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INFÂNCIA, EDUCAÇÃO E AS CULTURAS INFANTIS.

LIMA, Márcia Regina Canhoto de- FCT- UNESP/PP


marcialima@fct.unesp.br

LIMA, José Milton de – FCT- UNESP/PP


miltonli@fct.unesp.br

MOREIRA, Tony Aparecido – FCT/UNESP/PP


tony_ohsuper@hotmail.com

ORLANDI, Leonardo de Angelo – FCT/UNESP


leo_polemiko@hotmail.com

Eixo Temático: Educação Infantil


Agência Financiadora: PROEX- Pró Reitoria de Extensão

Resumo

O objetivo deste projeto de pesquisa e intervenção é analisar como as culturas da infância são
compreendidas no contexto da Educação Infantil e como são trabalhados os quatro eixos
estruturadores dessas culturas, denominados, segundo Sarmento (2004) de: interactividade,
ludicidade, fantasia do real, e a reiteração. O interesse em pesquisar este tema surgiu a partir
da constatação de que os atores escolares pouco sabem sobre as culturas infantis e pesquisas
podem contribuir para que novas concepções sejam socializadas e até mesmo incorporadas
pelos educadores da infância. A metodologia adotada é de natureza qualitativa,
caracterizando-se como pesquisa-ação. Este tipo de pesquisa é de natureza social e com base
empírica, sendo concebida e realizada em estreita associação com a resolução de um
problema coletivo e no qual o pesquisador e os participantes representativos da realidade
estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. A investigação esta sendo feita com
educadores de uma escola municipal de Educação Infantil da cidade de Presidente Prudente e
vários avanços já têm se efetivado. Nas últimas avaliações, os educadores da escola,
ressaltaram os benefícios que tiveram a partir deste trabalho, pois concepções estão sendo
repensadas e ações têm gerado mudanças que refletem de maneira qualitativa e significativa
na prática educativa e na formação das crianças. Espera-se como resultados, ampliar a
produção de conhecimentos consistentes e com rigor científico, que promovam a elaboração
de indicativos e apontamentos que possam colaborar em mudanças qualitativas nas práticas
educativas dos participantes da pesquisa e que sirvam de suporte para outros profissionais
dessa modalidade educacional.

Palavras chaves: Educação. Educação Infantil. Culturas da Infância.


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Introdução

Esta pesquisa esta sendo realizada em uma escola de Educação Infantil da rede
municipal da cidade de Presidente Prudente. Ela conta com a participação de docentes e
discentes do curso de Educação Física e Pedagogia da Faculdade de Ciências e Tecnologia –
Unesp, Campus de Presidente Prudente, todos membros do Grupo de Pesquisa: “Cultura
Corporal: saberes e fazeres” e por educadores da Escola Municipal contemplada.
A metodologia adotada e a pesquisa-ação e representa uma possibilidade de unir teoria
e prática, a fim de ocorrer à mediação entre pesquisador e grupo de participantes, entre o
saber formal com rigor teórico metodológico e o saber empírico. Em relação aos
pesquisadores, esta opção metodológica esta possibilitando uma experimentação em situação
real, na qual os participantes estão intervindo de maneira consciente e preocupados com as
mudanças e avanços na realidade estudada. Quanto aos participantes da instituição parceira
eles não são considerados como “cobaias”, pelo contrário, são respeitados e desempenham um
papel ativo, sendo partes fundamentais da pesquisa-ação. Esta opção metodológica, portanto,
é um instrumento de compreensão da prática, na qual todos os envolvidos buscam questioná-
la, avaliá-la e, conseqüentemente, transformá-la, exigindo, assim, formas de ação coletivas e
tomadas conscientes de decisões.
Em relação ao planejamento da pesquisa-ação junto ao grupo, foi adotado como
referência o roteiro destacado por Thiollent (1988, p.48- 72), que não estabelece formas
rígidas de construção, pelo contrário as etapas da pesquisa são bastante flexíveis. O autor
aponta algumas fases, destaque para: a exploratória, a definição do tema, a colocação dos
problemas, o lugar da teoria, as hipóteses, os seminários, o campo de observação, a
amostragem e a representatividade qualitativa, a coleta de dados, a aprendizagem, o saber
formal/ saber informal, plano de ação e divulgação externa. Nessa pesquisa foram inseridas
algumas dessas fases, que se distribuíram em 03 etapas: a inicial, o desenvolvimento e a
conclusão.
Todas as fases contaram com a participação efetiva, numa relação próxima, dialógica,
interativa entre pesquisadores e o grupo de participantes. A pesquisa-ação é sempre
participativa. No processo de produção de conhecimentos ela somente tem sentido se tiver
uma cumplicidade, uma parceria entre todas as partes envolvidas, o que nesta pesquisa
aconteceu.
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Neste sentido, é objetivo principal, analisar como as concepções de criança e culturas


