2) O direito função da sociedade? – as conceções redutivistas (o direito como variável
dependente)
- problema da determinação do modo como o direito se articula com a sociedade – será o
direito uma pura função dependente da sociedade?
- para essas orientações o direito seria um mero resultado dos elementos materiais irredutivelmente constitutivos da sociedade
- existem correntes defensoras da ideia de que o direito depende, em exclusivo, e
respetivamente, da economia, da política e da cultura» o direito sendo uma realidade fraca determinada pelas realidades mais fortes;
A. A redução do direito ao económico:
• sustenta a redução da normatividade jurídica – o direito é a mera expressão normativa das relações económicas, não traduzindo mais do que a normação do económico; • a estrutura económica da sociedade determina todas as dimensões de sentido e de valor da vida humana – desde a consciência individual à superestrutura jurídica e política que se viesse a institucionalizar; • para Marx, a infraestrutura é que seria a causa nuclear de todas as dimensões da vida societariamente significativas: cada cultura seria determinada pelas relações de produção constitutivas da mencionada estrutura económica da sociedade; • desta perspetiva, o económico seria o elemento determinante, e o direito, como estrato integrante da superestrutura, seria determinado por aquela infraestrutura; • é indesmentível o peso das preocupações económicas logo ao nível dos princípios – o económico é ainda hoje o referente decisivo, mas nem sempre o foi; • a racionalidade do económico é a da mera eficiência pragmática» como dispomos sempre de poucos meios vemo-nos constantemente compelidos a optar pelo meio mais eficaz para satisfazer os seus interesses ocasionais; • a racionalidade económica é funcional, instrumental de meio-fim; • se a realidade social fosse totalmente dominada pela economia, haveria apenas uma única racionalidade, a puramente técnico-funcional; • crítica: os interesses não podem ser avaliados em termos de pragmática eficiência» há exigências constitutivas da prática, isto é, da significação especificamente humana da vida – para além dos interesses há referentes culturais suscetíveis de serem mobilizados para ajuizar desses interesses; • crítica: tudo isto mostra não ser o económico o determinante exclusivo. O económico não reduz o ético-jurídico. B. A redução do direito ao político: • a política é uma estratégia de eficiência finalística e visa o domínio; • a comunidade tem no político uma dimensão constitutiva do seu próprio sentido, uma vez que é nele que se encontram os valores e os princípios que a humanizam; • o político é o húmus axiologicamente densificante e fundamentante da prática de qualquer comunidade concreta; • a política, diferentemente, identifica um programa finalístico, que tem na sua estratégia e que é assumido por um governo. A política alimenta-se de valores, mas sendo uma estratégia atuada por mais ou menos complexos jogos táticos, não se confunde com eles; • será o direito redutível à política? – é necessário apurar se o direito não passa da política traduzida em normas; • a autonomização da política coincidiu com a afirmação do Estado moderno – do Estado que assumiu a titularidade de toda a prática da comunidade e também do direito» tentação de reduzir todo o universo prático à política; • com o Estado moderno o direito passou a ser legislação, mera expressão da vontade do próprio Estado; • para esta tese redutivista o direito não é mais do que a vontade da instância politicamente soberana; • críticas: (plano institucional*) problema das relações direito/poder e (plano intencional+) as intensões do jurídico e da política: • *o problema da legitimidade do poder do Estado» o poder será legítimo se estiver em consonância substantiva com os valores que entretecem o político e se os tiver realizado em termos adjetivamente conformes a esse referente fundamentante – a dignidade da pessoa humana» afirmam-se direitos fundamentais inalienáveis de todos, mesmo dos membros da minoria, de que a maioria não pode dispor; • se o poder determinasse as validades, nunca entraria em conflito com elas, porque as validades estar-lhe-iam subordinadas e o poder disporia sempre delas» isto contribui para pôr em causa a mencionada e pretensa redução do direito ao poder; • um exemplo de limitação do poder é o Estado-de-direito – uma limitação do poder em nome em nome do direito» exigências predicativas da dignidade ética que nos reconhecemos. O Estado-de-direito representa uma tentativa de resolver o problema entre o poder e as validades; • hodiernamente fala-se em Estado-de-direito material porque se afirmam valores jurídicos que estão acima da própria legalidade; • há uma relação entre o direito e a política, mas isso não significa que o direito se identifique necessariamente com a política; • +a política e o direito têm racionalidades distintas: a primeira é uma estratégia finalisticamente prosseguida, ao passo que a normatividade, como validade que é, tem caráter universal, perfilando-se, por isso, como um fundamento dialogicamente constitutível, mobilizável e afinável; • a política e o direito sempre se afirmaram na história como realidades intencionalmente distintas; • houve depois um momento em que o direito se identificou com a legalidade» os valores jurídicos e políticos coincidiram. Todavia, esta coincidência logo se desfez quando a lei deixou de ser o estatuto universal, o enquadrante estável e racional das liberdades, para se transformar em mero instrumento da política; • distinção entre lei/direito a significar a existência de uma normatividade vigente constituída pela jurisprudência e pela própria realidade jurídica e a traduzir o reconhecimento de valores trans-legais – o direito distingue-se, então, da legislação política. C. A redução do direito ao axiológico-cultural: • O direito assimila os valores que entretecem a ordem axiológica da comunidade. Mas o direito não é menos condicionado pelos histórico-socialmente concretos problemas dessa mesma comunidade; • o direito só verdadeiramente o será se puder dizer-se vigente; • uma cultura será vigente quando se nos apresentar como uma efetiva dimensão de sentido de uma certa prática, conformando axiológico-intencionalmente e histórico- sociologicamente a pluralidade das manifestações existencialmente predicativas de uma determinada comunidade; • o direito só deverá considerar-se vigente se estiver em consonância problemática e intencional com uma certa prática, se responder aos problemas justificadamente reconhecidos como juridicamente relevantes que nela emergem e se assumir as constituendas valências especificantes da juridicidade que nela se afirmam» o direito tem a ver com a textura axiológica da comunidade circunstancialmente relevante; • o direito é um dever-ser, porque é uma intenção de validade que transcende os factos sociais para poder ajuizar deles; • (questão do juracionalismo e do jusnaturalimos – pág 262-269); • podemos concluir que o direito, embora não seja alheio a valores (pois é neles que afinal radica a sua dimensão de validade), não se reduz a eles: o direito, para se afirmar autenticamente como tal, tem também que ser eficaz, pois só assim será vigente – o direito não se reduz, portanto, nem ao económico, nem à política, nem ao axiológico-cultural» radica na intersubjetividade.