dificuldades, eu ouço. Longe de dispensar chavões de uma torre de marfim, David ancora-se nas
Escrituras e as prende firmemente em nosso pensamento, proporcionando passos práticos para
abraçar o Deus da Bíblia, que, a propósito, escreveu o livro sobre o sofrimento. A sabedoria de
David me ajudou em uma significativa parte dos meus anos como tetraplégica, e eu recomendo A
graça de Deus no seu sofrimento. Que grande guia para aqueles que, todos os dias, percorrem o
caminho árduo e manchado de sangue para o Calvário.”
Joni Eareckson Tada, Fundadora, Joni and Friends International Disability Center
“Às vezes navegar no conselho dos outros enquanto se está sofrendo pode ser um teste adicional.
Powlison coloca tudo isso de lado ao dar aos leitores o evangelho – mostrando-lhes o firme alicerce
da Palavra. Ele coloca a bússola da Palavra de Deus em nossas mãos trêmulas e nos aponta para o
norte verdadeiro: o próprio Cristo.”
Gloria Furman, coeditora, Ministério de Mulheres; autora, A esposa do pastor, Sem tempo para
Deus, Vislumbres da graça e Ministério de Mulheres (Editora Fiel)
“Tocante, refrescante e completamente bíblico, A graça de Deus no seu sofrimento é um copo de
água fresca para aqueles que estão no deserto do sofrimento. Escrevendo a partir da perspectiva de
um companheiro sofredor e um sábio conselheiro, Powlison gentilmente nos leva a encontrar a
bondade, a graça e a presença consoladora de Deus em nossa dor. Vemos como Deus está
trabalhando em nossas provações e pode fazer surgir ouro a partir de nossas aflições. Minha cópia
está bem marcada, pois sei que vou me referir a este livro penetrante vez após vez!”
Vaneetha Rendall Risner, autora, The Scars That Have Shaped Me: How God Meets Us in
Suffering
“Como David Powlison entende que ‘o bem profundo em nossas vidas muitas vezes surge de uma
mistura de sofrimento significativo’, ele está apto a nos conduzir em um workshop sobre o sofrimento
e a graça de Deus. E é exatamente isso que A graça de Deus no seu sofrimento é – uma oficina onde
Powlison nos guia pela Escritura, pelo hino ‘Que Firme Alicerce’ e nossas (e suas) experiências,
para que possamos ver a bondade de Deus e buscar a graça de Deus em nosso sofrimento e através
dele”.
Juan R. Sanchez, pastor da Igreja Batista de High Pointe, Austin, Texas;
“Aqui está um pequeno livro que é extenso em sabedoria bíblica para a vida real. Anseio por
colocar esse livro nas mãos daqueles que lutam para conectar as promessas da Bíblia às dolorosas
realidades da vida neste mundo de uma forma que traga a paz”.
Nancy Guthrie, autora, Hearing Jesus Speak Into Your Sorrow
“Sim e amém! David Powlison reúne o sofrimento ao poderoso e terno Deus que está conosco em
nossos sofrimentos, e em quem eles encontram significado e propósito. Você encontrará uma visão
panorâmica que sopra esperança e encorajamento, bem como profundas ideias valiosas que você
desejará espalhar por todo canto para saboreá-las. Como sempre, David torna as coisas práticas,
pessoais e ‘comuns’. Se você vive neste mundo caído, você vai querer ler este livro!”
Elizabeth W. D. Groves, Professora de Antigo Testamento, Seminário Teológico Westminster;
autora, Grief Undone e Becoming a Widow
Aos homens e mulheres
com os quais tenho o privilégio de trabalhar na
Christian Counseling & Educational Foundation.
Sua fé, amor, sabedoria e dons significam muito
para mim pessoalmente. Vocês dão riqueza
ao corpo de Cristo. Vocês dão a si mesmos.
Obrigado.
Nós humildemente rogamos a Ti, da Tua bondade,
ó Senhor, para consolar e socorrer todos aqueles que, nesta vida transitória, estão passando por
aflições, tristeza, necessidade, doença ou qualquer outra adversidade.
Livro de Oração Comum
Bendito seja o Deus e Pai
de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de
misericórdias e Deus de toda consolação! É ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para
podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos
somos contemplados por Deus.
2 Coríntios 1.3-4
SUMÁRIO
Introdução
Seu sofrimento significativo
Que firme alicerce
Ouça bem
Eu sou contigo
Eu sou contigo para um propósito
Meu propósito amoroso é a sua transformação
Provarei meu amor até o fim da sua vida
Nunca abandonarei você
Coda
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INTRODUÇÃO
Jó, sua esposa e seus três amigos concordavam em duas coisas. Nossas vidas são “breves no tempo
e cheias de inquietação” (Jó 14.1), e a mão de Deus está intimamente relacionada com nossas
inquietações. Mas contendas e perplexidade se abateram sobre eles ao tentarem explicar exatamente
como Deus e as inquietações se relacionam.
Eles discutiram sobre a causa das inquietações de Jó; ninguém compreendia o pano de fundo do
drama cósmico. Eles discutiram sobre o que Deus estava fazendo; ninguém compreendia que Deus
tinha bons propósitos além da compreensão humana e que ele não estava punindo Jó. Eles discutiram
sobre a validade da profissão de fé de Jó e sua fidelidade; ninguém compreendia que Jó era tanto
modelo de santidade quanto homem em processo de santificação. E eles discutiram sobre quem
deveria fazer o que em resposta à aflição; ninguém compreendia que o Senhor apareceria, que ele
estaria fazendo as perguntas, que seus propósitos seriam cumpridos. O próprio Senhor descreveu Jó
como “homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desvia do mal” (Jó 1.8). Mas quem poderia ter
previsto a jornada tumultuosa que provaria esse fato?
Milhares de anos depois, nós, humanidade, ainda somos breves no tempo e cheios de
inquietações. E nossas aflições ainda nos deixam perplexos. Por que isso está acontecendo comigo?
Onde está Deus? O que ele está fazendo? Como é a fé? Como o Senhor se mostra a nós? Por que a
jornada é tão tumultuada?
E que diferença faz que no espaço de tempo entre as aflições de Jó daquela época e as suas
aflições de agora, o Verbo se fez carne e habitou entre nós? Jó disse:
Eu sei que o meu Redentor vive
e por fim se levantará sobre a terra.
Depois, revestido este meu corpo da minha pele,
em minha carne verei a Deus.
Vê-lo-ei por mim mesmo,
os meus olhos o verão, e não outros;
de saudade me desfalece o coração dentro de mim.
(Jó 19.25-27)
O Redentor de Jó veio ao seu encontro finalmente. O Senhor respondeu do meio de um
redemoinho, e Jó disse: “Agora os meus olhos te veem” (Jó 42.5). Mas nós vemos com ainda mais
clareza. De onde estamos, podemos ver Jesus Cristo. Vemos mais de quem o Redentor é. Vemos mais
de suas obras. Dizemos mais do que Jó poderia dizer: “Deus, que disse: Das trevas resplandecerá a
luz, ele mesmo resplandeceu em nosso coração, para iluminação do conhecimento da glória de Deus,
na face de Cristo” (2Co 4.6). Nós vemos. Mas nossas vidas ainda são “breves no tempo e cheias de
inquietação”.
Aqui está a preocupação central do livro diante de você. Quando você enfrenta aflições, perdas,
impotência e dor, como o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo o alcança e o conforta? Como
graça e bondade o encontram, tocam-no, trabalham com você e caminham ao seu lado através das
águas profundas? Você provavelmente já conhece ao menos parte das “respostas corretas”. Considere
agora três amplas verdades:
A primeira, é óbvio, tanto a partir da Escritura quanto da experiência pessoal, que Deus nunca
estabelece uma zona de segurança mantendo todos os problemas afastados. Ele nunca promete que
sua vida será segura, fácil, tranquila, saudável e próspera. Pelo contrário, você e eu podemos ter a
certeza de que experimentaremos perigos, dificuldades, sofrimento, problemas de saúde e perdas. E
alguns dos amados filhos de Deus vivem vidas particularmente carregadas de dor física, pobreza,
isolamento, traição e perda. Para todos nós, a morte é a aflição final inevitável e iminente. Nós,
seres-humanos, somos como os lírios no Vale da Morte após a chuva. Florescemos por um momento.
Então o vento passa sobre nós e desvanecemos sem deixar rastro. Essa é a descrição dos filhos
amados e abençoados de Deus de acordo com o Salmo 103.15-16. Claro que pessoas alheias a Deus
também vivem vidas breves no tempo e cheias de inquietação. Não podemos interpretar o favor ou
desfavor de Deus avaliando a quantidade de problemas na vida de uma pessoa.
A segunda, é óbvio, tanto a partir da Escritura quanto da experiência pessoal, que também
experimentamos alegrias e dádivas das mãos de Deus. O lírio do campo é belo durante sua
existência. A maioria das pessoas experimenta algo de bom na vida – talvez o cuidado da família, o
pão diário, um banquete ocasional, uma certa medida de boa saúde, amigos e companheiros,
momentos de beleza, oportunidades para se tornar bom em alguma coisa, o amor comprometido, o
riso de uma criança, um trabalho bem feito, o prazer inocente do descanso após o trabalho e talvez
um sono tranquilo. Não há garantias de qualquer prazer terreno, mas todas as dádivas podem ser
apreciadas com gratidão.
Algumas pessoas parecem ser especialmente abençoadas com alegrias temporais. Jó desfrutou de
dádivas extraordinárias tanto no início quanto no final de sua vida – Satanás havia acusado o Senhor
de dar a Jó uma vida confortável como um suborno por sua fé. E pessoas arrogantes, em oposição a
Deus e autossuficientes, também podem desfrutar de uma vida de boa saúde, riquezas crescentes e
admiração dos outros. É assim que o Salmo 73.3-12 descreve as pessoas que florescem a despeito de
considerarem o Senhor irrelevante. Não podemos interpretar o favor ou desfavor de Deus avaliando
a quantidade de problemas na vida de uma pessoa.
A terceira, é óbvio a partir da Escritura – e pode se tornar profundamente enraizado na
experiência pessoal – que Deus fala e age por meio das aflições. Como C. S. Lewis disse, “Deus
sussurra a nós em nossos prazeres, fala conosco em nossa consciência, mas grita em nossa dor: é o
seu megafone para despertar um mundo surdo”.1 O propósito deste livro é ancorar sua experiência
pessoal mais profundamente na bondade de Deus. O sofrimento revela a genuinidade da fé em Cristo.
E o sofrimento produz a fé genuína. Por exemplo, quando você luta com aflições, os Salmos se
tornam reais. A verdadeira fé se aprofunda, torna-se mais vívida e sábia. Você cresce no
conhecimento de Deus. Quando você se torna um exemplo de santidade, permanece sendo alguém em
processo de santificação.
O sofrimento é tanto um teste de autenticidade quanto catalisador. Ele revela e forma a fé. Ele
também expõe e destrói a fé falsa. As aflições expõem as esperanças ilusórias investidas em deuses
imaginários. Tal desilusão é uma boa coisa, uma misericórdia severa. A destruição do que é falso nos
convida ao arrependimento e fé em Deus como ele é de fato. O sofrimento traz um prelúdio da perda
de toda boa coisa para aqueles que não professam fé no único salvador do mundo, o dom
inexprimível de Deus, o criador da vida. A aflição pressiona a incredulidade. Ela pressiona a
incredulidade para um caminho de amargura, desespero, vícios, ilusões ainda mais desesperadoras, e
tentativas ainda mais mortais de autossatisfação – ou então, para uma reconsideração de tudo aquilo
que é eterno. Perder aquilo pelo que se está vivendo, quando esses tesouros são vaidades, convida
você a um arrependimento completo. Podemos interpretar o favor ou desfavor de Deus ao observar
como uma pessoa responde à aflição.
A mão de Deus está intimamente relacionada às nossas aflições. “Basta a cada dia o seu próprio
mal” (Mt. 6.34). Algumas dificuldades são leves e momentâneas – diante de nós hoje e esquecidas
amanhã. Outros sofrimentos duram por um período. Alguns problemas são recorrentes e se abatem
sobre nós ciclicamente. Outras aflições se tornam crônicas. Alguns infortúnios pioram continuamente,
progressivamente trazendo dor e um sentimento de impotência para sua vida. E outros sofrimentos
chegam com inescapável irreversibilidade – a morte de um sonho, a morte de alguém amado, sua
própria debilitação e morte. Mas o que quer que seja que você tenha que enfrentar é mudado à luz da
ressurreição de Jesus Cristo e da promessa de que você também viverá. A fé pode crescer. Você
pode aprender a dizer de todo o seu coração, na companhia de grande nuvem de testemunhas: “Por
isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o
nosso homem interior se renova de dia em dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz
para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação” (2Co 4.16-17). Podemos aprender a
dizer isso, e realmente querer dizer isso, porque é verdade.
Se você é alguém que já considerou em profundidade o livro de Salmos, se você é alguém que já
ponderou sobre a segunda metade de Romanos 8, se você é alguém que leu do início ao fim de Jó, se
você deixou 1 Pedro penetrar em sua mente, então você já pegou a essência de como a graça de Deus
trabalha nas provações. Mas sempre há novos desafios. A sabedoria para sofrer bem é como o maná
– você precisa receber sua porção diariamente. Você não pode armazená-la, embora fique mais
familiarizado a respeito de como sair e encontrar o que precisa para hoje.
Como Deus efetivamente trabalhará os seus sofrimentos com a graça dele? Você talvez saiba a
resposta correta na teoria. Talvez saiba por experiência própria em algumas situações difíceis. E,
ainda assim, você descobrirá que não conhece Deus o suficiente ou da maneira exata que precisa
para lidar com a próxima dificuldade no seu caminho.
Pegamos as respostas difíceis de Deus e fazemos com que pareçam uma desculpa esfarrapada. Ele
nos dá uma resposta longa e lenta, mas estamos à procura de uma solução rápida. A resposta dele
insiste em ser vivida ao longo do tempo e nos detalhes. Agimos como se apenas dizer as palavras
mágicas resolvesse tudo. A resposta de Deus envolve transformá-lo em um tipo diferente de pessoa.
Mas agimos como se alguma verdade, princípio, estratégia ou perspectiva pudesse simplesmente ser
adicionada à pessoa que já somos. Deus personaliza sua resposta em nossos corações com uma
flexibilidade assombrosa. Mas a transformamos em uma fórmula: “Se você simplesmente acreditar
em x. Se você simplesmente fizer y. Se você simplesmente se lembrar de z”. Nenhuma verdade
importante jamais contém a palavra “simplesmente” na moral da história.
Podemos fazer a resposta correta parecer algo batido, mas eu garanto o seguinte: Deus o
surpreenderá. Ele irá pará-lo. Você lutará. Ele o confrontará. Você se machucará. Ele tomará o tempo
dele. Você crescerá em fé e amor. Ele será o seu profundo deleite. Você achará o processo mais
difícil do que jamais havia imaginado – e melhor. Bondade e misericórdia o seguirão todos os dias
de sua vida. No final da longa estrada você finalmente chegará em casa. Não importa quantas vezes
você a ouviu, não importa há quanto tempo você a conhece, não importa o quão bem você a tenha
memorizado, a resposta de Deus se mostrará melhor do que você jamais havia imaginado.
Ele responde com ele próprio.2
1. C. S. Lewis, The Problem of Pain (1940; repr., São Francisco: HarperSanFrancisco, 2001), 91.
Este livro é baseado em parte em David Powlison, “God’s Grace and Your Sufferings,” in Suffering and the Sovereignty of God, ed.
John Piper e Justin Taylor (Wheaton, IL: Crossway, 2006), 145–73.
CAPÍTULO 1
SEU SOFRIMENTO SIGNIFICATIVO
Pense neste livro como um workshop. Coloque-se dentro da história e você obterá maior proveito
dele. A Escritura é projetada para lidar com toda e qualquer dificuldade que enfrentamos na vida.
Então coloque os seus problemas na mesa. Ouça como o nosso Senhor nos convida a levá-los para o
lado pessoal.
Em essência, Jesus diz: “Em mim você tem paz. No mundo você tem aflições. Tenha coragem – eu
venci o mundo” (João 16.33). Vivemos em especificidades, não em generalidades. Você é convidado
a vir abertamente com suas aflições particulares.
Tiago diz que você “passará por provações de vários tipos” (Tiago 1.2). É exatamente nesses
momentos que o Senhor desenvolverá firmeza e profundidade em sua fé. Na aflição você descobre o
quanto lhe falta sabedoria. Então você pede por sabedoria. E Deus dá livremente o que você precisa.
Pedro diz que você “é contristado por vários tipos de provações” (1Pe 1.6). Mas em Cristo lhe
foi dado algo imperecível. Deus promete guardá-lo pelo seu poder e tornar a sua fé mais genuína e
verdadeira ao passar pelo fogo.
Paulo diz que nosso Pai e nosso Senhor nos confortam em “todas as nossas tribulações” (2Co
1.4). Seus problemas se aninham dentro dessa promessa. Ele irá confortá-lo e fortalecê-lo, dando-lhe
uma capacidade crescente de ajudar outros em qualquer problema que eles enfrentem.
Davi ora por si mesmo:
“Volta-te para mim e tem compaixão,
porque estou sozinho e aflito.
Alivia-me as tribulações do coração;
tira-me das minhas angústias”. (Sl 25.16-17)
E então ele ora por todos os filhos de Deus:
“Ó Deus, redime a Israel
de todas as suas tribulações”. (25.22)
Você é convidado a trazer sua necessidade, seus problemas, suas aflições e sua solidão para o
centro da graça e libertação de Deus.
Todas essas vozes falam a partir de experiências como a sua – diferentes nas especificidades,
porém difíceis da mesma maneira que é para você. Então traga a sua própria história para dentro da
nossa discussão.
Qual foi o sofrimento mais significativo que você experimentou no passado?
Qual é a situação mais difícil que você está enfrentando agora?
O que você tem medo de enfrentar algum dia?
Pense nisso e seja específico. Escreva nas margens dessas páginas. Continue pensando sobre isso
ao pausar a leitura deste livro. Ore por isso. Converse com o seu melhor amigo amanhã. Esgote o
assunto. O título deste livro é intencional. Não vamos discutir o tema geral de Deus e do sofrimento.
Vamos considerar como a graça de Deus penetra diretamente nos seus sofrimentos.
Não se apresse. Pegue uma caneta ou lápis. Tire cinco ou dez minutos – ou mais, se for necessário.
Onde você está tendo dificuldade de ver sentido nas coisas?
Onde você precisa de ajuda?
Onde você precisa de sabedoria?
Onde você precisa de coragem?
Onde você precisa de misericórdia?
Onde você precisa de proteção?
Onde você precisa de força?
Os dons da graça de Deus se encaixam perfeitamente em sua necessidade. Você é responsável por
metade deste livro! Se você fizer bem a sua parte, ela será a melhor metade.
Deixe-me estimulá-lo um pouco mais para fazer com que você pense de forma mais ampla. É
possível que um evento catastrófico tenha vindo à sua mente. Mas, à medida que você continua a
pensar, talvez algo mais esteja se tornando consciente para você. Talvez o momento de trauma não
tenha sido tão significativo quanto um relacionamento difícil e decepcionante de longa duração.
Existem muitos tipos de sofrimento significativo. Às vezes algo aparentemente pequeno é o
laboratório perfeito para crescer na graça. Seu redentor o convida a considerar qualquer situação que
esteja causando incômodo em sua vida, seja grande ou pequena, e então, torná-la pessoal. Nenhum de
nós sofre de forma genérica. Cada um de nós luta de maneiras específicas. Você pode colocar suas
particularidades na mesa.
Aqui está outro caminho para isso. O que marcou você? Mais especificamente, o que marcou você
para o bem? O bem profundo em nossas vidas muitas vezes surge no crisol do sofrimento
significativo. Jesus mesmo “aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu” (Hb 5.8). Fé e amor
brilham de forma mais clara, simples e corajosa em um lugar escuro.
E o que marcou você para o mal? Nossos pecados típicos surgem em reação à traição, perda ou
dor. Afligidos por algum mal, descobrimos males operando em nossos próprios corações. Sentimo-
nos ressentidos, ansiosos, desesperados, sobrecarregados, confusos – ou todos os itens acima!