da infância são compreendidas no contexto da Educação Infantil, tomando como base os
quatro eixos estruturadores dessas culturas, denominados por Sarmento (2004) de:
interactividade, a ludicidade, a fantasia do real e a reiteração.
Estudos mostram que a maioria das pessoas, ainda, desconhece ou ignora as culturas
das crianças, que as distinguem dos adultos e as instrumentalizam para lidar com o mundo
natural. Na maioria das vezes, as conceituações sobre infância estão camufladas em visões de
adultos referentes às suas próprias experiências da infância. Neste sentido, busca-se nesta
pesquisa, contribuir na produção de indicativos que possam colaborar na mudança de
concepções que norteiam o trabalho pedagógico na Educação Infantil no que diz respeito às
atividades que privilegiem a infância como categoria e as culturas infantis como um tipo de
identidade definidora.

Desenvolvimento

A criança possui várias formas de pensar, de agir e de estar no mundo, por isso,
compreendê-las e, principalmente interpretá-las, exige saberes técnicos, científicos, mas
acima de tudo, saberes humanos, no qual a sensibilidade é o fator preponderante. Através das
interações sociais que se estabelecem neste contexto, é preciso entender a criança como ser
concreto e que ocupa um lugar na história.
É preciso compreender a infância a partir do seu próprio campo, enxergar que em cada
criança existe antes de tudo um ser cultural, social, concreto que pensa, que sente e que tem
direitos à participação, portanto, não se justifica mais amparar a prática educativa pela visão
de criança como ser “imaturo”, “tabula rasa” ou “um projeto de adulto”.
A infância não pode ser vista como um dado universal nem como uma categoria
natural, mas, essencialmente, como uma construção histórica, cultural e social. Só que este
conceito nem sempre foi tratado assim. Na verdade, a criança sempre esteve presente em
todos os períodos da nossa trajetória humana, entretanto, o conceito de infância, enquanto
categoria social, segundo Áries (1981), começou a ser revelado e estruturado entre o século
XVIII e XIX.
Etimologicamente a palavra infância é derivada da expressão latina “infante”, que
significa aquele “que não fala”, “incapaz de falar”. Essa idéia da criança incapaz, que não
fala, não está presente apenas na literatura, mas está impregnada na concepção de pessoas que
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trabalham com crianças pequenas. Na maioria das vezes, a infância é entendida apenas como
uma etapa biológica da vida do ser humano. Pelo nível de maturidade, a criança é vista como
antagônica ao adulto, tornando-se assim, essa etapa da vida, uma preparação para a vida
adulta, um “vir a ser”. A criança é entendida, nesta perspectiva, como um “adulto em
miniatura”.
Para Áries (1981), a conotação de infância em cada período histórico teve diferentes
compreensões influenciadas pelos aspectos: político, econômico, social e cultural. A criança
não tinha lugar de destaque, não tinha privilégios, regalias, era vista como um ser substituível
e cuja função na sociedade era de cunho utilitarista. Aos sete anos de idade já era introduzida
na vida adulta, desempenhando tarefas, imitando pai e mãe, aprendendo ofícios, tornando-se
assim, útil e necessária à economia familiar.
Somente do adulto era esperado comportamento próprio da razão, do pensamento. A
infância era restrita apenas ao momento em que a criança não conseguia ter suficiência
própria, assim que superasse esta etapa era introduzida no mundo dos adultos, portanto, esta
fase da infância era uma situação transitória e cujas capacidades esperadas das crianças
ocorriam a partir das relações que elas estabeleciam com os mais velhos.
Segundo Áries (1981), foram séculos de altos índices de mortalidade infantil, pois as
perdas eram tratadas como naturais e esperadas. Nesse processo, aquelas que conseguiam
sobreviver demonstravam estar aptas para atender às exigências daquele contexto histórico. A
família, neste contexto social, era tradicional e não sentimental, também, não existia o
