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M U N D O : ALGUNS
PRINCÍPIOS BÁSICOS
Limiares
Sensação e t
Adaptação Sensorial
VISÃO
A Entrada do Estímulo:
Energia Luminosa
Percepção O O lho
Processamento de
Informações Visuais
Visão de Cores
A UDIÇÃO
enho visão perfeita”, explica m inha sação e percepção. Quando Sellers olha para
T
A Entrada do Estímulo:
colega Heather Sellers, aclamada escri um amigo, sua sensação é normal: seus recep Ondas Sonoras
tora e professora de redação. Sua visão tores sensoriais detectam a mesma informa
pode ser boa, mas a percepção tem um ção que os nossos detectariam, e eles trans O Ouvido
problema. Ela não consegue reconhecer mitem essa informação para o cérebro. E sua Perda Auditiva e Cultura Surda
rostos. percepção - a organização e a interpretação
Em Foco: Vivendo em um
Em seu livro de memórias, Face First (Pri de informações sensoriais que lhe possibili
meiro a Face, em tradução livre), Sellers tam reconhecer objetos conscientemente - é Mundo Silencioso
(2010) fala de momentos constrangedores quase normal. Assim, ela pode reconhecer OUTROS SENTIDOS
decorrentes de sua permanente prosopagnosia pessoas pelos cabelos, a maneira de andar, a IMPORTANTES
- cegueira facial. voz ou o físico particular, mas não pela face.
Pode ver os elementos do rosto - o nariz, os Tato
Quando estava na faculdade, em um encontro
olhos e o queixo - e ainda assim, em uma Dor
no Spaghetti Station, voltei do banheiro e me
meti na cabine errada, encarando o homem festa, “[eu me apresento] a minha colega Paladar
errado. Continuei sem saber que não era o rapaz Gloria TRÊS VEZES”. A experiência de Sellers
é similar à força que você ou eu faríamos para Olfato
com quem eu havia saído mesmo quando o pró
prio (um estranho para mim) foi tirar satisfa tentar reconhecer um pingüim específico em ORGANIZAÇÃO
ção com o Cara da Cabine Errada e depois se um grupo de pingüins bamboleantes. PERCEPTIVA
mandou do restaurante. Não posso distinguir Graças a uma área do lado inferior do
atores em filmes e na televisão. Não reconheço hemisfério direito do cérebro, podemos reco Percepção de Forma
a mim em fotos ou em vídeo nem a meus entea nhecer uma face humana (mas não a de um Percepção de Profundidade
dos na escolha do time de futebol; não pude
determinar qual marido era o meu em uma
pingüim) em um sétimo de segundo. Assim Percepção de Movimento
festa, no shopping, no mercado. que detecta uma face, você a reconhece (Jac-
ques e Rossion, 2006). Como você faz isso? Constância Perceptiva
Sua incapacidade de identificar conhecidos Vinte e quatro horas por dia, seu corpo é INTERPRETAÇÃO
significa que às vezes ela é tida como esnobe bombardeado por todo tipo de estímulo exte PERCEPTIVA
ou pouco sociável. “Por que você passou rior. Enquanto isso, em um mundo interior
direto por mim?”, poderiam perguntar depois. silencioso e aconchegante, o cérebro flutua Privação Sensorial e
Semelhantemente a quem tem perda auditiva em absoluta escuridão. Por si só, ele não vê Visão Restaurada
e finge ouvir durante uma conversa social nada. Não ouve nada. Não sente nada. Então, Adaptação Perceptiva
banal, Sellers vez por outra finge reconhecer. como o mundo lá de fora entra?
Conjunto Perceptivo
Com frequência sorri para as pessoas por Para abordar a questão de maneira cientí
quem passa, caso as conheça. Ou finge conhe fica: como construímos nossas representações Percepção e o Fator Humano
cer a pessoa com quem está conversando. do mundo externo? Como a luz bruxuleante, EXISTE PERCEPÇÃO
(Para evitar o estresse associado a essas falhas a crepitação e o cheiro de fumaça de uma
EXTRASSENSORIAL?
de percepção, indivíduos que têm uma perda fogueira ativam conexões neurais? E como, a
auditiva séria ou prosopagnosia muitas vezes partir dessa neuroquímica viva, criamos nossa Alegações de PES
se mantêm distantes de situações sociais agi experiência consciente do movimento e da Premonições ou Suposições?
tadas.) Mas há um lado positivo: quando temperatura do fogo, de seu aroma e de sua
Submetendo a PES a
encontra alguém que a irritou anteriormente, beleza? Em busca de respostas para tais ques
em geral ela não sente hostilidade, pois não tões, vamos olhar mais de perto o que os psi Verificação Experimental
reconhece a pessoa. cólogos aprenderam a respeito de como sen
Essa curiosa mistura de “visão perfeita” e tim os e percebem os o m undo que nos
cegueira facial ilustra a distinção entre sen cerca.
Assimilando o Mundo: • O macho do bicho-da-seda possui receptores tão
sensíveis ao odor sexualmente atrativo da fêmea que ela
Alguns Princípios Básicos precisa liberar menos de um bilionésimo de grama por
segundo para atrair todos os machos no raio de 1,5
quilômetro. É por isso que continuam existindo bichos-
1: O que são sensação e percepção? O que
da-seda.
queremos dizer com processamento bottom-up
» Similarmente, somos equipados para detectar as
(de baixo para cima) e processamento top-down características importantes de nosso ambiente. Os
(de cima para baixo)? ouvidos são mais sensíveis a frequências sonoras que
incluem as consoantes da voz humana e o choro de um
EM NOSSAS EXPERIÊNCIAS COTIDIANAS, sensação e per bebê.
cepção fundem-se em um processo contínuo. Neste capí
tulo, reduzimos a velocidade desse processo para estudar suas Iniciamos a exploração de nossas habilidades sensoriais
partes. com uma pergunta que passa por todos os sistemas senso
Começamos com os receptores sensoriais e evoluímos para riais: que estímulos cruzam nosso limiar de percepção cons
níveis mais elevados de processamento. Os psicólogos refe- ciente?
rem-se à análise sensorial que começa em seu ponto de
entrada como processam ento bottom-up (de baixo para
cim a). Porém, a mente também interpreta o que os sentidos Limiares
detectam. Construímos percepções com base tanto nas sen
sações que vêm de baixo para cima até o cérebro como em 2 : O que são os limiares absoluto e diferencial?
nossa experiência e nossas expectativas, o que os psicólogos Os estímulos abaixo do limiar absoluto exercem
cham am de p ro ce ssa m e n to top-down (de cim a p ara alguma influência?
baixo). Por exemplo, quando nosso cérebro decifra a infor
mação presente na FIGURA 6 .1 , o processamento bottom-up Existimos em um mar de energia. Neste momento, você e eu
habilita nossos sistemas sensoriais a detectar as linhas, os estamos sendo atingidos por raios X e ondas de rádio, luzes
ângulos e as cores que formam os cavalos, o viajante e os ultravioleta e infravermelha e ondas sonoras de frequências
arredores. Usando o processamento top-down, levamos em muito altas e muitos baixas. Somos cegos e surdos a tudo
conta o título do quadro, notamos as expressões apreensivas isso. Outros animais detectam um mundo que repousa além
e então dirigimos a atenção para aspectos da pintura que da experiência humana (Hughes, 1999). Aves migratórias
darão significado a essas observações. mantêm o curso com o auxílio de uma bússola magnética
Os dotes sensoriais da natureza se adaptam às necessida interna. Morcegos e golfinhos localizam as presas por meio
des de quem as recebe. Habilitam cada organismo a obter de sonares (emitindo um som que ecoa nos objetos). Em um
informações essenciais. Considere: dia nublado, abelhas voam detectando a luz polarizada de um
• Uma rã, que se alimenta de insetos voadores, tem olhos sol invisível (para nós).
dotados de células receptoras que disparam apenas em As sombras que incidem sobre nossos sentidos têm apenas
resposta a objetos pequenos, escuros e em movimento. uma pequena abertura, permitindo-nos somente uma consci
Uma rã poderia morrer de fome cercada de moscas ência restrita desse vasto mar de energia. Vejamos o que a psi-
imóveis. Mas basta uma passar zumbindo e as células cofísica descobriu a respeito da energia física que podemos
“detectoras de insetos" despertam instantaneamente. detectar e seu efeito sobre nossa experiência psicológica.
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25 - Estímulos
S subliminares
> FIG U R A 6.2
Limiar absoluta Que diferenças sutis posso
detectar entre estas amostras de café? Quando
estímulos são detectáveis em menos de 50% Baixa Limiar Média
das vezes, eles são "subliminares". O limiar absoluto
absoluto é a intensidade na qual conseguimos
detectar um estímulo na metade das vezes. Intensidade do estímulo-------- ►
conta. Em um experimento, 10 horas de um jogo de video- mem, um cadáver) um instante antes de os participantes
game de ação - consistindo em procurar e instantaneamente visualizarem imagens de pessoas (Krosnick et al., 1992). Os
reagir a qualquer invasão - elevaram as habilidades de detec participantes perceberam conscientemente cada uma apenas
ção de jogadores novatos (Green e Bavelier, 2 0 0 3 ). (Veja no como um lampejo. Ainda assim, as imagens de pessoas pare
Capítulo 16 pesquisas sobre efeitos sociais menos positivos ciam para os participantes como mais agradáveis se a cena
de videogames violentos.) precedente e não percebida conscientemente fosse a cena de
gatinhos em vez da do lobisomem. Outro experimento expôs
voluntários a odores subliminares prazerosos, neutros ou
Estim ulação Sublim inar desagradáveis (Li et al., 2007). A despeito de não terem cons
Na esperança de penetrar em nosso inconsciente, empresá ciência deles, os participantes classificaram um rosto com
rios oferecem gravações que supostamente falam direto com expressão neutra mais simpático após a exposição aos aro
o cérebro para nos ajudar a perder peso, parar de fumar ou mas prazerosos do que aos desagradáveis.
aprimorar a memória. Mascaradas por suaves sons do oce Esse experimento ilustra um fenômeno intrigante: às vezes
ano, mensagens não ouvidas ( “Eu sou magro”, “Cigarro tem sentimos o que não conhecemos e não podemos descrever.
gosto ruim ” ou “Eu me saio bem em provas. Lembro-me Com frequência, um estímulo imperceptivelmente breve
totalmente das informações”) irão, dizem eles, influenciar desencadeia uma resposta tênue que pode ser detectada por
nosso comportamento. Tais alegações sugerem duas coisas: um exame de imagem do cérebro (Blankenburg et al., 2003;
(1) Podemos perceber de modo inconsciente estímulos subli Haynes e Rees, 2005, 2006). A conclusão (aumente o volume
m in ares (literalmente, “abaixo do limiar”), e (2) sem nos aqui): Grande parte de nosso processamento de informações
darmos conta, esses estímulos têm extraordinários poderes ocorre de form a automática, longe de vista, fora da tela do radar
sugestivos. Podemos? Eles têm mesmo? de nossa consciência.
Podemos perceber estímulos abaixo de nossos limiares Mas o fato de haver sensação subliminar confirma as ale
absolutos? Em certo sentido, a resposta é clara: sim. Lembre- gações de persuasão subliminar? Seriam os anunciantes real
se de que um limiar “absoluto” nada mais é que o ponto em mente capazes de nos manipular com “persuasão oculta”? O
que detectamos um estímulo na metade das vezes (FIGURA quase consenso entre os pesquisadores é que não. O veredicto
6 .2 ). Nesse limiar ou um pouco abaixo dele, ainda detecta é semelhante ao dos astrônomos que dizem a respeito dos
mos o estímulo eventualmente. astrólogos: “Sim, eles estão certos quanto à existência das
estrelas e dos planetas; mas não, os corpos celestiais não nos
subliminar abaixo do limiar absoluto de percepção afetam diretamente.” A pesquisa laboratorial revela um efeito
consciente. sutil e fugaz. Pré-ativar pessoas sedentas com a palavra subli
minar sede poderia então, por um breve intervalo, tornar um
pré-ativação (p rim in g ) a ativação, muitas vezes
inconsciente, de certas associações, predispondo assim anúncio de bebida mais persuasivo (Strahan et al., 2002).
a percepção, a memória ou a reação. Do mesmo modo, pré-ativar esses indivíduos com Lipton Ice
Tea pode aumentar sua propensão a escolher a marca pré-
Podemos ser afetados por estímulos tão fracos que sequer ativada (Karremans et al., 2 0 0 6 ). Porém, os marqueteiros
são notados? Sob certas condições, a resposta é sim. Uma das mensagens subliminares afirmam algo diferente: um
imagem ou uma palavra invisível pode p ré-ativar (prim e) efeito poderoso e duradouro sobre o comportamento.
em um breve momento sua resposta a uma pergunta poste
rior. Em um experimento típico, a imagem ou palavra é exi
bida rapidamente e, em seguida, substituída por um estímulo
mascarador que interrompe o processamento cerebral antes
da percepção consciente. Por exemplo, um experimento exi “□ CDraçãD tem razões que a própria razão desconhece."
biu de forma subliminar cenas emocionalmente positivas Pascal, Pensamentos, 1E70
(gatinhos, um casal rom ântico) ou negativas (um lobiso
Para testar se gravações subliminares comerciais têm algum
O SENHOR é meu pastor,
efeito além do de placebo (o efeito da crença nelas), Anthony nada me faltará.
