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Título Unidade CÉSAR AUGUSTO EUGÊNIO

EDUCAÇÃO ESCOLAR:
POLÍTICAS E ORGANIZAÇÃO

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EDUCAÇÃO ESCOLAR: POLÍTICAS E ORGANIZAÇÃO
César Augusto Eugênio

2022
CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA
FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL –
ORDEM DOS FRADES MENORES

PRESIDENTE
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
DIRETOR GERAL
Jorge Apóstolos Siarcos
REITOR
Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM
VICE-REITOR
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO
Adriel de Moura Cabral
PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO
Dilnei Giseli Lorenzi
COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD
Renato Adriano Pezenti
GESTOR DO CENTRO DE SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CSE
Franklin Portela Correia
REVISÃO TÉCNICA
Daniela Dias dos Anjos
PROJETO GRÁFICO
Impulsa Comunicação
DIAGRAMADORES
Daniel Landucci
CAPA
Daniel Landucci

© 2022 Universidade São Francisco


Avenida São Francisco de Assis, 218
CEP 12916-900 – Bragança Paulista/SP
O AUTOR
CESAR AUGUSTO EUGENIO
Doutor em Educação - Linha: Educação, Sociedade e Processos Formativos pela Uni-
versidade São Francisco - Itatiba, onde cursou seu Mestrado em Educação - História,
Historiografia e Ideias Educacionais, ambos com o fomento da CAPES. Graduado em
Filosofia, é Professor há 25 anos acumulando experiência na Administração Superior
como Pró-Reitor de Extensão, na Coordenação Pedagógica e Docência em Escolas
Públicas de Educação Básica, desde 1995, e no Ensino Superior desde 2003. Atu-
almente, na Universidade de Taubaté, é Professor Assistente II de Filosofia e Ética
vinculado ao Instituto Básico de Humanidades, responde, pela Coordenação Pedagó-
gica do curso de Pedagogia, é Docente de Apoio de Filosofia da Educação a Distância
desta Instituição e é coordenador do projeto de extensão “Projetos de Vida: escolhas e
desafios”. Como pesquisador, prioriza os debates acerca da infância e sua educação,
ética, política e sociedade. Organizou e escreveu várias obras na área da Educação,
Filosofia, História Regional, Formação de Professores.

O REVISOR TÉCNICO

DANIELA DIAS DOS ANJOS


Possui graduação em Pedagogia, mestrado e doutorado em Educação, pela Faculda-
de de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Tem experiên-
cia na área de Educação como professora da educação básica e do ensino superior.
Atualmente é docente do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação da
Universidade São Francisco (USF), e atua na linha de pesquisa Educação, Sociedade
e Processos Formativos. Participa dos seguintes grupos de pesquisa: GPPL (Grupo
de Pesquisa Pensamento e Linguagem) e Grupo de Pesquisa Relações de Ensino e
Trabalho Docente. Integrante das seguintes associações: ABALF - Associação Brasilei-
ra de Alfabetização, ANPED - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Educação - GT 10 - Alfabetização, Leitura e Escrita.
SUMÁRIO

[Disponível no livro completo]


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

UNIDADE 1

POLÍTICA, ESTADO E EDUCAÇÃO NO


1
BRASIL: ANÁLISE HISTÓRICA

INTRODUÇÃO
Nesta unidade, discutiremos sobre os limites e aproximações entre política, Estado
e educação no Brasil. Para tanto, nosso percurso passará pelas divisões clássicas
da história do Brasil, a saber: Colônia, Império e República. No entanto, ao ajustar
nossa lente para focalizar a educação, daremos prioridade ao estudo de possíveis
acontecimentos que nos ajudam a entender como se deram as políticas educacionais
em nosso país, discutir interesses e problematizar encaminhamentos no objetivo de
oferecer elementos que ajudem no desenvolvimento de um olhar crítico sobre esse
processo, de modo a desnaturalizar a educação, sobretudo, a educação escolar. Afinal,
a história não se dá de forma linear e evolutiva, a humanidade caminha entre avanços e
retrocessos. Assim, veremos contribuições significativas de autores e políticos em cada
período de nossa história. Este processo será fundamental para o entendimento do
marco paradigmático da democracia brasileira: a Constituição Federal de 1988, ainda
vigente, sobretudo em seu artigo 205, que confirma a educação como direito de todos
e dever do Estado e da família.

1. POLÍTICA, ESTADO E EDUCAÇÃO NO BRASIL: ANÁLISE


HISTÓRICA
Nas conversas informais do nosso dia a dia, falamos sobre professores, escola, alunos,
material didático, carteiras e cadeiras, profissionais da gestão – direção, vice-direção,
coordenação pedagógica, orientação educacional – e toda a estrutura estatal, do nível
federal ao municipal, do Ministério da Educação às Secretarias Municipais, perpassando
as Diretorias Regionais de Ensino, como se eles sempre tivessem existido do modo
como os conhecemos.

CURIOSIDADES
Você sabia que a etimologia da palavra escola vem do termo grego skholê? Os gregos utili-
zavam desse termo para indicar o lugar de descanso, do ócio, não da preguiça; um espaço
de reflexão reservado aos homens livres, aqueles que não precisavam se dedicar aos tra-
balhos manuais, reservado às mulheres e escravos. Nesse sentido, podemos afirmar que a
escola nasce para os privilegiados da sociedade.

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Mesmo quando nos referimos a um passado que remete à infância de nossos pais ou
avós e identificamos algumas diferenças em relação à escola atual, em se tratando de
aspectos metodológicos e/ou organizacionais, mormente a percepção fundada no senso
comum não consegue ultrapassar a questão moral sempre presente nas expressões: 1
“no meu tempo os alunos respeitavam os professores”, “havia um(a) professor(a) que

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reprovava mais da metade da sala”, “quando o(a) diretor(a) falava, não se ouvia um pio”.

É verdade que tal escola existiu e alimentou o imaginário popular como sendo expressão
de qualidade, no tocante à reprodução de valores aceitáveis e desejáveis por uma
sociedade específica, e como portadora do conhecimento científico válido e indiscutível.
O professor dessa escola era, definitivamente, o portador da verdade.

O que pouca gente sabe é que essa escola, tal e qual a conhecemos – ou acreditamos
conhecê-la –, no Brasil, é uma criação do ideário republicano. Muito daquilo que se
discute hoje já se discutia há um século, pelo menos. Vários métodos utilizados na
escola atual, como o teatro e a contação de histórias, já eram utilizados pelos padres
jesuítas durante o período colonial. Considerar o aluno como central no processo de
ensino e aprendizagem era discutido pelos intelectuais que defendiam o movimento
escolanovista nos anos de 1920 e 1930, aqui no Brasil.

IMPORTANTE
Ideário Republicano: de acordo com a etimologia da palavra, república vem do latim res-pu-
blica e se refere ao que é público, à coisa pública. Dá a ideia de bem comum, de participação
popular. A república, como forma de governo contrária à monarquia, não admite a ideia de
dinastia, linhagem, poder hereditário, mas sim um tipo de poder legitimado pela escolha au-
tônoma e consciente de cidadãos livres. Apesar do clássico grego de Platão, A República, e
sua detalhada descrição – filósofos governam, guerreiros protegem, produtores alimentam –,
foi Cícero, em Roma, que eternizou o conceito de espírito republicano. Ao se falar de ideário
republicano, referimo-nos a um conjunto de ideias que, contrariamente à monarquia, ressig-
nificam e atualizam, dentro de cada período histórico, os conceitos de igualdade e liberdade,
de modo a permitir a todo cidadão ter acesso à educação, à saúde, a legitimar ou participar
do poder legitimado pela vontade popular. Obviamente, não se trata de um movimento homo-
gêneo. Assim, no Brasil, havia republicanos contra e a favor da abolição, contra e a favor da
participação das mulheres na política etc. Se você gostou desse tema, leia o artigo:

LAFER, Celso. O Significado de República. In: Revista Estudos históricos, Rio de Janeiro,
v. 2, n. 4, 1989, p. 214-224. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/
article/view/2286. Acesso em: 9 out. 2020.

Para outras reflexões, assistir a entrevista com a autora Heloísa M. Starling, disponível no
link: https://www.youtube.com/watch?v=504k1n79ouQ. Acesso em: 9 out. 2020.

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Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

Como vimos, nossa jornada será um complexo de informações e reflexões, mas não
se preocupe: cada período será cuidadosamente caracterizado para que você não se
perca pelo caminho.
1
Nossa viagem começa com a chegada dos portugueses em nossas terras, no
ano de 1500. Uma vez que as caravelas de Pedro Álvares Cabral aqui chegaram e,
costumeiramente, Frei Henrique de Coimbra celebrou a primeira missa, houve o contato
com os autóctones, que passaram a ser chamados de índios, os habitantes da selva, da
mata, ou, simplesmente, selvagens. Sobre estes últimos, os donos das terras brasílicas,
falaremos novamente daqui a pouco.

Como não houve interesse imediato pelas terras tidas como descobertas pelos europeus
civilizados, algumas expedições foram posteriormente enviadas – as Entradas e
Bandeiras – à procura de riquezas a serem exploradas, e assim começa a história do
Brasil depois da chegada dos portugueses. O processo de colonização propriamente
dito começou somente em 1530, com a vinda da expedição de Martim Afonso de Sousa
e, de forma mais sistemática, com a instalação do primeiro Governador Geral, Tomé de
Sousa, no ano de 1549. Junto com esse representante da coroa em terras brasílicas
vieram os padres da Companhia de Jesus. Mas, afinal, por que esses padres vieram
para cá? Quais seus motivos? Serão eles os criadores do primeiro modelo de educação
instaurado no Brasil.