sentimento de amor materno, como referência à afetividade; tanto que, crianças ao nascerem
eram entregues para serem educadas por outras famílias e podiam retornar ou não para a
família biológica. Para Áries, o processo de aprendizagem social das crianças era feito, na
maioria das vezes, distante dos pais; sendo comum a participação de outras famílias, vizinhos,
amigos e criados, na preparação da criança para o mundo adulto.
Para o autor (1981), as relações de convívio com os diferentes membros da sociedade
aconteciam no momento em que as crianças conseguiam o status de ajudante dos adultos no
desempenho de determinada tarefa. Por isso, vivenciar, experimentar e aprender este mundo
em que o adulto estava era essencial para que as crianças pudessem conseguir atingir o topo
que tinha a ver com o status de sujeito social.
Pode-se perguntar se antes era assim; hoje, o que temos na Educação Infantil? Qual a
visão dos educadores a cerca dessa criança? Eles a concebem como sujeito histórico, que se
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apropria e produz cultura? O trabalho nas escolas privilegia a criança na sua especificidade e
valoriza as culturas infantis? É possível pensar e assumir a concepção de infância como um
ser de direito e plena participação no processo educacional no interior das escolas?
Neste sentido, este projeto, estabelece como perspectiva, pesquisar como as
concepções de criança e culturas da infância são compreendidas no contexto da Educação
Infantil, tomando como base os quatro eixos estruturadores dessas culturas, denominados por
Sarmento (2004) de: interactividade, ludicidade, fantasia do real e reiteração.
O primeiro eixo a interactividade, segundo Sarmento (2004, p.23), considera que a
criança vive num mundo heterogêneo, onde ela está em contato com várias e diferentes
realidades que permitem a formação da sua identidade pessoal e social, destaque para a
escola, a igreja, a família, as atividades sociais, os seus pares. Por isso, para que a
aprendizagem se concretize, a cultura de pares que é estabelecida quando as crianças
partilham do mesmo espaço e se relacionam umas com as outras precisa ser garantida. A
interatividade como um dos fatores das culturas da infância demonstra que a criança é um ser
conotativo e atuante que realiza suas atividades sempre de uma forma distinta das culturas dos
adultos sendo necessário que viva em contato com realidades distintas. Todos os contextos e
espaços são fundamentais para a criança atuar na perspectiva da interatividade. As Instituições
de Educação Infantil transformam-se num espaço privilegiado de trocas, interações entre a
criança e o mundo que a rodeia. Além da interação com seus pares, é importante também
favorecer a construção de um ambiente que favoreça todos os tipos de interações e possibilite
à criança se desenvolver dentro de um espaço satisfatório para a sua inserção no mundo e
expressão de suas riquezas e realidades.
O segundo eixo a ludicidade representa um aspecto essencial das culturas infantis. A
natureza interativa do brincar é um dos primeiros componentes das culturas da infância.
Sarmento (2004) salienta que brincar não é exclusividade das crianças, é natural do homem,
mas as crianças brincam desinteressadamente e continuamente. “O brinquedo e o brincar são
também um factor fundamental na recriação do mundo e na produção das fantasias infantis”
(Ibidem, 2004, p. 26). A brincadeira é vista como linguagem e como um recurso privilegiado
que possibilita a ampliação do conhecimento da realidade onde está inserida. A Ludicidade é
um elemento fundamental das culturas da infância, e em especial o mais discutido. A criança
utiliza muito da ludicidade em suas manifestações, brincando, agindo ou expressando
emoções e realidades. O lúdico encontra-se presente nas relações das crianças com os seus
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pares e o mundo. A própria brincadeira já provoca a manifestação do lúdico, e brincando a


