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Elaborado por JPC prof.

Auxiliar-ISCED ano lectivo 2021/2022

INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO DE BENGUELA

CADEIRA SOCIOLGIA DA EDUCAÇÃO

Objectivo da cadeira: Desenvolver aos estudantes com conhecimentos que


abre o horizonte para a compreensão da vida social em si; esclarece o
processo educativo e as relações entre a escola e a sociedade; e analisa a
escola como grupo social e sua estrutura interna (nascida da convivência entre
educandos e educadores), que pode ser compreendida através da análise
sociológica da escola.

INTRODUÇÃO

A Sociologia tem um duplo papel: pode aumentar o conhecimento que o


homem tem de si mesmo e da sociedade e contribuir para a solução dos
problemas que enfrenta.
Como ciência, a Sociologia pode ser geral e especial. E geral quando
estuda os fatos sociais considerados em suas manifestações gerais, isto é,
quando consideramos a sociedade em seu sentido mais amplo, e é especial
quando se ocupa de determinado grupo de fatos sociais da mesma natureza.
Assim, a Sociologia divide-se em várias disciplinas, que nada mais são que
Sociologias especiais: Sociologia do Direito, da Religião, do Lazer, da Arte, do
Trabalho, do Desenvolvimento, da Educação, rural etc.
A Sociologia da Educação é um ramo da Sociologia geral que se ocupa dos
fatos sociais relacionados com a educação e estuda: a educação como
processo social global que ocorre em toda a sociedade; os sistemas escolares,
ou seja, o conjunto de uma rede de escolas e sua estrutura de sustentação,
como partes do sistema social mais global; a escola como unidade sociológica;
a sala de aula como subgrupo de ensino; o papel do professor.
A Sociologia da Educação procura à compreensão da educação como facto
social, mas fazê-lo de modo a introduzir o aluno, no universo das Ciências da
Educação, deforma a despertar nele o interesse e a curiosidade pela análise
objetiva da realidade angolana. A inclusão de notícias de jornal, textos literários
e comentários sobre fatos sociais ligados à educação concretiza essa
preocupação de não desligar da vida real e dos problemas humanos e o estudo
da Sociologia da Educação.

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Com uma análise e visão crítica mais profunda do processo educativo,


poderemos propor mudanças que contribuam para o desenvolvimento da
sociedade. E nesse sentido que é importante o papel da Sociologia da
Educação.

1. A Sociologia da Educação como Sociologia especial

A sociologia nasce e firma-se como uma tentativa de compreensão de


situações novas, criadas pela então nascente sociedade capitalista. Por isto, o
século IXX é particularmente importante não somente para o pensamento
ocidental quanto para o surgimento da sociologia. Neste sentido, a revolução
industrial pode ser considerada um marco significativo para esta ciência, uma
vez que ela instaura novas formas de organizar a vida social.

A introdução das máquinas na produção não apenas destruiu o artesão


independente, que antes possuía somente um pequeno pedaço de terra
cultivado nos seus momentos livres. Este foi submetido a uma severa
disciplina, a novas formas de conduta diante das relações de trabalho,
completamente diferentes das vividas anteriormente por eles (no auge da
revolução industrial, os trabalhadores passam a cumprir uma jornada de até 16
horas de trabalho diário).

A transformação da atividade artesanal em manufatureira e, por último, em


atividade fabril desencadeou uma maciça emigração do campo para a cidade,
assim como engajou mulheres e crianças em jornadas de trabalho de pelo
menos 12 horas, sem férias e feriados, ganhando um salário para a
subsistência. Grandes cidades industriais da Inglaterra (berço da revolução
industrial), como Manchester, passaram por mudanças radicais na demografia
(migração do rural para o urbano), sem possuir, no entanto, uma estrutura de
moradias, de serviços sanitários, de saúde etc., capaz de acolher a população
que se desloca para a cidade, a fim de trabalhar nas fábricas. A sociologia diz
respeito então a um conjunto de conceitos, de técnicas e de métodos de
investigação produzidos para explicar a vida social. É também uma ciência que
busca a compreensão e a transformação do real.

Além da revolução industrial, outras duas revoluções marcam o surgimento da


sociologia como ciência: a revolução do conhecimento e a revolução burguesa.

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A partir destas três ordens de transformação na sociedade, a sociologia se


estabelece como uma disciplina importante para qualquer pessoa
comprometida com uma forma de ação na sociedade. Mas mais do que uma
ação, a sociologia é marcada por uma tentativa de compreensão da dinâmica
da própria sociedade. Por isto o século IXX é marcado pelo surgimento das
ciências sociais e outras disciplinas que tentarão entender a sociedade, o
homem e a cultura.

A História da sociologia surgiu através da tentativa de Augusto Comte (1798 –


1857) em unificar vários estudos relativos às ciências humanas em apenas um
só. A linha de pensamento de Comte é denominada positivismo. O positivismo
se baseou no afastamento radical da teologia ou metafísica da existência
humana, afirmando que toda a vida humana tinha passado pelas mesmas
fases históricas distintas e que, se o indivíduo podesse compreender este
progresso, poderia resolver os problemas sociais.

Embora a sociologia tenha surgido a partir da tentativa intelectual de Comte,


foi só no século XIX com o aparecimento dos problemas sociais decorrentes da
Revolução Industrial, que a sociologia tomou proporção, surgindo como a
ciência responsável para solucionar esses problemas.

Émile Durkheim (1858 – 1917) se baseou nas idéias de Comte para formular
sua teoria. Para ele, a Sociologia é o estudo dos fatos sociais. Esses fatos
sociais são as formas e padrões pré-estabelecidos de um grupo social.
Durkheim achava que os fatos sociais, por ter características próprias,
deveriam ser estudados de maneira singular. O ideal de Durkheim foi tão
importante para a Sociologia, pois é a partir daí que ela passa a ser
considerada uma ciência.

Outro importantíssimo estudioso responsável pela formação da Sociologia foi


Karl Marx (1818 – 1883). Marx não tinha como objetivo estabelecer idéias para
a sociologia, apenas pretendia analisar e propor explicações para os problemas
decorrentes daquela época: desemprego, miséria, desigualdades sociais, etc.