Talvez mais frequentemente, tanto o mal quanto o bem se mostrem em nós. Uma provação traz à
tona aquilo que é mais errado, e Deus fomenta aquilo que é mais correto à medida em que vai ao seu
encontro e trabalha com você. Assim, o salmista diz:
“Antes de ser afligido, andava errado,
mas agora guardo a tua palavra” (Sl 119.67).
A aflição em si não é boa, mas Deus trabalha aquilo que é muito bom, trazendo os ignorantes e
rebeldes de volta para casa. A dependência duradoura e vigilante da fé é um dos mais agradáveis
frutos do Espírito. E você só carrega esse fruto quando tiver passado por algo difícil.
CAPÍTULO 2
QUE FIRME ALICERCE
Você experimentou, está experimentando e experimentará aflições. Pedi que você recorresse à
sua experiência e, nas páginas seguintes, também recorrerei à minha.
Temos bons modelos para mantermos uma postura de franqueza uns com os outros! Vemos as
aflições de Abraão, Jacó e José. Vemos os filhos de Israel primeiramente escravizados e depois
vagando. Vemos Noemi e depois Ana. Vemos Davi e depois Jeremias. Vemos Jesus e depois Paulo.
Eles falavam abertamente de suas aflições e revelavam os caminhos de Deus ao se entristecerem,
orarem, falarem, ensinarem e adorarem à partir de uma experiência sincera.
Os capítulos seguintes entrelaçarão quatro vertentes de testemunho. É claro que as Escrituras, a
sua experiência e a minha experiência aparecerão. A quarta vertente será um sábio hino: “Que Firme
Alicerce”3 (orig.: How Firm a Foundation). Escolho este hino porque ele expressa como um
desconhecido irmão ou irmã percebe a graça de Deus agindo em meio ao sofrimento. Leia com muita
atenção este hino. Cante se você ficar comovido. E leia novamente. Sinta-se à vontade para sublinhar
ou comentar aquilo que chama a sua atenção em uma primeira impressão.
Que firme alicerce, vós santos do Senhor,
tendes para vossa fé em sua Palavra excelente!
O que mais ele pode dizer do que já revelou
a ti que, por refúgio, para Jesus fugiu?
“Não temas, pois eu sou contigo, ó não desanimes;
pois sou o teu Deus e ainda te auxiliarei;
Te fortalecerei, te ajudarei e te farei levantar
Te sustentarei com a minha justa e onipotente destra.
“Quando por águas profundas te chamo a passar,
rios de tristeza não transbordarão;
pois serei contigo, para teus problemas abençoar,
e tua mais profunda angústia santificar.
“Quando por provas de fogo teu caminho passar,
minha graça, toda suficiente, teu suprimento será;
a chama não te ferirá; eu planejo apenas
Para sua impureza consumir e seu ouro refinar.
“Até a velhice todo meu povo provará
meu soberano, eterno e imutável amor;
e quando cabelos grisalhos seus templos adornarem,
como cordeiros, ainda nascerão em meu seio.
“A alma que em Jesus para o repouso se inclinou,
Não desertarei para seus inimigos;
essa alma, embora todo o inferno se empenhe para abalar,
Eu nunca, jamais abandonarei”.4
Neste capítulo farei dois comentários introdutórios sobre todo o hino e encorajarei você a
explorar outros hinos que também falem ao seu sofrimento. Depois, nos capítulos subsequentes,
exploraremos o significado e as implicações de cada estrofe.
O AUTOR E A VOZ
1. De quem é este hino? Um dos encantos sutis de “Que Firme Alicerce” é o fato de ser anônimo.
Somente Deus e o autor sabem quem o escreveu. Em um mundo obcecado por levar crédito e receber
pagamento pelas conquistas, este hino é apenas uma oferta sincera a Deus de uma pessoa
desconhecida. Quais sofrimentos significativos essa pessoa enfrentou? Não sabemos. Mas cada
estrofe exala experiência em primeira mão com o controle de Deus nas dificuldades da vida. O autor
era homem ou mulher? Jovem ou velho? Casado ou solteiro? Negro, mulato ou branco? Rico, pobre
ou da classe média? Batista, presbiteriano ou anglicano? Não sabemos. Quem quer que tenha sido a
pessoa, quaisquer que tenham sido as aflições que tornaram sua vida tumultuada, nós ouvimos as
palavras oportunas do Senhor que intervém pessoalmente. Estas palavras de seu irmão ou irmã
falarão aos seus sofrimentos mais significativos. O anonimato torna ainda mais adequado o convite
para se apropriar deste hino, como meio de graça.
2. De quem é a voz que fala por meio dele? Nem sempre prestamos atenção a isso, mas todo hino
adota um ponto de vista, uma voz que identifica um emissor e um receptor. Por exemplo, muitos
hinos, como muitos salmos, cantam diretamente para Deus. Ao cantar “Sê minha visão, ó Senhor do
meu coração”5 (Be Thou my vision), você dá voz à sua necessidade e expressa seu amor.
Outros hinos, como outros salmos, cantam sobre Deus de uns para os outros. Em “Graça
maravilhosa, que doce o som que salvou um desgraçado como eu”6 (Amazing Grace), você declara o
que nosso Senhor fez por você. Em “Ó vinde, todos os fiéis”7 (Oh come, all ye faithful), você
convida seus irmãos e irmãs a despertar e adorar nosso Senhor.
Ocasionalmente, como o Salmo 103, um hino faz você cantar para si mesmo. Em “Fique firme,
minha alma, o Senhor está ao seu lado”8 (Be still, my soul), você anuncia esperança a si mesmo
quando está agitado e ansioso. Em “Levanta-te, minha alma; livra-te de teus medos cheios de culpa”9
(Arise, my soul, Arise), você anuncia esperança a si mesmo quando se sente esmagado pelos seus
pecados.
Quer seja direcionado a Deus, uns aos outros ou a nós mesmos, damos voz à nossa fé,
necessidades e alegrias. Mas em “Que Firme Alicerce”, canta-se em uma voz pouco comum. Apenas
na primeira estrofe você fala sobre o Senhor e convida outros para ouvir o que ele disse. No restante
do hino, Deus está falando diretamente a você. Observe que cada uma das últimas cinco estrofes é
iniciada com aspas. Estas são as palavras do Senhor. Embora cantemos essas palavras, somos
colocados no papel de ouvintes – como no Salmo 50:5-23.
Deus está falando com você. Pondere sobre isso. Você canta esse hino ao escutá-lo atentamente.
Sobre o que o Senhor fala? É interessante que ele esteja falando diretamente aos seus sofrimentos
significativos. Ele lhe diz quem ele é, como ele é e o que ele está fazendo – não de forma genérica,
mas em relação ao que você está passando. Ele sopra os seus propósitos em seus pesares. Ele
promete as exatas coisas que você mais precisa. A maioria dos hinos expressa nossa fé – a Deus, uns
aos outros ou a nós mesmos. Este hino é mais elementar. A voz de Deus convida a fé. Ele está
chamando você.
Isso é particularmente apropriado quando se trata de sofrimento. O autor do hino demonstra um
sentimento profundo pelas lutas e necessidades de sofredores. A necessidade primordial de um
sofredor é ouvir Deus falando e senti-lo propositadamente em ação. Quando você ouve, leva a sério
e sabe que ele está com você, tudo muda, mesmo quando nada mudou em sua situação. Estando
entregue a si mesmo, você reage cegamente. Seus problemas deixam-no obcecado, distraído,
deprimido. Você se agarra a qualquer coisa. Deus parece invisível, quieto, distante. Ameaça, dor e
perda gritam em voz alta e persistente. A fé parece inarticulada. Tristeza e confusão estão em todo
lugar. É difícil lembrar de qualquer outra coisa, difícil de colocar em palavras o que realmente está
acontecendo, difícil de sentir alguma coisa da força de quem é Jesus Cristo.
Você pode murmurar as respostas certas para si mesmo, mas é como ler a lista telefônica. Você
ora, mas as suas palavras soam rotineiras, vagamente irreais, como meras generalidades piedosas.
Você nunca falaria com uma pessoa de verdade dessa maneira. Enquanto isso, a luta que cresce
dentro de você é tudo, menos rotineira e irreal. Pressão e mágoa o absorvem completamente. Você
está preso em um redemoinho de apreensão, angústia, arrependimento, confusão, amargura, vazio,
incerteza.
Essa luta não é uma surpresa. Êxodo 6.9, por exemplo, descreve como a “ânsia de espírito e a
dura escravidão” ensurdeceram as pessoas. Elas se sentiam tão pisoteadas que as palavras de
Moisés não faziam efeito. Suspeito que todos nós nos sintamos assim às vezes. Palavras que outras
pessoas acham significativas e que podem ser úteis são apenas palavras, sons vazios sem
significado.
Mas Deus trabalha para reverter o descendente espiral em direção à surdez e desespero.
Conforme a história de Êxodo se desdobra, o Senhor continua a dizer o que faz e a fazer o que diz. O
sofrimento, a surdez e a cegueira das pessoas não desapareceram em um piscar de olhos. Mas, em
Êxodo 15, as pessoas estavam vendo e ouvindo, e elas cantaram com alegria sincera e bem
fundamentada.
Quão mais a voz e a mão do Senhor nos alcançam em nossos tempos. O Espírito Santo trabalha de
forma poderosa e íntima nesta era da nova criação para comunicar as palavras, a presença e o amor
de Deus aos nossos corações. Os sofredores despertam para ouvir a voz de seu Pai e ver a mão de
seu salvador em meio ao sofrimento significativo.
Você precisa ouvir o que Deus diz, e experimentar que ele faz o que ele diz. Você precisa sentir o
peso e o significado do que ele é. Ele nunca mente. Ele nunca desaponta (embora ele sabiamente
desaponte nossas falsas esperanças para que possamos nos libertar de nossas ilusões). Ainda que
você ande pelo vale da sombra da morte, não precisa temer mal algum. Ele está com você. Bondade
e misericórdia o seguirão. Isso é o que ele está fazendo. A voz de Deus fala de forma mais profunda
do que aquilo que dói, de forma mais brilhante do que o que é escuro, mais duradoura do que o que
se foi, mais verdadeira do que o que aconteceu.
Você desperta. Você pondera isso em seu coração, e toma coragem. Você experimenta que é assim
mesmo. O mundo muda. Você muda. A voz dele muda o significado de todas as dificuldades. O que
ele faz – fez, está fazendo, fará – altera o impacto e o resultado de tudo o que acontece com você. A
sua fé cresce em direção a uma humanidade sincera e inteligente, não mais obscura e inarticulada.
Você se assemelha mais a Jesus: o homem de dores que sabe o que é padecer, o homem segundo o
coração de Deus, que, tendo amado os seus, amou-os até o fim.
LEVANDO PARA O LADO PESSOAL
À medida que desvendamos as maneiras pelas quais “Que Firme Alicerce” comunica a graça de
Deus aos problemas que enfrentamos, incentivo você a reunir outros recursos de graça para
fortalecê-lo e encorajá-lo.
Por exemplo, que outros hinos e canções falaram a você, tirando o seu coração de lugares
sombrios e elevando-o a Cristo? Aqui estão dois hinos clássicos que muitas vezes me encorajam
quando me sinto sobrecarregado.
1. Um hino que você canta sobre o Senhor – e também pode cantar para o Senhor. O título
“Jesus! Que Amigo para Pecadores!”10 (Jesus! What a Friend for Sinners!) comunica apenas metade
da história. Jesus também é um verdadeiro amigo para os sofredores. Wilbur Chapman é honesto
sobre as dificuldades da vida. Ele fala sobre os amigos que o decepcionaram. Ele fala de pessoas
que não são seus amigos de fato, mas estão querendo machucá-lo. Ele sabe como é se sentir de
coração partido, triste e fraco. Ele experimentou tempos de tempestade e noites escuras. Ao dar esses
exemplos e metáforas, Chapman convida-o a levar para o lado pessoal. E, acima de tudo, ele lembra-
o, em uma dúzia de maneiras diferentes, que Jesus está bem aqui quando sua vida é difícil. Ele ouve
o seu clamor por ajuda.
Ao longo deste hino, cantamos sobre como o Senhor se conecta com nossas lutas. Mas, há muitos
anos, nossa congregação alterou intencionalmente a última estrofe e o refrão final para que os
cantássemos diretamente para o nosso Salvador:
Jesus, agora eu Te recebo
mais do que tudo em Ti encontro;
Tu me concedeste perdão,
Eu sou Teu e Tu és meu.
Aleluia! Que Salvador!
Aleluia! Que amigo!
Salvando, ajudando, guardando, amando,
Tu estás comigo até o fim.
Pessoalmente achei muito significativo mudar para a linguagem direta de eu-tu no clímax do hino.
Hinos normalmente são escritos em uma única voz, como é o padrão. Mas a Escritura modela um
padrão mais flexível com as palavras. Muitas vezes muda de um lado para o outro, como o que nossa
igreja fez com esse hino. Por exemplo, o Salmo 23 começa e termina falando sobre quem é o Senhor
e o que ele faz. Mas no vale mais sombrio, falo diretamente: “Tu estás comigo”.
2. Um hino que você canta para si mesmo. Katharina von Schlegel havia experimentado a morte
de seus amigos mais queridos. Ela sentiu pesar, dor, lágrimas, tristeza, medos e decepção. Em
“Aquieta-te, Minha Alma” (Be Still, My Soul), ela luta consigo mesma, buscando encontrar calma em
meio à agitação e frustração. Ela lembra a si mesma de muitas maneiras que seu melhor amigo está
com ela. Ele enxugará todas as suas lágrimas no dia em que restaurar as mais puras alegrias do amor.
Cristo fará o mesmo por você.
Além dos hinos, muitos bons livros foram escritos sobre o sofrimento. Você não errará com livros
de Nancy Guthrie e Joni Eareckson Tada. Um livro menos conhecido que é muito atencioso é Why
Does It Have To Hurt?11 de Dan McCartney.
Como outros tópicos vastos e importantes – o evangelho de Jesus Cristo, a luta contra o pecado,
como é o amor – há espaço para um novo ângulo. Como todos os livros sábios e úteis bebem da
mesma fonte viva, eles se complementam. Mas nenhum deles aborda o tópico do mesmo ângulo ou
diz exatamente a mesma coisa que os outros. Minha esperança é que este livro, embora não tente
dizer tudo, ofereça algumas coisas que você achará úteis.
NT: Esta versão é uma tradução literal do hino original em inglês, esboçada sem relevar métrica e estética, e utilizada a fim de manter os
trechos pormenorizados ao longo do livro pelo autor. Não tendo relação, portanto, com a versão de hinário existente em português.
Considere esta nota também para todos os trechos de hino subsequentes.
Esta versão da letra foi atualizada para uma linguagem mais moderna, do Trinity Hymnal, ed. rev. (Filadélfia: Great Commission
Publications, 1990), nº 94. (O Trinity Hymnal dá o crédito a Selection of Hymns de Rippon, 1787; alt.) Pode ser cantada com várias
melodias bem conhecidas. Minha preferida é Adeste Fideles (também a melodia de “Ó Vinde e Adoremos”), dobrando o último verso
em cada estrofe.
Tradicional hino irlandês, sexto ou oitavo século, trad. Eleanor Hull, 1912.
John Newton, 1779.
Atribuído a John Francis Wade, 1751, trad. Frederick Oakeley, 1841.
Katharina von Schlegel, 1752, trad. Jane Borthwick, 1855.
Charles Wesley, 1742.
J. Wilbur Chapman, 1910.
Dan McCartney, Why Does It Have to Hurt? The Meaning of Christian Suffering (Phillipsburg, NJ: P&R, 1998).
CAPÍTULO 3
OUÇA BEM
Paulo escreveu: “o firme fundamento de Deus permanece, tendo este selo: O Senhor conhece os que
lhe pertencem” (2Tm 2.19). Esta excelente Palavra nunca muda. O Senhor o conhece. Essa realidade
é a coisa mais importante sobre você. Você é dele. Essa verdade faz a diferença decisiva na forma
como você caminha por estradas difíceis. Nosso hino começa convidando-nos a construir nossas
vidas fundamentadas nesta realidade.
Que firme alicerce, vós santos do Senhor,
tendes para vossa fé em sua Palavra excelente!
O que mais ele pode dizer do que já revelou
a ti que, por refúgio, para Jesus fugiu?
Considere três coisas sobre a afirmação e a pergunta retórica nesta estrofe de abertura.
O QUE MAIS ELE PODE DIZER?
Primeiro, a pergunta. “O que mais ele pode dizer do que já revelou?” Deixe isso ressoar por um
minuto. Eu não sei como você lê as Escrituras. Mas há uma maneira de ler as Escrituras que deixa-o
desejando que Deus tivesse dito muito mais. Como Satanás se tornou mau? Por que os livros de
Crônicas adicionam zeros aos números em Samuel e Reis? Como Jonas evitou a asfixia? Quem
escreveu o livro de Hebreus? E essas nem mesmo são as perguntas que mais frequentemente dividem
e confundem a igreja. Não teria sido ótimo se o Senhor tivesse introduzido um versículo que matasse
de vez o debate sobre o dia da volta de Cristo? Que resolvesse todas as questões sobre o significado
e o modo do batismo e da ceia do Senhor? Que especificamente nos informasse como organizar a
liderança e o governo da igreja? Que nos dissesse exatamente que tipo de música usar no momento
de louvor? Que explicasse como os propósitos soberanos de Deus se encaixam na responsabilidade
humana? Que descrevesse exatamente como o Espírito Santo tem ou não a intenção de manifestar seu
poder dinâmico?
Se apenas tivéssemos mais um verso para cada uma das dez principais questões que discutimos! E
pense no que ele poderia ter nos contado com um parágrafo ou capítulo extra sobre alguns dos
tópicos mais difíceis! Se pelo menos o Senhor tivesse encurtado as genealogias, omitido algumas
tribos na distribuição da terra, e condensado a folha de especificações para as dimensões, louças,
decoração e deveres do templo. Nossa Bíblia seria exatamente do mesmo comprimento – até mais
curta – mas as questões que abalam a igreja poderiam ter sido antecipadas e respondidas de forma
definitiva. De alguma forma, Deus em sua providência não escolheu fazer isso.
Tudo se resume ao que você está procurando enquanto lê e ouve. Quando você chega ao que mais
importa, às questões de vida ou morte, o que mais ele pode dizer do que já revelou? Em quem você
confia com sua vida? O que acontecerá com você? Você está enfrentando traição por parte de alguém
em quem confiava? Câncer agressivo e incurável? Uma deficiência desfigurante? Seu pecado mais
persistente? É disso que a Escritura trata. E as palavras de Deus abordam todas as questões
existenciais definidoras. Significado ou desespero diante da morte? Com propósito ou sem sentido?
Bem ou mal? Amor ou ódio? Confiança ou medo? Verdade ou mentiras? A misericórdia pode desatar
o nó do pecado? A justiça pode desfazer a opressão? E quanto ao caráter de Deus? A dinâmica do
coração humano? O sentido da aflição? O que mais o Senhor pode dizer do que já revelou? Escute
bem. Não há nada mais que ele precise dizer.
VÓS SANTOS
Segundo, considere o nome pelo qual esta estrofe de abertura o descreve. Você é um dos “santos”
do Senhor. De forma resumida, Deus está dizendo: “Você é meu. Você pertence a mim”. Ele conhece
os que são seus. No uso popular, a palavra “santo” foi depreciada para descrever realizações
espirituais individuais e extraordinárias. Mas na Bíblia – o modo como Deus define santidade – a
palavra descreve pessoas ordinárias que pertencem a um extraordinário Salvador e Senhor. Nosso
Redentor efetua todas as coisas extraordinárias. Mesmo estando no nosso melhor (e muitas vezes
estamos no nosso pior, ou tropeçando ali no meio!), “fizemos apenas o que devíamos fazer” (Lc
17.10). Deus o chama de santo para apontar a quem você pertence, não para honrá-lo por ir além do
chamado do dever. Não é a Medalha de Honra. São seus documentos de alistamento e sua chapa de
identificação. Quando Deus escreveu o nome dele em você, o sofrimento passar por uma mudança
qualitativa. Dor, perda e fraqueza não são mais o fim do mundo e a morte de suas esperanças.
Porque Deus o chama de “eleito, santo e amado” (Cl 3.12), você habitará em sua casa para
sempre. Isso o deixa livre para direcionar as suas energias de vida para se tornar mais como um filho
em relação a ele e mais prestativo em relação aos outros. Suas esperanças se tornarão realidade de
maneiras muito além das que você poderia sequer imaginar.