Para entendermos como se deu esse processo, precisaremos compreender um fenômeno


que aconteceu na Europa durante os primeiros anos do século XVI: a Reforma Protestante.

Estamos no final da Idade Média, um período que durou mil anos. A Igreja Católica Apostólica
Romana se tornou a instituição mais sólida e influente em toda Europa na condução dos
trabalhos da realeza, assistindo de perto às decisões de cunho político e a vida privada dos
palácios, coroando reis, presidindo matrimônios reais, abençoando guerras.

GLOSSÁRIO
Decurião: no contexto do Ensino Monitorial, também conhecido como Lancasteriano ou En-
sino Mútuo, era o título que se aplicava aos alunos que se destacavam dentre os demais e se
tornavam monitores, passando a se responsabilizarem pela transmissão do conhecimento,
determinado pelo professor, a um grupo de colegas.

Dogma: verdade de fé; o conjunto de dogmas, devidamente articulados, filosoficamente e


teologicamente, formam uma doutrina; as religiões têm seus pilares nos dogmas, em seus
rituais e tradição.

Indulgência: a questão das indulgências é sempre cercada de contradições. De maneira geral,


estimulavam-se práticas piedosas para o perdão dos pecados, ter uma vida virtuosa. No en-
tanto, foi muito comum, sobretudo na Idade Média, a cobrança em dinheiro, bens, riquezas de
maneira geral, para que os pecados fossem perdoados e houvesse alguma garantia de salva-
ção. Uma vez decretada pelos bispos ou pelo próprio papa, as “cartas” eram comercializadas.

Inquisição: ou Tribunal da Inquisição, tratou-se de um segmento com perfil jurídico que se


instaurou durante o século XIII no seio da Igreja Católica com o objetivo de combater as he-

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resias, o comportamento herético, ou seja, aquele que contrariava ou afrontava os dogmas
cristãos. Os fieis ou hereges eram julgados e, se perdoados, poderiam seguir suas vidas nor-
malmente, mas, se condenados, eram excomungados e, normalmente, condenados à morte,
o que se dava na fogueira; o fogo sempre foi o símbolo da purificação; acreditava-se que no
1
momento em que estivesse a queimar haveria o arrependimento, a conversão. Não se sabe

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ao certo quantas pessoas foram perseguidas e mortas pela Inquisição. Vários tribunais foram
instaurados pelo mundo, inclusive no Novo Mundo, as terras descobertas por espanhóis e
portugueses, por serem reinos católicos.

Simonia: comércio de relíquias, ou seja, objetos tidos como sagrados como espinhos da coroa
de Cristo, pedaços da madeira da cruz, fragmentos da roupa de santos ou de seus ossos etc.

Em meio aos ritos ordinários, havia a venda de indulgências e a prática de simonias,


que, durante a Inquisição, geraram insatisfações e feriram a unidade dessa fortaleza
cristã. Sendo assim, não foram poucas as vozes que se ergueram contra tais práticas
e questionaram dogmas inabaláveis. Dentre elas, a que mais ecoou foi, sem dúvida, a
de Martinho Lutero.

Lutero foi levado ao Tribunal após a publicação de suas 95 Teses, na porta da catedral
de Wittenberg. Além desta, outras de suas obras foram consideradas heréticas. Foi
julgado, excomungado, mas não condenado à morte por causa do grande apoio popular
e político entre os príncipes da Alemanha. Ainda assim, Lutero se manteve cristão, mas
fora da Igreja Católica. Seus admiradores e seguidores se espalharam por toda parte.
Surgiu a necessidade de se criar uma nova Igreja, e assim nasceu a Luterana. Estava
decretada a Reforma Protestante que carregou metade da Alemanha, a princípio, e se
espalhou por toda a Europa.

SAIBA MAIS
Você gostaria de aprender um pouco mais sobre a visão educacional de Lutero, que defendia
um modelo de escola pública, mantida pelas províncias, com três anos de duração, e o mo-
vimento reformista? Para isso, leia:

MANACORDA, Mário A. História da Educação: da Antiguidade aos nossos dias. 10. ed.
Tradução Gaetano Lo Monaco. São Paulo: Cortez, 2002.

Se tiver dúvidas sobre a Reforma Protestante, sugerimos que assista ao seguinte vídeo: Re-
forma Protestante: Lutero, do canal Brasil Escola. Disponível em: https:// www.youtube.com/
watch?v=IT-YjgJNkA4. Acesso em: 9 out. 2020.

Paralelo a esse processo, vários anos antes, a Igreja Católica avaliava suas ações
ao perceber insatisfações e discórdias não só de diversos membros do alto clero
mas também de setores ligados ao povo, padres etc. Chamamos esse movimento de
reorganização da Igreja de Contrarreforma, que, apesar de se referir imediatamente à
“contra a Reforma protestante”, conforme o próprio nome, trata-se de um movimento

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Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

maior da percepção da necessidade da instauração de mudanças. Dentre as várias


medidas contrarreformistas, podemos destacar o incentivo à criação de Ordens
Religiosas Missionárias, com vistas a se fazer presente nos recônditos mais distantes
1 do planeta, e a convocação para a realização do Concílio de Trento, que se deu entre
os anos de 1545 a 1563.

As Ordens Contemplativas, ou seja, daqueles que dedicavam sua vida ao trabalho e


oração e, normalmente, enclausurados, já existiam há muito tempo. A Ordem de São
Bento, os beneditinos, está entre as mais antigas.

Dentre as missionárias, a Companhia de Jesus, fundada em 1534 por Inácio de


Loyola, merece atenção especial. Os jesuítas ou soldados de Cristo, como eram
conhecidos os padres dessa Ordem, num momento de fortalecimento da aliança entre
Igreja e Coroa, passaram a contribuir nos processos de colonização das terras recém-
encontradas. É dentro desse contexto que um grupo de jesuítas, chefiados pelo Padre
Manuel da Nóbrega, desembarca no Brasil, junto com Tomé de Sousa, o primeiro
Governador Geral.

Uma vez instalados no Brasil, os jesuítas instauraram o primeiro modelo de escola em


nossas terras, por meio de duas frentes de trabalho: os colégios e as missões.

Os colégios foram criados para atender, originalmente, crianças em condições de


fragilidade e alguns índios, no intuito de convertê-los à fé católica. No entanto, não
demorou para que os colégios passassem a atender os filhos dos principais, como eram
chamados os herdeiros da elite que se formou no Brasil.

Os colégios se configuraram como escola moderna.

SAIBA MAIS
A escola moderna é uma das instâncias da modernidade, assim como os hospitais, hospí-
cios, cadeias, enfim, instituições que nasceram na modernidade e compuseram a estrutura
estatal, burocratizando as relações sociais de modo a descentralizar das mãos do rei deci-
sões e procedimentos que afetam a sociedade. Para se aprofundar nesse tema, leia:

VARELA, Julia; ALVAREZ-URIA, Fernando. A maquinaria escolar. Teoria & Educação, 6,


1992. Disponível em: http://peadrecuperacao.pbworks.com/w/file/fetch/104642074/A%20Ma-
quinaria%20Escolar.pdf. Acesso em: 15 jun. 2020.

Logo, eram escolas, ao lado de outras instâncias da modernidade, que ofereciam uma
educação com base num programa estruturado na racionalidade antropocêntrica. No
caso dos jesuítas, o Ratio Studiorum, programa de ensino da Companhia de Jesus que
dava as diretrizes para a ocupação do tempo e o conhecimento a ser contemplado, além
da indicação das práticas de piedade para uma vida virtuosa. Os colégios ofereciam um
ensino secundário, preparatório aos que fossem cursar o ensino superior na Europa e,
também, o curso de Teologia, específico para formação dos futuros padres.

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As missões eram destinadas à realização do Figura 01. Padre jesuíta
projeto civilizador direcionado aos índios. Um José de Anchieta.
dos missionários mais conhecidos foi o Padre

Fonte: 123RF.
José de Anchieta, representado na imagem do 1
selo ao lado, que escreveu na praia de Iperoig,

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no município de Ubatuba, litoral norte do estado
de São Paulo, versos à Virgem Maria. O termo
missão era utilizado tanto para o movimento de
ir ao encontro do índio, aos primeiros contatos,
como para a nova vila cristã que era erguida na
mata no lugar da aldeia. Havia, nessa vila, uma
nova conjuntura de relações e concepções.
A capela católica ocupava o centro da vila e os
índios eram catequizados, ou seja, recebiam
uma formação voltada à doutrina cristã, eram
batizados e passavam a trabalhar na lavoura. Vale
registrar que as lavouras dos jesuítas ocuparam
importante espaço nas relações comerciais. Aos
índios, reservavam-se os rudimentos da tríade ler-
escrever-contar, com o objetivo de acompanharem as orações, o catecismo, o livro
de cânticos e reconhecerem as autoridades do rei e da Igreja.

Nas palavras de Paiva (2003, p. 43),


As letras deviam significar a adesão plena à cultura portuguesa. [...] A so-
ciedade portuguesa tinha uma estrutura rigorosa, centrada na hierarquia,
fundada na religião. Hierarquia e religião eram princípios inadiáveis em qual-
quer situação. O serviço de Deus e o serviço d’El-Rei eram os parâmetros
das ações sociais e obrigavam a manutenção das letras, como eram enten-
didas à época.