Os conceitos de Marx deram ênfase na crítica de uma dominação com base


econômica, sofrendo diversas inflexões e desdobramentos. Marx estabeleceu

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importantes conceitos para compreender o funcionamento do capitalismo,


como o “mais-valia” e as formas de exploração das classes trabalhadoras.

Max Weber (1864 – 1920) teve uma linha de pensamento mais aproximada de
Durkheim, onde os dois estudiosos defendiam a objetividade em relação ao
método científico. No entanto, enquanto Durkheim se preocupava com a
análise objetiva da sociologia, Weber pretendia tomar a compreensão da
ciência, diferenciando também da análise crítica de Marx. Weber foi importante
no sentido de direcionar as ciências sociais para a imparcialidade, passo
fundamental para o surgimento do sociólogo como profissão.

A Sociologia como uma das Ciências Sociais que estudam de forma


sistemática o comportamento social do homem, tem um duplo papel: pode
aumentar o conhecimento que o homem tem de si mesmo e da sociedade e
contribuir para a solução dos problemas que enfrenta.

Como ciência, a Sociologia pode ser geral e especial. E geral quando estuda
os fatos sociais considerados em suas manifestações gerais, isto é, quando
consideramos a sociedade em seu sentido mais amplo, e especial quando se
ocupa de determinado grupo de fatos sociais da mesma natureza é. Assim, a
Sociologia divide-se em várias disciplinas, que nada mais são que Sociologias
especiais: Sociologia do Direito, da Religião, do Lazer, da Arte, do Trabalho, do
Desenvolvimento, da Educação, Rural entre outras.

Mas, o que é a Sociologia da Educação?

A Sociologia da Educação é um ramo da Sociologia geral que se ocupa dos


fatos sociais relacionados com a educação.

Assim, como Sociologia especial, a Sociologia da Educação estuda:

♦ a educação como processo social global que ocorre em toda a


sociedade;

♦ os sistemas escolares, ou seja, o conjunto de uma rede de escolas e sua


estrutura de sustentação, como partes do sistema social mais global;

♦ a escola como unidade sociológica;

♦ a sala de aula como subgrupo de ensino;

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♦ o papel do professor.

1.1. Importância da Sociologia da Educação para o educador

A Sociologia da Educação é uma disciplina fundamental para o educador. Ela


abre o horizonte para a compreensão da vida social em si; esclarece o
processo educativo e as relações entre a escola e a sociedade; e analisa a
escola como grupo social e sua estrutura interna (nascida da convivência entre
educandos e educadores), que escapa ao administrador e só pode ser
compreendida através da análise sociológica da escola.

A Sociologia da Educação também explica a influência da escola no


comportamento e na personalidade de seus membros; estuda os padrões de
interação entre escola e demais grupos sociais da comunidade e analisa os
sistemas escolares à luz dos sistemas sociais, permitindo, com base em
estudos da realidade social, que se compreenda o papel da educação na
sociedade e em seu desenvolvimento e que se proponham reformas
educacionais, com base nesses alicerces científicos.

A natureza social do processo educativo e as relações que existem entre a


escola e a sociedade mostram a importância da Sociologia da Educação na
formação do educador. Estudando-a, os professores tomam contacto mais
profundo com a realidade pedagógica e social; verificam a influência exercida
pelos factores sociais sobre o processo educativo; percebem a relação
existente entre os factores sociais e os factos pedagógicos; adquirem uma
visão mais nítida e penetrante dos fenômenos educacionais e ampliam sua
cultura geral e seus conhecimentos.

1.2.Conceito sociológico de educação

A educação é uma das atividades básicas de todas as sociedades humanas,


pois a sobrevivência de qualquer sociedade depende da transmissão de sua
herança cultural aos jovens. Toda sociedade, portanto, utiliza os meios
necessários para perpetuar sua herança cultural e ensinar aos mais jovens os
costumes do grupo.

Assim, a educação é o processo pelo qual a sociedade procura transmitir suas


tradições, costumes e habilidades, isto é, sua cultura aos mais jovens. A

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criança se toma socializada porque aprende as regras de comportamento do


grupo em que nasceu. A educação é uma socialização.

Do ponto de vista sociológico, portanto, a educação é a ação pela qual as


gerações adultas transmitem sua cultura às gerações mais jovens.

A educação visa a transmitir ao indivíduo o património cultural para integrá-lo à


sociedade e aos grupos que a constituem; visa, por conseguinte, a socializar, a
ajustar os indivíduos à sociedade e, ao mesmo tempo, a desenvolver suas
potencialidades e as da própria sociedade.

Análise da educação

De acordo com o conceito acima de educação, ela:

a. E a ação exercida, isto é, a atividade pela qual a geração adulta transmite o


seu património cultural, a sua herança social, às gerações mais jovens.

Em cada um de nós coexistem dois seres: o individual e o social. O ser


individual (natureza biopsíquica) nos é dado por nossos pais, como herança
biológica, através do processo de hereditariedade. O ser social é um sistema
de idéias, sentimentos, hábitos dos grupos sociais de que fazemos parte. São
nossas crenças e práticas morais, a língua que falamos, as tradições nacionais
ou profissionais, enfim, as maneiras de pensar, sentir e agir dos grupos a que
pertencemos. Assim sendo, este ser social não nasce connosco, ele é
constituído em nós pela educação.

b. É um processo que se passa entre as gerações adultas e as mais jovens.


Quando nascemos, não nascemos sabendo as coisas. Vamos aprendendo ao
longo do nosso processo de socialização. A cultura que adquirimos é a herança
social que é transmitida pelas gerações dos adultos às gerações mais jovens.
Assim, à medida que o tempo passa, em virtude do progresso tecnológico,
muitos traços culturais são acrescidos à cultura e alguns podem cair em
desuso, por se tomarem ultrapassados. A cultura de um povo não permanece
sempre igual. Ela muda com o decorrer do tempo.

c. Tem a finalidade de suscitar e desenvolver as potencialidades do indivíduo.