Se você não é o santo dele, então as perdas e decepções – de ontem, de hoje e de amanhã – são
presságios do fim de tudo o que você valoriza, anseia e luta. Tudo pelo que você vive morrerá
quando você morrer (Pv 10.28). Seus medos se tornarão realidade. Isso não é apenas por causa de
um dia de julgamento distante. Isso é simplesmente a lógica autoevidente da sua morte. Mas venha
para a vida e o amor de Cristo. Então os sofrimentos e as perdas se tornam um contexto no qual as
verdadeiras esperanças são despertadas e fortalecidas. Você recebeu uma herança que é imperecível.
Suas esperanças se tornarão realidade. Isso é simplesmente a lógica autoevidente da realidade de
que Jesus está vivo. A fé cristã não dá um passo de fé no escuro. Não crer dá o passo – um passo de
incredulidade em direção ao escuro, apostando com sua vida que Jesus não está vivo e bem. Ser
cristão é andar em um caminho que é como a luz da alvorada, que brilha cada vez mais até ser dia
pleno.
POR REFÚGIO
Terceiro, esta estrofe diz algo muito significativo a seu respeito. Você se refugiou no Senhor. Você
é um “refugiado”. Você fugiu para salvar sua vida e encontra todo tipo de ajuda e proteção em Jesus.
Em setembro de 2005, centenas de milhares de pessoas na Louisiana, Mississippi e Alabama
foram desalojadas pelo furacão Katrina. Muitos escaparam sem nada e perderam tudo. Eles estavam
vulneráveis. Precisavam de comida, moradia, cuidados médicos, roupas, dinheiro, proteção policial,
um novo começo. Mas uma autoridade do governo causou um alvoroço quando se referiu aos
evacuados como “refugiados”. O termo era visto como depreciativo. Trazia à mente as condições
degradantes nos campos de refugiados para aqueles que fugiam do genocídio na Bósnia ou no Sudão.
Nós, no entanto, somos refugiados contentes. A palavra pode ter uma conotação degradante para
alguns, mas, em Cristo, ela se torna uma afirmação de glória e esperança. Somos refugiados,
migrantes, pessoas sem casa, pessoas deslocadas, viajantes angustiados, estrangeiros e andarilhos
procurando a nossa verdadeira pátria. A Bíblia inverte tantas associações típicas. Palavras para
impotência e vergonha – escravo, necessitado, crucificado, fraco, refugiado – se transformam em
símbolos de alegria. Pessoas que fogem de desastres não têm um lugar seguro, são vulneráveis e
dependem totalmente de ajuda externa. Mas você encontrou tudo o que precisa e muito mais do que
poderia imaginar no Senhor, o único verdadeiro refúgio.
O oposto de ser um refugiado? Você ouve esta mensagem em todos os lugares. Acredite em si
mesmo. Seja autoconfiante, autossuficiente e autoafirmativo. Seja independente. Afirme-se. Você tem
direito, então afirme ousadamente suas opiniões e diga o que quer que pense e sinta. Você é livre
para fazer e ser exatamente o que quiser. Esse é o sonho da nossa cultura, e é delirante. Ponto por
ponto, é exatamente o tipo de pessoa que Provérbios chama de tolo. Viver como um tolo é
desastroso.
Mas viver como alguém que busca refúgio é viver. A vida como refugiado, migrante, é muitas
vezes desagradável. É uma sensação boa “confiar no Senhor de todo o coração” (Pv 3.5)?
Dependência significa se sentir seguro, aquecido, protegido e confortável? Às vezes. Uma criança no
colo de sua mãe descansa em confiança pacífica, como descreve o Salmo 131. Mas mesmo este
salmo descreve uma paz que só vem após uma luta interna. Na maioria dos salmos, fé significa
confiar em alguém em uma situação arriscada e perigosa.
É perturbador precisar de ajuda. Mesmo quando o final é alegre e pacífico, a dependência
frequentemente não causa uma boa sensação durante o processo. Você deve lançar as suas ansiedades
sobre Deus, que cuida de você, porque você não pode se ajudar (1Pe 5.7). Suas ansiedades são
maiores do que você. Você está sob pressão. Está vulnerável e sabe disso. Está sobrecarregado com
problemas que não pode controlar ou consertar. A vida é difícil. Você se sente esmagado, aflito,
ameaçado. Vem como um refugiado, não se vangloriando de seus espólios, mas trazendo suas
ansiedades. E seu pai cuida de você. Ele é forte e bom. Seguro finalmente! Por fim, você descansa
em paz.
O Salmo 28 captura todo o ciclo em um curto espaço de tempo. Davi clama: “Ajuda-me. Se tu não
me ouvires, morrerei”. Esse não é um sentimento confortável. Ele está ameaçado, quebrado e
exposto. Ele se sente impotente, sem outro lugar para onde ir. O Senhor de fato o escuta. O resultado
é exultante e agradecido.
Bendito seja o SENHOR, porque me ouviu as vozes súplices!
O SENHOR é a minha força e o meu escudo;
Nele o meu coração confia, nele fui socorrido;
Por isso, o meu coração exulta, e com o meu cântico o louvarei.
(28.6-7)
A voz da necessidade se torna a voz da alegria: “Você é tão bom”! O pedido de ajuda se torna um
grito de gratidão: “Obrigado”! Não é agradável precisar de ajuda. É pura alegria encontrar ajuda.
Quando Jesus diz que os pobres de espírito são bem-aventurados (Mt 5.3), ele inverte outra
palavra pejorativa. “Pobre” descreve refugiados e outros pedintes. “Pobre de espírito” significa que
você está plenamente consciente da realidade de que é desprovido. Está consciente da necessidade
terrível e urgente de ajuda que Deus deve dar. E Deus dá da maneira mais livre e generosa,
abençoando-o com nada menos do que a presença dele no reino da vida! O sofrimento insolúvel
(como o pecado insolúvel) leva-o através da porta de todas as bênçãos. Deus não se afasta das
aflições dos aflitos. Portanto, não tenha medo, pequeno rebanho, ele está lhe dando o reino.
Nossos materiais de discipulado muitas vezes não nos ensinam muito sobre isso. Aprendemos a
como ter um momento a sós com Deus. Descobrimos nossos dons espirituais. Estudamos boa
doutrina. Aprendemos a estudar a Bíblia e memorizar as Escrituras. Tudo isso é bom. Mas não
necessariamente aprendemos a precisar de ajuda. “Que Firme Alicerce” ensina-o a precisar de
ajuda. Deus usa sofrimento significativo para nos ensinar a precisar dele. E quando precisamos dele,
o encontramos.
MINHA HISTÓRIA
Este livro nasceu da experiência, sua proposta não é teórica. Em vários pontos deste livro
contarei um pouco da minha própria história.
Alguns anos atrás, voei da Filadélfia para o meio-oeste americano, a fim de encontrar dois grupos
que estavam tentando resolver suas diferenças. Seis de nós nos sentamos ao redor da mesa,
conversando sobre questões que haviam desgastado os relacionamentos. O resultado foi proveitoso
para as partes envolvidas. Mas durante aquele longo dia de discussão franca e construtiva, algo
muito incomum e perturbador continuava acontecendo comigo. Pelo menos meia dúzia de vezes,
comecei a dizer alguma coisa e, no meio do caminho, perdi completamente a minha linha de
raciocínio. Vez após vez, qualquer que fosse o argumento que eu estivesse tentando construir,
fracassava. Eu não tinha ideia do que estava tentando dizer. Era muito irritante.
Peguei um voo tarde para casa e, enquanto estava deitado na cama naquela noite, refleti sobre o
que havia acontecido. Foi angustiante. Meu trabalho envolve ensinar, aconselhar e escrever. Você
pode dizer que é minha obrigação completar meus pensamentos! Se não consigo lembrar o que estou
tentando dizer, não posso fazer o que tenho que fazer. Como um arremessador de beisebol que pode
ter uma lesão que faz terminar a sua carreira, enfrentei a angustiante possibilidade de um dano que
alteraria a vida.
No silêncio e na escuridão, levei meus problemas a Deus em oração. Tais orações são básicas:
“Senhor, tu prometes ser uma ajuda presente nos problemas… Isso é um problema… Ajuda-me”. E
foi levemente encorajador que, ao reconstruir o que aconteceu naquele dia, eu tenha podido juntar as
peças do que pretendia dizer. Mas duas outras considerações se mostraram muito mais úteis.
A primeira consideração foi algo que meu pastor havia instilado vinte e cinco anos antes. Ele
discipulava ativamente os líderes de pequenos grupos e os alunos do seminário em nossa
congregação. Ele se tornava extremamente pessoal ao alertar-nos para o perigo de transformar dons
em uma identidade e ministério em uma idolatria. Ele nos desafiou a fazer um experimento mental.
“E se você sofresse um acidente de carro e tivesse uma lesão cerebral permanente? Você não seria
mais capaz de fazer as coisas que ama fazer agora. Você poderia se contentar em trabalhar no
McDonald’s, reabastecendo os suprimentos, esvaziando lixeiras, esfregando o chão e limpando
banheiros”?
Precisávamos ser capazes de responder: “Sim, eu faria esse trabalho de bom grado”. Podíamos
lamentar nossa lesão e perda, certamente. Mas, no fim, era extremamente importante que pudéssemos
estar contentes em fazer qualquer trabalho honrado. E manter um restaurante limpo é honrado. O
trabalho de zeladoria faz bem aos clientes, colegas de trabalho e empregadores.
Parte do argumento do meu pastor era que, por definição, seus dons são apenas isto – empréstimos
de Deus para um propósito útil. E, por definição, ministério é trabalho servil. Significa ser servo,
assistente de alguém, ajudante. Você está executando tarefas. Você dá a sua vida para que a vida de
outra pessoa possa ser melhor. O descontentamento e a queixa revelam orgulho, como se o trabalho
servil estivesse “abaixo de mim”.
Ao longo dos anos, fiz esse experimento mental como uma avaliação da minha atitude. Naquela
noite, enquanto estava deitado ali no silêncio e na escuridão, isso não foi teórico. Repetidas vezes eu
havia sido incapaz de fazer o que o meu trabalho atual exigia. Está tudo bem se um dom temporário
não for mais meu para usar? Posso ser fundamentalmente contente?
A segunda consideração veio de 2 Coríntios 12. Esta passagem segue o mesmo caminho que o
experimento mental. Paulo descreve como o Senhor permitiu que ele fosse afligido por fraqueza e
dor persistentes a fim de protegê-lo do orgulho. Ele implorou ao Senhor que removesse aquilo que
tanto o angustiava. Mas Deus respondeu: “A minha graça te basta, porque o poder se aperfeiçoa na
fraqueza” (12.9). O princípio central do evangelho é que a graça e a força de Cristo são reveladas
em nossa necessidade. Paulo entendeu esse ponto. Ele estava contente em meio a todo tipo de
problemas e limitações. Estava vivendo o princípio fundamental da fé cristã: “Quando sou fraco,
então, é que sou forte” (12.10).
Naquela noite lutei com essas coisas. “Isso é realmente verdadeiro? Cristo é verdadeiro, nesse
exato momento, após um dia tão perturbador, ao enfrentar tal ameaça”? Revirei isso em meu coração,
ponderando e orando. Pela graça e poder do Senhor, cheguei a uma conclusão tranquila. Quando ele
diz: “Minha graça é suficiente para você”, é verdade. Eu não gostava do que estava acontecendo, mas
o ponto principal, eu podia afirmar: “Não vivo pelas minhas habilidades. Se for para ter uma
deficiência, lá no fundo, está tudo bem”.
Meu coração se aquietou. Relaxei e comecei a pegar no sono. Mas então mais uma coisa me veio
à mente. Aceitar uma situação difícil profundamente pessoal e espiritual liberou espaço mental para
que eu considerasse o que deveria fazer na prática. Por acaso me lembrei que havia começado a
tomar um novo medicamento para colesterol alguns dias antes. O médico não havia dito nada sobre
os efeitos colaterais. Mas eu deveria ligar para o médico ou farmacêutico de manhã. Era um pequeno
passo: “Ligue amanhã para ter alguma informação”. O que eu estava enfrentando era importante:
“Poderia estar perdendo a capacidade de fazer o trabalho que vinha fazendo nos últimos vinte e
cinco anos, o trabalho que eu amo, o trabalho que sustenta a minha família”. Mas, como em quase
tudo na vida, o que somos capazes de fazer é muito menor do que o que nos preocupa. Eu dormi.
De manhã deixei uma mensagem no consultório do meu médico, mas fui pessoalmente encontrar a
farmacêutica. Descrevi o que aconteceu. Ela disse: “É assim que está acontecendo? Como se você
entrasse no seu carro para ir até o mercado a um quilômetro de sua casa. Você se afasta três
quarteirões de sua casa e esquece completamente para onde está indo. Você se perde no caminho”. Eu
disse: “Você está descrevendo exatamente o que acontece – se perder no caminho”. Ela disse: “Essa
ruptura mental é um efeito colateral conhecido deste medicamento. Pare de tomar”. Parei, e o
problema não se repetiu.
Deus seja louvado! Esse foi um dia significativo. Sou muito grato por não ter me tornado
mentalmente incapacitado naquele momento, que esse sofrimento em particular tenha se mostrado
passível de cura. Mas sou ainda mais grato – profundamente grato – por como Cristo foi ao meu
encontro e se mostrou verdadeiro em um momento de necessidade. É eternamente significativo que o
experimento mental tenha se provado verdadeiro ao se tornar uma questão real, não teórica. Eu amo o
ministério de colocar palavras em frases que espero que ajudem alguém. Mas é garantido que um dia
não poderei mais fazer isso que amo fazer. E é tão importante que a capacidade de concluir um
pensamento não defina quem eu sou. Eu sou fraco; Cristo é forte. Sou um refugiado fugindo em
direção aos seus cuidados. Sou um dos seus.
LEVANDO PARA O LADO PESSOAL
Quando ele se envolve com o seu sofrimento, o Deus totalmente sábio normalmente cria uma
interação dinâmica de cinco perguntas.
1. Quais dificuldades você está enfrentando?
2. Que palavra revigorante dele fala a você?
3. Que contribuição os amigos sábios dão a você?
4. Como você pode lutar de forma sincera para confiar em Deus?
5. O que você deve fazer a seguir?
Você viu Deus trabalhando em cada um desses elementos na história que acabei de contar.
Responda às perguntas para si mesmo.
1. Quais dificuldades você está enfrentando? A primeira pergunta é fácil de responder, porque já
começamos a vida com dificuldades. O que você está enfrentando? Se você escolheu uma aflição
esmagadora e multidimensional, comece talvez com uma pequena fatia do problema maior. Os
caminhos de Deus conosco sempre garantem que consigamos apenas dar o próximo passo. Nada de
pular edifícios altos em um único salto.
2. Que palavra revigorante dele fala a você? A segunda questão tem muitas respostas possíveis.
Você já tem em mente algo verdadeiro da parte de Deus e sobre nosso Deus que fale de forma
relevante para você na sua situação? Quando experimentei me perder mentalmente, 2 Coríntios 12
uniu o poder do Senhor e minha fraqueza. Essas palavras “se revestiram” daquilo que eu estava
vivenciando. O que foi útil para você no passado? Ou você precisa de algo novo sobre quem é o
Senhor? Leia trechos da Escritura onde o sofrimento fornece o pano de fundo. Salmos, Jó, 2
Coríntios e 1 Pedro são os exemplos mais conhecidos. Mas muitas partes da Escritura falam sobre as
nossas aflições. Existe alguma música que traz à sua mente quem você é na visão dele? Um salmo
que se refira honestamente a Deus em meio a uma luta? Um tópico de ensino de um sermão ou livro
que fala sobre como Deus trabalha na aflição? Uma promessa do que o Senhor fará no futuro?
3. Que contribuição os amigos sábios dão a você? A terceira questão é muito importante, mas
pode ser complicada de responder. Você precisa de outras pessoas. É fácil esquecer isso e tentar um
voo solitário em tempos difíceis. Quem pode andar com você? Pergunte a si mesmo: “Quem é a
pessoa em quem mais confio? Quem lidará com minhas lutas sinceras de forma cuidadosa? Quem vai
me tirar disso e ser bom ouvinte? Quem guarda confidências, ora de forma séria e está disposto a
falar abertamente com sabedoria divina? Quem é a pessoa mais sensata, direta, humilde, crente,
experiente e corajosa que eu conheço”? Nenhum de seus amigos é perfeito! Mas Deus coloca pessoas
imperfeitas em nossas vidas que também são sábias, carinhosas e confiáveis – o tipo de pessoa que
você quer ser para os outros. Quem pode compartilhar o fardo com você, lançar suas ansiedades a
Deus, encorajá-lo?
Parte da complexidade da Questão 3 se dá porque as outras pessoas podem ser tolas – até mesmo
muito tolas. Elas podem ser como os conselheiros de Jó e tratá-lo de forma errada. Elas podem
oferecer conselhos ruins. Elas podem fazer promessas tolas que não são verdadeiras sobre Deus e
sobre a forma como ele trabalha em situações difíceis. Elas podem ser intrometidas e apenas tentar
consertá-lo. Elas podem ser indignas de confiança e propensas à fofoca. Logo, você não pode pedir a
qualquer um que ande você.
Meu pastor foi a pessoa significativa na pequena história que contei. Ele havia falecido alguns
anos antes. Minha esposa estava dormindo. Mas a maneira como meu pastor orientou a minha fé
ainda falou comigo naquela noite escura.
4. Como você pode lutar de forma sincera para confiar em Deus? A quarta pergunta faz com que
você lute para tornar seu o que é verdadeiro. Lute para lembrar e levar a sério a verdade facilmente
esquecida. Busque o Senhor honestamente. Ao voltar-se para ele, você provavelmente estará se
afastando de pecados instintivos e habituais. Ansiedade? Raiva? Desespero? Escapismo? Ele é
misericordioso. Ele resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes (Tg 4.6). Não tenha medo de
dizer ao Senhor a verdade sobre seus sofrimentos, seus pecados, seus desejos de misericórdia, suas
lutas. Dezenas de salmos trilharam esse caminho. Peça a seu Pai para lhe dar o seu Espírito Santo.
Toda a sabedoria, confiança, paz, coragem, amor, perseverança, esperança é um fruto do seu toque
pessoal.
Uma luta honesta não é mágica. Não é “reivindicar a vitória”. Não é encontrar um truísmo
religioso para causar um curto-circuito no processo. E não é afundar em mágoa e autocomiseração.
Deus está nos levando em sua direção. Pergunte. Busque. Bata à porta. Ele o encontrou primeiro e
está disposto a ser encontrado.
5. O que você deve fazer a seguir? A quinta pergunta faz com que você pense sobre o aspecto
prático: “E agora?”. No sofrimento significativo, o problema é sempre muito maior do que o que
você é chamado a fazer agora. Eu não pude consertar as coisas angustiantes que aconteceram naquele
dia, mas pude fazer alguns telefonemas. Katharina von Schlegel não pôde trazer de volta seus amados
amigos, mas pôde colocar a luta de sua alma em um poema que ainda cantamos: “Aquieta-te, Minha
Alma”. O que é um próximo passo pequeno, mas significativo? Pode ser tão simples quanto levantar-
se da oração e ligar para um amigo, lavar roupa, pagar as contas, ir trabalhar ou tirar um dia para
passear no parque.
CAPÍTULO 4
EU SOU CONTIGO
No cenário de todo o hino “Que Firme Alicerce”, as estrofes 2–6 aparecem entre aspas (não
repetirei as aspas com as estrofes individuais). Você lê e canta as palavras, mas o seu próprio Deus
está falando com você:
“Não temas, pois eu sou contigo, ó não desanimes;
pois sou o teu Deus e ainda te auxiliarei;
Te fortalecerei, te ajudarei e te farei levantar
Te sustentarei com a minha justa e onipotente destra.
Focarei em duas coisas dentro do que ele está dizendo, e em seguida, vamos desenrolar uma
implicação muito importante.
REAÇÕES A EVITAR
Observe como essa estrofe descreve a nossa experiência interna de sofrimento. Como você reage
ao sofrimento grave? “Temor e desânimo” já cobrem bem as opções! Se for sincero, você se sente
abalado, oprimido, preocupado, confuso, chateado, inseguro. Você luta – sempre. Luta descreve um
combate que acontece no seu interior. Você está se engalfinhando com alguma coisa. Se você não
sentisse a pressão ou o esgotamento daquilo que está acontecendo, você seria uma pedra, não um ser
humano. Portar a imagem de Deus não quer dizer que sejamos insensíveis.
