cauteloso porque suas outras namoradas também
tinham afirmado seu amor. Josi poderia contar-lhe sobre sua história de
honestidade e monogamia; racionalmente seria possível que ele acredi­
tasse nela, mas emocionalmente ele ainda poderia desconfiar.
Experiências que demonstram sua fidelidade ajudarão muito
mais. Situações como uma festa em que um homem mostra interesse
por ela, uma visita do seu antigo namorado e ter uma relação próxima
com um colega do sexo masculino no trabalho desafiariam a confian­
ça de Estêvão em Josi, mas também ofereceríam uma oportunidade
para sua honestidade e fidelidade ser demonstrada e para ele adquirir
mais confiança. Se ela é aberta e honesta sobre esses eventos, e se ela
mantém os limites adequados em todos esses contatos, a confiabilida­
de de Estêvão em Josi pode crescer - como poderia a segurança dela
em relação à confiança dele.
8

Nossa própria história


Aceitação pela compreensão

Ao compreender tudo, tudo está perdoado — e tudo


está aceito.
Variação de um velho adágio

A narrativa é radical, criando-nos no momento em


que está sendo criada.
Toni Morrison, Book ofNobel Lectures (1995).

A definição de um problema contém as sementes de sua solu­


ção. Como entendemos um problema determina a forma como lida­
mos com ele. Como vimos ao longo deste livro, a maioria de nós ten­
ta resolver o conflito conjugal exigindo uma reformulação dos nossos
parceiros. Por quê? Porque nós definimos o problema em termos da
outra pessoa: Eu tenho problemas por causa de você. Eu tenho problemas
por causa da maneira que você é.
Vimos também - muitos de nós em primeira mão - que tais so­
luções geralmente ficam aquém e muitas vezes até causam problemas
próprios. Definir problemas de relacionamento em termos de seu par­
ceiro pode criar conflitos destrutivos sobre quem é ruim ou louco ou
inadequado e, portanto, sobre quem deve procurar instrução moral,
Diferenças Reconeiliáveis 211

ajuda médica ou psicológica, ou educação corretiva. Mesmo a solução


final para o conflito conjugal, separação ou divórcio, com frequência
causa mais problemas do que resolve - como muitos casais bem sabem.
Nossos objetivos neste livro são duplos. Queremos ajudar os ca­
sais a lidar com os problemas de relacionamento cotidiano de forma
construtiva e queremos ajudar os casais a lidar com esses problemas de
relacionamento de maneira que os aproximem ativamente. O primei­
ro objetivo é simplesmente gerenciar um problema de forma eficaz; o
segundo objetivo, mais abrangente, é criar maior intimidade diante
dos problemas. Para lhe dar a maior chance de elaborar soluções que
funcionam para atingir esses objetivos, queremos que você defina o
problema com precisão. O método que concebemos para fazer isso é
criar uma verdadeira “história” de seus problemas.
No nosso aconselhamento de casal, passamos três ou quatro ses­
sões avaliando o problema e depois fornecemos aos casais as nossas
considerações. Uma parte importante desta devolução é a história que
contamos sobre seus problemas, que deve atender a critérios exigen­
tes. Primeiro, a história deve ser verdadeira no sentido de que ela se
encaixa em todos os fatos que apreendemos sobre o problema. Em se­
gundo lugar, ela deve ser única, na medida em que captura a expe­
riência particular de cada parceiro e de seu relacionamento. Em terceiro
lugar, deve ser original e realista. Em quarto, deve ser uma história em
que ambos possam concordar. Este último critério é o mais difícil de
atender. Normalmente, um casal entra em tratamento com histórias di­
ferentes e incompatíveis sobre seus problemas. Ele vê o problema como
resultado de algo nela, da família dela ou do ambiente dela; ela vê o
problema como resultado de algo nele, da família dele ou do ambiente
dele. Nosso objetivo é criar uma história comum aos dois.
Esta história do problema é essencial porque fornece a estrutura
para os nossos esforços de intervenção. E o alicerce para a aceitação e
a mudança por ambos os parceiros. Sabemos que os casais passam
tempo pensando nos seus problemas e sobre os motivos pelos quais
eles os têm. Queremos que incorporem uma história comum em seu
pensamento.
212 Nossa própria história

Você já criou uma nova história sobre o problema central em


seu relacionamento: sua análise DEEP (profunda). Entretanto, por­
que a história é tão nova, pode não estar totalmente desenvolvida e
pode ter alguns erros nela, alguns vestígios da velha história. Neste ca­
pítulo vamos rever essa história, desenvolvê-la com um exemplo, e nos
certificarmos de que temos todos os ingredientes certos.

0 QUE A HISTÓRIA DO PROBLEMA DEVE OU NÃO INCUIR

Uma boa história do problema se baseia nas análises da Parte


IL. E a “anatomia da discussão” para um único casal. Como qual­
quer boa história, enfatiza certas características e negligencia outras,
como será ilustrado por três casais com problemas comuns de rela­
cionamento. O problema de Chico e Graze é o sexo: eles não con­
seguem concordar sobre como e quantas vezes ter relações sexuais.
Janice e Luiz têm um problema de responsabilidade: eles discutem
sobre quem faz o quê na casa. E Saul e Erik têm um problema com
a família de origem: eles discutem sobre a mãe de Saul. Mesmo que
cada casal tenha circunstâncias únicas, seus conflitos podem parecer
familiares.

Questão central e descrição do conflito recente


Anote sua questão central e descreva brevemente um conflito re­
cente sobre esse problema. Por exemplo, Chico e Graze podem escrever
o seguinte: Nossa questão central: conflitos sobre o sexo. Descrição de
um conflito recente: No último sábado à noite, Chico queria fazer sexo
com Graze e queria que eles entrassem no clima assistindo a um filme
pornô que ele tinha gravado. Graze não estava certa se estava a fim de
sexo e certamente não queria assistir a nenhum filme pornô.

Nossa questão central:


Diferenças Reconciliáveis 213

Descrição de um conflito recente:

Diferenças ao invés de defeitos


Uma boa história do problema enfatizará diferenças entre os par­
ceiros em vez de defeitos em qualquer um deles. Concentra-se em in­
compatibilidades entre o casal em vez de falhas em ambos os cônju­
ges. Em nossa história do problema do sexo, nós nos concentramos
no fato de que Chico tem um desejo sexual diferente de Graze. Ele
prefere o sexo frequente envolvendo uma grande variedade de posi­
ções, e gosta de começar a fazer amor com Graze vestida provocadora-
mente com roupas íntimas sensuais. Graze geralmente prefere cari­
nhos ao sexo, sente-se desconfortável usando roupas sensuais e sente-
se mais interessada em ter relações sexuais depois de uma noite ro­
mântica, com as luzes apagadas e na posição papai e mamãe.
Seria fácil encontrar defeitos em ambos os lados desta história. Po­
deriamos rotular Chico como um marido tarado que trata Graze como
um objeto sexual em vez de uma esposa e amante; nós poderiamos rotu­
lar Graze como uma esposa sexualmente inibida que se sente desconfortá­
vel com seu corpo em geral e com sexualidade em particular. Em vez dis­
so, nossa história enfatizará as simples diferenças que existem no que Chi­
co e Graze acham confortável e agradável em seu relacionamento sexual.
Na nossa história do problema de responsabilidade, nós deve­
mos nos concentrar na necessidade de ordem de Janice em casa e na
sua preferência pela igualdade entre marido e mulher dentro e fora do
lar. Nossa história vai mostrar que conforto para Luiz deve ter algum
nível de desorganização das pessoas e das coisas e sua crença na teoria
da igualdade, não está exatamente de acordo com os mesmos padrões
propostos pela Janice. Resistiremos à tentação de rotular Janice como
compulsivamente impecável e controladora ou Luiz como desleixado
e passivo-agressivo.
214 Nossa própria história

Ao desenvolver a história sobre o problema com a família de


origem de Saul e Erik, iremos enfatizar a diferença de apego a suas
mães, em vez de explorar se Saul é um homem que nunca “cortou o
cordão umbilical” com sua mãe ou se Erik é inseguro e ciumento do
relacionamento de Saul com a mãe.
Mas e se realmente houver defeitos em um ou ambos os mem­
bros do casal? Deveriamos dissimular essas deficiências eufemistica-
mente chamando-as de “simples diferenças” ao invés de enfrentá-las
diretamente? Não devemos fazer uma distinção clara entre o que são
defeitos e o que são diferenças?
Exceto em extremos, tais distinções são quase impossíveis de
sustentar, porque todo comportamento cai em algum lugar ao longo
de um continuum. Quem vai dizer onde as diferenças “normais” ter­
minam e os defeitos patológicos começam? Profissionais de saúde
mental frequentemente não conseguem entrar num acordo. Mesmo se
tivéssemos dados confiáveis sobre a resposta sexual das mulheres ou a
desorganização dos homens, e mesmo se pudéssemos provar que Gra-
ze estava abaixo da média na questão sexual e Luiz estava acima da
média no quesito desorganização, qualquer decisão seria sobre um
ponto de corte “defeituoso” e seria claramente arbitrário.
E, mesmo se pudéssemos fazer distinções confiáveis entre dife­
renças e defeitos, qual a finalidade disto? Um foco na deficiência mui­
tas vezes leva à culpa e acusação, por um lado e comportamento de­
fensivo, por outro. Como vimos, isso não nos conduz a soluções, mas
com frequência a problemas reativos que são ainda mais intensos do
que os problemas originais.

Diferenças na questão centrai e conflito recente


Agora que você teve a chance de pensar sobre suas diferenças ou
semelhanças com mais detalhes, escreva-as abaixo. Descreva-as o mais
detalhadamente possível mencionando as diferenças específicas que
geraram o seu conflito recente, tendo o cuidado de excluir qualquer
referência a defeitos. Por exemplo, Chico e Graze podem escrever o
Diferenças Reconciliáveis 215

seguinte: Diferenças Gerais: Chico tem um impulso sexual mais forte


do que Graze e se interessa mais por sexo selvagem, enquanto que
Graze está mais interessada em sexo romântico. Diferenças no conflito
recente: Chico estava interessado em sexo e queria usar um filme por­
nô para colocá-los no clima. Graze não queria assistir a este tipo de
filme e não tinha certeza se ela estava a fim de sexo. Volte ao final do
Capítulo 6, onde escreveu pela primeira vez a sua análise DEEP (pro­
funda) do seu conflito central, para obter idéias adicionais.

Diferenças gerais na nossa questão central:

Diferenças específicas no nosso conflito recente:

Reações emocionais ao invés de provocações


Nas nossas histórias sobre nossos problemas, é provável que nos
concentremos nos comportamentos desrespeitosos que nos ofendem,
nas atitudes provocadores que nos perturbam. Graze pode se concentrar
na maneira agressiva como Chico a agarra. Janice pode se concentrar na
maneira desleixada em que Luiz deixa suas roupas espalhadas pelo quar­
to. Saul pode se concentrar na frieza com que Erik responde à sua mãe.
Se o nosso parceiro faz algo que cria uma forte reação negativa
em nós, frequentemente presumimos que nosso parceiro deve querer
criar essa reação na gente. Chico, muitas vezes, sente uma mistura de
raiva e mágoa porque, na sua opinião, Graze coloca limitações fictícias
sobre o prazer sexual que ambos poderiam experimentar. Mesmo nas
ocasiões em que têm relações sexuais, ele se sente limitado em sua ex­
pressão sexual. Além de sua raiva e frustração, ele se sente machucado.
216 Nossa própria história

É óbvio que, para ele, Graze não está satisfeita sexualmente, e por isso
ele se sente como um fracasso sexual. Ele se sente fragilizado por toda
a situação; afinal, um homem de verdade deveria ser capaz de dar pra­
zer à sua mulher. Então, talvez Graze queira fragilizá-lo; talvez ela se
sinta ameaçada por sua masculinidade e está tentando diminuí-lo.
Talvez inconscientemente ela queira que ele seja impotente!
Por sua parte, Graze sente tanta pressão e insatisfação de Chico
que ela questiona sua própria sexualidade. Ela vacila entre sentir raiva
dele por suas iniciativas e sentir-se inadequada como esposa e amante.
Em sua raiva, ela pode pensar que apenas uma estrela pornô poderia
satisfazer Chico. No entanto, ela sabe que sempre foi tímida e inibida
sexualmente. Infelizmente, sua relação sexual com Chico está distorci­
da por tanta pressão que suas inibições aumentaram, não diminuíram.
Então, ela começa a pensar: “Talvez ele queira que eu me sinta inade­
quada. Talvez ele esteja projetando em mim algum tipo de raiva in­
consciente para com as mulheres.”
Mesmo se não supormos que nossas fortes reações emocionais
próprias envolvam motivos inconscientes e negativos em nosso parcei­
ro, há uma outra maneira que as consequências emocionais do confli­
to podem afetar nossas histórias sobre estes conflitos. Podemos encon­
trar, na presença de nossa própria forte emoção negativa, a evidência
de uma ausência de forte emoção positiva em nossos parceiros em re­
lação a nós. “Se você está fazendo algo que cria uma reação tão negati­
va em mim, então certamente você não deve se preocupar com meus
sentimentos. Se você fizer coisas que me machucam, como você pode
me respeitar? Se você tomar atitudes que me fazem sentir não amado,
como pode realmente me amar?”
Erik quer um relacionamento mais próximo com Saul. Erik mui­
tas vezes se sente negligenciado por ele, particularmente quando vê o
quanto de contato Saul tem com sua mãe e pode imaginar a intimidade
que eles devem ter juntos. Ele se pergunta se Saul realmente o ama. Em
sua raiva, ele acusa seu parceiro de falta de amor. Em momentos dramá­
ticos, ele tira sua aliança de casamento e oferece a Saul com o desafio
“Por que você não dá a sua mãe? E ela, realmente, seu cônjuge, não eu!”
Diferenças Reeonciliáveis 217

Por sua parte, Saul se sente magoado e defensivo sobre os fre­


quentes ataques de Erik contra sua mãe e seu relacionamento com ela.
Ele diz a Erik que ele não está pedindo que ele ame sua mãe, apenas
para aceitá-la como ela é, ou pelo menos não atacá-la. No entanto,
para seu desgosto, Erik nunca diz uma coisa positiva sobre sua mãe e,
em vez disso, destaca todas as falhas dela. Saul, com suas próprias acu­
sações, contesta a acusação de Erik de que ele realmente não o ama:
“Como você pode me amar quando você constantemente ataca al­
guém que é tão importante para mim?”
Não surpreende que este foco no comportamento violador
que nos ofende, com frequência, leva a desentendimentos e brigas.
Chico vê suas investidas sexuais em direção a Graze simplesmente
mostrando um saudável interesse sexual por ela. Em sua opinião, ela
deveria ficar lisonjeada em vez de ofendida pelo seu comportamen­
to. Luiz vê Janice como compulsiva em vez de seu próprio compor­
tamento como desrespeitoso. Erik não pode imaginar como ele po­
deria responder de forma diferente a uma mãe que tem promovido
uma dependência tão doentia em seu filho. Se não nos concentrar­
mos apenas no comportamento violador, mas atribui-lo a motivos
repulsivos em nosso parceiro ou sugerir que resulta de uma falta de
amor por nós, então o conflito provavelmente será mais intenso.
Nossa análise do problema o tornará maior.
Para construir uma história em comum, é melhor focar menos
no comportamento violador e mais na vulnerabilidade que o com­
portamento desencadeia, menos na depreciação e mais na sensibili­
dade, menos na acusação e mais na ferida. Qualquer que seja o
modo que possamos descrever as investidas sexuais de Chico, para
Graze elas batem mais como um ataque do que um convite. Elas to­
cam uma sensibilidade nela de estar sendo invadida fisicamente. Ja­
nice sente-se ansiosa e fora de controle quando seu entorno está em
desordem. Uma sensibilidade sobre controle e desordem é desenca­
deada quando há bagunça em torno dela. Finalmente, Saul se sente
extremamente protetor de sua mãe viúva. Como filho único, ele
sabe que ela não tem ninguém mais para cuidar dela. Ele se sente
218 Nossa própria história

dividido entre seu marido e sua mãe quando Erik reage a ela de for­
mas que não lhe parecem amigáveis.

Reações emocionais na questão central e conflito recente


Agora escreva as reações emocionais que cada um de vocês pro­
vavelmente experimenta, incluindo tanto as emoções superficiais ob­
serváveis como as emoções ocultas. Certifique-se de que o foco está
nas reações de cada um, mais do que nas ações do outro ou nas razões
dessas atitudes. Observe também as reações específicas que cada um
sentiu no exemplo mais recente. Por exemplo, Chico e Graze pode­
ríam escrever: Reações emocionais: Ambos tendem a ficar irritados e
chateados. No fundo, Chico tende a se sentir rejeitado e Graze tende
a se sentir pressionada. Reações emocionais específicas no conflito re­
cente: Chico sentiu alguma irritação, mas principalmente desaponta­
mento. Graze se sentiu surpresa e até chocada com a sugestão de ver
um filme pornô, mas acabou se sentindo desesperada questionando se
algum momento ela conseguiría agradá-lo. Volte ao final do Capítulo
6, onde escreveu pela primeira vez a sua análise DEEP (profunda) do
seu conflito central, para obter idéias adicionais.
Reações emocionais superficiais e ocultas durante a nossa ques­
tão central (liste primeiro as suas próprias emoções e depois a sua su­
posição quanto às emoções do seu parceiro):

Reações emocionais superficiais e ocultas durante o nosso con­


flito recente (liste primeiro as suas próprias emoções e depois a sua su­
posição quanto às emoções do seu parceiro):
Diferenças Reeonciliáveis 219

Extressores externos e reações compreensíveis


ao invés de reações estressantes exageradas
Se incluímos o estresse de nossos parceiros em nossa histó­
ria do problema, podemos nos ater a suas reações a esses fatores
de estresse, em vez dos próprios estressores. Afinal de contas, o
que vemos geralmente na nossa frente são suas reações, tais como
quando chegam em casa preocupados, quando ficam acordados
até tarde, ou quando estão tensos ou irritadiços. Muitas vezes
não estamos a par das circunstâncias particulares que causam es­
sas reações, como a demanda de um chefe por um relatório de
trabalho para o dia seguinte, ou a pressão que causa o envelhecen­
do dos pais, o que exige mais tempo juntos. Assim, provavelmente
nos concentraremos nas suas reações e, talvez, nós os vejamos como
não manejando bem o estressor ou reagindo a ele exageradamente. Se
nos concentrarmos nessas reações, particularmente se elas são excep­
cionais, então é provável que desencadeiem conflitos e discussões com
nossos parceiros. Eles vão nos ver acrescentando mais tensão a seus es­
tressores, em vez de apoiá-los.
Se nos concentrarmos nos estressores e tentarmos entender o
significado deles para nosso parceiro, poderemos compreender suas
respostas melhor. Então naturalmente teremos mais empatia por eles,
e também estaremos em melhor posição para saber como ajudá-los ou
apoiá-los. Por exemplo, se Erik compreendeu o senso de responsabili­
dade que Saul tem em relação a sua mãe, o seu medo que ela sofra e
seu desejo de ser um bom filho, Erick poderia ser mais compreensivo
com Saul quando este fica ansioso sobre a próxima cirurgia da sua
mãe. Mesmo que seja uma cirurgia pequena. Os comentários de Erik
sobre o provável resultado da cirurgia podem ser tranquilizadores para
Saul, em vez de desconsiderar suas preocupações. Assim, Erik poderia
ser capaz de ajudar a reduzir seu estresse, em vez de redirecioná-lo
para uma briga entre eles.
220 Nossa própria história

Estressores externos na questão central e conflito recente


Agora escreva sobre os estressores externos que, muitas vezes, afe­
tam sua questão central e os estressores específicos que afetaram o exem­
plo recente. Certifique-se de se concentrar nos estressores externos e em
cada uma de suas reações compreensíveis, em vez de avaliar essas rea­
ções. Por exemplo, Chico e Graze poderiam escrever o seguinte: Estres­
sores externos que influenciam a questão central: Chico encontra no
sexo uma maneira de relaxar depois de um dia estressante, enquanto
que Graze tem dificuldade em relaxar e entrar no clima quando ela teve
um dia estressante ou está preocupada com o amanhã. Estressores exter­
nos no conflito recente: Chico não estava estressado, estava ansioso para
fazer amor com Graze, e aludiu a isso várias vezes no início da noite.
Graze sentiu a pressão das investidas sexuais mais cedo; ela gosta de fa­
zer amor mais quando acontece espontaneamente. Volte ao final do Ca­
pítulo 6, onde escreveu pela primeira vez a sua análise DEEP (profun­
da) do seu conflito principal, para obter idéias adicionais.
Estressores externos típicos e nossas reações compreensíveis que
muitas vezes afetam nosso problema central:

Estressores externos específicos e nossas reações compreensíveis


que afetaram nosso conflito recente:

Padrão de comunicação ao invés de


punição; descrição ao invés de avaliação
Uma boa história de problema inclui uma descrição de como
cada parceiro lida com o problema inicial criado por suas diferenças.
Diferenças Reeonciliáveis 221

suas sensibilidades e suas circunstâncias estressantes. Como um casal


tenta resolver seu problema é tão importante quanto seu conteúdo.
Mas a descrição do processo de enfrentamento deve se concentrar nos
pensamentos, sentimentos e comportamentos proeminentes de cada
parceiro sem julgamentos sobre se os pensamentos são distorcidos, os
sentimentos exagerados ou os comportamentos inadequados. Pren­
dendo-se numa avaliação mútua enquanto você constrói sua história
só irá desviá-lo do seu objetivo de tentar entender o problema.
Uma maneira comum que uma descrição de padrões de comuni­
cação pode se tornar avaliativa é quando os parceiros incorporam puni­
ção na sua análise. As reações que cada um percebe do outro ao lidar
com seu problema podem fazer com que eles se sintam mal, como se
estivessem sendo punidos. Eles podem supor que isso é o que o outro
pretende. Chico pode sentir que está sendo punido por seu interesse se­
xual por Graze ao privá-lo de satisfação, enquanto que ela pode sentir
que está sendo punida por sua reticência pela pressão de se envolver em
atividades sexuais ainda mais ousadas. Janice pode sentir que Luiz está
punindo-a deixando suas roupas bagunçadas, enquanto que ele pode se
sentir castigado pelas reações de Janice quando ela encontra algo fora de
seu lugar. Se eles tentam incorporar essas supostas intenções uns dos
outros em sua análise, isto rapidamente se tornará uma fonte de discus­
são ao invés de uma base para o entendimento comum.
Uma boa história, sem julgamento, captura o processo pelo
qual Chico e Graze tentam lidar com sua dificuldade sexual, mas não
condena qualquer um pelas medidas desesperadas que às vezes empre­
gam. Há um mundo de diferença entre dizer “Você é frígida” e dizer
“Quando eu fico frustrado, eu a acuso de ser frígida.” Da mesma for­
ma, existe uma grande lacuna entre dizer “Você tenta me punir” ver­
sus “Quando chegamos no calor da discussão, eu começo a sentir que
você está tentando me punir”. O primeiro é um julgamento que per­
petuará o problema; o segundo é um relato descritivo da dificuldade
que pode levar ao entendimento. Assim, é possível ter uma descrição
sem julgamento das avaliações que os parceiros fazem ao tentar lidar
com um problema.
222 Nossa própria história

Uma descrição completa da maneira como um casal lida com


uma dificuldade pode incluir algo sobre o desenvolvimento desta e o
seu enfrentamento. O padrão de comunicação que ocorre hoje não foi
provavelmente o que era quando o problema surgiu. No início, talvez
ambos os parceiros fossem mais pacientes e tentavam achar uma solu­
ção, mas ficavam frustrados quando suas tentativas eram malsucedi-
das. Talvez as coisas tenham mudado para um, ou ambos, que torna­
ram o problema mais difícil de resolver. Considere, por exemplo, os
esforços de Saul e Erik para lidar com a mãe de Saul. No início, Erik
estava ansioso por se dar bem com a mãe de Saul e este fez tudo para
que isto acontecesse. Com o passar do tempo, porém, Erik tornou-se
menos complacente quando viu Saul respondendo a mais demandas
de sua mãe, enquanto que Saul se frustrava ao sentir a resistência de
Erik. Além disso, a mãe de Saul desenvolveu mais problemas físicos
na medida em que envelhecia, o que a tornava mais dependente do fi­
lho, o que aumentou tanto as demandas dela sobre Saul, quanto o de­
sejo dele de responder a essas demandas. Assim, o padrão de comuni­
cação dos dois piorou não só por causa de seus repetidos esforços fra­
cassados para lidar com o problema, mas porque as próprias circuns­
tâncias mudaram.

Padrões de comunicação na questão


central e conflito recente
Escreva uma descrição do seu padrão de comunicação, enfati­
zando o que cada um de vocês pensa, sente e faz ao invés de avaliar
essas ações ou atribuir motivos a elas. Por exemplo, Chico e Graze po­
deríam escrever o seguinte. Padrão de comunicação na questão cen­
tral: Chico, muitas vezes, aborda Graze na expectativa de contato se­
xual, mas esperando uma reação negativa dela. Graze, frequentemen­
te, sente-se pressionada para o sexo, mas às vezes cede aos pedidos
dele, porém geralmente resiste. Quando ela resiste, às vezes ambos se
afastam, num clima pesado e outras vezes discutem sobre isto, cada
um acusando o outro de ter problemas sexuais. Padrão de comunica­
Diferenças Reconciliáveis 223

ção no conflito recente: Chico queria fazer amor com Graze e tentou
excitá-la com comentários sugestivos e uma proposta para assistir a
um filme pornô. Graze se sentiu pressionada por estes comentários e
ficou chateada com a proposta do filme. Eles discutiram brevemente e
depois se afastaram. Volte ao final do Capítulo 6, onde escreveu pela
primeira vez a sua análise DEEP (profunda) do seu conflito principal,
para obter idéias adicionais.
O Padrão de comunicação típico durante a nossa questão central:

O Padrão de comunicação durante nosso conflito recente:

Dilemas complexos ao invés de soluções simples


Uma boa história de conflito enfatiza os complexos dilemas
que os problemas de longa data apresentam ao invés de oferecer so­
luções simples para eles. Estas, geralmente, derivam de uma com­
preensão limitada das dificuldades que um problema apresenta,
muitas vezes minimizando ou mesmo ignorando como o próprio
comportamento contribui para essa dificuldade. Essas soluções sim­
ples se concentram nas coisas óbvias que seu parceiro pode fazer
para resolver esse problema. São, frequentemente, soluções que
complicam ainda mais os problemas, curas que agravam a doença.
Consequentemente, o que pode parecer um tanto paradoxal, os ca­
sais podem resolver dilemas complexos mais facilmente do que po­
dem implementar soluções simples.
A solução simples de Luiz é “Olha, eu coopero e quero ajudar.
Peça-me ajuda quando precisar de mim e me pede com gentileza,
não de uma forma irritada, braba, e eu normalmente faço o que
224 Nossa própria história

você quer que seja feito.” Esta solução simples ignora pelo menos
duas grandes questões. Janice quer que Luiz seja mais parceiro, não
apenas um ajudante. Ela quer que ele se dê conta quando as crianças
precisam, quando a casa precisa ser arrumada, ou a louça precisa ser
lavada. E, então, que ele tome uma atitude. Em vez disso, ele se reti­
ra em seu próprio mundo, lendo o jornal ou assistindo televisão, e
deixa toda a responsabilidade para ela. Quando ela fica sobrecarre­
gada com as responsabilidades domésticas e o vê “em seu próprio
mundo”, ela fica extremamente irritada para pedir gentilmente ou
docemente por sua ajuda.
A solução simples de Janice para seu problema seria: “Luiz, le­
vante e assuma um papel igual na família. Olha ao redor, veja o que
precisa ser feito e faça-o. Não espere que eu diga a você o que fazer ou
que as coisas fiquem completamente fora de ordem.” A solução sim­
ples de Janice também ignora algumas facetas importantes do proble­
ma deles: Luiz tem padrões diferentes de Janice para o lar e para as
crianças. E para ele agir por conta própria, as crianças teriam que estar
fazendo a maior bagunça, quase saindo do controle e a casa estar em
maior desordem do que Janice poderia tolerar. Então, Janice quer que
Luiz tome medidas de acordo com seus padrões, e não de acordo com
os dele, o que naturalmente seria muito mais difícil para Luiz. Além
disso, quando ele toma uma atitude, seja com as crianças ou com a
casa, muitas vezes não faz tão bem quanto Janice. Ela então o critica,
o que faz com que ele sinta que ela não ficará feliz a menos que seja
feito da maneira dela. Sendo assim, ele reage se afastando completa­
mente das tarefas domésticas. Já começa que, em primeiro lugar, ele
nem quer assumir tais responsabilidades, especialmente porque ele é
criticado por seus esforços.
Assim, as soluções simples propostas por cada um não terão êxi­
to. Eles colocam toda a responsabilidade sobre o outro, desconside­
ram o papel de cada um no problema e ignoram as barreiras emocio­
nais à sua implementação. Enquanto Luiz e Janice discutem sobre es­
sas “soluções simples”, eles, provavelmente, criarão problemas reativos
que, no mínimo, complicarão seu problema inicial. Uma história que
Diferenças Reeonciliáveis 225

descreve o complexo dilema do casal, ao invés de “soluções simples”,


pode criar mais aceitação em cada um dos parceiros e, possivelmente,
oportunidades mais realistas de mudança.

UMA HISTÓRIA COMO EXEMPLO

Até este momento, examinamos fragmentos de histórias de con­


flitos, trechos da luta de cada casal. Agora apresentamos uma história
de conflito completa: a dificuldade sexual de Chico e Graze.
As diferenças entre o interesse de Chico e Graze por sexo e suas
maneiras de expressá-las têm múltiplas origens. Em parte, elas repre­
sentam diferenças sexuais estereotipadas entre masculino e feminino
na América e, portanto, podem refletir as maneiras que meninos e
meninas são socializados. Em parte, podem representar diferenças
biológicas entre homens e mulheres. Mas suas diferenças também re­
fletem suas próprias histórias pessoais.
Graze veio de um lar mais religioso do que Chico, onde o recato
era a norma. Ela aprendeu sobre sexo com seus pais, que se certificaram
de que ela escutasse, primeiramente deles, para que pudessem ensiná-la
que expressão sexual deve acontecer dentro de um contexto apropriado
de amor. Antes de seu relacionamento com Chico, ela tinha tido apenas
uma relação que tinha sexo, com um namorado de longa data que ela
imaginava que iria casar. Seu relacionamento sexual com ele foi bom, mas
muito tradicional. Eles faziam amor no escuro, com ele por cima.
Chico aprendeu sobre sexo nas ruas com seus amigos. Seu pai
fez um leve esforço para lhe falar sobre sexo, deixando-lhe um livro e
convidando-o a fazer quaisquer perguntas que tivesse “sobre homens e
mulheres”. Chico não tinha certeza do que seu pai estava falando e
não estava interessado em perguntar. Quando ficou mais velho, seu
pai aconselhou-o a “manter seu pinto protegido”. Nesse ponto, seu
pai tinha pouca credibilidade com Chico. Este era sexualmente ativo
desde o fim da sua adolescência. Teve muitos relacionamentos dife­
rentes, e o sexo foi uma parte importante e prazerosa de todos eles.
226 Nossa própria história

Graze e Chico se conheceram quando ambos estavam com pou­


co mais de 20 anos. Ele se sentiu imediatamente atraído e foi atrás
dela insistentemente. Ela ficou lisonjeada por suas atenções, mas esta­
beleceu condições firmes sobre contato sexual. Ele respeitava seus li­
mites, mas também era desafiado por eles. A medida em que seu rela­
cionamento se desenvolvia, Graze, muitas vezes, achava estimulante o
intenso interesse de Chico por excitá-la, assim como sua busca pela
novidade sexual. Ele achava excitante a necessidade de cortejá-la cons­
tantemente. Suas diferenças despertaram a atração sexual entre eles.
Com o passar do tempo, o interesse sexual sistemático de Chico
tornou-se menos lisonjeador, menos excitante e mais claramente um
aborrecimento para Graze. Sua hesitação e, às vezes, resistência ativa tor­
nou-se menos desafiante para Chico e mais um obstáculo à satisfação se­
xual. O afeto físico de Chico e a atenção amorosa à Graze, que sempre lhe
serviram como afrodisíaco, sofreram com o conflito sexual deles e com a
familiaridade do contato diário. Como ele poderia ser tão atento e amo­
roso com ela quando se sentia tão negligenciado sexualmente? Para Graze,
Chico parecia cada vez menos interessado em amá-la e mais interessado
em simplesmente usá-la para o prazer sexual. Como ela poderia dar uma
resposta sexual quando ela não sentia o amor dele?
O que era antes uma sedução cheia de carinhos dele e os recata­
dos limites dela tornaram-se, ao longo do tempo, insistentes pressões
e recusas explícitas. A frustração pela falta de resposta e a expectativa
de uma reação negativa roubaram de Chico a gentileza e charme com
que ele, muitas vezes, a seduzia. A tensão das exigências imediatas dele
reforçou a resistência dela.
O que mudou neles não foi apenas a maneira como lidaram
com suas diferenças, mas as próprias diferenças. As exigências de Chi­
co amorteceram qualquer interesse espontâneo por sexo que Graze
pudesse ter. A resistência dela ao sexo e a privação que ele experimen­
tava criavam mais, e não menos, desejo nele. Então agora ele quer
mais sexo do que nunca e ela quer menos sexo do que nunca.
Os problemas sexuais também criaram ou acentuaram vulnera-
bilidades em cada parceiro. Graze nunca tinha sido completamente
Diferenças Reeonciliáveis 227

segura de si em relação à sua sexualidade. Agora ela sentia ainda mais


ansiedade sobre isto e, quando não estava zangada com Chico, pergun­
tava-se o que havia de errado com ela. Chico sempre se orgulhara de si
mesmo como um bom amante. Mas ele também, quando não estava
colocando o problema em Graze, começava a se questionar sobre si
mesmo. Ele certamente não era um bom amante com Graze. Assim
ambos se tornaram mais sensíveis sobre sua própria sexualidade.
As circunstâncias estressantes muitas vezes exacerbavam os pro­
blemas que Chico e Graze experimentavam. Ela ficava mais aberta ao
sexo quando estava completamente relaxada, mas com um emprego
com tempo integral e duas crianças pequenas, ela raramente encontra­
va momentos que não tivessem exigências sobre ela. Chico sempre en­
contrava na sexualidade uma liberação do estresse e da tensão. O rela­
xamento natural que o orgasmo lhe dava era uma coisa que ele sabia
que iria reduzir seu estresse. Assim, seu desejo sexual aumentava fre­
quentemente quando ele estava sob estresse, enquanto que o de Graze
diminuía quando ela estava estressada. No entanto, muitas vezes, eles
estavam sob tensão ao mesmo tempo.
Graze, agora, sente uma pressão implacável de Chico para ter
relações sexuais. Mesmo que ele não expresse diretamente, a forma
como ele a olha lhe diz que ele está pensando nisso e se perguntando
se agora é a hora. Ainda que ela concorde em transar, sente-se pressio­
nada em fazê-lo de maneiras que a deixam desconfortável. Parece que
os próprios desejos de Chico para o sexo levam a melhor. Não sobra
espaço para os sentimentos dela. Graze se pergunta “Como ele pode
se importar comigo quando ele força seus próprios desejos sexuais e
não tem nenhuma consideração pelos meus sentimentos?”
O sentimento de pressão da Graze sobre sexo é real e intenso. E
ainda mais, esse sentimento é fundamentado na realidade: Chico fica
“controlando” de perto, na esperança de encontrar o interesse dela,
ou, pelo menos, alguma concessão de sua parte. Durante o sexo ele
muitas vezes força alguma experimentação ou variação. No entanto,
ele raramente ignora os sentimentos dela. Ele a examina tão intensa­
mente porque está ciente de seus sentimentos e tenta avaliar seu esta-
228 Nossa própria história

do emocional antes de fazer qualquer investida sexual. Ele dificilmen­


te avança quando está alheio ao humor dela. Na verdade, a sensibili­
dade de Chico ao estado de espírito de Graze, em parte, cria o escrutí­
nio que aumenta a pressão que ela sente!
Com um problema tão grande e desgastante, cada um deles
pensa muito nisso. Ela se pergunta se realmente ele a ama. Ele se
pergunta se ela secretamente quer fragilizá-lo. Ao dividir suas idéias
individuais sobre o problema, estas tornam-se parte do problema.
Eles discutem não apenas sobre quando e como ter relações sexuais,
mas sobre as razões de serem da maneira que são e sobre possíveis
soluções para o problema. Ela o acusa de usá-la como um objeto se­
xual. Ele a acusa de ser frígida e a compara com outras mulheres.
Eles geram más soluções, simplistas e impossíveis para o problema.
Ele sugere que ela “simplesmente faça”, quer ela sinta vontade ou
não. Então talvez ela fosse se acostumar com o sexo e se sentir con­
fortável. Ela sugere que ele ignore seus impulsos adolescentes e os
impeça de controlar sua vida. Então talvez ele pudesse crescer e ter
um relacionamento sexual adulto.
Como uma história como essa pode ser útil para um casal?
Seu problema parece tão difícil, seu padrão parece tão entranhado, e
cada um parece tão preso que nenhuma solução parece possível. Mas
se esta história define com precisão o problema e descreve com vera­
cidade as formas fracassadas que cada um tenta resolvê-lo, a história
está certa. E se o casal começa a entender o problema de acordo com
esta história, poderá aceitar mais o comportamento um do outro
nessa situação. Os parceiros podem aliviar a acusação, culpa e com­
portamentos defensivos que tornaram o problema inicial um pro­
blema reativo mais grave. Podem encontrar alguma compaixão um
pelo outro, entre as ruínas de sua relação sexual. Eles podem se sen­
tir menos sozinhos em sua experiência diante deste problema dolo­
roso, porque eles encontram uma vítima igual, justamente no par­
ceiro. Eles podem encontrar intimidade emocional na sua batalha. E
a união íntima daqueles que lutam juntos pode ser uma poderosa
força contra o maior dos problemas.
Diferenças Reconciliáveis 229

RECAPITULANDO
0 primeiro passo para resolver um problema é defini-lo adequadamente. Uma boa
definição de um problema de relacionamento é uma história sobre a dificuldade em
que ambos os parceiros conseguem concordar. É uma história que incorpora o tipo de
análise descrita na Parte II, mas para um problema único de um casal em particular.
Como qualquer boa história, uma narrativa sobre um problema de relacionamento
enfatiza certas características sobre outras. Uma boa história é aquela que enfatiza
as diferenças entre os parceiros em vez de debilidades em qualquer um deles, que sa­
lienta as vulnerabilidades de cada um, em vez de violações por qualquer um, que
destaca os estressores que cada um experimenta e suas respostas compreensíveis, ao
invés das reações exageradas estressantes que cada um pode ter, que se concentra na
descrição e não na avaliação de seus esforços para lidar, e que define dilemas com­
plexos ao invés de soluções simples para o problema. Tal história, que é uma "anato­
mia de uma discussão" única para um casal, dá a cada parceiro uma rica compreen­
são do problema que fornece uma base tanto para a aceitação como para mudança.

Exercício: Quais Soluções


Simples Você Tentou?

Você já completou a maioria dos exercícios neste capítulo, escre­


vendo sua análise DEEP (profunda), tendo certeza de que não inclui
elementos desnecessários, e usando a análise DEEP para olhar um
exemplo recente do conflito. Um breve exercício final é olhar para as
soluções simples que tanto você e seu parceiro têm proposto, mas que
não funcionaram, pelo menos até agora. E útil saber o que não funcio­
na. No entanto, à medida que você alcança maior compreensão e acei­
tação de seu problema central e leia mais tarde capítulos sobre a reso­
lução de problemas, você poderá ser capaz de pegar alguns aspectos de
suas soluções simples e incorporá-los em uma resolução mais viável.
Soluções simples para a questão central que eu propus (talvez
no auge do conflito):
230 Nossa própria história

Soluções simples para a questão central que o meu parceiro


propôs (talvez no auge do conflito):

PRÓXIMOS PASSOS

Neste capítulo, nós nos concentramos numa compreensão


DEEP (profunda) e complexa de um problema, criando uma história
sobre ele, uma história que não se baseia em soluções unilaterais sim­
ples. Tal compreensão pode levar à maior aceitação e, até mesmo, a
uma sutil mudança espontânea. No mínimo tal história pode dimi­
nuir a probabilidade de que um problema reativo se desenvolva como
resultado de um manejo viciado para lidar com o problema inicial.
Entretanto, há outras maneiras além da compreensão intelectual para
criar a aceitação, tal como por meio da empatia e da compaixão, um
tópico para o qual nos voltaremos agora.
9

Caminhando com
os sapatos do outro
Aceitação pela compaixão

... as coisas que mais me atormentavam eram as mes­


mas coisas que me conectavam com [os outros].
James Baldwin, New York Times (1964)

Seja eu um pouco.
J ohn AJvide LinDqvist, Let the Right One In (2008)

Sylvia e Geraldo estão em constante conflito com o nível de in­


timidade em seu relacionamento. Sylvia sente que não é uma priori­
dade na vida de Geraldo. Ele parece ficar mais animado sobre uma
possível promoção no trabalho ou um fim de semana esquiando com
seus amigos do que ficar com ela. Por seu lado, Geraldo vê Sylvia
como constantemente insatisfeita. Parece que ele nunca faz o suficien­
te por ela, como se devesse constantemente provar que se importa
com ela. A luta em torno disso faz com que ele se pergunte, em alguns
momentos, o quanto ele realmente se importa.
O problema sobre intimidade se tornou um muro intransponí­
vel entre eles. Sylvia fica facilmente braba com os sinais da falta de
comprometimento de Geraldo com ela. Se ele se envolve intensamen­
te no trabalho, ou se parece muito animado com eventos recreativos
232 Caminhando com os sapatos do outro

que não a envolvem, ou mostra pouco interesse em fazer algo com ela,
sua raiva, muitas vezes, revela-se com sarcasmo: “Espero que não seja
um fardo para você ir comigo.” Ou na comparação provocativa: “Você
parece terrivelmente feliz em sair sozinho - bem mais feliz do que eu
tenho te visto nos últimos tempos.” Ou na acusação pura e simples:
“Você não me faz uma prioridade da sua vida. Estou lá embaixo na
sua lista.” Geraldo normalmente responde defendendo a si mesmo,
insistindo que ela é uma prioridade para ele, e que quer ‘mesmo’ estar
com ela. No entanto, quando ele fica completamente chateado, pode
contra-atacar: “Não tem maneira de te agradar. Você é tão insegura,
você precisa de atenção constante.” As vezes Sylvia fica tão desgastada
pelo conflito e se sente tão desesperada por receber o que precisa de
Geraldo que ela se fecha completamente. Ela para de culpar, mas a
raiva impregna seu silêncio.
O amor, o carinho ou a compaixão podem romper a nuvem de
raiva e distância que rodeia esse casal? Se você e seu parceiro estão pre­
sos em um tornado semelhante de raiva e dor, pode parecer impossí­
vel libertar-se disso. Mas quando seu foco muda das ações que ofen­
dem para as sensibilidades emocionais que ficam machucadas por es­
sas ações, você pode chegar a uma nova compreensão de cada um -
um entendimento que corta as discussões pela raiz e, ao longo do
tempo, aproxima vocês novamente.
Esta não é uma tarefa simples, é claro. A raiva é a emoção su­
perficial mais comum a entrar em erupção durante um conflito e
tende a se tornar um estado crônico quando sentimos que as nossas
necessidades são frustradas repetidamente, quando nos sentimos
oprimidos por exigências constantes ou quando nos sentimos des­
prezados, abatidos ou negligenciados dia após dia. Sob essas condi­
ções, adotamos os métodos de enfrentamento discutidos no Capítu­
lo 6, que geralmente entorpecem nossa compaixão e nos cegam para
o que precisamos manter em foco: as sensibilidades emocionais que
ficam feridas durante esse processo. Se optarmos pelo trio familiar
de acusação, culpa e coerção; as táticas evasivas de evitação, minimi-
zação e negação; ou uma estratégia mais sutil de colocar as barreiras
Diferenças Reeonciliáveis 233

defensivas e retalhar por meio de resistência passiva, acabamos por


não ser escutados e não nos sentirmos seguros num relacionamento
que deveria ser um santuário para ambos. Ficamos aprisionados
num vínculo emocional que corrói nosso amor e compromisso um
com o outro. Podemos desejar compaixão, mas aqueles que amamos
parecem, eles próprios, demasiado alienados e com raiva para nos
dar esta compaixão.
A maneira de quebrar esse padrão de raiva crônica, afastamento
e defensividade é ambos os parceiros revelarem aspectos de si mesmo
que nunca ou raramente mencionaram, ou comunicarem estes aspec­
tos de maneiras que nunca antes foram transmitidos. A revelação das
emoções ocultas que discutimos no Capítulo 4 é uma forma impor­
tante de despertar empatia no outro e alterar o padrão de comunica­
ção entre o casal. Mas não é fácil.

A IMPORTÂNCIA DO NÃO DITO

Muita infelicidade veio ao mundo por causa da per­


plexidade com as coisas que não foram ditas.
Fyodor Dostoevsky

O que não dizemos muitas vezes é mais importante do


que o que dizemos.

O conflito crônico pode deixá-lo acreditando que você já disse


tudo o que pode ser dito sobre o assunto da controvérsia - e já foi até
mais adiante com isso. De fato, porém, você e seu parceiro provavel­
mente não revelaram muitos de seus pensamentos e sentimentos im­
portantes sobre o conflito. Você pode estar apenas vagamente cons­
ciente de seus sentimentos, ou você pode não se sentir seguro em re­
velá-los. Ainda, são precisamente essas revelações que podem alterar o
tom da discussão e talvez suscitar empatia entre vocês.
234 Caminhando com os sapatos do outro

Quando a raiva não é revelada


Por mais difícil que se possa acreditar, considerando o tom de
suas vozes e suas acusações e defesas mútuas, você e seu parceiro po­
dem não expressar sua raiva diretamente. Um de vocês pode ficar pre­
so na ideia de colocar culpa, enquanto o outro está preocupado em se
proteger, refutar e contra-atacar. Um ou ambos podem estar distantes
e ressentidos. Nenhum de vocês diz abertamente: “Estou com muita
raiva de você agora.”
Essa revelação ajudaria? Possivelmente não. Um poderia respon­
der à revelação do outro competitivamente: “Bom, você não está com
tanta raiva quanto eu.” Ou sarcasticamente: “Ah é? Que coisa chata,
heim?” Ou arrogantemente: “E daí?”
Não há certamente nenhum benefício automático com esta ou
qualquer declaração semelhante, então por que correr o risco de me­
ramente escalar na discussão? Porque uma declaração direta de raiva
chama a atenção para o que é provavelmente o aspecto mais impor­
tante da discussão: sua base emocional. Esta simples revelação pode
ser um primeiro passo que afasta do debate fútil sobre a avaliação do
comportamento e leva em direção a uma discussão potencialmente
proveitosa da experiência emocional de cada um.
Este primeiro passo é possível, no entanto, apenas se a colocação
é feita estritamente para comunicar informações sobre si mesmo, ao in­
vés de informações sobre o seu parceiro. Se você diz “Estou com muita
raiva de você agora” como uma forma de encobrir um ataque, que sig­
nifica “Você me deixou com raiva por causa de todas as coisas horríveis
que você faz”, ou como um desafio, que significa “Estou com raiva, e é
melhor você fazer alguma coisa sobre isso agora mesmo”, agindo desta
forma você não está mudando a discussão de culpabilização para revela­
ção pessoal. Mesmo que você faça sua colocação apropriadamente, com
as melhores das intenções, seu parceiro pode acreditar, por causa de seu
próprio estado defensivo, que você o está acusando ou desafiando.
Além disso, provavelmente será preciso mais do que apenas um
simples comentário, não importa quão inocente, para manter o foco
Diferenças Reconciliáveis 235

em sua experiência emocional e não ficar tomado com acusações e de­


fesas. Para um exemplo, veja o diagrama a seguir. Nas caixas de texto
à direita, Sylvia é levada para uma discussão com Geraldo. Nas caixas
de texto à esquerda, ela evita a tentação de atacar o comportamento
dele ou defender o seu. Ela mantém o foco em sua experiência emo­
cional. Embora não haja garantias, este foco pode abrir a possibilidade
de Geraldo ouvi-la e até mesmo compartilhar sua própria experiência
emocional.

Dica 1: Quando você está chateado, tente revelar seu estado emocional ao
seu companheiro sem culpá-lo por isso. Quando seu parceiro está chateado,
mostre interesse sobre seu estado emocional.
_________ ____________________________________________________ Z
236 Caminhando com os sapatos do outro

Quando impulsos e sentimentos


são atuados mais do que expressos
Quando Sylvia fica frustrada pela falta de atenção de Geraldo e
seu aparente maior interesse em seu trabalho e hobbies, ela o acusa de
não amá-la. Ele responde se defendendo e reafirmando seu amor por
ela. Ele relata evidências de seu amor - por exemplo, que ele não era
infiel a ela, que ele não tentava abandonar o relacionamento. Ela res­
ponde: “Você lista as coisas que você não faz que mostram seu amor.
Diga-me qualquer coisa que você fez que mostre seu amor.” Geraldo
tentará então listar as vezes que ele esteve presente, como, por exem­
plo, quando ela foi hospitalizada com pneumonia. Ela então despreza
sua evidência: “Isso foi há anos” ou “Isso não é amor qualquer pessoa
razoavelmente responsável teria ajudado.”
De fato, Sylvia está tão furiosa com a negligência de Geraldo
que é improvável que seja influenciada por qualquer evidência con­
creta que ele possa reunir. E como se ela estivesse dizendo: “Estou
com raiva, então vou processá-lo por falta de amor”. E é como se ele
estivesse dizendo em resposta: “Estou ameaçado pela sua irritação,
então eu vou tentar acalmá-la com uma enumeração de pequenos
fatos de benevolência “.
Se Geraldo estivesse ciente do que estava acontecendo com ele
emocionalmente naquela hora e pudesse genuinamente articular
isto, ele diria algo como: “Neste exato momento eu estou me sentin­
do atacado por você e sinto que preciso me defender. Focado em me
defender, é difícil para eu sentir amor, mesmo sabendo que realmen­
te te amo “.
Fazer tal revelação poderia ser assustador para Geraldo. Ele teria
medo de uma reação ainda mais forte de Sylvia: “Viu...? Aí está - você
finalmente admitiu, você não me ama.” E ele poderia ser levado para
uma defesa ainda maior: “Eu só disse 'nesse exato momento'. Eu não
quis dizer que eu nunca te amo.” Por outro lado, a revelação de Geral­
do poderia parar com a frustrante charada que eles atravessam em que
Sylvia tenta gerar amor por meio de acusações de raiva sobre a falta
Diferenças Reconciliáveis 237

que ela sente dele e Geraldo tenta provar seu amor com uma lista de­
fensiva de fatos.
Se Sylvia estivesse ciente do que estava acontecendo emocio­
nalmente no momento e pudesse articulá-lo genuinamente, diria
algo como “Estou tão furiosa com você neste momento que não es­
tou aberta a ouvi-lo. Eu só quero atacar você. “ Essa mensagem seria
difícil para Sylvia, porque Geraldo poderia usá-la facilmente contra
ela. “Viu? Você admitiu, você não se importa se eu te amo ou não,
você só quer me atacar”. No entanto, a revelação de Sylvia poderia
poupá-lo dos esforços inúteis de provar seu amor por ela. E poderia
fazê-lo escutá-la.
Este tipo de comunicação é, certamente, difícil, e, por vezes, até
mesmo impossível durante os conflitos. Mas ela pode levar você a um
outro pequeno passo para fora de seu círculo vicioso de discussão,
porque você está dizendo o que você sente vontade de fazer, como
atacar ou defender, em vez de realmente fazê-lo. Eles expressam o im­
pulso no lugar da ação.

Dica 2: Quando você está emocionalmente chateado, tente dizer o que você
sente vontade de fazer ao invés de realmente fazê-lo. Quando seu parceiro
está chateado, tente discernir o que ele ou ela está sentindo que pode estar
conduzindo as ações perturbadoras do seu parceiro,
v_________________ ______________________________________________ X

Informações básicas cruciais podem ser omitidas


Discussões podem se tornar tão habituais e as reações tão ime­
diatas que os parceiros desempenham seus papéis com pouco conheci­
mento sobre que os fez iniciá-las. Eles podem nem sequer notar as
condições importantes que desencadeiam uma determinada discussão
e torná-la diferente das anteriores. Ou se eles notarem, eles podem es­
tar hesitantes em revelar essas condições.
Por exemplo, Sylvia está preocupada com alguns nódulos que
ela encontrou em seu seio. Ela pediu a Geraldo para que ele os to­
casse, mas ele fez apenas uma tentativa, sem muita vontade, dizen­
238 Caminhando com os sapatos do outro

do: “Eu não sou médico”. Ele disse a ela para ver o seu médico, que
é algo que frequentemente diz em resposta às muitas queixas físicas
dela (as quais cia admite). Neste ponto, sua mensagem para “ver o
seu médico” parece invalidante, encobrindo algo como “Não me en­
cha o saco com isso.”
A preocupação de Sylvia é tão grande que ela marca uma con­
sulta com seu médico. Ela conta a Geraldo sobre a esta marcação com
antecedência - e ele responde com um não muito convincente “Ah,
que bom.” Irritada por Geraldo demonstrar tão pouco interesse em
suas preocupações, Sylvia está vagamente consciente de que falar so­
bre a marcação da consulta é, em parte, um teste: Será que ele vai se
lembrar de sua consulta e comentá-la?
Sylvia tem uma noite de sono agitada antes de sua consulta.
Naquela manhã, ela acorda preocupada, sente o seio e detecta o que
parece ser um caroço. Ela entra na cozinha e encontra Geraldo, como
de costume, com a cabeça enfiada no jornal, tomando o café da ma­
nhã. Ele mal percebe sua entrada na cozinha.
Seu medo da sua consulta se transforma em raiva de Geraldo.
Ela diz sarcasticamente a seguinte observação: “Esse artigo do jornal
deve ser fascinante “.
Ele responde defensivamente: “Eu disse olá”.
“Ah, isso foi um olá? Eu pensei que era um tipo de grunhido.”
Geraldo presume que este é o mesmo velho conflito: “Por favor,
Sylvia. Um cara não pode nem ler o jornal em paz?”
Sylvia tem um impulso de desabafar algo sobre sua consulta,
mas não o faz, por medo de que ele vá ignorar suas preocupações. En­
tão, se seus “nódulos” forem benignos, ele se alegraria por estar certo e
a reprenderia novamente, pois não deveria ter ficado tão perturbada.
O lado irritado dela espera que o médico encontre algo sério para
que ela possa usá-lo contra a rejeição e falta de consideração dele.
Geraldo deixa Sylvia naquele dia irritada com o que ele rotula
de “mau humor estranho”. Ele se pergunta, brevemente, se ela estaria
com tensão pré-menstrual. Ela sai naquele dia com uma mistura de
raiva de Geraldo e medo do que o médico pode encontrar.
Diferenças Reeonciliáveis 239

A informação crucial que teria tornado compreensível tudo o


que aconteceu naquela manhã — a preocupação dela com a visita ao
médico - nunca foi um ponto de discussão. Geraldo esqueceu. Sylvia
nunca trouxe o assunto à tona, em parte por medo de que ele, prova­
velmente, ignoraria suas preocupações e em parte por raiva, para guar­
dar como uma arma posterior contra ele.
Mesmo se Sylvia mencionasse sua consulta, ela poderia ter fei­
to isso de tal maneira acusatória, e então Geraldo ficaria preso em se
defender mais do que escutar as preocupações dela. Ainda que ela
não o estivesse acusando, Geraldo poderia ter sido defensivo em vez
de mostrar empatia a ela. No entanto, sua menção à consulta naque­
le dia e seus sentimentos a respeito poderiam ter servido para redire­
cionar sua discussão. Poderia ter levado a algum apoio genuíno de
Geraldo. Não mencionando a consulta de modo algum lhes roubou
esta oportunidade.
-------------------------------------- ----------------- y------------------------------ \
Dica 3: Se você está chateado, dê ao seu parceiro informações suficientes
sobre o contexto para fazer com que suas emoções possam ser compreendidas.
Se seu parceiro está chateado, pergunte a ele sobre os fatores que possam ter
desencadeado a emoção..
v________________ _ _______________________________________ >

Quando emoções brandas permanecem ocultas


Quando algo que não gostamos nos acontece, experimentamos
emoções duras como raiva, irritação, impaciência, ressentimento, frus­
tração e nojo. Essas emoções e seus consequentes pensamentos difíceis
expressam um forte self que diz em termos inequívocos “Estou cha­
teado com o mundo” e “Não vou mais aguentar isso”. Estas são, mui­
tas vezes, as emoções superficiais e os pensamentos que nós pronta­
mente revelamos. A expressão deles é benéfica porque, frequentemen­
te, descarrega alguma negatividade que sentimos e porque estabelece
os nossos limites com os outros. Infelizmente, com frequência, isto
também convida a uma resposta semelhante: a raiva pode desencadear
raiva e ressentimento. Este ciclo não só pode levar à escalada, mas
240 Caminhando com os sapatos do outro

também pode realmente desencorajar o amor e a compaixão cuja au­


sência evocou as emoções duras em primeiro lugar.
Emoções brandas, em contraste, revelam um self vulnerável ex­
perimentando angústia interior. Dor, culpa, tristeza, desapontamento
e medo, todos sinalizam um sofrimento interior. Eles revelam um eu
machucado ao invés de um eu assertivo. Eles são, muitas vezes, acom­
panhados por pensamentos mais brandos que expressam dúvida e in­
certeza. Estas são as emoções e pensamentos ocultos que costumamos
manter para nós mesmos.
Qualquer experiência negativa relevante nos relacionamentos
é susceptível de levar a sentimentos duros e brandos, assim como
pensamentos duros e brandos. Se o meu parceiro me ignora em uma
festa, eu posso sentir raiva com esta negligência, mas eu também
posso me sentir magoado e inseguro. Eu posso me perguntar “Como
você pode me tratar dessa maneira?”, mas eu também posso me sen­
tir machucado porque meu parceiro não me achou mais interessan­
te. Se eu acabar fazendo a maior parte do trabalho doméstico, posso
me ressentir da injustiça de tudo, mas também me sinto desvaloriza­
do como parceiro, porque meu papel é “apenas fazer o trabalho do­
méstico”. Eu posso decidir não ser manipulado em ser como uma
empregada, mas também me perguntar sobre o meu valor.
A expressão de emoções brandas, como dor e medo, muitas vezes
pode desencadear cuidado e atenção em seu parceiro. Quando vemos al­
guém em sofrimento, particularmente aqueles que são importantes para
nós, naturalmente sentimos compaixão por eles. Queremos confortá-los e
protegê-los. Esquecemos de nossas próprias necessidades e vamos ajudá-
los. Infelizmente, as emoções e os pensamentos brandos normalmente
não são expressos num conflito. Frequentemente se faz uma tentativa de
abordá-los, mas são sabotados pela atmosfera de emoção dura em torno
deles. Pode-se dizer: “Eu me sinto machucado por você “, mas a maneira
pela qual ter admitido isso é passada e a ênfase no “ por você “ no final da
frase, pode tornar o que foi declarado mais uma acusação do que uma ex­
pressão de dor. Até mesmo a simples afirmação “ eu me senti machucado
pode ser expressa mais com raiva do que na dor.
Diferenças Reconciliáveis 241

Uma demonstração genuína de emoção branda, expressar que


você se sente solitário ou ferido ou decepcionado ou se sente negli­
genciado ou abandonado, é difícil porque lhe deixa exposto. Isto lhe
apresenta como uma pessoa vulnerável e indefesa. Você pode se sentir
desconfortável para agir desta forma em qualquer circunstância e
achar impossível de se mostrar assim quando está com raiva.
Geraldo e Sylvia raramente dão voz às suas emoções ocultas em
torno de seu conflito sobre intimidade — por razões muito boas de au-
toproteção. A exposição desses sentimentos pode torná-los mais vul­
neráveis e mais expostos ao ataque. No entanto, a mesma poderia des­
pertar compaixão e cuidado um com outro. Ao expressar esses senti­
mentos, eles podem ser capazes de ouvir o sofrimento de cada um sem
atribuir responsabilidades por essa dor. Eles podem experimentar co­
nexão e intimidade ao se darem conta, juntos, de como eles estão dis­
tantes e quanto isto dói. O problema poderia uni-los. Eles poderiam,
paradoxalmente, experimentar a intimidade por compartilhar de for­
ma compassiva seus sentimentos de distância.

Dica 4: Quando você está chateado tente revelar as emoções brandas que po­
dem existir ao lado das emoções duras que você experimenta. Se seu parceiro
está chateado, veja se consegue discernir quais emoções mais brandas ele ou
ela também podem estar sentindo.
V-------------------------------------------------------------------------------------- /

Quando o outro lado nunca é revelado


Num conflito duradouro, cada parceiro assume uma posição,
argumenta sobre ela, defende-a e torna-se cada vez mais inflexível nes­
sa posição. A opinião de Sylvia é que Geraldo não expressa amor e
afeto por ela o suficiente. O parecer de Geraldo é que Sylvia exige
mais do que qualquer homem razoável poderia dar. Em seus conflitos
regulares sobre esta questão de intimidade, nenhum recua ou reco­
nhece qualquer validade na posição do outro.
No conflito de Sylvia e Geraldo, como na maioria dos conflitos
entre casais, há alguma verdade na posição de cada pessoa, e não há
242 Caminhando com os sapatos do outro

padrões claros externos para julgamento. Logicamente, então, de tem­


po em tempo, cada um deve questionar sua própria posição. Sylvia
deve se perguntar se ela está exigindo muito de Geraldo ou se ela é ca­
rente demais ou hipersensível. Da mesma forma, Geraldo deve se per­
guntar, às vezes, se ele é egoísta ou não é generoso nem amoroso. Am­
bos relutam em expressar tais dúvidas sobre si mesmos, porque estas
revelações poderiam ser facilmente usadas contra eles.
No entanto, expressar essas dúvidas seria reconhecer a validade
da posição de cada pessoa. Questionar sua própria posição ou admitir
a verdade na opinião do outro, se feita genuinamente, sem falsa mo­
déstia ou pretensa nobreza, poderia tirá-los desta batalha sobre quem
está certo e quem está errado. Então eles poderiam se unir um ao ou­
tro com o reconhecimento de que ambos estão certos e ambos estão
errados. Aliviados do fardo de se defender ou atacar, eles poderiam es­
tar mais capacitados para batalhar com seu problema difícil de uma
forma mais exitosa. Poderiam até se sentir mais próximos como dois
seres humanos, ambos os quais têm limitações.

z--------------------------------------------------------------------------------------------------- h
Dica 5: Se você genuinamente pode fazê-lo, reconheça a validade na posi­
ção do seu parceiro, sem abandonar a sua própria posição. Saiba que o seu
parceiro, às vezes, pode questionar a própria posição dele e sentir a validade
da sua.
\/

Quando preocupações não são compartilhadas


Mesmo quando o casal não está no meio do conflito, pode pre­
ver um conflito futuro. Tendo passado por certas discussões tantas ve­
zes no passado, os parceiros conhecem os tipos de eventos que os pro­
vocam. Esses “eventos preliminares” ocorrem, e os casais preveem,
muitas vezes com precisão, que o conflito virá logo a seguir. Eles po­
dem estar relutantes em compartilhar suas previsões por medo de que
o próprio ato de compartilhar vá acelerar o conflito. No entanto, sem
alguma comunicação intermediária, o conflito esperado pode prosse­
guir inexoravelmente.
Diferenças Reeonciliáveis 243

No caminho para um fim de semana em que eles iriam esquiar,


Sylvia fica preocupada que Geraldo, que é um esquiador melhor do
que ela,vai abandoná-la nas pistas ou vai dedicar tanta atenção ao es­
porte que seu relacionamento vai ficar ganhar menos atenção. Ela se
lembra de um fim de semana, um ano atrás, quando ele se levantou
cedo para chegar nas pistas antes das multidões, ficou esquiando du­
rante todo o dia e, depois, demonstrou sua intenção de esquiar à noi­
te. Nesse ponto ela explodiu e ameaçou voltar para casa sozinha. Ele
não foi esquiar à noite, mas talvez devesse ter ido, pois eles tiveram
uma noite juntos horrível.
Se Sylvia tentar expressar suas preocupações com um irritado e
desafiador “Espero que você não transforme este fim de semana no
fiasco que tivemos no ano passado”, é provável que Geraldo responda
negativamente. Ele poderia se defender: “Tudo que eu queria fazer era
tentar um pouco de esqui noturno, e você foi agressiva.” Ou ele pode­
ria contra-atacar: “Lá vem você de novo, nem estamos nas montanhas,
e você já está prevendo o pior”.
Mesmo que Sylvia tente expressar sua preocupação de uma ma­
neira sem ataques, como por exemplo, dizendo: “Estou preocupada
que vamos entrar numa briga sobre nosso fim de semana esquiando”,
Geraldo poderá ouvir esta preocupação como um ataque. Ele pode
responder com um irritado “Você simplesmente não pode deixar fluir,
sempre tem que se preocupar que algo vai dar errado. Talvez seja isso
que faz com que as coisas não deem certo.”
Se fosse Geraldo, em vez de Sylvia, que falasse sobre suas preo­
cupações sobre o fim de semana esquiando, poderiamos facilmente
imaginar um cenário semelhante. Ele poderia se expressar de forma
acusatória (“Espero que você não fique agressiva este ano.”) o que a le­
varia a contra-atacar. Ou ele poderia expressar suas preocupações de
forma mais conciliatória (“Espero que possamos cooperar um com o
outro este ano”), mas ela poderia ouvir isto como acusação, levando a
um resultado idêntico. Com tais riscos envolvidos em uma discussão
antecipatória, ambos podem optar por evitar uma discussão e simples­
mente esperar o melhor.
244 Caminhando com os sapatos do outro

Uma história de luta inevitavelmente leva a expectativas emo­


cionais. Se Geraldo e Sylvia tiveram dificuldade em coordenar suas
necessidades em viagens de esqui ou em férias em geral, eles vão ter
pensamentos antecipatórios e sentimentos sobre o próximo fim de se­
mana. Eles podem evitar uma discussão aberta de suas previsões, mas
não podem evitar tê-las. Se estas previsões são intensas, pode até ser
difícil mantê-las fora da conversa. O comentário aparentemente ino­
cente de Sylvia de que ela quer relaxar e “dormir até tarde” pode ser
um “balão de ensaio” para testar se Geraldo planeja ir para as pistas na
primeira luz do dia, ou pode ser ouvido por ele como um teste. O co­
mentário aparentemente inocente de Geraldo de que as condições
para esquiar supostamente estão maravilhosas este fim de semana
pode ser um teste da possível reação de Sylvia ao desejo dele de es­
quiar tanto quanto for possível. Mesmo um comentário casual de Syl­
via que ela espera que eles tenham um ótimo fim de semana pode le­
var um entendimento de “E bom você se aprumar e se cuidar” ou ser
ouvido por Geraldo como tal.
Se Geraldo e Sylvia pudessem revelar abertamente suas preocu­
pações sobre o próximo fim de semana sem provocar um conflito, eles
poderiam sentir algum alívio da inquietação que ambos sentem. Ter
suas preocupações validadas poderia aliviá-las.