A educação não se limita a desenvolver a natureza biopsíquica, o “eu”
individual do homem. A educação cria um ser novo — o ser social —, dando-

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lhe qualidades físicas, intelectuais e morais. O homem só se toma homem


vivendo em sociedade. Ele é um ser eminentemente social.

1.3. Formas de educação

A cultura adquirida pelo homem na vida em sociedade pode ser espontânea e


erudita. A cultura espontânea é aquela que aprendemos pela observação, pela
imitação, pela experiência, pelo contato de uma pessoa com outras. Falar a
língua nacional, comer determinados alimentos, cantar certas músicas, fazer
certas brincadeiras são coisas que aprendemos prestando atenção, treinando,
quase sem perceber que estamos aprendendo. O folclore, por exemplo, é uma
forma de cultura espontânea do povo; é encontrado tanto no campo como na
cidade. As manifestações folclóricas, na maioria das vezes, são transmitidas de
maneira espontânea, dos mais velhos aos mais jovens, com isso preservando
a cultura popular.

A cultura erudita é aquela que aprendemos frequentando a escola, lendo


jornais, revistas e livros, assistindo à televisão, ouvindo rádio etc.

Cada um de nós tem uma parte de cultura espontânea e uma parte de cultura
erudita. Alguns mais, outros menos, mas todos aprendem a cultura espontânea
e a erudita.

Dessa forma, considerada em seu conjunto, a educação como transmissão de


cultura apresenta duas formas:

a. Educação assistemática:

“Os meninos observam os homens quando fazem arcos e flechas; o homem os


chama para perto de si e eles se vêem obrigados a observá-lo. As mulheres,
por outro lado, levam as meninas para fora de casa, ensinando-as a conhecer
as plantas boas para confeccionar cestos e a argila que serve para fazer potes.
E, em casa, as mulheres tecem os cestos, costuram os mocassins e curtem a
pele de cabrito diante das meninas, dizendo-lhes, enquanto estão
traba¬lhando, que observem cuidadosamente, para que, quando forem
grandes, ninguém as possa chamar de preguiçosas e ignorantes. Ensinam-nas
a cozinhar e aconselham-nas sobre a busca de bagas e outros frutos, assim
como sobre a colheita de alimentos”.

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(Brandão, C. R. O Que E Educação. 12“ edição. São Paulo, Brasiliense, 1984,


p. 21.)

Nos exemplos do texto, referentes à transmissão do saber da tribo em uma


aldeia africana, encontramos uma forma de educação assistemática. A
educação surge espontaneamente da própria necessidade da vida social. Não
é só na escola que o indivíduo aprende.

A educação assistemática é a educação realizada sem qualquer plano, sem


sistema, sem local ou hora determinada. Todas as pessoas, todos os grupos,
toda a sociedade participa desta espécie de educa¬ção. Realizando-se um
pouco por toda parte, ela assume caraterísticas de educação difusa, expressão
pela qual também é conhecida, e que significa ser informal, não-intencional,
não-institucional, espontâ¬nea, e que, por estar intimamente ligada à vida,
pode também ser chamada de educação existencialista.

b. Educação sistemática: a educação como processo sistemático visa


apenas à transmissão de determinados legados culturais, isto é, de
determinadas ciências, técnicas ou modos de vida. É uma forma seletiva de
educação. Dentro da cultura, escolhem-se determinados elementos
considerados essenciais ou mais necessários para serem transmitidos de
modo especial na escola, por pessoas especializadas.

A educação sistemática se faz na escola: um grupo especializado para


preparar pessoas a habilitar-se e adquirir certos conhecimentos especiais que
deverão adaptá-las ao meio social, fazendo igualmente com que este progrida
para melhor bem-estar e ajustamento indivi¬dual e social.

Atualmente, para atingir seus objetivos, a escola emprega vários recursos:

♦ local apropriado;

♦ horas de trabalho obrigatório;

♦ currículo;

♦ método conveniente;

♦ material didático: televisão, videocassete, projetor de slides,


retroprojetor, computador, mimeógrafo, livros e revistas etc.

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Nas comunidades mais isoladas, como, por exemplo, algumas tribos indígenas
e africanas, onde não há escola, a educação assiste¬mática é a única forma de
educação existente. Nestas sociedades ágrafas, ou seja, que não têm escrita,
as crianças e jovens aprendem vivendo, participando ativamente da vida
familiar e comunitária. Adaptam-se paulatinamente ao estilo de vida da tribo. As
provas por que passam os adolescentes, antes de ingressarem no mundo dos
adultos, representam apenas uma formalidade para consagrar uma
acomodação já efetivada.

Nas sociedades civilizadas, a educação assistemática não basta. A divisão do


trabalho e a extrema especialização exigem que as pessoas passem pelos
bancos escolares, onde recebem educação sistematizada.

Assim, instituições sociais como a família, às vezes a Igreja e atualmente os


meios de comunicação de massa (televisão, rádio, cinema etc.), exercem
influências sobre as crianças, mas as escolas, mais do que qualquer outra
instituição, encontram-se previamente organizadas para familiarizar as crianças
com sua herança cultural. A sabedoria institucionalizada nos diz que as
crianças precisam de escola, que elas aprendem na escola.

1.4. A origem da escola

No início, as escolas apareceram para satisfazer os anseios e os interesses da


aristocracia. Não é sem razão que a palavra escola significava “lazer”. O
vocábulo escola vem do grego skole, que quer dizer ócio, isto é, tempo livre
das ocupações; latinizado, o termo ficou schola. Originariamente, a escola era
o lugar onde as pessoas de posse davam-se ao luxo de fazer exercícios
intelectuais, sem visar a outros resultados que não o enriquecimento mental,
para mais fácil separação das pessoas com posição social mais baixa. Por
puro prazer...

A escola tendeu, então, para uma educação sistemática. A dife-renciação


económica, a divisão do trabalho e o comércio entre grupos e povos criaram
certos instrumentos culturais necessários para a sustentação de todos. O
comércio e a produção exigiram a criação da escrita, da numeração, do
cálculo. A divisão das terras do Nilo exigiu a Geometria. A navegação requereu
melhores conhecimentos de Astronomia. Aqueles elementos da classe

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dirigente que se dedicavam ao serviço do culto e das práticas religiosas


organizaram os primeiros cursos intencionais para transmitir essas novas
técnicas culturais. Estava fundada, assim, a escola. Seus fundadores: os
sacerdotes. 

