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1 - INTRODUÇÃO
Primeiramente, imperioso destacar que o Acordo de Persecução Penal (ANPP) trata-
se de uma modalidade extrajudicial de resolução consensual de conflitos, na área criminal.
Ou seja, é um acordo entre o Ministério Público e o acusado, ainda na fase pré-processual,
que possibilita o não oferecimento da denúncia e, consequentemente, a não abertura da ação
penal, caso sejam cumpridos requisitos que serão discutidos em outro tópico.
O presente trabalho tem por objetivo a análise dos aspectos controversos do
instituto do Acordo de Não Persecução Penal, previsto no artigo 28-A do Código de
Processo Penal brasileiro, com redação dada pela Lei Federal nº 13.9642, de 24 de
dezembro de 2019, chamada de “Pacote Anticrime”.
Através de ampla pesquisa jurisprudencial perante o Supremo Tribunal Federal
e demais tribunais brasileiros. Serão identificados o entendimento majoritário e as de-
cisões divergentes dos tribunais superiores, bem como a decisão paradigma, as teses
e argumentos que foram discutidos e a aplicação da decisão nos demais tribunais.
Em seguida serão demonstrados os diferentes entendimentos doutrinários e as
possíveis correntes de pensamentos - baseados em obras de grandes autores -, bem
como será feita a análise da legislação aplicável ao caso em estudo, à luz do ordena-
mento jurídico pátrio.
1Graduado em Direito pela PUC Minas. Pós Graduando em Direito Processual pela PUC Minas Virtual.
Advogado no escritório Humberto & Francisco Advogados e Consultores.
E-mail: carlos.eduardo@humbertoefrancisco.adv.br
Por fim, serão apresentadas a análise crítica e a conclusão do que foi demons-
trado ao longo do desenvolvimento do trabalho, permitindo ao leitor identificar o posi-
cionamento do autor em relação ao Acordo de Não Persecução Penal.
Art. 18. Não sendo o caso de arquivamento, o Ministério Público poderá pro-
por ao investigado acordo de não persecução penal quando, cominada pena
mínima inferior a 4 (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou
grave ameaça a pessoa, o investigado tiver confessado formal e circunstan-
ciadamente a sua prática, mediante as seguintes condições, ajustadas cumu-
lativa ou alternativamente:
I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo impossibilidade de fazê-
lo;
II – renunciar voluntariamente a bens e direitos, indicados pelo Ministério Pú-
blico como instrumentos, produto ou proveito do crime;
III – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período cor-
respondente à pena mínima cominada ao delito, diminuída de um a dois ter-
ços, em local a ser indicado pelo Ministério Público
IV – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do
Código Penal, a entidade pública ou de interesse social a ser indicada pelo
Ministério Público, devendo a prestação ser destinada preferencialmente
àquelas entidades que tenham como função proteger bens jurídicos iguais ou
semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito;
V – cumprir outra condição estipulada pelo Ministério Público, desde que pro-
porcional e compatível com a infração penal aparentemente praticada.
§ 1º Não se admitirá a proposta nos casos em que:
I – for cabível a transação penal, nos termos da lei;
II – o dano causado for superior a vinte salários mínimos ou a parâmetro eco-
nômico diverso definido pelo respectivo órgão de revisão, nos termos da re-
gulamentação local;
III – o investigado incorra em alguma das hipóteses previstas no art. 76, § 2º,
da Lei nº 9.099/95;
3 BRASIL. Conselho Nacional do Ministério Público. Resolução n. 181 de 7 ago. 2017. Dispõe sobre
instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal a cargo do Ministério Público.
Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas-busca/norma/5277 Acesso em: 01 jan.
2022.
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Com uma breve leitura do artigo alhures, surge a primeira discussão: é da com-
petência do CNMP editar normas de conteúdo penal e processual penal? A resolução
181 do CNMP é formal e materialmente constitucional?
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4BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Processo Penal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5790,
Brasília, 06 de outubro de 2017. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?inci-
dente=5283027 Acesso em: 01 jan. 2022.
5BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Processo Penal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5793,
Brasília, 13 de outubro de 2017. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?inci-
dente=5288159 Acesso em: 01 jan. 2022.
