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Título: Desejo, razão e método para clínicaS de Território (cST)

Título abreviado: clínicaS de Território (cST)

RESUMO

Ao discutir a Clínica no campo da saúde este artigo tem por objetivo manifestar a possibilidade
de uma clínica de território em campos que desejam sustentar práticas e investigações que
incluam as formas de vida e os discursos que organizam o laço social no processo de saúde,
adoecimento e cura. A parte dedicada ao Desejo apresenta a motivação para a proposta, seguida
da Razão, onde ela se justifica. O trecho mais longo, intitulado Método, introduz os avanços
obtidos por meio de atividades de investigação acadêmica no sentido do estabelecimento de
uma estrutura elementar que define o conceito de clinicas de território. A parte final situa e
explica o caráter dos elementos fundamentais desta clínica, a saber, derivar, escutar e escrever,
advertindo que é preciso que se coloque algo da singularidade individual ou coletiva para que
ela se materialize em práticas de investigação, cuidado e promoção de saúde para incrementar
qualidade de vida.

Palavras-chave: Território; clínica; saúde; método, saúde coletiva.

Desire, reason and method to Territory clinicS (cST)

ABSTRACT

When discussing the Clinic in the field of health, this article aims to demonstrate the possibility
of a territory clinic in fields that wish to sustain practices and investigations that include the
forms of life and the discourses that organize the social bond in the process of health, illness
and cure. The section dedicated to Desire presents the motivation for the proposal, followed by
Reason, where it is justified. The longest section, entitled Method, introduces the advances
obtained through academic research activities towards the establishment of an elementary
structure that defines the concept of territory clinics. The final part situates and explains the
character of the fundamental elements of this clinic, namely, to derive, listen and write, warning
that it is necessary to place something of the individual or collective singularity so that it
materializes in research, care and promotion health practices to improve quality of life.

Key-words: Territory; clinic; health, method, public health.


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Deseo, razón y método para clinicaS territoriales (cST)

RESUMEN

Al hablar de la Clínica en el campo de la salud, este artículo tiene como objetivo demostrar la
posibilidad de una clínica territorial en campos que deseen sustentar prácticas e investigaciones
que incluyan las formas de vida y los discursos que organizan el vínculo social en el proceso
de salud, enfermedad y cura. La sección dedicada a Deseo presenta la motivación de la
propuesta, seguida de Razón, donde se justifica. La sección más extensa, titulada Método,
presenta los avances obtenidos a través de las actividades de investigación académica hacia el
establecimiento de una estructura elemental que define el concepto de clínicas de territorio. La
parte final sitúa y explica el carácter de los elementos fundamentales de esta clínica, a saber,
derivar, escuchar y escribir, advirtiendo que es necesario colocar algo de la singularidad
individual o colectiva para que se materialice prácticas de investigación, cuidado y promoción
de la salud para mejorar la calidad de vida.

Palabras-llave: Territorio; clínica; salud; método, salud colectiva.

Désir, raison et méthode des cliniques territoriales (cST)

ABSTRAIT

En discutant de la Clinique dans le domaine de la santé, cet article vise à démontrer la possibilité
d'une clinique de territoire dans des domaines qui souhaitent soutenir des pratiques et des
recherches qui intègrent les formes de vie et les discours qui organisent le lien social dans le
processus de santé, maladie et guérison. La section consacrée au désir présente la motivation
de la proposition, suivie de la raison, lorsqu'elle est justifiée. La section la plus longue, intitulée
Méthode, présente les avancées obtenues grâce aux activités de recherche académique vers la
mise en place d'une structure élémentaire qui définit le concept de cliniques de territoire. La
dernière partie situe et explique le caractère des éléments fondamentaux de cette clinique, à
savoir, dériver, écouter et écrire, en avertissant qu'il faut placer quelque chose de la singularité
individuelle ou collective pour qu'il se matérialise dans les pratiques de recherche, de soins et
de promotion de la santé pour améliorer la qualité de vie.

Mots-clés: Territoire; clinique; santé; méthode, santé collective.


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1. Desejo

Augusto, que também atende por Epifânio, sai à deriva pelas ruas. Só sai, assim, à

noite. Os compromissos e contingências da parte ensolarada do dia não permitem o tipo de

experimento que procura. Para ele, entretanto, sair à deriva pela cidade não implica a

inexistência de um augusto propósito: escrever um livro. Porém, um tipo de livro que lhe

demanda algo da ordem de uma epifania, pois deseja que seu intento não seja capturado pelo

lugar-comum. Quer escrever um livro que escape da forma guia turístico ou manual das ruas.

Itinerários e olhares acerca da cidade precisam ser singulares. Para tanto, utiliza um método:

alugou uma peça para morar no território que deseja investigar, transita somente a pé e leva

um relógio que o avisa das três horas da madrugada, quando deve retornar a seu aposento e

escrever alguma página.