Sylvia: Estou um pouco preocupada com o fim de semana.


Geraldo: Você quer dizer sobre nós.
Sylvia: Sim.
Geraldo: Nós não temos boas recordações quando se trata de
fins de semana de esqui, não é?
Sylvia: (rindo tristemente) Não, não temos.

Uma discussão sobre o próximo fim de semana poderia fazer mais


do que simplesmente aliviar suas preocupações. Eles poderiam ser capa­
zes de discutir como gerenciar o fim de semana para que ambas as suas
necessidades fossem atendidas. Poderiam garantir que teriam tempo
juntos, bem como tempo para Geraldo se desafiar nas pistas de especia-
Diferenças Reco’’.; s.e? 2-5

Estas. Seria possível ter tanto momentos de intimidade, quanto tempo


ce esquiar, mas poderia exigir algum esforço de comunicação e coopera­
ção. Evitar discussões deixa muito à própria sorte.

Dica 6: Tente compartilhar sua preocupação antecipada com seu parceiro


antes de abordar um evento desafiador. Veja se vocês dois podem reconhecer
a dificuldade que tiveram no passado e, possivelmente, planejar um evento
melhor.
_________________________________________________________

RECUPERAR-SE DO CONFLITO

No calor do conflito, muitas vezes nos sentimos tão irritados


ou defensivos que somos incapazes ou não estamos dispostos a reve­
lar os tipos de informação que acabamos de discutir, as quais ofere­
cem a possibilidade de compreensão e intimidade, mesmo diante do
conflito. Ainda que possamos revelar essas informações e seguir as
dicas anteriores, nossos parceiros podem não ser receptivos. Portan­
to, apesar de nossos melhores esforços para alterar o curso de nossos
conflitos, os padrões de argumentação provavelmente serão repeti­
dos em alguns momentos. O progresso em direção à intimidade
pode ser lento, apesar de seu compromisso de introduzir aceitação e
compaixão nas discussões.
Por esta razão, aprender a se recuperar do conflito pode ser tão
importante quanto alterar o curso do conflito. Salvo o divórcio, to­
dos os casais se recuperam, em certa medida, de seus conflitos e re­
tomam seu comportamento normal. Mas durante dias após um con­
flito os parceiros podem se afastar, podem ser secos um com o outro,
ou podem evitar uma conversa completamente. Se você conseguir
cortar este processo, se você aprender a se recuperar mais rapida­
mente e com menos ressaca emocional, você terá a possibilidade de
diminuir o estresse total do conflito. Além disso, é mais provável
que você alcance entendimento e intimidade após um conflito do
que durante ele.
246 Caminhando com os sapatos do outro

Na recuperação do conflito, como durante o conflito em si,


compreensão e compaixão um pelo outro é fundamental, mas como
isso pode acontecer? Vamos considerar um conflito prolongado en­
tre Sylvia e Geraldo e então ver o que eles poderiam ter feito para se
recuperar do conflito. Uma manhã de sexta-feira, prestes a sair para
o trabalho, Geraldo conta para Sylvia que vai numa viagem de
acampamento no dia seguinte com seu amigo Dario e estará de vol­
ta na tarde de domingo. Ela reage furiosamente porque pensou que
iriam passar o sábado juntos. Ela pergunta: '‘Por que você não me
disse isso antes?” Ele responde defensivamente que eles não tinham
planos para o sábado e que não importaria quando ele dissesse para
ela sobre a viagem, porque ela certamente teria ficado com raiva. Ele
vai para o trabalho, e ela fica furiosa. Enquanto ele sai de casa apres­
sado, com medo de qualquer confronto, ela o acusa de ser um co­
varde. E ele a acusa de reagir exageradamente a tudo na vida e suge­
re que ela é mentalmente instável.
Mais tarde naquele dia, esperando que ela tivesse se acalmado,
Geraldo telefona para Sylvia, tenta ser simpático e conversa de forma
casual. Ela responde com frieza e poucas palavras. Frustrado, ele termi­
na a conversa. Ele tenta novamente uma reconciliação depois do traba­
lho. Ele a cumprimenta alegremente e propõe irem jantar fora e ao ci­
nema. Ela recusa e só aceitaria depois de um pedido de desculpas. Ele
resiste: “Não vou me desculpar por ir acampar com meu melhor ami­
go.” Ela responde com raiva: “Você não tem que se desculpar por ir
acampar. O que você me deve uma desculpa é por não me deixar saber
até o último minuto — e você é um frouxo não me dizendo até o mo­
mento de sair para o trabalho para que você não tenha que lidar comigo
e minhas reações. “ Geraldo se irrita com a acusação, e eles têm uma
discussão improdutiva, primeiro sobre se ele deveria pedir desculpas e
depois sobre acampar e quando ele deveria ter contado à ela sobre uma
viagem planejada. Finalmente, eles colocaram a discussão de lado e saí­
ram para jantar, a sua interação é tensa, mas formal, aliviando apenas
um pouco ao longo da noite.
Diferenças Reeoneiliáveis 247

Na manhã seguinte, enquanto ela está deitada na cama, Geral­


do despede-se de Sylvia beijando-a. Ela lhe diz para ter cuidado, e se
divertir. Ele percebe uma preocupação genuína na sua voz e tenta
tranquilizá-la, relembrando-a de quando voltará e dizendo que sentirá
falta dela. Ela não acredita nele realmente - ele adora acampar e curte
muito seu amigo para sentir falta dela - mas ela aceita o carinho com
que o comentário foi dado.
Geraldo se diverte muito no acampamento com seu amigo. O
dia está bonito e a caminhada é revigorante. Ele e Dario trocam pia­
das, discutem política, atualizam suas vidas, bebem muita cerveja à
noite e realmente esquecem todos os seus problemas. O sábado não
vai tão bem para Sylvia. Ela tenta fazer combinações com alguns
amigos, mas eles estão ocupados. Ela faz algumas tarefas domésticas,
mas fica ressentida porque ela está em casa trabalhando enquanto
Geraldo está se divertindo. Mais tarde, à noite, ela tenta fazer com­
pras e ver um filme, e, ainda que ambas situações a distraiam, mes­
mo assim, ela se sente solitária. No domingo, ela faz um grande es­
forço para deixar de lado seu ressentimento e desapontamento. Ela
aguarda com expectativa a chegada de Geraldo e quer que o reen­
contro seja bom.
No domingo eles se cumprimentam alegremente com um gran­
de abraço e um beijo. Geraldo está aliviado que ela está feliz em vê-lo,
já que ele não tinha certeza do tipo de humor que ela estaria no seu
retorno. Ainda radiante com a agradável viagem com seu amigo, ele
começa a falar sobre ela. Ao descrever alguns dos detalhes da viagem e
suas conversas com Dario, ele percebe o interesse dela diminuindo.
Ele pergunta como foi seu fim de semana. Ela responde: “Nada de
mais!” Ele oferece um sucinto “Que pena.” Então ele diz como ele
está cansado da viagem e vai para o quarto para tirar uma soneca.
Quando acorda da sesta, Sylvia está braba. Ele sacode a cabeça e
solta uma expressão de desagrado: “O que é agora?”
“Você simplesmente não entende, não é?” Ela pergunta acusato-
riamente.
248 Caminhando com os sapatos do outro

“Não, eu não entendo”, diz ele, com uma mensagem clara de


que ele realmente não quer entender. Ela sai furiosa do quarto. Em
outras ocasiões, ele a teria seguido, tentando descobrir o que estava
errado. A recém acordando de sua sesta e desgastado pelo conflito
contínuo, ele não sente vontade de fazer isso agora. Eles passam o
resto do dia numa distância fria e vão dormir sem o habitual beijo
de boa noite. Na manhã seguinte e à noite, eles começam a se apro­
ximar novamente, mas toda a experiência aprofundou suas convic­
ções negativas um com o outro. Ela se sente mais fortemente valida­
da em sua visão: “Ele simplesmente não quer me entender ou se co­
nectar comigo.” Ele se sente mais convencido no seu: “Ela é como
um bebê, ficando braba se ela não recebe o tipo certo de atenção
quando ela quer.”
Qualquer tentativa de Geraldo e Sylvia de se recuperar deste in­
cidente falando sobre isso um com o outro seria arriscado. Eles podem
reviver o incidente em vez de aprender com ele. A discussão poderia
facilmente se deteriorar na culpa, na defensividade e na retirada que
caracterizavam o próprio incidente. Isto é particularmente provável se
eles se concentrarem nas atitudes flagrantes de um com outro e tratá-
las fora de contexto. Geraldo poderia falar sobre como ela o chamou
de “covarde”; ela poderia mencionar seu comentário sugerindo que ela
era mentalmente instável. No entanto, é possível discutir um conflito
de forma a acelerar a sua recuperação.
Para se recuperar de conflito e ter uma discussão benéfica pós-
conflito, ambos parceiros têm de estar prontos para “voltar ao nor­
mal”. Muitas vezes eles se recuperam em tempos diferentes, com um
cônjuge iniciando a recuperação quando o outro não está pronto,
então os esforços de um são recebidos com uma resposta negativa,
fazendo voltar atrás aquele que tinha o desejo de se recuperar e, tal­
vez, reacender o conflito. Assim, uma condição necessária para a re­
cuperação pode ser quando ambos os parceiros estão em um estado
de espírito positivo, ou ao menos neutro, ou com a ideia de vamos
deixar isso de lado’. Mas o que eles realmente fazem para garantir a
Diferenças Reeonciliáveis 249

recuperação? Eles podem, naturalmente, agir como se nada tivesse


acontecido e ignorar o conflito, aliviados, pois estão agora num mo­
mento mais positivo. Mas se eles quisessem aprender com o confli­
to, sobre o que eles conversariam?

0 acúmulo antes do conflito


Um tópico que seria produtivo discutir, e que poderia auxiliar
na recuperação do conflito, seria saber o que estava se passando com
cada um antes do conflito. Geraldo, na verdade, tinha pensado na via­
gem com Dario há algum tempo, falou com ele duas semanas antes e
finalizaram o planejamento na terça-feira. Ele teve um pouco de difi­
culdade em escolher um fim de semana que não fosse interferir em
qualquer um dos planos dele e Sylvia. Ele não a deixou saber sobre
seus planos porque estava apreensivo com sua reação; Ela com fre­
quência ficava braba quando ele planejava algo sem ela. Uma vez que
ele terminou de planejar com Dario, ele sabia que deveria deixá-la sa­
ber o que estava ocorrendo. Mas terça-feira à noite ele teve que traba­
lhar até tarde. Na quarta e quinta eles estavam tendo um momento
tão agradável juntos que ele não queria estragá-lo trazendo o assunto
da viagem com seu amigo. Ele esperava que as aqueles momentos po­
sitivos pudessem amortecer uma reação negativa. A expectativa de
contar a ela foi acumulando e ficou tão grande que ele queria uma sa­
ída mais fácil — sendo assim, ele contou na sexta-feira de manhã, por­
que não podia, com consciência tranquila, adiar mais e porque teria
de sair imediatamente para o trabalho. A reação dela validou seus me­
dos: nenhuma estratégia de revelação funcionaria com ela.
Sylvia estava se sentindo bem com o relacionamento. Ela e
Geraldo tinham conversado bastante, compartilhando suas expe­
riências, e também estavam bem animados. Eles haviam feito amor
durante a semana - na noite de quarta-feira - o que era incomum
para eles. Sylvia estava ansiosa para o fim de semana porque não ti­
nham planos; eles poderiam simplesmente “passar o tempo juntos'.
250 Caminhando com os sapatos do outro

Talvez sair para um bom jantar e um filme. Talvez jogar tênis. Talvez
ir às compras juntos. Quando Geraldo contou seus planos para o
fim de semana na manhã de sexta-feira, ela ficou arrasada e furiosa.
Ela estava chateada com o tal acampamento e zangada com a manei­
ra como ele havia lidado. Por que ele não podia deixá-la saber o que
estava acontecendo com ele? A experiência validou suas suspeitas de
que ela não podia confiar nele, que ela nunca poderia saber o que
ele tinha na manga.
Uma discussão sobre os eventos e emoções que levaram ao
conflito pode transpor as dificuldades emocionais que os separam. A
medida que Sylvia aprendesse mais sobre os esforços de Geraldo
para ajustar seus planos à agenda deles, sobre sua apreensão em tor­
no das reações dela e sobre sua busca de um momento oportuno
para revelar seus planos, Sylvia poderia ter mais empatia com o dile­
ma dele. Da mesma forma, se Geraldo aprendesse mais sobre o que
se passava com Sylvia - sua crescente proximidade com ele durante
a semana, suas expectativas para o fim de semana e depois seu desa­
pontamento e consequente desconfiança dele - ele poderia sentir
compaixão pelo drama dela.
Se Geraldo e Sylvia pudessem expressar o que tinham passado
antes do conflito e se pudessem sentir empatia com o dilema um do
outro, eles se sentiriam mais próximos apesar do - ou talvez até devi­
do ao conflito. Essa discussão também pode ser um primeiro passo
para a mudança. Mesmo que uma conversa produtiva não seja suscep­
tível de criar uma mudança dramática, Geraldo pode dar um passo
em direção a uma maior abertura com Sylvia na próxima vez. E em­
bora Sylvia possa nunca receber com alegria a possibilidade de Geral­
do passar um fim de semana acampando sem ela, poderia ficar mais
aberta a ouvir suas idéias e planos.
■ >
Dica 7: Para se recuperar de um conflito, tente revelar ao seu parceiro o que
estava acontecendo com você antes do conflito. Tente descobrir o que estava
acontecendo com seu parceiro um pouco antes do conflito.
\__________________________________ d
Diferenças Reeonciliáveis 251

Esforços para a reconciliação


Uma segunda área de discussão potencialmente produtiva após
um conflito é a tentativa de reconciliação dos parceiros. As vezes, uma
discussão sobre recuperar-se e reconciliar-se é uma forma de facilitá-
las. No conflito entre Sylvia e Geraldo, cada um fez esforços para se
reconciliar após sua explosão inicial na manhã de sexta-feira. Geraldo
telefonou para Sylvia mais tarde no mesmo dia e tentou ser simpático
e conversar com ela. Embora esse esforço não tivesse êxito, ele tentou
novamente naquela noite, mas sem sucesso. Depois de voltar para casa
do acampamento, ele também tentou ser agradável, e ele comparti­
lhou com ela alguns dos detalhes interessantes de sua viagem. Mas
isso também não teve êxito. Não surpreende que Geraldo ficasse frus­
trado quando seus repetidos esforços genuínos para reconciliar não o
levaram a lugar algum.
Sylvia também tentou uma reconciliação. Na noite de sexta-
feira, ela pensou que poderia se reconciliar se Geraldo simplesmente
se desculpasse. Parecia tão claro que ele não teve a mínima conside­
ração por ela, dando-lhe um aviso muito tardio de seus planos de
fim de semana. Por que ele não poderia pedir-lhe desculpas genuí­
nas? Ela não guardaria ressentimento; ela poderia perdoar. Mas gos­
taria de algum reconhecimento do que realmente aconteceu: que ele
não tinha considerado seus sentimentos. O fato dele se recusar a se
desculpar não só frustrou sua tentativa de reconciliação como tam­
bém reativou o conflito.
Embora representasse um perigo de iniciar um conflito pro­
priamente dito, uma discussão sobre essas tentativas fracassadas de
reconciliação poderia levar a novos entendimentos importantes en­
tre Geraldo e Sylvia. Os esforços dele para se reconciliar sendo sim­
pático e conversando de maneira agradável não funcionaram para
Sylvia, porque ela viu como uma tentativa de evitar lidar com o
conflito que acabaram de ter. Dá a entender a ela que ele se esforça
para se eximir da responsabilidade e fingir que nada aconteceu. Mas
mesmo que ele não fizesse algo que, para ela, parecia tão evidente­
252 Caminhando com os sapatos do outro

mente errado, ela não poderia mudar repentinamente de estar abor­


recida para ser simpática com ele e conversar agradavelmente. Ela
quer que ele, de alguma maneira, reconheça o conflito e seus senti­
mentos feridos antes de seguir em frente. No pior dos cenários, Ge­
raldo a censura por “se apegar às suas emoções”, o que apenas a dei­
xa mais irritada.
Geraldo também tem dificuldade em responder aos esforços
de Sylvia para reconciliação. Suas exigências de desculpas dificilmen­
te o motivam a se desculpar; em vez disso, elas criam resistência e
contra-ataque. Mesmo quando ele fez algo que ele sabe que não es­
tava certo - não contar a ela mais cedo sobre a viagem de acampa­
mento - a raiva intensa e o tom exigente na voz de Sylvia tornam
impossível que ele genuinamente se desculpe. Ele sabe que sua ne­
gligência não veio da falta de preocupação pelos sentimentos dela;
na verdade, ele adiou dizer-lhe justamente porque estava muito pre­
ocupado com seus sentimentos. Ele não gosta de ser o foco de culpa
e acusação, mas, além disso, ele também odeia vê-la chateada por
qualquer motivo, o que levou Geraldo a evitar falar sobre o assunto.
Ademais, ele acredita, com alguma razão, que sempre que ele anun­
cia seus planos, a reação dela será negativa.
Uma discussão sobre esses esforços para se reconciliar e como
eles não correram bem, pode permitir que ambos vejam que cada
um estava tomando uma atitude, de alguma maneira mal conduzi­
da, para superar o conflito. Isto poderia lhes permitir ter empatia
com a frustração do outro. Mais importante ainda, poderia ajudar
Geraldo a perceber a futilidade de seus esforços para conciliar, for­
çando uma cara feliz ou ajudar Sylvia a perceber a futilidade de exi­
gir desculpas. Provavelmente, nenhum deles seria capaz de mudar
seu comportamento de forma drástica ou repentina. Mas Geraldo
poderia ouvir as preocupações de Sylvia, em vez de tentar aliviar
sua infelicidade com uma alegria indesejada. E Sylvia poderia não
exigir desculpas, as quais devem ser dadas livremente, se forem real­
mente genuínas.
Diferenças Reconciliáveis 253

Dica 8: Para se recuperar de um conflito, tente revelar ao seu parceiro suas


maneiras de tentar reconciliar ou se recuperar. Tente aprender como seu
parceiro pode ter tentado reconciliar ou se recuperar com você. Veja se você
pode entender por que seus esforços genuínos deram errados.
\_____________________________ >

A área perigosa da dor

Uma terceira área de discussão potencial, mas muito perigosa,


é o dano a um ou a ambos. Durante uma discussão, as pessoas cos­
tumam fazer alegações exageradas e acusações dramáticas. Mesmo
que estas sejam dificilmente agradáveis, elas podem não machucar
realmente. Quando há dano, quando a acusação de uma pessoa atin­
ge um ponto sensível na outra, a discussão pode tanto facilitar a re­
cuperação do conflito quanto promover uma maior proximidade.
Por exemplo, os comentários de Sylvia de que Geraldo é um covarde
e a alegação de Geraldo de que Sylvia é um caso de problema men­
tal podem ser apenas parte de seu repertório de conflitos, mas esses
comentários podem atingir um ponto vulnerável para um ou am­
bos. Se, por exemplo, Sylvia fica sensível a sugestões de que ela não
é mentalmente estável, então a acusação de Geraldo merecería uma
atenção. Se sua conversa sobre essa acusação levasse a alguma aber­
tura sobre o quão doloroso isso era para ela e ele pudesse encontrar
uma maneira genuína de pedir desculpas por seu comentário, ela
poderia não só se recuperar do conflito mais facilmente, mas tam­
bém experimentar a preocupação de Geraldo pelos sentimentos dela.
Esta preocupação foi, justamente, a questão que desencadeou a dis­
cussão em primeiro lugar. Assim, a recuperação do conflito poderia
se direcionar para a questão central.
Você e seu parceiro precisam saber quais são os pontos fracos
um do outro. Muitas vezes as ameaças de deixar o relacionamento ou
declarações sobre não amar o parceiro são flechas de veneno que infli­
gem feridas dolorosas. Acusações específicas podem tocar um ponto
sensível. Uma discussão, depois de uma briga sobre esses pontos fra­
254 Caminhando com os sapatos do outro

cos, corre o risco de gerar um novo conflito. Mas se os parceiros com­


preendem a dor que criam um no outro e experimentam alguma
compaixão por essa dor, há esperança de recuperação, mais comedi-
mento no futuro, e ainda maior proximidade após um conflito.
---------------------------------------------
Dica 9: Para se recuperar de um conflito veja se você pode esclarecer com
seu parceiro se você disse ou fez alguma coisa ofensiva que machucou a ele
ou à ela. Tente compreender porque isto foi doloroso e se você pode se des­
culpar pelo o que fez. Revele a seu parceiro, mas não de uma maneira ‘olho
por olho, dente por dente'(vingativa), um dano que você experimentou do
conflito. Ajude seu parceiro a conhecer suas áreas sensíveis.
k__________________________________ _ ________________________________________________ /

Foco no positivo
Um último aspecto nas discussões que pode auxiliar na recu­
peração, e que é menos provável que seja contraproducente, é um
foco no que é positivo. Mesmo em uma luta dolorosa, como a que
Sylvia e Geraldo tiveram sobre a viagem de acampamento, cada par­
ceiro toma atitudes, frequentemente, que atenuam o conflito ou que
comunicam consideração ou cuidado. Na manhã que Geraldo saiu
para acampar, Sylvia disse-lhe para ter cuidado e aproveitar. A since­
ridade que ele sentiu no comentário dela tornou mais fácil para que
ele desfrutasse sua viagem sem culpa. Ele tentou devolver o carinho,
e mesmo que ela não acreditasse literalmente no que ele disse (que
sentiria falta dela), ela aceitou o que Geraldo falou pela intenção
como foi dado. Além disso, quando ele voltou da viagem, eles esta­
vam felizes em se ver. O abraço e o beijo fez com que ambos se sen­
tissem bem. Qualquer atenção que um casal pode dar a suas ações
positivas, qualquer palavra de reconhecimento ou apreciação, pode
ajudar ambos os parceiros a se recuperar de um conflito que estava
repleto de ações negativas.
---------------------------------------------------------------------------- — -s
Dica 10: Para se recuperar de um conflito, reconheça qualquer atitude posi­
tiva de seu parceiro que foi útil para você.
\ /
Diferenças Reeonciliáveis 255

RECAPITULANDO

Quando tudo está dito, é raramente feito. Nem sequer


tudo está dito.

Variação de um velho provérbio

Como as discussões são repetitivas, os casais podem achar que disseram tudo o que é
relevante sobre um determinado conflito. Assim, eles podem sentir que seus parceiros
simplesmente não os escutaram ou não responderam ao que eles haviam dito. Neste
capítulo discutimos muitas coisas que não foram ditas nos conflitos em curso. Os
parceiros podem não revelar seus sentimentos genuínos e imediatos, nem mesmo sua
raiva. Eles podem deixar de fora informações básicas importantes sobre o que levou a
seus sentimentos. Eles podem expressar apenas os pensamentos e emoções superfi­
ciais "duras" que eles experimentam e não as ocultas e mais "brandas". Presos cm uma
determinada posição, eles nunca podem expressar o outro lado dessa posição, por te­
mer que possam ser verdadeiras. Eles podem não revelar completamente suas preo­
cupações sobre conflitos futuros.
Revelar esta informação não dita é na verdade arriscado. Ela pode ser transmitida
de forma acusatória ou ouvida como acusatória, de modo que pode levar a mais
conflitos. Mas essas revelações oferecem informações importantes sobre as sensi­
bilidades do outro. A discussão subsequente poderia alterar o curso da briga e levar
a uma conexão empática entre o casal. Poderia promover a compaixão um pelo
outro, uma resposta que cada um precisa. Poderia levar o casal em direção a acei­
tar os diferentes comportamentos e experiências de cada um ao invés de bri­
gar. Embora os riscos sejam altos para o fracasso, esses tipos de discussões podem
aproximar os casais, apesar de suas diferenças. Portanto, este capítulo ofereceu seis
dicas para revelar essas informações muitas vezes não ditas e para identificá-las em
seu parceiro:

1. Revele seu próprio estado emocional e se interesse pelo de seu parceiro.


2. Revele seus impulsos para tomar atitudes negativas ao invés de tomá-las, e tente
discernir os impulsos que podem levar seu parceiro a atitudes negativas.
3. Revele informações básicas suficientes para tornar suas emoções compreensíveis;
tente descobrir o que levou às emoções do seu parceiro.
4. Revele as emoções mais brandas que podem existir ao lado das duras; tente dis­
cernir as emoções mais brandas do seu parceiro.
5. Reconheça a validade na posição de seu parceiro e saiba que ele ou ela pode sen­
tir alguma validade na sua também.
256 Caminhando com os sapatos do outro

6. Tente compartilhar suas preocupações antecipatórias antes de um evento desafia­


dor como você também pode tentar discernir as preocupações do seu parceiro so­
bre esse evento.

Com frequência os casais estão muito irritados e defensivos para revelar seu lado
vulnerável ao parceiro durante sua desavença. Sua discussão segue seu curso normal.
Mas então eles são confrontados com a recuperação da briga. A menos que os confli­
tos conduzam ao divórcio, os cônjuges, depois, retornam à sua maneira normal de
tratar um ao outro. Como eles podem se recuperar do conflito mais rapidamente e
com menos ressaca emocional?
Depois de um conflito, ambos os parceiros ficam, frequentemente, menos irritados e
mais abertos ao outro. Às vezes, os casais podem se recuperar mais rapidamente e de
forma mais completa se puderem discutir o conflito sem retomá-lo, mas isso somente
se ambos estiverem prontos para tal discussão conciliatória. 0 capítulo deu quatro
dicas para as discussões conciliadoras:

1. Revele ao seu parceiro o que estava acontecendo internamente com você antes do
conflito, mas também tome conhecimento do que estava acontecendo interna­
mente com ele.
2. Revele seus esforços na reconciliação e descubra os esforços de seu parceiro.
3. Pergunte se algo que você disse ou fez foi realmente doloroso para o seu parceiro
durante o conflito; revele a ele quaisquer danos que você sofreu.
4. Reconheça qualquer ação positiva de seu parceiro que foi útil para você.

Alguns casais experimentam seus momentos de maior intimidade após o conflito.


Curam as feridas um do outro com amor. Eles demonstram que os conflitos não ape­
nas afastam, eles também podem unir.
Diferenças Reconciliáveis 257

Exercício: O que você diria se


dissesse o não dito

Um de meus ex-colegas costumava dar o seguinte conselho so­


bre conflitos de relacionamento: "Quando em apuros, revele-se em
dobro!" Ele estava sugerindo que a autorevelação do que chama­
mos de emoções e pensamentos ocultos muitas vezes pode alterar o
conflito em que você se encontra ou pode ajudá-lo a se recuperar
de uma desavença anterior imediatamente. Claro, para fazer isso,
você tem que estar plenamente consciente desses sentimentos e
pensamentos, e você tem que estar disposto a expressá-los. Portan­
to, nosso conselho é "perceber e revelar!"
Vejamos um exemplo específico de como isso pode ser feito.
Lembre-se de seu último conflito sério sobre sua questão central.
Uma vez que você se lembrou claramente, considere os seguin­
tes tópicos, veja se você pode recordar o que você sentiu ou pôde
ter sentido, e anote algumas idéias sobre o que você poderia ter
revelado.

ANTES DO CONFLITO

Preocupações/receios antecipando o conflito que poderiam ter


sido compartilhados:

DURANTE 0 CONFLITO

Sentimentos e impulsos para agir, mas que não foram revela­


dos:
258 Caminhando com os sapatos do outro

Informações básicas importantes que você pode não ter men­


cionado:

Emoções ocultas brandas que você não estava eompletamente


ciente ou que você estava hesitante em mencionar:

Qualquer validade na posição do seu parceiro:

RECUPERAÇÃO DO CONFLITO

Esforços de reconciliação que você tentou ou observou nas ati­


tudes de seu parceiro:

Coisas particularmente dolorosas que você ou seu parceiro po­


dem ter dito que realmente machucaram um ao outro:

Esforços positivos para a reconciliação que você tentou ou ob­


servou nas atitudes de seu parceiro:
Diferenças Reconciliáveis 259

PRÓXIMOS PASSOS

A aceitação emocional não pode ser obrigatória, mas pode ser


estimulada. No último capítulo, vimos como a aceitação pode ser pro­
movida por meio de uma verdadeira compreensão do conflito, o que
chamamos de uma “história” comum sobre o problema que ambos
endossam. Então, neste capítulo, vimos como a aceitação pode ser
promovida pela compaixão, uma conexão empática com o sofrimento
que seu parceiro sente sem negar ou abandonar sua própria angústia.
A empatia é mais importante quando as sensibilidades emocionais em
você e em seu parceiro são partes essenciais de seu conflito. No próxi­
mo capítulo vamos explorar uma maneira final e muito diferente para
promover a aceitação, que funciona bem para as diferenças entre vo­
cês dois que criam conflito.
10

Ganhando alguma
perspectiva no conflito
Aceitação por meio de distância
emocional que promove tolerância

Emoção relembrada na tranquilidade...


William Wordsworth, Letter to lady beaumont (1807)

Se a compaixão é a melhor resposta à sensibilidade emocional


de um ente querido, então a tolerância é a atitude ideal em relação a
diferenças problemáticas (ou semelhanças). Quando nossas sensibili­
dades causam conflito, a empatia pode impedir uma escalada de dis­
cussões ou promover a recuperação destas. Podemos encontrar maior
proximidade emocional quando aceitamos as fraquezas uns dos ou­
tros. Mas quando os pontos fracos emocionais não são a questão, um
pouco de distância e objetividade pode remover as farpas que fazem
nossas diferenças nos machucar.
Quando vocês dois se retiram da briga, vocês se tornam mais
como observadores e menos como combatentes. A distância permite
que você visualize suas brigas de um ponto de vista semelhante, ver
seus conflitos mais claramente e aceitar o papel de cada um neles.
Essa distância emocional e a aceitação que a acompanha podem não
resolver o problema inicial, mas muitas vezes cortam pela raiz pro­
blemas reativos associados.
Diferenças Reconciliáveis 261

É fácil ver porque uma tolerante distância, ao invés de compai­


xão, é a melhor maneira de lidar com incompatibilidades que as dife­
renças podem criar. Em um caso de “puras” incompatibilidades, não
há nada de compassivo, exceto a luta que a incompatibilidade impli­
ca. Se você e seu parceiro nunca puderem concordar se a casa está
muito quente ou muito fria, ou se vocês diferem em ir para a cama
tarde ou cedo, é improvável que qualquer um de vocês se sinta vulne­
rável em relação à sua posição. A incompatibilidade não causa, por si
só, medos primitivos ou ameaça à autoestima. Assim, pode haver pou­
ca ou nenhuma necessidade de empatia.
Entretanto, nossas lutas mais importantes, provavelmente, não
se centram em puras incompatibilidades. Na maioria dos casos, nossas
sensibilidades se combinam com nossas incompatibilidades para pro­
duzir instabilidade emocional. Nestes casos, as abordagens discutidas
no capítulo anterior são apropriadas. No entanto, as maneiras de bus­
car uma distância comum e tolerante, que descrevemos neste capítulo,
podem ser úteis para incompatibilidades mesmo quando são fortaleci­
das por vulnerabilidades. Para a maioria de nós, conseguir alguma dis­
tância de nossos conflitos por meio de uma perspectiva mais ampla,
observação objetiva ou humor, é benéfico mesmo quando o problema
toca emoções profundas e sensíveis. Podemos tomar nossos conflitos
menos pessoalmente, lidar com eles de forma mais razoável, e nos re­
cuperar deles mais rapidamente.
No entanto, para alguns casais, a distância emocional poderia
ser parte do problema e, portanto, não é uma solução. Por exemplo,
um marido pode usar seu excelente senso de humor para evitar lidar
com questões difíceis. Seu humor pode servir para distrair sua esposa
de suas preocupações com ele. Se já é difícil para ela articular suas
preocupações, os esforços dele podem ser bem sucedidos na intenção
de se distanciar do conflito central. Como outro exemplo, ambos os
membros de um casal podem ser à favor de objetividade, observação e
análise, mas usam essas habilidades para evitar tomar uma posição so­
bre suas questões. Com medo de se confrontar com suas diferentes
262 Ganhando alguma perspectiva no conflito

necessidades e desejos, eles mantêm uma distância tão grande de suas


preocupações que são incapazes de resolvê-las. Nestes casos, não gos­
taríamos de incentivar a distância emocional.
A “história do seu problema” - sua análise DEEP (profunda)
de sua questão central, se ela captar com precisão as dificuldades
que você enfrenta, sua luta por essas dificuldades e as consequên­
cias emocionais desta luta - oferece orientação quanto ao antídoto
apropriado para suas dificuldades. Ela pode ajudá-lo a esclarecer o
que pode solucionar seus conflitos e o que vai meramente perpe­
tuá-los. Discutiremos esta noção mais detalhadamente na Parte IV
deste livro.
Para a maioria de nós, que não costumamos evitar problemas
através do distanciamento, a distância que promove tolerância pode
ser benéfica. Considere Eleanor e Tiago. Ela é mais emocionalmente
expressiva do que ele; quando se sente mal ou feliz por alguma coisa,
ela conta para todo o mundo. Tiago, por sua vez, sente-se mais con­
fortável com discrição do que exagero. Ele muitas vezes considera o
estilo expressivo de Eleanor irritante; em público, ele frequentemente
fica envergonhado pela atenção que ela provoca. Em casos extremos,
ele se sente oprimido pelo que ele vê como histeria desnecessária. Ele­
anor está frustrada porque, como ela vê, seu próprio marido não vai
escutar seus problemas com atenção; em vez disso, ele os desconside­
ra. Suas incompatibilidades em relação à expressão emocional são in­
citadas pela sensibilidade de Eleanor sobre ser ouvida e pela “repres­
são” emocional de Tiago.
Obter distância emocional de um problema em relação a unu
emoção forte, e para que fiquem unidos em sua distância, será um de­
safio para Tiago e Eleanor. Mas tal distância, assim como a compai­
xão, pode prevenir conflitos ou facilitar sua recuperação e promover i
aceitação das características que levam a este.
Diferenças Reeonciliáveis 263

TRATANTO O PROBLEMA COMO "ELE" AO INVÉS DE "VOCÊ"

Os parceiros muitas vezes experimentam seus problemas como


coisas que você faz para mim” ao invés de '‘dificuldades que nós te­
mos”. Para sair desta primeira posição, ver os problemas como um
“você”, e ir para a segunda posição, vendo problemas como um “ele”
ou um “eles”, é um grande salto à frente. Ele transfere a falha de um
ou outro para fora de ambos. Como os casais podem dar o salto expe-
riencial?

Ampliando o contexto

Porque as diferenças de nossos parceiros machucam e nos inco­


modam, parece que é essa a intenção deles. Tiago acredita que a ex­
pressão emocional de Eleanor se destina a chamar sua atenção ou a
incomodá-lo apenas porque esse é o efeito que este comportamento
tem sobre ele. Eleanor acredita Tiago está tentando excluí-la de sua
vida interior, porque sua falta de expressão emocional tem esse resul­
tado. Nenhum consegue ver que o comportamento do outro é seu
próprio estilo de expressão emocional, porque eles estão próximos de­
mais do conflito imediato.
Claro, há um pouco de verdade em cada um dos pontos de
vista. Antecipando que Tiago pode desconsiderar seus sentimentos,
Eleanor os exagera ou os expressa mais estridentemente do que faria
caso contrário. E Tiago às vezes evita contar a Eleanor sobre seus
próprios sentimentos, porque ele fica ansioso sobre como ela poderá
reagir a eles. Esses comportamentos confirmam suas suspeitas mútuas
de intenção deliberada, de modo que os dois se apegam a seus pon­
tos de vista.
Quando você está perto demais de um conflito, uma verdade
parcial pode obscurecer a verdade maior. No caso de Eleanor e Tiago,
a verdade maior é que suas maneiras diferentes de expressão emocio­
nal vêm naturalmente de cada um. O estilo de expressão emocional
264 Ganhando alguma perspectiva no conflito

de Eleanor é essencialmente Eleanor, ao invés de um meio manipula­


dor de provocar Tiago. E a expressão contida de emoção de Tiago é
essencialmente Tiago, ao invés de uma consciente tentativa de excluir
Eleanor de sua vida interna.
Ao colocar suas diferenças em um contexto mais amplo, os ca­
sais são mais capazes de ver a verdade maior, a qual revela que grande
parte de seu comportamento em relação ao outro não é uma ofensa
deliberada, mas um produto de muitos fatores sobre os quais eles têm
pouco controle, incluindo sua herança genética e sua educação. Se
Tiago visse a maior expressividade emocional de Eleanor como típica
das mulheres e Eleanor encarasse a ênfase de Tiago em ação sobre a
emoção como típica dos homens, nenhum perceberia o comporta­
mento do outro como algo tão pessoal. Livros sobre diferenças de gê­
nero vendem em grande número, porque eles facilitam que homens e
mulheres compreendam e aceitem o comportamento que, muitas ve­
zes, consideram desconcertante uns nos outros. Se Tiago fosse muito
mais velho do que Eleanor, suas diferenças na expressão emocional
poderiam ser vistas como um produto dos costumes sociais dos tem­
pos em que cresceram. Se eles viessem de diferentes origens culturais
que colocam ênfases diferentes na expressão emocional, eles poderiam
atribuir suas diferenças à sua herança cultural.
Talvez a maneira mais eficaz de obter distância emocional das
diferenças seja vê-las em seu contexto histórico. Parceiros que tenham
uma percepção de como cada um foi criado ou o papel que cada um
teve na sua família de origem pode ver suas diferenças de uma manei­
ra mais generosa. Por qualquer motivo, a família de Eleanor era emo­
cionalmente expressiva. Durante uma das primeiras visitas dele à fa­
mília dela, Tiago observou uma discussão entre Eleanor e sua mãe e
seu pai, a qual o divertiu tanto quanto o assustou. Ele até se preocu­
pou que a família dela estivesse correndo o risco de se dividir, mesmo
enquanto ele se divertia com os fortes sentimentos que, para ele, não
significavam nada. Em contraste, Eleanor achou a família de Tiago
agradável e educada, mas surpreendente em sua evitação cuidadosa de
Diferenças Reeonciliáveis 265

controvérsias. Ela se pergunta por que eles não “tocam nos seus pro­
blemas”. Se Tiago e Eleanor percebessem suas próprias divergências à
luz de suas experiências familiares opostas, suas diferenças fariam per­
feito sentido.
Ver suas diferenças no contexto de gênero, idade, cultura ou
história pessoal elimina parte da culpa e da falha encontrada. Você
não é “mau” ou “errado” por ser do jeito que você é. Você é sim­
plesmente o produto natural do seu sexo, idade, cultura e história
pessoal. Sem culpa e culpa, seus problemas são menos propensos
a escalar ou polarizar ou levar à alienação. Em suma, eles são mais
aceitáveis.
• - \
Dica 1: Tente entender suas diferenças à luz de seus contextos incluindo as
experiências culturais associadas com a sua idade, gênero, identidade étnica
e história familiar.
V_______________________________________________________________ >

Observando mais que participando da dança interpessoal


Tentar discutir seus problemas coloca você em perigo de revivê-
-los. Ao invés de sondar suas dificuldades, você acaba reproduzindo-as.
Quando Eleanor e Tiago tentam discutir suas diferenças sobre expressão
emocional, ela estará sujeita a ficar emotiva e Tiago susceptível de des­
considerar as questões dela. Eles revelam o mesmo padrão na sua dis­
cussão do problema como eles o fazem com o próprio problema.
Mesmo se você não recriar o problema, você pode gerar outro
problema reativo. Se você estava tentando falar com seu parceiro so­
bre o fato de que vocês dois não fizeram amor por um bom tempo,
sua discussão poderia facilmente se deteriorar em acusação e defesa.
Agora, além do descaso sexual e privação que você sente, você tem um
problema de discordância e raiva.
Se você puder retroceder e observar suas próprias interações,
você pode descrever o que se passa entre vocês ao invés de cada um
defender uma determinada posição. Você pode identificar o padrão de
266 Ganhando alguma perspectiva no conflito

interação que ocorre entre os dois, em vez de perpetuar esse padrão.


Você pode descrever seus problemas ao invés de reencená-los.
A observação requer distância. Você e seu parceiro devem retro­
ceder emocionalmente ou fisicamente se você quiser se focar no que
está ocorrendo. Se um soldado é solicitado a relatar uma batalha, ele
deve temporariamente abaixar sua arma, mover-se para um ponto es­
tratégico diferente, colocar seus binóculos e não apontar para um de­
terminado alvo, mas olhar mais amplamente para campo de batalha.
Um soldado não pode ser um bom guerreiro e um bom observador ao
mesmo tempo. As exigências da batalha inviabilizam a observação, e
as exigências da observação impedem o ataque.
O que você deveria estar observando uma vez que você é capaz
de dar um passo para trás de seu conflito? Você pode examinar seus
processos de enfrentamento. Como cada um de vocês lida com as di­
ferenças ou sensibilidades que foram desencadeadas? Você pode olhar
para a sequência de comunicação sobre como você tenta resolver o
problema inicial. A chave é descrever o que acontece em vez de julgar
o que se passa.
Para Tiago e Eleanor, a sequencia do conflito geralmente come­
ça com um evento que altera à ela, como um problema no trabalho
ou uma interação com um amigo. Ela expressa suas preocupações a
Tiago, que responde minimizando-as. Esses comentários perturbam
Eleanor, que, então, expressa-se mais veementemente. Consequente­
mente, Tiago, chateado com o modo como Eleanor lida com suas
questões, faz comentários sobre a reatividade emocional dela. Estes,
percebidos por ela como desmotivadores na melhor das hipóteses e
críticos na pior deixam-na mais alterada. E a discussão está garantida,
com ambos finalmente se retirando com raiva. Depois de algum tem­
po, durante o qual eles mantêm certa distância emocional, eles gradu­
almente se juntam novamente.
Esta análise crua poderia ser completada com uma descrição
dos gatilhos para a reação emocional de cada pessoa e uma descrição
das próprias reações emocionais. O gatilho inicial para Eleanor é um
Diferenças Reeoneiliáveis 267

evento decepcionante ou frustrante que ocorre em seu mundo longe


do Tiago. Claro, ela também pode ser decepcionada ou frustrada por
ele, mas, quando um problema começa com ela e ele a dança é um
pouco diferente. Ela conversa com Tiago sobre seus problemas com
seu mundo, porque ela o sente como a pessoa mais próxima. O gati­
lho emocional para Tiago é ver Eleanor alterada: ele fica chateado por­
que ela está assim. Em sua opinião, ela se inquieta com cada pequena
coisa que acontece com ela. Ele responde tentando mostrar que ela
não tem razões para ficar alterada. Seus comentários servem à ela
como um segundo gatilho emocional: não só ela tem que lidar com
um evento do mundo real que a perturba, mas agora também tem
que lidar com a rejeição de Tiago em relação a seus sentimentos e sua
crítica nada sutil de que ela é reativa demais a tudo. Agora Eleanor
tem que enfrentar tanto a questão do mundo lá fora, que original­
mente lhe chateou, quanto uma luta interpessoal com Tiago. E claro,
os sentimentos de irritação aumentados de Eleanor servem como um
segundo gatilho emocional para Tiago. Então, neste exato momento,
‘fechou o tempo’. O problema inicial que incomodou Eleanor foi
substituído por um problema reativo muito mais sério entre o casal.
Uma maneira de se desprender de suas emoções é examiná-las logi­
camente, quase como um cientista as estudaria. Mesmo o simples ato de
classificar sua intensidade emocional em uma escala de 10 pontos, em
que 1 se refere a nenhuma alteração emocional e 10 se refere à maior que
você já experimentou, pode ajudá-lo a obter alguma perspectiva valiosa
sobre um conflito. Isto porque requer que você se afaste da emoção que
está sentindo agora e olhe para ela comparando-a com outras experiências
emocionais. Este “desprendimento” ajuda a se distanciar da emoção, e sua
avaliação pode lançar uma luz sobre ela. Por exemplo, o nível de emoção
das experiências de Eleanor sobre os eventos que ela quer discutir com
Tiago é geralmente um 5. Claro, há aquelas raras ocasiões em que ela fica
realmente chateada com alguma coisa, mas, normalmente, suas reações
emocionais às decepções diárias estão no meio de sua escala emocional.
No entanto, se a mesma situação que Eleanor experimentou acontecesse
268 Ganhando alguma perspectiva no conflito

com Tiago, ele respondería com apenas um 2. Em contraste, a reação


emocional de Tiago à reação de Eleanor é geralmente mais alta na escala
dele, que seria como um 6. Assim, ele pode lidar com frustrações diárias
com menos emoção do que ela, mas ele não consegue lidar com a emo­
ção dela, sobre esses eventos diários, sem se perturbar. Quando Tiago rea­
ge a Eleanor com um 6, ela reage a ele com um 8. Isso, por sua vez, leva
ele a uma reação emocional em torno de 8. Assim, a intensidade emocio­
nal vai de 2 a 8 para ele e de 5 a 8 para ela, em síntese. A interação do ca­
sal amplificou a intensidade emocional causada por qualquer evento que
Eleanor originalmente experimentou. Se eles estivessem conscientes desse
processo e pudessem observá-lo enquanto estava acontecendo, sem julgá-
-lo, essa intensidade crescente poderia ser reduzida.
--------------------------------------------------------------------------------------
Dica 2: No treinamento de mindfulness, o acrônimo STOP é frequentemente
usado para instruir as pessoas a como se separarem, brevemente, da imersão
em suas atividades diárias e se tornarem mais conscientes do que estão fazen­
do: S (Stop what you are doing) significa "Pare o que está fazendo", T (Take a
deep breath) significa "Respire fundo", 0 (Observe what is going on) significa
"Observe o que está acontecendo", e P (Proceed with what you were doing)
significa "Prossiga com o com o que estava fazendo". Tente usar uma versão
ligeiramente diferente de STOP quando você entrar numa situação difícil com
o seu parceiro: Pare o que está fazendo, Respire fundo, Observe a interação
entre vocês dois, e Prossiga de forma diferente com a interação. Abaixo vamos
mostrar-lhe algumas maneiras de prosseguir de forma diferente,
v______________________________ _____________________________ z

Criando um nome para acusar

Geralmente, há valor em nomear um problema nos relaciona­


mentos. O nome cria alguma distância emocional, sugerindo que o
problema é um “lá fora”, em vez de “um você/um eu aqui”. Assim
você pode falar sobre o problema, a “coisa” que vocês dois se envol­
vem, ao invés de criar um problema através de sua análise dele.
Você pode nomear o papel que cada um tem no conflito e sua
comunicação em conjunto. Por exemplo, um nome possível para o
papel de Eleanor é “vulcão”, pois suas erupções emocionais atingem
Diferenças Reeoneiliáveis 269

Tiago de forma imprevisível e danosa. Ela, às vezes, também sente o


mesmo. Um bom nome para o papel de Tiago seria “silenciador”, uma
vez que seus esforços visam abafar a intensidade emocional que Elea­
nor sente e expressa. Embora estas metáforas misturadas pudessem
não ser um ideal de linguagem, expressam a inutilidade de suas posi­
ções. Não há nenhum silenciador eficaz para um vulcão.
Fique alerta, entretanto, de que a seleção de nomes para os papéis
que cada um executa pode ser contraproducente. Nomes escolhidos para
ridicularizar ou culpar não vai distanciá-lo do conflito, mas sim intensifi­
cá-lo. Uma rota mais segura é nomear apenas o padrão de comunicação
que gera soluções tóxicas. Infelizmente, nossa linguagem não fornece mui­
tos termos para descrever um processo entre duas pessoas, então a criativi­
dade será necessária. Mas vale a pena o esforço, pois nomes que descrevem
um processo não podem ser usados tão facilmente de maneira acusatória.
Eleanor e Tiago originalmente escolheram “amplificação emocional e esca­
lada”, ou “AEE”, para descrever o modo como suas emoções se acumula­
vam durante a comunicação, mas acabaram estabelecendo “MAD” para
“Mútua e Amplificada Destruição” porque era mais criativo, admitia as
contribuições de cada um, e gostaram da ironia de sua semelhança com a
política da guerra fria de “mútua asseguração de destruição”.
Ter um nome para seus conflitos pode permitir que você con­
verse sobre eles sem revivê-los porque descreve sua dança sem conde­
nar qualquer um de vocês. Você pode usar esses nomes para evitar ou
limitar a implementação de seus conflitos. Quando Tiago diz a Elea­
nor, “eu sinto um MAD vindo”, ele muitas vezes impede e diminui o
conflito deles. Quando Eleanor pergunta a Tiago “Nós estamos total­
mente no MAD ainda?” ela às vezes facilita a saída do conflito.

Dica 3: Depois de parar, respirar fundo e observar sua interação, tente pros­
seguir de forma diferente rotulando o padrão de interação entre os dois.
Mesmo as frases simples como "eu penso que nós estamos entrando nele
outra vez" ou "aqui vamos nós com nossa dança usual" podem, frequente­
mente, ser benéficos. Se você previamente já concordou com um termo para
descrever seu padrão de interação, invocar esse termo pode ser mais útil,
v.____________________________ _________________ __________________ J
270 Ganhando alguma perspectiva no conflito

Rindo de nós mesmos


Humor pode criar distância emocional, proporcionando um alí­
vio, sendo engraçado e facilitando uma rápida mudança de perspectiva.
Exagero, autodepreciação e sarcasmo gentil podem cortar as réplicas au­
tomáticas de uma escalada e dar a ambos uma chance de lidar com a si­
tuação melhor do que poderia sem o humor. Eleanor poderia dizer:
“Estou realmente chateada com isso e sei que você vai querer ouvir tudo
isso de novo”. Ou Tiago poderia comentar: “Oh, conte-me tudo sobre
isso - você sabe como eu gosto de ouvir os detalhes de sua turbulência
emocional.” Esses comentários podem funcionar desde que não sejam
feitos com tal sarcasmo que poderiam ser interpretados como críticas.
Conflito em casais tem fornecido material rico para quadrinhos e
cartunistas porque discussões íntimas são frequentemente cheias de para­
doxo, contradição e absurdo. Se você perceber um indício revelador do
absurdo que acontece na sua relação, mesmo que você nunca o tenha
compartilhado ou rir dele juntos, a intensidade do seu conflito pode di­
minuir. Se Tiago percebesse a contradição em ficar chateado com Eleanor
ficando chateada, ou se Eleanor observa o absurdo de seus esforços para
reprimir a agitação emocional um do outro, ficando os dois cada vez mais
agitados, ambos poderiam se afastar um pouco do conflito.
Qualquer um que já tentou retransmitir uma história engraçada
ou brincadeira sabe a dificuldade de incluir humor. E ainda mais difí­
cil oferecer qualquer conselho bem humorado no contexto de um
conflito. Mas quando os parceiros podem rir - ou até mesmo sorrir -
em sua situação difícil, eles alcançaram alguma distância terapêutica
de seu conflito. Até mesmo um sentimento de que “Nós vamos rir
disso um dia” pode abrandar a intensidade do momento.

------------------------------------------------------------------------------------—>
Dica 4: Tente introduzir humor em sua interação como um meio de diminuir
a tensão. Lembre-se, no entanto, que rir de si mesmo, até como um comen­
tário autodepreciativo, provavelmente será mais bem sucedido do que impli­
car com seu parceiro, não importa quão gentil seja a provocação.
\_------------------------------------------------ '
Diferenças Reconciliáveis 271

AVERIGUAR A REALIDADE: QUANDO


A DISTÂNCIA É POSSÍVEL?

Conseguir o tipo de distanciamento e desprendimento intelec­


tuais que temos discutido raramente é possível no calor da batalha.
Pode haver momentos em que você pode, momentaneamente, tomar
a posição de um observador durante o conflito. Como o soldado
mencionado anteriormente, você pode baixar as armas temporaria­
mente para ter uma visão melhor da guerra. Mesmo essas breves ten­
tativas de observar, em vez de participar, podem atenuar as atuais hos­
tilidades. No entanto, é irrealista esperar que nós mesmos falemos so­
bre um “ele” quando acabamos de ser provocados por um “você”. A
capacidade de criar distância emocional e o benefício dela geralmente
vem bem antes da batalha ou bem depois dela.
Se percebermos uma discussão chegando com bastante antecedên­
cia, nossa capacidade de antecipar sua sequencia, às vezes, pode diminuir
a dor que causa, mesmo que não possa impedir a briga totalmente. Por
exemplo, Eleanor pode se queixar, em voz alta, de que ela poderá ter ape­
nas um pequeno bônus no trabalho este ano e comentar: “E se eu não re­
ceber uma bonificação decente, depois de todo o meu trabalho, eu prova­
velmente terei um colapso emocional - o qual tenho certeza que você vai
adorar.” Ou se Eleanor está preocupada com sua bonificação, Tiago pode­
ria comentar:” Bem, mesmo se você não receber um bônus decente, eu
vou ser capaz de compartilhar da sua dor!” Esses comentários podem tra­
zer um sorriso pesaroso para um ou ambos e proteger contra uma explo­
são de Eleanor se não conseguir o que ela quer.
Até o ato de descrever um padrão de conflito iminente pode
impedir ou alterar sua ocorrência. O marido na caricatura na página
xxx descreve uma possível sequencia de discussão com sua esposa,
em vez de se envolver nessa briga. Sua simples descrição pode mini­
mizar seu conflito.
Talvez o maior benefício da distância emocional ocorra após
um conflito. Estabelecer alguma distância é outra maneira de facilitar
272 Ganhando alguma perspectiva no conflito

a recuperação do conflito que discutimos no Capítulo 9. Vamos assu­


mir que Eleanor receba uma bonificação menor, e ela e Tiago execu­
tam seu padrão usual de escalada emocional. Depois de terem acalma­
do um pouco, o humor pode ajudá-los a se recuperar. Tiago poderia
se divertir consigo mesmo: “Tenho considerado uma mudança de car­
reira, talvez eu devesse me tornar um terapeuta, pois sou muito bom
em lidar com os problemas emocionais de outras pessoas”. Ou Elea­
nor poderia reconhecer sua situação: “Eu acho que você ficou sufoca­
do nas cinzas do meu Vulcão”. Com esses comentários, eles zombam
de si mesmos e reconhecem, com humor, o papel que desempenham
em sua luta. Sendo assim, isto os ajuda a se recuperar.

"Estou atfasaào, você. está com raivo - aós brigoMos."


Copyright The New Yorker Collection 1978 Miehael Maslin from www.cartoon-
bank.com. All rights reserved.
Diferenças Reconciliáveis 273

Dica 5: Tente fazer um comentário leve quando você vê que os dois vão
entrar em um conflito ou após o conflito passar, como um meio de diminuir
a tensão entre vocês. Mais uma vez, um comentário sobre você próprio pro­
vavelmente será mais bem-sucedido do que um sobre seu parceiro.
<______________________________ .__________________________ X

Encontrando a bênção na maldição

No Capítulo 3 discutimos sobre as diferenças com nossos par­


ceiros que nos confundem, aquelas mais complexas que despertam
sentimentos mistos. As vezes queremos que eles sejam diferentes;
outras vezes nós gostamos e apoiamos a maneira que são. No calor
do conflito, as características negativas de nossos parceiros podem se
destacar de forma tão dramática e podem ser transmitidas tão pode­
rosamente que falhamos em enxergar o contexto maior em que apa­
recem. No entanto, se formos capazes de tomar distância do confli­
to, poderemos ter outra perspectiva sobre as características deles.
Poderemos ver as características positivas e a influência interessante
das negativas. Esse “entendimento à distância” pode ajudar a nos re­
cuperar mais rapidamente do conflito e talvez até mesmo a evitar al­
gum conflito futuro.
Tiago frequentemente fica tão focado na reatividade emocional
negativa de Eleanor que ele não percebe a influência das emoções dela
em si. No início de sua relação, ele achava estimulante a ampla gama
emocional de Eleanor. Acrescentou cor à sua vida. Sua energia, ani­
mação e entusiasmo atraíam-lhe. Mesmo suas reações emocionais ne­
gativas eram, muitas vezes, atraentes para ele; ele se sentia bem quan­
do podia consolá-la em seu estado de irritação.
Por sua vez, Eleanor sentia que a estabilidade emocional de Tia­
go era reconfortante. Ele era tão lógico, organizado e razoável que po­
dia lhe ajudar em muitos dos problemas que enfrentava. Havia uma
sinergia entre suas características. Sua emotividade adicionou emoção
à vida dele, e a estabilidade de Tiago forneceu uma âncora para ela.
Apesar de seu conflito, eles aprenderam um com o outro. Sua conexão
274 Ganhando alguma perspectiva no conflito

com ela lhe acrescentou profundidade emocional; sua conexão com


ele forneceu a estrutura necessária para sua vida. Normalmente, as
brigas sobre sua reatividade emocional obscurecem as características
positivas que cada um traz para a batalha. Entretanto, quando cada
um fica vagamente consciente do intercâmbio complexo que fazem -
uma medida de emoção para uma medida igual de estabilidade — eles
balançam a cabeça, assentindo, com uma mistura de frustração e apre­
ço. E assim eles podem sentir uma maior aceitação das diferenças en­
tre eles e brigar menos em relação a essas diferenças.
Mesmo quando as características negativas de nossos parceiros
não têm um lado atrativo óbvio, podem nos forçar a enfrentar algu­
mas de nossas próprias características negativas. Como Tiago não es­
tava acostumado a emoções fortes e se sentia um tanto intimidado
por isso, ele com frequência evitava confronto com os outros. Ele
escolhia fugir ao invés de se arriscar num enfrentamento; ele optava
pela mentira branca em vez da verdade crua. Com Eleanor, no en­
tanto, sua estratégia de evitação não funcionava. As reações emocio­
nais dela, “esfregadas na cara”, forçavam a uma confrontação. A luta
com Eleanor levou Tiago a se posicionar nas questões. Embora ele
nunca aprecie enfrentamentos abertos, agora ele está menos intimi­
dado por fortes emoções no trabalho ou outros contextos. E ele deve
agradecer à sua esposa por isso.
A reatividade emocional de Eleanor parecia ter apenas duas po­
sições: ligada e desligada. Parecia haver, surpreendentemente, poucos
graus de intensidade em suas reações emocionais. Algum evento nega­
tivo trivial poderia despertar quase tanta emoção quanto um evento
verdadeiramente importante. Em suas brigas com Tiago, ele zombava
dela por ficar “chateada por nada”. Ele às vezes se recusava a ouvir suas
preocupações. Embora suas ações provocassem angústia adicional nela
na época, seu impacto cumulativo não era de todo ruim. Eleanor
aprendeu a escolher o que precisava contar a Tiago e o que não preci­
sava. Ainda que ela se sinta desapontada por não poder compartilhar
mais de sua vida emocional com Tiago, ela aprendeu a definir o que é
Diferenças Reeoneiliáveis 275

e o que não é importante. Eleanor sempre terá algo de um sistema


emocional de tudo ou nada, mas aprendeu a lidar com suas emoções
quando elas estão “ligadas” e a fazer algumas escolhas sobre o que ela
deseja compartilhar. Tiago foi seu professor relutante e ela sua estu­
dante resistente.
O respeito hesitante que cada um ganhou pelo que o outro traz
ao relacionamento tira um pouco do que fica à margem das lutas que
Tiago e Eleanor têm sobre emocionalidade. Eles ainda entram nas dis­
cussões, mas estas são um pouco mais leves, menos dolorosas e fica
mais fácil de se recuperar.

Dica 6: Após o calor da batalha, considere os benefícios positivos que as


características negativas de seu parceiro fornecem para você. Uma conside­
ração destas bênçãos contraditórias pode facilitar seu desconforto com ele.

NÃO É TÃO RUIM QUANTO PARECE

O conflito de casais consiste em grande parte de reações signifi­


cativas a eventos triviais. Embora haja altos crimes nos relacionamen­
tos, a maioria das lutas é sobre delitos menores. Alguns de nós podem
trair, enganar ou de outra forma desrespeitar nossos parceiros, mas ge­
ralmente a briga é sobre assuntos menores.
Para quem está de fora, pode parecer irracional que tais even­
tos triviais levem a emoções tão fortes. Um observador objetivo po­
deria ver a reação emocional de Eleanor às suas frustrações no traba­
lho como excessiva, a reação de Tiago à tentativa de Eleanor de lhe
falar sobre isso como uma reação exagerada, a resposta subsequente
de Eleanor como explosiva e a resposta subsequente de Tiago como
quase histérica.
Um observador objetivo da interação deste casal pode tentar ex­
plicar-lhes a irracionalidade de suas reações. Este observador pode
tentar usar a lógica para convencer a ambos que suas respostas emo­
276 Ganhando alguma perspectiva no conflito

cionais são exageradas. A razão, no entanto, é impotente diante da


forte emoção. Alguém que é fóbico sobre andar de avião não será afe­
tado por estatísticas sobre a segurança das viagens aéreas. Alguém que
sente terror de cobras não fará distinções entre aquelas que são vene­
nosas e as que não são.
Psicólogos têm desenvolvido poderosas formas de dessensibilizar
emoções fortes, particularmente o medo. Eles gradualmente expõem a
pessoa ao medo, mas em um ambiente seguro e de apoio. À medida que
as pessoas enfrentam o objeto temido a uma distância confortável, elas
podem ficar mais aptas a tolerar o contato cada vez mais próximo até
que seu medo eventualmente se dissipe. Da mesma forma, podemos
gradualmente expor nossos parceiros a partes do nosso comportamento
que causam sofrimento emocional neles. Se conhecermos os gatilhos
que os detonam, podemos criar uma situação na qual esses disparadores
possam ser menos ativados. Por exemplo, Eleanor poderia abordar Tia­
go com o comentário “Quero falar sobre um estresse emocional da mi­
nha vida. Você está bem para me escutar?” Com esta observação, Elea­
nor mostra que entende o que desencadeia reações emocionais em Tia­
go, ela o adverte do que quer fazer, e, ao fazê-lo, dá possibilidade a ele
para lidar melhor com sua aflição emocional, sem que ele fique tão an­
gustiado. Claro, um comentário como este requer alguma perspectiva
de Eleanor. Se ela está muito perturbada, ela só vai descarregar em Tia­
go sem qualquer aviso. Além disso, ele pode não estar numa posição de
ouvi-la, mesmo que ela se aproxime dele com sensibilidade a suas possí­
veis reações. Ela pode ter de aceitar, às vezes, um não como resposta.
Por sua parte, Tiago poderia alertar Eleanor de um possível gatilhc
para ela se ele expressasse sua intenção antes de sua ação. Por exemplo, ele
poderia dizer: “Eu tenho muita vontade de falar com você sobre sua rea­
ção e lhe explicar que o problema não é grande, mas eu não sei se você
está aberta a isso. Eu não quero que você se sinta ignorada ou criticada.
Tal comentário indicaria uma considerável consciência e comedimento de
Tiago. Dependendo de seu próprio estado emocional, ele poderia sim­
plesmente ser incapaz de dizer algo como isto, expressar o que acredita, e
Diferenças Reeonciliáveis 277

aceitar a possibilidade de que Eleanor pudesse não estar aberta a ouvi-lo.


