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PRÁTICA MUSICAL REMOTA

AULA 1

Prof. Alysson Siqueira


INTRODUÇÃO

Partimos do princípio de que a música é uma construção e uma prática


social. Fazer música com outras pessoas e para outros é de praxe nessa
atividade humana, desde os tempos mais remotos, de acordo com registros de
pinturas rupestres em diversos sítios arqueológicos espalhados mundo afora.
Ao longo da história, as práticas musicais só fizeram confirmar a sua
vocação de reunir pessoas. Desde o pequeno grupo formado para entoar cantos
litúrgicos, passando pelos músicos que animavam as tavernas, depois os grupos
câmara, as grandes orquestras, os madrigais, os coros sinfônicos, as big bands,
as bandas de rock, as duplas sertanejas, enfim, mesmo os cantores solistas
contam com outros musicistas para concretizar esse acontecimento social
chamado música.
Mas quando menos esperávamos, veio um ponto de inflexão nessa
história. A pandemia de COVID-19 impôs um distanciamento entre as pessoas
jamais imaginado. Diversas atividades foram afetadas, mas certamente as
práticas musicais fazem parte das mais prejudicadas. Da professora particular
de instrumentos musicais às grandes orquestras, todos se viram obrigados a
encontrar saídas para continuar suas atividades, dando vez, na história, às
práticas musicais remotas.
Esse cenário que não oferece alternativa presencial acaba revelando
grandes possibilidades e, por isso, este curso não trata apenas de alternativas
para uma crise, mas de oportunidades que se oferecem para expandir as
práticas musicais. O fazer musical em conjunto e presencial continuará a existir,
pois faz parte da essência da música. Mas as práticas remotas que aprendemos
irão ampliar as possibilidades, oferecendo alternativas par o rompimento das
barreiras geográficas dos encontros musicais.
Podemos partir do princípio de que essas práticas poderiam ser
síncronas, realizadas ao mesmo tempo em que são transmitidas, ou
assíncronas, realizadas previamente. As práticas musicais síncronas, por conta
da total falta de sincronia entre todos os equipamentos envolvidos nas
transmissões ainda estão presentes mais no campo do sonho do que da
realidade, exceto por uma iniciativa que iremos analisar posteriormente. Já as
práticas assíncronas ganharam muito destaque durante a pandemia e poderão
figurar como opção para as práticas musicais no futuro. Mas ainda há a

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possibilidade de trabalharmos de forma semissíncrona, ou seja, com parte do
material artístico preparada previamente e outra parte realizada ao vivo.
Sendo assim, a primeira parte deste curso tratará de uma prática musical
assíncrona amplamente difundida a partir do ano de 2020, que passou a ser
chamada de videomosaico. O uso de aplicativos para cantar em grupo também
promove as práticas de conjunto de maneira assíncrona e será um de nossos
temas. Também trataremos de outras maneiras semissíncronas de se praticar
música remotamente e encerraremos com os avanços que alcançados em
relação às práticas síncronas.
Mais do que assistir às aulas e ler este texto, recomendamos que você
experimente, arrisque, produza e compartilhe seus resultados, pois, com a
permissão de uma redundância didática, é preciso praticar para se desenvolver
nas práticas.

TEMA 1 – CONJUNTO MUSICAL VIRTUAL: PREPARANDO O MATERIAL

Preparação de material de apoio para gravação dos vídeos individuais

Vídeos de conjuntos e coros virtuais se mostraram uma estratégia


bastante interessante para manter a chama do grupo acesa, principalmente em
situações de afastamento. Mas é bem provável que, com a aquisição de know
how por parte de todos os envolvidos, e pelo sentimento de realização que
proporciona, será uma prática ainda bastante utilizada em conjuntos musicais.
Coros e orquestras virtuais, bandas e conjuntos musicais de diversos tipos
encontraram na produção de vídeos, que ficaram conhecidos como mosaicos,
uma das estratégias para se manter em atividade em situações que impeçam os
trabalhos presenciais.

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Figura 1 – Banaha – Prática de canto coral

Fonte: captura de tela de <https://www.youtube.com/watch?v=EMQ2qJIsELU>.

O vídeo retratado pela Figura 1 foi resultado de uma prática de canto coral
realizada por professores e alunos do curso de Licenciatura em Música da
Uninter. A partir do estudo de caso dessa produção, iremos repassar todas as
etapas, indicando as possibilidades que foram usadas e as que poderiam
também ter sido consideradas. Nesta aula, falaremos sobre o preparo do
material para as gravações, que começa com a escolha da música.

1.1 Seleção de música e arranjo

Normalmente, o registro de uma prática musical é precedido de muito


ensaio. Por essa razão, é conveniente que se escolha uma música do repertório
do grupo. Quanto menor a experiência do grupo, mais ensaios são necessários
para realizar os acertos nas músicas. Grupos integrados por musicistas mais
experientes e com formação musical são capazes de interpretar as obras a partir
da partitura, sendo possível, nesses casos, realizar a prática remota sem antes
ter passado por ensaios presenciais.
No caso do Banaha, a música foi apresentada em lives da Oficina de
Canto Coral realizada no início da pandemia de COVID-19. A melodia
descomplicada e o formato de cânone garantiram que o trabalho se sustentasse
mesmo sem realizar ensaios presenciais.

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Cânones são uma excelente alternativa para os casos em que não
podemos reunir o grupo para o ensaio, já que todos cantam uma única melodia,
sendo designado à edição a tarefa de iniciar vozes em momentos diferentes,
gerando, assim, a polifonia.
Outro aspecto importante para a escolha de repertório é a questão de
direitos autorais, pelo fato de que o resultado final da produção normalmente
será veiculado no Youtube e em redes sociais. É preferível que se escolha
músicas livres de direitos patrimoniais, como canções tradicionais sem autoria
definida, como Banaha, ou de compositores falecidos há mais de 70 anos. Mas
caso seu grupo não possua obras assim em seu repertório, ainda é possível
produzir, tomando o cuidado de, ao publicar no Youtube, inserir no título do vídeo
o nome dos autores e a palavra “cover”. Desta maneira, caso o vídeo capte
algum dinheiro pelas visualizações, o detentor do direito autoral recebe o
recurso.
Os arranjos devem ser pensados de acordo com as capacidades do grupo
e os arranjadores também devem ter seu crédito na descrição dos vídeos.

1.2 Produção de guia

Depois de selecionada a música é hora de se preparar para as gravações.