Não é sem razão que a primeira escrita da história — a egípcia — se chamou


hieróglifos. Do grego hieros (sagrado) e glifos (escri¬tos). Esses primeiros
sábios sagrados ensinaram a escrita, as leis, a religião, a Astronomia, a
Astrologia etc. Daí surgiram os primeiros letrados: os escribas.

A princípio, as escolas eram destinadas especificamente às pes¬soas de


determinadas classes, como nobres, militares e artesãos, e sua função era
especializar esses cidadãos nas missões e ofícios que desempenhavam.

Elas completavam os conhecimentos de pessoas que já se haviam,


antecipadamente, encaminhado em determinadas profissões. Os reis eram
ilustrados na arte de reinar; os guerreiros, na de combater; os artesãos, na
realização de trabalhos manuais mais aperfeiçoados; e assim por diante. A
educação sistemática era privilégio de poucos.

No entanto, a situação mudou depois que os ideais democráticos da Revolução


Francesa foram, aos poucos, difundidos. A escola passou a ser direito de
todos.

1.5.Funções sociais da educação

É utopia pensar que todos os problemas sociais se resolvem pela educação,


mas é certo que ela representa uma condição indispensável para resolvê-los.

A educação é um fato social que, a princípio, tem por função socializar, integrar
as gerações imaturas na sociedade e desenvolver a sociedade em geral e os
indivíduos em particular. Tem, pois, as funções de ajustamento e
desenvolvimento social.

Mas, além dessas funções, a educação, especialmente a sistemá¬tica, exerce


também as seguintes funções:

a. Estabilidade social: possibilita que os indivíduos façam “bem” o que seria


feito de qualquer forma, pois a educação é uma necessi¬dade em qualquer

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setor da vida, aumentando a eficiência do indivíduo e promovendo a ordem


social.

b. Canal de ascensão social: permite aos indivíduos atingirem status mais


elevados, desde que para eles estejam realmente capaci¬tados.

c. Peneiramento social: a educação distribui e redistribui os indivíduos


pelos status sociais e, enquanto “peneira”, seleciona os mais capazes para os
status que exigem maior capacidade.

d. Controle social: a educação é pensada também como técnica social, isto


é, como método de influenciar o comportamento humano, de modo que este se
enquadre dentro dos padrões vigentes de interação e organização sociais.
Assim, a educação pode ser inova¬dora ou conservadora, de acordo com o
contexto histórico e social no qual se manifesta.

Na análise da ação educativa percebemos duas posições:

1. que sustenta que a educação se define basicamente pela sua função


reprodutora da ordem social existente e que, portanto, tem um caráter
conservador inerente à sua própria natureza;

2. que afirma que a educação tem uma função inovadora e garante mudanças
e progressos, tanto no nível individual quanto no social.

Na opinião de Everett Reimer, no caso específico da escola: “Presume-se que


o papel da escola é educar. Esta a sua ideologia, e seu propósito público. As
escolas atravessaram os tempos sem serem contestadas, pelo menos até
recentemente, em parte porque a educação tem significados diferentes para
diferentes pessoas. Escolas diversas procedem, é evidente, de modo diverso,
mas, cada vez mais, em todos os países, em qualquer nível, e seja qual for sua
espécie, as escolas acumulam quatro atividades sociais distintas — a tutela
dos alunos, a seleção social, a doutrinação e a educa¬ção — tal como é
definida em termos de desenvolvimento das aptidões e ensinamentos”.

(Reimer, E. A Escola Está Morta. 3a edição. Rio de Janeiro, Francisco Alves,


1983, p. 33.)

QUESTÕES PARA ESTUDO

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1. O que a Sociologia da Educação estuda?


2. Qual a sua importância para o educador?
3. Dê o conceito sociológico de educação.
4. Quais são as formas de educação? Explique-as.
5. Atualmente, quais os principais recursos didáticos que as escolas
empregam para atingir seus objetivos?
6. Quais as funções sociais da educação? E da escola?

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Tema II: Os principais percursos teóricos da sociologia da educação


2.1. Objecto de estudo da sociologia da Educação
Um dos principais expoentes da sociologia da educação, foi Émile
Durkheim. Este autor argumentava que “ (…) a educação é, por excelência,
objeto da sociologia, visto que é um fenômeno social objetivo e que deve ser
estudado como tal”. Como veremos posteriormente, a sociologia da educação
transcende o plano teórico, já que propicia o conhecimento da sociedade e, por
consequência, da escola como instituição social. A escola, tal como a própria
sociologia, também é um objeto de transformação social (como também de
conservação social, diria Bourdieu), uma vez que se ocupa da transmissão de
valores e da formação de futuras gerações. Desta forma, nos dias atuais, a
sociologia da educação propõe como investigação realizar um mapa da
realidade escolar, a fim de que este possa ser analisado e refletido por todos
aqueles que se debruçam sobre os problemas educacionais. Podemos dizer
então que a escola e suas relações constituem o objeto privilegiado da
sociologia da educação.
Diferentes comunidades científicas trabalham sobre o objeto chamado
“escola”. A sociologia da educação foi apenas mais uma disciplina que se
interessou pela escola, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial. Isto
porque, do final do século 19 até o entre guerras, a sociologia da educação
possuía mais um caráter filosófico-sociológico, restrita a manuais didáticos e a
reflexões mais generalistas a respeito da educação em nossa sociedade. A
sociologia da educação emergiu com mais evidência como campo científico a
partir dos anos de 1960, trazendo em seu discurso certa denúncia a um
período precedente tido como “otimista” pelos economistas que defendiam a
tese do “capital humano” (VAN ZANTEN, 2000, p. 6), segundo a qual a
educação era um investimento produtivo, tanto do ponto de vista do indivíduo
quanto da sociedade.
A sociologia da educação, a partir dos anos de 1960, adotou um
discurso crítico, que se opunha a uma visão naturalista dos dons e habilidades
intelectuais, fortemente presente na teoria funcionalista de Durkheim e
reativada pelo sociólogo americano Talcott Parsons, defensor da tese da
seleção escolar com base nas habilidades e aproveitamento escolar
diferenciado, conjunto este que seria responsável pela preparação dos
indivíduos para ocupar postos sociais hierarquizados, em nome do equilíbrio
harmonioso da sociedade, como veremos a seguir.
Os países do chamado Primeiro Mundo começaram a se preocupar
com a modernização de seus sistemas educacionais a partir do fim da década

