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PARNASIANISMO

O Parnasianismo foi, originalmente, um movimento literário francês, cujo início se costuma


demarcar com a publicação da coletânea Le Parnase contemporain (1866), que apareceria mais duas
vezes: em 1871 e 1876. Tal coletânea reunia poetas de tendências diversas, mas, em sua maioria, movidos
pelo desejo de reagir contra o sentimentalismo romântico.

Os parnasianos elegiam como seus mestres os poetas Leconte de Lisle, Charles Baudelaire e


Théophile Gautier. Este último, apesar de ainda sofrer influência da estética romântica, pregava a
necessidade do rigor formal na composição poética, a busca de imagens que sugerissem plasticidade e o
abandono do subjetivismo. Na opinião de Gautier, a palavra deveria ser tratada como um objeto - e o
poema deveria nascer da reflexão, e não do automatismo da inspiração (ou entusiasmo criador) cultuada
pelos românticos.
É dessas ideias que nasce a teoria da arte pela arte, segundo a qual o único e verdadeiro sentido da
produção artística deve ser o da criação do belo. Ou seja, o fenômeno artístico é, ele próprio, o único fim
que a arte deve almejar.

Beleza e vigor poéticos

No Brasil, os primórdios do parnasianismo podem ser encontrados na poesia científica (ou


filosófico-científica), segundo a qual os poetas deveriam conhecer os princípios filosóficos e, por meio
deles, exercer a crítica em relação à vida e aos valores de seu tempo, e na poesia socialista, que pregava o
republicanismo, o Estado laico e a igualdade social.

Esses tipos artificiais de poesia, contudo, naufragaram sob a força dos poemas e da pregação
crítica de Machado de Assis - que defendia a sobriedade tanto na forma de composição como no uso das
imagens -, e também da poesia de Gonçalves Crespo. Graças, principalmente, a esses dois escritores, o
parnasianismo brasileiro voltou-se ao que de melhor propunham os franceses:

a) evitação de quaisquer proselitismos;


b) precisão vocabular;
c) construção de uma poesia plástica e sonora, que busque a perfeição técnica;
d) abandono das confissões sentimentais e do palavreado oco de grande parte dos românticos.

Deve-se ressaltar que, com o advento do Modernismo, os parnasianos passaram a ser ferozmente
ridicularizados no Brasil. Sob a acusação de "pedantismo poético", a produção parnasiana foi
injustamente desprezada e esquecida. Deve-se, em grande parte, à lucidez crítica de Manuel Bandeira a
sobrevivência de poetas exemplares como Olavo Bilac, Alberto de Oliveira e Raimundo Correia. Para
Bandeira, eles foram "autores de uma obra equilibrada e harmoniosa", que "reagiu contra a incorreção e a
eloquência derramada dos românticos, criando em nossa língua uma técnica precisa e comedida".
Inseridos no movimento mais amplo do Realismo, os parnasianos demonstraram que o uso de
formas poéticas fixas - o soneto, o alexandrino, o rondó, etc. - e a correção gramatical não excluíam a
beleza e o vigor poéticos. Alguns desses poetas mostraram-se, segundo Antonio Candido e Aderaldo
Castello, "notáveis cantores da magia, da dúvida, da aspiração, do triunfo amoroso".

Na verdade, a produção parnasiana brasileira - na qual se destacam, além da tríade preferida de


Manuel Bandeira, Vicente de Carvalho, Francisca Júlia, Augusto de Lima e Júlia Cortines - pede uma
revisão crítica despojada de preconceitos e da influência da estética modernista, que enaltecia,
exageradamente, o verso livre, o desrespeito à sintaxe e a exagerada referência a temas próprios da
brasilidade.

Destacamos três dos principais parnasianos brasileiros.

Alberto de Oliveira (1857-1937): grande leitor dos clássicos, conhecedor da língua, mestre da


versificação, é considerado o mais perfeito, o mais característico dos parnasianos brasileiros.

Crescente de agosto

Alteia-se no azul aos poucos o crescente,


O ar embalsama, os cirros leva, o escuro afasta;
Vasto, de extremo a extremo, enche a alameda vasta
E emborca a urna de luz nas águas da corrente.

Na escumilha da teia, onde a aranha indolente


Dorme, feita de orvalho, uma pérola engasta.
Faz aos lírios mais branca a flor cetínea e casta,
Mais brancos os jasmins e a murta redolente.

Faz chorar um violão lá não sei onde... (A ouvi-lo


Na calada da noite, um não-sei-quê me invade)
Faz que haja em tudo um como estranho espasmo e enlevo;

Faz as cousas rezar, ao seu clarão tranquilo,


Faz nascer dentro em mim uma grande saudade,
Faz nascer da saudade estes versos que escrevo.

