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FARMÁCIA

HOSPITALAR

Caroline Faria
Gestão de estoque
de medicamentos
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Descrever os principais conceitos de gestão de estoque.


„„ Distinguir tipos de demanda e controle de demanda.
„„ Reconhecer métodos de classificação de materiais (curvas ABC e XYZ).

Introdução
Neste capítulo, você vai ler sobre aspectos relacionados a um desafio
que requer esforços multiprofissionais: a gestão de estoque hospitalar
dos materiais e medicamentos. No contexto de healthcare supply chain
management, insere-se a gestão do estoque, isto é, o gerenciamento de
produtos ociosos que provavelmente serão demandados pela equipe
assistencial durante o cuidado ao paciente. Dessa forma, tal gestão está
intimamente relacionada à disponibilidade de medicamentos/materiais
e à segurança do paciente, sem que, idealmente, se percam de vista os
aspectos financeiros. Para que ocorra de forma eficiente, a gestão de
estoques lança mão de conceitos específicos e recursos matemáticos.
As demandas, isto é, as necessidades materiais dos processos de cui-
dado ao paciente, podem ser previstas com o intuito de se determinarem
processos de programação e aquisição relativamente assertivos. Assim, na
gestão da demanda também se faz uso de recursos quantitativos e, sob
certas circunstâncias, de técnicas qualitativas. Ademais, ferramentas de
classificação, destacadamente ABC e XYZ, são altamente recomendadas
para que o gerenciamento ocorra de forma prioritária e segura.
Dessa forma, estudar os conceitos e os métodos da gestão de es-
toques contribui para o dimensionamento tanto da necessidade da
abordagem multiprofissional quanto da sua importância na conjuntura
da segurança ao paciente e na sustentabilidade financeira da instituição.
2 Gestão de estoque de medicamentos

Além disso, com esse estudo será possível conhecer as responsabilidades


do farmacêutico de modo a vislumbrar possíveis áreas de interesse para
atuação.

1 Gestão de estoque da logística hospitalar


Cotidianamente, é comum relacionarmos o vocábulo “logística” apenas aos
sistemas produtivos industriais ou, ainda, aos modais de transporte de merca-
dorias. Todavia, essa é uma visão simplista, uma vez que fluxos logísticos estão
presentes em vários processos institucionais, inclusive naqueles relacionados
aos serviços hospitalares. Logo, faz-se necessária uma compreensão mais
profunda sobre essa terminologia.
Ainda que inexista um consenso na literatura sobre o conceito de logística,
o Council of Logistics Management propõe a seguinte definição: logística
é a parte dos processos da cadeia de suprimento que planeja, implementa e
controla o efetivo fluxo e a efetiva estocagem de bens, serviços e informações
correlatas desde o ponto de origem até o ponto de consumo, com o objetivo
de atender à necessidade dos clientes (LOURENÇO, 2005).
No que tange à logística hospitalar, autores indicam uma definição particular
para healthcare supply chain management (gestão da cadeia de suprimentos
em assistência à saúde), segundo a qual essa se relaciona com a informação,
os suprimentos e as finanças envolvidas na aquisição e no movimento das
mercadorias e dos serviços desde o fornecedor até o usuário final, o paciente,
visando à melhoria de desfechos clínicos ao mesmo tempo em que se considera
o controle financeiro (MOONS; WAEYENBERGH; PINTELON, 2019).
Por isso, as instituições hospitalares, no contexto das atividades de supri-
mento, utilizam ferramentas logísticas a fim de garantir que todos os materiais
necessários para o cuidado estejam disponíveis no local e no momento corretos.
Para tanto, lança-se mão, idealmente, de sistemas eficientes de planejamento da
aquisição, de armazenamento, de gerenciamento de estoque e de distribuição
dos materiais (MEDEIROS et al., 2009). A visão geral desse processo, isto
é, da cadeia de suprimentos no âmbito hospitalar, foi esboçado, para fins
didáticos, na Figura 1.
Gestão de estoque de medicamentos 3

Figura 1. Fluxo unidirecional de bens (materiais e medicamentos) desde o ponto de origem


(indústria) até o ponto de consumo (paciente).