Greenwald e seus colegas (1 9 9 1 ,1 9 9 2 ) atribuíram aleatoria Em verdes prados
ele me faz repousar.
mente a estudantes universitários a tarefa de escutar todos C onduz-m e
ju n to às águas refrescan tes,
os dias durante cinco semanas mensagens comerciais subli R estau ra as fo rç a s de m in h a alm a.
minares que prometiam melhorar a autoestima ou a memó P elo s c a m in h o s reto s
ele m e leva,
ria. Porém os pesquisadores fizeram uma verdadeira pegadi- p o r a m o r do seu n o m e .
nha e trocaram metade dos rótulos. Alguns estudantes pen A in d a q u e eu atra v e sse o v a le e s c u ro ,
n a d a t e m e r e i,
saram estar recebendo afirmações de autoestima quando na p o is e s t a is c o m ig o .
verdade estavam ouvindo a mensagem de aprimoramento de V o ss o b o r d ã o e v o s s o b á c u lo
sã o o m eu am p aro
memória. Outros receberam a de autoestima, mas pensaram P r e p a r a i s p a r a m im a m e s a
que suas memórias estavam sendo recarregadas. a vista de meus inim igos.
D erram ais o perfum e sobre m inha cabeça,
As gravações foram eficazes? Os resultados dos estudantes e tra n sb o rd a m in h a taça.
tanto nos testes de autoestima como nos de memória, reali A vossa b o n d a d e e m isericó rd ia
h ã o de seg u ir-m e
zados antes e depois das cinco semanas, não revelaram efeito p o r to d o s o s d ias da m in h a vida
E h a b ita r e i
nenhum. E, ainda assim, aqueles que pensavam ter ouvido n a casa do SEN H O R
uma gravação sobre memória acreditavam que suas memórias p o r lo n g o s d ia s .
tinham melhorado. Resultado semelhante ocorreu com os
que pensavam ter ouvido uma mensagem sobre autoestima. O limiar diferencial Nesta cópia do Salmo 23 gerada por
As gravações não fizeram efeito, mas os estudantes percebiam- computador, cada linha muda de tamanho da fonte
se recebendo os benefícios que esperavam. Ao ler essa pesquisa, imperceptivelmente. Quantas linhas são necessárias para que você
ouvem-se ecos dos testemunhos que pingam dos catálogos experimente uma diferença apenas perceptível?
de compras por correio. Alguns clientes, ao comprarem o que
supostamente não teriam ouvido (e de fato não ouviram!)
oferecem testemunhos como: “Eu sei que suas fitas não ser
viram para reprogramar minha m ente." Ao longo de uma ampla que ainda nos referimos a ele como lei de W eber: para
década, Greenwald conduziu 16 experimentos duplos-cegos que sua diferença seja perceptível, dois estímulos devem diferir
para avaliar fitas subliminares de autoajuda. Os resultados em uma proporção constante - não em uma quantidade cons
foram uniformes: nenhum teve efeito terapêutico algum tante. A proporção exata varia, dependendo do estímulo. Para
(Greenwald, 1992). A conclusão: “Procedimentos sublimi uma pessoa média perceber suas diferenças, duas luzes devem
nares oferecem pouco ou nenhum valor para o profissional diferir por volta de 8% em intensidade. Dois objetos devem dife
de marketing” (Pratkanis e Greenwald, 1988). rir por volta de 2% no peso. E dois tons devem diferir apenas
0,3% na frequência (Teghtsoonian, 1971).
Limiares Diferenciais
Para funcionar de maneira efetiva, precisamos de limiares
absolutos baixos o bastante para nos permitir detectar visões,
“Precisam os acim a de tudo conhecer n o ssas m udanças;
sons, texturas, sabores e odores importantes. É preciso tam
ninguém quer ou p recisa ser lembrado 16 horas por dia
bém detectar pequenas diferenças entre estímulos. Um músico
de que está com os sapatos calçados."
deve detectar minúsculas discrepâncias na afinação de um
David Hubel, neuracientista (1979)
instrumento. Pais devem detectar o som da voz de seu pró
prio filho entre as de outras crianças. Mesmo após viver dois
anos na Escócia, os balidos de carneiros parecem todos iguais
para meus ouvidos. Mas não para os das ovelhas, que obser
vei correndo, após a tosquia, diretamente até o balido de seu AdaDtação Sensorial
cordeiro em meio ao coro de outros cordeiros agoniados.
3 : Qual é a função da adaptação sensorial?
lim ia r d ife re n c ia l a d ife re n ça m ínim a e n tre do is
estím ulo s necessária para a d e te c ç ã o em 50% das vezes. Ao entrar na sala de estar de seus vizinhos, você sente um cheiro
E xp e rim e n ta m o s o lim ia r d ife re n c ia l c o m o uma
de mofo. Você se pergunta como eles o suportam, mas em minu
diferença apenas p e rcep tível (ou D A P ).
tos deixa de percebê-lo. A adaptação sensorial - a diminuição
le i de W e b e r o p rin c íp io seg un do o qual, para serem de nossa sensibilidade a um estímulo constante - vem para
p e rce b id o s co m o díspares, dois estím ulo s devem d ife rir salvá-lo. (Para experimentar esse fenômeno, eleve seu relógio
em uma p e rce n ta g e m m ínim a c o n sta n te (em vez de em dois centímetros no punho: você o sentirá - mas apenas por
um a q u a n tid a d e con stante). alguns instantes.) Após a exposição contínua a um estímulo,
nossas células nervosas disparam com menos frequência.
a d a p ta ç ã o sen sorial d im in u iç ã o da s e n sib ilid a d e co m o
con seq üê ncia de e s tim u la çã o constante.
Por que, então, se olharmos fixamente para um objeto, sem
piscar, ele não desaparece da vista? Porque, sem que perceba
O lim iar diferencial, também chamado diferença apenas mos, nossos olhos estão sempre se movendo, indo de um ponto
perceptível (DAP), é a diferença mínima que uma pessoa (ou para outro o suficiente para garantir que a estimulação sobre
uma ovelha) pode detectar entre dois estímulos quaisquer em os receptores oculares mude de maneira contínua.
metade das vezes. Essa diferença detectável aumenta com o Em 9 de cada 10 pessoas - mas em apenas 1 de
tamanho do estímulo. Assim, se você somar 1 grama a um peso cada 3 das que sofrem de esquizofrenia - esse
de 10 gramas, irá detectar a diferença, mas some 1 grama a um movim ento ocular cessa quando o olho está
peso de 100 gramas e provavelmente não irá. Há mais de um seguindo um alvo que se move (Holzm an e Matthyss,
século, Ernst Weber notou algo tão simples e de aplicação tão 1990).
E se realmente pudéssemos interromper o movimento dos Como vemos? Ouvimos? Cheiramos? Saboreamos? Sentimos
olhos? As imagens que vimos pareceriam sumir, como os dor? Mantemos o equilíbrio?
odores? Para descobrir, psicólogos conceberam engenhosos
instrumentos para manter uma imagem constante na super
ANTES DE P R O S S E G U IR ...
fície interna do olho. Imagine que tenhamos equipado uma
voluntária, Mary, com um desses instrumentos - um proje
tor em miniatura montado em uma lente de contato (FIGURA > P ergunte a Si M esmo
6 .3 a ). Quando os olhos de Mary se movem, o mesmo acon Que tipos de adaptação sensorial você experimentou nas
tece com a imagem no projetor. Então, para onde quer que últimas 24 horas?
Mary olhe, certamente lá estará a cena.
Se projetarmos o perfil de um rosto utlizando um instru > Teste a Si Mesmo 1
mento como esse, o que Mary verá? A princípio, o perfil com Qual é, grosso modo, a diferença entre sensação e percepção?
pleto. Mas, dentro de alguns segundos, à medida que seu sis
tema sensorial começar a se cansar, as coisas se tornarão As respostas às Questões “Teste a Si Mesmo" podem ser encontradas no
estranhas. Aos poucos, a imagem desaparecerá, reaparecendo Apêndice B, no final do livro.
depois e então desaparecendo outra vez - em fragmentos
reconhecíveis ou como um todo (FIGURA 6 .3 b ).
Embora a adaptação sensorial reduza nossa sensibilidade,
ela oferece uma importante vantagem: liberdade para focar Visão
mudanças informativas no ambiente sem sermos distraídos
pelo constante burburinho da estimulação de segundo plano, 4 : O que é a energia que vemos como luz?
que não traz informações. Nossos receptores sensoriais estão
alertas à novidade; deixe-os entediados com repetições e eles UMA DAS GRANDES MARAVILHAS DA NATUREZA NÃO é
liberarão nossa atenção para coisas mais importantes. Pes bizarra nem distante, mas um lugar-comum: como nosso
soas malcheirosas ou exageradamente perfumadas não notam corpo material constrói nossa experiência visual consciente?
o próprio odor porque, como você e eu, se adaptam ao que é Como transformamos partículas de energia luminosa em
constante e detectam mudanças. Isso reforça uma lição fun imagens coloridas?
damental: percebemos o mundo não exatamente como ele é, mas Parte desse talento é nossa capacidade de converter um
como é útil para nós percebê-lo. tipo de energia em outro. Nossos olhos, por exemplo, rece
bem energia luminosa e a transduzem (transformam) em
mensagens neurais que o cérebro então processa, formando
aquilo que vemos conscientemente. Como algo tão óbvio e
ainda assim notável acontece?
"Minha suspeita é de que □ universo é não apenas mais
bizarro do que supomos, m as sim m ais bizarro do que transdução conversão de uma forma de energia em
podemos supor,” outra. No caso da sensação, a transformação de
energias de estímulo, tais como luzes, sons e odores, em
J. B. S. Haldane, P ossible Worlds, 1927
impulsos neurais que nosso cérebro pode interpretar.
Q 0 N> t
>■ F IG U R A 6.3
A Z _ ___ / A Adaptação sensorial: agora você vê, agora
não vê! (a) Um projetor montado sobre uma lente
de contato faz a imagem projetada mover-se com o
olho. (b) Inicialmente, a pessoa vê a imagem
hB H B 3 4 estabilizada, mas logo vê fragmentos
desaparecendo e reaparecendo. (De: "Stabilized
BEER PEER PEEP BEE BE images on the retina", de R. M. Pritchard. Copyright
© 1961 Scientific American, Inc. Todos os direitos
(b) reservados.)
brinca
Piisma
>- FIG U R A 6 .4
O espectro de energia eletromagnética Este
espectro estende-se de raios gama, curtos como
o diâmetro de um átomo, a ondas de rádio de
Raios Raios X Raios Raios Radar Faixas de Circuitos mais de 1,5 quilômetro. A estreita faixa de
gama ultra- infraver- transmissão CA comprimentos de onda visível ao olho humano
violeta melhos (mostrada ampliada) estende-se das ondas mais
curtas, de luz azul-violeta, às mais longas, de luz
10"* IO"’ 10_1 101 103 105 107 10’ 1011 1013 101
vermelha. (A reprodução colorida desta figura
Comprimentos de onda em nanômetros (bilionésimos de metro) encontra-se no Encarte em Cores.)
rentes faixas do espectro. Abelhas, por exemplo, não podem Comprimentos de onda eletromagnéticos variam dos
ver o vermelho, mas sim a luz ultravioleta. pequenos pontos de raios cósmicos aos longos pulsos
de transmissão de rádio.
Duas características físicas da luz ajudam a determinar a
experiência sensorial que temos dela. Seu com prim ento de matiz a dimensão da cor que é determinada pelo
onda - a distância de um pico de onda para o seguinte comprimento de onda da luz; aquilo que conhecemos
(FIGURA 6 .5 a ) - determina o m atiz (a cor que experimen como os nomes de cores azul, verde e assim por diante.
tamos, como azul ou verde). A intensidade, a quantidade de
energia nas ondas luminosas (determinada pela amplitude, intensidade a quantidade de energia em uma onda
ou altura, de uma onda), influencia o brilho (FIGURA 6.5b ). luminosa ou sonora, que percebemos como brilho ou
volume, conforme determinado pela amplitude da onda.
Para entender como transformamos energia física em cor e
significado, é necessário primeiro entender a janela da visão, pupila a abertura ajustável no centro do olho através
o olho. da qual a luz entra.
5 : Como o olho transforma energia luminosa em cristalino a estrutura transparente atrás da pupila que
mensagens neurais? muda de forma para ajudar a focalizar imagens na
retina.
A luz entra no olho através da córnea, que protege o olho e
retina a superfície interna do olho, sensível à luz, que
desvia a luz para prover foco (FIGURA 6 .6 ) . A luz então contém os bastonetes e cones, mais camadas de
passa pela pupila, uma pequena abertura ajustável rodeada neurônios que iniciam o processamento de informações
pela íris, um músculo colorido que ajusta a entrada de luz. visuais.