6 “Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade. nos lermos seguintes: (...)
II - ninguém será obrigado afazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei:"
7 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do
trabalho;
3 – DA DECISÃO PARADIGMA
O Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 191.464/ SC, evidencia-se como
sendo a Decisão Paradigma, da qual foi dado um norte, uma direção a seguir pelos
tribunais estaduais e federais, no tocante à retroatividade da aplicação do artigo 28-
A do CPP, a partir da sua vigência em 24 de dezembro de 2019. A questão era sa-
ber em qual momento o ANPP poderia ser aplicado aos processos iniciados antes
da entrada em vigor da Lei 13.964/2019.
Resumindo o caso que deu origem ao HC 191.464 AGR/ SC, o réu foi conde-
nado em 1ª instância, pela prática dos crimes do art. 1°, I e II, c/c o art. 12, I, da Lei
8.137/9010, à pena de reclusão por 4 anos, 5 meses e 10 dias. Em sede de apela-
ção, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina confirmou a sentença condenatória. Ir-
resignado, o réu interpôs recurso especial ao STJ, o qual foi inadmitido na origem.
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STF. Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 191.464/ SC. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/pa-
ginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754484857 Acesso em: 01 jan. 2022.
10 Lei 8.137/90. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo,
e dá outras providências.
Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e
qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer
natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
Art. 12. São circunstâncias que podem agravar de 1/3 (um terço) até a metade as penas previstas nos
arts. 1°, 2° e 4° a 7°:
I - ocasionar grave dano à coletividade;
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Sendo assim, foi interposto Habeas Corpus perante ao STF contra a decisão
do Ministro Roberto Barroso, que negou seguimento ao HC, com base no art. 21,
§1º, do RI/STF, que versa sobre as regras que o relator deve seguir para negar se-
guimento aos HC’s sob seu julgamento.
Ao ter seu Habeas Corpus negado, o réu interpôs o referido Agravo Regimen-
tal. Extrai-se do relatório dos autos do HC 191464 AGR / SC:
“a parte agravante aduz que a decisão impugnada não está alinhada com o
entendimento mais recente do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tri-
bunal de Justiça (STJ). Nesse sentido, alega que a Sexta Turma do STJ en-
tende que “a norma em discussão é de natureza mista e mais benéfica ao réu
e deve retroagir em seu benefício em processos não transitados em julgado”.
Sustenta que o HC 191.464, Rel. Min. Gilmar Mendes, que trata da mesma
matéria, foi remetido para deliberação do Plenário, o que torna “justo que o
processamento da ação penal na origem seja suspenso”. Com essas consi-
derações, a defesa requer a nulidade da decisão proferida pelo STJ e a “sus-
pensão do processamento da Ação Penal n. 0008918-31.2012.8.24.0033 até
o julgamento final do HC 185.913/DF pelo Plenário desse Supremo Tribunal
Federal”.
11MPF. 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal. Enunciado 98. Disponí-
vel em: http://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr2/enunciados Acesso em: 4 de jan. 2022.
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que não recebida a denúncia”, para solucionar e pacificar decisões tão conflitantes,
como as citadas da 8ª Turma do TRF4. Basta mudar a referência, ou seja, o Desem-
bargador, que a linha de raciocínio jurídico e a aplicação da mesma norma são dife-
rentes.
Entretanto, como estamos no Brasil, país no qual reina a insegurança jurídica,
em setembro de 2021, no julgamento do HC 185.913/DF15, o Ministro Gilmar Mendes
decidiu pelo cabimento do ANPP em casos em que o processo está em andamento,
mas ainda não transitados em julgado, mesmo se ausente confissão do réu até aquele
momento.
No caso em tela, o réu foi condenado a 1 ano, 11 meses e 10 dias, com base
no art. 33 da Lei de Drogas, após ser preso pelo porte de 26 gramas de maconha,
tendo a pena de reclusão convertida em restritiva de direitos.
