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GUIA DE

NUTRIÇÃO PARA
O ONCOLOGISTA

Autores

Andrea Pereira Maria de Fatima Gaui


Coordenação Augusto Mota Micheline Tereza Pires de Souza
Aline Lauda Freitas Chaves Carla Prado Olívia Galvão De Podestá
Dan Linetzky Waitzberg Sabrina Segatto Valadares Goastico
Georgia Silveira de Oliveira Thais Manfrinato Miola
Gislaine Aparecida Ozorio
1
PREFÁCIO

A oncologia é uma especialidade multidiscipli-


nar, tanto no que tange ao tratamento quanto ao
suporte do paciente com câncer.

Temos vários profissionais envolvidos nesses


cuidados, mas cabe ao oncologista ser aquele que
visualiza o quadro de forma mais ampla e global.
Por isso, é fundamental ter em suas mãos concei-
tos e guias rápidos que abordem todo o suporte
ao paciente, direcionando-o de forma correta e
colaborando com sua recuperação. O GUIA DE
NUTRIÇÃO PARA O ONCOLOGISTA da Sociedade
Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) nasceu da Que este seja um
necessidade de organizar o tema dentro de um
texto curto, rápido e com uma linguagem direcio-
guia útil a todos!
nada ao oncologista.

Para elaborar este guia, a SBOC convidou gran-


des especialistas na área (nutrólogos e nutricionis-
tas) e oncologistas atuantes na parte educacional
e acadêmica do tema. A concepção deste material
foi baseada no ciclo de cuidado do paciente: des-
de o diagnóstico do seu estado físico (caquexia,
sarcopenia, obesidade), passando pelo suporte
nutricional durante seu tratamento (cirurgia/qui-
mio/radioterapia), condução dos efeitos colaterais, Dra. Clarissa Mathias
orientação sobre medicamentos e dietas, até a fase Presidente da SBOC
final dos seus cuidados (seja como sobrevivente ao
câncer ou em casos de cuidados paliativos).

Não é objetivo deste material esgotar o tema.


Muito pelo contrário, ele foi criado com a propos-
ta de ser um guia rápido para que o oncologista
tenha acesso fácil e de forma descomplicada aos
princípios envolvidos no suporte nutricional de seu
paciente.

O olhar do oncologista sobre o estado nutricio- Dra. Aline Lauda Freitas Chaves
nal do paciente é essencial, assim como envolver Membro titular da SBOC
os profissionais da área (nutricionistas e nutrólo- Coordenadora do Guia de Nutrição
gos). Ser técnico, como a especialidade exige, ter para o Oncologista da SBOC
um olhar humano e integral melhora não apenas o
valor que entregamos ao paciente, mas, também,
sua qualidade de vida.

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Capítulo 1:
A NUTRIÇÃO PARA O ONCOLOGISTA
Thais Manfrinato Miola
Aline Lauda Freitas Chaves

cer morrem a cada ano apenas


pelas consequências da desnu-
Destaques trição e da caquexia. A gravida-
de dessas consequências são
• A questão nutricional, muitas vezes, é negligenciada pelo preditores independentes de
oncologista; curta sobrevida global (MUSCA-
RITOLI et al., 2011; MUSCARITOLI
• 40 a 80% dos pacientes com câncer desenvolvem algum et al., 2019; RAVASCO, 2019).
grau de desnutrição. A causa da desnutrição no câncer é
multifatorial; Estima-se que 40 a 80% de
todos os pacientes com câncer
• Baixa massa muscular aumenta a toxicidade do trata- desenvolvem algum grau de
mento e piora o prognóstico do paciente; desnutrição durante o curso da
doença, sendo que, já no diag-
• Abordagem mínima do oncologista deve ser reconhecer nóstico, 15 a 40% relatam perda
a importância do tema, envolver equipe multiprofissional de peso. Quando se trata de indi-
no rastreamento e abordagem do paciente, orientar o pa- víduos hospitalizados, 30 a 50%
ciente contra modismos. têm risco nutricional ou des-
nutrição já presente. Pacientes
com câncer de cabeça, pescoço
e esôfago são considerados do
grupo de alto risco nutricional
devido à alta prevalência des-
sa condição nutricional nesses
Estudos demonstram que o mente uma equipe multiprofis-
subgrupos (MUSCARITOLI et al.,
estado nutricional do paciente sional para ajudá-lo na aborda-
2019; RAVASCO, 2019).
com câncer pode afetar os re- gem da questão, favorecendo
sultados do tratamento e quali- seu paciente. Seguir guidelines A causa da desnutrição no
dade de vida do mesmo (RAUH, sobre o tema e orientar os pa- câncer é multifatorial e ocorre
2018). Apesar dessa afirmação, o cientes contra modismos e uso pelas alterações metabólicas
oncologista, muitas vezes, negli- de suplementos e ervas não ba- da própria doença ou por efei-
gencia a questão nutricional. A seado em evidência devem ser tos adversos do tratamento,
alta demanda dos procedimen- a orientação mínima do oncolo- como anorexia, náuseas, vômi-
tos/atualizações médicas, a falta gista no que se refere à nutrição tos, xerostomia, disgeusia, mu-
de tempo para abordagem e do seu paciente. cosite oral, obstrução intestinal
rastreamento nutricional, a não e diarreia. Além disso, traz as
inclusão do tópico nos estudos A perda de peso pode acon- seguintes consequências: im-
clínicos, assim como a falta de tecer desde o início da doença pacto negativo nos resultados
estudos na fase III sobre nutri- ou durante o tratamento. É fre- clínicos com menor tolerância
ção, podem colaborar para essa quente que o primeiro sinal de ao tratamento, fruto do au-
negligência. É fato que os cui- alteração no estado nutricional mento da toxicidade e redu-
dados do paciente têm início seja associado ao aumento de ção da resposta ao tratamento;
com o oncologista, e esse sim morbidade e ao pior prognós- maiores taxas de complicações
deve reconhecer a importância tico e qualidade de vida. Cerca em pós-operatório; retardo na
da nutrição e envolver precoce- de 20% dos pacientes com cân- cicatrização; maior tempo de

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internação; pior qualidade de toxicidade de terapias antine- panhamento); conscientização,
vida; e aumento da mortali- oplásicas (LAVIANO et al., 2018; conhecimento e treinamento
dade (MATTOX, 2017; LAVIANO MUSCARITOLI et al., 2019; CO- para os profissionais; infraestru-
et al., 2018; PENNA et al., 2019; TOGNI et al., 2019). tura; e fatores relacionados aos
MUSCARITOLI et al., 2019; RA-
pacientes, como preferências e
VASCO, 2019). Os agentes citotóxicos cau-
sam efeitos diretos nas células motivação. Ainda, a falta de dire-
O paciente com câncer des- musculares por vários mecanis- trizes e restrições de tempo que
nutrido pode chegar em um mos. Derivados da rapamicina impeçam o encaminhamento
quadro de caquexia, sendo podem interferir nas vias depen- ou orientação nutricional po-
considerado o último evento e dentes de mTor, por exemplo, dem dificultar a interação do on-
inevitável no curso natural da que é uma das principais vias de cologista com a nutrição (SPIRO
doença, e fazendo com que os sinalização de síntese proteica et al., 2006).
profissionais considerem seu muscular ativada por insulina,
tratamento como cuidados pa- aminoácidos e exercícios físi- A inclusão da avaliação do
liativos. Contudo, estudos mais cos. Outros agentes como oxali-
estado nutricional e do seu mo-
recentes sobre a fisiopatologia platina, cisplatina, antracíclicos,
da caquexia mostram que essa fluouroracil e irinotecano podem nitoramento deve ser conside-
conduta deve ser alterada. Vale ser absorvidos pelas células mus- rado ponto estratégico das boas
destacar que distúrbios bio- culares e induzir a atrofia, mito- práticas clínicas no tratamento
químicos, moleculares e me- fagia, dano oxidativo e apoptose do câncer. A elaboração de con-
tabólicos, responsáveis pelo (SCHIESSEL; BARACOS, 2018). dutas nutricionais padronizadas
desenvolvimento da caquexia, é complexa e requer a interação
geralmente, estão presentes no Embora as evidências mos- entre médicos e nutricionistas,
diagnóstico do câncer, mesmo trem o importante papel do
que devem integrá-las como
que não ocorra a perda de peso estado nutricional no câncer, a
atenção à perda de peso e des- parte do processo de atendi-
(MUSCARITOLI et al., 2011).
nutrição permanece insuficien- mento para beneficiar os pacien-
Um dos componentes mais te. Os motivos provavelmente tes com câncer (COTOGNI et al.,
importantes para a perda de estão relacionados à falta de co- 2019; MUSCARITOLI et al., 2019).
peso da caquexia do câncer é a nhecimento, falta de treinamen-
baixa massa muscular, que está to e valores mínimos para en- O cuidado nutricional deve
presente em mais da metade saios clínicos em nutrição. A falta ser adjuvante em qualquer tra-
dos pacientes oncológicos (MUS- de evidência de alta qualidade tamento e incluído na abor-
CARITOLI et al., 2011; RAVASCO, baseada em ensaios clínicos ran- dagem multidisciplinar em
2019; PRADO et al., 2020). domizados sobre a eficácia da
oncologia. A abordagem multi-
terapia nutricional enfraqueceu
A perda de músculo esquelé- o interesse dos oncologistas pela disciplinar é fundamental para
tico relacionada ao câncer leva nutrição. No entanto, evidências definir estratégias eficientes
à deterioração do estado clínico crescentes apoiam as interven- que possam melhorar a quali-
e funcional do paciente e pior ções nutricionais no paciente dade da assistência do paciente
prognóstico, pois é impulsio- oncológico (MUSCARITOLI et al., oncológico, uma vez que a inter-
nada por sistemas proteolíticos 2011; MUSCARITOLI et al., 2019). venção nutricional não é ampla-
intramusculares e desencade- mente acessível a todos os pa-
ada pela interação entre baixa Martin et al. (2016) observaram
cientes (RAVASCO, 2019).
ingestão alimentar; aumento cinco fatores principais para me-
do gasto calórico; inflamação lhorar a prática nutricional entre
A nutrição é de grande im-
sistêmica, podendo ser de baixo oncologistas: base de evidências
grau e crônica; crescimento do para o benefício de intervenções portância em oncologia, sendo
tumor; e o tratamento. A baixa nutricionais; implementação de fundamental para o sucesso do
massa muscular também é um processos de cuidado nutricional tratamento e recuperação do
fator de risco para o aumento da (avaliação, intervenção e acom- paciente (RAVASCO, 2019).

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Caminho do Oncologista Caminho do Nutricionista

Triagem e avaliação Nutricional


Diagnóstico e Estadiamento (máximo de 4 semamas após
o diagnóstico do câncer)

Intervenção Nutricional
Primeira Linha de Tratamento (adaptação às necessidades
específicas do paciente)

Seguimento Seguimento

Reavaliação Periódica Reavaliação Periódica

Intervenção Nutricional
Segunda Linha de Tratamento (nutriçao específica;
enteral/parenteral)

5
Referências

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MUSCARITOLI, M.; MOLFINO, A.; •
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Capítulo 2:
GLOSSÁRIO – PRINCIPAIS TERMOS
UTILIZADOS EM NUTRIÇÃO
Olivia Galvão De Podestá
Thais Manfrinato Miola

Abreviação de jejum pré-ope- Caquexia: Desnutrição relacionada à do-


ratório: síndrome multifatorial com per- ença com inflamação:
oferta de líquidos claros com da contínua de massa muscular resultado da ativação do sistema
carboidrato de rápida absorção (com ou sem perda de tecido inflamatório por uma doença de
para reduzir o tempo de jejum adiposo), a qual não pode ser base, como o câncer. A respos-
pré-operatório. totalmente revertida com a TN ta inflamatória causa anorexia e
convencional, levando o orga- quebra dos tecidos, o que resul-
nismo a um comprometimento ta em perda de peso, alterações
Aconselhamento dietético: funcional progressivo. na composição corporal e redu-
primeira linha de terapia nutri- ção da capacidade física.
cional. Orientações nutricionais
individuais e específicas, com Caquexia refratária:
estratégias para solucionar os pleno catabolismo, não tem res- Estado nutricional:
problemas relativos ao trata- posta ao tratamento e a expec- resultado do equilíbrio entre
mento oncológico tanto na pre- tativa de sobrevida é menor que o consumo de nutrientes e o
venção quanto no tratamento 3 meses. gasto energético do organismo
das toxicidades. para suprir as necessidades nu-
tricionais, em plano individual
Desnutrição: ou coletivo.
Avaliação antropométrica: expressão biológica relacionada
avaliação do crescimento físico à carência prolongada da inges-
e, por extensão, do estado nu- tão de nutrientes essenciais à Eutrofia:
tricional por meio de medidas manutenção, ao crescimento e estado nutricional adequado.
de peso e de altura e, de forma ao desenvolvimento do organis-
complementar, de outras medi- mo humano.
das, como perímetros, circunfe- Imunonutrição:
rências e dobras cutâneas. oferta de nutrientes específicos
Desnutrição crônica: que modulam a resposta infla-
processo caracterizado pela ca- matória.
Avaliação nutricional: rência pregressa da ingestão e
abordagem completa realizada utilização de nutrientes pelo or-
pelo nutricionista com o objeti- ganismo humano. Índice de massa corporal, IMC.:
vo de avaliar o estado nutricio- indicador de saúde utilizado
nal do cliente/paciente. para avaliar a adequação entre
Desnutrição energético-pro- peso e altura corporais e sua re-
teica: lação com o risco para doenças
Bioimpedância elétrica: estado orgânico nutricional re- crônicas não transmissíveis. É
método de avaliação da compo- sultante da ingestão insuficien- calculado pela seguinte fórmu-
sição corpórea através da passa- te de calorias e proteínas por la: IMC = P/A2, em que P é o peso
gem de corrente elétrica. um indivíduo. corporal em quilogramas, A é

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a altura em metros elevada ao ou maior que 5% do peso corpo- de do indivíduo.
quadrado; o resultado é expres- ral; pode haver anorexia e altera-
so em kg/m2. ções metabólicas.
Sobrepeso:
excesso de peso de um indiví-
Nutrição parenteral: Prebióticos: duo quando em comparação
solução ou emulsão composta componentes alimentares não
com tabelas ou padrões de nor-
basicamente por carboidratos, digeríveis e que afetam benefi-
malidade.
aminoácidos, lipídios, vitaminas camente o hospedeiro pelo estí-
e minerais, estéril e apirogênica, mulo seletivo da proliferação ou
acondicionada em recipiente atividade de populações de bac-
de vidro ou plástico, destinada térias desejáveis no cólon. Suplemento nutricional oral:
à administração intravenosa em produto para ingestão oral,
pacientes desnutridos ou não, apresentado em formas farma-
em regime hospitalar, ambu- Probióticos: cêuticas, destinado a suplemen-
latorial ou domiciliar, visando à micro-organismo vivo que, tar a alimentação de indivíduos
síntese ou manutenção dos te- quando administrado em quan- saudáveis com nutrientes, subs-
cidos, órgãos ou sistemas. tidades adequadas, confere um tâncias bioativas, enzimas ou
benefício à saúde do indivíduo. probióticos, isolados ou combi-
nados.
Obesidade:
doença crônica de natureza Sarcopenia:
multifatorial (fatores ambien- distúrbio progressivo e gene-
tais, nutricionais e genéticos), ralizado do músculo esqueléti- Terapia nutricional enteral:
caracterizada pelo acúmulo ex- co, com diminuição e perda de assistência dietética prestada ao
cessivo de gordura no corpo e força, associado ao aumento da cliente/paciente ou usuário para
que acarreta prejuízos à saúde. probabilidade de desfechos ad- manter ou recuperar o seu esta-
versos, incluindo quedas, fratu- do nutricional através de trata-
ras, incapacidade física e morta- mento nutricional, com formu-
Obesidade Sarcopênica: lidade. lações específicas.
combinação da obesidade com
sarcopenia, cujos mecanismos
incluem inflamação e/ou ina- Simbióticos:
tividade do músculo induzido Triagem nutricional:
produtos alimentares que com-
por catabolismo em pacientes procedimento que busca iden-
binam probióticos – suplemen-
obesos. tificar indivíduos desnutridos ou
to alimentar microbiano vivo
– e prebióticos – componentes em risco de desnutrição, com
alimentares não digeríveis –, os o propósito de verificar se uma
Pré-caquexia: quais atuam sobre a microbiota avaliação nutricional adicional,
quando há perda ponderal igual intestinal para beneficiar a saú- mais detalhada, é necessária.

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Capítulo 3:
AVALIAÇÃO INICIAL DO PACIENTE
Carla Prado
Augusto Mota
Thais Manfrinato Miola

esta ocorre. Perda de peso >2%


em apenas 1 semana já é con-
Destaques do capítulo siderada perda ponderal gra-
ve, assim como perda >5% em 1
• A avaliação inicial do paciente deve justificar, informar e mês, >7,5% em 3 meses e >10%
guiar a intervenção nutricional; em 6 meses (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2013).
• Deve ser feita precocemente e continuamente para evitar
a evolução da desnutrição e informar, sucessivamente, os re- Investigar sobre as possíveis
sultados da intervenção nutricional; mudanças na ingestão alimen-
tar também é um componente
• A baixa massa muscular (sarcopenia) é uma das caraterís- essencial das ferramentas de
ticas da desnutrição e caquexia; triagem devido ao impacto que
a ingestão alimentar inadequa-
• Desnutrição, sarcopenia e caquexia são síndromes dife- da causa ao estado nutricional
rentes, porém compartilham características em comum; e ao estado geral de saúde dos
pacientes. Os pacientes com
• Os métodos diretos e indiretos de avaliação da massa câncer podem apresentar uma
muscular podem otimizar a avaliação inicial do paciente. série de sintomas que tende a
interferir diretamente na inges-
tão alimentar, como alterações
A avaliação inicial do pacien- em risco nutricional e, portan- do paladar e do olfato, náuse-
te aplica-se a todos os pacientes to, determinar se a avaliação as e vômitos, saciedade preco-
(ambulatoriais e hospitalizados) nutricional detalhada é indica- ce, diarreia, dentre outros (RA-
e tem como objetivo justificar, da (TEITELBAUM et al., 2005). VASCO, 2019). Embora diversos
informar e guiar a intervenção Como apresentado na Tabela 1, questionários destinados ao ras-
nutricional (ARENDS et al., 2017). dentre as variáveis incluídas na treamento nutricional imediato
A avaliação inicial pode ser rea- triagem nutricional estão altura, do paciente já estejam disponí-
lizada como parte do processo peso, índice de massa corporal veis, possivelmente o mais am-
de triagem nutricional, que con- (IMC) calculado e perda de peso plamente utilizado no Brasil é o
siste numa abordagem rápida, involuntária, informações que Nutrition Risk Screening 2002
econômica e prática para deter- podem ser coletadas por um (NRS®-2002) (KONDRUP et al.,
minar o estado geral de saúde profissional de saúde ou autor- 2003), conforme disposto no
do paciente (PRASAD; CHAR- relatado pelo paciente (BARA- anexo 3.1.
NEY, 2008). As ferramentas de COS et al., 2010).
triagem nutricional podem ser As diretrizes internacionais
usadas em todos os pacientes, Com relação à porcenta- de oncologia nutricional reco-
e suas características permitem gem de perda de peso, esta é mendam, veementemente, a
que elas sejam aplicadas por frequentemente avaliada com avaliação regular da triagem nu-
qualquer profissional de saúde. base em períodos previamente tricional, que deve ser parte in-
definidos, como perda em 1, 3 tegrante do atendimento ao pa-
O principal objetivo da tria- ou 6 meses. A gravidade da per- ciente, devendo ser iniciada no
gem é identificar um indivíduo da de peso está diretamente re- momento do diagnóstico e repe-
que esteja com desnutrição ou lacionada com o tempo em que tida com periodicidade depen-

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dente da evolução clínica dos tricional por meio de avaliações baixa massa muscular também
pacientes (ARENDS et al., 2017). longitudinais (GONZALEZ et al., é conhecida por sarcopenia. A
A etapa subsequente à triagem 2010). Conforme discutido por sarcopenia no câncer é conside-
é a avaliação completa do esta- Jager-Wittenaar e Ottery (2017), rada secundária, pois está asso-
do nutricional, considerando as o ASG-PPP pode agilizar o fluxo ciada a uma condição, ou seja,
diretrizes de terapia nutricional de trabalho clínico e melhorar a ao câncer. Muitas vezes é carac-
no paciente com câncer estabe- qualidade da interação entre o terizada apenas pela medição
lecidas pela Sociedade Brasileira corpo clínico e o paciente. Mais da massa muscular (BAUER et
de Nutrição Parenteral e Enteral recentemente, a Iniciativa de Li- al., 2019).
(BRASPEN). Nessa etapa, todos derança Global em Desnutrição
os pacientes previamente iden- (GLIM) publicou um consenso A sarcopenia primária é a
tificados em risco nutricional das maiores Sociedades de Nu- sarcopenia relacionada à idade,
precisam, obrigatoriamente, ter trição Clínica Global (incluindo o definida pela perda de massa
o seu estado nutricional avaliado Brasil), com proposição de crité- e força/função muscular obser-
(BRASPEN, 2019). rios para o diagnóstico de des- vada no envelhecimento. Em
nutrição (CEDERHOLM, 2019). casos de o paciente apresentar
A etapa de avaliação do esta- Sua performance na identifica- síndrome de desnutrição, deve-
do nutricional envolve métodos ção da desnutrição em pacien- -se procurar a sarcopenia como
mais abrangentes e abordagens tes com câncer ainda está sen- possível consequência; já nos
diversas, os quais, consequente- do explorada. casos em que a sarcopenia é pri-
mente, demandam mais custo meiramente identificada, deve-
e tempo em sua execução. Essa A inclusão da composição -se procurar a desnutrição como
etapa requer um conhecimen- corporal como parte da avalia- causa (CEDERHOLM et al., 2019;
to especializado do tema e, por ção nutricional se apresenta CRUZ-JENTOFT; SAYER, 2019).
isso, deve ser feita por nutricio- como um interesse emergen-
nistas treinados. Em contrapar- te devido à maior capacidade De acordo com as caracterís-
tida, fornece informações mais de identificação de anormali- ticas apresentadas na Figura 1 e
precisas sobre o real estado nu- dades ocultas, que somente a Tabela 2, as Diretrizes de Tera-
tricional dos pacientes, confor- avaliação de peso não é capaz pia Nutricional no Paciente com
me pode ser observado na Ta- de rastrear. A título de ilustra- Câncer, propostas pela BRAS-
bela 1. ção, pessoas com peso dentro PEN (BRASPEN, 2019), sugerem
da faixa de eutrofia ou com so- que a perda de peso, as altera-
A ferramenta de avaliação brepeso que apresentam baixa ções na ingestão alimentar e os
nutricional mais amplamente massa muscular, e pessoas em marcadores inflamatórios de-
aceita é a Avaliação Subjetiva situações de baixo peso ou peso vem ser utilizados para o diag-
Global Produzida pelo Próprio eutrófico, mas com alta quan- nóstico da caquexia oncológica.
Paciente (ASG-PPP) (JAGER- tidade de gordura corporal, em Conforme proposto pelo grupo
-WITTENAAR; OTTERY, 2017), ambas as situações, não seriam de consenso internacional, for-
disposto no anexo 3.2. Esse rastreadas apenas pela verifica- mado por experts em pesquisa
questionário foi desenvolvido ção do peso corporal (PRADO et clínica da caquexia do câncer,
especificamente para pacientes al., 2018). o diagnóstico inclui perda de
com câncer, elaborado a partir peso >5% do peso corporal total
da Avaliação Subjetiva Global A baixa massa muscular é em qualquer valor de classifica-
(ASG) e validado para o portu- de particular importância, pois ção do índice de massa corporal
guês por Gonzalez et al. (2010). essa é uma característica defi- (IMC), ou perda de peso >2% do
Nessa validação, a ferramenta nidora de desnutrição associa- peso corporal total em IMC <20
se mostrou um método sensí- da ao câncer. A perda de massa kg/m2, ou a existência de sarco-
vel e capaz de identificar preco- muscular esquelética no câncer penia com perda de peso >2%
cemente um maior número de ocorre com ou sem perda de do peso corporal (FEARON et al.,
pacientes que necessitam de massa gorda, sendo indepen- 2011). A avaliação da massa mus-
intervenções nutricionais dire- dente da caquexia oncológica cular é essencial para o diagnós-
cionadas (MILANI et al., 2018). A (ARENDS et al., 2017). A inter-re- tico da sarcopenia (nesse caso,
sua pontuação contínua é van- lação entre sarcopenia, desnu- sarcopenia secundária) e pode
tajosa e permite uma avaliação trição e caquexia é demonstra- ser feita por meio de técnicas
da eficácia da intervenção nu- da na Figura 1 e na Tabela 2. A de composição corporal ou por

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avaliações alternativas. poral (Tabela 3). Recomenda-se prognóstica desses exames não
ao leitor uma discussão mais está bem definida no contexto
Como parte do exame físico, aprofundada sobre as vanta- do câncer, e, apesar de fornece-
a antropometria pode ser utiliza- gens e desvantagens de cada rem informações complementa-
da para estimar ou avaliar o sta- técnica de avaliação da compo- res, eles não foram oficialmente
tus da massa muscular, como, sição corporal (PRADO; HEYMS- considerados como parte do
por exemplo, a medida da área FIELD, 2014) e dos pontos de diagnóstico de sarcopenia no
muscular do braço, que é con- corte disponíveis para a classifi- câncer (FEARON et al., 2011).
siderada como uma opção no cação (SOUZA et al., 2014).
diagnóstico da sarcopenia e da
caquexia (FEARON et al., 2011). Em idosos, a avaliação da Considerações Finais
Outra medida comumente uti- massa muscular pode envolver A avaliação inicial do estado
lizada na antropometria é a cir- a avaliação da função e perfor- nutricional do paciente é essen-
cunferência da panturrilha, que mance física (BRASPEN, 2019), cial para uma intervenção pre-
se correlaciona com a massa o que não deve ser confundido coce, contínua e direcionada. Os
muscular, mas tem sido estuda- com um diagnóstico proposto instrumentos de triagem nutri-
da essencialmente na popula- para todos pacientes, como ex- cional são acessíveis, rápidos e
ção de idosos. Como técnica pro- plicado detalhadamente nes- podem ser aplicados por todo
missora, a medida da espessura sa referência (BRASPEN, 2019). o corpo clínico, que inclui onco-
do músculo adutor do polegar As técnicas recomendadas in-
logistas, nutrólogos ou nutricio-
(EMAP) também pode ser útil cluem a força de preensão pal-
nistas. Nas situações em que os
como parte dos protocolos de mar, por meio da dinamometria
pacientes são identificados com
avaliação nutricional no rastreio para avaliação da força muscu-
desnutrição ou em risco de des-
da desnutrição, apesar de ainda lar, considerada como um dos
nutrição, é necessária uma ava-
não terem sido conduzidos estu- critérios para o diagnóstico da
dos para a validação do seu uso sarcopenia primária (CRUZ-JEN- liação aprofundada do estado
(POZIOMYCK et al., 2018). TOFT; SAYER, 2019). nutricional e, nesse caso, sua con-
dução é de exclusiva responsabi-
A análise de bioimpedância Outro teste físico é a avaliação lidade do nutricionista. Por fim,
elétrica e a tomografia compu- da velocidade de marcha, por a prevenção e o tratamento da
tadorizada estão entre as ferra- meio do teste da caminhada, que desnutrição são essenciais para
mentas úteis e populares, res- é utilizado para o diagnóstico e melhorar a qualidade de vida, a
pectivamente, para a estimativa grau da sarcopenia secundária. resposta ao tratamento e o prog-
e medição da composição cor- Vale ressaltar que a capacidade nóstico geral dos pacientes.