No entanto, nas ocasiões em que ele conseguisse fazer tal comentário, po­
deria ser uma possibilidade para Eleanor o escutar.
■ - \
Dica 7: Tente verificar com seu parceiro antes de o expor a algo que possa
desencadear suas sensibilidades. Sua consideração respeitosa dessas sensibi­
lidades pode permitir que ele responda mais positivamente ao que você tem
que fazer ou dizer.
\_________________________________________________________ X

SÓ, MAS COM UMA PEQUENA AJUDA DE SEUS AMIGOS

Intelectualmente, todos nós podemos endossar a noção de que


nossos parceiros não podem atender a todas nossas necessidades ou
satisfazer a todos os nossos desejos. Sabemos que há diferenças para as
quais o acolhimento ou comprometimento não é solução. Para algu­
mas de nossas necessidades e desejos, não esperamos ou buscamos a
satisfação em nossos parceiros. Particularmente se nossos cônjuges
nunca satisfizeram nossas necessidades em uma área particular, não te­
remos nenhuma dificuldade de buscar em outro lugar. Ou se nossos
desejos parecem uma “coisa masculina” ou uma “coisa feminina”,
pode ser fácil obter satisfação com um amigo de nosso próprio gêne­
ro. Tiago não tem nenhum problema em ir a jogos de futebol com
seus amigos sem Eleanor como ela não tem problemas de fazer com­
pras com suas amigas sem Tiago.
Se uma necessidade ou desejo são intensos e pessoais, no entan­
to, podem não ser facilmente preenchidos fora do relacionamento.
Além disso, se a necessidade tem sido historicamente satisfeita dentro
da relação, um parceiro pode, compreensivelmente, esperar uma con­
tinuada satisfação em casa. No início de seu relacionamento, Tiago
estava feliz em consolar Eleanor quando ficava chateada, mas a fre­
quência e intensidade de suas reações emocionais passaram a esmore­
cer a capacidade de respostas adequadas de Tiago. Eleanor ainda acre­
dita que no casamento você deve ser capaz de compartilhar seus pro­
278 Ganhando alguma perspectiva no conflito

blemas com seu parceiro, não importa o que eles sejam. Tiago no pas­
sado também endossava esse ideal.
Eleanor tem vários amigos que servem como apoio emocional para
ela. Muitas vezes eles são uma melhor ajuda do que Tiago. Mas se ela tem
que recorrer a eles com muita frequência, fica chateada com o marido por
não estar lá para ela. E se sente ainda mais distante dele porque, assim,
Tiago não está fazendo parte de sua vida emocional. No entanto, a reali­
dade é que Tiago não é capaz de ouvir a sua angústia tanto quanto ela
gostaria. As vezes, ela ficará angustiada e ele estará indisponível. Ela estará
só com seu mal-estar. Para Eleanor buscar consolo com seus amigos pode
ser uma solução, mas apenas parcial, devido à incompatibilidade do casal.
Embora os amigos ofereçam soluções para algumas incompatibili­
dades, procurar sua ajuda e conselho tem riscos. E muito fácil tentar
transformar amigos em aliados contra nossos parceiros, o que somente
prejudica nossa própria relação, como foi discutido no Capítulo 6. Os
amigos ajudam mais quando podem satisfazer algumas de nossas necessi­
dades, sem entrar no conflito que temos com nosso parceiro sobre as mes­
mas. Então, esses amigos nos permitem aceitar nossos parceiros e sua ca­
pacidade limitada de satisfazer todas as nossas necessidades.
------------------------------------- - \
Dica 8: Tente recorrer a seus amigos para atender algumas das necessidades
que seu parceiro tem dificuldade em satisfazer, desde que ele fique bem com
isso e seus amigos não se tornem seus aliados contra o seu parceiro,
k_____________________________ _ ________________________________ >

RECAPITULANDO
Como seus conflitos são tão dolorosos, os casais gostariam de exoreizá-los de suas
vidas. Eles querem apagar as disputas repetitivas e mandá-las embora, imediata­
mente. Com certeza, Tiago e Eleanor gostariam de remover cirurgicamente o trau­
ma repetido da reatividade de Eleanor, a reação de Tiago à ela, e uma mobilização
ainda maior de Eleanor. Neste capítulo não fornecemos remédios para exorcizar o
conflito. Em vez disso, temos mostrado maneiras de domar o conflito, domesticá-lo
em vez de demoli-lo. Mostramos que é possível que os casais aceitem os conflitos e
vivam com ele.
Diferenças Reeonciliáveis 279

Ao lidar com qualquer problema, o primeiro passo é identificá-lo apropriadamente.


Quando os parceiros identificam o problema como sendo de um ou de outro, seus es­
forços para resolvê-lo, muitas vezes, fazem-no ficar pior. Se os casais podem tratá-lo
como um "ele" que ambos enfrentam, poderiam ver suas diferenças de uma forma
mais desapaixonada. Poderia ver suas diferenças no contexto mais amplo de gênero,
idade, cultura ou história pessoal. Poderiam observar a sequencia do que acontece
entre eles e discuti-la a partir de um ponto de vista mútuo. Poderiam identificar os
papéis que cada um tem e ver sua luta sob uma perspectiva maior, até mesmo, às ve­
zes, com humor. Graças a esta perspectiva maior, eles poderiam ver a bênção na mal­
dição: as vantagens, bem como as desvantagens que as características de seus parcei­
ros lhes fornecem. Eles poderiam, então, tolerar o lado negativo dessas característi­
cas, com, talvez, um pouco de ajuda de seus amigos. Fornecemos as seguintes oito
dicas para ajudá-lo a atingir esses objetivos.

1. Tente entender suas divergências à luz das diferenças de seus contextos incluindo
as experiências culturais associadas com a sua idade, gênero, identidade étnica e
história familiar.
2. Numa situação difícil com seu parceiro, PARE (STOP): Pare o que está fazendo;
Respire fundo; Observe a interação entre vocês dois; e prossiga de forma diferente
com a interação, como indicado nas três próximas dicas.
3. Tente rotular o padrão de interação entre vocês dois, particularmente se vo­
cês mutuamente concordaram com um bom termo para descrevê-lo.
4. Tente introduzir humor em sua interação como um meio de diminuir a tensão.
Lembre-se, no entanto, que rir de si mesmo, até como um comentário autodepre-
ciativo, provavelmente será mais bem sucedido do que implicar com seu parceiro,
não importa quão gentil seja a provocação.
5. Tente fazer um comentário leve quando você vê que os dois vão entrar em um con­
flito ou após o conflito passar, como um meio de diminuir a tensão entre vocês.
6. Após o calor da batalha, considere os benefícios positivos que as características
negativas de seu parceiro fornecem para você.
7. Tente verificar com seu parceiro antes de o expor a algo que possa desencadear
suas sensibilidades.
8. Tente recorrer a seus amigos para atender algumas das necessidades que seu par­
ceiro tem dificuldade em satisfazer, desde que ele fique bem com isso e seus ami­
gos não se tornem seus aliados contra o seu parceiro.

É quase impossível manter uma distância tolerante e implementar as dicas relevantes


no calor da batalha. Durante uma discussão real cada membro experimentará o pro­
blema como um "você", e como não um "ele". Entretanto, tomar esta perspectiva mais
ampla antes de uma batalha pode aliviar o conflito; tomá-la depois pode facilitar
uma recuperação mais rápida e mais fácil do conflito.
Se os casais não conseguem exorcizar seus demônios, talvez eles possam domesticá-los.
280 Ganhando alguma perspectiva no conflito

Exercício: Preparando-se para uma


distância que promova tolerância
Para melhor prepará-lo para os inevitáveis conflitos que você
terá com seu parceiro, queremos que você reveja alguns aspectos
de seu conflito principal e considere possíveis maneiras de imple­
mentar as dicas acima. Então você poderá diminuir seu conflito se
distanciando um pouco dele.
Considere seu conflito central e sua análise DEEP (profunda)
dele. Como são as diferenças centrais ou as semelhanças que dão
origem a este conflito relacionando com a sua idade, gênero, con­
texto cultural ou histórico pessoal específico? Anote algumas idéias
sobre o que pode ter dado origem a essas diferenças.

Descreva algumas das características positivas dessas diferen­


ças (ou similaridades). Como elas são úteis para você ou seu relacio­
namento, mesmo que também sejam problemáticas?

Lembre-se do último conflito que você e seu parceiro tiveram


sobre sua questão principal (que você considerou no último capítu­
lo). Presumivelmente, envolveu alguma variação do padrão de inte­
ração que você identificou em sua análise DEEP.

Descreva a sequencia dessa interação específica como se você


fosse um observador objetivo (isto é, sem culpar nenhum de vocês.
Então tente chegar a um nome bem-humorado para descrever esse
padrão geral de interação.
Diferenças Reeoneiliáveis 281

Ainda considerando esse último conflito, que comentário você


poderia ter feito no início do conflito, ou antes, que o conflito se
intensificasse, que poderia ter alterado o curso da discussão? Que
comentários você poderia ter feito depois que poderiam ter facili­
tado a recuperação do conflito?

Considerando o conflito central como um todo, existem dese-


jos/necessidades relacionadas a esse conflito que você poderia sa­
tisfazer em outro lugar que não aumentariam o problema? Se sim,
descreva-os.

PRÓXIMOS PASSOS

Na Parte III do livro, primeiro revisamos as diferenças entre


aceitação e mudança e consideramos quais coisas na relação deveriam
ser aceitas e o que deveria ser mudado. Embora muito importantes,
havia poucas coisas que deveriam ser mudadas universalmente, como
a violência, ou aceitas universalmente, como a essência ou a personali­
dade básica de um parceiro. Outras coisas que devem ser aceitas ou
mudadas são assuntos individuais, com a ressalva de que o que pensa­
mos que deve ser mudado nos parceiros ou que deve ser aceito em
nós, normalmente, compõem listas proibitivamente longas. Examina­
mos, então, formas de promover a aceitação, uma vez que ela não
282 Ganhando alguma perspectiva no conflito

pode ser comandada ou forçada. Ter uma história objetiva e conjunta


sobre o problema é o primeiro passo. Propiciar a empatia pelas sensi­
bilidades emocionais do outro que são desencadeadas em conflito é
um segundo passo. Finalmente, desenvolver uma distância tolerante
para as diferenças que geram conflito é um terceiro passo. Oferecemos
dicas concretas para irmos em direção a uma conexão empática com
seu parceiro e desenvolver uma distância mais tolerante antes, durante
e depois de um conflito.
Essas estratégias para promover a aceitação muitas vezes criam
maior proximidade emocional no relacionamento. Além disso, elas
podem trazer mudanças espontâneas, pois cada parceiro geralmente
ama e quer agradar o outro. Uma pessoa que se sente mais aceita e
menos pressionada, frequentemente, tentará melhorar a relação por
conta própria. No entanto, às vezes a mudança é necessária e não está
iminente. Assim, em nossa próxima seção, a Parte IV, vamos explorar
maneiras de trazer mudanças construtivas nos relacionamentos.
Parte IV
Mudança Deliberada
Por Meio da Aceitação
11
Os dilemas da
mudança estabelecida

Não há nada permanente exceto a mudança.


Heraclitus, Quote Dindiogenes Laertius, Lives ofthe
Eminent Philosophers, Traduzido por Rober Thicks(1925)

Se quisermos que as coisas fiquem como estão, as coi­


sas terão de mudar.
Giuseppe Di Lampedua, The Leopard (1957 )

Como muitos velhos ditados nos dizem, não há nada tão certo
como mudança. Não é uma questão de saber se nós e nossos relacio­
namentos mudaremos, mas como eles vão mudar. Na verdade, manter
as coisas da maneira como são, com frequência, exige consideravel­
mente mais esforço do que mudá-las. Se você duvida disso, tente
manter seu carro novo ou casa nova na mesma condição em que esta­
va quando você comprou.
Um tipo de mudança é a modificação lenta e imperceptível que,
inevitavelmente, vem com o tempo. Nos relacionamentos, tais mu­
danças podem ser boas ou ruins. O tempo e a experiência podem nos
suavizar. Questões que pareciam muito importantes para nós no iní­
cio do relacionamento podem parecer menos mais tarde. Mas, por ve­
286 Os dilemas da mudança estabelecida

zes, nossa experiência torna as coisas mais difíceis. Ficamos mais sen­
síveis e irritados com nossos parceiros. Ficamos menos tolerantes.
Apreciamos menos das coisas boas que nosso parceiro faz. Tornamo-
-nos cada vez melhor e melhor em sendo pior e pior.
Outro tipo de mudança é mais súbita, geralmente provocada
pelas circunstâncias. Eventos negativos que afetam nossos relaciona­
mentos podem acontecer inesperadamente, como perder um empre­
go, lesionar-se ou contrair um problema de saúde grave. Ou eventos
positivos podem afetar nosso relacionamento de repente, como conse­
guir uma promoção que requer uma mudança de cidade ou engravi­
dar após várias tentativas malsucedidas. Se as mudanças trazidas
pelo tempo e pelas circunstâncias são súbitas ou graduais, muitas
vezes afetam nossos relacionamentos de maneiras imprevistas. Se
um acidente ocorrer, além de não saber que iríamos nos machucar,
não teríamos ideia de quão dramaticamente isso afetaria a divisão
de trabalho no relacionamento. Embora possamos ter batalhado
para a promoção de trabalho que significou que a família teria que
se mudar, não podemos prever a ruptura com nosso círculo de fa­
miliares e amigos e como isso afetaria o nosso relacionamento.
Em contraste com essas mudanças, outro tipo que pode ocorrer
nos relacionamentos é a mudança deliberada. Queremos que nossos par­
ceiros mudem de maneiras específicas. Queremos que eles ajam e sejam
diferentes para que nossa relação possa ser diferente. As vezes, queremos
essas mudanças deliberadas desde o início do relacionamento quando ob­
servamos algo aversivo em nosso parceiro. Mais frequentemente, as mu­
danças inevitáveis que o tempo e as circunstâncias trazem para nossos par­
ceiros e nossos relacionamentos nos fazem buscar mudanças deliberadas.

DA ACEITAÇÃO À MUDANÇA

A parte III deste livro focalizou a aceitação como uma alternati­


va à mudança deliberada. Quando você desiste do esforço para mudar
Diferenças Reconciliáveis 287

o outro e, em vez disso, aceita seu parceiro e seu comportamento em


re.ação a você, ele muitas vezes faz mudanças espontâneas na direção
cue você queria originalmente. Aliviado da pressão de se defender,
mas com uma experiência do impacto emocional de seu comporta­
mento em você, ele pode fazer acomodações para você por conta pró­
pria. Da mesma forma, quando você experimentar a aceitação dele,
ocê pode fazer mudanças espontâneas na direção que ele deseja. No
melhor dos casos, essas mudanças mútuas promovem acomodação
adicional para cada um.
Embora esse seja o cenário ideal e frequentemente ocorre nos
relacionamentos, nem sempre funciona desta maneira. A aceitação
nem sempre leva a mudanças espontâneas e nem sempre leva a uma
maior intimidade. Mesmo quando isso acontece, essas mudanças po­
dem não ser suficientes. As vezes, queremos e precisamos de mudan­
ças deliberadas.
Nosso primeiro impulso é geralmente buscar mudanças imedia­
tas e drásticas.

A CONFRONTAÇÃO: MUDANÇA IMEDIATA E DRÁSTICA

É somente nos romances que as pessoas sofrem uma


metamorfose súbita.
Isadora Duncan, My Life (1942)

Podemos fantasiar sobre uma transformação do dia para a noite


em nossos parceiros. Podemos desejar um confronto único, no qual
deixemos cair qualquer fingimento de que tudo está bem, e não mais
poupamos os sentimentos de nossos parceiros. Em vez disso, aponta­
mos, de forma franca e veemente, como suas ações equivocadas e
omissões negligentes têm causado não só o nosso sofrimento, mas o
seu próprio sofrimento também. Destacamos suas limitações e inade­
quações. Nós fornecemos exemplos elaborados e detalhados, que fo­
288 Os dilemas da mudança estabelecida

ram preservados cuidadosamente em nossa memória, que ilustram


suas deficiências. Eles podem combater nossa lógica, mas é uma bata­
lha dos derrotados. Internamente, eles sabem a validade de nossas rei­
vindicações. Eles logo abandonam qualquer defesa e reconhecem a
verdade no que estamos dizendo. Eles convocam a força e a coragem
para fazer as mudanças que enumeramos. No dia seguinte, tudo é di­
ferente no relacionamento. Ocorreu uma transformação. Há uma mu­
dança radical em seu comportamento e atitude. Estamos mais felizes,
e eles estão mais felizes também. Em última análise, eles são gratos a
nós por fazer a mudança acontecer. E vivemos felizes para sempre.
Como vimos na Parte I deste livro, a maioria de nossos esfor­
ços para mudar nossos parceiros - e, portanto, mudar nossos rela­
cionamentos - é impulsionada por essa fantasia. E a maioria desses
esforços não tem êxito. No entanto, muitas vezes persistimos nessa
direção. E quando o confronto repetido não traz nenhuma mudan­
ça, podemos ameaçar nossos parceiros, implícita ou abertamente,
com consequências negativas. Em um extremo estão as ameaças des­
trutivas, que não só aniquilam a confiança mútua e respeito, como
também pode terminar em violência (que nunca é aceitável e é dis­
cutido em mais profundidade na Parte V). No outro extremo, são
ameaças vazias: Podemos advertir sobre uma raiva implacável, dis­
tância intransponível ou rupturas de relacionamento como a infide­
lidade, separação ou divórcio. Como essas ameaças nunca são leva­
das a cabo, nossos parceiros acabam por reconhecê-las como gritos
de “Olha o lobo!”, e as ignoram.
A maioria das ameaças é ineficaz na melhor das hipóteses e des­
trutiva no pior dos casos. Mas a mais poderosa ameaça - o ultimato -
tem o potencial para alterar o curso de uma relação de forma drástica
e positiva desde que satisfaça certos critérios cruciais. Quando esses
critérios não são atendidos, o potencial do ultimato para infligir dano
é tão grande quanto seu potencial para evocar a mudança.
Betina e Fred tinham namorado por um ano antes de começa­
rem a debater seriamente sobre casamento. Nessas primeiras discus­
Diferenças Reeoneiliáveis 289

sões Fred reafirmou seu amor por Betina, mas insistiu que ele não es­
tava pronto para um compromisso tão sério como casamento. A seus
olhos, o casamento era um prelúdio de ter filhos, e embora quisesse
crianças eventualmente, não estava pronto ainda. Betina expressou al­
guma urgência para “ir adiante com o relacionamento”. Ela também
não estava pronta para a maternidade, mas, aos 31 anos, queria com o
casamento uma garantia de comprometimento e a intenção de ter fi­
lhos no futuro. Durante os seguintes 6 meses eles tiveram uma série
de discussões sobre o casamento que frustraram a ambos. Betina cada
vez mais ficava em dúvida quanto aos sentimentos de Fred por ela e
sua disposição ou capacidade de se comprometer com o casamento.
Fred ficava cada vez mais desconfortável com a crescente pressão que
sentia. Ela começou a dar sinais a Fred, primeiro indiretamente e de­
pois diretamente, que iria romper com ele, se ele não estivesse dispos­
to a casar. No início, Fred avisou-a para não lhe dar um ultimato. Ao
se sentir tão pressionado, ele disse que ela estava blefando. Betina ter­
minou a relação, jurando nunca mais vê-lo.
Como sentiam muita falta um do outro, eles reataram, mas não
demorou muito para que o velho problema surgisse mais uma vez.
Betina insistiu novamente que ou se casavam ou se separavam; Fred
tentou dissuadi-la de seu ultimato. Ela terminou o relacionamento
uma segunda vez, mas desta vez com maior convicção, sabendo que
uma reconciliação sem casamento só prolongaria sua dor. Embora ela
conversasse com Fred em certas ocasiões, ela se recusava a vê-lo. Suas
atitudes forçaram Fred a uma grande reavaliação de sua vida. Temia a
perda de alguém que se tornara a figura central de sua existência. En­
tão, ele finalmente decidiu se casar com ela.
Betina insistiu no casamento num futuro próximo, para o qual
Fred, nesse ponto, concordou. Apesar de alguma discordância sobre a
cerimônia em si e alguns ajustes após o casamento, eles estavam felizes
em levar adiante seus planos. Como sua relação era essencialmente
boa e se preocupavam um com o outro tão profundamente, seu casa­
mento era uma conexão sólida entre os dois. Anos mais tarde, eles se
290 Os dilemas da mudança estabelecida

divertiam recordando o ultimato de Betina. Ele apreciava a força que


ela demonstrara ao insistir que sua relação se tornasse mais oficial. Ela
reconheceu o fato de que quando o momento decisivo veio, Fred con­
cordou em validar a união.
A experiência de Fred e Betina representa o melhor cenário para
ultimatos. Seu resultado foi positivo porque o ultimato dela reuniu
cinco condições cruciais.
Primeiro, a ameaça de Betina era verdadeira. Por mais que ela
amasse Fred, ela tinha tomado a decisão de romper com ele se ele
não casasse com ela, e ele finalmente percebeu que ela estava falan­
do sério. Em segundo lugar, a exigência dela se centrou numa única
decisão: que Fred se casasse com ela. Seu ultimato não exigiu dele
transformações não especificadas ou uma quantidade indetermina­
da de mudança. Em vez disso, obrigou-o a fazer uma escolha cru­
cial. Em terceiro lugar, o ultimato exigiu a mudança dentro de um
curto espaço de tempo. Ela insistiu que eles definissem uma data
imediatamente e que deveria ocorrer dentro de nove meses. Ela não
exigiu atitudes repetidas durante um período de tempo longo ou
indeterminado. Em quarto lugar, Fred não perdeu seu senso de in­
dependência ou autonomia ao aceitar a exigência dela. Por causa da
natureza de seu relacionamento e da forma como ela deu o ultima­
to, Fred sabia que Betina não estava simplesmente fazendo um mo­
vimento de poder para exercer controle sobre ele. Fred sabia que
sua decisão de lhe dar o ultimato era uma tortura para ela e feito,
em parte, por desespero. Mesmo que ele não quisesse, parte dele
também acreditava que era hora de fazer a escolha pelo casamento.
Finalmente, a decisão que o ultimato exigiu foi algo que colocou
em movimento toda uma série de mudanças positivas adicionais
(ao invés de algo que ele tivesse que “suportar com cara de feliz”).
Ao se casarem, eles mudaram seu status com amigos e familiares,
tiveram maior contato diário e foram legalmente unidos, entre ou­
tras coisas. De um modo geral, os dois experimentaram essas mu­
danças como algo positivo.
Diferenças Reeoneiliáveis 291

Quando todas essas cinco condições não existem, os ultimatos


geralmente fracassam. Se você não está realmente determinado na sua
imposição, você vai comunicar ambivalência e, provavelmente, não
obterá uma resposta. Se você exige algo inespecífico e vago, será im­
possível dizer se a reivindicação será atendida. Se Betina insistisse que
Fred mostrasse mais consideração ou mais respeito ou mais amor, ele
não saberia exatamente o que deveria fazer. Da mesma forma, exigir
mudanças em um período de tempo indeterminado torna impossível
dizer quando a exigência será atendida. Se o seu parceiro perceber seu
ultimato como principalmente uma tentativa de controle, pode, como
consequência, rejeitá-lo. Concordar significaria não só desistir de algo,
mas também ceder ao outro. Fred poderia ter rejeitado o ultimato de
Betina, porque ele não suportaria que ela dissesse a ele o que fazer —
mesmo se ele, no final, escolhesse por conta própria casar com ela.
Ainda se Fred tivesse sucumbido à exigência de Betina, o ressentimen­
to que ele teria sentido depois de ser forçado a casar com ela poderia
ter contaminado seu casamento desde o início. Finalmente, se o cum­
primento de um ultimato não tiver a perspectiva de criar mudanças
positivas adicionais, realizar esta exigência será um erro. Betina fez
uma avaliação perspicaz de que as dúvidas do parceiro indicavam uma
ansiedade real, porém temporária por parte dele, mas não refletiam
sérias inadequações em Fred ou no relacionamento deles. Ela acredita­
va que depois do casamento, ao estarem juntos desfrutando a vida de
casal, suas dúvidas se dissipariam. Fred finalmente chegou à mesma
conclusão. Felizmente suas avaliações estavam certas. Se estas estives­
sem erradas, eles teriam se casado apenas para enfrentar as dificulda­
des pelas quais a relutância de Fred tinha sido um sinal de alerta.
Mesmo se você atender a estas cinco condições, seu parceiro
pode se recusar a cumprir sua exigência, ou a decisão de consentir
pode não ter os efeitos positivos previstos. Ultimatos são empreendi­
mentos de alto risco e devem ser sua última cartada para a mudança.
Mesmo assim, muitos casais devem a um ultimato bem colocado sua
satisfação, até mesmo a continuação da própria relação, o momento
292 Os dilemas da mudança estabelecida

de ter um filho, entrar em terapia de casal, casar, buscar tratamento


para o abuso de álcool. Entretanto, para muito mais casais, os ultima­
tos que falham e dos quais se abre mão prejudicam as discussões nos
relacionamentos.
/--------------------------------------------------------------------- \
Dica 1: Use ultimatos raramente, e somente na circunstância quando há uma
violação importante do relacionamento, uma grande decisão ou um problema
pessoal grave. Então, use-os somente quando você está falando sério sobre
como prosseguir na relação, quando você está pedindo uma mudança espe­
cífica dentro de um período de tempo específico, quando a transformação
provavelmente trará mudanças futuras positivas e quando você pode fazê-lo
sem criar resistência em seu parceiro, o qual pode se recusar simplesmente
para não ficar mal.
V_______________________________________________________________ '

MUDANÇAS DIÁRIAS

Felizmente, os ultimatos são normalmente considerados - por


todos, exceto os mais histriônicos - apenas nas raras circunstâncias em
que um grande problema, aparentemente intratável, é encontrado. A
maior parte da mudança que buscamos em nossos relacionamentos, e
a maior parte da mudança que obteremos em nossos relacionamentos,
é uma mudança gradual no comportamento cotidiano.
Estas transformações graduais que queremos, com frequência,
parecem simples e diretas para nós: Faça mais trabalho doméstico.
Passe mais tempo com as crianças. Não seja tão crítico. Preste mais
atenção quando eu falo com você. Seja mais ambicioso no trabalho.
Coloque mais energia em nosso relacionamento.
As vezes essas mudanças deliberadas vêm com relativa facilida­
de. Nossos parceiros tentam fazer o que queremos; nós tentamos fazer
o que eles querem. Em outras ocasiões, as mudanças são muito mais
difíceis. Por quê?
Diferenças Reeoneiliáveis 293

Quando mudança deliberada é relativamente fácil

Mudanças específicas versus mudanças gerais

Uma mudança específica pode ser feita mais facilmente do que


uma mudança geral. Se Cátia pede que Lúcio “coloque mais energia
na relação”, e ele está motivado a cumprir, ele pode fazer esforços he­
róicos, mas falhar em dar o que ela quer, porque ele não tem certeza
do que é. Se o que ela quer é que ele faça mais coisas como planejar
seus momentos de lazer, ela terá mais sucesso se pedir especificamente
para fazer exatamente isso.
Solicitar ao seu parceiro que cumpra seus pedidos de mudanças
gerais requer que ele faça duas coisas: traduzir seu pedido geral em al­
terações específicas e, em seguida, fazer essas mudanças específicas. O
primeiro passo - a tradução de um pedido geral em mudanças especí­
ficas - pode ser difícil se você não tem muita consciência do que seu
parceiro realmente quer. As chances são que, uma vez que você está
lendo este livro, você tem a tendência de pensar muito sobre seu rela­
cionamento, seu parceiro e o impacto que seus comportamentos têm
sobre ele e a relação. No entanto, seu parceiro pode não ter o mesmo
nível de consciência. Sendo assim, fazer pedidos específicos em vez de
gerais será muito importante.
Transformar um pedido geral em um pedido específico é com­
plicado porque qualquer pedido único, por mais exato que seja, pode
não ser suficiente para satisfazer o pedido geral. Cátia se sentiria me­
lhor se Lúcio planejasse mais os momentos de lazer, mas isso, por si
só, poderia não ser suficiente para satisfazer o desejo dela de que ele
colocasse “mais energia na relação”, porque há muitas outras maneiras
pelas quais ele ainda não parece ser muito dinâmico. Além disso, se
ele investisse mais energia em geral na relação, então o fato de que ele
nunca fez os planos para suas noites de sábado não iria incomodá-la.
Assim, há uma variedade de maneiras que Lúcio poderia ser mais pro-
ativo; várias mudanças são necessárias para satisfazer Cátia, mas ne­
nhuma alteração em particular é obrigatória.
294 Os dilemas da mudança estabelecida

Apesar desta complexidade, Cátia terá mais sucesso em conse­


guir que Lúcio mude se ela listar as coisas específicas que ela quer que
ele faça. Se ele souber concretamente o que ela quer, é mais provável
que ele possa realizar pelo menos alguns dos seus pedidos.

Ação propositiva versus ação contida

E mais fácil mudar fazendo algo positivo do que mudar paran­


do de fazer algo negativo. É normalmente mais fácil fazer mais de algo
bom do que fazer menos de algo ruim. Portanto, quando possível,
uma mudança deve ser formulada em termos do que você quer, em
vez de em termos do que você não quer. E mais fácil “limpar a casa a
cada sábado” do que “parar de esperar até que eu lhe diga que é hora
de limpar a casa”. E mais fácil “iniciar sexo comigo ocasionalmente”
do que “parar de ser tão passivo no sexo”. Em cada caso, o ouvinte es­
cutará um pedido de ação positivo em vez de uma combinação de crí­
ticas e um pedido para parar alguma ação.
Embora esta advertência sobre formular os pedidos de uma ma­
neira positiva seja pertinente, às vezes isto pode por tudo a perder.
Lúcio se queixa de que Cátia é "negativa demais”, e ele se sentiria me­
lhor se ela não fosse tão crítica com ele. Ela poderia mudar mais facil­
mente fazendo algo ativo para ele, como elogiá-lo, do que se privar de
suas críticas. Mas ainda isso não satisfaria Lúcio. Sim, ele sempre po­
deria receber mais elogios, mas ela já é generosa nisto. O que o inco­
moda é a crítica, e ainda o incomodaria, mesmo que ela desse uma
dose mais forte de valorização. Então mesmo que seja mais fácil para
Cátia aumentar um comportamento do que reduzi-lo, a mudança que
Lúcio realmente quer dela é menos crítica.
No entanto, na maioria das vezes as mudanças que queremos de
nossos parceiros são ações específicas e positivas por parte deles. Em
nossa frustração com eles, podemos nos concentrar no que eles não
deveriam fazer. Mas o que realmente queremos é que eles façam algu­
mas ações concretas. Por exemplo, Cátia pode censurar Lúcio por ser
Diferenças Reeonciliáveis 295

preguiçoso e pressioná-lo a parar de “de se paparicar”. Porém, o que


ela pode realmente querer é que ele faça coisas específicas, como le­
vantar-se com as crianças em um fim de semana e dar a ela uma chan­
ce de dormir mais até tarde. Provavelmente ele fará o que ela deseja se
ela fizer o pedido direto ao invés de pedir que ele não faça as ações
que ela não quer.

Mudando como você é comigo versus


mudando como você é cm outros contextos

Há dois tipos de mudanças que podemos buscar em nossos


parceiros: uma mudança na maneira como eles nos tratam ou se co­
municam conosco e uma mudança em como eles são em outros
contextos. Um exemplo do primeiro é o pedido de Cátia de que Lú­
cio “preste mais atenção em mim”, enquanto um exemplo do segun­
do é seu pedido de que ele “seja mais ambicioso no trabalho”. Cer­
tamente, alguns pedidos de mudança, como “ser mais aberto e co­
municativo”, podem abranger como nossos parceiros são conosco e
em outros contextos. No entanto, esta distinção é importante por
pelo menos duas razões. Primeiro, temos mais legitimidade quando
solicitamos mudanças na maneira como nossos parceiros nos tratam.
Quando nossas inquietações são dirigidas a como nossos parceiros
falam conosco ou brincam conosco ou trabalham conosco, é clara­
mente “da nossa conta”. Cátia certamente tem o direito de discutir,
por exemplo, se Lúcio é atencioso com ela ou não. No entanto, se
quisermos que os nossos parceiros se comportem de forma diferente
no trabalho ou com os seus amigos ou com a sua família, eles po­
dem argumentar que estas áreas “não são da nossa conta”. Embora
tenhamos controle compartilhado com nossos parceiros sobre o que
acontece quando estamos juntos, eles têm o controle principal sobre
o que fazem com suas vidas para além de nós. Se Cátia quer que Lú­
cio seja mais ambicioso no trabalho, ele pode insistir que é o traba­
lho dele e não o dela.
296 Os dilemas da mudança estabelecida

Não somente temos mais legitimidade, mas também temos


mais poder para criar mudanças em nossos parceiros quando estas di­
zem respeito ao seu comportamento em relação a nós. Podemos ob­
servar suas ações e influenciá-las diretamente pelo que dizemos e faze­
mos. Cátia normalmente pode dizer, por exemplo, quando Lúcio está
prestando atenção nela ou não, e então comentar algo sobre isso. No
entanto, quando solicitamos mudanças na maneira como nossos par­
ceiros lidam noutros contextos, isto não nos diz respeito. Nós não po­
demos observar seu comportamento ou influenciá-lo diretamente.
Cátia não pode, por exemplo, observar diretamente o quanto Lúcio é
ambicioso no trabalho; nem pode intervir diretamente para encorajá-
lo a ser mais ambicioso. Devido a esta importante distinção, deveria­
mos tentar separar os nossos pedidos de mudança, aqueles que têm a
ver com o comportamento dos nossos parceiros em relação a nós, da­
queles que têm a ver com o comportamento dos nossos parceiros em
relação aos outros. Se quisermos que nossos parceiros sejam mais
abertos e comunicativos em geral, poderiamos separar nosso pedido
de ser mais abertos e comunicativos conosco do nosso pedido de que
eles sejam mais abertos e comunicativos em geral. E primeiramente
poderiamos lidar com o pedido de que eles sejam abertos e comunica­
tivos conosco. É mais fácil promover a mudança na forma como os
nossos parceiros lidam conosco do que na forma como lidam com o
mundo à parte de nós.

Mudança apoiada por circunstâncias versus


mudança por meio de pura força de vontade

Uma das formas mais fáceis de promover a mudança é mudar as


circunstâncias de maneiras que possam facilitá-la. Por exemplo, Cátia
sente que ela nunca pode dar um tempo com as crianças quando está
em casa com elas. Mesmo que Lúcio “oficialmente” esteja responsávex
por elas nas manhãs de sábado, elas continuam a solicitar pela mãe
com seus problemas ao invés de recorrer a ele. Na verdade, sabendo
Diferenças Reconciliáveis 297

que ela está sempre íá como seu “apoio”, Lúcio tende a afrouxar sua
supervisão. Assim, Cátia tem dificuldade de ficar “livre”, mesmo
quando Lúcio está supostamente “de plantão”. A solução mais rápida
e fácil para este problema é alterar as circunstâncias. Se ele sair com as
crianças, então ela ficará verdadeiramente livre em casa; da mesma
forma, se ela sair de casa, então ela também ficará verdadeiramente li­
vre. Em cada um desses casos, as crianças devem trazer seus problemas
e procurar a atenção de Lúcio, e ele deve supervisioná-las. As circuns­
tâncias não permitem outra opção.
Da mesma forma, um marido que quer que sua esposa se junte
a ele em uma atividade que ela realmente não gosta, pode ser mais
bem sucedido se organizar circunstâncias sociais que apoiariam a ati­
vidade. Um passeio de bicicleta, por exemplo, pode ser mais atraente
para sua esposa não esportiva se incluísse a melhor amiga dela ou che­
gasse a um destino que ela gostaria de visitar.
Estudos de casais têm demonstrado consistentemente que as es­
posas fazem mais trabalho doméstico e assistência aos filhos do que
maridos, mesmo quando ambos trabalham em tempo integral fora de
casa. Mas quando o casal trabalha em turnos diferentes, e os maridos
estão em casa com seus filhos enquanto suas esposas estão no traba­
lho, eles cuidam das crianças e fazem as tarefas domésticas muito mais
do que de outra forma. As circunstâncias encorajam - de fato, literal­
mente forçam - as mudanças que as esposas podem ter desejado
quando elas trabalhavam nos mesmos turnos que seus maridos.
-------------------------------
Dica 2: Para promover mudanças em seu parceiro, faça solicitações espe­
cíficas em vez de gerais. Certifique-se de que seu pedido é que ele ou ela
tome determinadas ações positivas, em vez de parar certas ações negati­
vas. Concentre-se principalmente, se não exclusivamente, em mudanças em
como seu parceiro age com você, em vez de como age em outros contextos
(trabalho, família e amigos) quando você não está presente. Quando pos­
sível, tente organizar as circunstâncias que auxiliam a mudança que você
está solicitando.
\_______________________________________________________________ /
298 Os dilemas da mudança estabelecida

QUANDO A MUDANÇA É DIFÍCIL

A maioria de nós acha que fazer mudanças deliberadas é difícil


mesmo quando nós mesmos queremos essa mudança. No início de
cada ano, milhões de americanos tomam a decisão de perder peso e
fazer mais exercício. Alguns desses milhóes realmente se inscrevem em
programas de ajuda para atingir esses objetivos. No entanto, é muito
mais comum que em alguns dias, semanas ou meses depois, que este
desejo desapareça e velhos hábitos retornam com força total. Comidas
deliciosas e sofás macios são alternativas mais atraentes e convidativas
do que fazer dieta e atividade física, por isso é fácil entender a razão
pela qual, frequentemente, falhamos em fazer as mudanças de peso e
exercício que desejamos. Com os relacionamentos, temos que lidar
não só com alternativas atraentes para a mudança, mas também com
desejos conflitantes sobre a mesma. Com frequência são nossos par­
ceiros, e não nós mesmos, que investem na nossa mudança. Além dis­
so, há outras complexidades sobre a natureza da mudança interpessoal
que complicam nossos esforços.

"Quero que você mude a VOCÊ"

Talvez a mais importante razão pela qual seja difícil mudar nas
relações interpessoais é que a mudança toca em incompatibilidades
entre os parceiros ou em sensibilidades emocionais em um ou am­
bos. Fazer uma mudança pode ameaçar uma característica funda­
mental do outro. Por exemplo, Lúcio deseja que Cátia leve a vida de
forma mais amena, que não se preocupe tanto com tantas coisas, e
apenas “nade a favor da correnteza”... O mantra dele para ela é “não
sofra com as coisas pequenas.” E embora às vezes Cátia concorde
que ela deva levar a vida com mais calma, ela tem dificuldade em fa­
zê-lo. Por natureza ela não é uma pessoa descontraída. E, por sua
vez, ela quer que Lúcio leve a vida mais a sério e seja mais ambicio­
so. Na verdade, eles são fundamentalmente diferentes em sua abor­
Diferenças Reconciliáveis 299

dagem com a vida, e seus pedidos de mudança em cada um se con­


frontam com essas diferenças básicas.
Sensibilidades emocionais também podem se atravessar no ca­
minho da mudança. Lúcio quer passar mais tempo com Cátia. Ele
gosta de ficar perto dela, mesmo quando ela está trabalhando num
projeto em casa. Mas o senso de liberdade e independência de Cátia
fica cerceado quando ele está ao seu redor o tempo todo. Ele não con­
segue entender a razão dela não querer ficar mais tempo com ele e se
magoa com o que ele percebe como um desinteresse. Ela não pode
entender a razão pela qual ele invade seu espaço tanto e, muitas vezes,
se sente desconfortável, até irritada, com a presença de Lúcio pairan­
do ao seu redor.
Solicitar que o outro mude, com frequência, centra-se em in­
compatibilidades e vulnerabilidades. Estas são as áreas que criam dor
para cada indivíduo, por isso é em relação a elas que os parceiros,
muitas vezes, fazem seus pedidos de mudança. Se um parceiro se sente
vulnerável com questões de aprovação, ele pode solicitar que o outro
seja mais validante e menos crítico, enquanto que o outro pode res­
ponder com pedidos para que seu parceiro seja “menos sensível” ou
mais “casca grossa”. Estas não serão mudanças fáceis de fazer.

"Quero que você queira"


Como nosso foco está nas muitas mudanças que buscamos em
nossos parceiros, tais como querer que eles façam mais do trabalho
doméstico ou que levem as crianças para a aula de futebol, há pouca
preocupação em como eles se sentem quando fazem o que queremos.
Claro, preferimos que eles se sintam felizes com o que estão fazendo.
E isso criaria um problema se eles se sentissem ressentidos. Mas a nos­
sa preocupação é com o seu comportamento, não com o seu estado
emocional. Nossa mensagem é: Apenas faça!
Há outras vezes em que as mudanças que buscamos em nossos
parceiros se mostram mais complexas. Queremos mudança de com­
300 Os dilemas da mudança estabelecida

portamento, mas também queremos mudança de atitude. Estamos


preocupados não apenas com o que eles fazem, mas também com seus
motivos para fazê-lo e seu estado emocional enquanto estão fazendo.
Lúcio pode querer que Cátia demonstre com mais palavras seu afeto e
apreciação por ele. Ele gostaria que ela o elogiasse em mais oportuni­
dades e que expressasse seu amor com mais frequência e mais ardor.
Certamente, Cátia tem a capacidade de demonstrar mais afeto. Mas
se ela se forçar a agir assim, isto não seria bom nem para ela nem para
Lúcio. Ele poderia acusá-la de “apenas estar cumprindo uma tarefa”.
Mesmo que Lúcio goste de receber mais afeto de forma verbal, ele
também quer a motivação e a atitude que geralmente acompanham
um gesto de afeto. Ele quer que ela queira fazê-lo.
Cátia gostaria que Lúcio ganhasse mais dinheiro em seu traba­
lho. Mas, além desta mudança concreta, ela gostaria que ele fosse
mais ambicioso em geral. Ela quer que ele seja mais focado em ser
bem sucedido. Embora ele possa ter mais ambição e escutar os so­
nhos dela para um futuro financeiro melhor, o que ela realmente
quer é que ele compartilhe da paixão dela por um futuro promissor.
Ela quer que ele vá em frente, mas, mais do que isso, ela quer que
ele queira ir mais longe.
Pedidos de mudança como estes apresentam um difícil dilema
para os casais. Transformar um comportamento é bastante desafia­
dor em si mesmo. Quando pedimos a mudança, nossos parceiros
devem ouvir o nosso pedido, respeitá-lo, endossá-lo, lembrá-lo e
apoiá—lo. Se pedimos uma mudança de atitude, motivação ou emo­
ção, além de uma mudança de comportamento, nossos parceiros en­
frentam uma tarefa muito mais difícil. Não somente devem mudar
alguma coisa que está sob seu controle - seu comportamento — mas
devem mudar algo que não está diretamente sob seu controle: seus
desejos e emoções. Eles podem controlar o que fazem, mas não o
que eles querem fazer.
Diferenças Reeoneiliáveis 301

"Lide com seu estresse de maneira diferente"


Muitas vezes queremos que os nossos parceiros ajam de forma dife­
rente quando experimentam fortes emoções. Podemos querer que eles,
quando estão chateados, deixem de ter condutas ofensivas e que se envol­
vam em ações desejáveis. Lúcio quer que Cátia pare de ser tão crítica,
porque acredita que ela procura alguém para culpar cada vez que ela está
chateada. Cátia quer que Lúcio seja mais expressivo porque pensa que ele
se retira quando está chateado e revela pouco do que o está perturbando.
As dificuldades que temos em fazer mudanças deliberadas en­
quanto estamos emocionalmente confortáveis, são ampliadas quando
estamos emocionalmente agitados. Quando as emoções estão intensas,
repetimos padrões de comportamento desgastados e menos flexíveis.
Mesmo se pudermos ver alternativas aos nossos velhos padrões, podere­
mos ser incapazes de alterar nosso comportamento naquele momento.
Muitas vezes queremos que nossos parceiros façam mais do que mu­
dar a maneira como agem quando perturbados; às vezes nós realmente
queremos que eles não fiquem tão chateados. Nossa mensagem, despojada
de qualquer envolvimento eufemístico e autojustificante, é simplesmente
“Não seja tão dramático’'. Suas emoções chatearam a nossa, por isso insisti­
mos em que eles sufoquem as deles. Naturalmente, dizer a seu parceiro
que não vale a pena ficar chateado com o que está ocorrendo, só fará com
que ele se sinta invalidado e, então, chatear ainda mais seu parceiro.

"Não vou permitir as mudanças que preciso"


Não chame um homem de honesto só porque ele nun­
ca teve a chance de roubar.
Provérbio Yiddish

Ernani não confia em Jairo por boas razões. No início de seu re­
lacionamento, ele descobriu que Jairo ainda estava vendo seu antigo
namorado secretamente. Ele sabe que o estilo de Jairo com os homens
é ser paquerador e provocante, e também sabe que Jairo não declara
302 Os dilemas da mudança estabelecida

publicamente que está num relação estável. Ernani lida com esse pro­
blema mantendo um olho vigilante. De fato, ele está convencido de
que é a sua fiscalização que mantém Jairo fiel. Se ele ficasse menos
atento, Jairo poderia flertar com outros. Na verdade, a única maneira
que ele poderia ter certeza de que Jairo é confiável seria relaxar em sua
vigilância e ver que Jairo permanece fiel a ele. Mas Ernani tem medo,
com alguma justificativa, de se envolver em ações que poderiam levar
a uma relação de confiança.
Da mesma forma, Gisela se preocupa que Leandro não é cuida­
doso o suficiente com Dudu, o filho pequeno deles que é muito ativo e
afoito. Como Leandro não é tão ansioso ou tão vigilante quanto ela,
Gisela fica hesitante em entregar completamente as responsabilidades
parentais para ele. Mesmo quando Leandro supostamente está “respon­
sável” por Dudu, Gisela mantém uma orelha em pé e um olhar atento.
Ela passa por cima de Leandro quando ele está atendendo seu filho, e o
critica por sua falta de atenção. Exceto pelos ocasionais esforços irrita­
dos dele para mostrar à Gisela quem é o responsável naquele momento,
Leandro vai ficando, realmente, menos cuidadoso com Dudu porque
Gisela está sempre lá supervisionando. E, embora mesmo que ela preci­
se que o marido tome conta do filho às vezes, para que ela possa dar um
tempo nos cuidados de Dudu, ela teme dar a Leandro total responsabi­
lidade porque ela não quer arriscar um acidente. Gisela quer que Lean­
dro assuma o cuidado, mas não vai permitir isto. Mas Leandro também
não vai insistir em ser realmente responsável.

Dica 3: Mudar será difícil, se não impossível para o seu parceiro, se a mu­
dança que você pede é contrária a uma característica central de quem seu
parceiro é ou está relacionada a uma forte sensibilidade emocional dele ou
dela. Mudar também será extremamente difícil se não for apenas uma al­
teração de comportamento que você solicita, mas uma mudança de atitude
ou na reatividade emocional, ou se você minar essa mudança devido a suas
próprias ansiedades. Estar ciente destas dificuldades com a mudança pode
diminuir sua frustração com seu parceiro ou pode permitir uma conversa
mais sutil e construtiva sobre essas mudanças.
v______ _ ____________________________ ___________________________ >
Diferenças Reeoneiliáveis 303

PORQUE VOCÊ DEVERIA MUDAR

Quando a mudança que pedimos é difícil, nossos parceiros po­


dem questionar por que eles deveriam mudar, ou eles podem ignorar
ou resistir aos nossos pedidos. Mesmo que reconheçam a validade de
nossas solicitações, eles podem não prosseguir com a mudança. Em
resposta, podemos tentar justificar nossos pedidos provando as razões
pelas quais eles deveriam mudar. No entanto, alguns tipos de justifica­
tivas podem ser mais eficazes do que outras para produzir a mudança
que queremos.

"Os outros fazem..."

Uma maneira de justificar a necessidade de mudança é apontar


para os outros, tais como outros maridos ou outras esposas, que fazem
o que queremos que nossos parceiros façam: “Bernardo assume bas­
tante a responsabilidade com seus filhos”. “A maioria das outras mu­
lheres vai para esta festa”. Esta estratégia pode facilmente degenerar
em brigas sobre se, de fato, o outro parceiro em questão faz o que é
reivindicado. “Eu não acho que Bernardo faz tanto com seus filhos,
ele faz uma demonstração disso na presença dos outros, mas...” Ou
nossos parceiros podem fornecer exemplos contrários: “Mas olhe para
Júnior e Nilo, eles estão tão ocupados com o trabalho que mal sabem
quem são seus filhos”. Ou outras características do cônjuge em com­
paração podem ser questionadas. “Então você realmente gostaria de
estar casada com um nerd como o Bernardo?” O que começou como
um esforço para justificar um pedido de mudança pode se tornar uma
discussão improdutiva sobre amigos e conhecidos.
Os psicólogos sociais escrevem sobre dois tipos de comparações:
comparações sociais ascendentes, em que nos comparamos com pes­
soas que são melhores do que nós por algum critério, e comparações
sociais descendentes, em que nos comparamos com pessoas que são
piores do que nós por alguns critério. Com a maioria das característi­
304 Os dilemas da mudança estabelecida

cas, é possível fazer comparações sociais ascendentes ou descendentes.


Então, se você tentar justificar a sua exigência de que seu parceiro faça
mais, dizendo “Você não faz tanto quanto Júlio”, ele pode facilmente
contrapor com “Mas eu faço mais que Hilton”. E ambos os tipos de
comparações são complicados pelo fato de que raramente sabemos
exatamente o quanto Júlio ou Hilton realmente fazem. Novamente, a
tentativa de justificar o pedido original é fútil e pode terminar em
uma nova briga.

"Eu faço isto por você"

Podemos dar um fundamento mais convincente para a mudan­


ça por meio de apelos de justiça e igualdade. “Eu faço isto por você,
então por que você não pode fazer isto por mim?” Ou “ Eu não lhe
trato desta maneira, porque você deveria me tratar assim?”
Durante os dias difíceis da Convenção Constitucional nos Esta­
dos Unidos, Benjamin Franklin serviu como um excelente moderador
usando seu humor e sabedoria para ajudar a resolver os conflitos. Em
um determinado ponto durante a briga entre representantes de esta­
dos maiores e estados menores, ele contou uma história de como um
galo estava tentando negociar as regras do galinheiro com um cavalo.
O galo propôs o que lhe parecia um plano razoável: se o cavalo não
pisasse nas suas patas, então ele não pisaria nas patas do cavalo! O ca­
valo não viu a sabedoria da proposta do galo, pois não faria diferença
para o cavalo o quanto o galo pisasse nas suas patas.
Da mesma forma, propostas de mudança baseadas na justiça e
na igualdade não consideram o fato de que os parceiros são diferentes
e que o mesmo ato envolve diferentes níveis de “energia psíquica” ou
“sofrimento psíquico” quando é feito por duas pessoas distintas. E
fundamentalmente uma tarefa mais difícil para Cátia expressar seu
amor por Lúcio do que Lúcio expressar seu amor por Cátia. Da mes­
ma maneira, é muito mais fácil para Cátia se levantar cedo numa ma­
nhã de sábado e realizar as tarefas domésticas do que é para Lúcio.
Diferenças Reconciliáveis 305

Quando não aceitamos a verdade de que o mesmo ato é dife­


rente quando feito por pessoas diferentes, podemos criar um novo
conflito em cima do original.

"Olha tudo o que eu fiz por você!"

Podemos também justificar os nossos pedidos, apontando que


tentamos fazer nossos parceiros felizes, mudando de uma maneira
que eles pareciam querer; agora é nossa vez de obter as mudanças
que queremos. Nessa justificativa para a mudança, há uma suposi­
ção implícita de desigualdade e dívida. Demos mais do que eles, en­
tão nos devem algo.
Embora possamos acreditar ardentemente, esta suposição é,
muitas vezes, falsa. Psicólogos descobriram um “viés egocêntrico”
quando duas pessoas em um relacionamento são convidadas a estimar
sua própria contribuição para alguma atividade conjunta como, por
exemplo, o cuidado com os filhos: suas porcentagens individuais, rela­
tadas somam mais de 100% porque os dois se dão mais crédito relati­
vo do que o outro dá. Um marido e uma esposa podem ambos con­
cordar que ela cuida mais dos filhos do que ele, mas ele estima que faz
40%, enquanto ela estima que faz 75%! Psicólogos teorizam que este
viés ocorre porque cada um de nós tem mais informações sobre nossas
próprias contribuições do que temos sobre as de nossos parceiros, por
isso damos mais peso para o quanto contribuímos.
Com ou sem o viés egocêntrico, haverá desigualdades reais em
seu relacionamento. Mas o fato de que a desigualdade exista não justi­
fica, necessariamente, que haja uma exigência de corrigi-la. Seu par­
ceiro pode legitimamente argumentar que ele ou ela não estava ciente
de qualquer acordo recíproco para a mudança. Se um marido propõe
que sua esposa participe mais de suas atividades sociais porque ele se
adaptou tanto aos seus desejos de viver perto dos pais dela, a esposa
pode replicar: “Eu não me lembrava de concordar com uma permuta
aqui! Você elaborou um piano sem obter o meu consentimento para
306 Os dilemas da mudança estabelecida

ele.” Assim, se há uma percepção distorcida da desigualdade em seu


relacionamento ou uma desigualdade real, é improvável que você in­
centivará uma mudança em seu parceiro tentando provar que você é
uma vítima da injustiça dele.

"Eu realmente preciso que você mude"

Em contraste com as outras justificativas que vimos até agora, a


mais simples e, de certa forma, mais convincente para a mudança é
baseada em nosso próprio desejo: “Eu quero que você mude” ou “E
importante para mim que você mude.” Há pouco espaço para discus­
são com essa abordagem honesta porque sabemos o que queremos e o
que é importante para nós. Tal mensagem não garante a mudança,
mas esclarece a razão para ela: a mudança me agradaria.
No entanto, alguns de nós não se sentem autorizados a requisi­
tar a mudança de nossos parceiros. “Só porque isso me agradaria” não
parece uma justificativa suficiente. Assim, podemos dar mais peso aos
nossos pedidos fortalecendo um “eu quero” em um “eu preciso”. Pre­
cisar soa mais urgente do que querer. Satisfazer as necessidades garan­
te a sobrevivência, enquanto que a satisfazer desejos só garante prazer
ou contentamento. Portanto, se formulamos nossos pedidos como ne­
cessidades, comunicamos que, de alguma forma, nossa sobrevivência
depende da mudança de nossos parceiros.
Podemos também reforçar nosso pedido de mudança com um
apelo ao amor de nossos parceiros por nós. “Se você realmente me
amasse, você faria as mudanças que eu precisava.” “Se você realmente
se importasse, você faria isso.” Mas esta tática pode ser facilmente um
tiro pela culatra. Nossos parceiros podem responder: “Se você real­
mente me amasse, você me aceitaria como eu sou”. Ou eles poderiam.
por sua vez, apelar para o nosso amor para pressionar para as mudan­
ças que eles desejam.
Quaisquer que sejam os métodos que usamos para justificar as
mudanças que solicitamos - apelos ao amor, à justiça, à igualdade -
Diferenças Reeonciliáveis 307

essas justificativas, frequentemente, levam a uma briga sobre mu­


dança. Nossos parceiros percebem nossos esforços como pressão
para que mudem, e paradoxalmente, quanto maior a pressão que
eles sentem para mudar, mais eles podem resistir à mudança. Pode­
mos exigir deles: Você deve mudar. Eu não posso sobreviver sem a
mudança. Você me deve uma mudança, e se você me amasse, você
mudaria. Em resposta, eles podem se defender, contra-atacar com as
suas próprias demandas ou, em última instância, recusar-se a discu­
tir mais sobre nossos pedidos.

Dica 4: As solicitações de mudança que vêm com argumentos de que os


outros as fazem, de que eu fiz por você, de que você me deve, paradoxal­
mente, é mais provável que levem a uma discussão do que à mudança dese­
jada. Há mais chances de que pedidos simples para uma mudança específi­
ca, livres de justificativas e argumentos, sejam respondidos de forma
positiva. Muito provavelmente o seu parceiro quer agradá-lo; simplesmente
solicitando o que lhe agradaria é a melhor maneira de pedir a mudança.
\______________________ /

RECAPITULANDO
A mudança é uma força inexorável. Inevitavelmente, nós mudamos, nossos parcei­
ros mudam e nossos relacionamentos mudam. Mas estas não necessariamente se
movem na direção que desejamos. 0 que queremos é uma transformação delibera­
da em áreas específicas de nossas inquietações. Às vezes queremos grandes mudan­
ças imediatamente e confrontamos nossos parceiros para obter o que queremos.
Em raras ocasiões, uma mudança drástica e positiva é possível a partir de um con­
fronto, um ultimato, mas apenas quando você pede algo específico. Por exemplo,
tomar uma decisão dentro de um período de tempo determinado, quando esta po­
derá trazer mudanças positivas futuras e quando você pode fazer o pedido sem
criar tanta resistência em seu parceiro. Raramente nossas solicitações são nestas
condições. Além disso, o que muitas vezes queremos não é uma única decisão ou
uma única ação, mas mudanças corriqueiras e cotidianas no que o nosso parceiro
faz ou diz para nós.
Às vezes a mudança diária é fácil. Pedimos aos nossos parceiros ações específicas em
nosso relacionamento, ao invés de lhes pedir para mudar alguma coisa geral ou para
não fazer alguma coisa, e os eventos conspiram para apoiar essas ações. No entanto,
308 Os dilemas da mudança estabelecida

na maioria das vezes, as alterações solicitadas não são fáceis de serem feitas por eles.
Nossos pedidos atingem o núcleo de incompatibilidades ou vulnerabilidades que nos
dividem. As mudanças nestas áreas são sempre complicadas. Além disso, podemos so­
licitar mudanças não apenas no comportamento dos nossos parceiros, mas também
no seu estado emocional. Podemos querer que eles sintam mais paixão por nós ou
que eles não se irritem quando ficam chateados. Embora eles tenham controle sobre
seu comportamento, eles têm pouco controle direto sobre como eles se sentem. Por­
tanto, o cumprimento de nossos pedidos é difícil.
Se nossos parceiros não fizerem as mudanças diárias que buscamos, podemos tentar
justificar a eles essas mudanças. Podemos apontar como os outros cônjuges são, po­
demos apelar para a igualdade ou para o amor, ou podemos nos gabar de toda nossa
mudança a favor do outro para justificar os nossos pedidos e inspirar conformidade.
Esses esforços muitas vezes são contraproducentes. Em vez de provar a necessidade
de que eles mudem, nossos esforços só geram mais briga pela mudança. Nós os pres­
sionamos e eles resistem a mudar.

0 capítulo ofereceu quatro dicas para fazer mudança:

1. Use ultimatos somente nas raras circunstâncias quando há uma violação de rela­
cionamento importante, uma decisão importante ou um grande problema pessoal.
Então, use-os apenas quando você está falando sério sobre cumprir sua intenção,
quando você está pedindo uma mudança específica dentro de um período de
tempo preciso, quando a mudança é susceptível de trazer algo positivo no futuro
e quando você pode fazê-lo sem criar tal resistência em seu parceiro que ele ou
ela vai se recusar simplesmente para salvar a própria pele.
2. Para provocar mudanças em seu parceiro solicite algo específico. Certifique-se de
que seu pedido seja para tomar ações positivas ao invés de parar certas ações ne­
gativas. Concentre-se principalmente, se não exclusivamente, em mudanças em
como seu parceiro age com você, em vez de como ele ou ela atua em outros con­
textos (trabalho, família e amigos) quando você não está presente. Quando possí­
vel, tente criar circunstâncias que favoreçam o que você está solicitando.
3. Esteja alerta para áreas difíceis de mudança, tais como solicitações de alterar uma
característica central de quem seu parceiro é, solicitações que estejam ligadas a
fortes sensibilidades emocionais dele, pedidos de mudança de atitude ou uma mu­
dança na reatividade emocional, demandas que possam prejudicar seu desejo de­
vido a suas próprias inquietações.
4. Faça pedidos simples para uma mudança específica, isenta de justificativa e argu­
mentação sobre o que seu parceiro deveria mudar.
Diferenças Reeoneiliáveis 309

Exercício: Facilitando a mudança


tanto em você como em seu parceiro

Este exercício está elaborado para prepará-lo para fazer mu­


danças em seu relacionamento, Como sempre, comece por conside­
rar seu conflito central e sua análise DEEP (profunda) dele.
Existe algo que você gostaria de seu parceiro ou que seu par­
ceiro gostaria de você que não envolve incompatibilidades compli­
cadas ou vulnerabilidades?

1. Mudanças que eu gostaria de meu parceiro que me parecem cla­


ras e simples:

Há alguma coisa sobre a forma como você poderia reformular seus


pedidos de mudança para torná-los mais bem sucedidos? Por exem­
plo, você pode torná-los mais específicos, torná-los coisas para fa­
zer (não coisas para NÃO fazer), ou mudar as circunstâncias da mu­
dança para que seja mais fácil ou menos aversivo?

Tente solicitar essas mudanças ao seu parceiro de forma direta


e específica e tente alterar as circunstâncias para favorecê-las. Não
tente justificar as mudanças enquadrando-as como uma necessida­
de urgente, usando comparações com outros, ou fazendo apelos à
igualdade ou ao amor. Basta indicar como essas mudanças torna­
riam sua vida mais fácil ou mais satisfatória.

2. Alterações que eu poderia fazer para o meu parceiro que o meu


parceiro quer e que são relativamente claras e simples:
310 Os dilemas da mudança estabelecida

Proponha uma tentativa de realizar essas mudanças para seu par­


ceiro.
Considere também as mudanças mais difíceis que você gostaria
que fossem implementadas. Algumas das alterações que você de­
seja de seu parceiro invocam incompatibilidades e vulnerabilida­
des? Você está buscando uma mudança nas emoções e atitudes
que seu parceiro experimenta, assim como uma mudança no seu
comportamento?

3. Algumas mudanças que eu gostaria de meu parceiro fizesse que


será muito difícil para ele ou ela:

Você está empenhado em fazer algum esforço para criar uma


mudança que fracasse, diminuindo as chances de que seu parceiro
fará o que você deseja (como justificar seu pedido, apontar que os
outros parceiros fazem, fazer apelos ao amor ou justiça)?

4. Minhas ações que atrapalham ao invés de facilitar essa mudança:


Diferenças Reconciliáveis 311

PRÓXIMOS PASSOS

Em nosso primeiro capítulo sobre mudança, consideramos dife­


rentes tipos de transformações e algumas dificuldades para promovê-
-las, mas focando em alterações simples que você pode conseguir sem
muitas complicações. No próximo capítulo vamos considerar fazer
mudanças que são mais complicadas, mas ainda é possível se você
abordá-las com sabedoria e com atenção plena {mindfulness).
12
Mudança estabelecida por meio
da atenção plena (mindfulness)
Mudança personalizada
para a sua relação

Às vezes, apenas reconhecer o que realmente está


acontecendo ao invés do que “deveria” estar aconte­
cendo é tudo o que é necessário para transformar
nossa experiência.
Mark Willians, John Teasdale, Zindel Segai and Jon Kbat Zinn,
The Mindful Way through Depression (2007)

A melhor saída é sempre através de.