A íris dilata-se ou contrai-se em resposta à intensidade da luz
e mesmo a emoções. (Quando temos um sentimento amo acomodação o processo pelo qual o cristalino muda
roso, nossas pupilas dilatadas e nossos olhos escuros, indis de forma para focalizar objetos próximos ou distantes
cretos, subitamente sinalizam nosso interesse.) Cada íris é na retina.
tão distinta que um escaneamento dela pode confirmar a
Atrás da pupila encontra-se o cristalino, que focaliza os
identidade de uma pessoa.
raios luminosos que entram, formando uma imagem na
comprimento de onda a distância entre o pico de uma retin a, um tecido de múltiplas camadas sensível à luz, na
onda luminosa ou sonora e o pico da seguinte. superfície interna do globo ocular. O cristalino focaliza os
Comprimento de onda curto = frequência alta Grande amplitude
(cores azuladas) (cores brilhantes)
> F IG U R A 6 .5
As propriedades físicas das
ondas (a) As ondas variam em
comprimento (a distância entre picos
sucessivos). A frequência, o número de
x. J y y V / Vj
comprimentos de onda completos que
podem passar por um ponto em um
dado momento, depende do Comprimento de onda longo = frequência baixa Pequena amplitude
comprimento de onda. Quanto mais (cores avermelhadas) (cores opacas)
curto for o comprimento de onda, mais
alta a frequência, (b) As ondas também * ■*
variam em amplitude (a altura do pico à
parte mais inferior). A amplitude da
onda determina a intensidade das cores.
[ \/\-/
(A reprodução colorida desta figura
encontra-se no Encarte em Cores.) (a) (b)
raios alterando sua curvatura, em um processo denominado ponto cego o ponto em que o nervo óptico sai do
acom odação. olho, criando um ponto “cego” porque nenhuma célula
receptora está localizada ali.
Há séculos os cientistas sabem que, quando a imagem de
uma vela passa por uma pequena abertura, sua imagem espe fóvea o ponto focal central da retina, em torno do
lhada aparece invertida em uma parede escura localizada atrás. qual os cones do olho se aglomeram.
Se a retina recebe esse tipo de imagem de cabeça para baixo,
como na FIGURA 6 .6 , como podemos ver o mundo de cabeça
para cima? O sempre curioso Leonardo da Vinci teve uma A Retina
ideia: talvez os fluidos aquosos do olho desviassem os raios Se pudesse seguir o caminho de uma única partícula de ener
luminosos, revertendo a imagem para a posição normal ao gia luminosa olho adentro, você passaria primeiro pela
alcançar a retina. Porém, em 1604, o astrônomo e especialista camada externa de células da retina até suas células recepto
em óptica Johannes Kepler mostrou que a retina de fato recebe ras internas, os bastonetes e os cones (FIGURA 6 .7 ). Lá,
imagens invertidas do mundo (Crombie, 1964). E como pode veria a energia luminosa desencadear alterações químicas que
ríamos compreender um mundo assim? “Deixo a resposta”, disparariam sinais neurais, ativando as células bipolares pró
disse o perplexo Kepler, “para os filósofos naturais.” ximas. Estas, por sua vez, ativariam as vizinhas células gan-
Por fim, a resposta tornou-se clara: a retina não “vê” uma glionares. Seguindo o caminho da partícula, você veria axô-
imagem completa. Em vez disso, seus milhões de células recep nios dessa rede de células ganglionares convergindo, como
toras convertem partículas de energia luminosa em impulsos os filamentos de uma corda, para formar o nervo óptico,
neurais e os passam adiante para o cérebro. Lá, os impulsos que transporta informações para o cérebro (onde serão rece
são reunidos em uma imagem percebida de cabeça para bidas e distribuídas pelo tálamo). O nervo óptico pode enviar
cima. quase 1 milhão de mensagens de uma vez por meio de quase
1 milhão de fibras ganglionares. (O nervo auditivo, que pos
bastonetes receptores da retina que detectam o preto, sibilita a audição, transporta muito menos informações por
o branco e o cinza; necessários às visões periférica e suas meras 30.000 fibras.) No local em que o nervo óptico
crepuscular, quando os cones não respondem. deixa o olho não há células receptoras (sensíveis à luz) -
criando um ponto cego (FIGURA 6 .8 ). Feche um olho e,
cones células receptoras da retina concentradas no entanto, você não verá um buraco negro na tela da TV.
próximo ao centro da retina e que funcionam à luz do
Sem pedir sua aprovação, o cérebro preenche o buraco.
dia ou em lugares bem-iluminados. Os cones detectam
detalhes finos e dão origem a sensações de cor. Bastonetes e cones diferem quanto à geografia e às tarefas
que lhes são designadas (TABELA 6 .1 ). Os cones aglome-
nervo óptico o nervo que transporta impulsos neurais ram-se dentro e em torno da fóvea, a área de foco central da
do olho para o cérebro. retina (veja a FIGURA 6 .6 ) . Muitos deles têm sua própria
Cristalino Retina
Pupila
\
Fóvea (ponto de foco central)
>► F IG U R A 6 .6
O olho Raios de luz refletidos pela vela passam
através da córnea, da pupila e do cristalino. A
curvatura e a espessura do cristalino mudam para
focalizar na retina tanto objetos próximos como
distantes. Raios do topo da vela atingem a porção Nervo óptico em
inferior da retina, e os do lado esquerdo atingem o Córnea direção ao córtex
lado direito desta. A imagem retiniana da vela é,
visual do cérebro
então, de cabeça para baixo e invertida.
1 . A luz que penetra no olho 2 . A reação química por sua
desencadeia uma reação vez ativa células bipolares.
fotoquímica nos bastonetes e
cones na parte posterior da retina.
Um
FtluU j M >
I Impulso
neural
linha direta para o cérebro - células bipolares que ajudam a tênue energia na direção de uma única célula bipolar. Assim,
transm itir a mensagem individual do cone para o córtex cones e bastonetes fornecem, cada um, uma sensibilidade espe
visual, que reserva uma extensa área aos estímulos vindos da cial - aqueles a detalhes e cores, estes à luz fraca.
fóvea. Essas conexões diretas preservam a informação precisa Quando você entra em um teatro escuro ou apaga as luzes
dos cones, tornando-os mais aptos a detectar detalhes finos. à noite, suas pupilas dilatam-se para permitir que mais luz
Os bastonetes não dispõem dessa linha direta; eles compar alcance a retina. Em geral demora pelo menos 20 minutos
tilham células bipolares com outros bastonetes, enviando para que seus olhos se adaptem inteiramente. Pode-se demons
mensagens combinadas. Para testar essa diferença na sensi trar a adaptação ao escuro fechando-se ou cobrindo-se um
bilidade a detalhes, escolha uma palavra nesta frase e olhe olho por até 20 minutos. Depois deixe a luz do quarto fraca
diretamente para ela, focalizando sua imagem nos cones de 0 suficiente para ler este livro com o olho aberto. Agora abra
sua fóvea. Notou que as palavras que estão alguns centíme 0 olho adaptado ao escuro e leia (com facilidade). Esse período
tros para 0 lado parecem borradas? Sua imagem atinge a região de adaptação é paralelo à transição natural média entre o pôr
mais periférica da retina, onde os bastonetes predominam. do sol e a escuridão.
Na próxima vez em que estiver dirigindo ou pedalando, note, Alguns animais noturnos, como sapos, camundongos,
também, que é possível detectar um carro em seu campo de ratos e morcegos, têm retinas feitas quase inteiramente de
visão periférico muito antes de perceber seus detalhes. bastonetes, o que lhes permite funcionar bem na penumbra.
Os cones também permitem perceber cores. Na penumbra É provável que essas criaturas tenham uma visão de cores
eles se tornam ineficazes, então você não as vê. Os bastonetes, muito pobre. Sabendo apenas 0 que já vimos sobre o olho,
que possibilitam a visão em preto e branco, permanecem sen você pode imaginar por que um gato enxerga tão melhor do
síveis na penumbra, e em grande quantidade irão canalizar sua que você à noite?1
TABELA 6.1
Cones Bastonetes |
Área visual
do tálamo
Retina
Córtex
visual
Cena
Passe um arco por um violino e a energia de estímulo resul o u v id o m é d io a câm ara lo ca liza d a e n tre o tím p a n o e a
cóclea, co n te n d o trê s m in úscu los ossos (m a rte lo ,
tante são ondas sonoras - moléculas de ar que se empurram, b ig o rn a e e s trib o ) que co n ce n tra m as v ib ra çõ e s do
umas se chocando contra as seguintes, como um empurrão tím p a n o na jane la oval da cóclea.
transmitido através do túnel de saída lotado de uma sala de
concertos. As conseqüentes ondas de ar comprimido e expan có cle a um tu b o ósseo e sp ira lad o e p re e n c h id o p o r
dido são como a água de uma lagoa reverberando em círculos líq u id o , lo c a liz a d o no o u v id o in te rn o , através do qual
ondas sonoras desencadeiam im p ulso s sonoros.
no ponto em que uma pedra foi atirada. Enquanto nadamos
em nosso oceano de moléculas de ar que se movimentam, o u v id o in te rn o a p a rte mais in te rn a d o o u vid o ,
nossos ouvidos detectam essas breves mudanças de pressão c o n te n d o a cóclea, os canais sem icirculare s e os sacos
do ar. Expostos a um som bastante grave e alto - talvez de vestib ulares.
um contrabaixo ou de um violoncelo -, também podemos
sentir a vibração, e ouvimos por condução tanto aérea como Meu voto para a parte mais intrigante do processamento
óssea. auditivo vai para as células ciliadas. Um relatório do Howard
Os ouvidos então transformam o ar vibrante em impulsos Hughes Medicai Institute (2008) sobre esses “trêmulos fei
nervosos, que o cérebro decodifica como sons. A força, ou xes que nos permitem ouvir” admira-se de suas “extremas
amplitude, das ondas sonoras (lembre-se da FIGURA 6 .5 , sensibilidade e velocidade”. Uma cóclea possui 16.000 dessas
que ilustrou a amplitude em relação à visão) determina seu células, o que parece muito até compararmos esse número
volume. As ondas também variam em comprimento e, por com os cerca de 130 milhões de fotorreceptores do olho. No
tanto, em frequ ência. Esta determina a altu ra que experi entanto, leve em consideração sua capacidade de resposta.
mentamos: ondas longas têm frequência baixa - e altura Curve os minúsculos feixes de cílios na extremidade de uma
também baixa. Ondas curtas têm frequência alta - e altura célula ciliada da largura de um átomo - o equivalente a des
também alta. Um violino produz ondas muito mais curtas e locar o topo da Torre Eiffel meia polegada - e a célula ciliada.
rápidas que um violoncelo. ativada, dispara uma resposta neural, graças a uma proteína
Medimos sons em decibéis. O limiar absoluto da audição especial em sua membrana (Corey et al., 2004).
é definido arbitrariamente como zero decibel. Cada 10 deci Lesões nas células ciliadas são a maior causa de perda audi
béis correspondem a um aumento de 10 vezes na intensidade tiva. Elas já foram comparadas a fibras de um tapete felpudo.
do som. Assim, uma conversa normal (60 decibéis) é 10.000 Se caminharmos sobre esse tapete e, em seguida, passarmos
vezes mais intensa que um sussurro de 20 decibéis. E o som nele o aspirador de pó suas fibras voltarão rapidamente a
temporariamente tolerável de 100 decibéis de um trem sub posição inicial. Porém, se deixarmos um móvel pesado sobre
OUVIDO
(a) OUVIDO EXTERNO OUVIDO MEDIO INTERNO
Canais semicirculares
Ovío s do
ouvido Osso
médio i
Nervo auditivo
Ondas
sonoras Cóclea
Cóclea,
parcialmente Córtex auditivo
Martelo Bigorna
desenrolada do lobo temporal
ele, isso nunca acontecerá. Como regra geral, se não puder excede 100 decibéis, como acontece em animadas arenas
mos falar mais alto que um determinado ruído, ele é poten esportivas, bandas de gaitas de foles e iPods tocando quase
cialmente prejudicial, especialmente se prolongado e repetido no último volume (FIGURA 6 .1 6 ). O zumbido nos ouvidos
(Roesser, 1998). Tais experiências são comuns quando o som após a exposição ao ruído alto de máquinas ou de música
indica que tratamos mal nossas desafortunadas células cilia
das. Como a dor nos alerta para possíveis ameaças físicas,
esse zumbido nos alerta para possíveis danos auditivos. É o
equivalente auditivo do sangramento.
Garotos adolescentes, mais do que as garotas ou os adul
tos, estouram os ouvidos com volumes altos durante longos
períodos (Zogby, 2006). A maior exposição dos homens ao
barulho pode ajudar a explicar por que sua audição tende a
ser menos aguçada do que a das mulheres. Porém, homem
ou mulher, quem passa várias horas em uma casa noturna
barulhenta, atrás de um cortador de grama elétrico ou sobre
uma britadeira deveria usar protetores auriculares. “Preser
vativo ou, ainda mais seguro, abstinência”, recomendam os
educadores sexuais. “Protetores auriculares ou vá embora”,
dizem os educadores auditivos.
Percebendo o Volum e
Então, como detectamos o volume? Não é, como eu teria
Seja gentil com as células ciliadas de seu ouvido interno Ao
imaginado, pela intensidade da resposta de uma célula ciliada.
vibrar em resposta ao som, as células ciliadas, aqui mostradas Em vez disso, um tom suave e puro ativa apenas as poucas
alinhadas na cóclea, produzem um sinal elétrico. células ciliadas sintonizadas com sua frequência. Para sons
humanos para observar seu interior com um microscópio,
Decibéis descobriu que elas vibravam, semelhantemente a um lençol
140 Banda de rock Exposição
prolongada
quando sacudido, em resposta ao som. Frequências altas pro
(amplificada) de perto
130 a cim a de duziam intensas vibrações perto do início da membrana da
85 decibéis cóclea; frequências baixas, perto do fim.