Portanto, ser civilizado significava ser obediente às leis dos homens, pela pessoa
do rei e seus representantes, e às leis de Deus, pela Igreja e seu clero. Tratava-
se de abandonar, definitivamente, a cultura pagã e primitiva pela europeia,
branca, católica, moderna.

Aos filhos dos fazendeiros e da elite política, as primeiras letras eram dadas em casa,
de forma assistemática, sendo conduzidos aos colégios para o ensino secundário.
Não havia, no Brasil, um sistema de educação originalmente público e extensivo à
população. A preocupação com a educação do povo viria apenas séculos depois da
chegada dos jesuítas.

Essa frágil política educacional da Coroa portuguesa, protagonizada pelos padres


da Companhia de Jesus, para o Brasil Colônia, manteve os jesuítas, seus colégios
e missões durante 210 anos. O desfecho dessa política se deu com a expulsão da
Companhia de Jesus, no ano de 1759, do Brasil e de todas as colônias portuguesas, logo
após Marquês de Pombal assumir o cargo de Primeiro Ministro, em 1750. Importante
deixar claro que a Igreja Católica não foi expulsa, mas apenas os jesuítas, acusados de
insubordinação à Coroa e à própria Igreja, ao ordenarem os índios, tornando-os padres

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Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

e permitindo, com isso, sua participação no clero e a desvirtuação dos rituais católicos
universalizados no Concílio de Trento, celebrando missas em tupi guarani, usando dos
instrumentos musicais indígenas nos rituais cristãos.
1
O que ficou no lugar dos jesuítas? Quase nada. Marquês de Pombal, que nunca veio
ao Brasil, instaurou as aulas régias, assim chamadas por se referirem à Coroa, à
Realeza. Trata-se de um sistema público de educação destinado a oferecer o ensino
secundário a quem pudesse pagar pelos serviços dos professores. Esse modelo de
escola se caracteriza pela oferta de disciplinas avulsas que não constituíam exatamente
um currículo, mas tinham a função de ser propedêutico ao ensino superior a ser cursado
na Europa, normalmente na Universidade de Coimbra.

Não se sabe ao certo, devido às dificuldades óbvias da confecção de um censo demográfico


que expressasse a realidade da população brasileira, qual o percentual daqueles que
conseguiam ter acesso à educação. Por dedução, supõe-se que não chegasse a 1% a
população que usufruía de tal sistema, levando-se em conta os milhões de índios que não
tinham acesso, somados aos escravos negros que passaram a compor nossa sociedade
desde 1550, e aos milhares de bandeirantes que se perderam de suas Bandeiras e
firmaram residência em pequenas propriedades, engrossando a população de pobres
brancos que aqui habitavam, todos fora do sistema de educação das aulas régias.

As aulas régias se estenderam até a independência do Brasil, em 1822. No entanto, uma


nova política educacional se instaurou com a vinda da Família Real em 1808, por ocasião
da sua fuga de Lisboa, amedrontada com a possibilidade de uma invasão napoleônica e
derrocada da Coroa, situação provocada pela Coroa portuguesa por não haver cumprido
o fechamento de seus portos aos ingleses, o Bloqueio Continental, imposto por Napoleão.

Logo que a Família Real se instalou no Rio de Janeiro, segunda capital do Brasil, foi
incrementada uma nova política de educação, fundando as faculdades de Medicina
e Engenharia. A Faculdade de Direito seria criada somente em 1827. De acordo com
Vieira e Farias (2013, p. 53),
Em virtude das necessidades mais urgentes são criados, a princípio, cursos
ligados à defesa e à saúde: a Academia Real de Marinha (1808), a Academia
Real Militar (1810), os cursos de cirurgia na Bahia e no Rio de Janeiro e o
curso de anatomia, também no Rio de Janeiro. Logo em seguida, organiza-
-se o curso de medicina.

Dado o exposto, podemos perceber que a preocupação era garantir, dentro de certos
limites, a formação de médicos e engenheiros que atendessem ao exército, a marinha e
a nobreza, afinal, não há registros de avanços na área saúde pública. O ensino primário
e o secundário não sofreram mudanças. O Príncipe João, coroado como Dom João VI,
rei de Portugal, Brasil e Algarve em 1818, mesmo que já governasse desde a morte
de Dona Maria I, sua mãe, em 1816, não se ocupou em criar um sistema de educação
que, minimamente, demonstrasse alguma unidade na capital brasileira. Houve algum
investimento na ambiência cultural pelas criações da Biblioteca Pública, do Jardim
Botânico, da Imprensa Régia e do Museu Nacional. Em todo caso, parece-nos que suas
maiores preocupações ainda estavam em Portugal.

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CURIOSIDADES
O Brasil teve, ao longo de sua história, três capitais:
1
a.  Salvador, atual capital do estado da Bahia, foi a primeira capital do Brasil, criada na oca-
sião da vinda do Governador Geral Tomé de Sousa, entre os anos de 1549 a 1763.

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b.  Rio de Janeiro, atual capital do estado com o mesmo nome, tornou-se capital do Brasil
na ocasião das reformas implementadas por Marquês de Pombal, Primeiro Ministro portu-
guês. Como a exploração de riquezas no século XIX se concentrava no ouro encontrado
em Minas Gerais, o litoral carioca foi visto como estratégico tanto para escoar o minério
extraído – entre outros tantos produtos – como para proteção do território brasileiro.

c.  Brasília, fundada em 21 de abril de 1960. Foi uma cidade construída para se tornar a
capital do Brasil. Planejada e edificada durante a gestão de Juscelino Kubitschek, ainda
hoje é a capital do Estado brasileiro.

Com exceção do Seminário de Olinda, fundado em 1800 em Pernambuco, e do Colégio de


Caraça, criado em 1820 na província de Minas Gerais, ambos por inciativa da Igreja, não
tivemos nenhuma lei que incentivasse, organizasse ou destinasse fundos para a manutenção
e desenvolvimento da educação de primeiras letras e secundário no Brasil até então.

A partir de 1820, ano que coincide com a volta de Dom João VI à Portugal por causa
das agitações geradas pela Revolta do Porto, que exigiam a presença do rei em Lisboa,
o Conde de Scey implantou, em caráter experimental, o método monitorial/mútuo,
também conhecido como método lancasteriano. Foi inaugurado um longo período
de discussões pedagógicas no Brasil que contribuirão para o amadurecimento das
reflexões acerca da organização da escola e sua gestão, das relações e aproximações
entre o ensino e a aprendizagem, criação e aperfeiçoamento de material didático,
edificação de prédios próprios, formação de professores etc.

Para entendermos o interesse do Estado brasileiro pelo método monitorial, faz-se necessário
que o compreendamos desde sua criação. Durante a segunda metade do século XVIII, o
médico André Bell dirigiu, em Madras, um orfanato entre os anos 1787 e 1794 e registrou sua
experiência na obra Essai d’education fait au collège de Madras. Há, ainda, o registro de outra
experiência, a de Joseph Lancaster, que dirigiu uma escola com mais de mil crianças pobres,
entre meninos e meninas, em Londres, no ano de 1798. Em ambos os casos, Bell e Lancaster
teriam se utilizado do método monitorial para resolver problemas de carência de professores e
demais profissionais na condução dos trabalhos das instituições que dirigiam.

Logo, vale destacar preocupações semelhantes: manutenção da ordem, otimização racional


do tempo, carência de recursos e motivação religiosa, uma vez que Bell era pastor anglicano
e Lancaster pertencia à seita dos Quackers. A pesquisadora Zélis (apud BASTOS, 2005)
sinaliza que experiências educativas com esse método foram encontradas nas escolas
monásticas durante a Alta Idade Média e em momento anterior à Revolução Francesa.

Como sugere o nome monitorial, esse método consiste na utilização dos próprios alunos,
na condição de monitores e/ou de instrutores, para a transmissão de um conteúdo,
uma lição, previamente definido pelo professor. As turmas, mesmo as maiores, eram

Educação Escolar: Políticas e Organização 13


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

divididas em classes dentro do mesmo ambiente. Cada classe se refere a um grupo de


alunos que estão em nível de conhecimento mais ou menos comum.
O aluno é integrado a uma classe, depois de averiguado seu conhecimento.
1 A classe tem um ritmo determinado de estudo e um programa a desenvolver
de leitura, escrita e aritmética. Por exemplo, a leitura para os menores da pri-
meira classe consiste em aprender o alfabeto e traçar as letras sobre a areia;
na segunda classe, os alunos são iniciados nas sílabas de duas letras, que
escrevem sobre a ardósia; na terceira, fazem a combinação com três letras;
na quarta, trabalham com as palavras com várias sílabas; na quinta come-
çam a ler; somente na sexta classe leem corretamente. Cada aluno pode
pertencer ao mesmo tempo a várias classes diferentes: ele pode estar mais
avançado em leitura do que na escrita ou no cálculo. (BASTOS, 2005, p. 36)

Sendo assim, o professor acaba não tendo um contato direto com os alunos e sua
atuação é restrita à manutenção da ordem e uso racional do tempo, devidamente
dividido de acordo com programação prévia das aulas, à instrução dos monitores e à
verificação da aprendizagem, a fim de garantir o nivelamento das classes.
Figura 02. Sala de aula – Método Monitorial.