Depleção associada a
citocinas inflamatórias e a
Ingestão inadequada doença
de nutrientes Baixa massa muscular
Perda de peso e sem perda de gordura;
sintomas de impacto anorexia
nutricional Desnutrição
Não pode ser totalmente
revertido por intervenção
nutricional
Baixa massa
muscular (e baixa
força na sarcopenia
primária)
Baixa massa
A inflamação pode muscular Caquexia
ser subclínica (Sarcopenia)

11
Tabela 1: D
 iferenças entre ferramentas de triagem nutricional e de avaliação do
estado nutricional do paciente

Considerações Triagem Avaliação

Ferramenta de triagem Avaliação subjetiva global (ASG)


nutricional (MST) Avaliação subjetiva global (ASG)
Miniavaliação nutricional (MNA- produzida pelo paciente (ASG-PPP)
Ferramentas / SF) Miniavaliação nutricional (MNA)
Abordagem Risco Nutricional (NRS®-2002) Composição corporal
Ferramenta internacional Ingestão alimentar
de triagem para desnutrição Performance física / função
(MUST) Inflamação sistêmica

Igual à triagem mais sintomas


gastrointestinais
Exame físico
Índice de massa corporal (IMC) Análise de composição corporal
Perda de peso involuntária (DXA, BIA, TC ou antropometria) para
detectar a perda de massa muscular
Variáveis utilizadas Perda de apetite/ diminuição do oculta
consumo alimentar
Escala OMS / ECOG ou escala de
Estado geral de saúde desempenho de Karnofsky
Proteína C reativa e albumina (outros
marcadores bioquímicos adicionais
relevantes)
Gravidade da doença /
diagnóstico oncológico Teste de velocidade de marcha,
dinamômetros
Possíveis variáveis Estresse psicológico ou doença
aguda Pontuação de prognóstico de Glasgow
adicionais necessárias
para classificar a resposta inflamatória
Problemas neuropsicológicos
Exame físico
Mobilidade
Pacientes identificados como risco
Populações-alvo Todos os pacientes nutricional
Julgamento clínico
Funcionários na admissão clínica
Profissional responsável (pacientes hospitalizados) Nutricionista
Equipes comunitárias de saúde

No diagnóstico ou 24-48h após a


No diagnóstico de desnutrição ou de
hospitalização
risco nutricional.
Quando realizar Repetir em todos os pacientes
Repetir como parte do monitoramento
durante o tratamento
e avaliação nutricional (dependendo da
(semanalmente, a cada 15 dias ou
intervenção)
mensalmente).

BIA: Bioimpedância elétrica; DXA: Absorciometria por dupla emissão de raio X; ECOG: Eastern Cooperative Oncology Group perfor-
mance status; OMS: Organização mundial de saúde; TC: tomografia computadorizada

12
 aixa massa muscular (sarcopenia), desnutrição e caquexia: diferenças
Tabela 2: B
e similaridades

Perda de Massa muscular


Desnutrição Caquexia
(Sarcopenia)
X ? X

Baixo índice de massa


X ? X
corporal (IMC)

Perda de massa muscular X X X


Perda de gordura corporal X ? ?
Inflamação X ? X

Perda de apetite/sintomas de
X - X
impacto nutricional

Baixa ingestão alimentar X - X

Pode ser revertido por


X X -
intervenção nutricional

Legenda: X = sim/usualmente presente; ? = não necessariamente presente

Tabela 3: M
 étodos de avaliação da composição corporal relevantes para
ambientes clínicos baseados nas recomendações da BRASPEN (2019)

Método Vantagens Desvantagens


Fácil, rápido, amplamente disponível Ainda não apresenta um ponto de
Circunferência da
panturrilha Pontos de corte validados pra população corte como valor prognóstico no
brasileira câncer
Aproveitamento das imagens já Alta radiação, pode ser usado apenas
Tomografia coletadas como parte do atendimento para fins secundários
computadorizada clínico oncológico Não disponível para todos os pacientes
Medição direta da massa muscular (imagem ou área de interesse)
Medições sensíveis à flutuação no
Seguro, portátil, acessível
estado de hidratação
Bioimpedância Medida do Ângulo de fase, um método
Massa muscular estimada com
elétrica promissor como marcador da baixa
base em equações de predição que
quantidade e qualidade da massa
são específicas da população e do
muscular
dispositivo utilizado

Suscetível à disponibilidade
Baixa radiação, rápido
Absorciometria Sensível a mudanças severas de
Alta precisão
por dupla emissão estado de hidratação
de raio X (DXA) Pode ser feito no contexto de avaliação
Não mede diretamente a massa
da densidade mineral óssea
muscular

13
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TRIAGEM NUTRICIONAL NRS 2002

Sim Não

1 O IMC do paciente é <20,5kg/m2?

2 O paciente teve perda de peso não-intencional nos últimos 3 meses?

3 O paciente teve redução na ingestão alimentar na última semana?

O paciente está em estado grave, mau estado geral ou em terapia


4
intensiva?
Se a resposta for SIM para alguma dessas 4 perguntas, a parte 2 deve ser realizada:

14
Parte 2

Gravidade da doença
Estado nutricional debilitado
(metabolismo da doença)

Ausente Ausente
Estado nutricional normal Necessidades nutricionais normais
Escore 0 Escore 0
Perda de peso >5% em 3
meses Fratura de quadril
OU Pacientes crônicos, em particular
Leve Leve
Ingestão alimentar abaixo com complicações agudas: cirrose,
Escore 1 Escore 1 DPOC, hemodiálise crônica,
de 50-75% das necessidades
normais na semana diabetes, câncer
precedente
Perda de peso >5% em 2
meses
OU
IMC 18,5-20,5 + condição geral
Cirurgia abdominal grande,
Moderado debilitada Moderado
AVC, pneumonia grave, câncer
Escore 2 OU Escore 2 hematológico
Ingestão alimentar abaixo
de 25-50% das necessidades
normais na semana
precedente
Perda de peso >5% em 1 mês
(ou >15% em 3 meses)
OU
IMC <18,5 + condição geral Traumatismo craniano,
Grave debilitada Grave Transplante de Células-Tronco
Escore 3 OU Escore 3 Hematopoiéticas, paciente de
terapia intensiva
Ingestão alimentar abaixo
de 0-25% das necessidades
normais na semana
precedente
Escore: +
Escore Total:

Calcule o escore total:


1. Encontre um escore (0-3) para estado nutricional debilitado (somente um: escolha a variável com o es-
core mais elevado) e gravidade da doença (metabolismo do estresse isto é, aumento nas necessidades
nutricionais);
2. Some os 2 escores escore total;
3. Se idade ≥70 anos: adicione 1 ao escore total para corrigir a fragilidade das pessoas idosas;
4. Se o total com a idade corrigida ≥3: inicie o suporte nutricional.
Fonte: Fonte: KONDRUP, J.; RASMUSSEN, H. H.; PHAMBERG, O.; STANGA, Z. Ad Hoc ESPEN Working Groupet al. Clin Nutr, v. 22, n. 3, p. 321-36, 2003.

15
ANEXO 3.2 Avaliação Subjetiva Global

Uso com autorização da PT-Global. Acesso do documento original em: pt-global.org/pt-global

16
Uso com autorização da PT-Global. Acesso do documento original em: pt-global.org/pt-global

17
Capítulo 4:
TERAPIA NUTRICIONAL ORAL
Thais Manfrinato Miola
Georgia Silveira de Oliveira
Olivia Galvão De Podestá
Carla Prado

ou açúcar livre; isentos ou ricos


em gordura; fortificados com
Destaques do capítulo nutrientes imunomoduladores;
acrescidos ou não de fibras ali-
• A terapia nutricional se baseia no aconselhamento dietéti- mentares, ou, ainda, direciona-
co e na recomendação do uso de suplementos nutricionais; do a condições clínicas específi-
cas, como pacientes diabéticos,
• Pacientes com baixa ingestão alimentar e/ou perda de com insuficiência renal ou he-
peso devem receber suplementos nutricionais; pática, entre outros (TANAKA et
al., 2017; GARÓFOLO et al., 2020).
• A oferta proteica pode variar de 1,0-1,5 gramas/kg peso/dia,
com principal alvo de oferta de 1,2 gramas/kg peso/dia, po- A oferta de suplementos nu-
dendo chegar a 2,0 gramas/kg peso/dia; tricionais contempla pacientes
com baixa ingestão alimentar
• Ômega-3 está indicado para câncer avançado, quimiote-
(<70% das necessidades nutri-
rapia e risco de perda ponderal, com recomendação de 2g/
cionais) e/ou perda de peso, mas
dia de EPA;
que tenham sua função digesti-
• Não há recomendação de megadoses de vitaminas e mi- va preservada e capacidade de
nerais para pacientes com câncer. ingestão oral. Indivíduos com
trato gastrintestinal não funcio-
nante, disfagia grave, vômitos
incoercíveis e instabilidade he-
modinâmica não têm indicação
para essa terapia (ARENDS et al.,
2017; HORIE et al., 2019; GARÓ-
Introdução et al., 2019; COTOGNI et al., 2019;
FOLO et al., 2020).
RAVASCO, 2019; GARÓFOLO et
A terapia nutricional pode ser al., 2020).
via oral, enteral e/ou parenteral Além de melhorar a ingestão
e deve-se sempre priorizar a via Os suplementos nutricionais alimentar com o aumento do
mais fisiológica, quando pos- são disponibilizados para consu- consumo calórico-proteico e au-
sível. A terapia nutricional oral mo por via oral e podem ser en- xiliar na recuperação do estado
(TNO) tem como principal pilar contrados de forma pronta para nutricional, melhorando o peso
o aconselhamento dietético e a o consumo, em embalagem e a composição corporal, a TNO
recomendação do uso de suple- tetra-pack ou em latas, ou em melhora a tolerância ao trata-
mentos nutricionais. A nutrição pó para reconstituição. Diver- mento e a qualidade de vida de
oral deve ser a via preferencial sos são os tipos de suplementos pacientes com câncer. Em pa-
de alimentação, pois é uma par- nutricionais e são divididos em cientes hospitalizados, reduz o
te significativa da rotina diária fórmulas padrão e especializa- tempo de internação e custos
do paciente e contribui subs- das, de acordo com a sua com- hospitalares. Além disso, estu-
tancialmente para a sua au- posição, podendo ser: normo a dos demonstram que a diminui-
tonomia (CACCIALANZA et al., hipercalórico; normo a hiperpro- ção da massa muscular impacta
2016; ARENDS et al., 2017; HORIE teico; isentos ou não de sacarose no aumento da toxicidade da

18
quimioterapia (ARENDS et al., como a oferta do HMB (β-hidro- suplementados apenas em ca-
2017; PACCAGNELLA et al., 2010; xi-β-metilbutirato), um metabó- sos de deficiências específicas.
BALDWIN et al., 2012; PHILIP- lito da leucina. Já a suplementa- Não há recomendação de me-
SON et al., 2013; CACCIALANZA ção de glutamina tem sido cada gadoses de vitaminas e mine-
et al., 2016; YALCIN et al., 2019; vez menos indicada devido à fal- rais para pacientes com câncer
GOMES et al., 2019; DE VAN DER ta de evidências clínicas para o (ARENDS et al., 2017; HORIE et
SCHUEREN, 2019). anabolismo muscular e pelo seu al., 2019).
potencial efeito no metabolis-
Embora existam as opções de mo tumoral (ARENDS et al., 2017; Considerações Finais
suplemento em pó ou líquido, HORIE et al., 2019; PRADO et al.,
parece que o uso de fórmulas lí- 2020; KANAREK et al., 2020). A TNO exige trabalho mul-
quidas e com maior densidade tiprofissional, já que cada es-
energética apresentam melhor Ácidos Graxos Ômega-3 pecialidade é responsável por
adesão à terapia pelo paciente parte do processo, porém, essas
Embora ainda não haja evi- especialidades possuem dife-
(YALCIN et al., 2019). Cabe ainda
dência científica para a reco-
ressaltar que esse tipo de inter- rentes visões sobre o suplemen-
mendação de ácidos graxos
venção nutricional apresenta to nutricional, sendo conside-
ômega-3, estudos vêm apon-
melhores resultados quando rada desde medicamento até a
tando potenciais benefícios na
aliado ao aconselhamento die- complementação à nutrição. Os
sua suplementação em onco-
tético e acompanhamento re- diferentes entendimentos so-
logia. Esses ácidos estão rela-
gular do paciente. A eficácia da bre a finalidade do suplemento
cionados à atenuação da pro-
TNO para melhora da massa e ocasionam certa confusão para
teólise e inflamação, aumento
força muscular é visível com, os pacientes sobre o real benefí-
da ingestão alimentar, ganho
no mínimo, 12 semanas de in- cio do mesmo, influenciando na
de peso e melhora da compo-
tervenção (CRUZ-JENTOFT et sua adesão e acompanhamento
sição corporal, principalmen-
al., 2014; LEE et al., 2016; DE VAN te em pacientes caquéticos (BRINDISI et al., 2020).
DER SCHUEREN, 2019; PRADO (ARENDS et al., 2017; HORIE et
et al., 2020). A intervenção nutricional
al., 2019; PRADO et al., 2020).
deve fazer parte do tratamen-
Por terem ação anti-inflamató-
Proteínas ria, essa suplementação pode to oncológico com abordagem
ser promissora na sarcopenia, multidisciplinar, pois assim per-
A oferta proteica em pacien- mite melhor adesão, sendo esta
tes com câncer pode variar de uma vez que a inflamação crô-
nica de baixo grau associada um fator importante para o tra-
1,0-1,5 gramas/kg peso/dia, com tamento e recuperação do pa-
principal alvo de oferta de 1,2 ao envelhecimento pode ser
um importante fator para o de- ciente (RAVASCO, 2019).
gramas/kg peso/dia, podendo
chegar a 2,0 gramas/kg peso/dia senvolvimento dessa condição
para pacientes oncológicos sar- (DUPONT et al., 2019). Referências
copênicos e com presença de • ARENDS, J. et al. ESPEN guidelines
inflamação, resistência à secre- As recomendações seriam on nutrition in cancer patients.
de 2 a 4g ao dia de ácidos gra- Clinical Nutrition, v. 36, n. 1, p. 11-48,
ção de insulina e sedentarismo,
xos ômega 3 (2:1 de EPA e DHA) 2016.
sendo distribuída ao longo do
(FREITAS et al., 2019; PRADO et • BALDWIN, C.; SPIRO, A.; AHERN, R.;
dia com 20-30 gramas de prote-
al., 2020). Em indivíduos com EMERY, P. W. Oral Nutritional Inter-
ínas por refeição (ARENDS et al.,
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ção é de 2g/dia de EPA (ARENDS
A qualidade da proteína ofer-
et al., 2017).
tada permanece em discussão • BRINDISI, M. C.; NOACCO, A.; HAN-
na literatura. Estudos mostram SAL, A. A. B.; GENTIAL, C. H. Delivery
que aminoácidos de cadeia ra-
Vitaminas e Minerais of oral nutrition supplement in hos-
pital: Evaluation of professional prac-
mificada, como a leucina, pode- Os micronutrientes devem tices in evaluation of nutritional sta-
riam trazer benefícios, pois são ser ofertados em dosagens cor- tus and representations of ONS by
um dos principais sinalizadores respondente às RDAs (Recom- the caregivers and patients. ESPEN.
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Exp Res, v. 31, n. 6, p. 825-836, 2019. Care Cancer, v. 24, n. 1, p. 469-480, 2382-2396, 2019. doi:10.1016/j.clinthe-
doi:10.1007/s40520-019-01146-1. 2016. doi:10.1007/s00520-015-2958-4 ra.2019.09.006.

20
Capítulo 5:
DIETA ENTERAL E PARENTERAL
Gislaine Aparecida Ozorio
Micheline Tereza Pires de Souza
Sabrina Segatto Valadares Goastico
Dan Linetzky Waitzberg

NISTÉRIO DA SAÚDE, 2015, n.p.).

Destaques do capítulo A Terapia Nutricional Enteral


(TNE) está indicada para qual-
• A Terapia Nutricional Enteral (TNE) é indicada para qual- quer paciente incapaz de atingir
quer paciente oncológico incapaz de atingir por via oral me- por via oral menos de 60% das
nos de 60% das necessidades nutricionais nas últimas duas necessidades nutricionais nas úl-
semanas; timas duas semanas, seja por al-
terações neurológicas, anatômi-
• Existem diversas vias de acesso para o paciente receber cas, psicossociais ou patologias,
TNE e que dependem da condição clínica do paciente e do as quais afetam o seu metabolis-
tempo de permanência da TNE; mo e suas necessidades calóricas
e proteicas (ARENDS et al., 2017).
• A seleção da fórmula enteral baseia-se em diversos dados
clínicos, entre eles a capacidade digestiva e absortiva, e os A nutrição enteral é contrain-
estados nutricional e metabólico do paciente; dicada nas seguintes situações
(Quadro 1):
• A Terapia Nutricional Parenteral (TNP) deve ser indicada
em pacientes oncológicos que não possuam aparelho di- Quadro 1:
gestivo funcional e com capacidade absortiva;
Contraindicações da
• Em pacientes desnutridos graves ou em jejum prolonga- nutrição enteral
do por mais de sete dias, o início da terapia nutricional deve
ser de forma gradativa para evitar a Síndrome de Realimen-
tação; • Obstrução mecânica total do
trato gastrintestinal;
• Pacientes em cuidados paliativos devem ser avaliados • Refluxo gastroesofágico
quanto ao benefício da TNP. intenso (débito gástrico
persistentemente maior que
500ml/dia);
• Íleo paralítico;
• Hemorragia gastrintestinal;
NUTRIÇÃO ENTERAL ou elaborado para ser utilizado
• Vômitos incoercíveis;
de forma exclusiva ou comple-
A nutrição enteral é definida, • Diarreia intratável;
mentar na alimentação de pa-
segundo a RDC nº 21, de 13 de
cientes com capacidade limita- • Fístulas do TGI de alto débito
maio de 2015, como: “alimento
da de ingerir, digerir, absorver e/ (500ml/dia);
para fins especiais industria-
lizado apto para uso por tubo ou metabolizar alimentos con- • Enterocolite grave;
e, opcionalmente, por via oral, vencionais ou de pacientes que
• Situações de abdome agudo
consumido somente sob orien- possuem necessidades nutricio- ou isquemia mesentérica.
tação médica ou de nutricionis- nais específicas determinadas Consequosse nobit audit
ta, especialmente processado por sua condição clínica” (MI-

21
Via de acesso para TNE da: (a) cirúrgica (técnica aberta tabelecidos com base nas re-
ou laparoscópica), realizada por comendações para população
A sonda nasoenteral é a for-
cirurgião e anestesia geral; (b) saudável;
ma mais utilizada de posicio-
fluoroscópica, com orientação
namento preferencialmente
radiológica por radiologista ca- II – Fórmula modificada para
gástrico, salvo em condições de
pacitado com sedação; ou (c) nutrição enteral: fórmula para
contraindicação (gastroparesia,
endoscópica (Gastrostomia En- nutrição enteral que sofreu al-
condição na qual o estômago
doscópica Percutânea (GEP), ou teração em relação aos requisi-
não tem esvaziamento adequa-
do termo em inglês PEG (Percu- tos de composição estabeleci-
do, mas o restante do intesti-
taneous Endoscopic Gastros- dos para a fórmula padrão para
no sim; vômitos e tumores do
tomy), por gastroenterologista nutrição enteral, e que implica
trato gastrointestinal superior),
ou cirurgião com sedação. Esses ausência, redução ou aumento
quando a sonda é posicionada
tipos de sondas podem perma- dos nutrientes, adição de subs-
na porção jejunal do intestino.
necer no local por meses a anos tâncias ou de proteínas hidroli-
Sondas nasojejunais também
(BAIU; SPAIN, 2019). sadas;
são chamadas de sondas pós-
-pilóricas, embora o ideal seja
Tipos de fórmulas III – Módulo para nutrição
a posição jejunal. As formas de
administração podem ser con- Nas últimas décadas, houve enteral: fórmula para nutrição
tínua (por bomba de infusão), aumento no número de formu- enteral composta por um dos
intermitente ou em bolo (BRAS- lações de dietas enterais disponí- principais grupos de nutrientes:
PEN, 2019). veis no mercado. As dietas ente- carboidratos, lipídios, proteínas,
rais podem ser classificadas em: fibras alimentares ou micronu-
Quando o paciente precisa trientes (vitaminas e minerais)
da TNE por mais de duas sema- I – Fórmula padrão para nu- (BAIU; SPAIN, 2019).
nas, indica-se a colocação de trição enteral: fórmula para nu-
gastrostomia ou sonda de jeju- trição enteral que atende aos IV – Dieta mista: intercala uso
nostomia. Existem três maneiras requisitos de composição para de dietas industrializadas com
principais de colocar essa son- macro e micronutrientes, es- preparações “caseiras”.

