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Capítulo IV

Argumentação e retórica
Índice
 Capítulo IV – Argumentação e retórica

I – o que é a retórica

 A retórica segundo Aristóteles


 Técnicas de persuasão: Como persuadir?
 O logos
 O pathos
 O ethos
O que é a retórica?
A retórica surgiu na antiga Grécia, ligada à
democracia e em particular à necessidade de
preparar os cidadãos para uma intervenção activa
no Governo da cidade. “Rector” era a palavra
grega que significava “orador”, o político.

No início esta não passava de um conjunto de


técnicas de bem falar e de persuasão para serem
usadas nas discussões públicas.

A sua criação é atribuída a Coráx e Tísis, V a.C.,


tendo sido desenvolvida pelos sofistas que a
ensinaram como verdadeiros mestres. Entre estes
destacam-se Górgias e Protágoras.
O que é a retórica?
A palavra retórica deriva da palavra rhêtorikê, que
significa «arte da palavra».

• A definição mais comum de retórica afirma que a retórica é


a arte da persuasão, isto é, uma técnica ou um sistema
de regras práticas que possibilitam ao orador obter o
assentimento do auditório pelo discurso. É pois uma forma
de comunicação mas daquela que tem fins persuasivos
“A capacidade de descobrir o que é adequado a cada caso
com o fim de persuadir.”

Aristóteles, Retórica,1355 b
A retórica segundo
Aristóteles
Segundo Aristóteles, a retórica é necessária porque:

a) A verdade e a justiça não devem ser vencidas;

b) Há alguns auditórios que nem a ciência mais exacta


consegue persuadir;

c) É preciso ser capaz de argumentar sobre coisas


contrárias, para dominar o tema e para que, sempre que
alguém argumente contra a justiça, seja possível refutar
os seus argumentos;

d) Devemos ser capazes de nos defender verbalmente.


Técnicas de persuasão:
Como persuadir?
 Para persuadir, o orador pode
recorrer a dois tipos de provas:

Provas não técnicas

Provas técnicas
Técnicas de persuasão:
Como persuadir?

• Provas não técnicas são específicas da


retórica judicial, são aquelas que já existem e
que o orador só tem de usar no seu discurso.

• São provas não técnicas as leis, os


testemunhos, os contratos, as confissões sob
tortura e os juramentos, os documentos
escritos.
Técnicas de persuasão:
Como persuadir? (Manual, p111 e seg)

As provas técnicas são aquelas que podem


ser preparadas pelo orador. Estas são de três
espécies:
As que residem no carácter moral do orador -
ethos
As que se encontram no modo como se dispõe
o auditório - pathos
As que residem no próprio discurso, pelo que
este demonstra ou parece demonstrar - logos
O ethos
O orador persuade por intermédio do
carácter moral, quando é visto pelo auditório
como alguém que inspira confiança. Para isso,
é preciso que o discurso, mesmo na ausência
de provas pelo logos, crie no auditório uma
imagem do orador como pessoa prudente,
virtuosa e benevolente.
Aristóteles
O seu poder persuasivo vem do seu prestígio,
da sua autoridade moral e científica, das
suas virtudes, da sua personalidade, da sua
credibilidade.
Esta imagem tem de ser, segundo Aristóteles, a
consequência do discurso do orador e não de aspectos
anteriores e exteriores a esse discurso.
O ethos
«Persuade-se pelo carácter quando o discurso é proferido
de tal maneira que deixa a impressão de o orador ser
digno de fé. Pois acreditamos mais e bem mais depressa
em pessoas honestas, em todas as coisas em geral, mas
sobretudo nas de que não há conhecimento exacto e que
deixam margem para dúvida. É, porém, necessário que
esta confiança seja resultado do discurso e não de uma
opinião prévia sobre o carácter do orador; pois não se
deve considerar sem importância para a persuasão a
probidade do que fala (…), mas quase se poderia
dizer que o carácter é o principal meio de persuasão.»
Aristóteles, Retórica, 1356a
O ethos – argumento da
autoridade
Tipo de argumento que se apoia no testemunho de pessoas
(pode ser ela própria) ou instituições com conhecimentos
seguros acerca do assunto/problema em questão.
Acontece sempre que alguém justifica uma afirmação
recorrendo à figura de alguém qualificado na matéria,
(cientista, professor, Instituto de Estatística…)

Deve evitar-se ser tendencioso e observar o seguinte:


1. Basear-se me fontes credíveis e imparciais;
2. Comparar as fontes entre si, para evitar as
discordâncias;
3. Citá-las com rigor e precisão.
O pathos
• Para ser persuasivo, o orador deve procurar
suscitar sentimentos e emoções no auditório que
o predisponham de forma favorável para a tese que
defende. São as emoções despertadas nos ouvintes

• Embora Aristóteles critique os que o antecederam no


estudo da retórica por terem dado mais importância a
esta prova e por terem descurado o logos, que, segundo
ele, é a prova retórica por excelência, reconhece a
importância de emoções como a ira, a compaixão e o
medo para a persuasão do auditório.
O pathos
• O pathos depende da capacidade do orador ter
uma relação empática com o auditório

Implica ter uma conhecimento prévio do auditório


a quem se vai dirigir.