LAREIRA
ENTRADA PRINCIPAL

PROFESSOR
ESTRADO
MONITOR-GERAL

MEIO-CÍRCULOS

BANCOS

ENTRADA LAREIRA
Fonte: Bastos (2005, p. 37).

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A implantação do método monitorial no Brasil começou pela iniciativa do Conde de Scey em
1819. A partir de 1820, soldados eram convocados para aprender o método e difundi-lo em
suas províncias de origem. Acreditava-se, na época, que os soldados seriam os melhores
professores para atuarem no ensino de primeiras letras por garantirem a ordem, perspectiva 1
inerente ao método, mentalidade e postura que se estenderam até 1837, quando o Império

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entendeu ser inviável a manutenção dos soldados no exercício do magistério.

SAIBA MAIS
O processo de emancipação política do Brasil passou por várias etapas que precisam ser
compreendidas. Parte das mudanças protagonizadas por Marquês de Pombal, Sebastião
José de Carvalho e Melo, Primeiro Ministro português por quase três décadas (1750-1777),
afetaram nossas terras. Além da expulsão dos jesuítas e transferência da capital de Salvador
para o Rio de Janeiro, o Brasil passou a contar com “vice-reis”. Foram sete entre os anos
1763 e 1808, fase que terminou com a vinda da Família Real nesse ano. No ano de 1815, o
Brasil foi elevado à categoria de Reino Unido a Portugal e a Algarves, e assim ficou até a Pro-
clamação de Independência, quando se inaugurou o Primeiro Império, em 1822. Dom Pedro
I foi o primeiro imperador do Brasil como Estado independente, pois Dom João VI, seu pai,
foi coroado em terras brasileiras em 1818. Importante registrar que Dom Pedro já respondia
pelo governo desde a ida de seu pai para Portugal em 1820. O Primeiro Império durou até o
ano de 1831, quando se iniciou o Período Regencial. Isso se deu em virtude da ida de Dom
Pedro I para Portugal, para assumir o trono na ocasião da morte de Dom João VI. O Brasil
foi governado por regentes até o ano de 1840, quando o herdeiro do trono, Dom Pedro II, foi
coroado, aos 14 anos. Ele permaneceu no trono do Segundo Império até a Proclamação da
República, em 1889.

Tão logo proclamada a Independência, em 1822, o neófito Estado brasileiro se viu


diante do desafio de criar suas próprias políticas e enfrentar, dentro de seus limites, as
discussões propaladas em outras partes do mundo. A Assembleia Constituinte de
1823, de acordo com os estudos de Cury, Horta e Fávero (2005), chegou a discutir a
elaboração de um “compêndio para a juventude brasileira” e a criação de universidades.
Segundo esses pesquisadores, houve discursos acerca da oferta e promoção de uma
educação primária gratuita e extensiva a toda a população. O resultado desses debates
pode ser visto no art. 179 da Constituição de 1824, que estabelece “instrução primária
e aberta a todos os cidadãos”.

Importante considerar, pela letra da lei, o conceito de “primária” como o ensino das
primeiras letras, o que exigia um programa de educação nacional. Na sequência, “aberta
a todos os cidadãos” implica a definição da população que teria direito à educação
gratuita, descartando a possibilidade dos escravos, de forma direta, e, indiretamente, dos
índios, que mesmo não sendo escravos também não eram cidadãos, em sua maioria.
Negros e índios tiveram pouquíssimas oportunidades de acesso às letras durante toda
história do Brasil, mesmo nos momentos mais democráticos do período republicano.

Na mesma direção, a Lei Imperial de 15 de outubro de 1827 veio para regulamentar


a criação de escolas em todas as vilas, cidades e lugares populosos. Tais escolas
deveriam seguir o método monitorial/mútuo, tido como oficial. Aliás, o decreto de

Educação Escolar: Políticas e Organização 15


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

1823 já colocava em evidência as vantagens do método e, em 1826, membros


da Comissão de Instrução Pública da Câmara de Deputados fizeram a seguinte
menção ao método monitorial:
1 [...] os mestres procurarão aproximar-se o mais possível do método lancas-
teriano, repartindo o ensino por decúrias, a fim de que os mais adiantados
discípulos se exercitem no ensino dos menos adiantados, na metade do
tempo da aula, e depois recebam eles mesmos as instruções do mestre no
resto do tempo. (MOACYR apud BASTOS, 2005, p. 41).

Interessante é o aspecto centralizador da obrigatoriedade pelo financiamento da


educação. Os anos passaram e pouca coisa foi feita em relação ao cumprimento da
Constituição e da Lei Imperial de 1827. A promulgação do Ato Adicional de 1834,
durante o Período Regencial, descentralizou as obrigações de oferta e financiamento
da educação, com exceção do ensino superior, de modo que cada província deveria
arcar com as despesas a partir de suas próprias arrecadações.

Mas como expandir a educação se não havia professores? Mesmo que parte das soluções
políticas encontradas em meio às discussões no interior da Câmara ficassem, quase sempre,
restritas à letra da lei, no caso da carência de profissionais da educação determinou-se a
criação da primeira Escola Normal para formação de professores em Niterói, no ano de
1835. Os professores a serem formados, tanto os novos como os que já atuavam, deveriam
se especializar no método monitorial/mútuo, também chamado de lancasteriano.

Ficou claro, com o decorrer do tempo, que a aplicação do método mútuo tinha um viés
político. As escolas, acondicionadas em espaços adaptados, recebiam os filhos dos mais
pobres e, por isso, apelava-se muito mais para seu aspecto moralizante e controlador do
que para a emancipação intelectual das crianças com vistas à continuidade dos estudos
no ensino secundário. Os filhos dos principais, como eram chamados aqueles de origem
nobre ou fazendeiros bem sucedidos donatários de terras, continuavam recebendo uma
educação personalizada em suas casas por meio do chamado método individual, no
qual o educador atendia um a um, sanando suas dificuldades e avançando nos estudos.

Mesmo com a regulamentação dos concursos públicos para o provimento do cargo


de professor de primeiras letras, em 1845, Dom Pedro II continuou recebendo inúmeras
críticas à educação decadente e fragilizada por conta, segundo políticos da época,
da adoção do método monitorial. A falta de materiais e edifícios escolares adequados
engrossavam as reclamações dos defensores da propagação de uma educação
esclarecedora, aos moldes iluministas.

As pressões levaram à Reforma Couto Ferraz – Decreto nº 1331 de 1854 –, que


abandonou o método monitorial e adotou o simultâneo. Este método foi assim chamado
pelo fato de o professor ensinar a todos simultaneamente, ou seja, a exposição do
conteúdo aconteceria a todos ao mesmo tempo. Tal método recebeu outros nomes no
decorrer do tempo, de acordo com o contexto de cada pesquisador: ensino tradicional,
educação bancária, terminologia cunhada por Paulo Freire, etc. A questão, todavia, é que
durante muitos anos os professores foram cobrados a dominar a dinâmica própria do
método mútuo e tiveram que se adaptar ao simultâneo. O resultado foi o surgimento de
um método alternativo, o misto, nascido da síntese criativa dos educadores que passaram

16
a usar das vantagens do simultâneo ao lado da dinâmica envolvente e participativa do
monitorial.

No Segundo Império, durante o governo de Dom Pedro II (1840-1889), houve algum 1


esforço do Estado em assumir a educação, o que se mostrou, quase sempre, restrito
à capital, Rio de Janeiro. Como vimos acima, através da Reforma Couto Ferraz

Universidade São Francisco


(1854) o método simultâneo foi oficializado. Para que isso ocorresse, foi necessário,
minimamente, a instalação de lousas ou quadros-negros num processo de ambientes
adaptados para o funcionamento das escolas.

Importante registrar que a iniciativa Figura 03. Colégio Jesuíta.


privada superou a pública durante

Fonte: Wikimedia Commons.


todo esse período. Vocês se lembram
da Companhia de Jesus, expulsa por
Marquês de Pombal em 1759? No ano de
1842, os jesuítas voltaram e se instalaram
no Brasil oferecendo o que sabiam fazer:
educar. Numa sociedade diferente daquela
colonial de 83 anos atrás, os soldados
de Cristo investiram na construção de
colégios, mas desta vez suntuosos, no
centro ou próximos ao centro das cidades,
por exemplo o colégio edificado em Nova
Friburgo, região serrana do Rio de Janeiro,
e os construídos em São Paulo, Recife e tantas outras cidades. Estes colégios tornaram-
se referência de educação de qualidade.

Definitivamente a iniciativa privada, mesmo que no espaço doméstico, na casa dos


próprios professores, nas escolas particulares, vinculadas ou não à Igreja, foram
responsáveis, majoritariamente, pela oferta dos serviços educacionais. O Liceu de Artes
e Ofícios, criado no Rio de Janeiro em 1856, oferecia cursos profissionais, por exemplo,
ao lado de inúmeras instituições que surgiram para acolher órfãos, abandonados,
desvalidos, ingênuos, meninos e meninas, nas grandes e pequenas cidades por todo
Brasil.

Essa situação é um reflexo daquilo que já acontecia durante o Primeiro Império. O


historiador Luciano Mendes de Faria Filho (2003) registra que no ano de 1827 havia 23
escolas públicas e 170 particulares na província de Minas Gerais. Outro dado importante
é oferecido pelas pesquisadoras Vieira e Farias (2011), segundo o qual no ano de 1867
houve o registro de 107 mil matrículas por todo o Brasil, para uma população livre
de pouco mais de 8 milhões. Considerando aqueles em idade escolar, o número de
matriculados não atingia a casa de 10%, ou seja, o Brasil ainda estava longe de ser
uma nação escolarizada.

