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Autoria Mediata por meio do Dominio da Organizacao" Claus Roxin I —A idéia-base da concepcao imes no ambito de aparatos organizados de poder” foi o titulo | da minha conferéncia de posse na Universidade de Hamburgo em fevereiro de 1963'. A época, propus uma nova forma de autoria me- | diata. O cerne de meu pensamento consistia em que, partindo-se do dominio do fato como critério decisive para a autoria, haveria apenas | trés formas tipicas ideais, nas quais se poderia dominar um aconteci- ‘Mento sem que o autor estivesse presente no momento da execugio: pode-se coagir o executor, engani-lo ou (e essa era a idéia nova) dar ordens através de um aparato de poder que garanta.a.execugao.do comando, mesmo sem coagio ou engano, uma vez que o aparato en- quanto tal assegura a execucao.do fato, Aquele que ordena tem condi- Ses de renunciar 3 coacéo ou ao engano do autor imediato, isto, por- que, no caso de este nao-cumprir 0 comando, 0 aparato dispée, sufi- cientemente, de outros individuos para assumir a funcdo de executor. Em razio disso, € também caracteristico, nessa forma de autoria me- Original: "Mittelbare Taterschaft kraft Organisationsherrschaft’, in: Axel Boetticher / Martin W. Huff / Herbert Landau / Gunther Widmaier (eds.}, Sondetheft fur Gerhard Schafer 2um 65. Geburtstag am 18. Minchen, Frank- fart a. M:C. H_ Beck, 2002, pp. 52 € ss. Tredugao de José Danilo Tavares Lobsto. 1 Publicado em GA, 1963, p.193 7 323 : OC eee data, que o homem de trés freqientemente nem sequer conheca pes- \ soaimente o executor imediato. “0 exemplo histérico que esteve diante de meus olhos no desen- volvimento desta forma de autoria mediata foi o dominio nacional so, Gialista da violencia. Quando Hitler, Himmler ou Eichmann (que fora processado, em 1961, na cidade de Jerusalém) deram ordens de ma, tar, podiam estar seguros de sua execugio, pois, diferentemente de tuina instigacio, a eventual recusa de algum exortado, na execucao de ordem, seria incapaz.de fazer com que o fato ordenado nao fosse leva, do 2 cabo. Neste contexto, 0 comando seria cumprido por outta pes. soa. Por isso, autor mediato 6, segundo a minha concepeao, todo aque le que tem, em suas mos, a alavanca de controle do aparavo de porte, independentemente do grau hierdrquice 5, &, através de un pode dar origem a fatos peiiais, ‘nos quais néo importa a inc de do executante. —Portants, €a Fungibilidade (substitu imediato) que garante ao homem de trés a e: -xecugio do fato e Ihe permite dominar os acontecimentos. O atuante imediato & apenas uma roldana substitufvel dentro das engrenagens do aparaio de poder, a idade do autor imediato que, ao fim, Com as suas préprias mos. No entanto, os “co. mandantes” da alavanca de controle do aparato de poder sfo autores ediatos, uma ver que a execucdo do fato,diferentemente da intigar 0, ndo depende da deciséo do autor imediato. Visto que a autoria imediata do executor ¢ a mediata do homem de trés dependem de Pressupostos diversos, respectivamente, uma em razio do atuar de Proprio punho e a outra em funcéo da condugdo do aparato; amibas adem, sem dividas, ligica teleologicamente coexistir lado a lado, Gontrariando, assim, um pensamento amplamente difundido. A forme de aparisio descrita do autor mediato & a expressio juridicamente adequada para o fendmeno do “autor de gabinete" ou “autor de eserh, Pninha” (Schreibtischtater), que, sem prejuizo de seu dominia do fato, carece, necessariamente, de autores imediatos. lade ilimitada do autor Tl— A recepgio da teoria da autoria me ta por meio do dominio da Organizacao na ciéncia e na jurisprudéncia, no estrangeiro e no direlto Penal internacional Enquanto a jurisprudéncia alemé, ao longo de 25 anos, nfo repa- 04 na nova construsio, apesar de ela ter podido ser de grande ajuda 324 no julgamento dos delitos violentos do sepne nacional soins correr do tempo, & doutrina literatura, ela ascendeu, no corre majorite i ‘dica encontrou aceitacio, pt No exterior, a nova figura juri c “ ramente, em meados da década de 80, quando do Joltamento dor crimes da antiga junta mila, isto, ne Funcamentagio dos acbrdos do Tribunal de Apeagses e da Corte Suprema de Justiga da Argen- tna’, Nos registro do Tribunal, const que: “os acusades tinhar dominic do fato, pois eles controlavam a orgarizagio que os produ de sentido o executor con: ziu. (..) Neste contexto, per > rete dos face 3 ae iio — que quem controla o sistema detém sobre é m relizagio dos fatos ordenedos€ total, isto porque mesmo se um dos subordinados levste & cena a su opoio,aotomatiements ste i fc 0; do que se segue qu 1 seria substituido por um outro; phno pret. do nio pode ser levado a0 fracasso através do querer opositivo do executor que, pura simplesmente, representa uma mera reds dentada dentro de um maquindrio gigante. (,..) O instrumento, tungsherrschaft, 1992, pp. 60.€ 8; pp. 71 2 BOTTKE, Taterschaft und Gestaltung 82. pp 6088571 de Coimbra Symsposium fiir Roxin, 1995, Beth in LAC, 9 40 age 8 1874 DIBRLANI. SZ 1998, p. 569, EBERT, StrafR AT, 3 ed., 2001, p. 198; ESER Saf 1,304 Caso 38, margem. 25, 1979; HAFT, StrafR AT, 8 ey 1998, p,200; HERZ: BERG, Taterch und Teale, 1977, pp 42 ¢ 1 HERZBERG, [URA, 1992, pp. 183) kK 165, p. 1.206; KUHL. StrafR AT, ), ma geome Cig acon HUH GB ERS § ‘Tnargem 2, 2001; LAMPE, 250 , 7 i ¢ GOS: Eh ‘SuafR AT. T* ed, 1989, pp. 48/88; M.