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Campinas, 4 a 10 de abril de 2011

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A arquitetura a serviço do ensino Foto: Antonio Scarpinetti Foto: Antoninho Perri

Livro de
docente da
FEC mostra
importância
das edificações
para aprendizado
de alunos
ISABEL GARDENAL

E
bel@unicamp.br
A professora Doris Kowaltowski, autora
do livro Arquitetura Escolar: o Projeto
stá estabelecido na do Ambiente de Ensino (destaque):
literatura internacio- obra aborda tendências e conceitos
nal que um ambiente
arquitetônico como o
de uma escola pode Jundiaí tem trabalho
de excelência na área
interferir na aprendi-
zagem do aluno, o que prova que
a arquitetura escolar é um tema de
elevada importância a ser conside- A docente relata que está ministrando uma
rado quando um projetista é cha- disciplina com a professora Labaki sobre
mado a fazer o seu trabalho. Tarefa arquitetura bioclimática, ensinando aos futuros
simples não é, ainda mais quando arquitetos um olhar atento sobre ambiente escolar,
este profissional tem que lidar com sobretudo no que diz respeito ao conforto térmico.
pouco espaço, pouco dinheiro e pouco Neste semestre sugeriram aos alunos solucionar
tempo. Neste caso, o conhecimento problemas das escolas municipais de Jundiaí que,
sobre a arquitetura escolar, nos seus segundo Doris, possui um trabalho de excelência
aspectos mais amplos de conforto, em arquitetura escolar. A cidade, afirma, passa por
funcionalidade e beleza, apoia o pro- Crianças em
sala de aula de um sistema de manutenção em que cada escola
jetista na busca de um ambiente ideal escola pública: recebe, duas vezes ao ano, a visita de uma equipe
para abrigar as atividades de ensino. busca de um de mão de obra especializada que desembarca com
Anos depois de ter recebido o seu ambiente
ideal para as todas as ferramentas para melhorar o prédio. Em
primeiro grande desafio como estu- atividades uma semana deixam a escola “novinha em folha”.
dante de arquitetura da Universidade de ensino É um trabalho de restauro em que os professores
de Melbourne, Austrália, para ideali- esperam a sua vez de receber as instalações.
zar um projeto de uma escola, Doris Uma inovação que Jundiaí fez, dentro de
Kowaltowski, hoje professora titular um projeto de memória institucional, foi pedir
da Faculdade de Engenharia Civil, Ar- às professoras para estimularem as crianças a
quitetura e Urbanismo (FEC) da Uni- realizar desenhos sobre sua escola, selecionados
camp, teve a chance de retribuí-lo com pelos próprios alunos e reproduzidos em escala
sua experiência. Ela acaba de publicar maior nos muros, que são – na visão de Doris – a
o livro Arquitetura Escolar: o Projeto identidade da escola. A Secretaria de Educação
do Ambiente de Ensino, lançado pela de lá busca outras melhorias e veio à Unicamp
Editora Oficina de Textos, primeira pedir ajuda, lembra a arquiteta, para introduzir
obra da professora em carreira solo. um projeto padrão na cidade. Os alunos terão
A docente detalha em 272 páginas pela frente um trabalho com certo nível de
os aspectos a serem observados antes padronização para racionalizar uma construção,
de se executar um projeto. O livro teve mas ao mesmo tempo dando identidade e
a contribuição de colegas de Doris qualidade para cada escola implantada.
do Departamento de Arquitetura e
Construção, como as professoras
Lucila Labaki, Stelamaris Rolla, pais e comunidade, para formar uma que podiam ser postas e retiradas em ção de que o Estado dá suporte a estas ambiental, a acessibilidade plena
Regina Ruschel e Silvia Mikami. Os discussão mais robusta que estimule minutos. Entretanto, os professores construções. “Tivemos a Companhia e a sustentabilidade. A sala de aula
desenhos que ilustram os conceitos o projetista a fazer inserções diferen- e as classes perderam seus territó- de Construções Escolares (Conesp), deve ser o espaço mais importante.