120 Trovoada alta produz Há, porém, uma falha na teoria da codificação de lugar.
perda
110 Jato a cerca de 150 metros aLÍ(jitiva Ela pode explicar como ouvimos sons agudos, mas não como
ouvimos os graves, pois os sinais neurais gerados por estes
100 Trem do metrô a 6 metros
não têm uma localização tão precisa na membrana basilar.
90 A teo ria da frequência sugere uma explicação alternativa:
0 cérebro identifica a altura ao monitorar a frequência dos
80 Esquina movimentada
impulsos neurais que atravessam 0 nervo auditivo. Toda a
70 membrana basilar vibra com a onda sonora que entra, desen
cadeando impulsos neurais para o cérebro no mesmo ritmo
60 Conversa normal
da onda sonora. Se esta tiver uma frequência de 100 ondas
50 por segundo, então 100 pulsos por segundo viajarão pelo
nervo auditivo.
40
Por que não temos apenas uma grande orelha - quem sabe
Percebendo a Altura em cima de nosso único nariz? Para ouvi-la melhor, como
disse o lobo à Chapeuzinho Vermelho. Assim como a locali
10: Que teorias nos ajudam a compreender a zação dos olhos nos ajuda a perceber a profundidade visual,
percepção da altura do tom? a de nossos dois ouvidos permite-nos desfrutar a audição
estereofônica ( “tridimensional”).
Como sabemos se um som é o gorjeio agudo e de alta fre Dois ouvidos são melhor que um por pelo menos duas
quência de um pássaro ou 0 ronco grave de baixa frequência razões: se 0 carro à direita buzinar, seu ouvido direito recebe
de um caminhão? O pensamento atual acerca da discrimi um som mais intenso, e 0 recebe um pouco antes que 0
nação da altura, como o da discriminação da cor, combina esquerdo (FIGURA 6 .1 7 ). Visto que o som viaja a mais de
duas teorias. 1.200 quilômetros por hora e nossos ouvidos estão a meros
A te o ria da cod ificação de lu gar de Hermann von 15 centímetros de distância um do outro, a diferença de inten
Helmholtz supõe que ouvimos alturas diferentes porque ondas sidade e o atraso de tempo são extremamente pequenos. No
sonoras diferentes desencadeiam atividade em locais diferen entanto, nosso supersensível sistema auditivo pode detectar
tes ao longo da membrana basilar da cóclea. Assim, o cérebro essas diminutas diferenças (Brown e Deffenbacher, 1979;
determina a altura de um som ao reconhecer o local especí Middlebrooks e Green, 1991). Uma diferença apenas percep
fico (na membrana) que está gerando 0 sinal neural. Quando tível na direção de duas fontes de som corresponde a uma
0 futuro ganhador do Prêmio Nobel Georg von Békésy (1957) diferença de tempo de apenas 0,000027 segundo! Para simu
fez furos nas cócleas de porquinhos-da-índia e de cadáveres lar 0 que os ouvidos experimentam com o som vindo de dife-
Danos aos receptores das células ciliadas da cóclea ou a
seus nervos associados podem causar a perda auditiva neu-
rossensorial (ou surdez nervosa), mais comum. Esta é oca
sionalmente provocada por doenças, porém com mais fre
quência a culpa é das mudanças biológicas ligadas à heredi
tariedade, ao envelhecimento e à exposição prolongada a
barulhos ou música ensurdecedores. (Veja Em Foco: Vivendo
em um Mundo Silencioso.)
Por ora, a única maneira de restaurar a audição para quem
tem surdez nervosa é uma espécie de ouvido biônico - um
im plante coclear. Esse aparelho eletrônico traduz sons em
sinais elétricos que, ligados aos nervos da cóclea, transmitem
informações sobre o som para o cérebro. O implante ajuda
crianças a se tornar proficientes em comunicação oral (espe
cialmente se o receberem na pré-escola ou mesmo antes de
> FIG U R A 6.17 1 ano de idade) (Dettman et al., 2007; Schorr et al., 2005).
Como localizamos sons Ondas sonoras atingem um ouvido antes Os implantes cocleares mais recentes também ajudam a res
e com maior intensidade que o outro. A partir dessa informação,
taurar a audição na maior parte dos adultos (embora não
nosso ágil cérebro calcula a localização do som. Como é de se
esperar, pessoas que perdem totalmente a audição de um ouvido naqueles cujo cérebro nunca aprendeu a processar sons
muitas vezes têm dificuldade de localizar sons. durante a infância). Até 2003, cerca de 60.000 pessoas em
todo o mundo tinham implantes cocleares, e outros milhões
eram potenciais candidatos (Gates e Miyamoto, 2003).
rentes locais, um software de áudio pode emitir som de dois Também estão a caminho experimentos para
alto-falantes com retardo e intensidade variados. O resultado: restaurar a visão - com uma retina biônica (um
podemos perceber uma abelha zumbindo alto em um ouvido, microchip de 2 milímetros de diâm etro com
fotorreceptores que estimulam células retinianas
depois voando pela sala e voltando a zumbir próximo ao outro
danificadas) e com uma câmera de vídeo e um
ouvido (Harvey, 2002). com putador que estimulam o córtex visual. Em
Então, como você supõe que nos saímos ao tentar locali testes, ambos os dispositivos proporcionaram visão
zar um som equidistante dos dois ouvidos, como aqueles que parcial a pessoas cegas (Boahen, 2 0 0 5 ; Steenhuysen,
vêm diretamente da frente, de trás, de cima ou de baixo de 2002 ).
nós? Não muito bem. Por quê? Porque ele atinge os dois ouvi
dos ao mesmo tempo. Sente-se com os olhos fechados O uso de implantes cocleares é objeto de intenso debate.
enquanto um amigo estala os dedos em torno de sua cabeça. De um lado estão os pais ouvintes de mais de 90% das crian
Você apontará com facilidade o som quando ele vier de um ças surdas. A maioria deles quer que seus filhos experimentem
dos lados, mas é provável que erre algumas vezes quando vier o seu mundo do som e da fala. Se o implante é eficaz, eles não
diretamente da frente, de trás, de cima ou de baixo. É por isso podem retardar a decisão até que a criança atinja a maioridade
que, quando tenta localizar com exatidão um som, você ergue para consentir. Do outro lado estão os defensores da cultura
a cabeça, para que os dois ouvidos recebam mensagens ligei Surda, que se opõem ao uso de implantes em crianças com
ramente diferentes. surdez pré-lingual - que já eram surdas antes de desenvolver
a linguagem. A Associação Nacional dos Surdos (EUA), por
exemplo, argumenta que a surdez não é uma deficiência, pois
Perda Auditiva e Cultura Surda quem tem a linguagem de sinais como sua forma de comuni
cação original não é linguisticamente deficiente. Em seu livro
Sign Language Structure (Estrutura da Língua de Sinais), de
12: Quais são as causas comuns de perda
1960, William Stokoe, linguista da Universidade Gallaudet,
auditiva, e por que os implantes cocleares são demonstrou o que sequer essas pessoas haviam compreendido
cercados de controvérsia?
plenamente: os sinais constituem uma linguagem completa, pessoas com surdez e à comunidade Surda em geral.
com gramática, sintaxe e significados próprios. Ao se referir a crianças sem audição, a palavra
costuma ser escrita com letra minúscula porque,
perda auditiva condutiva perda auditiva causada por nessa idade, ainda não tiveram a oportunidade de
danos ao sistema mecânico que conduz ondas sonoras à tom ar uma decisão informada quanto a sua
cóclea. participação na comunidade Surda. Segui este estilo
ao longo do texto.
perda auditiva neurossensorial perda auditiva causada
por danos às células receptoras da cóclea ou aos nervos
auditivos; também chamada de surdez nervosa.
Os defensores da cultura Surda às vezes chegam a afirma:
que a surdez tanto poderia ser considerada “aprimoramento
implante coclear um dispositivo para converter sons da visão” como “prejuízo da audição”. Pessoas que perdera,
em sinais elétricos e estimular o nervo auditivo por um canal de sensação de fato parecem compensá-lo corr.
intermédio de eletrodos introduzidos na cóclea.
um pequeno aprimoramento das outras capacidades senso
. Defensores da cultura Surda preferem escrever riais (Backman e Dixon, 1992; Levy e Langer, 1992). Algun;
“Surdo” com letra maiúscula quando se referem a exemplos:
• Músicos cegos (pense em Stevie Wonder) têm mais cial para o desenvolvimento. Ratos filhotes privados do con
propensão a desenvolver ouvido absoluto do que aqueles tato materno produzem menos hormônio de crescimento e
que veem (Hamilton, 20 0 0 ). apresentam taxa metabólica mais baixa - uma boa maneira
• Com um ouvido tampado, cegos também são capazes de de se manter vivo até o retorno da mãe, porém uma reação
localizar uma fonte de som com mais precisão do que que interrompe o crescimento se prolongada. Macacos jovens
pessoas que enxergam (Gougoux et al., 2005; Lessard et que possam ver, ouvir e cheirar mas não tocar a mãe entram
al., 1998). em desespero; aqueles que são separados por uma tela com
• Feche os olhos e indique com as mãos a largura de uma orifícios que permitem o toque ficam muito menos infelizes.
embalagem de uma dúzia de ovos. Indivíduos cegos, Como observamos no Capítulo 4, bebês humanos prematu
segundo pesquisadores da Universidade de Otago, ros ganham peso mais rápido e vão para casa mais cedo se
podem fazer isso com mais precisão do que pessoas que forem estimulados por massagem com as mãos. Como aman
enxergam (Smith et al., 2005). tes, ansiamos por tocar - beijar, acariciar, aconchegar-nos. E
• Pessoas surdas desde o nascimento demonstram maior mesmo estranhos, tocando-se apenas nos antebraços e sepa
atenção à visão periférica (Bavelier et al., 20 0 6 ). Seu rados por uma cortina, podem comunicar raiva, medo, des
córtex auditivo, ávido por estímulos sensoriais, gosto, amor, gratidão e simpatia em níveis bem acima das
permanece em grande parte intacto, mas torna-se expectativas (Hertenstein et al., 2006).
responsivo ao toque e a estímulos visuais (Emmorey et O humorista Dave Barry pode estar certo ao brincar que
al., 2003; Finney et al., 2001; Penhune et al., 2003). nossa pele “priva as pessoas de ver o interior do corpo, que
é repulsivo, e impede que os órgãos caiam no chão”. Porém,
Feche os olhos e imediatamente você também notará sua ela tem muitas outras utilidades. Nosso “sentido do tato” é
atenção sendo atraída para os outros sentidos. Em um expe na verdade uma mistura de sentidos distintos, com diferen
rimento, participantes que haviam passado 90 minutos sen tes tipos de terminações nervosas dentro da pele. Tocá-la em
tados calmamente com os olhos vendados tornaram-se mais vários pontos com cabelos macios, um fio aquecido ou frio
precisos na localização de sons (Lewald, 20 0 7 ). Ao se beijar, e a ponta de um alfinete revela que alguns locais são espe
um casal minimiza a distração e aumenta a sensibilidade ao cialmente sensíveis à pressão, outros à tepidez, outros ao frio
toque fechando os olhos.
e outros ainda à dor.
Surpreendentemente, não há uma relação simples entre o
ANTES DE PROSSEGUIR... que sentimos em um determinado ponto e o tipo de termina
ção nervosa especializada encontrada nele. Apenas a pressão
>- P ergunte a Si M esmo
tem receptores identificáveis. Outras sensações na pele são
variações das quatro básicas (pressão, tepidez, frio e dor):
Se você ouve, imagine se tivesse nascido surdo. Você acha que
iria querer receber um implante coclear? Você se surpreende • Afagar pontos de pressão adjacentes causa cócegas.
• Afagar suave e repetidamente um ponto de dor gera uma
com o fato de a maioria dos adultos que foram surdos durante
sensação de coceira.
a vida toda não desejar implantes para si ou para seus filhos?
• Tocar pontos de frio e de pressão adjacentes desencadeia
uma sensação de umidade, que você pode experimentar
> Teste a Si Mesmo 3
tocando um metal seco e frio.
Quais são os passos básicos na transformação de ondas • Estimular pontos de frio e de calor próximos produz
sonoras em sons percebidos? sensação de calor (FIGURA 6 .1 8 ).
A s respostas às Questões “Teste a Si Mesmo” podem ser encontradas no
Apêndice B, no final do livro.
C om preendendo a Dor
Nossas experiências de dor variam amplamente, dependendo
de nossa fisiologia, de nossas experiências e nossa atenção e
da cultura que nos rodeia (Gatchel et al., 20 0 7 ). Assim, nos
sas dores combinam sensações bottom-up (de baixo para cima)
e processos top-down (de cima para baixo).