Até certo ponto, temor e desânimo são reações naturais. Mas os problemas surgem quando a
aflição e a apreensão tomam o lugar de Deus. A angústia honesta da fé passa a ser ira sem Deus. À
medida que os problemas se instalam, eles reivindicam seu pensamento, conversas, emoções, futuro,
fé. Eles ocupam horas de vigília à noite. Se adormecer, eles acordam com você logo pela manhã. O
desânimo cobre bem toda uma gama de tentações: de aflito a irado, de desapontado a
desesperançoso, de preocupado a apavorado, de frustrado a enfurecido.
Há também as reações desonestas que visam evitar o desânimo diante dos problemas da vida.
Algumas pessoas intencionalmente silenciam as realidades desanimadoras fazendo ginásticas mentais
que mantêm o sofrimento a uma distância segura. Mas a Escritura nunca recomenda o estoicismo.
Outras pessoas tornam-se cínicas, insensíveis, duras e invulneráveis – a maioria não é leitora de um
livro com “Seu Sofrimento” no título! A Escritura nunca recomenda o cinismo. Outras pessoas se
afastam da vida, com tanto medo de serem machucadas que se retiram para uma concha de
autoproteção excruciante. Desejar evitar a dor é natural, mas a Escritura nunca recomenda o
isolamento como estratégia. Algumas pessoas evitam a dor se entregando a prazeres e falsos refúgios
de entretenimento, recreação, comida, bebida e drogas. A Escritura nunca recomenda o vício como
uma maneira de lidar com a dor.
A Escritura recomenda enfrentar a fraqueza e a dor de forma honesta – como Jesus e os Salmos
fizeram – , tanto por uma questão de integridade quanto para amar outras pessoas que também sofrem.
A honestidade sente o peso das coisas que despertam temor e desânimo – porque de fato coisas
temíveis e desanimadoras acontecem conosco. Dificuldades nos dão boas razões para ficarmos
ansiosos, então Deus dá razões melhores ainda para confiar nele. O problema não é ficarmos aflitos
com a aflição e magoados com a mágoa. Algo doloroso deveria doer. O problema é que Deus se
torna irrelevante quando nos tornamos obcecados com o sofrimento ou o evitamos compulsivamente.
Deus ocupa uma ideia adicional vaga – sem peso e distante em comparação a algo imediatamente
urgente. Ou fabricamos um deus que magicamente fará tudo melhor se simplesmente conseguirmos
nos fazer ouvir. A dor desencadeia naturalmente uma cascata de apreensão, infelicidade e angústia; e,
por causa do desvio de nossos corações, muitas vezes provoca reações ruins de incredulidade e
pecado. Isto é, a menos que nos lembremos do que a nossa segunda estrofe do hino está nos dizendo.
PROMESSAS PARA ABRAÇAR
Observe o que mais Deus diz. Embora tenhamos boas razões para a apreensão, ele apresenta uma
cascata de excelentes razões que convidam as melhores reações de que um ser humano é capaz. Essas
razões imitam a consciência, os motivos, as emoções, as palavras e as ações de Jesus ao enfrentar
seu próprio sofrimento significativo.
Na nossa segunda estrofe, Deus faz sete promessas que falam ao nosso temor e desânimo. O autor
do nosso hino não as inventou simplesmente. A estrofe parafraseia bem de perto Isaías 41.10. Deus
pronunciou essas palavras, e nosso hino as cita com precisão e, em seguida, amplifica um pouco a
fonte de forma que a letra sustente uma rima e um ritmo cantáveis. Coloquei as palavras exatas do
Senhor em itálico e as amplificações entre parênteses.
Não temas, pois eu sou contigo.
Não desanimes; pois sou o teu Deus.
(e ainda te auxiliarei.)
Te fortalecerei.
Te ajudarei.
(E te farei levantar.)
Te sustentarei com a minha justa e (onipotente) destra.
Jesus, o autor e consumador da fé, ouviu essa voz e a tomou em seu coração. Ele agora diz essas
mesmas coisas para você.
Você está ouvindo?
Podemos ter dificuldades em desacelerar o suficiente para ouvir. Talvez simplesmente não
queiramos ouvir. Talvez estejamos ocupados ouvindo dez mil outras vozes, incluindo a nossa. Ou
talvez nos sintamos tão cansados e desanimados que não nos sentimos prontos para ouvir. Mas,
quaisquer que sejam os detalhes, nosso problema essencial é a surdez à voz de Deus. Somos
absorvidos no mundo de nossas próprias experiências, pensamentos, sentimentos e opiniões.
Uma notável frase em latim capta a natureza essencial da pecaminosidade de voltar-se para si:
incurvatus in se. Nós nos encurvamos sobre nós mesmos. O incurvatus in se do pecado se afasta
intencionalmente de Deus. Quando você ou outros sofrem, você experimenta ou testemunha a força
dessa tendência encurvadora. É difícil não ser preocupado consigo mesmo.
Mas Deus voluntariamente continua falando. Ouça o quanto ele soa próximo neste hino. Aquele
que dá a vida voluntariamente dá ouvidos para ouvir. O encurvamento pode ser invertido. Os salmos
clamam para fora em vez de se voltarem para dentro. Jesus é um excelente professor. No extremo de
sua agonia, não houve incurvatus in se. Ele ouviu a voz de Deus e se lembrou. Ele se voltou para
Deus em necessidade, generosidade e confiança: “Meu Deus, meu Deus, por que me desamparaste”?
“Perdoe-os, porque eles não sabem o que fazem”. “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Mt
27.46; Lc 23.34, 46). Ele se voltou para as pessoas em amor prático: “Ainda hoje estarás comigo no
paraíso”. “Eis aí teu filho... Eis aí tua mãe” (Lc 23.43; Jo 19.26-27). Ele deu voz à experiência
honesta de sua provação: “Tenho sede... Está consumado” (Jo 19.28, 30).
Este é o Jesus para quem fugimos por refúgio. O mais cuidadoso e atencioso dos ouvintes andou à
nossa frente. Ele lida de forma gentil com a nossa ignorância e desobediência. Ele agora anda
voluntariamente conosco, plenamente consciente de nossas tentações de sermos esquecidos,
distraídos e desatentos. Ele aborda o problema maior primeiro. É por isso que este hino fala na
primeira pessoa. As palavras de nova vida criam primeiramente ouvidos que ouvem.
Deus está falando. As suas ovelhas ouvem a sua voz, até mesmo no vale da sombra da morte. Você
está ouvindo?
O ponto de partida desta estrofe é bem escolhido. “Eu sou contigo”. É a promessa central em toda
a Escritura, e a promessa central que transmitimos ao falar pastoralmente aos sofredores. Por que
Davi pode dizer “Não temerei mal algum” ao enfrentar perigo e ameaça de morte? “Porque tu estás
comigo” (Sl 23.4). Você não está sozinho, não está abandonado, não é ignorado, não importa o que
esteja acontecendo. Não é por acaso que esta é a promessa central de toda a Bíblia, a única
esperança de pecadores e sofredores. Essa é a única coisa que Moisés realmente queria – sem isso a,
assim chamada, terra prometida seria apenas uma propriedade medíocre. É a razão essencial pela
qual a vida de Davi floresceu. E chega ao seu ápice em Emanuel. Quando Deus vem em pessoa andar
conosco, todas as suas promessas se tornam “Sim” e “Amém” (2Co 1.19-20).
“Eu sou contigo” também é uma realidade que incorporamos uns com os outros. Embora a
presença de um irmão ou irmã em Cristo não substitua Deus, a proximidade de outro crente é um
meio muito significativo da graça de Deus. A graça de Cristo é incorporada – em nós, uns nos outros.
Outras pessoas são parte do conforto que Deus nos traz na aflição.
O PROBLEMA COM “O PROBLEMA”
Deixe-me desenrolar uma implicação pastoral da importante promessa “Eu sou contigo”.
Sofrer muitas vezes traz uma dor dupla. Em primeiro lugar, há “o problema” em si – talvez doença
ou pobreza, traição ou luto. Isso já é bastante difícil (e a realidade de que você não está sozinho traz
conforto). Mas muitas vezes ele é composto por um segundo problema. Outras pessoas, mesmo bem-
intencionadas, frequentemente não reagem muito bem aos que sofrem. Sofredores são amiúde
incompreendidos, ou escarnecidos, ou ignorados. Essas reações adicionam isolamento relacional e
psicológico ao “problema”.
Por exemplo, Jó sofreu a morte de seus filhos, desastre financeiro e uma dor física impiedosa.
Mas então ele teve que lidar com as atitudes de sua esposa e amigos. Eles exacerbaram seu
sofrimento. Ele se tornou totalmente isolado porque foi mal compreendido e maltratado. Quando a
vida de Jó estava mais difícil, ele também estava mais sozinho.
De forma similar, Jesus enfrentou traição, zombaria e tortura nas mãos de seus inimigos. Mas e os
seus amigos mais verdadeiros? Primeiro eles discutiram sobre quem era o mais importante. Depois
eles caíram em uma incompreensão sonolenta. Então eles se desagregaram em confusão, pânico, fuga
e negação. Quando a vida de Jesus foi mais dolorosa, ele também teve que passar por isso sozinho.
Deus diz em meio a isso: “Eu sou contigo”.
Dificuldade dupla é uma experiência comum. Uma jovem perde seu pai a quem tanto ama. Seus
amigos são inicialmente muito solidários. Mas eles se cansam do seu luto muito antes do luto
terminar. Eles desistem dela como amiga. Ou pais de uma criança gravemente deficiente enfrentam
dificuldades de vários tipos ao longo de toda a vida. Eles também enfrentam o tratamento dado pelos
outros. Amigos e familiares se distanciam, ou acham as situações embaraçosas e não sabem o que
dizer, ou oferecem uma ajuda inadequada risível (ou lamentável), ou não querem ser incomodados,
ou oferecem mil sugestões e correções que revelam total incompreensão da realidade. A deficiência
é combinada ao isolamento.
Aqui está outra maneira disso acontecer. Pessoas que o amam geralmente focam exclusivamente
no “problema” – as dificuldades que você está enfrentando. Eles perguntam sobre “o problema”.
Eles oram para que Deus resolva “o problema”. Eles oferecem conselhos para resolver “o
problema”. Eles se importam com você! Estas são tentativas bem intencionadas de serem úteis. Mas
o efeito pode ser bastante rude. Eles estão perdendo de vista você – a pessoa enfrentando esses
problemas.
Muitos sofrimentos significativos não têm remédio até o dia em que todas as lágrimas forem
enxugadas. Sua doença ou deficiência é incurável. A injustiça não será remediada em sua vida. Seu
amado está morto. O casamento acabou. O dinheiro acabou. Pode haver ajuda parcial ao longo do
caminho, redenção parcial, mas nenhum conserto.
Mas independentemente de um problema ser ou não solucionável, você está enfrentando desafios
espirituais. “Como você está? O que está aprendendo? Onde está falhando? Onde precisa de
encorajamento? Você aprenderá a viver bem e com sabedoria em meio à dor, limitação, fraqueza e
perda? O sofrimento o definirá? Será que a fé e o amor crescerão, ou você secará”? Essas são
questões de vida ou morte – mais importantes do que “o problema” em última análise. Elas envolvem
perguntar, pensar, ouvir, responder. Elas tomam tempo. Outras pessoas são muitas vezes indelicadas
e incompreensivas acerca das coisas mais importantes, enquanto gastam energia e amor para resolver
o que muitas vezes não tem solução.
Este sofrimento duplo comumente ocorre quando um problema de saúde escapa ao diagnóstico e à
cura. Jesus encontrou uma mulher que “havia doze anos, vinha sofrendo de uma hemorragia e muito
padecera à mão de vários médicos, tendo despendido tudo quanto possuía, sem, contudo, nada
aproveitar, antes, pelo contrário, indo a pior” (Mc 5.25-26). Sua história decididamente tem um quê
contemporâneo! O sangramento era um problema médico real. Mas tentativas de ajudar multiplicaram
sua miséria. Os dois mil anos subsequentes não eliminaram o fenômeno: diagnósticos errôneos,
tratamentos equivocados, efeitos colaterais negativos, conselhos contraditórios, enorme desperdício
de tempo e dinheiro, falsas esperanças repetidamente frustradas, falsos temores inutilmente
ensaiados, nenhuma explicação plausível, culpar a vítima, e a simpatia declinante à medida que a
fadiga da compaixão se instala em possíveis ajudantes! A mulher estava doente; outras pessoas
pioraram o quadro.
J. I. Packer certa vez observou que “meias-verdades disfarçadas de verdade completa são
mentiras completas”.12 Podemos estender sua lógica. Uma meia gentileza disfarçada de gentileza
completa é uma indelicadeza completa. O desejo de explicar e resolver “o problema” é certamente
uma gentileza. Mas pode perder de vista a pessoa que, de todo jeito, precisa lidar com o que está
acontecendo.
Então, quer você esteja abandonado por causa do seu sofrimento ou ofuscado pela preocupação
dos outros com “o problema”, o primeiro verso desta estrofe mostra uma notável intuição pastoral.
Deus fala primeiramente ao temor, desânimo e isolamento que acompanham as dificuldades. E ele
responde com a promessa monumental de sua graça: “Eu sou contigo”. Ele responde com ele mesmo.
MINHA HISTÓRIA
Minha segunda história também se originou de uma situação médica. Eu havia tido diverticulite
várias vezes ao longo do ano anterior. Minha médica, uma mulher que não mede palavras, disse:
“Você pode morrer em uma dessas ocasiões. Você precisa fazer uma cirurgia – logo. Então eu fiz.
Eu despertei da anestesia na névoa de estupor usual do pós-operatório, dor, sede e a
excessivamente lenta passagem do tempo. Isso era previsível. Mas algo muito mais perturbador
também estava acontecendo. Tudo parecia estar ocorrendo à distância. Eu me senti despersonificado.
A vida não parecia ser real, havia uma sensação de desconexão emocional, desorientação interna.
Foi uma experiência de dissociação. “Eu” havia me separado de “mim mesmo”, desconectado do
senso de mim mesmo como uma pessoa que experimenta, escolhe e pensa. Era como se “eu” tivesse
sido cortado de todas as realidades às quais estamos normalmente conectados. Você não quer que
isso aconteça com você. Não ser capaz de completar os próprios pensamentos é uma preocupação
leve em comparação com a sensação de desconexão do próprio senso de ser uma pessoa.
Como as outras pessoas geralmente respondem a alguém que esteja passando por esse tipo de
experiência? Por apresentar substrato fisiológico como um possível efeito colateral da anestesia, a
resposta mais fácil é dizer: “Não se preocupe, isso desaparecerá quando o seu corpo restabelecer o
funcionamento normal”. Foi isso que a enfermeira me disse. Ela me via como um corpo defeituoso.
Verdade, mas dentro desse corpo está uma pessoa experimentando algo extremamente preocupante.
Telefonei para um amigo de confiança e esbocei o que estava acontecendo. Até hoje ele não
conseguiu explicar exatamente por que fez o que fez em seguida. Ele não me deu informações
fisiológicas. Ele não disse: “Não se preocupe”. Ele não me fez perguntas. Ele não tentou me
aconselhar. Ele não orou por mim. Em vez disso, ele leu os Salmos de Romagem, um após o outro,
quinze salmos direto sem pausa, sem comentários, do Salmo 120 ao Salmo 134. Ele se importava
comigo como uma pessoa imersa em uma experiência muito desagradável. Ele disse mais tarde que a
única coisa que estava pensando era que ele sabia do meu amor pelos Salmos. Ele achou que ler
salmos seria uma coisa boa já que eles são lúcidos, honestos, sensatos e cheios do Senhor. Ele estava
certo.
Quando ele terminou, fui reconectado a mim mesmo. E então ele orou por mim. E agradeço de
coração a Deus. Os Salmos trazem Deus para junto de uma pessoa.
Por que e como eu mudei? Eu fui mudado porque Deus me encontrou quando eu mesmo não era
capaz de me localizar. Eu fui mudado porque palavras de fé são palavras de sanidade e realidade. Eu
fui mudado porque um amigo fez algo inédito. Eu fui mudado porque um efeito colateral brutal de
anestesia e uma cirurgia de grande porte me fizeram precisar de ajuda. Eu mudei porque creio,
conheço, preciso e confio no Senhor que está presente em todo o livro de Salmos – então eu pude
ouvir a sua voz.
LEVANDO PARA O LADO PESSOAL
Há muito tempo, em muitos momentos e de muitas maneiras, Deus falou aos nossos pais dizendo:
“Não temas”. Nosso hino capta a lógica do Senhor em Isaías:
RESPOSTA: “Não temas.”
RAZÃO: “Pois eu sou contigo.”
RESPOSTA: “Não desanimes.”
RAZÃO: “Pois sou o teu Deus.”
Aqui está uma versão anterior da mesma mensagem, em Deuteronômio 31.8:
RAZÃO: “O SENHOR é quem vai adiante de ti; ele será contigo, não te deixará, nem te desamparará.”
RESPOSTA: “Não temas nem desanimes.”
E aqui está uma versão subsequente dessa mensagem, em Filipenses 4.5-6:
RAZÃO: “Perto está o Senhor.”
RESPOSTA: “Não andeis ansiosos de coisa alguma.”
Você levará a sério essa dinâmica de razão e resposta? Se sim, sua vida nunca mais será a mesma.
Ao lutar para levar isso a sério, o Senhor estará reescrevendo a forma como você experimenta o
estresse, ansiedade, pressão e ameaça.
Considere este capítulo como um tipo de workshop. Pegue o seu sofrimento mais significativo ou
alguma outra dificuldade que tem a tendência de lhe causar agitação e aflição e preencha os espaços
em branco nestas frases.
Porque é verdade que ______________________________,
eu não tenho medo de ______________________________.
Não estou desanimado por ________________________,
porque _____________________________________________.
Você pode dizer isso e realmente ter a intenção de dizê-lo? O que o impede? Lute com Deus,
pedindo para que ele escreva o que é verdadeiro em seu coração.
Orar significa pedir algo que você precisa. Uma oração é um pedido de ajuda. Aqui está como eu
parafraseio o Salmo 102.1-2 para destacar a intensidade e a honestidade com as quais você pode
lutar.
SENHOR, ouve o que estou pedindo.
Permite que o meu clamor por ajuda chegue a Ti.
Não escondas Teu rosto de mim – em um momento tão angustiante!
Aproxima-te e ouve-me de fato.
No exato momento em que chamo, responde rapidamente a mim!
Você pode falar dessa maneira com Deus. Você precisa da graça do Único que o salvará. Agora
mesmo. Ele dá razões pelas quais você pode dizer isso, ter a intenção de dizê-lo de fato e viver isso
por todos os seus dias!
J. I. Packer, em Packer e Mark Dever, In My Place Condemned He Stood: Celebrating the Glory of the Atonement (Wheaton, IL:
Crossway, 2007), 113.
CAPÍTULO 5
EU SOU CONTIGO PARA
UM PROPÓSITO
A terceira estrofe de “Que Firme Alicerce” examina um dos mais profundos mistérios de como
Deus nos encontra em nossos sofrimentos.
Quando por águas profundas te chamo a passar,
rios de tristeza não transbordarão;
pois serei contigo, para teus problemas abençoar,
e tua mais profunda angústia santificar.
Palavras de Isaías 43 (especialmente 43.2) fluem através desta estrofe. Seus problemas são vistos
como águas profundas e rios inundados. Isaías alude a quando o povo de Deus se viu diante do Mar
Vermelho com inimigos atrás de si, e a quando enfrentaram o rio Jordão no período de inundação.
Nenhum ser humano poderia traçar um caminho através de tais dificuldades.
Deus novamente declara sua promessa fundamental, desta vez com um olhar para o futuro: “Eu
serei contigo”. Isso em si é significativo, pois os efeitos da maioria dos sofrimentos significativos se
estendem para um futuro indeterminado. Precisamos de muito mais do que ajuda no momento
presente. O que exatamente significa que Deus será contigo em meio a forças destrutivas? O que
significa que ele irá “abençoá-lo e santificá-lo” em meio a seus problemas e aflições?