foram criados pelo também arquiteto ciadas. É desejável ainda um processo rios próprios e, em alguns casos, depois substituída pela Fundação Dentro dela, existem 18 modalidades
professor Francisco Borges Filho. educativo com a comunidade que usavam-se móveis para criar nichos.” para o Desenvolvimento da Educação de aprendizado, entre elas o estudo
Arquitetura Escolar deverá atrair receberá o prédio, para entender o Na sua avaliação de hoje, é possí- (FDE)”, informa ela. Esta Fundação independente, em pequenos grupos, o
profissionais que projetam escolas, potencial da nova edificação escolar. vel que aquele tenha sido um proble- tem uma expertise acumulada sobre- dirigido pelo professor e a distância.
universitários, escolas que repen- “Um ambiente é composto de ele- ma de processo do projeto. Os profes- tudo porque ela administra todas as “Essas atividades não podem ocorrer
sam seus projetos, pesquisadores e mentos arquitetônicos, mas não deve sores não foram instruídos a usar os obras, reformas e manutenções das numa sala 5m X 5m com cadeirinha,
interessados no assunto. O livro tem ser exclusivamente tradicional, com prédios e nem se sentiram à vontade escolas estaduais. Com esta experiên- mesinha e lousa. Deve haver varie-
apoio financeiro da Fundação de sala de aula, corredor e uma quadra, de mudar as divisórias para criar am- cia, a FDE sabe o que não funciona. dade de formato de espaços”, alerta.
Amparo à Pesquisa do Estado de São por exemplo. Muitos consideram bientes mais adequados. “Logo, a Isso foi repassado aos projetos. Agora Outra coisa: “se a entrada não for
Paulo (Fapesp) e já está à venda nas isso escola. Para mim, é muito mais. flexibilidade é um conceito valioso ela apoia o processo de projeto junto convidativa, isso não criará uma re-
livrarias e na Editora que o lançou. Tem que acomodar as atividades em arquitetura pois a sociedade muda, com arquitetos. Quando é época de lação da escola com a comunidade”.
O trabalho é dedicado a Mar- pedagógicas, para que contribuam bem como as ideias e os equipamen- contratá-los, acompanha o processo de No último capítulo, a obra aborda
lei do Nascimento, professora do para um aprendizado mais rico.” tos. A cada dia se ensina diferente do projeto e os orienta em todas as etapas. os processos de projeto nas etapas
ensino fundamental que participou A professora relembra o desafio que se ensinava há 50 anos”, refere. “Esta arquitetura, que não é mais que se pretende melhorar. A sus-
do primeiro projeto Fapesp sobre o de Melbourne, em que projetou uma “Esse conceito deve ser sempre con- a padrão, também é baseada em tentabilidade é tratada como item
ambiente escolar com a autora do escola numa situação urbana central, siderado mas não pode ser neutro e padrões”, pontua Doris. O arquite- de primeira grandeza nos prédios
livro. “Com ela, homenageamos com um terreno muito pequeno. precisa dar indicações aos usuários.” to recebe o trabalho e ganha uma atuais. Pensando nisso, a FDE in-
os alfabetizadores que atuam em À época, tinha lido muito sobre A infraestrutura também deve lista de ambientes, como programa troduziu no Brasil o certificado da
escolas públicas. Essas pessoas são um ambiente ideal. A construção ser projetada para ampliar a flexi- arquitetônico, e sabe que não pode sustentabilidade, no qual os pro-
verdadeiras heroínas no ensino”, diz horizontalizada, relata, sempre foi bilidade de uso dos espaços. Anti- sair do estipulado. “Isso é proble- jetos escolares devem se pautar.