Influências Biológicas O sistema da dor, diferentemente
da visão, não está localizado em um simples tubo neural que
sai de um dispositivo sensitivo até uma área definível no cére Jogando com a dor Em um jogo das finais da NBA em 2008, Paul
bro. Ademais, não há um tipo específico de estímulo que Pierce, astro do Boston Celtics, gritou de dor após um oponente pisar
desencadeia a dor (como a luz desencadeia a visão). Em vez em seu pé direito, fazendo seu joelho se torcer e se deslocar. Depois
de ser retirado da quadra, ele voltou e continuou a jogar apesar da
disso, existem diferentes nociceptores - receptores sensoriais
dor, que reclamou sua atenção após o fim da partida.
que detectam temperaturas, pressões ou substâncias quími
cas prejudiciais (FIGURA 6 .2 0)
>• FIG U R A 6 .2 0
O circuito da dor Receptores sensoriais
(nociceptores) respondem a estímulos
potencialmente danosos enviando um impulso à
medula espinhal, a qual passa a mensagem para
o cérebro, que interpreta o sinal como dor.
tar a dor crônica é estimular (por massagem, estimulação ponto a ser lembrado: sentimos, vemos, ouvimos, saboreamos
elétrica ou acupuntura) a atividade de “fechamento do por e cheiramos com o cérebro, que pode assimilar sensações mesmo
tão” nas fibras neurais maiores (Wall, 20 0 0 ). Esfregar a área sem os sentidos funcionarem.
em volta de um dedo do pé machucado gera uma estimula
ção competidora que bloqueia algumas mensagens de dor. Influências Psicológicas Os efeitos psicológicos da dis
tração ficam claros nos casos de atletas que, focados na vitó
te o ria d o p o rtã o de c o n tro le da d o r ( “ Gate-control ria, continuam jogando apesar da dor. Carrie Armei e Vilaya-
theory ” ) a te o ria de que a m edula esp in hal co n té m um nur Ramachandran (2003) ilustraram de maneira perspicaz
“ p o rtã o ” n e u ro ló g ic o que b lo q u e ia sinais de d o r ou as influências psicológicas sobre a dor com outra versão da
p e rm ite que eles sigam até o cére bro . O “ p o rtã o ” é
ilusão da mão de borracha. Eles curvaram levemente para
a b e rto pela a tiv id a d e de sinais de d o r que são
tra n s m itid o s através de pequenas fib ra s nervosas e trás um dedo nas mãos ocultas de 16 voluntários, ao mesmo
fe c h a d o pela a tiv id a d e de fib ra s m aiores ou pela tempo “machucando” (curvando acentuadamente) um dedo
in fo rm a çã o vin d a d o cérebro. em uma mão falsa de borracha. Os voluntários sentiram
como se seu dedo verdadeiro estivesse sendo internamente
No entanto, a dor não é meramente um fenômeno físico curvado e responderam com elevada transpiração cutânea.
de nervos lesionados que enviam impulsos para o cérebro - Parecemos também editar nossas memórias da dor, que
como puxar uma corda para tocar um sino. Melzack e Wall muitas vezes diferem da dor que de fato experimentamos. Em
observaram que as mensagens transmitidas do cérebro para a experimentos, e após procedimentos médicos, foi demons
medula espinhal também podem fechar o portão, ajudando a trado que as pessoas não prestam atenção à duração de uma
explicar algumas impressionantes influências sobre a dor. dor. Sua rápida memória, em contrapartida, registra dois fato
Quando estamos distraídos dela (uma influência psicológica) res: primeiro, as pessoas tendem a registrar o momento do
e anestesiados pela liberação de endorfinas, nossos analgésicos pico da dor, o que pode levá-las a lembrar de uma dor variá
naturais (uma influência biológica), a experiência da dor pode vel, com picos, como sendo pior (Stone et al., 2005). Segundo,
ser bastante reduzida. Lesões em atletas podem passar desper elas registram quanta dor sentiram no final, como o pesqui
cebidas até a chuveirada pós-jogo. Pessoas que carregam um sador Daniel Kahneman e seus colaboradores (1993) desco
gene que alavanca a disponibilidade de endorfinas são menos briram ao pedir a pessoas que imergissem uma das mãos em
incomodadas pela dor, e seu cérebro responde menos a ela água dolorosamente gelada por 60 segundos e depois a outra
(Zubieta et al., 2003). Outras, que carregam um gene mutante mão na mesma água pelo mesmo tempo, seguido por mais
que interrompe a neurotransmissão do circuito da dor, podem 30 segundos ligeiramente menos dolorosos. Qual dessas expe
ser incapazes de experimentá-la (Cox et al., 2006). Tais des riências você esperaria recordar como mais dolorosa?
cobertas podem apontar o caminho para novos medicamentos Curiosamente, ao ser-lhes perguntado qual teste preferi
analgésicos que mimetizem esses efeitos genéticos. riam repetir, a maioria escolheu o mais longo, com mais dor
O cérebro também pode criar dor, como ocorre em expe no total - porém menos dor no final. Um médico utilizou
riências de sensações de membros fantasma, ao interpretar equi- esse princípio com pacientes submetidos a exames de cólon
vocadamente a atividade espontânea do sistema nervoso cen - prolongando o desconforto por um minuto, mas dimi
tral que ocorre na ausência de entrada normal de informa nuindo sua intensidade (Kahneman, 1999). Embora o des
ções sensoriais. Assim como quem sonha pode ver de olhos conforto mais brando estendido se somasse a sua experiência
fechados, cerca de 7 em cada 10 pessoas com membros ampu total de dor, os pacientes que passaram por esse tratamento
tados podem sentir dor ou movimento em membros inexis redutor recordaram mais tarde o exame como menos dolo
tentes, conforme observa o psicólogo Melzack (1992, 2005). roso que aqueles cuja dor foi interrompida abruptamente.
(Um amputado também pode tentar sair da cama com a
perna fantasma ou levantar a xícara com uma mão fantasma.) Influências Socioculturais A percepção da dor também
Mesmo quem nasce sem um membro às vezes tem sensações varia de acordo com a situação social e as tradições culturais.
do braço ou da perna ausente. O cérebro, resume Melzack Tendemos a perceber mais dor quando os outros também
(1998), vem preparado para prever “que receberá informa parecem experimentá-la (Symbaluk et al., 1997). Isso pode
ções de um corpo que possui membros”. ajudar a explicar outros aparentes aspectos sociais da dor.
como quando grupos de digitadores australianos sofreram
graves surtos de dor em meados da década de 1980 devido
ao trabalho repetitivo - sem nenhuma anormalidade física
observável (Gawande, 1998). Às vezes, a dor de uma entorse
"A dor é aumentada pela atenção que lhe damos.” está, acima de tudo, no cérebro - literalmente. Ao sentirmos
Charles Darwin, A E x p ressão d a s E m oções empatia pela dor alheia, nossa própria atividade cerebral pode.
no Homem e n o s A nim ais, 1072 em parte, espelhar que o cérebro do outro está em dor (Sin
ger et al., 2004).
Dessa forma, nossa percepção da dor é um fenômeno biop
sicossocial (FIGURA 6 .2 1 ). Vê-la dessa forma pode nos aju
Um fenômeno semelhante ocorre com outros sentidos. dar a entender melhor como lidar com a dor e tratá-la.
Pessoas com perda auditiva frequentemente experimentam
o som do silêncio: sons fantasma - uma sensação de cam
painha nos ouvidos conhecida como zumbido ou tinido. Aque C ontrolando a Dor
las que perdem a visão por glaucoma, catarata, diabetes ou Se a dor está onde o corpo encontra a mente - se é um fenô
degeneração da mácula podem experimentar visões fantasma meno tanto físico como psicológico -, então deveria ser tra-
- alucinações não ameaçadoras (Ramachandran e Blakeslee, tável tanto física como psicologicamente. Dependendo do
1998). Alguns indivíduos que sofrem danos neurais sentem tipo de sintomas, clínicos do controle da dor selecionam uma
sabores fantasma, como uma água gelada que parece enjoa- ou mais terapias de uma lista que inclui medicamentos, cirur
tivamente doce (Goode, 1999). Outros relatam odores fan gias, acupuntura, estimulação elétrica, massagem, exercícios
tasma, como o de um alimento estragado que não existe. O hipnose, relaxamento e distração do pensamento.
Influências biológicas: Influências psicológicas:
• atividade nas fibras grandes e pequenas da • atenção à dor
medula espinhal • aprendizado baseado na
• diferenças genéticas na produção de endorfina experiência
• a interpretação cerebral da atividade do SNC • expectativas
\
Influências socioculturais:
• presença de outros
• empatia pela dor dos outros
• expectativas culturais
Experiência
pessoal da
dor
> F IG U R A 6.21
Enfoque biopsicossocial da dor Nossa experiência
de dor vai muito além de mensagens neurais enviadas
ao cérebro.
Mesmo um placebo pode ser útil, por diminuir a atenção e o outro (Kaptchuk et al., 20 0 6 ). Pessoas com dor persistente
as respostas do cérebro a experiências dolorosas - mimetizando no braço (2 7 0 ) receberam uma simulação de acupuntura
drogas analgésicas (Wager, 2005). Após receberem uma inje (com agulhas de mentira que se retraíam sem penetrar na
ção de uma pungente solução de água salgada no maxilar, pele) ou comprimidos azuis de amido de milho parecidos
homens que participaram de um experimento receberam um com os frequentemente receitados para lesões por esforço.
placebo que supostamente aliviaria a dor. De imediato eles se Um quarto daqueles que receberam as agulhadas inexistentes
sentiram melhor, um resultado associado à atividade em uma e 31% dos que receberam os comprimidos reclamaram de
área cerebral que libera opioides analgésicos naturais (Scott et efeitos colaterais, como dor na pele ou boca seca e fadiga.
al., 2007; Zubieta et al., 2005). Os falsos fármacos analgési Após dois meses, ambos os grupos acusavam menos dor, com
cos levaram o cérebro a dispensar os fármacos verdadeiros. “A o da acupuntura falsa relatando a maior queda.
crença torna-se realidade”, observou um comentador (Therns- Distrair pessoas com imagens prazerosas ( “Pense em um
trom, 2006), pois “a mente se une ao corpo”. ambiente ameno e confortável”) ou atrair sua atenção para
Outro experimento pôs dois placebos - comprimidos fal longe do estímulo doloroso ( “Conte de trás para a frente de
sos e um procedimento simulado de acupuntura - um contra 3 em 3 ”) é uma maneira especialmente eficaz de aumentar
a tolerância à dor (Fernandez e Turk, 1989; McCaul e Malott,
1984). Uma enfermeira bem treinada pode distrair pacientes
que tenham aversão a agulhas conversando com eles e
pedindo-lhes que olhem para longe enquanto aplica a inje
ção. Para vítimas de queimaduras que recebem tratamentos
excruciantes contra os ferimentos, uma distração ainda mais
eficaz vem da imersão em um mundo em 3-D gerado por
computador, como o cenário de neve mostrado na FIGURA
6 .2 2 . Imagens de RM funcional (RMf) revelam que brincar
na realidade virtual reduz a atividade cerebral relacionada à
dor (Hoffman, 2004). Como a dor está no cérebro, desviar
a atenção deste pode trazer alívio.
Paladar
umami, mais reconhecido como o realçador de sabor gluta Se um jato de água for bombeado sobre sua língua, bastará a
mato monossódico. adição de um concentrado salgado ou doce por um décimo
O paladar tem mais propósitos do que nosso simples pra de segundo para atrair sua atenção (Kelling e Halpern, 1983).
zer (veja a TA B E LA 6 .2 ) . Sabores prazerosos atraíam nossos Quando um amigo lhe pedir “só uma provinha” de seu refri
ancestrais para alimentos ricos em energia ou proteína, que gerante, você pode tirar dele o canudo após uma mera fração
permitiram a sobrevivência deles. Gostos aversivos m anti de segundo.
nham-nos distantes de alimentos novos que podiam ser tóxi Receptores gustativos reproduzem-se a cada uma ou duas
cos. Vemos a herança dessa sabedoria biológica nas crianças semanas; por isso, se você queimar a língua com comida
de 2 a 6 anos de hoje em dia, tipicamente implicantes com quente, não é grave. No entanto, à medida que envelhece
comida, em especial quando lhes oferecem um novo tipo de mos, o número de papilas gustativas diminui, bem como a
carne ou verduras de gosto amargo, como espinafre e couve- sensibilidade do paladar (Cowart, 1981). (Não é de admirar
de-bruxelas (Cooke et al., 2 0 0 3 ). As toxinas das carnes e das que adultos apreciem alimentos de sabor forte, aos quais as
plantas tinham um perigoso potencial de intoxicação alimen crianças resistem.) O fumo e o consumo de álcool aceleram
tar para nossos antepassados, principalmente para as crian esse declínio. Pessoas que perdem o paladar afirmam que a
ças. Estas, porém, ao receberem repetidas vezes pequenas comida adquire gosto de “palha” e se torna difícil de ingerir
quantidades de alimentos de que não gostam, em geral come (Cowart, 2005).
çam a aceitá-los (Wardle et al., 2003). Por mais que as papilas gustativas sejam essenciais, o pala
O paladar é um sentido químico. Dentro de cada pequena dar envolve mais do que tange à língua. Como ocorre com
saliência na parte de cima e nos lados da língua encontram- outros sentidos, nossas expectativas influenciam a resposta
se pelo menos 200 papilas gustativas, cada uma contendo do cérebro. Quando somos prevenidos de que um sabor desa
um poro que capta as substâncias químicas da comida. Em gradável está por vir, o cérebro responde de modo mais ativo
cada um desses poros, de 50 a 100 células receptoras gusta a sabores negativos, que são classificados como muito desa
tivas projetam cílios em forma de antena que apreendem as gradáveis. Quando levados a crer que o mesmo sabor será ape
moléculas do alimento. Alguns receptores respondem prin nas ligeiramente desagradável, a região cerebral que responde
cipalmente às moléculas doces, outros às salgadas, às azedas, a gostos repulsivos torna-se menos ativa, e o classificamos
às umami ou às amargas. Não é preciso muito para desenca como menos desagradável (Nitschke et al., 2006). Da mesma
dear uma resposta que ative o lobo temporal de seu cérebro. forma, ser informado de que um vinho custa 90 dólares, em
vez de seu preço real de 10 dólares, faz uma bebida barata
parecer mais saborosa e desencadeia mais atividade em uma
área cerebral que responde a experiências prazerosas (Plass-
TABELA 6.? mann et al., 2008). Como acontece com o efeito do placebo
em relação à dor, os lobos frontais pensantes oferecem infor
hs F u n çõ es de S o br ev iv ên cia dos S a b o r es B á sic o s mações sobre as quais outras regiões do cérebro vão agir.