Um elemento importante para isso é a guia de gravação. Mas para que
precisamos dela? Quando recebermos as gravações dos musicistas,
precisaremos sincronizá-las, ou seja, fazer com que todos os integrantes do
grupo estejam tocando juntos, como se estivessem reunidos de fato. Se cada
um gravar em um andamento diferente, essa tarefa será impossível de se
executar. Por essa razão, todos devem gravar ouvindo um áudio que servirá de
guia e irá garantir o sincronismo e viabilizar a afinação.
Para Banaha, foi oferecida aos cantores uma guia contendo o arranjo
instrumental já finalizado, acompanhado da melodia tocada por flauta. Nesse
caso, como se tratava de cânone, uma única guia servia a todas as vozes. Mas
se você tiver um coral a quatro vozes, por exemplo, irá precisar de uma guia para
cada uma das vozes: soprano, contralto, tenor e baixo.
Além dos sons musicais, a guia pode conter também orientações faladas
na gravação, como contagem de entrada, instruções de dinâmica e cortes.

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A guia pode ser produzida também em vídeo, ampliando, assim, as suas
possibilidades. Um vídeo com partitura pode servir como guia e dispensar o uso
da pasta do musicista.

Figura 2 – Guia com partitura

Crédito: Alysson Siqueira.

O vídeo da Figura 2 é de um arranjo a três vozes utilizado em alguns


portfólios do curso de Licenciatura em Música da Uninter. Além dos três
professores cantando as vozes do arranjo, há a partitura passando em tempo
real na parte inferior do vídeo.
Além da partitura, é possível inserir o regente do grupo no vídeo-guia,
orientando de maneira similar à presencial as entradas, os cortes, o andamento
e as dinâmicas.
As possibilidades são diversas e cada música irá trazer sua necessidade.
Mas você pode estar se perguntando: como colocar regência, partitura e áudio
em um mesmo vídeo-guia? As habilidades para resolver esta questão serão as
mesmas desenvolvidas em conteúdo posterior. Por hora, vamos finalizar os
preparativos para as gravações.

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TEMA 2 – CONJUNTO MUSICAL VIRTUAL: ORIENTAÇÕES PARA AS
GRAVAÇÕES

Orientações para gravação dos vídeos

Por mais que o grupo seja experiente, é sempre prudente enviar todas as
instruções para a gravação de maneira clara e objetiva aos musicistas. Seguem
algumas orientações imprescindíveis:

• Orientação da câmera: orientar que deve ser gravado com o celular na


vertical (retrato) ou na horizontal (paisagem). Para isso, é importante que
já se tenha uma ideia do layout do vídeo.

Figura 3 – Exemplos de layout

Crédito: Alysson Siqueira.

• Plano de fundo: irá depender da concepção do projeto como um todo. É


prudente que não se deixe totalmente livre para evitar situações que
inviabilizarão a utilização de algum vídeo.
• Iluminação: recomendar o uso de luz frontal, se possível, a própria luz do
dia. Também, havendo a possibilidade, é interessante iluminar o plano de
fundo para evitar sombras e destacar o plano principal, do musicista.

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Fundos brancos, pretos ou monocromáticos são sempre opções que
fornecem boas alternativas para edição.
• Qualidade do vídeo: é prudente orientar sobre a resolução do vídeo a
ser gravado. Resoluções muito diferentes serão nítidas no produto final.
A resolução de 1080 pixels é um padrão que funciona bem para a maioria
dos casos. Quanto mais pessoas fizerem parte do mosaico, menor pode
ser a resolução de cada vídeo. Vale ressaltar que é possível reduzir a
resolução do vídeo no processo de edição, mas aumentar só gera efeito
nominal. Quanto maior a qualidade de vídeo, maior a memória que ele
ocupa e, consequentemente, melhor deverá ser a configuração do
computador para a edição. Tudo isso deve ser considerado para a
definição da resolução.
• Monitoração e captação de áudio: explicar como funciona o processo é
sempre necessário. Se não fizer isso preventivamente, provavelmente
você terá que explicar pontualmente para os integrantes menos
experientes. Em geral, pode-se dizer “utilize um dispositivo para ouvir a
guia com fone de ouvido e outro para filmar a performance”. Não se
esqueça de orientar a colocar o celular da gravação em um suporte fixo,
seja em um pedestal próprio ou em um suporte improvisado.
• Postura e figurino: da mesma forma que o figurino, é necessário fazer
essas orientações preventivamente, e até mesmo para atender a
situações específicas do projeto, como, por exemplo, em grupos que
utilizam tipos diferentes de uniformes.
• Envio do vídeo: essa orientação é muito importante pois pode afetar a
qualidade do vídeo. Se o integrante mandar seu vídeo por uma rede
social, o arquivo será compactado e terá sua resolução reduzida. É
importante combinar uma maneira de envio sem perdas como, por
exemplo, gerar um link através de uma conta Google ou enviar
diretamente por e-mail, nos casos de arquivos não tão grandes.

Saiba mais
Essas instruções podem ser transmitidas por escrito ou através de um
videotutorial, como foi feito no caso de Banaha, e publicado no Youtube:
<https://www.youtube.com/watch?v=13CJa8vBGv0>. Acesso em: 5 out. 2021.

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Além das instruções contidas no vídeo, em sua descrição estão os links
necessários para a gravação.

Figura 4 – Descrição do vídeo de orientação de Banaha

Fonte: Vamos cantar!!! Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=13CJa8vBGv0>.

É importante que se estabeleça um prazo para envio das gravações,


mesmo que não haja uma data específica em que o vídeo necessite estrear.
Ao receber os arquivos, organize-os em pastas no seu computador e os
nomeie de uma maneira que você possa identificar de maneira clara o seu autor.
Isso facilitará o próximo passo: a edição.