Diante do exposto, questiona-se como o profissional farmacêutico insere-


-se nessa conjuntura tão próxima às áreas administrativas. Inicialmente,
é válido atentar para o conceito de farmácia hospitalar como a unidade clínica-
-assistencial, técnica e administrativa onde se processam as atividades rela-
cionadas à assistência farmacêutica (BRASIL, 2010). Tais atividades, por sua
vez, de acordo com a Resolução CNS 388/2004, podem ser sintetizadas no
ciclo da assistência farmacêutica, constituído pelas seguintes etapas: seleção,
programação, aquisição, armazenamento, distribuição, dispensação, garantia
da qualidade dos produtos e dos serviços, acompanhamento e avaliação da
utilização de medicamentos (BRASIL, 2004).
Dessa forma, partindo dos pressupostos básicos sobre assistência far-
macêutica supracitados, da observação dos conceitos iniciais e da imagem
esquematizada, pode-se compreender a superposição entre os processos
envolvidos na cadeia de suprimentos e o ciclo da assistência farmacêutica.
Por isso, é primordial reconhecer que a logística hospitalar demanda a in-
tegração de saberes multiprofissionais, destacadamente da estatística, da
engenharia, da administração, da tecnologia da informação, do financeiro e,
é claro, da farmácia hospitalar.
4 Gestão de estoque de medicamentos

Conceitos sobre gestão de estoque


Apesar de em princípio intuitivo, é válido reforçar que estoques hospitalares
só existem porque há um “descompasso” entre a demanda do cuidado (por
exemplo, necessidade de administração de um antipirético) e a viabilidade de
fornecimento (por exemplo, a entrega do medicamento dipirona pela distri-
buidora). Em outros termos, afirma-se que os serviços hospitalares requerem
estoques porque as demandas não podem ser previstas com exatidão, a dispo-
nibilidade dos produtos para saúde deve ser imediata e os tempos envolvidos
no transporte desses produtos estão sujeitos à morosidade e/ou a atrasos. Nesse
sentido, a gestão de estoque, inserida no contexto da logística hospitalar, pode
ser definida como gerenciamento de recursos ociosos, tais como materiais e
medicamentos, com o objetivo de reduzir ao máximo possível a imobilização
de valor estocado (FERRANTI, 2018).
Enfatiza-se que tal gestão supre os sistemas institucionais de informações
para as tomadas de decisão em programação (quando e quanto comprar?) e em
aquisição (o que comprar?) de produtos para saúde. Por isso, a gestão de estoque
deve apresentar, minimamente, informações sobre a posição dos estoques
(quanto temos de determinado item?), dados de consumo/perdas (quanto foi
consumido/perdido de determinado item em determinado tempo?), demanda
(quanto será necessário de cada item?) e custo do produto estocado (qual o
valor médio de cada item estocado? Qual valor será gasto caso esse item falte?).

O custo do produto estocado está relacionado ao custo de capital (valor monetário


médio do produto, do frete e dos juros) somado aos custos estruturais (luz, água,
equipamentos, seguros, manutenção do local de estoque), aos custos com recursos
humanos (colaboradores da central de abastecimento farmacêutico) e aos custos de
ruptura (impacto financeiro em caso de estoque zero).

Diante da variabilidade de medicamentos e de suas apresentações, bem


como da diversidade de materiais médico-hospitalares elencados institucio-
nalmente, lança-se mão, majoritariamente, de sistemas informatizados de
gestão de estoque em detrimento dos sistemas manuais, uma vez que aqueles
proporcionam maior agilidade e confiabilidade dos dados (DIEHL; SANTOS;
Gestão de estoque de medicamentos 5

SCHAEFER, 2016). Observe-se que, idealmente, os sistemas de gestão de


materiais e medicamentos devem estar integrados aos sistemas de prescrição
eletrônica de cuidados, de modo a garantir a rastreabilidade do produto por
toda a cadeia intra-hospitalar.
Ainda sobre sistemas de gestão de estoque, deve-se salientar que o in-
ventário de medicamentos e materiais é uma ferramenta imprescindível para
o controle e a eficiência dos processos, uma vez que objetiva a conferência
entre a quantidade “física” de itens e a quantidade registrada pelo sistema,
normalmente o informatizado de gestão de estoque. Essa contagem física de
medicamentos e materiais estocados pode ocorrer em diferentes periodicidades,
a depender do objetivo específico e das peculiaridades do item inventariado
(por exemplo, sujeição ao controle especial conforme legislações vigentes ou
valor agregado). Nesse contexto, indicadores de acurácia devem ser empregados
para análise crítica do desempenho dos processos em gestão. Como exemplo,
observe o indicador obtido por meio da seguinte fórmula, na qual Q refere-se
à quantidade de determinado item estocado.