criança enriquece seu tempo, ilustra seu espaço, se conhece. De maneira geral, nas atividades
da criança perpassa a ludicidade e se caracteriza como linguagem rica e própria.
Na maioria das vezes, o adulto não entende essas ações da criança, julga
equivocadamente e age indiferente a sua real importância. Há muito a se explorar em cada
manifestação da criança, há uma gama de detalhes que nós adultos não conseguimos
identificar, há um traço íntimo, uma forma única que se encaixa perfeitamente a sua realidade
e descreve suas características.
A ludicidade propícia a manifestação do eu e do exercer do corpo como sujeito. O
corpo por sua vez possui uma linguagem rica e própria, e na perspectiva da ludicidade este
corpo expressa além da essência do individuo, a ocupação do espaço e do tempo, dado por
uma gama de movimentos que são apropriados, descobertos ou reproduzidos por meio da
bagagem cultural.
A linguagem lúdica é o grande instrumento das manifestações da criança, é também
um importante instrumento de nossa interação com elas. O educador tem grande
responsabilidade para o sucesso das atividades, pois, as atividades lúdicas devem se adaptar as
crianças e não as crianças a ela. Um ritual deve ser seguido, desde a entrega da criança à
atividade, até o partilhar de vivências e experiências. Mesmo estando no grupo, as sensações
geradas se manifestam em cada indivíduo pessoalmente, e o modo como estes conceberão a
atividade definirá se esta será lúdica ou não, se gerará prazer ou uma experiência ruim, e isto é
próprio do individuo, que deste modo é o real sujeito de sua ação.
Em relação ao terceiro eixo, a fantasia do real, o autor mostra que é através do mundo
da fantasia, do faz de conta, que a criança atribui significado às coisas e constrói a sua visão
de mundo. É uma capacidade de resistência frente às situações indesejáveis, dolorosas,
vivenciadas pelas crianças. E possível perceber que a criança possui um potencial próprio, na
brincadeira ela cria, recria, enriquece e transforma. Tudo o que faz parte de seu ambiente
ganha um significado especial aos seus olhos, diferente da visão objetiva dos adultos. Isso faz
com que estes não compreendam as ações das crianças e desvalorizem suas manifestações. A
imaginação da criança renova e transforma o que a cerca sem se prender aos limites da lógica,
simplesmente ela pode fazer e através deste poder fazer ela concretiza os desejos que foram
impossibilitados pelos adultos ou por seus próprios limites.
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A fantasia do real possibilita à criança elaborar diversas hipóteses, tomar atitudes,


transformar-se em personagens, modificar a realidade num mundo de faz-de-conta onde tudo
pode acontecer. A fantasia do real enriquece as atividades, pois a criança experimenta várias
formas de brincar e de resolver problemas através de recursos materiais que ganham
determinado valor ou contextos imaginários que resolvem aos seus olhos o que o mundo a
havia convencido de ser impossível.
Sarmento (2004, p. 26), destaca à imbricação dos dois mundos: o real e o fantasioso;
que estão inseridos, inclusive nas brincadeiras infantis. Contudo, precisamos relevar que o
mundo idealizado pela criança não é somente uma representação do real, trata-se de um
distanciamento do real. A criança se distancia da realidade quando cria situações para
esconder algo que aconteceu de ruim a ela, a fantasia permite que ela possa tanto reconstruir o
universo circundante por seus ideais ou construir um novo mundo, mas sem deixar de se
relacionar com o mundo real.
Como quarto eixo, Sarmento (2004) aponta a reiteração, destacando que o tempo da
criança é sempre provido de novas possibilidades, capaz de ser repetido, reiniciado a qualquer
momento. Este tempo tanto pode ser no plano sincrônico, no qual rotinas e situações são
recriadas, como no plano diacrônico, por meio da transmissão dos jogos, brincadeiras e rituais
“das crianças mais velhas para as crianças mais novas, de modo continuado e incessante,
permitindo que seja toda a infância que se reinventa e recria, começando tudo de novo” (Ibid,
p.29). O tempo da criança é muito diferente do tempo do adulto e esta compreensão faz a
diferença em nossas relações com elas. A criança é introduzida em um mundo já pronto, onde
por uma forma já imposta terá que se adaptar ao mundo.
Enquanto o adulto possui um tempo totalmente dividido por funções e
responsabilidades, a criança possui um tempo recursivo que se equaciona no dia-a-dia, em
meio as suas atividades, sendo o brincar uma atividade principal. O adulto ao estar
executando qualquer atividade, se restringe a uma parcela de tempo determinada por um fator
externo ao qual está envolvido. A criança brinca e continua a brincar se a caso estiver
gostando, ou pára se não lhe interessar mais, e se ela está brincando há dez minutos ou há uma
hora, se brincou há uma semana ou há um dia, isto é relativo para ela, pois, o seu tempo é
cheio de possibilidades que se renovam a cada momento e se estabelecem por meio de um
potencial ilimitado.
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Estes quatros eixos acima destacado estão sendo investigados e analisados no contexto
da Educação Infantil. Um espaço onde as crianças deveriam ser compreendidas como atores
sociais, pois elas se relacionam com a instituição, com as pessoas e se colocam perante os
adultos, desenvolvendo estratégias próprias para lidar com questões do mundo social em que
estão inseridas.
As culturas da infância só são relevantes se o contexto social for levado em conta, ou
seja, é preciso observar as condições sociais em que as crianças vivem e se relacionam. O
mundo delas é muito diversificado, convivem com realidades diferentes, aprendendo e
lidando com valores que auxiliam na sua formação. Portanto, todas as contribuições são
importantes, por isso, a escola tem uma função essencial neste processo e os educadores
também, pois, alguns ainda desconhecem, ou ignoram as culturas das crianças, que as
distinguem dos adultos e as instrumentalizam para lidar com os adultos e o mundo natural. As
conceituações sobre infância estão camufladas em visões de adultos referentes às suas
próprias experiências da infância. Tais influências marcaram o seu modo de conceber a
própria infância. Neste sentido, a infância existe em seu modo de ser, e precisa ser respeitada
nisso.