Ao prometer isso, Deus explicitamente não quer dizer que lhe dará um mero conforto e
sentimentos calorosos por um amigo estar ao seu lado em tempos difíceis. Deus está ao seu lado, mas
ele desempenha um papel muito mais ativo e poderoso.
O CUIDADO SOBERANO DE DEUS PELOS SEUS
Essa estrofe completa o significado com quatro vastas verdades, quatro maneiras que ele
personaliza no detalhe aquilo que está fazendo no esquema geral da História de Israel (o contexto
original de Isaías 43):
• O próprio Deus o chama às águas profundas.
• Deus estabelece um limite para suas tristezas.
• Deus está com você ativamente trazendo bem a partir de seus problemas.
• No contexto de ocasiões angustiantes, Deus o transforma.
Isso é algo arrebatador: soberania elevada e proposital – um grande Deus que se aproxima para
falar com ternura, trabalhar pessoalmente, fazê-lo diferente, terminar o que começa.
Em outras palavras, seus sofrimentos significativos não acontecem por acaso. Não é uma
probabilidade aleatória. Não é miséria sem propósito. Não é má sorte. Nem mesmo (e entenda isso
do jeito certo) uma tragédia. Tragédia significa ruína, destruição, queda, um final infeliz sem
redenção. Sua história de vida pode conter muita miséria e sofrimento ao longo do caminho. Mas no
final, em Cristo, sua história de vida provará ser uma comédia no sentido original da palavra, uma
história com um final feliz. Você faz parte da Divina Comédia, como Dante a chama, com o final mais
feliz de qualquer história já escrita. Morte, luto, lágrimas e dor não existirão mais (Ap 21.4). Vida,
alegria e amor têm a última palavra. A Soberania elevada de Deus possui um propósito.
As pessoas perdem esse ponto quando fazem “a soberania de Deus” soar fatalista e determinista.
Mas a providência ativa de Deus em nossas vidas não é como o kismet islâmico, ou que sera sera,
ou apenas ser realista, filosófico e resignado com as dificuldades da vida. Os propósitos soberanos
de Deus não incluem o objetivo de fazê-lo simplesmente aceitar seus problemas. Ele não está
interessado em lhe oferecer alguma perspectiva cognitiva para ajudá-lo a passar por uma fase difícil.
Ele está trabalhando para que você o conheça, para que confie nele, para que o ame.
Essa estrofe expressa os propósitos amáveis do Mais Alto Deus. Mas não faz pouco de suas
dificuldades. Não há objetividade fria nessas palavras. Cada verso se refere cuidadosamente à dor
de sofrimentos profundos. Deus fala pungentemente, não com frieza, sobre “águas profundas”, “rios
de tristeza”, “problemas”, “profunda angústia”. De fato, o hino original (com a linguagem mais
formal do século 18) expressa o segundo verso ainda mais graficamente: “Os rios da miséria não vos
transbordarão”. Miséria é a mais aguda das angústias, a extremidade da aflição, a tristeza elevada ao
mais alto grau de dor.
Os rios da miséria não vos transbordarão.
Esses rios varrem muitas coisas boas. Sua angústia mais profunda é profundamente angustiante.
Mas o Deus que o ama é Senhor de sua tristeza significativa. Ele o chama para passar até mesmo por
essa dificuldade. Ainda que a miséria pareça impossível, ainda que a miséria devaste as esperanças
terrenas, Deus estabelece um limite (mas não onde nós o estabeleceríamos). Ele o convence de que
dessa dificuldade se tornará em bem além de tudo que você possa pedir, imaginar, ver, ouvir ou
conceber em seu coração (Ef 3.20; 1Co 2.9). Você passará pelo vale da sombra da morte repleto de
males e inimigos, mas sairá dizendo que a bondade e misericórdia o seguiram todos os dias da sua
vida enquanto retornava para a casa do seu Pastor (Sl 23).
Deus é Deus. Seu reino é elevado e proposital, e se estende até os detalhes. Mas muitas vezes
aplicamos mal a soberania de Deus quando se trata de realmente ajudar os que sofrem – nós mesmos
e os outros. Aqui está uma má aplicação comum. “Deus está no controle, portanto o que está
acontecendo é a vontade dele. Você precisa apenas confiar no Senhor e aceitar isso. Ignore seus
sentimentos. Lembre-se da verdade. Cinja os seus lombos. Adeque-se ao programa”. Conclusões
estóicas são feitas a partir de uma verdade nada estoica sobre um Deus nada estoico! Na Bíblia,
Deus é tremendamente comprometido com o bem de seus filhos. Parte desse bem é aprender a ser
honesto da forma como os Salmos são honestos.
A CONFIANÇA DA ALMA NO CUIDADO SOBERANO
O texto clássico cuja aplicação pastoral muitas vezes escorrega para o estoicismo é 1 Pedro 4.19:
“Também os que sofrem segundo a vontade de Deus encomendem a sua alma ao fiel Criador, na
prática do bem”. Mesmo quando você lê essas palavras, parece que a Bíblia coloca panos quentes na
dor? Pedro está ensinando uma versão santificada de um distanciamento tranquilo e autodisciplina
obediente? Ele está dizendo: “Não importa que você esteja sofrendo. Deus está no controle, então
apenas continue com seu tempo a sós com Deus e cumpra com suas responsabilidades”? Deus faz
com que as águas profundas cheguem apenas na altura da cintura? Será que ele canaliza os rios da
miséria para que eles fluam suavemente por entre os blocos de enrocamento? Será que ele santifica o
estresse tornando-o não-estressante? Será que ele o chama para ignorar o que está acontecendo ao
seu redor a fim de continuar a ser um cristão? Veja cuidadosamente como encomendar a sua alma a
um fiel Criador. Você nunca lerá 1 Pedro 4.19 da mesma maneira. Como é realmente essa
encomenda?
Primeiro, considere o Salmo 28 de Davi. Ele apresenta um exemplo vigoroso e ardente do que
significa encomendar sua alma ao soberano Deus.
“A ti, Senhor, eu clamo.
Minha Rocha, não sejas surdo para comigo.
Se tu não me responderes, morrerei.
Ouve a voz das minhas súplicas,
meu clamor por socorro a ti”. (28.1-2)
Essas palavras não são calmas, serenas e tranquilas. Davi não ensaia mentalmente o fato de que
Deus está no controle, a fim de prosseguir tranquilamente com uma compostura inabalável. Em vez
disso, ele pede de forma sincera e crédula a Deus: “Isso é um grande problema. Tu precisas me
ajudar. Eu preciso de ti. Tu és minha única esperança”. Orar significa pedir algo que você precisa e
quer. Súplica significa realmente pedir. A súplica franca é o que há de mais distante de manter tudo
em perspectiva, para que você possa continuar com a vida normalmente. A súplica não ensaia
mentalmente perspectivas tranquilas sobre os problemas da vida. A súplica implora por ajuda a
Alguém que possa ajudar.
O soberano Deus não tem a intenção de que você mantenha o status quo enquanto sofre. A dor
atrapalha o normal. Deveria atrapalhar o normal. Deveria fazer você sentir necessidade de ajuda. O
Salmo 28 não é um “tempo a sós com Deus” tranquilo e em ordem. É barulhento e necessitado.
Quando deixa que os problemas da vida cheguem até você, você é levado ao único que pode ajudar.
À medida que o Salmo 28 se desenrola, Davi nomeia especificamente o problema pelo qual está
passando, do que ele tem medo, o que ele quer. Sua confiança no cuidado soberano de Deus se
transforma em confiança contente. Por fim, sua fé se desenvolve em amor. Ele começa a interceder
em nome de outros que também precisam ser fortalecidos, salvos, protegidos, abençoados, guiados e
acompanhados!
Segundo, observe como o Salmo 10 expressa confiança em um Deus fiel. Sua vida está sendo
ameaçada por pessoas predatórias que lhe dão uma boa razão para estar apreensivo. Você começa a
encomendar sua alma gritando: “Por que estás longe de mim, ó Senhor? Onde estás? Por que te
escondes nas horas de tribulação”? Isso é um apelo de fé, não uma acusação amarga. É o oposto de
se queixar com Deus: “Onde estavas quando precisei de ti? É tua culpa que eu esteja sofrendo,
porque poderias ter impedido”. Tanto os estoicos quanto os acusadores têm uma visão mecânica do
controle soberano de Deus, separando-o de seus propósitos. Para os estoicos, o controle de Deus
sobre o sofrimento racionaliza o distanciamento frio. Para os acusadores, torna-se motivo para
acusações acirradas.
Quando confia no governo soberano de Deus, nas promessas e propósitos, você fala sobre as
implicações com ele. Em vez de ignorar a situação e os sentimentos de ameaça, em vez de encontrar
um consolo tranquilo (mas irreal), em vez de apenas manter-se ocupado dando continuidade aos
negócios como sempre, em vez de acusar, o salmista toma tempo até mesmo para pensar
cuidadosamente sobre os processos de pensamento dos ímpios (10.2-11, 13). Seu escopo de
preocupação vai além de sua situação, a todos aqueles que são pobres, desamparados, humildes,
órfãos, oprimidos. Ele pensa em como a mão de Deus repousa de maneira diferente sobre os
malfeitores e os que sofrem (10.12, 14-18). Podemos dizer que as coisas da terra definitivamente
não crescem estranhamente obscuras. Em vez disso, crescem muito mais claras à luz de sua glória e
graça! Este salmo chega a um momento de resolução e confiança. Mas a confiança nunca anestesia a
ameaça. Assim, encomendar a um Criador fiel termina com um pedido:
“para fazeres justiça ao órfão e ao oprimido, a fim de que o homem, que é da terra, já não infunda terror” (10.18).
Isso não é calmo, sereno e tranquilo. É fé trabalhando através do amor.
Finalmente, os Salmos 22.1 e 31.5 foram audíveis nos lábios de Jesus, porque esses salmos
estavam em seu coração quando ele encomendou sua alma a Deus. Hebreus 5.7 refere-se a este
momento como sendo caracterizado por “forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia
livrar da morte”. Jesus dificilmente ignorou seus sentimentos, ou os viu como um subproduto
inconveniente de processos cognitivos! Estes são salmos de intensa aflição. Você vê o que estava na
mente de Jesus quando ele derramou seu coração. Ele exclamou: “Meu Deus, meu Deus, por que me
desamparaste?” (Mt 27.46; Mc 15.34) porque ele cria que o Deus soberano não tratava com
leviandade “a dor do aflito”; que Deus não se afastaria de nossos problemas em consternação; que
Deus não se distancia e ignora a necessidade nua (Sl 22.24). Ele não nos abandona. Ele ouve e age.
Outras pessoas frequentemente se distanciam do sofrimento. Eles o minimizam, afastam-se com
desgosto, olham para o outro lado ou culpam a vítima. Mas este Deus ouvirá nosso clamor.
O ato final de confiança de Jesus foi expresso em palavras do Salmo 31.5: “Nas tuas mãos entrego
o meu espírito” (Lc 23.46). Fora do contexto, essas palavras podem parecer calmas, serenas e
tranquilas. Mas, no contexto, elas são tudo menos calmas. Este é um apelo de necessidade de um
homem totalmente comprometido tanto com seus problemas quanto com seu Deus. As emoções do
Salmo 31 expressam como a fé confia em meio ao perigo e à angústia. As emoções da fé vão do
medo à coragem, da tristeza à alegria, do ódio ao amor, da necessidade à gratidão.
Agora, vamos conectar isso de volta a 1 Pedro 4.19. O “encomendem [suas] almas a um fiel
Criador” de Pedro usa a mesma palavra grega que o “eu entrego o meu espírito” de Jesus. Pedro nos
chama intencionalmente ao padrão da fé angustiada de Jesus na cruz.
A providência soberana e elevada de Deus em todas as coisas tira o pânico da vida. Razões para
o desespero desaparecerem. Mas, entenda isso corretamente, e você nunca será apático e friamente
desapegado. Os propósitos de Deus são para santificar você. E seu tipo de santificação visa um
compromisso vibrante com as condições reais e imediatas da vida, tanto as boas quanto as más. As
expressões contrastantes “Tudo o que há em mim, bendiga alegremente ao seu santo nome” (cf. Sl
103.1) e “Ouve a minha angustiada súplica” (cf. Sl 102.1) fluem ambas da santificação. Cristo se
opõe impetuosamente ao distanciamento frio. É o oposto do que ele é. Deus lhe ensinará a
experimentar a vida da maneira que os salmos a expressam.
MINHA HISTÓRIA
Durante um período da minha vida, eu (involuntariamente!) ganhei alguns inimigos. Tive que
enfrentar repetidamente insultos públicos e privados. Doeu. Ser xingado e ter mentiras espalhadas
sobre você irrita profundamente: “Isso é tão errado! Isso é completamente injusto”!
Como essas pessoas eram em sua inimizade? Elas eram hostis. Elas zombavam. Elas não queriam
ter nada comigo. Elas não queriam reconciliação. Aos seus olhos, eu era um anátema, um malfeitor. À
luz do meu mal aparente, elas se sentiram justificadas em sua acusações condenatórias.
Uma das surpresas que surgiu ao me tornar cristão foi a descoberta de que havia pessoas que me
odiavam por causa do que eu acreditava. Uma das surpresas de crescer como cristão foi a descoberta
de que algumas das pessoas que me odiavam eram cristãos professos. E uma das grandes bênçãos
compensatórias de amadurecer como cristão foi perceber o quão perfeitamente os Salmos sintonizam
com nossos corações ao enfrentarmos malícia e mentiras. Sabemos que Davi escreveu suas palavras
para si mesmo. Sabemos que Jesus fez dessas palavras suas. E descobrimos que essas palavras
também são escritas para nós. Foi assim que o Salmo 31 ganhou vida na minha experiência.
Enfrentei inimigos, mas encontrei um inimigo mais sério residindo em meu próprio coração.
Fiquei excessivamente preocupado, estressado e distraído. As maneiras como estava sendo
maltratado tomavam quase toda minha atenção. O mal preocupante era o anseio de ser justificado, de
ser entendido com precisão, de ser tratado com justiça. Quando tomava banho, ou quando acordava à
noite, ou quando alguém perguntava sobre as acusações, minha mente se ocupava criando respostas
para as coisas falsas e zombeteiras que estavam sendo ditas. A tentação de retribuir o mal com o mal
assume muitas formas. Retribuir insulto com insulto não era minha tentação particular (embora tais
pensamentos estivessem às vezes presentes). Minha armadilha era tentar responder a acusações
falsas e ofensivas construindo uma autojustificativa defensiva. Esforcei-me por vários meses. Eu
precisava de ajuda.
E Deus ajudou. Ele não me deixou afundar em águas profundas. Ele estava comigo para abençoar
meus problemas e santificar minha angústia. Ele usou muitos meios de graça e levou um tempo, mas
aqui estão as principais notas de como ele fez isso.
Aconteceu que o retiro de inverno de nossa igreja naquela ocasião focou em descobrir os pontos
de contato em que cada um de nós precisava que a mão e a voz de Deus trabalhassem em nossas
vidas. Assim que essa meta foi introduzida para o fim de semana, eu sabia que minha reação errada
ao erro era a questão do momento. Eu vi o erro de tentar a autojustificação em face da condenação
injusta. Os julgamentos de Deus são precisos, misericordiosos e decisivos. Eu estava me
desgastando demais com o julgamento de alguém. Minha preocupação levou a pecados de omissão
enquanto estava distraído em vez de atento à minha família, amigos, alunos e colegas. Minha
preocupação era motivada pelo medo do homem, pelo orgulho, pelo desejo de ser compreendido e
pelo amor à boa reputação. Simplesmente nomear a questão trouxe uma medida de perspectiva e
propósito.
Ao final da palestra da primeira noite, nosso pastor pediu para que cada um de nós ponderasse
qual passagem da Escritura poderia trazer palavras de vida à questão com a qual estávamos lutando.
Depois de pensar um pouco, escolhi os versos finais do Salmo 31.
Como é grande a tua bondade,
que reservaste aos que te temem,
da qual usas, perante os filhos dos homens,
para com os que em ti se refugiam!
No recôndito da tua presença, tu os esconderás das
tramas dos homens,
num esconderijo os ocultarás da contenda de línguas.
Bendito seja o SENHOR,
que engrandeceu a sua misericórdia para comigo,
numa cidade sitiada!
......................
Sede fortes, e revigore-se o vosso coração,
vós todos que esperais no SENHOR. (Sl 31.19-21, 24)
Essas palavras falaram. Elas me cativaram por seu discernimento, intimidade e vigor. Elas
capturaram minha experiência de ameaça e como é ser assediado por palavras hostis. Elas
inspiravam segurança e bondade na presença protetora do Senhor. O último verso do salmo me
chamou para retornar energicamente à vida, à família e ao ministério.
Fiquei fascinado com esta imagem de como nosso Deus reserva e usa o bem, e como ele nos
esconde e nos oculta dentro de sua bondade. “Contenda de línguas” me deu palavras para nomear o
que estava acontecendo comigo. Eu me arrependi de tentar agir como defensor do reino da minha
reputação. O Senhor perdoa de forma abundante, e ele tornou sua bondade maravilhosa para mim.
Abandonei o desejo de convencer meus agressores, perdoei-os e resolvi buscar a paz se surgisse
uma oportunidade (vários esforços foram rejeitados). Aquela carga final – “Sede fortes, e revigore-
se o vosso coração!” – mexeu comigo como o tocar de uma gaita de foles.
Ataques verbais, minhas reações pecaminosas, os motivos depravados do meu coração, uma
passagem libertadora da Escritura e um pastor sábio combinaram-se para animar o meu trato da
situação, orações e aceitação. Eu estava significativamente liberto para deixar a preocupação de lado
e me concentrar nas pessoas e tarefas que Deus havia colocado diante de mim. As mudanças não
foram instantâneas, mas se desdobraram ao longo de vários meses.
Mais uma pessoa merece menção honrosa no processo. Um homem mais velho e sábio
desempenhou um papel crucial em colocar tudo isso nos eixos para mim. Ele é um homem em quem
as palavras de Deus habitam ricamente e então saem agradáveis, iluminadas, oportunas e vivas. Eu
não o conhecia muito bem antes, mas uma conversa longa e abrangente estabeleceu nossa amizade.
Ele me ajudou a avaliar corretamente todos os componente do jogo. Ele afirmou que as acusações
feitas eram infundadas, e que eu deveria ver tais palavras como andorinhas que voam ao redor e
nunca pousam (Pv 26.2). Mas ele observou que a inimizade ainda dói. Pessoas que dão falso
testemunho são comparadas a maças, espadas e flechas agudas (Pv 25.18); a vítima de palavras
precipitadas sente-se apunhalada com uma espada (Pv 12.18).
Acontece que ele havia conhecido meus acusadores anos atrás, que um deles havia sido
excomungado de uma igreja por causa de divisões, e outro era uma bomba relógio que nunca havia se
unido a uma igreja. Meu amigo havia sido ele próprio publicamente difamado por um deles no
passado. Ele me lembrou que você nunca pode fazer as pazes com uma pessoa facciosa (Tt 3.9-11).
Ele me encorajou a deixar isso para trás e seguir em frente, a amar as pessoas que Deus me chamou
para amar e a fazer as coisas que Deus me chamou para fazer. Acima de tudo, ele reafirmou e também
incorporou a bondade e a benignidade de nosso Deus. Ele reafirmou e também incorporou que o
Senhor simpatiza conosco em nossas aflições. Ele reafirmou e também incorporou como o cuidado
do Senhor é protetor e construtivo. Conforme conversamos, pensei na segunda metade de Provérbios
12.18 que ele havia mencionado: palavras precipitadas apunhalam, mas “a língua dos sábios é
medicina”. Obrigado, meu amigo.
Coisas insondáveis estão em operação no centro do porquê e do como nós mudamos e
amadurecemos. Um processo orgânico, dinâmico e relacional – em que cada elemento é tocado pela
presença, mão e voz de Deus – escapa à nossa capacidade de analisar, explicar, roteirizar ou
controlar. Estamos lidando com o trabalho contínuo do Oleiro que trabalha em seu barro, a fim de
nos tornar mais parecidos com ele em todos os sentidos comunicáveis a uma criatura. Variações
infinitas de múltiplos fatores estão em ação. Não há duas histórias iguais. O próprio Deus está
envolvido nisso tudo. O processo nunca é quantificável. Dito isso, em termos gerais, variantes de
cinco fatores se entrelaçam na minha história e em todas as histórias de como a graça dele funciona
nas dificuldades de nossas vidas.
