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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2022.0000454684

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1016460-55.2020.8.26.0451, da Comarca de Piracicaba, em que são apelantes MRV
ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S.A. e PIAZZA FLORENÇA
INCORPORAÇÕES SPE LTDA, é apelado CICERO FELIZ DA SILVA JUNIOR
(JUSTIÇA GRATUITA).

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 2ª Câmara de Direito Privado


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Por maioria, negaram
provimento ao recurso. Declara voto contrário o 3º juiz, de conformidade com o
voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ CARLOS


FERREIRA ALVES (Presidente sem voto), ALVARO PASSOS, GIFFONI
FERREIRA, HERTHA HELENA DE OLIVEIRA E MARIA SALETE CORRÊA
DIAS.

São Paulo, 13 de junho de 2022.

JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS


Relator(a)
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Voto nº 41.964.
Apelação Cível nº 1016460-55.2020.8.26.0451.
Apelantes/Rés: MRV Eng. e Participações e Parque Piazza Florença
Incorp. SPE Ltda.
Adv.: André Jacques Luciano Uchôa Costa, Leonardo Fialho Pinto.
Apelado/Autor: Cícero Felix da Silva Júnior.
Adv.: Juliana Cesta Benincasa.
Juiz Dr. Lourenço Carmelo Tôrres.
Origem: 3ª Vara Cível do Foro de Piracicaba.

Apelação Cível Indenização Dano moral Decadência


Inocorrência Impossibilidade de aplicação de prazo
decadencial Pretensão condenatória de indenização por
inadimplemento contratual Hipótese que não diz respeito a
exercício de direito potestativo de reclamar pelos vícios
aparentes ou de difícil constatação Aplicabilidade do prazo
prescricional do art. 205, do CC.

Indenização Publicidade enganosa Imóvel que não foi


entregue ao apelado de acordo com o contratado Incidência
do CDC Dever de prestação de informação ao consumidor
que não restou observado Precedentes.

Dano moral Reconhecimento da ocorrência de dano moral


“in re ipsa” Incontroversa entrega de imóvel em
desconformidade com o projeto apresentado ao comprador
Desnecessidade da prova inconteste de angústia ou humilhação
sofridas pelo ofendido.

Dano moral Redução descabida Apuração que deve


observar os critérios de proporcionalidade e razoabilidade,
atendidas as condições do ofensor, do ofendido, e do bem
jurídico lesado, bem como a extensão e a gravidade do dano
Montante arbitrado que não se afigura exagerado Sentença
mantida Recurso improvido.

Sucumbência Recursal Honorários advocatícios Majoração


do percentual arbitrado Observância do artigo 85, §§ 2º e 11,
do CPC.

Cuida-se de recurso de apelação interposto contra a


r. sentença de fls. 624/626 que assim deliberou:
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“Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a ação,


a fim de condenar as rés, solidariamente, no pagamento de indenização por
danos morais ao autor, no importe de R$ 8.000,00, valor este que deverá
ser corrigido a partir deste pronunciamento pela tabela prática do E. TJSP e
com juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação. Não é demais lembrar
o disposto na Súmula 326/STJ: “na ação de indenização por dano moral, a
condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica
sucumbência recíproca”. Condeno as rés, ainda, no pagamento das
custas, despesas processuais e honorários advocatícios, ora fixados em
10% do valor da condenação, atualizados desde esta data pelos índices
da tabela prática do E. TJSP e com juros moratórios legais de 1% ao mês
a contar do trânsito em julgado desta sentença. P.I.”.

Inconformadas, apelam as rés às fls. 628/646.