Epifânio tem, no entanto, um elemento adicional em seu propósito de encontrar um

modo e uma filosofia que o ajude a estabelecer uma melhor comunhão com a sua cidade. Um

elemento que aparentemente o desvia de seu objetivo literário, embora tenha proximidade

evidente. Augusto tem uma espécie de fetiche, de compulsão, por ensinar prostitutas a ler.

Assim que diagnostica o analfabetismo numa garota de programa, faz o contrato padrão. Mas

o que se consuma é o seu programa de alfabetização a partir da leitura de notícias em jornais,

com o qual já tivera sucesso dezenas de vezes.

Outros incidentes também se interpõem em suas deambulações pelo centro da cidade,

como, por exemplo, o daquela pessoa que lhe pede para auxiliar a colar manifestos ecológicos

em automóveis de uma garagem pública, pouco antes das três da manhã. Coisas que Epifânio

acolhe e, mais que isso, se solidariza, imediatamente.

A cidade é um delírio civilizatório da humanidade. Ofereceu a melhor condição para a

vida em coletividade, mas, ao mesmo tempo, desvelou seus impossíveis. Constituiu-se a partir

do caráter sedentário dos povos. Estruturou-se perto das fontes, dos rios, do mar, a partir da
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organização racional das atividades econômicas e, mais adiante, estabeleceu seus fluxos de

vida em torno da fábrica. Sua população, a medida que cresce, vai segregando os indesejáveis

e a sociedade, assim, se conforma. Indomável, por mais que se desenvolva inteligência

urbanística, cresce desordenadamente e representa a mais pura essência do conforto

desconfortável da vida em comum. Os centros das grandes cidades são como documentos

históricos a céu aberto onde se pode ler, com algum letramento fino, as origens dos

sofrimentos ou encontrar saídas possíveis para os impasses da vida em comunidade, na

medida em que não sejam desarticulados os elementos complexos que explicam seus

principais problemas.

A narrativa de A arte de andar nas ruas do Rio de Janeiro (Fonseca, 1992) constrói um

personagem comum, urbano, idealista, sensível, solidário, que se entrega à tarefa de conhecer

um território a partir de seu terreno, mas também de sua vida pulsante. O faz a pé, observando

e escutando. Identifica problemas e se sente convocado a resolvê-los. Não recua frente a

encontros com o inesperado. Há algo de inspirador no desejo peripatético de Augusto-

Epifânio, inclusive para aqueles cuja implicação pelo trabalho esteja situada na compreensão

e na busca dos aprimoramentos da vida em comum.

O geógrafo pode ser um deles, o urbanista, outro. No campo teórico há o sociólogo, o

antropólogo. No campo prático, pode haver o psicólogo e o assistente social, bem como o

gestor público tecnocrático. Contudo, se o foco estiver colocado sobre a questão do respeito

aos modos de vida e das condições dignas de reproduzi-la, existem outros tantos, mesmo fora

dos registros acadêmico, técnico e científico.

E os profissionais da saúde e suas clínicas? Também há neles a preocupação em

articular os processos de curar com os de viver?

Como responder sem alguma noção sobre o que é considerado viver em nosso tempo?

A resposta sintética e de aparência pessimista é: tudo aquilo que sustente minimamente uma
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sobrevivência. Decerto que alguns poucos gozam de uma vida além da sobrevivência.

Contudo, mesmo a pequena massa de remediados da classe média brasileira, com os novos

rumos das políticas de financiamento público, previdência social e contratos trabalhistas,

viverão apenas para reproduzir serviços e mercadorias para comprar dinheiro durante todo o

tempo que durar sua vida. Apenas sobreviverão, também. Os demais, cerca de 80% da

população brasileira já viviam um dia após o outro, sem muitos planos futuros ou aspirações

que não seja a sobrevivência, mesmo antes da pandemia que iniciara em 2020.

Parece coerente que ter saúde para produzir meios de sobrevivência passe a ser a busca

e o bem mais importante para manter a vida. E aí, chegamos à clássica querela: o que se

entende por ter saúde? O processo da Reforma Sanitária dos anos 70-80 inaugurou um novo

discurso sanitarista. A saúde coletiva, como invenção de um campo de saber e de práticas a

partir desse movimento, é constituída fundamentalmente por oferecer uma noção segundo a

qual há também uma determinação social da saúde, além da biológica e psíquica. Os modos

de vida e os condicionantes culturais, políticos e econômicos afetam a qualidade desse viver.

O urbano, o rural, as matas e as florestas são os cenários onde o compartilhamento de

tradições e experiências coletivas produzem a vida. Dessa forma, a vida de relação com as

instituições culturais, políticas e econômicas e, inexoravelmente, com os semelhantes e em

coletividade, importa para a harmonia entre a vida e a saúde. Todos concordam com isso.

Nem todos, entretanto, o consideram no contexto de suas práticas clínicas ou em outros

registros do cuidado em saúde.

O médico, o enfermeiro, o odontólogo, entre outros, que procuravam a saúde coletiva

como um suplemento para sua formação, não deixam de lado, necessariamente, suas práticas

profissionais específicas em nome de um novo saber-fazer em saúde. O psicólogo segue

operando com as ferramentas da psicologia, por exemplo, embora possa haver um


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atravessamento, muitas vezes já latente em sua formação pregressa, do modo de agir e pensar

da saúde coletiva como crítica de suas práticas tradicionais.