Primeiro, o próprio Deus é o autor da vida. Ele faz viver. Ele se importa. Ele fala. Ele pastoreia.
Ele inicia. Ele responde. Ele poda. Ele disciplina. Ele anima. Ele fortalece. Ele protege. Ele perdoa.
Ele conduz. Ele ouve. Nós, que somos ignorantes e desobedientes, vivemos em contínuo
relacionamento com Aquele que conhece todas as coisas e sempre se envolve conosco. Na história
que acabei de contar, ele estava trabalhando.
Segundo, nós, a humanidade, somos duplamente afligidos. Lutamos com inúmeros sofrimentos e
com a loucura em nossos corações. Lutamos porque coisas difíceis chegam até nós de fora e porque
coisas sombrias saem de dentro de nós. Nossa experiência, objetiva e subjetivamente, clama em
necessidade da graça que intervém. Na história que acabei de contar, senti a dor da hostilidade e a
pressão das mentiras. Lutei dentro dos emaranhados da autopreocupação e do impulso de me
justificar.
Terceiro, a Palavra de Deus traz luz e misericórdia às trevas e desvios. Por meio de palavras,
aprendemos o amor salvífico do Pai, do Filho e do Espírito Santo. É de acordo com estas palavras
que o Agricultor, o Pastor e o Doador da vida reescrevem o roteiro de nossas vidas. Na história que
acabamos de contar, o Salmo 31 comunicava o recôndito de sua presença, repleto de bondade. Seu
apelo à força e ao vigor foi eficaz.
Quarto, outras pessoas trazem a graça de Deus. Os ministérios públicos da igreja e os
ministérios pessoais de pessoas sábias unem-se para transmitir a graça de Deus com uma voz da
experiência em primeira mão, um coração amoroso e uma mão amiga. Na história que acabei de
contar, o contexto do ensino e da reflexão dirigida no retiro foi um significativo meio de graça. O
conselho sábio do meu amigo consolidou muitos aspectos díspares.
Quinto, nós mesmos nos voltamos das trevas para a luz. Nós mesmos levamos suas palavras a
sério. Nós confiamos nossas próprias vidas às mãos de Deus. Nós agimos de forma diferente. Na
história que acabei de contar, respondi à promessa de bondade dele. Perdoei meu agressor e desisti
de tentar me justificar. Redirecionei meu tempo e energias para onde eles pertenciam.
LEVANDO PARA O LADO PESSOAL
Qual “categoria” de sofrimento significativo você tem focado enquanto lê? Problemas de saúde e
hostilidade interpessoal, como nas minhas três histórias? Uma vítima de violência verbal, física ou
sexual? Problemas financeiros? Preconceito e rejeição por causa de sua raça, sexo, fé, deficiência,
status socioeconômico ou algum outro preconceito socialmente incorporado? As consequências de
uma falha moral? Alguma outra dificuldade?
Assim como eu mudei de sofrimentos de saúde para sofrimento interpessoal, existe algum
infortúnio diferente em sua vida que Deus deseja que você enfrente proveitosamente. Coloque o Deus
da terceira estrofe do nosso hino em contato com o seu problema. Ele “santificará a sua mais
profunda aflição”.
CAPÍTULO 6
MEU PROPÓSITO AMOROSO É A SUA TRANSFORMAÇÃO
A quarta estrofe de “Que Firme Alicerce” torna o propósito de Deus ainda mais explícito. Ele
planeja o seu sofrimento significativo por três razões. Ele está revelando sua generosidade
permanente em relação a você. Ele está removendo tudo o que é pouco generoso em você. Ele o está
tornando permanentemente generoso.
Quando por provas de fogo teu caminho passar,
minha graça, toda suficiente, teu suprimento será;
a chama não te ferirá; eu apenas planejo
Para tua impureza consumir e teu ouro refinar.
Nosso misericordioso Senhor está “conosco” para trabalhar esse propósito. A metáfora de provas
de fogo que não podem machucá-lo vem de Isaías 43.2. Mas a promessa central desta estrofe vem de
1 Pedro 1.6-9. Pedro usa a metáfora de uma fornalha de fundição. Você é uma criatura misturada - e
bagunçada. Nas mãos de Deus, experiências de sofrimento purificam-no. O amor dele trabalha para
tirar o que está errado com você: sua impureza. O resultado é um crescente amor e alegria para com
Deus em Cristo, e um amor mais sincero pelos outros: seu ouro. Pedro diz que esse é o fruto da fé,
porque você nunca viu Jesus. Mas ele se torna mais e mais real no contexto das provas de fogo.
Vamos olhar primeiro para a impureza e depois para o ouro.
TUA IMPUREZA CONSUMIR
Na maioria das vezes, estamos certos em separar os sofrimentos dos pecados. O que você faz é
diferente do que acontece com você. Seus pecados são coisas ruins sobre você como um agente
moral. Seus sofrimentos são coisas ruins que acontecem com você. Agente e vítima são opostos em
princípio. Até aí, tudo bem. A maior parte deste livro se concentrou naturalmente nas coisas que
acontecem a nós. Como nova criação em Cristo, você vive em um relacionamento essencialmente
diferente com seus sofrimentos.
Mas vale a pena notar que você, como nova criação em Cristo, também vive em um
relacionamento essencialmente diferente com sua própria pecaminosidade. O seu pecado agora o
aflige. A impureza dos seus pontos cegos e dos pecados constantes não mais o define ou encanta. O
pecado que habita em você se torna uma forma de sofrimento significativo. Aquilo que você uma vez
amou instintivamente agora o atormenta.
Com quais pecados você ainda luta? Esquecer-se de Deus e agir como se a vida girasse em torno
de você? Uma escrupulosidade religiosa obsessiva que mata a sua humanidade? Orgulho defensivo e
autoafirmativo? Preguiça ou impetuosidade, ou uma oscilação entre ambos? Irritabilidade,
julgamento e reclamação? Impulsos imorais e fantasias? Preocupação obsessiva com dinheiro, com
comida ou com entretenimento? Medo do que os outros pensam a seu respeito? Inveja de coisas boas
que outra pessoa desfruta? Esconder a verdade em meias verdades para forjar sua imagem? Falar
palavras vazias ou mesmo destrutivas, ao invés de sabedoria nutritiva, construtiva e graciosa? Esses
são os pecados endêmicos diários. Talvez você reconheça os “sete pecados capitais” (e alguns
extras) dentro dessa lista da loucura mundana de nossos corações! Posso me identificar com cada um
deles e suspeito que você também possa. Nosso Pai nos ama com misericórdias a cada nova manhã,
mais numerosas do que os cabelos de nossas cabeças. Ele é bom e faz o bem. Ele escolheu nos amar.
E nós realmente o amamos – como crianças de rua que ele resgatou e adotou. Mas nosso amor está
longe de ser perfeito. C. S. Lewis capturou com perfeição nossa luta contínua, crescente e cada vez
mais profunda com tudo aquilo que precisa das misericórdias redentoras de Deus:
O amor do homem por Deus, pela própria natureza do caso, deve sempre ser em grande parte, e com frequência é
inteiramente, um amor de necessidade. Isso é óbvio quando imploramos perdão pelos nossos pecados ou apoio em nossas
tribulações. Mas, a longo prazo, talvez isso seja ainda mais aparente em nossa crescente – pois ela deve estar crescendo –
consciência de que todo o nosso ser, por sua própria natureza, é uma grande necessidade; incompleto, introdutório, vazio, no
entanto bagunçado, clamando por Aquele que pode desamarrar coisas que agora estão amarradas juntas e atar coisas que
ainda estão balançando soltas.13
Se nos encontramos amarrados ou balançando em pontas soltas, ele ouve o nosso clamor. Ele diz:
“Você é meu. Então tenha coragem. Eu completarei o que comecei”.
A mudança essencial em seu relacionamento com Deus muda radicalmente seu relacionamento
com a pecaminosidade remanescente. Em Cristo, para pecar, você deve cair na insanidade
temporária, no esquecimento. É o seu pior câncer, sua deficiência mais deformadora, seu inimigo
mais traiçoeiro, sua angústia mais profunda. É a força mais destrutiva causando impacto na sua vida.
Como nada mais em toda a criação, isso ameaça sua vida e seu bem estar.
Dizer que nossos pecados nos afligem como uma loucura não é justificar ou desculpar nosso
transtorno. Seu pecado é seu pecado. Quando você vira as costas em uma discussão, quando vegeta
na frente da TV, quando tece um mundo de fantasia de romance ou erotismo, quando resmunga sobre o
tempo, quando fica obcecado com seu desempenho aos olhos de outras pessoas importantes, quando
se preocupa, critica ou fofoca, você faz essas coisas. Nenhum gêmeo do mal, nenhum hormônio,
nenhuma agência satânica, e nenhum aspecto de sua criação pode levar crédito ou culpa pelas obras
da sua carne. Você faz isso. Você quis fazer isso... mas você não quer realmente, quando recupera os
sentidos. E você de fato volta a seus sentidos. A consciência dupla conflituosa do cristão sempre cai
em si. Você se afasta e comete pecado. Mas depois volta para o Senhor, porque está mais
comprometido com ele. E você está mais comprometido com ele porque ele está absolutamente
comprometido com você, e a nova criação já está trabalhando em você. Muitos salmos captam essa
tensão entre nossa propensão ao pecado e nossa fidelidade ao nosso Redentor do pecado. Eles
confessam a vitalidade obscura do pecado interior enquanto confessam amor pelas misericórdias e
bondade triunfantes do Senhor.14
Em momentos de autoconhecimento em sanidade, você enxerga suas tendências sombrias como
uma aflição: “Eu sou o que de fato não quero ser. Eu faço o que de fato não quero fazer. Eu sinto o
que de fato não quero sentir. Eu penso o que de fato não quero pensar. Eu quero o que de fato não
quero querer”. Você conhece a contradição interna: “Quero amar a Deus com alegria, mas me
enrosco na autopreocupação. Quero amar os outros de forma franca, mas caio na falta de amor. Quero
perdoar, mas me aconchego na amargura. Quero dar aos outros, mas descubro que tiro deles ou os
ignoro. Quero ouvir e aprender, mas descubro que sou teimoso e limitado. Meu maior problema me
olha do espelho”.
Mas o pecado interior não define você. Ele se opõe a você. É uma aberração, não uma identidade.
A vontade própria é uma contradição viva dentro de você. Então você olha muito além do espelho:
“Senhor Jesus, o teu amor por mim terá a última palavra. Tu és misericordioso comigo por causa do
teu nome, por causa da tua própria bondade, por causa do teu constante amor e compaixão (Salmo
25). Quando tu pensas em mim, tu te lembra como tu és, e essa é a minha maior alegria. Minha
esperança indestrutível é que viraste a tua face para mim e tu nunca a afastarás.
Todas as promessas do nosso hino se aplicam ao sofrimento significativo do mal interior, bem
como aos males que vêm do seu exterior. Você provavelmente não identificou inicialmente um padrão
do pecado interior como seu sofrimento mais significativo. Mas junte os dois. Como Deus usa seu
problema externo conhecido para revelar os pecados nos quais ele está trabalhando internamente?
Como você sabe que ele o livrará dos pecados que o afligem? Ele consumirá sua impureza no fogo
de seu amor por você.
TEU OURO REFINAR
Como é o seu ouro? A primeira coisa a notar é que é o seu ouro. Deus começou em você uma boa
obra de fé e amor. Anteriormente retratei como a fé pensa e fala de acordo com a paixão inteligente
dos Salmos. E essa fé leva a um lugar muito, muito bom. Aqui examinaremos dois aspectos
fundamentais do amor que a fé produz. As coisas boas mais memoráveis que o planeta já viu ou
jamais verá só podem surgir no contexto do sofrimento. Vamos olhar primeiro para a perseverança
corajosa e depois para o amor sábio. O fogo do refinador produz ouro a partir da aflição.
1. Graça ensina coragem. Quando Deus diz: “Não temas”, seu objetivo não é que você
simplesmente se acalme e experimente uma relativa ausência de medo. Ele não diz: “Não tenha
medo. Tudo vai dar certo. Pode relaxar”. Em vez disso, ele diz: “Não tenha medo. Eu sou contigo.
Portanto, seja forte e corajoso”. Você percebe a diferença? As águas profundas não desapareceram.
Problemas ainda o pressionam. O oposto do medo é coragem, não serenidade imperturbável. O
destemor é corajoso em face de coisas temíveis. Ele avança construtivamente em meio ao estresse
que não é nada bom. Coragem significa mais que liberdade de sentimentos ansiosos. Perseverança é
um proposital “descansar à sombra” do que é difícil e doloroso, e considerar os outros mesmo
quando você não se sente bem com isso.
Existem inúmeras maneiras de simplesmente diminuir a ansiedade: exercício vigoroso, obter
todos os fatos, Prozac, terapia cognitivo-comportamental, encontrar o melhor médico possível, ioga,
férias nas Bermudas, uma taça de vinho, distanciar-se do problema, encontrar apoio de companheiros
sofredores, ocupar-se totalmente com o trabalho. Algumas dessas coisas tem o seu lugar. Mas
nenhuma delas fará com que você seja destemido diante de problemas. Nenhuma delas cria aquele
resiliente fruto do Espírito chamado “perseverança”, que aparece repetidamente quando o Novo
Testamento fala sobre os propósitos de Deus no sofrimento. Nenhuma das estratégias para a paz
pessoal lhe dá disposição e poder para amar outra pessoa com consideração nas pequenas escolhas
da vida diária. Nenhuma delas lhe dá alegria ao saber que toda a sua vida é um experimento sagrado,
à medida que as mãos de Deus moldam-no à imagem de seu Filho. Nenhuma delas muda a maneira
como você sofre, incorporando-a a um significado mais profundo. Nenhuma lhe dá razão para
perseverar em dar frutos em todos os seus dias, mesmo que o escopo de sua obediência seja restrito
às suas interações com enfermeiras à beira do seu leito.
2. A graça ensina amor sábio. Na verdade, a perseverança destemida tem como propósito o amor
sábio. Deus está tornando-o semelhante a Jesus nas dificuldades da vida real. Jesus combina duas
qualidades que raramente andam juntas: a verdadeira compaixão e o conselho de reorganização da
vida. Ele pretende combiná-los em você. Alguns que auxiliam se importam intensamente, mas não
sabem o que dizer. Eles sentem uma compaixão desamparada. Eles oferecem banalidades. Eles
reforçam a autocomiseração e o direito dos vitimados. Outros dispensam conselhos, mas não entram
na difícil situação de quem sofre. Eles servem conselhos frios. Eles se tornam impacientes quando o
sofredor demora a mudar. Eles descartam a significância da aflição dos aflitos. Nem mesmo são
capazes de confortar ou guiar de fato.
Mas quando você passou por suas próprias provações de fogo e descobriu que Deus é fiel ao que
ele diz, você tem ajuda real para oferecer. Você tem experiência em primeira mão tanto da sua graça
sustentadora quanto do seu propósito. Ele o sustentou através da dor; ele o moldou mais conforme
sua imagem. Você descobriu que todo o nosso hino é verdade. O que você está experimentando de
Deus, agora pode distribuir em medida crescente aos outros. Você está aprendendo a ternura e a
clareza necessárias para ajudar a santificar a angústia mais profunda de outra pessoa.
Segunda Coríntios 1.4 diz melhor: “Deus… nos conforta em toda a nossa tribulação, para
podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos
somos contemplados por Deus.” Essa palavra “conforta” (ou “encoraja”, em algumas traduções) não
significa simplesmente consolo ou inspiração. Você é encorajado. Você é fortalecido. Você
experimenta a compaixão transformadora de Deus, a união perfeita de sua bondade e candura. Ele
fala a verdade em amor, a fim de que você cresça para fazer o mesmo.
Observe duas coisas. Primeiro, a maneira como Deus nos encontra em nossa necessidade
transforma nossa fé e amor em habilidades generalizáveis que vão ao encontro de outras pessoas em
suas necessidades. O conforto que você recebe de Deus em sua aflição particular torna-se útil para
outros em qualquer aflição. Um hino escrito há quase 250 anos pode nos ajudar em nossas aflições
porque fala de forma relevante sobre o encorajamento que alguém recebeu. Segundo, lembre-se de
que Deus usa as pessoas como parte da forma como ele encoraja. Segunda Coríntios 1.4 não é apenas
sobre obter encorajamento a partir das verdades do evangelho na privacidade de sua mente!
Confirmar seu amor por alguém que é perdoado traz conforto com um toque pessoal (2 Coríntios 2.7-
8). Paulo foi confortado porque os coríntios estavam em seu coração e os corações deles estavam
abertos para ele. Ele foi encorajado porque Tito veio e lhe contou sobre isso. Ele foi encorajado
porque Tito havia sido confortado. Ele foi confortado porque a fé sincera dos coríntios era óbvia (2
Coríntios 7.4-16). A correspondência entre o toque de Deus e o toque humano é um dos prazeres
profundos de nossa fé cristã.
A ternura pessoal de Deus, sua verdade imutável e seus altos propósitos estão unidos de modo que
ele simultaneamente realiza coisas aparentemente contraditórias. Ele nos conforta profundamente
enquanto sofredores, fortalecendo-nos para a perseverança. Ele misericordiosamente nos desafia
enquanto pecadores, humilhando-nos com nossa necessidade contínua pelo sangue do Cordeiro. Ele
nos transforma poderosamente enquanto seus filhos e filhas, tornando-nos destemidos e sábios para
ajudar outros sofredores, outros pecadores, outros filhos e filhas. Há inevitavelmente uma solidão no
sofrimento porque ninguém pode entrar totalmente na experiência de outra pessoa. Cada pessoa
conhece “a aflição do seu próprio coração” (1Re 8.38; cf. Pv 14.10). Deus garante que a ajuda
humana nunca substitua o Senhor, o único que se aproxima completamente. Mas podemos suportar o
fardo uns dos outros com amor e podemos nos aconselhar com a verdade. O dar e receber do amor
sábio é uma das alegrias mais significativas da vida.
MINHA HISTÓRIA
Quando eu tinha cinquenta anos e era cristão há vinte e cinco anos, precisei de uma cirurgia
cardíaca. A recuperação após a cirurgia teve seus momentos agonizantes. Mas as sequelas a longo
prazo foram muito piores do que a dor a curto prazo. Os cinco anos e meio seguintes foram os mais
difíceis da minha vida.
De 2000 a 2006, habitei um corpo que não funcionava. Eu não tinha resiliência. Não me
recuperava da fadiga normal. E estava em uma espiral descendente de exaustão e crescente
impotência, incapaz de sustentar uma vida social normal e a vida ministerial. Comparo esses anos de
perdas acumuladas a viver em um colapso em câmera lenta. Apenas a família, um punhado de amigos
e a escrita permaneceram frutíferas. Tive que contar o custo de cada interação social. Ensinar era
uma provação – consegui fazê-lo apenas por um semestre. Eu amo aconselhar, mas era desgastante
demais – e tive que parar.
E, através de tudo isso, Deus me encontrou e me mudou para o bem. A mudança às vezes ocorre
em um momento decisivo. Nos capítulos anteriores, minhas duas primeiras histórias envolveram uma
virada relativamente dramática, algo que ocorreu em um dia ou apenas alguns minutos. A terceira
história foi de um processo mais lento – cheguei a uma conciliação com a hostilidade em um período
de meses, com vários surtos significativos.
Muito de como nós crescemos é uma questão de formação lenta de hábitos – o acréscimo de novos
padrões de pensamento, atitude e resposta. Grande parte do nosso crescimento acontece
subconscientemente, da mesma forma que uma criança cresce. Como qualquer habilidade, a
sabedoria inclui coisas explícitas e definíveis que aprendemos, momentos que podemos descrever.
Mas, como qualquer habilidade, a sabedoria também envolve aprendizado tácito, implícito, que não
é ensinado. Há maneiras que cresci que nunca poderia quantificar, que nem sequer vejo. Deus retém o
direito de trabalhar de maneiras além da nossa compreensão. Porque aprender a viver é a habilidade
mais complexa imaginável, a luta não cessará até que enfrente o último inimigo e veja a face de
Deus.
Minha experiência de cinco anos e meio foi a gênese do livro que você está lendo. Ele tomou sua
forma e tom básicos no fim daqueles anos – numa época em que a causa do meu cansaço ainda era
misteriosa e quando eu não tinha esperança terrena de que minha condição melhorasse. Minha vida
estava perdendo o vigor. É por isso que o que escrevo tem como premissa manter em tensão três
realidades complementares.