Tabela 1: Classificação de fórmulas para nutrição enteral

Termo Descrição
Preparação nutricional cuja composição em macro e micronutrientes abrange
as necessidades da maioria da população sem distúrbios metabólicos ou
digestivos.
• CHO – 45
• Lipídio – 15 a 35%
Nutrição enteral padrão
• Proteína – 10 a < 20%
• Fórmula polimérica
• Vitaminas e minerais dentro de limites mínimo e máximo
•P ode ter adição de fibras (até 2g/100Kcal), entre outros nutrientes (flúor,
carnitina, inositol, β-caroteno).

Fibra solúvel ou fermentável: substância de origem vegetal, carboidrato ou


derivados, que resiste à hidrólise de enzimas digestivas e chega íntegra no
intestino grosso, onde algumas podem ser hidrolisadas e fermentadas pelas
bactérias. Retém a água e forma um gel durante a digestão, retardando a
Nutrição enteral digestão e absorção dos nutrientes. Inclui pectina, mucilagens e gomas.
com fibras Fibra insolúvel ou não fermentável: substância de origem vegetal, carboidrato
ou derivados, que resiste à hidrólise de enzimas digestivas e chega íntegra
no intestino grosso. É dificilmente fermentada, não sendo solúvel, embora
absorva água, o que acelera a passagem dos alimentos e aumenta o volume
das fezes. Inclui celulose, hemicelulose, amido não digerível e lignina.

22
Termo Descrição
Fórmula cuja composição de macro e/ou micronutrientes é adaptada às
Nutrição enteral
necessidades de acordo com a enfermidade e/ou determinado distúrbio
específica ou especial
metabólico ou digestivo.

Fórmula nutricionalmente Fórmula capaz de cobrir 100% das necessidades nutricionais de macro e
completa micronutrientes.

Fórmula polimérica Contém proteínas intactas, como macromoléculas ou peptídeos grandes.

Fórmula A maior parte das proteínas são hidrolisadas para pequenos peptídeos ou
oligomérica aminoácidos livres.

Fórmula monomérica Possui aminoácidos livres, isenção de resíduos, hiperosmolares e,


ou elementar normalmente, é de alto custo.

Fonte: RDC nº 21, de 13 de Maio de 20159; STIPPLER, 2015 (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2015).

Tabela 2: Classificação conforme os macronutrientes

Critérios na fórmula pronta para o


Nutriente ou
Alegação consumo de acordo com instruções de
substância
preparo do fabricante
Fórmula com densidade
Densidade energética inferior a 0,9 kcal/ml.
energética baixa

Fórmula com densidade Densidade energética maior ou igual a 0,9 kcal/ml


Energia
energética normal e menor ou igual a 1,2 kcal/ml.

Fórmula com densidade


Densidade energética superior a 1,2 kcal/ml
energética alta

Quantidade de proteínas inferior a 10% do valor


Fórmula hipoproteica
energético total

Quantidade de proteínas maior ou igual a 10% e


Fórmula normoproteica
menor que 20% do valor energético total

Quantidade de proteínas igual ou superior a 20%


Fórmula hiperproteica
do valor energético total

Fórmula intacta ou fórmula Somente com proteínas na forma intacta, com


Proteína polimérica exceção dos casos previstos no § 1º do art. 9º

Fórmula de aminoácidos livres,


fórmula elementar ou fórmula Somente com aminoácidos livres
monomérica

Quantidade de proteínas hidrolisadas na forma


Fórmula hidrolisada ou fórmula de peptídeos (cadeias de 2 a 50 aminoácidos)
oligomérica superior a 50% do teor de proteína no produto;
não pode conter proteínas na forma intacta

23
Critérios na fórmula pronta para o
Nutriente ou
Alegação consumo de acordo com instruções de
substância
preparo do fabricante

Fórmula hipolipídica Quantidade de lipídios inferior a 15% do VET

Quantidade de lipídios maior ou igual a 15% e


Fórmula normolipídica
menor ou igual a 35% do VET

Fórmula hiperlipídica Quantidade de lipídios superior a 35% do VET

Alto teor de gorduras


Quantidade de ácidos graxos monoinsaturados
monoinsaturadas, alto teor de
superior a 20% do valor energético total
Lipídeo MUFA ou alto teor de ômega 9.

Soma das quantidades de ácidos graxos saturados


Baixo em gorduras saturadas
e trans inferior ou igual a 0,5 g/100 kcal

Quantidade de ácido linolênico igual ou superior a


Fonte de ômega 3 300mg/100kcal ou soma das quantidades de EPA
e DHA igual ou superior a 40 mg/100 kcal.

Quantidade de ácido linolênico igual ou superior a


Alto teor de ômega 3 600 mg/100 kcal ou soma das quantidades de EPA
e DHA igual ou superior a 80mg/100kcal.

Fonte: RDC nº 21, de 13 de Maio de 2015 (1). VET- valor energético total (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2015).

Tabela 3: Alegação conforme a composição de nutrientes

Critérios na fórmula pronta para o


Nutriente ou
Alegação consumo de acordo com instruções de
substância
preparo do fabricante
Sem lactose, não contém lactose
Quantidade de lactose inferior a 25mg/100 kcal
ou isento de lactose
Carboidratos
Não contém sacarose adicionada, nem ingredientes
Sem adição de sacarose
que contenham sacarose

Fonte de fibras Quantidade de fibra superior ou igual a 1,5 g/100 kcal

Fibras Alto teor de fibras Quantidade de fibra superior ou igual a 3 g/100 kcal

Sem fibra Quantidade de fibra inferior a 0,1g/100 kcal

Sódio Hipossódica Quantidade de sódio inferior ou igual a 50mg/100 kcal

Fonte de... (especificar os Quantidade dos nutrientes superior ou igual ao


nutrientes) valor mínimo estabelecido.
Vitaminas
Alto teor de... (especificar os Quantidade dos nutrientes superior ou igual a duas
nutrientes) vezes o valor mínimo estabelecido

Nutriente ou Critérios na fórmula pronta para o consumo de


Alegação
substância acordo com instruções de preparo do fabricante

Fonte: RDC nº 21, de 13 de Maio de 2015 (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2015).

24
A prescrição de terapia nu- nal com módulos, ou se interca- FERREIRA; SCHIEFERDECKER,
tricional enteral deve atender la com dieta industrializada. É 2014).
à meta nutricional estabeleci- importante salientar que as die-
da com segurança. Para tanto, tas industrializadas possuem A terapia nutricional mis-
é fundamental o uso de dietas pH e viscosidade adequados ao ta pode ser considerada desde
quimicamente definidas ou uso nos diferentes dispositivos que se avaliem alguns critérios
industrializadas que, além de existentes no mercado, além de específicos (vide fluxograma
abaixo), seguidos de monitora-
garantir o fornecimento dos garantir sua qualidade nutricio-
mento constante por parte de
nutrientes na sua totalidade, é nal, com menor risco de con-
equipe multiprofissional (BRAS-
mais segura, pois evita conta- taminação (BRASPEN, 2018). A
PEN, 2018). O retorno à adminis-
minação, obstrução do dispo- maior dificuldade na prescrição
tração completa por dieta indus-
sitivo e tem uma viscosidade de dietas artesanais é garantir trializada deve ser indicado em
adequada (BRASPEN, 2018). sua qualidade nutricional. Na casos de piora clínico-nutricional.
literatura, apesar de poucos
A dieta artesanal implica a estudos, está clara sua baixa Abaixo, reproduz-se o fluxo-
utilização de alimentos in na- qualidade nutricional, com in- grama retirado das diretrizes da
tura. Chama-se de dieta mista dicação de alto déficit de ma- BRASPEN para paciente em te-
quando se mescla dieta artesa- cro e micronutrientes (SOUSA; rapia nutricional.

Fluxograma: Critérios de elegibilidade para uso da TNE mista

Sim Não
Trato gastrointestinal Nutrição Parental
funcionante?

Nutrição Enteral Apresenta algum distúrbio Sim

metabólico?
Não

Apresenta sonda nasojejunal, Dieta enteral polimérica Dieta enteral especializada


ou jejunostomia? industrializada

Possui gastrostomia?

Sim

Não
Moradia apresenta BOAS
condições higiênico-sanitárias?

Sim Sim

Sim
Dieta enteral Paciente desnutrido ou meta
industrializada nutricional Acima de 2000KCal?

Não

Paciente possui lesão por


Sim pressão?
Dieta Mista
Intercalar dieta artesanal Não
com dieta industrializada
ou uso de módulos Monitorar mensalmente o
industrializados paciente, em caso de piora
Dieta Mista clínica ou nutricional, reavaliar
a prescrição

Fonte: Diretriz Brasileira de Terapia Nutricional (BRASPEN, 2018).

25
Monitoramento nutricional enteral não é capaz pacientes críticos em terapia
de atingir 60% das necessidades intensiva com instabilidade he-
Recomenda-se, para obten-
nutricionais calculadas, diarreia modinâmica ou distúrbios me-
ção de melhor tolerância, ini-
ou mucosite grave (Quadro 2) tabólicos graves (hiperglicemia
ciar a TNE de maneira precoce
(ARENDS et al., 2017). > 300 mg/dl, hipernatremia Na >
e aumentá-la progressivamente
150 mEq/L, hipocalemia: K < 3,0
em até 72 a 96 horas, com mo-
nitorização diária em pacien- Quadro 2: Indicações mEq/L, hipofosfatemia: P< 2,0
mEq/L, ácidos metabólica: pH
tes internados, e semanal ou de terapia de nutrição < 7,30. Em pacientes em cuida-
quinzenalmente em pacientes parenteral dos paliativos, o risco x benefício
ambulatoriais. A avaliação deve
deve ser avaliado (McCLAVE et
contemplar exame físico, antro-
• Terapia nutricional enteral al., 2009).
pométrico, laboratorial, presença
de eliminação de flatos e fezes, não atinge 60% das
necessidades nutricionais Síndrome de realimentação
náuseas, vômitos e distensão
abdominal, dor e desconforto • Vômitos intratáveis (SR)
associado à dieta enteral. O des- • Mucosite grave São alterações metabólicas e
mame da nutrição enteral está • Diarreia grave eletrolíticas que ocorrem como
indicado quando a aceitação ali- resultado da reintrodução ou
• Íleo paralítico
mentar por via oral for maior que provisão de calorias após perío-
70% das recomendações nutri- • Fístulas entero-cutâneas de do de ingestão calórica diminuí-
cionais por, pelo menos, três dias alto débito da ou ausente (SILVA et al., 2020).
consecutivos (ARENDS et al., • Suboclusão intestinal Em pacientes oncológicos, a SR
2017; BRASPEN, 2019). • Doença do enxerto x é particularmente frequente,
hospedeiro (GVHD) sobretudo em pacientes desnu-
TERAPIA DE NUTRIÇÃO • Desnutrição grave / tridos graves, em jejum prolon-
gado ou em dieta hipocalórica
PARENTERAL moderada em pacientes
internados por mais de sete dias (BRASPEN,
A nutrição parenteral (NP) 2019). O diagnóstico baseia-se
é definida, segundo a portaria • Pré-operatório de paciente na queda dos níveis séricos de
do Ministério da Saúde nº 272/ desnutrido moderado/ fósforo, potássio e magnésio,
MS/SNVS de 8 Abril 1998, como: grave cirurgia abdominal podendo estar associado à hi-
“Solução ou emulsão, composta de grande porte pernatremia e alterações de flui-
basicamente de carboidratos, dos (edema) (BRASPEN, 2019).
aminoácidos, lipídeos, vitaminas As possíveis complicações da SR
e minerais, estéril e apirogênica, TNP e cirurgia
são: neurológicas (síndrome de
acondicionada em recipiente A TNP pode ser indicada em Wernicke Korsakoff), cardíacas
de vidro ou plástico, destinada pacientes cirúrgicos, desnutri- (insuficiência cardíaca conges-
à administração endovenosa dos graves (ASG C ou NRS >5) ou tiva, arritmias), insuficiência res-
em pacientes desnutridos ou que serão submetidos à cirurgia piratória e até óbito (SILVA et al.,
não, em regime hospitalar, am- abdominal de grande porte por 2020). Evita-se a SR em pacien-
bulatorial ou domiciliar, visando 7-10 dias no período pré-opera- tes em risco, com oferta gradati-
a síntese ou à manutenção dos tório quando ocorre perda de va de calorias (inicialmente 15-20
tecidos, órgãos e sistemas.” peso de >10-15% do peso nos úl- kcal/kg/dia) e reposição de vita-
timos 6 meses, IMC < 18,5 kg/m², mina B1.
Indicação de Terapia de albumina sérica < 3 mg/dl (WEI-
Nutrição Parenteral MANN et al., 2017). Monitoramento
As principais indicações de No paciente oncológico hos-
Contraindicação da TNP
Terapia Nutricional Parente- pitalizado em início de TNP, ava-
ral (TNP) em pacientes que es- A TNP é contraindicada liam-se diariamente os níveis séri-
tão em tratamento oncológico quando o trato gastrintestinal cos de sódio, potássio, magnésio,
(quimioterapia, radioterapia, for suficiente para garantir as fósforo, cálcio iônico, ureia, creati-
cirurgia) com intenção curati- necessidades nutricionais ade- nina, hemograma, glicemia, peso.
va são: trato gastrintestinal não quadas (via oral ou enteral), hi- Semanalmente, triglicérides,
funcionante, quando a terapia pertrigliceridemia > 400 mg/dL, TGO, TGP, FA, GGT, bilirrubinas

26
totais e frações, proteínas totais e cuidados especiais para a ad- Ill Patient: Society of Critical Care Me-
frações (SILVA et al., 2020). ministração da TNP (BRASPEN, dicine (SCCM) and American Society
2019; DRUML et al., 2016). for Parenteral and Enteral Nutrition
(A.S.P.E.N.). J Parenter Enter Nutr., v.
Cuidados Paliativos 33, n. 3, p. 277–316, 2009. DOI:  10.1177/
Existem controvérsias sobre Referências 0148607115621863 (ano errado)
os benefícios da TNP em pa- • ARENDS, J. et al. ESPEN guidelines
on nutrition in cancer patients. Clin • MINISTÉRIO DA SAÚDE. Agência Na-
cientes em cuidados paliativos,
Nutr., v. 36, n. 1, p. 11–48, 2017. https:// cional de Vigilância Sanitária – AN-
considerando a sobrevida, mor-
doi.org/10.1016/j.clnu.2016.07.015 VISA. RDC no 21, de 13 de maio de
bidade e tempo de hospitali- 2015. Dispõe sobre o regulamento
zação. A decisão cabe à equipe • BRASPEN BS OF P AND EN. Diretriz técnico de fórmulas para nutrição
multidisciplinar de saúde em BRASPEN de terapia nutricional no enteral. Brasília: MS/ANVISA, 2015.
conjunto com a vontade do pa- paciente com câncer, v. 34, Supl. 1,
ciente. Para isso, é importante p. 2-32, 2019. •
SOUSA, L. R. M. de; FERREIRA, S.
avaliar o conhecimento, respei- M. R.; SCHIEFERDECKER, M. E. M.
• BAIU, I.; SPAIN, D. A. Enteral Nutrition. Physicochemical and nutritional
tar os desejos do paciente e ava- JAMA, v. 321, n. 20, p. 2040, 2019. ht- characteristics of handmade en-
liar as expectativas do paciente tps://doi.org/10.1001/jama.2019.4407 teral diets. Nutr Hosp., v. 29, n. 3, p.
e família por meio da abertura 568–74, 2014. https://doi.org/10.3305/
de uma comunicação efetiva. • BRASPEN BS OF P AND EN. Diretri- nh.2014.29.3.7083
De modo geral, não é alterna- zes Brasileira de Terapia Nutricio-
nal, v. 33, Supl. 1, p. 1-37, 2018.
tiva terapêutica para pacientes • SILVA, J. S. V. et al. ASPEN Consen-
com expectativa de vida igual • DRUML, C. et al. ESPEN guideline on
sus Recommendations for Refee-
ou menor que 90 dias e com ca- ethical aspects of artificial nutrition ding Syndrome. Nutr Clin Pract., v.
35, n. 2, p. 178–95, 2020. https://doi.
pacidade funcional igual ou me- and hydration. Clin Nutr., v. 35, n. 3, p.
545–56, 2016. https://doi.org/10.1016/j. org/10.1002/ncp.10474
nor que 50%. A equipe de saúde
clnu.2016.02.006
também deve levar em conside- • WEIMANN, A. et al. ESPEN guideli-
ração as complicações poten- • McCLAVE, S. A. et al. Guidelines for the ne: Clinical nutrition in surgery. Clin
ciais advindas da TNP, o custo Provision and Assessment of Nutrition Nutr., v. 36, n. 3, p. 623–50, 2017. ht-
financeiro e a necessidade de Support Therapy in the Adult Critically tps://doi.org/10.1016/j.clnu.2017.02.013

27
Capítulo 6:
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
DE INAPETÊNCIA E CAQUEXIA
Dan Linetzky Waitzberg
Micheline Tereza Pires de Souza
Gislaine Aparecida Ozorio
Augusto Mota

Destaques do capítulo
• Os agentes farmacológicos podem ser usados para direcionar os principais mecanismos pato-
gênicos da caquexia do câncer;

• As evidências permanecem insuficientes para endossar fortemente qualquer agente farmaco-


lógico e melhorar os resultados da caquexia do câncer.

Em pacientes com quadro de Tabela 1: Agentes farmacológicos associados


inapetência e/ou desnutridos,
caquéticos com câncer avança-
à paliação de sintomas
do, os agentes farmacológicos
podem ser usados para auxiliar Agente farmacológico Recomendações sugeridas
no tratamento dos principais Antiemético Aliviar náuseas e vômitos
mecanismos patogênicos da
caquexia do câncer (CONSEN- Eliminar causas fúngicas,
Antimicrobianos bacterianas ou virais de infecções
SO BRASILEIRO DE CAQUEXIA/
gastrointestinais ou outras.
ANOREXIA, 2011).
Aliviar a dor crônica ou associada à
As necessidades nutricio- Analgésicos mastigação, deglutição ou atividade
nais dos pacientes com câncer intestinal.
devem ser atendidas de forma Agentes para induzir a
adequada, independente do tra- Xerostomia.
produção de saliva
tamento farmacológico. Agentes
farmacológicos específicos po- Diminuir a produção excessiva
Agentes antissecretores de saliva ou vômito em casos de
dem ser necessários ou úteis em
transporte intestinal prejudicado.
distúrbios gastrointestinais com
relevância para a ingestão ou ab- Tratar ou proteger contra lesões
Inibidores da secreção de
sorção de alimentos, bem como sintomáticas da mucosa ou refluxo
ácido gástrico
em estados tipicamente asso- esofágico.
ciados à diminuição do apetite, Agentes para manter ou
como infecções microbianas, dor Tratar ou evitar constipação ou
normalizar a motilidade
diarreia.
crônica ou sofrimento psicosso- intestinal
cial (ARENDS et al., 2017a). Isso
Aliviar a ansiedade, modulador do
pode incluir as seguintes cate- Antidepressivos
humor.
gorias de agentes e recomenda-
ções sugeridas para seu uso: Fonte: Adaptado Consenso Brasileiro de Caquexia / Anorexia (2011).

28
Como a maioria dos estudos ral em pacientes com caquexia ao uso de corticosteroides em
controlados e randomizados por câncer. No entanto, o tipo longo prazo, seu papel como es-
não demonstrou benefícios da de ganho de peso associado ao timulante do apetite geralmen-
intervenção nutricional isolada uso de acetato de megestrol é, te é limitado a pacientes com
no ganho de peso e na quali- principalmente, tecido adiposo expectativa de vida de semanas
dade de vida, o tratamento da em vez de músculo esqueléti- a alguns meses (ARENDS et al.,
caquexia passa a ser associado co. As toxicidades do acetato 2017b).
ao uso de grande variedade de de megestrol incluem eventos
agentes farmacológicos, cujo tromboembólicos, edema e su- Vale ressaltar que as evidên-
objetivo principal é obter melho- pressão adrenal. Achados seme- cias permanecem insuficien-
ra na qualidade de vida do pa- lhantes foram observados com tes para endossar fortemente
ciente oncológico (ROELAND et acetato de medroxiprogeste- qualquer agente farmacológi-
al., 2020). A Tabela 2 aponta, de rona (CONSENSO BRASILEIRO co e melhorar os resultados da
maneira resumida, os principais DE CAQUEXIA/ANOREXIA, 2011; caquexia do câncer; os médicos
fármacos utilizados e ilustra as ARENDS et al., 2017a). podem optar por não oferecer
medicações mais importantes medicamentos para o tratamen-
utilizadas, assim como as drogas Os corticosteroides também to da caquexia do câncer. Atual-
emergentes no manuseio da sín- melhoram o apetite em um mente, não há medicamentos
drome caquexia/anorexia. grau semelhante ao observado aprovados pela Food and Drug
com o acetato de megestrol. No Administration (FDA) para a in-
O acetato de megestrol me- entanto, dadas as toxicidades e dicação de caquexia do câncer
lhora o apetite e o peso corpo- o declínio na eficácia associados (ROELAND et al., 2020).

29
Tabela 2: Medicamentos preconizados no tratamento da caquexia induzida pelo câncer

Classificação Nível de
Medicamento Indicação Clínica Dose Precaução
Farmacológica Evidência

Tratamento paliativo
para o câncer de mama e
Início: 160 mg Progressão: História prévia
Agente antineoplásico, endométrio,
conforme resposta clínica de fenômenos B para caquexia e
Megestrol Hormônio estimulante Caquexia, Meta: 400-1200mg/dia Ideal: tromboembólicos TVP, anorexia
de apetite
Anorexia, 800 mg/dia TEP, gravidez
Perda inexplicável de peso

1ª linha para síndrome


anorexia caquexia. Agente
de ação anti-inflamatória
e imunossupressora para
várias doenças clínicas.
A ação de bem-estar e
aumento de apetite (↓
náusea e melhora astenia). Imunossupressão,
↑curto prazo para o apetite hiperglicemia,
Corticoide Anti-
e ingestão alimentar, 2-8mg /dia Limite: 4 osteoporose, fraqueza
Dexametasona inflamatório hormonal ---
sem assegurar ganho semanas muscular, delírios,
Antiemético
de peso. Devido à sua insônia, irritabilidade,
ação limitada e efeitos cushing, candidíase oral
colaterais, é o fármaco de
escolha para pacientes
em fase avançada da
doença oncológica, com
melhora na qualidade de
vida, porém não reduz
mortalidade

30
Classificação Nível de
Medicamento Indicação Clínica Dose Precaução
Farmacológica Evidência
Teratogênico. Pode
Corticoide Anti- causar dor neuropática.
Eritema nodoso Mieloma
Talidomida inflamatório hormonal 100 a 300mg 1x/dia. Proibido em gestante. ---
múltiplo Caquexia
Antiemético Possui recomendações
especiais para seu uso.

Claudicação intermitente Contraindicado em


Agente redutor na doença arterial casos de hemorragia
Pentoxifilina obstrutiva crônica 400mg 3 xs/dia ---
viscosidade sanguínea retineana ou cerebral
Caquexia recente

Cipionato de Testosterona:
50 a 400 mg –a cada 2 a 4
semanas

Cipionato de Testosterona Undecanoato de


Testosterona: Início: 120
a 160mg por 3 semanas
Undecanoato Manutenção: 40 a 120 mg
de Testosterona Disfunções hipogonadais por dia
em homens, atraso da
Anabolizante puberdade, promoção do Masculinização,
Undecilato de Testosterona esteroides, derivados crescimento; e em doenças Undecilato de Testosterona: retenção de fluidos e ---
crônicas associadas ao 1000mg a cada 10 a 14 hepatotoxicidade
sintéticos
catabolismo, anorexia e semanas
Fenilpropianato de testosterona
(60mg)* isocarproato caquexia
de testosterona (60mg)*, propionato fenilpropianato de
de testosterona (30mg) *e decanoato testosterona (60mg)*
de testosterona (100mg)* isocarproato de testosterona
(60mg)*, propionato de
testosterona (30mg) *e
decanoato de testosterona
(100mg)*: 1 ampola a cada 3
semanas

31
Classificação Nível de
Medicamento Indicação Clínica Dose Precaução
Farmacológica Evidência

Iniciar: 7,5 mg/d dose única


Risco de suicídio.
Antidepressivo Alfa-2- à noite. Dose usual: 15-
Mirtazapina --- Não suspender ---
antagonista 30 mg/dia Dose Máxima
abruptamente.
(geriátrica): 45 mg/dia

Útil em condições como


cefaleia e anorexia
Anti-histamínico glaucoma, úlcera
devido ao bloqueio 5HT. Adultos: 4mg cloridrato de
piperimídico péptica estenosante,
Cloridrato Ciproeptadinaz Atua como antagonista ciproeptadina via oral três ---
e Antagonista hipertrofia prostática
serotoninérgico no centro vezes ao dia
serotononérgico sintomática
do apetite hipotalâmico,
com o aumento do apetite

Canabinóide* Ilícito no Brasil

O Ibuprofeno na dose
de 400mg, três vezes
ao dia, foi demonstrado
que diminui os níveis
de proteínas de fase
aguda, de interleucina-6 Náuseas, vômitos, dor
e cortisol, e que normaliza epigástrica, azia, úlceras
a cinética das proteínas 400mg de 6/6horas ou até gastroduodenais,
Anti-inflamatório não
Ibuprofeno totais corporais em alguns de 4/4h dose máxima diária: sangramentos, ---
hormonal (AINH).
pacientes com câncer 2.400mg nefrotoxicidade,
colorretal. Em estudo hepatotoxicidade e
envolvendo pacientes com reações cardiovasculares
neoplasia de pâncreas,
estabiliza o peso e melhora
a qualidade de vida, talvez
por diminuição do gasto
energético

Fonte: Adaptado do Consenso Brasileiro de Caquexia / Anorexia (2011).