Considerações Finais.

As crianças sempre estiveram presentes na história da humanidade, desde os primeiros


registros históricos já havia algumas interpretações implicadas a idéia de infância, e este
termo passou por diversas fases de definição, tendo se originado do latim infante que significa
“ser que não fala”, o que já define a desvalorização direcionada ao termo infância. As crianças
no início da história não tinham valor próprio, eram tidas como seres em formação e esta
concepção, ainda, sobrevive, apesar do avanço legal e da produção bibliográfica sobre o tema.
A modernidade trouxe consigo outros aspectos, com investimentos da sociedade e dos adultos
sobre as crianças e a preocupação em criar formas para regular a infância. Estudos
contemporâneos resgatam as concepções de infância na história da humanidade e relatam o
fato de as crianças participarem coletivamente na sociedade, da qual são sujeitos ativos, a
partir disso, elas não só reproduzem elementos culturais, mas também produzem cultura.
A constituição deste espaço no âmbito da instituição de Educação Infantil parece tão
complicada quanto importante, mas antes de qualquer coisa é preciso que o próprio educador
entenda a criança como ator social, valorizando o seu desenvolvimento global e não apenas os
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resultados das tarefas, ou unicamente tente melhorar sua prática. É preciso que ele se aproprie
desta concepção como norte de sua abordagem pedagógica.
Há dentro de cada criança uma rica uma construção social, cultural e histórica,
todavia, resultantes de uma interpretação única e especial que clama por atenção e
valorização. A criança não pode continuar a ser minada pelos adultos que não compreendem
suas manifestações e agem como se nunca tivessem sido crianças. O que parece “bobeira,
traquinagem, faz de conta, brincadeira” aos olhos de um adulto, é na realidade ampla da
criança: desenvolvimento, apropriação, inserção no mundo, ilustração de tempo e ocupação
de espaço. É fundamental que enxerguemos esses aspectos em cada uma, que nos
direcionemos em olhar a criança de uma forma consciente e fundamentada na sua formação
humana.
Portanto, compreender as culturas da infância, com seus quatro eixos estruturadores
foi o objetivo desta pesquisa realizada em uma escola municipal na cidade de Presidente
Prudente. Durante a realização da pesquisa, foi possível verificar os avanços obtidos durante o
processo. No princípio dos trabalhos, alguns educadores rejeitavam a temática, por vários
motivos: uns porque não sabiam e não tinham conhecimento sobre o tema, outros por medo,
outros porque não acreditavam na proposta e, ainda, havia aqueles que não tinham tempo,
pois precisavam dar “conta do conteúdo”. Havia também aqueles que gostavam da temática,
mas precisavam de ajuda, já que não sabiam por onde começar. Contudo, uma coisa era
comum: todos queriam participar do processo e se colocaram abertos ao debate, às reflexões,
no decorrer de todo o processo. Como a própria metodologia de pesquisa-ação adotada
referencia, as mudanças na realidade ocorreram, todavia, não da maneira como os
participantes tinham como expectativas.
Durante as aulas ministradas pelos discentes universitários do grupo de intervenção e
de pesquisa, na escola, em todas as quartas-feiras, os professores da sala estavam presentes e
com o plano de aula que seria ministrado em mãos. As aulas eram, além de assistidas,
questionadas e avaliadas pelo docente da sala, que, na semana seguinte, trabalhava com suas
crianças as atividades novamente. Nos seminários e nas aulas semanais, as dúvidas eram
sanadas e o conteúdo avaliado.
Mesmo considerando algumas fragilidades, dificuldades e limitações da investigação,
o ganho foi substancial. Por meio do estudo teórico dos autores da área, das intervenções
realizadas pelos alunos e da coleta de dados, composta por entrevistas e questionários, foi
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possível destacar que a visão dos educadores sobre a infância foi ampliada, constatando-se
avanços no modo de conceberem a criança como sujeito histórico, que se apropria e produz
cultura. Também foi considerado que a escola, por vários motivos, não está privilegiando nem
valorizando as culturas infantis, uma vez que vários problemas foram levantados, nesse
aspecto, como pressão dos pais, pressão do sistema, falta de interesse da criança, falta de