TEMA 3 – CONJUNTO MUSICAL VIRTUAL: EDITANDO ÁUDIO

Edição de áudio para a produção musical remota

Os editores de vídeo disponíveis no mercado possuem já a funcionalidade


de edição de áudio embutida. Porém, a quantidade e qualidade de recursos que
um software específico para edição de áudio oferece é bem maior.
Pensando em um trabalho que provavelmente será postado no Youtube
e compartilhado em diversas redes sociais, e que algumas pessoas
provavelmente irão fazer o download para suas máquinas, precisamos zelar o

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máximo possível pela qualidade final do projeto. Por essa razão, editamos o
áudio em software de áudio e o vídeo em software de vídeo.
Como os integrantes de nossa prática virtual nos enviaram vídeo, o
primeiro passo necessário será converter os arquivos em áudio. Há diversas
maneiras de realizar essa operação. Há alguns sites na web que oferecem
gratuitamente esse serviço, e para encontrá-los basta digitar “mp4 para mp3” no
campo de busca do Google. Outra ferramenta que realiza a tarefa é a partir de
um software para edição de áudio como o SoundForge. Nesse caso basta
apenas abrir o vídeo nesse programa que ele irá exibir apenas o áudio, sendo
necessário apenas salvar o arquivo posteriormente como áudio (mp3 ou wave,
por exemplo).
Feita essa preparação inicial, podemos passar, agora, para a edição de
áudio propriamente dita.
Para a edição e mixagem do áudio, será necessário um software
denominado como Digital Audio Workstation, ou simplesmente DAW. Nesse tipo
de programa é possível sincronizar diversas faixas de áudio ao mesmo tempo,
suprimir ruídos, afinar, equalizar e criar a ambiência desejada para o projeto. É
sobre esses processos que falaremos aqui.
Existem diversas DAWs no mercado, sendo que algumas são gratuitas.
Uma das mais utilizadas é o Reaper, cuja versão mais atual possui dois meses
de gratuidade para avaliação.

Saiba mais
Para baixar o Reaper, acesse: <https://www.reaper.fm/download.php>.
Acesso em: 5 out. 2021.

A edição do áudio de Banaha foi feita no software Cubase, que também é


uma DAW. Como as diversas Digital Audio Workstations obedecem a princípios
semelhantes, apresentando a interface com usuário de maneira bastante similar,
os processos aqui indicados a partir do Cubase são facilmente transponíveis
para os outros programas, como o próprio Reaper, além de Pro Tools, Nuendo,
entre outros.
O primeiro passo será abrir um projeto – um arquivo novo para a edição
de áudio. Se você já produziu a guia de gravação na sua DAW, pode aproveitar
esse mesmo projeto e salvá-lo com outro nome. No caso de Banaha, foi isso que
fizemos. O projeto da guia possuía quatro trilhas, como podemos observar a
seguir.
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Figura 5 – Projeto da guia de Banaha

Crédito: Alysson Siqueira/Cubase Elements 8.

Para a produção da guia de Banaha, partiu-se de um loop de percussão,


o qual foi repetido pela música toda. Com base nele, foi gravado o piano no
formato MIDI1, com auxílio de um teclado controlador. Da mesma maneira, foi
gravada a melodia, utilizando o timbre de flauta. Uma das vantagens de utilizar
essas trilhas MIDI é a possibilidade de mudar os timbres posteriormente.
No caso descrito, a base produzida para a guia seria a mesma do produto
final. Sempre que puder, faça dessa maneira, pois assim você irá otimizar o
tempo de produção, além de ter mais chances das gravações dos integrantes se
compatibilizarem com a base instrumental.
Depois de criado o arquivo para a edição de áudio, segue uma série de
operações, cuja ordem pode variar de acordo com a realidade e a preferência de
cada produtor. Como ponto de partida, sugerimos a seguinte sequência:

3.1 Montagem do projeto de áudio

Ao abrir um novo projeto de áudio, cada gravação dos integrantes da


prática deverá ocupar uma nova trilha.

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O protocolo MIDI é um pacote de dados que transmite informações sobre altura, duração, intensidade,
timbre, entre outras, de cada nota musical. O dispositivo de saída recebe esses dados e transforma em
sons.
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Figura 6 – Inserção de áudios no projeto

Crédito: Alysson Siqueira/Cubase Elements 8.

Procure inserir primeiro as gravações mais precisas, no tocante à afinação


e à rítmica de cada naipe – elas servirão como referência para as demais.
Normalmente, para inserir uma nova faixa de áudio basta arrastar o
arquivo de sua pasta de origem para a janela da DAW. Mas em alguns softwares
pode ser necessário importar o arquivo de áudio.

3.2 Sincronização inicial

O primeiro arquivo de áudio deve ser sincronizado à guia e os demais


devem tomar esta primeira gravação como referência. Trata-se de um processo
que envolve um alinhamento visual entre as faixas de áudio, executado por meio
do deslocamento horizontal manual de uma das faixas, seguido de uma
conferência auditiva.

Figura 7 – Sincronização inicial

Crédito: Alysson Siqueira/Cubase Elements 8.

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Repare que, na Figura 7, as representações gráficas dos dois sons têm
representações semelhantes. A sincronização visual ocorre, então, por meio da
busca pela coincidência dessas figuras, sobretudo dos picos de intensidade
correspondentes.
A conferência auditiva é necessária por conta da imprecisão natural do
ser humano. Muitas vezes o alinhamento visual aparentemente perfeito de um
evento sonoro específico implica no desalinhamento de todo o resto. Nesse
ponto, o editor de áudio precisa contar com a percepção musical acurada para
encontrar a melhor opção de alinhamento.

3.3 Cortes e fades

Depois dessa primeira sincronização, é preciso cortar tudo que não será
necessário nas faixas de áudio, como longos períodos de silêncio, por exemplo.
Após executar um corte, é necessário fazer uma suavização da intensidade, por
meio do recurso chamado fade. O fade in é utilizado no início do áudio, para
realizar um acréscimo de ganho gradual, do silêncio ao máximo, e o fade out, de
maneira semelhante, promove uma diminuição gradual do ganho.

Figura 8 – Fade in e fade out

Crédito: Alysson Siqueira/Cubase Elements 8.

3.4 Sincronização fina

Mesmo depois de todos os áudios estarem sincronizados entre si, o fator


humano mais uma vez pode causar imprecisões muito perceptíveis. Nesse caso,
é preciso identificar os pontos e as vozes ou instrumentos que estão gerando a
imprecisão. Para isso, primeiro anote o momento em que ocorrem essas
imprecisões, depois coloque para reproduzir apenas a voz de referência e vá

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adicionando as demais. Quando perceber a imprecisão, ela certamente estará
na última voz adicionada.
A solução dos problemas de sincronia fina pode se dar por operações
manuais de cortes, deslocamentos e fades, ou por processos automáticos,
contando com recurso específico da própria DAW, ou de plug-ins2, como o
Melodyne.