32
*Canabinóides: Apesar de ser ilícito no recebendo benefício clínico. O drona- • JATOI, A. et al. Dronabinol Versus Me-
Brasil, os canobinóides têm sido utili- binol foi menos eficaz do que o acetato gestrol Acetate Versus Combination
zados por alguns pacientes que con- de megestrol em relação ao ganho de Therapy for Cancer-Associated Ano-
seguem o seu uso por via judicial. No peso, apetite e qualidade de vida, sendo rexia: A North Central Cancer Treat-
entanto, não há na literatura indicação este último avaliado pelo instrumento ment Group Study. J Clin Oncol., v.
segura sobre a dose a ser utilizada e de Avaliação Funcional da Anorexia / Ca- 20, n. 2, p. 567–73, 2002. https://doi.
precauções, além de comprovação do quexia. A combinação de dronabinol e org/10.1200/jco.2002.20.2.567
benefício para o tratamento e mane- acetato de megestrol não foi mais eficaz
jo do quadro de anorexia e caquexia do que o acetato de megestrol isolada-
do câncer. Um ensaio clínico, realiza-
• ROELAND E. J. et al. Management
mente(JATOI et al., 2002). of Cancer Cachexia: ASCO Guideline.
do em 2018, designou aleatoriamente
47 pacientes com câncer avançado de J Clin Oncol. , v. 38, n. 21, p. 2438–53,
2020. DOI: 10.1200/JCO.20.00611
pulmão de não pequenas células e ano- Referências
rexia para tratamento com nabilona ou
placebo por oitos semanas. Os braços do • ARENDS, J. et al. ESPEN guidelines • STRASSER, F. et al. Comparison of
estudo não diferiram significativamen- on nutrition in cancer patients. Clin Orally Administered Cannabis Ex-
te em relação ao apetite, mudança de Nutr., v. 36, n. 1, p. 11–48, 2017a. https:// tract and Delta-9-Tetrahydrocan-
peso ou ingestão total de energia (TUR- doi.org/10.1016/j.clnu.2016.07.015 nabinol in Treating Patients with
COTT et al., 2018). Um ensaio realizado Cancer-Related Anorexia-Cachexia
em 2006, com 243 pacientes com cân- Syndrome: A Multicenter, Phase III,
• ARENDS, J. et al. ESPEN expert group
cer avançado e perda de peso ≥ 5% nos Randomized, Double-Blind, Place-
6 meses anteriores, avaliou três grupos: recommendations for action against
bo-Controlled Clinical Trial From the
(a) delta-9-tetrahidrocanabinol (THC) e cancer-related malnutrition. Clin
Cannabis-In-Cachexia-Study-Group.
canabidiol, (b) THC sozinho e (c) placebo. Nutr., v. 36, n. 5, p. 1187–96, 2017b. ht-
J Clin Oncol., v. 24, n. 21, p. 3394–
A duração pretendida do tratamento era tps://doi.org/10.1016/j.clnu.2017.06.017
400, 2006. https://doi.org/10.1200/
de 6 semanas. O ensaio foi interrompi-
jco.2005.05.1847
do precocemente devido às diferenças •
CONSENSO BRASILEIRO DE CA-
insuficientes entre os braços (STRASSER QUEXIA / ANOREXIA. Revista Brasi-
et al., 2006). Outro estudo publicado • TURCOTT, J. G. et al. The effect of na-
leira de Cuidados Paliativos, v. 3, n. bilone on appetite, nutritional status,
em 2002 avaliou dronabinol, acetato de
megestrol e a combinação em 469 pa-
3, supl. 1, p. 3-42, 2011. http://www.crn1. and quality of life in lung cancer pa-
cientes com câncer incurável, excluin- org.br/wp-content/uploads/2014/06/ tients: a randomized, double-blind
do câncer de cérebro, mama, ovário ou CONSENSO-BRASILEIRO-DE-CA- clinical trial. Support Care Cancer, v.
endometrial. O tratamento foi continu- QUEXIA-ANOREXIA-EM-CUIDADOS- 26, n. 9, p. 3029–38, 2018. https://doi.
ado enquanto o paciente parecia estar -PALIATIVOS_-2011.pdf?x53725 org/10.1007/s00520-018-4154-9

33
Capítulo 7:
ABORDAGENS DIETÉTICAS
ALTERNATIVAS
Carla Prado
Georgia Silveira de Oliveira
Olivia Galvão De Podestá
Thais Manfrinato Miola
ocorrência de equívocos, barrei-
ras na adoção de intervenções
Destaques nutricionais e escolhas alimen-
tares inadequadas, as quais im-
• Pacientes com câncer estão susceptíveis a fontes erradas pactam negativamente o esta-
de informação nutricional; do nutricional.

• Dietas alternativas podem alterar negativamente o estado Entre as mensagens comu-


nutricional do paciente; mente observadas e que são
direcionadas a esses pacientes
• O profissional da saúde deve educar o paciente a não se- estão as abordagens dietéticas
guir dietas/abordagens da moda; não convencionais durante o
tratamento do câncer. A maio-
• Algumas dietas alternativas podem ser potencialmente ria é baseada em uma evidência
benéficas para os pacientes, especialmente em curto pra- emergente, mas insuficiente,
zo, embora estudos clínicos maiores sejam necessários para proveniente principalmente de
melhor compreensão do seu papel e reais benefícios ao tra- pequenos estudos clínicos ou
tamento do câncer. desenho de ensaios clínicos fra-
cos e/ou estudos em animais.
Nenhuma dieta é conhecida por
curar ou prevenir a recorrência
do câncer. Por isso, é importante
A nutrição adequada pode sua saúde e prognóstico, além ressaltar que as dietas da moda
contribuir para a diminuição de de estarem motivados à imple- são tipicamente restritivas, o que
sintomas adversos, melhorar os mentação de mudanças dieté- aumenta o risco de ingestão ina-
resultados de saúde no proces- ticas (DEMARK-WAHNEFRIED dequada de nutrientes, como
so contínuo do tratamento e et al., 2005; PATTERSON et al., energia, gordura, proteína e mi-
apoiar a taxa de sobrevivência 2003), considerando a busca cronutrientes.
ao câncer. Portanto, atingir o es- ativa de informações e conheci-
tado nutricional ideal compõe mentos nutricionais que orien- A American Society of Clinical
uma das características do tra- tam as escolhas alimentares Oncology (ASCO), a Sociedade
tamento de câncer bem-suce- (TAN; MELLO; HORNIK, 2012). In- Brasileira de Nutrição Parenteral
dido (RAVASCO, 2019). felizmente, informações errône- e Enteral (BRASPEN) e o guia de
as sobre as relações entre dieta recomendações para pacientes
O diagnóstico de câncer é e câncer estão amplamente com câncer da Sociedade Euro-
um dos principais fatores pro- disponíveis em vários meios de peia para Nutrição e Metabolis-
motores de mudança do esti- comunicação e, infelizmente, mo e Oncologia Nutricional (ES-
lo de vida (PATTERSON et al., são facilmente acessíveis a esse PEN) não recomendam o uso de
2003). Pacientes oncológicos público, que apresenta maior dietas restritivas em pacientes
entendem a importância do susceptibilidade e vulnerabili- com risco ou em desnutrição
bom estado nutricional para dade. Portanto, são comuns a (ARENDS et al., 2017; BRASPEN,

34
2019; ROELAND et al., 2020). antitumorais (YOUM et al., 2015). se (TURBITT et al., 2019). A “fome
Neste capítulo, sumarizam-se Os criadores da dieta destacam a curto prazo” das células provê
as atuais evidências científicas também uma possível redução resistência ao estresse oxidati-
sobre algumas abordagens die- dos níveis de glicose e insulina vo 1000 vezes maior em células
téticas comumente usadas para séricas, que estão associados à saudáveis do que em células
pacientes com câncer. promoção de crescimento tu- cancerígenas (RAFFAGHELLO
moral. et al., 2008). Esse fenômeno é
Dieta Cetogênica conhecido por “resistência se-
No entanto, os números de letiva ao estresse” e apresenta
A cetose é um estado nutri-
estudos ainda são restritos e as um importante potencial na
cional que representa uma al-
diferenças entre os delineamen- redução drástica da toxicidade
teração na fonte de energia ce-
tos e características das pesqui- no tratamento quimioterápico.
lular de glicose para os “corpos Portanto, poderia maximizar a
sas contribuem para evidências
cetônicos” derivados da gordu- dosagem farmacológica a ser
gerais de baixa qualidade, li-
ra. Esses corpos se tornam as recebida, já que as células tu-
mitando a capacidade de con-
principais fontes energéticas morais são extremamente sen-
clusões mais sólidas baseadas
sob condições de jejum, exer- síveis à privação de nutrientes
nas evidências sobre o impac-
cícios intensos ou restrição de (MEYNET; RICCI, 2014).
to da dieta cetogênica no cân-
carboidratos na dieta (dieta ce-
cer. Como tal, essa estratégia
togênica). A dieta cetogênica é Resultados pré-clínicos su-
alimentar não é recomendada
caracterizada como uma dieta gerem que curtos períodos de
(ARENDS et al., 2017).
rica em gordura, moderada em jejum (jejum intermitente) ou
proteínas e muito baixa em car- Pacientes que seguem essa restrição calórica associada ao
boidratos, geralmente distribuí- dieta estão expostos a dese- tratamento quimioterápico ini-
da nas proporções de 90%, 8% e quilíbrios nutricionais a curto e bem o crescimento tumoral,
2%, respectivamente, da inges- longo prazo, com consequên- aumentam a eficácia da qui-
tão energética diária total. cias clínicas, como desconforto mioterapia e reduzem os efei-
gastrintestinal, constipação, le- tos colaterais, enquanto que,
O conceito de uma dieta ce- ao mesmo tempo, promovem
targia, hipoglicemia durante 1-3
togênica (DC) no câncer surgiu resistência à quimioterapia em
semanas de seguimento duran-
como uma terapia metabólica, células saudáveis em seletos
te a fase adaptativa. A longo pra-
ou seja, visando ao metabolis- tipos de tumores (por exem-
zo, pode ocorrer piora do perfil
mo das células cancerígenas plo, modelos de camundongos
lipídico, cálculo e dano renal.
em vez de unicamente uma transgênicos e de transplante
Uma alternativa para evitar tais
abordagem dietética (OLIVEIRA de neuroblastoma, fibrossarco-
efeitos é o seguimento dessa
et al., 2018). Uma série de estu- ma, glioma, melanoma e mama,
abordagem dietética de forma
dos clínicos conduzidos em hu- e câncer de ovário) (O’FLANA-
aguda, isto é, somente durante
manos forneceu evidências de GAN et al., 2017; CABO; MATT-
os dias próximos e em conjunto
uma supressão do crescimento SON, 2019). Assim, isso significa
com a administração de terapia
tumoral após a incorporação da que a restrição calórica tem o
antineoplásica para explorar os
DC em seletos tipos de câncer potencial de proteger células
efeitos sinérgicos entre a dieta
(por exemplo, mama, próstata, saudáveis dos efeitos da qui-
e os agentes quimioterápicos.
cérebro e modelos de câncer mioterapia, porém, o mesmo
Apesar dessa abordagem ainda
gástrico); entretanto, os meca- não é aplicável às células cance-
não ser recomendada, ensaios
nismos de ação do efeito anti- rígenas.
clínicos randomizados em an-
neoplásico da dieta ainda não
damento podem demonstrar
foram totalmente elucidados. Como explicado por Cabo e
um benefício a ser potencial-
Os mecanismos potenciais in- Mattson (2019), a maioria dos
mente explorado (PRADO, 2019).
cluem a modulação de expres- estudos clínicos relacionados
são gênica em vias associadas ao jejum intermitente focou em
Restrição Calórica
ao câncer, redução da infla- desfechos ligados à adesão, aos
mação e de estresse oxidativo, Da mesma forma que a DC, a efeitos colaterais de quimio-
expressão de IGF-1, edema, an- restrição calórica, isto é, redução terapia e à caracterização de
giogênese, hipóxia e imunossu- da ingestão energética diária to- biomarcadores. Dados clínicos
pressão, e aumento de citocinas tal, também pode inibir a glicóli- preliminares sugerem que o je-

35
jum de curto prazo ou a restri- caso os alimentos classificados 2019; SONBOL et al., 2019).
ção calórica são seguros, viáveis como ácidos fossem restringi-
e promissores à redução da to- dos. Além disso, é importante Probióticos
xicidade no tratamento desses ressaltar que, até o presente mo-
Suplementos dietéticos,
pacientes (BAUERSFELD et al., mento, não há evidências de que
como probióticos, têm sido su-
2018; GROOT et al., 2015). Contu- a dieta alcalina seja benéfica
geridos para reduzir o risco de
do, o efeito na resposta do tumor para a prevenção ou tratamen-
câncer, especialmente devido
pela quimioterapia ainda não foi to do câncer (FENTON; HUANG, à relação entre o microbioma
estudado em um ambiente clíni- 2016), pois um alimento não alte- saudável e a redução da prolife-
co. Nenhum estudo determinou ra o pH sanguíneo. ração tumoral e da toxidade da
se o jejum intermitente afeta a terapia antineoplásica (MOTA;
recorrência de câncer em huma- Dieta Neutropênica WALTER; PRADO, 2018). Embo-
nos (CABO; MATTSON, 2019). ra a maioria dos estudos seja de
A dieta neutropênica é um
plano alimentar com foco no natureza experimental, há evi-
Coletivamente, de acordo dências para apoiar os efeitos
sistema imunológico, que ob-
com as recomendações das di- benéficos dos probióticos no
jetiva a prevenção de infecções
retrizes clínicas de oncologia e câncer colorretal, incluindo me-
em pacientes com câncer. Sua
de forma semelhante às dietas lhora da integridade intestinal,
abordagem dietética restritiva
cetogênicas, essa abordagem menor número de infecções,
envolve a exclusão de alimentos
dietética não é recomendada diminuição da resposta infla-
com maior potencial de vincula-
aos pacientes devido à falta de matória, diminuição da prolife-
ção de patógenos de origem ali-
estudos clínicos grandes e bem ração e crescimento de células
mentar da dieta, visando, assim,
planejados que comprovem a cancerígenas e redução dos
limitar a exposição a micro-orga-
sua eficácia. efeitos colaterais associados
nismos patogênicos e bactérias
prejudiciais. As restrições dietéti- ao tratamento (ESLAMI et al.,
Dietas Alcalinas 2019; MOTA; WALTER; PRADO,
cas incluem evitar a maioria das
A argumentação que justifica frutas e vegetais crus, queijos, 2018). Contudo, seu uso tem
a dieta alcalina é a premissa de carne crua e delicatessen, lati- sido questionado em pacientes
que um ambiente ácido no cor- cínios não pasteurizados, água imunossuprimidos devido ao
po tem o potencial de promover não filtrada, fast food ou prepa- risco de bacteremia (OLIVEIRA
o crescimento de células cance- rações prontas para viagem e et al., 2019). Não há indicação
rosas. Como tal, essa dieta é con- para o uso em pacientes fazen-
castanhas cruas. Os alimentos
siderada como restritiva, uma do imunoterapia.
a serem excluídos podem variar
vez que os alimentos alcalinos de acordo com as diferentes di-
Conforme descrito por Mota,
devem ser consumidos, enquan- retrizes alimentares disponíveis
Walter e Prado (2018), apesar de
to os alimentos ácidos devem ser para essa abordagem dietética
auxiliar na recuperação e manu-
evitados ou limitados. Os alimen- (SONBOL et al., 2019).
tenção da microbiota intestinal
tos alcalinos incluem alguns ve-
saudável, e serem alvo nutricio-
getais, frutas e legumes. Por sua Uma vez que é permitida a
nal e clínico emergentes, os pro-
vez, os alimentos ácidos incluem cocção dos alimentos, é possí-
bióticos atualmente disponíveis
todas as carnes, peixes, laticí- vel que os pacientes obtenham
no mercado não foram projeta-
nios, a maioria das leguminosas, uma ingestão adequada de nu-
dos para atingir o câncer. Por-
grãos, arroz, algumas frutas, ve- trientes quando em seguimento
tanto, o uso de probióticos não
getais e açúcar, sendo, dessa for- dessa dieta. No entanto, não há
é recomendado; ensaios clínicos
ma, variável a definição do que evidências para apoiar a dieta bem planejados são necessários
é considerado como alcalino ou neutropênica como mais eficaz para esclarecer a segurança, efi-
ácido (FENTON; HUANG, 2016). do que os procedimentos segu- cácia, dose e o momento para
ros de manipulação de alimentos realizar a suplementação com
Como uma preocupação nu- na prevenção de infecções em probióticos (MOTA; WALTER;
tricional, embora os alimentos pacientes com câncer. Tais estu- PRADO, 2018).
alcalinos sejam fontes de micro- dos foram conduzidos principal-
nutrientes e densos em fibras, a mente em cânceres hematológi-
cos e em alguns tumores sólidos
Fitoterapia
ingestão de energia e proteína
provavelmente seria inadequada (ARENDS et al., 2017; BRASPEN, As substâncias à base de

36
plantas apresentam benefícios ao leitor sobre o resumo de inte- cias para a sua incorporação nas
para a saúde, incluindo a pre- rações entre fitoterápicos e qui- diretrizes clínicas de oncologia
venção e tratamento do câncer. mioterápicos, descrito por Fasi- nutricional. Os profissionais de
De fato, várias terapias farma- nu e Rapp (2019). saúde têm um papel fundamen-
cêuticas atuais contra o câncer tal na educação dos pacientes
são baseadas em fitoquímicos, Chás sobre as potenciais implicações
como, por exemplo, a campto- negativas de tais abordagens
Não há evidências reais de
tecina. Existem mais de 25.000 dietéticas (BRASPEN, 2019).
que o consumo de chá pode au-
fitoquímicos na natureza, mui-
xiliar no tratamento do câncer.
tas vezes com importantes pro- Referências
Sua relevância para o tratamen-
priedades biológicas, incluindo
to do câncer é semelhante à da • ARENDS, J. et al. ESPEN Guidelines
efeitos antioxidantes e anti-an-
fitoterapia, mas com foco nos on Nutrition in Cancer Patients.
giogênese, que são relevantes
polifenóis do chá preto e verde, Clinical Nutrition, v. 36, n. 1, p. 11–
para o tratamento do câncer
sendo estes os mais comumen- 48, 2017. http://dx.doi.org/10.1016/j.
(BAHMANI et al., 2017; GORDA- clnu.2016.07.015.
te utilizados dentre as pesso-
LIZA, 2007). É fundamental des-
as com diagnóstico de câncer.
tacar que a maioria dos estudos • BAHMANI, M. et al. Cancer Phyto-
As catequinas são os polifenóis
que descreve o impacto dos fi- therapy: Recent Views on the Role of
mais abundantes, considerados Antioxidant and Angiogenesis Ac-
toquímicos com evidências de
responsáveis pelos benefícios à tivities. Journal of evidence-based
efeitos antiproliferativos foram
saúde e tradicionalmente atribu- complementary & alternative me-
conduzidos em linhagens de
ídos ao consumo de chás. Chás e dicine, v. 22, n. 2, p. 299–309, 2017. ht-
células cancerígenas in vitro e/
extratos de chá têm sido associa- tps://doi.org/10.1177/2156587215625157
ou em modelos animais, como dos a um menor risco de câncer
no caso da equinácea, allium e a uma redução na proliferação • BAUERSFELD, S. P. et al. The Effects
sativum, alho, ginseng, linhaça, de células cancerosas, mas isso
of Short-Term Fasting on Quality of
sálvia officinolis, cúrcuma/cur- Life and Tolerance to Chemotherapy
requer uma investigação mais in Patients with Breast and Ovarian
cumina e unha de gato /uncaria aprofundada, pois as evidências Cancer: A Randomized Cross-over
tomentosa. são baseadas principalmente em Pilot Study. BMC Cancer, v. 18, n. 1,
estudos observacionais e linha- p. 1–10, 2018. https://doi.org/10.1186/
Ainda que não haja evidên- s12885-018-4353-2
gens celulares in vitro. Embora
cias científicas confiáveis que
os chás verde e preto pareçam
suportem o uso da fitoterapia •
BRASPEN. Diretriz Braspen De Te-
ser seguros para o consumo, al-
como um tratamento para o rapia Nutricional No Paciente Com
guns estudos in vitro mostraram
câncer, vários extratos de fitoquí- Câncer. Braspen Journal, v. 34, supl
uma influência negativa na ação 3, p. 2–32, 2019.
micos/fitoterápicos estão dispo- de quimioterápicos.
níveis para venda sem prescrição
•
DEMARK-WAHNEFRIED, W.; AZIZ,
médica e a qualidade, eficácia Algumas instituições con- N. M.; ROWLAND, J. H.; PINTO, B. M.
e segurança desses produtos traindicam o consumo de chá Riding the Crest of the Teachable
apresentam ampla variabilidade. verde com bortezomibe, tamo- Moment: Promoting Long-Term He-
É importante ressaltar que existe xifeno e irinotecano devido às alth after the Diagnosis of Cancer.”
um potencial de interação des- Journal of Clinical Oncology,  v. 23,
interações medicamentosas.
favorável ou indesejável entre n. 24, p. 5814–30, 2005. https://doi.
Em demais contextos, seu uso org/10.1200/jco.2005.01.230
produtos à base de plantas e te- deve ser feito individualmente
rapias contra o câncer, como, por e em quantidades consideradas • CABO, R. de; MATTSON, M. O. Effects
exemplo, a diminuição da ação de consumo normal/modera- of Intermitent Fasting on Health,
do quimioterápico ou exacer- do (~1-2 copos por dia). Além do Aging and Disease. New Englang
bação do seu feito, entre outras mais, a quantidade de cafeína journal of medicine, v. 381, v. 26,
interações negativas (FASINU; ingerida deve ser considerada. p. 2541-2551, 2019. DOI: 10.1056/NE-
RAPP, 2019). Além disso, como JMra1905136
um agravante, a percepção do
paciente sobre os produtos fito-
Conclusão • ESLAMI, M. et al. Importance of Pro-
biotics in the Prevention and Treat-
terápicos como mais seguros do Várias abordagens dietéticas ment of Colorectal Cancer. Jour-
que os tratamentos farmacêu- alternativas estão amplamente nal of cellular physiology, v. 234,
ticos tende a alterar as decisões disponíveis, mas nenhuma tem n. 10, p. 17127–43, 2019. https://doi.
de tratamento. Faz-se referência o suporte baseado em evidên- org/10.1002/jcp.28473

37
• FASINU, P. S.; RAPP, G. K. Herbal In- cer Therapy. BMC medicine, v. 15, n. • RAVASCO, P. Nutrition in Cancer Pa-
teraction with Chemotherapeutic 1, p. 106, 2017. https://doi.org/10.1186/ tients. Journal of Clinical Medici-
Drugs-A Focus on Clinically Signi- s12916-017-0873-x ne, v. 8, n. 8, p. 1211, 2019. https://doi.
ficant Findings. Front Oncol., v. 3, org/10.3390/jcm8081211
n. 9, p.1356, 2019. https://dx.doi.or- • OLIVEIRA, C. L. P. et al. A Nutritio-
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38
Capítulo 8:
TERAPIA NUTRICIONAL NO
PERIOPERATÓRIO
Thais Manfrinato Miola