Tão logo iniciou-se a década de 1870, intensificaram-se as insatisfações em relação à


monarquia brasileira. Nesse mesmo ano houve a publicação do Manifesto Republicano
e, em 1873, a fundação do Partido Republicano Paulista. A defesa de ideias

Educação Escolar: Políticas e Organização 17


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

democráticas e federalistas alimentou o movimento abolicionista, que ganhou forças


até culminar na Abolição em 1888. Mesmo que o tráfico negreiro houvesse sido proibido
desde 1850 pela lei Eusébio de Queiroz, seguida da Lei do Ventre Livre em 1871 e pela
1 Lei do Sexagenário em 1886, o comércio interno de escravos e a manutenção desse
tipo de mão-de-obra mantinha as condições cruéis de sobrevivência daqueles que eram
reduzidos a um nível semi-humano.

Outras transformações, portanto, se fizeram necessárias: a imigração de povos de


diferentes nacionalidades para terras brasileiras estimulou a troca do trabalho escravo
pelo assalariado. O que estava em jogo é o modelo de sociedade monárquico,
escravocrata e desigual.

No campo da educação, outro método de ensino sacudiu as discussões pedagógicas


e impulsionou novas reformas educacionais. Estamos, agora, falando sobre o método
intuitivo. Fundamentado nos estudos de Jean-Henri Pestalozzi, educador suíço, o
método intuitivo inovou a maneira de se conceber a educação, pois trouxe à tona o
debate sobre ensino e aprendizagem como processos distintos e complementares.
Nesse sentido, além de pensar acerca da melhor maneira de se ensinar, é preciso
refletir sobre as formas pelas quais se dá aprendizagem do aluno.

CURIOSIDADES
A etimologia da palavra aluno não é a – negação, lumni – luz, logo, sem luz. Apesar de se
difundir essa tradução indevida, há um sentido interessante, pois o conhecimento ilumina, tira
das trevas, no sentido da filosofia de Platão, Mito da Caverna. A origem correta da palavra
vem do latim alumnus, termo que identificava a criança de peito, lactente, aquela que precisa
de ajuda para se alimentar. Sendo assim, supõe-se que o aluno precisa saciar sua fome e o
professor é quem irá alimentá-lo, ou seja, saciar sua fome com conhecimento.

Esse método tem suas bases no empirismo, ou seja, afirma que nossa experiência
no mundo se dá pelos sentidos, daí a importância da observação como porta de
entrada para a síntese elaborada pela racionalidade. Considera-se intuição o
momento em que se dá o conhecimento propriamente dito, quando a experiência
sensível se torna conceito.
Essa etapa da observação minuciosa e organizada é condição para a pro-
gressiva passagem, pelos alunos, de um conhecimento sensível para uma
elaboração mental superior, reflexiva, dos conhecimentos. Tal etapa inicia-se
pelas “lições de coisas”, momento em que o professor deve criar as condi-
ções para que os alunos possam ver, sentir, observar os objetos. Podia-se
realizar tal procedimento utilizando-se dos objetos escolares ou dos objetos
levados para a escola (caneta, carteira mesa, pedras, madeiras, tecidos...),
ou realizando visitas e excursões à circunvizinhança da escola ou, ainda,
possibilitando aos alunos o acesso a gravuras diversas que tanto pode-
riam estar nos próprios livros de “lições de coisas” ou de outros conteúdos,
ou em cartazes especialmente produzidos para o trabalho com o método.
(FARIA FILHO, 2003, p. 143).

18
Se com o método monitorial o professor tinha uma função muito mais disciplinadora
do que pedagógica, uma vez que sua orientação era direcionada aos monitores,
também chamados de decuriões dentro do contexto escolar, no simultâneo ele ganhou
espaço significativo na transmissão do conhecimento, pois tornou-se protagonista da 1
ciência a ser aprendida pelo aluno e, no intuitivo, tornou-se peça chave para que o

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aluno soubesse o que e como observar e, assim, obter elementos suficientes para
desenvolver a reflexão.

Como bem observou Faria Filho (2003), Figura 04. Objetos escolares.
qualquer objeto poderia ser utilizado

Fonte: 123RF.
pelo(a) professor(a) para ser observado,
explorado. Como na imagem ao lado,
a professora poderia somar ou subtrair
com os lápis, explorar o cheiro, a cor e o
formato da maçã, os números do relógio,
o peso dos livros, enfim, o método intuitivo
alavanca a criatividade do professor
em favor da aprendizagem do aluno.
O problema é que diante da dificuldade
de se fazer visitas à circunvizinhança,
parques, oficinas, ou de se levar objetos
estranhos à rotina escolar para contribuir nas lições, as gravuras contidas nos livros
de lições de coisas foram tomando o lugar dos objetos e, consequentemente, a
experiência educativa foi se tornando menos atrativa e envolvente.

Várias iniciativas contribuíram para a difusão do método intuitivo. Dentre elas,


destacamos as de Benjamin Constant, na direção do Instituo dos Meninos Cegos em
1871, e Alambary Luz, durante o período em que respondeu pela direção da Escola
Normal e se utilizou do método na formação dos professores, importando materiais
criados exclusivamente para estimular a observação e educar os sentidos, como a Caixa
de Lições de Coisas de Madame Pape-Carpentier. Além dessas iniciativas, no ano de
1875 houve a criação dos jardins-de-infância no Rio de Janeiro, por Menezes Vieira,
iniciativa fundamentada no método intuitivo de Pestalozzi, mas também no modelo de
Froebel e da já citada Madame Pape-Carpentier. Em todos os casos, os jardins-de-
infância criados com tal fundamentação teórica deram um novo sentido e impulso na
compreensão do conceito de infância como uma fase de desenvolvimento do sujeito e
não como um sujeito incompleto. Assim, as brincadeiras, as cores, passaram a fazer
parte da rotina escolar da criança.

A Reforma Leôncio de Carvalho no ano de 1879, mesmo não sendo colocada em


prática, segundo Shelbauer (2005), gerou um debate conceitual sobre a maneira como
foi escrito o decreto que reduziu a lição de coisas a uma disciplina, deixando de ser
parte integrante do método intuitivo a ser usado em todas as aulas, como um apoio ao
professor ou uma nova postura do docente frente aos exercícios do magistério.

As discussões pedagógicas que nasceram desde os anos 1820, com o ensino monitorial,
ganharam força ao longo dos anos, principalmente a partir do método intuitivo, de
modo a se reivindicar material didático apropriado e prédios que fossem projetados e

Educação Escolar: Políticas e Organização 19


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

construídos para abrigarem a escola. Somados às questões pedagógicas, os avanços


das pesquisas médico-sanitaristas afirmavam a importância dos ambientes abertos e
iluminados para se evitar a proliferação de doenças infectocontagiosas.
1

SAIBA MAIS
Os avanços das pesquisas médico-sanitaristas ou médico-higienistas se transformaram num
movimento organizado conhecido como Eugenia. De acordo com o pesquisador Bonfim
(2017, p. 64), o movimento eugênico reclamava o atraso brasileiro e a urgência da regenera-
ção da população. Os eugenistas atuaram durantes os anos de 1920 e 1930.

[...] a eugenia desponta como um recurso científico à disposição dos ideais


de progresso nacional entre medidas reformistas de caráter sanitário- edu-
cacional e propostas mais radicais de aprimoramento do perfil racial pela
segregação e esterilização dos indivíduos considerados inaptos.

Gostou do tema? Para se aprofundar, leia:

BONFIM, Paulo R. Educar, Higienizar e Regenerar: uma história da Eugenia no Brasil.


Jundiaí: Paco editorial, 2017.

Além do mais, aos poucos o Estado brasileiro foi percebendo a necessidade de ampliar
sua presença, criando mecanismos de controle, como a inspeção escolar, a fim de ter
a escola a seu favor.

O estado de São Paulo foi pioneiro em promover reformas educacionais à luz do ideário
republicano. A marca mais significativa da nova concepção de política de educação aos
moldes da República foi a criação dos grupos escolares. Nas palavras da pesquisadora
Rosa Fátima de Souza (1998, p. 49-50), o conceito que melhor expressa o modelo
gerado por São Paulo é o seguinte:
O processo de construção do grupo escolar como uma nova organização ad-
ministrativo-pedagógica do ensino primário concretizou-se em poucos anos.
Uma escola urbana, moderna e de melhor qualidade. A reunião de escolas
trazia todos os princípios fundamentais que propiciaram as mudanças no
ensino primário: a racionalização e a padronização do ensino, a divisão do
trabalho docente, a classificação dos alunos, o estabelecimento de exames,
a necessidade de prédios próprios com a consequente constituição da esco-
la como lugar, o estabelecimento de programas amplos e enciclopédicos, a
profissionalização do magistério, novos procedimentos de ensino, uma nova
cultura escolar.

A criação dos grupos escolares se tornou modelar e se espalhou rapidamente por todo
Brasil. A partir do ano de 1910, podemos ver grupos escolares, a título de exemplo, na
cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, em vários municípios de Minas Gerais e por
todo o interior de São Paulo, como em Guaratinguetá e Aparecida, que ainda não havia
conseguido sequer sua emancipação política.