~ MEYER, Aus de on i 1 ss; ROTSCH. NSt 18, P a forse Zea SCHMIDHAUSER. Sn 2ed., 198 ry 1B, 26" ed., § 25, nargem 23 © rsel ind Tatherrschaft, 1994, pp. 10, 16, 19, e 24 8 j ser math Do takes id das Prinzip der Selbstverantwortung der Anderen, 1986, pp- 75 aaTene TENWERTH. xe a chen 13 mer ee ee Oeil, irr tae bia tonire cae’ fc edigdo mais recente de sua ot . sn: de 1985 e 1986; mais préximo desta eres bem, sobre @ responsabilidade acessria do homem de tras frente a concl resultado ver em: AMBOS. GA, 1998, p. 238. 325 qual o homem de trés se serve, € 0 proprio sistema (...) composto de intermediarios fungiveis (...)"4 ~~ Em uma decisio de sua 4 Turma (Senat), datada de 1988, sobre o.assim conhecido caso do rei dos gatos, o Bundesgerichtshof — BGH (Superior Tribunal Federal elemao)° citou, pela primeira vez, como argumento obrer dictum, mas com uma visivel admissio, a teoria que reconhece, “sem considerar a plena responsabilidade do atuante con- creto, uma autoria atrés do autor para os casos de crime organizado por meio de um aparato de poder”®. A aceitagao desta figura juridica consumou-se em uma famosa deciséo da 5" Turma do BGH no ano de 1994; a época o relator foi Gehard Schafer, sendo Laufhiitte o presi- dente da S* Turma. Nesse acérdio, os membros do Conselho de De- fesa Nacional da antiga Replica Democrética Alema foram conde- nados como autores mediatos pelo homicidio dos “fugitivos da repii- blica” no muro de Berlim. Os acusados ordenaram, através de instru- ‘s6es gerais, os tiros dos soldados de fronteira e a colocagao de explo- sivos mortais no muro ¢ dominaram, segundo a tese do acérdao, os acontecimentos por meio do aparato de poder por eles dirigido, nao obstante serem os executores imediatos na fronteira, igualmente, res- ponsaveis na qualidade de autores (imediatos) culpiveis, Os membros do Conselho de Defesa Nacional foram considerados “autores media- tos atrs dos autores (responsdveis)". Jé havia décadas que o argumento central para o reconhecimento desta terceira forma de autoria mediata fora por mim formulado: “Uma organizagdo desta espécie (...) desenvolve uma vida que é inde- pendente da varivel existéncia de seus membros. Ela funciona auto- maticamente, isto é, sem depender da individualidade da pessoa do -xecutor’’, © BGH adota esta fundamentagéo para o dominio do fato do homem de trés no acérdao registrado na pigina 236 do tomo 40 de sua coletnea de jurisprudéncie penal (BGHSt, 40, 236): “ha (..) gru- os de casos nos quais, apesar de uma responsabilidade irrestrita da- guele que intermedeia o fato, a contribuigio do homem de tras quase (que automaticamente guia a realizado do tipo penal por ele pretendi- 4 Citade por: AMBOS. GA, 1998, p. 238. 3 Tribunal equivalenite a0 nosso Superior Tribunal de Justica. 6 BGHSt 35, 347 (353); Nw, 1989, p. 912; NStZ, 1989, p. 81. jg ROMIN: Taterchaft und Tatherechaf, ed, 1963, ate; 7* ed, 2000, p 326 do, Tal situacéo pode existir quando o homem de tris, através de estruturas de organizagio, se aproveita de determinada infra-estrutu- ta, dentro da qual a sua contribuigio inicia cursos criminosos regulares (..} o homem de tras atuando em um caso semelhante, com conheci- mento destas circunstancias, € (_..) autor na forma da autoria mediata. Ele possui o dominio do fato”. | Desde entio, 0 instituto da autoria mediata por meio de um apa- rato organizado de poder vem sendo, em diversas partes do mundo, vivamente discutido’, A referida figura juridica, provavelmente, tam- bém encontrara aplicacao no julgamento de outros crimes cometidos ‘em sistemas totalitirios e, do mesmo modo, ser observada no Direito Internacional em suas extenses progressivas®, Na literatura alema, a principio, o acérdie do Superior Tribunal Federal alemao encontrou muita adesio, sendo que os autores concordavam ora com a totalida- de!” da concepgio por mim desenvolvida e ora em parte, mas, em menor volume; de forma bem reduzida, outras fundamentagdes fo- ram igualmente adotadas pela doutrina'!. Tao-somente com referén- cia a esta prematura onda de adesio, nos iltimos anos, cada vez mais, recusou-se a adocio da tese da autoria mediata, e, no seu lugar, os, criticos vem adotando uma co-autoria ou uma instigagao". Essa critica merece discussao, § _Apenas no livro "Nuevas Formulaciones en las Ciencias Penales. Homenaje Claus Roxin” (Cérdaba, coordenado por C. Lascano, 2001) encontram-se trés rmonografias que discutem a teoria do dominio do fato através de aparedos orgs nizados de poder (DONNA, p. 295; GARCIA VITOR, p. 327; LASCANO, p. 349). Mais doutrina Argentina enn: AMBOS. GA, 1998, nota de rodapé 238 da p. 238. Do mesmo modo, em Espanha, na coletiaea organizada por Ferré Olive € Anarte Borallo em 1999 ha trés artigos sobre o tema: FERRE OLIVE, p. 85; FIGUEIREDO DIAS, p. 99; MUNOZ CONDE, p. 151 8. Assim afirma Vest (2StW 113, 2001, p. 492): “A partir de uma visio do Direito Internacional € umn mérito indiscutivel de Claus Roxin ter, pele primeira vez, reconhecido um ‘injustosistémico-coletivo' através da concepcio da autora rediata por meio de aparatos organizados de poder". E Ambos expe, em sua obra recém publicada (Der Allgemeine Teil des Vlkerstrafrechts, 2002, nota 349 na p. 594), que todo inicio de anslse deve partir desta concepgio. 10 AMBOS. GA, 1998, p, 226; BLOY. GA, 1996, p. 425, GROPP. 14S, 1996, p. 13; JUNG. Jus, 1995, p. 173; KUPPER, GA, 1998, pp. 523 e 524, U. SCHULZ. Jus, 1997, p. 108. 11 MURMANN. GA, 1996, p, 269; SCHROEDER. JR, 1995, p.177. 