• Enfrentamos certas aflições inescapáveis que se mostrarão insolúveis até que as lágrimas sejam
enxugadas quando vermos Cristo face a face.
• Muitas aflições são momentâneas, ou duram por um período, e então somos restaurados.
• Deus está trabalhando em nós, tanto quando nossos sofrimentos têm um remédio como quando
eles não têm.
Com o passar do tempo, após esses mais de cinco anos sombrios, surpreendentemente recuperei a
saúde pela descoberta e tratamento de um distúrbio do sono. Mas esta não é uma história de cura
médica (por mais alegre que tenha sido). É uma história sobre a cura contínua de uma alma. Como
Deus trabalhou?
Primeiro veio o sofrimento em si. Em meio a perdas e problemas gradativos, todos os hábitos e
certezas familiares foram lançados ao ar como confete. Eu me tornei como um homem na casa dos
oitenta anos, não de cinquenta. A vida mudou, sem explicação e sem solução. Deus trabalha no e por
meio do sofrimento. O sofrimento é um meio de graça, de acordo com as Escrituras. Minha fé e amor
tiveram que crescer – como sempre tenho que crescer – novamente.
Segundo, um punhado de amigos sábios e piedosos desempenhou um papel muito significativo.
Alguns estavam passando por experiências análogas (morrendo de câncer, ou incapacitado por dores
ou fadiga crônicas). Eles entendiam. Sua compaixão e percepção não eram retrospectivas. Não era:
“Já passei por isso, fiz assim”. Estávamos juntos nisso: “Estou passando por isso, fazendo assim”.
Outros amigos me conheciam bem o suficiente para transformar sua simpatia em me ajudar a tomar
medidas realistas. Eles me ajudaram a planejar e agir dentro de limitações evidentes. Eu precisava
tanto da ternura quanto do realismo. Ambos são aspectos da sabedoria prática. Ambos encarnam
Jesus Cristo. Minha família desempenhou um papel diferente. Eles não me aconselharam. Eles
simplesmente cuidaram de mim, e eu cuidei deles. Foram anos em que paguei um alto preço pela
interação social. A sensibilidade da minha família foi muito importante para mim.
Terceiro, a sabedoria de santos cuja carreira terminou há muito tempo desempenhou um papel
significativo. A adoração pública me sustentou e me instruiu – mesmo quando tive que me afastar
antes da bênção para que eu não ficasse desgastado pela interação. Sempre amei hinos sábios e bem
elaborados que me convidam tanto a pensar como a cantar. (Por isso de um hino nos ter dado a
estrutura deste livro!) Mas eu nunca havia percebido quantos hinos (como os Salmos) encontram-se
no sofrimento. Eles buscam e encontram nosso Salvador em meio à dor e perplexidade.
Por exemplo, “Aquieta-te, Minha Alma” [Be Still, My Soul no original] de Katharina von Schlegel
dá voz sincera à sua angústia e perplexidade. Ela também expressa sua esperança e alegria, incluindo
suas razões para esperança em meio ao luto. O Senhor está ao seu lado, mesmo nisso. Ele é o seu
melhor – seu celestial – amigo, que não lhe desolará. Ele também governa essa tempestade. Ele
acalma as emoções sombrias. Ele lhe restaurará as mais puras alegrias do amor. Von Schlegel dá
todos esses presentes para nós. Estou ansioso para conhecê-la e agradecer a ela por me ajudar.
Quarto, não posso expressar quantas vezes a criação de Deus se mostrou sustentadora, renovadora
e santificadora. Em todas as estações e climas eu saí de casa e caminhei. Notei o vôo de um
pintassilgo, neve nas pedras do riacho, um campo de cornisos brancos em flor, uma tempestade
iminente a oeste, folhas de bordo como fogo no outono. Fui repetidamente atraído para um palco
maior do que os meus problemas. Fazia minhas orações por minha necessidade e minha gratidão em
voz alta enquanto caminhava. Teólogos que limitam os meios da graça a práticas religiosas
notoriamente redentivas deixam de ver algo sobre o Deus que fala sem palavras no teatro de sua
criação.
Quinto, o Deus que fala e age inspira todos esses meios de graça. Deus me encontrou com suas
palavras e seu Espírito – por meio da pregação, por meio da Ceia do Senhor, por meio do conselho
informal de amigos, por meio da minha própria reflexão sobre as Escrituras, por meio da criação,
por meio do sofrimento. Eu ouvi a voz da verdade de Deus, e o busquei, e o encontrei. À medida que
palavras familiares se envolviam na minha experiência atual, essas palavras assumiam significados e
ressonâncias que eu não poderia ter imaginado. Eu precisava da graça de Deus de novas maneiras.
Quantas vezes li os Salmos? Mas agora era como se os estivesse lendo pela primeira vez. Minha fé
precisava encontrar expressão de novas maneiras. A obediência teve que assumir novas formas. Era
como ouvir as promessas e mandamentos de Deus em uma nova língua – diferente, mas familiar, há
muito cridos, mas agora ganhando vida de ângulos inesperados. Aqui estão algumas das passagens
que habitaram meu coração e mente, e repetidamente foram ao meu encontro. Estas são revelações
elementares. Elas ligam minha fraqueza e necessidade à misericórdia, proteção e força de Deus.
Mateus 5.3-10. Se o Sermão do Monte é o discurso principal de Jesus, então as Bem-aventuranças
são a essência de seu discurso. As sementes do todo estão nessas oito bem-aventuranças. Nas quatro
primeiras, a bênção está ligada à fraqueza ao dependermos de Deus: carência genuína, tristeza por
tudo que está errado, submissão dentro da vontade de Deus e o desejo de que tudo seja feito reto.
Nas últimas quatro, a bênção está ligada à força ao nos movermos para o mundo: generosidade ativa,
pureza de propósito, engajamento construtivo e perseverança corajosa. Jesus viveu essa interação
incomum de fraqueza e força, de dependência e ação. Isso é o que significa ser verdadeiramente
humano. Espírito Santo, faz-me assim.
Salmo 103. Não consigo nem dizer com que frequência e com que profundidade esse salmo me
favoreceu e me renovou. Ele descreve minha necessidade e desperta minha fé. Ele me leva pela mão,
para que eu dependa, confie e adore meu Pai. Ele me capacita para que eu ame outros que
compartilham da iniquidade, fragilidade, dependência e mortalidade da condição humana. O Salmo
103 é um esboço bruto de carvão que antecipa a cor viva de Efésios 1–3. “Todas as coisas boas que
ele faz” (Sl 103.2, trad. lit.) é o antecessor de “toda sorte de bênção espiritual” (Ef 1.3) que
encontramos especificadas e cumpridas em Cristo. Bendize ao Senhor, ó minha alma, e não te
esqueças.
Salmo 119. O modo que eu havia sido ensinado sobre este salmo, era um tratado sobre a natureza
das Escrituras e uma exortação ao estudo da Bíblia. O modo como cheguei a aprender e viver este
salmo, me mostra como falar com Deus e sobre o que falar. Ele expressa como a honestidade pessoal
é redimida do odor do egocentrismo. Escritura, oração e sofrimento se encontram.
Cumprirei os teus decretos;
não me desampares jamais. (119.8)
2 Coríntios 1.4 e Hebreus 5.2-3. Minha experiência em primeira mão não termina em mim. É
transmutada para que eu possa lidar de forma gentil e proveitosa com outros em suas lutas. Essas
passagens retratam uma dinâmica muito curiosa e maravilhosa. Minhas aflições particulares –
controladas pelo Deus de misericórdia e consolo – me equipam para “consolar os que estiverem em
qualquer angústia” (2Co 1.4). Meus pecados e fraquezas – tratados honestamente diante do Senhor,
que dá misericórdia e graça para ajudar em tempos de necessidade – me equipam para ministrar bem
até mesmo aos “ignorantes e aos que erram” (Hb 5.2). Jesus, ensina-me a aconselhar outros da
forma como tu me aconselhas.
________________
Vou parar aí. As estantes de livros em minha casa não poderiam conter tudo o que poderia ser
escrito sobre aqueles anos mais difíceis. No sofrimento, aprendi a precisar de misericórdia. Do
sofrimento, aprendi a dar misericórdia. A fé viva que abraça a Cristo é formada na fraqueza. A
coragem de continuar e o forte amor que cuida bem dos outros são formados na luta.
Como eu mudei? Fui mudado porque Deus nunca me abandonou e ele brilha em tudo o que é justo.
Fui mudado porque a Escritura falou muitas palavras sobre a misericórdia, proteção, força e vontade
de Deus. Fui mudado porque muitos amigos me suportaram. Fui mudado porque tive que caminhar
através da escuridão e destruição, em meio à incerteza de nenhuma explicação e nenhuma solução.
Fui mudado porque repetidamente me voltei para fora com fé e amor, revertendo minha tendência de
me voltar para mim mesmo.
LEVANDO PARA O LADO PESSOAL
Nós, do século 21, somos pessoas apressadas. Gostamos que as coisas aconteçam rapidamente.
Queremos que os problemas tenham soluções rápidas para que possamos passar para outra coisa.
Mas Deus fez nossas almas trabalharem no tempo agrícola e no tempo da criação de filhos. Você não
pode apressar o processo que produz um bom tomate para ser comido no final do verão, ainda quente
do sol. Você não pode apressar o processo que nutre uma criança e a torna um ser humano decente ao
crescer. Os problemas do sofrimento não têm “soluções” rápidas. As aflições fazem parte do
processo pelo qual Deus nutre seus filhos para que cresçam e se tornem seres humanos excelentes.
Reserve algum tempo para discutir essas questões e textos:
O que significa que o seu sofrimento significativo desempenha um papel intrínseco em como você conhecerá o amor de Deus
derramado em seu coração? (Rm 5.3-5)
O que significa que o seu sofrimento significativo desempenha um papel intrínseco em como você conhecerá a alegria indizível
e cheia de glória? (1Pe 1.3-9)
O que significa que o seu sofrimento significativo desempenha um papel intrínseco em como você conhecerá a paz de Jesus
Cristo? (Jo 16.33)
O que significa que seu sofrimento significativo desempenha um papel intrínseco em como você se tornará profundo e sábio?
(Tg 1.2-5)
O que significa que o seu sofrimento significativo desempenha um papel intrínseco em como você aprenderá a realmente ajudar
outras pessoas que sofrem? (2Co 1.4)
Amor, alegria, paz, sabedoria – e a capacidade de fazer diferença. É isso que significa crescer e
se tornar um ser humano excelente. Isso que significa que sua impureza foi consumida e seu ouro
refinado. A maneira como você passa “por provas de fogo” ao longo do seu caminho faz toda a
diferença.
C. S. Lewis, The Four Loves [Os Quatro Amores] (London: Harcourt Brace, 1991), 3.
A maioria das pessoas associa salmos de confissão (por exemplo, Salmos 32, 38, 51) com este tema. Mas o Salmo 119 captura de forma
mais vívida a consciência dual que cai de pé. Veja “Suffering and Psalm 119”, em David Powlison, Speaking Truth in Love
(Greensboro, NC: New Growth, 2005), 11-31. O Salmo 25 e Romanos 6–8 também estão repletos com essa sagrada ambivalência que
se coloca ao lado de Deus da luta.
CAPÍTULO 7
PROVAREI MEU AMOR ATÉ O FIM DA SUA VIDA
Tudo o que vimos até agora continua até a velhice. Isso é notável. O autor de “Que Firme
Alicerce” mostrou grande sensibilidade à condição humana ao abordar o desafio de envelhecer:
Até a velhice todo meu povo provará
meu soberano, eterno e imutável amor;
e quando cabelos grisalhos seus templos adornarem,
como cordeiros, ainda nascerão em meu seio.
ATÉ A VELHICE
Os leitores já “adornados” com cabelos brancos ou grisalhos – grandes fãs do Salmo 71! –
apreciarão imediatamente por que um hino para sofredores deve lidar com o envelhecimento. A
maioria das pessoas com mais de 70 anos diz algo nesta linha: “Envelhecer não é para os fracos de
coração”. Deus não é intimidado pelas coisas que nos intimidam. Ele encoraja os que têm medo e, ao
fazê-lo, ensina-nos a encorajar uns aos outros.
Cada leitor que vive uma longa vida experimentará uma sucessão de perdas e incapacidades. Viva
o suficiente e você provavelmente viverá mais do que todos que você ama: pais, amigos, cônjuge –
até filhos e, talvez, netos. Você viverá mais que sua utilidade no local de trabalho e em outras arenas
produtivas. Você talvez viva mais que seu dinheiro. Você talvez viva mais que sua relevância e não
mais faça parte do que está acontecendo. Você talvez viva mais do que sua saúde conforme cada
sistema de seu corpo definhar. Você pode viver mais que sua capacidade de andar, de ir ao banheiro,
sua capacidade de se alimentar sozinho; sua memória e – mais para o fim – sua capacidade de reunir
pensamentos, de relacionar-se com os outros da forma como gostaria e até mesmo de lembrar quem
você é. Se viver o suficiente, você poderá perder todo bem terreno. E então certamente perderá sua
vida. O último inimigo ainda nos mata rotineiramente.
Nosso hino menciona apenas os indicadores externos: os anos acumulados, os cabelos brancos.
Mas essas alusões apontam para uma história de fraqueza, dificuldades e, finalmente, da iminente
perda da própria vida. É nesse contexto que Deus, de forma gentil e persistente, promete provar seu
“amor soberano, eterno e imutável” a seus idosos: “como cordeiros, ainda nascerão em meu seio”.
Ele carrega ternamente os desamparados – e que bela inversão da metáfora, que os idosos se tornem
como cordeiros recém-nascidos que devem ser carregados. A velhice espelha, em reverso, o
desamparo e as limitações da infância.
Uma querida amiga havia experimentado muitas perdas em sua vida. Recentemente ela enfrentou
mais uma: uma cirurgia facial desfigurante por causa do câncer. Ela colocou sua dor de forma
lamentosa: “Eu não esperava as cicatrizes após retirar os curativos. É perturbador olhar no espelho.
É mais uma perda. E eu tenho muita incerteza sobre se o câncer retornará. Então há a perda de
pessoas, o isolamento, a perda da sociedade humana, as partes da vida em que não posso mais
participar”. Ela é uma mulher de fé articulada. Ela é honesta sobre a dor da perda. Mas o seu Deus
dá a palavra final, decisiva sobre ela: “Eu carregarei você e nunca a abandonarei”. Esse talvez seja
o conforto mais profundo transmitido pela maneira deste hino de comunicar a voz de Deus. Ele tem a
primeira palavra, e ele tem a última palavra. Assim, tudo no meio – sobre o qual ele espera que
tenhamos muito a dizer! – está ancorado no amor soberano, eterno e imutável.
COMO CORDEIROS COM O PASTOR
Em meio à dor da perda, Deus nos ensina em quem confiar, no que confiar, e o que dizer. Pense
novamente na promessa central que ancora cada estrofe deste sábio hino pastoral: “Eu sou contigo.
Eu sou contigo. Eu sou contigo.” Cada estrofe reitera essencialmente a mesma coisa, dando-nos
detalhes diferentes, desvendando novas implicações, fornecendo-nos novas metáforas para evocar
uma nuance diferente das riquezas inesgotáveis da presença, sabedoria e amor de Deus.
O Salmo 23.4 forneceu mais conforto a pessoas sofrendo e morrendo do que qualquer outra
passagem da Escritura:
Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte,
não temerei mal nenhum,
porque tu estás comigo.
Ao longo de todo o nosso hino, Deus está nos dizendo essa mesma verdade de sua direção. Isso
permite que a fé do versículo 4 diga: “Tu estás comigo”. A fé ouve bem e dá o que confia de volta a
Deus.
Trago isso aqui por causa dos outros detalhes no Salmo 23.4-5. O caminho de volta para onde o
Senhor vive passa por trevas profundas, e nós enfrentamos muitos males e muitos inimigos. Como
uma ovelha perseguida por lobos, Davi viveu grande parte de sua vida sob ameaças específicas de
morte. Como todos nós, ele viveu sabendo que a morte aguarda. Isso se aplica poderosamente às
dificuldades do envelhecimento. A morte está chegando mais perto. O envelhecimento lança
numerosas sombras específicas da morte que se aproxima: doença, perdas, fraqueza, impotência,
futilidade. Na verdade, se você estiver disposto a pensar sobre isso, quer seja jovem ou velho, toda
forma de sofrimento significativo, todo mal, deixa alguma coisa do gosto amargo da morte em sua
boca. É benéfico pensar sobre essas coisas. O Salmo 90.12 ancora a sabedoria na disposição de
encarar a realidade:
Ensina-nos a contar os nossos dias,
para que alcancemos coração sábio.
É deprimente pensar nisso? Não. É sóbrio, claro. Mas levar em conta o limite de seus dias é como
você aprende a viver bem. As pessoas que acham que é deprimente considerar seus limites, não
levaram Jesus Cristo em conta. Na realidade, a vida terá a última palavra. A vida e a alegria
derrotam a morte e o desespero.
O “andar pelo vale da sombra da morte” do salmista não é simplesmente uma metáfora evocativa,
e “não temer mal nenhum” não é uma generalidade vaga (Sl 23.4). A sombra e o mal são específicos
da pessoa: são seus sofrimentos significativos. Sua necessidade de que a graça de Deus alcance seus
sofrimentos é mais do que teórica. Na aflição, você imediatamente sente sua necessidade. Uma
sombra se aproxima de você. Cobre-o. Sua lógica interior sussurra ou grita de morte. E Deus diz:
“Eu sou contigo”.
Você pode honestamente dizer: “não temo mal nenhum”? Você pode dizer isso em termos dos
males e sofrimentos específicos de sua vida?
Tudo depende se você ouve o Deus que lhe dá razões para dizer isso. Se o Deus da vida está de
fato com você, carregando-o como um cordeiro recém-nascido, você pode se tornar destemido em
qualquer sofrimento. Nos altos e baixos, as dolorosas lutas de uma vida, este é o destino em direção
ao qual você luta. E se Deus promete sua fidelidade absoluta a você, se o amor indestrutível
acompanhá-lo a um bom final, então você será capaz de andar por uma estrada muito difícil.
E você terá de andar em uma estrada muito difícil. A morte envia muitos mensageiros ao longo do
caminho, mesmo para os muito jovens. Mas se ouvir a voz de seu pastor, você se tornará destemido.
Se ouvir, você perseverará. Se ouvir, você combaterá o bom combate na mais terrível das guerras. Se
ouvir, você saberá que precisa ser resgatado. Você saberá que precisa ser carregado para a batalha,
carregado durante a batalha e, finalmente, carregado do campo de batalha. Se ouvir o Bom Pastor,
você viverá.
MINHA HISTÓRIA
Minha mãe morreu em 2015 após três difíceis anos de declínio acentuado. Ela tinha noventa e
quatro. A demência vascular é um adversário difícil. Os derrames destruíram progressivamente sua
capacidade de linguagem e autoconsciência. Eles deixaram-na cada vez mais confusa e desorientada.
E durante esses mesmos anos, minha mãe sofreu com uma dor enlouquecedora e irremediável da
herpes que se instalou em torno de seu olho esquerdo, bochecha, têmpora e testa.
Essas perdas devastadoras da velhice extrema são o oposto do desenvolvimento infantil normal,
com sua sucessão de ganhos florescentes. Uma dificuldade para Mamãe e para nós era que suas
limitações eram um alvo em movimento. Sua localização na escala de aptidão-inaptidão era
imprevisível. Algumas vezes ela estabilizava por um breve período, mas logo, inevitavelmente,
desviava, deslizava ou mergulhava, sempre na direção da inaptidão. Ao mesmo tempo, suas
crescentes limitações estavam roubando sua capacidade de se adaptar a suas limitações. Envelhecer
não é para os fracos de coração. Cuidar dos idosos não é para os fracos de coração. Mas, quer
sejamos mais velhos ou mais jovens, somos todos fracos de coração.
Deus foi ao encontro de Mamãe com um conforto genuíno, mas certamente não fez tudo ficar
melhor. Como cristã, até o final, ela respondia à uma palavra de promessa das Escrituras –
eventualmente reduzida a uma única frase, e até mesmo essa parafraseada para simplicidade.