3.5 Afinação

Diferenças sutis de afinação entre vozes são naturais, e também são um


dos fatores que geram a sensação de aumento da massa sonora, chamada de
chorus – outros fatores são as pequenas imprecisões de sincronia e as
diferenças entre os timbres vocais. Porém, variações de afinação muito grandes
podem comprometer esse efeito de chorus, ou então, em uma música com voz
ou instrumento solo, podem gerar choques indesejáveis entre melodia e
harmonia. Nesses casos há a possibilidade de usar um plugin, muitas vezes já
integrante do pacote da DAW, que faz as correções em tempo real, sem
modificar o áudio original, mas alterando a afinação automaticamente, à medida
que os erros aparecem. O problema é que esses ajustes automáticos soam
muito artificiais quanto mais imprecisas forem as notas. A solução que oferece
mais recursos é utilizar plug-ins desenvolvidos para essa finalidade, como o
Melodyne e o AutoTune. Nesses programas é possível fazer uma varredura
inicial na faixa de áudio e aplicar ajustes automáticos e/ou manuais de maneira
bastante intuitiva, podendo atuar somente naqueles pontos mais críticos da
afinação.

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Plug-ins são softwares executados dentro de outro programa. Os efeitos sonoros dentro das DAWs são
exemplos de plug-in.
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Figura 9 – Afinação

Crédito: Alysson Siqueira/Melodyne.

3.6 Mixagem

O processo de mixagem consiste na mistura das faixas de áudio de um


projeto. Todas as faixas já editadas precisam agora ser ajustadas entre si com o
objetivo de uni-las em um único e coeso áudio estéreo. A complicação em
relação às práticas remotas é que cada integrante gravou sua parte em
ambientes diferentes, na maioria das vezes sem um tratamento acústico
adequado. O resultado é que cada áudio individualmente tem sua própria
ambiência, e aqueles que já se pode perceber bastante reverberação não se
deve incluir o efeito de reverb. Naqueles áudios mais “secos”, ou seja, sem muita
reverberação, será necessário incluir o efeito. De resto, o que temos a fazer é
equilibrar as intensidades das vozes e distribuí-las lateralmente (L e R) com a
intenção de criar uma concepção espacial para a mixagem. Depois desses
ajustes, é feita a exportação para um arquivo único de áudio que, dependendo
da DAW, pode ser chamada de mixdown, exportação, renderização etc.
Após a produção do áudio, o próximo passo será a edição do vídeo.

TEMA 4 – CONJUNTO MUSICAL VIRTUAL: EDITANDO VÍDEO

Edição de vídeo para finalização da produção

Para esta etapa da produção, será necessário um software para edição


de vídeo. Existem diversos editores de vídeo gratuitos que você pode encontrar
a partir de uma busca na web, como o DaVinci Resolve e o Shotcut. Dependendo
da complexidade do seu projeto, eles podem servir. Adobe Premiere, Vegas Pro,

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Final Cut, por exemplo, são editores de vídeo utilizados pelos profissionais da
área.
Mas, a exemplo dos softwares de áudio, a lógica de operação é bastante
similar entre os editores de vídeo, o que nos permite orientar essa etapa da
produção a partir do software que utilizamos em Banaha, considerando
extensível aos demais programas de edição de vídeo.
Basicamente, nesse processo, precisamos considerar a composição da
cena e suas alterações ao longo do tempo, sempre tomando como referência a
mixagem de áudio, que servirá como guia para a edição de vídeo.

4.1 Composição da cena

Em audiovisual, um conceito bastante discutido é a diegese. Os sons que


ouvimos e podemos identificar sua fonte na cena são chamados diegéticos, e
aqueles cuja fonte não é revelada pela imagem são os não diegéticos.
Considerando que estamos trabalhando em uma versão virtual de uma prática
musical, podemos entender que nosso tratamento será, a priori, diegético.
No caso de Banaha, optamos por não mostrar imagens dos instrumentos
de base, como o piano e a percussão, para ressaltar o protagonismo dos
estudantes e dos professores na prática coral. A partir disso, deu-se a
composição das cenas.
É importante compreender a influência de todo o processo, também,
nesse estágio. As gravações foram solicitadas de maneira geral a todas as
pessoas que acompanharam as oficinas de Canto Coral. Não havia como prever
quantas contribuições receberíamos e, por conta disso, não havia um projeto
inicial das cenas. Quando se pode prever o número de integrantes, é possível
pensar nas cenas já na preparação do material, como vimos anteriormente.
Como Banaha era um cânone a três vozes, optou-se por dispor os
cantores do mesmo grupo na mesma linha horizontal, gerando, no momento em
que todos cantam simultaneamente, a seguinte cena:

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Figura 10 – Banaha – cena geral

Fonte: captura de tela de <https://www.youtube.com/watch?v=EMQ2qJIsELU>.

Perceba que, mesmo com as instruções, nem todos os vídeos foram


gravados com a mesma orientação. Mesmo assim, foi possível fazer a
composição das imagens, de modo a deixar cada grupo na mesma linha
horizontal.
Optou-se também por deixar um espaçamento entre cada integrante,
dando, assim, o aspecto de margem. É possível perceber que as margens
ficaram com espessura variável. Caso se optasse por deixá-las com a mesma
espessura, poderíamos lançar mão da utilização de um gabarito, composto por
um conjunto de linhas da espessura desejada que se sobrepõe a toda a cena.

Figura 11 – Aplicação de gabarito

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Fonte: elaborada com base na captura de tela de
<https://www.youtube.com/watch?v=EMQ2qJIsELU>.

4.2 Roteirização

O roteiro é fundamental para a produção ideal. Em uma situação ideal, ele


deve ser a base de todo processo, inclusive da captação de som e imagem. Em
um vídeo musical, a própria música é a base do roteiro. Com base nela, pode-
se pensar na composição e na sucessão das cenas.
Se olharmos para o projeto de Banaha, podemos ter um vislumbre da
sucessão de cenas que a própria música sugere.

Figura 12 – Visão geral do projeto de áudio

Crédito: Alysson Siqueira/Cubase Elements 8.

Nas cores vermelho, verde e azul estão as faixas de áudio dos cantores
dos grupos 1, 2 e 3, respectivamente. Em laranja está o áudio de um xequerê
miniatura, gravado para agregar um novo elemento na segunda parte da música.
Em amarelo está o áudio da guitarra, que foi replicado em dois outros canais
com defasagem de tempo para gerar também um cânone.
Pensando a partir do ponto de vista dos sons diegéticos, a sucessão de
cenas mais evidente possível é a seguinte:

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Figura 13 – Definição de cenas de acordo com o projeto de áudio

Crédito: Alysson Siqueira/Cubase Elements 8.