12 Quanto a0 mais novo estado da discussie ver: AMBOS. Der Allgemeine Teil des Votherstrafreckts, 2002, pp. 580 e ss. 327 II — Objecées a0 dominio da organizacio As objegses centrais a0 dominio da organizagio dirigem-se contra a autoria do homem de tras, que, em minha concepcio, é fundamen- tada com a fungibilidade dos executores e a execugo quase automé- tica da ordem. O BGH manifestou-se através da expresso, muitas veves citada, dos “cursos criminosos regulares”, nos quais, também segundo sua formulacao, a realizagio do tipo se consuma “quase auto- maticamente”. Essa argumentacio € contestada de trés maneiras. Primeiramente, nega-se que o homem de trs, na realizagio do po penal, possa estar, de todo modo, mais seguro do que um instiga- dor que precisa entregar a decisio sobre a execugio do fato a0 autor. Assim afirma, por exemplo, Hereberg: “se o encarregado da execugio se decidir contra o homicidio de uma pessoa, impede, sim, que 0 pro- vocador atinja a sua meta criminosa por este caminho. Especialmente explicita sera tal situagio em relacdo aos soldados de fronteira que, intencionalmente, atirem ao lado dos fugitivos de modo a permitir sua evasio. Contesto, portanto, (...) 0 diagnéstico de que aquele que dia ordem possa estar seguro da execucéo do comando e da realizacio do delito””®. Com isto fica apenas provado que uma autoria mediata, em todas as suas formas, assim como no caso particular ora tratado, pode fracassar e configurar uma tentativa, Com razio, afirma 0 BGH!*: "(..) nos casos de instrumento em erro ou inimputavel € comum que © autor mediato tenha nas suas maos um controle bem inferior sobre a realizagao do resultado do que nas hipdteses aqui descritas”. Portan- to, pode nao importar se hd automatismo em cada caso particular. Ele funciona no caso padrio, o que nio se pode dizer da instigagio. E que isso procede esté provado, com uma trégica clareza, pelos assassinatos cometidos no regime nazista e por aquelas pessoas que morreram no muro de Berlim. A fungibilidade dos lacaios € por de- mais evidente nos homicidios causados pelos nazistas (os recusantes cram facilmente substituidos}, mas também no caso da defesa do muro os trechos de fronteira no eram, de modo algum, vigiados por uma tinica pessoa. Alias, o domfnio do homem de trés mostra-se, tam- 13 HERZBERG, in: Amelung (Coord). Individuelle Verantwornng und Betei- Ugungsverhalenisse bei Straftaten in bilrokratischen Organisationen des Staates, der Wirtschaft und der Gesellschaft, 2000, p. 39. 14 BGHSt 40, 236 ess. 328 bém, no momento em que as pessoas que se recusaram a executar os assassinatos nos campos de concentracao ou no muro de Berlim, pu- deram ser trocadas, sem qualquer problema, por executores muito solicitos, o que nao é exatamente possivel na mera instigagio. Em segundo lugar, argumenta-se contra 0 dominio do fato do ho- mem de tris, que nao haveria a mesma situagio fitica, se, por meio da troca do autor imediato, se assegurasse a execugio da ordem. Por exemplo, Rotsch' considera que quando se argumenta que a recusa de um soldado nao impediria 0 fuzilamento, pois um outro se coloca- ria em seu lugar, entao, olvida-se que “o homicfdio cometido por um idade, nio mais se trata do mesmo fato material”, De forma similar, Renzikowski afirma: “na verdade, © homem de tras possui possibilidades garantidas, através do aparato, de realizar seus planos independentemente da pessoa do executor. Estas oportunidades ndo podem, em um caso particular, substituir a falta de um dominio real (..)""” No tocante, deixa-se de fora, todavia, 0 que o proprio Rotsch’® reconhece, mas que nio quer fazer valer, isto €, que mesmo “o assas- sinato da vitima pelo homem de trés € apenas um nico homicidio, que independe do ntimero de intermedidrios empregados e da ques- Uo sobre através de qual instrumento 0 injusto foi finalmente consu- mado (..)”. O homem de tras domina este fato tinico, mesmo que no precise dominar o comportamento individual dos autores imediatos, justamente, em razo da fungibilidade destes. Esta equivocado que a admissio de apenas um tinico homicidio, através do homem de trés, seja uma “questio de concurso crimes”"? que nao mudaria em nada o carater diferente dos atos materiais de matar; 0 homem de tras come- te, desde o principio, um Gnico homicfdio, ainda que ele, eventual- mente, se sirva de pessoas diversas para a sua realizagio. E quando Renzikowski® replica que "agées hipotéticas de terceiros” (isto €, do substituto que toma o lugar do lacaio ausente), no Direito Penal, néo segundo homem da frente, em re: 1S ROTSCH. 25+ 112, 2000, pp. $28 ess 16 ROTSCH. 2S¢W 112, 2000, p. 528 17 RENZIKOWSKI. Restriktiver Taterbeariff und fakrlassige Beteiligung, 1997, p. 88. 18 ROTSCH. ZStW 112, 2000, p. $30. 19 ROTSCH. ZS#W/ 112, 2000, p. 530. 20_ RENZIKOWSKI. Restriktiver Tarerbegriff und fahrlassige Beveiligung, 1997, p. 89 329 seriam tomadas em consideracéo, ndo compreende ele que 0 funcio- namento do aparato € uma realidade e néo uma hipétese. Nisto, a existéncia do “poder das causas de substituigio"®! garante a realizado do tipo e pode ser, inteiramente, empregada na fundamentacio do dominio do fato. Pois 0 referido poder leva a que o atuar responsével do autor imediato, diferentemente da instigacio, néo decida se uma exortagdo delitiva ser concretizada ou se o fato deixard de se realizar. Em terceiro lugar, contra o dominio da organizagio, contesta-se que ele inexiste em agses nio substituiveis, portanto, indispenséveis, noutras palavras, quando para o sucesso do plano delitivo necessite-se de especialistas decisivos”. De fato, isso é correto. Quando 0 servigo secreto de um regime politico criminoso ou o cabeca de uma organiza- io terrorista escolhe para 0 atentado de uma pessoa alguém que € 0 nico a dispor de know-how necessério para a execucio do crime ou aquele Gnico que tem o acesso a vitima, enti, nestas hipéteses inexis- te autoria mediata, mas, sim, instigacio, isto, enquanto o homem de trds abdicar da coacao moral, conforme o disposto no § 35 do Cédigo Penal alemao. Entretanto, tampouco