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POLÍTICAS PÚ BLICAS EM SAÚ DE,

EDUCAÇÃ O E HABITAÇÃ O
Equipe de Elaboração
Grupo ZAYN Educacional

Coordenação Geral
Ana Lúcia Moreira de Jesus

Gerência Administrativa
Marco Antônio Gonçalves

Professor-autor
Luciano de Assis Silva

Coordenação de Design Instrucional do Material Didático


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Diagramação e Projeto Gráfico


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Revisão
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GRUPO ZAYN EDUCACIONAL

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escolhê-lo para realizar e/ou dar continuidade aos seus estudos. Nós do ZAYN
estamos empenhados em oferecer todas as condições para que você alcance
seus objetivos, rumo a uma formação sólida e completa, ao longo do processo
de aprendizagem por meio de uma fecunda relação entre instituição e aluno.
Prezamos por um elenco de valores que colocam o aluno no centro de
nossas atividades profissionais. Temos a convicção de que o educando é o
principal agente de sua formação e que, devido a isso, merece um material
didático atual e completo, que seja capaz de contribuir singularmente em sua
formação profissional e cidadã. Some-se a isso também, o devido respeito e
agilidade de nossa parte para atender à sua necessidade.
Cuidamos para que nosso aluno tenha condições de investir no
processo de formação continuada de modo independente e eficaz, pautado
pela assiduidade e compromisso discente.
Com isso, disponibilizamos uma plataforma moderna capaz de oferecer
a você total assistência e agilidade da condução das tarefas acadêmicas e, em
consonância, a interação com nossa equipe de trabalho. De acordo com a
modalidade de cursos on-line, você terá autonomia para formular seu próprio
horário de estudo, respeitando os prazos de entrega e observando as
informações institucionais presentes no seu espaço de aprendizagem virtual.
Por fim, ao concluir um de nossos cursos de pós-graduação, segunda
licenciatura, complementação pedagógica e capacitação profissional,
esperamos que amplie seus horizontes de oportunidades e que tenha
aprimorado seu conhecimento crítico a cerca de temas relevantes ao exercício
no trabalho e na sociedade que atua. Ademais, agradecemos por seu ingresso
ao ZAYN e desejamos que você possa colher bons frutos de todo o esforço
empregado na atualização profissional, além de pleno sucesso na sua
formação ao longo da vida.
“Registrar as brechas das políticas
públicas é fácil, o difícil é o diálogo
para a construção das melhorias.”

Rafael O. Leme
POLÍTICAS PÚBLICAS GRUPO ZAYN
EM SAÚDE, EDUCAÇÃO EDUCACIONAL
E HABITAÇÃO

EMENTA: CONTEÚDO PROGRAMÁTICO


Na disciplina Políticas públicas em -Introdução: A distinção entre política
saúde, educação e habitação será e políticas públicas;
1. A previdência social como prática
estudada a distinção entre política e
de assistência a saúde;
políticas públicas; A previdência social 2. O SUS e a reforma do Estado;
como prática de assistência a saúde; 3. Políticas públicas educacionais;
4. Globalização, neoliberalismo e
O SUS e a reforma do Estado;
educação;
Políticas públicas educacionais; 5. A questão habitacional;
Globalização, neoliberalismo e 6. Direito à cidade e habitação;
-Leitura Complementar;
educação; A questão habitacional e
-Referências.
Direito à cidade e habitação.

Organização do conteúdo:
Prof.ª M.ª Jéssica de Freitas Lopes
CARACTERIZAÇÃO DA DISCIPLINA
Disciplina: POLÍTICAS PÚBLICAS EM SAÚDE, EDUCAÇÃO E
HABITAÇÃO

EMENTA

Na disciplina Políticas públicas em saúde, educação e habitação será estudada


a distinção entre política e políticas públicas; A previdência social como prática
de assistência a saúde; O SUS e a reforma do Estado; Políticas públicas
educacionais; Globalização, neoliberalismo e educação; A questão habitacional
e Direito à cidade e habitação.

OBJETIVOS

Compreender alguns pontos sobre Políticas públicas em saúde, educação e


habitação.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

-Introdução: A distinção entre política e políticas públicas;


1. A previdência social como prática de assistência a saúde;
2. O SUS e a reforma do Estado;
3. Políticas públicas educacionais;
4. Globalização, neoliberalismo e educação;
5. A questão habitacional;
6. Direito à cidade e habitação;
-Leitura Complementar;
-Referências.
SUMÁRIO

Introdução: A distinção entre política e políticas públicas 07


1. A previdência social como prática de assistência a saúde 08
2. O SUS e a reforma do Estado 09
3. Políticas públicas educacionais 10
4. Globalização, neoliberalismo e educação 11
5. A questão habitacional 13
6. Direito à cidade e habitação 15
Leitura Complementar 18
Referências 30
7

POLÍTICAS PÚBLICAS EM SAÚDE, EDUCAÇÃO E HABITAÇÃO

Introdução: A distinção entre política e políticas públicas

Fonte: Imagem retirada da internet

Azevedo (2003, p. 38) definiu que “política pública é tudo o que um governo
faz e deixa de fazer, com todos os impactos de suas ações e de suas omissões”
(OLIVEIRA, 2010).

O primeiro destaque a se fazer com relação a essa definição dada por


Azevedo é de que política pública é coisa para o governo. A sua definição é clara
nesse sentido. Isso quer dizer que a sociedade civil, ou melhor, o povo, não é
responsável direto e nem agente implementador de políticas públicas. No entanto, a
sociedade civil, o povo, faz política (OLIVEIRA, 2010).