Podemos observar a existência de nove cenas, sendo que a de número


7, por agregar todos os grupos mais o xequerê, foi tomada como base, sendo
que as demais são obtidas pela subtração dos grupos. Sendo assim, essa
sequência de cenas definidas se materializou nas seguintes imagens:

Figura 14 – Layout das cenas de Banaha

Crédito: Alysson Siqueira.

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As cenas 4, 5 e 6 foram criadas para suprir a demanda do solo de guitarra.
Nesse momento, entra também o xequerê que acaba amarrando a sequência do
solo com a cena 7.
Além de definir a sequência e o layout das cenas, há uma série de outras
escolhas estéticas que precisam ser levadas em conta na edição, tais como
definir as transições entre as cenas, de que maneira os integrantes da prática
irão entrar e sair de cena, inserção de outras imagens, como logotipo, edição de
títulos, legendas e créditos, além de uma ampla possibilidade de animações que
se abrem à medida que os desafios da prática de edição de vídeo se sucedem.
Esses foram alguns princípios de edição de vídeo que trouxemos para
orientar o seu trabalho como produtor de práticas remotas. Evoluir nessa questão
depende de muita prática, pesquisa de referências e de tutoriais para auxiliar a
resolver os novos desafios que cada projeto lhe trará. É importante também que
você mesmo se desafie, buscando sempre agregar uma nova técnica, um novo
recurso, a cada projeto.

TEMA 5 – LIVES MUSICAIS: STREAMING

Técnicas e tecnologias para realização de lives ao vivo

Assim como tantos outros recursos, já era possível transmitir ao vivo por
sites como Youtube e redes sociais como o Facebook antes mesmo da
pandemia de COVID-19. Porém, o evento de nível global transformou o que
antes era uma possibilidade pouco utilizada pelos músicos em uma necessidade
para amenizar os impactos do distanciamento social. Desde artistas de alto apelo
midiático, como Alok e Ivete Sangalo, até os músicos que conquistavam seu
sustendo tocando em happy hours passaram a utilizar as ferramentas de
transmissão ao vivo – os chamados streamings.
Todo esse cenário ofereceu à cadeia produtiva da música novas
competências e ferramentas tecnológicas que serão incorporadas aos seus
fazeres musicais de maneira definitiva. E é sobre algumas dessas ferramentas
e suas possibilidades que falaremos nesta aula.

5.1 Streaming: princípios e ferramentas

A tradução literal da palavra streaming para o português é transmissão.


Algo que, até o início dos anos 1990 só era delegado a emissoras de rádio e
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televisão, com a revolução da internet passou a ser cada vez mais
disponibilizado a outros segmentos e ao público em geral. Nesse aspecto, o Real
Audio, plataforma da Progressive Networks, popularizou-se em 1995 como
pioneira na transmissão de áudio ao vivo (Zoeweb, 2018). Podemos considerar
que plataformas como Spotify, Deezer e Apple Music são decorrentes desse
mesmo conceito que, expandido para o vídeo, culminou no surgimento de Netflix,
Amazon Prime, Disney+, entre outras. Em comum, é que todas essas empresas
são gigantes e o público em geral acessa seu conteúdo por demanda, ou on
demand, apenas como compositor.
Mas as possibilidades que se abriram a grandes multinacionais também
se ofereceram a todas as pessoas quando plataformas como Youtube,
Facebook, Vimeo, entre outras, possibilitaram que os usuários atuassem
também como criadores de conteúdo. Primeiro, isso ocorreu por meio da
possibilidade de carregar vídeos que ficariam disponíveis a outros usuários para
acesso por demanda. Mais tarde, passou a ser possível transmitir vídeos em
tempo real – o que finalmente viabiliza a realização de lives musicais.
Antes mesmo de 2020, já era possível realizar um show e transmitir por
Youtube ou Facebook, mas poucas pessoas utilizavam este recurso. Qualquer
pessoa com uma conta nessas plataformas poderia fazer uma transmissão, mas
isso ainda não fazia parte do cotidiano das pessoas e parecia uma realidade
ainda muito distante.
Com a necessidade que se interpôs, não só se incluiu esse recurso em
nossa normalidade, como se encontrou diversas ferramentas que possibilitam a
transmissão por plataformas da internet de maneira bastante profissional. Entre
elas, destacamos o OBS Studio e o Streamyard – plataforma em que iremos nos
concentrar nesta aula.

Saiba mais
O OBS Studio está disponível em: <https://obsproject.com/>. Acesso em:
5 out. 2021.
O Streamyard está disponível em: <https://streamyard.com/>. Acesso em:
5 out. 2021.

Tanto o OBS quanto o Stramyard podem ser considerados como


ferramentas para edição ao vivo de vídeo e transmissão. Porém, o público não
irá assistir as lives por essas plataformas, pois elas direcionam essa transmissão

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para outras plataformas, como Youtube e Facebook, a partir das quais o
conteúdo pode ser acessado.
Para utilizar o Streamyard, basta acessar o site e se cadastrar. Ao fazê-
lo, você pode também cadastrar as plataformas, e suas respectivas contas, para
as quais você irá transmitir. É possível incluir ou remover contas a qualquer
tempo também pelo menu “Destinos”.

Figura 15 – Tela inicial do Streamyard

Crédito: Alysson Siqueira/Streamyard.

Clicando em “Criar uma transmissão” é possível agendar sua live, colocar


imagem de apresentação, título, descrição e selecionar o(s) destinos.
Na hora da transmissão, ou durante os testes, ao entrar no estúdio virtual,
você primeiro será direcionado a uma janela de configurações de áudio e vídeo.
O estúdio virtual do Streamyard oferece diversas possibilidades de
personalização da cena, que aumenta à medida que são adquiridos pacotes de
acesso mais avançado. Mas mesmo no modo gratuito, é possível ter acesso a
alguns desses recursos.

Figura 16 – Estúdio Virtual do Streamyard

Crédito: Alysson Siqueira/Streamyard.

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A operação dessa ferramenta é bastante intuitiva e o bom aproveitamento
de todos os seus recursos demanda bastante prática. Além disso, como ela não
é a única ferramenta do gênero, e provavelmente outras tantas ainda surgirão,
vamos nos ater, de agora em diante, a detalhes técnicos de som e imagem
aplicáveis às ferramentas de streaming de modo geral.

TEMA 6 – LUZ, CÂMERA E SOM

Tão importante quanto dominar as plataformas para streaming, é saber


utilizar os equipamentos de maneira correta. Muitas vezes não haverá recursos
para comprar os equipamentos ideais, mas obedecendo alguns princípios
básicos em relação às configurações da câmera disponível e ao uso da luz e do
som, é possível alcançar ótimos resultados.