o dominio da organizacio é talhado com base em tais acontecimentos singulares, mas para fatos que se baseiam em situagées repetitivas e similares e que séo executdveis através de pessoas fungiveis, como os genocidios cometidos nos campos nazistas de concentrasao e 0s tiros dados pelos soldados da Republica Demo- 21 HOYER, in: SK-StGB, 6 ed., § 25, margem 90, 1999; AMBOS. Der Allge- meine Teil des Volkerstrafreckts, 2002, p. 588; Ambos autores consideram que esse ponta de vista nio é apropriado para a fundamentagéo do dominio do fato, 22, SCHROEDERJR., 1995, p. 178; FREUND. SerafR AT, 1998, § 10, mar- sgem92, 1998; AMBOS' Der 1 Teil des Volkerstrafreckts, 2002, p. S98, 2 _ Nota de Tradutor:§ 35 do Codigo Penal slemio — Estado de Necesidade xculpante ) Atua sem culpabilidade quem comete um fato antijuridico com o fim de sfastar 0 perigo atual, que de outro modo néo pode ser evitado, a sua pessos, a ‘um parente ou a outra pessoa préxima. Isso nto vale enquanto se pode exigir do autor tolerar o perigo, isto, conforme certascircunsténcias particu damente, porque ele provocou o préprio perigo ou estava em ums si dica especial ‘autor néo tivesse que (2) Supondo equivocadamente 9 autor, durante © cometimento do fato, ffcunstincias que o exculpassem conforme ¢ item acima, entio, seré ele punido, apenas, quando o erro Fosse evitavel 330 critica Alea durante a guarda muro de Berlim, Quando Ambos" afirma “(...) a pretensio de v. geral do critério da fungibilidade 6 refutada jé por um caso contririo”, desconhece ele que o dominio da organizagio no € nenhuma receita patenteada que reivindica valida- de, em todos 0s casos imaginveis, independente dos pressupostos concretos. Pelo contririo, trata-se de um modelo cujos elementos constitutivos precisam ser examinados na realidade do caso concreto. Por isso, esta figura juridica exclui a possibilidade da co-autoria e da instigacdo no ambito dos aparatos organizados de poder, apenas, den- tro da regra, mas nio em todo caso particular. No entanto, os argu- mentos daqueles que, em principio, adotam a co-autoria ou a insti- gagdo no lugar da autoria mediata, necessitam de uma apreciacéo 3 parte, IV —A admissao de uma co-autoria Uma série de autores considera o homem de trés, que, ne Ambito de aparatos organizados de poder, ordena acées criminosas, ndo autor mediato, mas como co-autor®®, Neste caso, a rejeicao baseia-se, quase sempre, na suposicao de que nao seria possivel um autor mediato atris de um agente plenamente responsivel, Entretanto, tal premissa € equivocada. Posto que, como apresentado no tépico o dominio a acao do executor e © da vontade do homem de trés se Fundam em pressupostos distintos, podem ambos coexistir sem qualquer proble- ma: o autor direto domina o fato concreto através de seu proprio atuar) ("dominio da ago") ¢ @ homem de trés por meio do dominio sobre a | organizagio (“dominio da organizacéo”), que o liberta da individuali- dade do executor. Por outro lado, contra uma co-autoria, pronun- | ciam-se trés argumentos decisivos. = Primeiramente, falta uma resol acordo comum, que, segundo a doutrina majoritéria, € 0 pressuposto 24 AMBOS. Der Allgemeine Teil des Volkerstrafreckts, 2002, p. $96. 25, BAUMANN © WEBER. StrafR AT, 10* ed., § 29, Ill 2d e V 3e, 1995; JAKOBS, StrafR AT, 2° ed., cap. 21, margens 103, 190 e 191, 1991; JAKOBS. [NStZ, 1995, pp. 26 e ss; JESCHECK e WEIGEND. StrafR AT, S*ed., § 62 I 8, 1996) OTTO. SoafR AZ, 6 ed, § 2h IV 34, 2000; SAMSON, in: SK-SIGB, 5* ed. § 25, marge 26, 1993 (igual a Hoyer etn SK-StGB, § 25, margem 87 & 8), 331 de toda “comissio conjunta’, vide o i . : . preceito do item 2 do § 25 do Cédigo Penal alemao®. Freqiientemente, o homem de tras e cows, tor nem se conhecem, nao deliberam nada em conjunto e muito me nos se percebem como portadores de uma decisio, por ambos, Coo. aenada. K execugio de uma ordem, como nos cas0s em questio, fun- “da-se em um comando e no em uma resolugao comum, Até em Jes- check Weigend, lé-se que: “a resolucdo criminosa torna-se comum. através da consciéncia do cabeca e do executor de que um determina- do crime ou mais, de igual calibre, devem ser realizados segundo as instrugées de comando””. A consciéncia de ser o destinatério de uma ordem nao significa uma resolugo comum. Otto entende “como seo executor se apropriasse tacitamente do plano delitivo"®.No entanto, este “apropriar-se” também nio é qualquer resolugio comum. Seno uma instigagio exitosa (da determinacio para o injusto) deveria signi- ficar uma resolugéo criminosa comum, o que néo € compativel com 0 § 26 do Cédigo Penal alemio®. Baumann e Weber ensinam que a co-autoria no exige contato pessoal algum entre os participantes do fato tipico e nem um plano conjunto; bastando o "entendimento taci- tamente produzido™, Contudo, tal construgio estende em demasia a co-autoria (aplicada 3 situacio ora analisada). Quando alguém executa © plano de um desconhecido em tempo e lugar que este dltimo ignora, nio se permite conceber tal evento como um cometimento comum. Pe forma conseqiiente, Jakobs abdica totalmente do critério da reso- lusio delitiva em coum", com isso, porém, sacrifica a “comunhao” e ida na comissao do injusto, violando, deste modo, 0 ordenamento juridico, especificamente, a a mao? 25 Nowa do Tradutor: § 25 do Codigo Penal aleméo — Autovia . eer ppunido aquele que comete ofato penal autonomamen aun See Sines nde comer oto pes em omnia ad 27, JESCHECK e WEIGEND. StrafR AT, 5* ed, § 62 118, 1996. 28 OTTO. StrafR AT, 6 ed., § 21 IV 3d, 2000. : 29. Notado Teadutor: § 26 do Cécigo Penal alemio dang ce stir er punid, na mesma forma do esminar cuteem so cometimento de un fato ant 30 BAUMANN e WEBER SirafR AT, 10*ed.,§ 31 JAKORS. NSIZ, 1995, p. 27 32 Nota do Tradutor ver seferéncia némero 25. 