cursos de aperfeiçoamento, número excessivo de crianças por sala, entre outros. E, como
última questão, os educadores relataram que, apesar de todos os problemas levantados, é
possível, partindo dos quatros eixos estruturadores, assumir uma concepção de infância na
escola, que valorize sua maneira de ser.
Nas últimas avaliações, tanto a diretora quanto a orientadora pedagógica ressaltaram
os benefícios que a escola teve, com esse trabalho, pois os professores da escola puderam
usufruir de um processo de formação continuada que levou em conta o contexto social onde
estão inseridos; além disso, concepções foram trabalhadas e ações geraram mudanças que
refletiram de maneira qualitativa na sua prática educativa e na formação das crianças.
Em relação aos discentes universitários, a participação nesta pesquisa teve um ganho
substancial, visto que, a partir de uma base teórica diferenciada e um espaço de vivências e
experiências práticas, foi-lhes propiciado uma formação acadêmica mais sólida, promovendo
a relação entre teoria e prática assimiladas no processo de formação acadêmica.
Para os docentes universitários, os resultados foram positivos, porque, ao
desenvolverem suas pesquisas, lideraram produções de conhecimento e enriqueceram as suas
práticas educativas, no interior da universidade, com questões e encaminhamentos
vivenciados na realidade escolar. Isso possibilitou igualmente socializar os conhecimentos
adquiridos através de publicações e participações em eventos e nas aulas ministradas no
interior da universidade.
O grupo, apesar de todos os problemas enfrentados no cotidiano escolar, defende que
não é função da escola apenas transmitir informações e instruções, porém educar, despertar
nas pessoas a capacidade de aprender e rever suas visões e representações. O processo de
ensino-aprendizagem não pode ficar restrito à formação de crianças, em uma ou duas áreas de
competências, pois, além de escrever e de resolver problemas matemáticos, a criança deve ser
capaz de se emocionar, de sentir, de amar, de agir, de ser solidária, sonhar e de se realizar
como pessoa que é. Que, acima de tudo, cresça feliz, como ator social pleno, sem deixar de
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ser criança e que os educadores jamais permitam que a magia e a cultura da infância se
percam.
Cada criança na sua trajetória cultural e histórica traz uma rica construção social,
todavia, resultantes de uma interpretação única e especial que clama por atenção e
valorização. A criança não pode continuar a ser minada pelos adultos, que não compreendem
suas manifestações e agem como se nunca tivessem sido crianças. O que parece
“traquinagem, faz de conta, brincadeira”, aos olhos de um adulto; constitui, na realidade
ampla da criança, desenvolvimento, apropriação, inserção no mundo, ilustração de tempo e
ocupação de espaço. É fundamental que enxerguemos esses aspectos em cada uma, que nos
direcionemos em olhar a criança de uma maneira consciente e fundamentada na sua formação
humana.
As crianças interagem com outras pessoas e instituições, reagem frente aos adultos,
desenvolvem estratégias para atuar no mundo social. As culturas da infância estruturam-se
nessas relações e interações, as quais se manifestam na sociedade em que a criança está
inserida.
Assumir esse trabalho, partindo dessas premissas levantadas, é um desafio muito
grande. A nossa contribuição caminha no sentido de socializar esses conteúdos, de sorte que,
ao conhecer a temática, o educador possa fazer suas escolhas e definir a sua opção política.
Uma opção que, apesar de reconhecer os problemas encontrados nesta sociedade excludente e
opressora, busca alternativas para lutar contra a morte dos sonhos e das utopias. Que os
educadores acreditem, com a alma e com o coração, que a infância não morreu. Para finalizar,
terminamos parafraseando Carlos Drummond de Andrade, que diz sabiamente que “brincar
com criança não é perder tempo, é ganhá-lo, se é triste ver meninos sem escola, mais triste
ainda é vê-los sentados enfileirados, em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para
a formação do homem”.

REFERÊNCIAS

ARIÈS, P. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro, Zahar, 1981.

SARMENTO, M. J.; CERISARA, A. B. Crianças e Miúdos: perspectivas sociopedagógicas


da infância e educação. Lisboa: Asa Editores S.A. 2004.

THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez, 1988.

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