TERAPIA NUTRICIONAL
PRÉ-OPERATÓRIA
Destaques A terapia nutricional pré-ope-
• A terapia nutricional perioperatória reduz complicações ratória contempla a orientação
no pós-operatório e hospitalização; dietética e uso de suplementos
nutricionais, nutrição enteral
• A imunonutrição deve ser indicada em cirurgias de médio ou, até mesmo, parenteral; ob-
a grande porte, em pacientes com risco nutricional ou des- jetiva prevenir a desnutrição ou
nutrição já presente; reduzir seus efeitos; e auxilia na
redução das taxas de complica-
• Abreviação de jejum deve ser ofertada a todos os pacien- ções infecciosas e cirúrgicas. É
tes submetidos à cirurgia eletiva e que não apresentem con- indicada nas cirurgias de médio
traindicação; a grande porte, independente
do estado nutricional, no perío-
• A realimentação precoce é segura e favorece a recupera- do de 5-10 dias antes da cirurgia.
ção do paciente no pós-operatório. Nos casos de desnutrição grave
presente, a intervenção deve ser
realizada por 10-14 dias prévios à
cirurgia (WEIMANN et al., 2017;
DE-AGUILAR-NASCIMENTO et
INTRODUÇÃO otimizá-lo, favorecendo a recupe- al., 2017; GUSTAFSSON et al.,
ração no pós-operatório. Embora 2019; LOW et al., 2019).
A cirurgia é um dos principais não haja consenso sobre o me-
tratamentos para o câncer e a te- lhor método de avaliação nutri-
rapia nutricional perioperatória IMUNONUTRIÇÃO
cional no período pré-operatório,
é de grande importância para o diversas ferramentas de rastrea- Os nutrientes imunomodula-
sucesso desse procedimento. O mento e avaliação nutricional va- dores, ômega-3, arginina e nu-
estado nutricional influencia di- lidadas podem ser utilizadas para cleotídeos, promovem a modu-
retamente os resultados cirúrgi- diagnosticar o estado nutricional, lação da resposta inflamatória
cos, pois a desnutrição aumen- como: IMC (Índice de Massa Cor- e melhoram a síntese proteica
ta o risco de morbimortalidade, pórea) <18,5 kg/m2 para adultos e após a cirurgia. Assim, há redu-
tempo de internação e custos <22 kg/m2 para idosos; perda de ção das complicações no pós-
hospitalares (MUSCARITOLI et peso >10% nos últimos 6 meses -operatório e tempo de inter-
al., 2011; BITENCOURT et al., 2019; ou >5% nos últimos 3 meses; Ín- nação. Recomenda-se o uso da
GUSTAFSSON et al., 2019). dice de Massa Livre de Gordura imunonutrição para pacientes
por Bioimpedância Elétrica <15 que serão submetidos a cirurgias
AVALIAÇÃO kg/m2 para mulheres e <17 kg/ de médio a grande porte, e que
NUTRICIONAL m2 para homens; Avaliação Sub- apresentem risco nutricional ou
jetiva Global grau C; Nutritional desnutrição. A imunonutrição
PRÉ-OPERATÓRIA
Risk Screening >5 (WEIMANN está indicada para o período de
A literatura recomenda a ava- et al., 2017; DE-AGUILAR-NASCI- 5-7 dias àqueles com risco nutri-
liação nutricional prévia ao trata- MENTO et al., 2017; GUSTAFSSON cional e 7-14 dias para os desnu-
mento, uma vez que é possível et al., 2019; ARENDS et al., 2017; tridos graves. A intervenção no
identificar o estado nutricional e LOW et al., 2019). pós-operatório deve acontecer

39
de 5-7 dias, independente do es- o procedimento cirúrgico, inde- atingir a meta calórica e protei-
tado nutricional (WAITZBERG et pendentemente da presença ca em até 72 horas. As fórmu-
al., 2006; ARENDS et al., 2017; DE- ou ausência dos sinais que indi- las enterais mais indicadas são
-AGUILAR-NASCIMENTO et al., quem o retorno da função intes- as poliméricas, hipercalóricas e
2017; ZHANG et al., 2019; HORIE tinal, não só é segura (mesmo hiperproteicas. O acompanha-
et al., 2019). na presença de anastomoses di- mento pós-operatório com a
gestivas), como diminui o tem- fonoaudiologia é fundamental
ABREVIAÇÃO DE JEJUM po de internação, morbidades para reestabelecer a alimenta-
PRÉ-OPERATÓRIO pós-operatórias, custos hospita- ção via oral. A transição da en-
lares e favorece a alta mais pre- teral para via oral deve ser gra-
A abreviação de jejum pré- coce (DE-AGUILAR-NASCIMEN- dativa, visando reduzir o risco da
-operatório, com oferta de 200 a TO et al., 2017; WEIMANN et al., perda de peso (MIOLA; FIRMI-
400 mL de líquidos claros con- 2017; GUSTAFSSON et al., 2019; NO, 2020).
tendo maltodextrina até 2 horas LOW et al., 2019).
antes do procedimento cirúrgi- Cirurgia do Trato
co, visa à redução dos prejuízos TERAPIA NUTRICIONAL Gastrintestinal
do jejum prolongado, como re-
sistência à insulina no intraope-
NO PÓS-OPERATÓRIO A dieta no pós-operatório de
ratório e proteólise, reduzindo A alimentação no pós-ope- cirurgias do trato gastrointes-
complicações no pós-operatório ratório requer cuidados especí- tinal deve iniciar o mais preco-
e tempo de internação. Além ficos de acordo com o procedi- cemente possível. Alimentos
disso, fornece melhor conforto mento cirúrgico. Para cirurgias fermentescíveis (leite integral,
ao paciente, com redução de que não envolvem o trato diges- feijões, ovos, cascas e sementes
sensações de fome e sede (DE- tivo e não apresentam compli- de frutas e legumes) devem ser
-AGUILAR-NASCIMENTO et al., cações sistêmicas, a dieta deve evitados nos primeiros dias de
2017; WEIMANN et al., 2017; HO- ser liberada imediatamente pós-operatório e reintroduzidos
RIE et al., 2019; GUSTAFSSON et após a recuperação anestési- gradativamente. Para a cirurgia
al., 2019; LOW et al., 2019). ca, sem restrições, mantendo de colectomia total ou confec-
os cuidados alimentares indi- ção da bolsa de ileostomia, a
O jejum para alimentos sóli- vidualizados de cada paciente dieta deve ser isenta de resídu-
dos deve ser de seis horas, assim (alergias e doenças associadas) os, pois o intuito de evitar a for-
como para fórmulas infantis ou (MIOLA; FIRMINO, 2020; PEREI- mação excessiva do bolo fecal
leite (não humano); quatro ho- RA; SILVA, 2020; SANTOS; MO- em consistência líquida (PEREI-
ras para leite materno; três horas RAES, 2020). RA; SILVA, 2020; SANTOS; MO-
para suplementos nutricionais RAES, 2020).
específicos, contendo carboi- Cirurgia de Cabeça e
dratos e proteínas; e duas horas Nas cirurgias que envolvem
Pescoço
para líquidos claros enriqueci- o pâncreas, além da restrição de
dos com carboidratos de rápida Pacientes submetidos à ci- alimentos que fermentam nos
absorção. Não há indicação para rurgia por câncer de cabeça e primeiros dias, também deve-
abreviação de jejum em casos pescoço, normalmente, utilizam -se ofertar alimentos com baixo
de retardo do esvaziamento a nutrição enteral como via de teor de gorduras. Nessas cirur-
gástrico, como refluxo gastroe- alimentação no pós-operatório. gias pode ocorrer a insuficiência
sofágico moderado a grave, gas- A necessidade da permanência pancreática endócrina, cujo con-
troparesia e obesidade mórbida da sonda se dá conforme a ex- trole da glicemia é fundamental,
(DE-AGUILAR-NASCIMENTO et tensão cirúrgica e reabilitação sendo necessário manter a dieta
al., 2017; WEIMANN et al., 2017; fonoaudiológica. Na maioria dos isenta de sacarose em alguns ca-
HORIE et al., 2019; GUSTAFSSON casos, a sonda está alocada em sos (PEREIRA; SILVA, 2020; SAN-
et al., 2019; LOW et al., 2019). posição gástrica, favorecendo o TOS; MORAES, 2020).
início precoce da dieta enteral
REALIMENTAÇÃO em até 24 horas. Normalmen- Algumas cirurgias do trato
te, inicia-se com volumes bai- gastrintestinal requerem nutri-
PRECOCE xos (20-25ml/hora), evoluindo ção enteral antes da via oral no
A oferta de alimentos e líqui- gradativamente conforme tole- pós-operatório, como nas esofa-
dos nas primeiras 24 horas após rância do paciente. Procura-se gectomias, gastrectomias totais

40
e algumas cirurgias do pâncre- Referências • SANTOS, C. G.; MORAES, A. P. Terapia
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tiva. A dieta enteral pode ser po- • WAITZBERG, D. L. et al. Postsurgical
limérica e, sempre que possível, • BITENCOURT, A. G. V. et al. Compu- infections are reduced with specia-
hiperproteica, além de conter ted tomography-measured body lized nutrition support. World Jour-
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cas em que há necessidade de Clinical Nutrition,; v. 36, n. 3, p. 623-
repouso intestinal, a nutrição •
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Câncer. BRASPEN J, v. 34, supl. 1, p.
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• PEREIRA, A. C. C.; SILVA, F. B. L. Terapia


Realimentação precoce nutricional em pacientes com tumo-
no pós-operatório com res abdominais. In: MIOLA, T. M.; PIRES,
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São Paulo: Manole, 2020. p. 68-79.

41
Capítulo 9:
MANEJO NUTRICIONAL DA
TOXICIDADE DO TRATAMENTO
ONCOLÓGICO
Georgia Silveira de Oliveira
Olivia Galvão De Podestá
Thais Manfrinato Miola
Carla Prado

robustas. A qualidade de vida é


Destaques uma medida-chave de resultado
em oncologia e evidências con-
sistentes mostram que a desnu-
• Os efeitos colaterais do tratamento oncológico causam
trição afeta de uma forma direta
prejuízos aos pacientes e podem atrasar ou interromper o
a qualidade de vida do paciente,
tratamento e aumentar as taxas de hospitalização e morta-
a qual, por sua vez, é melhora-
lidade;
da por meio de intervenção nu-
tricional. Além disso, a nutrição
• A recuperação do estado nutricional pode melhorar a tole-
continua sendo um indutor po-
rância às toxicidades;
tente de respostas metabólicas
• O manejo nutricional é fundamental para o melhor prog- (CLEELAND et al., 2012; LAVIANO;
nóstico do paciente. MOLFINO; FANELLI, 2012).

Estudos recentes demons-


tram que o estado nutricional e,
em particular, a massa muscular
O câncer afeta várias funções moral. Por isso, qualquer estra- são os principais determinantes
metabólicas e leva a alterações tégia clínica de tratamento de da toxicidade relacionada à te-
desfavoráveis do estado nutri- pacientes com câncer deve ser rapia anticâncer. A baixa massa
cional. Efeitos colaterais dos tra- considerada juntamente com muscular (sarcopenia) reduz a
tamentos, como quimioterapia, uma abordagem que visa à to- sobrevida, aumenta a incidên-
radioterapia, hormonioterapia e xicidade relacionada à terapia cia da toxicidade e pode alterar
imunoterapia, também contri- anticâncer. Infelizmente, as toxi- a farmocinética e farmodinâmi-
buem para a desnutrição desses cidades continuam sendo uma ca da droga, diminuindo a ação
pacientes. Como consequência, questão subestimada no mane- da quimioterapia nos pacientes
ocorre a diminuição das possi- jo desses pacientes. Na verdade, em tratamento. A intervenção
bilidades terapêuticas, compro- a toxicidade raramente é o foco nutricional intensiva mantém os
metendo a sobrevida e a quali- das investigações clínicas, uma níveis de energia e a ingestão de
dade de vida do sobrevivente ao vez que, historicamente, há uma proteínas durante a terapia ativa
câncer (BRASPEN, 2019). maior preocupação com a cura e reduz a toxicidade, o que pode
do que com a toxicidade (LAVIA- permitir que os pacientes conti-
A toxicidade associada ao NO; MOLFINO; FANELLI, 2012). nuem e completem seu esque-
tratamento tem um papel con- ma de tratamento proposto. Ela
siderável, pois limita a admi- A importância clínica de man- parece ser mais eficaz na pre-
nistração proposta de doses ter ou restaurar o estado nutri- venção do que na ação de tratar
adequadas e pode impedir a cional em pacientes com câncer as toxicidades relacionadas aos
conclusão do esquema antitu- é agora apoiada por evidências tratamentos anticâncer (LAVIA-

42
NO; MOLFINO; FANELLI, 2012; lhorar a saúde em todo o conti- gios e tipos de tratamento onco-
BOZZETTI et al., 2017). nuum do câncer, apoiar a sobre- lógico durante a jornada clínica,
vivência ao câncer. É ainda uma e devem seguir as diretrizes da
A nutrição é um fator central marca registrada do tratamento prática clínica, assim como as
na oncologia, pois influencia di- bem-sucedido (RAVASCO et al., recomendações sobre nutrição
retamente os sintomas ineren- 2013; RAVASCO, 2019). em pacientes com câncer e ma-
tes ao tumor, à resposta e à re- nejo e prevenção da toxicidade
cuperação após os tratamentos Assim, o objetivo é começar o (ARENDS et al., 2017; RAVASCO,
antineoplásicos, tendo um forte manejo nutricional precocemen- 2019; PRADO et al., 2020).
impacto na qualidade de vida te, com avaliação do estado nutri-
e no prognóstico da doença. A cional no momento do diagnós- Na verdade, a integração de
intervenção nutricional preco- tico e intervenções nutricionais diferentes conhecimentos em
ce adaptada tem o potencial de paralelas às terapias anticâncer uma abordagem abrangente e
melhorar a composição corporal (vide figura 1 – capítulo 1). As es- multidisciplinar é ideal para o tra-
e a eficácia do tratamento, pode tratégias nutricionais devem ser tamento e prevenção da toxici-
aliviar a carga dos sintomas, me- adaptadas aos diferentes está- dade nos pacientes oncológicos.

Tabela 1: Manejo nutricional nos efeitos adversos do tratamento oncológico

Efeitos Adversos Orientação


Encaminhar para acompanhamento fonoaudiológico e modificar a consistência
da dieta oral de acordo com a recomendação e grau de disfagia;
Aumentar o fracionamento da dieta;
Aumentar a oferta calórica e proteica das refeições;
Indicar suplemento oral
Disfagia Evitar alimentos secos e duros;
Utilizar colheres de sobremesa ou de café para evitar quantidade excessiva de
alimento na boca;
Preferir alimentos umedecidos e macios;
Manter cabeceira elevada para alimentar-se;
Indicar Terapia Nutricional Enteral para disfagia grave – discutido em equipe.

Alterar a consistência da dieta, de acordo com a aceitação e tolerância;


Manter boa higiene oral;
Aumentar a oferta calórica e proteica das refeições;
Odinofagia
Indicar suplemento ora;
Evitar alimentos secos, duros, cítricos, picantes e condimentados;
Evitar alimentos com extremos de temperatura;

Ajustar a consistência da dieta, conforme tolerância;


Aumentar o fracionamento da dieta, reduzindo o volume por refeição;
Aumentar a densidade calórica e proteica das refeições;
Evitar alimentos secos, duros, cítricos, salgados, picantes e condimentados;
Esofagite Evitar alimentos gordurosos;
Evitar a ingestão de café, refrigerante e bebidas gaseificadas;
Preferir alimentos em temperatura ambiente;
Mastigar bem os alimentos e evitar falar durante as refeições;
Manter cabeceira elevada durante as refeições.

43
Efeitos Adversos Orientação
Ingerir líquidos, em pequena quantidade, durante as refeições para facilitar a
mastigação e deglutição;
Manter boa hidratação, ingerindo constantemente pequenas quantidades de
água, e/ou deixar derreter pedaços de gelo na boca, feitos de água de coco e/ou
sucos;
Xerostomia e Adequar a consistência dos alimentos, conforme aceitação;
hipossalivação Consumir alimentos umedecidos, macios e adicionar molhos às preparações;
Usar gotas de limão nos alimentos e bebidas desde que o paciente não tenha
mucosite;
Promover a estimulação salivar residual através da utilização de balas/chicletes
sem açúcar e/ou à base de xilitol ou sorbitol, pois eles estimulam a função
gustatória e mastigatória.

Estimular a ingestão de alimentos preferidos e de desejo;


Preparar pratos visualmente agradáveis e coloridos;
Utilizar alimentos cítricos para estimular a salivação;
Disgeusia
Preparar pratos mais coloridos e mais sedutores;
Usar ervas frescas, secas e especiarias para acentuar o sabor e aroma dos
alimentos.

Incluir gengibre (in natura ou em pó) na forma de chás, sucos, sopas, balas ou
cristais;
Realizar refeições em ambientes tranquilos e pequenas porções de alimentos;
Alimentar-se em locais arejados, longe de odores forte de preparação de comida;
Evitar alimentos gordurosos;
Náuseas e vômitos
Estimular a higiene oral;
Preferir alimentos cítricos e em temperaturas frias/geladas;
Preferir alimentos secos;
Evitar a ingestão de líquidos durante as refeições. Os líquidos podem ser ingeridos
de 30 a 60 minutos antes e depois de comer.

Realizar higiene bucal cuidadosa sempre que se alimentar;


Promover hidratação adequada;
Modificar a consistência da dieta, conforme aceitação e tolerância do paciente;
Reduzir o consumo de sal e condimentos das preparações;
Evitar alimentos secos, duros e irritantes (p. ex. cítricos, cafeína, condimentos,
picantes);
Mucosite oral
Evitar alimentos em temperaturas quentes, preferir alimentos frios ou em
temperatura ambiente;
Utilizar bochecho de chá de camomila para alívio da dor;
Crioterapia em pacientes com protocolo de 5-FU ou melfalano. Uso de gelo ou
picolé 30 minutos antes;
Encaminhar para ao estomatologista – laserterapia.

Indicar alimentação hipercalórica hiperproteica, fracionada, em pequenas


Inapetência, anorexia porções e várias vezes ao dia;
e saciedade precoce Introduzir suplementos orais hipercalóricos e hiperproteicos, caso o paciente
não atinja suas necessidades nutricionais.

44
Efeitos Adversos Orientação
Evitar alimentos fonte em lactose e sacarose;
Realizar refeições pequenas e frequentes;
Evitar alimentos irritantes ou estimulantes do peristaltismo, como cereais
integrais, fibras solúveis, alimentos ricos em gorduras;
Fornecer fontes de fibras solúveis que auxiliam no controle do trânsito intestinal,
proporcionando viscosidade (p. ex. maça, chicória, tapioca, sagu e suplemento de
Diarreia/Enterite
fibra);
Adequar a ingestão de líquidos – incluindo os isotônicos, água de coco, chás,
sucos;
Evitar alimentos fermentativos (p. ex. alho, cebola, repolho, brócolis, pimentões,
leguminosas, batata doce, doces em geral);
Incluir probióticos (se possível, conforme contagem de neutrófilos).

Consumir alimentos com maior potencial laxativo, principalmente frutas e


verduras;
Adequar a ingestão hídrica via oral;
Constipação intestinal
Realizar atividade física conforme disposição e estado clínico;
Uso de prébióticos e simbióticos deve ser discutido em equipe em casos de
imunossupressão.

Conscientizar o paciente e familiares da necessidade da alimentação;


Adequar a consistência dos alimentos de acordo com a aceitação e tolerância do
paciente;
Trismo
Utilizar utensílios adequados para facilitar a ingestão alimentar (p. ex. canudos,
seringas, colheres e squeezes);
Verificar a necessidade de suplementação.

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45
Capítulo 10:
ASPECTOS BIOÉTICOS,
PSICOSSOCIAIS E ECONÔMICOS
NA NUTRIÇÃO
Dan Linetzky Waitzberg
Micheline Tereza Pires de Souza
Olivia Galvão De Podestá
Georgia Silveira de Oliveira
Gislaine Aparecida Ozorio

como para a promoção do uso


racional de recursos (BRASIL,
Destaques 2015).

• Para a terapia nutricional no domicílio, é necessário avaliar Para a terapia nutricional no


a possibilidade de uso de fórmulas com alimentos; domicílio, é necessário avaliar a
possibilidade de uso de fórmu-
• Para admissão no Serviço de Atenção Domiciliar, é neces- las com alimentos. As famílias,
sário atender aos critérios de inclusão nas modalidades de como unidades de organização
atenção domiciliar; social, são retomadas e estimu-
ladas pelo SUS no processo de
• Pacientes com câncer têm necessidades especiais de co-
trabalho das equipes de Aten-
municação.
ção Básica e equipes de Aten-
ção Domiciliar (BRASIL, 2015).

Neoplasias e reabilitação nu-


tricional são condições clínicas
Acesso à dieta do, ou indivíduos que apresen- frequentes na atenção domici-
tam doenças ou agravos que, liar. Para admissão do Serviço
A terapia nutricional no do-
em situações de agudização, de Atenção Domiciliar, é neces-
micílio pode ocorrer por meio resultam na piora clínica e nu-
de duas modalidades: sário atender aos critérios de
tricional (BRASPEN J., 2019). inclusão nas modalidades de
Dispensação permanen- atenção domiciliar, conforme
A demanda para dispensa-
te - destinada aos indivíduos Portaria GM/MS n.º 963, de 27
ção de fórmulas nutricionais
que apresentam doenças ou de maio de 2013 (BRASIL, 2015).
pode vir tanto da atenção hos-
agravos que comprometem pitalar após a alta, quanto das O serviço responsável pela dis-
permanentemente a utilização equipes de Atenção Básica (AB) pensação das fórmulas nutri-
fisiológica de algum tipo de nu- e equipes de Atenção Domici- cionais industrializadas deve
triente; liar (AD). No entanto, o acompa- ser estabelecido pela gestão lo-
nhamento clínico e nutricional, cal, preferencialmente de acor-
Dispensação condicional ou e não somente a dispensação do com o fluxo já estabelecido
temporária - destinada aos indi- de fórmulas nutricionais, é im- para dispensação de outros in-
víduos acometidos por doenças prescindível para a manuten- sumos, sendo necessário ates-
ou agravos que podem se ma- ção ou melhora do estado de tar a entrega ao usuário (BRA-
nifestar por período determina- saúde dos indivíduos, assim SIL, 2015).