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de 1950 e ao longo da década de 1960. Estavam entrando no período de


crescimento econômico acelerado que se seguiu à reconstrução da economia
europeia depois da Segunda Guerra Mundial. O desenvolvimento econômico
fez com que se tornasse necessária uma mão de obra mais qualificada e, de
modo geral, uma população com nível de formação mais alto. Este período foi
marcado pela produção de vários relatórios de pesquisa financiados pelo
Estado em diversos países e marcou uma fase que via a educação como
sinônimo de desenvolvimento econômico.
Contrapondo-se à tese de que a educação corrigiria as
desigualdades sociais, ao promover uma política educacional com base na tese
da equalização social, a sociologia da educação do final dos anos de 1960
começou a ver a escola com certo desencantamento e, portanto, como uma
instituição distante para cumprir a promessa de que a democratização do
ensino pudesse representar um fator de equidade social, logo, de progresso
econômico.
Para esta sociologia da educação, a margem de ação do indivíduo
era limitada por fatores estruturais da sociedade que tangiam as escolhas do
sujeito. Neste contexto, a ação pedagógica aparecia também condenada de
início, já que os mecanismos presentes no sistema escolar acabam por
reproduzir a divisão social imposta em uma sociedade de classes.
Esta tonalidade crítica da sociologia da educação se atenua a partir
dos anos de 1980. A partir deste período, os trabalhos versados na área de
sociologia da educação manifestam um desejo latente de compreender melhor
o funcionamento interno das instituições de ensino, denotando, de certa forma,
uma lacuna existente tanto na tradição funcionalista quanto na tradição
marxista em compreender a equação entre os mecanismos globais da
sociedade e a atividade comum dos profissionais da educação, bem como a
experiência dos próprios alunos. Os dois grandes paradigmas da sociologia da
educação acabam explorando pouco os determinantes individuais da ação,
subestimando o papel do ator e conferindo um peso maior às dinâmicas
macroestruturais da sociedade.
É a partir deste “mapa conceitual” que a sociologia da educação tem
ocupado os debates científicos na sociedade contemporânea. Tais debates dão
conta, de maneira resumida, dos principais paradigmas que orientaram e ainda
orientam esta disciplina, além de nos ajudar a traçar o itinerário genealógico da
mesma.

2.2. Terias que sustentam a sociologia da Educação

As análises de caráter sociológico sobre a problemática educacional, nesse


período, apesar de ter como paradigma dominante o enfoque funcionalista,
apresenta dentro deste enfoque duas variantes importantes: de um lado, com a

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teoria técnico-funcional e de outro, com a teoria do capital humano.

Teoria técnico-funcional

Nesta teoria que dominará boa parte das análises produzidas no campo,
esta se desenvolveu a partir da importância dada à educação, no processo de
estratificação social e de modernização da sociedade. Neste caso, privilegiam-
se as exigências de uma sociedade tecnocrática e o papel da educação para
dar uma resposta às necessidades crescentes de formação técnica e científica
e às necessidades de mobilidade da mão-de-obra.Pode-se afirmar, em linhas
gerais, que as proposições básicas dessa teoria são as seguintes:
 A mudança tecnológica exige progressivamente mais habilidades para o
trabalho, isto é, aumenta a proporção de empregos que requerem mais
alto nível de habilidade e que aumenta o nível de exigência de
habilidades pelos empregos em geral.
 As crescentes exigências de habilidades levam à maior demanda de
educação por parte dos empregadores, isto significa escolarização mais
longa e matrícula de maior número de pessoas nas escolas.
 As exigências mais elevadas de educação levam à predominância da
realização sobre a atribuição e à construção de sociedades baseadas no
mérito.
Teorias do Capital Humano
Esta teoria tem impacto ainda maior no âmbito da sociologia da educação,
uma vez que relaciona educação com investimento econômico e produtividade.
A educação deixa de ser percebida como um bem de consumo para ser vista
como investimento, o que lhe dá grande legitimidade como objeto de estudo, e
consolida, em larga medida, o campo da sociologia da educação.
Nos anos pós-guerra, os sociólogos da educação recorrem
permanentemente a uma visão economicista da educação, o que lhes concede
uma dupla legitimidade, reconhecendo, por um lado, o papel impulsionador da
educação no processo de crescimento econômico e, por outro, o de
instrumento de equalização das oportunidades e de redistribuição de bens e
serviços.
No início da década de 1960, a teoria do capital humano foi desenvolvida e
divulgada como demonstração do valor econômico da educação. Em
consequência, a educação passou a ser entendida como aspecto fundamental
para o desenvolvimento da economia.
Os principais temas de pesquisa que se inserem no interior desta
problemática são:
 A mobilidade social;
 Os mecanismos de seleção escolar que remetem à temática da
necessária democratização do ensino;

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 Análises dos processos diferenciais de escolarização segundo as


classes, os sexos ou as etnias.
Essa problemática mais crítica vai contribuir para pôr em evidência a
persistência das desigualdades escolares e para mostrar a necessidade de
reformas dos sistemas de ensino. Na fase seguinte do pós-guerra, a visão das
reformas, bem como da capacidade renovadora da Acão da escola, entra em
crise e conduz a um novo tipo de enfoque. No caso da sociologia da educação,
esta será o palco de um intenso e inovador debate, que mudará profundamente
o seu perfil conservador para um perfil construído com base numa teoria crítica
da educação.
A Sociologia da Educação encontra, assim, os caminhos para a construção
de seu espaço como campo cientifico a partir de duas direções principais:
internamente, através da busca do “rigor científico” de suas pesquisas e
construções teóricas e, externamente, a partir do reconhecimento e
legitimidade de seu objeto (a educação), que passa a ser priorizado em função
da sua significativa contribuição social.