Após a compreensão dos aspectos iniciais apresentados acima, é recomen-


dável o entendimento sobre algumas variáveis necessárias para os cálculos de
níveis de estoque considerando-se o modelo de reposição periódica. Atente-se
aos conceitos abaixo e aos exemplos do Quadro 1, nos quais as variáveis foram
manipuladas por meio de fórmulas simples.

„„ Consumo mensal médio (CMM): resultado da média aritmética re-


ferente aos consumos mensais (de pelo menos seis meses) do estoque
de determinado item.
„„ Estoque médio: nível médio de estoque em torno do qual as operações
de aquisição e consumo se realizam.
„„ Estoque mínimo ou estoque de segurança (ES): quantidade mínima
de determinado item que deve ser mantida em estoque para cobrir
atrasos da entrega de fornecedores, aumento brusco da demanda
e/ou outras eventualidades, de modo que o fornecimento do material ou
medicamento seja ininterrupto, isto é, sem risco de falhas. O ES deve
ser entendido como um estoque “reserva” que prevê a ocorrência de
rupturas de estoque, isto é, estoques zerados de produtos requeridos.
6 Gestão de estoque de medicamentos

„„ Estoque máximo (Emáx): corresponde ao somatório do estoque mí-


nimo e do lote de compra e está relacionado à capacidade máxima de
estocagem para cada item.
„„ Lote de compra: quantidade do item a ser adquirida em certo processo
de aquisição para determinado período de tempo.
„„ Tempo de reposição (TR): intervalo de tempo compreendido desde
a constatação da necessidade de se reporem estoques até a efetiva
estocagem apropriada do item.
„„ Ponto de pedido (PP): ponto quantitativo que determina a necessidade
de uma nova emissão de pedido de aquisição.

Quadro 1. Variáveis envolvidas em gestão de estoque

Variável Fórmula simples/Método Exemplo

Consumo CMM de codeína 30 mg


mensal (unidades de comprimidos)
médio
(CMM) C1: 45 u; C2: 67 u; C3: 32 u;
C1: consumo em janeiro; C4: 38 u; C5: 41 u; C6: 34 u.
C2: consumo em fevereiro;
C3: consumo em março; CMM: ΣC/6 = 43 u/mês
C4: consumo em abril; C5:
consumo em maio; C6: Entende-se que a previsão
consumo em junho. de consumo para julho é de
cerca de 43 comprimidos.

Estoque ES = CMM × k ES de albendazol 400 mg


de k = constante proporcional (unidades de comprimido)
segurança ao grau de atendimento
(ES) desejado para o item. Dados:
k = 90% (relação entre a
demanda atendida e a demanda
real) e CMM = 95 u/mês

ES = 95 × 0,9 = 85,5 unidades

Entende-se que se fazem


necessárias 86 unidades
do medicamento a fim de
evitar ruptura do estoque em
caso de eventualidades.

(Continua)
Gestão de estoque de medicamentos 7

(Continuação)

Quadro 1. Variáveis envolvidas em gestão de estoque

Variável Fórmula simples/Método Exemplo

Estoque ES = CMM × TR ES de albendazol 400 mg


de (unidades de comprimido)
segurança
(ES) Dados:
CMM = 95 u/mês e
TR =1,5 mês

ES = 95 × 1,5 = 142,5

Entende-se que se fazem


necessárias 143 unidades
do medicamento a fim de
evitar ruptura de estoque em
caso de eventualidades.