332 Inclusive, como uma segunda ponderacio, falta também uma exe- cugio conjunta do fato. Pois o “autor de escrivaninha”, precisamente, nada executa através de sua pr6pria pessoa, “ndo suja suas mos”, mas se serve de "instrumentos” que executam sua vontade, Quando se exige, como eu faco, para a co-autoria uma cooperagao substancial na fase de execucao, elimina-se, de antemio, uma co-autoria, pois 0 mandante ndo participa da fase de execugio ¢, em geral, nem sequer conhece o tempo e 0 lugar de sua realizacao. Entretanto, com base na jurisprudéncia, mesmo que, eventualmente, se entenda suficiente para uma co-auitoria contribuigées dadas na fase de preparacio, ainda nesta hipotese faltaré algo. A Gnica contribuigéo do homem de trés reside em que ele planeja 0 fato ¢ o provoca. Nisto néo bé qualquer execugdo conjunta. Sendo, 2 resolucdo criminosa seria uma execugao € a instigagéo uma co-autoria, o que ndo seria adequado & concepgac legal das formas de participagio. Também nao se pode pensar em “divisdo de tarefas", que, em geral, é vista hodiernamente como a caracteristica central da co-autoria, quando o dono do poder deixa a realizacéo global de seu comando aos Srgios de execusio. Em terceiro lugar, através da aceitagdo de uma co-autoria, a dife- renca de estruturas entre a autoria mediata (do cometimento "por meio de outrem’, § 25, item 1, do Cédigo Penal alemao”) e a co-au- toria (do cometimento conjunto, § 25, item 2, do Cédigo Penal ale- mao) é também abandonada, como resultado, confunde-se a linha divis6ria existente entre ambas formas de autoria, de modo duvidoso em um Estado de Direito. A autoria mediata tem uma estrutura verti- cal (no sentido de um curso de cima para baixo, do provocador para o executor), a co-autoria, pelo contrério, 6 horizontalmente estruturada (com a idéia de co-autores que estdo, lado a lado, em igualdade de condigées). Com razio, afirma Bloy: “Quando se tem (como aqui) um comportamento com inequivoca coordenacao vertical, no qual, de an- temio, 0 papel do homem de tris esta fixado em uma execugao tipica que se dé plenamente pelas maos de outrem, neste caso, entio, trata- se claramente de autoria mediata e nao de co-autoria”. 33. Nota do Tradutor: ver referéncia niimero 25 34 Nota do Tradutor: vet refertacia niimero 25, 38. BLOY. GA, 1996, p, 440. 333 A concepgio de Bockelmann®® constitui uma variante da tese da autoria mediata, Ble considera "os assassinos de gabinete (...) e seus lacaios” como autores colaterais, uma vez que, para ele, “urn dominio do fato intermediado através de um dominio pleno do fato” € uma “ideia de dificil compreensio”. Contudo, existe também o autor atrés do autor inteiramente culpavel em diversas variac6es. E a construgao de uma autoria colateral ignora a circunstancia de que as contribuigaes dos “autores de escritério” e “dos “lacaios” néo correm paralelamente sem conex6es reciprocas, como é marcante na autoria colateral, mas relacionam-se umas com as outras de modo caracteristico 8 autoria mediata, O “assassino de escrit6rio” comete 0 injusto “por meio de coutrem" (§ 25, item 1 I, parte final, do Cédigo Penal alemao), seguin- doa regra geral do “executor” anénimo. V—A admissio de uma instigagao Desde 0 advento do acérdio do BGH registrado na pégina 218 do tomo 40 de sua coletdnea de jurisprudéncia penal, a tese partidéria da instigagao através do homem de tris, que anteriormente havia desapa- recido da discusséo, mais uma vez, encontrou defensores consideré- veis. Sobretudo, Heraberg e Rotsch fizeram esta concepcao valer no- vamente em longos estudos, Herzberg afirma que "Hitler, Himmler e Honecker nio cometeram os homicidios que ordenaram, como auto- res, mas na qualidade de instigadores”””. Rotsch entende que, nos ca- sos da guarda do muro de Berlim, a instigagdo pode ser admitida “sem dificuldades"*, Kohler® e Renzikowski"® também defendem esta concepcio. De fato, a defesa de uma instigacio esté, pelo menos, mais proxi- ma de uma resposta mais aceitive! do que a de uma co-auttoria. Pois, a 3 BOCKELMANN ¢ VOLK. Sif AT, 4" ed, §24, 1987 37 BERG, in: Amelwig (Coord.) Individuelle Verantwortung und Betei- ligungsverhairnsse bei Strafaten in burokratischen Organtationen ces States, der Wirtschaft und der Gesellschaft, 2000, p. 48. 38_ ROTSCH. ZS¢W 112, 2000, p. 562, ver também o seu trabalho enterior em: Sec ase 1. 562; ver também o seu trabalho enteric 39 KOHLER Straff AT, 1997, p. 510, BoRENZIKOWSKI, Resrttiver Taerbegriff und farlasie Betting, 334 instigagio apresenta, comoa autoria mediata, uma estrutura vertical e consiste, como esta, na mera provocacao de acontecimentos a serem realizados pelas maos alheias. No entanto, a diferenga decisiva, tam- bém, esta em que o instigador néo domina 2 execucio do fato, isto, porque a realizacio do tipo nda depende de sua vontade. Com 0 autor de escrivaninha é diferente: cle € 0 personagem central.e dominao crime por ele ordenado, enquanto os lacaios envolvidos na execucao sio responséveis como autores em virtude de seu dominio da agio; todavia, no se pode fazer duvidoso 0 grau superior de dominio da vontade resultante da diregio do aparato por aquele que dé as ordens. ‘Quando Hitler ou Stalin mandaram matar seus opositores, isto era cobra sua (ainda que nao apenas deles dois). Contradiz principios racio- nais de imputacio social, hist6rica e também juridica dos autores afi mar que Hitler e Stalin teriam concedido a seus subordinados a de so sobre se 0s crimes ordenados seriam executados. Igualmente, ou- tras