Alegam, em apertada síntese, que caracterizada a


decadência do direito do autor em relação ao reclamo de vícios aparentes,
porquanto decorridos mais de 90 dias, nos termos do disposto no art. 26, inciso
II do Código de Defesa do Consumidor. No que tange ao mérito, sustentam
que o imóvel, antes de ser entregue, foi submetido à vistoria pelo adquirente e
os apontamentos feitos pelo cliente foram prontamente resolvidos, de forma
que não existe divergência entre o imóvel entregue e o oferecido. Aduzem que
a construção do bem foi realizada de acordo com o projeto hidráulico
aprovado, que contém previsão de shafts em determinados cômodos da
unidade; que as quinas construídas de forma sextavada são benéficas ao
cliente, pois dão uma amplitude ao ambiente e permitem um melhor
aproveitamento do imóvel; que os shafts tal qual construídos não prejudicam o
projeto e a estética do imóvel; que o projeto hidráulico daquele
empreendimento está em consonância com as normas NBR-5626, NBR-8160
e NBR-5688; que são previstas contratualmente eventuais alterações do
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projeto, tendo o cliente sido previamente informado de tal possibilidade


(cláusula 2.5); ausência de divergência na metragem da vaga de garagem,
inexistindo qualquer impeditivo para o seu regular uso.

Nestes termos, pedem o provimento do recurso.

Contrarrazões (fls. 675/683).

É o relatório.

De início, não há que se falar em decadência do


direito do autor, ora apelado.

Respeitada a irresignação das apelantes,


inaplicável ao caso dos autos a disposição contida no artigo 26, do Código de
Defesa do Consumidor, não se tratando de hipótese de prazo decadencial.

Na verdade, tratando-se de pretensão condenatória


de indenização por inadimplemento contratual - e não de exercício de direito
potestativo de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação -,
aplicável o prazo prescricional decenal do artigo 205, do Código Civil.

Nesse sentido, o C. STJ:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE


DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO
CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE
SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA
RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL.
INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO
CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO
CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO
EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO
QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA
CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. I -
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Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os


embargos de divergência tem como finalidade precípua a
uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu,
consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os
casos de responsabilidade civil contratual. II - A prescrição,
enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo
modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar
interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador. III -
A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a
expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, §
3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil
aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado
na responsabilidade civil contratual. IV - Corrobora com tal
conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade
civil contratual e extracontratual, advinda da distinção
ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o
tratamento isonômico. V - O caráter secundário assumido
pelas perdas e danos advindas do inadimplemento
contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação
anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não
prescrita a pretensão central alusiva à execução da
obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso
não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar
fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo
à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do
pactuado. VI - Versando o presente caso sobre
responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento
de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre
empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do
Código Civil). Embargos de divergência providos (EREsp n.
1.281.594-SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Rel. P/Acórdão
Min. Felix Fisher, DJe 23.05.2019).

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL.


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS.
PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO
OU OBSCURIDADE. AUSÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO.
FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. DEFEITOS APARENTES
DA OBRA. METRAGEM A MENOR. PRAZO DECADENCIAL.
INAPLICABILIDADE. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA.
SUJEIÇÃO À PRESCRIÇÃO. PRAZO DECENAL. ART. 205
DO CÓDIGO CIVIL. 1. O propósito recursal, para além da
negativa de prestação jurisdicional, é o afastamento da
prejudicial de decadência em relação à pretensão de
indenização por vícios de qualidade e quantidade no imóvel
adquirido pela consumidora. 2. Ausentes os vícios de omissão,
contradição ou obscuridade, é de rigor a rejeição dos embargos
de declaração. 3. Devidamente analisadas e discutidas as
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questões de mérito, e fundamentado corretamente o acórdão


recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há
que se falar em violação do art. 458 do CPC/73. 4. É de 90
(noventa) dias o prazo para o consumidor reclamar por
vícios aparentes ou de fácil constatação no imóvel por si
adquirido, contado a partir da efetiva entrega do bem (art.
26, II e § 1º, do CDC). 5. No referido prazo decadencial,
pode o consumidor exigir qualquer das alternativas
previstas no art. 20 do CDC, a saber: a reexecução dos
serviços, a restituição imediata da quantia paga ou o
abatimento proporcional do preço. Cuida-se de verdadeiro
direito potestativo do consumidor, cuja tutela se dá mediante as
denominadas ações constitutivas, positivas ou negativas. 6.
Quando, porém, a pretensão do consumidor é de natureza
indenizatória (isto é, de ser ressarcido pelo prejuízo
decorrente dos vícios do imóvel) não há incidência de
prazo decadencial. A ação, tipicamente condenatória,
sujeita-se a prazo de prescrição. 7. À falta de prazo
específico no CDC que regule a pretensão de indenização
por inadimplemento contratual, deve incidir o prazo geral
decenal previsto no art. 205 do CC/02, o qual corresponde
ao prazo vintenário de que trata a Súmula 194/STJ,
aprovada ainda na vigência do Código Civil de 1916
("Prescreve em vinte anos a ação para obter, do
construtor, indenização por defeitos na obra"). 8. Recurso
especial conhecido e parcialmente provido (REsp 1534831/DF,
Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Rel. p/ Acórdão
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, J. em
20/02/2018, DJe 02/03/2018).

Naquela oportunidade, dispôs a Corte Superior:

“Consoante estabeleceu o Tribunal de origem soberano na


análise das circunstâncias fáticas esses vícios cuidam de
metragem a menor e de anomalias aparentes, de fácil
constatação, relacionadas à construção (projetos,
materiais e execução). Nesse contexto, acolheu o acórdão
recorrido a prejudicial de decadência, ao entendimento de que
transcorreu, entre a efetiva entrega do bem e o ajuizamento da
presente ação, prazo superior a 90 dias (e-STJ fls. 625/627).
Não obstante, em que pese se tratar de vícios aparentes
o que atrai, de fato, a imediata fluência do prazo
decadencial observa-se que a demanda veicula
pretensão indenizatória, e não pretensão de redibição do
contrato, abatimento do preço ou reexecução dos serviços.
Assim, incide na espécie o prazo de prescrição decenal,
não transcorrido entre a entrega do imóvel e o ajuizamento
da ação”.
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Por tais razões, incide, no caso, o prazo decenal do


art. 205 do Código Civil, não estando prescrita a pretensão autoral, porquanto
o imóvel fora entregue em maio de 2018 (fls. 60), tendo a ação sido ajuizada
em meados de 2020.
No que concerne ao mérito propriamente dito,
não assiste razão às rés, ora apelantes.

Em que pese o inconformismo das rés, apelantes,


nenhum reparo merece a solução empregada na sentença que, reconhecendo
que a unidade imobiliária não fora entregue ao comprador de acordo com o
contratado, julgou procedente sua pretensão indenizatória por dano moral.

Em vista da incidência das normas protetivas do


direito consumerista, não se olvida que o dever de prestação de
informação ao consumidor deve ser observado também no momento pré-
contratual. E, no caso em exame, resta verossímil a alegação do recorrido
de que não lhe fora expressamente prestada informação de que o projeto do
apartamento poderia ser diferente do exposto no material publicitário
apresentado pelas vendedoras no momento da proposta de compra, incluindo
a possibilidade de entrega de vaga de garagem com dimensões relativamente
menores do que a divulgada e com área permeável integrante da sua
dimensão.

A este respeito, importa salientar que esta Eg. Corte


já manifestou seu entendimento em casos análogos ao dos autos, em que
figurou como parte requerida as mesmas apelantes, em ações que tramitaram
perante a mesma comarca de origem:

Compromisso de compra
e venda. Ação de nulidade de cláusula contratual
c.c. restituição de valores e indenização por danos
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morais. Sentença de procedência. Irresignação das


rés. Imóvel entregue com diversos vícios
construtivos e divergências com o projeto divulgado
na venda. Dano moral configurado. Circunstâncias
do caso que transcendem o mero aborrecimento
cotidiano, em especial pela natureza do negócio.
Indenização arbitrada e mantida em R$ 7.000,00.
Taxa de despachante. Inadmissibilidade da
cobrança. Irrelevância da distinção com a
denominada taxa SATI. Inteligência do
entendimento consolidado no REsp nº
1.599.511/SP. Enunciado nº 38.10 e precedentes
desta C. Câmara. Sentença mantida. Recurso
desprovido (TJSP; Apelação Cível
1004202-47.2019.8.26.0451; Relator (a): Alexandre
Marcondes; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito
Privado; Foro de Piracicaba - 1ª Vara Cível; Data do
Julgamento: 09/06/2020; Data de Registro:
09/06/2020);