Ponto de PP = (CMM × TR) + ES PP de paracetamol 500 mg


pedido (unidades de comprimido)
(PP)
Dados:
CMM = 300 u/mês; TR =
2,5 mês; ES = 100 u

PP = 300 × 2,5 + 100 = 850 u

Entende-se que, quando o nível


de estoque for igual a 850, faz-se
necessária nova aquisição.

Fonte: Adaptado de Cavallini e Bisson (2010) e Vecina Neto e Reinhardt Filho (1988).

Por fim, ressalte-se que a gestão de estoques nos serviços de saúde


relaciona-se diretamente à segurança do paciente e à sustentabilidade fi-
nanceira institucional. Isto é, os benefícios da gestão eficiente de estoque
estão diretamente relacionados aos desfechos clínicos favoráveis, devido ao
acesso ao medicamento e/ou ao material de forma oportuna. Além disso,
por meio dela é possível prevenir “furos ou ruptura de estoque”, perdas de
produtos, aquisições emergenciais e, evidentemente, gastos desnecessários
com o suprimento hospitalar. Por outro lado, a gestão de estoque ineficiente
8 Gestão de estoque de medicamentos

compromete a segurança do paciente e onera financeiramente as instituições


(MANAGEMENT SCIENCE FOR HEALTH, 2012).

É imprescindível que, para a aplicação das fórmulas e o entendimento das variáveis,


as unidades relacionadas ao tempo estejam padronizadas. Em outras palavras, ao se
utilizar, por exemplo, o CMM (unidade temporal mês), deve-se empregar o tempo de
reposição (TR) também em mês. Dessa forma, se o dado TR estiver inicialmente em dias,
deve-se convertê-lo para mês por meio da proporcionalidade (regra de três simples).

2 Demandas
Conceitualmente, demanda está relacionada à vontade e/ou necessidade de
determinado produto ou serviço. Em hospitais, as demandas por materiais ou
medicamentos estão relacionadas às necessidades dos processos de cuidado
em consonância com o tipo de atendimento/setor da instituição (SFORSIN
et al., 2012). Por exemplo, a demanda por medicamentos de uso intravenoso
tende a ser maior na unidade de tratamento intensivo (UTI) se comparada à
que ocorre nas áreas de recuperação/reabilitação da enfermaria; por outro lado,
a demanda por fórmulas líquidas para administração oral de medicamentos
tende a ser maior na ala pediátrica se comparada à que ocorre nos serviços
intensivos. Contudo, independentemente das variações intra-hospitalares,
é imperativo que seja realizada a gestão da demanda com o intuito de se
alcançarem estimativas relativamente acuradas sobre o volume de itens a
serem adquiridos.
Para tanto, lança-se mão de técnicas de previsibilidade da demanda/do
consumo, que podem ser classificadas da seguinte maneira (CAVALLINI;
BISSON, 2010).

„„ Técnicas quantitativas
■■ Técnicas de projeção: admite-se que o consumo vindouro será a
repetição do consumo passado ou, ainda, que haverá uma evolução
conforme lei observada no passado — por exemplo, projetar-se que
um consumo previamente em ascensão continuará em crescimento.
Gestão de estoque de medicamentos 9

■■ Técnicas de explicação: admite-se que o consumo futuro será reflexo


de leis de consumo do passado relacionadas com outras variáveis
estatisticamente avaliadas por métodos de regressão e de correlação.
Em outros termos, relaciona-se à identificação de variáveis que
influenciam na demanda.
„„ Técnicas qualitativas
■■ Técnicas de explanação: admite-se que pontos de vista de colabo-
radores experientes sejam incorporados às previsões de consumo.

Os métodos de controle da demanda, por sua vez, podem ser divididos


em aqueles que utilizam exclusivamente dados da série histórica de consumo
(médias simples e ponderada) e aqueles que utilizam, além da série histórica,
um modelo causal, ou seja, um modelo estatístico que avalia o quanto uma
condição (variável independente) influencia na demanda de determinado
item (variável dependente) (regressão linear). Recomenda-se que tais métodos
sejam continuadamente atualizados a fim de que sejam reduzidos os erros
de previsibilidade.