Robert Frost, Servantto Servants (1914)

Em mindfulness a aceitação sempre vem primeiro, a


mudança vem depois.
Shamash Alidina, Mindfulness for Dummies (2010)

Sidney e Helena estavam aprisionados num padrão de distância


e crítica. Angustiada com o que sentia em relação à negligência dele
com qualquer responsabilidade na família - ele raramente ajudava
com cuidados infantis ou tarefas domésticas - Helena o criticava im­
placavelmente. Do ponto de vista de Sidney, nada que ele fizesse agra­
daria a Helena. Então, por que se preocupar em fazer qualquer coisa,
exceto ignorá-la?
Diferenças Reconciliáveis 313

No meu (Andrew Christensen) trabalho inicial com este casal,


estabeleci alguns objetivos positivos e razoáveis para a terapia, com os
quais ambos concordaram: Sidney se tornaria mais envolvido na famí­
lia e Helena proporcionaria mais reconhecimento e apreço pelos es­
forços dele. Na minha primeira intervenção com eles, pedi para Hele­
na anotar suas expressões diárias de reconhecimento ou apreço pelos
esforços de Sidney e pedi a ele para registrar seus esforços diários para
participar mais nos afazeres da casa.
No início da sessão seguinte pedi seus registros. Helena tinha o
seu pronto em cima de sua bolsa, produzido orgulhosamente. Ela ti­
nha feito cuidadosamente um calendário dos dias da semana e fiel­
mente registrado cada momento das ações de Sidney pela família e
sua correspondente comunicação de apreciação ou reconhecimento.
Sidney, como veio a aparecer na sessão, tinha se esquecido de fazer a
tarefa até o final da semana e o fez só quando Helena o lembrou. Ten­
tou registrar mentalmente o que tinha feito para, mais tarde, anotar.
Helena observou que ele não tinha escrito até o momento em que eles
estavam na sala de espera, antes da consulta.
Ao ler as notas mal rascunhadas e apressadas que Sidney tinha
feito, Helena olhou para mim com a confiança de um advogado
promotor que acaba de entregar ao júri a arma fumegante. Então ela
se lançou para seu marido: ele não podia sequer fazer terapia direito.
Seu comportamento aqui era um exemplo perfeito de seu compor­
tamento em casa: muito pouco, muito tarde. Sidney balançou a ca­
beça e a ignorou.
Meu esforço terapêutico para mudar o comportamento do casal
simplesmente lhes dava uma nova ocasião para exibir o mesmo com­
portamento antigo. Minha tarefa tinha dado a Sidney uma nova opor­
tunidade para falhar e à Helena uma nova oportunidade para criticá-
-lo. Eles estavam usando minha tarefa para se envolver exatamente no
mesmo padrão que minha tarefa tinha tentado terminar!
O tipo de experiência que eu tive com Helena e Sidney é ape­
nas uma maneira pela qual meus esforços terapêuticos, por vezes, são
314 Mudança estabelecida por meio da atenção plena (mindfulness}

um tiro que sai pela culatra. Às vezes os casais usam a ação positiva
que eu sugiro para justificar seu comportamento existente. Digamos
que, como um passo positivo para a resolução de conflitos entre um
marido crítico e uma esposa retraída, estimulo o casal a expressar seus
sentimentos um ao outro. Na semana seguinte, o marido dá sermão
na sua esposa por causa de algumas falhas dela. Na outra sessão, ele
justifica sua crítica a ela dizendo: “Eu estava apenas expressando meus
sentimentos, como você (terapeuta) disse.”
Às vezes eu ofereço aos parceiros uma muleta para ajudá-los a se
comunicar, e eles acabam batendo na cabeça um do outro com ela. O
marido crítico pode usar minha sugestão para expressar seus senti­
mentos como outra oportunidade de atacar sua esposa: “Você nunca
expressa seus sentimentos! Como você pode esperar que eu responda a
você quando você não faz nem mesmo uma coisa simples como essa,
que o médico aqui recomenda?
Eu aprendi que as tentativas de mudança, frequentemente, le­
vam a mais do mesmo. Como terapeuta, permiti que isso acontecesse
ao não prever a relação entre minha intervenção e os círculos viciosos
de interação na qual o casal está aprisionado. Você pode evitar a mes­
ma armadilha olhando verdadeiramente para os passos que está to­
mando para tentar obter mudanças e prever, com base em sua histó­
ria, como seu próprio parceiro provavelmente reagirá.

QUANDO VELHOS PADRÕES VÊM VESTIDOS


EM NOVA ROUPAGEM

Cláudio tem um impulso sexual mais forte do que Glória e pressio­


na por contato sexual mais frequente e diverso. Em resposta à resistência
dela, ele faz vagas ameaças sobre a viabilidade de seu casamento e faz alu­
são a “procurar em outro lugar”. Embora perturbada por essas ameaças.
Glória muitas vezes as desafia: “Se você acha que as ameaças vão me exci­
tar sexualmente, você tem muito a aprender sobre as mulheres”.
Diferenças Reeoneiliáveis 315

Cláudio não quer realmente deixar Glória ou ameaçar sua rela­


ção mais ainda ao ter um caso, então ele decide tentar fazer algumas
mudanças positivas por conta própria. Sabendo como Glória se sente
pressionada por ele, ele decide recuar, para lhe dar “mais espaço se­
xualmente”, como ela muitas vezes solicitou. Isso certamente seria
uma mudança, e difícil para ele fazer. Talvez ajudasse.
Cláudio diz a Glória: “Olha, eu não vou mais te pressionar se­
xualmente, se tiver que acontecer qualquer tipo de relação, você terá
que iniciá-la. Vou esperar e ver como isso funciona.”
Embora sua atitude pudesse ter parecido uma grande mudança
para Cláudio, seu impacto sobre Glória foi o mesmo que o de seu an­
tigo comportamento. “Eu só vou esperar e ver como isso funciona”
parecia outra forma de pressão para ela, e o comentário veio com uma
ameaça velada, mas vaga, de que ele poderia tomar medidas mais drás­
ticas se Glória não tomasse a iniciativa imediatamente. Seu comentá­
rio “ se tiver que acontecer qualquer tipo de relação, você terá que ini­
ciá-la” foi feito com ressentimento e raiva. Apesar dos esforços genuí­
nos de Cláudio para fazer algo construtivo, sua atitude foi apenas uma
variação sobre o mesmo tema de pressionar e ameaçar.
Para um observador, os esforços de um casal para mudar podem
ser divertidos porque são tão claramente “mais do mesmo”. Um mari­
do que quer mais poder de decisão em seu casamento pede para sua
esposa para deixá-lo tomar mais decisões. Uma esposa que percebe a
verdade nas queixas de seu marido de que ele assume a maior parte da
responsabilidade pelo trabalho doméstico, pede-lhe para lembrá-la
quando as coisas precisam ser feitas. Eles, no entanto, estão tão mer­
gulhados em seus círculos viciosos de interação que não veem qual­
quer ironia em seus esforços.
De forma realista, é claro, o marido que quer mais poder pode
precisar da ajuda de sua esposa para se tornar mais assertivo e a esposa
não doméstica pode precisar de um leve lembrete para que ela assuma
mais responsabilidades na casa. Se eles puderem reconhecer a ironia
em seus pedidos, transmitir essa ironia para os seus parceiros, e estes
316 Mudança estabelecida por meio da atenção plena [mindfulness)

puderem escutar esses pedidos com a aceitação da compaixão, as mu­


danças que desejam provavelmente ocorrerão.

QUANDO "MAIS DO MESMO" SE


TORNA O "PIOR DO MESMO"

Quando uma compreensão tolerante de cada um está faltando,


os esforços para mudar podem exacerbar um conflito existente esca­
lando um padrão negativo de comunicação. O casal fica melhor e me­
lhor em ser pior e pior.
Quando Alice sente que Júlia se coloca como superior e avalia
seu desempenho como esposa e mãe, ela se afasta de Júlia verbal e
emocionalmente, e isto perturba Júlia. Depois de um incidente parti­
cularmente doloroso, quando Júlia criticou seu comportamento em
relação à sua filha, Alice afastou-se com mágoa e raiva e começou a re-
moer sobre o quão injusto era que Júlia a criticava mas nunca aponta­
va seu dedo para si mesma. Alice decidiu ensinar uma lição a Júlia e se
recusou a falar com ela de forma alguma. Alice nunca antes tinha se
recusado a falar com Júlia, esta maneira de agir era nova e diferente,
mas isto era dificilmente uma mudança no padrão. Em vez disso, foi
uma intensificação da velha forma de se relacionar.
Existe uma mítica aldeia dinamarquesa cujas pessoas são conhe­
cidas por sua bondade e tenacidade, por um lado, e sua ignorância e
burrice, por outro. Muitas histórias maravilhosas são contadas sobre
este grupo. Em uma história particularmente relevante, alguns mem­
bros do grupo cavam um poço para que eles possam ter acesso fácil à
água fresca. Embora o poço seja bem efetivo, o projeto de escavação
deixou para trás um monte de barro bem feio. Querendo que seu pro­
jeto fosse esteticamente agradável, bem como funcionalmente bem-
sucedido, os aldeões decidem se livrar do monte de barro. Eles cavam
um buraco de um tamanho adequado para colocar o barro do novo
poço neste buraco. Naturalmente, o que permanece é mais barro que
Diferenças Reeoneiliáveis 317

foi deixado por escavar o buraco novo. Eles cavam outro buraco
para aquele monte de barro, mas são confrontados com o mesmo
problema. Mais uma vez repetem seus esforços, sem sucesso. Como
eles podem se livrar do monte de barro feio restante? Eles consultam
seu sábio líder, que escuta a história cuidadosamente. Ele vai para o
local onde está o monte de barro e estuda a situação. Então ele passa
um tempo valioso, sozinho, pensando sobre o problema. Finalmen­
te, ele anuncia a solução, com a qual toda a aldeia concorda que é
brilhante. A aldeia vai cavar um buraco enorme, grande o suficiente
para acomodar todo o barro!

MUDANÇA DELIBERADA INICIA COM


ATENÇÃO PLENA (MINDFULNESS)

Então, como você pode criar a mudança deliberada em seu rela­


cionamento sem que ela fracasse ou mesmo tornando as coisas piores?
Para fazer uma mudança genuína em seu relacionamento, você deve
estar ciente do que está acontecendo com ele. Se você não conhece
sua própria história — as vulnerabilidades e incompatibilidades que
contribuíram para seus conflitos e como os dois desenvolveram certos
padrões de interação, até mesmo círculos viciosos, em um esforço em
vão para resolver seu problema — você pode simplesmente tornas as
coisas piores. Você pode enganar a si mesmo em pensar que você está
fazendo algo positivo quando você não está. Mas o conhecimento de
sua história, sendo um ótimo ponto de partida, é apenas o começo.
Você precisa seguir isto com maior atenção plena (mindfulness), que é
a atenção no momento presente, para o que está acontecendo em seu
relacionamento e uma postura de não julgar os acontecimentos.
Quando você não está empenhado em uma avaliação de sua experiên­
cia, você fica mais aberto a essa experiência e mais capaz de ser guiado
por ela, como vamos ilustrar abaixo.
318 Mudança estabelecida por meio da atenção plena (mindfulness)

Consciência do momento presente

Na Parte II deste livro você desenvolveu um entendimento


DEEP (profundo) de um problema de relacionamento importante.
No Capítulo 8, você transformou essa análise em uma história ver­
dadeira e viável sobre seu problema. A construção dessa história
deve ter ajudado a desenvolver uma consciência geral do seu proble­
ma, o que poderia clarear seus esforços para resolvê-lo. No entanto,
uma ampla consciência de sua história pode não ser suficiente para
ajudá-lo a fazer a mudança. A menos que você entenda como sua
história geral se desenrola em incidentes particulares, você não verá
como seus esforços de mudança, provavelmente, serão e produzirão
mais do mesmo. No Capítulo 8 você também aplicou seu conheci­
mento de sua história geral a uma análise de um incidente específico
recente. Agora vamos mostrar como a conscientização do aqui-e-
-agora, uma percepção do que está acontecendo emocionalmente
neste exato momento, nesta discussão em particular com o seu par­
ceiro, uma maior consciência plena (mindfulness) do relacionamen­
to pode promover mudanças genuínas.
Um sábado de manhã, enquanto Norton está guardando os pra­
tos do café da manhã, Ceres pergunta com uma voz amável: “Você
sabe quando terminará de arrumar a garagem?” Norton responde com
irritação, “Vai ficar pronta quando eu terminar.” Ceres sai sem dizer
uma palavra. Cerca de 15 minutos depois, ela se aproxima dele nova­
mente e pergunta educadamente, “Quem sabe a gente faz a nossa cor­
rida agora?” Norton olha para ela, incrédulo, e responde: “Na real,
não.” Ceres diz sarcasticamente: “Você certamente está de bom hu­
mor hoje”, e sai porta afora. Norton a segue e tenta se desculpar:
“Não fique tão chateada. Eu só não estava a fim de correr. Talvez mais
tarde.” Ceres chaveia a porta do quarto. Norman grita com ela, “Dro­
ga, eu odeio quando você faz isso.”
Para tornar mais claro o que aconteceu emocionalmente neste
breve encontro, vamos primeiro considerar a “história geral” deste
problema para Ceres e Norton. Ela é muito mais dedicada na organi­
Diferenças Reeoneiliáveis 319

zação das coisas do que ele, e se sente mais confortável quando tudo
está no seu devido lugar. Embora ele não tenha nenhuma objeção a
isto, e até mesmo ache útil, a desordem não o incomoda, desde que
ele possa “relaxar” em sua poltrona e ler. Para ele, raramente um ar­
mário, ou prateleiras ou gavetas organizadas é sua meta - ou até
mesmo uma bancada na garagem vale a pena o esforço necessário
para realizá-lo. Assim, a motivação de Norton para a ordem rara­
mente é suficiente para estimulá-lo a agir. Em contraste, Ceres, mui­
tas vezes, vai colocar muita energia para manter tudo arrumado,
para ter a roupa em seu devido lugar, e assim por diante. No entan­
to, ela não acha que deveria ter que fazer todo o trabalho enquanto
Norton fica sentado lendo. O que particularmente a irrita é usar seu
próprio tempo organizando todas as coisas dele. Assim, Ceres recor­
re ao encorajamento, lembretes e alertas como uma maneira de dei­
xá-lo mais envolvido na manutenção da ordem em casa. Norton se
tornou sensível a essas sugestões gentis. Ele não quer ser “adminis­
trado”; nem Ceres quer ser um incômodo. Mas ainda, sem alguma
intervenção por parte dela, Norton não vai agir. Como com a gara­
gem, que ele prometeu que iria limpar.
Para ver como esta história geral se desenrola neste incidente
particular da garagem, devemos dar uma olhada não só nas palavras e
ações de Ceres e Norton, mas também na comunicação emocional
que fazia parte dessas palavras e ações.

Palavras Faladas ou Ações Tomadas Mensagem Emocional

CERES: (amavelmente} Você sabe Quero lembrá-lo para terminar de


quando terminará de arrumar a arrumar a garagem, mas eu não
garagem? quero causar uma discussão, então
estou pedindo amavelmente.
NORTON: Vai ficar pronta quando eu Eu não gosto de ser incomodado,
terminar. mesmo quando você tenta camuflar
com um jeito delicado.
320 Mudança estabelecida por meio da atenção plena [mindfulness)

(Ceres se afasta.) Deus, eu tento ser gentil com você e


você fica irritado.

CERES: (educadamente) Quem sabe a Eu não quero que briguemos hoje.


gente faz a nossa corrida agora? Estou tentando ser conciliadora,
sugerindo que façamos algo que
ambos gostamos. Mas minha
paciência tem limites.

NORTON: (incrédulo) Na real, não Você me enche o saco e isto eu


odeio, e então entra e age como se
nada tivesse acontecido e convida
para uma corrida juntos. Eu não
entendo.

CERES: (sarcasticamente) Você Eu tento ser gentil com você, e isso


certamente está de bom humor hoje. simplesmente não funciona. Estou
(Ela sai porta afora.) furiosa. Para mim chega!

NORTON: (segue-a) Não fique tão Ops! Agora ela está realmente
chateada. Eu só não estava a fim de chateada. Eu odeio isso. Vou retirar
correr. Talvez mais tarde. o que eu disse. Eu farei qualquer
coisa para apaziguá-la, pra ela não
explodir num ataque de raiva.

(Ceres chaveia a porta do quarto.) Estou realmente com muita raiva.


Acabou para mim.

NORTON: (gritando para ela) Droga, eu 0 dia está arruinado. Não há


odeio quando você faz isso! nenhuma maneira que eu possa
consertar as coisas. Estou com raiva
e chateado.

Quando você está ciente das mensagens emocionais em uma


conversa, você tem a opção de expressar abertamente essas mensagens.
Por exemplo, Ceres poderia ter aberto a discussão dizendo: “Eu não
quero ser um incômodo ou criar uma cena desagradável entre nós.
mas estou ansiosa para ver a garagem limpa.” Ou Norton poderia ter
dito, não importa como Ceres iniciasse a discussão, “Eu fico incomo­
dado quando você me relembra de algo que eu já concordei em fazer.
Diferenças Reeoneiliáveis 321

Como esses comentários são mais diretos e abertos, eles têm uma
maior chance de sucesso.
A consciência das mensagens emocionais também permite que
cada um reconheça as reações do outro. Em vez de propor uma corrida,
Ceres poderia ter dito, “Aposto que você está irritado porque eu mencio­
nei a garagem.” Se ela tivesse proposto a corrida, como na fala original,
Norton poderia ter dito: “Eu sei que você ao sugerir uma corrida está ten­
tando ser agradável e suave para não criar qualquer tensão entre nós, mas
eu somente não estou a fim.” Esse reconhecimento do que o outro está
passando, com frequência, pode evitar a escalada emocional.
Em terceiro lugar, a conscientização permite a possibilidade de
ações positivas por qualquer das partes. Sabendo que Ceres estava preocu­
pada com a garagem, mas não querendo instigar uma discussão, Norton
poderia ter oferecido a ela um prazo para a conclusão da tarefa. Sabendo
que ele estava chateado com sua menção à garagem, ela poderia ter espe­
rado um pouco mais para fazer seu convite para uma corrida. Qualquer
uma dessas ações poderia ter evitado o desgaste emocional que se seguiu.
Vejamos outro exemplo dos benefícios da consciência do mo­
mento presente em uma conversa que aconteceu entre Cláudio e Gló­
ria um sábado à noite, quando eles não tinham nenhum plano.
Cláudio olha o guia de TV a cabo e sugere um filme para assis­
tir. Ele lê a breve descrição e observa: “Eu ouvi dizer que deve ser um
filme meio sexy.”
Há uma pausa longa de Glória. “Não parece ser tão interessante
para mim.”
Cláudio responde com um pouco de desapontamento em sua
voz: “Bem, não há mais nada para se ver.”
Glória diz: “Você pode assistir, eu tenho uma leitura que eu
gostaria de fazer.”
“Eu esperava que pudéssemos fazer algo juntos”, Cláudio responde.
“Nós dois estaremos juntos na sala da TV. Talvez eu veja se for
interessante.”
Cláudio diz “Otimo!” sarcasticamente e sai dali.
322 Mudança estabelecida por meio da atenção plena [mindfulness]

Glória o chama, “Então, se a gente não pode fazer exatamente


o que você quer, você não fica feliz?” Ele nem se dá ao trabalho em
responder.
Já conhecemos a história geral do problema de Cláudio e Glória
com sexo. Vamos ver como esta conversa enviou mensagens emocio­
nais, que ambos não conseguiram ouvir ou responder diretamente.

Palavras Faladas ou Ações Tomadas Mensagem Emocional

CLÁUDIO: (lendo a descrição do filme) Eu espero que este filme estimule


Eu ouvi dizer que deve ser um filme você e nós poderemos fazer amor.
meio sexy.
GLÓRIA: Não parece tão interessante Estou sentindo que ele está me
para mim. pressionando para fazer sexo. Eu
não quero que você fique com
muitas esperanças.
CLÁUDIO: (eom decepção) Bem, não há Estou desapontado. Eu não
mais nada para se ver. estava insistindo em sexo, apenas
esperando que isso pudesse
acontecer.
GLÓRIA: Você pode assistir. Eu tenho Eu não quero que você fique
uma leitura que eu gostaria de fazer desapontado, mas eu não quero me
sentir pressionada.
CLÁUDIO:Eu esperava que pudéssemos Eu não posso acreditar que você
fazer algo juntos. nem vai nos permitir a possibilidade
de ter uma intimidade sexual.
GLÓRIA: Nós dois estaremos juntos OK. Vou permitir essa possibilidade.
na sala da TV. Talvez eu veja se for Mas é apenas uma possibilidade.
interessante.
CLÁUDIO: (sarcasticamente) Ótimo. Estou ficando irritado. Vamos
esquecer tudo.
GLÓRIA: Então, se a gente não pode Estou chateada. Eu lhe ofereço a
fazer exatamente o que você quer, possibilidade, e você a rejeita.
você não fica feliz?
Diferenças Reconciliáveis 323

Se Cláudio e Glória estivessem mais conscientes do que estava


acontecendo entre eles, eles poderiam estar mais abertos para suas
próprias mensagens emocionais. Por exemplo, ele poderia ter iniciado
a discussão dizendo “O filme provavelmente é sexy. Talvez pudesse
nos botar no clima...” Mesmo se Cláudio tivesse iniciado a conversa
como ele fez, Glória poderia ter dito, “Quando você descreve um fil­
me como sexy, eu sinto que você está me dizendo que você quer que
façamos amor depois, e então eu me sinto pressionada e começo a re­
sistir a esta pressão.”
A consciência também lhes permitiria reconhecer as reações de
cada um. Em algum momento da conversa, Cláudio poderia reconhe­
cer que “Eu aposto que você se sente pressionada quando eu propo­
nho um filme sexy.” Ou Glória poderia admitir, “Eu acho que você
está desapontado por eu estar rejeitando qualquer possibilidade de
sexo hoje à noite.”
A consciência também abre a possibilidade para ações positivas.
Cláudio poderia decidir não ter comentado sobre a sensualidade do
filme, sabendo o efeito que poderia ter sobre Glória. Ou ela poderia
fazer um comentário humorístico: “Vou assistir ao filme com você,
mas vou manter meu cinto de castidade à mão.”
Assim, a consciência das emoções torna possível para cada par­
ceiro identificar seus próprios sentimentos ou os sentimentos do outro
ou agir de forma que mude o curso da discussão. Nenhuma dessas
ações alternativas são formas infalíveis de evitar um conflito sério,
mas, muitas vezes, promovem uma comunicação mais construtiva.
Todos os nossos exemplos de ações alternativas que poderiam
evitar o conflito se concentraram nos estágios iniciais da discussão.
Uma vez que as emoções estejam à flor da pele, os parceiros podem fi­
car chateados demais para estar cientes da luta que se passa entre eles.
Ou, mesmo se conscientes, eles podem estar com muita raiva para
qualquer ação construtiva. Uma vez que Ceres se trancou no quarto,
tanto ela como Norton estavam muito perturbados para se dar conta
do que tinha levado à briga, para estar cientes de que ações positivas
324 Mudança estabelecida por meio da atenção plena (mindfulness)

poderiam tirá-los daquela situação, ou mesmo para ser receptivos a


quaisquer ações positivas do outro. Eles simplesmente precisavam de
distância um do outro para se acalmar.
Estar plenamente consciente, momento a momento, do que
está acontecendo emocionalmente durante uma discussão, mesmo nos
estágios iniciais de tal discussão, é um objetivo ideal. Tipicamente, as
pessoas têm apenas uma consciência limitada de suas próprias emo­
ções e ainda menos consciência das emoções dos seus parceiros. O jul­
gamento frequentemente turva nossa consciência de nossas próprias
emoções. Se Ceres está chateada consigo mesma por ter irritado Nor­
ton (ele realmente ainda não teve a chance de limpar a garagem) ou se
Norton está chateado por estar irritado com o pedido de Ceres (ela
estava apenas pedindo gentilmente), então é menos provável que fi­
quem cientes de suas emoções e menos capazes de descrevê-las. O jul­
gamento também embaça a consciência que temos de nossos parceiros
quando os estamos julgando. Se Cláudio e Glória julgarem os senti­
mentos sexuais um do outro como desviantes e distorcidos, estarão
menos atentos da variação desses sentimentos e das lutas que o outro
realmente experimenta. Nenhum dos dois estará aberto para ouvir o
que o outro está passando. Nós, do lado de fora, podemos ver a inte­
ração emocional entre Ceres e Norton e o diálogo sexual não dito en­
tre Cláudio e Glória, mas é muito mais difícil para eles vê-lo enquan­
to está acontecendo. Qualquer aumento em sua consciência de sua
“história geral” e como ela se desenrola em um determinado incidente
lhes proporcionará mais opções para alterar seu padrão usual

Dica 1: Quando você e seu parceiro começarem a ficar tensos um com o


outro, (START) Inicie uma comunicação diferente entre vocês dois: (Stop)
Pare o que está fazendo no momento, (Take a deep breath) Respire fundo,
(Attend your emotions) Preste Atenção ao que está acontecendo com você
emocionalmente neste momento, (Reveal your emotional State) Revele seu
estado emocional a seu parceiro e (Take an interest) Coloque interesse no
que está acontecendo emocionalmente com seu parceiro. Quando você fala
continua
v_______________________________________________________________ -
Diferenças Reeoneiliáveis 325

'----- ------------------------— ------——. .


(continuação)

sobre seus processos internos, não tem problema se você estiver apenas
vagamente consciente da emoção ou incerto do que a desencadeou. Um
comentário tal como "Estou começando a me sentir tenso, mas não tenho
certeza do motivo" pode alterar um conflito em potencial, porque desloca
a atenção para longe do conteúdo da discussão para os elementos emocio­
nais, os quais poderiam, facilmente, desviar de uma discussão construtiva
sobre esse conteúdo. Uma boa maneira de se interessar pelo estado emocio­
nal de seu parceiro é perguntar gentilmente ou expressar curiosidade sobre
o que ele ou ela está experimentando no momento. Se você acha que sabe
o que seu parceiro pode estar sentindo, expresse-o somente com cautela,
pois seu parceiro é a autoridade final sobre o que ele ou ela está sentindo.
Este esforço para parar o curso do que normalmente acontece e iniciar uma
nova e melhor direção pode interromper um padrão frustrante e levar a
uma interação mais construtiva.
v_______________________________________________________________ /

Consciência em retrospectiva'

Há sérios limites para a consciência momento a momento de


Ceres e Norton e Cláudio e Glória, assim como da nossa. Muitas ve­
zes, no meio da discussão, temos apenas uma clareza limitada do que
está acontecendo emocionalmente conosco e com nossos parceiros.
Felizmente, esta não precisa ocorrer ‘no momento presente” para ser
útil. A consciência a partir de uma retrospectiva também pode nos
auxiliar. Esta consciência a posteriori pode não ter a capacidade de
impedir que um conflito ocorra ou mesmo interromper o seu curso,
mas pode lhe dar a possibilidade de que você aceite conflitos e se re­
cupere mais rapidamente. Para ilustrar, vamos retomar o conflito de
Ceres e Norton a partir de onde paramos.
Ceres está agora trancada no quarto, com raiva e repetindo
em sua mente a cena que acabou de ter com Norton. Ele não me con­
sidera, ela pensa. Tento ser gentil com ele, aproximar-me amavelmen­
te e quando faço uma simples pergunta sobre a garagem, ele me rejei-
Na tradução optamos pela expressão “Consciência em Retrospectiva”, mas também pode­
ria ser traduzida como “Tomada de Perspectiva”.
326 Mudança estabelecida por meio da atenção plena (mindfulness)

ta. Como uma idiota, eu fico ali aguentando, tento ser doce, convi­
do-o para uma corrida, e ele me rejeita novamente. Quando é que eu
vou aprender? Ele não tem consideração pelos meus sentimentos. O
único efeito que eu posso ter sobre ele é quando eu realmente explo­
do; isso atrai sua atenção. Então eu tenho que ficar furiosa para obter
uma resposta do meu marido. Que tipo de casamento é este?
Norton também fica ruminando sobre o conflito que acabaram
de ter. O que há de errado com ela? Ela de novo me incomoda, e en­
tão não suporta que eu fico irritado. Eu me recuso a correr com ela, e
ela age como se eu tivesse cometido um assassinato. Agora é ela quem
fica magoada e furiosa. Mas foi ela quem começou tudo!
Pensamentos e sentimentos como esses tornarão difícil para
Norton e Ceres se recuperarem desse conflito. Qualquer discussão ba­
seada nessas experiências internas inflamará ainda mais sua briga. Se
em algum momento após o conflito eles se tornassem conscientes,
mesmo em retrospectiva, do que realmente aconteceu, eles poderiam
se recuperar mais facilmente e rapidamente. Por exemplo, se Norton
percebesse que sua procrastinação criou um problema para Ceres, ou
que a maneira dela de perguntar e de propor uma corrida foram esfor­
ços genuínos para uma ação positiva, ou que ele estava sendo excessi­
vamente sensível aos lembretes dela, então ele poderia ser mais recep­
tivo ao comportamento dela e ao seu próprio. Da mesma forma, se
Ceres percebesse que seus lembretes apresentavam um problema para
Norton, mesmo quando mascarados de gentileza, ou que ela tinha di­
ficuldade em tolerar a rejeição dele, ou que ele não sabia lidar com a
angústia emocional dela, ela também poderia ser mais receptiva com
ele e consigo mesma. A consciência de qualquer um desses sinais de
conflito poderia ter facilitado o retorno à normalidade para ambos.
Ceres poderia superar sua raiva e sair do quarto mais cedo com esta
consciência em retrospectiva. Da mesma forma, Norton poderia supe­
rar sua raiva mais cedo e iniciar alguma reconciliação entre eles.
Algumas orientações específicas podem ajudar a alcançar a cons­
ciência em retrospectiva. Primeiro, nós (e nossos parceiros), provável­
Diferenças Reconciliáveis 327

mente, acusamos mais do que nós (ou eles) percebemos. Durante as


discussões, mesmo nas mais civilizadas, podemos dizer coisas que re­
fletem negativamente no outro. Mesmo sem nunca dizer palavrões
um ao outro, ou praticar difamação, ou mesmo sem levantar nossas
vozes, podemos conseguir transmitir muita acusação e culpa. Consi­
dere um conflito entre um marido e uma esposa sobre visitar os pais
no fim de semana. Durante o curso da discussão, o marido poderia
dizer: “Será que temos de visitá-los novamente?” - o que insinua que
sua esposa já os está pressionando para visitar com mais frequência do
que é razoável. Ele poderia perguntar: “Você não consegue passar um
fim de semana sem vê-los?” - dando a entender que sua esposa é mui­
to dependente de seus pais e dificilmente pode sobreviver psicologica­
mente sem contato constante com eles. Ela pode se sentir provocada
por essas observações, mas ele pode não estar ciente de quão sutilmen­
te agressivo elas foram. Da mesma forma, ela pode perguntar durante
a discussão, “Não poderiamos fazer o que eu quero pelo menos em
um final de semana?” - insinuando que ele, de maneira egoísta, deter­
mina o que eles fazem e nunca acolhe as necessidades dela. Além dis­
so, ela poderia propor durante a discussão, “Tenho certeza que vai exi­
gir um pouco de altruísmo da sua parte para ir” - querendo dizer que
ele é muito egoísta e teria dificuldade de, pelo menos, ser um pouco
generoso. Assim como os comentários do marido, esses comentários
da esposa podem ferir e irritá-lo, mas ela pode estar relativamente in­
consciente de seu poder acusatório.
Uma segunda orientação para a consciência em retrospectiva é
lembrar que nossos parceiros têm seu próprio lado da história, sua
própria experiência no conflito, e ela é legítima. A maioria de nós po­
deria concordar que cada pessoa em um conflito tem sua própria opi­
nião sobre ele. Mas como pode ser uma posição legítima se é diame­
tralmente oposta à nossa? E como pode uma posição ser legítima nes­
sas ocasiões em que estão claramente equivocadas? Será que a sua ver­
são simplesmente não será uma desculpa para a sua incapacidade de
fazer o que era certo?
328 Mudança estabelecida por meio da atenção plena [mindfulness]

Vamos considerar um exemplo em que uma pessoa está clara­


mente incorreta: Sandro não fez nada para o aniversário de Joyce —
sem cartão, sem presente, sem reconhecimento, nada. Pela maioria
dos nossos padrões de apreço, consideração e amor entre cônjuges,
julgaríamos que Sandro tinha feito algo errado. A dor e a raiva de
Joyce estão justificadas. De fato, ela está tão magoada e com raiva que
ela realmente não quer ouvir nada dele, porque qualquer explicação
que ele possa ter parecería uma desculpa.
Mas há uma história por trás da falha de Sandro em dar impor­
tância ao aniversário de Joyce, e é relevante para ela ter conhecimento
disso. Considere algumas das várias possibilidades:
1. Sandro não dá bola para eventos como aniversários, bodas e
coisas do gênero. Ele nunca foi muito bom em lembrá-los. Ele
não fica chateado se os outros esquecem seu aniversário (ele
mesmo, muitas vezes, não se lembra), e assim ele não pode en­
tender por que Joyce faz tanto alvoroço sobre isso. Ele não está
plenamente ciente de que, embora os aniversários não signifi­
quem muito para ele, eles são importantes para ela.
2. Sandro sabia do aniversário de Joyce. No entanto, ele está fu­
rioso com ela por várias coisas que ela fez a ele. Ele deliberada-
mente evitou fazer qualquer coisa para o aniversário dela por­
que ele queria machucá-la assim como ela o tinha machucado.
3. Os aniversários de Joyce têm sido controversos há muito tem­
po. Sandro sente que não importa o que ele faça, nada será
bom o suficiente para Joyce. O cartão que ele escolhe é engra­
çado ao invés de romântico. O presente que ele compra é prá­
tico demais. Ele não é inteligente o suficiente para surpreendê-
la. Nada que ele faça parece ser bom o suficiente. Sandro se
lembrava do aniversário dela, mas não se sentia bem em lhe
comprar um presente ou um cartão romântico, reconhecia que
ela iria se ofender com menos do que isso e não sabia como re­
solver o problema. Ele evitou lidar com o aniversário de Joyce
e, um pouco antes do dia, ficou muito envolvido com seu tra­
Diferenças Reeoneiliáveis 329

balho e realmente esqueceu. Talvez em algum nível ele estives­


se dizendo, se você não gosta do que eu faço para você, talvez
eu não faça nada por você.

Cada uma dessas histórias é muito diferente. Nenhuma retrata


Sandro sob um prisma positivo, mas todos mostram o lado humano
de seu erro. Cada um torna sua ação compreensível, se não aceitável.
Tanto Joyce e Sandro precisam ser capazes de entender lado dele, as­
sim como o lado dela para que eles possam lidar com o problema de
forma eficaz. Claro, o primeiro desafio será Sandro expressar seus pen­
samentos e sentimentos, sem parecer que ele está dando uma desculpa
ou transferindo a culpa para Joyce.
Uma terceira orientação para a consciência retrospectiva segue a
segunda. Se a mensagem dos nossos parceiros não faz sentido para
nós, se a sua história parece pouco convincente, então, provavelmen­
te, está nos faltando consciência do que realmente está acontecendo
com eles. Talvez eles não tenham sido capazes de articular sua posição.
Talvez a mensagem se tornasse muito embaçada com culpa e acusação
ou com atitude defensiva. Mas qualquer que seja a razão está faltando
uma peça importante no quebra-cabeça.
Carlos está sem trabalho há três meses, desde que sua empresa
fechou. Como ele não conseguiu encontrar um emprego, ele, Janete e
suas duas filhas adolescentes estão sobrevivendo com a renda dela. Ja­
nete não entende o motivo que ele não está sendo mais agressivo na
busca de um emprego. Parece que ela está mais angustiada com isso
do que ele. Será que ele quer ser dependente dela? Será que ele não
tem o impulso para ir atrás de trabalho e lutar por um emprego? Ela
começou a perder o respeito pelo marido. Janete simplesmente não
entende o que está acontecendo.
Por seu lado, Carlos vê a esposa não como uma aliada em sua
busca de trabalho, mas como uma adversária. Ela parece tão fria e
zangada com ele. Tenta controlá-lo, chega em casa e exige um relató­
rio de seu desempenho. Até põe a mão na televisão para ver se estava
330 Mudança estabelecida por meio da atenção plena [mindfulness]

ligada, e quer saber quantas ligações ele fez - um registro de suas ati­
vidades. Agora ele, frequentemente, se recusa a lhe dar uma resposta.
Por que ele deveria responder a ela? O que está acontecendo com ela?
Como nenhum está ciente do que está acontecendo com o outro,
Carlos e Janete se distanciaram. Eles estão lutando individualmente
com fortes emoções, mas lutam em isolamento. Nesta situação difícil,
ambos não têm o apoio da pessoa que mais se importa com eles.
O que cada um transmitiría idealmente para o outro, mesmo
que não pudesse articulá-lo completamente? O que cada um precisa
tomar conhecimento do outro?
A mensagem de Janete seria: Estou frustrada porque você não en­
controu um emprego. Isso, provavelmente, é óbvio para você. Mas mais
do que isso, estou ansiosa que você não vai conseguir um trabalho. Re­
ceio por nosso futuro financeiro. Estou preocupada que vamos ter que
sobreviver com minha renda sozinha. Então não haverá nenhuma ma­
neira para nós todos viajarmos e visitar meus pais, nenhuma maneira de
pagarmos a faculdade para as meninas. Nem tenho certeza de que pos­
samos continuar a manter a casa. Diante desses medos poderosos e rea­
listas, preciso ver que você está preocupado. Eu preciso que você me re­
assegure que também sente alguma urgência sobre a situação. Quando
eu não recebo qualquer informação sobre o que você está considerando
em termos de um trabalho e o que você fez, eu fico desconfiada. Temo
que você não se importe com isso. Que você não fez nada. E então eu
entro em meu modo controlador - investigando, interrogando-o sobre
o que tem feito. Eu preciso de informações para acalmar meus medos, e
eu não estou recebendo isso de você.
A mensagem de Carlos seria: Ser demitido e tentar encontrar
um novo emprego é a crise mais difícil que enfrentei na minha vida.
Eu perdi a confiança em mim mesmo, e não acho que tenho todas as
habilidades tecnológicas que preciso para começar tudo de novo em
um novo emprego. Tenho que brigar comigo mesmo, todos os dias,
para me motivar a fazer alguma coisa. Eu definitivamente evito agir
porque não me sinto a altura, porque antecipo outro fracasso. E se
Diferenças Reeoneiliáveis 331

consigo me motivar, também devo lutar com a ideia de passar por vá­
rias agências de emprego e entrevistas com o pessoal de recursos hu­
manos. E se isso não fosse o suficiente, também tenho que brigar com
você. Eu odeio quando você fica me investigando, quando me inter­
roga sobre o que eu fiz, quando eu vejo repúdio em seu rosto. Faz-me
sentir pior sobre mim mesmo.
No calor de sua briga, Carlos e Janete seriam incapazes de arti­
cular suas posições tão claramente como nós as colocamos. Nem eles
compreendem completamente a posição um do outro no meio de seu
conflito. No entanto, qualquer comunicação que pudessem ter que
aproximasse suas posições, mesmo se feita depois de uma briga - uma
comunicação retrospectiva - seria útil porque poderia aumentar a
consciência desta situação desagradável. Mesmo sem comunicação,
cada um poderia ser capaz de obter algum aumento na consciência
em retrospectiva, simplesmente refletindo melhor só no problema.
Há, pelo menos, duas vantagens de quaisquer ganhos na cons­
ciência retrospectiva tanto para Janete, como para Carlos. Primeiro,
como discutimos, pode diminuir sua luta interpessoal. Janete poderia
ficar menos fria ou zangada com Carlos e, talvez, não o monitorasse
tão de perto. E, se Carlos visse os comportamentos de Janete como
resultado do medo, em vez de repúdio a ele, poderia ficar mais pro­
penso a se abrir sobre seus próprios medos. No entanto, pode haver
um segundo benefício: a consciência retrospectiva também poderia
ajudar Carlos a encontrar um emprego. Se Janete entendesse o que ele
estava passando, ela poderia encorajá-lo ou apoiá-lo de maneira que
realmente o motivasse. Se Carlos entendesse o que Janete estava pas­
sando, ele poderia se sentir mais forte e até mesmo mais competente
ao assegurá-la de que seus medos financeiros não iriam se concretizar.
Poderia fazer um esforço mais intenso e consistente para encontrar
trabalho e poderia ser mais compreensivo com os esforços dela para
controlar a situação.
332 Mudança estabelecida por meio da atenção plena [mindfulness]

( '■------------------------------------------------------------------'j
Dica 2: Depois de uma interação difícil com o seu parceiro, considere a pos­
sibilidade de tê-lo culpabilizado mais durante a discussão do que você se deu
conta. Lembre-se de que seu parceiro tem uma posição legítima e compreen­
sível, mesmo se ele ou ela fez algo de errado. Tente entender essa posição e
você terá mais chance de aceitar o conflito que surgiu, recuperar-se e seguir
em frente. Esse entendimento também poderá ajudá-los no futuro a discutir
melhor se vocês revisitarem o conflito ou o encontrarem novamente.
<________________________________________________________ J

RECAPITULANDO
Esforços para mudar um relacionamento, seja por um terapeuta ou por nós mesmos,
podem ter consequências não intencionais. Em vez de criar mudança, nossos esforços
podem simplesmente ser mais do mesmo. Na verdade, podemos criar uma situação que
é uma versão pior do mesmo problema antigo. Para evitar que nossos esforços bem in­
tencionados caiam nessas armadilhas, precisamos ter consciência do que está aconte­
cendo entre nós. Um bom ponto de partida é a consciência da história de nosso proble­
ma, elaborada no Capítulo 8. Então podemos ver como a história geral de nosso proble­
ma se desenrola em interações cotidianas; tornamo-nos conscientes (mindful) da co­
municação emocional durante nossas discussões uns com os outros. Essa consciência
nos mostra opções para alterar o curso de nossos conflitos enquanto eles estão ocor­
rendo, às vezes prevenindo-os ou, pelo menos, minimizando seu impacto e facilitando a
recuperação deles. Embora tal consciência no momento presente é, muitas vezes, difícil
de alcançar, uma consciência retrospectiva do que aconteceu entre nós também pode
ajudar, facilitando a aceitação de uma discussão, uma recuperação mais rápida e moti­
vação para buscar uma discussão mais produtiva.
0 capítulo ofereceu duas dicas, uma para a consciência no momento presente e uma
para a consciência retrospectiva

1. No início de um conflito, quando você e seu parceiro estão ficando tensos:


(START) Inicie uma comunicação diferente entre vocês dois: (Stop) Pare o que
está fazendo no momento, (Take a deep breath) Respire fundo, (Attend your
emotions) Preste Atenção ao que está acontecendo com você emocionalmente
neste momento, (Reveal your emotional State) Revele seu estado emocional a seu
parceiro e (Take an interest) Coloque interesse no que está acontecendo emocio­
nalmente com seu parceiro.
2. Depois de uma interação difícil com seu parceiro, perceba que você tem sido mais
culpabilizador durante a discussão do que você imagina. Lembre-se de que seu
parceiro tem uma posição legítima e compreensível. Tente entender essa posição,
pois pode ajudá-lo a se recuperar e lidar com esse conflito no futuro.
Diferenças Reconciliáveis 333

Exercício: aumentando sua própria consciência

É mais fácil começar com a consciência retrospectiva do que com


a consciência no momento presente. Olhe para trás em uma briga re­
cente sobre o seu conflito central. Você consegue ver como a história
geral de seu problema se desenrolou nesta briga em particular?

1. De que forma você estava colocando mais culpa no seu parceiro


sem ter percebido naquele momento? 0 que você disse que seu
parceiro pode ter entendido como acusação:

2. Quais foram as principais mensagens que cada um de vocês não


conseguiu transmitir ao outro? Qual foi a mensagem que você es­
tava tentando transmitir que seu parceiro pode não ter escutado?

3. Qual foi a mensagem que seu parceiro estava tentando transmitir


que talvez você não tenha escutado?

Agora considere o mesmo conflito:


4. Se você tivesse tido maior consciência no momento presente, o
que você poderia ter dito no início do conflito que teria sido uma
expressão mais direta do que você estava sentindo e que poderia
ter alterado o curso da interação?
334 Mudança estabelecida por meio da atenção plena [mindfulness)

5. O que você poderia ter dito que teria reconhecido o que seu par­
ceiro estava sentindo ou que poderia ter mostrado seu interesse
em relação ao que estava acontecendo com ele?

PRÓXIMOS PASSOS

Discutimos agora duas maneiras de promover a mudança. No


capítulo anterior, consideramos pedidos simples e diretos de mudança
que, às vezes, podem ser bem-sucedidos. Neste capítulo, considera­
mos fazer mudanças em sua interação uns com os outros por meio de
uma maior consciência dessa interação. No próximo capítulo, consi­
deraremos outras maneiras de mudar sua comunicação com seu par­
ceiro, observando orientações para boas habilidades de comunicação,
as quais você já pode ter ouvido falar. Vamos discutir essas orienta­
ções, mas também condições quando estas podem ser úteis e quando
podem ser prejudiciais.
13
Mudança estabelecida
por meio da comunicação
Seguindo bons conselhos
sobre como falar e escutar com
cuidado e atenção plena

O único grande problema com a comunicação é a ilu­


são de que ela ocorreu.
George Bernard Shaw

O que ocorre com uma relação duradoura que torna a comuni­


cação entre parceiros tão difícil?
Como vimos, o amor nos torna especialmente vulneráveis à dor e à
raiva. A falta de interesse ou um desentendimento que pode acontecer
com um amigo ou colega de trabalho, quando envolve os nossos parcei­
ros, não pode ser deixada de lado tão facilmente. Quando nossas incom­
patibilidades e vulnerabilidades são acionadas, nossas reações emocionais,
com frequência, impedem a comunicação produtiva entre nós. Podemos
estar muito irritados para nos comunicar construtivamente. Mesmo assim
a comunicação geralmente não se desintegra completamente: ainda pode­
mos conversar com nossos parceiros sobre outros tópicos além do assunto
do conflito. Entretanto, um conflito, às vezes, pode se espalhar gradual­
mente e, até mesmo, a comunicação cotidiana se torna difícil.
As legiões de conselheiros para casais - aqueles profissionais
de saúde mental ou clero ou “especialistas em relacionamentos” da
336 Mudança estabelecida por meio da comunicação

televisão ou bartenders ou amigos que afirmam ter algum conheci­


mento especial sobre o amor — estão bem cientes de que a comuni­
cação está no cerne de muitos de nossos problemas. Assim eles for­
mularam uma riqueza de conselhos para expressar nossas queixas,
transmitir nossos sentimentos e propiciar as mudanças que quere­
mos em nossos entes queridos e nossos relacionamentos. Examinare­
mos agora algumas dessas regras, com o objetivo não apenas de pro­
movê-las, mas também de expor seus limites e inadequações. Co­
nhecer as “regras de boa comunicação” pode ser instrutivo, especial­
mente se você sabe quando elas não funcionam, mas também quan­
do funcionam.

SE CONSELHO FOSSE BOM A GENTE VENDIA

Muito do que acontece com conselhos sobre como conversar e


amor são palavras genéricas, óbvias e sem sentido. Você não questio­
naria que se deve amar numa relação, assim como, em teoria, você
não discordaria de um conselho que diz que você deve honrar, respei­
tar, prezar ou apoiar o seu parceiro pelo o que ele ou ela é. Estes con­
selhos de sentimentos positivos não necessariamente o aproximam da
relação ideal que você deseja.
O conselho que incentiva algum sentimento de bem estar entre
o casal, admirável tal como o amor ou o respeito é bem intencionado,
mas simplificado ao extremo. Quando nossos relacionamentos estão
indo bem, pode ser fácil ser respeitoso ou solidário ou amoroso, mes­
mo sem tentar. Quando o relacionamento não está indo bem, pode­
mos não fazer ideia sobre como alcançar este bem estar.
Mesmo conselhos que são mais específicos podem ser impossí­
veis de seguir. A sugestão comum de dizer algo agradável ao seu par­
ceiro todos os dias lhe diz exatamente o que fazer - diga que ama seu
parceiro ou dê a ele um elogio diário - mas desconsidera o papel de
seus sentimentos nessa comunicação. Não é nenhum problema dizer
Diferenças Reeonciliáveis 337

‘‘eu te amo” quando você se sente amoroso ou dizer “você está lindo”
quando você se sente atraído por ele. Mas e aqueles momentos nos
quais você não se sente desta maneira? E realmente uma boa ideia di­
zer algo que você não está querendo dizer?
Outro tipo de conselho comum aborda explicitamente os
sentimentos, mas presume que eles estão completamente sob nosso
controle. Considere o conselho, muitas vezes repetido, de não ir
para a cama irritado um com o outro, não estar com raiva ao mes­
mo tempo, ou ser otimista e alegre com seu parceiro. Quando você
está com raiva ou pessimista, pode não ser possível terminar sua
raiva voluntariamente, muito menos transformá-la em otimismo e
boa disposição.
Nossa sociedade geralmente reconhece a distinção entre senti­
mentos e pensamentos de um lado e comportamento do outro, por
isso parece estranho que, aqueles que dão conselhos sobre relações
interpessoais, muitas vezes não a reconhecem. Nossos costumes e
leis nos responsabilizam pelo que fazemos, mas não pelo que pensa­
mos ou sentimos - e por boas razões. Nossos sentimentos e pensa­
mentos são privados e não são prejudiciais para os outros, a menos
que levem a ações danosas e, mais importante, não podemos contro­
lá-los tão facilmente quanto podemos controlar nosso comporta­
mento. As vezes, podemos usar distração ou razão para alterar nos­
sos sentimentos um pouco, especialmente se esses sentimentos não
são intensos. Podemos também tentar evitar certos sentimentos ou
pensamentos, evitando os desencadeadores previsíveis. Mas geral­
mente nossos pensamentos, e especialmente sentimentos, vêm es­
pontaneamente, sem serem convidados.
Os conselhos que nos incitam a ter certos sentimentos ou a
proibir certos pensamentos não consideram a distinção elementar en­
tre o que fazemos e o que pensamos e sentimos. Portanto, geralmente
não são muito úteis.
338 Mudança estabelecida por meio da comunicação

QUANDO UM BOM CONSELHO É MAU


PARA SEU RELACIONAMENTO

Obviamente, muitos bons conselhos não caem em nenhuma das


armadilhas que acabamos de discutir. O conselho para “pedir desculpas
quando você comete um erro que afeta seu parceiro” é certamente especí­
fico e é direcionado ao comportamento ao invés das emoções. Mas tam­
bém pode ser um bom conselho. Os relacionamentos seriam melhores se
os parceiros estivessem mais dispostos a se desculpar por seus erros.
No entanto, mesmo bons conselhos podem ser ruins quando
ignoram o contexto emocional. Jaques pode estar zangado com Letí-
cia e exigir um pedido de desculpas, que ela dá sabendo que cometeu
um erro, mas ainda ressentida com a forma irritada que ele pediu. Sua
desculpa, meio forçada, deixa a ambos insatisfeitos. Mesmo que Letí-
cia fosse capaz de fazer um pedido genuíno de desculpas, Jaques po­
deria estar tão zangado para aceitá-lo e continuar criticando-a, fato
que, por sua vez, poderia enfurecê-la.
Um bom conselho também pode falhar porque ignora o con­
texto maior do relacionamento no qual o comportamento, mesmo o
“bom” comportamento, ocorre. Evandro geralmente usa desculpas
como parte de uma estratégia de apaziguamento, pedindo desculpas
rapidamente para evitar a raiva de Sérgio e mais discussão sobre o tó­
pico. Como resultado, Sérgio somente fica irritado com as frequentes
desculpas de Evandro. Para Jaques e Letícia, bem como Evandro e
Sérgio, o que soa como “bons conselhos” na verdade é ruim para eles
e leva a uma solução tóxica.
Infelizmente, esse problema é agravado porque frequentemente
somos atraídos por “bons conselhos” que são ruins para nós. Provavel­
mente escolhemos aconselhamentos que se encaixam com o que nor­
malmente fazemos. Evandro gosta do conselho para se desculpar por­
que essa é a sua tendência natural. E ele força esse “bom conselho” so­
bre Sérgio. Este gosta do conselho de “expressar seus sentimentos” por­
que essa é sua tendência natural. Mas, muitas vezes, como com Evandro
e Sérgio, o conselho que seguimos não é o conselho que precisamos.
Diferenças Reeoneiliáveis 339

Tendo em mãos sua compreensão DEEP (profunda), bem como


a consciência no momento presente e a consciência em retrospectiva,
você pode discriminar os bons conselhos dos maus para o seu problema
específico. Se Evandro e Sérgio entendessem que a acusação por parte
de Sérgio e o apaziguamento de Evandro, incluindo suas desculpas, fa­
ziam parte de seu padrão problemático de interação, e das suas soluções
tóxicas, eles saberiam que esse conselho, que pode parecer bom — Sérgio
“falar o que vem na mente” e Evandro a “estar disposto a pedir descul­
pas” -poderia simplesmente reforçar seu problema.
O restante deste capítulo irá rever conselhos comuns para al­
cançar uma boa comunicação que pode ser útil para você. Conhecer
os benefícios, os riscos e as dificuldades de implementação de aconse­
lhamentos específicos sobre como se comunicar permitirá que você
aborde a mudança no contexto de aceitação. Permitirá que você avalie
conscientemente (mindfully) seus conselhos, com base em sua com­
preensão de seu problema particular e em sua observação do seu pa­
drão de interação em andamento. Finalmente, ele permitirá que você
entenda que qualquer conselho pode ser contraproducente, mesmo se
ele é implementado corretamente, e prepará-lo para aceitar e aprender
com as situações nas quais ele é ineficaz. Às vezes aprendemos tanto
com nossos fracassos como com nossos sucessos.

ORIENTAÇÕES PARA FALAR COM SEU PARCEIRO

Existem vários conselhos de comunicação que podem ser úteis


para o seu relacionamento, quando seguidos com cautela.

Escolher um momento e um lugar para


conversar que funcione para ambos
Provavelmente a maioria das discussões sobre questões de rela­
cionamento ocorre quando acionada por algum incidente provocati­
vo. Quando acontecem discussões desta forma na “cena do crime”,
340 Mudança estabelecida por meio da comunicação

não é de surpreender que, com frequência, corram mal. Um ou am­


bos os parceiros estão ressentidos, e eles são susceptíveis de trocar acu­
sações e defesas. Eles podem obter algum benefício ao descarregar suas
frustrações, e a discussão, certamente, salienta o que um ou ambos
não gostam. No entanto, é improvável que eles tenham uma discussão
produtiva, significativa e satisfatória. Para ter tal discussão, o momen­
to deve ser aquele em que ambos os parceiros estejam emocionalmen­
te calmos e receptivos um ao outro; o lugar deve ser onde ambos se
sintam confortáveis. Vamos considerar um exemplo de como Otávio e
Suzane usam esse conselho ao invocar sua compreensão e aceitação de
sua maneira de lidar com o conflito.
Depois de uma discussão desagradável sobre seus planos para o
fim de semana, Otávio e Suzane vão cada um para um canto e se ocu­
pam com suas tarefas de sábado de manhã. Ele odeia o tenso silêncio
que vem depois de qualquer discussão com ela e quer explicar sua posi­
ção sobre o fim de semana, que ele acredita que ela distorceu. Ele se
aproxima dela, propõe um beijo e fazer as pazes, para depois recomeçar
a conversa. Otávio sugere que eles têm todo o fim de semana pela frente
e ainda podem desfrutar da maior parte dele. Este fato só deixa Suzane
irritada. Ela demora mais para se recuperar do conflito do que ele, e
neste momento, ela não tem nenhuma vontade de fazer as pazes.
Neste ponto, ambos estão em perigo de criar um problema rea­
tivo que é mais grave do que o problema inicial de sua discordância
sobre o fim de semana. Se seguirem sua forma habitual, Suzane vai re­
jeitar a abertura de Otávio com uma onda de desprezo, ele vai ficar
com raiva novamente e criticar a insensibilidade dela para o seu "‘gesto
positivo”, ela vai questionar a honestidade deste gesto, e eles vão aca­
bar brigando sobre a forma como eles se recuperam das discussões
mais veementemente do que discordaram, inicial mente, sobre seus
planos de fim de semana.
No entanto, eles não seguem sua forma usual. Ambos estão
cientes (mindful) da compreensão DEEP (profunda) de seus conflitos
e chegaram a aceitar o seu padrão de recuperação do conflito. Eles sa­
Diferenças Reconciliáveis 341

bem que uma conversa tem que acontecer em um momento e lugar


que funcione para ambos. Suzane respira profundamente e, aprovei­
tando sua consciência no momento presente, reprime seu impulso de
rejeitar a proposta de Otávio sem uma palavra de explicação ou, o que
seria pior, com um comentário acusatório, tal como “Você sempre
quer conversar nos piores momentos.” Em vez disso, ela diz honesta e
diretamente: “Eu ainda não posso, Otávio.”
Mesmo que ela não “beije e faça as pazes” e discuta o que ele
queria, o comentário de Suzane explica sua atitude. Para Otávio, são
coisas bem diferentes de simplesmente sair sem falar nada. O “ainda”
também implica que ela vai chegar num momento de reconciliação
no seu devido tempo. Portanto, o comentário dela, além de sua pró­
pria consciência no momento presente de que sua bem intencionada
abertura poderia levá-los a um conflito mais profundo, ajudou-o a re­
cuar. Ele disse: “OK, estou pronto para conversar quando você esti­
ver.” Então deixou Suzanne em paz.
Sem a pressão de fazer as pazes, Suzane se sentiu aliviada, recu­
perou-se mais depressa de sua angústia. Mais tarde juntou-se a Otávio
na cozinha e o ajudou a lavar os pratos. Ele não fez nenhuma exigên­
cia de um beijo para marcar sua reconciliação, mas aceitou sua manei­
ra calma de se aproximar dele, uma vez mais. Eles retomaram a con­
versa sobre seus planos, esta ocorreu de uma forma muito melhor, e
eles acabaram tendo um bom fim de semana juntos.
Otávio e Suzane conseguiram seguir o conselho para escolher
um momento e lugar que funcione para ambos, porque eles fizeram
de maneira tão ponderada — ao compreender e aceitar seu padrão de
interação. Suzane veio a entender que Otávio fica ansioso quando há
distância emocional entre eles, tenta transpor essa distância com es­
forços para fazer as pazes e conversar, e então fica furioso quando essas
propostas são rejeitadas. A aceitação dela em relação à maneira de
Otávio de lidar com o conflito e sua capacidade de manter essa aceita­
ção no momento permitiu que ela lhe dissesse “Eu ainda não posso,
Otávio”, em vez de rejeitar a tentativa dele.
342 Mudança estabelecida por meio da comunicação

Da mesma forma, por meio da consciência em retrospectiva,


Otávio veio a aceitar que seus esforços de reconciliação apenas pres­
sionavam Suzane e tornavam mais difícil para ela se reconectar com
ele. Essa aceitação permite a ele deixar que ela volte para ele em seu
próprio ritmo e à sua maneira. A abordagem combinada de ambos,
sua consciência mútua, compreensão e aceitação de como eles lidam
com conflitos de forma diferente, permitiu-lhes não apenas seguir al­
guns bons conselhos, mas salvar um fim de semana e começar a mu­
dar a maneira destrutiva de se recuperar do conflito.

Expressar seus sentimentos

Talvez o conselho de comunicação mais comum da psicologia


popular seja “expressar seus sentimentos”. A psicologia popular nos
diz não só que isso é uma boa coisa a fazer, mas também que se não
expressarmos nossos sentimentos, particularmente nossos sentimentos
negativos, algo ruim pode acontecer conosco. Este conselho é como
tentar “afundar uma bola na água”, uma bola cheia de sentimentos
negativos: se a empurrarmos para baixo em um ponto, ela aparecerá
em outro. Sentimentos não expressos podem “se acumular” dentro e
depois “surgir” fisicamente como úlceras, dores de cabeça e coisas do
tipo ou “surgir” psicologicamente em reações impulsivas, tais como
explosões de raiva ou decisões precipitadas. Mesmo que os sentimen­
tos não surjam de outras maneiras, eles podem criar estresse que pro­
move a doença e prejudica o bem-estar. Parece não haver nada de bom
em manter nossos sentimentos negativos.
Não surpreende que a evidência científica para estas noções
aponte muito mais complexidade do que o ‘modelo da bola na água
indicaria. O impacto de expressar sentimentos depende de quais são
eles, como são expressos e para quem são ditos. Às vezes, a externali-
zação das emoções pode prolongar ou amplificá-las. No entanto, ape­
sar dessas ressalvas, a expressão emocional tem claros efeitos positivos
em nosso relacionamento. A comunicação apropriada dos sentimen­
Diferenças Reeonciliáveis 343

tos pode levar a uma maior intimidade e influência sobre o outro.


Confiar sentimentos - especialmente emoções ocultas - aos nossos
parceiros é uma das melhores maneiras de se sentir emocionalmente
mais perto deles. E ouvindo-nos, eles podem se sentir emocionalmen­
te mais próximos de nós. Além disso, à medida que aprendem sobre
nossas emoções, eles podem levá-las em consideração quando lidam
conosco. Eles podem alterar seu comportamento por consideração a
nossos sentimentos.
Apesar de todo o bem potencial que pode resultar da comuni­
cação de nossos sentimentos aos nossos parceiros, surgem muitos pro­
blemas quando tentamos expressar aqueles que são negativos, espe­
cialmente quando estes lhes dizem respeito. Certamente, não será
agradável escutar sobre as emoções negativas que temos em relação a
nossos parceiros. Eles podem ter problemas para ouvir; eles podem
interpor seus próprios sentimentos negativos sobre nós. Mas, além da
sua reatividade com o que dizemos, pode ser difícil para nós expressar
nossos sentimentos honestamente.
Primeiro, podemos simplesmente não saber exatamente o que
sentimos. Tome o medo como um exemplo. Psicólogos medem o
medo de três maneiras diferentes: observando o comportamento (as
pessoas exibem medo evitando ou escapando de um objeto temido),
avaliando a excitação fisiológica (as pessoas têm taxas cardíacas mais
rápidas, pressão arterial mais alta e suam mais quando têm medo) e
perguntando sobre sentimentos subjetivos (as pessoas relatam sentir
medo). Psicólogos constataram que essas três medidas são consisten­
temente altas quando o medo é grande. Se um marido pegasse uma
faca para ameaçar sua esposa, ela poderia fugir dele, seu coração es­
taria batendo forte, e ela certamente relataria terror. No entanto, se
há pouco medo — se um marido levantou a voz para sua esposa, a
qual ficou intimidada pela raiva dele - ela pode não demonstrar de
forma tão clara como no exemplo anterior. Ela poderia se afastar
dele, sua frequência cardíaca subiria levemente, mas, talvez, ela não
relatasse um sentimento de medo. Ela genuinamente não rotularia
344 Mudança estabelecida por meio da comunicação

seu estado interno de medo porque simplesmente não estava ciente


disso. Se tivéssemos evidências claras de sua história de intimidação
pela raiva, poderiamos dizer que ela não estava consciente de seus
sentimentos de medo neste caso.
Este exemplo de medo é simples, porque apenas uma emoção
foi despertada. Quando mais de uma emoção é acionada, mas todas
em níveis baixos, estar “ciente de seus sentimentos” se torna mais
complicado. Por exemplo, suponha que um marido e uma esposa
saem para jantar com os amigos. As participações dele na conversa
não são particularmente interessantes ou divertidas, mas as dela são.
Encorajada pela atenção e interesse que ela recebe, ela o interrompe
algumas vezes. Ela não faz nada grosseiro ou dramático, mas ela ligei­
ramente despreza as contribuições dele e assume o controle da conver­
sa. Se pudéssemos inspecionar os sentimentos dele com uma lupa, po­
deriamos ver que se sente competindo com sua esposa, que tem inveja
da capacidade dela de divertir os outros e que está irritado com as in­
terrupções. No entanto, porque as coisas que ela fez foram sutis e por­
que seus sentimentos de concorrência, ciúme e aborrecimento são de
tal baixa intensidade, ele pode não ser capaz de articulá-los. Ele só
pode experimentar um vago sentimento de insatisfação. No caminho
para casa, depois do jantar, ela pode expressar seu prazer com a noite
divertida que eles tiveram, enquanto ele parece de mau humor.
Outra razão pela qual temos dificuldade de expressar nossos
sentimentos honestamente é que, talvez, não estejamos confortáveis
com certas emoções e talvez não queiramos experimentá-las. O mari­
do acima não só tem problemas para detectar seus verdadeiros senti­
mentos porque eles estão em uma baixa intensidade; ele não quer
identificar esses verdadeiros sentimentos dentro de si mesmo. Ou não
se sente confortável competindo ou com inveja de sua esposa, ou ele
acredita que esses sentimentos não são justificados neste caso e, por­
tanto, ele se sente vergonhado.
Quando nós não podemos ou não vamos expressar nossos
sentimentos honestamente, nós recorremos, frequentemente, a atuá-
Diferenças Reconciliáveis 345

los em vez de dar voz a eles. Quando saímos da sala e nos recusamos a
discutir um assunto com nosso parceiro, estamos atuando nossos sen­
timentos de raiva e não falando sobre estes. Quando nos afastamos e
ficamos mal-humorados, estamos atuando nossa mágoa, em vez de
verbalizá-la. Mesmo quando falamos com nosso parceiro, podemos
estar atuando nossos sentimentos, em vez de expressá-los. Como ex­
plicamos no capítulo 9, nossas palavras podem ser estimuladas por
nossas emoções ocultas, mas essas palavras podem não mencionar as
emoções. Quando chamamos nosso parceiro de idiota ou gritamos
“Nunca mais me faz isso de novo”, podemos pensar que nossos senti­
mentos são perfeitamente claros, mas estamos realmente adotando a
tática desviante de se concentrar nas falhas da outra pessoa em vez de
nas nossas emoções escondidas.
Quando peço a um casal em terapia para expressar como eles
se sentem sobre uma questão importante, e estou fazendo perguntas
sobre uma pessoa, com frequência, o que eu obtenho é uma argu­
mentação sobre a outra. Aqui está uma resposta típica de um mari­
do quando perguntado sobre seus sentimentos sobre sua comunica­
ção conjugal: “Ela não sabe como se comunicar muito bem. Ou ela
deixa escapar alguma emoção, não importa qual - e se a situação é
apropriada ou não - ou se recusa a falar sobre seus sentimentos. Ela
não pode ter apenas uma discussão simples e direta sobre qualquer
desacordo sem que ela fique tensa. Acho que ela tem medo de se
prejudicar ao tentar lidar com um problema racionalmente.” Obser­
ve que o marido nunca mencionou nada sobre seus próprios senti­
mentos ou mesmo sobre si mesmo.
Não se surpreenda se você se pegar “expressando suas emo­
ções” desta maneira. Você pode acabar se sentindo machucado e frus­
trado porque seu parceiro não escutou seus sentimentos. Mas talvez
você nunca os tenha expressado.
346 Mudança estabelecida por meio da comunicação

Falar na "linguagem do eu"


Um conselho comum de comunicação elaborado para ajudar
os casais a expressar sentimentos, em vez de julgamentos como os
acima, prescreve mensagens que começam com “Eu sinto” ao invés
de “Você”. Uma fala que começa dessa maneira provavelmente é
mais sobre os próprios sentimentos e menos um julgamento, uma
acusação ou um comentário culpabilizador. Em contraste, uma fala
“você” é sobre o outro e, com frequência, será acusatória. O comen­
tário “Você estragou tudo de novo” poderia facilmente comunicar
julgamento e culpa e convida à discussão. Por outro lado, “eu sinto
raiva quando você faz isso” se concentra nos sentimentos de quem
fala e é menos sujeito ao debate. E muito mais difícil argumentar
sobre se alguém teve certa reação emocional do que sobre se deter­
minado comportamento era apropriado. Então terapeutas e outros
conselheiros defendem a “linguagem do eu” para filtrar a culpa e o
julgamento da comunicação.
Se você espera promover a mudança e intimidade em seu rela­
cionamento com a ajuda deste conselho, entretanto, tenha cuidado
com a facilidade com que este pode ser sabotado. Parceiros em confli­
to frequentemente iniciam julgamentos utilizando um “Eu sinto .
como em “Eu sinto que você está fugindo da sua responsabilidade” ou
“Eu sinto que você está sendo egoísta”. Na verdade, os parceiros po­
dem tentar sanear suas declarações mais acusatórias ou degradantes,
colocando-as sob um disfarce de expressão de sentimentos: “Eu sinto
que você é um idiota.” “Eu sinto que você não tem a capacidade de
amar.” “Eu sinto que você é inútil como cônjuge.”
Conselhos mais específicos sobre o usar a “Linguagem do Eu
sugere que o “Eu sinto” seja seguido por uma palavra de emoção
Mensagens como “Eu sinto raiva” ou “Eu me sinto decepcionado ou
“Eu me sinto magoado” claramente comunicam sentimentos e ni
julgamentos. Mas, é claro, para uma pessoa empenhada em culpar e
xingar a outra, há uma maneira de desviar este conselho: “Eu sint:
raiva que você está sendo tão egoísta.” “Eu me sinto decepcionao
Diferenças Reeonciliáveis 347

quando você é tão cruel.” “Eu me sinto machucado por você estar
sendo tão idiota.” E provável que o ouvinte ouça a acusação - egoísta,
cruel, idiota — mais do que qualquer expressão de sentimentos.
Há uma resposta a esta distorção também: exclua todas as refe­
rências à outra pessoa. Em vez de “Eu me sinto irritado que você está
sendo tão egoísta” ou “Eu me sinto decepcionado quando você é tão
cruel”, tente “Eu sinto raiva por todo esse incidente” ou “Eu me sinto
muito desapontado”.
Sim, claro, há outra brecha. Dependendo do contexto, do tom
de voz e da expressão facial, uma declaração como “Eu me sinto irri­
tado com todo esse incidente” poderia comunicar “Você sabe exata­
mente o motivo pelo qual estou com raiva, você fez a coisa covarde
que me deixou com raiva e vai pagar por isso.” Quando a raiva é in­
tensa, pode ser impossível não comunicar algum tom de julgamento
e culpa, não importa qual seja a escolha da palavra. A expressão de
raiva pode então levar à defensividade e contra-ataque em um par­
ceiro, uma situação que o foco nos sentimentos do orador foi elabo­
rada para ser evitada.
Se você deseja fazer uma abordagem para mudança no contex­
to da aceitação, você precisa estar ciente desses maus usos da “Lin­
guagem do Eu”. No entanto, uma genuína expressão de sentimen­
tos, sem qualquer referência ao parceiro, é, com frequência, um bom
início para uma conversa. E é, particularmente, um bom começo
quando essa expressão inclui seus sentimentos ocultos e brandos.
Lembre-se do Capítulo 4 a distinção entre emoções superficiais e
ocultas. Podemos sentir raiva, mas também sentir mágoa. Podemos
sentir ressentimentos, mas também decepção. Podemos nos sentir
irritados, mas também negligenciados. Essas emoções ocultas mais
brandas, menos óbvias podem captar o interesse, a atenção e a em­
patia de nosso parceiro.
Embora comentários como “Estou realmente com raiva”, “Es­
tou realmente desapontado” e “Sinto-me negligenciado e ignorado”
sejam um bom início para uma conversa, é claro que mais precisa
348 Mudança estabelecida por meio da comunicação

ser dito. A menos que o gatilho para esses sentimentos seja óbvio,
seu parceiro pode perguntar a si mesmo ou diretamente a você: “Por
que você está com raiva?” ou “O que fez você ficar desapontado?”
Isso nos leva ao próximo tópico: como podemos falar sobre nossos
parceiros sem atacá-los.