O decano propôs tese divergente da decisão paradigma elencada no presente
artigo. A título de comparação, vejamos uma ao lado da outra:
Decisão Paradigma – Tese fixada pela 1ª Decisão Monocrática – Tese proposta pelo
Turma do STF. HC 191.464 AGR/ SC Min. Gilmar Mendes. HC 185.913/DF
“O acordo de não persecução penal (ANPP) “É cabível o acordo de não persecução penal em
aplica-se a fatos ocorridos antes da Lei nº casos de processos em andamento (ainda não
13.964/2019, desde que não recebida a transitados em julgado) quando da entrada em
denúncia.” vigência da Lei 13.964/2019, mesmo se ausente
confissão do réu até aquele momento. Ao órgão
acusatório cabe manifestar-se motivadamente
sobre a viabilidade de proposta, conforme os re-
quisitos previstos na legislação, passível de con-
trole, nos termos do artigo 28-A, § 14, do CPP.”
4 - ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO
Um aspecto absolutamente relevante sobre o ANPP, que gera enorme diver-
gência doutrinária é, se preenchidos os requisitos que o autoriza, se o acordo seria
direito subjetivo do acusado, ou seria discricionariedade do Ministério Público, haja
vista que o legislador foi omisso neste ponto.
Américo Bedê Freire Junior16 defende que o oferecimento do ANPP, preenchi-
dos todos os requisitos que o art. 28-A do CPP exige, é direito subjetivo do acusado.
Da mesma forma entende Aury Lopes Junior. O renomado autor completa sua tese
discordando do §14, do art. 28-A, do CPP, que prevê a negativa de proposta do acordo
pelo MP. Para ele, a negativa do ANPP e a consequente remessa para revisão no
órgão superior do MP, permite a manutenção da decisão denegatória, ou que outro
membro firme o acordo. Ou seja, pode tomar rumos diversos à homologação do
acordo.
Interessante destacar que o ANPP tem natureza jurídica idêntica à suspensão
condicional do processo, prevista no art. 89 da Lei 9.099/95. Nesse sentido, Aury Lo-
pes Junior afirma que há a obrigatoriedade de o parquet oferecer o acordo:
16JUNIOR, Américo Bedê Freire. O Acordo de Não Persecução Penal: Permissões e Vedações. In:
Acordo de não Persecução Penal, Cunha, Rogério Sanches e outros, 2ª ed. Salvador: ed. JusPodivum,
2019, p. 336.
17 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 17ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 1209.
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Augusto Resende vai além. O autor delineia o ANPP como direito constitucional
de locomoção, uma vez que o acordo é capaz de afastar a pena de prisão, quando
preenchidos os seus requisitos e, por isso, o considera direito subjetivo do acusado:
(...) a esfera normativa do art. 5º, inciso XV, da Carta Constitucional de 1988
abrange o benefício legal do “Acordo de Não Persecução Penal”, na medida
em que se trata de instrumento despenalizador, impeditivo da persecução
penal em juízo e, desse modo, obstante da imposição da pena privativa de
liberdade. O instituto amplia a esfera de proteção da liberdade de locomoção
da pessoa, conferindo-lhe obstáculos ou guard rails ao seu cercamento em
virtude da prática de crime sem violência ou grave ameaça e com pena mí-
nima inferior a quatro anos.19
18 GIACOMOLLI, Nereu José. Juizados Especiais Criminais – Lei 9.099/95. 3ª ed. Porto Alegre: Livra-
ria do Advogado. 2009, p. 192.
19 RESENDE, Augusto César Leite de. Direito (Subjetivo) ao Acordo de Não Persecução Penal e
Controle Judicial: Reflexões à Luz da Teoria dos Direitos Fundamentais. Revista Brasileira de Direito
Processual Penal, Porto Alegre, v. 6, n. 3, p. 1543 – 1582, set.-dez. 2020. P. 1555.
20 Ibidem, P. 1570 – 1571.
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Nota-se que a corrente que considera o Acordo de Não Persecução Penal di-
reito subjetivo do acusado é evidentemente robusta, haja vista que se escora no topo
da pirâmide das leis, no direito constitucional e no direito internacional. Evidente que
para evocar o topo da pirâmide legal, o acusado deve preencher os requisitos exigidos
pela lei ordinária e haver a negativa do parquet quanto à aplicação do acordo.
Contrariamente, existe a corrente que se apoia na ideia de o ANPP tratar-se de
discricionariedade do Ministério Público, ao invés de ser direito subjetivo do acusado.