Sabor Indica
Interação Sensorial
Doce Fonte de energia O paladar também ilustra outro fenômeno curioso. Tampe
o nariz, feche os olhos e peça que alguém lhe dê vários ali
Salgado Sódio essencial aos processos fisiológicos mentos. Uma fatia de maçã pode ser indistinguível de um
pedaço de batata crua, uma porção de bife pode ter gosto de
Azedo Ácido potencialmente tóxico
papelão; sem seus odores, pode ser difícil diferenciar uma
Amargo Potencialmente venenoso xícara de café frio de uma taça de vinho tinto. Para saborear
algo, normalmente sentimos o aroma pelo nariz - é por isso
Umami Proteínas para o crescimento e a reparação de que comer não tem muita graça quando se está com um res
tecidos friado forte. O cheiro pode também alterar nossa percepção
do sabor: o odor de morango de uma bebida aumenta nossa
percepção de sua doçura. E a in teração sensorial em ação
Olfato
Nervo olfatõrio
3 . Os sinais são
Bulbo olfatório transportados por meio dos
axônios que convergem
Células
receptoras na
membrana
olfativa
>t
i . Células receptoras
olfativas são ativadas e
enviam sinais elétricos
1 . Moléculas
odoríficas ligam-se
aos receptores
Receptor
para odor
* .* r
Ar carregado de moléculas odoríficas
> FIG U R A 6 .2 4
O sentido do olfato Para você sentir o cheiro de uma flor, moléculas de sua fragrância transportadas pelo ar devem alcançar receptores
localizados no topo do nariz. A inalação leva o ar a esses receptores, realçando o aroma. As células receptoras enviam mensagens para o bulbo
olfatório do cérebro e em seguida para o córtex olfativo primário, no lobo temporal, e para as partes do sistema límbico relacionadas à memória e
às emoções.
Mulheres
> F IG U R A 6 .2 5
Idade, sexo e sentido do olfato Entre
1,2 milhão de participantes de uma
pesquisa do tipo "raspe e cheire" realizada Homens
pela National Ceographic, as mulheres e
os jovens adultos foram os mais bem-
sucedidos na identificação de seis
amostras de odores (fonte: Wysocki e
Gilbert, 1989). Fumantes e pessoas que
sofrem de Alzheimer, Parkinson ou
dependência alcoólica tipicamente
70-79 80-89 90-99
apresentam um sentido olfativo diminuído
(Doty, 2001). Faixa etária
primitivos e com certeza mais difíceis de descrever e de recor tido para se comunicar e se guiar. Muito antes de o tubarão
dar (Richardson e Zucco, 1989; Zucco, 2003). visualizar sua presa, ou a mariposa seu parceiro, os odores
Como qualquer cão ou gato com um bom faro poderia nos lhes informam 0 caminho a seguir. Salmões migratórios
dizer, cada um de nós tem sua própria assinatura química seguem tênues pistas olfativas que os levam de volta ao seu
identificável. (Uma exceção digna de nota: um cão seguirá o córrego de origem. Se expostos em um criatório a uma de
rastro de um gêmeo idêntico como se o rastro tivesse sido duas substâncias odoríficas, eles irão, ao retornarem dois anos
deixado pelo outro [Thomas, 1974].) Animais que têm muito depois, buscar o córrego próximo ao local em que foram sol
mais receptores olfativos do que nós também usam esse sen- tos que tiver o odor familiar (Barinaga, 1999).
“□ cheiro e o sabor das coisas carregam , firm em ente, em
"Poderia haver um a pilha de pneus de cam inhão
um a m inúscu la e quase im palpável gota de sua essência,
queim ando n a sa la e eu não n ecessariam en te sen tiria o
a v a sta estru tu ra das recordações.”
cheiro. Em contrapartida, m inha m ulher pode detectar
Mareei Prciust, rom ancista francês, no livro Em B u sca do
um a sim ples uva podre a duas ca sa s de d istân cia.”
Tempo P erdido [1913], descrevendo como o aroma e o sabor
Dave Barry, ZDD5 de um pedaço de bolo embebido em chá ressuscitaram
lembranças há muito esquecidas da velha casa da família.
Figura e Fundo
Para começar, o sistema precisaria reconhecer as faces como r \ r \ r
distintas do fundo. Da mesma forma, nossa primeira tarefa j \ J K J
perceptiva é identificar qualquer objeto (a figura) como dis
tinto de seus arredores (o fundo). Entre as vozes que você Continuidade Conectividade
ouve em uma festa, aquela a que você presta atenção torna-
se a figura; todas as outras, parte do fiando. Enquanto você > FIG U R A 6 .2 9
lê, as palavras são a figura; o papel branco, o fundo. Na Organizando estímulos em grupos Poderíamos perceber os
estímulos mostrados aqui de muitas maneiras, embora pessoas em
FIGURA 6 .2 8 , a relação figura-fundo inverte-se continua qualquer lugar os vejam de forma semelhante. Os psicólogos da
mente - mas sempre organizamos o estímulo em uma figura Gestalt creem que isso mostra que o cérebro segue regras para
vista contra um fundo. Essas ilustrações de figura e fundo ordenar as informações sensoriais em um todo.
C onectividade Por serem uniformes e ligados, percebemos cada percepção de profundidade, ver objetos em três dimensões,
conjunto de dois pontos e a linha entre eles como uma uni habilita-nos a estimar a distância entre eles e nós. Estimamos
dade. imediatamente a distância de um carro vindo em nossa dire
ção ou a altura de uma casa. Essa habilidade é em parte inata.
Eleanor Gibson e Richard Walk (1 9 6 0 ) descobriram isso
usando a miniatura de um abismo com o declive coberto por
vidro grosso. A inspiração de Gibson para esses experimentos
ocorreu enquanto ela fazia um piquenique à beira do Grand
Canyon. Ficou curiosa: será que uma criança pequena, pro
curando algo próximo à borda, perceberia o perigoso declive
e recuaria?
J De volta a seu laboratório na Universidade Cornell, Gib
son e Walk puseram crianças de 6 a 14 meses de idade na
1
beira de um cânion seguro - um abismo visual. Quando as
mães encorajaram as crianças a engatinhar em direção ao
F ech am en to (ou closu ra) Preenchemos lacunas para criar um tampo de vidro, a maioria se recusou, indicando que eram
objeto completo, inteiro. Assim, presumimos que os círculos capazes de perceber a profundidade. Crianças em idade de
(acima à esquerda) são completos, mas parcialmente bloqueados engatinhar chegam ao laboratório após um grande período
pelo triângulo (ilusório). Adicione nada mais que pequenos seg de aprendizado. Ainda assim, animais recém-nascidos prati
mentos de linha que fechem os círculos (acima à direita), e o
camente sem experiência visual - incluindo jovens gatinhos,
cérebro deixa de construir um triângulo.
um cabrito com um dia de vida e pintinhos recém-saídos do
Tais princípios geralmente auxiliam nossa construção da ovo - respondem de modo semelhante. Para Gibson e Walk,
realidade. Algumas vezes, porém, desviam nossa atenção, isso sugeria que animais recém-nascidos e que podem se movi
como ao olharmos para a casinha de cachorro na FIGURA mentar já estão preparados para perceber a profundidade.
6 .3 0 . Cada espécie, na época em que ganha mobilidade, tem as
habilidades perceptivas de que necessita. Porém, se o ama
F igu ra e fu n d o a o rg a n iza çã o d o ca m p o visual em durecimento biológico predispõe nossa cautela quanto a altu
o b je to s (as figuras) que se de stacam de seus a rre do res
ras, a experiência a amplifica. A cautela dos bebês aumenta
(o fundo).
com a experiência de engatinhar, não importa em que idade
a g ru p a m e n to a te n d ê n cia p e rce p tiva a o rg a n iza r eles comecem (Campos et al., 1992). E, a julgar pelo que
estím ulo s em g ru p o s coerentes. conseguem alcançar, crianças de 7 meses usam a sombra de
um brinquedo para avaliar sua distância, ao passo que as de
5 meses não o fazem (Yonas e Granrud, 2006). Isso sugere
Percepção de Profundidade que em bebês humanos a percepção de profundidade cresce
com a idade.
Como fazemos isso? Como transformamos duas imagens
18: Como vemos o mundo em três dimensões? retinianas bidimensionais distintas em uma única percepção
tridimensional? O processo tem início com indicadores de
A partir das imagens bidimensionais que chegam à retina, de
profundidade, alguns dependentes do uso dos dois olhos,
alguma forma organizamos percepções tridimensionais. A
outros disponíveis para cada olho separadamente.
p e rc e p ç ã o de p ro fu n d id a d e a c a p a cid a d e de ver
o b je to s em trê s dim ensões em b ora as im agens que
chegam à retin a sejam bid im e n sio n a is; p e rm ite -n o s
ju lg a r a distâ ncia.
in d ic a d o re s b in o c u la re s in d ic a d o re s de p ro fu n d id a d e ,
co m o a d is p a rid a d e retin ia na, que de p e n d e m d o uso
dos d o is olhos.
in d ic a d o re s m o n o cu la re s in d ica d o re s de
p ro fu n d id a d e , c o m o in te rp o s iç ã o e p e rs p e c tiv a linear,
d isp o n íve is para cada oiho.
> FIG UR A 6 .3 0
Princípios de agrupamento Qual é o segredo desta casinha de Indicadores Binoculares
cachorro impossível? Você provavelmente a percebe como uma Tente isto: com os dois olhos abertos, segure duas canetas ou
gestalt - uma estrutura completa (apesar de impossível). Na verdade,
seu cérebro impõe esse senso de completude à imagem. Como
lápis a sua frente e encoste a ponta de um na do outro. Agora
mostra a Figura 6.34, os princípios de agrupamento da Gestalt, como faça o mesmo com um olho fechado. Com um olho, a tarefa
o fechamento e a continuidade, estão funcionando aqui. torna-se nitidamente mais difícil, o que demonstra a impor
>• FIG U R A 6.31
A salsicha de dedos flutuante Ponha os dois
dedos indicadores a cerca de 10 cm de distância
dos olhos, com as extremidades a pouco mais de
1 cm uma da outra. Agora olhe para além deles e
note o estranho resultado. Afaste-os, e a
disparidade retiniana - e a salsicha de dedos -
encolherá.
tância dos indicadores binoculares para o julgamento da imagem da câmera esquerda e o olho direito ver a imagem
distância entre objetos próximos. Dois olhos é melhor que da câmera direita, o efeito 3-D imita ou exagera a disparidade
um. retiniana normal. De forma semelhante, câmeras gêmeas em
Como nossos olhos estão a cerca de 6 cm de distância um aviões podem fotografar o relevo para integração em mapas
do outro, as retinas recebem imagens ligeiramente diferentes tridimensionais.
do mundo. Quando o cérebro compara ambas as imagens, a
diferença entre elas - sua disparidade retin ian a - fornece
um importante indicador binocular da distância relativa entre Indicadores Monoculares
objetos diferentes. Quando se põem os dedos diretamente à Como julgamos se uma pessoa está a 10 ou a 100 metros de
frente do nariz, as retinas recebem visões bastante distintas. distância? Em ambos os casos, a disparidade retiniana, ao
(Você pode constatar isso se fechar um olho e depois o outro, olharmos para a frente, é pequena. A essas distâncias, depen
ou se criar uma “salsicha” com os dedos como na FIGURA demos de indicadores m onoculares (disponíveis para cada
6 .3 1 .) A uma distância maior - digamos, quando os dedos olho separadamente). Esses indicadores também influenciam
ficam à distância de um braço a disparidade é menor. nossas percepcões cotidianas. O Gateway Arch de St. Louis
Os criadores dos filmes em três dimensões (3-D ) simulam (FIGURA 6 .3 2 ) - a maior ilusão do mundo construída pelo
ou exageram a disparidade retiniana fotografando uma cena homem - é mais alto do que largo? Ou mais largo do que
com duas câmeras posicionadas a poucos centímetros de dis alto? Para a maioria das pessoas, ele parece mais alto. Na
tância uma da outra (uma característica que podemos querer verdade, a altura e a largura são iguais. A altura relativa pos
incluir em nosso computador visual). Quando assistimos ao sivelmente contribui para essa inexplicável ilusão horizontal-
filme usando óculos que permitem ao olho esquerdo ver a vertical - o fato de percebermos dimensões verticais como
maiores que dimensões horizontais idênticas. Não é de se
admirar que as pessoas (mesmo barmen experientes) botem
menos suco quando recebem um copo alto e estreito do que
ao receberem um copo baixo e largo (Wansink e van Ittersum,
2003, 2005).
Outro indicador monocular de profundidade, o efeito de
luz e sombra, pode ter contribuído para inúmeros acidentes
quando os degraus do novo ginásio de nossa faculdade foram
impropriamente pintados de preto nas extremidades (fazendo-
as parecer mais distantes) e de prateado na superfície plana
abaixo (fazendo-as parecer mais próximas). O aparente resul
tado foi a percepção equivocada de que não havia degraus
abaixo e (para alguns) entorses nos tornozelos e nas costas.