APELAÇÃO Ação de
Indenização por Danos Morais - Instrumento
Particular de Promessa de Compra e Venda de
Imóvel - Pretensão de ressarcimento por danos
morais decorrentes da entrega de imóvel com
características diversas do apartamento decorado
mostrado pelas rés na ocasião da venda Sentença
de procedência - Inconformismo das rés, alegando,
preliminarmente a decadência da pretensão autoral,
e no mérito, que a construção da unidade imobiliária
"sub judice" observou rigorosamente o projeto
original, não havendo se falar falha ou alteração
indevida, especialmente quanto ao posicionamento
da janela da lavanderia Preliminar rechaçada
Pretensão da autora tem natureza indenizatória,
sendo aplicável o prazo prescricional quinquenal
aludido do artigo 27 do Código de Defesa do
Consumidor Alegação de mérito rechaçada - Caso
em que, ao se valerem da exposição de imóvel
decorado como técnica de venda de unidades
imobiliárias, as rés geram aos seus clientes a
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expectativa de receber imóvel com características


assemelhadas, não razoável que as vendedoras, ao
final, entreguem imóvel muito diverso daquele que
serviu de referência para orientar a compra dos
adquirentes - Entrega de imóvel que tenha
formatação de cômodos, posicionamento de portas
e janelas diversas do apartamento decorado que lhe
foi mostrado no stand de vendas que se revela
abusivo, por se tratar de propaganda enganosa
Danos morais caracterizados Recurso desprovido
(TJSP; Apelação Cível 1006183-48.2018.8.26.0451;
Relator (a): José Aparício Coelho Prado Neto; Órgão
Julgador: 9ª Câmara de Direito Privado; Foro de
Piracicaba - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento:
15/04/2020; Data de Registro: 15/04/2020).

No mesmo sentido, o entendimento já manifestado


por esta Relatoria no julgamento dos recursos de Apelação Cível nºs.
1016459-70.2020.8.26.0451, j. 08/11/2021, 1011606-18.2020.8.26.0451, j.
14/06/2021, 1006813-70.2019.8.26.0451, j. 24/06/2020;
1014700-08.2019.8.26.0451, j. 02/10/2020; 1016677-35.2019.8.26.0451, j.
02/10/2020, entre outros.

Ou seja, é crível que, no caso, as rés, vendedoras,


falharam no dever de informação ao adquirente do empreendimento, fazendo
com que suas expectativas fossem frustradas, ensejando o reconhecimento da
ocorrência de dano moral causado ao apelado, uma vez que este se apresenta
“in re ipsa”.
Vale dizer que, em vista da aplicabilidade de
normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor e da incontroversa
entrega do imóvel em desconformidade com o projeto apresentado ao
comprador e com as informações prestadas no período pré-contratual, não
se faz necessária a prova inconteste de angústias ou humilhações sofridas
pela parte ofendida.
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Suficiente, no caso, para fins de reconhecimento da


responsabilidade das empresas apelantes, a prova de transtornos causados
ao comprador apelado em decorrência da falha no dever de informação para
que seja reconhecida sua responsabilidade de indenizar.

Irretocável a r. sentença da lavra do D. Magistrado


Lourenço Carmelo Tôrres, cujos fundamentos merecem aqui repetidos:

“Restou indene de
dúvidas que a unidade entregue à parte autora
apresentou divergências em relação ao que lhe foi
prometido, notadamente, com colunas que embutem
fios, conduítes e encanamento, bem como vaga de
garagem com perímetro menor ao previsto no
projeto. As rés ponderam não ter havido falha de
informação, pois a parte autora havia tomado
conhecimento dos pormenores do empreendimento,
contudo, tratando-se de relação de consumo,
deveria constar com destaque que o apartamento
possuiria colunas, bem como que a vaga de
garagem poderia ter perímetro menor ao previsto no
projeto. Destarte, por falta dessa informação
adequada e com destaque, considero ter o autor
sido ludibriado, sofrendo o considerável dissabor de
constatar configuração diversa da unidade adquirida
com aquela que lhe foi prometida quando da sua
aquisição. Em suma, houve defeito na prestação de
serviços pelas rés, ao não alertarem devidamente o
autor sobre esses aspectos construtivos, o que
causou efetivos danos morais. Passando-se à
fixação do quantum devido, entendo que a quantia
de R$ 8.000,00 é suficiente para repressão de
condutas idênticas e reparação do abalo sofrido pelo
autor, sem acarretar o enriquecimento sem causa”.
(fls. 625).

Por outro lado, também não é o caso de redução do


montante arbitrado a título de indenização por danos morais.
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É cediço na doutrina e na jurisprudência que o valor


deve refletir a reprovabilidade da conduta do ofensor sem, contudo, servir de
estímulo ao enriquecimento sem causa do ofendido.

Em suma, a indenização do dano moral abrange o


aspecto ressarcitório e punitivo, não devendo ser tão branda a ponto de se
tornar inócua, nem tão pesada que se transforme em móvel de captação de
lucro (Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade Civil, Companhia Editora
Forense, p. 318). E para que ela se dê de maneira justa, devem-se levar em
conta critérios de proporcionalidade e razoabilidade na apuração do “quantum”,
atendidas as condições do ofensor, do ofendido, e do bem jurídico lesado, bem
como a extensão e a gravidade do dano.

Isto posto, não se afigura exagerado o montante


fixado pela sentença, correspondente a R$ 8.000,00, valor equivalente a 7,27
salários mínimos vigentes à época da prolação da r. sentença (2021).

Em vista do exposto, majora-se a verba honorária


arbitrada em desfavor da parte apelante de 10% para 14% do valor atualizado
da condenação, de acordo com o disposto no artigo 85, §§ 2º e 11 do Código
de Ritos.
Observa-se, para tanto, os requisitos elencados pelo
STJ, necessários para majoração da verba honorária, quais sejam: a) decisão
recorrida publicada a partir de 18.03.2016, data de entrada em vigor do novo
Código de Processo Civil; b) recurso não conhecido ou não provido, de
forma monocrática ou por órgão colegiado; e c) condenação em honorários
advocatícios desde a origem no processo em que interposto o recurso.

Por fim, prequestionada toda matéria constitucional


e infraconstitucional suscitada com a finalidade de acesso à Superior Instância,
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pelas vias extraordinária e especial, observando-se que em prequestionamento


é desnecessária a indicação exaustiva dos dispositivos legais, bastando que a
questão tenha sido decidida, como o fora no teor deste acórdão.

Advirta-se, no mais, que a oposição de embargos de


declaração manifestamente protelatórios e a reiteração destes, em
evidente abuso do direito de recorrer, poderão ensejar a incidência das
penalidades previstas no artigo 1.026, §§ 2º e 3º, do Código de Processo
Civil.

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.

JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS


Relator
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Voto nº 37150/2022
Apelação Cível nº 1016460-55.2020.8.26.0451
Comarca: Piracicaba
Apelantes: Mrv Engenharia e Participações S.a. e Piazza Florença
Incorporações Spe Ltda
Apelado: Cicero Feliz da Silva Junior

DECLARAÇÃO DE VOTO Nº 37150

Dissinto respeitosamente da d. Maioria.