Frequentemente, essa frase era alguma variante de “Mamãe, você não está sozinha. Jesus está com
você”. Ela gostava que orassem por ela – e isso também acabou eventualmente sendo reduzido a um
par de frases curtas e simples, usando palavras concretas e de uma sílaba. Ela gostava de um hino
familiar e fazia o seu melhor para cantar junto, mesmo depois que suas habilidades de linguagem
foram significativamente comprometidas. Ela gostava da nossa presença – o toque humano era parte
de como Deus cuidava e carregava seu cordeiro em sua fraqueza.
Deus andou com minha mãe, embora os pontos brilhantes tenham se tornado menores e a escuridão
se tornado maior. Não é surpresa nenhuma que a fé, a humildade e o amor de Mamãe tenham
permanecido incompletos. Nossas lutas constantes contra o pecado não desaparecem. Elas se
transformam em novas formas sob novas condições de tentação. A igreja dela havia sido fraca em
nutrir essa dinâmica dos Salmos e das Bem-Aventuranças que nos ensina a reconhecer a necessidade
voluntariamente, o que naturalmente abre uma porta para pedir ajuda de Deus e de outros. A maioria
de nós tem uma tendência a dizer “eu posso fazer isso sozinho. Eu não quero ajuda”. A teimosia e a
recusa em pedir ajuda complicaram sua queda para o desamparo. Isso complicou suas dificuldades
em reconhecer limitações. Então ela permaneceu imperfeita. Mas isso também estava debaixo da
misericórdia.
Quando mamãe estava confusa ou angustiada, tanto o toque humano de seus filhos como simples
lembranças do amor de Cristo muitas vezes – não sempre – traziam uma presença tranquilizante.
Quando eu disse adeus a ela pela última vez, ela não conseguia entender o conceito de que eu estava
saindo. (Ela morava no Havaí; nós na Filadélfia). Nesse ponto, ela estava vivendo apenas no
momento presente, como uma criança. Sua capacidade de resposta emocional foi significativamente
embrutecida e enfraquecida. Mas Deus nos deu um momento inexprimivelmente terno. De rosto
colado, eu disse: “Eu amo você, Mamãe”. Ela disse, com notável atenção, clareza e vigor, “Também
amo você, filho”. Ainda posso ouvir sua voz dizer essas palavras, e choro novamente ao contar a
história. Houve alguns momentos alegres e até mesmo engraçados, mesmo nos estágios finais. Certa
tarde de domingo, alguns meses antes de ela morrer, meu irmão e minha irmã colocaram hinos
familiares para tocar no YouTube e cantaram junto com ela. Mamãe despertou tanto para o canto que
meu irmão comentou depois: “Acho que mamãe provavelmente ganhou mais seis meses de vida”!
À medida que me recordo, me pergunto se minha mãe perdeu a capacidade de “autogerar” fé em
seu último ano. Ela havia perdido a autoconsciência. Será que ela também perdeu a capacidade de
refletir conscientemente sobre seu Deus, de reter alguma verdade em sua mente e depois articular
uma resposta interna a ele? No final, será que sua fé era apenas uma resposta à apresentação da
Palavra, hino ou oração de um ente querido – um reflexo animado pela presença do Espírito em seu
coração, que de outra forma era inarticulado? Eu não sei, mas suspeito que ela perdeu a capacidade
de reflexão e resposta autoiniciada.
“Quando sou fraco, então, é que sou forte” (2Co 12.10). Em seu declínio final, ela incorporou a
incapacidade ao enésimo grau. Ela havia se tornado um dos membros mais frágeis do corpo que são
indispensáveis aos demais, em cujos sofrimentos todos sofrem juntos, cuja proteção e nutrição são
uma revelação da santificação corporativa do corpo de Cristo (1Co 12.22-26). A fé conscientemente
articulada é um dom desejável. Mas suspeito que sua perda não seja uma barreira para o amor de um
Salvador cujo reino é baseado na escolha das coisas loucas e fracas para envergonhar os sábios do
mundo e presunçosamente fortes.
A vida e a morte de mamãe foram tanto um triunfo da graça de Cristo quanto um vale de lágrimas.
Katharina von Schlegel colocou bem:
Aquieta-te, minha alma: quando a mudança e as lágrimas forem passado,
Nos encontraremos finalmente, todos seguros e abençoados.
O ÚLTIMO INIMIGO
No início deste livro, pedi que você escolhesse algum sofrimento significativo em sua vida. Você
o manteve em mente enquanto trabalhamos em nosso hino, estrofe por estrofe.
Mas também estamos expandindo os limites e ampliando a batalha. No capítulo anterior, nos
concentramos no sofrimento nas mãos do “último inimigo”, a morte. No capítulo antes desse falamos
sobre “o inimigo interno”, como nossa pecaminosidade se torna uma forma de aflição. Esta última
estrofe expande o limite mais uma vez. Você tem inimigos do inferno. Você enfrenta “o Inimigo”. O
fato de você morrer não é um dado impessoal. Registra a animosidade pessoal de um assassino. Um
senhor das trevas é pai de ambos, do pecado e da morte. Ele personifica todos os aspectos dos males
que chegam até nós e dos males que vêm de dentro de nós.
Ao falar de inimigos infernais que vêm atrás de você, nosso autor do hino (assim como a Bíblia)
está falando sobre a realidade – não dos gêneros de terror e fantasia em livros, filmes e videogames.
A vida comum, cotidiana sob a sombra da morte é vivida sob o poder do Maligno. Cabelos brancos e
velas de aniversário testemunham que um predador está chegando em breve. Satanás é tanto o
acusador quanto o assassino dos pecadores. Ele detém o poder da morte (Hb 2.14). Ele
voluntariamente esconde sua identidade rotineira por trás de máscaras comerciais de terror, fantasia
e superstição. Ele dá a ilusão de que no âmbito do mal, não existe nada além daquilo que podemos
ver. Ele é bem-sucedido quando as pessoas acreditam nele de fato, mas imaginam um bicho-papão.
Ele é bem-sucedido quando as pessoas não acreditam nele e, em vez disso, descartam-no como uma
invenção de imaginação hiperativa. O Maligno se esconde no nevoeiro da guerra. Assim, pessoas
desavisadas não percebem que ele está no ramo da mortalidade, seja como for que aconteça.
Ao invocar os poderes do inferno, nosso autor (mais uma vez, como a Bíblia) está falando sobre a
realidade sutil – não de contos escabrosos de adoração a Satanás. Ele está falando sobre pecado
comum, incredulidade e vontade própria se desdobrando em dez mil formas. Ele está falando sobre
sofrimento comum, aflição, dor e perda. O salário justo e honesto pago pelo pecado comum é a morte
comum (Romanos 6.23). O Maligno é o mentiroso e tentador que trabalha habilidosamente com e nos
fatos do pecado. Ele é o assassino e torturador que trabalha habilidosamente com e nos fatos do
sofrimento. Pouco importa para ele se as pessoas acreditam que ele existe ou não. Ele
voluntariamente esconde sua verdadeira malignidade por trás dos contos e do ceticismo. Assim,
pessoas desavisadas não percebem que ele está no ramo da incredulidade, seja qual for a forma que
ela tome.
Você sofre em um mundo no qual os seus sofrimentos significativos imediatos apontam para coisas
mais profundas, mais sombrias e mortais. O inimigo interno, o inimigo final e o Inimigo – todos os
três afligem significativamente cada um de nós. Eles caracterizam a condição humana. “O mundo
inteiro jaz no maligno” (1 João 5.19, trad. lit.). Habitamos um mundo escravo. Um mundo sombrio.
Um mundo de morte.
Mas você sofre em um mundo no qual todas as coisas sombrias e mortais existem dentro de um
planejamento e chamado ainda mais profundos. O drama do mal ocasiona a revelação do bem, o
drama mais profundo do evangelho. A santa justiça e o amor sacrificial de Deus se desdobram no
palco das trevas. Ele trará todos os inimigos para a justiça final. Ele mostrou a você e a mim
misericórdia totalmente imerecida. Quando estávamos desamparados, quando éramos ímpios, quando
éramos pecadores, quando éramos inimigos, Cristo morreu por nós. Você é livre agora. Você é luz no
Senhor. Você vive. “Somos de Deus... estamos no verdadeiro, em seu Filho, Jesus Cristo. Este é o
verdadeiro Deus e a vida eterna” (1 João 5.19-20).
Se você “para o repouso se inclinou” em Jesus, então viverá. Repouso aqui não significa um
estado sossegado de paz e tranquilidade. É o significado original antigo: confiar inteiramente,
depender, colocar ativamente o peso da sua vida em Jesus. Coloque toda a sua fé, segurança e
confiança nele. Nosso Senhor Jesus Cristo aboliu a morte e trouxe à luz a vida e a imortalidade.
"porque sei em quem tenho crido e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até
aquele Dia" (2 Timóteo 1.10;12). Esta é a linguagem do nosso repouso.
UMA PROMESSA FINAL
Esta estrofe final do nosso hino tem como objetivo torná-lo livre e destemido, não importa o que
você tenha enfrentado, o que esteja enfrentando agora, ou o que enfrentará. Eu nunca o abandonarei
– Deus está disposto a dizer isso até que você entenda! O último verso do hino nos despede com
outra das principais promessas da Bíblia. Na verdade, completa um quarteto de duas promessas e
dois mandamentos que Deus frequentemente conecta: “Eu sou contigo. Não tenhas medo. Sê forte e
corajoso. Eu nunca te abandonarei”.15 Já discutimos a primeira promessa e os dois mandamentos nos
capítulos anteriores. Aqui a promessa final fica com a última palavra.
Há uma certa conveniência em fechar com Eu nunca o abandonarei. Sofredores sentem apreensão
sobre o futuro, por um bom motivo. Alguns males não irão embora. Os graves inimigos que
consideramos nos últimos capítulos não podem ser compreendidos, gerenciados ou controlados. As
sombras se multiplicam e escurecem. A noite está chegando. E assim, esta palavra de conforto olha
para o futuro. Ela fala diretamente à nossa tentação de temer e desanimar.
Observe como as palavras de Deus compelem-no e elevam seu coração. O hino se desdobrou em
um duplo crescente. Nossa consciência de sofrimento, dor, fraqueza e perigo foi gradativamente
intensificada constantemente. Mas com isso, nossa consciência do amor poderoso de Deus em ação
também se intensificou gradativamente. Pecado, miséria e morte são abundantes. Graça, alegria e
vida são superabundantes. A misericórdia terá a palavra final.
Mas facilmente nos acovardamos. Sentimos a força das coisas que nos desfazem e nos desnudam.
Elas nos sacodem. Elas imediatamente doem. A voz salvadora de Deus é meramente palavras? O que
a Bíblia diz é realmente assim? E se o temido x, y ou z realmente acontecer? O autor do hino conhece
nossa vulnerabilidade ao desânimo.
Eu nunca, jamais, abandonarei
Eu nunca, jamais, abandonarei
Se você já cantou esse hino alguma vez junto de seus irmãos e irmãs, esses últimos versos saem
ardentemente triunfantes.
Nas páginas da Bíblia, Deus promete explicitamente: “Eu nunca o abandonarei” (veja, e.g., Js
1.5). Uma vez que você saiba procurar, verá que ele também diz a mesma verdade de uma centena de
outras maneiras. “Deus é fiel”, e “Seu amor constante dura para sempre”, e “O Senhor é meu refúgio”
são variações do tema. O que Deus diz para si mesmo, seus porta-vozes frequentemente proclamam
sobre ele, Ele não o abandonará (veja, e.g., Dt 31.6,8). Então, com um bom motivo seus filhos
clamam a ele em seus problemas e aflições, Não me abandone! Mais uma vez, ouvindo, nós cremos e
falamos. A Escritura dá muitos exemplos particulares dessa dinâmica. Você é idoso, sofrendo de
fraqueza, dor, inaptidão e perdas por envelhecimento? Não me abandone! (Sl 71.9,18). Você se sente
solitário e vulnerável ao enfrentar uma poderosa hostilidade interpessoal, desprovido de alguém que
possa protegê-lo? Não me deserte! (Sl 27.9-10). Você se sente desanimado por Deus ter todos os
motivos para desistir de você por causa de seus pecados? Não desista de mim! (Sl 119.8). Você está
duplamente desanimado, tanto por causa de seus pecados quanto por causa da hostilidade dos outros?
Não me deixe ir! (Sl 38.17-21).
Nosso hino toma o simples “Eu nunca” de Deus e repete dez vezes seguidas: “Eu nunca, nunca,
nunca, nunca, nunca, nunca, nunca, nunca, nunca, nunca te abandonarei”. Muito mais do que uma mera
duplicação, essa é uma promessa elevada à décima potência. É a sabedoria pastoral, ajudando-nos a
ouvir a impetuosidade e o triunfo da benignidade de Deus. Você nunca será abandonado. Você nunca
estará sozinho. Ele nunca desistirá de você.
Nunca se esqueça disso. Nunca se esqueça. Nunca, nunca, nunca se esqueça de que ele não o
abandonará.
MINHA HISTÓRIA
Adoração, sermões e comunhão têm um efeito cumulativo. Sou crente em Jesus Cristo há mais de
quarenta anos. Ouvi muitos sermões. Cantei muitos hinos, cânticos e canções. Tomei a ceia do Senhor
muitas vezes. Estive em muitos bate-papos e fiz muitas orações. Mas eu não me lembro vividamente
de muitos sermões, ou cultos, ou tempos de oração em particular. A maioria deles se mistura em um
conjunto de memórias, como impressões da infância, mesclando as experiências de muitos anos.
Mas eu me lembro vividamente de alguns momentos. No final da década de 1970, ouvi um sermão
em Romanos 8.26 que nunca esqueci. O tema foi “O Espírito nos ajuda em nossa fraqueza”. Eu me
lembro do ponto exato: “Note que nossa fraqueza é singular, não plural. Paulo não diz fraquezas, no
plural, como se você pudesse fazer uma lista. Ele diz fraqueza, no singular, como nossa característica
definidora. Nós somos fraqueza. Somos fraqueza por causa da pecaminosidade. Somos fraqueza por
causa da fragilidade e mortalidade. Precisamos que nosso Pai coloque seu amor sobre nós.
Precisamos que Jesus Cristo nos resgate. Precisamos que o Espírito nos ajude e nos faça vivos. E ele
faz”.
O Salmo 40 tem um ponto semelhante, com detalhes mais vívidos. Davi resume sua visão de Deus
desta maneira:
Quanto a Ti, Ó Senhor, tu não reterás
tuas misericórdias de mim
Teu amor inabalável e fidelidade
Me guardarão diariamente (40.11, minha trad.)
E Davi resume a sua visão de si mesmo desta maneira:
Quanto a mim, sou pobre e necessitado,
porém o Senhor cuida de mim;
tu és o meu amparo e o meu libertador;
não te detenhas, ó Deus meu (40.17)
“Quanto a Ti”, “quanto a mim”. Isso captura a realidade básica. É a verdade dupla que reescreve
o roteiro de sua vida.
LEVANDO PARA O LADO PESSOAL
Nós chegamos longe. Deixe-me sugerir que você leia todo o nosso hino lentamente. Então,
responda ao Deus que fala com você. Cante com a melodia de Adeste Fideles – a mesma melodia de
“Ó Vinde e Adoremos”. Leve-o ao coração. Ore. Confie. Agradeça.
Que firme alicerce, vós santos do Senhor,
tendes para vossa fé em sua Palavra excelente!
O que mais ele pode dizer do que já revelou
a ti que, por refúgio, para Jesus fugiu?
“Não temas, pois eu sou contigo, ó não desanimes;
pois sou o teu Deus e ainda te auxiliarei;
Te fortalecerei, te ajudarei e te farei levantar
Te sustentarei com a minha justa e onipotente destra.
“Quando por águas profundas te chamo a passar,
rios de tristeza não transbordarão;
pois serei contigo, para teus problemas abençoar,
e tua mais profunda angústia santificar.
“Quando por provas de fogo teu caminho passar,
minha graça, toda suficiente, teu suprimento será;
a chama não te ferirá; eu planejo apenas
Para sua impureza consumir e seu ouro refinar.
“Até a velhice todo meu povo provará
meu soberano, eterno e imutável amor;
e quando cabelos grisalhos seus templos adornarem,
como cordeiros, ainda nascerão em meu seio.
“A alma que em Jesus para o repouso se inclinou,
Não desertarei para seus inimigos;
essa alma, embora todo o inferno se empenhe para abalar,
Eu nunca, jamais abandonarei”.
Nosso Deus tem a intenção de dizer o que ele diz, e ele faz o que diz que fará.
Veja Dt 31.6, 8; Js 1.5; 1Cr 28.20.
CODA
Muitas vezes a reação inicial ao sofrimento doloroso é “Por que eu? Por que isso? Por que agora?
Por quê”? Você agora ouviu Deus falando com você através das verdades de “Que Firme Alicerce”.
O verdadeiro Deus diz todas essas coisas maravilhosas e faz tudo o que ele diz. Ele vem por você,
em carne, em Cristo, para dentro do sofrimento, em seu favor. Ele não oferece conselhos e
perspectivas de longe; ele adentra em seu sofrimento significativo. Ele será o seu amparo e
trabalhará com você por todo o caminho. Ele o carregará mesmo nas situações mais difíceis. Essa
realidade muda as perguntas que surgem de seu coração. Aquela curvatura para si mesmo “Por que
eu?” se acalma, ergue os olhos e começa a olhar em volta.
Você se volta para fora, e uma nova e maravilhosa pergunta se forma.
Por que tu? Por que tu, Senhor da vida? Por que tu entrarias neste mundo de males? Por que tu passarias por perda, fraqueza,
sofrimento, tristeza e morte? Por que tu farias isso por mim, de todas as pessoas? Mas tu fizeste. Tu fizeste isso pela alegria
que lhe estava proposta. Tu fizeste isso por amor. Tu fizeste isso mostrando a glória de Deus na face de Jesus Cristo.
Conforme essa questão mais profunda se aloja em seu lar, você se torna alegremente são. O
universo não é mais primordialmente sobre você. No entanto, você não é irrelevante. A história de
Deus faz com que você tenha o tamanho exato – nem muito grande nem muito pequeno. Tudo tem
valor e todo mundo importa, mas a escala muda para algo que faz muito mais sentido. Você enfrenta
coisas difíceis, mas já recebeu algo melhor, que nunca pode ser tirado de você. E esse algo melhor
continuará a funcionar por toda a jornada.
Por que tu? A questão gera uma reação sincera.
Bendize, ó minha alma, ao SENHOR, e não te esqueças de nem um só de seus benefícios. Ele é quem perdoa todas as tuas
iniqüidades; quem sara todas as tuas enfermidades; quem da cova redime a tua vida e te coroa de graça e misericórdia; quem
farta de bens a tua velhice, de sorte que a tua mocidade se renova como a da águia. Obrigado, meu Pai.
Você é capaz de dar voz verdadeira a um obrigado em meio a tudo o que é realmente errado,
porque todos os pecados e todos os sofrimentos agora estão sob a benevolência dele.
Finalmente, você está preparado para fazer – e fazer com sinceridade – uma pergunta quase
inimaginável: “Por que não eu? Por que não isso? Por que não agora”? Se de alguma forma a sua fé
pode servir como uma luz noturna de três watts em um mundo muito escuro, por que não eu? Se o seu
sofrimento mostra o salvador do mundo, por que não eu? Se você tem o privilégio de preencher as
aflições de Cristo? Se ele santifica a sua mais profunda aflição? Se você não teme o mal? Se ele o
carrega em seus braços? Se a sua fraqueza manifesta o poder de Deus para nos salvar de tudo o que
está errado? Se a sua luta honesta mostra a outros lutadores como cair de pé? Se sua vida se torna
uma fonte de esperança para os outros? Por que não eu?
Claro que você não quer sofrer, mas se torna disposto – como o seu Salvador, que disse: “Meu
Pai, se possível, passe de mim este cálice! Todavia, não seja como eu quero, e sim como tu queres”
(Mt 26.39). Como ele, seus clamores e lágrimas serão, de fato, ouvidos por aquele que salva da
morte. Como ele, você aprenderá obediência através do seu sofrimento. Como ele, você simpatizará
com as fraquezas dos outros. Como ele, você lidará gentilmente com os ignorantes e rebeldes. Como
ele, você mostrará fé a um mundo sem fé, esperança a um mundo sem esperança, amor a um mundo
sem amor, vida a um mundo que está morrendo. Se tudo o que Deus promete se torna realidade, então
porque não eu?
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