O discurso centra-se na sedução do auditório


através das emoções que se possa vir a despertar.
O pathos

“Persuade-se pela disposição dos ouvintes, quando


estes são levados a sentir a emoção por meio do
discurso, pois os juízos que emitimos variam
conforme sentimos tristeza ou alegria, amor ou ódio”

Aristóteles, Retórica, 1356 a


Dispositivos retóricos ligados
ao Pathos
O apelo à popularidade
O apelo à popularidade ou à
maioria é uma forma de
argumento que explora
sentimentos da audiência para
a fazer adoptar o ponto de vista
de quem fala. O "argumento"
dirige-se a um conjunto de
pessoas – "ao povo" – e tira
partido de desejos e emoções
para tornar persuasiva uma ideia
ou uma conclusão.
O apelo à popularidade

Os argumentos ad populum não


são, com propriedade, argumentos,
mas estratagemas para despertar e
manipular as emoções, desejos e
paixões da maioria das pessoas. E,
como se sabe, o apelo aos
sentimentos é, em muitos casos,
o caminho mais eficaz – e curto –
para persuadir um auditório.
O apelo à compaixão
ou à piedade

O apelo à piedade acontece quando alguém argumenta


recorrendo a sentimentos de piedade e de
compreensão por parte da audiência de modo que a
conclusão ou afirmação defendida seja aprovada.
O logos
• É a dimensão da linguagem, é os argumentos que
poder ser mais ou menos convincentes, das figuras de
estilo. É o aspecto racional do discurso
“Persuadimos enfim pelo discurso, quando mostramos a
verdade ou o que parece ser a verdade, a partir do que
é persuasivo em cada caso particular” Aristóteles, Retórica, 1356 a
Para Aristóteles os principais meios de persuasão são:

ENTIMEMA EXEMPLO
O logos - Entimema
O entimema é uma forma de argumento dedutivo que
permite no domínio dos discursos públicos demonstrar ou
provar uma proposição a partir de premissas que são sempre
ou quase sempre prováveis (que se verificam em muitos
casos). Distingue-se dos outros argumentos pelo seguinte:
Ser formado a partir de poucas premissas
(auditório que não está habituado a seguir longas
cadeias de inferências)
Ter premissas que, embora sejam aceites pelo
auditório, são apenas prováveis
Uma ou mais premissas podem ser omitidas embora
aceites pelo auditório
O logos - Entimema
Os entimemas têm origem em probabilidades e
sinais.

A probabilidade é o que geralmente acontece, mas


não o que acontece sempre e, por isso, os
entimemas que têm premissas prováveis têm
também conclusões prováveis. O auditório deve
aceitar que é provável que algo ocorra.
O logos - Sinais
• Os sinais estabelecem uma relação entre dois factos em que, a
partir da existência de um, se estabelece a existência do outro. Se
esta relação é necessária, o sinal chama-se tekmérion (prova,
evidência) e dá origem a um argumento irrefutável; se não é
necessária, a conclusão é apenas provável.
• O auditório deve acreditar que existem e aceitar que indicam a
existência de outra coisa. São exemplos de sinais:

Sócrates ser justo é sinal de que


os sábios são justos
Ter febre é sinal de estar doente
Logos
O exemplo é semelhante à indução do particular para
o particular e pode basear-se em factos passados ou
em factos inventados pelo próprio orador.
Não oferece provas indiscutíveis mas pretende
apresentar casos representativos do que se pretende
afirmar
O objectivo é induzir o auditório que o caso particular
ilustra o princípio geral
Neste último caso, os exemplos podem ser
parábolas ou fábulas.
Logos
Aristóteles
• Aos entimemas e aos exemplos Aristóteles junta ainda
as máximas.
• As máximas são afirmações gerais que podem ser
aceites ou rejeitadas e que se referem a acções. No
entanto, se à máxima se juntar a causa e o porquê, ela
transforma-se num entimema.
Logos - Máximas
Aristóteles considera que as máximas são muito úteis:
 porque, por um lado, os juízes, devido a terem um
espírito rude e serem incultos, sentem-se satisfeitos por
ouvir alguém, falando em geral, ir ao encontro das suas
opiniões pessoais;

 porque, por outro, as máximas conferem ao discurso um


carácter ético, isto é, se forem honestas, farão com que o
carácter do orador pareça honesto.
Logos
Assim, a máxima é uma espécie de entimema truncado,
isto é, uma afirmação cuja justificação é omitida. Por
exemplo:

Não há homem que seja inteiramente feliz.