Percebe-se então que existe uma distinção entre política e política pública.
Mas como definir a primeira expressão? O filósofo e historiador Michel Foucault
(1979) afirmou que todas as pessoas fazem política, todos os dias, e até consigo
mesmas! Isso seria possível na medida em que, diante de conflitos, as pessoas
precisam decidir, sejam esses conflitos de caráter social ou pessoal, subjetivo.
Socialmente, a política, ou seja, a decisão mediante o choque de interesses
desenha as formas de organização dos grupos, sejam eles econômicos, étnicos, de
8

gênero, culturais, religiosos, etc. A organização social é fundamental para que


decisões coletivas sejam favoráveis aos interesses do grupo (OLIVEIRA, 2010).

Por fim, é importante dizer que os grupos de interesse, organizados


socialmente, traçam estratégias políticas para pressionarem o governo a fim de que
políticas públicas sejam tomadas em seu favor (OLIVEIRA, 2010).

1- A previdência social como prática de assistência a saúde

Fonte: imagem retirada da internet

A atuação do Estado brasileiro na tentativa de resolução dos problemas de


saúde da população teve, desde o seu surgimento no início do século até os anos
1980, duas características básicas: uma estreita relação entre o estabelecimento
das políticas de saúde e o modelo econômico vigente e uma clara distinção entre as
ações de saúde pública e de assistência médica (RONCALLI, 2003).

Com relação ao primeiro aspecto, as primeiras preocupações do Estado


brasileiro, de economia eminentemente agro-exportadora, era com os “espaços de
circulação de mercadorias” e daí tem-se, como resultante, ações dirigidas ao
saneamento dos portos, particularmente o de Santos e o do Rio de Janeiro. Era
importante, ademais, que fosse fomentada a política de imigração, a qual abasteci a
de mão-de-obra a cultura cafeeira e, como consequência disso, já em 1902 o então
9

presidente Rodrigues Alves lança o programa de saneamento do Rio de Janeiro e o


combate à febre amarela urbana em São Paulo (Tomazi, 1986; Luz, 1991).
(RONCALLI, 2003).

No que diz respeito às ações de assistência, o surgimento de um modelo de


prestação de serviços de assistência médica esteve condicionado ao
amadurecimento do sistema previdenciário brasileiro, que teve, como suas práticas
fundantes, as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs). No mesmo ano de
surgimento das Caixas, 1923, é promulgada a Lei Eloy Chaves, considerada por
muitos autores como o marco do início da Previdência Social no Brasil (Tomazi,
1986; Luz, 1991; Mendes, 1993; Oliveira & Souza, 1997; Cunha & Cunha, 1998).
(RONCALLI, 2003).

2- O SUS e a reforma do Estado

Fonte: Imagem retirada da internet

No cenário brasileiro, não é de hoje que o Sistema Único de Saúde vem


sendo atacado no sentido de mutilá-lo em suas características principais,
particularmente a universalidade e a integralidade, além da garantia da saúde como
1

direito de cidadania. Já durante a revisão constitucional, cinco anos após a


promulgação, se tentou remeter o direito à saúde à legislação complementar,
eliminando assim o direito constitucional, o que não chegou a acontecer por
pressões da sociedade civil organizada, destacadamente do movimento sanitário
(RONCALLI, 2003).

De fato, o SUS corre na contramão da tendência dos países da América


Latina em geral e do Brasil em particular, com uma política de saúde com base nos
preceitos da universalidade e da equidade, os quais são opostos à lógica neoliberal
no que diz respeito à ação do Estado e ao estabelecimento de políticas sociais.
Campos (1997b) afirma que é curioso que se pretenda implantar no Brasil um
sistema de base eminentemente pública quando, em todo o mundo são levantadas
sérias dúvidas a respeito da capacidade do Estado de produzir bens e serviços
(RONCALLI, 2003).

3- Políticas públicas educacionais

Fonte: Imagem retirada da internet

Se “políticas públicas” é tudo aquilo que um governo faz ou deixa de fazer,


políticas públicas educacionais é tudo aquilo que um governo faz ou deixa de fazer
em educação. Porém, educação é um conceito muito amplo para se tratar das
políticas educacionais. Isso quer dizer que políticas educacionais é um foco mais
1

específico do tratamento da educação, que em geral se aplica às questões


escolares. Em outras palavras, pode-se dizer que políticas públicas educacionais
dizem respeito à educação escolar (OLIVEIRA, 2010).

Por que é importante fazer essa observação? Porque educação é algo que
vai além do ambiente escolar. Tudo o que se aprende socialmente – na família, na
igreja, na escola, no trabalho, na rua, no teatro, etc. –, resultado do ensino, da
observação, da repetição, reprodução, inculcação, é educação. Porém, a educação
só é escolar quando ela for passível de delimitação por um sistema que é fruto de
políticas públicas (OLIVEIRA, 2010).

Nesse sistema, é imprescindível a existência de um ambiente próprio do fazer


educacional, que é a escola, que funciona como uma comunidade, articulando
partes distintas de um processo complexo: alunos, professores, servidores, pais,
vizinhança e Estado (enquanto sociedade política que define o sistema através de
políticas públicas). Portanto, políticas públicas educacionais dizem respeito às
decisões do governo que têm incidência no ambiente escolar enquanto ambiente de
ensino-aprendizagem (OLIVEIRA, 2010).

Tais decisões envolvem questões como: construção do prédio, contratação de


profissionais, formação docente, carreira, valorização profissional, matriz curricular,
gestão escolar, etc (OLIVEIRA, 2010).