diferencas nas estruturas de relacdo justificam um dominio do autor de escrivaninha, dominio este que, justamente, falta ao instiga- dor: aquele que instiga, em primeiro luger, precisa de encontrar um autor, enguanto que o autor de escrivaninha necessita apenas dar 0 comando; 0 instigador tem que fazer contato com o autor em poten- cial, convencé-lo de seu plano e, eventualmente, superar a sua resis téncia; 0 comandante dentro da hierarquia de um aparato de poder poupa-se disto tudo, Com razio, Ambos, agora, também acentua “a real incomparabili- dade que radica no comportamento do organizador e comandante de crimes em massa frente ao de um mero instigador de crimes especifi- cos"*!. Do mesmo modo, Rogall afirma, no “Livro em Homenagem a0 BGH? que dedicou a doutrina a0 BGH, que, se 0 condutor de um apsrato de poder for punido apenas como instigador, “nao restaria claro que 2 execucio imediata da infragio da norma seria coisa sua 41 Ver AMBOS, Der Allgemeine Teil des Volkerstrafrechts, 2002, p. 593. Am= bos quer, em adeséo a Murmann (GA, 1996, pp. 273 ¢ ss.) nos casos, que, segundo seu entendimento, ndo se compreendem no critério da fungibilida Tecorrer 8 construcio desenvolvida por mim em um outro contexto ¢, em razdo disto, originar do dever do Estado de protegio de seus cidaddos uma autoria dos homens de teas. Parece-me duvidoso a necessidade de tal construséo no ambito do dominio da organizagio. No entanto, para a responsabilidad dos administra- ddores das sociedades empresariais, eu recomendei, também, uma solugdo semne~ Thante (comparar com o texto citado abaixo e com a referéncia nimero 59}. 335 além da instigagio”, Por este motivo, a imputagio através da autoria mediata seria “a soluco mais plaustvel"®, VI —Aextenséo do dominio da organizagéo a empresas, Portanto, a figura da autoria mediata em virtude dos aparatos or- ganizados de poder nao é de modo algum, como Herzberg pensa, uma “hiperextensao da autoria”?, No entanto, de fato, ela o é, quando se transporta esta construcio as acdes dos superiores em empresas e em outras organizagdes hierdrquicas sem se perquirir a motivacio delitiva de suas condutas, tal como, em crescente medida, tem feito a juris- prudéncia alem’, Esse desenvolvimento jé fora adotado no acérdio do BGH] registrado na pagina 218 do tomo 40 de sua coletinea de juris- prudéncia penal", A 5* turma do BGH até concorda com tal posicio- namento quando fundamenta que “uma autoria mediata, assim enten- dida, interessa nao apenas para os abusos de poder do Estado, mas, também, para os casos dos crimes organizados na forma de méfias"*. E acrescentado que também, frente as organizacSes terroristas, nas quais tem-se & disposicio uma variedade de executores reciprocamen- te substituiveis, o dominio da organizac3o possui um amplo campo de aplicacio, Contudo, quando 0 acérdio prossegue: “também o proble- ma da responsabilidade no funcionamento de empresas pode ser solu- cionado desta mesma maneira”; neste instante, chega-se longe de- mais. Aqui, pois, em regra, falta a fungibilidade dos executores, como nas organizagdes, apresentadas anteriormente, que se afastam do am- bito da licitude com respeito aos tipos penais por elas praticados, por exemplo, homicidio, Uma tal “dissociagao ao Direito™® ”” ocorre nos 42 ROGALL, in: Festschr. 50 Jahre BGH, 43 HERZBERG, in. Amelung (Coord rung nd Bete ligungsverhalmnisse bei Straftaten in birokratischen Organisationen des Staates, der Wirtschaft und der Gesellschaft, 2000, p. 47. 44 Ver também in: NJW 1994, p. 2.703 € NStZ, 1994, p. 537. 48 BGHSt 40, 218 (237); NIW 1994, p. 2.703; NSWZ 1994, p. 537, 48. Nota do Tradutor: O critério "Rechtsgelostheit”, que foi traduzido como “dissociagio a0 Direito’, € o fator que caracteriza 0 atuar do. aparado organizado: de poder como de um total abandono aos valores juridicos da sociedade, 47 Comparar 0 posicionamento doutrindrio a respeito do critério da “dissects 336 crimes praticados pelo Estado, nos delitos de terrorismo e nos casos da criminalidade organizada. Porém, quando, por exemplo, em uma empresa, que atua dentro dos limites do ordenamento juridico ao rea- lizar seus negécios, um diretor de uma seco exorta um empregado a falsificar um documento, na hipétese do crime ser cometido, este igente serd apenas um instigador do fato tipico cometido pelo em- pregado (este, sim, na qualidade de autor). Em face de uma organiza- Gio que trabalha dentro do Direito, deve-se esperar que ordens ilicitas no sejam obedecidas, vide o exemplo dos estatutos dos servidores piblicos com suas disposi¢des expressas quanto a conduta dos agentes 05. acérdio do Superior Tribunal Federal aleméo, em um caso de eutanésia, registrado na pagina 257 do tomo 40 de sua coleténea de jurisprudéncia penal, nos traz um exemplo de tal hiperextensio®®. O Iho da paciente e o médico por ela responsivel ordenaram aos fun- cionérios da enfermaria que suspendessem o tratamento e, apenas por isto, foram condenados pelo Superior Tribunal Federal alemao como autores mediatos, dada a ocorréncia do homicfdio. A frase decisiva do acérdio preceitua que: “por um lado, em virtude do poder de dar ordens do filho e do chefe da enfermaria ou do médico encarregado e, pelo outro, como também, em principio, os auxiliares, em funcio do papel que possuem, estdo vinculados a cumprimento de ordens, no pode haver divida de que em ambos acusados ha o critério subjetivo da vontade de autor e 0 pressuposto objetivo do dominio do fato”. Entretanto, neste caso, exclui-se um dominio da organizaca0 nao ape- nas porque falta a fungibilidade do chefe da enfermaria competente para a execucio da ordem, mas, também, porque