A FIGURA 6 .3 3 ilustra a altura relativa, o efeito de luz e
sombra e outros indicadores monoculares.
Percepção de Movimento
I V l ' M JU J*
>- FIG U R A 6.32 Imagine que você fosse capaz de perceber o mundo como
O Gateway Arch de S t Louis O que é maior: sua altura ou largura? dotado de cor, forma e profundidade, mas que não pudesse
Mí.o ttnho |>eM!.e.fsçã.o i t f>t-oÇuriAiA<vAt.
Há um -V 'pxxrtxà.o ¥VX ou
tem unr\«K 'bc.ssov^Wc^ rso <L<xbeJo?
p
' t t l :
II
\ v ^ ijfl
^ V \
\ \ V
Movimento relativo À
medida que nos movemos,
objetos na realidade estáveis
podem parecer se mover. Se
enquanto estiver em um
ônibus você fixar o olhar em
algum objeto - digamos,
uma casa - os elementos
além do ponto de fixação
parecerão mover-se com
você, e os que estão à frente
dele parecerão ir para trás.
Quanto mais longe esses
objetos estiverem do ponto
Perspectiva linear Linhas paralelas, tais como trilhos de fixação, mais rápido
ferroviários, parecem convergir a distância. Quanto mais parecerão mover-se.
Direção do movimento da passageira
convergem, maior sua distância percebida.
> FIG U R A 6 .3 4
A solução Outra visão da casinha de cachorro impossível da Figura por mudanças de forma, tamanho, brilho ou cor - uma habi
6.30 revela os segredos dessa ilusão. Do ângulo da foto naquela lidade a que chamamos constância perceptiva. Indepen
figura, o princípio do fechamento leva-nos a perceber as bordas como
se fossem contínuas. dentemente do ângulo de visão, da distância ou da ilumina
ção, esse processo de cima para baixo (top-down) permite-nos
identificar pessoas e objetos em menos tempo do que leva
mos para respirar. Esse recurso perceptivo humano, que há
O cérebro também perceberá o movimento contínuo em décadas deixa pesquisadores intrigados, impõe um desafio
uma rápida série de imagens sutilmente variáveis (um fenô monumental ao nosso computador perceptivo.
meno chamado movimento estroboscópico). Como bem sabem
os artistas de animação, pode-se criar essa ilusão projetando-
se 24 imagens estáticas por segundo. O movimento que vemos Constâncias de Forma e Tamanho
então em populares filmes de aventura e ação não está na Às vezes, um objeto cuja forma real não pode mudar parece
tela, que apresenta simplesmente uma sucessão de imagens mudar de acordo com o ângulo de visão (FIGURA 6 .3 5 ).
de forma extremamente rápida. O movimento é construído Com mais frequência, graças à constância deform a, percebe
em nossas mentes. Propagandas luminosas criam outra ilu mos o formato de objetos familiares, como a porta na FIGURA
são de movimento utilizando o fenôm eno fi. Quando duas 6 .3 6 adiante, como constante mesmo que sua imagem em
luzes estacionárias adjacentes acendem e apagam em uma nossa retina mude.
rápida seqüência, percebemos uma única luz movendo-se Graças à constância de tam anho, percebemos os objetos
para lá e para cá entre elas. Sinais luminosos exploram o como dotados de um tamanho constante, mesmo que nossa
fenômeno fi com uma sucessão de luzes que cria a impressão distância em relação a eles varie. Presumimos que um carro
de algo como uma flecha em movimento. é grande o bastante para transportar pessoas, mesmo quando
Todas essas ilusões reforçam uma lição fundamental: a vemos sua minúscula imagem a dois quarteirões de distân
percepção não é uma mera projeção do mundo sobre o cére cia. Isso ilustra a estreita conexão entre a distância e o tam a
bro. Em vez disso, as sensações são desmembradas em por nho percebidos. Perceber a distância de um objeto fornece-
ções de informação que o cérebro então reúne, segundo seu nos indicações de seu tamanho. Da mesma forma, saber seu
próprio modelo funcional do mundo externo. Nosso cérebro tamanho geral - que se trata de um carro - nos dá indicações
constrói nossas percepções. de sua distância.
É impressionante como a percepção do tamanho ocorre
fenômeno fi uma ilusão de movimento criada quando
duas ou mais luzes adjacentes acendem e apagam em
sem grande esforço. Ao serem fornecidos a distância perce
uma rápida seqüência. bida de um objeto e o tamanho de sua imagem em nossas
retinas, inferim os in stan tânea e in con scien tem ente o
constância perceptiva perceber objetos como
inalterados (tendo constância de formas, tamanho,
claridade e cor) mesmo quando a iluminação e as
imagens retinianas mudam.
Constância Perceptiva
tamanho desse objeto. Embora os monstros na FIGURA indicadores de distância - olhando para a Lua no horizonte
6 .3 7 a gerem as mesmas imagens na retina, a perspectiva (ou para cada monstro, ou ainda para cada tarja) através de
linear informa ao cérebro que aquele que está perseguindo o um tubo de papel - e o objeto imediatamente encolherá.
outro está mais longe. Consequentemente, o percebemos As relações entre tamanho e distância também explicam
como maior. por que na FIGURA 6 .3 8 as duas garotas da mesma idade
parecem tão diferentes em tamanho. Como o diagrama revela,
constância de cor perceber a cor de um objeto elas têm na verdade aproximadamente o mesmo tamanho,
familiar como constante, mesmo que a mudança da
iluminação altere os comprimentos de onda refletidos mas a sala está distorcida. Se a sala for vista com um olho
por ele. através de um orifício, suas paredes trapezoidais produzirão
as mesmas imagens que as de uma sala retangular normal
Essa interação entre tamanho percebido e distância per vista com os dois olhos. Quando apresentado à visão mono-
cebida ajuda a explicar diversas ilusões bastante conhecidas. cular da câmera, o cérebro faz a suposição razoável de que a
Por exemplo, você imagina por que a Lua parece até 50% sala é normal e que cada garota está, portanto, à mesma dis
maior quando próxima do horizonte do que quando mais tância de nós. E, dados os tamanhos diferentes de suas ima
alta no céu? Durante pelo menos 22 séculos, estudiosos deba gens na retina, o cérebro acaba calculando que as meninas
teram essa questão (Hershenson, 1989). Uma razão para a são muito diferentes em tamanho.
ilusão da Lua é que indicadores de distâncias de objetos fazem Nossos eventuais equívocos revelam o funcionamento dos
com que no horizonte - como o monstro distante na FIGURA normalmente eficazes processos perceptivos. A relação per
6 .3 7 a e a tarja distante na ilusão de Ponzo na FIGURA 6 .3 7 b cebida entre distância e tamanho costuma ser válida. Porém,
- ela pareça estar mais longe, e portanto, maior que no alto sob circunstâncias especiais, pode levar-nos ao erro - como
do céu noturno (Kaufman e Kaufman, 20 0 0 ). Descarte esses ao ajudar a criar a ilusão da Lua ou a ilusão de Ames.
> FIG U R A 6 .3 8
A ilusão das garotas encolhida e aumentada A sala distorcida, projetada por Adelbert Ames, parece ter um formato retangular normal
quando vista com um olho através de um orifício. A garota no canto direito parece desproporcionalmente grande porque julgamos seu tamanho
com base na suposição falsa de que ela está à mesma distância que a menina no outro canto.
Constância de Claridade
O papel branco reflete 90% da luz que incide sobre ele; o
negro, apenas 10%. À luz do sol, um papel negro pode refle
tir 100 vezes mais luz que um papel branco visto em um
ambiente fechado, mas ainda parece negro (McBurney e
Collings, 1984). Esse fenômeno ilustra a constância de clari
dade (também chamada constância de brilho); percebemos um
objeto como dotado de claridade constante mesmo que sua
iluminação varie.
A claridade percebida depende da luminância relativa - a
quantidade de luz que um objeto reflete em relação àquilo
que o rodeia (FIGURA 6 .3 9 ) . Se você vir um papel negro
iluminado pelo sol através de um tubo estreito, de modo que
nada mais fique visível, ele pode parecer cinza, pois sob o bri > FIG U R A 6 .3 9
lho do sol ele reflete uma grande quantidade de luz. Olhe-o Luminância relativa Os quadrados A e B são idênticos em cor,
sem o tubo e ele voltará a ser negro, porque reflete muito acredite ou não. (Se não acreditar, tire uma cópia da ilustração, corte
menos luz que os objetos à sua volta. os quadrados e compare.) No entanto, percebemos o quadrado B
como mais claro, graças ao contexto adjacente.
Constância de Cor
À medida que a luz muda, uma maçã vermelha em uma tigela muda (como está drasticamente evidenciado na FIGURA
de frutas permanece vermelha. Isso acontece porque nossa 6 .4 0 ) . Esse princípio - o de que percebemos objetos não de
experiência de cor depende de algo mais que a informação maneira isolada, mas em seu contexto - é importante para
de comprimentos de onda recebida pelos cones da retina. as artes, a decoração de interiores e o design de roupas. Nossa
Esse algo a mais é o contexto adjacente. Se visualizarmos ape percepção da cor de uma parede ou de uma faixa de tinta
nas uma parte da maçã vermelha, sua cor parecerá mudar sobre uma tela é determinada não apenas pela tinta na lata,
conforme a luz. Se no entanto virmos a maçã inteira como mas pelas cores adjacentes. A lição que levamos para casa: as
um item em uma tigela de frutas frescas, sua cor continuará comparações governam as percepções.
basicamente constante com a alteração da iluminação e dos
***
comprimentos de onda - um fenômeno conhecido como
c o n stân cia de cor. Dorothea Jameson (1 9 8 5 ) observou que
Percepção de forma, percepção de profundidade, percep
um objeto colorido de azul sob a luz de um ambiente fechado ção de movimento e constância perceptiva esclarecem a forma
reflete a mesma quantidade de comprimentos de onda refle como organizamos nossas experiências visuais. A organização
tidos por um objeto dourado à luz do sol. Mesmo assim, se perceptiva aplica-se também a outros sentidos. Isso explica
você puser um pássaro azulão em um ambiente fechado, ele por que percebemos o toque contínuo de um relógio não
não vai parecer um pintassilgo. Da mesma forma, uma folha como um tique-tique-tique, mas como sons agrupados, diga
verde pendendo de um galho marrom pode, quando a ilumi mos, TIQUE-tique, TIQUE-tique. Ao escutarmos uma língua
nação mudar, refletir a mesma energia luminosa que antes que não nos é familiar, temos dificuldade em discernir quando
vinha do galho. Ainda assim, para nós, a folha permanece uma palavra termina e a outra começa. Ao escutarmos nossa
esverdeada e o galho, amarronzado. Ponha óculos de esqui própria língua, automaticamente ouvimos palavras distintas.
amarelos e, após um segundo, a neve parecerá tão branca Isso também reflete a organização perceptiva. Mas vai além,
quanto antes. visto que até mesmo organizamos uma seqüência de letras
- VIVEREMOSETERNAMENTE - em palavras que formem
A o le re m a frase:
Atirei o Pré-ativado (pr/med) para ver faces O cérebro humano, um
o pau no gato detector de faces supersensível, pode encontrar "a face de Deus" em
m u ita s p e sso a s p e rc e b e m o q u e e sp e ra m , se m se uma formação nebulosa ou, como nesta foto, na concha de uma ostra.
d a r c o n ta da p a la v ra re p e tid a . Isso a c o n te c e u c o m
vo cê ?
O que determina nosso conjunto perceptivo? Por meio da de nuvens e de óvnis, todos influenciam o modo como inter
experiência, formamos conceitos, ou esquemas, que organi pretamos sensações ambíguas com processamento de cima
zam e interpretam informações não familiares (ver Capítulo para baixo (top-down).
5). Nossos esquemas preexistentes de homens saxofonistas Nossos esquemas para faces nos tornam propensos a ver
e de rostos femininos, de monstros e de troncos de árvore, padrões faciais mesmo em configurações aleatórias, como a
> F IG U R A 6 .4 3
Crer é ver O que você percebe nestas fotos? (a) Trata-se de Nessie, o monstro do Lago Ness, ou de um tronco? (b) Isto são discos voadores ou
nuvens? Muitas vezes percebemos o que esperamos ver.