Em se tratando da educação primária, contava-se com o grupo escolar, com as escolas


reunidas, um modelo semelhante ao do grupo escolar, porém administrativamente e

20
pedagogicamente mais frágil, pois apesar de reunidas se mantinham como escolas
isoladas, e o modelo mais antigo, aquele em que cada professor em suas casas e em
locais improvisados correspondiam a uma escola.
1
Com esse modelo, os inspetores escolares passaram a ser o braço do Estado, de
modo a verificarem o número de matriculados e frequentes, alfabetizados e analfabetos,

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meninos e meninas. Os grupos e/ou escolas reunidas passaram a fazer festas abertas
à comunidade, desfiles, apresentações em eventos políticos e religiosos, recepções de
autoridades, ou seja, passaram a participar de forma mais ativa da vida da cidade.

Exemplo disso está nos registros do jornal Santuário de Aparecida, em publicação de


26 de novembro de 1910, ao descrever a Festa da Bandeira:
Festa da Bandeira: A patriótica Festa da Bandeira foi carinhosamente re-
alizada em nossas Escolas Reunidas. Ao meio-dia, quando já se tinha rea-
lizado um festival na seção masculina, esta e a seção feminina, formadas
em frente ao edifício escolar, assistiram ao hasteamento da Bandeira. Nes-
te momento o símbolo de nossa Pátria foi festejado com palmas e flores,
fazendo bela saudação à Bandeira o festejado orador Sr. João Evangelis-
ta. Cantaram então os meninos o Hino Nacional e outros hinos patrióticos,
acompanhados por uma pequena orquestra regida pelo maestro Benedicto
Barreto. (apud EUGENIO, 2009, p. 191).

Aos poucos a escola foi se ajustando à instituição que conhecemos atualmente. Os exames
finais se tornaram um evento importante, no qual os alunos eram avaliados não somente
pelos professores, mas por uma banca da qual participavam o diretor da escola, o inspector
escolar e, às vezes, políticos da cidade. Vale o registro do alto índice de reprovação nesse
momento. O período de matrículas e a concepção de ano letivo também são construções
dessa época, das políticas educacionais geradas a partir da república.

A educação, enquanto direito social, foi tema de debate na Assembleia Constituinte de


1890. Naquele contexto, os liberais acreditavam que a composição de uma educação
obrigatória poderia ferir a liberdade individual que deveria ser plena, deixando, assim, à
iniciativa do cidadão a procura pela educação.
Já no terreno específico da educação escolar [...] é possível dizer que a
educação teria sido o único direito social insinuado no campo de direitos
civis. Mas, mesmo isto, com a hegemonia do liberalismo oligárquico, será
ancorado na dimensão de virtus própria do esforço individual de cada qual.
Assim, não haverá educação obrigatória exatamente porque a oportunidade
educacional será vista como demanda individual. (CURY, 2005, p. 79).

No município do Rio de Janeiro, capital da República, sucessivas reformas aconteceram


sem impactos nacionais, ou seja, o Brasil não contou, durante toda Primeira República,
com um Estado que desse conta de organizar e implementar políticas educacionais que
abrangessem a totalidade na nação brasileira.

Em 1890, houve a Reforma Benjamin Constant, que tentou canalizar para a educação
os ideais do Positivismo, a valorização da ciência e, nesse interim, a sobreposição das
exatas e biológicas em detrimento das humanas. Em 1901, houve o código Epitácio
Pessoa, que acentuou os estudos literários, afinal, Benjamin Constant havia sofrido
muitas críticas e equiparou as escolas públicas e privadas. Em 1911, Rivadávia Corrêa

Educação Escolar: Políticas e Organização 21


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

desoficializou totalmente o ensino, concedendo-lhe autonomia. Em 1915, Carlos


Maximiliano reoficializou o ensino e instituiu o vestibular. Por fim, Rocha Vaz, em 1925,
tornou os vestibulares classificatórios e estabeleceu os currículos do ensino superior
1 (EUGENIO, 2009).

Segundo a historiadora Marta de Carvalho (1989), o novo regime quis gerar no


imaginário popular a imagem de uma república ordeira, progressista. Acreditavam, com
isso, convencer as pessoas de que estaria superado o passado de trevas e o atraso da
monarquia. Nesse sentido, houve um esforço em condecorar os sujeitos que estiveram
ligados à Proclamação da República e o resgate de nomes do passado colonial, como
o de Tiradentes, na tentativa de serem reconhecidos como heróis na ausência destes,
uma vez que, no caso brasileiro, os movimentos que culminaram na Independência
e República não foram gerados em organizações populares, mas expressões de
interesses da própria elite.

Em se tratando da educação, a construção dos edifícios-escola foi estratégica para que


o povo entendesse, concretamente, o novo Estado que se estabelecia.
À visão do luminoso templo laico levantado com recursos que o Império ha-
via destinado à construção de uma catedral, contrapunham-se visões tene-
brosas da escola na velha ordem: “casas sem ar e luz, meninos sem livros,
livros sem método, escolas sem disciplina, mestres tratados como párias”.
No retrato da educação no Império, a falta de recursos “trazia a de estímulos,
o desânimo, e a escola pública era, em geral, a penitenciária do menino, e o
ganha-pão do mestre”. Dessas escolas não se poderia nem obter educação
cívica, nem “preparação para satisfazer as necessidades da vida ou para
desempenhar as funções sociais, que o regime representativo exige”, nem
“preparo da mentalidade infantil para receber as ideias que por ampliação
se lhe deveriam incutir nos anos superiores”. Por isso, resolvido o problema
econômico, o social e o político, o governo republicano ter-se-ia voltado para
o da instrução. (CARVALHO, 1989, p. 25)

A escola mencionada por Carvalho (1989) trata-se de um prédio que, atualmente, abriga
a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo: um edifício monumental, como se
acreditava que a república deveria ser.

Na ocasião de sua criação, com dinheiro Figura 05. Escola Normal de São Paulo da Praça.
que seria usado para construir uma
Fonte: Corrêa, Mello e Neves (1991).

catedral, esse edifício-escola sediou a


ousada Reforma Caetano de Campos,
abrindo as portas para a construção de
grupos escolares por todo o estado de
São Paulo, de modo a se tornar modelar
a política educacional paulista. Essa
Reforma consistiu na criação da Escola
Normal da Praça com a Escola Modelo
anexa, com todo o aparato desejado
pelas discussões pedagógicas que
atravessaram o século XIX. Definitivamente, tornou-se exemplar.

22
IMPORTANTE
Convencionalmente se divide a história republicana do Brasil em fases bem distintas:
1
01. Primeira República ou República Velha (1889-1930): esse período ficou também
conhecido como “república do café-com-leite”, por dois motivos: primeiro, pelo domínio da

Universidade São Francisco


política nacional dos estados de São Paulo, produtor de café, e Minas Gerais, produtor de
leite; segundo, pelas eleições serem fraudadas de modo a vencer o candidato apoiado pelo
governo, quase que uma “brincadeira de criança”, logo, café-com-leite. O primeiro presidente
do Brasil foi Marechal Deodoro da Fonseca, seguido de Floriano Peixoto.

02. Era Vargas (1930-1945): tão logo Getúlio Vargas do Rio Grande do Sul perdeu as elei-
ções para Júlio Prestes, candidato paulista, foi organizado o golpe que impediu a posse de
Prestes, retirou Washington Luiz da cátedra presidencial e empossou Vargas como presiden-
te da república. Foi um período subdividido em três fases: Governo Provisório (1930-1934),
Democrático (1937-1937) e Estado Novo (1937-1945), a primeira ditadura vivenciada pelos
brasileiros após a proclamação da república.

03. Período Democrático (1945-1964): foi uma fase em que, mesmo com a democracia
ameaçada por várias vezes, o Brasil pôde votar em seus candidatos. Foi nessa época que
Vargas voltou à presidência e Juscelino Kubitschek realizou seu plano ousado e construiu a
cidade de Brasília com a finalidade de ser a capital brasileira.

04. Regime Militar (1964-1985): após a renúncia de Jânio Quadros em 1961, João Goulart,
seu vice, assume a presidência. Odiado pelos direitistas e pelas Forças Armadas, Jango,
como era chamado, foi acusado de apresentar interesses comunistas. Seu governo tornou-
-se insustentável em meio à crise econômica deixa por Jânio e, no dia 31 de março, consoli-
dou-se o Golpe Militar. A partir daí, o Brasil contou com uma sequência de cinco generais na
presidência. Passou por momentos de censura, perseguições a intelectuais, exílios, assassi-
natos e torturas de presos políticos.

05. Nova República (1985-atual): no período mais duro da ditadura, por causa das inten-
sas manifestações populares e organizações engajadas na luta pela democracia, o governo
militar se enfraqueceu e o Brasil voltou à democracia por meio das eleições indiretas que ele-
geram Tancredo Neves, que não chegou a tomar posse, tendo sua morte anunciada em 21
de abril de 1985. Sarney, então, assume a presidência. É nesse período, de que estamos fa-
lando até a atualidade, que foi promulgada a Constituição Federal de 1988 e ascenderam os
debates acerca dos direitos civis e políticos que garantem a dignidade do cidadão brasileiro.