um hospital ndo trabalha “fora do Direito” frente 3 proibicao de matar, mas a observa estritamente. No caso concreto, 0 chefe da enfermaria nio s6 nio executou a ordem como, inclusive, impediu a morte. Portanto, faltou aos homens de tris o dominio do fato. Ainda que outras pessoas fos- sem tomadas em consideragio na qualidade de executores, frente 4 fo 20 Diseito” por mim exigido; mais devalhadamente: ROXIN, Festschr. F. nte a favor da minha concepsio. FIGUEIREDO. DIAS, Sammelband des Kongresses ven Huelva, p. 99; ver também referencia nimero 8, onde se encontram outros autores que defendem a minha concep¢éo. io supracitado: AMBOS, GA, 1998, pp. 243 e ss. e manifesta ilicitude da morte, poderia teria que se esperar, também, em relagio a elas, a recusa na execucéo da ordem. Por conseqiiéncia, existiria apenas uma instigacéo. ‘Outras decisées avancam na via do acérdio sobre a eutandsia, Em 1997, a 2° Turma do Superior Tribunal Federal alemao condenou os responséveis de uma sociedade limitada como autores mediatos de uma remocio de lixo ambientalmente perigosa (§ 326 do Cédigo Pe- nal alemao™). © “dominio do fato escorado na vontade de autor” dos responsiveis da sociedade derivou de que eles teriam “aberto e apon- tado o caminho” para uma remogio ilegal de lixo. Contudo, abrir € apontar a via que leva ao fato penal é um papel tipico do instigador (e freqiientemente préprio do conselho técnico que o cimplice forne- ce). Um dominio do fato nao resulta, em qualquer caso, simplesmen- te desta circunstancia. No mesmo ano*", por meio de um acérdio da 4° Turma, dirigentes de uma sociedade limitada foram apenados como autores mediatos nos estelionatos cometidos pelos empregados desta, apesar de néo se ter podido “comprovar nenhuma atuacéo con- creta ou, também, um conhecimento atual dos réus com relacio 3s, respectivas encomendas das mercadorias”. Pois, como “autor por do- 49 BGH.NSiZ, 1997, p. 544 $0 Nota do Tradutor: § 326 do Cédigo Penal alemia — Manejo. -Autoriza- do de Dejetos Perigos “ vo Nio-Auroris (1) Sera punide com pena privativa de liberdade até cinco anos ou com multa quem, ilegalmente, tratar, armazenar, depositar, evacuar ou, de outra for- rma, climinar desejos que possam conter ou produzir toxicos ou agentes patogénicos de enfermida- des - Perigo pablico transmissiveis a seres humanos ou animais; Scjam cancerigenos, prejudiciais para a fertilidade ou possam modificar a genética, Heenes, rsh » eikaécow pos en 3. sci perigosos por seem explosives, auto-nflamves ov nfo de mera ‘escassa radioatividade ou; » oe node 4. sejam apropriados segundo o modo, natueeza ou quantidade para: a) contaminar de maneira permanente os recursos hidricos, @ ar, 0 solo ou, ace forma, alterd-los com perenidade, ou; Por em perigo um numero de animais ou plantas fora de uma instalagio ‘autorizada para este fim ou fora de um processo le; Prescrito ou permitide® : 2, De ‘igual modo, serd punido quem levar dejetos, na forma do item (1), ontratando uma probicto ou sem » autoriaagto neces ou tamnbern fos sso doit de valde de “Ss gnerccenb c ) BGH. Wistra, 1998, p. 148. 338 mfnio do fato” entraria “igualmente em consideracdo aquele que apro- veita as condigdes, que desatam cursos criminosos regulares, dadas pelas estruturas da organizagio”, Isto, o Superior Tribunal Federal alemio “afirmou também para as atividades empresariais". Nao se fundamentou, em detalhes, a decisio sobre como, porém, deve existir um dominio do fato em um acontecimento, no qual os acusados, em concreto, nem pelo menos influfram. O dominio do fato é aqui util zado como fim de se imputar a autoria em qualquer forma de respon- sabilidade, nao somente na mediata, a todo aquele que esté no nivel de direcao de uma empresa. No entanto, para isto, este conceito nao é apropriado. Essa jurisprudéncia que se distancia do dominio da organizacao tornou-se possivel porque o Superior Tribunal Federal alemao, j6, em seu primeiro acérdao sobre “o Conselho de Defesa Nacional, recorre- ra complementarmente a dois outros pontos de vista para fundamen- tar 2 autoria mediata: com o primeiro, para afirmar que o homem de tris aproveita-se “de uma disposicao incondicionada do executor ime- diato de realizar o tipo penal” e, através do segundo, reforga sua dec so expondo que aquele quer “o resultado como conseqiiéncia de seu propri O primeiro ponto de vista advém de Schroeder que nele vé 0 fundamento para a autoria mediata nos casos de dominio da organiza- ‘gio quando do emprego da resolugao criminosa jé existente no execu- tor. Contudo, isto néo é correto e, inclusive, vem sendo rejeitado pela doutrina majoritéria®', Pois, mesmo, a aceitag3o de um ofereci- mento, conforme o § 30, Il do Cédigo Penal®*, é, sem controvérsias, 52 BGHSt tomo 40, p. 236 53. SCHROEDER, Der Tater hinter dem Tater, 1965, p. 152. s4_AMBOS, GA, 1998, p. 230; HERZBERG. Taterschaft und Teilnahme, 1977, p49; ROTSCH, Individuelle Haftung in Grofuntemehmen, 1998, p 143, ROTSCH, Z5tW 112, 2000, p. 530; ROXIN. JZ, 1995, p. 51; STEIN. Die strafrechiliche Beteiligungsformentehre, 1988, p. 186. 55 Nota do Tredutor: § 30 do Cédigo Penal alemao —~ Tentativa de Partici- agio (1) Sera punido conforme as prescrigbes legais sobre a tentativa do crime quer tacit ote tocetel SA GE ap {2) Da mesma forma, seré punido queth se declarar disposto, aceltar aoferté de outtem ou combinar com terceiro © cometimento de um crime ou a sue Inseigagao. 