Os doutrinadores que defendem a referida corrente se baseiam na premissa prevista
no caput do art. 28-A do CPP, após preenchidos os requisitos, qual seja: “o Ministério
Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e su-
ficiente para reprovação e prevenção do crime”.
Nesse sentido, discorre Rogério Sanches:
Notório que o autor, ao defender sua tese, se afasta por completo dos requisitos
e das condições que o a lei exige para o oferecimento do ANPP, bem como da obri-
gatoriedade do parquet em observá-los, o que tornaria o acordo direito subjetivo do
acusado. O autor entende que a discricionariedade está ligada à voluntariedade, e
que do contrário, poderia resultar no acordo determinado de ofício pelo juiz. Assim
dispõe Lima:
Caso fosse o ANPP aceito como direito subjetivo do investigado, o juiz pode-
ria determinar que o direito do investigado fosse assegurado de ofício, reti-
rando a característica essencial de voluntariedade (consenso) entre as partes
e decretando a obrigatoriedade de sua pactuação 22.
21 CUNHA, Rogério Sanches. Pacote Anticrime – Lei 13.964/2019: Comentários às alterações do CP,
CPP e LEP. 2ª Ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2021. P. 140.
22 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal: Volume Único. 8ª Ed. Salvador: Editora Jus-
No mesmo sentido, Rodrigo Cabral afirma que “para que exista acordo, deve
existir concordância entre as partes, de modo que não é possível se falar em acordo
forçado e é precisamente por essa razão que o art. 28-A, caput, CPP, dispõe que: o
Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal.”23
Expostas as duas correntes doutrinárias que discorrem se o ANPP se trata de
direito subjetivo do acusado, ou é discricionariedade do Ministério Público, imperioso
destacar que o Supremo Tribunal Federal defende a corrente na qual o ANPP é dis-
cricionariedade do MP, não podendo o magistrado oferecer o acordo sem a concor-
dância do parquet, não considerando, portanto, como sendo direito subjetivo do acu-
sado.24
23CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do Acordo de Não Persecução Penal. 2ª Ed. Salvador:
Editora Juspodivm, 2021. P. 222.
24STF. Inquérito 3438/ SP. Rel. Min, Rosa Weber. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pa-
ges/search/sjur291674/false Acesso em 6 de fev. de 2022.
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5 - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que propor-
cional e compatível com a infração penal imputada.
Quanto aos crimes que são passíveis de oferecimento do ANPP, os quais de-
vem ter pena mínima cominada inferior a 4 anos, o rol é bastante extenso, alcançando
desde furto até peculato e lavagem de dinheiro. O que interessa realmente é que o
acordo atinge a maior parte da demanda da justiça criminal, permitindo, assim, que as
autoridades policiais se concentrem nos crimes de maior potencial ofensivo.
Imperioso destacar que a constitucionalidade do requisito de confissão do in-
vestigado vem sendo questionada à luz do art. 5º, LXIII da CRFB/88, bem como do
art. 8, 2, g da Convenção Interamericana de Direitos Humanos. Vejamos os dispositi-
vos:
Art. 5º, LXIII, da CRFB/ 88: o preso será informado de seus direitos, entre os
quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família
e de advogado;
Art. 8º, 2, g, da CIDH/ 69: 2 - Toda pessoa acusada de delito tem direito
a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legal-
mente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em
plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
g. direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a de-
clarar-se culpada
Art. 1º, III, da CRFB/ 88: A República Federativa do Brasil, formada pela
união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-
se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;
Art. 5º, XXXV, da CRFB/ 88: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judi-
ciário lesão ou ameaça a direito;
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Art. 5º, XXXIX, da CRFB/ 88: não há crime sem lei anterior que o defina, nem
pena sem prévia cominação legal;
Art. 5º, LIV, da CRFB/ 88: ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal;
Art. 5º, LV, da CRFB/ 88: aos litigantes, em processo judicial ou administra-
tivo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla de-
fesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Art. 5º, LVII, da CRFB/ 88: ninguém será considerado culpado até o trânsito
em julgado de sentença penal condenatória;
Por fim, importante destacar as normas que regulamentam a aplicação das leis
penais e processuais penais no tempo, ainda que sejam motivo de divergência, con-
forme demostrado em alhures:
Art. 5º XL, CRFB/88: a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
Art. 2º, § único, do Código Penal: A lei posterior, que de qualquer modo
favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por
sentença condenatória transitada em julgado;
Art. 2º, do Código de Processo Penal: A lei processual penal aplicar-se-á
desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da
lei anterior.
