Você está na página 1de 3

RESENHA CRITICA DA INTRODUÇÃO “APRESENTAÇÃO DO PROBLEMA” DO

LIVRO “A CULTURA POPULAR NA IDADE MÉDIA E NO RENASCIMENTO: O


CONTEXTO DE FRANÇOIS RABELAIS”.
Aluna: Mariane de Souza Cunha

Mikhail Bakhtin foi um filósofo, pensador russo e estudioso da linguística,


desenvolveu inúmeras teorias sobre a linguagem e é uma referência nesta área de
estudo. Bakhtin começa a introdução do livro “A Cultura Popular na Idade Média e
no Renascimento: o contexto de François Rabelais” evidenciando a importância
histórica do pensador Rabelais e a sua influência na literatura francesa e mundial.
Na introdução chamada “Apresentação do problema” é proposto esmiuçar o cômico
popular da Idade média, sua natureza e suas características a partir da concepção
de François Rabelais. O autor coloca que o verdadeiro caráter da antiga cultura
cômica popular ainda é permeado de questões nebulosas e expõe:

[...] sua amplitude e importância na Idade Média e no Renascimento eram


consideráveis. O mundo infinito das formas e manifestações do riso opunha-
se à cultura oficial, ao tom sério, religioso e feudal da época. Dentro da sua
diversidade, essas formas [...] possuem uma unidade de estilo e constituem
partes e parcelas da cultura cômica popular, principalmente da cultura
carnavalesca uma e indivisível.

Bakhtin elenca a divisão as manifestações da cultura popular medieval em


três categorias: “As formas dos ritos e dos espetáculos, [...] Obras cômicas verbais;
[...] diversas formas e gêneros do vocabulário familiar [...]”; é colocado ainda, que os
festejos e os ritos de natureza cômica estavam em disparidade com a natureza dos
princípios da Igreja e do Estado criando assim uma espécie de dualidade nas
manifestações culturais.
O autor analisa o carnaval como sendo uma manifestação cultural liberta dos
dogmas religiosos da época. Cita a festividade como um grande jogo de caráter
concreto e por isso transpõe os limites entre a vida e a arte.
Embora seja necessário entender que se trata de uma manifestação
distinta do que é conhecido como carnaval na contemporaneidade, por uma questão
de distanciamento histórico, é possível identificar alguns elementos citados por
Bakhtin desta manifestação ancestral nas festividades atuais. O seu caráter
universal, os elementos teatrais que não compõe necessariamente um espetáculo
estritamente teatral uma vez que o indivíduo não deixa o seu “eu” durante a
festividade.
Bakthin explica que para Rabelais o cômico era o concreto, aquilo que
permitia ao homem se desvencilhar dos ideários e distanciamentos exigidos pela
estruturação social e entrar com contato com sua verdadeira natureza e com o seu
semelhante numa situação de real equivalência, ainda que provisória.
O autor evidencia que as obras verbais da linguagem cômica, foram
influenciadas pelos princípios carnavalescos, para ele: “a literatura cômica medieval
[...] permanece [...] a expressão da concepção do mundo popular e carnavalesca, e
emprega, portanto, a linguagem das suas formas e símbolos”.
Acerca da terceira categoria da cultura cômica medieval “diversas formas e
gêneros do vocabulário familiar e grosseiro” o autor enuncia que a partir das
festividades de caráter popular, surge a noção de informalidade. Ele explica que a
partir do contato familiar entre indivíduos passaram a surgir elementos de
comunicação que expressam a informalidade de um cotidiano.
“Alguns ritos antigos incorporaram-se à vida pratica moderna por intermédio
do carnaval, mas perderam quase completamente a significação que nele
tinham. [...] a linguagem familiar converteu-se [...] em um reservatório onde
se acumularam as expressões verbais proibidas e eliminadas da
comunicação oficial.” (BAKHTIN).

Ao ponderar o processo de formação destas três formas da cultura cômica


medieval e suas estruturas e elementos, o autor traz o surgimento de uma
concepção estética que ele chama de Realismo Grotesco.
Para ele Rabelais trata do Grotesco como uma estética que detinha o
principio da universalidade, “O corpo e a vida corporal adquirem simultaneamente
um caráter cósmico e universal” possuía do carnaval a natureza alegre “a
abundancia e a universalidade determinam por sua vez o caráter alegre e festivo
(não cotidiano) das imagens referentes à vida material e corporal” e se caracterizava
primordialmente pelo rebaixamento: “O traço marcante do realismo grotesco é o
rebaixamento, isto é, a transferência ao plano material e corporal, o da terra, o do
corpo na sua indissolúvel unidade de tudo que é revelado espiritual, ideal e
abstrato”.
Bakhtin adentra então na definição de Rabelais do que de fato seria o
Realismo Grotesco a partir dos moldes medievais, uma vez que para ele, se perdeu
muito da sua concepção. Não há que se negar que a ideia de grotesco foi afetada
pelos ideais cristãos de céu e inferno, demoníaco e celeste, falta um olhar para a
real construção da cultura cômica e suas raízes pagãs desvencilhadas de qualquer
pensamento religioso.
“Para compreender a profundidade, as múltiplas significações e a força dos
diversos temas grotescos, é preciso fazê-lo do ponto de vista da unidade da
cultura popular e da visão carnavalesca do mundo; fora desses elementos,
os temas grotescos tornam-se unilaterais, débeis e anódinos”. (BAKHTIN)

O autor segue enumerando a influencia do grotesco nas manifestações


culturais posteriores, como o realismo renascentista, realismo burguês, dentre
outras.
A verdadeira natureza do grotesco está no popular. Nesta introdução, o
autor é cirúrgico ao definir a problemática quanto à noção do que seria o Realismo
Grotesco e destrincha os elementos históricos do seu surgimento e da sua
concepção. Resgata de Rabelais o surgimento do cômico popular, das suas
estéticas e suas influências na cultura e na linguagem da sociedade medieval e
evidencia sua influência nas manifestações culturais posteriores.

Você também pode gostar