2.3. Principais momentos da Sociologia da Educação

Segundo os autores (NOGUEIRA, 1995; VAN ZANTEN, 2000), podemos


falar de dois momentos que são considerados particularmente importantes para
esta disciplina:

• Primeiro momento: período que vai de Émile Durkheim, considerado “o pai


fundador da sociologia da educação”, até aproximadamente a Segunda Guerra
Mundial;

• . Segundo momento: período posterior à Segunda Guerra Mundial até os dias


atuais.

No primeiro momento, a sociologia da educação é especialmente marcada por


três características:

1. Ausência de investigação empírica, ou seja, os estudos nesta área se


preocupavam mais com os grandes modelos de análise estatística que se
ancoravam em uma tradição mais quantitativa e nos quais os sujeitos quase
não apareciam;

2. Sociologia “macroscópica”, tipo de abordagem que dificultava a


investigação sobre o que acontecia no interior da escola;

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3. A sociologia se reduz a uma matéria de ensino, ou seja, ela não havia se


constituído ainda em um campo de pesquisa e se debruçava em uma tradição
mais histórico-filosófica.

Desta forma, os sujeitos da sociologia da educação neste período são quase


que uma categoria abstrata, ou seja, não pertencem a uma classe, não têm
voz, sua origem social é desconhecida, não são filiados a nenhum mercado de
bens culturais ou simbólicos, enfim, é a amostra quantitativa que tem validade,
são os dados estatísticos que falam pelos sujeitos.

Já no segundo momento, assistimos à institucionalização da “sociologia da


educação” enquanto disciplina científica. Os sociólogos deste período estão
preocupados em reconstituir a história da disciplina.

Três grandes acontecimentos podem ser destacados no segundo momento da


disciplina:

1. Período de institucionalização da disciplina (1945-1965): a sociologia de


Talcott Parsons;

Este período é marcado pela chamada “explosão demográfica”, conhecida


como baby boom: as famílias se recompõem, os homens voltam da guerra, as
mulheres ingressam no mercado de trabalho e o período é marcado por uma
prosperidade econômica. Na educação, é possível sentir o maior acesso das
crianças à escola e o prolongamento dos estudos. O principal teórico desta
fase é um autor chamado Talcott Parsons, teórico importante e influente na
sociologia da educação do período. A corrente teórica representada por
Parsons era o estrutural-funcionalismo, corrente que defendia uma visão
“sistêmica” e “funcionalista” da sociedade. De acordo com Parsons, para que
uma sociedade estável pudesse existir, era preciso responder a diversas
funções: a adaptação ao meio que assegura a sobrevida da sociedade, a
busca por objetivos, a integração de membros do grupo e, finalmente, a
manutenção de modelos e de normas.

A partir deste modelo, Parsons procura explicar as diferentes instituições


sociais da sociedade americana: a família, a polícia, a justiça, o ensino, a
religião, suas funções e sua lógica interna. Os sistemas são abertos e

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evolutivos: eles deixam os indivíduos livres para escolherem (o marido, a


profissão etc.), desde que existam os mecanismos de regulação econômica ou
social.

Outra característica importante deste período é a chamada “explosão escolar”,


com a universalização do ensino de segundo grau. Além disso, a chamada
guerra fria (confronto entre dois blocos hegemônicos) acaba por estimular a
competição entre os países desses blocos, o que, em termos concretos, eleva-
se o investimento em recursos científicos e tecnológicos em busca da disputa
pela supremacia militar – período conhecido como “caça-talentos”.

O Estado passa a financiar as pesquisas relativas aos sistemas educacionais,


tradição esta já existente na Inglaterra desde o final do século 19. Neste país, o
Estado financia abundantemente equipes de sociólogos para a realização de
grandes pesquisas (surveys). Cada vez mais se reconhecerá que a escola é
um instrumento de mobilidade social. Acredita-se que quanto mais as
sociedades se desenvolvem, mais a escola passa a desempenhar um papel
central na questão da mobilidade.

Os estudos deste período tinham o objetivo de levar à democratização do


ensino. A educação era vista como um meio de equalização social. Os teóricos
desta época acreditavam que a educação poderia ser um fator de correção das
desigualdades sociais.

A construção teórica de Parsons procura resolver um problema: como


compreender uma ordem social organizada em um país livre, onde os homens
escolhem livremente suas atividades? Isto porque o contexto em que as teorias
de Parsons foram concebidas tinham uma especificidade: enquanto a
sociologia do pré-guerra esteve marcada pela crise e problemas de
desorganização social, como a marginalidade, a criminalidade, a imigração,
entre outras, a América do pós-guerra de Parsons vive um período de
crescimento e de forte integração social. Por isto, estava preocupado com um
modelo de educação ancorado na ideia de oferecer a todos a mesma igualdade
de oportunidades. De acordo com o clima de euforia econômica no qual vivia,
Parsons foi um entusiasta do sistema capitalista, acreditando que este sistema

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ofereceria melhores oportunidades às pessoas por meio do esforço e do


mérito.

A concepção de educação que temos hoje ainda se organiza pela promessa de


funcionamento meritocrático, de democratização fundada no mérito, este é o
tema que surge com força nos países ocidentais, sobretudo na sociedade
americana na década de 1950 (CASASSUS, 2007, p. 50).

2. Período marcado por um “olhar radical” da disciplina (1965-

1975): a sociologia da reprodução cultural de Pierre Bourdieu; Este período é


marcado pelo tema das desigualdades escolares. O período é fortemente
influenciado pelos movimentos sociais na Europa e na América, e Maio de 68,
na França, é paradigmático das reivindicações por uma universidade menos
elitista e que pudesse fazer parte do universo de aspirações de todas as
pessoas, independentemente de seu pertencimento de classe social. Depois da
chamada “democratização de ensino” no que diz respeito à educação básica,
era hora de lutar pelo acesso ao ensino superior, começando a luta por uma
reforma universitária na França. Constatou-se que a “democratização de
ensino” não levou a população a uma democratização das estruturas sociais,
isto é, a escolarização não havia diminuído o fosso entre pobres e ricos,
mesmo nos chamados “países mais desenvolvidos”. Assim, este é também o
chamado momento da desilusão e do desencanto em relação ao papel da
escola. Esta seria tão mais eficiente quanto mais mascarasse sua real
intenção, qual fosse, a manutenção das desigualdades sociais. Na teoria, é o
momento da chamada “teoria da reprodução” de Pierre Bourdieu. Para este
autor, a ação pedagógica assegura, através da sua função de reprodução
cultural, uma função de reprodução social, perpetuando o “arbitrário cultural”.
Para o autor, o campo escolar contribui para produção, reprodução e
legitimação das desigualdades. O sistema de ensino teria então uma dupla
função:

a) função de inculcação;

b) função de reprodução de um arbitrário cultural. Ou seja, garantiria a


autorreprodução e reprodução das relações entre grupos ou classes.