Métodos de controle da demanda

Média móvel simples (MMS)

A MMS é altamente recomendada em casos de demandas não influenciadas por


sazonalidades e apresenta ótimos resultados nos casos de demandas regulares.
Observe a fórmula abaixo, em que d corresponde à demanda real relativa aos
meses e n, ao número de meses analisados.

Média móvel ponderada (MMP)

Diferentemente da média simples, a MMP é caracterizada por atribuir pesos


(ou importâncias) diferentes às demandas. Observe a fórmula abaixo, em que
p corresponde aos pesos.
10 Gestão de estoque de medicamentos

Regressão linear

Conforme explicado anteriormente, o objetivo do modelo de regressão linear é


avaliar as variáveis que efetivamente causam impacto na demanda. Para tanto,
a partir de um conjunto de pontos (x, y), determina-se a equação da reta que
mais se aproxima dos valores da demanda real (AMARAL; SOUZA, 2017).

y = ax + b

Confira, no link a seguir, a aplicação detalhada das fórmulas que envolvem a regressão
linear e a manipulação dos dados, bem como exemplos que auxiliarão no entendimento
desse método.

https://qrgo.page.link/EyZ88

Ademais, faz-se necessário conhecer o comportamento da demanda do


item, isto é, a tipologia da demanda, para aplicá-la aos diversos produtos de
saúde a serem adquiridos. Veja a seguir.

„„ Demanda regular: relaciona-se ao consumo médio relativamente


constante. Em blocos cirúrgicos de atendimento exclusivo para ci-
rurgias eletivas, há agendamento de procedimentos. Considerando-se
que a antibioticoprofilaxia é realizada da mesma forma em todos os
procedimentos, pode-se estimar um consumo relativamente regular de
frascos do medicamento.
„„ Demanda sazonal: relaciona-se ao conjunto de flutuações e movimentos
de consumo numa série temporal de até um ano. Eles apresentam picos
e/ou vales que variam em, no mínimo, ± 25% em relação ao consumo
médio regular e necessariamente estão relacionados a uma causa de
origem social, econômica, ambiental ou institucional. Um exemplo
Gestão de estoque de medicamentos 11

notório é o aumento da frequência de doenças respiratórias (virais e


bacterianas) durante o inverno em localidades de clima tropical típico,
isto é, onde essa estação é seca. Nesse período, há aumento da demanda
por serviços de saúde e pelos produtos utilizados para o controle/tra-
tamento dessas infecções.
„„ Demanda em desuso: relaciona-se à redução e/ou extinção da de-
manda/do consumo do produto. Isso pode ocorrer devido, por exemplo,
às alterações em diretrizes clínicas que preconizam o uso de determi-
nado medicamento em detrimento de outro.
„„ Demanda derivada: está relacionada a outro produto, podendo ser
aumentada ou diminuída. Ainda recorrendo ao exemplo das diretrizes
clínicas, cite-se que alterações em protocolos de quimioterapia podem
incorrer em mudanças no perfil de escolha de antieméticos, uma vez
que alguns quimioterápicos apresentam maior potencial emetogênico
se comparados a outros, o que contribui para a escolha de antieméticos
mais potentes e, consequentemente, para o aumento da sua demanda.
„„ Demanda irregular: relaciona-se a consumos aleatórios de determi-
nados itens, culminando na dificuldade de adotarem-se técnicas de
previsibilidade (SFORSIN et al., 2012).

3 Métodos de classificação
A maioria dos métodos para gestão da demanda e do estoque apresentada
ao longo deste capítulo é aplicável para previsão individual de um único
item. Entretanto, na prática hospitalar, é demasiadamente complexa a gestão
individual de cada item entre as centenas dos que compõem o variadíssimo
estoque de materiais e medicamentos. Portanto, métodos de agregação, isto é,
de classificação em subgrupos de acordo com critérios específicos, devem ser
empregados com o intuito de se economizar tempo das atividades gerenciais
e priorizar a análise de itens mais “importantes” (SANTOS; RODRIGUES,
2006).
A seguir, serão apresentadas duas propostas de classificação de itens em
estoque — sistema ABC e sistema XYZ — baseadas em diferentes critérios
de agregação.
12 Gestão de estoque de medicamentos

Sistema de classificação ABC


O critério de classificação do sistema ABC (princípio de Pareto ou Curva 80/20)
baseia-se na importância relativa dos itens, melhor dizendo, no impacto em
termos quantitativos e financeiros que o item exerce em termos administra-
tivos. Em resumo, o objetivo dessa classificação é identificar aqueles poucos
itens que consomem grandes cifras do orçamento, a fim de se realizar o seu
gerenciamento minucioso. Por isso, os itens são segregados nos subgrupos A,
B e C, conforme as características sintetizadas no Quadro 2.