4- Globalização, neoliberalismo e educação

A escola como se conhece hoje, lugar de ensino para todos os grupos sociais,
garantida em suas condições mínimas de existência pelo Estado, reprodutora da
cultura universal acumulada pela experiência humana sobre a Terra e disseminada
em todos os países do planeta, não possui mais do que 150 anos, ou seja, um
século e meio. É uma experiência educacional do final do século XIX, momento em
que as relações capitalistas de produção, amadurecidas pelo ritmo da
industrialização (mecanização da produção) e visando a mais-valia, demandavam,
por um lado, conhecimento técnico padronizado da mão-de-obra e, por outro,
controle ideológico das massas de trabalhadores (OLIVEIRA, 2010).
1

Fonte: Imagem retirada da internet

Assim surgiu a escola moderna, encerrando, desde sua fundação, uma


grande contradição: ser ao mesmo tempo espaço de superação, de criação, de
práxis e, na contramão dessa feita, espaço de reprodução e controle ideológicos (a
esse respeito, ver OLIVEIRA, 2007; BOURDIEU, 2001; e GADOTTI, 2003). É com
essa característica contraditória, dialética, dual que a escola se desenvolveu nos
últimos 150 anos, tempo em que a cultura humana passou por suas mais profundas
transformações em 1,5 milhões de anos de existência da humanidade. A revolução
tecnológica desse período exigiu um conjunto significativo de novos saberes, pois
esse período representou uma sucessão de saltos que partiram da Revolução
Industrial à automação da produção (processos automáticos, baseados na
microeletrônica e na informática), conformando o mundo dos meios de transporte
velozes, da telemática, da conquista do espaço sideral, dos satélites artificiais, da
teleconferência, da financeirização das relações econômicas (venda de dinheiro
pelos bancos), da urbanização, etc (OLIVEIRA, 2010).

Não obstante, ao mesmo tempo em que tais transformações significaram um


grande avanço da humanidade no controle e na previsão da natureza, elas também
serviram para unificar o mundo na dinâmica produtiva do capitalismo. A ampliação
1

das desigualdades sociais resultantes desse processo (visível na divisão do planeta


entre hemisfério norte e hemisfério sul, na divisão dos países entre o urbano e o
rural, na divisão do espaço urbano entre o centro e a periferia) e a degradação da
natureza em função dos modelos de produção predatórios marcaram o final do
século XX e produziram a face do fenômeno designado como globalização
(OLIVEIRA, 2010).

5- A questão habitacional

Fonte: Imagem retirada da internet

A questão habitacional compõe um dos elementos mais importantes no


passivo da exclusão social brasileira. A disparidade no país é histórica e remonta à
origem da nação brasileira baseada no setor agrário exportador. Segundo Tavares
(1978), a alta concentração da propriedade era acompanhada de extrema
desigualdade na distribuição de renda. Essa desigualdade refletiu-se,
principalmente, na ocupação do solo urbano (RAMOS e NOIA, 2016).

A partir da década de 30 do século 20 o Brasil começa a investir no processo


de industrialização com vistas a diminuir as importações e propiciar o
1

desenvolvimento e a modernização da sociedade brasileira. A agricultura e a


manufatura vão gradativamente perdendo espaço para a produção industrial. O
Estado passa a investir em infraestrutura urbana e regional para dar apoio ao
processo industrial. Essas mudanças acarretaram a regulamentação do trabalho
urbano, o que reforçou o movimento migratório campo-cidade (RAMOS e NOIA,
2016).

O mercado habitacional constitui-se num setor estratégico da economia, tanto


pela geração de emprego e renda para o sistema econômico quanto pela
importância social do produto habitação. A compreensão do seu funcionamento é
imprescindível para a formulação e execução de políticas habitacionais. Para tanto,
faz-se necessário conceituar o bem habitação, pois há características que o
diferenciam de outros bens duráveis disponíveis no mercado (RAMOS e NOIA,
2016).

O bem habitação possui diversas características específicas, dentre as quais


pode-se destacar: “i) necessidade básica; ii) custo elevado; iii) durabilidade; iv)
heterogeneidade; v) imobilidade; vi) mercado reduzido face ao tamanho do estoque;
vii) assimetria de informações e ix) mercado segmentado” (Morais, 2002, apud
RAMOS e NOIA, 2016).

O fato de a moradia ser uma necessidade básica de todo ser humano faz de
cada família uma demandante em potencial do bem habitação, no entanto configura-
se como um bem muito caro, de modo que depende de esquemas de financiamento
de longo prazo aos demandantes finais (RAMOS e NOIA, 2016).

Os gastos com o serviço de habitação absorvem elevada parcela dos ganhos


dos indivíduos, independentemente do seu nível de renda – elasticidade renda
aproximadamente igual a um, o que significa uma estabilidade na proporção dos
gastos com habitação à medida que a renda varia. Segundo Santos (1999), o preço
da habitação é aproximadamente três a quatro vezes a renda anual do indivíduo
(RAMOS e NOIA, 2016).
1

6- Direito à cidade e habitação

Fonte: Imagem retirada da internet

No Brasil, destacam-se dois marcos legais que dão novos rumos às políticas
de habitação. O primeiro refere-se à promulgação da Constituição Federal de 1988,
e o segundo à Lei 10.257 de 2001, denominada Estatuto da Cidade. Até então, não
havia um tratamento jurídico adequado para disciplinar a vida nos grandes centros
urbanos, que foram crescendo de forma desordenada, sem assegurar condições de
vida adequadas aos seus cidadãos (Machado, 2008). A criação e promulgação da
Constituição Federal do Brasil de 1988 descentralizou a gestão das políticas
prevendo a promoção de programas de habitação e saneamento básico pelas três
esferas de governo e incluiu, no artigo 6º, a moradia entre os direitos sociais
mínimos (RAMOS e NOIA, 2016).

São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a


moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (Brasil, 2000,
p. 3, grifo do autor). É importante explicitar que nas décadas precedentes ao
processo de redemocratização política do Brasil a elaboração do planejamento
1

urbano estava relacionada à tomada de decisão da União (Machado, 2008) (RAMOS


e NOIA, 2016).