Falar sobre um comportamento específico de seu


parceiro, ao invés de suas características de personalidade
Para evitar a acusação inerente a uma afirmação como “Eu sin­
to raiva porque você é tão egoísta” e para evitar a falta de referência
em uma declaração como “Eu sinto raiva”, um conselho comum é
expressar seus sentimentos como reação a um comportamento espe­
cífico de seu parceiro: “Sinto-me irritado quando você chega tarde e
não me telefona” ou “Estou desapontado por você ter esquecido que
eu tinha uma consulta médica hoje”. Com este tipo de mensagem,
expressamos os nossos sentimentos e indicamos aquilo a que esta­
mos reagindo, mas não atacamos o caráter dos nossos parceiros nem
questionamos a sua personalidade ou os colocamos na defensiva.
Compare “Eu sinto raiva que você é tão egoísta” com “Eu me senti
ignorado quando você não me perguntou sobre o meu dia.” Embora
um parceiro, provavelmente, não goste de ouvir qualquer comentá­
rio, o primeiro convida para uma reação defensiva e discussão (“Eu
não sou egoísta, você é o egoísta”), enquanto que o segundo convida
à compreensão.
Assim como na “Linguagem do Eu”, comentários específicos
também podem ser sabotados. Adriana poderia especificar o compor­
tamento de Marcelo de prestar atenção a outras mulheres dizendo “Eu
fico braba quando você fica babando por outras mulheres” ou “quan­
do você encara outras mulheres”. Embora essas declarações não conte­
nham descrições de personalidade, cada uma delas contém alguma
observação negativa que poderia levar à defensiva e discussão: “Eu não
estava olhando”.
Diferenças Reeonciliáveis 349

Uma abordagem mais construtiva seria Adriana evitar palavras


carregadas como “encarar” ou “babar” e em vez disso, descrever seu
comportamento de forma mais neutra. Por exemplo, ela poderia dizer
“Eu não gostei quando você olhou de relance para o decote da Susi”
ou “Eu fiquei com raiva quando você olhou a Esther de cima a baixo”.
Com mensagens como estas, ela vai comunicar numa linguagem clara
e detalhada seus exatos sentimentos e o comportamento específico
dele, o qual levou a esses sentimentos.
Será fácil para Adriana ter essa abordagem? Talvez não. Ela
pode achar falso usar essa linguagem inexata que não expressa com
precisão sua experiência. Ou se o comportamento de Marcelo era su­
til, ela poderia não ter certeza exatamente do que causou seus senti­
mentos, da mesma forma que o marido que acabou se sentindo com­
petindo e com inveja de sua esposa após uma festa, foi incapaz de
identificar a fonte de seu mau humor. Ou ela poderia estar errada so­
bre o que causou seus sentimentos. Adriana pode atribuir sua infelici­
dade a sua antipatia por Susi ou Esther e suas roupas provocantes,
pois ela está apenas vagamente consciente de que foram as ações de
Marcelo, mais do que a maneira de vestir das outras mulheres, que a
perturbou. Finalmente, concentrar-se no comportamento específico
pode ser um mau conselho para Adriana, porque poderia obscurecer
uma questão maior de ansiedade, tal como o comprometimento de
Marcelo com o relacionamento deles. Sem abordar isso, ele poderia
nunca mais olhar para o decote de mulheres, mas o problema de com­
prometimento permanecería.
Apesar dessas dificuldades, o foco no comportamento específico
será mais construtivo do que um foco em traços mais amplos de per­
sonalidade. Quando conhecemos as dificuldades desse foco, podemos
aceitar alguma luta e confusão e persistir até descobrirmos as coisas
que realmente incomodam cada um.
350 Mudança estabelecida por meio da comunicação

--------------------------------------------------- -
Dica 1: Ao discutir problemas com seu parceiro, primeiro encontre um mo­
mento e um lugar onde vocês se sintam confortáveis, razoavelmente calmos
e receptivos um ao outro. Depois, fale sobre suas próprias reações emocio­
nais ao comportamento específico de seu parceiro. Mantenha o foco no
que você sente ao invés de no que seu parceiro sente. Se você puder, tente
descrever suas emoções ocultas mais brandas, assim como suas emoções
superficiais. Descreva o comportamento do seu parceiro que o incomodou
da maneira mais específica e neutra possível.
\ >

ORIENTAÇÕES PARA ESCUTAR SEU PARCEIRO

Enquanto é típico pensarmos sobre comunicação com o signifi­


cado de “como nós falamos” ou “como nossos parceiros falam,” há
uma outra parte importante da comunicação a considerar: como nós
e nossos parceiros escutamos. Aqui novamente, quando estamos com
mais cautela, com consciência plena (mindful), alguns conselhos ge­
rais podem ser úteis.

Escutar o que seu parceiro está dizendo


Escutar é uma das primeiras vítimas dos conflitos de casais. A
medida que os desentendimentos entre parceiros escalam, cada um
afirma seu ponto de vista e produz suas evidências, as quais entram
por um ouvido e saem pelo outro. As interrupções de cada um tor­
nam impossível manter, até mesmo, uma aparência de escuta. E quan­
do os parceiros permitem que cada um tenha a sua vez de falar sem
interrupção, eles usam seu silêncio para planejar sua resposta, ao invés
de ouvir o que o outro diz.
Terapeutas e outros conselheiros foram além de simples incenti­
vos quanto à escuta e criaram uma maneira de garantir que os parcei­
ros não apenas atendam ao que o outro está dizendo, mas também o
compreendam verdadeiramente. A estratégia é chamada de “escuta
ativa”, e exige que os parceiros alternem entre os papéis do orador e
Diferenças Reconciliáveis 351

do ouvinte. O ouvinte deve parafrasear ou resumir o que o orador


disse, para a concordância do orador, antes que o ouvinte tenha a
chance de dizer sua parte. O ouvinte não tem que concordar com a
posição do orador, mas deve demonstrar sua compreensão dessa posi­
ção. Aqui está um exemplo em que Tony tenta ouvir uma preocupa­
ção de sua esposa, Rose.

Rose: Eu estou incomodada com todas as nossas discussões so­


bre as crianças. Eu acho que elas são desnecessárias - não deve­
riamos tê-las - e elas entristecem as crianças.
Tony: Então você não gosta das discussões e você acha que as
crianças também não.
Rose: Sim, mas é mais do que isso. Acho que deveriamos ser ca­
pazes de discutir nossas diferenças sem brigar. E eu acho que as
discussões podem ser prejudiciais para as crianças.
Tony: Você acha que as brigas são prejudiciais à saúde mental
das crianças?
Rose: Sim. Eu acho que isso faz com que se sintam inseguras.
Talvez elas se perguntem se vamos ficar juntos.
Tony: Então você acha que devemos ser capazes de discutir as
nossas diferenças sem brigarmos, e se isso acontecer, você acha
que seria melhor para as crianças. Elas se sentiriam mais seguras.
Rose: Sim, isso mesmo.

Neste exemplo, Rose passou sua mensagem para Tony. Se ele


concorda ou não, ele genuinamente compreendeu o que ela tinha a
dizer. A comunicação aconteceu. Se fosse assim, Rose se sentiria es­
cutada, entendida e validada por Tony. Ela provavelmente estaria
mais aberta ao ponto de vista dele se ele quisesse expressá-lo. Mesmo
que Tony não concordasse com Rose, ele teria compreendido algu­
ma coisa importante sobre ela. A conexão que fizeram a respeito da
preocupação dela poderia, facilmente, aumentar a proximidade en­
tre eles.
352 Mudança estabelecida por meio da comunicação

Não havia nada particularmente complicado na mensagem de


Rose, mas seria fácil, até mesmo nesta simples comunicação, algo ir mal.
Se ela colocasse a mensagem acusando-o, Tony teria dificuldade em ouvi-
la. Rose poderia ter dito: “Eu não sei por que você sempre discute comigo
sobre as crianças. Isso realmente as machuca.” Nesta mensagem ela coloca
a culpa em Tony (é “você discute”, não “nós discutimos”), e ela usa a pala­
vra incendiária “sempre”. Então Rose comunica que Tony é culpado e
que ele sempre tem esse comportamento condenável. Tony provavelmen­
te reagiria fortemente a essa mensagem. Mesmo que ele não se defendesse
e contra-atacasse, poderia ignorar Rose e se distanciar. Provavelmente ele
não seria receptivo para ouvir mais nada dela.
Mesmo se Rose não atacasse abertamente Tony e transmitisse as
mensagens como no exemplo acima, ele ainda poderia se sentir na de­
fensiva e responder de maneira que distorceria a mensagem e desviaria
a discussão.

Rose: Eu estou incomodada com todas as nossas discussões so­


bre as crianças. Eu acho que elas são desnecessárias - não deve­
riamos tê-las - e elas entristecem as crianças.
Tony: (defensivamente) Então você não aguenta as simples dis­
cussões que temos.

Aqui Tony sutilmente distorce a colocação de Rose, interpretan­


do sua revelação de que “eu estou incomodada com todas as nossas
discussões” como uma fraqueza dela: “você não aguenta” as discussões.
Chamar os conflitos de “simples discussões” insinua que ela não su­
porta o que qualquer outra pessoa comum conseguiria. Veja onde isso
pode levar.

Rose: Eu não disse que não conseguia aguentar; Eu disse que


me incomodava com isso.
Tony: Bem, você parece estar tão incomodada que eu acho que
você não consegue aguentar.
Diferenças Reeonciliáveis 353

Rose: Não é uma questão de saber se consigo ou não; Eu já te­


nho aguentado demais. E uma questão de saber se é bom ou
apropriado para as crianças.

Agora eles estão bem dentro de uma briga sobre suas discus­
sões referentes às crianças. Um ouvinte pode fazer uma perversão
ainda mais sutil da mensagem do orador, reafirmando as palavras do
orador precisamente, mas acrescentando uma ou duas palavras apa­
rentemente inocentes.

Rose: Eu estou incomodada com todas as nossas discussões so­


bre as crianças. Eu acho que elas são desnecessárias - não deve­
riamos tê-las — e elas entristecem as crianças.
Tony: Pois então você quer se sentir incomodada com todas as
nossas discussões sobre as crianças.

Ao jogar no 1 você quer se sentir”, Tony acusa Rose de ficar in­


comodada intencionalmente. Ele insinua que a angústia dela é por sua
própria culpa. Vamos ver onde isso vai dar:

Rose: Eu não disse que queria me incomodar. Eu disse que esta­


va incomodada.
Tony: Mas você tem algum controle sobre suas emoções, não
tem? Você não é uma vítima de suas emoções, é?
Rose: Claro que não sou uma vítima das minhas emoções.
Tony: Então, se você se sente mal, você deve querer se sentir
mal.

Então, agora os dois estão dentro de uma discussão que parece


sondar questões filosóficas e psicológicas sobre o controle de reações
emocionais, mas é realmente uma briga sobre de quem é a culpa do
conflito. Tony se sente culpado pelas discussões sobre as crianças e,
portanto, tenta culpar Rose por estar chateada com essas brigas.
354 Mudança estabelecida por meio da comunicação

As tentativas de resumir as palavras do orador podem incluir


distorções muito mais óbvias do que as dos exemplos anteriores. O
ouvinte pode opinar sobre a mensagem do orador ou ridicularizar esta
mensagem em seus supostos resumos.

Rose: Eu estou incomodada com todas as nossas discussões so­


bre as crianças. Eu acho que elas são desnecessárias — não deve­
riamos tê-las - e elas entristecem as crianças.
Tony: Você acha que temos discussões demais sobre as crianças.
Mais do que o casal ideal que nunca tem conflitos e ambos são
sempre doces e agradáveis.

Aqui Tony dá uma opinião sobre o que poderia estar acontecen­


do na mente de Rose, isto é, que ela está comparando suas brigas com
algum relacionamento ideal. No entanto, a mensagem de Tony real­
mente serve para invalidar a colocação de Rose. Dentre tantas pala­
vras, ele está dizendo: Seus sentimentos não são justificados porque
você está comparando nossas discussões normais com seu ideal irreal.
Vejamos um exemplo final no qual o ouvinte, com a intenção
de resumir a mensagem do orador, ridiculariza essa mensagem.

Rose: Eu acho que deveriamos ser capazes de discutir nossas di­


ferenças sem brigar. E eu acho que as discussões podem ser pre­
judiciais para as crianças.
Tony: Então você acha que nossas pequenas briguinhas vão fa­
zer as crianças enlouquecer!

Aqui Tony minimiza as discussões (“pequenas briguinhas' e


exagera o possível impacto (“fazer as crianças enlouquecer”) numa
mensagem que está longe de capturar as preocupações de Rose, mas as
invalida ridicularizando-as.
Até agora temos focado apenas no conteúdo verbal da mensa­
gem do ouvinte. A forma como o ouvinte se comunica não verbal­
Diferenças Reeonciliáveis 355

mente — a postura, o tom de voz e a expressão facial — pode obscure­


cer essa mensagem. Por exemplo, Tony poderia fazer verbalmente um
comentário exato, tal como “Você está realmente preocupada que
nossas discussões irão fazer as crianças se sentirem inseguras”, mas di­
zer com um tom de voz e de maneira que comunicam compreensão e
simpatia. Ou ele poderia dizer isso em um tom de voz e maneira que
comunica “Essa é a ideia mais louca que eu já ouvi.”
Por que é que os ouvintes têm tanta dificuldade com o simples
pedido para resumir o que o parceiro está dizendo? As complicações
normalmente surgem quando o ouvinte se sente culpado ou desafiado
pela mensagem do orador. O ouvinte, em seguida, faz uma declaração
que pode tentar capturar as preocupações do orador, mas ao mesmo
tempo invalida essas preocupações.
A complicação para os casais é que qualquer conversa sobre um
problema comum é susceptível de incluir alguma implicação de culpa.
Quando o foco está em algo que está incomodando a um dos parcei­
ros no relacionamento, é impossível comunicar isso sem também co­
municar alguma acusação. Pela última vez, vamos considerar a mensa­
gem inicial do orador:

Rose: Eu estou incomodada com todas as nossas discussões so­


bre as crianças. Eu acho que elas são desnecessárias - não deve­
riamos tê-las - e elasentristecem as crianças.

Mesmo se Rose combinasse essas palavras não recriminatórias


com um estilo de discurso não acusatório, há uma clara mensagem de
culpabilidade. Ela está sugerindo que Tony não deveria estar fazendo
o que está fazendo para contribuir com as discussões.
Certamente, ela não está transferindo toda a culpa para ele. Mas
Tony, conhecendo Rose muito melhor do que nós, pode ver com pre­
cisão que a mensagem agradável é uma fachada para a verdadeira
mensagem subjacente “você é a causa de nossas discussões que pertur­
bam a mim e as crianças.” Ou Tony pode estar tão resistente que ele
356 Mudança estabelecida por meio da comunicação

responde até mesmo a uma implicação de culpa compartilhada com


atitude defensiva.
Os desafios de escutar o seu parceiro quando ele ou ela está
descrevendo uma dificuldade em que temos algum papel são gran­
des, como as ilustrações acima indicam. No entanto, a recompensa é
imensa. Quando somos capazes dar voz às nossas mais profundas
preocupações e questões e ter a pessoa que mais amamos ouvir e va­
lidá-las como razoáveis, mesmo que nosso parceiro não concorde
com elas ou não as veja da mesma maneira, é um poderoso impulso
à intimidade emocional. Não nos sentimos mais sozinhos com as
nossas ansiedades. Mesmo se estas não sejam ou não possam ser
prontamente tratadas pela resolução de problemas ou por mudanças
apropriadas no comportamento, o mero fato de serem ouvidas e
compreendidas pode ser reconfortante.
Devido aos desafios de ouvir nossos parceiros descreverem pro­
blemas em seu relacionamento conosco, inevitavelmente tropeçare­
mos às vezes, enquanto eles estarão tentando nos escutar. A aceitação
desses tropeços e a persistência diante deles pode significar que nós as­
seguramos nossos parceiros, e eles nos asseguram, com essa experiên­
cia especial de ser ouvidos e validados enquanto expressamos algo de
grande importância - uma preocupação sobre o nosso relacionamento
com a pessoa que mais amamos.
-------------------------------------------------------------------------------------- -
Dica 2: Tente mostrar a seu parceiro que você o entende, resumindo a men­
sagem dele antes de incluir a sua própria. Não dê opinião ou imponha sua
própria posição. Tente ver a validade do que seu parceiro está dizendo e
comunique essa validação. Lembre-se que a compreensão não significa con­
cordância e que há muitas maneiras de ver qualquer situação. Comunicar
que seu parceiro tem um ponto de vista válido aumentará as chances de que
ele ou ela também vai ouvir e validar o seu ponto de vista.
\ _
Diferenças Reconciliáveis 357

ORIENTAÇÕES PARA NEGOCIAR ACORDOS RAZOÁVEIS

Melhor dobrar do que quebrar.

Scottish proverb

Um acordo é uma solução pela qual cada lado ganha o


que nenhum dos lados queria.
Evan Esar, 20,000 Quips and Quotes (1968)

O homem que diz que está disposto a chegar a um


acordo geralmente julga mal as distâncias.
Evan Esar, 20,000 Quips and Quotes (1968)

A ideia de que o casamento envolve acordos é provavelmente tão


antiga quanto o próprio casamento. O que é mais recente é a ênfase no
processo de resolução de problemas, no qual os parceiros negociam e se
comprometem como meio de lidar com suas diferenças. Questões co­
merciais e legais, em que as pessoas elaboram acordos detalhados entre
as partes, têm influenciado a instituição do casamento. Observa-se que
casar e criar uma família é, em parte, um negócio e é governado pela lei.
A alta frequência de divórcios tem alertado a maioria de nós para a pos­
sibilidade de que nosso casamento pode não durar para sempre e tem
incentivado uma visão pragmática de autoproteção diante dessa possibi­
lidade. Jovens apaixonados são forçados a um relacionamento descon­
fortável com acordos pré-nupciais e planejamento imobiliário.
Algumas abordagens para a terapia de casal e muitos livros de
autoajuda têm defendido soluções racionais de problemas no casa­
mento. Os parceiros devem se sentar, de uma maneira profissional, e
discutir suas diferenças, negociar e barganhar para criar acordos, regis­
trá-los e deixar que estes orientem o seu comportamento quase como
se fossem contratos legais. Às vezes, os casais são encorajados a partici­
par desse processo no início de seus relacionamentos para que as ex­
pectativas possam ser esclarecidas e os problemas evitados. Vejamos
alguns dos conselhos específicos comumente oferecidos aos casais.
358 Mudança estabelecida por meio da comunicação

Definir o cenário para a solução de problemas

Muitas vezes os casais tentam resolver problemas no momento


em que estão mais incomodados por eles. Nestas horas, os problemas
parecem dramáticos, e os casais estão com toda a energia para se con­
centrar neles. Mas os parceiros também podem estar com muita raiva
para entrar num acordo ou estão tão aborrecidos para avaliar possíveis
soluções. Eles também podem não ter discutido o problema o sufi­
ciente para compreendê-lo completamente. Tão semelhante ao conse­
lho acima sobre a comunicação em relação às dificuldades de relacio­
namento, os casais são aconselhados a se envolver na solução de pro­
blemas somente quando estão calmos e sem pressa e em um lugar
confortável para ambos. O único problema com este conselho é que
os casais, frequentemente, não querem se concentrar em questões
controversas quando estão relaxados e se sentindo bem entre si. As­
sim, este conselho pode fazer com que os casais evitem completamen­
te as questões que os incomodam. No entanto, é mais provável que
um problema tenha mais chances de ser resolvido quando ambos es­
tão num estado emocional confortável mais positivo.

Focar somente em um problema específico de cada vez

As discussões de problemas frequentemente aumentam em in­


tensidade e se expandem em conteúdo, tanto horizontal como verti­
calmente. Horizontalmente, o conteúdo inclui mais e mais tópicos es­
pecíficos; verticalmente, o conteúdo pode se expandir de tópicos espe­
cíficos para categorias mais amplas. Rose e Tony podem começar com
uma discussão sobre suas brigas na frente das crianças, mas acabar
com uma discussão de suas habilidades como pais e o quanto cada um
realmente ama os filhos. O conselho para se concentrar em um tópico
específico por vez destina-se a evitar esta tendência.
Entretanto, pode ser importante que os casais explorem temas
mais amplos, assim como problemas específicos. Por exemplo, Rose
pode ter uma questão mais importante para falar para Tony do que
Diferenças Reeonciliáveis 359

apenas sobre o fato de que eles não deveríam discutir na frente das
crianças. Ela pode estar preocupada que eles como casal, e Tony
como pai, não estejam considerando o impacto de suas ações e pala­
vras sobre os filhos. Não observar o impacto de suas discussões sobre
as crianças pode ser apenas um exemplo. Ela também pode estar
preocupada que ele não parece notar o impacto de seus diferentes
humores sobre as crianças. O desafio para Rose e Tony é poder dis­
cutir este tema amplo, e talvez até mesmo o tema de Tony sobre
Rose superproteger as crianças, sem que a discussão se torne uma
confrontação confusa e angustiante que fale de tudo, menos do que
realmente deveria ser discutido. Assim, nosso desafio é restringir
nosso foco em um problema particular, mas sem limitar uma explo­
ração completa e ampla desse problema.

Separar a definição do problema da solução do problema

Com frequência, um ou ambos os membros de um casal podem


gerar soluções antes que o problema tenha sido claramente definido e
acordado. Como vimos no Capítulo 8, essa tendência leva a soluções
simplificadas demais que são tóxicas. Portanto, faz sentido, primeiro,
ter uma abordagem lógica e sistemática para definir o problema. E o
conselho comum aos casais sugere que eles definam cuidadosamente o
problema antes de tentar resolvê-lo.
Mas o pensamento e a emoção humanos raramente seguem a
sequência sincronizada que a lógica ditaria. Âs vezes, a consideração
de possíveis soluções ajuda a definir o verdadeiro problema. Vamos
supor que Rose levantou a questão das brigas na frente das crianças e
que Tony, ignorando nosso conselho, propôs que estaria disposto a le­
var estas discussões para um local privado, longe dos filhos se ela sim­
plesmente pedisse isto naquele momento. Embora essa solução resol­
vesse o problema como Rose inicialmente o definiu, ela não ficaria sa­
tisfeita com esta proposta. Ao considerar essa solução e sua conversa
com Tony sobre isto, ela passou a perceber duas facetas importantes
360 Mudança estabelecida por meio da comunicação

do problema: (1) Além de qualquer impacto direto que tinham so­


bre os filhos, as discussões a perturbavam e tornavam-na menos ca­
paz de lidar com as crianças. Simplesmente mantê-las longe de suas
brigas, portanto, lidaria somente com o impacto direto das discus­
sões sobre elas. Mas não trataria do impacto indireto: como as brigas
incomodavam a ela e a tornavam menos adequada como mãe. (2)
Ela estava em parte angustiada porque Tony não estava sintonizado
com os filhos. Ela queria que ele notasse o impacto das brigas, assim
como o impacto de seu próprio comportamento sobre eles. Se ela ti­
vesse que avisá-lo quando as crianças fossem afetadas, isso não resol­
vería sua preocupação.

Gerar soluções e negociar um acordo

Uma vez que um problema foi definido de modo que ambos os


membros concordem exatamente com qual ele é, podem ir para a fase
da solução, na qual geram, avaliam e negociam idéias para resolvê-lo.
Um conselho comum é “brainstorm” (tempestade de idéias), isto é,
gerar tantas idéias quanto possível, sem avaliar a sua qualidade. Con-
centrar-se na avaliação de soluções pode frustrar a criatividade ao ge­
rá-las. Muitas vezes, um parceiro entusiasmado propõe uma possível
solução para, depois, ficar frustrado com a reação do parceiro que diz:
“Isso nunca funcionará”.
Depois que todas as soluções possíveis foram geradas, aconse-
lha-se os casais a passar por sua lista e, sistematicamente, avaliar os
itens, identificando os prós e contras de cada um. Este processo de
avaliação torna-se uma negociação sobre possíveis soluções, na qual os
casais fazem concessões mútuas até chegar a um consenso sobre uma
solução ou conjunto de soluções a implementar. Neste ponto, os ca­
sais são incentivados a escrever a solução; o mero ato de colocá-la no
papel vai torná-la mais concreta para eles. Eles são, então, aconselha­
dos a implementar a solução e ver se ela é útil. Eles podem mais tarde
se sentar e discutir como a solução funcionou e, talvez, modificá-la
conforme um novo acordo.
Diferenças Reeonciliáveis 361

Na avaliação de Tony e Rose sobre possíveis soluções, Rose poderia


pressionar para adiar as discussões deles para mais tarde. Tony ficaria relu­
tante em aceitar esse plano, porque sabe que ela pressionaria por um
“mais tarde” muito mais tarde. Ele poderia concordar em prorrogar sua
discussão se concordassem em definir um período de tempo específico
para retomar mais cedo a conversa do que bem mais tarde. Mesmo se
conseguissem chegar a algum acordo sobre essa solução, Rose ficaria preo­
cupada, com base em sua experiência com Tony, que ele pudesse pressio­
nar para ter a última palavra antes que eles adiassem a discussão. Seria di­
fícil para ela voltar a dar atenção para as crianças se ainda estivesse furiosa
com o comentário final dele. Assim, mesmo soluções aparentemente sim­
ples e concretas, como concordar em adiar a discussão de um conflito, re­
querem diálogo e negociação antes que seja possível um acordo.
Resolução de problemas pode ser um processo difícil e tedioso,
mas se ela resulta em um novo comportamento que resolva um velho
problema, vale muito a pena o esforço. E mais provável que a resolução
de problemas seja bem-sucedida quando aborda ações nas quais as emo­
ções desempenham pouco ou nenhum papel. Os casais podem usar es­
tratégias racionais de solução de problemas para lidar com conflitos so­
bre tarefas domésticas, horários de trabalho e cuidados com os filhos
com mais facilidade. No entanto, pode ser bem complicado usar estas
estratégias para resolver conflitos sobre como eles discutem ou como ex­
pressam sua raiva. Tony e Rose podem negociar sobre quem lava a rou­
pa mais facilmente do que podem negociar sobre suas brigas na frente
das crianças. Negociações sobre comportamentos são especialmente di­
fíceis porque, normalmente, requerem emoções positivas. Estar “a fim”
é, em grande parte, irrelevante para cumprir com um acordo sobre
quem vai aspirar a casa ou pegar as crianças na terça-feira. No entanto,
estar “a fim” é relevante para um acordo sobre ser mais afetuoso ou ter
sexo ou estar atento. Você pode facilmente seguir com o primeiro, mes­
mo se você não sente vontade. Não é assim com o último.
Mesmo quando a estratégia de solução racional de problemas
funciona - quando os parceiros abordam um problema que se presta à
362 Mudança estabelecida por meio da comunicação

estratégia, quando são capazes de seguir uma sequência lógica e quando


podem concordar com uma solução possível - o resultado é, com fre­
quência, surpreendente. Parceiros podem chegar a uma solução agradá­
vel, mas nunca implementá-la! Rose e Tony lutaram com a questão de
suas brigas diante das crianças. Após um esforço considerável, elabora­
ram um plano no qual eles adiariam suas discussões; acordariam um
determinado momento para isto; Tony não iria ironizar Rose nesse
meio tempo; e Rose iria parar o que ela estava fazendo e falar na hora
combinada. Nas semanas que se seguiram ao acordo sobre este plano,
Rose pediu um adiamento apenas uma vez. Tony concordou, mas am­
bos se esqueceram de voltar ao tópico mais tarde. Em várias ocasiões,
nem Tony nem Rose atentaram para solução quando entraram em um
desacordo sobre as crianças na frente delas. Essa falta de implementação
do acordo foi, em parte, devido ao fato de que seus desentendimentos
diante das crianças não eram tão intensos como antes. Ao refletir sobre
o problema, ficou claro para Rose que ela só queria que suas preocupa­
ções fossem ouvidas e levadas a sério por Tony. O processo de resolução
de problemas conseguiu isso. Depois, ambos ficaram mais cuidadosos
sobre como lidavam com desacordos na frente das crianças. Assim, sua
“solução” tornou-se irrelevante quase tão logo foi criada. No entanto, a
solução de problemas foi bem sucedida.

-------------------------------------------------------------------------------------- s
Dica 3: Tente resolver os problemas quando ambos os parceiros estiverem
relativamente calmos e não incomodados com a questão. Tente definir o
problema cuidadosamente antes de considerar as possíveis soluções. Con­
sidere tantas possibilidades quanto cada um de vocês pode pensar e avalie
seus possíveis efeitos antes de escolher qualquer uma delas. Negocie a so­
lução mais adequada e experimente-a, revendo-a conforme necessário com
base em como ela funciona. No entanto, seja flexível na sua resolução de
problemas porque, como os nossos exemplos ilustraram, às vezes pode ser
útil flexibilizar as orientações. Em caso de dúvida, permita que a consciência
no momento presente e a consciência em retrospectiva de seu relaciona­
mento molde as orientações gerais - elas não estão escritas em pedra.
\______________________ ___________________________________ >
Diferenças Reconciliáveis 363

RECAPITULANDO
Neste capítulo, revisamos algumas das regras de comunicação mais comuns. Descon­
sideramos conselhos genéricos e óbvios que simplesmente encorajam as pessoas a
manter uma determinada atitude ou estados emocionais sem qualquer informação
sobre como alcançar esse estado. Em seguida, focamos três grandes categorias de
conselhos que dão prescrições comportamentais sobre o que fazer, levando-nos a su­
gerir três dicas para a comunicação.
1. Ao discutir problemas com seu parceiro, primeiro encontre um momento e um lu­
gar onde ambos se sintam confortáveis, razoavelmente calmos e receptivos um ao
outro. Então, fale sobre suas próprias reações emocionais ao comportamento espe­
cífico dele, incluindo suas emoções mais brandas e ocultas, bem como suas emo­
ções superficiais e descrevendo o comportamento de seu parceiro de forma mais
específica e neutra possível.
2. Ao escutar o seu parceiro, sintetize a sua mensagem sem distorcê-la ou dar qual­
quer opinião e tente capturar sua validade. Lembre-se que compreensão não signi­
fica concordância.
3. A resolução de problemas deve acontecer quando ambos estão relativamente cal­
mos e definiram cuidadosamente o problema. Depois considere todas as possíveis
soluções, avalie seus prós e contras, negocie uma alternativa realizável e experi­
mente-a, revisando-a, mais tarde, conforme necessário.

Como a maioria dos conselhos, estas dicas podem ser úteis se você entender e acei­
tar suas limitações, se você for flexível em seu uso, adaptá-las conscientemente
(mindfully) com base em sua compreensão de você e seu parceiro e estar preparado
para falhas ocasionais.

Exercício: Comunicando-se
melhor com seu parceiro(a)

Embora algumas das regras discutidas neste capítulo sejam


úteis para uma conversa diária, elas são aplicáveis, principalmente,
para discussões sobre problemas de relacionamento. São estas dis­
cussões que, provavelmente, podem se transformar em acusação,
defensividade, contra-ataque e afastamento. Portanto, são elas que
precisam da estrutura que as regras podem fornecer.
Aplicando essas orientações ao seu conflito central de relacio­
namento, responda às perguntas abaixo.
364 Mudança estabelecida por meio da comunicação

• Normalmente, qual é um bom momento e lugar onde ambos fi­


cariam confortáveis e receptivos e poderiam discutir esta questão
de forma construtiva?

• Como você poderia dizer a seu parceiro sobre sua reação emo­
cional a um comportamento particular dele ou dela relacionado
com o conflito central? Escreva uma mensagem que você pode­
ria dar.

• Você provavelmente tem alguma ideia sobre a mensagem que


seu parceiro quer transmitir a você relacionada ao conflito cen­
tral. O que você poderia dizer que iria resumir essa mensagem de
forma que a valide?

• Se você e seu parceiro chegam a um ponto de solução de proble­


mas desta questão, quais são algumas soluções concretas que po­
dem ser úteis (liste pelo menos uma coisa que você poderia fazer
diferente e uma coisa que seu parceiro poderia fazer diferente)?

Se você e seu parceiro têm lido este livro até este capítulo, vo­
cês poderiam tentar usar essas orientações de comunicação para
compartilhar, um com o outro, as análises DEEP (profundas) que vo­
cês fizeram sobre um problema central no relacionamento. Por
exemplo, ao descrever a análise DEEP (profunda) que você fez, você
Diferenças Reeonciliáveis 365

poderia descrever as sensibilidades emocionais que são tocadas em


você quando seu parceiro tem certos comportamentos. Você tam­
bém poderia usar as habilidades de escutar e resumir a mensagem
do seu parceiro quando ele descreve a própria análise DEEP (pro­
funda). Mesmo que seu parceiro não esteja lendo este livro, você
poderia, em um momento apropriado, usar essas orientações para
compartilhar com ele ou ela a sua análise DEEP (profunda) de um
problema central e ver as reações dele. Uma vez que você tenha
chegado a entender melhor os pontos de vista um do outro, você
pode até tentar utilizar a resolução de problemas para fazer algu­
mas mudanças comportamentais usando os conselhos acima.

PRÓXIMOS PASSOS

Como ilustramos amplamente neste capítulo, haverá momentos


em que diferentes humores e emoções impedem você ou seu parceiro
de usar essas regras apropriadamente. As vezes, essas boas regras serão
maus conselhos para o seu relacionamento. No entanto, frequente­
mente, podem ser úteis na comunicação com seu parceiro sobre suas
principais questões conflituosas. Sendo consciente (mindful) das ar­
madilhas que vocês ficam presos, aplicar estas regras permitirá que vo­
cês as usem de forma mais eficaz.
Apesar de nossos melhores esforços, às vezes nossas tentativas de
comunicação com nossos parceiros vão dar errado. Mesmo assim, sig­
nificativos obstáculos no esforço de falar sobre as coisas que mais nos
importam emocionalmente, também podem nos fornecer oportuni­
dades. Podemos aprender a evitar que uma situação ruim se agrave.
Podemos aprender a transformar uma situação ruim em algo benéfico
para o nosso relacionamento. No nosso próximo e último capítulo so­
bre mudança, nós consideramos a mudança sob as circunstâncias mais
difíceis quando as coisas vão mal entre nós.
14
A peça chave para a
mudança estabelecida
Responsabilizando se pela
mudança, mesmo quando
as coisas vão mal
Seja a mudança que você deseja ver...
Mahatma GAndhi

Eu queria mudar o mundo. Mas descobri que a única


coisa que se pode ter certeza de mudar é a si mesmo.
Aldous Huxley, Point Counter Point (1928)

O prazer mais doce advém das dificuldades superadas.


Publilius Syrus, lhe MoralSayings ofPubliiius Syrus: A Roman Slave (185 5

Pelo menos uma derrota ocasional é inevitável para aqueles que


buscam transformações - como os últimos três capítulos demonstra­
ram. Esforços para buscar mudanças repentinas e dramáticas geralmen­
te falham e, muitas vezes, tornam o problema pior. Novas abordagens
entre si são, muitas vezes, desmascaradas como simplesmente mais do
mesmo comportamento antigo porque é muito difícil reconhecermos
como nossa história de relacionamento entra em jogo em cada encontro
entre nós. O bom conselho é ruim porque não considera o contexto
emocional de nossos conflitos. As regras racionais tornam-se absurdas
porque caem na armadilha capturada por W. C. Fields, cujo conselho
Diferenças Reconciliáveis 367

para superar a insônia era “Dormir muito”. Mesmo quando fazemos


tudo certo, nossos parceiros podem ter boas razões para não responder
bem aos nossos esforços para mudá-los.
Agora, aqui está a boa notícia: Estar preparado para aceitar a
falta de mudança e estar ciente de como seu padrão atual de intera­
ção não resolve o problema e, com frequência, o torna pior dá aber­
tura para uma riqueza de oportunidades. Esta possibilita transfor­
mar o seu relacionamento em uma união pacífica e íntima que você
queria desde o início. Quando você aceita que seus esforços falha­
ram, você encabeça discussões sobre a mudança que você acredita
que deveria ter ocorrido. Seu parceiro pode até mesmo responder à
sua aceitação de que suas tentativas fracassaram, de forma que dimi­
nua a necessidade de mudança. Finalmente, você pode se sentir me­
nos desencorajado e frustrado do que se você tivesse sido obstinado,
fato que pode dar a oportunidade de seguir outros caminhos, mais
bem sucedidos de mudança.
Neste capítulo, mudamos nossa atenção para situações em que
as circunstâncias entre você e seu parceiro vão mal. E inevitável sentir
decepção diante dos resultados com esforços para criar mudanças, mas
você pode dar passos positivos para minimizar as situações de fracasso
ou para ganhar com elas quando ocorrem. Em vez de melhores regras
para se comunicar e agir, ofereceremos orientações mais flexíveis que
incorporam a aceitação dos fatos que podem acontecer e que se ajus­
tam para acomodar suas circunstâncias únicas.
Com essa abordagem condescendente, adaptável, de aceitação
e atenção plena (mindfulness), você pode ter sucesso na melhora do
seu relacionamento se algum esforço particular para fazer a mudan­
ça for bem-sucedido ou falhar. Você pode ganhar mesmo quando
você perde.
368 A peça-chave para a mudança estabelecida

PARA MUDAR SEU RELACIONAMENTO,


PRIMEIRO MUDE VOCÊ MESMO

Como você já viu muitas vezes, a maioria dos esforços para me­
lhorar os relacionamentos é direcionada para mudar nossos parceiros.
Uma transformação fundamental ocorre quando nos concentramos
nas mudanças que nós podemos fazer, e não nas que eles podem fazer.
Em vez de pressupor que somos culpados por quaisquer problemas,
essa mudança reconhece que só nós temos controle e responsabilidade
sobre nosso próprio comportamento. Da mesma forma, apenas nossos
parceiros têm controle e responsabilidade por suas próprias ações. E
estimulante saber que nós podemos mudar, ao invés de esperar, frus­
trados, por uma iniciativa de mudança por parte de nossos parceiros.
Esta noção de mudar a si primeiro como um meio de mudar o seu re­
lacionamento é a “peça-chave” da mudança deliberada.
Giane admirava Natan por suas muitas e excelentes qualidades.
Ele era um homem bom: honesto, generoso, trabalhador e compro­
metido com a família. Ela sabia que ele a amava e nunca seria infiel.
No entanto, algumas de suas dificuldades de comunicação eram frus­
trantes para ela. Muitas vezes Natan não a ouvia, distraía-se facilmen­
te quando ela falava com ele e a interrompia a cada frase.
Primeiro ela tentou falar com ele sobre o problema. Algumas
vezes Natan reconhecia sua dificuldade; outras vezes ele se defendia.
Mas nada parecia mudar, então Giane comprou-lhe um livro sobre
comunicação. Com alguma persistência de sua parte, ela conseguiu
que o parceiro lesse alguns capítulos. Ele reconheceu alguns pontos
valiosos no livro, mas, ainda assim, seu comportamento não pareceu
mudar. Finalmente, Giane propôs que fossem para uma aula de trei­
namento em comunicação oferecida pelo programa de extensão da fa­
culdade local. Mas nesse momento Natan bateu o pé. A aula não era
realizada em uma noite boa para ele. Além disso, ele estava cansado
das constantes queixas dela sobre sua “incapacidade de se comunicar”.
Ela deveria apenas aceitá-lo pelo o que e como ele era.
Diferenças Reeoneiliáveis 369

Esse confronto precipitou uma pequena depressão em Giane. Ela


não queria acabar com o casamento por causa algumas dificuldades apa­
rentemente simples de comunicação. No entanto, esses problemas eram
uma frustração diária para ela, diminuíam o valor das qualidades mais
importantes do parceiro e minavam seus sentimentos positivos por ele.
Em seu desespero com este problema, ela se afastou. Isso despertou mais
atenção e preocupação por parte de Natan, o qual realmente queria que
ela fosse feliz. Giane respondeu à sua dedicação, aproximou-se novamente
do parceiro, mas sabia que seus problemas não iriam desaparecer.
Neste ponto, ocorreu uma mudança fundamental em Giane.
Em sua frustração sobre a possibilidade de nunca efetuar uma mudan­
ça em Natan, ela decidiu que poderia parar com um evento irritante:
o hábito dele de continuar assistindo à televisão ou tentar ler o jornal
enquanto ele a escutava.
No passado, quando se queixava desse desvio de sua atenção,
ele argumentava que conseguia ouvi-la e ainda manter uma orelha
voltada para a televisão ou um olho no jornal. Assim, a televisão per­
manecia ligada e o jornal em seu colo.
Reunindo coragem, uma noite Giane disse a Natan que queria
conversar com ele, mas, antes disso, queria a televisão desligada e o
jornal longe de seu colo. Ele ficou irritado com o pedido e começou a
argumentar que poderia facilmente fazer as duas coisas ao mesmo
tempo. Ele lembrou uma ocasião anterior em que ela o acusara de não
tê-la escutado, mas provou que poderia se lembrar de tudo o que ela
tinha acabado de dizer, mesmo que ele estivesse olhando para a televi­
são. Devido ao fato de Giane ter considerado cuidadosamente esta
conversa com ele, e já tinha previsto sua reação, ela estava preparada
para este argumento. Aceitou seu ponto de vista, mas fez seu pedido
de qualquer maneira: “Você pode ser capaz de me escutar e assistir te­
levisão ou ler o jornal, mas é desconfortável e perturbador para mim.
Não consigo me concentrar no que estou dizendo quando eu fico me
perguntando se você está realmente escutando, então eu preferiría ter
sua atenção total quando eu tiver algo importante a dizer.”
370 A peça-chave para a mudança estabelecida

Giane tinha acrescentado a palavra importante para justificar sua


posição, a qual ela percebia que poderia ser muito extrema. No entan­
to, essa palavra serviu para estimular a curiosidade de Natan. Ele dis­
cutiu com ela um pouco, mas quando se convenceu de que ela não
seria persuadida, desligou a televisão com aborrecimento e disse,
“Tudo bem, o que é?” Giane insistiu que ele precisava colocar o jornal
de lado também. Frustrado, jogou o jornal sobre a mesa, mas estava
bem atento. Intimidada com a raiva dele, contou-lhe sobre um acon­
tecimento que tinha acontecido no trabalho naquele dia, tentando
torná-lo o mais interessante possível. Ao final de sua história, ele co­
mentou sarcasticamente: “Bem, isso certamente era algo muito im­
portante para eu desligar a televisão e deixar de lado o jornal”. Natan
voltou para a televisão e Giane subiu as escadas e chorou.
Devido ao fato de este primeiro incidente ter ido tão mal, Giane
quase desistiu de sua luta com Natan sobre a televisão e o jornal. No
entanto, ela sabia que não seria fácil conseguir que ele mudasse seus há­
bitos, e disse a si mesma que ela merecia ter toda a atenção dele. Ela
persistiu com seu plano; ela apenas iria cumprimentá-lo e trocar infor­
mações mínimas enquanto ele estivesse envolvido com sua televisão e o
jornal. Ela pediria para falar com ele sem nenhum dos dois. Às vezes ele
recusava ou adiava qualquer conversa. Havia também momentos frus­
trantes quando ele desligava a televisão e guardava o jornal com ressen­
timento ou discutia sobre a posição dela. Mas, gradualmente, estabele­
ceram um novo padrão no qual ele a escutava sem as distrações.
Mesmo durante esses momentos de conversa sem distração, ha­
via problemas. Às vezes a atenção de Natan vagava, especialmente
quando Giane ficava se repetindo. Noutros momentos, ela estava tão
carente para conversar com ele que, dada a total atenção de Natan, ela
aproveitava ao máximo sem pensar no que ele estava experimentando.
Além disso, ele com frequência a interrompia e falava ao mesmo tem­
po em que ela. Em uma tentativa de lidar com esses problemas, Giane
tentou conter sua tendência para o monólogo. Ela também decidiu
enfrentar as interrupções de Natan diretamente.
Diferenças Reconciliáveis 371

Como estava tão acostumada às interrupções de Natan e tão


acostumada a ceder a elas, muitas vezes, Giane não se dava conta des­
tes cortes no momento em que aconteciam. Só mais tarde durante a
conversa, como sua frustração por não conseguir expressar suas idéias
aumentava, ela percebeu que ele a estava interrompendo. Então, algu­
mas vezes, ela o criticava por estar lhe interrompendo, ele se defendia,
e uma discussão se seguiria. Só quando tomou consciência das inter­
rupções dele, no momento em que ocorriam, foi capaz de intervir de
modo que lhe permitiu evitar o corte, mas sem criar uma briga. Ela
diria: “Espere, eu ainda não terminei”, ou “Por favor. Você me inter­
rompeu. Eu não terminei”. Esses comentários, frequentemente, per­
mitiríam que ela continuasse sua comunicação com Natan.
Desnecessário dizer que Natan não ficava particularmente sa­
tisfeito com esses comentários. Estavam interrompendo suas inter­
rupções. Mesmo que eles não criassem necessariamente uma discus­
são, ele ficava frustrado pelos esforços dela em continuar falando.
Ele a deixava prosseguir com o que ela tinha a dizer, mas ficava fre­
quentemente irritado. Embora Giane vacilasse, algumas vezes, em
seus esforços, perguntando-se se ela tinha o direito de ser tão insis­
tente, questionando se valia a pena lidar com as reações negativas de
Natan, sentindo-se culpada por perturbar o status quo entre eles, ela
persistiu. Ela convenceu a si mesma: Claro que ele vai reagir negati­
vamente; estou perturbando seu estilo habitual. Mas tenho o direito
de ser escutada por ele.
Um divisor de águas aconteceu, paradoxalmente, quando ela
estava tão frustrada com a pressão que seus esforços criaram que es­
tava pronta para desistir. Ela explodiu com Natan: “Eu realmente
não quero criar tensão entre nós, mas eu estou num terrível dilema.
Eu posso deixar você me interromper e manter a paz, mas então eu
me sinto mal comigo mesma, que minhas idéias não merecem a sua
atenção. Ou eu posso parar suas interrupções e completar meus pen­
samentos, mas então eu crio tensão entre nós. Nenhuma das duas
formas parece funcionar.”
372 A peça-chave para a mudança estabelecida

Como suas emoções e palavras soaram tão verdadeiras, Natan


ouviu sua mensagem. Ele compreendeu a posição de Giane. Surpre­
endentemente ele a encorajou em seus esforços e, então, tentou inter­
rompê-la com menos frequência.
No entanto, lidar com as interrupções dele em público criou dife­
rentes desafios para Giane, do que lidar com estas privadamente. Ela te­
mia criar uma cena e não queria que seus amigos detectassem a tensão
entre eles. Mas depois de conseguir algum sucesso nos seus esforços quan­
do estavam a sós, ela os levou adiante na frente de outras pessoas. A prin­
cípio, interveio cautelosamente, quase se desculpando, quando ele a inter­
rompeu em público. A tensão que sua atitude criou foi dolorosa para Gia­
ne. O que ela não havia previsto, e o que lhe era ainda mais difícil, foi ver
o olhar chateado no rosto de Natan quando ela o deteve.
Com o tempo, os esforços de Giane foram recompensados. Na­
tan não só a escutava sem televisão e jornal como distrações como
também a interrompia menos. Ocasionalmente, ele a surpreendia, in­
terrompendo-se em sua própria interrupção e deixando que ela termi­
nasse seus comentários. Embora ele nunca fosse ser incorporado ao
“Hall da Fama dos Ouvintes”, ele a escutava com mais atenção. Ele
mudou de maneira muito clara e concreta - mas somente porque Gia­
ne tinha mudado primeiro.
Embora Giane não fosse inocente - ela tinha uma tendência a ser
prolixa - a maior parte desse problema estava claramente do lado de Na­
tan. Seria natural para Giane persistir em tentar fazê-lo mudar sua ma­
neira pouco atenciosa com ela. Mas, ao mudar seu próprio comporta­
mento, Giane não só teve que superar a ideia de que ela era a única certa,
como teve que enfrentar suas próprias dúvidas, medos e frustrações, as­
sim como as reações negativas de Natan e, finalmente, teve que lidar
com o fracasso repetido de seus esforços. No começo parecia injusto que
o ônus da mudança recaísse sobre ela, a pessoa que estava certa, mas no
final, como ela começou a ver Natan mudando gradualmente, a experi­
ência foi motivadora. Ela não teve que esperar - impacientemente — até
que ele mudasse. Ela poderia pegar as rédeas em suas próprias mãos.
Diferenças Reeoneiliáveis 373

Talvez mais importante do que as mudanças específicas que Natan


fez, no entanto, foram as mudanças que ocorreram no relacionamento
deles. Como uma fonte frequente de ressentimento diminuiu, Giane sen-
tiu-se mais confiante em relação a Natan, conseguiu ser mais leve com
ele, e ele respondeu da mesma forma. Além disso, como Natan estava
agora mais atencioso com Giane — ela tinha insistido que ele fosse assim -
ele se adaptou mais aos sentimentos e opiniões dela. Assim, Giane se sen­
tiu mais importante para Natan e ele, por sua vez, tornou-se mais impor­
tante para ela. As “pequenas” mudanças de Giane criaram “pequenas”
mudanças em Natan, e então, juntas, elas trouxeram grandes benefícios
para sua relação, aumentando intimidade um com o outro.

FAÇA MENOS 0 MESMO - E MAIS 0 DIFERENTE

Há sempre o perigo de que a mudança, mesmo uma mudança


em nós mesmos, revele-se mais do mesmo - o que parece novo é, na
verdade, mais uma variação do velho. A consciência do que está acon­
tecendo na relação — a consciência da “história” que você compôs e
tem usado desde o Capítulo 8 — pode impedir esse tipo de falsa mu­
dança. Com a atenção plena no que está acontecendo, você pode fazer
um esforço genuíno para realizar algo diferente.
Na seção anterior, pedimos que você primeiro fizesse uma mu­
dança em si mesmo. Nesta seção, nós solicitamos que você mude fazendo
algo verdadeiramente diferente. Nas seções a seguir, nós apontamos para
áreas específicas nas quais você pode fazer alguma coisa diferente.

Mais do que se queixar e criticar


proceda de maneira construtiva

Uma armadilha comum nos relacionamentos é ficar preso no


padrão de reclamar ou criticar o seu parceiro sobre um problema, mas
não fazer nada mais sobre ele, mesmo que a ação construtiva pudesse
374 A peça-chave para a mudança estabelecida

mudá-lo. Parafraseando Eleanor Roosevelt, alguns amaldiçoariam a


escuridão ao invés de acenderem uma vela.
Ao tentar criar mudanças na comunicação, era normal Giane
se queixar depois que Natan tinha deixado de prestar atenção nela e li­
gado a televisão ou para reclamar depois que ele a tinha interrompido.
Mas suas queixas só criavam discussões sem garantir as mudanças que
ela queria. O que era mais difícil para Giane - e seria para a maioria
de nós - era intervir no momento em vez de reclamar depois. Ela ti­
nha que se forçar a pedir a Natan para desligar a televisão e para colo­
car o jornal de lado antes de conversar com ele. Ela teve que conseguir
uma consciência no momento presente em torno das interrupções
dele enquanto elas ocorriam, para que ela pudesse intervir no mo­
mento de um corte e assim evitá-lo.
Consideremos outro exemplo de ação construtiva em vez de
reclamações. Zeca está chateado com o fato de Samantha ser contro­
ladora. Tudo tem que ser do seu jeito ou, nas palavras de Zeca, ela
“faz um escândalo”. E muito hábil em controlar a situação de modo
que a única alternativa razoável pareça ser a ação que ela deseja. E
normal para Zeca resmungar sobre Samantha, para dizer sarcastica­
mente “Eu acho que devemos fazer o que você quer fazer, porque
nunca fazemos do seu jeito”, ou para lamentar, “Vamos fazer do seu
jeito de novo.” Em outro momento, quando tudo está bem, longe
da cena de qualquer incidente relevante, ele pode até trazer o pro­
blema sobre o controle dela como uma questão a ser discutida. Sa­
mantha, geralmente, ignora o sarcasmo e lamúria dele. Quando ele
traz o problema para discussão, ela, normalmente, tenta justificar
sua postura.
E difícil para ele colocar seus desejos de forma construtiva e
assertiva no momento de uma tomada de decisão. Ela geralmente tem
um plano para suas atividades antes que Zeca tenha pensado em uma
alternativa. Como as decisões do dia-a-dia são muito mais importan­
tes para Samantha do que para Zeca, ela pode sobrepor a casual predi­
leção dele com uma preferência dela já decidida.
Diferenças Reconciliáveis 375

Embora qualquer decisão específica geralmente não seja tão


importante para Zeca, sua crescente falta de ingerência o incomoda
muito. Para alterar esse padrão, Zeca terá que decidir quando forçar o
que ele prefere e quando concordar com sua parceira. Por um lado,
ele não quer precipitar uma briga sobre um assunto que pouco impor­
ta para ele. Por outro lado, se ele simplesmente ignora Samantha por­
que as decisões não são importantes para ele, ele se sente mal em rela­
ção a ela, porque ela é tão controladora, e se sente mal consigo pró­
prio, porque ele se deixa controlar. Uma vez que decide forçar suas
preferências, tem que confrontar o questionamento e resistência dela.
“Você realmente quer fazer isso? E tão chato.” Ele também pode ter
que enfrentar limitações realistas sobre o que ele pode fazer, limitações
que, às vezes, são exacerbadas pelo planejamento cuidadoso de Sa­
mantha. Por exemplo, um sábado de manhã eles estavam viajando
para visitar amigos há algumas horas quando Zeca viu um lugar pito­
resco, o qual ele queria visitar brevemente. Samantha explicou que ela
tinha dito aos seus amigos que eles chegariam ao meio-dia para o al­
moço, então não haveria tempo para este desvio. Para fazer o que ele
quer, Zeca teria que ligar para os amigos e fazer uma alteração poten­
cialmente perturbadora, de última hora, dos planos que Samantha fi­
zera sem a sua participação. Claro, ela faz planos sem ele, porque ele,
com frequência, não participa e mostra pouco interesse.
Zeca decidiu falar neste momento e disse: “Eu vou ligar para
eles e ver se é um problema se chegarmos um pouco mais tarde.” Sa­
mantha protestou, argumentando que seria um problema, mas seus
amigos não diriam isso, e apontou que os desejos dele eram egoístas
e triviais: “Eu não posso acreditar que você quer se atrasar com nos­
sos amigos apenas para ver uma paisagem tão ridícula.” Zeca resistiu
a um impulso de atacar de volta e apenas disse tensamente: “Acredi­
to que meus desejos são tão importantes quanto os seus e os deles”.
Samantha respondeu azeda, “Então você está criando uma estúpida
luta de poder?” Em vez de se envolver em uma discussão, Zeca igno­
rou seu comentário e simplesmente ligou para seus amigos que,
376 A peça-chave para a mudança estabelecida

como ele havia previsto, ficaram bem com o fato de que chegariam
um pouco mais tarde. Zeca resistiu à tentação de falar um “Eu te
disse.” Ele e Samantha dirigiram em um silêncio tenso para olhar
brevemente a paisagem, o que não estava muito à altura de sua ex­
pectativa. Ele ficou surpreso por Samantha não ter comentado a de­
cepção com o lugar, mas simplesmente ficado em silêncio. Quando
chegaram à casa de seus amigos, relaxaram um com o outro e se di­
vertiram. Como ele se sentia melhor consigo mesmo por sua asserti-
vidade, ele ficou mais afetuoso com ela pelo resto do dia. Para sua
agradável surpresa, ela não resistiu.
Um incidente instrutivo como este não alterou a dinâmica entre
Zeca e Samantha. Ele precisará de uma maior consciência no momento
presente de seus próprios desejos e um maior envolvimento no planeja­
mento de Samantha. Desta maneira ele poderá ver que pode obter mais
o que ele quer, em vez de reclamar por não ter suas necessidades satisfei­
tas depois do fato ocorrido. Zeca vai ter que resolver o que é importante
para ele e o que não é porque ele nunca estará tão preocupado com o
planejamento como Samantha, e a maioria dos detalhes não importa a
ele da mesma maneira que para ela. Não vai ser fácil, mas provavelmen­
te vai valer a pena todo esforço. Quando Zeca se sente impotente na re­
lação, ele fica mal consigo mesmo e zangado com a parceira. Ele se afas­
ta dela, o que exacerba o sentimento de Samantha de que tem que fazer
tudo sozinha no relacionamento, e isto os priva da intimidade que dese­
jam. Qualquer movimento que Zeca faça para desenvolver uma maior
consciência, seja no momento presente, ou até mesmo a consciência em
retrospectiva, e afirmando seus próprios desejos, como o fez no exemplo
acima, seria um passo para alterar seu dilema.

Faça algo positivo para seu parceiro -


sem nenhuma condição

Quando os parceiros estão em conflito, grande parte da atenção


positiva do dia-a-dia que, normalmente, dão um ao outro, pode ces­
Diferenças Reconciliáveis 377

sar. Portanto, muitos conselheiros insistem em enfatizar que façamos


para nossos parceiros pequenas cortesias e considerações, demons­
trações de reconhecimento e afeto, as quais lhes temos negado por
raiva e ressentimento. Infelizmente, este conselho cai na categoria de
W. C. Fields: Se pudéssemos seguir o conselho, não teríamos o pro­
blema; se temos o problema, não conseguimos seguir o conselho.
Como vimos no Capítulo 13, nossa mágoa e raiva por causa das
ofensas de nossos parceiros podem fazer com que seguir tal aconse­
lhamento seja impossível. Ou não podemos dar esses mimos livre­
mente ou não podemos enfrentar a forma como eles podem ser re­
cebidos. Por esta razão, gestos positivos em relação ao seu parceiro
provavelmente não devem ser oferecidos a menos que você possa fa­
zê-los sem exigir que ele responda da mesma forma - sem, de fato,
prever a sua atitude em relação a qualquer tipo de resposta dele. O
comportamento positivo mais poderoso é oferecido no contexto da
aceitação - uma aceitação dos sentimentos negativos do seu parcei­
ro, que pode levá-lo a rejeitar sua ação positiva. Quando seus gestos
positivos são feitos independentemente da reação do seu parceiro,
eles permanecem positivos, não importa qual seja a resposta.
Depois de um confronto particularmente desagradável, Saman­
tha diz a Zeca, “Eu sei que posso ser controladora e difícil de lidar às
vezes. Eu só quero dizer que eu te amo muito e estou disposta a tentar
resolver este ou qualquer outro problema.” Esta declaração reconhece
o seu papel nos seus problemas, assegura-lhe o seu amor, e indica a
sua vontade de pensar sobre a questão. Dificilmente poderiamos ima­
ginar um gesto mais positivo. No entanto, Zeca pode estar chateado
demais para responder da mesma maneira. Ele pode estar desconfiado
da resposta positiva dela e testá-la. Ele poderia responder com raiva:
“Bem, você finalmente reconheceu alguma responsabilidade. Agora o
que você vai fazer com isso?”
Se Samantha reage à resposta negativa dele, eles entram nova­
mente numa discussão. Se ela conseguir aceitar a reação negativa de
Zeca, talvez por ter alguma compaixão por seu esforço com eia, Sa-
378 A peça-chave para a mudança estabelecida

mantha pode dizer: “Eu sei que você está com raiva agora. Talvez de­
véssemos conversar mais tarde, mas eu quero que você saiba que eu
entendo seus sentimentos.” Fazer este reconhecimento, com estas pa­
lavras positivas exigiriam uma força considerável por parte de Saman­
tha. Mas quando ela os oferece a Zeca, ela está dando o único presen­
te genuíno - um que vem sem nenhuma condição. Se ele parar um
momento para rever esta interação mais tarde, ele pode muito bem ser
tocado pela generosidade e coragem de sua esposa. Na verdade, seria
difícil para ele não ser afetado por uma ação positiva que resistiu até
mesmo às suas próprias tentativas de testá-la. Seu gesto simples e ver­
dadeiro para com ele poderia levar a uma poderosa reconciliação entre
o casal. Além da resolução de seu conflito imediato, sua mensagem
comunica a Zeca que ela o escuta. Ela entende. Como resultado, ele
pode ter menos necessidade de distância para se proteger dela.