66
Porcentagem de
estudantes que
reconheceram 4,2
corretamente o <,0
rosto 56
> F IG U R A 6 .4 4
Reconhecendo faces Quando mostrada rapidamente, uma caricatura de Arnold Schwarzenegger foi reconhecida com mais precisão do que ele
próprio. Idem para outros rostos masculinos familiares.
vista da Lua, nuvens, rochas ou pãezinhos de canela. Kieran • A “caixa do mágico” na FIGURA 6 .4 5 está sobre o chão
Lee, Graham Byatt e Gillian Rhodes (2 0 0 0 ) demonstraram ou pendurada no teto? O modo como o percebemos
como reconhecemos pessoas pelas características faciais que depende do contexto definido pelos coelhos.
cartunistas podem destacar. Por não mais que uma fração • Qual é a altura do jogador mais baixo na FIGURA 6 .4 6 ?
de segundo, eles mostraram a alunos da Universidade do
Oeste da Austrália três versões de rostos familiares - o ver Até ouvir uma música triste em vez de uma alegre pode
dadeiro, uma caricatura criada por computador, que acen predispor a pessoa a perceber um significado triste quando
tuava as diferenças entre esta face e uma face comum, e uma palavras com sons semelhantes são pronunciadas - lamento
“anticaricatura”, que alterava as feições mais características em vez de alento, morte em vez de sorte, dor em vez de cor
da face verdadeira. Como mostra a FIGURA 6 .4 4 , os estu (Halberstadt et al., 1995).
dantes reconheceram com mais exatidão as caricaturas do Os efeitos do conjunto perceptivo e do contexto mostram
que os rostos verdadeiros. Uma caricatura de Arnold Schwar como a experiência nos ajuda a construir a percepção. Na
zenegger é mais reconhecida como Schwarzenegger do que vida diária, por exemplo, os estereótipos de gênero (outro
ele próprio! caso de conjunto perceptivo) podem realçar a percepção. Sem
as pistas óbvias do azul ou do rosa, as pessoas ficam em dúvida
quanto a chamar o novo bebê de “ele” ou “ela”. Mas, se infor
Efeitos Contextuais madas de que seu nome é “David”, essas pessoas (especial
Um dado estímulo pode desencadear percepções radicalmente mente crianças) podem percebê-lo como maior e mais forte
diferentes, em parte devido a nossos conjuntos diferentes, mas do que se o mesmo bebê se chamasse “Diana” (Stern e Kar-
também por causa do contexto imediato. Alguns exemplos: raker, 1989). Algumas diferenças, ao que parece, existem
• Imagine ouvir um barulho interrompido pelas palavras: meramente nos olhos de quem vê.
“undo gira”. Provavelmente você perceberia a primeira
palavra como mundo. Dado “undo do poço”, você
ouviria fundo. Esse curioso fenômeno, descoberto por
Richard Warren, sugere que o cérebro pode funcionar de
trás para a frente no tempo para permitir que um “□uvimas e apreendem os apenas o que já nos é
estímulo posterior determine como percebemos um parcialm ente conhecido."
anterior. O contexto cria uma expectativa que, de cima Henry Eavid Thoreau, Diário, 1060
para baixo (de maneira top-down), influencia nossa
percepção quando comparamos nosso sinal de baixo
para cima (bottom-up) com ele (Grossberg, 1995).
• O monstro perseguidor na FIGURA 6 .3 7 a parecia Emoção e Motivação
agressivo? O idêntico perseguido parecia assustado? Se a As percepções são influenciadas, de cima para baixo (top-
resposta for sim, você experimentou um efeito down), não apenas por nossas expectativas e pelo contexto,
contextual. mas também por nossas emoções. Dennis Proffitt (2006a, b)
> FIG U R A 6 .4 5
Efeitos contextuais: a caixa do mágico A caixa no primeiro quadro à esquerda está repousando no chão ou pendurada no teto? E a caixa
localizada na extrema direita? Em cada caso, o contexto definido pelos coelhos curiosos guia nossas percepções. (Fonte: Shepard, 1990.)
w
II
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fí
*1
I;
>■ FIG UR A 6 .4 7
1
Figura ambígua de cavalo/foca Se motivadas a perceber animais
rurais, cerca de 7 a cada 10 pessoas imediatamente perceberam um
cavalo. Se motivadas a perceber um animal marinho, cerca de 7 a
cada 10 perceberam uma foca.
>- FIG U R A 6 .4 9
Desenhando produtos
O acessório para cadeiras O recipiente de medição Oxo O Bule Chatsford traz um adequados às pessoas O
dobráveis Ride On Carry On, permite ao usuário ver a coador embutido. psicólogo dos fatores humanos
“ desenhado por uma mamãe quantidade de cima. Donald Norman oferece estes e
aeromoça” , permite que uma outros exemplos de novos
pequena mala se desdobre produtos desenhados com eficácia
em um carrinho de bebê. (veja www.jnd.org).
auxílio da teoria. Se uma organização se perguntar que tipo quando bem equipado, em um alto-falante intra-auricular.
de Web design (Enfatizar o conteúdo? A velocidade? A parte Com a oferta de som conveniente, sutil e personalizado, muito
gráfica?) seria mais eficaz em atrair visitantes e incitá-los a mais pessoas optam por usar o auxílio auditivo.
voltar, o psicólogo irá querer testar as respostas a diversas Projetos que possibilitam interações seguras, fáceis e efi
alternativas. Se a Nasa (a agência espacial americana) quiser cazes entre seres humanos e tecnologia com frequência pare
saber que tipo de projeto mais facilitaria o sono, o trabalho cem óbvios após serem feitos. Por que, então, não são mais
e o ânimo em suas espaçonaves, seus psicólogos dos fatores comuns? Profissionais que desenvolvem tecnologia às vezes
humanos desejarão testar as alternativas (FIGURA 6 .5 1 ). presumem equivocadamente que os outros compartilham de
Considere, por fim, as tecnologias de auxílio auditivo dis sua expertise - o que é claro para eles terá clareza semelhante
poníveis em vários teatros, auditórios e locais de prática reli para outros (Camereretal., 1989; Nickerson, 1999). Quando
giosa. Uma delas, comum nos Estados Unidos, requer um fone batucamos na mesa para transmitir uma melodia familiar
de ouvido ligado a um receptor portátil que detecta sinais (tente isso com um am igo), costumamos esperar que o
infravermelhos ou de FM do sistema de som do recinto. As ouvinte a reconheça. Para ele, no entanto, essa é uma tarefa
pessoas bem-intencionadas que projetam, compram e insta quase impossível (Newton, 1991). Quando se sabe algo, é
lam esses sistemas entendem de forma correta que a tecno difícil simular mentalmente como seria não saber, e a isso se
logia coloca o som diretamente nos ouvidos do usuário. O chama maldição do conhecimento.
problema é que poucas pessoas com dificuldade auditiva se O ponto a ser lembrado: Designers e engenheiros devem
sujeitam ao incômodo e ao constrangimento de localizar, soli levar em consideração habilidades e comportamentos huma
citar, utilizar e retornar um espalhafatoso fone de ouvido. A nos desenhando objetos adequados às pessoas, testando suas
maioria desses aparelhos, portanto, repousa em armários. Em invenções com usuários antes de produzi-los e distribuí-los
vez disso, a Grã-Bretanha, os países escandinavos e a Austrá e estando cientes da maldição do conhecimento.
lia instalaram sistemas de indução magnética (ver hearingloop.
psicologia dos fatores humanos um ramo da
org) que transmitem sons diretamente para o aparelho audi psicologia que explora como as pessoas e as máquinas
tivo do indivíduo de forma personalizada. Um discreto toque interagem e como estas e os ambientes físicos podem
em um interruptor pode transformar um aparelho auditivo, ser construídos de maneira segura e fácil de usar.
10
Altitude
(milhares B
j Trajetória descendente
de pés) percebida pelo piloto
6
Diferença para
4 . a altitude real
Trajetória
descendente real
20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0
Distância da pista (milhas)
> FIG U R A 6 .5 0
O fator humano em acidentes Devido à falta de indicadores de distância ao se aproximarem de uma pista de pouso após sobrevoarem uma
região não iluminada, os pilotos, em uma simulação de aterrissagem noturna, tenderam a voar muito baixo. (Fonte: Kraft, 1978.)
Existem de fato pessoas - sejam quem forem - capazes de
ler mentes, de ver através de paredes ou de predizer o futuro?
Cinco universidades britânicas possuem unidades de parap
sicologia nas quais atuam profissionais com PhD do pro
grama de parapsicologia da Universidade de Edimburgo (Tur-
pin, 2005). As Universidades de Lund, na Suécia, de Utrecht,
na Holanda, e de Adelaide, na Austrália, também acrescen
taram cadeiras ou unidades de pesquisa dedicadas à matéria.
Os parapsicólogos nesses lugares realizam experimentos em
busca de PES e de outros fenômenos paranormais. Porém,
outros psicólogos e cientistas - incluindo 96% dos membros
da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos - são
céticos quanto à existência de tais fenômenos (McConnell,
1991). Se a PES for real, precisaremos derrubar o entendi
mento científico de que somos criaturas cuja mente está presa
ao cérebro físico e cujas experiências perceptivas do mundo
são feitas de sensações. Algumas vezes novas evidências real
mente derrubam nossos pressupostos científicos. A ciência,
como veremos ao longo deste livro, oferece-nos várias sur
presas - a respeito da extensão da mente inconsciente, dos
efeitos das emoções sobre a saúde, do que cura e do que não
cura e de muito mais. Antes de avaliarmos as alegações de
> F IG U R A 6.51 PES, vamos analisá-las.
Como não enlouquecer em uma viagem a Marte Futuros
astronautas enviados a Marte ficarão confinados em condições de • Haveria tam bém algumas pessoas, observa Michael
monotonia, estresse e falta de gravidade durante meses a fio. Para Shermer (1999), que não teriam necessidade de
ajudar a projetar e a avaliar um ambiente humano viável para identificador de chamadas, que nunca perderiam no
se trabalhar, como este Módulo Habitacional em Trânsito (Transhab), a “pedra, papel e tesoura” e para quem nunca
Nasa recorre a psicólogos dos fatores humanos (Weed, 2001; poderíamos dar uma festa surpresa. .
Wichman, 1992).
Alegações de PES
ANTES DE P R O S S E G U IR ... Alegações de fenômenos paranormais ( “Psi”) incluem pre
visões astrológicas, cura psíquica, comunicação com os mor
>- P ergunte a S i M esmo tos e experiências extracorpóreas. Porém, as mais verificáveis
Você se lembra de alguma vez em que suas expectativas e (para uma discussão acerca da percepção) mais relevantes
predispuseram sua maneira de perceber uma pessoa (ou um correspondem a três variedades de PES:
grupo de pessoas)? • Telepatia, ou comunicação entre mentes - uma pessoa
enviando pensamentos para outra ou captando seus
> Teste a Si Mesmo 6 pensamentos.
Que tipo de evidência mostra que, de fato, “existe mais na • Clarividência, ou percepção de eventos distantes, como
percepção do que aquilo que chega aos sentidos”? sentir que a casa de um amigo está em chamas.
• Precognição, ou percepção de eventos futuros, como a
As respostas as Questões "Teste a Si Mesmo" podem ser encontradas no morte de um líder político ou o resultado de uma
Apêndice B. no final do livro. competição esportiva.
Intimamente ligadas a essas estão as alegações de telecinese
(TC), ou “mente sobre a matéria”, como fazer levitar uma
Existe Percepção Extrassensorial?
. ............................. ........................................................................ — ........................-•
mesa ou influenciar um jogo de dados (FIGURA 6 .5 2 ). (Ela
é ilustrada pelo sarcástico pedido: “Todos aqueles que acre
2 5 : Quais são as alegações de PES, e o que a ditam na telecinese podem, por favor, levantar m inha
mão?”)
maioria dos psicólogos concluiu depois de
testá-las?
I
Telepatia
I
Clarividência
1
Precognição
Ao longo do dia, todos nós imaginamos muitos eventos.
Dados os bilhões de eventos que acontecem no mundo dia
riamente, e dados dias o bastante, é certo que algumas coin
cidências assustadoras ocorrerão. Em uma estimativa cuida
dosa, o acaso sozinho prediria que mais de mil vezes por dia
alguém no planeta iria pensar em outra pessoa e dentro de
cinco minutos seria informado de que ela morreu (Charpak
> FIG U R A 6.5 2 e Broch, 20 0 4 ). Com tempo e pessoas suficientes, o impro
Conceitos parapsicológicos vável torna-se inevitável.
Essa foi a experiência do autor de histórias em quadrinhos
John Byrne (2 0 0 3 ). Seis meses após o lançamento de uma
de suas aventuras do Homem-Aranha sobre um blecaute em
não abdicou do trono para entrar para um convento.) E os Nova York, a cidade sofreu um imenso apagão. Uma trama
do novo século deixaram passar acontecimentos que invadi subsequente com o mesmo super-herói envolvia um grande
ram os noticiários, como a tragédia do 11 de setembro. (Onde terremoto no Japão. “E novamente”, recordou Byrne, “acon
estavam os sensitivos em 10 de setembro quando precisáva teceu de verdade no mês em que a edição chegou às bancas.”
mos deles? Por que, a despeito da recompensa de 50 milhões Mais tarde, ao trabalhar em uma revista do Super-Homem,
de dólares oferecida, nenhum deles pôde ajudar a localizar ele “fez o Homem de Aço voar para o resgate de um ônibus
Osama bin Laden depois daquele dia?) Gene Emery (2 0 0 4 ), espacial da Nasa envolvido em um desastre. A tragédia da
que seguiu previsões anuais durante 26 anos, relata que quase Challenger aconteceu quase em seguida” (a tempo de a edi
nunca previsões incomuns se tornaram realidade, e pratica ção ser redesenhada). “Mais recentemente, e mais arrepiante,
mente nunca os videntes alertaram para os principais even foi quando eu estava trabalhando em uma história da Mulher
tos do ano. Maravilha em que ela era morta como um prelúdio a sua
transformação em deusa”. A capa “foi feita como a primeira
página de um jornal, com a manchete ‘Morre a Princesa
Diana’. (Diana é o nome verdadeiro da personagem.) Aquele
número foi à venda na quinta-feira. No sábado seguinte...
“Uma pessoa que fala muito às vezes está certa."
Não preciso dizer, preciso?”
Provérbio espanhol