6.1 Escolha da câmera

Tratando de equipamentos para transmissão de vídeo, podemos partir do


mais básico possível: o telefone celular. Os chamados smartphones são nada
menos do que computadores portáteis, com câmera, microfone e autofalante
embutidos, ou seja, todos os dispositivos de áudio e vídeo que se precisa em um
só. Além disso, ele naturalmente já estará conectado a uma rede de internet
móvel ou wifi, isto é, está mais do que pronto para transmitir.
Obviamente, nem todo celular terá uma câmera de boa qualidade, bem
como captação de áudio adequada para lives musicais. O importante é que, se
esse for o equipamento escolhido, seja utilizado um fone de ouvido, evitando que
o microfone capte novamente o som emitido pelo autofalante, gerando, assim, a
ocorrência de eco.
Tratando-se de câmera, é possível também utilizar a câmera embutida do
notebook, ou ainda as chamadas webcams, desenvolvidas para essa finalidade
específica. É possível também utilizar a câmera do celular como webcam, a partir
do uso de um aplicativo específico para isso, como o Droidcam. Além disso,
alguns fabricantes de câmeras profissionais estão desenvolvendo drivers para
utilizar seus equipamentos com conexão USB como câmeras para transmissões.
Independentemente da câmera que se utilize, a resolução máxima
admitida no Streamyard é de 720p, correspondente a uma tela de 1280 x 720
pixels. Mais do que isso, é preciso compatibilizar a resolução da tela com a

23
velocidade da conexão da internet. Em alguns casos, a opção pela resolução
mais alta resulta em problemas na transmissão de vídeo.
Mas mesmo uma boa câmera e uma conexão muito rápida não são
garantia de uma boa imagem. Um quesito fundamental para tanto é a luz.

6.2 Recomendações quanto ao uso da luz

Algumas câmeras compensam muito bem a falta de luz, mas a maioria


não tem o mesmo comportamento nessa situação. É fundamental que se tenha
ao menos uma luz direta iluminando a pessoa que está transmitido. Pode ser
uma luminária, um abajur, ou, se puder investir, uma ring light.

Figura 17 – Ring light

Crédito: Alysson Siqueira.

Essa luz que irá iluminar o personagem, ou grupo, que está em foco pode
ser chamada de iluminação principal. Além desses dispositivos portáteis
indicados, pode-se utilizar os comerciais, como uma soft box, que também pode
ser improvisada de modo caseiro.

24
Figura 18 – Soft box

Crédito: Alysson Siqueira.

A soft box proporciona uma iluminação mais uniforme, com sombras


menos destacadas, similar à luz do dia. Quanto mais desses dispositivos utilizar,
mais se elimina as sombras.

Saiba mais
Para saber como fazer uma soft box caseira, acesse o link:
<https://www.youtube.com/watch?v=IBgd3QkIbq0&t=138s>. Acesso em: 5 out.
2021.

Além da luz principal ainda é possível trabalhar com uma backlight, ou luz
de fundo, que serve para definir o contorno da figura em destaque, e também
com a iluminação de cenário. A designer Bianca Ortiz Siqueira demonstrou o
efeito que essas luzes proporcionam durante a “I Semana de Linguagens
Cultural e Corporal”.

25
Figura 19 – Iluminação de preenchimento

Crédito: Alysson Siqueira.

Uma boa iluminação é o segredo para uma boa composição estética da


imagem. Além das recomendações que apresentamos, lâmpadas de led de
todos os tipos estão cada vez mais acessíveis e são uma excelente alternativa
para compor a luz do cenário.

6.3 Sonorização da live

Quanto ao som para lives, para obter resultados melhores que os


proporcionados por microfones já integrado aos dispositivos (celular,
computador etc.), é possível utilizar uma interface de áudio ou uma mesa de
som. Se a mesa for analógica, a conversão para áudio digital será feita dentro
do próprio computador, ocupando, assim, alguma capacidade de
processamento. A vantagem de interfaces de áudio ou mesas de som digitais é
que o processamento é feito externamente ao computador, deixando mais
capacidade de processamento para outras tarefas, como o próprio streaming.
A escolha desse dispositivo externo passa pela avaliação de diversos
fatores, como custos, quantidades de vozes e instrumentos, entre outros. O que
importa é estabelecer que em uma transmissão é possível ter diversas câmeras,
mas o áudio de apenas uma delas deve ser transmitido, enquanto os outros
devem ser mantidos no modo mudo.

26
Figura 20 – Possibilidade de live com várias câmeras

Crédito: Alysson Siqueira.

A imagem mostra uma live feita com três câmeras pelo Streamyard. Nela,
apenas o som vinculado à imagem da direita era transmitido.
Para fazer transmissões pelo Streamyard com diversas câmeras, basta
entrar no estúdio virtual com dispositivos diferentes. No caso, foi utilizado um
notebook, outro computador com webcam e um aparelho celular.
Uma última dica sobre o som para lives: as ferramentas como o
Streamyard, e até mesmo as de vídeo conferência, possuem um recurso para
eliminar ruídos em conversas, ou para silenciar automaticamente os microfones
das pessoas que não estão emitindo som. No Streamyard esse recurso se
chama “Ajustar automaticamente o volume do microfone”, fica nas configurações
de áudio, e deve ser desabilitado, pois pode cortar inícios e fins de frases
musicais.

TEMA 7 – IDEIAS PARA PERFORMANCE MUSICAL SEMISSÍNCRONA

Técnicas para apresentações mistas: assíncronas e síncronas

Entre as práticas musicais totalmente produzidas de maneira prévia, e


aquelas executadas em tempo real, como as lives, existe um campo a ser
explorado que pode misturar os dois conceitos, que envolve a possibilidade de
trabalhar com parte da apresentação produzida de maneira antecipada e a outra
parte ao vivo.
A ideia não é nova, pois é muito parecida com a prática de se apresentar
com parte do arranjo em playback. Isso já é difundido desde a década de 1990,
quando surgiu a possibilidade de produzir música no PC, e de antes disso até,

27
com o uso do protocolo MIDI para programar teclados para executar arranjos
mais complexos do que a quantidade de músicos de um grupo poderia executar.
A novidade é, na verdade, a aplicação do conceito em práticas musicais
remotas, e nós iremos analisar aqui dois exemplos que podem nos servir como
inspiração para propormos soluções aos nossos grupos.