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A legitimação da reprodução das hierarquias sociais é transmutada em


hierarquias escolares. A escola é o local onde se opera a transformação do
capital social em capital cultural institucionalizado. O axioma da teoria da
reprodução seria então a violência simbólica e a imposição de um arbitrário
cultural. Se antes a escola era analisada como uma instituição natural,
contribuindo para a reprodução dos saberes e habilidades requeridas pela
divisão do trabalho, a sociologia crítica da educação (na figura de Bourdieu, por
exemplo), transforma a tranquilidade deste esquema, redefinindo-a como
instrumento de produção/ reprodução das relações de força.

Para Bourdieu, muitas vezes é difícil fazer a crítica ao sistema escolar em


virtude do apego a uma certa definição de equidade de oportunidades que
seria resultante do processo de escolarização. Em contrapartida, é possível
desvendar, por meio de mecanismos de seleção consagrados pela escola, o
quanto ela ignora, em termos cognitivos, as desigualdades culturais entre as
crianças.

Por isto a escola pode ser percebida como um dos mecanismos mais eficazes
de “conservação social. A ‘ação do privilégio cultural’ é um dos mecanismos
mais seletivos que opera no interior do sistema escolar, ou seja, a transmissão
da herança cultural”. A posse deste “capital” permitiria o acesso a percursos
escolares marcados pelo sucesso e pela distinção, legitimando, pela via da
escola, um “patrimônio” familiar – a cultura – transmitido por herança às futuras
gerações entre famílias de classe social favorecida.

A influência deste capital é percebida pela relação entre o nível cultural global
da família e o êxito escolar da criança. A “ancestralidade” na transmissão deste
capital não pode ser desconsiderada, como o nível cultural dos avós, por
exemplo. As partes mais “rentáveis” do capital escolar na escola seriam o
capital linguístico e a chamada “cultura livre”, marcada por experiências
extraescolares. A “cultura livre” é desigualmente distribuída entre as diferentes
classes sociais e a escola nada mais faz do que perpetuar estas diferenças.
Quanto mais rico for o conhecimento dos estudantes (sobre cinema, música,
artes em geral), mais elevada é sua origem social. As atitudes da família em
relação à escola refletem, pois, a posição social que esta ocupa na sociedade:

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quanto mais elevada for sua posição social, maiores suas expectativas de
escolarização, e quanto mais desfavorecida for a família, mais limitadas suas
aspirações em relação ao futuro. A ação do meio familiar sobre o sucesso
escolar parece ser quase exclusivamente cultural, uma vez que a proporção de
“bons alunos” parece aumentar com a renda e com o nível do diploma do pai.
As duas instâncias, quando conjugadas, permitem aos pais não somente
intervir com competência na escolaridade dos filhos, mas influenciar no
desenvolvimento do aluno por meio do ambiente familiar e, notadamente, das
conversas e dos diálogos entretidos entre pais e filhos.

Pode-se dizer que a cultura de elite é tão próxima à cultura escolar que as
crianças originárias de outras classes não podem adquirir, senão
penosamente, o que é herdado pelos filhos das classes cultivadas: o bom
gosto, o estilo, o talento etc. A “ideologia do dom” é aquela que acredita na
transmissão quase osmótica do capital cultural (por isso o sentido do “inato”) e
transforma as desigualdades sociais em “desigualdades de dons” ou “méritos”.
Tal ideologia faz com que as classes desfavorecidas aceitem o destino que a
sociedade lhes reserva e acreditem, desta forma, que o responsável pelo seu
insucesso deriva de sua própria “inaptidão natural” para a cultura escolar.

Esta corrente, chamada “teoria da reprodução cultural”, marca uma linha de


pensamento que concluiu que a fonte das diferenças nos resultados dos alunos
– e, portanto, de desigualdade educacional – está ancorada tanto nos fatores
internos à escola, quanto nos fatores externos, encontrados tanto nos
mecanismos de transmissão de um saber pela escola quanto no âmbito
socioeconômico e familiar.

3. Período de “explosão do objeto” ou “destruição dos paradigmas” (1975 até


os dias atuais): a novas tendências na sociologia da educação.

Este período denota o rompimento com uma sociologia que vinha sendo feita
até meados da década de 1970, cujo enfoque era ainda o macroscópico. A
sociologia agora será apreendida no seu fazer cotidiano. Os sujeitos envolvidos
no processo educativo entram em cena e novos atores surgem neste contexto:
a família, os professores, os alunos. Assim como novos atores entram em
cena, assistimos também à recorrência de temas da “microssociologia”, como a

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cultura escolar, o currículo, a sala de aula. Desta forma, a sociologia da


educação percebe que o que se passa no interior da escola não é só objeto da
pedagogia, mas igualmente da sociologia e de outras disciplinas. O olhar
sociológico vai se deslocar das macroestruturas para as microestruturas.
Acredita-se que um dos fatores que possibilitou o chamado “retorno do ator” e
a valorização do microscópico tenha sido a crise do marxismo e, com ela, a
esterilização das explicações estritamente econômicas para as desigualdades
escolares. O “por que” dá lugar ao “como”, ou seja, muda-se o foco de
explicações reducionistas para o fraco desempenho escolar e passa- -se a
desvendar a “alquimia” que faz com que o capital cultural da família, medido
pelo grau de instrução dos pais, produza sucesso ou fracasso escolar. A figura
do sujeito passa a ser central para as análises sociológicas, isto é, tal linha de
pensamento passa a atribuir um papel relevante para os sujeitos e suas
interações na dinâmica social. A crítica desta corrente teórica é que a corrente
anterior havia sido “hiperfuncionalista”, ou seja, a escola era vista como um
“subsistema” ou “aparelho” que servia funcionalmente a um sistema maior,
legitimando as hierarquias.

