Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
10.37885/210605065
RESUMO
305
Agroecologia: métodos e técnicas para uma agricultura sustentável - Volume 5
INTRODUÇÃO
A modernização da agricultura no Brasil por meio do uso dos chamados pacotes tecno-
lógicos (sementes melhoradas, fertilizantes, mecanização e uso de agrotóxicos) promoveu
considerável aumento da produtividade agrícola, especialmente das espécies cultivadas para
exportação (milho, soja, café e cana de açúcar), entretanto, trouxe inúmeras consequências
negativas para a agricultura familiar, visto que muitos produtores não conseguiram se adaptar
e/ou ter acesso às novas tecnologias. Dentre os principais impactos negativos podemos citar
o aumento do custo de produção, êxodo rural, a redução da diversidade e qualidade dos
alimentos produzidos e consumidos pela população rural e a erosão genética de espécies
cultivadas pelas comunidades rurais.
A tradição da estocagem de sementes pelos agricultores sofreu forte impacto decor-
rente da expansão e intensificação do processo de modernização técnica da agricultura
brasileira. A subordinação da agricultura à lógica da produção capitalista alterou as formas
tradicionais de produção da agricultura familiar à medida que o tradicional passou a ser
desvalorizado e tido como sinônimo de atrasado e antigo, e o “novo” passou a ser sinônimo
de moderno e revolucionário (NASCIMENTO, 2011).
A substituição de sementes próprias por sementes híbridas comerciais e transgênicas
teve como consequência um acelerado processo de erosão genética (SOUZA et al., 2017).
Inúmeras espécies e variedades tradicionais que até então eram produzidas e consumidas
pelas famílias da área rural desapareceram, na medida que a prática de se armazenar se-
mentes de espécies selecionadas a inúmeras gerações deu lugar a compra de sementes
produzidas pelas grandes empresas. Como consequências deste processo podemos citar a
perda da autonomia das comunidades rurais em decidir o que e como cultivar, a redução na
diversidade e qualidade dos alimentos produzidos, o desaparecimento de inúmeras espécies
vegetais e a perda do conhecimento popular sobre a forma de cultivo, usos alimentares e
medicinais destas espécies.
Além dos altos custo para a aquisição dos insumos no cultivo de híbridos e transgê-
nicos, o valor destas sementes vem aumentando consideravelmente nos últimos anos, isto
se deve a fusão de empresas produtoras de sementes que têm monopolizado e controlado
o comércio mundial, retirando principalmente dos agricultores familiares a autonomia de
seus cultivos e como já mencionado a perda de inúmeras espécies, fato este reconhecido
inclusive pelas próprias instituições que promoveram este ‘novo modelo’ de agricultura.
Diante deste cenário várias ações a níveis mundiais vêm sendo realizadas com o ob-
jetivo de resgatar a autonomia, preservar e conservar as espécies de interesse econômico,
social e cultural das comunidades rurais e estimular a diversificação produtiva, promovendo
maior segurança alimentar destas comunidades. No Brasil, a principal estratégia utilizada
306
Agroecologia: métodos e técnicas para uma agricultura sustentável - Volume 5
vem sendo a criação dos Bancos de Sementes Comunitários (BSC) de sementes crioulas
(BALENSIFER; SILVA, 2014).
De acordo com a Lei de Sementes 10.711 (BRASIL, 2013) sementes crioulas e tradi-
cionais são aquelas variedades desenvolvidas, adaptadas ou produzidas por agricultores
familiares, assentados da reforma agrária ou indígenas, com características fenotípicas bem
determinadas e reconhecidas pelas respectivas comunidades e não se caracterizem como
substancialmente semelhantes aos cultivares comerciais.
A formação de bancos de sementes comunitários vem sendo uma das principais es-
tratégias no Brasil especialmente nas regiões sul e nordeste, como forma de garantir a
continuidade e a existência das variedades tradicionais/crioulas e de todo o conhecimento
popular associado a elas, desde as técnicas de manejo, até as diversas formas de uso na
alimentação e na medicina popular.
Na região do Pontal do Triângulo Mineiro do estado de Minas Gerias, existem mui-
tos assentamentos rurais reconhecidos pelo INCRA e agricultores familiares tradicionais,
entretanto não existe até o momento nenhum banco de sementes comunitário, as trocas
são realizadas informalmente e sem um controle na produção e qualidade das sementes, e
muitos agricultores relatam a perda de cultivares tradicionais locais.
A experiência relatada possui como objetivo a formação de um banco de sementes
comunitário e a implantação de uma área de multiplicação de sementes agroecológicas
na UFTM (Universidade Federal do Triângulo Mineiro) campus de Iturama (MG) que visa
auxiliar os agricultores familiares no resgate de espécies tradicionalmente cultivadas na
região, na conservação genética destas espécies, e incentivar a diversificação de cultivos
e consequentemente maior segurança alimentar destas famílias.
RELATO DE CASO
308
Agroecologia: métodos e técnicas para uma agricultura sustentável - Volume 5
Figura 01. Colheita, secagem e distribuição das sementes crioulas aos agricultores familiares.
Em 2021 será realizado o preparo da área para cultivo de novas variedades crioulas
de forma agroecológica, para a manutenção do banco e distribuição aos agricultores. Tão
logo a pandemia passe, esperamos que as atividades presenciais como oficinas de seleção,
conservação de sementes e as feiras de troca sejam retomadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O uso das mídias sociais tem possibilitado a troca de saberes populares e científicos,
a divulgação do banco de sementes e despertando o interesse da comunidade sobre a
importância da preservação das sementes crioulas e adoção de práticas agroecológicas.
Durante a elaboração e execução do projeto os alunos participantes estão tendo a pos-
sibilidade de vivenciar a realidade inerente da agricultura familiar. Através das atividades rea-
lizadas foi possível a construção do conhecimento entre acadêmicos, docentes e agricultoras.
Observamos que as ações do programa estão possibilitando maior autonomia das
famílias que obtiveram suas sementes, uma vez que muitos relataram que já estão reali-
zando o cultivo das variedades crioulas. O cultivo destas espécies também tem auxiliado
as famílias na diversificação dos seus cultivos e poderá contribuir para maior segurança
alimentar das famílias.
Muitos agricultores que estão participando do programa comercializavam seus produ-
tos em feiras locais, via mercados institucionais e/ou diretamente com o consumidor, em
época de pandemia onde algumas vias de comercialização diminuíram e as vendas diretas
aumentaram, tem se mostrado importante a diversificação de produtos e adoção de práticas
que reduzam os custos de produção.
309
Agroecologia: métodos e técnicas para uma agricultura sustentável - Volume 5
REFERÊNCIAS
1. BALENSIFER, P. H. M.; SILVA, A. P. G. Metodologia para formação de bancos comunitá-
rios de sementes. Recife, PE: Instituto Agronômico de Pernambuco, 2016. 32 p.
2. BRASIL. Constituição (2003). Lei nº 10.711, de 05 de agosto de 2003. Dispõe Sobre O Sis-
tema Nacional de Sementes e Mudas e Dá Outras Providências. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.711.htm>. Acesso em: 20 set. 2020.
310
Agroecologia: métodos e técnicas para uma agricultura sustentável - Volume 5