7.1 Banda playback

Em 23 de agosto de 2020, a banda Fresno promoveu a live “Quarentemo


2.0”, transmitida pelo canal do grupo no Youtube. Em determinado momento da
transmissão, o vocalista da banda anuncia que terá uma apresentação ao vivo
da banda toda.

Saiba mais
Acesse a live da banda Fresno no link:
<https://www.youtube.com/watch?v=Cc9H8bWMJ2c>. Acesso em: 5 out. 2021.

Na verdade, a estratégia da banda foi de pré-produzir a gravação dos


outros dois integrantes e somente o vocalista tocou ao vivo. Por essa razão pode
ser classificada como uma performance semissíncrona.
A grande questão para nós é: como fazer isso? E por volta da 1h e 30 min
da live, encontramos a explicação. A ferramenta utilizada para o streaming foi o
OBS e, previamente, foi produzido vídeos dos dois outros integrantes da banda,
tocando seus instrumentos, com um vazio entre eles, onde o vocalista poderia
aparecer para tocar e cantar ao vivo. Esse tipo de vídeo é chamado de
transparente, e para ficar com essas lacunas ele utiliza o sistema de cores RGB
alpha, em que R significa red, G green, B blue e o alpha é justamente a
transparência.
Poderia utilizar esse recurso no Streamyard? A resposta é: ainda não.
Isso porque o formato de vídeo aceito por essa plataforma é o mp4, que ainda
não comporta o sistema de cores RGB alpha. Porém, com a velocidade dos
avanços tecnológicos, essa é uma informação que deve ser sempre verificada.
A opção que temos para o Streamyard é compartilhar um vídeo pré-produzido
em uma das opções de janela que a plataforma disponibiliza, como foi feito pelos
professores de Licenciatura em Música em um evento de extensão realizado em
2020.

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Figura 21 – Layout de abertura de evento de extensão

Fonte: captura de tela de <https://www.youtube.com/watch?v=OZbSkZxZ6UQ>.


Crédito: Alysson Siqueira.

Nesse caso, o violão foi gravado previamente e a professora que tocou a


flauta também compartilhou o vídeo, evitando, assim, problemas de sincronia. A
experiência funcionou, porém no Streamyard não há muitas opções de
personalização de cena.

7.2 Tocando com o colega

Há uma forma quase síncrona de se tocar em dupla. Durante uma oficina


de construção de instrumentos transmitida pelo Facebook, a professora tocou
ukulelê e cantou ao vivo, aparecendo na TV, enquanto o professor a
acompanhou na percussão.

Figura 22 – Layout da oficina de construção de instrumentos

Crédito: Alysson Siqueira.

29
Em um computador, os professores se conectaram por meio da
ferramenta de conferências institucional e a transmissão via Streamyard foi feita
por um segundo computador. Os professores se comunicavam pela ferramenta
de conferência apenas e, na hora de tocar, a professora desabilitava o áudio do
professor, que a acompanhava sem que ela o ouvisse.
Com um monitor de melhor qualidade, utilizando mesa de som para inserir
o áudio de um computador no outro, o resultado poderia ser melhor. Fica a ideia
para as suas práticas também.

TEMA 8 – PRÁTICA MUSICAL REMOTA: OUTRAS POSSIBILIDADES

Avanços nas práticas musicais síncronas à distância e outras


possibilidades de trabalho colaborativo à distância

Quem já participou de uma festa de aniversário online sabe que cantar


Parabéns a Você se torna um verdadeiro caos. Por que cada um canta em um
tempo diferente? A resposta é bem simples: porque quando você ouve o som de
alguém ele já faz parte do passado. Por isso é impossível produzir sons
perfeitamente sincronizados. Há uma tolerância para isso, e no caso das
transmissões e das conferências, estamos ainda muito longe do tolerável, de
maneira geral.
Enquanto alguns buscam solução para esse problema, outros se divertem
com práticas assíncronas que permitem encontros de cantores mesmo à
distância. É o que promove o aplicativo Smule, sobre o qual também iremos falar.
E para fechar o tema, ampliaremos o campo das possibilidades de
práticas remotas com possibilidades de criação e produção musical remotas.

8.1 A guerra contra a latência

A latência é o tempo que o som leva para chegar ao ouvinte depois de ser
produzido. Ela ocorre em relações presenciais e virtuais.
Imagine que você está em uma performance musical acústica com mais
um musicista. Quando ele tocar seu instrumento o som irá se propagar pelo ar
até chegar aos seus ouvidos, e só então você reage. Sabemos que o som se
propaga no ar a uma velocidade de aproximadamente 340 metros por segundo
(Siqueira, 2020). Então, se vocês estiverem a 3,4 metros de distância, o som

30
levará 1 centésimo de segundo, ou 10 milésimos de segundo (ms), para viajar
entre vocês. Podemos dizer, nesse caso, que a latência é de 10 ms, mas está
completamente dentro do limite tolerável da sincronia: até 30 ms, o que ocorre a
uma distância de aproximadamente 10 metros.
Ocorre que as ferramentas de streaming e de conferências disponíveis
oferecem uma latência da ordem de 500 ms, ou meio segundo, que torna
completamente inviável sincronizar a performance musical por meio delas.
Diversos fatores contribuem para isso: primeiro a velocidade de conversão do
áudio analógico para digital, depois a velocidade de transmissão dos dados dos
diversos usuários envolvidos, e até mesmo a velocidade da luz, de 300 milhões
de metros por segundo, que limita a distância a cerca de 9.000 km, ou um pouco
menos que a distância entre São Paulo e Paris.
Apesar das dificuldades, alguns pesquisadores resolveram buscar
soluções para o problema da latência. Assim, em uma parceria entre o Centro
de Pesquisa Computacional em Música e Acústica (CCRMA) da Universidade
de Stanford e a empresa de software Silicon Valley, surgiu a Fundação Jacktrip,
que desenvolve o software de mesmo nome, com o objetivo de possibilitar
práticas musicais síncronas.
O princípio do Jacktrip é otimizar a transmissão dos dados de áudios,
fazendo-os circular de maneira mais eficiente e com a melhor qualidade possível.
É uma questão de programação, ou seja, de ajustar os algoritmos para essa
finalidade.
Em condições ideais, com placas de som de baixa latência e velocidade
alta de transmissão de dados, o raio de alcance do software é de cerca de 800km
– distância até a qual se tem a sensação de sincronia (Jacktrip, 2020).
Se por um lado as pesquisas da Fundação Jacktrip são uma esperança
para as práticas musicais remotas síncronas, revelam também uma limitação
física, natural: não será possível, tão cedo, daquele músico paulista fazer uma
jam session com o seu amigo que mora em Paris.