46
Recusa da Sonda na administração da nutrição O desejo dos médicos nas
Nasoentérica - SNE/ (SARTORI et al., 2013). decisões clínicas sobre a colo-
Gastrostomia – GTT pelo cação de tubos de alimentação
Um paciente com diagnósti- se faz na expectativa de uma
paciente/familiar
co de câncer pode sentir medo melhor nutrição para seus pa-
A adesão é um componen- e ansiedade em relação aos tra- cientes. Já os pacientes espe-
te crítico de qualquer plano de tamentos que, geralmente, são ram pelo prolongamento da
tratamento. Para atingir efe- difíceis, caros e complicados. A vida, administração mais fácil
tivamente o resultado deseja- comunicação é importante em de medicamentos e risco redu-
do de uma intervenção tera- todo o tratamento do câncer, zido de aspiração (HANSON et
pêutica, o paciente e o familiar mas, especialmente, quando al., 2008).
devem participar ativamente decisões importantes devem
do tratamento recomendado ser tomadas (PDQ/NCI, 2020), O oncologista conhece a
(KREKELER et al., 2018). como a necessidade de uma via trajetória clínica do paciente; a
alternativa para se alimentar história natural da doença, sua
Para o paciente, o fato de (PDQ SUPPORTIVE [...], 2002). gravidade e a duração da toxici-
precisar alimentar-se por sonda dade de um tratamento onco-
impõe uma nova etapa em sua A equipe multidisciplinar lógico; e os efeitos adversos da
vida e no tratamento com re- exerce função importante na desnutrição no prognóstico dos
presentações sociais importan- assistência aos pacientes e pacientes. Assim, tem-se uma
tes. Inicia-se uma longa cami- familiares em uso de NE, por maior chance de reconhecer a
nhada que começa quando se meio de suporte emocional di- desnutrição em uma fase mais
depara, pela primeira vez, com recionado a minimizar receios, precoce (pré-caquexia) e res-
a necessidade de uso da son- apreensões e dúvidas. Essas ponsiva, visto que a maioria dos
da para se alimentar e quando orientações e explicações de- pacientes encaminhados às
ocorre o processo de decisão vem ser verbais e por escrito, unidades especializadas para
em aceitá-la ou não (SARTORI não deixando dúvidas penden- cuidado e suporte nutricional
et al., 2013). tes (MARSHALL et al., 2020). estão em um estado avançado
Recomendações aos pacien- de caquexia e, muitas vezes,
Na maioria das vezes, a nu- tes, combinando estratégias não respondem ao tratamento
trição enteral (NE), tanto por passivas (livreto de nutrição (YALCIN et al., 2019).
SNE ou GTT, não é desejada, escrito) e ativas (educação e
mas imposta. Isso representa reforço profissional de saúde), Referências
afetivamente uma desvincu- são mais eficazes à saúde de-
lação social, gerando estresse •
BRADY, G. C.; GOODRICH, J.; ROE,
les (MARSHALL et al., 2020). A
J. W. G. Using experience-based
para o paciente e suas famílias. experiência na clínica de pré- co-design to improve the pre-tre-
Deve-se evitar decisões contro- -tratamento é positiva para pa- atment care pathway for people
ladoras e prescritivas. Deve-se cientes e familiares. Eles valo- diagnosed with head and neck
buscar ouvir o que o paciente rizam uma equipe experiente cancer. Support Care Cancer, v.
pensa e sente, e, na condição e consistente, além das men- 28, n. 2, p.739–45, 2020. https://doi.
de profissional de saúde que org/10.1007/s00520-019-04877-z
sagens que fornecem aborda-
valoriza o ser humano, manter gem em equipe (BRADY; GOO- • BRASIL. Ministério da Saúde. Secre-
uma relação compreensiva, ga- DRICH; ROE, 2020). taria de Atenção à Saúde. Departa-
rantindo-lhe o direito de tomar mento de Atenção Básica. Caderno
decisões próprias e conscientes, O envolvimento de pacien- de Atenção Domiciliar. Cuidados
e dar respostas àquelas situa- tes bem informados em suas em terapia nutricional. 1. ed., 1 reim-
ções que dependem de cuida- decisões de tratamento pro- pr. Brasília: Ministério da Saúde,
2015. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/
do especializado e humanizado porciona mais conforto pessoal publicacoes/cuidados_terapia_do-
(SARTORI et al., 2013). com a decisão de tratamento, miciliar_v3.pdf
melhor adesão e motivação ao
Os familiares dos pacientes tratamento, redução do núme- • BRASPEN J. Diretriz BRASPEN de
nessa condição têm importân- ro de intervenções em alguns terapia nutricional no paciente
cia fundamental, pois desem- casos e maior controle por par- com cancer, v. 34, supl. 1, p. 2-32,
penham um papel vital nos 2019.
te dos pacientes (MARSHALL et
cuidados e, principalmente, al., 2020). •
HANSON, L. C.; GARRETT, J. M.;

47
LEWIS, C.; PHIFER, N.; JACKMAN, ceptions of a patient- and family- •
SARTORI, T.; ROSANELLI, C. de L.;
A; CAREY, T. S. Physicians’ Expecta- -centred intervention to improve STUMM, E.; KOLANKIEWICZ, A.;
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48
Capítulo 11:
A IMPORTÂNCIA DA NUTRIÇÃO
NOS SOBREVIVENTES E
NA PREVENÇÃO DO CÂNCER
Georgia Silveira de Oliveira
Olívia Galvão De Podestá
Thais Manfrinato Miola

recuperar a saúde, prevenir o re-


torno da doença e o desenvolvi-
Destaques mento de outro tipo de câncer.
As informações são baseadas
• Abordagem de programas nutricionais e de estilo de vida nos relatórios do Fundo Mundial
tem sido promissora para os sobreviventes do câncer; para Pesquisa contra o Câncer
(WCRF), Instituto Americano de
• 30% dos casos de câncer podem ser evitados por meio de Pesquisa em Câncer (AICR) e no
praticas saudáveis de vida e alimentação. resumo do terceiro relatório de
especialistas com uma perspec-
tiva brasileira do Instituto Nacio-
nal de Câncer José Alencar Go-
A expressão “sobrevivente vo como parte da rotina diária; mes da Silva (INCA).
de câncer” abrange pessoas consumir uma dieta rica em ce-
em uma variedade de circuns- reais integrais, vegetais, frutas e As evidências mostram que
tâncias, desde o diagnóstico, leguminosas, sendo a base da apenas uma pequena parcela
durante o tratamento, até o fim alimentação; evitar o consumo dos cânceres é herdada. Os fato-
res ambientais e comportamen-
da vida. Usar um único termo de alimentos ultraprocessados,
tais são os mais importantes e
para definir sobreviventes de bebidas açucaradas; limitar o
podem ser modificados. A rápi-
câncer, em todas essas etapas, consumo de carne vermelha a
da urbanização e a industrializa-
pode não considerar a natureza 500 gramas por semana; evitar
ção aumentaram o número de
diversa da doença e a condição o consumo de carne processa-
indivíduos expostos a diversos
de ser um sobrevivente. Cada da; evitar o consumo de bebi-
agentes carcinogênicos. No Bra-
estágio de sobrevivência tem das alcoólicas; evitar o consumo sil, estima-se que a alimentação
suas próprias características. O de chimarrão em temperatura inadequada, o consumo de be-
impacto das intervenções ou superior a 60°C; não usar su- bida alcoólica, a inatividade fí-
exposições, incluindo dieta, nu- plementos alimentares para a sica, o sobrepeso e a obesidade
trição e atividade física, varia de prevenção do câncer; e, para as sejam responsáveis por 14,7% (n
acordo com isso. mães, se possível, amamente = 63.541) dos casos de câncer e
seu bebê (INCA, 2020). 17,8% (n = 33.606) dos óbitos por
Os sobreviventes de câncer câncer são atribuídos aos estilos
são encorajados, se for apro- Após o tratamento, pesso- de vida (INCA, 2020).
priado às suas circunstâncias e as que tiveram diagnóstico de
salvo indicação contrária feita câncer, incluindo aquelas livres Nos últimos anos, mudanças
por um profissional de saúde, da doença, também devem se- no padrão alimentar e no perfil
a seguir as recomendações ge- guir essas recomendações. Cui- nutricional dos brasileiros vêm
rais para a prevenção do câncer, dar da alimentação, praticar ati- apontando um cenário preo-
que são: manter o peso corporal vidade física e buscar manter o cupante. O aumento no consu-
saudável; ser fisicamente ati- peso adequado é essencial para mo de alimentos processados

49
e ultraprocessados frente aos o novo modelo de classificação Abordagens baseadas na teo-
alimentos frescos e às refei- de alimentos para embasar as ria que trata dos múltiplos com-
ções e preparações tradicio- recomendações sobre alimen- portamentos de estilo de vida
nais vem sendo acompanhado tação adequada e saudável à em sobreviventes de câncer têm
pelo crescimento da prevalên- população. As recomendações se mostrado promissoras. No
cia de sobrepeso e obesidade. desse guia levam em conta não entanto, ainda há a necessidade
As intervenções nutricionais e só os nutrientes, mas também de se desenvolver e avaliar uma
dietéticas representarão uma
os alimentos, as combinações intervenção mais eficaz tanto
medida eficaz na prevenção
de alimentos, as preparações na proporção de respostas dos
secundária ou terciária, bem
culinárias e as dimensões cul- indivíduos quanto no grau de
como parte de uma terapia ad-
juvante. turais e sociais das práticas ali- mudança, principalmente para
mentares. O INCA adota o re- compará-la aos padrões atuais; e
O Ministério da Saúde, a par- ferido guia como instrumento definir estratégias biocomporta-
tir da publicação da atualização norteador para a promoção de mentais que possam melhorar
do Guia Alimentar para a Popu- práticas alimentares saudáveis e os resultados e promover a ma-
lação Brasileira em 2014, adotou prevenção e controle do câncer. nutenção (STACEY et al., 2015).

Figura 9 – Conjunto integrado de recomendações


para prevenção do câncer no Brasil

Limitar o consumo de
carne vermelha a 500 Evitar o consumo de
gramas por semana. carne processada.

Evitar o consumo de alimentos


ultraprocessados, bebidas Evitar o consumo de
açucaradas e fast food. bebidas alcoólicas

RECOMENDAÇÕES PARA Evitar o consumo


Fazer dos alimentos de chimarrão em
de origem vegetal a PREVENÇÃO DE CÂNCER temperatura superior
a 60ºC
base da alimentaçao
Escolhas saudáveis no dia a dia são
formas importantes de se proteger
contra câncer. É fundamental
também que haja mobilização a favor
Ser fisicamente de políticas públicas e ações que Não usar suplementos
ativo como parte facilitem essas escolhas alimentares para a
da rotina diária. prevenção de câncer

Manter o peso Se puder, amamentar


corporal saudável seu bebê

Se puder, procurar
seguir essas
recomendações após o
diagnóstico de câncer

Não fumar e evitar outras exposições ao tabaco e ao excesso de sol também são ações importantes para reduzir o risco de câncer.
Embora cada recomendação individual ofereça benefícios para a proteção contra o câncer, a maior parte do benefício é obtida
ao tratar todas as recomendações como um padrão integrado de comportamentos relacionados à alimentação, à atividade física
e a outros fatores associados ao modo de vida.
Fonte: Adaptação gráfica da SBOC com informações do INCA. Acesse à fonte original.

50
Recomendações do INCA para a prevenção do câncer no Brasil
Manter o peso corporal saudável
Ao longo da vida, procurar manter o peso corporal dentro dos limites recomendados de IMC. Evitar o ganho de
gordura corporal na vida adulta, mantendo o peso e a circunferência de cintura adequados.

Ser fisicamente ativo como parte da rotina diária


Quando possível, ser fisicamente ativo no lazer, nos deslocamentos, nas atividades domésticas ou no trabalho,
buscando atividades que deem prazer e limitando os hábitos sedentários, como passar muito tempo assistindo TV e
usando o celular ou o computador,

Fazer dos alimentos de origem vegetal a base da alimentação


Procurar incluir regularmente, nas refeições, frutas, legums, verduras, feijões, cereais integrais, sementes e nozes. Uma
alimentação variada e rica em alimentos de origem vegetal, incluindo pelo menos cinco porções (400 gramas) de
frutas, legumes e verduras ao dia, protege contra o câncer.

Evitar o consumo de alimentos ultraprocessados, bebidas açucaradas e fast food


O melhor é não ingerir esses alimentos, pois, além de possuírem elevadas quantidades de açúcar, gordura e/ou sal,
promovem o ganho de peso. Comer à mesa com amigos e familiares, não substituir refeições por lanches e conzinhar
favorecem a alimentação saudável.

Limitar o consumo de carne vermelha a até 500 gramas por semana


Limitar o consumo de carne vermelha a até 500 gramas de carne cozida (equivalente a 750 gramas de carne crua)
por semana. As melhores formas de preparo são assadas, cozidas e ensopadas. Carnes grelhadas, fritas ou preparadas
como churrasco aumentam a produção de agentes que causam câncer. Nessa situação, aconselha-se usar carnes
frescas (pouco tempo de armazenamento), optar por pedaços menores no preparo, marinar ou pré-cozinhar no forno
convencional ou no micro-ondas.

Evitar o consumo de carnes processadas


O melhor é não consumir carnes processadas, como presunto, salsicha, mortadela, linhuiça, salame, bacon, peito
ou blanquet de peru, entre outras. Quanto maior o consumo, maior o risco. Se consumir, procurar comer a menor
quantidade possível.

Evitar o consumo de chimarrão em temperatura superior a 60 ºC


Para quem consome o chimarrão, recomenda-se que a temperatura da bebida seja inferior a 60 ºC. Para chegar
nessa temperatura, aconselha-se desligar o forno quando iniciar a formacão de bolhas gasosas no fundo da panela ou
chaleira e esperar alguns minutos antes de consumir a bebida.

Evitar o consumo de bebidas alcoólicas


O melhor é não consumir bebidas alcoólicas. Quanto maior o consumo, maior o risco, Se beber, procurar consumir a
menor quantidade possível.

Se puder, amamentar seu bebê


Amamentaão protege as mães do câncer de mama e os bebês do sobrepeso e da obesidade ao longo da vida. É
aconselhável amamentar até dois anos ou mais, oferecendo somente leite materno nos primeiros seis meses.

Não usar suplementos alimentares para prevenção do câncer


Para a população em geral, usar suplementos alimentares não é recomendado para a prevenção do câncer. Uma
alimentação saudável fornece a quantidade adequada de nutrientes.

Se puder, procurar seguir essas recomendações após o diagnóstico de câncer


Após o diagnóstico de câncer, sempre que possível, seguir as recomendações de prevenção. Durante o tratamento,
avaliar, junto ao profissional de saúde responsável, o que é aconselhável.
Fonte: Adaptação gráfica da SBOC com informações do INCA. Acesse à fonte original.

Referências e câncer: uma perspectiva global:


um resumo do terceiro relatório de
sobreviventes de câncer. Journal of
Cancer Survivorship, 2015.
• BRASIL. Ministério da Saúde. Secre- especialistas com uma perspectiva
taria de Atenção à Saúde. Depar- brasileira. Rio de Janeiro: INCA, 2020.
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STACEY, F. G.; JAMES, E. L.; CHA- AMERICAN INSTITUTE FOR CANCER
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JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. / ou intervenções de mudança de Project Expert Report 2018. http://
Dieta, nutrição, atividade física comportamento nutricional para dietandcancerreport.org

51
Capítulo 12:
NUTRIÇÃO AO FINAL DA VIDA
Andrea Pereira
Augusto Mota
Olívia Galvão De Podestá

minar expectativas irreais (PDQ


SUPPORTIVE [...], 2002).
Destaques A NA em final de vida tem
• Estabelecimento de uma comunicação aberta entre pa- sido prescrita por motivos reli-
cientes / familiares e cuidadores para garantir que as suas giosos, culturais e emocionais
preocupações sejam ouvidas e que a história natural da do- da família e/ou profissionais de
ença avançada seja esclarecida; saúde, e não necessariamente
por motivos médicos (BRODY
• Respeitar as preferências do paciente quanto ao trata- et al., 2011; ARENDS et al., 2006).
mento, uma vez explicados o prognóstico e a trajetória pre- Muitos profissionais de saúde
vista com e sem a alimentação artificial. acreditam que a NA demonstra
cuidado, portanto, suas crenças
pessoais dificultam a justifica-
ção para a família sobre o não
uso dessa forma de cuidado.
Pacientes e famílias acreditam,
INTRODUÇÃO CHEN, 2004). Nutrição artificial
muitas vezes, que o uso dessas
(NA) inclui suplementos nutri-
Pela primeira vez na história, cionais orais, nutrição enteral intervenções melhorará a qua-
esperamos viver além dos 60 (NE) ou nutrição parenteral (NP) lidade e a longevidade, mas fal-
anos em média (STEPTOE; DE- (DRUML et al., 2016). tam evidências de benefícios
ATON; STONE, 2015; WHO, 2018). cientificamente comprovadas
Consequentemente, no mundo Embora a NA no final de vida (PDQ SUPPORTIVE [...], 2002).
todo, há uma proporção cada não necessariamente melhore Evidências sugerem, surpreen-
vez maior de pessoas em final a qualidade, nem prolongue o dentemente, que é mais fácil
de vida devido às várias doen- tempo de vida, além das evidên- para a equipe de saúde e/ou fa-
ças crônicas, incluindo o câncer. cias de complicações (pulmonar mília considerar a ressuscitação
Em muitos casos, observamos e gastrointestinal), ela ainda cardiopulmonar como um tra-
associação simultânea de duas tem sido usada com frequência tamento fútil do que a NA (BRO-
ou mais doenças crônicas, cul- (BRODY et al., 2011). Isso se deve, DY et al., 2011).
minando com deterioração sig- em grande parte, à crença dos
nificativa da saúde e reduzindo familiares e profissionais de saú- De acordo com a American
a qualidade de vida dos indiví- de de que a interrupção da ali- Academy of Hospice and Pallia-
duos acometidos. O avanço tec- mentação é uma causa tão di- tive Medicine, é de responsabili-
nológico das últimas décadas reta de morte quanto parar um dade dos profissionais de saúde
tem contribuído sobremaneira respirador (BRODY et al., 2011). descrever as opções existentes
para esse cenário, já que, cada Por isso, a comunicação dentro quando se considera a imple-
vez mais, pessoas estão viven- da equipe de saúde e o apoio mentação, continuação ou des-
do em função de tratamentos da família e dos cuidadores são continuação da NA; estabelecer
que podem, muitas vezes, ser importantes para aliviar o sofri- metas de cuidado com o pa-
considerados fúteis, incluin- mento relacionado à diminui- ciente e/ou tomador de decisão
do nutrição artificial (SPATHIS; ção da ingestão de alimentos e substituto; e facilitar discussões
BOOTH, 2008; HANSEN-FLAS- líquidos, assim como para eli- respeitosas e informadas sobre

52
os efeitos da NA perto do fim explicar nossas dificuldades em menos de seis meses de ex-
da vida. Idealmente, os pacien- negar a NA para nossos pacien- pectativa, pois não é capaz de
tes poderão tomar suas próprias tes terminais, mesmo quando aumentar a qualidade de vida
decisões com base em uma ava- há falta de benefícios compro- e nem de prolongar a sobrevi-
liação cuidadosa dos benefícios vados cientificamente. Como da desses pacientes (DRUML
e encargos potenciais, seguindo dito antes, para os profissionais et al., 2016; VOLKERT et al., 2015;
as normas legais e éticas, e per- de saúde e família é mais fácil ARENDS et al., 2017; DEL RÍO,
mitindo aos mesmos aceitarem não fazer ressuscitação cardio- 2010). O objetivo principal da
ou não as intervenções médi- pulmonar do que recusar a NA intervenção nutricional em pa-
cas (STATEMENT ON ARTIFICIAL (BRODY et al., 2011). cientes com câncer avançado
NUTRITION [...], 2013). é conservar ou restaurar a me-
Fome e sofrimento lhor qualidade de vida possível
O papel da comida em e controlar quaisquer sintomas
Por conta de todos os aspec-
nossas vidas relacionados à nutrição que
tos citados anteriormente, a
causem sofrimento.
Nossa dieta é baseada em um anorexia do paciente oncológi-
mecanismo fisiológico, influen- co causa ansiedade na família No entanto, questões relacio-
ciado por aspectos sociais, am- e na equipe de oncologia, que nadas à nutrição para pacientes
bientais, culturais e psicológicos, temem que o paciente passe com câncer avançado podem
os quais interagem com muitos fome até a morte. No entanto, ser uma fonte de conflito en-
outros fatores (HARDCASTLE; os pacientes no fim de vida não tre os pacientes e suas famí-
THØGERSEN-NTOUMANI; CHAT- experimentaram a sensação de lias, e entre os pacientes e suas
ZISARANTIS, 2015; MA, 2015). So- fome (>60%), portanto, eles não equipes de saúde. Os profissio-
mado a isso, nossas escolhas sofrem nos períodos de jejum nais de saúde podem precisar
nutricionais são baseadas em ou de pouca alimentação (PRE- abordar a história natural da
biologia, fisiologia, economia, VOST; GRACH, 2012; MUSCARI- caquexia do câncer em estágio
sociologia, marketing e aspectos TOLI et al., 2010). terminal e ajudar os pacientes
emocionais (KÖSTER, 2009). e familiares a lidarem com as
Todos em torno do paciente
implicações emocionais da ca-
A comida tem muitos signi- devem ser informados, de forma
quexia-anorexia do câncer (PDQ
ficados simbólicos, como, por delicada e contínua, que a falta
SUPPORTIVE [...], 2002).
exemplo, comer sozinho é dife- de alimentação não está cau-
rente de comer em grupo, de- sando o seu sofrimento, nem A terminalidade é ligada à
monstrando o aspecto social da acelerando a sua morte. Essas complexidade e emoção, o que
alimentação. Para uma pessoa informações objetivam evitar a torna esse período muito difícil
religiosa, o consumo de alimen- NA, mostrando que essa é a me- para o paciente, familiares, pro-
tos durante cerimônias religio- lhor conduta nesses casos (PRE- fissionais de saúde, cuidadores,
sas pode determinar e restabe- VOST; GRACH, 2012). A causa de amigos e sociedade (HEUBER-
lecer a relação entre o homem e morte pela falta de alimentação GER, 2010 ). É justamente por
Deus (MA, 2015). é a desidratação. A falta de co- isso que, a despeito da inexis-
mida para uma pessoa saudá- tência de benefícios cientifi-
A comida pode ser um sím- vel resulta em óbito, em média, camente comprovados, a NA
bolo de felicidade e riqueza, após dois meses, enquanto a fal- continua sendo prescrita nesse
por isso, nossas cerimônias re- ta de hidratação provoca o óbi- período (ORREVALL et al., 2013).
ligiosas, festas, amizades, reu- to em até duas semanas (PEEL,
niões familiares e empresariais, 1997; GÉTAZ et al., 2012). De um modo geral, a NP –
e status social são associadas à embora com implementação
alimentação (MA, 2015). Para as RECOMENDAÇÕES mais complexa e com mais efei-
sociedades ocidentais, passar NUTRICIONAIS NO tos colaterais potenciais – é pres-
fome é inaceitável, pois influen- crita com maior frequência do
cia diretamente a nossa prática
FINAL DE VIDA que a NE, uma vez que a sonda
clínica (MILLER, 2017). A NA pode ser administrada nasoenteral ou nasogástrica é
em cuidado paliativo, porém considerada mais desconfortá-
Todos esses fatores associa- não deveria ser no período de vel pelos familiares e pela equi-
dos à alimentação poderiam final de vida, caracterizada por pe oncológica (ORREVALL et al.,

53
2013). Segundo a literatura cien- GEPPERT; ANDREWS; DRUYAN, a melhor e mais adequada con-
tífica, a prescrição de NA em fase 2009). O mais difícil nessa con- duta, pois não causa nenhum
final de vida é causada por três duta é convencer a todos os sofrimento ao paciente.
fatores principais (BRODY et al., envolvidos que não estamos
2011; ORREVALL et al., 2013): matando o paciente de fome, Referências
nem sendo cruéis com ele, pelo
• ARENDS, J. et al. ESPEN Guidelines
Família: prognóstico termi- contrário, estamos melhorando
on Enteral Nutrition: Non-surgical
nal; crença em ser cruel por não a sua qualidade de vida nos mo- oncology. Clin Nutr., v. 25, n. 2, p.
concordar com a administração mentos finais de vida. 245–59, 2006. https://doi.org/10.1016/j.
da NA; deve exigir intervenções clnu.2006.01.020
para evitar a culpa; As considerações sobre os
custos financeiros, a carga de • ARENDS, J. et al. ESPEN guidelines
Médicos: falta de familiari- hospitalizações e procedimen- on nutrition in cancer patients.
Clin Nutr [Internet], v. 36, n. 1, p. 11–
dade com técnicas de cuidados tos médicos adicionais para o 48, 2017. http://dx.doi.org/10.1016/j.
paliativos; pouco tempo neces- paciente e família, e todas as clnu.2016.07.015
sário para educar as famílias complicações potenciais devem
sobre fatos verdadeiros da NA; ser discutidas e avaliadas con- •
BRODY, H.; HERMER, L. D.; SCOTT,
ganho financeiro na prescrição tra qualquer possível benefício L. D.; GRUMBLES, L. L.; KUTAC, J. E;,
de nutrição enteral e parenteral; que o suporte de NA apresente MCCAMMON, S. D. Artificial nutrition
and hydration: The evolution of ethi-
desejo de evitar discussões con- (PDQ SUPPORTIVE [...], 2002).
cs, evidence, and policy. J Gen Intern
troversas; medo de litígios; Med., v. 26, n. 9, p. 1053–8, 2011. https://
Nas discussões e explicações doi.org/10.1007/s11606-011-1659-z
Administrativos: ganho fi- aos pacientes e familiares, o on-
nanceiro na prescrição da nutri- cologista clínico deve reconhe- •
CASTRO JÚNIOR, F. et al. Bioethi-
ção enteral e parenteral; medo cer que vale a pena explorar a cs Inserted in Oncologic Palliative
percepção de expectativas com Care : a Systematic Review. Int Arch
de sanções regulatórias se a NA
Med., v. 8, n. 103, p. 1–15, 2015. http://
não for administrada; falta de compromisso e respeito pela
dx.doi.org/10.3823/1702
tempo extra e pessoal necessá- perspectiva do paciente. Um
rios para auxiliar na alimentação ensaio por tempo limitado pode • DEL RÍO, N. The influence of Latino
oral; medo de litígios. ser muito positivo para ambos ethnocultural factors on decision
(PDQ SUPPORTIVE [...], 2002). making at the end of life: withhol-
Uma meta importante para ding and withdrawing artificial nu-
trition and hydration. J Soc Work
os cuidados de alta qualidade Considerações Finais End Life Palliat Care., v. 6, n. 3–4, p.
ao final da vida é o alívio de sin- 125–49, 2010. https://doi.org/10.1080/1
tomas angustiantes que podem Neste capítulo, discutimos
5524256.2010.529009
levar ao sofrimento do paciente os aspectos envolvidos nas
e dos familiares. A falta de co- escolhas alimentares e na • DRUML, C. et al. ESPEN guideline on
municação entre profissionais dificuldade de acompanhar ethical aspects of artificial nutrition
e paciente/familiares gera uma um paciente que não come por and hydration. Clin Nutr [Internet],
longos períodos. Essa discussão v. 35, n. 3, p. 545-556, 2016. https://doi.
grande confusão e ansiedade org/10.1016/j.clnu.2016.02.006
é importante porque, embora
sobre a questão de se utilizar
os guidelines demonstrem
tratamentos potencialmente •
GEPPERT, C. M. A.;, ANDREWS, M.
que a melhor indicação
sustentadores de vida, como a R.; DRUYAN, M. E. Ethical issues in
para pacientes em final de artificial nutrition and hydration: a
NA (PDQ SUPPORTIVE [...], 2002).
vida seja apenas a dieta oral, review. J Parenter Enter Nutr., v.
A nutrição na terminalidade muitos profissionais acabam 34, n. 1, p. 79–88, 2009. https://doi.
prescrevendo indevidamente a org/10.1177/0148607109347209
deve ser baseada em dieta oral,
de acordo com as quantidades nutrição artificial.
• GÉTAZ, L.; RIEDER, J. P.; NYFFENE-
e escolhas do paciente, visando Concluímos, então, que a die- GGER, L.; EYTAN, A.; GASPOZ, J. M.;
ao seu maior conforto. Suple- ta no final de vida deve ser con- WOLFF, H. Hunger strike among de-
mentos orais, nutrição enteral tainees: Guidance for good medical
fortável e prescrita de acordo
practice. Swiss Med Wkly., v. 142,
ou parenteral não são indicados com a vontade do paciente; e, w13675, 2012. https://doi.org/10.4414/
porque aumentam as compli- no caso de apenas oral, deve ser smw.2012.13675
cações e reduzem a qualida- explicada para a família e toda a
de de vida (DRUML et al., 2016; equipe envolvida de que essa é • HANSEN-FLASCHEN, J. Chronic Obs-