No Brasil, as intervenções governamentais no âmbito da política social foram


tomadas tardiamente. Segundo Carmo (2006), pode-se afirmar que apenas a partir
de 1930, com a derrocada da República Velha e com o sensível enfraquecimento
das oligarquias regionais que a sustentavam, houve o surgimento de uma legislação
que buscava promover a atuação do Estado em áreas sociais, inclusive para as
questões ligadas aos problemas habitacionais (RAMOS e NOIA, 2016).

Antes de 1930, época em que a economia era baseada no setor agrário


exportador, a precariedade habitacional já atingia a população mais pobre. Em
grandes cidades, como Rio de Janeiro, haviam cortiços insalubres situados nos
bairros centrais. Posteriormente, com o aparecimento das epidemias e pestes, as
autoridades governamentais recomendaram a demolição dessas habitações e a
construção de novas, fora do perímetro urbano (Machado, 2008) (RAMOS e NOIA,
2016).

No entendimento de Carmo (2006), a ideia era tomar medidas de higienização


da cidade, para evitar a contaminação da “parte sã”, eliminando-se a pobreza, e com
ela, se não houvesse alternativa menos custosa, os pobres também. Em nome da
higiene, as autoridades declararam guerra aos pobres, afastando-os do centro da
cidade, local que se pretendia transformar no cenário que representasse o progresso
do país (RAMOS e NOIA, 2016).

Assim, no período entre 1930 e 1934, a demolição maciça dos cortiços para
eliminar focos de epidemias e liberar áreas valorizadas das grandes cidades
ocasionou a construção de barracos, principalmente nos morros do Rio de Janeiro.
Essas moradias precárias eram habitadas, na época, por escravos libertos,
migrantes rurais e imigrantes europeus (Sampaio, 2007) (RAMOS e NOIA, 2016).

Para estimular a produção habitacional, o governo oferecia incentivos


convidativos à iniciativa privada. Assim, Sampaio (2007, p. 34) afirma que a
administração pública “não só delegava à iniciativa privada as providências
relacionadas com a ocupação do espaço urbano, como manifestava a intenção de
segregar a população trabalhadora em áreas distantes do núcleo central das
1

cidades”. Isso permitia aos empresários do ramo imobiliário daquela época atuarem
livremente conforme seus interesses (RAMOS e NOIA, 2016).

Também na década 30 o Estado passa a investir em infraestrutura urbana e


regional para dar apoio ao processo industrial. Essas mudanças acarretaram a
regulamentação do trabalho urbano (não extensiva ao campo), o que reforçou o
movimento migratório campo-cidade, mas também levou, segundo Carmo (2006), a
um processo de urbanização intenso e desordenado. A crescente população que
buscou os centros urbanos para viabilizar sua entrada no mercado de trabalho e no
mundo do consumo moderno ocupou as áreas possíveis: os morros, as periferias ou
os mangues (RAMOS e NOIA, 2016).

Durante o primeiro período do governo do presidente Getúlio Vargas, houve


uma intervenção estatal no mercado de habitação. Foram construídos os primeiros
conjuntos habitacionais. Essas moradias beneficiavam determinadas categorias
profissionais, que eram viabilizadas a partir da utilização dos recursos dos Institutos
de Aposentadoria e Pensões – IAPs (Brasil, 2004). Em 1946 foi criada a Fundação
da Casa Popular, primeira política nacional de habitação, que teve por objetivos: a
construção de moradias, apoio à indústria de materiais de construção e a elaboração
de projetos de saneamento (Brasil, 2004) (RAMOS e NOIA, 2016).
1

LEITURA COMPLEMENTAR

POLÍTICAS PÚBLICAS: EXPERIÊNCIAS EM EDUCAÇÃO,


CULTURA, COMUNICAÇÃO E CIDADANIA

Mariana Oliveira de Freitas

Resumo: Este trabalho propõe uma discussão em torno das políticas públicas e o
seu papel na construção da cidadania. Para isto, aborda, inicialmente, alguns
conceitos e paradigmas a respeito do tema e, em seguida, apresenta o potencial das
políticas públicas para a emancipação social, frisando a importância de se fomentar
mais ações que priorizem educação e cultura.

Palavras-chave: políticas públicas, cidadania, educação, cultura, comunicação.

Introdução

Apesar de ter havido, nos últimos anos, um interesse maior na abordagem e


ampliação do debate em torno de políticas públicas, tanto no meio acadêmico como
na imprensa e em outras esferas da sociedade, ainda se observa que há uma
lacuna a ser preenchida no que se refere à forma com que este assunto chega até
os cidadãos. E aqui, entenda-se forma tanto como os meios através dos quais as
informações são transmitidas, como o próprio teor destas informações.
Em relação à cobertura de políticas públicas pela imprensa, podemos afirmar
que, em geral, o que ocorre é uma superficialização do tema, ou mesmo, um
sensacionalismo em cima dos problemas ocorridos em função da ausência de
1

determinadas políticas públicas em setores específicos, como ocorre com as


coberturas de violência, por exemplo. O que se observa, nesses casos, é “uma
extensa cobertura sobre violência centralizada em crimes individualizados, sem
quaisquer intersecções com as políticas de segurança pública – existentes ou que
deveriam existir – para o setor” (CANELA, 2008, p. 64).
Em razão desta lacuna, faz-se necessária a promoção de uma maior
discussão sobre o que vem, efetivamente, a ser uma política pública? A quem ela
deve servir? Como são elaboradas, implementadas e avaliadas as políticas
públicas? E qual o seu papel na construção da cidadania?
A proposta deste trabalho é tentar esclarecer alguns desses pontos, ou, até
mesmo, lançar novos questionamentos sobre os desafios e obstáculos enfrentados
para se tirar um maior proveito das políticas públicas na busca de um caminho de
construção do bem estar social.
Desta forma, iniciamos trazendo alguns conceitos e a origem das políticas
públicas no Brasil. Em seguida, demonstramos diferentes pontos de vista em relação
à funcionalidade e às formas de implementação e gestão das mesmas, para, em
seguida, abordarmos, especificamente, as razões pelas quais educação e cultura
são dois caminhos que podem gerar inúmeros benefícios no sentido de suprir os
direitos dos cidadãos. Por fim, traçamos nossas impressões sobre os caminhos das
políticas públicas na sociedade brasileira contemporânea, destacando suas
tendências e limitações.