Quadro 2. Classificação ABC dos itens (materiais e medicamentos) estocados

Classi- Impor- Valores percentuais Metas


ficação tância gerenciais
%Itens %Valores

A Extrema 5%–15% 65%–80% Intenso controle


do estoque;
menor volume
estocado;
menor tempo
de reposição;
melhores
fornecedores
e preços.

B Intermediária 15%–25% 15%–25% Acompanha-


mento preciso,
porém menos in-
tenso que em A.

C Baixa 65%–80% 5%–15% Acompanha-


mento com
menor pe-
riodicidade;
maiores volumes
estocados.

Fonte: Adaptado de Ferranti (2018) e Sforsin et al. (2012).


Gestão de estoque de medicamentos 13

Utilizando-se uma tabela com informações sobre valores e consumos,


é possível plotar um gráfico no qual se observa a curva ABC, como se pode
conferir na Figura 2.

Valor (custos)

100
100%
90
C

80
30%
70 B

60

50

40

30 A
60%

20

10

0 % Materiais
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

20% 30% 50%

Figura 2. Comportamento gráfico da classificação ABC, no qual se nota que os itens A


correspondem a 20% dos materiais, mas a 60% dos valores envolvidos. Já os itens B cor-
respondem a 30% tanto dos materiais quanto dos valores. Os itens C, por fim, representam
metade dos materiais e apenas 10% dos custos envolvidos.
Fonte: Adaptada de Cavallini e Bisson (2010).

Sistema de Classificação XYZ


Assim como o sistema de classificação ABC, o sistema XYZ objetiva facilitar
a gestão de estoques de materiais e medicamentos. Todavia, esse se diferencia
daquele devido ao critério de agrupação dos itens, uma vez que o sistema
XYZ orienta-se pela criticidade da falta do produto para saúde. Ou seja, essa
classificação segrega os itens em X, Y ou Z de acordo com o grau de impres-
cindibilidade, o que será mais bem detalhado abaixo.
14 Gestão de estoque de medicamentos

„„ Classe X: produtos para saúde de baixa criticidade que, quando estão


em falta, não interrompem as atividades assistenciais ou causam risco
de morbimortalidade aos pacientes hospitalizados. Ainda, podem ser
facilmente obtidos ou substituídos por outros produtos em estoque.
„„ Classe Y: produtos para saúde de média criticidade que são vitais para a
realização das atividades assistenciais; todavia, podem ser substituídos
com relativa facilidade.
„„ Classe Z: produtos para saúde de alta criticidade que, quando estão em
falta, interrompem as atividades ou causam risco de morbimortalidade
para os pacientes hospitalizados. Além disso, não podem ser facilmente
substituídos ou seus equivalentes são difíceis de difícil obtenção.

Por meio da análise da classificação XYZ, torna-se claro que os produtos


prioritários, em termos administrativos, são aqueles da Classe Z, devido es-
pecialmente ao impacto clínico advindo de uma eventual ruptura de estoque
(SFORSIN et al., 2012).
Diante da variabilidade e da complexidade dos itens que compõem os
estoques hospitalares, as classificações de produtos para saúde, inclusive
do tipo ABC e XYZ, são ferramentas de grande valia para a administração
dos materiais. Dessa forma, em última análise, elas contribuem tanto para a
segurança do paciente quanto para a sustentabilidade financeira da instituição.

AMARAL, T. M.; SOUZA, L. S. Aplicação de modelos de previsão da demanda: um


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Gestão de estoque de medicamentos 15

CAVALLINI, M. E.; BISSON, M. P. Farmácia hospitalar: um enfoque em sistemas de saúde.


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16 Gestão de estoque de medicamentos

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