 Raimundo Correia:
Raimundo Correia (1860-1911): o melhor de sua obra está nos poemas em que traduziu o mais
profundo desencanto.

Fetichismo

Homem, da vida as sombras inclementes


Interrogas em vão: - Que céus habita
Deus? Onde essa região de luz bendita,
Paraíso dos justos e dos crentes?...

Em vão tateiam tuas mãos trementes


As entranhas da noite erma, infinita,
Onde a dúvida atroz blasfema e grita,
E onde há só queixas e ranger de dentes...

A essa abóbada escura, em vão elevas


Os braços para o Deus sonhado, e lutas
Por abarcá-lo; é tudo em torno trevas...

Somente o vácuo estreitas em teus braços;


E apenas, pávido, um ruído escutas,
Que é o ruído dos teus próprios passos!...

Olavo Bilac (1865-1918): Em seus poemas há uma combinação da tradição clássica portuguesa com o
parnasianismo francês, refundida por um ardente temperamento plástico e retórico, no qual também se
destaca a perfeição formal, seja na pureza da língua seja na habilidade da versificação:

Vila Rica

O ouro fulvo do ocaso as velhas casas cobre;


Sangram, em laivos de ouro, as minas, que a ambição
Na torturada entranha abriu da terra nobre:
E cada cicatriz brilha como um brasão.

O ângelus plange ao longe em doloroso dobre.


O último ouro de sol morre na cerração.
E, austero, amortalhando a urbe gloriosa e pobre,
O crepúsculo cai como uma extrema-unção.

Agora, para além do cerro, o céu parece


Feito de um ouro ancião que o tempo enegreceu...
A neblina, roçando o chão, cicia, em prece,

Como uma procissão espectral que se move...


Dobra o sino... Soluça um verso de Dirceu...
Sobre a triste Ouro Preto o ouro dos astros chove.

Olavo Bilac
Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac nasceu em dezembro de 1865 no Rio de Janeiro.
Incentivado pelo pai cursou Medicina, mas abandonou o curso no último ano. Iniciou o curso de Direito
em São Paulo, contudo, foi outra faculdade que não conseguiu finalizar. A partir de então, o escritor
dedicou-se ao jornalismo e à literatura. Em 1896, foi um dos fundadores da Academia Brasileira de
Letras. Envolveu-se com os preceitos republicanos e nacionalistas. É autor do “Hino à Bandeira” escrito
em 1889. Por fazer sátiras ao governo de Floriano foi exilado em Ouro Preto, Minas Gerais.

Em conjunto com Raimundo Correia e Alberto de Oliveira forma a tríade Parnasiana brasileira.
É o autor mais popular do Parnasianismo e tem como princípios: a busca por perfeição na forma de
escrever (versos alexandrinos); a exaltação pelos poemas épicos da Antiguidade Clássica (Ilíada), o forte
lirismo; a inovação nos temas filosóficos de meditação; o descritivismo e nacionalismo, além de
linguagem com conotação sensual, como é o caso do poema “Sarças de fogo”.

Bilac teve uma vida voltada à participação na vida política, o que não o influenciou na
subjetividade de sua literatura. Em sua militância, iniciou campanhas cívicas a favor da alfabetização e
serviço militar obrigatório. Viveu uma vida solitária de muitas viagens à Europa, o que possivelmente o
fez refletir sobre a realidade sócio-política do Brasil, ao comparar as transformações entre os países.

O poeta faleceu em dezembro, dois dias depois de completar 53 anos, em 1918 na


sua cidade natal. Veja o trecho do poema “Via Láctea” – Soneto XIII

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo


Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto,
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite enquanto


A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E ao vir do Sol, saudoso e em pranto
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!


Que conversas com elas? Que sentido
Têm o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!


Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas."

Obras: Poesias: Paóplias, Via Láctea e Sarças do Fogo (1888), Sagres (1898), Poesias infantis
(1904); Tarde (1919).

Prosa: Crítica e fantasia (1904); Tratado de versificação (1905).

Raimundo Correia:
Raimundo da Mota de Azevedo Correia nasceu em maio de 1859, a bordo de um navio no litoral do
Maranhão. 
Formou-se em Direito pela Faculdade do Largo de S. Francisco, em São Paulo, e exerceu sua profissão no
cargo de Juiz de Direito no interior de Minas Gerais e do Rio de Janeiro. Casou-se com Mariana Sodré,
filha de ilustre família, em 1884. Em 1897 se tornou sócio fundador da Academia Brasileira de Letras.