1. Políticas Públicas: conceitos e paradigmas

Quando se tenta definir políticas públicas, depara-se com diferentes conceitos


e linhas de pensamento. Mas, de acordo com a cientista social Maria Helena
Guimarães de Castro (2008, p. 69), embora “teoricamente, toda política pública deve
promover o bem comum e o desenvolvimento das pessoas, considerando os direitos
que detêm”, existem duas definições clássicas para elas, utilizadas no campo da
ciência política.
Uma delas está centralizada no Estado, como sendo o único atuante no que
se refere às políticas públicas, definindo-as da seguinte maneira: “política pública é o
2

Estado em ação” (Jobert; Muller apud Castro, 2008, p. 66). Entretanto, Castro reitera
que na teoria de Bruno Jobert e Pierre Muller,
Embora o Estado apareça como um agente central dentro
desta concepção, tal abordagem não deve remeter à falsa
conclusão de que toda política pública deve ser estatal, mas
sim que uma política só é pública a partir do momento em que
o Estado participa como um agente importante (CASTRO,
2008, p. 66).

Dentro desta linha de pensamento, os autores costumam responsabilizar


exclusivamente o Estado pelas políticas públicas: “política pública é tudo que um
governo faz e deixa de fazer, com todos os impactos de suas ações e omissões”
(AZEVEDO apud CARDOSO; JÚNIOR, 2006, p. 32).
Já a segunda definição clássica, segundo Castro (2008), é bem mais ampla,
está ligada aos conceitos de política social e segue uma linha de pensamento não
marxista, influenciada pela democracia liberal e pela social-democracia,
desvinculando o conceito de política pública exclusivamente do setor estatal, embora
o Estado continue exercendo o papel central. O precursor desta definição foi T. H.
Marshall, que afirmou que: “política social é todo bem produzido para promover as
coletividades em diferentes campos” (MARSHALL apud CASTRO, 2008, p. 66). Ou
seja, dentro desta definição, educação, cultura, saúde, transporte, enfim, tudo o que
se produz em prol do desenvolvimento social e humano pode ser considerado
política pública.
Ainda de acordo com a autora (CASTRO, 2008), a partir do conceito de
política social de Marshall, novas linhas de pensamento surgiram, com diversas
influências, desde as marxistas, passando pelas liberais e as social-democratas etc.
Algumas dessas linhas aprimoraram a teoria original, enquanto outras a
superficializaram. Além disso, a teoria de Marshall deu origem a várias outras
definições de políticas públicas e sociais e a um campo de estudo bastante amplo: o
Estado de bem-estar social, ou o Welfare State.
O Estado de bem-estar social foi influenciado pela social-democracia e se
originou no período pós-guerra. Consiste em um modelo político no qual o Estado
deve suprir todas as necessidades da população, nos mais diferentes campos,
2

englobando a educação e a cultura, dentre outros, tratando-as, contudo, como


direitos de cada cidadão. Nesse modelo, o Estado também possui autonomia para
intervir na economia. Para Cancian (2008, on-line), estas são, inclusive, as principais
características que distinguem o Estado de bem-estar social do Estado assistencial:

É preciso esclarecer, no entanto, que todos estes tipos de


serviços assistenciais são de caráter público e reconhecidos
como direitos sociais. A partir dessa premissa, pode-se afirmar
que o que distingue o Estado do bem-estar de outros tipos de
Estado assistencial não é tanto a intervenção estatal na
economia e nas condições sociais com o objetivo de melhorar
os padrões de qualidade de vida da população, mas o fato dos
serviços prestados serem considerados direitos dos cidadãos
(...) Paralelamente à prestação de serviços sociais, o Estado do
bem-estar passou a intervir fortemente na área econômica, de
modo a regulamentar praticamente todas as atividades
produtivas a fim de assegurar a geração de riquezas materiais
junto com a diminuição das desigualdades sociais.

Mas com a emergência de modelos políticos neoliberais, a intervenção do


Estado na economia foi tornando-se cada vez mais limitada, em função da
priorização do capital e da defesa de uma economia livre. Consequentemente,
houve uma espécie de privatização do público e, com isso, um aumento dos
contrastes sociais e uma marginalização das classes que já eram vulneráveis,
acentuando sua posição. Dentro desse contexto é que surgem no Brasil, as políticas
sociais focalizadas, ou compensatórias, que falaremos mais profundamente, na
próxima seção. Por ora, reservamo-nos a falar brevemente sobre os paradigmas das
políticas sociais no contexto político-social brasileiro.
No Brasil, as primeiras políticas públicas surgiram ainda no governo de
Getúlio Vargas (1930 – 1945) e referiam-se, em especial, embora não
exclusivamente, às questões trabalhistas. Além destas, as áreas da saúde,
educação profissional e habitação também foram contempladas. Antes disso, de
acordo com Castro (2008, p. 70), “havia programas assistenciais e pontuais,
2

exclusivos para determinados grupos de interesse e de profissionais (bancários,


ferroviários etc.)”. Mas a autora reitera que “é importante ressaltar que as políticas
propostas por ele mantêm o caráter excludente das ações existentes no período pré-
Vargas” (CASTRO, 2008, p. 70). Esse caráter excludente, para ela, referia-se ao fato
de que, em geral, essas políticas eram focalizadas em grupos ou categorias
profissionais específicos.
Somente a partir da década de 80, com o fim da ditadura, as políticas públicas
brasileiras ganharam uma nova roupagem, sendo redesenhadas e ampliadas na
Constituição de 1988. A partir dela, o Estado passou a ser mais responsabilizado
pela regulação, implantação e gestão das mesmas. E é a partir dela também, que
são previstas e propostas as políticas sociais universalistas, valendo destacar, nesse
caso, um avanço específico nas áreas de educação e saúde, com a universalização
do ensino fundamental e a criação do SUS (Castro, 2008). Apesar desse avanço,
conforme aponta Oliveira (2001, on line) no trecho a seguir, o projeto Constitucional
brasileiro sofreu um entrave de natureza política e econômica:

A Constituição de 1988 representaria a consolidação e a


ampliação política desses direitos no plano legal. No entanto,
os rumos tomados pelo desenvolvimento do capitalismo em
escala mundial, o fim do Welfare State, e as políticas
neoliberais atiraram a cidadania brasileira no contrapé de sua
própria história (...) A aplicação das políticas neoliberais no
Brasil, aliada a um certo refluxo dos movimentos populares,
colocou em recuo os direitos sociais e civis confirmados e
ampliados na Constituição de 1988.

A seguir, falaremos um pouco mais sobre as soluções propostas por este


modelo político para os problemas de desigualdade social gerados por ele próprio.

2. Políticas sociais universalistas X Políticas sociais focalizadas

Conforme fora apontado, as políticas sociais, em especial em modelos de


Estados de bem-estar social, são implementadas com o objetivo de assegurarem a
2

todos os cidadãos, padrões mínimos de educação, saúde, habitação etc.,


reconhecendo-os como direitos sociais, buscando desta forma, diminuir as
desigualdades por meio da intervenção do Estado na economia (CANCIAN, 2008).
Para este modelo, todos os cidadãos têm direitos iguais de acesso a serviços
básicos, ou seja, o ideal em um Estado de bem-estar social são políticas públicas
universalistas, que prevêem esta igualdade de acesso.
Já nos modelos liberais e neoliberais, conforme exposto anteriormente, a
intervenção do Estado na economia é cada vez mais impossibilitada e, esses
modelos que priorizam o capital, inclusive privatizando órgãos públicos, colaboraram
para um crescimento das desigualdades, em especial nos países até então menos
desenvolvidos, como o Brasil. E é a partir daí que surgem as principais contradições
e problemas gerados na implementação, gestão e avaliação das políticas públicas.
Para os adeptos deste modelo político, a forma ideal de solucionar, ou pelo
menos amenizar, os fortes contrastes sociais, é por meio de políticas públicas
voltadas para a população, considerada por eles, mais carente: “a ascensão do
neoliberalismo, sobretudo a partir da década de 1980, deu origem à produção de
políticas mais focalizadas, com recortes em grupos de maior vulnerabilidade”
(CASTRO, 2008, p. 74). O problema é que este segundo tipo de política pública, em
geral, quando submetida a uma análise mais profunda, apresenta uma série de
deficiências.
Para Gohn (2006, p. 15), as políticas focalizadas desenvolvem “um modelo de
modernização conservadora, em que os excluídos passam a ser incluídos, via
políticas sociais compensatórias”. Para ela, esse tipo de política social não colabora
para uma construção plena de cidadania, pois “não criam sentimento de pertença,
não geram redes de sociabilidade, a cidadania do papel/cartão/consumidor usuário
não induz ao comportamento pró-ativo, ela gera a passividade e a espera. Será que
a esperança se resume a isso: espera por uma doação?” (GOHN, 2006, p. 17)
Assim, de um lado temos pensadores e políticos que defendem a
universalização das políticas sociais, ou seja, o acesso igual aos serviços públicos
como direito de todos os cidadãos, como já ocorre no Brasil, com a saúde e o ensino
fundamental, embora estes possuam inúmeras contradições internas. Sem
questionar, aqui, a qualidade desse tipo de política social no Brasil, é sabido que
desde a Constituição de 1988, é previsto um acesso universal de todos os cidadãos
2

aos serviços de saúde pública e de todas as crianças em idade escolar, ao ensino


fundamental.
Por outro lado, há aqueles que defendem o modelo compensatório ou
focalizado de políticas sociais, que embora possam até surtir algum efeito positivo
de imediato, acabam caindo em um círculo vicioso e acomodando seus
beneficiários, que passam a viver na espera de um dos programas que o atinjam
diretamente. Mas afinal, qual seria o modelo que, tomando o devido cuidado para
não cair na utopia, poderia ser considerado ideal?
Não podemos também simplesmente ignorar o papel de determinadas
políticas públicas focalizadas no que diz respeito a soluções de problemas graves
gerados pelo injusto sistema político sob o qual estamos submetidos, como a fome
ou a ampliação das possibilidades de acesso ao ensino superior, por exemplo.
Entretanto, é necessário ter em mente que as políticas sociais devem, mais do que
suprir necessidades imediatas, gerar subsídios para que os indivíduos em situação
de vulnerabilidade possam ser inseridos na sociedade como legítimos cidadãos,
portadores de direitos, e não serem apenas vistos como pessoas carentes que
necessitam de uma “ajuda” do governo. Nesse sentido, experiências de políticas
sociais que priorizam a educação e a cultura podem ser eficientes, conforme
exposto a seguir.

2. Experiências em Educação, Cultura, Comunicação e Cidadania

Vários autores concordam que no Brasil, o processo de democratização e


conquista da cidadania, compreendida aqui, diretamente ligada a questões de
direitos civis e sociais, ocorreu de forma tardia, atravessou vários obstáculos e ainda
não chegou à sua plenitude. Para Oliveira (2001, on line),

No Brasil, a obtenção de direitos sociais a partir de 1930, se


deu sem que os direitos civis e políticos estivessem sido
consolidados como conquistas da sociedade. Ao contrário, foi a
aquisição de certos direitos sociais pelos trabalhadores que,
contraditoriamente, acabaram por impulsionar, a sociedade no
sentido da obtenção mais plena de direitos políticos e civis
2

elementares. Portanto, o percurso da história da cidadania no


Brasil se deu em sentido inverso ao caminho experimentado
pela Inglaterra, onde a conquista de direitos sociais no
presente século foi precedida dos direitos civis, no século XVIII,
e dos direitos políticos, no século XIX.