6 - ANÁLISE CRÍTICA
Diante de todo o exposto, nota-se que o instituto do Acordo de Não Persecução
Penal reveste-se de diversas divergências, tanto jurisprudências quanto doutrinárias.
Vale lembrar que o Brasil, há muito tempo, vive os problemas causados pela insegu-
rança jurídica, refletindo diretamente no tema pesquisado no presente artigo.
Pois bem, do ponto de vista jurisprudencial, a tese firmada pela 1ª Turma do
STF, quando do julgamento do Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 191.464/ SC
(decisão paradigma), com o entendimento de que “O acordo de não persecução penal
(ANPP) aplica-se a fatos ocorridos antes da Lei nº 13.964/2019, desde que não rece-
bida a denúncia”, mostra-se a mais adequada. Haja vista que o acordo se trata de
modalidade pré-processual de resolução consensual de conflito criminal e, portanto,
deve ser oferecido apenas nos casos em que ainda não foi oferecida a denúncia.
Nesse sentido, a tese proposta pelo Ministro Gilmar Mendes, no julgamento do
HC 185.913/DF é completamente desprovida de lógica jurídica, pois, se o ANPP é um
acordo pré-processual, não há que se falar na aplicação do acordo aos processos em
andamento.
Quanto à análise da doutrina, a corrente que considera que o ANPP é direito
subjetivo do acusado mostra-se mais assertiva, pois, entende-se que se forem cum-
pridos os requisitos que o art. 28-A, do CPP exige, o MP fica obrigado a oferecer o
acordo, sendo certo que não se trata de discricionariedade do parquet.
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7- CONCLUSÃO
O presente trabalho procurou esmiuçar boa parte das discussões acerca do
Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), sem a pretensão de esgotá-las, haja vista
as restrições que um artigo científico contem.
Ao longo da pesquisa, foi apresentada a origem do ANPP, criado pela Resolu-
ção 181/2017 do CNMP, alterada pela Resolução 183/2018 da mesma instituição e,
por fim, foi inserido no Código de Processo Penal – art. 28-A -, através da Lei
13.964/2019, o famoso e polêmico Pacote Anticrime.
Estudamos as decisões do Supremo Tribunal Federal na aplicação do ANPP,
e vimos que há divergência quanto a retroatividade do acordo. Como vimos, a 1ª
Turma fixou a tese (decisão paradigma) na qual ficou entendido que, cabe o ofereci-
mento do acordo, desde que a denúncia na fosse ainda oferecida. Na contramão deste
entendimento, o Ministro Gilmar Mendes propôs a tese, da qual discordamos, que o
ANPP é cabível também nos processos já em andamento.
No estudo da doutrina, foram elencadas as correntes de pensamento mais uti-
lizadas na interpretação do tema estudado. De um lado, os doutrinadores que defen-
dem ser o ANPP direito subjetivo do investigado. Fazemos coro para essa linha de
interpretação. Do outro lado, os que entendem que o acordo em questão é uma dis-
cricionariedade do Ministério Público. Vale lembrar que ambas as correntes são de-
fendidas por juristas tem alto quilate.
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REFERÊNCIAS
STF. Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 191.464/ SC. Disponível em: https://re-
dir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754484857 Acesso em:
01 jan. 2022.
LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 17ª ed. São Paulo: Saraiva Educação,
2020.
RESENDE, Augusto César Leite de. Direito (Subjetivo) ao Acordo de Não Persecu-
ção Penal e Controle Judicial: Reflexões à Luz da Teoria dos Direitos Fundamentais.
Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, v. 6, n. 3, p. 1543 –
1582, set.-dez. 2020.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal: Volume Único. 8ª Ed. Salva-
dor: Editora Juspodivm, 2020.
STF. Inquérito 3438/ SP. Rel. Min, Rosa Weber. Disponível em: https://jurispruden-
cia.stf.jus.br/pages/search/sjur291674/false