No entanto, três décadas se passaram e os grupos escolares e escolas normais criadas


pelo estado de São Paulo não trouxeram as transformações desejadas, muito menos
se ampliarmos nosso olhar para todo o Brasil. Em 1920, após experiências com os
movimentos revolucionários, socialistas e anarquistas que criaram escolas, organizaram
mobilizações grevistas, fundaram sindicatos, Sampaio Dória, secretário da educação
do estado de São Paulo naquela ocasião, resolve reduzir o Ensino Primário para dois
anos. Vale o registro de que, mesmo com esforços de unificação por todo o Brasil, o
ensino primário variava entre três e cinco anos, sendo mais comum ser concluído em

Educação Escolar: Políticas e Organização 23


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

quatro anos. Dória acreditava que, com essa mudança, mais alunos poderiam passar
pelas mesmas escolas sem grandes investimentos. A ideia era escolarizar na tentativa
de o Estado se fazer presente antes que os esquerdistas pudessem atingir a consciência
1 dos pequenos e de seus pais.

Em se tratando de processos de modernização das relações de poder, renovações


institucionais e emergência de novos ideais no âmbito da educação, a década de 1920
é particularmente frutífera. É nela que tivemos a Semana da Arte Moderna, a criação
da Associação Brasileira de Educação, a fundação do Partido Comunista do Brasil e o
nascimento da Escola Nova no Brasil, por meio de intelectuais como Anísio Teixeira e
Lourenço Filho, que defendiam o pensamento do norte-americano John Dewey.

IMPORTANTE
Escola Nova: a expressão escola nova foi usada em momentos diferentes da história. Por
exemplo, quando Lutero propôs um modelo de escola primária, mantida pelas províncias, em
três anos, chamou-a de escola nova, pois considerava antiga a dos gregos e tradicional a dos
mosteiros católicos. Mas, no sentido em que estamos tratando nesse texto, referimo-nos ao
movimento que se gerou em torno das ideias e produção de John Dewey. Numa perspectiva
da escola útil e pragmática, pensava-se no desenvolvimento pleno do educando. Pedagogi-
camente, o aluno se tornava central no processo de ensino e aprendizagem e o professor o
mediador do conhecimento a ser sistematizado. Nesse movimento, os interesses dos alunos
devem ser levados em conta na determinação do conteúdo a ser trabalhado. O aprender
fazendo, fruto de uma concepção de escola ativa, está presente. Além de Dewey, outros
nomes, como Decroly, Montessori e Cousinet compõem o quadro de intelectuais dessa ten-
dência pedagógica chamada por Luckesi (1994) de Tendência Pedagógica Liberal Progres-
sivista. A Escola Nova, no Brasil, representou mais do que uma reforma nos limites pedagó-
gicos, mas, sobretudo, uma reforma de sociedade. Introdução ao Estudo da Escola Nova, de
Lourenço Filho, e Em marcha para a democracia: à margem dos Estados Unidos, de Anísio
Teixeira, são referências da perspectiva escolanovista no país.

Dentre os intelectuais mencionados acima, temos Lourenço Filho, que foi Secretário
da Educação no Ceará, onde questionou os motivos de o sertanejo não querer ir à
escola e chegou à conclusão de que essa instituição literária e distante da realidade
de nada servia ao trabalhador. A escola deveria estar atenta à realidade do aluno e ser
pragmática, útil, ofertar um conhecimento que pudesse ser aplicado, pois, ao contrário,
invés de fortalecer enfraqueceria o trabalhador. Assim, Lourenço Filho investiu na
formação dos professores em atividade e na criação de escolas normais.

Anísio Teixeira, por sua vez, foi Secretário da Educação no estado da Bahia. Foi o
primeiro a demonstrar que as escolas poderiam ser organizadas em ciclos e não séries,
uma vez que os alunos poderiam estar mais avançados nos estudos de linguagem e
menos em matemática. Nesse sentido, o currículo escolar deveria ser revisto de modo
a se tornar mais dinâmico. Ainda, foi Anísio Teixeira quem criou a Universidade Federal
do Rio de Janeiro, em 1935, incorporando a Escola de Educação para formação de
professores em nível superior. Na mesma direção, tivemos Fernando de Azevedo
lançando no Rio de Janeiro, no final da década de 1920, os ideais escolanovistas.

24
Esses três representantes do escolanovismo no Brasil, além de participarem ativamente
da política brasileira, foram signatários, com Carneiro Leão, Sampaio Dória, Cecília
Meirelles e outros tantos intelectuais, somando 26, do Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova, lançado a público no ano de 1932. Trata-se de uma defesa da escola 1
pública, claramente mantida pelo Estado e notadamente gratuita, mista e laica. Em suma,

Universidade São Francisco


foi um manifesto em favor dos ideais republicanos fundamentado no escolanovismo.

Eles defendiam, basicamente, que a educação pública deveria se estender a toda


população e, para que isso fosse realmente possível, ela deveria ser gratuita, a fim
de garantir o acesso e permanência das crianças de comunidades mais fragilizadas.
No contexto do lançamento do Manifesto, defendiam a escola mista, pois separavam
então meninos e meninas e ofereciam menos chance de continuidade dos estudos aos
garotos ao introduzir trabalhos domésticos no currículo das garotas. Ao lado, temos
uma fotografia de uma turma masculina.

Além do mais, a defesa pela escola laica, Figura 06. Modelo de sala de aula nos
não ateia, se deu por conta dos princípios Grupos Escolares.
da laicidade do Estado, que se separou

Fonte: 123RF.
da Igreja na ocasião da promulgação
da Constituição Federal de 1891, a
primeira do Brasil republicano. A questão
da laicidade transcendia a perspectiva
religiosa que, em si mesma, já feria a
constituição federal, de modo a criar
uma pauta de debates entre privatistas
e publicistas. Enquanto os primeiros
defendiam uma liberdade de ensino,
cujos apologistas eram pessoas ligadas à
Igreja Católica, de outro lado estavam os
escolanovistas, defensores da escola pública.

Adentrando a Era Vargas, fundada no nacionalismo, ideologia que dava base a ditaduras
como o nazismo da Alemanha e fascismo da Itália, o Brasil avançava para uma política
educacional mais abrangente e impactante, atingindo todo território nacional.

Em 1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública – MESP, e Francisco


Campos, que foi secretário da Educação em Minas Gerais, foi quem assumiu a pasta.
Por meio de uma sucessão de decretos, o então Ministro da Educação criou o Conselho
Nacional de Educação, reformou o Ensino Superior, deu um tom profissionalizante
ao ensino secundário, dividindo-o em Fundamental e Complementar – em dois anos
–, criando um grupo para Medicina, outro para Direito e outro para Engenharia,
contemplando biológicas, humanas e exatas. Entre seus decretos, foi criada a Escola
do Comércio e promovido o restabelecimento do ensino religioso nas escolas públicas.

Na política de educação varguista, outro ministro merece destaque: Gustavo


Capanema, que respondeu pelo ministério de 1934 até 1945. Tal longevidade
se justifica pela existência de um projeto de educação que foi construído ao logo
dessa década de atuação. Também por meio de decretos, Capanema intensificou o

Educação Escolar: Políticas e Organização 25


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

projeto profissionalizante já incrementado pelo seu antecessor, criando o secundário


industrial, comercial, agrícola e reformando o normal e o secundário propedêutico ao
ensino superior, implementando o clássico, como preparação às faculdades da área
1 de humanas, e o científico, com ênfase aos estudos de exatas e biológicas. É desse
ministro da educação a responsabilidade pela criação do sistema “s”, iniciado pelo
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI no ano de 1942.

Durante a Era Vargas, tivemos as Constituições Federais de 1934, 1937 e, logo


após sua saída, a de 1946. As autoras Xavier, Ribeiro e Noronha (1994, p. 186-187)
sistematizaram as semelhanças e diferenças entre essas constituições no tocante à
temática da educação:
Tabela 01. Constituições Federais de 1934, 1937 e 1946.

1934 1937 1946

Produzida por uma Assembleia Produzida por tecnoburocratas e Produzida por uma Assembleia Nacional
Nacional Constituinte. imposta a toda a população. Constituinte eleita em eleições gerais.

De tendência antidemocratizante, uma De tendência democratizante, uma


De tendência democratizante, uma
vez que: vez que:
vez que:
`  Desobriga o Estado (em nível `  Afirma a obrigação do Estado
`  Afirma a obrigação do Estado
federal, estadual e municipal) da (em nível federal, estadual e
(em nível federal, estadual e
manutenção e expansão do en- municipal) na manutenção e na
municipal) na manutenção e na
sino público; expansão do ensino público;
expansão do ensino público;
`  Institucionaliza o ensino público `  Afirma a gratuidade do ensino
`  Afirma gratuidade do ensino
pago (quem pudesse deveria primário e a gratuidade dos
primário e tendência à
pagar uma taxa desde o ensino demais graus dependendo da
gratuidade dos demais graus
primário que, em princípio, na lei prova de falta ou insuficiência
de ensino.
era gratuito). de recursos.

Determina percentuais mínimos Determina percentuais mínimos


dos impostos a serem aplicados em dos impostos a serem aplicados em
Nada afirma sobre percentuais
Educação: nunca menos de 20% Educação: nunca menos de 10% pelo
mínimos dos impostos a serem
pelo governo federal, de 20% pelos governo federal, 20% pelos governos
aplicados em Educação.
governos estaduais e de 10% pelos estaduais e 20% pelos governos
governos municipais. municipais.

Determina concursos públicos para o Nada afirma sobre concursos Afirma sobre os concursos públicos
magistério. públicos. para o magistério.