Para os teóricos dessa corrente, o mundo deveria ser visto não apenas em
termos de dominação, inculcação, legitimação etc., mas se deveriam entender
as relações sociais em termos de resultados de conflitos, de projetos e de
debates entre os diferentes grupos sociais.

Com isso, temos o estudo da microssociologia, da investigação da “caixa-preta”


do sistema educacional. A escola, a partir deste momento, deixa de ser vista
apenas como um espaço de reprodução e passa a ser percebida também
como um espaço de produção de práticas culturais diversas, inclusive práticas
de resistência, revelando que a escola não é uma instituição passiva diante das
estruturas sociais.

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Novos objetos passam a dar o tom para a sociologia da educação, alargando


tanto o campo de análise quanto o instrumental teórico necessário para se
compreender a relação entre educação e sociedade.

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Pode-se dizer hoje que a sociologia da educação constitui um campo fértil de


análise das relações escolares, campo este aberto à interlocução com outras
disciplinas, e está disposta, enquanto disciplina e campo científico, a olhar
tanto para as relações microscópicas, quanto para as relações macroscópicas
que acontecem dentro e fora dos muros escolares.

A sociologia da educação contemporânea tem buscado cada vez mais conjugar


teoria e prática de pesquisa, reabilitando a célebre assertiva de Durkheim:
“Nossas pesquisas não valem mais do que meia hora de reflexão se elas forem
meramente especulativas.” Com base nesta afirmação, Brandão (2001, p. 153)
propõe uma discussão a respeito da superação dos chamados “mecanismos
metodológicos” no campo da pesquisa em sociologia da educação.

A partir da década de 1980, ficou cada vez mais evidente para a sociologia da
educação que as opções teórico-metodológicas devem apoiar-se cada vez
mais nas necessidades da investigação e não em uma opção apriorística do
pesquisador por qualquer uma das alternativas. Isto porque, segundo Brandão
(2001, p. 156), uma antiga querela ainda ronda a pesquisa em sociologia da
educação: a divergência sobre qual a perspectiva mais compatível com o
estudo dos processos educacionais: a das relações face a face entre os
indivíduos empreendidas pelas análises microssociais, ou das relações entre
as estruturas – imposições mais gerais da sociedade –, por meio de análises
macrossociais.

Superar o antagonismo micro/macro na apreensão dos fenômenos sociais pela


sociologia da educação é a tarefa principal desta disciplina científica, a qual
busca ultrapassar as oposições clássicas e defender que o coletivo é individual
e que os níveis microsssociais constroem gradativamente padrões de ações e
representações que se consubstanciam em níveis macrossociais.

Como já analisamos, a sociologia da educação, após a Segunda Guerra


Mundial, esteve marcada por um movimento pendular entre as teorias da ação
e as teorias estruturais. A abordagem fenomenológica inspirou as perspectivas
microssociais, ao passo que entre os defensores das perspectivas
macrossociais estão os adeptos do funcionalismo, das teorias sistêmicas e
estruturalistas de diferentes extrações teórico-ideológicas.

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Pode-se dizer que, no que tange à sociologia da educação no Brasil, até a


década de 1980, houve um predomínio de estudos sociodemográficos e
exames macrossociais voltados para a análise das relações escolares, como
desigualdade, repetência etc.

Com a chegada da década de 1980 e, com ela, da crítica ao positivismo e ao


caráter demasiadamente genérico de algumas abordagens de pesquisa, como
os surveys, é que assistimos a uma virada hegemônica no campo das
estratégias metodológicas em sociologia da educação (BRANDÃO, 2001, p.
161). A etnografia, os estudos de caso, a observação participante, enfim, as
estratégias da pesquisa qualitativa é que foram dominando a pesquisa em
educação.

A nova sociologia da educação (a partir de 1980), portanto, rejeita as


perspectivas unilaterais, pois entende que os processos de configuração social
estão inseparavelmente ligados às dinâmicas micro e macrossociais. A arte do
pesquisador estaria exatamente em sua capacidade de escolher o instrumento
de análise mais adequado ao problema de pesquisa que o desafia e às
possibilidades empíricas do campo de investigação que se apresentam ao
pesquisador (BRANDÃO, 2001, p. 164).

QUESTÕES PARA ESTUDO

1- A escola e suas relações constituem o objeto privilegiado da sociologia da


educação. Fundamente a firmação em refência.

2- Por que é que se considera a educação como investimento e como


sinônimo de desenvolvimento econômico?

3- Diferencie a teoria funcionalista de Durkheim e do sociólogo americano


Talcott Parsons.

4- Resume os dois momentos que são considerados particularmente


importantes para esta disciplina

5- Até que ponto a educação pode representar uma mudança social? Lembre-
se de que, ao apresentar seu argumento, você deve justificá-lo de acordo com
as críticas e ideias dos autores mencionados no fascículo ou noutras
bibliografias consultadas.

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2. Assinale V (verdadeiro) ou F (falso):


( ) A teoria da reprodução cultural de Pierre Bourdieu procura
desmistificar o mito de “escola libertadora”, evidenciado pela teoria
estrutural funcionalista de Talcott Parsons.
( ) A mobilidade ligada à escola é um juízo de valor comum em
sociedades democráticas, nas quais os talentos individuais são
cultivados, já que se espera dessas sociedades uma igualdade de
oportunidades para os indivíduos.
( ) De acordo com o texto lido, fica evidente que a mobilidade social
pela via da escola só acontece para as pessoas que têm familiares
altamente escolarizados.
( ) A associação entre educação e mobilidade social está fortemente
assentada na concepção liberal de economia, de política e de sociedade.
( ) A meritocracia é uma concepção que diverge da ideia de se cultivar os
talentos individuais e as aptidões inatas do indivíduo.

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