Faça o que seu parceiro tem pedido para você fazer

Uma pista sobre o que podemos fazer que fosse realmente di­
ferente, que não é mais do mesmo, reside nas queixas dos nossos
parceiros. O que eles nos acusam de não fazer, o que eles pedem ou
exigem que façamos mais, podem incluir indicações para uma ação
construtiva de nossa parte. Contanto que o pedido não seja algo que
desencadeie nossas emoções brandas e vulneráveis ou que nos exijam
comprometer nossa identidade e nossos valores centrais, podemos
ser capazes de cumprir os pedidos de nossos parceiros pelo menos
uma parte do tempo. Por exemplo, se os nossos parceiros querem
que visitemos seus pais com mais frequência, juntarmo-nos a eles
para assistir a um evento desportivo ou um concerto ou filme, ou
simplesmente ajudá-los com um projeto, os seus desejos nos orien­
tam para uma ação construtiva da nossa parte. Mesmo se não esta­
mos entusiasmados com esses eventos, todos eles envolvem contato
com nosso parceiro. Podemos participar deles ocasionalmente sem
nos comprometer a fazê-lo tão frequentemente como eles poderiam
Diferenças Reeoneiliáveis 379

dealmente gostar. Poderiamos usar a nossa criatividade para fazer da


experiência, embora não seja a nossa primeira ou mesmo segunda
escolha, algo agradável para nós dois.
Fazer algo para nossos parceiros em vez de com eles pode ser
mais complicado, mas às vezes é um presente mais significativo.
Como exemplo, vamos considerar um conflito entre Enrico e Rosa
sobre os cuidados infantis e trabalhos domésticos. Ela se queixa, com
justificativa considerável, de que ele não assume sua parte da respon­
sabilidade pela assistência aos filhos e ao lar. Ele reclama que ela insis­
te que os cuidados das crianças e as tarefas de casa sejam feitas confor­
me seus padrões minuciosos e que ela não reconhece as contribuições
dele. Uma atitude simples e positiva que ele poderia tomar seria fazer
o que ela tem lhe pedido: envolver-se mais com as crianças e com a
casa. Devido ao seu talento para o drama e o inesperado, ele decide
oferecer para Rosa um sábado inteiro livre. Ele vai tomar conta de
tudo e ela pode ter o dia para si mesma.
Essa atitude, aparentemente simples e positiva, poderia, no
entanto, ser complicada para Enrico implementar. Primeiro, ele tem
que lidar com seus próprios sentimentos de que fazer um gesto tão
positivo para ela indicará fraqueza, que ele cedeu a ela, e que sua
posição não tem validade. Um segundo desafio para ele é fazer sua
oferta de um sábado de folga sem rancor por um lado ou martírio
ou heroísmo por outro. Se ele vem com uma atitude que cheira a
“Você tem reclamado tanto, eu acho que eu vou, finalmente, fazer
alguma coisa para calar você”, ele não vai ter uma boa recepção para
sua oferta, e esta, contaminada por seu ressentimento, apenas levará
a outra discussão.
Terceiro, Enrico também deve se preparar para ser recebido
com ceticismo e suspeita. Rosa pode não saber o que fazer de sua ofer­
ta e, portanto, não responder ao seu primeiro esforço com reconheci­
mento e entusiasmo. Quarto, ele pode enfrentar alguns obstáculos
práticos. Talvez o sábado que ele quer “dar a ela” não funcione para
Rosa. Finalmente, ela pode ter dificuldade de “se permitir” um dia in­
380 A peça-chave para a mudança estabelecida

teiro, talvez porque se sinta culpada por estar longe das crianças ou
por Enrico ficar com todo o fardo neste sábado. Só porque ela genui­
namente quer que ele tenha mais responsabilidades não significa que
seja fácil para ela abrir mão disto por si mesma.
Mesmo que Enrico e Rosa enfrentassem todos esses desafios, al­
guns comentários inesperados de um ou outro poderiam desestabilizar
sua precária trajetória de genuína mudança. Vamos dizer que ele faça
a oferta de um sábado livre para Rosa, ela aceita, e ele realiza tudo cer­
to. Em seu retorno para casa, ele compartilha sua experiência com ela.
Talvez ele tivesse alguma dificuldade com as crianças e agora tem uma
maior compreensão de quão desafiador pode ser passar um dia inteiro
com elas. Ele conta suas dificuldades e sua frustração e diz, “Agora eu
sei mais o que você quer dizer sobre o quão difícil é cuidar delas por
horas a fio e manter sua sanidade ao mesmo tempo”.
Rosa pode se sentir culpada por ter saído o dia inteiro. Ela
pode antecipar que ele vai usar este dia contra ela - que ele irá man-
tê-lo como prova do que ele faz para as crianças, que este dia irá in­
validar todas as suas acusações de não envolvimento. Como resulta­
do, ela pode reagir à sua expressão de frustração. “Bem, agora você
sabe o quão difícil pode ser. Talvez a partir de agora você será um
pouco mais solidário comigo e se oferecerá para ajudar mais do que
só de vez em quando.”
Se Enrico permanecesse atento (mindful), ele poderia manter a
mudança positiva e não ser arrastado para uma discussão: “Eu sei que
é difícil, e planejo me envolver mais. Hoje foi apenas um começo,
mas foi um começo de verdade”. No entanto, após um dia com as
crianças, isso pode ser pedir demais. Ele responde a seu comentário
provocativo com uma réplica irritada: “Eu não posso acreditar. Eu
aqui passo o dia inteiro com as crianças e tudo que você pode fazer é
saltar sobre mim.”
Ela responde: “Bem, você acha que um dia é tudo que você pre­
cisa fazer. Então seu trabalho com as crianças foi feito por este ano
certo?” E uma discussão se desencadeia.
Diferenças Reconciliáveis 381

No entanto, esta briga não precisa sinalizar a bandeira branca


da derrota; ela não precisa destruir o esforço positivo para mudar. Um
casal pode recuperar o impulso para mudança, apesar de uma discus­
são. Após essa desagradável briga, Rosa reflete sobre seu dia sozinha e
a briga que acabaram de ter. Ela consegue alguma consciência em re­
trospectiva do que acabou de acontecer. Ela percebe que seu marido
fez um esforço genuíno e que, ela, devido às suas próprias ansiedades,
usou a expressão de frustração do marido contra ele. Embora ela ain­
da tenha seus medos sobre o que vai significar este dia em que ele to­
mou uma atitude, ela pede desculpas. Ela expressa seu reconhecimen­
to pelo que ele fez.
As atitudes de Enrico mostram a Rosa não somente que ele
escutou sua mensagem, mas também que está disposto a tomar me­
didas construtivas em relação a esta. As desculpas de Rosa mostram
que está aberta a admitir o erro e a reconhecer os esforços dele. Es­
sas ações poderiam fazer mais do que iniciá-los no difícil caminho
para mudar a responsabilidade do cuidado com as crianças. Estes
são os tipos de comportamento, mesmo quando nascem a partir de
uma discussão, que podem promover reconhecimento e proximida­
de nos parceiros.

Cuide melhor de si mesmo

Um punhado de culpa é melhor do que um caminhão


carregado de ressentimento.
Provérbio

Nosso desejo genuíno de proteger nossos parceiros de certos sen­


timentos pode nos fazer esconder os nossos próprios e reprimir nosso
comportamento que os machuca. Embora esses atos amorosos de prote­
ção possam assegurar a paz no curto prazo, se prolongados, podem nos
criar ressentimento que, ironicamente, gera mais sofrimento do que se
não tivéssemos sido tão protetores. Se cuidássemos melhor de nós mes­
382 A peça-chave para a mudança estabelecida

mos, talvez tivéssemos que lidar com conflitos no curto prazo, mas po­
deriamos aumentar nossa satisfação em longo prazo.
Por exemplo, no nosso relacionamento sexual podemos abdicar
de um possível prazer ao invés de arriscar ferir ou constranger nossos
parceiros. Mencionar que se sente desconfortável por algo ou que pre­
cisamos de um ritmo mais lento pode chateá-los ou criar tensáo. Pedir
algum comportamento que pudesse nos excitar poderia envergonhá-
los e a nós mesmos e interromper o momento de intimidade. Nosso
esforço para melhorar nossa vida sexual pode ser contraproducente e
piorar as coisas. Assim, nós nos submetemos ao desconforto ou re­
nunciamos ao prazer para preservar o que temos. Nós desperdiçamos
oportunidades de melhorar o nosso próprio nível de satisfação sexual
e, em última análise, o de nossos parceiros.
Embora a nossa relação sexual seja, frequentemente, uma área
particularmente sensível na qual tentamos proteger os sentimentos de
nossos parceiros, podemos fazê-lo em quase todas as áreas. Por exem­
plo, você pode estar assistindo a um programa de televisão que lhe in­
teressa, mas seu parceiro lhe interrompe para dizer algo. Não queren­
do machucar os sentimentos dele, você não diz honestamente “Eu re­
almente quero assistir a este programa. Você pode me falar mais tar­
de?” Em vez disso, você dá a seu parceiro metade de sua atenção, dei­
xa a outra metade focada na televisão e se sente vagamente ressentido.
Enquanto isso, seu parceiro pode se sentir irritado com a pouca aten­
ção que você deu.
Estes exemplos não pretendem simplificar demais. Exprimir seus
desejos pode criar sentimentos que machucam, gerar tensão ou precipi­
tar uma discussão. O desconforto que talvez resulte da liberdade de ex­
pressão pode não valer a pena. Em certas circunstâncias, como os senti­
mentos de seu parceiro são importantes para você, pode ser melhor su­
primir suas reações e deixar a situação passar. Uma orientação útL
como cuidar melhor de si mesmo, nunca deve substituir o bom senso.
Quando um problema se repete, no entanto, a confrontaçá:
pode ser melhor do que a proteção. Carla gostaria de passar mais tem­
Diferenças Reeoneiliáveis 383

po longe de Diane. Ela gosta de, algumas vezes, fazer compras sozi­
nha e gostaria de sair com seus amigos mais frequentemente sem
Diane. Por outro lado, Diane prefere fazer as coisas com Carla e vai
ajustar seu horário para ir com ela em quase todas as ocasiões, desde
eventos sociais até tarefas diárias. Carla geralmente não tem coragem
para dizer que ela quer fazer sozinha suas compras ou outras ativida­
des corriqueiras. Sendo assim, Diane vai junto e Carla se sente ligei­
ramente irritada pela presença da parceira. Sua única solução até
agora é ser ligeiramente desonesta: ela faz suas tarefas quando Diane
está ausente ou parece muito ocupada para acompanhá-la, ou inven­
ta desculpas para não levar Diane junto quando ela se encontra com
um amigo. Carla se sente ligeiramente culpada por essas dissimula­
ções, e, então, fica brava com Diane por colocá-la nessa posição de­
fensiva. Mas cuidar melhor de si mesma e afirmar seu direito à ativi­
dade independente significaria fazer coisas que machucariam os sen­
timentos de Diane, o que, por sua vez, significaria mais culpa para
Carla. Poderia também precipitar uma discussão ou estimular Diane
a se retirar com ressentimento.
Não existe uma maneira fácil para Carla resolver sua necessi­
dade de independência. Mas, seguindo o caminho mais tortuoso —
planejando o momento para as atividades corriqueiras ou compras,
oferecendo meias-verdades sobre o que ela e seus amigos vão fazer —
ela se obriga a repetir esses artifícios a cada vez que quer algum tem­
po sem Diane. Enfrentar Diane mais diretamente sobre suas necessi­
dades exigiría que ela lidasse com as respostas emocionais da parcei­
ra e com as próprias, mas, com o tempo, uma mudança genuína po­
deria acontecer. Poderia surgir um novo padrão de maior indepen­
dência para ela na relação.
Carla poderia iniciar conversando sobre suas inquietações
com Diane. Seria importante para ela se concentrar em seu desejo
de ter um tempo seu, em vez de qualquer suposta dificuldade de
Diane, tal como a sua insegurança. Se a conversa enfatiza as inade­
quações de Diane ao invés de seu próprio desejo de independência,
384 A peça-chave para a mudança estabelecida

certamente falhará. No entanto qualquer que seja a maneira que


Carla aborde o assunto, Diane certamente ficará magoada. Em al­
gum nível, ela verá o desejo de Carla por mais independência como
uma rejeição. Diane pode muito bem tentar reenquadrar esta ne­
cessidade da parceira como falta de amor, ou ela pode se afastar e
ficar aborrecida de forma que induza à culpa. Será um desafio para
Carla assegurar seu amor por Diane e sua necessidade de mais inde­
pendência. Pode ser útil se Carla compartilhar suas próprias emo­
ções brandas vulneráveis: sua culpa por tê-la machucado, a atração
que sentia no início do relacionamento por Diane desejar sua cons­
tante presença, seu medo de que o fato de fazer tudo juntas possa
amortecer seu amor por ela. E possível que elas sejam aliadas ao in­
vés de adversárias nesse esforço.
Se Carla começa com uma discussão de coração aberto ou não,
o verdadeiro desafio para ela virá nas decisões cotidianas sobre como
usar seu tempo. Ela precisará dizer a Diane com quantas palavras fo­
rem necessárias: “Eu quero ir às compras sozinha hoje” ou “Eu quero
passar algum tempo a sós com Cândida.” Sem dúvida, ela terá que li­
dar com algumas reações negativas por parte de Diane. As vezes ela
pode decidir não forçar a situação, às vezes ela pode precisar reassegu­
rar Diane que uma maior independência não é seu único objetivo.
Em outros momentos, apesar de seus melhores esforços, suas ações
podem desencadear uma discussão.
Se Carla persistir neste empenho, ela alcançará seu objetivo
imediato de mais tempo sem Diane. No entanto, ela pode conseguir
muito mais. Uma vez que ela se sinta mais independente e com me­
nos culpa, pode se dar conta que valoriza ainda mais seu tempo com a
parceira. Ao invés de tolerar a presença de Diane com uma leve irrita­
ção, ela pode desfrutar de sua companhia. Embora Diane possa achar
dolorosa a rejeição inicial de Carla, ela pode vir a ter uma parceira
mais amorosa e grata. Diane pode decidir que ter sua companheira
por inteiro por menos tempo vale mais do que ter alguém por muito
tempo, porém pela metade. Além disso, a insistência de Carla por
Diferenças Reeonciliáveis 385

mais independência pode forçar Diane a reavaliar sua própria depen­


dência por ela e sua conexão com outros amigos e familiares.
A mudança genuína ameaça o conflito, mas oferece o potencial
para um maior crescimento pessoal e crescente intimidade.

Dica 1: A maneira mais poderosa de criar mudanças em seu parceiro e em


seu relacionamento é mudar a si mesmo primeiro. Ao invés de reclamar
sobre o seu parceiro, tome algumas medidas construtivas você mesmo. Ten­
te fazer coisas positivas e gentis com e para o seu parceiro, sem esperar
nada em troca. Se puder, faça algo do que o seu parceiro lhe pediu para
fazer. Finalmente, sempre cuide de si mesmo, assim como de seu parceiro.
Não se esqueça de suas próprias necessidades ou permita que suas preo­
cupações sobre as reações do seu parceiro o impeçam de perseguir de ma­
neira razoável seus próprios valores.
v___________________ ____________________________________________ /

MINIMIZE DANOS

O amor nos põe em perigo. Embora os médicos tentem seguir


o ditado “Primeiro, não cause danos”, os amantes não conseguem.
Como nos importamos tanto com nossos parceiros, que são diferen­
tes de nós em relação ao que eles querem, pensam e sentem, inevita­
velmente, farão coisas que nos decepcionam, entristecem, magoam e
nos irritam. Eles, naturalmente, também fazem coisas que nos esti­
mulam, agradam, relaxam, e nos alegram. Mas a dor sempre será
parte do amor.
Uma característica importante de bons relacionamentos é o “ge­
renciamento da dor” e o “controle do dano”. Parceiros em qualquer
relacionamento de longo prazo inevitavelmente experimentarão ten­
são e angústia. O desafio é acomodar essas experiências, para impedi-
las de escalar e ficar fora de controle. Uma discussão, uma decepção,
um mal-entendido pode criar sentimentos de mágoa e raiva que se in­
tensificam em declarações nocivas (“Eu nunca amei você realmente”)
ou ameaças intimidadoras (“Vou embora, não quero mais essa rela­
386 A peça-chave para a mudança estabelecida

ção”). Estes são os tipos de palavras e ações prejudiciais que queremos


evitar. As orientações a seguir são elaboradas para controlar os danos.

Se você não consegue se fazer entender,


mude o meio de comunicação

Pode ser impossível falar construtivamente com seu parceiro so­


bre algumas questões. Um tópico controverso pode ter tal história de
conflito que nenhum de vocês pode abordá-lo sem tensão. A mera
menção deste assunto pode iniciar uma sequência de estímulo emo­
cional que leva a um impasse. No entanto, o tópico é tão importante
que não pode ser ignorado.
Você pode mudar as circunstâncias de sua discussão. Você pode
expor o tópico quando ambos estiverem calmos. Você pode falar sobre
o tema quando você está em um restaurante, onde nenhum de vocês
gostaria de fazer uma cena. Você pode falar ao telefone, uma vez que a
distância extra que vem com um telefonema pode impedir a escalada
de suas emoções. Todas essas estratégias são tentativas razoáveis para
criar um cenário no qual uma discussão construtiva pode ter lugar.
No entanto, se eles não tiverem êxito, uma mudança mais dramática
pode ser necessária.
Você pode alterar o meio de comunicação da sua mensagem.
Em vez de falar pessoalmente ou por telefone, você pode escrever
um bilhete, enviar um texto ou e-mail, deixar uma mensagem de
correio de voz ou fazer um vídeo. Esta mudança pode capturar a
atenção do seu parceiro, especialmente se você normalmente não se
comunica desta forma. Seu parceiro pode ficar intrigado ao receber
um bilhete, um e-mail ou um vídeo de você. Alterar o meio também
permite que você diga o que pensa sem feedback ou interrupção.
Você não será dissuadido por olhares de aborrecimento, confundiu:
pelas tentativas de seu parceiro de “corrigir” a sua versão dos aconte­
cimentos, ou irritado por sua expressão de ironia. Você tamberr
pode entregar uma declaração mais ponderada, reflexiva e gentil st-
Diferenças Reeoneiliáveis 387

bre sua posição. Você pode preparar o que vai dizer, excluir uma fra­
se que não parece certa ou cortar uma parte do vídeo que pode ser
nociva. Se você usar a palavra escrita, não haverá tons de voz irritada
ou sinais de tensão facial para dispersar de sua mensagem. Final­
mente, se o seu parceiro escolher responder da mesma forma, ele ou
ela irá desfrutar de alguns dos mesmos benefícios: liberdade de ex­
pressão sem feedback ou interrupção e a oportunidade de preparar
uma resposta mais elaborada. Como resultado, o processo de comu­
nicação poderá ser menos acusatório e menos defensivo. A alteração
do meio de comunicação pode mudar a mensagem.

Quando a discussão se deteriora numa briga,


eoncentrar-se nas emoções ao invés de focar no conteúdo

Escute a melodia, não as palavras.


Tamara e Nelson estão conversando sobre suas férias de verão,
planejando ir para Califórnia. Embora ela não esteja totalmente cons­
ciente, Tamara está se sentindo cada vez mais irritada por Nelson estar
tomando conta da discussão e do planejamento da viagem. Ele men­
ciona que eles podem, facilmente, ir de carro em um dia de Los Ange­
les para San Francisco. Ela contrapõe vigorosamente.

Tamara: Não, não podemos dirigir de Los Angeles para San Fran­
cisco em um dia.
Nelson: Claro que podemos. As pessoas fazem isso o tempo
todo em menos de um dia.
Tamara: Não, elas não fazem isso. A menos que sejam motoris­
tas de carros de corrida.
Nelson: O que você sabe sobre distância e tempo. Podemos pegar a
autoestrada 5; são apenas algumas centenas de quilômetros!
Tamara: Besteira! São mais de 700 quilômetros. E é essa a sua
ideia de férias - ficar dirigindo em uma autoestrada?
Nelson: Minha ideia de férias é chegar aonde você quer ir o
mais rápido possível.
388 A peça-chave para a mudança estabelecida

Tamara: Bem, eu posso querer tomar a rota costeira que é mais-


bonita.
Nelson: Otimo, então podemos passar todas as nossas férias
dentro do carro.

Nesse exemplo, Tamara e Nelson se concentram nos detalhes -


a distância entre Los Angeles e San Francisco e se pegam a rota da au­
toestrada ou a costeira, mas ignoram a tensão crescente entre eles que
os impedirá de chegar a uma decisão. Como a história da família que
tem um elefante em sua sala de estar, mas nunca discute isso, eles ig­
noram a poderosa interação emocional acontecendo entre eles e se
concentram apenas nos detalhes superficiais de sua discussão.
No livro The Talk Book, Gerald Goodman oferece o seguinte
conselho: “Quando em apuros, revele-se em dobro.” Afirmações como
“Estou começando a me sentir tenso” ou “Eu temo onde essa conver­
sa vai acabar” ou “Eu acho que estamos ficando empacados” podem
afastar uma conversa de seu conteúdo, o qual muitas vezes é superfi­
cial, e aproximar da questão emocional que é mais importante. A au-
torrevelação pode colocar a ênfase na ‘melodia de uma conversa, em
vez de nas palavras. Com esta atenção na emoção, é possível acalmar a
discussão em vez de inflamá-la ainda mais. Ou, pelo menos, adiar a
discussão até um momento posterior, quando as emoções estão mais
calmas. Vamos ver como isso poderia acontecer.

Tamara: Eu não sei por que, mas estou ficando muito irritada
com essa conversa.
Nelson: Eu estou vendo.
Tamara: Bem, você também não está exatamente muito calmo.
Nelson: Isso é verdade. Estou frustrado também. Eu tenho lou­
co para ir no Google e provar a você que LA e San Francisco es­
tão a menos de 700 quilômetros de distância.
Tamara: (sorrindo) Por favor, não. Mesmo se você estivesse certo.
você ganharia a batalha, mas perderia a guerra. Porque eu poderia
me recusar a ir para a Califórnia com você de qualquer forma.
Diferenças Reeonciliáveis 389

Ao falar sobre seu estado emocional, Tamara conseguiu parar


a escalada de emoção e incluir alguma leveza bem vinda em sua
discussão.
Como todo o conselho interpessoal, este vem sem garantias.
Dificilmente há uma solução infalível para uma conversa cheia de
tensão. Um perigo é que nós comentaremos sobre as emoções ou o
comportamento de nossos parceiros ao invés de revelar os nossos.
Afirmações como “Você está exagerando com essa coisa toda” e “Por
que você está ficando tão irritado?” muda o foco do conteúdo da
discussão para seu tom emocional. No entanto, ao invés de comuni­
car como estamos nos percebendo, fazemos uma avaliação crítica de
como nossos parceiros estão se sentindo. Além disso, mesmo se fi­
zermos uma revelação genuína sobre nosso próprio estado emocio­
nal, podemos transmitir que nossos parceiros são culpados por cau­
sar essas emoções. Por exemplo, o comentário “Estou ficando real­
mente frustrado” pode ser feito simplesmente como uma declaração
de suas emoções ou com um tom de “e você é um idiota por me dei­
xar frustrado”. Mesmo quando fazemos certo - estamos ficando ten­
sos em uma conversa, de modo que mudamos o foco do conteúdo
de nossa discussão para as emoções que estamos sentindo - nossos
parceiros podem estar tão angustiados que ignoram o que dissemos
e avançam com seus próprios argumentos.

Quando tudo falha, dê um tempo

Existe um momento nas discussões quando nada de bom vai


acontecer. As emoções estão muito intensas. Seu parceiro não está lhe
escutando, e nem você a ele. A troca de olhares e palavras entre vocês
são apenas condenações irritadas. E hora de “dar um tempo”, uma
pausa na comunicação em que vocês podem se afastar da presença um
do outro. Você pode mentalmente relembrar a briga e ficar mais fu­
rioso, mas pelo menos os comentários destrutivos terão parado. E,
eventualmente, você vai se acalmar. O afastamento oferecido por “dar
um tempo” pode ser uma vitória para o relacionamento.
390 A peça-chave para a mudança estabelecida

O “dar um tempo” é amplamente recomendado porque tem a


lógica clara de um cessar-fogo. O primeiro ato construtivo é parar a
briga. E a implementação parece simples: apenas afaste-se. Deixe a
cena imediatamente. Não falem um com o outro até que ambos este­
jam mais calmos.
Claro, nada é tão simples entre aqueles que se amam, e o “dar
um tempo” não é exceção. Pode ter um uso excessivo por aqueles
que querem evitar o conflito e pode ser recusado por aqueles que
preferem levar a briga adiante a todo custo. E a eficácia de “dar um
tempo” vai depender, em grande medida, de como os parceiros pro­
cedem. A própria forma como ele é feito pode conter uma acusação
pesada, como em “Você está ficando histérica, então eu vou dar um
tempo” ou “Eu não posso falar com alguém que não seja razoável,
então eu vou sair até que você se acalme.” Ou o “dar um tempo”
pode ser a ação seguinte após um aspecto revelador ou uma síntese
dramática de nossa posição, fato que vem, precisamente, no mo­
mento errado para nossos parceiros. O “dar um tempo” nesta hora
nos deixa com a última palavra e nossos parceiros recuam de nosso
ataque final. Não surpreendentemente, eles podem não cooperar
com a nossa proposta.
Podemos iniciar um “dar um tempo” sugerindo que pode ser
mais do que temporário ou com a declaração explícita ou implícita de
que vamos nos recusar a falar sobre este tema para sempre. Ou pode­
mos simplesmente deixar a cena, insultando e confundindo nossos
parceiros com nossa partida repentina.
Talvez a melhor maneira de pensar sobre “dar um tempo” seja
como uma estratégia de autoproteção para uso em casos de discussões
fracassadas. Se você vê o “dar um tempo” como uma maneira de cui­
dar de si mesmo e do relacionamento quando está muito aborrecido
para ser razoável ou construtivo, é menos provável que o utilize acusa-
toriamente ou o use para obter a última palavra. Mesmo se seu parcei­
ro é a pessoa que está histérica, enquanto você ainda é capaz de ser
razoável, você pode usar o “dar um tempo” como uma estratégia de
autoproteção. As vezes, quando seu parceiro está muito chateado.
Diferenças Reeoneiliáveis 391

você pode agir de maneira a acalmar e confortar, mas quando a histe­


ria é dirigida a você, envolver-se só vai lhe chatear também. Então
“dar um tempo” ainda apresenta a mesma mensagem: eu não consigo
agir construtivamente nesta situação. Eu quero dar um tempo como
uma forma de proteger a mim e nosso relacionamento.
A melhor forma de pedir “dar um tempo” é fazê-lo de forma
simples e breve, solicitando-o para si mesmo e indicando a sua vonta­
de de continuar a discussão em um momento posterior. Por exemplo,
“Estou ficando frustrado e quero dar um tempo, estou disposto a con­
tinuar a discussão mais tarde”. Ou “Eu penso que nós não estamos
chegando a lugar algum. Preciso dar um tempo - mas vou conseguir
falar sobre isso mais tarde.”
Quando você vê o “dar um tempo” como uma maneira de pro­
teger a si mesmo e o relacionamento, você pode respeitar mais as ne­
cessidades de autoproteção do seu parceiro e, portanto, acolher quan­
do ele pedir “dar um tempo”. Em vez de impedir que ele saia da sala
ou segui-lo, você vai permitir a sua privacidade e liberdade de movi­
mento. Você vai aceitar os pedidos dele para dar um tempo, mesmo se
você quiser continuar a discussão.
Quando você usa o “dar um tempo” apropriadamente, você re­
conhece uma falha mútua: nenhum de vocês foi bem sucedido em
tornar a conversa construtiva. Esta aceitação do fracasso, entretanto,
pode impedir uma escalada mais prejudicial da discussão. Além disso,
permite uma recuperação mais rápida da briga e renova seus esforços
para se relacionar um com outro. Sua aceitação do fracasso pode plan­
tar as sementes do sucesso posterior.
O conflito é uma janela sobre o melhor e o pior dos relaciona­
mentos humanos. Durante o conflito, os parceiros que, de outra
forma são amorosos, podem atacar implacavelmente um que esteja
vulnerável ou se afastar de um outro que esteja carente, ferindo
emocionalmente, mesmo que eles mesmos estejam machucados. O
conflito é frequentemente o caminho tortuoso à separação e ao di­
vórcio. No entanto, também pode desencadear reconciliações pode­
rosas, inspirar intimidade e comprometimento e revigorar as rela­
392 A peça-chave para a mudança estabelecida

ções. É, muitas vezes, a ocasião em que os parceiros dão voz, mesmo


que de forma exagerada, ao que eles não conseguiram transmitir an­
tes. Pode revelar vulnerabilidades e incompatibilidades, mas, ao fa­
zê-lo, estimula esforços para ir em direção a elas, em vez de evitá-las.
Esses aspectos positivos do conflito só podem ocorrer se os danos
durante o mesmo forem reduzidos ao mínimo. Assim, o “dar um
tempo”, ao limitar o prejuízo, pode preparar o caminho para um re­
lacionamento mais íntimo e gratificante.
—-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- X
Dica 2: Tente minimizar os danos que o conflito pode causar. Se um de­
terminado tópico normalmente desencadeia conflitos improdutivos, tente
usar uma configuração diferente ou um meio de comunicação distinto para
falar sobre esse tema. Intervenha cedo se a tensão começar a tomar conta
da discussão. Concentre-se em suas reações emocionais ao invés de persistir
com um foco no tópico do conflito. Se os seus esforços para evitar ou al­
terar uma discussão conflituosa falharem, use "dar um tempo" para evitar
escalada adicional.
_________________________________________________________________________________

RECAPITULANDO
Fazer mudanças positivas e deliberadas em nossos relacionamentos não é fácil, mas
podem ser feitas. Embora nossa tendência seja colocar foco no que nossos parceiros
deveriam mudar, teremos mais sucesso se nos concentrarmos no que nós podemos
mudar. Se fizermos menos do que fazemos normalmente e mais do que tipicamente
não fazemos, podemos conseguir mudanças positivas. Em particular, podemos tomar
medidas construtivas em vez de reclamar e criticar. Podemos fazer algo positivo para
os nossos parceiros, embora haja negatividade entre nós. Podemos fazer o que nossos
parceiros nos pediram para fazer. Nenhum desses atos aparentemente simples serão
fáceis de implementar. Podemos enfrentar nosso próprio ressentimento ou uma res­
posta menos entusiasmada dos nossos parceiros.
Às vezes, podemos fazer uma genuína mudança em nossos relacionamentos, cuidan­
do melhor de nós mesmos. Se não protegemos tanto nossos parceiros, podemos nos
sentir menos ressentidos. Mas temos de lidar com as nossas próprias inibições e culpa
sobre chateá-los ao fazer o que queremos fazer.
Em alguns momentos, nossos desentendimentos com nossos parceiros podem ficar
fora de controle. Nossos sentimentos e os deles são tão fortes que a discussão
construtiva torna-se impossível. Uma mudança positiva pode ser simplesmente para
Diferenças Reeoneiliáveis 393

minimizar os danos. Se certos tópicos parecem impossíveis de discutir construtiva­


mente, podemos mudar as circunstâncias ou o meio de comunicação dessas discus­
sões. Nos primeiros sinais de angústia, podemos ser capazes de salvar uma discus­
são enfocando a interação emocional entre nós, em vez de persistir com o tópico
específico que nos levou para outra direção. Quando uma discussão não é recupe­
rável, talvez precisemos solicitar "dar um tempo" para interromper a discussão e
permitir um período para baixar a carga emocional. Um "dar um tempo" representa
um reconhecimento explícito do fracasso da nossa discussão, mas, ao prevenir a
escalada prejudicial, pode facilitar a reconciliação após o conflito e uma recupera­
ção mais rápida para o "normal". Sendo assim, teremos conflitos menos dolorosos e,
por vezes, com uma reconciliação compassiva, com maior intimidade.

A discussão neste capítulo levou a duas dicas específicas:


1. Ao invés de reclamar sobre o seu parceiro, tome alguma atitude construtiva você
mesmo. Tente fazer coisas positivas com e para seu parceiro, sem esperar nada em
troca, incluindo algumas das coisas específicas que seu parceiro lhe pediu para fa­
zer. Mas sempre cuide de si mesmo, assim como de seu parceiro.
2. Se um determinado tópico geralmente desencadeia conflitos improdutivos, tente
usar uma configuração diferente ou um meio de comunicação distinto sobre o
tema. Intervenha cedo se a tensão começar a tomar conta da discussão. Concen­
tre-se em suas reações emocionais ao invés de persistir com o foco no tópico de
conflito. Se os seus esforços para evitar ou alterar uma discussão conflituosa fa­
lharem, use "dar um tempo" para evitar escalada adicional.

Exercício: Responsabilizando-se Pela Mudança

A mudança mais fundamental e de longo alcance que você


pode fazer em seu relacionamento é se concentrar mais no que
você pode fazer diferente e menos no que seu parceiro pode fazer
diferente.

• Considere algumas das coisas que você reclama. Que tipos de


atitude construtiva você poderia tomar para melhorar essas
situações?
394 A peça-chave para a mudança estabelecida

• Quais são algumas atitudes simples e positivas que você poderia


tomar para ou com seu parceiro (pense no que ele ou ela tem
pedido que você faça ou se queixa de que você não faz)?

• Você protege os sentimentos do seu parceiro desnecessariamen­


te, à custa de seu próprio ressentimento? Quais são algumas ma­
neiras que você poderia cuidar de si mesmo melhor, ao mesmo
tempo sendo gentil com seu parceiro?

Uma maneira importante de melhorar seu relacionamento é


minimizar as interações prejudiciais.

• Se você não consegue, realmente, comunicar-se construtivamen­


te sobre um tópico em particular, tente mudar as circunstâncias
ou o meio de comunicação. Qual seria uma configuração dife­
rente ou meio distinto que poderia levar a uma comunicação
mais construtiva?

• Se uma discussão particular começa a se deteriorar, concentre-se


nas emoções, não no conteúdo. Que emoções são tipicamente
acionadas em você e em seu parceiro que interferem na discus­
são produtiva (pense sobre sua análise DEEP (profunda), particu­
larmente nas sensibilidades emocionais)?
Diferenças Reeoneiliáveis 395

• Tente usar o "dar um tempo" como uma maneira de proteger a si


mesmo e o relacionamento quando não é mais possível recuperar
uma discussão e torná-la construtiva. Há alguma discussão re­
cente na qual poderia ter sido melhor "dar um tempo"? Escreva a
melhor maneira para você implementar o "dar um tempo" com
seu parceiro sem exacerbar ainda mais uma situação conflituosa
(por exemplo, explicando que você está chateado em vez de acu­
sar seu parceiro de estar muito chateado, indo embora sem a úl­
tima palavra e sugerindo seu desejo de falar sobre o assunto no
futuro próximo).

ONDE ESTAMOS AGORA E ONDE ESTAMOS INDO?

Neste ponto, esperamos que a leitura deste livro e os exercícios o


tenham ajudado a atingir diversos objetivos abrangentes. Primeiro, com
a Parte I, você deve ter uma maior compreensão da complexidade de
conflitos íntimos e quão entranhada ela pode se tornar quando seus es­
forços para resolvê-la começam com culpas e acusações. Com a Parte II
você deve ter adquirido uma compreensão de como suas Diferenças
(D), sensibilidades Emocionais ou vulnerabilidades (E) e estressores Ex­
ternos (E) levam a problemas iniciais entre você e seu parceiro e como
seus esforços para lidar com essas dificuldades, seu Padrão de comunica­
ção (P), podem levar a problemas reativos mais graves. Segundo, com a
parte III, você deve ter tomado este conhecimento geral do conflito e
aplicado a suas próprias lutas particulares com seu parceiro e criado
uma “história de seus problemas de relacionamento.” Com base nessa
história e na sua leitura da Parte III, você deve ter mais compreensão e
compaixão pela posição de seu parceiro no conflito e ser capaz de co­
municar essa compaixão. Em alguns momentos você deve conseguir ver
sua luta com alguma distância restauradora, mais como um “ele” e me­
396 A peça-chave para a mudança estabelecida

nos como um “você”. Tudo isso pode torná-lo mais receptivo às lutas
nas quais você se encontra. Finalmente, com a parte IV, você deve ter
uma compreensão maior da dificuldade de fazer uma genuína mudança
deliberada e de uma consciência de como, frequentemente, os esforços
para mudar criam mais do mesmo.
Esperamos que você também esteja capacitado para ter a noção
de que a mudança genuína, embora difícil, é possível se você começar
com a única pessoa que você tem controle: você mesmo. Além disso,
vale a pena a luta pela verdadeira mudança, porque esta não só reduz
o conflito, mas também leva a uma maior intimidade. De modo ideal,
o impacto total deste livro levará a um abrandamento de sua posição
em relação ao seu parceiro e a uma apreciação das limitações humanas
e vulnerabilidades dele, bem como das suas próprias, mesmo quando
você se esforça para criar um relacionamento melhor e mais gratifi-
cante. Talvez você agora tenha começado a se afastar de incompatibili­
dades antagônicas direcionando-se para diferenças reeonciliáveis.
Neste ponto, você pode achar útil avaliar seu progresso. Para
obter uma indicação objetiva deste, você poderia pegar novamente
os questionários de satisfação de relacionamento no Capítulo 1 e ver
se houve melhora. Se você não atingiu alguns dos objetivos descritos
acima ou se seu nível de melhoria na satisfação não é o que você
queria, pode ser adequado reler um capítulo ou seção ou refazer al­
guns dos exercícios recomendados (ou fazê-los agora se você não os
fez). Também é possível que algum problema especial - um desres­
peito de seu parceiro, como um caso, violência, abuso verbal ou um
transtorno grave em seu parceiro, como depressão ou alcoolismo -
impeça as mudanças positivas que imaginamos. Também é possívei
que suas dificuldades, exacerbadas ou não por problemas especiais-
exijam mais do que qualquer um de vocês possa fazer. Nesse caso.
você pode precisar de assistência profissional. Na Parte V abordare­
mos cada um desses problemas especiais.
Parte V
Quando Aceitação
Não é Suficiente
15

"Não Faça isso comigo"


Violência, abuso verbal e infidelidade

Ao longo deste livro promovemos várias idéias importantes: Há


pelo menos dois lados para cada conflito. Nenhum parceiro é respon­
sável por um problema interpessoal; ambos os membros contribuem
para ele, geralmente não intencionalmente. A dor interpessoal vem
em parte da ação perpetrada e em parte de uma vulnerabilidade a essa
ação. Crimes do coração, muitas vezes, são delitos menores, mas nos­
sas vulnerabilidades nos fazem senti-los como crimes.
No entanto, com frequência, verdadeiros crimes são cometidos
nos relacionamentos. As vezes um parceiro faz algo que é certamente
errado, sem discussão. O problema não é que somos sensíveis, embora
possamos ser. O problema é que nossos parceiros fizeram algo que
ninguém deveria ter que aceitar ou mesmo tolerar.
Este capítulo discute três categorias de ação muito comuns em
relacionamentos que não devem ser aceitas porque levantam ques­
tões morais assim como interpessoais: (1) violência, destruição e co­
erção física; (2) abuso psicológico, emocional e verbal; e (3) infideli­
dade. Estes três tipos de comportamento são muito diferentes e têm
consequências distintas. Não queremos igualar seu grau de gravida­
de. Claramente, a violência é a única que pode literalmente ser mor­
400 "Não faça isso comigo"

tal. Além disso, atos específicos dentro de cada categoria variam dra­
maticamente em sua importância: ser empurrado é muito diferente
de ser espancado. No entanto, cada um desses três tipos de ação é
destrutivo nos relacionamentos. Em cada caso, há vítimas. A vítima
de todos os três tipos de ação pode dizer de maneira convincente:
“Seja o que for que eu tenha feito de problemático para o nosso re­
lacionamento, eu não merecia isso.”

VIOLÊNCIA, DESTRUIÇÃO E COERÇÃO FÍSICA

Parece óbvio que violência, destruição e coerção física não deve­


riam ser aceitos em qualquer relação. No entanto, eles estão tão difun­
didos que precisam ser discutidos no contexto de aceitação e mudan­
ça. Nós imaginamos o lar como um refúgio seguro, um lugar onde es­
tamos protegidos das batalhas do mundo. Infelizmente, em vez de ser
um santuário de segurança e apoio, os lares são, demasiadas vezes, lo­
cais perigosos de violência e destruição.
Em 1985, Murray Straus e Richard Gelles realizaram uma
pesquisa telefônica nacional com mais de 3.500 casais casados ou vi­
vendo juntos e representativos da população dos Estados Unidos em
geral. Entre outras questões, os pesquisadores perguntaram sobre
atos violentos específicos que podem ter ocorrido no último ano en­
tre marido e mulher. Seus resultados mostraram que atos violentos,
como agarrar, empurrar, dar tapas, bater, chutar e espancar ocorre­
ram em 16% dos casais. Violência severa, que eles definiram como
chutar, morder, dar socos, bater com um objeto, espancar, ameaçar
ou usar uma faca ou arma, ocorreu em 6% dos casais. Como esses
relatórios foram feitos a um estranho por telefone, eles provavel­
mente subestimam a verdadeira prevalência de violência nos casais.
Pesquisas mais recentes têm encontrado níveis ainda mais altos de
abuso. Por exemplo, Breiding, Black e Ryan (2008) estimaram que
29,4% das mulheres e 15,9% dos homens experimentam pelo me­
Diferenças Reeonciliáveis 401

nos uma vez na vida uma ocorrência de violência física ou sexual em


um relacionamento íntimo.
Não surpreendentemente, as taxas de agressão física são maiores
em casais com dificuldades que procuram aconselhamento do que na
população em geral. Estudos sugerem que 50% ou mais de todos os
casais que buscam terapia se envolvem em pelo menos alguma agres­
são física. Por exemplo, em nosso estudo clínico de terapia de casal,
273 casais mostraram interesse no programa e completaram os ques­
tionários iniciais. Destes, classificamos apenas 21% como casais sem
agressão. Os casais remanescentes foram divididos, aproximadamente,
igualmente entre casais de violência de baixo nível, envolvidos em
comportamentos como agarrar e empurrar, e casais de violência mo­
derada a grave, que sofreram socos, lesões, etc. Mesmo depois de ex­
cluir de nosso estudo os casais com níveis potencialmente perigosos
de agressividade, um total de 45% dos casais relataram um ou mais
incidentes de baixo nível de violência no ano anterior à terapia. As­
sim, particularmente a violência de baixo nível, como empurrar, agar­
rar e pressionar, é, infelizmente, muito comum entre os casais, parti­
cularmente aqueles em desespero.
Tanto homens como mulheres são violentos, e a maioria dos es­
tudos revela que ambos têm quase a mesma probabilidade de perpe­
trar violência de nível baixo a moderado. Taxas semelhantes ocorrem
nas relações entre pessoas do mesmo sexo, bem como nas relações se­
xuais cruzadas, dados que contestam os estereótipos de que os homens
não poderiam ser vítimas de violência por seus parceiros masculinos
ou que as mulheres não seriam violentas com suas parceiras. No en­
tanto, nas relações heterossexuais, os efeitos físicos e psicológicos da
violência sobre as mulheres tendem a ser mais nocivos do que os efei­
tos sobre os homens. Como os homens são, geralmente, maiores e
mais fortes do que as mulheres, eles provavelmente prevalecem em
qualquer episódio violento. De fato, as mulheres têm o dobro da pro­
babilidade de sofrer lesões físicas por violência do que os homens. Por
outro lado, elas são mais propensas do que eles a sofrer consequências
402 "Não faça isso comigo"

psicológicas, por exemplo, diminuição da autoestima, depressão e es­


tresse como resultado da agressão. Num estudo de referência sobre
maltratos, Neil Jacobson e John Gottman relataram que os homens
praticamente nunca experimentaram ou relataram medo durante as
brigas, ao passo que as mulheres ficavam particularmente aterroriza­
das antes, durante e depois. E mais provável que a violência masculina
escale em intensidade do que a violência feminina.
Outra importante diferença entre a violência praticada por
homens e mulheres é que eles são mais propensos a cometer violên­
cia severa, muitas vezes referida como 'maltrato”. Este parece ter um
propósito diferente para homens e mulheres. Os homens são mais
propensos a usar a violência como um método de controle, intimi­
dação e subjugação, enquanto que as mulheres são mais propensas a
ser violentas como um ato de autodefesa ou como uma expressão
ineficaz de raiva.
Em contraste com as informações sobre violência, há pouca in­
formação sobre a frequência de destruição e coerção física na popula­
ção. Destruição ocorre quando um dos parceiros danifica deliberada-
mente uma posse do outro. Coerção física ocorre quando um parceiro
fisicamente força o outro a fazer algo, como ter relações sexuais, ou
impedir fisicamente o outro de fazer algo, como sair com um amigo.
Embora não haja muita informação sobre esses tipos de atos, eles vão
lado a lado com a violência.

A terapia de casal ou as técnicas recomendadas neste


livro podem ajudar a parar a violência numa relação?

Para responder a essa pergunta, precisamos distinguir entre o


maltrato, por um lado, e, por outro, a agressão física mais comum, de
baixa a moderada. Em situações de violência, quase sempre perpetra­
das por homens, os parceiros têm medo do agressor por causa das le­
sões atuais ou passadas que sofreram em suas mãos. O maltrato inclui
atos como bater com o punho fechado, chutar, bater com um objeto,
Diferenças Reconciliáveis 403

jogar o outro para o chão ou contra uma parede, morder e espancar.


Mesmo que não haja tais atos de violência, pode haver intimidação.
Os parceiros podem ter medo por sua segurança física ou ficar muito
amedrontados para falar o que vem em suas mentes, sob pena de que
o agressor faça uma retaliação.
Nós não fazemos terapia de casal, nem a recomendamos, para
casais em que haja espancamento; a terapia poderia ser perigosa nes­
tas situações. Como a terapia envolve ambos os parceiros nas discus­
sões de tópicos carregados de conflitos, a terapia pode precipitar epi­
sódios violentos. Por exemplo, como terapeutas, poderiamos incen­
tivar uma esposa a explicar seu ponto de vista, seu marido poderia
ficar furioso com ela pelo que ela disse na nossa frente, e poderia re­
taliar em casa, espancando-a. Como terapeutas, teríamos involunta­
riamente precipitado a violência.
Além disso, se concordarmos em fazer a terapia de casal onde
houver espancamento, estamos tratando o problema do agressor
como se fosse um problema de casal. Isso vem a calhar para o agres­
sor, que tipicamente culpa o parceiro pela violência, mas é destruti­
vo para o que sofre a agressão. Coloca o terapeuta na posição insus­
tentável de culpar implicitamente a vítima. Na verdade, parar de ba­
ter é apenas responsabilidade do agressor. Além disso, tratando o par
como um casal, nós damos a entender que este é um relacionamento
que vale a pena salvar. Estamos apoiando o casal para ficar juntos
em vez de separar. Mas isso raramente é o caminho certo para um
casal no qual há maltrato.
Finalmente, há pouca indicação de que qualquer tratamento irá
parar as agressões, incluindo a terapia de casal. A evidência a favor da
reabilitação de qualquer tipo é escassa e sugere que os agressores serão
agressores enquanto estiverem fisicamente aptos. A melhor solução
para o maltrato é que as vítimas se afastem, o que normalmente fazem
quando têm um plano de segurança adequado. Mas o risco em curto
prazo pode ser colocar as vítimas maltratadas num perigo ainda maior
se tentarem partir. Embora, possivelmente, muitas vítimas maltrata­
404 "Não faça isso comigo"

das escapem de relacionamentos abusivos, a fuga é, demasiadas vezes,


seguida por espancamentos mais graves, perseguição, assédio e até as­
sassinato. As vítimas maltratadas interessadas em escapar com segu­
rança, aconselhamos acionar a rede de proteção à mulher vítima de
violência no Brasil, ligando para a Central de Atendimento à Mulher-
SPM Nacional, no número 180. Este pode ser o telefonema mais im­
portante que as vítimas maltratadas fazem. Sugerimos também ir ao
site da DEAM- Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher -
Rede de enfrentamento à Violência contra a Mulher: sistema3.planal­
to. gov.br. Neste site encontram-se os endereços e telefones das delega­
cias especializadas em várias cidades do Brasil.
Eer este livro não vai ajudar vítimas maltratadas assim como
uma terapia de casal não ajudaria. Se você está em um relacionamento
muito violento, você está lendo o livro errado. Na seção Recursos (ao
final deste livro), sugerimos algumas leituras que podem ser úteis para
lidar com a violência nos relacionamentos.
E quando há agressão física mas não há espancamento? O que
pode ser feito sobre esses embates agressivos que levam a um baixo ní­
vel de violência, como empurrar, agarrar ou pressionar, mas não há fe­
rimentos ou intimidação?

Leve a sério a violência, mesmo um empurrão

Uma das coisas preocupantes sobre a violência em casais é que


nenhum dos parceiros talvez a leve a sério. Em nosso estudo de 14”
casais que foram recrutados como parte de nosso ensaio clínico, soli­
citou-se a ambos os parceiros a “Por favor, liste os principais fatores
que levaram você a procurar a terapia de casal”. Apenas um casal rela­
tou abuso físico ou sexual como motivo para a busca de terapia. No
entanto, 52% dos casais sofreram um incidente leve de agressão física
no ano anterior, como agarrar e empurrar e 24% tiveram um inciden­
te de agressão grave, como dar socos ou bater na parede durante o ano
anterior. Nossos resultados estão em consonância com outros no mes­
Diferenças Reeonciliáveis 405

mo campo de estudo. Fica claro que a maioria dos casais com eventos
violentos não os relata como um grande problema.
E mais provável que haja uma tendência para ignorar a violên­
cia quando seu nível é baixo. Por que fazer tanto alarde por um
apertão ocasional ou empurrão? Na verdade, há uma razão muito
boa. A violência leve deveria ser sempre levada a sério, pois pode facil­
mente escalar para uma violência mais grave. O empurrão pode ser
retribuído; mas depois esta troca de agressões pode se transformar
em chutar ou bater. O que antes parecia algo inocente pode se tor­
nar perigoso. A violência leve também pode causar lesões acidentais
- por exemplo, uma pessoa que é empurrada pode tropeçar e cair.
Se você tem filhos, você tem outra boa razão para levar a sério a
agressão leve. Qualquer manifestação violenta entre os pais é preju­
dicial para as crianças, não só porque ela dá um exemplo terrível
para eles e aumenta as chances deles serem fisicamente agressivos em
situações de conflito, mas também porque desencadeia ansiedade
nos filhos em relação aos pais. Eles podem sentir medo e querer pro­
teger aquele que foi empurrado ou agredido. Pode perturbar seus
sentimentos em relação às duas pessoas mais importantes de suas vi­
das. Além disso, a violência entre os pais que ocorre na frente da
criança poderia, certamente, pôr em perigo essa criança (a partir de
objetos lançados ou outras ações não intencionais), e tal violência é
considerada, por lei, um abuso infantil em potencial.
O que significa levar a violência a sério? Você precisa reconhecê-
-la abertamente como um problema. Você precisa falar sobre isso com
seu parceiro e estabelecer uma meta de não-violência em seu relacio­
namento. Você precisa insistir em um padrão de “tolerância zero” para
a agressão. A seguir discutiremos os passos para alcançar esse objetivo.

Estabelecer responsabilidade pela violência

Uma premissa principal neste livro é que ambos os parceiros con­


tribuem para os problemas entre eles. Infelizmente, aqueles que são vio­
406 "Não faça isso comigo"

lentos, destrutivos ou fisicamente coercitivos, muitas vezes, usam esse ra­


ciocínio para justificar seu próprio comportamento: eu não teria empur­
rado você se você não tivesse me insultado tanto. Eu não teria rasgado
nossa foto de casamento se você não tivesse me rejeitado tanto. Eu não te­
ria lhe trancado na cozinha se você estivesse disposto a falar comigo.
Há, é claro, certa lógica para esses argumentos. Sem o insulto,
não teria acontecido a agressão. Sem a rejeição, a foto do casamento
teria permanecido intacta. E com disposição para conversar, não teria
havido necessidade de coerção. Isso não significa, no entanto, que in­
sultos, rejeição ou falta de comunicação causem diretamente a violên­
cia ou que os atos violentos sejam justificados por palavras desrespei­
tosas, por rejeição ou recusa para falar. A liberdade de expressão, mes­
mo a linguagem insultante, é garantida para todos, assim como a li­
berdade de movimento. Violência, destruição e coerção física são atos
ilegais, exceto em casos de autodefesa. Portanto, aquele que é violen­
to, destrutivo ou fisicamente coercivo possui plena e única responsa­
bilidade por essas ações. Ambos os parceiros são responsáveis por con­
flitos e discussões, mas apenas o perpetrador da violência, destruição e
coerção física tem a responsabilidade pela agressão.

Lembrar que o perpetrador pode controlar a violência

Os parceiros violentos podem argumentar que ficam tão irrita­


dos que não conseguem controlar a violência. O conflito provoca a
sua raiva de forma que eles não conseguem não agarrar ou empurrar,
quebrar as coisas, ou impedir o livre movimento do outro. De fato,
parceiros levemente violentos podem controlar a si mesmos e já estão
controlando sua violência. Eles não ultrapassaram certos limites. Ape­
sar de sua raiva, eles não se envolveram numa destruição desnecessária
ou realmente espancaram seus parceiros. Eles têm demonstrado, repe­
tidamente, que eles podem e controlam seus impulsos, provando que
os insultos ou o que quer que os tenha deixado zangados não estão
controlando sua reação violenta.
Diferenças Reeoneiliáveis 407

A tarefa nestes casos é recuar o limite do que é aceitável, mudar


esse controle para que qualquer violência, qualquer destruição ou
qualquer coerção física seja proibida. Você pode insistir verbalmente
sobre este padrão de “tolerância zero”. Mais importante,você pode re­
cusar se envolver em violência, destruição ou coerção física, mesmo
com retaliação. Você pode desencorajar o início da agressão jurando
nunca responder à violência com violência. A menos que seja crítico
para sua autodefesa, qualquer ato de retaliação de violência pode sina­
lizar seu parceiro que você ache que um comportamento levemente
violento seja tão aceitável quanto ele ou ela pensa.

Interromper a discussão antes da violência

Os baixos níveis de violência que são o foco desta seção geral­


mente desenvolvem-se a partir de uma discussão. Há uma escalada do
conflito, um aumento na intensidade, até que você não está ouvindo
o seu parceiro e este não está escutando você. Nenhum debate cons­
trutivo está ocorrendo. Então começam as agressões leves.
Esta escalada pode ser rápida. Como um carro numa corrida
automobilística, você pode ir de um ponto zero de uma conversa cal­
ma para 160 quilômetros por hora de intensa raiva e frustração em
menos de um minuto. Mas é possível estar atento para essa transfor­
mação, não importa o quão rapidamente ela ocorra. E é possível assu­
mir o controle, para aplicar os freios, antes de a violência irromper.
O Capítulo 14 discutiu o “dar um tempo”, interrompendo
uma discussão no meio do caminho. Você e seu parceiro podem usar
esta estratégia para acabar com as brigas e adiar a conversa e, assim,
evitar a violência. Você deve tomar consciência da escalada, estar
sintonizado com a mudança de um debate construtivo para uma
discussão infrutífera. E então é possível parar a briga antes que a
violência aconteça.
Mesmo que você não seja violento, você pode ajudar neste pro­
cesso. Se o seu parceiro pedir para “dar um tempo”, você pode aceitá-lo.
408 "Não faça isso comigo"

Você pode até mesmo ajudar na percepção de uma discussão infrutífe­


ra. Você pode dizer, mesmo que seu parceiro não o faça, "Esse desen­
tendimento está ficando fora de controle. Vamos dar um tempo.” Não
é sua responsabilidade impedir seu parceiro de ser agressivo, somente
impedir a si próprio de agir com agressão. Contudo, se você consegue
parar uma discussão improdutiva, você ajudará seu relacionamento. E
se seu parceiro é o violento, você pode, assim, facilitar que ele contro­
le sua violência.

Buscar ajuda profissional

Se você não conseguir acabar com a violência por conta própria,


procure ajuda profissional. Mesmo que não recomendemos a terapia
de casal para espancamento, nossa pesquisa demonstra que é útil para
a violência de nível baixo a moderado que surge nas discussões. Espe­
cificamente, a terapia de casal é eficaz na melhoria da satisfação geral
do relacionamento quando os casais relatam níveis leves a moderados
de agressão e estes não representam um risco de escalada de violência.
Se um parceiro tem um problema para lidar com a raiva sem recorrer
à violência de baixo nível, destruição ou coerção, a terapia individual
também pode ser útil. O próximo capítulo discute a assistência profis­
sional com mais detalhes.

ABUSO VERBAL, PSICOLÓGICO E EMOCIONAL

Paus e pedras podem quebrar nossos ossos, mas as pa­


lavras quebrarão nossos corações.
Robert Fulghum, All I Really Need to Know I Learned in Kindergarten (1988}

Palavras podem machucar. A crítica meticulosamente pensada, o


comentário depreciativo, a rejeição grosseira e a piada sarcástica podem
criar sofrimento psicológico que faz a dor física parecer leve em compa­
ração. Mesmo a ausência de palavras pode criar angústia emocional se­
Diferenças Reconciliáveis 409

melhante. O afastamento físico em resposta a um gesto afetivo, um


olhar aborrecido em resposta a um entusiasmo, ou uma preocupação
que inibe a expressão emocional pode quebrar nossos corações.
Embora a maioria de nós saiba que o amor traz seu quinhão de
dor, algumas palavras são mais ofensivas do que se possa aceitar. Mas
onde acaba uma atitude “indelicada” ou “injusta” ou “mesquinha” e
começa uma atitude “abusiva”?

Definindo abuso

A expressão abuso verbal se concentra nas ações do agressor,


nas palavras inaceitáveis que este utiliza. Costumamos usar essa ex­
pressão para descrever qualificações e insultos que qualquer um con­
sideraria inconcebivelmente cruéis. Um padrão de ficar amaldiçoan­
do, praguejando ou dizendo palavrões pode, certamente, ser abusi­
vo. Ninguém deve ter que tolerar expressões pessoalmente degradan­
tes como “Você, cadela horrorosa!” Ou “Você, perdedor imprestá­
vel!” Ou “Covarde miserável!”
Certamente, as ameaças de violência física, mesmo que não se­
jam levadas adiante, são outra forma de abuso verbal flagrante. Você
nunca deve ouvir ameaças como “Você diz isso de novo e eu vou que­
brar a tua cara” ou “Você faz isso de novo e eu vou te dar uma surra
de um jeito que você nem vai saber o que aconteceu.” Mesmo que a
ameaça de violência não seja clara, mas apenas implícita, ela é abusiva:
“Você não fará isso se souber o que é bom para você” ou “Você faz
isso de novo e vai se arrepender”.
Outros tipos de ameaças extremas, envolvendo ações ilegais ou
inaceitáveis, também são abusivas, sejam elas realizadas ou não. Você
não deve ter que ouvir ameaças envolvendo a privação de sua liberda­
de (“Eu não vou deixar você sair de casa”) ou ameaças sobre o contato
com seus filhos (“Você faz isso de novo e eu vou levar as crianças, e
você nunca mais vai vê-las”) ou ameaças sobre o acesso a seus amigos
e familiares (“Eu não vou deixar você ir vê-los”) ou ameaças que ne­
410 "Não faça isso comigo"

gam a você a autonomia de um adulto normal (“Eu não vou deixar


você ter dinheiro e quero ver o que você vai fazer”) ou ameaças sobre
a destruição de seus pertences (“Da próxima vez vou queimar esse seu
diário imbecil”). Todas essas ações são abusivas; estas ameaças, realiza­
das ou não, são abusos verbais.
Além destes exemplos óbvios de abuso verbal, é difícil especi­
ficar quais ações e palavras são abuso verbal e quais são meramente
indesejáveis. Definido de forma muito ampla, o termo perde seu sig­
nificado e o ímpeto para parar o comportamento. Em um estudo de
Julian Barling e colaboradores, com 398 casais de Nova York, seis
meses após o casamento, sendo que nenhum dos quais estava procu­
rando terapia de casal, 89% assinalaram o item “insultado/xingado
por ele/ela”, 82% assinalaram “fez/disse algo para ofender ele/ela”,
84% assinalaram “saiu abruptamente da sala/casa/páteo”, e 97% as­
sinalaram “ficou de mau humor/recusou-se a conversar sobre um
problema”. Não surpreende que as taxas são mais altas para os casais
em tratamento: 90% ou mais, admitiram cada um desses comporta­
mentos. Estes provavelmente não são abuso, mas o resultado das di­
ficuldades de relacionamento comuns que apresentamos nas Partes I
até a IV deste livro.
Em vez disso, o termo abuso se refere a alguma ação que é
moral mente errada, que é um comportamento humano inaceitável,
que deveria ser condenado por todos. Podemos ser tentados a usar
a palavra para descrever algo que é meramente negativo ou desagra­
dável para nós, porque acrescenta peso ao nosso protesto, invocan­
do sanções morais contra nossos parceiros. Mesmo se nós usarmos
na esperança desesperada de dissuadir o comportamento desagradá­
vel, no entanto, a acusação de “abuso” pode ser outra forma de acu­
sação que inflama uma discussão. Além disso, pode ser contrapro­
ducente. Por exemplo, a descrição de um marido em relação às crí­
ticas de sua esposa a ele como “abusivas” não mudou o comporta­
mento dela. Em vez disso, deu a ela a oportunidade de desqualificar
a reclamação dele completamente: ver a opinião dela como abusiva
Diferenças Reconciliáveis 411

justamente mostra como ele era ridiculamente sensível à sua “críti­


ca construtiva”.
Como, então, distinguimos o verbalmente abusivo do não
abusivo? Talvez possamos encontrar uma definição mais clara de
abuso se deslocarmos nosso foco das ações abusivas do agressor para
as reações emocionais da vítima. Algumas ações são chamadas de
abuso psicológico ou abuso emocional porque o efeito sobre a vítima é
abusivo. O que significa sentir-se emocionalmente ou psicologica­
mente abusado? E muito mais do que simplesmente sentir-se ma­
goado ou chateado por alguma coisa, mesmo se essa dor ou pertur­
bação for enorme. Podemos ficar muito feridos porque nossos par­
ceiros esqueceram nosso aniversário ou flertaram com alguém ou fi­
zeram um comentário crítico sobre nossa aparência, mas seu com­
portamento, por si só, não é abusivo.
Sentimentos de abuso emocional envolvem medo, intimidação
e degradação. Você é emocionalmente abusado quando se sente sub­
jugado e controlado por seu parceiro. Quando você é abusado emo­
cionalmente, você está assustado, você se sente mal consigo mesmo,
até mesmo desumanizado, e você pode se culpar exclusivamente pelos
problemas no relacionamento.
E claro que é possível ter sentimentos de medo, inadequação,
intimidação, degradação e autoacusação mesmo quando o outro não
está sendo particularmente abusivo. Esses sentimentos podem vir mais
de si mesmo do que de seu contato com seu parceiro. Além disso,
mesmo que ele/ela seja claramente abusivo — gritando, xingando e
ameaçando - talvez você não sinta esses sentimentos ruins sobre si
mesmo. Você pode reagir gritando, xingando e ameaçando em troca.
Embora a comunicação seja claramente destrutiva, ninguém está se
sentindo abusado, apenas com raiva.
Portanto, para obter uma compreensão clara do abuso emocio­
nal e psicológico, devemos considerar as duas pessoas no relaciona­
mento. Se uma mulher se sente intimidada e seu marido está tentan­
do dominá-la; se ela estiver se sentindo desvalorizada e ele olha para
412 "Não faça isso comigo"

ela com desdém e tenta rebaixá-la; se ela está se sentindo culpada e


seu parceiro está lhe acusando veementemente; ou se ela está se sen­
tindo frágil e inadequada e seu parceiro está tentando controlá-la, en­
tão o abuso emocional e psicológico está ocorrendo. O abuso aconte­
ce apenas num contexto de desigualdades de poder. Quando alguém
está por cima e tentando tirar proveito disto e o outro está embaixo e
se sentindo assustado, a situação é abusiva.
Assim, as palavras que são abusivas em um relacionamento
podem não ser abusivas em outro. O que é meramente desagradável
para um casal pode ser veneno para outra relação. Um parceiro po­
deria ridicularizar o outro com comentários como “Você realmente
estragou tudo, você estragou tudo de verdade. Será que você não
consegue acertar pelo menos uma vez?” Se quem ouviu achou estes
comentários irritantes e simplesmente devolveu verbalmente (“Oh,
larga do meu pé”), isso seria uma discussão, não abuso. No entanto,
se as mesmas coisas fossem ditas, e o ataque ocorresse no contexto
de uma história de violência e intimidação, a mesma mensagem se­
ria abusiva.
O maltrato é quase sempre acompanhado de abuso psicológico.
Quando os homens batem nas suas esposas e namoradas (ou seus ma­
ridos e namorados se eles estão em relações homossexuais), suas pala­
vras ameaçadoras carregam as memórias de violência real ou potencial
para a mesma. Suas palavras são frequentemente usadas em conjunto
com seus punhos para subjugar e controlar. Nós mencionamos acima
que este livro não é útil para casais em um relacionamento com mal­
trato. Também não é útil para lidar com o abuso psicológico que
acompanha o espancamento.
Com que frequência o abuso psicológico ou emocional ocorre
na ausência de maltrato? Certamente é possível que alguém em um
relacionamento seja intimidado, subjugado e controlado mesmo sem
a ameaça ou ocorrência real de violência física. Um homem poderoso
poderia usar o dinheiro, junto com suas palavras abusivas, para con­
trolar sua esposa, sem nunca bater nela ou ameaçar agredi-la. Simples­
Diferenças Reeonciliáveis 413

mente não sabemos quantas vezes isso ocorre. No entanto, muitos dos
conceitos deste livro - especialmente em relação à aceitação - não são
apropriados para aqueles casos de controle nem para casos de maltra­
to. Recomendamos que alguém neste tipo de relacionamento comece
com os recursos descritos acima sobre espancamento.