Atribui à União competência para


Atribui à União competência privativa Nada afirma sobre a competência legislar sobre as diretrizes da
para traçar diretrizes da Educação da União para traçar as diretrizes da Educação Nacional.
nacional. Educação nacional.
Coloca a responsabilidade das
Não afirma nada sobre a cooperação Estabelece o regime de cooperação empresas quanto à educação de
entre indústria e Estado quanto ao entre a indústria e o Estado quanto ao seus empregados e dos filhos dos
ensino profissionalizante. ensino profissionalizante. empregados, caso estes sejam em
número superior a cem.

Fonte: Xavier, Ribeiro e Noronha (1994. p. 186-187).

26
No período democrático que se segue após a deposição de Vargas em 2 outubro de
1945, as políticas educacionais são balizadas pela Constituição Federal de 1946.
Definitivamente, a educação passou a ser tratada como assunto nacional. Talvez, essa
tenha sido uma das mais importantes conquistas fruto das exigências do Manifesto dos 1
Pioneiros de 1932 que foi contemplada pela Constituição Federal de 1934.

Universidade São Francisco


Após três décadas da criação do MESP, o Brasil teve a sua primeira Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional – LDB, a Lei 4024/61, promulgada no dia 20 de dezembro
de 1961. No entanto, uma lei que abrangesse, novamente, todo o sistema de educação
foi acontecer somente por meio da Lei 9394/96, a atual LDB, também promulgada no dia
20 de dezembro do ano de 1996. Entre essas duas, houve a promulgação da Reforma
Universitária, a Lei 5540/68 e a Lei 5692/71, promulgada no dia 11 de agosto de 1971,
ambas durante o regime militar. Para alguns autores, a Lei 5692/71 é considerada como
LDB; a segunda, para outros, no entanto, não é contada como LDB, por não abarcar
todo sistema de educação. Por isso que, dependendo das referências em pesquisa,
falam-se de duas ou de três Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Esse tema será tratado com a profundidade merecida na próxima unidade, mais
precisamente no item 2.2 Histórico das leis de diretrizes e bases da educação nacional:
as mudanças desde a primeira LDB, no. 4024/61, até a terceira, no. 9394/96.

Com a entrada do Brasil na Nova República, novamente em ares democráticos, as


políticas públicas de educação e demais áreas são ressignificadas, de modo a frear a
perspectiva profissionalizante intrínseca às políticas varguistas e do regime militar. No
entanto, não se poderia construir uma Nova República fundada na Constituição Federal
de 1967, letra da mentalidade da ditadura militar. Sendo assim, em 10 de fevereiro
de 1987 é empossada a Assembleia Constituinte, por meio de eleições diretas que
ocorreram em 1986, com a incumbência de escrever a Constituição Federal de 1988,
vigente até a atualidade.

Vamos, agora, conversar sobre esse dispositivo legal, a Carta Magna do país.

1.1 A EDUCAÇÃO BRASILEIRA E O QUE DIZ A LEI: A CONSTITUIÇÃO


DE 1988, EM ESPECIAL O ART. 205
Como sabemos, a Constituição Federal de 1988 foi escrita em meio a debates de uma
Assembleia Constituinte formada por eleições gerais. Carta Magna marcante da Nova
República, é a partir dela, dos seus 245 artigos e 70 disposições transitórias, que serão
revistos os direitos e deveres dos cidadãos.

As pesquisadoras Vieira e Farias (2011, p. 178) a caracterizam da seguinte forma:


Dentre as medidas inscritas na nova Lei, cabe assinalar: a definição dos
direitos individuais e coletivos; a independência entre os três poderes (Exe-
cutivo, Legislativo e Judiciário); a restrição das Forças Armadas à garantia
dos poderes constitucionais; a substituição do decreto-lei, usado no regime
militar pela medida provisória, cuja validade é perdida se não for aprovada
pelo Congresso num prazo de 30 dias e, o voto facultativo para jovens a
partir de 16 anos.

Educação Escolar: Políticas e Organização 27


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

Obviamente, por conta do clima de euforia em que foi confeccionada a Constituição


Cidadã, como foi conhecida, muitos de seus dispositivos passariam por revisões,
mesmo que não estruturais a ponto de descaracterizá-la por completo, mas atenderiam
1 a interesses partidários majoritários em diferentes momentos da história recente do
país, justificados pelas mudanças globais, mercadológicas, e a educação não escaparia
dessas transformações que marcaram a transição dos séculos XX para o XXI.

No entanto, dentro de certos limites legais e conceituais, que trataremos com maior
propriedade nas unidades 2 e 4, respectivamente, o Artigo 205 ainda se mantém como
o aquele que garante a educação como direito de todos e determina suas finalidades.
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida
e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvol-
vimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifi-
cação para o trabalho. (BRASIL, 1988).

De forma ampla, a Carta Magna trata a educação nesse artigo não diferenciando
Ensino Fundamental e Médio na tarefa de preparar para o exercício da cidadania. Vale
o registro de que, na ocasião da promulgação da Constituição Federal, a Educação
Básica ainda era o 1º grau, o Ensino Fundamental, ou seja, do 1º ao 8º ano na época,
até o 9º ano atualmente.

No artigo 6º, a educação é classificada como direito social, juntamente com a saúde,
o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, além da proteção à maternidade
e à infância e, também, a assistência aos desamparados.

A questão da “preparação para a cidadania” é um tema que estará presente em todos os


documentos da área da Educação, uma vez que, num Estado Democrático de Direito,
como passou a ser a República Federativa do Brasil após o fim da Ditadura Militar, o
exercício da cidadania é entendido como direito fundamental e deve ser preservado e
estimulado a começar pela garantia de acesso e permanência na escola.

O conceito de cidadania possui uma dimensão filosófica e sociológica de modo que


não se reduz ao voto, mas não se traduz sem ele. O voto direto, universal, é elemento
indispensável para que os sujeitos “X” ou “Y” sejam considerados cidadãos. A liberdade
de expressão, opinião e posição assumida publicamente, em se tratando de quaisquer
temas, de ordem pessoal e/ou privada, como assumir-se homossexual, ou quando
se trata de preferências religiosas, político-partidárias ou ideológicas, também são
condições inerentes à concepção de cidadania. Vale a reflexão de que as liberdades a
que nos referimos não incluem aquelas que possam ferir ou limitar a liberdade de outros
grupos ou pessoas e, ainda, manifestar-se de forma inconstitucional. Por exemplo, faz
parte da cidadania ser ateu ou membro do candomblé, ser do Partido Político “X” ou
“Y”, inclusive é ético que se garanta a liberdade e se cultive a virtude da tolerância. Não
é exercício de cidadania difundir a homofobia, ideologia neonazista, preconceitos etc.

Não seria possível, olhando as largas dimensões da cidadania, que a escola reservasse
apenas o Ensino Fundamental ou o Médio, de forma excludente, para tratar da vida em
sociedade, do impacto e extensão de nossas ações, além, é claro, da responsabilidade
pelas nossas escolhas.

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Tratar sobre a questão da cidadania implica o investimento em políticas sociais. Não
há cidadania na miséria, na falta de documentos, de acesso à saúde e à educação.
O combate à pobreza e à extrema desigualdade social e extensão das condições de
acesso e permanência na escola são obrigações do Estado, que se coloca à frente da 1
família na ordem apresentada pelo artigo 205, afinal, a educação é imprescindível para

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que haja o “pleno desenvolvimento da pessoa”.

Em se tratando da questão do trabalho, o mundo do trabalho, a Constituição Federal


oferece uma visão mais ampla. Preparar para o trabalho é diferente de formar mão-
de--obra ou, ainda, ser função da escola reduzir-se, no Ensino Médio, ao ensino
profissionalizante. O Ensino Médio é “médio” por se localizar entre o Fundamental e
o Superior, o que implica muito mais a continuidade dos estudos do que a imediata
entrada no mercado de trabalho.

É papel da educação desenvolver competências e habilidades que possibilitem o


aluno a aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a ser e aprender conviver, de
acordo com os quatro pilares da educação apontados pela UNESCO. A Constituição
Federal não inviabiliza ou exclui o ensino profissionalizante, mas entende que, na
ordem das prioridades, o trabalho aparece em terceiro lugar, antecedido pelo
desenvolvimento pleno da pessoa e a preparação para o exercício da cidadania. No
entanto, entende, também, que seria contraditório não colocar a preparação para o
trabalho, uma vez que faz parte da condição cidadã trabalhar, estar inserido de forma
dinâmica e criativa no mundo do trabalho.

Por fim, as políticas educacionais implementadas com base na Constituição Federal dão
liberdade para a iniciativa privada sem eximir o Estado de sua obrigação em promover o
desenvolvimento e a manutenção da educação no Brasil.

SAIBA MAIS
Quer saber um pouco mais sobre as implicações do Art. 205 da Constituição Federal de 1988?
Assista ao vídeo a seguir, no qual o autor oferece uma visão oriunda da ambiência jurídica:

CF88 - Art. 205 (Da Educação). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tZinpiM-


T_1g. Acesso em: 9 out. 2020.

CONCLUSÃO
Nesta unidade, você viu um panorama histórico da formação e das transformações das
políticas educacionais implementadas pelo Estado Brasileiro em seu período colonial, em
atenção às imposições da Metrópole, a Coroa portuguesa, com uma viagem cuidadosa
no tempo, desde a chegada dos portugueses em nossas terras até a Constituição de
1988, na Nova República.

Educação Escolar: Políticas e Organização 29


Política, Estado e Educação no Brasil: análise histórica

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