Em função dos direitos sociais brasileiros terem iniciado pelas conquistas


trabalhistas, o Estado se tornou, literalmente, um regulador da sociedade, definindo
quem era ou deixava de ser cidadão, por meio do trabalho. Como já exposto, com a
Constituição de 1988, novos direitos foram legitimados, muito embora, nem sempre
eles tenham sido colocados em prática.
Se considerarmos a cidadania de modo mais amplo, no sentido definido por
Demo (apud FIGUEIREDO, 2003, p. 69), que estabelece como “componentes
cruciais da cidadania: educação, organização política, identidade cultural,
informação e comunicação e, acima de tudo, processo emancipatório”, percebemos
que apesar de termos evoluído, ainda há um longo caminho para a conquista da
cidadania no Brasil.
Para que realmente se atinja a emancipação social, na qual o sujeito se torna
protagonista de sua história e consciente de seu papel cultural, social e político na
sociedade, dois elementos são de fundamental importância e, mais do que isso,
chegam a ser fatores condicionantes a esta conquista. São eles: a educação,
voltada para o saber e não apenas para índices estatísticos, e o direito cultural.
Com relação à educação voltada para ao conhecimento, vários pensadores2
dedicaram-se a comprovar que esta é a melhor forma de se conquistar a cidadania,
a libertação e a emancipação, já que ela forma a consciência política e social do
sujeito:

O aprendizado cidadão, que converte a informação em


conhecimento, é fruto de reflexão, não se dá automaticamente
pela repetição mecânica da informação apreendida, mas pela
informação discutida, contextualizada, repensada, reelaborada,
reconstruída (...) A porta de entrada do conhecimento é,
2

portanto, aprender a aprender, para aprender a pensar e a


fazer sua própria história. (CALDAS, 1982, pp. 140-141)

Figueiredo (2003), por exemplo, propõe uma relação direta entre nível de
investimento em educação e o nível econômico de uma nação. Para ele, além do
crescimento econômico, tudo se altera quando há um maior investimento em
educação, possibilitando o desenvolvimento do ser humano. De acordo ainda com
sua lógica de pensamento, o ser humano desenvolvido possibilita o desenvolvimento
da sociedade na qual ele faz parte. O autor acredita, desta maneira, que esse
resultado é possível independente do tipo de investimento que é feito na educação,
seja ele público ou privado.
Mas o que, em geral, observa-se em sociedades em que o capital é priorizado
em detrimento dos direitos sociais básicos dos cidadãos é algo diferente desta
proposta. Nesse sentido, o sistema educacional brasileiro e outras políticas sociais
sofrem críticas, por priorizarem uma quantificação das mesmas, sem que seja dada
a devida importância à qualidade. Sob esta ótica, a maneira com que as políticas
públicas brasileiras são avaliadas, para utilizar como exemplo ainda a educação, é
por meio de índices, metas, eficácia, impacto etc.
Para Gohn (2006, p. 18), com esses modelos, “passou a haver uma
desconstrução do interesse público que o Estado deveria representar e muitas áreas
sociais passaram a receber tratamento de mercado (…) Com isso também se
desconstrói os direitos que passam a ser tratados como carências”.
Por outro lado, Cardoso e Junior (2006, p. 30) destacam que no caso
brasileiro, é

necessário reconhecer as inúmeras experiências inovadoras


que têm sido desenvolvidas por várias prefeituras municipais, e
mesmo por alguns governos estaduais, na perspectiva da
universalização dos direitos sociais e do fortalecimento da
dinâmica democrática, tornando o governo local um espaço de
disputa política relevante quanto aos rumos da sociedade
brasileira.
2

Dentro desta perspectiva, programas governamentais que estimulam a


participação da população, como plenárias, assembléias, orçamentos participativos
etc., são iniciativas que dão voz à população e podem tornar suas demandas em
direitos e políticas sociais. Assim como a mobilização social, por meio de conselhos,
associações e outras formas de organização também podem ser experiências
positivas no sentido de protagonismo e emancipação. Quando esse tipo de ação
pode ser aliado a uma cobertura eficaz da imprensa, é possível chegar a resultados
ainda mais proveitosos.
Entendemos, desta forma, que programas que priorizam, além da educação
para o saber, a diversidade cultural e o capital social, entendido aqui como algo que
“não se localiza em indivíduos, mas na relação que se estrutura entre eles, nas
organizações sociais. Ele envolve interações entre indivíduos e constitui capital
porque produz resultados e benefícios pra eles” (GOHN, 2006, p. 17), são as
melhores formas de construção de elos sociais e conscientização política de
indivíduos, o que, por si só, constituem maneiras eficazes de formação de cidadãos
e caracterizam maneiras de se comunicar socialmente, gerando uma mobilização
entre indivíduos.
No que se refere à cultura, podemos afirmar também, que somada à
educação, é uma das áreas extremamente relevantes para um processo de
emancipação social, já que se trata de um campo bastante amplo, diversificado e
que engloba desde questões de identidade, até o consumo e produção de bens
culturais. Por esta razão, políticas públicas voltadas para o direito cultural, para
muito além da valoração estética, estimulam e colaboram diretamente para o
respeito à diversidade e a articulação social.
É necessário que ações nesse sentido sejam priorizadas em uma sociedade
complexa como a que estamos inseridos, onde há um constante diálogo entre
diferentes culturas e, até mesmo, o surgimento de uma nova cultura global, como
apontam alguns teóricos contemporâneos, como Thompson ou Castells3 , que
defende a idéia de sociedade em rede. Gohn (2006, pp. 22-23), compartilha deste
argumento, ao afirmar que:

No meu ponto de vista, defendo, em primeiro lugar, caminhos que reconheçam as


diferenças e a existência de conflitos como partes constitutivas do ser humano na
2

sociedade. Para tal, deve-se considerar o desafio colocado pelo multiculturalismo.


