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SOLIDÃO E SOLITUDE: A DIMENSÃO TRÁGICA D0 SOFRIMENTO
Muitas tragédias contemporâneas se assemelham ao que
aconteceu no bairro carioca de Realengo em 7 de abril de
2011, quando doze crianças foram mortas dentro da Escola
Municipal Tasso da Silveira por um ex-aluno que se sentia
rejeitado pelos antigos colegas e professores. Um homem
que vivia isolado e retornou para se vingar dos colegas e da esco-
la que o teria repudiado, para depois se suicidar. Posteriormente,
vários serviços de saúde receberam denúncias contra solitários
contumazes. A razão diagnóstica adora devorar tragédias.
Entendo que as tragédias nos convidamareconhecer algo
que está suprimido em uma determinada configuração social.
Não são, portanto, espécies que se incluem em classes pré-consti-
tuídas, mas desafios para nossa imaginação politica e psicológica.
Georg Lukács, em seu clássico A teoria do romance, mos-
trou que o herói moderno situa-se necessariamente entre o cri-
e a loucura, pois essas são as duas formas fundamentais de
desterro. O herói é alguém que vive radicalmente a distância
com relação a si e ao outro, seja como tensão entre o ser e o de-
ver ser, seja como cisão interna, seja como oposição entre vida
real e ideal. Lembremos que Dom Quixote, Hamlet, Don Juan
ou Fausto são figuras do desterro e do autoexilio, personagens
que escolhem não ter lugar. Daí que a solidão seja o sentimento
essencial da tragédia, assim isolamento seria a experiên-
como o
de se defender, de mimetizar
surgem tais patologias, maneiras
ou de exagerar um processo benéfico a ponto
de sua finalidade
isso se
tornar-se irreconhecível ao próprio sujeito. Tipicamente
expressa em sentimentos aparentados da solidão: 0 vazio, a
ir
menos-valia. O que vem depOIS
relevància, a inadequação e a
in-
de uma maratona social de consumo, do início de férias, da
nunca: a re
sônia crônica, do final de namoro que não termina
cusa do fato trágico da solidão. 0s protagonistas dos grandes ro
ironia um recurso
formal para
mances do século xIX tinham na
torna-se um
transtorno quando
com.
de u m não pode perteitamente ir a
que ou
está solitário, mas pode
O sujeito que está aquém da
a escola ou ver os amigos,
uma festa, frequentar mas quando exposto
a
'acha que pode,
linha. Aquele que apenas Mas quando eu quiser
recorre ao autoenganoso
direta
uma prova eu paro,
similar alcoolista Quando eu quiser
irmão do
eu consigo, depressões, as distimias, as
dos males),
RE a) Na filosofia: a meditação grega (premeditação
A
o retiro monástico, a meditação investigativa (como
em
são da demanda, que não pede nada e que não oferece nada, e se
nização local, não apenas porque surgia uma igreja e uma pre-
um bordel.
m e n o s um presídio e
Ieitura, mas porque havia pelo
elementares de
O bordel eo presídio são nossas duas estratégias
ou seja,
definindo-o de fora
enfrentaro espaço indeterminado,
e de dentro para
fora pelo que, desde
para dentro pelos m u r o s deve oque
no se inscreve no espaço público,
nossa fantasia,
pode sair de
Ser entre quatro paredes e o que não
posto 27
desse processo quan-
quatro paredes. Há um equivalente
da vida digital. Rapida-
nesse novo espaço que éo
dopensamos com qualquer um gerou
mente, a oferta de poder se contactar
condominizaçao. E claro que
fenómenos de sexualização e de
abertos, as comuni
mais ou m e n o s
Os presidios são os grupos
microlugares,
ou afinidade. Ou seja,
dades definidas por gosto instalamos e depois de al-
nos
Sites ou equivalentes, nos quais
As redes podem aprofun-
sOCiais
trabalho
Por exemplo, dá muito, mas muito
tes muito diversos.
encontrar alguém por meio de sites de relacionamento do tipo
de esvaziamento, no qual
a) Os que procedem da experiencia
nos sentimos como um
tubo ou como uma imagem trans-
mas nada de relevan-
parente, pelo qual as coisas passam,
vivido. Na literatura ééo
te fica e é realmente digno de ser
monstro formado por pedaços
de
tema de Frankenstein, o
ele é uma
é uma experiência comunitária. Em grande medida,
de não
experiencia de solidão. Os infinitos espaços tempo, que
um encontro e outro, as intermináveis es-
I passam nunca, entre
peculações de ciúme, os temores da perda, os diálogos que faze-
travesseiro são todos efeitos da
mos e retazemos com a cabeça
no
convida a
impossibilidade de ficar só, que a experiência de amar
e a melhor
fazer de modo radical. E por isso também que pior
a
conduz as coisas para que isso ocorra. Mas quando isso acontece,
sem que nenhum dos dois tenha que cobrir o abismo da solidao
com alguma palavra vazia, começa a análise.
Estar cercado de gente não é o mesmo que estar fazendo sua
parte no teatro do mundo, cultivando e aprimorando seu per
o desenvolvimento da auto
considerada u m a condição para ono-
Não porque isso ue
emancipaçao.
mia, da independência e da coletivo social, mas n
uma
prescinde do
individualidade que dr-
de posição na qual
reconhecer melhor tipo
o
que isso permite
Outro. Em vez de isolamento
nos e n c o n t r a m o s em
relaço ao
Ou separar-se do Outro é um
seja,
prefiro a palavra separação. necessário
é absolutamente para
movimento, um tempo, que
só nos damos conta
Mas geralmente
estar com o outro.
poder
demais.
disso quando já é tarde
intuitivamente sabem disso. Depois de
Os bons vendedores
vantagens
com e infor-
invadir e seduzir potencial comprador
o
aquele momento
mações sobre o produto, eles sabem propiciar
decisão, o instante que torna o movi-
de intervalo, esse tempo de
mento para o
autêntico e seguro próprio sujeito.
descritiva demais.
A noção de isolamento é pouco
um
não
Alguém que não vê pessoas que
ou
O que é alguém isolado?
estar próximo do outro
se interessa por elas? Alguém que pode
colocar em seu lu-
de forma asfixiante, mas que é incapaz de se
alguém pode
esse estar vivendo u m isolamento imaginário
gar,
u m a experiência
simbólica,
agudo. Ou seja, o autoisolamento é
castigo que é a prisão veja
e
e não uma exclusão física. Pense no
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