Na visão deste insignificante magistrado, a decisão proferida relativamente
ao acatamento da pretensão falhou na visão dos fatos – além da atribuição do elevado
valor deferido a título dos tais danos morais havidos.
Houve aqui mero e vulgar problema de natureza contratual que não
atingiu a esfera íntima da parte A., seu complexo valorativo.
No AG.INT.REC.ESPEC.1.684.398-SP o eminente Min. VILLAS BOAS
CUEVA assentou da inviabilidade do reconhecimento de dano moral em problema
meramente contratual tal como aqui.
Demais disso, a parte A. assinou todos os documentos relativos ao
recebimento da unidade, sem ressalva para ao depois buscar a pretendida reparação.
O próprio Des. J.J.DOS SANTOS o mesmo Relator d`agora - revelou em
seu Voto nº 39.439 que o recebimento das chaves firmava o conhecimento dos vícios
e aqui a reclamação foi a destempo dos prazos do C.D.C.
O apartamento decorado não necessita ser observado milimetricamente em
relação à unidade entregada serve como mera referência visual para dar idéia de como
ficará o bem comprado.
Coisa vulgar e corriqueira, não se lhe pode emprestar a obrigatoriedade cega
com que acena o R. Voto.
De mui mór importância a assinatura de documentos que apontam do
recebimento do apartamento, e sem vícios, como procedido.
Os equipamentos instalados no bem em nenhum momento impedem a
colocação de móveis e aparelhos.
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Ou seja: mais uma decisão com desmesurada proteção ao consumidor, e


proteção à incúria do comprador nem se lhe lobrigando alguma frustração quanto à
aquisição; sabia ele do Memorial Descritivo.
Ou será que quereria uma unidade decorada e com aparelhos, tal como
lobrigou o A. no local de vendas?
Outrossim, para o simples problema apontado pela sentença, de natureza
contratual, OITO MIL REAIS é valor excessivo e ainda mais com os juros, e sem
falar na correção monetária.
Ver que em julgamento do Magnífico SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA, fixou-se, em precedente, para caso de morte, indenização por dano moral no
importe de R$-50.000,00.
Esse o exato valor localizado pelo eminente Des. J.J. DOS SANTOS,
também para caso de MORTE POR ERRO MÉDICO, em julgamento realizado aos
15.05.2018 e que foi indicado para jurisprudência, acatado o “quantum” por V.U.
O Ministro SIDNEI BENETTI, que horou esta Relação, fixou em CINCO
MIL REAIS danos morais por negativa de fornecimento de materiais cirúrgicos ver
A.R. Nº 46.590-SP.
A mesma C.Corte Superior, em Brasília, em precedente recebido por todos
os integrantes desta Seção de Direito Privado, por Boletim Interno, dá notícia de que o
MINISTRO JOÃO OTÁVIO NORONHA houve por exata V. decisão do E. Tribunal
carioca que fixou em R$-3.000,00 (Três mil reais) indenização a quem INGERIRA
METAL EM ACHOCOLATADO (ARESP Nº 477.364 RJ); esse valor de
R$-3.000,00 também consta de outros precedentes ver Rec. Espec. 149.296, da E. 2ª
Turma. Também a mesma fonte relata de outro precedente, da mesma H. Corte, quando
se mandou ao pagamento de R$-5.000,00 a título de dano moral por corpo estranho
localizado em alimento nem sequer ingerido.
E em recente entendimento, o mesmo E. Tribunal Superior assentou, no
Rec. Especial nº 1639470-RO indenização de DOIS MIL REAIS por protesto indevido.
Aqui, por um problema com mui menor gravidade fixou-se um valor que
com os acréscimos deverá ampliar em muito aquele limite.
Isso, na ótica do inútil prolator destas linhas, tangencia a figura profligada
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pelo Art.884 do Código Civil.


O Judiciário não pode prestigiar o enriquecimento sem causa.
De aí que, por minha tenção, DEFERIA PROVIMENTO ao recurso, para
haver por IMPROCEDENTE a ação, arcando o A. com as custas e com honorários de
15% sobre o valor dado ao feito.
SINE IRA ET STUDIO

L. B. Giffoni Ferreira
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Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:

Pg. inicial Pg. final Categoria Nome do assinante Confirmação


1 12 Acórdãos JOSE JOAQUIM DOS SANTOS 1A73BE5B
Eletrônicos
13 15 Declarações de LUIZ BEETHOVEN GIFFONI FERREIRA 1A7C689B
Votos

Para conferir o original acesse o site:


https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informando o processo
1016460-55.2020.8.26.0451 e o código de confirmação da tabela acima.

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