Em 1883 publicou o livro “Sinfonias”, completamente voltado à estética parnasiana. Contudo, sua
primeira obra “Primeiros sonhos” ainda estava impregnada das características românticas. Pertencia à
chamada tríade do Parnasianismo no Brasil, fundada também pelos autores: Alberto de Oliveira e Olavo
Bilac. Em 1897 se tornou sócio fundador da Academia Brasileira de Letras. Sua temática, como de todo
poeta parnasiano, estava concentrada na exaltação das formas estruturais na composição do poema, na
contemplação da natureza, na perfeição dos objetos, na métrica rígida. Enfocava também um forte
pessimismo marcado por desilusão dos sonhos que podem não ser realizados.  Veja a poesia “As
pombas”, na qual há presença da exaltação das formas, da métrica perfeita e da natureza: 

“Vai-se a primeira pomba despertada ... 


Vai-se outra mais ... mais outra ... enfim dezenas 
De pombas vão-se dos pombais, apenas 
Raia sanguínea e fresca a madrugada ... 
E à tarde, quando a rígida nortada 
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, 
Ruflando as asas, sacudindo as penas, 
Voltam todas em bando e em revoada... 
Também dos corações onde abotoam, 
Os sonhos, um por um, céleres voam, 
Como voam as pombas dos pombais; 
No azul da adolescência as asas soltam, 
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam, 
E eles aos corações não voltam mais...”

Algumas complicações na saúde levaram Raimundo Correia a ir para Paris em busca


de tratamento, onde faleceu em setembro de 1911. 

Obras: Poesias: Sinfonias (1883); Versos e versões (1887); Aleluias (1891); Poesias (1898).

Alberto de Oliveira:

Fez parte do estilo de época chamado Parnasianismo e juntamente com Olavo Bilac e Raimundo


Correia participou da Tríade Parnasiana. Foi um poeta tipicamente parnasiano, embora tenha presenciado
várias transformações na política e na sociedade, mudanças que não influenciaram seu estilo literário.

Características de suas obras

- Perfeição formal
- Métrica rígida
- Linguagem rebuscada e trabalhada
Alberto de Oliveira revela algumas características românticas, porém estava longe dos excessos
sentimentais do Romantismo.

Obras

- Canções Românticas (1878)


- Meridionais (1884)
- Sonetos e Poemas (1885)
- Versos e Rimas (1895)
- Poesias

VASO CHINÊS

Estranho mimo aquele vaso! Vi-o,


Casualmente, uma vez, de um perfumado
Contador sobre o mármor luzidio,
Entre um leque e o começo de um bordado.
Fino artista chinês, enamorado,
Nele pusera o coração doentio
Em rubras flores de um sutil lavrado,
Na tinta ardente, de um calor sombrio.
Mas, talvez por contraste à desventura,
Quem o sabe?... de um velho mandarim
Também lá estava a singular figura.
Que arte em pintá-la! A gente acaso vendo-a,
Sentia um não sei quê com aquele chim
De olhos cortados à feição de amêndoa.

VASO GREGO

Esta de áureos relevos, trabalhada


De divas mãos, brilhante copa, um dia,
Já de aos deuses servir como cansada,
Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.

Era o poeta de Teos que o suspendia


Então, e, ora repleta ora esvasada,
A taça amiga aos dedos seus tinia,
Toda de roxas pétalas colmada.

Depois... Mas, o lavor da taça admira,


Toca-a, e do ouvido aproximando-a, às bordas
Finas hás de lhe ouvir, canora e doce,

Ignota voz, qual se da antiga lira


Fosse a encantada música das cordas,
Qual se essa voz de Anacreonte fosse.

Antonio Mariano Alberto de Oliveira.

Nasceu em 28 de abril de 1857 em Saquarema (RJ). Abandonou o curso de Medicina no


terceiro ano e foi estudar Farmácia tendo se formado em 1883. Também foi professor de
Literatura Brasileira e um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Alberto de Oliveira
é considerado “O Príncipe dos Poetas Brasileiros”, na verdade, ele ficou com este título, que
antes havia sido de Olavo Bilac. O Segundo Príncipe dos poetas Brasileiros, como afirmam
alguns estudiosos, faleceu em 19 de janeiro de 1937, em Niterói (RJ).

Bibliografia:

Presença da literatura brasileira (história e antologia), Antonio Candido & J. Aderaldo Castello, Editora
Bertrand Brasil, 7ª edição, 1996.

O Realismo, João Pacheco, Editora Cultrix, 3ª edição, 1968.

Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira, org. de José Paulo Paes e Massaud Moisés, Editora Cultrix, 1967.

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