Desencorajando linguagem cruel e inaceitável

As sugestões que se seguem não se aplicam a casos de maltrato


ou controle e subjugação abusivos. Seguir essas orientações poderia fa­
cilmente precipitar a violência em uma relação de maltrato ou adicio­
nar mais abuso num relacionamento que já é psicologicamente ou
emocionalmente abusivo. Essas sugestões se aplicam apenas a casos de
linguagem cruel e inaceitável, tal como xingar, insultar e fazer amea­
ças não violentas. Não usaremos o termo abusivo para esse tipo de lin­
guagem, reservando-o para situações em que há subjugação e contro­
le. Nós também encorajamos você a não usar o termo abusivo, pois
isso pode ser contraproducente nas tentativas de mudar a linguagem
que seu parceiro usa. Você pode entrar em discussões infrutíferas so­
bre se a expressão “foda-se” é abusiva ou não ou se é errado chamar o
outro de “merda”. Isto faz com que se perca o ponto principal, o qual
seria discutir se determinada linguagem é dolorosa, ou não, para você.
E se esta for dolorosa ou cruel ou inaceitável, então ela merece a aten­
ção do seu parceiro. Sua reação emocional ou psicológica é a chave
para determinar se um comportamento justifica a ação. Alguns par­
ceiros podem, ocasionalmente, dizer ao outro “vai à puta que pariu”
ou chamar o outro de “idiota” ou um “merda” ou ameaçar uma sepa­
ração ou divórcio sem causar danos graves. Embora estes sejam atos
pouco louváveis, eles podem ser apenas parte da maneira como um ou
ambos expressam raiva. Se esses atos são extremamente dolorosos,
uma séria afronta à sua dignidade, então você deve agir.
414 "Não faça isso comigo"

Fale com o seu parceiro

E importante falar com seu parceiro sobre um comentário que é


uma afronta dolorosa para você, mas apenas em uma situação calma,
não durante o calor da discussão. Diga ao seu parceiro as palavras ou
comentários específicos que o ofendem e focalize no impacto dessas
palavras em você. Não conversar claramente sobre “a maneira como
você fala comigo” pode deixar seu parceiro inseguro de exatamente o
que você acha ofensivo e pode levar a uma defensividade e discussões
sobre sua própria sensibilidade.
Considere como Ana fala a Edir sobre seus sentimentos e resiste
a ser levada a defendê-los.

Ana: Preciso falar com você. Eu realmente não gosto quando


você me chama de “cadela” durante uma discussão. Acho esse
termo degradante e ofensivo.
Edir: Oh, eu só digo isso quando estou com raiva. Não é real­
mente isso o que quero dizer.
Ana: Você pode não querer dizer isso, mas acho ofensivo, e eu
gostaria que você não dissesse mais.
Edir: Eu acho que você está fazendo uma tempestade em um
copo d’água. E apenas uma palavra.
Ana: E apenas uma palavra, mas para mim é uma palavra ofen­
siva. E eu gostaria, por consideração por mim, que você não
usasse essa palavra.

Agir no momento
Uma maneira eficaz de lidar com linguagem que é inaceitável
para você é agir de maneira que mostre que você não vai tolerar quando
isto ocorre. Por “agir” não queremos dizer uma discussão como a descri­
ta, mas uma ação rápida para acabar com a linguagem imediatamente.
Se o seu parceiro está xingando você ou insultando com uma palavra
inaceitável, você pode simplesmente comunicar “Eu não vou ouvir você
Diferenças Reeonciliáveis 415

falar comigo assim”, e sair. Ou você pode ir embora sem qualquer co­
mentário. Você não tem que tolerar ameaças ou xingamentos ou insul­
tos. Dê um tempo para a situação e deixe o seu parceiro sem público.
Terminar uma conversa quando seu parceiro faz um comentário
desagradável comunica uma mensagem poderosa sobre esse comentá­
rio, mas não é uma atitude fácil de tomar. Você pode ser tão provoca­
do pelo ataque do seu parceiro que você quer atacar de volta. Você
não quer deixar a situação; seu impulso é ficar e brigar. Muitas vezes
isso leva a uma linguagem mais condenável, talvez de ambos os lados.
Da mesma forma, se você está envolvido na conversa ou se há alguma
urgência para esta, você pode não sentir vontade de terminá-la e espe­
rar por um momento melhor.

Não use linguagem condenável com seu parceiro


Se você quiser que seu parceiro fale com você sem falar pala­
vrões, gritar, praguejar ou ameaçar, respeite-o ao se dirigir a ele. A lin­
guagem censurável é, muitas vezes, o produto final de uma discussão
que vai aumentando cada vez mais. Se você próprio evitar o uso de tal
linguagem, além de parar este processo, você pode diminuir as chan­
ces de que seu parceiro o faça. Você pode precisar pedir o “dar um
tempo’ para interromper a escalada.

INFIDELIDADE

Relações românticas mais sérias e comprometidas endossam a


monogamia. De fato, o acordo de ser monogâmico é fundamental
para a maioria dos relacionamentos. E por isso que ter relações sexuais
com outra pessoa é considerado infidelidade - literalmente, “não fiel”:
mais do que ser simplesmente um ato de intimidade com uma tercei­
ra pessoa, significa traição de uma confiança fundamental - e muitas
vezes também uma grande mentira.
416 " Não faça isso comigo"

Infidelidade pode ocorrer mesmo em relacionamentos que


permitem o contato sexual com outros. Esses relacionamentos geral­
mente têm regras acordadas sobre isso. Por exemplo, alguns relacio­
namentos homossexuais permitem o contato sexual com outros,
desde que estas pessoas não sejam amigas de ambos ou que o encon­
tro com esse outro indivíduo ocorra uma única vez. Quebrar estas
regras seria infidelidade.
Infidelidade pode até ocorrer além do contato sexual com ou­
tros. Durante meses Clayton se encontrou secretamente com sua co­
lega de trabalho, Alicia. Apesar de ter dito à esposa que as demandas
de trabalho o mantinham até mais tarde no escritório, na verdade
era por causa de Alicia. Ele abriu seu coração para ela, revelando to­
dos os seus problemas conjugais, incluindo dificuldades da sua vida
sexual. Ela se tornou sua principal confidente. Atrás de sua porta fe­
chada do escritório, Clayton e Alicia não só conversavam um com o
outro; eles se beijavam e se acariciavam. No entanto, eles delibera-
damente evitavam ter uma relação sexual, porque Clayton sentia
que o ato sexual seria claramente uma violação dos seus votos matri­
moniais. Além disso, Alicia queria guardar o sexo para o dia em que
Clayton deixasse sua esposa.
Apesar de Clayton se reassegurar moralmente pelo fato de que
ele não tinha consumado o ato sexual com Alicia, isso teria proporcio­
nado pouco consolo para sua esposa. Ela teria ficado indignada com
seu segredo, mentiras e comentários enganosos. Ficaria furiosa por ele
ter compartilhado seus segredos conjugais com outra mulher. E teria
se sentido uma idiota por confortá-lo quando ele chegava em casa tar­
de, depois de um longo dia de trabalho. O fato de que seu contato fí­
sico com Alicia nunca tivesse ultrapassado a linha até o ato sexual não
a teria consolado. Mesmo que Clayton nunca tivesse beijado e acari­
ciado Alicia, sua esposa teria visto sua relação com sua colega como
um caso romântico que violava seu casamento.
Em uma pesquisa norte americana sobre o comportamento se­
xual humano, cerca de 20% das mulheres e 25% dos homens indica­
Diferenças Reconciliáveis 417

ram que haviam sido sexualmente infiéis em seus casamentos. Entre­


tanto, uma pesquisa britânica com uma definição expandida de infi­
delidade que incluía “adultérios do coração” revelou que 40% dos
participantes eram infiéis. E um relatório sugere que 60% dos casais
que procuravam terapia tinham sido afetados por relações extraconju-
gais que eram completamente sexuais ou eram assuntos do coração.
Parece claro que, embora a maioria dos casais consegue permanecer
fiel um ao outro, há muitos que não.

0 impacto de ter um caso

A descoberta de um caso pode ser um ponto crucial, como a


morte de um membro da família que fica gravada em sua memória e
muda sua vida para sempre. Se você não tem nenhuma ideia do caso
e, então, recebe uma carta anônima ou pega seu parceiro com outra
pessoa, você pode se sentir chocado e atordoado. Se você for forte­
mente ligado ao seu parceiro, você pode experimentar o evento
como um trauma, mais grave em seu impacto emocional do que um
acidente de carro ou um assalto à mão armada. Você pode experi­
mentar os sintomas impostos por um trauma: pensamentos constan­
tes e intrusivos sobre o caso, a incapacidade de experimentar as
emoções que você normalmente vivência, ou ficar muito atento e
super vigilante, e ficar, por exemplo, examinando o seu parceiro para
ter mais provas sobre o assunto.
Mesmo quando a descoberta não é traumática, pode ser destru­
tiva de outras maneiras. Se você suspeitava da infidelidade do seu par­
ceiro, descobrir a verdade pode lhe dar uma sensação estranha de alí­
vio porque mostra que suas suspeitas não eram loucas, como seu par­
ceiro insistia. Ainda assim, a confirmação de suas suspeitas pode lan­
çar uma sombra escura de desconfiança ou erguer uma parede de raiva
que afeta todo o seu contato com seu parceiro.
Ter um caso é uma condição para terminar um relacionamento?
A infidelidade certamente apresenta uma crise, e pode sinalizar o fim
418 "Não faça isso comigo"

do relacionamento. Às vezes, a infidelidade conduz um relacionamen­


to já gravemente deteriorado para um crítico final súbito, porque ne­
nhum dos parceiros tem o desejo de retomar o relacionamento. Mas
mesmo se uma relação for capaz de ser recuperada, a experiência de
violação moral e emocional pode ser tão grande que o parceiro traído
não está disposto ou não pode dar outra chance. Há muitas coisas
boas no relacionamento, mas a infidelidade cruzou uma linha que não
poderia ser ultrapassada.
Embora infidelidade possa e frequentemente acabe com os rela­
cionamentos, isto não precisa, necessariamente, acontecer. Nosso es­
tudo clínico mostrou que casais em que havia infidelidade poderiam
melhorar substancialmente durante a terapia de casal e ficar juntos,
desde que a revelassem na sessão da terapia de casal. Aqueles cuja infi­
delidade foi descoberta após o término do tratamento quase todos ter­
minaram em divórcio. No entanto, ainda que ambos os parceiros
queiram se recuperar do trauma e consertar o relacionamento, pode
ser difícil. Seus esforços podem criar tais problemas adicionais inten­
sos que terminam na separação. Esta é uma situação especial do pro­
blema reativo acabar causando mais problemas — o fim do relaciona­
mento - do que o problema inicial, o caso. E uma armadilha tão co­
mum para os casais que o resto desta seção será dedicado a ajudá-los a
se orientar por meio das dificuldades diante da infidelidade.

Apurar informações sobre a infidelidade

Você pode ter uma forte necessidade de saber o que aconteceu.


Você pode perceber o caso de seu parceiro como algo que também é
seu, assim como dele. Você certamente tem o direito de saber sobre
qualquer risco à sua segurança física. Seu parceiro praticou sexo seguro?
Existe um risco de doença sexualmente transmissível ou de gravidez?
Seu parceiro deveria fazer algum exame clínico? Você deveria também?
Uma vez que as perguntas sobre a segurança física foram resol­
vidas, você pode, desesperadamente, querer saber detalhes sobre a in­
Diferenças Reeonciliáveis 419

fidelidade para que você possa entender o que foi violado e avaliar o
seu impacto. Quanto tempo a relação durou? Quão séria ela era? Al­
guma vez discutiram sobre casamento? Será que eles foram para os
mesmos lugares especiais e românticos que vocês frequentaram como
casal? Eles alguma vez fizeram sexo em sua cama?
Muitas vezes, um enfrentamento se desenvolverá em torno das
revelações sobre o caso. Como seu parceiro não quer irritá-lo mais
ou alimentar sua própria culpa, ele, talvez, esconda detalhes. Ele ou
ela pode minimizar os fatos, tais como o tempo gasto ou os presen­
tes comprados ou a intensidade dos sentimentos. A medida que você
sente a relutância dele em revelar o que realmente aconteceu, você
começa a temer que o caso tenha sido algo mais importante. Você
pressiona para obter detalhes, enquanto seu parceiro resiste. Você
pode se perguntar se em algum momento saberá toda a história.
Como sua sede por informação nunca parece ser satisfeita, você se
encontra perguntando coisas nos momentos mais estranhos. Passan­
do na frente de um hotel na cidade, você pode perguntar: “Você já
foi lá com ele/ela?” Seu parceiro certamente ficará frustrado com o
que parece ser um fluxo interminável de perguntas: “Será que você
nunca vai desistir disso?”
Na terapia de casal, com frequência, estabelecemos um perío­
do limitado para uma revelação completa. Averiguamos se aquele
que traiu está disposto a responder a todas e quaisquer perguntas
durante um número limitado de sessões de terapia, digamos duas ou
três. Durante essas sessões pedimos ao parceiro infiel que não mini­
mize o envolvimento no caso. De fato, podemos pedir a ele ou ela
para contar o que houve o mais próximo da verdade. Por exemplo,
se um marido encontrou seu caso uma ou duas vezes por semana,
ele deveria dizer duas vezes por semana, em vez de uma vez. Desta
forma, sua esposa pode ter uma imagem clara e não minimizada do
caso e seu envolvimento nele.
Pedimos ao parceiro que foi traído que concorde em fazer per­
guntas somente durante aquelas sessões especialmente designadas para
420 "Não faça isso comigo"

tal. Nós o encorajamos a pensar em todas as perguntas possíveis e até


mesmo a escrevê-las antes da sessão. Também pedimos que não faça
apenas perguntas, mas que também revele suas inquietações ao fazê-
-las. Por exemplo, um marido pode querer saber os detalhes físicos ín­
timos do caso da esposa para descobrir se ela era mais ousada com seu
amante do que ela foi com ele. Se ele sentia que ela era resistente a ex­
periências sexuais com ele, ele pode querer saber se ela era mais aberta
com seu amante. Essas revelações podem levar a uma exploração útil,
embora talvez dolorosa, do próprio relacionamento sexual do casal. A
recompensa nestas discussões para o parceiro traído é a revelação com­
pleta, desde que esteja disposto a manter as perguntas nestas sessões
de terapia especialmente concebidas para esta conversa. A recompensa
para o parceiro infiel é que as perguntas cessarão se a revelação com­
pleta for feita conforme acordado.
Se você está lutando com as consequências do caso do seu par­
ceiro e tem uma forte necessidade de saber o que aconteceu, você
pode querer preparar alguma coisa similar. Alguns encontros de reve­
lação completa podem permitir que você obtenha as informações de­
sejadas sem que nenhum de vocês aguente um enfrentamento cons­
tante sobre o que aconteceu.

Feche a porta para a outra relação

Para ir adiante com seu relacionamento, o caso deve parar. Seu


parceiro provavelmente entenderá isso. Ele ou ela pode ter considera­
do um término ou mesmo tentado isto antes de você descobrir o caso.
Mas é uma decisão que afeta três pessoas, e é importante manter isso
em mente. O terceiro envolvido é, frequentemente, uma vítima tam­
bém, talvez tendo sido enganado por seu parceiro em algumas das
mesmas maneiras que você foi. Por exemplo, Clayton uma vez enga­
nou Alicia sobre suas intenções de divórcio, dizendo que tinha con­
sultado um advogado quando ele não o tinha feito. Mesmo que seu
parceiro não tenha enganado o “terceiro”, ele ou ela pode ter preocu-
Diferenças Reeoneiliáveis 421

pações legítimas sobre os sentimentos dessa pessoa. Seu parceiro pode


precisar considerar a melhor forma de terminar o relacionamento.
Você pode querer que seu parceiro acabe não apenas com as re­
lações sexuais, mas com qualquer tipo de relação com seu ou sua
amante. Por causa dos fortes sentimentos que foram gerados nessa ou­
tra relação, seu parceiro pode querer manter laços estreitos, mesmo se
não houver relação sexual. Ele ou ela pode ainda desejar ter conversas
íntimas ou querer manter esse outro relacionamento em aberto para a
eventualidade de a relação de vocês não se recuperar.
Você vai ter um período difícil para voltar a confiar em seu
parceiro novamente, mas pode ser impossível se o seu parceiro não
cortar a outra relação completamente. Seria perfeitamente natural se
preocupar que se uma relação platônica continuar, uma conversa ca­
sual se transformará em uma conversa íntima ou uma conversa ínti­
ma se transformará em intimidade sexual. O progresso de seu rela­
cionamento ficará comprometido se seu parceiro mantiver até mes­
mo uma conexão amigável com a pessoa que uma vez teve uma co­
nexão mais íntima e mais intensa com seu parceiro do que você. No
entanto, seu parceiro pode não estar disposto ou incapaz de cortar
todos os laços. A outra pessoa pode ser um colega de trabalho, e seu
parceiro pode não querer fazer um sacrifício de carreira. Você pode
andar numa corda bamba: Você pressiona seu parceiro para fazer um
sacrifício pela sua relação ou tenta aceitar o contato limitado de seu
parceiro com a outra pessoa?
Restabelecer a confiança pode ser mais fácil se você puder parti­
cipar do término deste outro relacionamento ou pelo menos ter co­
nhecimento sobre seu fim. Talvez você e seu parceiro possam compor
uma carta que diga ao outro que o caso está terminado e que vocês
dois juntos vão retomar sua vida. Ou talvez você pode escutar en­
quanto seu parceiro fala ao telefone e diz ao outro que ele ou ela quer
terminar o caso e recuperar seu relacionamento.
O que é importante neste processo é alterar o equilíbrio de inti­
midade e confidencialidade. Durante o caso, o relacionamento extra-
422 "Não faça isso comigo1

conjugal era um segredo para você. Eles falavam sobre a relação de


você e seu parceiro e seus problemas. Você não sabia nada do relacio­
namento deles. Neste momento, você, a vítima, tem um desejo com­
preensível de saber sobre o relacionamento deles, agora passado, e
uma necessidade igualmente compreensível de negar à terceira pessoa
qualquer informação sobre como sua relação está agora. Você, natu­
ralmente, quer fechar a porta para a pessoa que teve um caso com seu
parceiro para que você possa abri-la para o seu relacionamento.
Esta abordagem vai parecer correta para você que foi traído,
mas pode não parecer certa ao seu parceiro, o qual ainda tem senti­
mentos por outro homem ou mulher. Ele pode alegar, certamente,
ser incapaz de inibir seus sentimentos por essa outra pessoa. Mas
você não está pedindo que ele evite suas emoções, apenas para dei­
xar de ter o mesmo comportamento em relação a esta outra pessoa,
algo que seu parceiro pode controlar. Ele pode se sentir mal por ma­
chucar a outra pessoa, terminando todo o contato. E, se a outra pes­
soa se importava com seu parceiro, o término vai machucá-lo. Mas
o problema do triângulo com um amante nunca pode ser resolvido
sem dor. Geralmente é sofrimento para todos os três. E uma pessoa
deve ser eliminada do triângulo.

Estabeleça responsabilidade pelo caso

Seu parceiro pode culpar os problemas do seu relacionamento


para ter tido um caso. O fato de que a relação não estava íntima ou
que o sexo não era grande coisa, levou-o para os braços de outra pes­
soa. Ou seu parceiro pode ir mais além e culpá-lo diretamente, ale­
gando que você não escutava as inquietações dele, ou porque você era
tão egoísta, ou porque você não era sexualmente receptivo, então pro­
curou conforto em outro lugar. Assim, o caso é tanto sua culpa quan­
to a de seu parceiro — talvez mais sua.
O que você pensa sobre ter um caso e em suas discussões com
seu cônjuge, você precisa esclarecer e separar dois pontos. Em pri­
Diferenças Reeoneiliáveis 423

meiro lugar, pode muito bem ter havido problemas em seu relacio­
namento ou dificuldades em sua receptividade às necessidades do
parceiro. Os casos sempre acontecem num determinado contexto;
eles não acontecem quando ambos estão completamente satisfeitos
com seu relacionamento atual. Mas o segundo ponto é ainda mais
importante: os casos extraconjugais não são feitos para resolver pro­
blemas de relacionamento, e eles, geralmente, tornam esses proble­
mas piores, não melhores. Há muitas outras maneiras construtivas
de responder a problemas de relacionamento que não envolvam se­
gredo e traição. Embora você e seu parceiro sejam conjuntamente
responsáveis pelas dificuldades do relacionamento, seu parceiro é o
único responsável por escolher um caso como uma solução inade­
quada para resolver esses problemas.

Esquece o caso

Três semanas depois de ter confessado o caso, Joel sentia que


não havia trégua na raiva de Maria Luíza. Parecia que todas as conver­
sas se voltavam para o caso. Os olhares dela lhe jogavam mil farpas.
Ela não podia perceber que tinha sido um erro de sua parte? Ele não
foi o primeiro ser humano a cometer tal erro. E ele tinha sido honesto
o suficiente para admitir o caso e forte o suficiente para terminá-lo.
Ela não poderia se concentrar nisto?
Por sua parte, Maria Luíza achava a postura de Joel inacreditá­
vel. Ele parecia querer elogios sobre o fato de que tinha confessado e
terminado o caso, em vez de, pra início de conversa, receber críticas
por ter tido outra relação. Por que ele não poderia dar mais atenção à
dor e angústia dela em vez de justificar sua própria atitude? Por que
ele não poderia lhe dar um verdadeiro e sincero pedido de desculpas?
Ela não precisava que ele se debulhasse em lágrimas, mas sim de um
genuíno arrependimento.
Joel achava difícil pedir desculpas a Maria Luíza por causa da
intensa raiva dela. Ele via em sua raiva, “Você cometeu um crime hor­
424 "Não faça isso comigo'

rível”, ou. “Você é um traste pelo o que fez comigo.” Uma desculpa
lhe parecia admitir ser este traste ou confessar um pecado imperdoá­
vel. Em vez de oferecer um pedido de desculpas ou mostrar remorso,
ele tentava convencê-la de que o caso não era sério e que a outra mu­
lher não significava nada para ele. Mas para Maria Luíza, as tentativas
de Joel para explicar o caso vinham como esforços para invalidar os
sentimentos dela. Ela ouvia em seus comentários a mensagem “Você
não deveria ficar tão chateada, eu não fiz nada tão ruim.” Assim, os
esforços dele para se explicar faziam com que ela ficasse mais brava. E
a raiva dela tornava mais difícil para ele ver o quanto ela sofria e res­
ponder a isto adequadamente.
Um embate, como o que ocorre entre Joel e Maria Luíza, fre­
quentemente acontece quando quem foi traído não consegue esquecer
o caso extraconjugal. Claro, seu parceiro quer que você siga adiante,
para parar de se concentrar no que aconteceu. Ele pode incentivar ou
mesmo insistir que você não pense no passado, que você olhe para o
futuro. Pode, ainda, perguntar por que você traz à tona o assunto
quando isso só cria sofrimento. Mas a traição pode ter abalado a sua
confiança ou ter sido tão emocionalmente traumática que você tem
dificuldade de esquecê-la. Você não consegue evitar pensar nisso. Com
frequência o caso vem à sua mente e você o traz à tona.
Mesmo que seu parceiro reconheça verbalmente a responsabili­
dade pelo o que aconteceu, talvez você ainda não sinta muito alívio
ou satisfação. Seu parceiro pode ter admitido, relutantemente, depois
que você o pressionou a isto. Ele é mais veemente em justificar o caso,
apontando a inadequação em você ou no relacionamento ao invés de
reconhecer a sua própria responsabilidade pessoal.
Se você percebeu que seu parceiro compreendeu sua dor e real­
mente sentiu muito pelo que ele ou ela fez, você poderia esquecer o
caso mais facilmente. Mas, em vez disso, você sente que ele se coloca
numa postura defensiva sobre a traição. As desculpas de seu parceiro
podem parecer muito falsas e não convincentes. Em resposta, sua rai­
va aumenta e seu foco no caso extraconjugal é mais intenso.
Diferenças Reconciliáveis 425

Seu parceiro pode achar difícil expressar um genuíno remorso.


Em face de sua acusação de raiva, ele ou ela pode resistir até mesmo a
dar uma desculpa trivial. Ele não consegue perceber o sofrimento que
há por trás de suas acusações.
Romper esse tipo de embate requer uma de três possíveis ações.
Seu parceiro pode colocar de lado seus próprios sentimentos, perceber
que sua raiva mascara o seu sofrimento, e responder a isto com genuí­
no remorso e desculpas. Por outro lado, você pode abrir mão de algu­
mas de suas acusações, permitir que sua dor e vulnerabilidade — suas
emoções ocultas - sejam mais claras e criar um contexto no qual seu
parceiro possa sentir empatia por você. Qualquer uma dessas ações, se
tomadas unilateralmente, é difícil e, para muitas pessoas, impossível.
Um movimento de ambos é um caminho mais provável para deixar o
embate e, finalmente, o caso. Se o seu parceiro faz um esforço para
compreender a profundidade dos seus sentimentos e você mostra o
lado oculto e mais brando destes, então ele pode ir em direção ao re­
morso genuíno e você em direção ao perdão genuíno.

A permanente questão da confiança

Você pode se perguntar se vai confiar em seu parceiro novamente.


Ele ou ela traiu você uma vez e isso poderia acontecer novamente. Passar
por um caminho desconhecido é mais fácil na segunda vez. Como você
pode resgatar sua confiança em seu parceiro, uma vez que foi quebrada?
Você pode tentar restaurar a confiança ao procurar provas da fi­
delidade ou infidelidade de seu parceiro. Você pode questioná-lo so­
bre suas atividades enquanto não estiver em sua presença. Pode obser­
var cuidadosamente as vezes que ele sai de casa e retorna do trabalho.
Pode interrogá-lo se seu comportamento se desvia do usual — ele che­
ga em casa um pouco tarde, ela não está no escritório quando você
liga, ele tem “assuntos para resolver” na manhã de sábado.
Em resposta, seu parceiro pode ficar irritado com a sua descon­
fiança. Você também pode se perguntar se poderá confiar novamente.
426 "Não faça isso comigo"

Desde suas perguntas aparentemente inocentes sobre seu paradeiro até


seu interrogatório sobre qualquer coisa suspeita, seu parceiro pode te­
mer que ele ou ela nunca será livre novamente. Ele ficará enquadrado
pela sua desconfiança.
Batalhas sobre confiança, às vezes, podem criar tantos ou mais
problemas do que a infidelidade em si. Você fica com raiva de seu par­
ceiro, porque ele ou ela não vai suportar a sua desconfiança. Por um
lado você teve que tolerar a infidelidade, mas por outro, seu parceiro
fica irritado porque você não vai, subitamente, confiar outra vez. Seu
parceiro fica zangado por suas suspeitas, suas perguntas e sua vigilân­
cia. Ele pode se sentir torturado por sua desconfiança.
Uma vez que seu parceiro tenha sido infiel, você pode ficar
procurando por evidências que sejam convincentes. No entanto, o
problema com a evidência é que só é convincente pelo lado negati­
vo, isto é, quando aponta para um caso extraconjugal. A evidência
positiva é sempre suspeita. Se você não encontrar nenhuma evidên­
cia de chamadas suspeitas na conta de telefone, isso pode significar
apenas que seu parceiro usou um celular descartável ou telefones de
trabalho para fazer as chamadas. Se você não encontrar recibos de
cartão de crédito suspeitos, seu parceiro pode ter simplesmente pago
em dinheiro. Mesmo na situação extrema de contratar um detetive
particular, a ausência de provas poderia simplesmente significar que
o/a amante de seu parceiro estava fora da cidade ou não estava dis­
ponível durante o período de vigilância.
Para construir confiança, o que é mais importante do que evi­
dências sobre o que seu parceiro faz quando ele ou ela não está com
você é a experiência que você tem quando ele ou ela está com você.
Vocês podem ter vivências juntos que criem confiança além de qual­
quer evidência sobre o que seu parceiro faz quando você não está pre­
sente. Algumas dessas experiências ocorrem como parte do processo
de descoberta da infidelidade. Por exemplo, se seu parceiro se sentiu
tão culpado pelo caso que ele ou ela parou e revelou a você, mesmo
quando você tinha pouca ou nenhuma suspeita. Você pode encontrar
Diferenças Reeonciliáveis 427

nessa revelação uma base para a confiança. Seu parceiro não consegui­
ria persistir na infidelidade, pois o compromisso com você e integri­
dade pessoal fez com que parasse. Certamente, este tipo de experiên­
cia, não importa o quão perturbadora, estabelece mais uma base para
a confiança futura do que uma situação em que você mesmo desco­
briu a infidelidade em pleno auge.
Mesmo se você descobriu a traição, existem experiências em tor­
no dela que promovem a confiança. Se você percebe a culpa e o remor­
so genuíno de seu parceiro, você se reassegurar que ele tem fortes senti­
mentos por você e um senso intacto de integridade. Se você vivência a
empatia de seu parceiro em relação à dor que você sofreu, você tem uma
razão para acreditar que ele não vai lhe machucar novamente.
A sensibilidade do seu parceiro aos seus sentimentos também
pode reforçar a confiança. Ele pode fazer esforços extras para lhe tele­
fonar quando estiver ausente em viagens de negócios, para que você
possa sentir a segurança do contato com ele. Ela tolera sua inseguran­
ça e suas perguntas. Ele pode deixar passar uma festa em que seu ex-
amante esteja presente.
Uma maior abertura é um antídoto direto para a desconfiança.
Ter segredos e enganar são aspectos necessários para a infidelidade. Se
o seu parceiro faz esforços para ser mais aberto, então haverá menos
pontos desconhecidos entre vocês dois e ele irá promover a sua con­
fiança. Seu parceiro pode oferecer mais informações sobre o que se
passa com ele. Ela pode incluir você em seus círculos sociais do traba­
lho para que você conheça seus colegas e amigos.
O que, em última análise, irá construir a sua confiança são os
esforços do seu parceiro dentro de seu próprio relacionamento. Se ele
abordar os problemas da sua relação, você sabe que esta é importante
para ele ou ela. Você sabe que seu parceiro quer estar com você.
O que complica todas essas experiências de construção de con­
fiança é que elas não podem ser levadas apenas por seu parceiro. Sua
fúria acusatória pode dissipar a empatia dele. Suas exigências podem
anular sua sensibilidade. Seu interrogatório pode impedir muita aber­
428 "Não faça isso comigo'

tura. Para ter experiências de reforço da confiança com seu parceiro,


você deve dar, bem como receber. Você pode querer e precisar que seu
parceiro faça os primeiros movimentos, mas o processo de reconstruir
a confiança exigirá de você dois.

Busque auxílio profissional

Se você não conseguir lidar de forma efetiva com um caso ex­


traconjugal por conta própria, lendo este livro ou os materiais espe­
ciais sugeridos na seção Recursos (no final deste livro) que focam es­
pecificamente sobre este tema, você pode precisar de assistência pro­
fissional. A terapia de casal poderia ajudá-lo a passar pela infidelidade
e resolver alguns de seus problemas de relacionamento. No próximo
capítulo, discutiremos sobre a terapia de casal.

RECAPITULANDO
As três maneiras comuns pelas quais podemos ser maltratados nos relacionamentos
são (1) por meio da violência, da destruição ou da coerção física; (2) por abuso ver­
bal, emocional ou psicológico; e (3) por meio da infidelidade dos nossos parceiros. Es­
ses tipos de ações são muito diferentes umas das outras, particularmente em seu ris­
co, mas são todas semelhantes por serem objetivamente erradas. Na maior parte des­
te livro, tentamos afastá-lo de julgamentos morais, para que você veja seus proble­
mas como diferenças e sensibilidades emocionais exacerbadas por estressores exter­
nos e padrões de comunicação. No entanto, algumas ações, mesmo que sejam co­
muns, são simplesmente erradas. Você não deveria ter que suportar a violência, o
abuso, ou a traição de alguém que o ama.
As ações presentes nestas três categorias não são igualmente erradas. Ser empurrado
é muito diferente de ser espancado. Ser chamado de "idiota" é muito diferente de ter
sua vida ameaçada. Fizemos uma distinção importante entre a agressão por um lado
e a agressão física de baixo nível por outro. Espancamento envolve lesões e intimida­
ção e é quase sempre cometido por homens. Se você está em um relacionamento
com espancamento, este livro não é para você. É importante que você procure ajuda
em outro lugar, como por exemplo, chamando Central de Atendimento à Mulher-
SPM Nacional, no número 180 ou visitando seu site da DEAM- Delegacias Especiali­
zadas de Atendimento à Mulher - Rede de enfrentamento à Violência contra a Mu-
Diferenças Reconciliáveis 429

lher: sistema3.planalto.gov.br. Neste site encontram-se os endereços e telefones das


delegacias especializadas em várias cidades do Brasil. Nossos comentários sobre vio­
lência, destruição e coerção física diziam respeito apenas a níveis leves desses atos.
Da mesma forma como o espancamento, o abuso psicológico e emocional envolve
medo e intimidação. Estes frequentemente andam de mãos dadas com as agressões
físicas, e as pessoas nesses tipos de relacionamentos deveriam consultar os recursos
que fornecemos para espancamentos. Nossos comentários focaram mais estreitamen­
te em linguagem censurável, como dizer palavrões e praguejar.
Finalmente, discutimos a infidelidade, isto é, a traição dos votos de um relacionamento.
A menos que um parceiro revele suas ações imediatamente, um caso extraconjugal
também envolve enganar. Isto quase sempre cria uma crise para a relação, desafiando
um princípio central que os parceiros fizeram pelo relacionamento que é a confiança, e
levantando uma pergunta persistente sobre se a restauração da mesma será possível.
Embora lidar com cada uma dessas ameaças à relação tem seus próprios requisitos
especiais, houve uma semelhança entre essas questões. Nossos parceiros podem acre­
ditar que contribuímos para sua infidelidade ou seu abuso psicológico ou sua violên­
cia pelo que fizemos no relacionamento. Mesmo que eles fossem os perpetradores,
nossas ações os levaram a fazer o que fizeram. Nós também podemos acreditar que
temos a responsabilidade por nossos maus-tratos em suas mãos. Talvez mereçamos.
É importante que nós e nossos parceiros estabeleçamos a responsabilidade pela infide­
lidade, o abuso psicológico, a violência, a destruição e a coerção. Sim, nós assumimos a
nossa parte da responsabilidade - juntamente com os nossos parceiros - por problemas
no relacionamento. Mas nossos parceiros têm a plena responsabilidade de reagir a es­
ses problemas por serem infiéis, verbalmente abusivos, violentos, destrutivos ou fisica­
mente coercitivos. Nenhum problema de relacionamento força os indivíduos a recorrer
a esses tipos de ações. Ninguém merece ser tratado com mentiras ou com abuso. Essas
ações não significam que nossos parceiros são monstros ou desumanos, mas que eles
estavam errados. A recuperação da infidelidade, linguagem cruel ou inaceitável e bai­
xos níveis de violência, destrutividade e coerção física é possível, particularmente quan­
do a responsabilidade apropriada por esses atos é primeiramente estabelecida.
16
Buscando profissionais
Terapia de casal e individual

Se você tem sido bastante infeliz em seu relacionamento por vá­


rios meses ou mais, e seus esforços construtivos para conversar com
seu parceiro, para implementar as sugestões neste livro, e para fazer
mudanças positivas em si mesmo não conseguiram melhorar o seu re­
lacionamento substancialmente, você pode querer tentar outras alter­
nativas. Claro, existem muitos outros livros de autoajuda que se con­
centram em relacionamentos, alguns que geralmente se focam em
problemas de casal, como o presente livro e outros que se concentram
em problemas específicos, como a infidelidade. Na seção Recursos,
listamos vários outros livros de autoajuda que são baseados em princí­
pios sólidos de funcionamento de relacionamento, os quais têm al­
gum apoio na literatura científica.
Outra área totalmente diferente e crescente de autoajuda é por
meio de programas de relacionamento on-line. Dois dos autores
(Doss e Christensen) desenvolveram um programa on-line (www.
OurRelationshi p.com) com base nos princípios deste livro. OurRela-
tionship.com tem dois programas: um para que os casais completem
juntos e outro para que os indivíduos completem sozinhos se seu par­
ceiro não estiver disposto a participar. Se seu cônjuge não estiver len­
Diferenças Reeonciliáveis 431

do este livro com você ou conversando sobre o que aprendeu, mas


pode achar que uma atividade virtual é mais atraente, seguir este pro­
grama on-line juntos pode ser uma boa maneira de envolvê-lo na me­
lhoria de seu relacionamento.
O programa on-line, o qual é interativo e adaptado às necessi­
dades específicas dos participantes, consiste em três seções, uma seção
“observar”, onde os participantes completam questionários breves so­
bre seu relacionamento e recebem feedback individualizado, uma se­
ção “compreender” onde os participantes são levados por meio de
uma análise DEEP (profunda) de seu problema de relacionamento
particular, e uma seção “responder” que ajuda os participantes a deci­
dir sobre as mudanças específicas para abordar o problema e melho­
rar seu relacionamento. No programa para casais, estas três seções cul­
minam em uma conversa: primeiro para esclarecer o problema ou os
problemas que os participantes querem trabalhar na (seção observar),
segundo para compartilhar o que cada um pensa sobre as causas do
problema (seção entender) e, finalmente, para compartilhar o que
cada um gostaria de fazer para resolver esse problema (seção respon­
der). No programa para os indivíduos, os participantes passam por
três seções sozinhos com a opção de envolver o parceiro apenas na fase
de conversação. No entanto, uma vez que você chegou tão longe em
Diferenças Reeonciliáveis, fazer o programa on-line por conta própria
provavelmente não seria o melhor uso do seu tempo, especialmente se
as idéias deste livro estão frescas em sua mente.
Autoajuda, seja por meio de um livro como este ou por um
programa on-line como OurRelationship.com, tem suas limitações.
Se esses programas não funcionam para você ou você deseja mais
atenção profissional, você pode querer procurar terapia de casal. Se o
fizer, não estará sozinho: problemas de relacionamento são uma das
questões mais comuns que enviam as pessoas para profissionais de
saúde mental. A primeira metade deste capítulo explica quem pode se
beneficiar da terapia de casal, que tipos de ajuda estão disponíveis e
como encontrar a melhor pessoa para ajudá-lo.
432 Buscando profissionais

Autoajuda é particularmente susceptível de ficar aquém quando


você ou seu parceiro tem graves problemas individuais que estão afe­
tando o relacionamento. Ao longo deste livro, tentamos afastá-lo da
ideia de culpar seu parceiro por conflitos íntimos. Mas, às vezes, um
de vocês tem um problema comportamental ou emocional, e este cla­
ramente desempenha um papel importante em suas batalhas e na re­
cuperação destas. Pesquisas indicam que a qualidade dos relaciona­
mentos íntimos está associada à presença de ansiedade, depressão,
abuso e dependência de substâncias e disfunção sexual - os problemas
comportamentais e emocionais pelos quais as pessoas mais comumen-
te buscam ajuda. Um relacionamento pobre pode contribuir para a
depressão ou ansiedade de seu parceiro ou abuso de substâncias ou di­
ficuldades sexuais, mas estes problemas também podem contribuir
para um relacionamento pobre, numa espécie de ciclo vicioso.
Se seu parceiro tem um problema individual, você pode ter um
papel importante a desempenhar, não só conseguindo com que ele
procure ajuda profissional, mas também em assisti-lo no seu problema
individual. A segunda metade deste capítulo explicará como.

"NÓS PRECISAMOS DE AJUDA!"

Não é difícil entender porque tantas pessoas procuram terapia


de casal. Quase metade de todos os primeiros casamentos terminam
em divórcio, e as perspectivas são ainda mais sombrias para os segun­
dos casamentos. Mesmo muitos dos que ficam casados não estão feli­
zes no relacionamento - muitos casais ficam juntos apenas porque
barreiras financeiras ou religiosas impedem que eles se separem ou
porque acreditam que ficar juntos será o melhor para seus filhos. Se
seu relacionamento deixou de ser um fator positivo em sua vida, um
prazer ou um apoio para você, e é, em vez disso, um fardo emocional,
a terapia de casal pode ajudar. Mesmo se você está extremamente in­
satisfeito com o relacionamento - ou por causa de uma preponderân­
Diferenças Reconciliáveis 433

cia de emoções negativas como raiva, ressentimento, culpa e desapon­


tamento ou porque há pouca emoção de qualquer tipo, positiva ou
negativa — você é um bom candidato para terapia de casal se você ain­
da estiver comprometido com a relação.

0 que é terapia de easal?

Perguntar como é a terapia de casal é um pouco como pergun­


tar como é o tratamento para o câncer. Assim como o tratamento que
um paciente recebe para o câncer dependerá do tipo de câncer, a va­
riedade de opções de tratamento disponíveis, a filosofia do médico e a
receptividade do paciente, a sua experiência na terapia de casal irá va­
riar dependendo do seu problema específico, a abordagem de trata­
mento escolhida, o tipo de terapeuta que você consulta, e o que vocês
dois estão dispostos a fazer.
A terapia de casal é geralmente feita conjuntamente. Embora
algumas vezes o terapeuta possa querer ver cada um de vocês sozi­
nho, ambos estarão presentes durante a maioria das sessões. E pos­
sível realizar uma abordagem conjugal sem seu parceiro, mas o de­
sejo de ambos os cônjuges para vir ao tratamento certamente au­
mentará sua eficácia.
Você também deve estar ciente de que os terapeutas normal­
mente tomam uma posição neutra sobre os conflitos que dividem os
parceiros. Muitos casais vêm à terapia buscando um conselho específi­
co sobre como resolver um conflito particular, mas os terapeutas ge­
ralmente não entregarão simplesmente um plano passo-a-passo sobre
como o conflito deveria ser resolvido ou como eles próprios solucio­
nariam o mesmo problema em seu relacionamento. Embora possam
dar sugestões, os terapeutas servem, principalmente, como mediado­
res que ajudam os casais a entender seus problemas e, com base nessa
compreensão, auxiliam os cônjuges a criarem suas próprias soluções.
As pessoas que procuram terapia de casal às vezes não querem
conselhos, mas afirmação de suas próprias crenças. Muitos clientes en­
434 Buscando profissionais

saiam mentalmente a ‘evidência” contra seus parceiros antes da pri­


meira sessão. Outros vêm temendo que o terapeuta vá encontrar fa­
lhas na forma como eles se comportam no relacionamento. Como,
geralmente, há um excesso de atribuição de falhas nos casais que pro­
curam a terapia, o terapeuta trabalhará para ajudar os parceiros a se
comunicar melhor e encontrar uma base de entendimento em co­
mum, ao invés de acusar um ao outro.
Isso não significa, no entanto, que o terapeuta seja passivo.
Aqueles que não têm experiência anterior de terapia, muitas vezes,
têm em mente uma imagem estereotipada de um paciente deitado
em um divã, queixando-se de seus problemas, enquanto o terapeuta
se senta próximo, silenciosamente tomando notas. Esta imagem é
mais verdadeira na psicanálise do que na psicoterapia. A maior parte
das terapias individuais hoje não procede desta forma, e, certamen­
te, a terapia de casal também não. Tipicamente, os cônjuges se sen­
tam de modo que possam falar diretamente ao terapeuta, assim
como um ao outro. Além disso, o terapeuta é um participante ativo
na comunicação, ao invés de um observador que fica tomando no­
tas. Como um casal em terapia pode facilmente entrar em discus­
sões, o terapeuta frequentemente serve como um mediador ativo em
seus conflitos.

Quais os tipos de terapia de casal estão disponíveis?

Na verdade, existem tantos tipos de abordagens terapêuticas


quanto há casais em terapia. Cada terapeuta desenvolve sua própria
maneira de trabalhar com os casais e adapta essa estratégia a cada casal
individualmente. No entanto, existem várias abordagens amplas para
trabalhar com casais que têm influenciado os terapeutas.
Uma distinção abrangente é entre aquelas abordagens que se
concentram no passado e aquelas que se concentram no presente.
Uma parcela substancial de terapeutas, que se autodenominam com
orientação psicodinâmica ou psicanalítica, olha para o passado para
Diferenças Reconciliáveis 435

obter respostas para os enigmas do presente. Estes terapeutas acredi­


tam, por exemplo, que as dificuldades conjugais resultam de suas rela­
ções passadas com suas mães e pais ou outras figuras importantes de
seu passado. Portanto, esses terapeutas estarão interessados nas histó­
rias de infância dos cônjuges e estarão à procura de conexões entre o
relacionamento atual e padrões no passado. Por exemplo, talvez o ma­
rido tivesse uma mãe crítica e aprendeu a lidar com esta recolhendo-se
e evitando a comunicação direta com ela. Agora, quando sua esposa é
crítica, ele sente como se fosse com sua mãe e lida da mesma maneira,
recolhendo-se. Ou uma esposa pode ter recebido elogios generosos e
admiração de seu pai quando ela era uma menina. Se seu pai não se
aproximava com adoração, ela fazia beicinho e ficava magoada. Talvez
ela se comporte da mesma forma com seu marido, buscando o seu
louvor, mas fazendo beicinho se ela não conseguir o que ela sente que
seria uma resposta adequada dele. Os terapeutas que se concentram
no passado acreditam que quando as pessoas conseguem se dar conta
da origem de seu próprio comportamento na infância e do comporta­
mento de seus parceiros, elas aprenderão estratégias novas e mais
construtivas para lidar umas com as outras.
Os terapeutas que se concentram no presente não negam que o
passado é influente. Mas não acreditam que seja necessário prestar aten­
ção ao passado para resolver problemas do presente. Além disso, eles se
perguntam sobre a precisão da memória que as pessoas têm de suas histó­
rias de infância. De qualquer forma, eles examinam o comportamento
presente dos casais, as reações emocionais e os processos de pensamento
para ajudá-los a abordar seus problemas de forma mais construtiva.
Uma abordagem importante, chamada terapia de casal comporta-
mental, concentra-se em ações positivas que cada cônjuge poderia ter para
resolver seus problemas e promover um melhor relacionamento. Esses te­
rapeutas estimulam os parceiros a fazer listas de ações que poderiam reali­
zar para tornar o outro mais satisfeito, incentivam os mesmos a se envol­
verem em comportamentos dessas listas e questionam todas as ações que
são realizadas para ter certeza de que estão reconhecendo os esforços uns
436 Buscando profissionais

dos outros. Esta estratégia de focar em mudanças positivas é também um


pilar de clínicos que se chamam terapeutasfocados em soluções.
Além do foco em ações positivas, os terapeutas comportamen­
tais ensinam a comunicação entre os parceiros e as habilidades de re­
solução de problemas, tais como as discutidas no Capítulo 13. Da
mesma forma como treinadores ensinam habilidades atléticas, os tera­
peutas podem fazer os casais praticar durante a sessão, dão um retorno
de seu desempenho e, em seguida, atribuem-lhes exercícios para fazer
em casa para melhorar suas habilidades de comunicação.
Um grupo de clínicos que se chama de terapeutas cognitivo-com-
portamentais pode usar todas as estratégias que acabamos de descrever,
mas eles adicionam uma ênfase à interpretação do comportamento.
Numa noite, Wilson interpreta a falta de interesse de Claire em rela­
ção a afeto físico como punição a ele ao não lhe dar afeto. De fato, a
intenção dela não é, de modo algum, puni-lo; ela simplesmente não
está a fim de ser afetiva. Nesse caso, um terapeuta cognitivo-compor-
tamental analisaria as interpretações de Wilson sobre o comportamen­
to de Claire em um esforço para ajudá-lo a melhor compreendê-la e
responder a ela mais adequadamente.
Outros terapeutas focalizam o presente, mas atendem mais às
emoções do que às interpretações cognitivas. Um grupo de clínicos
que se chama terapeutas de casal focados na emoção olha para as emo­
ções primárias que os parceiros despertam entre si. Por exemplo, os
cônjuges podem ficar tão angustiados um com o outro porque se sen­
tem feridos ou temem o abandono. Esses terapeutas ajudam os parcei­
ros a expressar essas emoções primárias de medo e mágoa em vez de se
envolverem em ataques verbais ou afastamento. A expressão dessas
emoções primárias geralmente gerará uma resposta positiva e empáti­
ca no outro, o que pode levar à proximidade e intimidade.
Pesquisadores estudaram a eficácia de cada uma dessas aborda­
gens em terapia de casal. Mais pesquisas têm sido realizadas sobre a
terapia de casal comportamental do que em qualquer outra aborda­
gem. De fato, estudos realizados nos Estados Unidos, no Canadá, na
Diferenças Reeonciliáveis 437

Europa, na Austrália e na América do Sul mostraram consistentemen­


te que essa forma de terapia ajuda a maioria dos casais heterossexuais
e que muitos casais recaem no período entre 1 a 4 anos após o trata­
mento. Embora menos estudos tenham sido feitos sobre as outras
abordagens para a terapia de casal, a evidência de vários deles mostra
que a terapia cognitivo-comportamental e a terapia focada na emoção
também ajudam os casais.
Desenvolvemos uma abordagem chamada terapia comporta­
mental integrativa de casal (IBCT — Integrative Behavioral Couple
Therapy), que utiliza estratégias semelhantes a várias das terapias já
discutidas, bem como novas estratégias, mas se concentra na aceita­
ção emocional nos relacionamentos. Este livro é uma descrição dessa
abordagem, mas escrito para os próprios casais. Pesquisas que fize­
mos, bem como estudos que outros realizaram, sugerem que a IBCT
é um tratamento eficaz, talvez mais eficaz do que a terapia de casal
comportamental, a qual é a terapia mais estudada até o momento.
Devido à nossa pesquisa, o Instituto Nacional de Saúde Mental dos
Estados Unidos nos (A.Chistensen e N.Jacobson) propôs um finan­
ciamento para conduzir um grande ensaio clínico comparando
IBCT à terapia comportamental tradicional de casal. Cento e trinta
e quatro casais cronicamente e seriamente em dificuldades em Los
Angeles e Seattle receberam até 26 sessões semanais de terapia de ca­
sal. Os dados deste estudo indicaram que a IBCT conduziu a resul­
tados superiores que persistiram ao longo de 2 anos de seguimento.
Um total de 69% dos casais mostrou melhora clinicamente signifi­
cativa, mesmo 2 anos após o término do tratamento. Ao longo dos
3 anos seguintes de acompanhamento, os ganhos tenderam a dimi­
nuir e as diferenças entre os dois tratamentos foi dissipada. Concluí­
mos que a IBCT levou a resultados superiores, mas que para casais se­
riamente e cronicamente em dificuldades, um tratamento adicional na
forma de sessões de reforço pode ser necessário para manter os ganhos. A
seção Recursos lista links para sites onde você pode encontrar tera­
peutas que praticam esta e outras abordagens de tratamento.
438 Buscando profissionais

Quem faz terapia de casal?

Não existe tal coisa como uma profissão de aconselhamento de ca­


sal. Várias profissões diferentes com diferentes tipos de licenças estaduais
ou certificação envolvem tal aconselhamento. Nos Estados Unidos, as leis
de licenciamento dos estados determinam que tipo de prática profissional
uma pessoa detentora da licença pode se envolver. As leis de certificação
estabelecem quem pode usar um título profissional específico.

Psiquiatras
Os psiquiatras são, antes de tudo, médicos clínicos. Assim como
seus colegas que mais tarde se tornarão cirurgiões ou radiologistas ou espe­
cialistas em alguma outra área da medicina, eles passam pelos anos de fa­
culdade de medicina, após completam um estágio ou residência e devem
passar por um exame de licenciamento estadual para a prática médica. O
treinamento da especialidade em psiquiatria vem principalmente durante
uma residência em psiquiatria, que acontece após receber o certificado e
dura 3 ou mais anos. Normalmente, esta residência centra-se em tratamen­
tos médicos, como prescrição de medicamentos e hospitalização, para tra­
tar transtornos mentais graves, como depressão e esquizofrenia. Psiquiatras
também aprendem a deliberar com outros médicos sobre pacientes com
distúrbios físicos que podem ser complicados por fatores psicológicos. A
terapia de casal geralmente não é um foco importante de seu treinamento.

Psicólogos clínicos***
Nos Estados Unidos os psicólogos clínicos têm um PhD ou
PsyD (doutorado em psicologia), em vez de um MD (doutorado em
* N. de T.: No Brasil as determinações legais dos profissionais que trabalham com terapia são
federais.
**N. de T.: No Brasil os psicólogos clínicos, após a formação na faculdade de psicologia, fa­
zem cursos de pós graduação em diferentes abordagens terapêuticas para realizar psicotera-
pia. O treinamento engloba avaliação e tratamento dos transtornos mentais e supervisão de
atendimentos. Com relação à terapia de casal, há poucas instituições especializadas nesta
modalidade terapêutica.
Diferenças Reeonciliáveis 439

medicina). Eles passam por 5 ou mais anos de pós-graduação em


psicologia, na qual estudam avaliação e tratamento de transtornos
psicológicos. Sua formação também inclui um ano de estágio, mui­
tas vezes em um hospital ou clínica de saúde mental, antes de rece­
ber seu doutorado. Antes do licenciamento ou certificação como
psicólogos, eles devem completar um ano adicional ou mais de pós-
-doutorado em avaliação e tratamento. Alguma experiência com te­
rapia de casal é normalmente uma parte do treinamento, embora
apenas um pequeno número de psicólogos, tais como os autores
deste livro, especializam-se nesta.

Assistentes Sociais*

Nos Estados Unidos os assistentes sociais fazem um programa


de pós-graduação de 2 anos antes de obter um grau de MSW (mestra­
do em assistência social). Antes de se tornar licenciado ou certificado
como um assistente social clínico, eles precisam de 2 anos adicionais
de treinamento supervisionado. Estes assistentes sociais que se espe­
cializam em assistência social psiquiátrica vão aprender sobre transtor­
nos mentais e terapia individual, de grupo, de casal e família.

Conselheiros**

Nos Estados Unidos, a maioria dos estados têm leis de licencia­


mento ou certificação para outros tipos de conselheiros ou terapeutas,
tais como conselheiros de saúde mental. De maior relevância para a
discussão atual são aqueles treinados como terapeutas conjugais e de
família (MFTs, às vezes chamados de conselheiros de casal, família e
de crianças). Eles geralmente completam 2 anos de pós-graduação le­
vando a um mestrado. Antes da certificação ou licenciamento, eles ge­
ralmente completam 2 anos de supervisão. O conteúdo desses progra­
* N. de T.: No Brasil os assistentes sociais, após a formação na faculdade de serviço social,
participam de cursos de pós-graduação de terapia de casal e família.
**N. de T.: No Brasil esta profissão não existe.
440 Buscando profissionais

mas de pós-graduação varia consideravelmente, mas MFTs são especi­


ficamente treinados em aconselhamento de casal.

Escolher um terapeuta de casal

Qual desses profissionais de saúde mental é melhor na terapia


de casal? Se supormos que aqueles que têm mais formação geral são os
melhores, escolheriamos os psiquiatras. Geralmente, eles passaram
mais tempo dedicado à sua educação e formação do que qualquer das
outras profissões. Além disso, se considerarmos que o custo e a quali­
dade estão relacionados, também escolheriamos psiquiatras, uma vez
que são geralmente os mais caros. No entanto, grande parte do treina­
mento de psiquiatras é completamente irrelevante para a terapia con­
jugal, especialmente se os problemas do casal não estão ligados a pro­
blemas de saúde física ou mental. De fato, a maioria dos psiquiatras
teve pouco ou nenhum treinamento formal em aconselhamento de
casal. Pode-se pagar muito por muito pouco.
Se excluir o treinamento médico e procurar o profissional com a
maior quantidade de treinamento psicológico, então vamos natural­
mente escolher psicólogos no nível de doutorado. Durante seu treina­
mento, eles podem gastar mais tempo e esforço estudando o comporta­
mento humano do que as outras profissões de saúde mental. No entan­
to, a menos que tenham se especializado em terapia de casal ou família,
eles podem não ter tido muita experiência trabalhando com casais.
Se considerarmos que não é a quantidade total de treinamento
que importa, mas sim a quantidade de treinamento específico em
aconselhamento de casal, podemos escolher um terapeuta conjugal e
de família. Embora menos treinados no todo do que as profissões com
doutorado em saúde mental, esses conselheiros tiveram treinamento
especial em terapia conjugal e de família. Além disso, eles serão menos
dispendiosos do que os profissionais de nível de doutorado. No en­
tanto, os programas que treinam clínicos com nível de mestre mos­
tram grandes diferenças de qualidade. Os padrões de admissão ten­
Diferenças Reeoneiliáveis 441

dem a ser mais baixos do que para os programas de doutorado. Por­


tanto, nos Estados Unidos, o terapeuta que tem uma licença de con­
selheiro ou certificação pode não ser um melhor conselheiro de casal.
Além disso, as qualidades que fazem um bom terapeuta de casal
podem ter menos a ver com a formação profissional e experiência do
que com as qualidades pessoais do terapeuta. Há evidências conside­
ráveis para este ponto na terapia individual. Há alguns anos, revisa­
mos uma vasta literatura de pesquisa sobre treinamento e experiência
em psicoterapia individual e descobrimos que ela tem pouco a ver
com o sucesso da terapia. Sendo assim, os clientes são tão propensos a
ter um resultado bem sucedido da psicoterapia com um terapeuta me­
nos experiente e menos treinado quanto com um terapeuta mais ex­
periente e mais treinado. No entanto, pode ser que o treinamento es­
pecífico em uma abordagem com apoio empírico — como aqueles trei­
nados em IBCT ou terapia focada na emoção - pode alcançar melho­
res resultados para seus clientes.
Acreditamos que a terapia de casal é mais desafiadora do que a
terapia individual simplesmente porque há duas pessoas na sala em
vez de uma e essas duas pessoas são, frequentemente, adversárias. Ser
um bom ouvinte pode levar a ótimos resultados na terapia individual.
Muito mais é necessário na terapia de casal. Portanto, treinamento e
experiência em terapia de casal pode fazer muito mais diferença do
que treinamento e experiência em terapia individual. No entanto, ne­
nhuma pesquisa de excelência existe até este momento sobre como o
treinamento e a experiência em terapia de casal afeta o sucesso dessa
terapia. Devemos, ainda, olhar para outros fatores quando escolhemos
um terapeuta casal.
O melhor terapeuta de casal é aquele que tem sido bem sucedido
com outros casais. Portanto, um bom lugar para obter uma referência é
de amigos que foram ajudados pela terapia de casal. Outro bom lugar
para obter um encaminhamento é de profissionais, tais como terapeutas
e médicos e de religiosos, os quais encaminham as pessoas para a terapia
de casal e obtêm relatos de seu sucesso. Entrar em contato com profis­
442 Buscando profissionais

sionais que podem fornecer rais referências pode significar ligar para
uma clínica de psicologia universitária ou um centro de saúde mental
da comunidade ou um profissional em uma organização de saúde. Mas
não se esqueça de perguntar se a pessoa que for recomendada trabalha
com casais que ficaram satisfeitos com o terapeuta que está sendo suge­
rido. Provavelmente, relatos de clientes satisfeitos são, ainda, a melhor
maneira de encontrar uma terapia satisfatória. Pergunte também se o
terapeuta está praticando qualquer uma das abordagens empiricamente
apoiadas discutidas acima. Essa informação também aumentará as
chances de uma experiência bem sucedida.
Na escolha de um terapeuta, lembre-se que os custos podem
variar amplamente e não são necessariamente uma indicação de qua­
lidade. Se solicitado, esses terapeutas, algumas vezes, negociam com
os clientes por menos do que seu valor normal. Além disso, há segu­
ros de saúde que podem fornecer alguma cobertura para a terapia de
casal, especialmente se você estiver com um terapeuta que é contra­
tado por ou que tenha um convênio com sua empresa para cuidados
de saúde.
Nos Estados Unidos existe um site http: //ibct.psych.ucla.edu,
dedicado à IBCT, que lista centenas de terapeutas em todo o país,
treinados nessa abordagem. A maioria desses terapeutas foi treinada
por meio do Departamento de Assuntos de Veteranos dos EUA,
programa de treinamento em saúde mental. Esses terapeutas licen­
ciados passaram vários dias em uma oficina de treinamento na qual
aprenderam sobre IBCT do primeiro autor (A.Christensen.). Em se­
guida, durante aproximadamente 6 meses, eles atenderam casais
usando esta abordagem enquanto eram supervisionados a cada se­
mana por supervisores IBCT. Estes ouviram fitas de áudio das ses­
sões de terapia desses terapeutas para que pudessem ver como esta­
vam trabalhando e dar-lhes feedback preciso sobre o seu desempe­
nho. Somente foram aprovados pela VA e estão listados neste site
aqueles terapeutas que tiveram um número suficiente de casais, que
participaram de um número suficiente de sessões de supervisão, e
Diferenças Reconciliáveis 443

que demonstraram nas fitas de áudio suficiente competência na


IBCT. Estes terapeutas incluem principalmente psicólogos e profis­
sionais de saúde mental de nível mestre, tais como assistentes so­
ciais. Muitos deles atendem os casais apenas por meio da instituição
VA em que eles são afiliados, mas muitos também atendem casais
nos consultórios privados.
No Brasil, o CEFI (Centro de Estudos da Família e do Indiví­
duo) é o local em que é realizado atendimento para casais e treina­
mento para terapeutas na abordagem teórica IBCT, sob a coordena­
ção da psicóloga Mara Lins. A matriz se localiza em Porto Alegre/
RS, mas oferece cursos em várias cidades do Brasil. O site é www.ee-
fipoa.com.br, e o blog que fala sobre as terapias contextuais e IBCT
é terapiascontextuais.com.br.
O CEFI tem parceria com a CIPCO (Centro Integral de Psico-
terapias Contextuales) em Córdoba/Argentina, que também trabalha
com a IBCT, sob a coordenação do Dr. Fabián Olaz. O site da CIP-
CO é www.cipco.com.ar.

Avaliando o seu terapeuta de casal

Só porque você escolheu cuidadosamente um profissional que


foi bem sucedido com outros casais não significa que ele será bem su­
cedido com você. Mesmo se o terapeuta teve sucesso de 100% antes,
se ele ou ela não pode ajudá-lo, você não encontrou o terapeuta certo.
O processo de escolher criteriosamente um profissional não termina
com a seleção do mesmo. Você deveria avaliar como você e seu parcei­
ro se sentem em relação ao seu terapeuta.
Primeiro, ambos devem se sentir confortáveis com seu terapeuta.
Estar em terapia significa revelar seus sentimentos pessoais, alguns dos
quais podem ser desconfortáveis ou embaraçosos. Você certamente não
quer sentir que seu terapeuta o está julgando por seus sentimentos e po­
sições. Mas mais do que isso, você quer sentir que é fácil falar na frente
dele, que ele ou ela encoraja a comunicação aberta.
444 Buscando profissionais

Em segundo lugar, ambos devem sentir que seu terapeuta é um


aliado compreensivo. Ele ou ela deve ser neutro sobre seus problemas
particulares, não tomar partido por você ou seu parceiro. Mas a neu­
tralidade não impede a compreensão. Ambos devem sentir que seu te­
rapeuta entende seu ponto de vista, que ele ou ela pode ver porque
você se sente de certa maneira.
Em terceiro lugar, as discussões sobre seus problemas devem
ser mais construtivas nas sessões de terapia do que em qualquer ou­
tro lugar. Você veio para a terapia porque evitava falar sobre seus
problemas ou entrava em discussões destrutivas. A menos que seu
terapeuta consiga mantê-los longe de brigas um com o outro ou re-
orientar a discussão para que seja mais produtiva, você não está ga­
nhando nada da terapia.
A última medida de sucesso, no entanto, não é o que acontece
na sessão de terapia, mas o que acontece em casa. Não importa quais
coisas maravilhosas acontecem na sessão, se a tensão entre os dois não
diminui em casa e satisfação entre os dois não aumenta fora da sessão,
então a terapia é um fracasso. Além disso, esses efeitos positivos da te­
rapia não devem levar muito tempo para acontecer. A terapia de casal
não é psicanálise. Não leva anos. A maioria das pesquisas sobre a tera­
pia de casal mostra que os casais podem melhorar com apenas uma
dúzia de sessões (cerca de 3 meses). Em nossa pesquisa, que é mais ex­
tensa do que qualquer estudo publicado até o momento, obtivemos
grandes e duradouros ganhos na satisfação de relacionamento com ca­
sais que estavam cronicamente e seriamente em conflito em 26 sessões
ou menos (cerca de 6 meses).
Melhora em seu relacionamento, como qualquer melhora con­
sequente de outro empenho importante na vida, não é uma linha reta
para cima. Há retrocessos. As vezes, os casais experimentam um “efei­
to de lua de mel” inicial da terapia seguido de um retrocesso, visto
que os problemas são mais profundos ou mais complexos do que se
pensava. No entanto, apesar de alguns altos e baixos, em torno de 10
a 15 sessões de terapia, vocês devem experimentar algum progresso
Diferenças Reeoneiliáveis 445

genuíno. Vocês dois estão enfrentando questões diretamente. Estão


conseguindo conversar sobre elas de forma mais construtiva. Mesmo
se ainda tiverem um caminho a percorrer, vocês deveriam estar sentin­
do certo progresso.
Se a terapia não está ajudando, discuta suas preocupações com
seu terapeuta. Talvez vocês três possam traçar um caminho mais produ­
tivo. Se a terapia ainda não está sendo eficaz, tente outro te-rapeuta. A
terapia de casal é dificilmente uma panaceia, mas nas mãos certas pode,
definitivamente, alterar os relacionamentos para melhor.