339 apenas uma instigacao. Inclusive, 0 dominio da organizagéo baseia-se justamente em que, devido a fungibilidade do executor, a resolugio criminosa deste individuo nao importa, Inexiste também qualquer fundamento para se entender que, nas empresas que trabalham den- tro da conformidade do Direito, os empregados sejam mais resolutos a execucao de exortagies delitivas do que as outras pessoas”, O segundo ponto de vista nos reconduz 4 teoria subjetiva e nao & compativel com a teoria do dominio do fato, sendo que, em virtude de sua formulacao sem qualquer contetido, éa mesma imprestavel, Pois, quando se diz.que as pessoas ativas nos cargos de direco teriam que- rido os crimes de seus empregados como conseqiiéncia de seu proprio atuar, neste momento, tem-se uma maneira de falar que nada expres- sa. Com maior razo, pode-se formular que eles teriam guerido os crimes como resultados do atuar de seus empregados. ‘A tentativa do BGH de resolver o problema da responsabilidade nos negécios das empresas através da construcio de uma autoria me- diata em virtude de aparatos organizados de poder, édo mesmo modo rejeitada pela doutrina majoritéria”, Tampouco se deve negar a ne- cessidade de responsabilizar os administradores das empresas como autores dos crimes relacionados ao servigo de seus empregados quan- do tais diretores os provocaram, os fomentaram ou quando contraria- mente a seus deveres no os impediram, Por isso, Schiinemann'®’ e Mujioz Conde’? querem aceitar, frente & rejeicdo da autoria mediata, uma co-autoria que se limita aos casos de crimes empresariais e que deriva, segundo Schiinemann, de uma “dupla colaboragao do garante (que participa simultaneamente por omisséo € por comissio)””. 56 Outros argumentos contra a tese de Schroeder podem ser encontrados no artigo de Rotsch em: ZStW 112, 2000, pp. 525e ss. 57. AMBOS. GA, 1998, p, 236.; KUHL. StrafR AT, 3° ed.,§ 20, mazgem 73 b, 2000; ROTSCH. Individuelle Haftung in Grofunternchmien, 1998, pp. 144 es ROTSCH. NSiZ, 1998, pp. 493¢ ss; ROTSCH. Wistra, 1999, p. 327; ROXI 12,1995, p.51; ROXIN, Taterschaft und Tatherrschaft, 1° ed., 1963, até; ed., 2000, pp. 682'e ss; SCHUNEMANN, in: Festschr. 50 Jakre BGH, tomo IV, 2000, pp. 629 ¢ ss; Por outro lado, seguindo o BGH pode-se citar: RANSIEK, Uniernehmensstrafl, 1996, pp. 46 e ss. 58 SCHUNEMANN, in: Festschr, 50 Jahre BGH, tomo IV, 2000, pp. 628 ¢ 88,;No mesmo sentido: DIERLAMM, NStZ, 1998, p. 569 82. MUNOZ CONDE, in: Feseschr. f- Roxin, 2001, pp. 623 e ss; MUNOZ CONDE, Revista Penal, 2002, p. 59 ‘ 60 SCHUNEMANN, in: Festschr. 50 Jahre BGH, tomo IV, 2000, p. 632. 340 O pensamento de Schiinemann leva ao resultado correto, ainda que eundo some a omissio e a comissao para a co-autoria. E a posicio de garante do empresério que o faz autor, conforme a regra dos delitos de infracio dever, independentemente de se a sua contribuigio para 0 fato tipico consiste em um fazer ou em um mero deixar acontecer que, em razio de sua nfo entrada em cena, o leva a responder pela ocorréncia do evento que deveria ter sido obstado. Pode-se enxergar uma tal “autoria mediata em virtude da posse de deveres” como uma forma auténoma da autoria mediata''. Esta figura encontrou acolhida no art. 13 do chamado Corpus Juris para a defesa dos interesses finan- ceiros da Comunidade Européia®, onde se afirma: “o crime que uma ‘pessoa comete por conta da empresa, submetendo-se essa pessoa d au- toridade do administrador ou de outro com poder decisao ou controle, faz com que este individuo hierarquicamente superior seja também penalmente responsdvel, quando possuit conhecimento do cometimento do crime, dew instrugdo para sua realizacdo, 0 deixou acontecer ou omitiu as medidas necessdrias de controle". Enquanto néio temos uma regra semelhante no Cédigo Penal, pode-se derivar uma autoria por omissao da posigao de garante que ocupa o administrador da empresa, pois ndo se exclui esta forma de autoria pelo fato de que 0 garante que ndo impediu o resultado participou ativamente na realizacao do delito Nao se trata, porém, de casos de dominio do fato na forma comissiva Isto me leva & conclusdo: a autoria mediata por aparatos organiza~ dos de poder é, apesar das muitas objegées, uma figura juridica capaz de se afirmar, 0 que, sobretudo, nos permite compreender 0 homem de trés como autor nos crimes praticados pelo Estado e nos delitos das organizacées criminosas. Contudo, este instituto penal seré exigido além de seus limites, caso haja o seu emprego em todas as relagdes hierdrquicas ¢ se pretenda imputar o dominio do fato dos crimes co- 61 Comparar com TIEDEMANN, in: Festschr.f. Nishihara, 1998, pp. 496 5, autor este que prevé uma forma pr6pria de autoria da “responsabilidad pela Conduta alheia" para um modelo de Cédigo Penal da Europa 62 Nota do Tradutor: Projeto de c6digo referido a delitos transacionsis econd- micos europeus, tendo como foco a proteséo de bens juridicos comunitérios. A Corrupgéo, 4 lavagem de dinheiroe a conspiragio sio exemplos de crimes prev tos em seu bojo, Um cédigo que contém disposicées de Direito Pnal e Direit Processual Penal, endo que odireito material esta subdividido em parte especi ¢ geral. Esse projeto fot uma iniciativa da Comissio Buropéia que contou com 2 patticipagio de professores de diversos pafses, dentre eles, Bacigahpo da Espa je Tiedemann da Aiemanba 341 metidos pelos subordinados, no ambito dos negécios da empresa, aos administradores sem tomar em consideracio a sua forma de colabora, $0, Aqui, para o dominio da organizacio, ter-se-ia que, de forma complementar, apresentar outras construcées. Como me foi dito, 2 3° Turma Criminal do BGH considera também um desenvolvimento adicional da, ainda atual, jurisprudéncia para determinadas constela. g6es de casos. Com tal fato, hi de ficar-se surpreso, VU TENTATIVA

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