Doris. Além disso, a apresentação considerada a melhor. “Então me gamente havia apenas uma tomada mático porque bons profissionais O livro conclui que a arquitetura
do livro é assinada pela arquiteta dei um desafio e fiz uma escola em nas salas de aula. Hoje há várias e, devem ter liberdade de interpretar o escolar necessita reflexão a partir
Cibele Haddad Taralli, professora da que o pátio ficava no teto, para ho- além disso, rede wireless para as programa para soluções de qualidade.” da complexidade de suas variáveis,
Faculdade de Arquitetura e Urbanis- rizontalizar as atividades criadas.” pessoas usarem os ambientes mais A professora comenta que orientou inclusive em diferentes metodologias
mo da Universidade de São Paulo. Doris se formou com honras. Fez plenamente em diferentes momentos. uma pesquisa de mestrado com apoio de ensino, na dinâmica da sociedade,
Para Doris, elementos como então o mestrado na Universidade de da Fapesp em que foram entrevistados na situação urbana ou rural que se
funcionalidade, identidade com a Berkeley, Califórnia (depois partiu Brasil arquitetos que tinham feito projetos há coloca. Esta arquitetura serve à socie-
pedagogia e infraestrutura configu- para o doutorado na mesma univer- O Brasil tem uma longa história de pouco com a FDE. Foi-lhes indagado dade do futuro. “Precisa ser especial,
ram a distinção e o reconhecimento sidade, dedicando-se à arquitetura arquitetura escolar. Houve épocas em como trabalhavam com a Fundação. correta, estética e um abrigo positivo,
do ambiente escolar em suas múl- escolar e aos seus aspectos humani- que ela foi quase um monumento das Alguns disseram que tentavam agregar dando suporte ao ensino de qualidade.
tiplas funções, e a discussão sobre zadores), onde discutiu o ambiente cidades. Os prédios tinham um alto in- algo ao solicitado. “Isso mostra o cari- Gostaríamos que a arquitetura fosse
a qualidade do ambiente de ensino escolar, as novas pedagogias da vestimento do Estado e do município, nho que têm com a arquitetura escolar.” um lugar para as comunidades, as
leva ao questionamento de “como década de 1970 e como a arquitetura sendo em geral construídos na praça Doris recomenda que os arqui- crianças e os professores. Que eles
o projeto arquitetônico pode contri- escolar deveria reagir às tendências. principal, junto à Prefeitura e à igreja tetos se debrucem sobre questões vissem o local como um espaço de
buir para aumentar essa qualidade”. Era uma época de incertezas, con- matriz. Eram representados por uma complicadas. Esse processo no pré- prazer, pertencimento e suporte a
A obra apresenta teorias de pe- ta, em que se procurava aprimorar arquitetura eclética, destinando-se projeto tem que ser bem cuidadoso e convivências, em particular aquelas
dagogia e metodologias de ensino, o ensino, a priori nos EUA, isso mais à elite. “Com a democratização, o seu desenvolvimento precisa de um que ficam na memória”, expõe Doris.
discute a composição de ambientes com uma dinâmica muito rápida. o crescimento urbano e as políticas feedback. “Levá-lo ao conhecimento ................................................
escolares formados por alunos, pro- Os profissionais ficavam perdi- de ensino para todos, houve perío- da comunidade, para que ela o visua- ■ Publicação
fessores, equipamentos, móveis e a ar- dos, porque havia uma inclinação dos em que os Estados e municípios lize, a fim de saber se funciona, é um Livro “Arquitetura Escolar: o Projeto
quitetura em sua volta. Aborda a his- à arquitetura escolar ser neutra em tiveram que se apressar por construir retorno valoroso. Depois é preciso do Ambiente de Ensino”
tória da arquitetura escolar no mundo, certo sentido e ao mesmo tempo fle- escolas para oferecer vagas”, con- refletir, arrumar e repensar, reagindo Autora: Doris Kowaltowski
e introduz suas tendências e conceitos. xível, com o professor configurando textualiza Doris. Com isso, criaram- se os resultados são inesperados. Editora: Oficina de Textos
No contexto escolar, a arquiteta o ambiente com a necessidade. “Isso se as escolas-padrões. Até agora a São vários instantes de análise.” Financiamento: Fapesp
recomenda que haja, antes de se foi um desastre!”, sinaliza Doris. situação é esta. Os Estados estão A docente realça que são pelo me- Páginas: 272
projetar, um processo analítico e par- “Aqueles prédios eram quase barra- investindo em projetos mais racionais. nos 35 os parâmetros para o projeto Preço: R$ 75,00
ticipativo com professores, alunos, cões vazios com divisórias flexíveis, Em São Paulo, há uma longa tradi- escolar, não podendo faltar o conforto ................................................

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