8.2 Vem cantar comigo

Se por um lado todo o processo descrito entre os temas 1 e 4 pode resultar


em produto de qualidade profissional e totalmente personalizada, por outro lado
ele pode demandar um tempo que talvez não se tenha para a produção. Para
esses casos é possível encontrar algumas soluções no mercado de aplicativos
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para celulares. Umas delas é o app Virtual Choir, que automatiza todo processo
de edição, mas ainda assim necessita do preparo de uma guia. Outra alternativa
já bastante difundida entre os cantores é o aplicativo Smule, do qual iremos tratar
neste momento.
O Smule é um aplicativo de celular de karaokê que permite gravar você
cantando, seja solo ou em parceria com um ou mais cantores.
Para gravar um vídeo musical do seu grupo, basta todos os integrantes
possuírem o aplicativo instalado no celular, um fone de ouvido e um dos
integrantes ter acesso VIP ao aplicativo, que requer pagamento de uma taxa
anual. Com o acesso VIP é possível escolher a música dentro do catálogo de
playbacks do Smule, ou fazer o upload de um playback do seu arquivo pessoal,
abrindo a possibilidade de cantar solo, em dueto ou em grupo. Com o acesso
gratuito é possível apenas acessar músicas que foram abertas por outras contas
VIP.
Para utilizar o Smule como uma ferramenta para práticas musicais em
conjunto, o integrante com acesso VIP escolhe a música que o grupo deseja
executar. Em seguida, abrirá uma janela na qual é possível escolher a
modalidade que deseja cantar, no caso em “Grupo”. Depois abrirá outra tela
onde é possível escolher um filtro para o vídeo, e depois disso é só apertar no
botão “iniciar” e cantar a música. Após o término da música, é possível regular o
volume da sua voz na gravação, buscando sempre o equilíbrio das vozes. Caso
a gravação tenha saído de forma satisfatória é só clicar no botão “Continuar”, do
contrário, é possível regravar. Na sequência, haverá algumas configurações e
será possível escolher para quem mandar essa gravação. É possível também
convidar as pessoas a partir de um link que pode ser gerado no aplicativo e
enviado da maneira adequada ao grupo.
A cada nova gravação no projeto o aplicativo edita automaticamente o
vídeo, sendo possível assim monitorar o processo. Após aberto o projeto, os
cantores terão 14 dias para gravar e, depois desse prazo, a edição final fica salva
no Smule, podendo ser compartilhada em redes sociais e também baixada para
o dispositivo pessoal.

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8.3 Produção musical colaborativa

Vamos, agora, extrapolar o conceito de práticas musicais para além da


performance. Há possibilidades de trabalho à distância colaborativo nas áreas
de composição, arranjo e produção musical.
O Flat é um software para edição de partituras online e que pode ser
usado para escrever música e arranjos de maneira colaborativa. Basta abrir uma
nova partitura e compartilhá-la com outro usuário do Flat, ou gerar um link para
compartilhamento.

Figura 23 – Projeto de partitura do Flat

Fonte: captura de tela de <https://flat.io>.


Crédito: Alysson Siqueira.

Ao finalizar o projeto, é possível exportá-lo para PDF, que permite a


impressão, para midi, que possibilita sua utilização em projetos de gravação, e
também para MusicXML, formato que pode ser aberto em diversos editores de
partitura.
Além de editor de partituras, existem DAWs colaborativas, como o
Cakewalk BandLab.

Saiba mais
O Cakewalk BandLab está disponível em: <https://www.bandlab.com/>.
Acesso em: 5 out. 2021.

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Figura 24 – Projeto do Cakewalk BandLab

Crédito: Alysson Siqueira/BandLab.

O BandLab utiliza a lógica de multipistas comum a todas as DAWs e,


embora tenha recursos limitados, oferece excelentes alternativas para produção
musical colaborativa e de maneira bastante intuitiva. Há loops de instrumentos
virtuais que podem ser utilizados nas produções, além da possibilidade de gravar
e também utilizar áudios previamente preparados em outros softwares.
Para trabalhar de maneira colaborativa no BandLab, basta convidar um
usuário cadastrado ou gerar um link de compartilhamento. A qualquer momento,
os usuários convidados poderão incluir novas faixas, gravar e importar arquivos
de áudio, entre outras funções.
Ao final da produção, é possível exportar as faixas separadamente ou a
mixdown do projeto em diversos formatos possíveis.
Agora que você conhece essas possibilidades, faça um teste: convide
seus parceiros de música e criem, arranjem e produzam à vontade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A música possui uma vocação natural para reunir pessoas, não só


aquelas envolvidas na produção musical propriamente dita, mas também
aquelas que fruem do espetáculo. Em uma prática presencial, aliás, o público
acaba assumindo a coparticipação na produção sonora, com aplausos, canto,
palmas e demais reações espontâneas.
Nada substituirá essa prática presencial em sua plenitude, mas em
situações em que ela não seja possível, as técnicas que dispomos para práticas
musicais remotas podem suprir, em partes, a ausência de contato físico.
Assim, fazer música em conjunto, ganha novas possibilidades a partir dos
anos 2020. As tecnologias que já existiam afloraram definitivamente e passaram

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a estar disponíveis a todos para viabilizar práticas presenciais, semipresenciais
e remotas, e estas à distância podendo ser síncronas, assíncronas e
semissícronas.
O que podemos esperar para o futuro é que essas tecnologias
emergentes promovam, por meio da criatividade que nos é inerente, práticas e
espetáculos musicais cada vez mais surpreendentes.

INDICAÇÃO DE 2 ARTIGOS

• Disponível em: <http://seer.unirio.br/simpom/article/view/5807/5243>.


Acesso em: 5 out. 2021.
• Disponível em
<http://seer.fundarte.rs.gov.br/index.php/revistadafundarte/article/view/85
3/pdf_157>. Acesso em: 5 out. 2021.

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REFERÊNCIAS

JACKTRIP. Tecnology. Disponível em: <www.jacktrip.org>. Acesso em 11 de


jul. 2021.

SIQUEIRA, A. Acústica. 1. ed. Curitiba: InterSaberes, 2020.

VASCONCELOS, N. História do streaming. Zoeweb. 2018. Disponível em:


<https://zoeweb.com.br/historia-do-streaming>. Acesso em: 5 out. 2021.

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