(...) As práticas culturais podem ser desenvolvidas em duas frentes: na sociedade
civil – via manifestações culturais ou associativas, que possibilitem a articulação de
singularidades existentes; e na sociedade política – via políticas públicas, criando-se
espaços e arenas institucionais de negociação das diferenças. (...) A área da cultura
é rica e propícia para a geração desse consenso, desde suas formas clássicas de
expressão artísticas até os direitos culturais modernos, de última geração, como os
que estão surgindo com o avanço tecnológico na área das comunicações e da
genética humana.
A própria Unesco tem focalizado algumas de suas ações nesta direção,
reservando à cultura e à educação papéis fundamentais para o desenvolvimento
humano: “Sem a implementação dos direitos culturais – o direito à educação, o
direito de tomar parte na vida cultural, sem liberdade de atividades e esforços
artísticos, científicos e intelectuais, o desenvolvimento humano é impossível”
(UNESCO apud GOHN, 2006, p. 25).
Educação e cultura são campos que dialogam entre si e interferem
diretamente no sucesso ou fracasso um do outro e a comunicação pode ser o elo
entre esses campos, através das próprias interações sociais. Eles são também,
pilares extremamente importantes na construção de uma sociedade mais pacífica e
igualitária. Desta forma, o exercício da cidadania, bem como a emancipação social,
estão condicionados, dentre outros fatores, aos mesmos.
Assim, entendemos que ações que priorizem o sujeito e respeitem a
diversidade, a pluralidade e o diálogo são importantes iniciativas para o exercício
pleno da cidadania. Estas ações são de responsabilidade do Estado, embora elas
não precisem necessariamente estar atreladas exclusivamente a ele. A mobilização
social e a comunicação são também, nesse sentido, importantes ferramentas para a
emancipação.

Considerações Finais

Recusando a utopia, o que buscamos com este trabalho, foi ampliar o debate
no sentido de reservar ao Estado o papel de promotor do bem estar social, através
das políticas públicas. Quisera fosse possível chegar a alguma conclusão precisa
2

sobre o melhor caminho para a construção da cidadania em nossa complexa


sociedade, cada vez mais pautada pelo avanço tecnológico e pelo capital. Diante de
um cenário cheio de contradições, é no mínimo desafiador tentar mostrar o caminho
das pedras e julgar se determinadas políticas universais ou focalizadas estão ou não
colaborando para a construção da cidadania.
Acreditamos que políticas compensatórias, embora possam trazer algum
alívio imediato para estas contradições e tensões impostas pelo modelo econômico
e político sob o qual estamos inseridos, são limitadas quando submetidas a uma
análise mais profunda, que leve em conta suas consequências a longo prazo.
Nesse sentido, concordamos com Cardoso e Junior (2006, p. 30), quando
eles afirmam que a função estrutural das políticas sociais compensatórias são “forjar
um mínimo de legitimidade a um sistema que não garante a todos os cidadãos e
cidadãs direitos fundamentais e nem mesmo igualdade de oportunidades”.
Quando falamos de igualdade de oportunidades, novamente remetemos a
uma ideia de Gohn (2006, p. 18), na qual ela defende que “igualdade não é o
contrário de diferença – que todos nós concordamos: devem ser respeitadas. O
contrário é a desigualdade e as políticas focalizadas aprofundam as desigualdades
porque dividem, compartimentalizam, separam e estigmatizam”.
Reconhecemos que desde a implementação das primeiras políticas públicas
no Brasil, ainda na era Vargas e, inicialmente, bastante voltadas para a questão
trabalhista, evoluímos. Entretanto, em função disso, não podemos concluir,
erroneamente, que já atingimos um modelo ideal de ações públicas voltado para a
emancipação social.
Ao contrário, ainda há um longo caminho a ser percorrido nesse sentido e,
nesse caminho, educação, cultura e comunicação, enquanto políticas sociais, devem
ser priorizadas, pois são de fundamental importância para a transformação dos
sujeitos em atores de suas próprias histórias e não meros telespectadores,
participantes de uma política de inclusão, excludente.

Texto completo disponível em:


3

https://mestrado.fic.ufg.br/up/76/o/politicas_publicas_experiencias_educacao_cultura
.pdf.

MATERIAL COMPLEMENTAR:

VÍDEO: Avaliação das políticas públicas da educação:

https://www.youtube.com/watch?v=LsT21yPiTQA.

Referências

OLIVEIRA, Adão Francisco. Políticas públicas educacionais: conceito e


contextualização numa perspectiva didática. Texto publicado no livro “Fronteiras da
Educação: desigualdades, tecnologias e políticas”, organizado por Adão F. de
Oliveira, Alex Pizzio e George França, Editora da PUC Goiás, 2010, páginas 93-99 .

RAMOS, Jefferson da Silva; NOIA, Angye Cássia. A Construção de Políticas


Públicas em Habitação e o Enfrentamento do Déficit Habitacional no Brasil: Uma
Análise do Programa Minha Casa Minha Vida. Editora Unijuí . Ano 14, n. 33
jan./mar. 2016

RONCALLI, A.G. O desenvolvimento das políticas públicas de saúde no Brasil e a


construção do Sistema Único de Saúde. In: Antonio Carlos Pereira (Org.).
Odontologia em Saúde Coletiva: planejando ações e promovendo saúde. Porto
Alegre: ARTMED, 2003. Cap. 2. p. 28-49. ISBN: 853630166X.

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