"VOCÊ PRECISA DE AJUDA!"

Quando um problema pessoal se torna um problema interpes­


soal? Quase invariavelmente, quando um dos parceiros de uma rela­
ção tem um problema pessoal grave, esse problema interfere no rela­
cionamento, causando conflitos e, por vezes, impedindo uma resolu­
ção eficaz.
Quando Jamil começou a se queixar de dores no peito, ele as
atribuiu à indigestão, ignorando as preocupações Lena de que poderia
ser algo mais sério. Quando começou a transpirar e a sentir náuseas,
continuou a insistir que devia ter sido algo que comeu, mas Lena in­
sistiu para que ele fosse a uma emergência. “Se você não fizer isso por
você mesmo”, ela disse, “pelo menos faça isso por mim”.
No hospital, seus medos mais profundos foram confirmados:
Jamil estava tendo um ataque cardíaco. No entanto, como Lena tinha
insistido que ele fosse para a emergência, os médicos foram capazes de
intervir cedo e minimizar os danos ao seu coração. Ele mais tarde dis­
se a ela: “Você provavelmente salvou a minha vida.”
Os esforços de Lena não terminaram com este evento dramáti­
co. Quando Jamil retornou do hospital, ambos decidiram fazer algu­
mas mudanças radicais em seu estilo de vida. Ele parou de fumar e
cortou a bebida. Ambos tentaram comer menos gordura saturada e
446 Buscando profissionais

mais frutas e vegetais. Eles começaram um programa de exercícios.


No início, o entusiasmo e o apoio de Lena a essas mudanças foram
uma ajuda bem vinda para Jamil. Ela o animava e era empática ao seu
sofrimento, particularmente quando ele parou de fumar. Ela até era
tolerante com seu mau humor.
Mas, gradualmente, Lena assumiu um papel controlador, pa-
rental com Jamil. Ela monitorava sua dieta e olhava com desaprova­
ção quando ele se entregava a um bife ou se enchia de sorvete ou
biscoitos. Servia-lhe legumes mesmo quando ele não queria comê-
-los. Ela relembrava Jamil quando este não fazia seus exercícios. Pre­
ocupada com o seu nível de estresse, ela insistia para ele não ficar
acordado até tão tarde.
Esta forma de relação entre Jamil e Lena criou seu próprio es­
tresse para ele. Ele resistia aos esforços dela para controlá-lo, não im­
portando quão bem intencionados eles eram. Ele se pegava roubando
biscoitos quando ela não estava olhando. Esperava, ansiosamente,
para comer sem ela porque era mais relaxante. Ocasionalmente ele
mentia que ia à academia. Sentia-se diminuído por todo o processo:
de algum modo ele passara de um marido competente e respeitado
para uma criança cheia de tarefas.
Por seu lado, Lena sentia-se cada vez mais frustrada com os es­
forços ridículos de Jamil para proveito próprio. Ele não percebia o
quão próximo da morte ele esteve? Ele queria trazer mais estresse para
si mesmo e para a família? Por que ele não podia fazer o que todos
concordaram que era saudável para ele? Em um momento de insight,
Lena percebeu que ela se importava mais com o problema de Jamil do
que ele. Ela tinha ido de um extremo ao outro: de ajudá-lo no proble­
ma dele a tomá-lo para si própria.
Neste exemplo, Jamil é claramente aquele com o problema de
saúde. E o seu coração que sofreu o dano. E ele quem deve tomar a
medicação e mudar seu estilo de vida. Em um casamento, no entanto,
raramente pode haver um problema isoladamente. Seu ataque cardía­
co afetou Lena de maneira dramática - ela foi confrontada com a pos­
Diferenças Reeonciliáveis 447

sível perda de seu companheiro ou com uma situação em potencial de


ter que cuidar de um inválido. Era quase como se seu casamento ti­
vesse sofrido um ataque cardíaco também.
Como qualquer parceiro amoroso, Lena tentou ajudar Jamil
com seu problema. Mas com o tempo sua ajuda se transformou em
pressão e controle. Talvez Jamil precisasse um pouco disso, mas as ati­
tudes dela criaram seu próprio estresse para ele. E as dificuldades de
Jamil em fazer mudanças no estilo de vida criaram estresse para Lena.
Um problema de saúde tornou-se um problema interpessoal.
Com um problema de saúde física, é relativamente fácil de es­
clarecer quem tem a dificuldade, o que deve ser feito sobre ela e
como um companheiro pode ajudar. Quando um dos parceiros tem
um distúrbio psicológico, é mais difícil fazer essas simples distin­
ções. Problemas psicológicos existem em um contínuo, e, a menos
que estes transtornos sejam extremos, os parceiros podem nem mes­
mo concordar se existe um problema. Um marido que menciona
que sua esposa tem um problema com depressão pode se deparar
com a resposta que qualquer depressão da parte dela é apenas o re­
sultado do mau tratamento dele para com ela. Mesmo se ambos
concordam que um tem um problema psicológico, eles podem dife­
rir sobre o que deveria ser feito sobre ele. A esposa pode sugerir tera­
pia conjugal, enquanto que o marido propõe medicação antidepres-
siva. Além disso, eles podem divergir sobre o papel que o parceiro
“que está bem” deveria assumir. A esposa deprimida pode querer
mais apoio emocional de seu marido enquanto ela luta contra a de­
pressão, ao passo que ele pode referir todas as responsabilidades ex­
tras que já assumiu em um esforço para aliviar o estresse dela. Em
cada uma dessas situações, qualquer problema pessoal que existe
pode rapidamente tornar-se um problema interpessoal. Além disso,
o problema pessoal pode ter se originado, em parte, na relação.
Se seu parceiro tem um problema pessoal sério, como você po­
deria não assumir o problema como sendo seu próprio, e, ao mesmo
tempo, sem rejeitá-lo ou abandoná-lo para que ele lide sozinho com
448 Buscando profissionais

sua dificuldade? Se você puder navegar nessas águas difíceis, você não
só irá ajudar o seu parceiro, como poderá aumentar a intimidade em
seu relacionamento. Uma luta conjunta contra um problema impor­
tante pode trazer uma maior proximidade. Se você é aquele com a di­
ficuldade pessoal, a sua abertura e desejo de olhar para si ajudará não
só a você, mas também ao seu relacionamento. Isto também pode per­
mitir que seu parceiro lhe auxilie mais ativamente.
Está além do escopo deste livro examinar especificamente to­
dos os possíveis problemas psicológicos que você ou seu parceiro
possam ter, ou mesmo considerar especificamente os mais comuns,
tais como ansiedade, depressão, problemas com álcool ou outras
drogas e disfunção sexual. Cada um desses problemas é complicado
por conta própria e pode impor desafios específicos em um relacio­
namento íntimo. O que podemos fazer aqui é oferecer algumas dire­
trizes gerais, com base nos princípios deste livro, para lidar com um
parceiro que tenha um transtorno psicológico. Na seção Recursos,
fornecemos informações para ajudar você ou seu parceiro a localizar
livros apropriados ou tratamento se algum de vocês estiver enfren­
tando problemas individuais.

Pense das dificuldades do seu parceiro como


uma dificuldade psicológica ou transtorno, não
como uma falha de caráter

E relativamente fácil lidar com problemas físicos de um parcei­


ro. Se seu marido é ferido em um acidente ou tem uma doença real,
você sente genuína preocupação e empatia por ele. Se sua esposa pre­
cisa de uma cirurgia, você a visita no hospital de bom grado. Você não
se ressente se seu parceiro não dá conta das suas responsabilidades,
mas, em vez disso, você assume parte destas, enquanto ele ou ela não
pode lidar com isso.
Dificuldades emocionais e comportamentais são mais difíceis
de lidar. Você pode acreditar que seu parceiro trouxe para si um
Diferenças Reeonciliáveis 449

problema emocional e, portanto, é responsável por isto. Pode sus­


peitar que seu parceiro se faça de doente por preguiça. Também ver
dificuldades emocionais, tais como ansiedade ou depressão, como
uma fraqueza pessoal, uma inadequação no manejo das tensões da
vida. Você pode temer que seu parceiro esteja lhe manipulando
emocionalmente.
As dificuldades comportamentais, ainda mais do que as dificul­
dades emocionais, podem sugerir falhas de caráter. As pessoas podem
não ser responsáveis por suas emoções, mas, certamente, são responsá­
veis por seu comportamento. Um abusador de álcool toma a decisão
de beber; ele ou ela não é forçado a fazê-lo. Os problemas comporta­
mentais tais como abuso de álcool e outras drogas envolvem um com­
portamento tão claramente voluntário, que, por isto, pode parecer
inadequado ser chamado de transtorno psicológico. Pois se assim fos­
se, isso não permitiria que seu parceiro se isentasse da responsabilida­
de por seu comportamento?
De modo algum. Ver o seu parceiro como tendo um transtorno
psicológico não o absolve da responsabilidade ou lhe tira a escolha de
cuidar ou não deste transtorno. Assim como as vítimas de câncer fa­
zem a escolha de procurar um tratamento mesmo quando este é dolo­
roso e assustador, as pessoas com problemas com álcool ou jogo po­
dem buscar e cooperar num tratamento difícil.
Existem muitas boas razões para pensar nos problemas emocio­
nais e comportamentais como dificuldades ou transtornos psicológi­
cos e não como falhas de caráter. Primeiro, uma abundância de evi­
dências sugere uma vulnerabilidade genética para quase todos os dis­
túrbios psicológicos. Ansiedade, depressão, disfunção sexual e alcoo­
lismo não são falhas em algo tão nebuloso como o caráter; eles são
produtos complicados de fatores biológicos e ambientais sobre os
quais podemos ter pouco controle.
Segundo, se os problemas emocionais e comportamentais são
aceitos como problemas psicológicos, parte da vergonha e culpa
associada a eles pode ser dissipada. Ao invés de impulsioná-los
450 Buscando profissionais

para a mudança, a vergonha e a culpa que muitas pessoas sentem


sobre a depressão ou abuso de álcool pode afundá-los ainda mais
em seus problemas. Quando a autoculpabilização faz eco com uma
condenação da família e amigos, uma espiral descendente pode fa­
cilmente ocorrer.
Em terceiro lugar, as pessoas podem admitir que tenham uma
dificuldade ou transtorno mais facilmente do que admitir que sejam
más, inadequadas ou um fracasso. Chegar à conclusão de que elas têm
um problema com a bebida ou com jogo ou um problema com de­
pressão é, muitas vezes, o primeiro grande passo para quem tem um
transtorno psicológico. Este ato, não importa quão difícil seja, é nor­
malmente mais fácil se isto não destruir sua dignidade.
Finalmente, ver problemas emocionais e comportamentais co­
mo transtornos psicológicos torna mais fácil buscar ajuda para eles. E
existem tratamentos específicos. Passos concretos podem ser tomados
para procurar esses tratamentos: fazer uma consulta, participar de uma
avaliação, ir para um grupo de mútua ajuda. Não está claro como tratar
falhas de caráter, uma falta de vontade, uma personalidade inadequa­
da ou fracasso como uma pessoa.
Você pode achar mais fácil pensar no problema de seu parceiro
como um transtorno psicológico se você conhecer mais sobre o mes­
mo. O apêndice deste livro lista recursos para vários transtornos psi­
cológicos comuns que podem ser um ponto de partida em sua busca
por mais informações sobre um transtorno em particular. No entanto,
cada pessoa é única. Se você quiser saber mais sobre os problemas de
seu parceiro, você precisará conversar com ele ou ela e escutar.

Fale sobre o problema

As vezes problemas psicológicos são o elefante na sala sobre o


qual ninguém trata. Um marido raramente discute a dificuldade de
sua esposa em sair de casa por causa de sua ansiedade; nem ela. Uma
esposa nota, mas não menciona, a quantidade de álcool que seu ma­
Diferenças Reeonciliáveis 451

rido consome a cada dia; nem ele. O cônjuge com o problema pode
negar a gravidade da sua patologia; o parceiro pode ter medo de tra­
zê-lo à tona.
Outros casais podem discutir sobre as dificuldades de um par­
ceiro com frequência, mas de forma improdutiva. Um marido se quei­
xa dos problemas com drogas de sua esposa, mas ela descarta ou igno­
ra suas queixas. Uma esposa se queixa do completo desinteresse do
marido em relação ao sexo, mas ele desconsidera, passivamente, as in­
quietações dela.
Se você tem um parceiro com um transtorno psicológico sério,
você pode sugerir que ele procure tratamento; você pode até mesmo
pressioná-lo. No entanto, seu aconselhamento, especialmente se for
baseado em algumas leituras sobre o problema, pode parecer como
conselhos autoritários, vindos de um “especialista” autodenominado.
Ou suas recomendações podem ser entendidas como uma mensagem
subliminar acusatória: “Você está tão mal que precisa de um psiquia­
tra.” Seu conselho pode advir de sua própria frustração e transmitir a
seguinte conotação “E impossível para eu lidar com você, talvez os
profissionais possam fazê-lo.” Estas recomendações refletem suas pró­
prias necessidades e não as necessidades de seu parceiro: “Eu não que­
ro mais ter que lidar com isso, vá para um profissional.” Estas reco­
mendações são, muitas vezes, de rejeição ao outro: “Leve seus proble­
mas para outro lugar.”
Não é surpresa quando um parceiro reage negativamente às re­
comendações que contêm essas mensagens. Ele pode discutir com
você, rejeitar seus apelos para que se trate, ou criticá-lo em troca. Pode
resistir a suas sugestões, simplesmente porque você as fez. Suas reco­
mendações para tratamento podem, então, impedir que seu parceiro o
procure ou, no mínimo, postergue-o.
E melhor conversar com seu parceiro sobre seu problema
quando você não está frustrado com isso. Quando você não está
chateado, então pode se aproximar de seu parceiro com interesse
pelo seu bem-estar; sua mensagem, provavelmente, não terá tons de
452 Buscando profissionais

acusação. Também, normalmente é melhor falar sobre o problema


de seu parceiro quando ele não está irritado com você. Sendo assim,
é menos provável que ela ou ele entenda como uma acusação e have­
rá mais chances de que escute sua preocupação. Finalmente, é me­
lhor não mencionar o tratamento de imediato. Seu parceiro deve
admitir o seu problema antes que esteja disposto a buscar tratamen­
to. Se ele fica defensivo sobre abordar seus problemas, pode ser ne­
cessária uma longa conversa construtiva antes que ele possa encarar
a possibilidade de um tratamento.

Você não pode controlar as emoções


ou o comportamento do seu parceiro

Um tipo especial de dor vem quando vemos aqueles que amamos


fazer coisas prejudiciais para si mesmos. Vemos um parceiro alcoolista
tomar o primeiro copo, sabendo o que vai se seguir. Nós assistimos um
parceiro deprimido repreender-se implacavelmente. Normalmente, es­
sas ações não só nos trazem dor indireta, mas também nos afetam dire­
tamente. Nós ficamos envergonhados com as bebedeiras de nossos par­
ceiros e limpamos tudo depois. Tememos que a espiral descendente da
depressão possa levar a uma perda de emprego. Queremos parar essa
emoção e comportamento autodestrutivos, tanto por eles como por nós
mesmos. Não podemos sentar e ficar assistindo, impotentes, sem fazer
nada. Assim, tentamos controlar seu comportamento destrutivo. Pode­
mos pressionar uma pessoa deprimida para sair da cama e tentar apro­
veitar o dia. Podemos lembrar um parceiro alcoólico de não beber em
uma festa. Podemos tentar distrair um parceiro ansioso.
Se o problema for grave, é improvável que esses lembretes te­
nham muito impacto. Podemos nos tornar muito mais um parceiro
irritante do que alguém útil. Como assistimos o fracasso de nossos es­
forços para controlar os nossos parceiros, provavelmente ficaremos
com raiva. Reclamamos do seu comportamento destrutivo e os criti­
camos pelo seu problema.
Diferenças Reeonciliáveis 453

Em nossos esforços frustrados para ajudar nossos parceiros, con­


trolando seu comportamento, podemos inadvertidamente contribuir
para suas dificuldades. Há considerável pesquisa sobre como os mem­
bros da família respondem a um cônjuge ou filho com um transtorno
emocional grave. Críticas, hostilidade e até mesmo envolvimento ex­
cessivo na vida do paciente e seus problemas têm, consistentemente,
demonstrado ter efeitos negativos sobre ele. Por exemplo, Jill Hooley,
psicóloga da Universidade de Harvard, examinou a recaída em pa­
cientes deprimidos. Ela e seus colegas acompanharam pacientes depri­
midos após serem liberados do hospital e analisaram o que prediz se
sua depressão retornaria. Os pacientes cujos cônjuges tinham atitudes
críticas e hostis em relação a eles eram mais propensos à recaída. De
fato, em um estudo, a resposta de pacientes à pergunta “Quão crítico
é o seu cônjuge com você?” foi o melhor preditor de recaída - melhor
do que a satisfação conjugal geral do casal e melhor do que outra va­
riável previamente mostrada para prever a depressão, e ainda melhor
do que essas duas variáveis combinadas!
Pode ser difícil aceitar que você não possa controlar as emo­
ções destrutivas e comportamento do seu parceiro. No entanto, você
tem algum poder para influenciá-lo de várias maneiras positivas.

Valide as emoções de seu parceiro, não


necessariamente o comportamento

Aqueles com problemas psicológicos muitas vezes se sentem an­


gustiados, tanto como parte do problema , quanto como resultado do
problema. Uma pessoa deprimida por definição é infeliz, mas também
pode ficar deprimida porque ela é deprimida. Da mesma forma, uma
pessoa ansiosa é angustiada por definição, mas também pode ficar an­
gustiada porque ela é ansiosa. Finalmente, alguém com um problema
de álcool ou outras drogas ou de uma disfunção sexual pode ficar en­
vergonhado por seus problemas. Essa angústia é real, e você pode aju­
dar mostrando alguma empatia.
454 Buscando profissionais

Às vezes, os parceiros hesitam em empatizar com emoções que


parecem excessivas, no medo de que sua empatia possa exacerbar ou
reforçar as emoções. Embora isso possa acontecer se a expressão emo­
cional for a única maneira de chamar a atenção, uma ocorrência mais
comum é que o “parceiro que está bem” resista ou minimize as emo­
ções do “parceiro doente”, então este exagera suas emoções em uma
tentativa vã de provar ao outro que sua dor é real. Ou o “parceiro do­
ente” se sente ainda pior por se sentir sozinho na dor. Em ambas situ­
ações, a resposta do “parceiro que está bem” realmente exacerba a an­
gústia do “parceiro doente”.
A dor de seu parceiro é real. Você pode validar essa dor de for­
ma a mostrar a seu parceiro que acredita e compreende sua angústia.
Esta validação irá provavelmente aliviar sua dor e facilitar a tomada de
ação construtiva para resolver suas dificuldades, especialmente se você
seguir os conselhos adicionais abaixo.

Estimule mas não insista para seu


parceiro ter uma ação construtiva

Se seu parceiro sente que você é um aliado e não um adversário,


ele ou ela provavelmente estará mais aberto a suas sugestões carinho­
sas. Por exemplo, incentivar sua esposa ansiosa para fazer um telefone­
ma que ela sente como difícil pode facilitar que ela o faça. Sua suges­
tão de que seu marido deprimido levante da cama e vá às compras
com você pode alterar seu comportamento e seu humor. Seu pedido
de que você e seu parceiro saiam de uma festa mais cedo, antes que ele
beba mais do que seu limite, pode impedir um episódio de bebedeira.
Entretanto, existe uma linha tênue entre o estimular e o insistir.
Se o seu parceiro começa a resistir, é melhor recuar. Ainda é a vida
dele e seu direito de decidir como se comportar. Você não pode ser
aliado se assumir o papel de pai ou juiz.
Diferenças Reeonciliáveis 455

Reforce o comportamento construtivo

Praticamente todos com dificuldades psicológicas tentam, às vezes,


ter ações construtivas para lidar com isto. Seu parceiro também, e você
pode estar lá para apoiar esses esforços. Se seu marido deprimido faz um
esforço para se envolver numa atividade construtiva, apesar de se sentir
desanimado, você pode apoiar essa ação, reforçando-a adequadamente,
demonstrando-lhe que você aprecia o esforço que ele está fazendo para se
mover, apesar de se sentir deprimido. Se sua esposa ansiosa faz um esforço
para enfrentar um de seus medos, você pode estar lá para animá-la. E se o
seu parceiro solicita que você retire a bebida de casa para que não seja
uma tentação constante, você pode apoiar esse pedido saudável.
As vezes, os parceiros não são generosos em relação ao seu
apoio. Eles não querem reforçar nada exceto uma mudança muito in­
tensa de comportamento. No entanto, as evidências mostram que nós
geralmente não mudamos em saltos dramáticos, mas tomando peque­
nas atitudes construtivas. Reforçar as modestas mudanças que seu par­
ceiro faz pode ter um efeito cumulativo ao longo do tempo.
Lidar com um parceiro com um problema sério é emocional­
mente difícil e, às vezes, perigoso. Tais problemas podem afetá-lo dra­
maticamente. E importante desistir de alguns dos seus esforços infru­
tíferos para tentar controlar o seu parceiro e para ajudá-lo como des­
crito acima. No entanto, você será capaz de fazer isso de forma ideal
apenas se também cuidar bem de si mesmo.

Proteja-se e cuide de si mesmo

Alguns problemas emocionais e comportamentais de seu parceiro


podem apresentar ameaças à sua própria segurança, bem como a dele. E es­
sencial dar atenção ao cuidado de si mesmo, ainda que não possa cuidar de
seu parceiro. Talvez você não possa impedir que seu parceiro dirija sob a in­
fluência de álcool ou outras drogas, mas você pode se recusar a andar junto.
Você pode não ser capaz de impedir que seu parceiro jogue, mas pode to­
mar medidas para proteger o seu dinheiro e talvez o dinheiro da família.
Mesmo em circunstâncias menos dramáticas, talvez seja necessário que você
456 Buscando profissionais

cuide de si mesmo. Lidar com um parceiro que tem um transtorno de an­


siedade ou depressão pode ser uma situação que lhe exija demais. Sua vida
pode se concentrar nas necessidades do outro em detrimento das suas. Você
assume as responsabilidades de seu parceiro porque ele tem muita dificulda­
de com elas. Suas antenas estão exatamente sintonizadas com o estado emo­
cional do outro, e, sendo assim, você detecta as mudanças de humor, mes­
mo antes que ele o faça. A medida que sua vida se torna restrita pelas de­
mandas dele, você naturalmente se sente ressentido com ele e o critica pelo
comportamento deprimido e ansioso. Esta crítica pode então exacerbar as
dificuldades de seu parceiro com ansiedade ou depressão e criar tensão entre
vocês dois. Além disso, você pode sentir culpa junto com ressentimento,
por ver a luta de seu parceiro. Este é outro exemplo do esforço para lidar
com um problema inicial criando um problema reativo adicional.
Ao não se perder nos seus esforços para ajudar o seu parceiro,
cuidando de suas próprias necessidades, bem como das dele, você
pode ter que enfrentar alguma decepção, possivelmente até raiva, de
seu parceiro. No entanto, você pode limitar seu próprio ressentimento
e culpa e ser capaz de ser mais enérgico e solidário. Ao cuidar de si
mesmo, você também poderá ser mais capaz de cuidar do outro.

Busque ajuda profissional

Os transtornos psicológicos geralmente requerem assistência profis­


sional. Uma vez que seu parceiro tenha admitido um sério problema psi­
cológico, você pode ajudar a buscar um tratamento. Na verdade, pode ser
útil se você participar. A terapia sexual é realizada de uma maneira melhor
com ambos os parceiros. Alguns tratamentos para problemas de uso de
substâncias, como o alcoolismo, também envolvem os dois. A terapia de
casal é um tratamento útil para a depressão, especialmente quando os
problemas de relacionamento são uma das causas originais deste transtor­
no ou servem para mantê-lo. Mesmo se você não participar do tratamen­
to em si, você pode apoiar os esforços do seu parceiro na terapia.
Algumas das sugestões que fizemos sobre buscar terapia de casal são
aplicáveis à terapia individual. Entre em contato com amigos e profissio-
Diferenças Reconciliáveis 457

nais para encontrar um profissional de saúde mental que se especializou


no transtorno em questão e que tenha sido bem sucedido. Seu parceiro
precisa se sentir confortável e confiante com o terapeuta. Este deve traba­
lhar com um tratamento baseado em evidências científicas. Por exemplo,
dos tratamentos psicológicos, a terapia comportamental e terapia cogniti­
vo-comportamental têm se mostrado eficazes com ansiedade e transtor­
nos depressivos. Psicoterapia interpessoal também se mostrou efetiva para
a depressão. Existem também medicamentos que são eficazes para a de­
pressão e ansiedade, particularmente para a depressão. Não hesite em per­
guntar ao seu terapeuta sobre a evidência científica que apoia o tratamen­
to que ele ou ela lhe oferece ou para pedir indicações de bibliografia.

RECAPITULANDO
Apesar de seus melhores esforços, você pode ser confrontado com problemas de rela­
cionamento, os quais você é incapaz de resolver só por meio da leitura deste livro.
Programas de relacionamento on-line também podem ser benéficos, como OurRela-
tionship.com, que é baseado nos princípios deste livro. No entanto, seus problemas
podem necessitar de ajuda profissional - aconselhamento de casal ou terapia de casal
- para melhorar seu relacionamento. Dezenas de estudos realizados em todo o mun­
do mostraram que a terapia pode ajudar os casais a melhorar sua satisfação uns com
os outros. A terapia de casal certamente não é uma panacéia para problemas de rela­
cionamento: alguns casais não são ajudados e outros recaem após o tratamento. Mas
pode ajudar a maioria dos casais a resolver suas dificuldades e melhorar sua relação.
Consulte a seção Recursos sobre fontes para lhe auxiliar na busca de terapeutas.
As dificuldades psicológicas de seu parceiro, tais como ansiedade, depressão, disfun­
ção sexual ou alcoolismo, apresentam problemas para ambos. Na pior das hipóteses,
os problemas de relacionamento contribuem para o transtorno psicológico individual
e este interfere nos problemas de relacionamento. Na melhor das hipóteses, a relação
pode apoiar e até mesmo curar os problemas individuais de seu parceiro, contribuin­
do para uma maior intimidade entre vocês. Se ambos conseguem discutir o problema
de forma construtiva, assim como se você aceitar suas limitações em influenciar o
comportamento do seu parceiro, proteger-se e se cuidar enquanto o ajuda, validando
sua angústia emocional, estimulando-o para ações construtivas e as reforçando, vo­
cês podem unir forças para enfrentar o problema juntos ao invés deste lhes alienar.
Você pode procurar ajuda profissional e usá-la de forma eficaz.
Recursos
WEBSITES DOS AUTORES

Andrew Christensen, PhD


www.psych.ucla.edu/faculty !faculty_page?id=24&area=2
www.DrAndrewChristensen.com

Brian D. Doss, PhD


www.psy.miami.edu/faculty/bdoss

TERAPIA COMPORTAMENTAL INTEGRATIVA DE CASAL

A Terapia comportamental Integrativa de Casal (Integrative behavioral couple therapy -


IBCT) foi desenvolvida por Andrew Christensen e Neil S. Jacobson e é a abordagem te­
rapêutica deste livro. Para informações desta abordagem, incluindo a pesquisa que a
apóia, assim como as referências dos terapeutas treinados nela, veja o seguinte website:
HTTP://ibct.psych. ucla.edu
Para participar do programa online de IBCT descrito no capítulo 16, vá para www.
OurRelationship.com
No Brasil saiba mais sobre IBCT em: terapiascontextuais.com.br

VIOLÊNCIA E ABUSO DE PARCEIRO ÍNTIMO

Nos Estados Unidos da América: HOT LINES

1-800-799-SAFE (7233)
1-800-787-3224 (TTY)
No Brasil*: Central de Atendimento à Mulher—SPM Nacional, no número 180
460 Recursos

WEBSITES
www. thehotline. org www. ncadv. org

No Brasil*: DEAM — Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher — Rede de


enfrentamento à Violência contra a Mulher:
sistema3.planalto.gov.br

* Inclusão de dados do Brasil autorizada pelo autor

LIVROS DE AUTOAJUDA
Problemas Gerais de Relacionamento
Gottman, J. M., & DeClaire, J. (2002). The relationship cure:A stepguide tostrengthe-
ningyour marriage,family, andfriendships. New York: Three Rivers Press.
Johnson, S. (2008). Hold me tight: Seven conversationsfor a lifetime oflove. New York:
Little Brown.
Markman, H. J., Stanley, S. M., & Blumberg, S. L. (2001). Fightingfor your marria­
ge: Positive steps for preventing divorce andpreserving a Lasting love. New York: John
Wiley.
Notarius, C., & Markman, H. C. (1994). We can work it out: How to solve con-
flicts, save your marriage, and strengthen your lovefor each other. New York: Berkley
Books.
Wile, D. B. (2008). After the honeymoon: How conflict can improve your relationship.
Oakland, CA: Collaborative Couple Therapy Books.

Violência nos Relacionamentos


Bancroft, L. (2003). W/y/ does he do that?: Inside the minds ofangry and controlling
men. New York: Berkley Books.
Dececco, J., Letellier, P., & Islan, D. (1991). M en who beat the men who love them:
Batteredgay men anddomestic violence. New York: Routledge.
Evans, P. (2010). The verbally abusive relationship: How to recognize it and how to res-
pond. Holbrook, MA: Bob Adams.
Lobel, K. ( 1986). Naming the violence: Speaking out about lesbian battering. Berke-
ley, CA: SealPress.
NiCarthy, C. (2004). Gettingfree: You can end abuse and take backyour Izfe. Seattle:
Seal Press.
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Infidelidade
Glass, S. P., & Staeheli, J. C. (2004). Not 'fustfriends”: Rebuilding trust and recovering
your sanity after infidelity. New York: Atria.
Snyder, D. K., Baucom, D. H., & Gordon, K. C. (2007). Gettingpast the ajfair: A pro-
grarn to helpyou cope, heal and move on-Together or apart. New York: Guilford Press.
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ner has been unfaithful. New York: William Morrow.

ORGANIZAÇÕES PROFISSIONAIS

Os websites das maiores organizações profissionais que lidam com questões de saúde
mental dão informações sobre cada profissão em particular, oferecem assistência para
conseguir um terapeuta e informações sobre problemas em relação à saúde mental.
American Association for Marriage and Family Therapy
www.aamft.org
Association for Behavioral and Cognitive Therapies
www.abct.org
American Psychological Association
www.apa.org
American Psychiatric Association
www.psych.org
National Association of Social Workers
www.socialworkers.org
Registry of Marriage and Family Therapists in Canada, Inc.
www.marriageandfamily.ca/?ww_pageID=953C5 5 F2-1372-5A65-3BD 54999-
BE76B41F
International Association of Marriage and Family Counselors
www.iamfconline.org

Family Therapy Association of Ireland


www.familytherapyireland .com

No Brasil**: CEFI- Centro de estudos da Família e do Indivíduo


www.cefipoa.com.br

Na Argentina**: CIPCO- Centro Integral de Psicoterapias Contextuales


www.cipco.com.ar

**Inclusão de dados autorizada pelo autor


462 Recursos

RECURSOS PARA TRANSTORNOS MENTAIS

Listamos vários sites com informações sobre alguns dos mais comuns trans
tomos mentais, os quais foram mencionados brevemente no capítulo 16

National Institute of Mental Health


www.nimh.nih.gov

National Institute on Alcoholism Abuse and Alcoholism


www. n iaaa. n i h. gov

National Institute on Drug Abuse


www.nida.nih.gov

Anxiety and Depression Association of America


www.adaa.org
Australian Psychological Society
www.psychology.org.au

Canadian Mental Health Association


www.cmha.ca

Mind
www.mind.org. uk

Mental Health Foundation


www.mentalhealth.org.uk

Mental Health Association Australia


www.mentalhealth.org.au

Australian and New Zealand Mental Health Association


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ves: Expressed emotion, marital distress, and perceived criticism. Journal ofAbnor­
mal Psychology, 98, 229-235.
Jacobson, N. S. Principal Investigator. Acceptance and change in marital therapy
(National Institute of Mental Health grant). 9/1/97-2/29/04.
Whisman, M. A. (1999). Marital dissatisfaction and psychiatric disorders: Results
from the National Comorbidity Study.Journal ofAbnormalPsychology, 108,701- 706.
Índice remissivo
experiência que promove, 41-42, 193-194,
Abandono, sensibilidade ao 105-110, 116- 207-209
118, 126-127, 130-131, 145-147, 164, mudança espontânea e, 40-41, 193-196,
435-436 207-208, 230, 282, 286-287
Abordagem comporramental para a terapia o que não deveria ser aceito, 195-200
de casal, 434-438 o que deveria ser aceito, 200-203
Abordagem de resolução de problemas, 189- planejar para seu relacionamento 207-209
190-194,357-363 versus mudança, 187-192
Abuso. Ver também Violência no relaciona­ versus submissão, 186-187
mento. Acordo em relação às diferenças, mudanças,
desencorajando abuso verbal, 399-400, 409- 202-203
410, 415-416 Acusação
emocional, psicológico e verbal, 196-197, consciência em retrospectiva e, 325-326,
408-416, 428-429 332-333, 342, 376
físico, 109-110, 195-197, 207-208, 399- de falta de amor, 216-217,236-237, 383-384
401,405-408,428 reações exageradas e, 27-28, 154-155, 165,
humilhação pública, 196-199 171-172, 228-229, 275
verbal, 196-197, 399-400, 408-416, 428- curas tóxicas e, 158-159, 174-175, 181
429 verdade na, 70-72, 263-264
Aceitação do motivo inconsciente, 224-229
antes da mudança 193-196 Afastamento da emoção, 267-268
combinada com mudança, 192-194 Afastamento depois da briga, 173-175
confiança e, 208-209 Afeto físico. Ver também Exemplos de caso
definição, 185-187, 188 aceitação e mudança ao lidar com incom
descrição da, 40-42, 186-194, 204-208 patibilidades, 187-196, 200
desenvolvimento da, 41-42, 181, 209, 224- experiências do passado e, 88-91
225, 230, 259 Agressão física. Ver Violência no relaciona­
exemplo de, 185-194, 202-203 mento
468 índice remissivo

Alcoolismo. Ver Problemas Especiais no re­ estresse, 148-152


lacionamento expressividade emocional, 102-103
Alergias psicológicas inventário de Satisfação Conjugal, 44-49
abandono, 116-118 padrão de comunicação, 174-177
aprisionamento, 117-120 personalidade, 100-101, 103
falta de aprovação, 120-122 relações negativas, 47-50, 52-53
falta de reconhecimento, 117-120 relações positivas, 45-46, 49-50, 52-53
perda de controle, 120-124 satisfação na relação, 43-49
Alianças com outros, 164-167
Ambivalência, 94-95, 98-99, 289-290 B
Ameaças Bola cheia de sentimentos negativos, 342-
ameaça vazia, 287-288 346
como ultimatos, 159-160, 287-292, 314- Batalha de acusações, 66-70
315, 386
destrutiva, 287-290 C
de violência, 196-197, 409-410, 413-416 Características Centrais, 195-196, 200
Amigos Características do parceiro, bênçãos contra­
alianças problemáticas com, 164-167 ditórias, 92-95, 272-275
necessidades atendidas por, 276-278 Características físicas, aceitar comparado a
Amor mudar, 202-205
acusação de falta de, 215-219 Caso extraconjugal. Veja Infidelidade
administração da dor e diminuição do pre­ Casos: exemplos
juízo, 384-385,391-392 atitude construtiva (Samantha e Zeca),
Ampliando o contexto do problema, 263- 375-378
265 consciência em retrospectiva (Janete e Car­
Anatomia da discussão, 156, 211-212, 228- los), 328-332
229. Ver também a História do Problema consciência no momento presente (Ceres e
Antecipando o padrão de comunicação, 170- Norton), 317-326
171,241-245,270-273 cuidados com as crianças (Rosa e Enrico),
Apego da criança ao cuidador, 116-118 377-378,381-382
Aprisionamento demonstração física de afeto (Denise e
sensibilidade emocional, 117-120 Franco), 189-194, 200, 209
vulnerabilidade a sentimentos de, 117-118, expressão emocional (Eleanor e Tiago),
126-127, 130-131, 146-147 261-280
Aprovação, sensibilidade à, 116-117, 120- falha em estar lá para o outro (Susana e
122, 128-131, 299-300 Tomás), 110-113
Argumento do Leopardo, 200-203 humilhação pública (Mary Todd e Abra-
Assistente Social, 438-439 ham Lincoln), 197-199
Atitude, requisitando mudança na, 297-301 independência (Carla e Diane), 381-385
Atração e diferenças, 78-83, 272-275 intimidade (Débora e Frank), 23-38
Avaliando sua relação intimidade (Sylvia e Geraldo), 231-233,
classificação negativa e positiva da 235-247, 255-256
qualidade do relacionamento 45-46,48-53 mude você primeiro (Giane e Natan), 367-
desejo de intimidade 102-103 368, 373-374
emoções, superficiais e ocultas, 130-133 parentes (Saul e Erik), 214-222
índice remissivo 469

problema reativo (Anita e Ralph), 153- Compreensão DEEP (profunda).Ver tam­


156, 170-174 bém Padrões de comunicação; Diferenças;
relação sexual (Graze e Chico), 212-228 Emoção;
relação sexual (Glória e Cláudio), 314-315, casais, 32-38, 224-225, 228-229
321-326 circunstâncias externas aplicada em exem­
trabalho doméstico (Janice e Luiz), 212- plos de
225 elaborando sua, 211-223
três lados da história (Débora), 23-24, 27- escrevendo sobre, 177-180
28 Comprometimento e vulnerabilidade àrejei-
três lados da história (Frank), 27-28, 32-33 ção, 139-140
três lados da história (objetiva), 32-33, 37- Comunicação. Veja também Aconselhamen­
38 to; Padrão de comunicação; Problemas de
Céu azul (filme), 185 comunicação
Cinco Dimensões da Medida de Personali­ antecipando, 170-171, 241-242, 244-245,
dade, 100-101, 103 270-273
Circustâncias, influência no comportamen­ conflito central e, 221-223
to, 134-138 dicas para resolvê-los, 235-237, 239-242,
Circunstâncias externas - Ver também estresse 244-245, 250-251, 253-255
Ciúmes, 106-107, 168, 343-344 emoções brandas não reveladas, 239-241
Clima Emocional da família de origem 89- escalada dos, 170-172
91 informação do passado não considerada,
Criando sensibilidades emocionais, 139-141 237-240
seu papel nos relacionamentos, 134-137 levando a mais ou ao pior do mesmo, 312-
Coerção 313,316-317
curas tóxicas e, 158-159, 162-163 o outro lado escondido, 241-242
definição de, 399-400, 402-403 padrão de comunicação, raiva não expres­
física, 399-403, 406-407, 428-429 sa, 234-236
responsibilidade por, 406-408 parando-os enquanto acontecem, 264-
Comparação social, 303-304 265, 272-273
Comportamento recuperação da, 244-245, 250-251
ação positiva sem nenhuma relacionada a outras partes da compreensão
condição, 376-378 DEEP, 153-156
explicando as ações dos outros e as nossas, resolvendo por meio de aceitação e mu
58-60 dança, 187-188, 191-194
inaceitável, 196-200 sentimentos negados ou não revelados, 37-
personalidade, 159-160, 348-350 38, 235-237
separando sentimentos e pensamentos do, tentativas de mudança comportamento
335-338 inaceitável e, 197-200
Comportamento abusivo comparado à vul­ recuperando de, 244-245, 249, 272-275
nerabilidade, 215-219 repetição do ciclo de, 166-167, 169-170
Comportamento humano vigilância, intrusão e
experiência passada e, 88-91, 109-110, violação, 162-164
130-131 Comunicação, dicas de. Veja também Pro­
influência genética no, 85-87, 449-450 blemas de Comunicação; Abordagem de
situações e, 134-137 Resolução de Problemas
470 índice remissivo

escolhendo a hora e o lugar, 339-342 “expresse seus sentimentos”, 342-350


escute seu parceiro, 349-350, 357-358 quando um bom conselho é ruim, 337-
expressando sentimentos, 342-346 340
“linguagem do Eu”, 345-349 “se fosse bom a gente vendia”, 335-338,
falar sobre um comportamento específico, 362-363
348-350 síntese de, 335-336
Compaixão e emoções brandas, 239-241 Controle, 122-124, 406-414,452-455
Comparação com outros casais, 303-304 Controle da deteriorização na relação: mu­
Competitividade como fonte de ambivalên­ dança na maneira de passar a mensagem,
cia, 97 386-387
Concessões, negociações, 357-358, 362-363 foco na emoção ao invés de no conteúdo,
Condenação e convicção do papel do parcei­ 386-389
ro no conflito, 60-62 dar um tempo, 388-389, 393, 408
Confiança Crise, fracasso do parceiro em estar para o
promover no relacionamento, 208-209 outro, 112-114
reconstruir depois da infidelidade, 420- Crítica
421, 428 aceitação e mudança ao lidar com, 192-194
Conflito. Veja também Discussões; A histó­ ação construtiva no lugar de, 373-376
ria do problema; Violência no relaciona­ como gatilho para a discussão, 54-56
mento ação-reaçáo, 127-128, 130-131 como sensibilidade emocional, 120-122
alianças e coalizões, 174-175 como preditora de recaída em pacientes de­
ambivalência no, 95-99 primidos, 452
características positivas do, 391-392 escutando, 35-36
conteúdo do, 156-159 vulnerabilidade e, 124-125, 130-131
descrição do, 220-222 Culpa, 158-160, 327-329, 345-348, 351-
estratégias para solucionar, 360-363 352, 355-356
evento preliminar, 241-245 Curas tóxicas
interno, 91-93 acusação, culpar e coerção, 158-160
nomeando, 268-269 coalizões e alianças, 164-167
papel do parceiro no, 60-62 escalada,polarização e alienação, 170-175
próprio papel no, 65-66 evitação, negação e minimização, 161-163
processo do, 154-155, 158-159 usos repetidos de, 166-170
recuperação do, 244-256 vigilância e intrusão, 162-164
Conflito crônico. Veja Padrão de comunicação
Consciência da história do problema em re­ D
trospectiva, 325-326, 332-333, 342, 362- Dar um tempo durante a discussão/ briga,
363, 375, 380-381 388-389,391-392,408
importância de, 317-318 Defeitos. Ver Explicação do problema com­
no momento, 186-187, 317-318, 324-325, parados às diferenças, 212-214
332-334,337-338, 340-342, 375-376 Definição do problema. Ver a História do
Conselho. Ver também dicas de Comunica­ problema.
ção Desculpar-se, 246-247, 251-252, 337-338,
acordos negociáveis, 357-358, 362-363 380-381,423-425
escute o que seu parceiro diz, 349-350, Dessensibilização do parceiro, 275-277
357-358 Desejo por intimidade, medida, 102
índice remissivo 471

Desempenho, avaliação do parceiro, 63-66 anatomia da, 156, 211-212, 228-229


Destruição, 399-410, 429 conteúdo do conflito, 156-158
Diagnóstico do parceiro, 61-64 desesperança depois, 173-175
Dicas.Ver também dicas de comunicação; diferenças de raciocínio, 49-50
abordagem de solução de problema; mu­ dinheiro e poder, 104-106, 145-146, 412-
dança em si 413
consciência, 324-325, 331-332 escalada da, 27-28, 32-33, 169-172, 260-
mudança, 291-292, 297-298, 302-303, 261,386-389,415-416
306-307 evento gatilho, 54-57, 156-158
problemas de comunicação, 235-237, 239- foco na emoção mais do que no conteúdo
242, 244-245,250-251,253-255 386-389
revelando emoções ocultas, 235-237, 239- foco nos fatores externos 218-219
242, 244-245, 254-256 início da, definindo a, 168-170
Diferenças
parar durante, 264-273, 388-393, 408,
aceitação das, 200-203 416
acordo em relação à mudança, 202-203
polarização durante, 171-174
atração inicial como, 77-80
problema inicial, 156-158
circunstâncias e, 78-79
processo do conflito, 157-159
como certeza matemática, 81
recuperando-se de, 244-249, 272-275
como origem da discussão, 34-35
repetição de, 166-170
como origem da atração, 32-35, 78-79
Distância tolerante
comparando aos defeitos, 212-214
a necessidade, 261 -262
cirscunstâncias atuais e, 135-138
como a melhor atitude em relação à in
década pessoa, 91-93
compatibilidade, 260-264
de personalidade, 78-80, 99-101
conseguindo, 270-273, 279-281
distância tolerante para, 261-262
dessensibilizando o parceiro, 275-277
exacerbadas pelo estresse, 144-146
experiências do passado e, 88-89 dicas para, 264-265, 268-278
expressividade emocional, 80, 102 tratando o problema como “ele” ao invés
influência genética, 85-87 de “você” 263-264, 270-271
mudanças com o tempo, 34-35, 81-83 uma benção na maldição, 272-275
naturais, 34-38, 41-42 versus compaixão, 260-264
origens na infância das, 86-91 Distorcendo o significado das palavras do
perspectiva maior das, 261-262 parceiro, 352-358
pontos fortes e problemas como 92-93, Divórcio, 38-39, 86-89, 108-110, 138, 432
98-99 Doença Mental. Ver Problemas especiais no
proximidade e intimidade, 80, 102 relacionamento
questão central e, 214-216 Drogas, problemas. Ver Problemas especiais
Dilema Complexo comparado com uma sim­ no relacionamento
ples solução, 222-225 Dúvida, expressar, 239-241
Discussão/Briga. Ver também Problemas
de Comunicação; Padrões de Communi- E
cação; História do Problema; Curas Tóxi­ Egocêntrico, viés 305
cas; Violência no relacionamento Emissor, descrição de, 187-192
afastamento depois da, 27-28, 32-33, 169- Emoções
170, 173-175 afastando-se das, 267-268
472 índice remissivo

consciência da mensagem emocional, 319- “Eu faço isso por você,” 303-305
325 “Eu” linguagem do, 345-346, 348-349
conselho para “expresse seus sentimentos”, “Eu realmente preciso que você mude,” 306-
342-346 307
duras comparadas com brandas, 239-241 Evento gatilho, 156-158
incompatibilidade na expressão das, 260- Evitação do problema, 161-163, 170-171,
264, 276-278 241-245
requisitar mudança nas, 295-297, 306-308 Exercícios. Ver também Avaliando seu rela­
separando-as do comportamento, 335-338 cionamento aumentando sua consciência,
Emoções ocultas. Ver também Sensibilidades 332-334
emocionais compreensão DEEP (profunda), desenvol­
avaliando suas, 130-133 vimento, 177-180
comparadas a emoções superficiais, 105-109 compreensão DEEP, elaboração, 211-223
como maneira do padrão de comunicação, conseguindo que seu parceiro mude, 308-
232-233, 236-237, 386-389 310
definição, 105-106 mudanças na comunicação, 257-259
dicas para revelar, 236-237, 239-242, plano de mudança e aceitação, 207-209
244-245, 254-256 plano de resolução de problemas, 363-
raiva como, 234-236 365
razões para esconder, 105-107 plano de tolerância, 279-281
Emoções superficiais, 105-106 plano para mudar a si, 393-395
avaliando as suas, 130-133 soluções que não funcionaram, 228-230
comparadas a emoções ocultas, 105-109 Exigências, 55-56, 204-205
problemas que elas criam, 106-107 Expectativas, 37-38
Enfrentamento Explicação do problema
estressores, 142-144 avaliação do desempenho do parceiro, 66-
incompatibilidade, 156, 173-174 67
Escalada antes do conflito batalha de acusações, 66-70
discutindo, 249-251 busca por, 58-64
interrompendo, 406-408 condenação das ações do parceiro, 61-62
Escuta ativa, conselho sobre, 349-358 diagnóstico do parceiro, 61-64
Espancamento. Veja Violência no relaciona­ enterrando o cerne da verdade, 70-72
mento papel de coconspiradores, 66-70, 72-73
Estressores Diários, 141-143 papel da vítima, 65-67, 72-73
Estresse. Ver também Circunstâncias externas Expressividade Emocional, Medida, 102
avaliando seu nível de, 148-151
emocionais, 145-147, 150-152 F
exacerbando diferenças, 144-146, 150-152 Falhar
exacerbando sensibilidades em estar lá quando é importante, 110-114
maiores estressores, 142-143 em mudar o parceiro, 366-368
mudança versus aceitação do, 205-206 Filhos
questão central e, 219-221 cuidados com e luta de poder, 377-382
seu papel nos relacionamentos, 141-144 competição por atenção parental, 119-
Estudos sobre irmãos gêmeos nas diferenças 121
humanas, 86-87 envolvimento em alianças e coalizões, 166
índice remissivo 473

questões de controle e, 122-124 profissionais capacitados a, 437-439


violência no relacionamento e, 405-406 terapia de casal focada na Emoção, 437-
438
G tipos de, 434-438
Gelles, Richard, 400-401 violência no relacionamento e, 402-403,
Gêncro-diferença de expressão emocional, 412-413
264-265 websites de organizações profissionais, 461-
Genética-influência no Comportamento hu­ 462
mano, 85-87, 449-450 Incompatibilidades. Ver também Distância
Getting Free (NiCarthy), 460 tolerante
Goodman, Jerry, The Talk Book, 465 como certeza matemática, 81
Gottman, John, 171-172,402-403 desejo sexual e interesse, 78-80, 171-174,
224-229
H lidando com, 157-159
História do Problema. Ver também Cons­ lidar com as finanças, 104
ciência da história do problema ver o todo mudança e, 297-300
ao invés de uma pequena ação, 219-221 mudança nas, 82-83
consequência consciente ao invés de inten­ Infância, experiências na, histórias pessoais
ção inconsciente, 214-217 origem das diferenças como, 86-91
dilema complexo ao invés de simples solu­ origem das sensibilidades emocionais, 115-
ção, 222-225 124
descrição ao invés de avaliação, 215-219, Infidelidade
220-222 aceitação, 196-197
diferença ao invés de defeito, 212-214 ajuda professional para lidar com, 428
exemplos de, 224-229 ciúmes, 113-115
reação emocional ao invés de razões, 216-220 como comportamento inaceitável, 196-
validação da experiência de cada parceiro 197
na, 211-213 comunicar a, 418-421
vulnerabilidade ao invés de violação, 215- confiança, reconstrução 425-428
216 deixar para trás os sentimentos e acusações,
Hooley, Jill, 452 423-425
Hotlines/Central de atendimento à mulher, fechando a porta para outro relacionamen­
403-404 to, 420-423
interrompendo a briga antes da, 406-408 impacto da, 416-418
responsabilidade pela, 405-407 responsibilidade pela, 422-423
terapia e, 402-404 Influências culturais na expressão emocional,
Houts, Renate, 81 261-266
Humor, criando distância emocional com, experiência passada e, 88-89
269-273 Insatisfação, 37-38, 70, 159-160, 162-163,
Huston, Ted, 81 215-216, 345-346
Instituto Nacional de Saúde Infantil e de­
I senvolvimento humano, 38-39
IBCT - Integrative behavioral couple thera­ Instituto Nacional de Saúde Mental, 37-38,
py (Terapia Comportamental Integrativa 437-438
de Casal) 34-35, 37-38, 437-438 Internet, recursos, 430-431
474 índice remissivo

Intimidade. Veja também em Casos: exem­ com o parceiro comparado com o resto do
plos, intimidade mundo, 295-297
avaliação de, 102-103 comigo versus com o mundo, 295-297
diferenças na, 80, 127-128 consciência em retrospectiva, 325-332
discusses sobre, 66-70, 231-232, 240-241 consciência, importância da, 317-318
e uma compreensão DEEP, 177-178 consciência no momento presente e, 317-
e emoçóes ocultas, 105-106, 117-120, 240- 318,324-325
241 cuidando melhor de si mesmo, 381-385
por meio de tolerância, 260-261 dando atenção positiva ao parceiro, 376-378
Intrusão, 162-164 desejos conflitantes em relação à, 297-298,
Inveja, 26-28, 97, 106-107 302- 303
Irritação acumulada, 55-57 desigualdade e dívida, propostas baseadas
em, 305
J dicas para, 291-292, 297-298, 302-303,
Jones, Tommy Lee, 185 306-307
Justificando a necessidade de mudança específica comparado com o geral, 291-
Justiça e igualdade, propostas para mudança 294
baseada cm, 303-305 espontânea comparado com planejada, de
liberada, 193-196
K fazendo o que o parceiro pede, 377-378,
Kleck, Robert, 124-125 381-382
imediata e dramática, 286-292
L justiça e igualdade, propostas baseadas em,
Lange, Jessica, 185 303- 305
Lincoln, Abraham and MaryTodd, 197-199 justificando necessidade por, 302-307
mudando a comunicação, 306-307
M mudando a si mesmo para mudar a rela­
Medo ção, 367-374
abuso emocional e, 408-413, 429 não permitindo a necessária, 301-303
de intimidade, 35-36, 61-62, 68-69 o que deveria ser mudado, 195-200
rotulando o estado interno como, 343-344 por meio dos confrontos, 286-288
violência no relacionamento e, 403-404 tentativas que levam à mais ou pior do
Mensagens contraditórias, 91-93, 97-99 mesmo, 312-317
Milgram, Stanley, 134-135 tipos de, 285-287, 291-292
Mindfulness. Ver consciência da história do ultimatos para, 287-292
problema versus aceitação, 187-190
Mítica aldeia dinamarquesa, 316-317 Mudança espontânea, 193-196, 286-287
Motivo inconsciente, 214-217 Mueller, Charles, 88-89
Mr. and Mrs. Bridge (filme), 186-187
Mudança. Veja também em mudança em si N
mesmo baseada em aceitação, 286-287 Nomeando o problema no relacionamento,
ação construtiva, 373-3376 268-270
agindo versus inibindo a ação, 293-295 Negação do problema, 161-163, 174-175
apoiada pelas circunstâncias versus força de Negligência
vontade, 296-298 como sensibilidade emocional, 119-121
índice remissivo 475

história da, 113-115 do terapeuta na Terapia de Casal, 433-435


Negociando acordos, 357-364 papéis de gênerodefinidos culturalmente,
Newman, Paul, 186-187 86-91
Perpetracor (agente), 197-199, 205-206
O
Personalidade, aceitar comparado a mudar,
Objetivos do livro, 210-212, 394-396
200-205
Observar ao invés de participar do proble­
avaliando, 100-101, 103
ma, 264-269
bênçãos contraditórias na personalidade do
“Olha tudo o que eu fiz por você,” 305
parceiro, 92-95
“Os outros fazem...,” 303-304
examinando o papel no conflito, 61-64
OurRelationship.com, 430-431
influências genéticas na, 85-87
P perspectiva de mudança ao longo do tem
Pais po, 67
competição pela atenção dos, 119-120 teoria do desenvolvimento da, 120-122
envolvimento em alianças coalizões, 164-167 Pessoas, atribuindo o problema às, 113-115
questões de controle na educação dos fi­ Peterson, Don, 54-56
lhos, 122-124 Poder
semelhanças com o parceiro, 88-89 como dimensão do relacionamento, 85-87
Papel do cuidador, ambivalência, 94-99 desigualdade e abuso emocional e psicoló­
Parceiro/Cônj uge gico, 410-413
ambivalência sobre as qualidades, 95-99 dinheiro e, 95-97
compreendendo a posição do, 328-332 elementos do, 92-93
dando atenção positiva ao 376-378
escolhas individuais de vida e, 100-101
deslocar a raiva para, 115-118
ideal igualitário comparado à realidade do,
encontrando intimidade na briga com,
94-96
224-229, 389-392
impotência como sensibilidade emocional,
justificando a necessidade de mudança ao,
122-124
302-303, 307-308
papéis de gênero definidos culturalmente
legitimidade da experiência e história do,
e, 92-95
327-330
trabalho doméstico, cuidado dos filhos e,
necessidades distintas, 101
98-99
papel no conflito, 60-66
Polarização
requisitando mudança no, 297-303
ao longo do tempo, 171-174
vulnerabilidades do, lidando com, 124-127
Parentes durante a discussão, 171-172
alvo do problema conjugal, 82-83 questionando a posição da, 241 -242
buscando explicações no comportamento Pope, Hallowell, 88-89
dos, 61-62 Problemas de Comunicação. Veja também
história do problema-exemplo, 214-217, Padrão de Comunicação e Dicas de Co­
219-222 municação
Papéis acabando com a alienação e desesperança,
ambivalência sobre os cuidados, 95-96, 98- 173-175
99 acusação, culpabilização c coerção, 158-160
de si mesmo noconflito, 65-66 alianças e coalizões, 164-167
diferenças e, 78-80 avaliando seu, 174-177
do parceiro no conflito 60-66 conteúdo versus processo, 156-159
476 índice remissivo

evitação, negação e afastamento, 161-163 curas tóxicas e, 158-163, 166-170


mudança versus aceitação da, 205-206 escalada, 171-174
Problema Inicial infidelidade e, 418
exemplo de caso, 153-156 no relacionamento com
Problemas pessoais. Ver Problemas especiais polarização, 171-174
no relacionamento problemas especiais, 456-457
Processo Reconciliação, tentativas, 250-252
do conflito, 156-160 Reconhecimento, sensibilidade à, 119-121
de enfrentamento, 215-222 Recuperação do conflito
Profissionais, buscando assistência. Ver tam­ consciência em retrospectiva, 325-326-
bém Terapia dc Casal 331-332
sobre infidelidade, 428 dar um tempo e, 389-392
sobre relações violentas, 408 discutindo a escalada antes do conflito,
sobre transtornos psicológicos, 456-458 249-251
Promovendo aceitação no relacionamento, distância emocional, 270-273
208-209 dor ou machucado, enfrentando, 253-254
Psicólogo clínico, 438-439
foco no positivo, 254-255
Psicoterapia. Ver Terapia de Casal;
revendo as tentativas de reconciliação, 250-252
Psiquiatra, 437-439
Rejeição, 54-59, 116-118
Responsabilidade por problemas interpes­
Q soais, 127-131
Questão central
Respostas de curto-circuito, 170-171
aceitação da, 204-206
Ressentimento, 378-382
compreensão DEEP (profunda) da, 177-
Resumindo a Síndrome de ÓAQGortman),
180
171-174
seleção da 72-74
Resumindo o que o seu parceiro está falan­
Questionários. Ver Avaliando sua relação
do, 314-320
R Retirada, 23-24, 34-35, 37-38, 161-163
Raiva Retirada, questões dc controle na, 122
expressando, 27-28, 30-33, 105-109, 231- Revelação, importância da, 234-237, 249-
236, 359-363,412-414 257, 388-389
falar na linguagem do “eu”, 347-349 Rindo de si mesmo, 269-271
padrão crônico no relacionamento, 231- Rodin, Judith, 135-136
233 Rogers, Carl, 120-121
Reações emocionais. Ver também Sensibili­
dades emocionais S
aceitação como, 202-205, 207-209 Segurança, vulnerabilidades na, 116-118
acusação como motivo de, 215-219 Self- Mudança de si mesmo, rir de si, 269-
às diferenças, similaridades, 108-110 271
como uma reação alérgica, 108-110 ação construtiva, 373-376
focando no conflito, 218-219 algo positivo para o parceiro, 376-378
gatilhos para, 265-268, 276-277, 335 cuidando-se melhor, 381-385, 389-392,
requisitando mudança nas, 297-300 456-458
Reação ao Problema dar um tempo, 388-392
alienação, 173-175 foco nas emoções, 386-389
índice remissivo 477

maneira de se comunicar, 386-387 Solução simples comparada à dilema com­


papel no conflito, 65-66 plexo, 222-225
Sensibilidades emocionais. Ver também Emo­ Situação, influência no comportamento da,
çóes ocultas e Emoções superficiais aceita­ 134-138
ção das, 204-206 Status, 138
“alergias psicológicas” como, 108-110 Straus, Murray, 400-401
avaliando suas, 130-133 Strcnta, Ângelo, 124-125
conflito central e, 218-219 Submissão, 195-197
eventos na relação como origem de, 109-115
exacerbadas por estresse, 145-147 T
experiências na infância como origem de, Temperamento, 86-87
115-124 Teorias do comportamento do outro, 35-
pontos fracos, 253-254 38
quando combinadas com as do parceiro, Terapeutas
124-128 avaliação, 443-445
reação forte diante de uma colocação apa­ escolha, 440-444
rentemente inocente, 124-131
focados em soluções, 435-436
reação extrema ao problema, 154-155,
papel na terapia de casal, 433-435
275
Terapia de Casal
relacionadas a diferenças, 108-109
alternativas fornecidas pela internet, 430-
tipos de, 110-111, 123-124
432
relacionamento anterior como origem de,
avaliando o terapeuta, 443-445
115-124
escolhendo um terapeuta, 440-444
tendo como certas, 110-115
Trabalho, atribuindo o problema ao, 112-
Sentimentos. Ver emoção
114
Sentimentos negativos, expressar, 342-346
Trabalho domestico e briga de poder
Sentindo-se sem apoio, como sensibilidade
domésticos das mulheres, 296-297
emocional, 112-114
Sexual-disfunção. Ver Problemas Especiais fazer o que seu parceiro lhe pede - exem­
no relacionamento plo de caso, 377-378, 381-382
Sexual, privação 173-174 história do problema-exemplo, 212-214,
Sexual - relacionamento incompatibilidade 220-225
no desejo e interesse, 171-174 Transmissão transgeneracional para instabi­
cuidando-se melhor, 381-385 lidade conjugal, 86-89
falando sobre, exemple de caso, 314-315,
321-322, 325-326 U
incompatibilidade na história do proble­ Ultimato, 287-288, 291-292, 307-308
ma, 212-219,224-229 Updike, John, S, 115
repetição do conflito, 169-170, 173-174
Similaridades V
atrações iniciais como, 82-85 Verdade nas acusações, 70-72, 263-265
falha em reconhecê-las, 35-38 Veredito do papel do parceiro no conflito,
papel no conflito, 95-99 60-62, 71-72
problemas como, 84-86 Veteranos de guerra dos Estados Unidos (VA)
Solução de problemas, 189-190, 193-194, - Departamento para as questões dos, 38-
357-363 39, 441-442
478 índice remissivo

Vigilância, 162-164 comparada com comportamento abusivo,


Violência no relacionamento/violência do­ 215-219
méstica abuso psicológico e, 412-413 conflito de ação-reação devido à, 127-131,
como comportamento inaceitável, 195-200, 159-160
399-407 crítica e, 127-131
espancamento,definição de, 402-403 estresse e, 141-144
experiência passada e, 86-91 lidando com o parceiro, 124-127
frequência de, 400-401 mudança e, 299-301
gênero e, 400-403
gravidade da, 403-406 W
Vítima, papel da, 52-54, 65-66 Web, Recursos da, 459
Vulnerabilidade. Ver também Sensibilidade When men batter women (livro), 464
emocional abrindo-se para o parceiro, 232- Woodward, Joanne, 186-187
234, 250-254 Wortman,Calille, 98-99
odos os casais têm desentendimentos,
T
mas o que acontece quando os conflitos
se tornam recorrentes e começam a
destruir seu relacionamento? Você fica
acordado de noite, na esperança de que seu
parceiro finalmente veja as coisas da sua
maneira, ou ruminando as evidências que dizem
que você está certo? Exigir algumas mudanças
imediatas - ou o quê? Este livro acessível e com
base científica oferece soluções poderosas para
casais frustrados por esforços contínuos para
fazer o outro mudar. Aceitação verdadeira talvez
seja difícil de conseguir, mas os passos precisos
e exercícios que estimulam a reflexão neste livro
podem tornar isto uma realidade. Você
aprenderá as razões pelas quais continua tendo
as mesmas brigas, de novo e de novo; como
manter as pequenas incompatibilidades de
maneira a não causar grandes problemas; quais
estratégias de comunicação realmente funcionam
para resolver os conflitos; e como solucionar
problemas e fazer mudanças positivas - juntos.

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