54
tructive Pulmonary Disease : The Last • MUSCARITOLI, M. et al. Consensus cancer patients undergoing pallia-
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55
Capítulo 13:
OBESIDADE E CÂNCER
Georgia Silveira de Oliveira
Maria de Fatima Gauí
Andrea Pereira

Tabela 1: Classificação do
Destaques Estado Nutricional pelo
Índice de Massa Corporal
• A obesidade (IMC> 30 kg/m2) é um fator de risco isolado de (IMC) (kg/m2) OMS
grande impacto para o câncer;
IMC(kg/m2) Classificação
• Insulinemia, adiposidade e inflamação são fatores fisiopa- < 16 Desnutrição grau III
tológicos da associação entre obesidade e câncer;
16 – 16,9 Desnutrição grau II
• Obesidade aumenta a mortalidade, quimiotoxicidade, lin- 17 – 18,4 Desnutrição grau I
fedema, neuropatia, fadiga, infecções pós-operatórias e re-
cidiva. 18 – 24,9 Eutrofia
25 – 29,9 Sobrepeso
30 – 34,9 Obesidade grau I
Obesidade crescimento foi entre adultos de 35 – 39,9 Obesidade grau II
25 a 34 anos (84,2%) e de 35 a 44
A obesidade é um dos maio- anos (81,1%). Hoje, no país, 20,7% ≥ 40 Obesidade grau III
res problemas de saúde mundial das mulheres e 18,7% dos homens
deste século, sendo uma epi- têm obesidade. Já o excesso de Obesidade como fator de
demia global tanto em países peso atinge 60,3% da população risco para o câncer
desenvolvidos quanto em sub- de 18 anos ou mais de idade, o
desenvolvidos (ORTEGA; LAVIE; Entre as causas que podem fa-
que corresponde a 96 milhões de
BLAIR, 2016; CALLE; THUN, 2004). vorecer o diagnóstico de câncer,
pessoas, sendo 62,6% das mulhe-
É um dos mais graves problemas a obesidade tem uma importân-
res e 57,5% dos homens. Esses da-
de saúde que temos para en- cia igual ao tabaco (LIGIBEL et al.,
dos estão disponíveis no segun-
frentar. Em 2025, a estimativa é 2014). Em 2014, aproximadamen-
do volume da Pesquisa Nacional
de que 2,3 bilhões de adultos ao te 11% de todos os casos de câncer
de Saúde 2019, divulgado pelo
redor do mundo estejam acima Instituto Brasileiro de Geografia e diagnosticados entre mulheres
do peso, sendo 700 milhões de Estatística (IBGE). nos EUA e 5% entre os homens
indivíduos com obesidade, isto é, foram atribuídos ao excesso de
com um índice de massa corpo- A obesidade é uma doença peso (WORLD CANCER RESEAR-
ral (IMC) acima de 30. crônica, associada a comorbi- CH FUND, 2018). Somado a isso,
dades como hipertensão, disli- estudos do Eastern Cooperative
No Brasil, a proporção de obe- Oncology Group (ECOG) avalia-
sos na população com 20 anos pidemia aterogênica, Diabetes
mellitus tipo 2, doenças cardio- ram obesidade e seu desfecho,
ou mais de idade dobrou no país
vasculares e câncer. Sua classi- concluindo que há menor sobre-
entre 2003 e 2019, passando de
ficação está baseada no índice vida global (IYENGAR et al., 2015;
12,2% para 26,8%. Nesse perío-
de massa corporal (IMC), o qual SALAÜN et al., 2017).
do, a obesidade feminina subiu
de 14,5% para 30,2%, enquanto a é calculado através do peso(kg)/
A obesidade está associada
obesidade masculina passou de (altura/m) (AHMAD; EDWARDS,
a vários tipos de câncer, como
9,6% para 22,8%. A maior taxa de 2016) (tabela 1) (WHO, 2000). endométrio, mama, cólon, rim,

56
esôfago, fígado, pâncreas, linfo- et al., 2014; CARMICHAEL, 2006). Política e legislação: melhorar
ma e mieloma (WOLIN; CARSON; o acesso da população aos servi-
COLDITZ, 2010; WORLD CANCER Devido à importância do con- ços de tratamento da obesidade.
RESEARCH FUND, 2018). Além trole da obesidade no câncer,
disso, a obesidade ocasiona pior a Sociedade Americana de On- Fisiopatogenia
prognóstico no câncer de mama. cologia Clínica (ASCO) sugeriu
Em mulheres menopausadas, au- algumas prioridades nessa área, O principal mecanismo que as-
menta o risco de desenvolvimento as quais estão direcionadas aos socia o excesso de peso a alguns
do tipo ER+ (HIMBERT et al. 2017; subtipos de câncer não é bem
pacientes e acompanhantes (LI-
KOLB; ZHANG, 2020). No câncer estabelecido, entretanto, existem
GIBEL et al., 2014):
de endométrio, quanto maior o inúmeros mecanismos biológi-
IMC, maior o risco de morte, IMC Educação: aumentar o co- cos associados a fatores genéti-
> 40 aumenta esse risco em mais nhecimento sobre o papel do cos, estilos de vida e mudanças
de 60% das mulheres obesas em balanço energético no risco de comportamentais que podem
relação às eutróficas. As comor- câncer e na sua prevenção; explicar essa susceptibilidade (DE
bidades associadas à obesidade, PERGOLA; SILVESTRIS, 2013). É
principalmente o Diabetes melli- importante destacar o papel da
Guia clínico prático e expli- adiposidade central, a hiperplasia
tus, aumentam ainda mais a mor-
cativo: recomendações práticas e a hipertrofia de adipócitos inti-
talidade (FADER et al., 2009).
e embasadas cientificamente, mamente ligadas com aumento
De um modo geral, a obesida- direcionadas à obesidade e ba- de mediadores inflamatórios, au-
de está relacionada ao aumento lanço energético; mento da resistência à ação da
da mortalidade (aproximada- insulina e hiperinsulinemia (HIM-
mente 14% em homens e >20% Promoção de pesquisas: BERT et al. 2017; RENEHAN; ZWA-
em mulheres); pior resposta ao mudanças de comportamento HLEN; EGGER, 2015).
tratamento oncológico; maior ris- depois do diagnóstico interfe-
co de complicações pós-operató- rem no prognóstico, tais como O excesso de adiposidade pode
rias, como infecção e linfedema; contribuir para a carcinogênese,
perda de peso, qualidade die- pois atua em diferentes etapas do
maior incidência de comorbida-
des em sobreviventes, como fadi- tética e aumento da atividade processo: aumento da prolifera-
ga e neuropatia; maior risco para física, e melhoria dos métodos ção celular por ativação de fatores
uma segunda neoplasia (WOLIN; para avaliar essas mudanças em de crescimento; aumento do nível
CARSON; COLDITZ, 2010; LIGIBEL sobreviventes; sérico de hormônios sexuais e in-

OBESIDADE

Hormônios
Ác. Graxos Adipocinas Inflamação Alteração
sexuais(HS) Esteatose
Energia Celular

Síndrome Fatores de risco para


Resistência Insulínica
metabólica SD Metabólica

Receptores ↓ Globulina Perioxidação AMPK


↑ Insulina IGF-1
HS ligante HS lípidca & Stress Efeito
Oxidativo “Janus”

Receptor Receptor Citoquinas


Insulina IGF1 Inflamatórias

Desenvolvimento Tumoral
↓ apoptose, ↑ proliferação cel, ↑ angiogênese, ↑ motilidade

Figura 1: Mecanismo de associação da obesidade e câncer na obesidade (IGF1-fator de crescimento insulina like 1/AMPK-5 adenosina
monofosfato proteína quinase/Sd-síndrome/HS-hormônios sexuais) (TODARO; PEREIRA, 2019; ASHRAFIAN et al., 2011).

57
sulina; indução de angiogênese das nos estudos relacionados à tais, frutas e grãos, comprovada-
e estresse oxidativo; inibição da cirurgia bariátrica (WOLIN; CAR- mente, pode reduzir o risco de
apoptose, facilitando as metás- SON; COLDITZ, 2010; ROY et al., câncer de mama em mulheres
tases; diminuição da imunidade 2013). Contudo, há controvérsias. pós menopausa (CHLEBOWSKI
e controle celular através de um Outros estudos mostraram que, et al., 2020).
processo crônico de inflamação
após a cirurgia bariátrica, hou-
(HIMBERT et al. 2017). O IARC (International Agen-
ve uma redução significativa da
prevalência de câncer em mu- cy for Research on Cancer) re-
Prevenção e Tratamento comenda como prevenção do
lheres, porém, não nos homens.
da Obesidade Isso pode ser explicado pelo fato câncer evitar o sobrepeso e a
da perda de peso ser mais bené- obesidade, manter atividade fí-
Os estudos são favoráveis às sica regularmente e dieta com
fica às mulheres em relação ao
mudanças de estilo de vida, há- limite de calorias, diminuir o
risco de câncer (ROY et al., 2013;
bitos alimentares e prática de consumo de carne vermelha,
SJÖSTRÖM et al., 2009).
atividade física. Esses fatores alimentos processados, bebidas
são citados em vários estudos Por outro lado, há estudos alcoólicas, e priorizar uma dieta
como importantes, principal- que também demonstram que rica em grãos, vegetais e frutas.
mente nos sobreviventes de a cirurgia bariátrica está rela-
câncer e na prevenção (WOLIN;
CARSON; COLDITZ, 2010; LIGI-
cionada à redução de risco de Referências
diferentes tipos de câncer, inde- • ABESO. Diretrizes Brasileiras de
BEL et al., 2014; BIANCHINI; KA- pendente do gênero, por conta Obesidade 2016/ABESO. 4. ed. São
AKS; VAINIO, 2002). da perda de peso; efeito anti-in- Paulo: ABESO, 2016.
flamatório e imune; redução da
Os fatores dietéticos associa- •
AHMAD, A. N.; EDWARDS, K. L. A
resistência à insulina; redução
dos ao excesso de peso corporal global perspective for managing
da esteatose, peroxidação lipídi-
incluem a ingestão de bebidas obesity and improving health : con-
ca e stress oxidativo; modulação ventional treatment and surgical op-
mais concentradas e açúcares,
das adipocinas; redução do es- tions : 4th Annual Obesity Summit,
os chamados fast foods e a die-
tradiol e da globulina ligante de London , April 2016. Futur Sci OA, v.
ta do tipo “ocidental”, ou seja, a
hormônios sexuais; modulação 2, n. 4, FSO144, 2016. https://dx.doi.or-
dieta rica em gorduras satura- g/10.4155%2Ffsoa-2016-0059
e redução da grelina (ASHRA-
das, açúcares, carne vermelha
FIAN et al., 2011).
e alimentos processados. Reco- • ASHRAFIAN, H. et al. Metabolic sur-
menda-se, para reduzir o risco gery and cancer. Cancer, v. 117, n. 9, p.
Além da perda de peso, essa 1788–99, 2011. https://doi.org/10.1002/
de câncer, a dieta do tipo medi-
cirurgia pode alterar importan- cncr.25738
terrânea; limite de calorias e de
tes biomarcadores de inflama-
ingestão de carne vermelha, ali- • BALLINGER, T. J. et al. Effect of ba-
ção, resistência à insulina, meta-
mentos processados e bebidas riatric surgery on breast tissue
bolismo e síntese de hormônios
alcoólicas; e dieta rica em grãos, and biomarkers in obese women
em pacientes obesas com ris-
vegetais e frutas. Além disso, a at increased risk for breast can-
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gundo país do mundo em nú- prognóstico e mais complica-
mero de cirurgias bariátricas por ções em oncologia. O conheci- • BRASIL. Ministério da Saúde. Vigitel
ano, registrando um aumento mento de sua prevenção e trata- Brasil 2016: vigilância de fatores de
dessas cirurgias de modo signi- mento são essenciais para uma risco e proteção para doenças crôni-
ficativo (TONATTO FILHO et al., melhor abordagem oncológica. cas por inquérito telefônico. Brasília:
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da perda de peso no indivíduo a adoção de um padrão alimen- • BRASIL. Ministério da Saúde. Vigitel
obeso, associada ao menor risco tar com baixo teor de gorduras Brasil 2019: Vigilância de fatores de
de câncer, têm sido demonstra- e aumento da ingestão de vege- risco e proteção para doenças crô-

58
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59
Capítulo 14:
A IMPORTÂNCIA DA EQUIPE
MULTIDISCIPLINAR DE SUPORTE NO
ESTADO NUTRICIONAL DO PACIENTE
Andrea Pereira
Aline Lauda Freitas Chaves
Olivia Galvão De Podestá

rências do paciente (HAMILTON


et al., 2016; FLEISSIG et al., 2006).
Destaques do capítulo Atualmente, na oncologia,
• A abordagem do paciente oncológico por equipe multi- observam-se dilemas terapêu-
disciplinar melhora prognóstico e diminui complicações do ticos sobre planos de manejo e
tratamento; esquemas de tratamento apre-
sentados para o paciente. Isso
• A equipe multidisciplinar envolve várias especialidades, as decorre da rápida expansão
quais interagem e atuam de forma organizada, eficiente e tecnológica ligada às opções de
coesa, contribuindo para o cuidado centrado no paciente; tratamentos, os quais são cada
vez mais eficazes (FLEISSIG et
• Benefícios são percebidos para os pacientes e também al., 2006). Dentro desse contex-
para a própria equipe. to, a equipe multidisciplinar,
composta por médicos, nutri-
cionistas, psicólogos, fisiotera-
peutas, enfermeiros, terapeutas
Vários estudos têm compro- dos em serviços especializados ocupacionais, fonoaudiólogos,
vado a importância da nutrição apresentavam melhor prog- dentistas, entre outros profis-
no tratamento do paciente on- nóstico e menos complicações. sionais de saúde, interage com
cológico. Nos últimos anos, a Daí surgiu o conceito de equipe o objetivo comum de promover
sarcopenia, desnutrição, micro- multidisciplinar (HAMILTON et a saúde e melhorar a forma de
biota, obesidade e caquexia têm al., 2016; ABDULRAHMAN JNR, difusão do conhecimento para
ganhado cada vez mais desta- 2011). Define-se como equipe o paciente sobre a sua doença e
que em relação ao prognósti- multidisciplinar o grupo de pes- seu tratamento (FLEISSIG et al.,
co, sobrevida e prevenção da soas, de diferentes disciplinas 2006; TANAKA; MEDEIROS; GI-
doença oncológica. Contudo, a de saúde, que se reúne em um GLIO, 2020).
equipe nutricional não trabalha determinado momento (seja fi-
sozinha. Ela faz parte de uma sicamente em um lugar, ou por Quando essa equipe atua de
equipe multidisciplinar integra- vídeo ou teleconferência) para forma organizada, eficiente e co-
da no cuidado ao paciente. Esse discutir sobre um paciente em esa, há um melhor entendimen-
será o tópico do nosso capítulo. particular e como cada um pode to do plano terapêutico, maior
contribuir, independentemente empatia, uma comunicação
Equipe multidisciplinar das decisões de diagnóstico e mais efetiva através da escuta
tratamento, para o seu bem-es- ativa, o que gera uma maior sa-
Em 1995, Calman and Hine
tar. O objetivo principal da equi- tisfação e adesão ao tratamento
(1995) demonstraram que pa-
pe multidisciplinar é o cuidado por parte do paciente oncológi-
cientes oncológicos atendi-
centrado no melhor e nas prefe- co, além do aumento das taxas

60
de sobrevida (ABDULRAHMAN de políticas para a equipe; (5) à assistência. A sua participação
JNR, 2011; TANAKA; MEDEIROS; exploração, inicialmente em for- nos protocolos de pesquisa, ba-
GIGLIO, 2020; SILBERMANN et ma de projeto piloto, do uso de seada em boas práticas, é funda-
al., 2013). dados PROM (patient-reported mental para manter o aumento
outcome measures), os quais da sobrevida geral a longo prazo
Embora todo esse conheci- auxiliam na avaliação e no mo- para 70% dos pacientes até 2035
mento sobre a importância da nitoramento do paciente; (6) (SELBY et al., 2019).
multidisciplinaridade na jorna- melhoria da qualidade de vida
da do paciente esteja embasa- e da experiência do paciente a A atuação da equipe
do cientificamente, no Brasil, há partir da redução do tempo de multidisciplinar no estado
um grande desafio dessa equi- intervenção (SELBY et al., 2019; nutricional
pe no sistema público, uma vez PATKAR et al., 2011).
que no privado existem mais re- A desnutrição e a perda de
cursos para contratação de uma Abaixo listamos os benefícios peso pioram o prognóstico dos
maior gama de profissionais relacionados à atuação da equi- pacientes oncológicos, portan-
(TANAKA; MEDEIROS; GIGLIO, pe multidisciplinar (FLEISSIG et to, a terapia nutricional é funda-
2020). al., 2006; PATKAR et al., 2011): mental para ajudar no processo
terapêutico desses pacientes
Os especialistas mostram um • Melhor consistência, con- (LIN et al., 2017). A seguir descre-
maior reconhecimento sobre tinuidade, coordenação e vemos o papel de alguns mem-
a importância da intervenção custo efetivo do cuidado; bros da equipe que auxiliam os
multidisciplinar e da comunica- profissionais da nutrição nessa
• Melhor comunicação entre
ção como elementos essenciais tarefa.
profissionais de saúde;
ao cuidado do paciente e das
famílias, principalmente em cui- • Melhores resultados clíni- Enfermagem: O enfermeiro é
dados paliativos (TANAKA; ME- cos; um ponto fundamental de con-
DEIROS; GIGLIO, 2020). tato entre profissionais de saúde
• Maior recrutamento para
e uma conexão entre eles e os
Um estudo brasileiro mos- ensaios clínicos; pacientes, sendo fundamental
trou que 66% dos médicos on- • Oportunidades para me- para a continuidade dos cuida-
cológicos aprovaram o trabalho lhorar a auditoria; dos (SAINI et al., 2012; TABERNA
da equipe multidisciplinar. En- et al., 2020). Dentre as funções
• Maior satisfação e bem-es-
tre os pacientes, as mulheres, os da enfermagem, podemos des-
tar psicológico de pacien-
idosos e os tratados em serviço tacar o fornecimento de suporte
tes;
público são os que mais reco- emocional para pacientes e pa-
nhecem a importância da equi- • Oportunidades educacio- rentes após o impacto do diag-
pe multidisciplinar (TANAKA; nais para profissionais de nóstico e durante o tratamento;
MEDEIROS; GIGLIO, 2020). saúde; educação em saúde para pa-
cientes e familiares em relação
• Apoio a todos os membros
Com efeito, a equipe mul- à prevenção, detecção precoce
tidisciplinar pode melhorar os da equipe;
e gestão de sintomas e efeitos
resultados dos pacientes onco- • Economia/paciente no colaterais, além do fornecimen-
lógicos através das seguintes atendimento em geral; to de ferramentas para melho-
práticas: (1) revisão da organiza- rar sua autonomia; colaboração
• Maior satisfação no traba-
ção de processos e da qualida- em outras áreas de saúde (ou
lho e bem-estar psicológi-
de de decisões regulares, bus- seja, hospitalização, testes clíni-
co de membros da equipe;
cando melhorar continuamente cos); intervenções pós-cirúrgi-
sua prática; (2) recrutamento Continuidade do atendimen- cas e toxicidade induzida pelo
para um portfólio de ensaios to, mesmo quando diferentes tratamento; etc. (TABERNA et
clínicos; (3) atualização de da- aspectos do atendimento são al., 2020).
dos de patologia molecular a entregues por diferentes indiví-
cada ano; (4) seguimento de duos ou fornecedores. Em relação à terapia nutricio-
uma política de envolvimento nal, a enfermagem pode fazer
do paciente no atendimento A importância do cuidado a primeira triagem do estado
individual e desenvolvimento multidisciplinar não está restrita nutricional dos pacientes para