E isto:
Não há homem que seja livre;
São máximas, mas passam a entimemas, se lhe acrescentarmos:
Porque o homem é escravo da riqueza ou da fortuna.
Aristóteles, Retórica, II, 21
Logos, ethos e
pathos
Existe uma relação estreita entre
o logos, o ethos e o pathos,
uma vez que as emoções (pathos)
que o discurso (logos) do orador
suscita no auditório têm um papel
importante na construção da
imagem que este faz do carácter
(ethos) do orador e, desse modo,
da sua capacidade de persuasão.
Esquema retórico – fases de
construção de um discurso
A retórica pode ser dividida em cinco partes que
correspondem às fases pelas quais passa quem
constrói um discurso argumentativo.
1ª Parte - Invenção
Nesta parte, o orador procura descobrir e conceber os
argumentos mais apropriados à tese que pretende
defender.
Para isso, deve ter em conta o tema que vai abordar, o
género (deliberativo, judicial e epidíctico) a que
este tema pertence e qual, dos três tipos de provas
retóricas (a prova pelo logos, pelo ethos e pelo
pathos), é o mais persuasivo no caso em questão.
Esquema retórico – fases de
construção de um discurso
O discurso deliberativo tem por auditório os membros da
assembleia, a quem procura aconselhar ou dissuadir, mostrando por
meio do exemplo que uma qualquer acção possível futura (uma vez que
só podemos deliberar sobre o que ainda não aconteceu) é conveniente ou
prejudicial. Esta é a forma por excelência do discurso político.

O discurso judicial é o usado pelos oradores nos tribunais. Tem por


auditório os juízes e como intenção acusar ou defender, mostrando
por meio do entimema que uma determinada acção ocorrida no passado
(uma vez que só podemos julgar o que já aconteceu) é justa ou injusta.

O discurso epidíctico tem por auditório os espectadores/público e a


sua intenção é elogiar ou censurar, mostrando por meio da
amplificação de um argumento que alguém, devido às acções que
praticou, é virtuoso ou vicioso, belo ou feio.
Esquema retórico – fases de
construção de um discurso
2ª Parte - Disposição
Nesta parte, o orador determina a forma como os
argumentos devem estar ordenados no discurso, isto
é, elabora o plano do discurso. Ao longo dos tempos
foram propostos diversos planos, mas o mais comum
tinha cinco partes:
1. o exórdio ou proémio,
2. a narração,
3. a confirmação ou prova,
4. a refutação e a
5. peroração ou epílogo
Esquema retórico – fases de
construção de um discurso
• O exórdio é a parte introdutória do discurso e tem por
objectivo principal captar o favor e a atenção do auditório. Para
isso, o orador desculpa-se das suas insuficiências, louva o
talento do adversário e adula o auditório.
• A narração consiste na exposição dos factos e, para ser
eficaz, deve ser clara, breve e credível.
• A confirmação serve para o orador provar a tese que
defende apresentando os argumentos que a sustentam; e a
refutação para destruir os argumentos contrários a essa posição.
(Momento particular do logos, mas também do pathos)
• A peroração ou epílogo é a conclusão do discurso e nela o
orador visa normalmente três objectivos: recapitular a
argumentação, realçar os argumentos principais e comover o
auditório, suscitando piedade ou indignação.
Esquema retórico – fases de
construção de um discurso
3. A elocução

Esta parte da retórica trata da redacção e do estilo do


discurso. A elaboração do discurso centra-se em duas
questões essenciais:

1. a clareza de expressão;

2. ornamento.

O ornamento não tem apenas uma finalidade estética. A


sua finalidade é também fazer do discurso uma arma
eficaz, capaz de vencer no debate.
Esquema retórico – fases de
construção de um discurso

4ª Parte – A acção

A acção designa a pronunciação efectiva do


discurso. Trata-se de um factor essencial da persuasão
retórica, na medida em que a imagem do orador e,
portanto, a sua credibilidade, dependem, além do ethos,
da sua presença física face ao auditório.

Por esta razão, a teoria da acção interessa-se pelos


diferentes elementos da presença física do orador: por
exemplo, a respiração, a colocação e o tom de voz, a
mímica da face, a atitude do corpo e os gestos.

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