61
depois encaminhar ao nutricio- sofágica (TABERNA et al., 2020) início da carreira médica, pro-
nista, responsável por dar conti- e o diagnóstico preciso da disfa- movendo interações interdisci-
nuidade ao acompanhamento gia são essenciais para a escolha plinares e facilitando o trabalho
e gerar ótimos resultados (LIN da terapia nutricional adequada em equipe (ABDULRAHMAN
et al., 2017). Os enfermeiros são e melhor aceitação da mesma. JNR, 2011). O médico especialista
responsáveis pelos cuidados em dor também é fundamental,
com as sondas nasoenterais e Fisioterapia/Preparador físi- uma vez que quando esse sinto-
ostomias das dietas enterais, e co: o uso de exercícios melhora ma não está controlado, conduz
de cateteres da dieta parente- a perda de força e resistência a uma redução da ingestão ca-
ral, além de sua administração muscular durante a caquexia; lórico-proteica (MUSCARITOLI;
((TABERNA et al., 2020; LEE et aumenta a sensibilidade à in- ARENDS; AAPRO, 2019).
al., 2018). Também assumem a sulina, a taxa de síntese de pro-
avaliação das mudanças de nu- teínas e a atividade da enzima A atuação do médico tam-
trição e do estado clínico dos antioxidante; suprime a respos- bém é fundamental na lide-
pacientes, monitoramento da ta inflamatória; fortalece fun- rança do serviço da equipe de
transição do planejamento de ção imunológica; reduz a fadiga nutrição; na condução de con-
cuidados e comunicação com (AOYAGI et al., 2015). A atuação sultas médicas com o time; na
todos os membros da equipe de fisioterapeuta e/ou prepara- avaliação do estado clínico e
(LEE et al., 2018). dor físico é essencial para man- nutricional dos pacientes; no
ter a massa muscular nos pa- desenvolvimento do plano de
Odontologia: a equipe de cientes oncológicos e facilitar os cuidados nutricionais; na pres-
dentistas, do ponto de vista nu- cuidados de nutrição. crição de nutrição parenteral e
tricional, ajuda a reduzir a gra- enteral; no monitoramento da
vidade da mucosite, usando la- Farmácia: o profissional de resposta do paciente; na soli-
serterapia e vários agentes, tais farmácia estabelece o cálculo, citação de testes para reavaliar
como enxaguatório bucal, com- preparação e plano de adminis- o estado nutricional; na revisão
binação de antibióticos, anti- tração do nutriente intraveno- das recomendações sugeridas
-histamínico ou anestésico local, so; aconselha a adequação da para a nutrição; e na integração
antifúngico, corticoide tópico e nutrição por meio de monito- das equipes médicas (LEE et al.,
uma base que auxilia os demais ramento contínuo de pacientes 2018).
componentes a cobrir a mucosa tratados com terapia parenteral;
afetada. Além disso, auxilia no revisa e sugere medicamentos Nutricionistas oncológicos:
controle da disgeusia e da xe- relacionados à nutrição; admi- a equipe de nutrição é respon-
rostomia, comumente observa- nistra interações medicamen- sável pelo acompanhamento
das durante o tratamento com tosas; monitora efeitos adversos, nutricional - fundamental para a
quimio e radioterapia, pois am- como diarreia, náusea, etc.; e melhora do prognóstico e redu-
bos diminuem o apetite, levan- avalia a compatibilidade de dro- ção de complicações -, realizado
do à redução da ingestão oral e gas (LEE et al., 2018). por meio de avaliação precoce,
do peso (TABERNA et al., 2020). classificação de risco nutricio-
Medicina: existem várias es- nal e implementação de terapia
Psicologia: as intervenções pecialidades médicas envolvi- nutricional precoce (MUSCARI-
psicológicas incluem: aconse- das no tratamento oncológico. TOLI; ARENDS; AAPRO, 2019). A
lhamento psicoeducacional, De um modo geral, todo mé- avaliação nutricional não deve
psicoterapia (individual), cog- dico deve estar envolvido no ultrapassar quatro semanas do
nitivo-comportamental, inter- tratamento multidisciplinar do diagnóstico de câncer, deven-
venções de treinamento, apoio câncer. Não apenas cirurgiões, do ser o mais precoce possível,
individual e em grupo. Tudo isso radio-oncologistas e oncologis- incluindo classificação de per-
contribui para melhorar a ade- tas, mas também clínicos gerais, da de peso, anorexia, sarcope-
são à terapia nutricional e favo- patologistas, radiologistas, espe- nia, aporte calórico-proteico,
recer o controle dos sintomas de cialistas em cuidados paliativos, caquexia e inflamação sistê-
depressão e ansiedade (TABER- psiquiatras, entre outros. É fun- mica (MUSCARITOLI; ARENDS;
NA et al., 2020). damental que o estudante de AAPRO, 2019).
medicina se familiarize com os
Fonoaudiologia: a reabilita- princípios e a prática das equi- Toda avaliação nutricional é
ção da musculatura laringo-e- pes multidisciplinares desde o baseada em protocolos padrão

62
para identificar e classificar o on cancer management. Pan Afr tion support in cancer care. Asian
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63
Capítulo 15:
PERSPECTIVAS
Microbiota oral e intestinal – novas fronteiras para o tratamento do
paciente – como a dieta pode ajudar

Dan Linetzky Waitzberg


Micheline Tereza Pires de Souza
Gislaine Aparecida Ozório

regulação do sistema imunoló-


gico (RAZA et al., 2019).
Destaques do capítulo Microbiota intestinal, em de-
• Bactérias intestinais e da cavidade oral podem estar asso- sequilíbrio de riqueza e diversi-
ciadas ao desenvolvimento de diferentes tipos de câncer. dade, pode modular a fisiopa-
tologia e o desenvolvimento de
• A microbiota intestinal contribui para regular a resposta à câncer por distintos mecanis-
terapia do câncer por meio de vários mecanismos, os quais mos e classes de ação:
incluem imunomodulação, translocação e degradação en-
zimática. Classe A: bactérias patogê-
nicas estimulam inflamação
• A microbiota intestinal impacta diretamente a farmaco- crônica e ativação imunológica.
cinética de medicamentos anticâncer, sua atividade antitu- Mediadores inflamatórios (in-
moral e sua toxicidade celular em vários níveis. terleucinas pró-inflamatórias)
produzidos nesse processo cau-
• Estudos recentes apontam aplicação potencial de terapias sam ou facilitam proliferação
baseadas na alteração da microbiota intestinal em vários ti- celular, mutagênese, ativação
pos de câncer. de oncogene e angiogênese
(SURAYA et al., 2020)+.

Classe B: requer interações


microbianas diretas com célu-
A microbiota humana com- benef ícios: estruturais, meta- las parenquimatosas. Bactérias
preende mais de cem trilhões bólicos e imunológicos. Entre podem afetar a proliferação ce-
de organismos, incluindo bac- os estruturais, encontram-se lular por vias pró-inflamatórias
térias, vírus, fungos e proto- o fortalecimento da barreira e procarcinogênicas do NF-κB
zoários, e tem, principalmen- mucosa intestinal e o combate e inibir a apoptose celular (SU-
te, como habitat a superf ície a microrganismos enteropato- RAYA et al., 2020).
epitelial do corpo humano. O gênicos. São benefícios meta-
intestino humano e a cavida- bólicos, entre outros, a produ- Classe C: envolve efeitos dis-
de oral são as sedes de maior ção de ácidos graxos de cadeia tantes das interações locais da
quantidade e diversidade de curta (AGCC) a partir da fibra microbiota intestinal. Bactérias
bactérias do microbioma hu- alimentar, síntese de vitami- geram várias substâncias, in-
mano, sobretudo pela elevada na B e K, metabolismo de vá- cluindo intermediários e meta-
disponibilidade de nutrientes rios compostos, como esteróis bólitos hormonais, que podem
e proteção à microbiota resi- e xenobióticos. São benefícios atuar de forma carcinogênica
dente. A microbiota intestinal imunológicos a promoção de em locais distantes (SURAYA et
humana entrega uma série de tolerância microbiológica e a al., 2020).

64
A Tabela 1 apresenta as espécies de bactérias estudadas e associadas ao desenvolvimento de dife-
rentes tipos de câncer, bem como o tipo de associação e o mecanismo na carcinogênese. Já a Tabela 2
destaca o impacto da microbiota oral na carcinogênese.

Tabela 1: Bactérias associadas à carcinogênese

Espécie de Tipo de
Tipo de Câncer Mecanismo na Carcinogênese
Bactéria Associação
Fusobacterium Instigação da cascata de sinalização NF-κβ
Câncer de Colorretal Enriquecido
nucleatum para estimulação da via de sinalização Wnt
Escherichia coli
Câncer de Colorretal Causal Produção de genotoxinas
NC101
Streptococcus Promoção de respostas inflamatórias via
Câncer de Colorretal Causal
gallolyticus IL-1, IL-8 e COX-2
Bacteroides Produção de toxinas, promoção da
Câncer de Colorretal Causal
fragilis degradação da E-caderina
Helicobacter
Câncer de Colorretal Enriquecido Produção de citotoxina vacuolante A (VacA)
pylori

Salmonella typhi Câncer de vesícula biliar Causal Portador crônico de bacilos tifoides

Helicobacter
Câncer de vesícula biliar Causal Agravamento de lesões mucosas
pylori
Pneumonia por
Linfoma MALT Causal Infecção em estágio avançado
clamídia
Chlamydia
Linfoma MALT Causal Infecção em estágio avançado
psittaci
Chlamydia Câncer ocular Adnexa
Causal Infecção em estágio avançado
psittaci MALT

Mycoplasma sp. Carcinoma de ovário Causal Controverso

Pneumonia por
Carcinoma de ovário Enriquecido Infecção em estágio avançado
clamídia

Prevotella sp. Câncer de cavidade oral Enriquecido Controverso

Bacillus sp. Carcinoma de pulmão Enriquecido Produção de toxinas

Mycoplasma sp. Carcinoma de pulmão Causal Produção de ROS levando a danos no DNA

Estimulação da proliferação celular em


Epiderme de
Carcinoma de pulmão Enriquecido tumores de câncer de pulmão por ácidos
Staphylococcus
lipoteicóicos

Fonte: Adaptado e traduzido de Raza et al. (2019).

65
Tabela 2: Bactérias orais como biomarcadores de tipos específicos de câncer

Localização
Bactérias orais biomarcadoras Principais achados
de câncer

Carcinoma de células A infecção por S. anginosus é mais comum


Streptococcus anginosus
escamosas oral (OSCC) no OSCC

Os níveis encontrados das bactérias


Carcinoma de células Capnocytophaga gengivais, Prevotella
mencionadas foram elevados na saliva de
escamosas oral (OSCC) melaninogenica, Streptococcus mitis
pacientes com CEC
Diferenças significativas entre lesão
Carcinoma de células Bacillus, Enterococcus, Parvimonas,
precursora epitelial e pacientes com câncer
escamosas oral (OSCC) Peptostreptococcus, Slackia
em 5 gêneros bacterianos apresentados
Streptococcus sp. 058, S. salivarius,
S. Gordonii, S. parasanguinis,
Carcinoma de células Bactérias foram altamente associadas aos
Peptostreptococcus estomatite,
escamosas oral (OSCC) locais de tumor OSCC
haemolysans Gemella, G. morbillorum,
ignava Johnsonella
Capnocytophaga gingivalis, Prevotella Altas contagens salivares das bactérias
Carcinoma de células
melaninogenica, Streptococcus mitis, estudadas podem ser indicadores
escamosas oral (OSCC)
Porphyromonas gingivalis diagnósticos de carcinoma epidermoide oral

Carcinoma de células P. gingivalis muito aumentada no epitélio


Porphyromonas gingivalis
escamosas gengival oral maligno

Streptococcus intermedius, S.
As bactérias foram isoladas em linfonodos
Câncer da mucosa oral constellatus, S. oralis, S. mitis, S. sanguis,
cervicais em pacientes com câncer oral
S. salivarius, Peptostreptococcus sp.
Amostras de saliva de HNSCC associadas
Carcinoma de células a quantidades aumentadas de
escamosas de cabeça e Streptococcus sp. e Lactobacillus sp. Streptococcus e Lactobacillus e diminuição
pescoço (HNSCC) de Haemophilus, Neisseria, Gemella e
Aggregatibacter
Carcinoma de células
A infecção por S. anginosus implica a
escamosas de cabeça e Streptococcus anginosus
carcinogênese do HNSCC
pescoço (HNSCC)
Veillonella sp., Fusobacterium sp.,
Carcinoma de Prevotella sp., Porphyromonas sp., Maior número de bactérias apresentadas
células escamosas Actinomyces sp., Clostridium sp., no carcinoma de células escamosas
queratinizante Haemophilus sp., Streptococcus sp. E queratinizante
Enterobacteriaceae
P. gingivalis é biomarcador para risco de
Câncer oro digestivo Porphyromonas gingivalis morte, associado a micróbios em câncer oro
digestivo

As bactérias estudadas podem promover o


Streptococcus anginosus, S. mitis,
Câncer de esôfago processo carcinogênico ao causar inflamação
Treponema denticola
e promover carcinogênese

Adenocarcinoma de A abundância de P. gingivalis confere maior


esôfago e carcinoma de Porphyromonas gingivalis, Tannerella risco de carcinoma de células escamosas
células escamosas de forsythia do esôfago; e T. forsythia está associada ao
esôfago maior risco de adenocarcinoma de esôfago

66
Localização
Bactérias orais biomarcadoras Principais achados
de câncer

Aumento destas bactérias em pacientes com


Câncer colorretal (CRC) Fusobacterium sp., Porphyromonas sp. CRC; menor abundância de Clostridium sp.
(observado simultaneamente)

Enriquecimento de Fusobacterium está


Câncer colorretal (CRC) Fusobacterium sp. associado a subconjuntos moleculares
específicos de câncer colorretal
Fusobacterium sp. estão enriquecidos em
adenomas do cólon humano. F. nucleatum
Câncer colorretal (CRC) Fusobacterium sp.
aumenta a multiplicidade do tumor e pode
promover a progressão do tumor
Pacientes com níveis baixos de F. nucleatum
tiveram maior tempo de sobrevida global
Câncer colorretal (CRC) Fusobacterium nucleatum
que pacientes com níveis moderados e altos
da bactéria
A superabundância de Fusobacterium
Câncer colorretal (CRC) Fusobacterium sp. no tumor tem associação positiva com
metástases em linfonodos
Sequências de Fusobacterium enriquecidas
Câncer colorretal (CRC) Fusobacterium sp.
em CRC
As bactérias apresentadas exibiram
abundância maior em tecidos cancerosos,
Câncer colorretal (CRC) Fusobacterium sp., Lactococcus sp.
enquanto Pseudomonas e Escherichia -
Shigella foram reduzidas
Indivíduos com altos níveis de anticorpos
Câncer de pâncreas Porphyromonas gingivalis contra P. gingivalis possuem maior risco de
câncer pancreático
Porphyromonas gingivalis, Associados ao maior risco de câncer
Câncer de pâncreas Aggregatibacter pancreático
actinomycetemcomitans
O nível de espécies de Fusobacterium no
Câncer de pâncreas Fusobacterium sp. tumor está associado ao pior prognóstico de
câncer pancreático
Bactérias podem ser usadas como
biomarcadores para distinguir pacientes
Câncer de pâncreas Streptococcus mitis, Neisseria elongata
com câncer pancreático de indivíduos
saudáveis
Os níveis de bactérias apresentadas foram
Câncer de pulmão Capnocytophaga sp., Veillonella sp. significativamente maiores na saliva de
pacientes com câncer de pulmão
Fonte: Adaptado e traduzido de Karpiński (2019).

Em que pesem os avanços ser baixa ou não observada em ta intestinal (RAZA et al., 2019).
significativos no desenvolvi- muitos pacientes. Isso pode, em
mento de novas terapêuticas parte, ser explicado ao se consi- A microbiota intestinal pode
anticâncer, particularmente derar a regulação da resposta à regular a resposta à terapia do
de imunoterapia, a resposta à terapia do câncer e de sua efici- câncer por meio de vários me-
terapia anticâncer ainda pode ência modificada pela microbio- canismos, os quais incluem

67
imunomodulação, transloca- testinal (HAISER; TURNBAUGH, intestinal (VIAUD et al., 2013).
ção e degradação enzimática. A 2013).
translocação se refere à passa- Para alterar a composição
gem da microbiota comensal e O metabolismo parcial de da microbiota intestinal, existe
patogênica através da barreira medicamentos injetáveis ocorre a possibilidade de modificação
epitelial do intestino para indu- no fígado, onde também são ex- dietética e estilos de vida, assim
zir efeitos sistêmicos que regu- postos à ação da microbiota in- como de consumo de prebióti-
lam a morbidade dos agentes testinal. O irinotecano - medica- cos, probióticos e simbióticos.
quimioterápicos (KARPIŃSKI, mento anticancerígeno usado Opção, em parte experimen-
2019). Além disso, a microbiota para tratar câncer colorretal, é tal, para modular a microbio-
intestinal pode impactar dire- convertido em SN-38 no fígado ta intestinal é o transplante de
e, em seguida, em SN-38-G pe- microbiota fecal (FMT), no qual
tamente a farmacocinética dos
las UDP-glucuronosiltransfera- fezes liquefeitas e filtradas de
medicamentos anticâncer, sua
ses produzidas pelo hospedeiro. um doador saudável são trans-
atividade antitumoral e sua to-
No entanto, o irinotecano pode plantadas para receptores por
xicidade celular em vários níveis
ser metabolizado pela β-glucu- meio de distintos procedimen-
(RAZA et al., 2019).
ronidase, produzida pela micro- tos, como colonoscopia ou ad-
biota intestinal, em SN-38, que, ministração de enema (SURAYA
O metabolismo e a biodis-
subsequentemente, pode indu- et al., 2020). FMT é atualmente
ponibilidade de vários medica- zir toxicidade celular no intesti- considerada uma opção de tra-
mentos orais podem depender no (RAZA et al., 2019). tamento em pacientes graves
de sua exposição a uma varieda- infectados com Clostridium dif-
de de enzimas produzidas pelo O mecanismo de interferên- ficile, recorrentes e não suscep-
hospedeiro e microbiota antes cia da microbiota com a ativi- tíveis a tratamento antibiotico-
de entrar na corrente sanguínea dade antitumoral de agentes terápico (KARPIŃSKI, 2019).
(FENG et al., 2015). Demonstrou- quimioterápicos permanece
-se, por exemplo, que a nitrore- obscuro, exceto para os deriva- A Tabela 2 ilustra a aplicação
dução do misonidazol e o me- dos de platina e ciclofosfamida, de terapia baseada na alteração
tabolismo do metotrexato são que confirmam a modulação da de microbiota intestinal em vá-
modulados pela microbiota in- quimioterapia pela microbiota rios tipos de câncer.

Tabela 2: Exemplos de aplicação da terapia baseada na alteração da microbiota


intestinal em vários tipos de câncer

Tipo de câncer Terapia Resposta à Terapia Sujeito

Maior expressão de linfócitos CD3,


Câncer Probióticos (Bifidobacterium CD4, CD8, naïve e de memória.
Humano
colorretal longum + Lactobacillus johnsonii) Diminuição de CD83-123, CD83-
HLADR e CD83-11c
Redução pós-cirúrgica em
Câncer Probióticos (mistura de marcadores inflamatórios
Humano
colorretal Lactobacillus e Bifidobacteria) circulantes (por exemplo, TNF-α, IL-
6, IL-17a, IL-17c)
Contagem de linfócitos reduzida,
relação plaquetas / linfócitos e
Câncer de Probióticos (Clostridium relação neutrófilos / linfócitos.
Humano
pulmão butyricum) Diminuição dos gêneros
patogênicos e aumento dos gêneros
produtores de SCFA

68
Tipo de câncer Terapia Resposta à Terapia Sujeito

Câncer de Dieta rica em fibras com / sem Distúrbios gastrintestinais induzidos


Humano
intestino probióticos por quimioterapia reduzida

Incidência reduzida de
Câncer de
Dieta rica em probióticos obesidade sarcopênica devido a Humano
mama
medicamentos antiestrogênicos
Probióticos (Lactobacillus
Diarreia de grau 2-4 induzida por
Câncer pélvico acidophilus + Bifidobacterium Humano
radiação reduzida
longum)
Câncer Probióticos (Lactobacillus Efeitos antiproliferativos e
Células Caco-2
colorretal paracasei K5) apoptóticos in vitro
Probióticos (Lactobacillus Redução da carga tumoral e
Câncer
rhamnosus + Lactobacillus multiplicidade, além do aumento da Camundongo
colorretal
acidophilus) com Celecoxib atividade de apoptose
Aumento da proliferação tumoral
intestinal com diminuição de
Câncer FMT de pacientes com câncer
apoptose e aumento da expressão Camundongo
colorretal colorretal ou doador
de citocinas pró-inflamatórias por
meio da ativação de sinalização Wnt
A composição da microbiota
intestinal muda em direção a uma
Câncer de FMT de sobrevivente de longo população mais favorável para inibir
Camundongo
pâncreas prazo de câncer pancreático o crescimento do tumor por meio
do recrutamento e ativação de
células T CD8
Redução da atividade de
crescimento do tumor e aumento
FMT de pacientes que respondem
Cânceres de apoptose, com respostas
ao bloqueio PD-1 e probióticos Camundongo
epiteliais adicionais de imunossurveilência
(Akkermansia muciniphila)
Th1 dirigidas por Akkermansia
Muciniphila
Fonte: Adaptado e traduzido de Suraya et al. (2020).

Modular a microbiota intes- Referências • RAZA, M. H. et al. Microbiota in can-


tinal em câncer é uma opção cer development and treatment. J
• FENG, R. et al. Transforming ber- Cancer Res Clin Oncol., v. 145, n. 1, p.
nova, mas importante. É consi- berine into its intestine-absorbable 49–63, 2019. https://doi.org/10.1007/
derada uma possibilidade tera- form by the gut microbiota. Sci Rep s00432-018-2816-0
[Internet], v. 5, n. 12155, 2015. https://doi.
pêutica futura e adicional para
org/10.1038/srep12155
aumentar a eficácia e a segu- • SURAYA, R.; NAGANO, T.; KOBAYASHI,
K.; NISHIMURA, Y. Microbiome as a Tar-
rança de outras modalidades de • HAISER, H. J.; TURNBAUGH, P. J. Deve-
get for Cancer Therapy. Integr Cancer
tratamento do câncer por meio loping a metagenomic view of xeno-
Ther., v. 19, 1534735420920721, 2020. ht-
biotic metabolism. Pharmacol Res.,
de seu mecanismo de modula- v. 69, n. 1, p. 21–31, 2013. https://doi.or- tps://doi.org/10.1177/1534735420920721
ção imunológica central. Além g/10.1016/j.phrs.2012.07.009
disso, o tratamento da disbiose • VIAUD, S. et al. The Intestinal Microbio-
• KARPIŃSKI, T. Role of Oral Microbiota ta Modulates the Anticancer Immune
da microbiota intestinal tam-
in Cancer Development. Microorga- Effects of Cyclophosphamide. Scien-
bém pode ser uma nova opção nisms, v. 7, n. 1, p. 20, 2019. https://doi. ce, v. 342, n. 6161, p. 971–6, 2013. DOI:
para a prevenção do câncer. org/10.3390/microorganisms7010020 10.1126/science.1240537

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SOBRE OS AUTORES

Aline Lauda Freitas Chaves Gislaine Aparecida Ozorio


Oncologista assistente e diretora da DOM Clínica Coordenadora de Nutrição e Administrativa da
de Oncologia; presidente do Grupo Brasileiro de Equipe Multiprofissional de Terapia Nutricional
Cancer de Cabeça e Pescoço (GBCP) e chair do (EMTN) do ICESP; tutora da Residência Multipro-
Grupo de Cabeça e Pescoço do Latin American fissional em Atenção Oncológica no Adulto pelo
Cooperative Oncology Group (LACAOG). HC-FMUSP; e mestre em Ciências da Saúde pela
UNIFESP.
Andrea Pereira
Nutróloga no Hospital Israelita Albert Einstein; pre- Maria de Fatima Gauí
sidente e cofundadora da ONG Obesidade Brasil;
Professora de oncologia clínica da Universidade
doutora em Obesidade e Cirurgia Bariátrica pela
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); e médica onco-
UNIFESP; e pós-doutora pelo Instituto Israelita de
logista clínica do Grupo Américas.
Ensino e Pesquisa Albert Einstein.

Augusto Mota Micheline Tereza Pires de Souza

Oncologista clínico, coordenador científico e dos Nutricionista do Instituto do Câncer (INCA) de Rio
grupos de Tumores de Cabeça e Pescoço e Tumo- Preto. Realiza mestrado em Ciências da Saúde pela
res Geniturinários da Clínica AMO (Assistência Mul- Faculdade de Medicina da USP e aperfeiçoamen-
tidisciplinar em Oncologia). to em Terapia Nutricional em Oncologia Pediátrica
pela UNIFESP.
Carla Prado
Olivia Galvão De Podestá
Professora da Universidade de Alberta, no Canadá,
e Campus Alberta Innovates Chair (CAIP) em Nut- Doutora em Ciências na Área de Oncologia pela
rição, Alimentação e Saúde; e diretora da Unidade Fundação Antonio Prudente; docente e nutricio-
de Pesquisa em Nutrição Humana. nista oncológica do Instituto Podestá Oncologia.

Dan Linetzky Waitzberg


Sabrina Segatto Valadares Goastico
Professor associado do Departamento de Gastro-
enterologia da Faculdade de Medicina da USP; e Médica especialista em Clínica Médica e Nutro-
Diretor do Grupo de Apoio de Nutrição Enteral e logia; e membro da equipe de terapia multiprofis-
Parenteral, o Ganep Nutrição Humana. sional de nutrição (EMTN) do HC-FMUSP.

Georgia Silveira de Oliveira Thais Manfrinato Miola

Coordenadora de Nutrição da Rede Oncologia Supervisora de Nutrição Clínica e coordenadora


D’Or (Regional Rio de Janeiro); especialista em da Residência Multiprofissional de Nutrição em
Terapia Nutricional pela BRASPEN e em Nutrição Oncologia do A.C.Camargo Cancer Center. Douto-
Oncológica pela Sociedade Brasileira de Nutrição randa e mestre em Ciências na Área de Oncologia
Oncológica (SBNO). pela Fundação Antônio Prudente.

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