Na maioria dos casos, o enfermeiro, o odontólogo e o psicólogo, assim como os

demais profissionais da área da saúde, em torno de 15 profissões, seguem sendo formados sob

tradições da ordem médica e da lógica liberal de prestação de serviços no mercado de

trabalho. O objetivo da clínica ou de práticas e serviços resultantes disso é a reabilitação ou a

terapia curativa com vistas à normalização ou adaptação ao discurso vigente.

Que o discurso da ordem médica indique como devo viver e o que deve ser o normal,

quais os caminhos para me manter nessa normalidade e qual o remédio, caso me afaste do que

se espera do meu comportamento ou funcionamento de meu corpo, é a expectativa da

sociedade. Que esse discurso seja capturado pelo do capitalismo, nada mais natural, visto que

a sociedade pode ser traduzida e pensada como mercado consumidor. Eis um dos elementos

que organizam a Clínica.

1.1 A Clínica e a clínica

1.1.1 A Clínica

De que é feita a Clínica? A pergunta é pelo seu elemento potencializador, seu

princípio ativo, aquilo que determina as práticas e os seus fundamentos elementares. A

história da Clínica moderna inicia efetivamente com a ocupação dos hospitais por parte da

medicina na Europa do séc. XVIII. Seu fundamento fora a escuta e a observação intensiva do

enfermo no leito (Foucault, 2004). O processo do surgimento e desenvolvimento da Clínica

pode ser representado como uma espiral que engloba em sua trajetória os eixos da evolução

do conhecimento científico e tecnológico, das pesquisas anatomopatológicas e


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microbiológicas, das políticas estatais de saúde pública e do trabalho, bem como do processo

de desenvolvimento do modo de produção da sociedade capitalista.

É possível conceber uma articulação de fatores que organizaram e delimitaram o

campo médico em torno do estudo dos agentes patógenos e possibilidades de cura e

tratamento, assim como da produção de um discurso hegemônico sobre o corpo e a saúde. Um

processo que partiu da construção de técnicas e saberes com a experiência intensiva no

hospital, do desenvolvimento subsequente de expertise e do status social adquirido a partir da

vinculação da corporação médica aos projetos estatais de modernização pós revolução

industrial. No séc. XX a Clínica também passa pelos ideais de constituição de práticas

profissionais liberais como produto a ser comercializado no mercado de serviços e obtém um

grande reforço por meio do avanço tecnológico dos exames de imagem e da indústria

farmacêutica. Hoje, reconhece-se a Clínica mais pelo uso do diagnóstico por imagem, exames

laboratoriais e terapêuticas pela via farmacológica, do que por qualquer outro de seus

elementos fundantes, como a escuta e o acompanhamento da experiência do sujeito da doença

ao longo do tempo.

A Clínica é o lugar da tecnologia e do expert. O expert é aquele que se reclina sobre o

seu objeto já sabendo o que vai encontrar. Sua procura é invertida. Na narrativa do paciente

ou na observação de seu corpo não interessa tanto aquilo que não sabe, mas aquilo que já

sabe. É assim que pode pintar o quadro clínico que lhe corresponde e operar sobre ele. O

lugar onde está exposta a tela, a moldura, a origem das tintas, o processo que a produziu e

suas idiossincrasias de traços e formas costuma ter pouca ou nenhuma importância no

processo.

Trata-se de uma Clínica baseada em conhecimento estrito e sustentada cientificamente

pela estatística. Uma clínica não mais baseada nas singularidades da narrativa de sofrimento

do paciente e dos sentidos múltiplos que isso pode representar, mas baseada em evidências
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quantitativas: a epidemiologia, o experimento em grandes e homogeneizadas amostras e na

lógica indutiva. Um perfeito paradoxo, pois se trataria de uma Clínica especializada, mas

sustentada em generalizações. Algo impossível, a menos que se exclua a experiência subjetiva

e singular da dor e do sofrimento humanos.

Mas qual o alcance da grande Clínica, se ela exclui a experiência singular e os

múltiplos fatores formadores de sua complexidade? Certamente um alcance limitado a

determinado campo operatório: uma anedota apócrifa afirma que o especialista é aquele que

comete erros em um campo estreito de conhecimento em comparação com o generalista. Por

que acreditaríamos que a Clínica, representada pelo conjunto de práticas orientadas pela

racionalidade médica, comporiam um saber totalizante a respeito não só da saúde, mas do

valor da vida em seus mais diversos aspectos?

O valor do ser humano não é constante. Estruturalmente, podemos dizer que sua

singularidade depende do lugar onde ele está. O lugar é o conjunto de objetos e determinações

que excedem qualquer parcialidade como a economia, a política, a saúde, a cultura. É o

conjunto das determinações, inclusive as minoritárias, o que organiza o lugar. Milton Santos

(1993), no campo da geografia, também se debruça acerca da questão do expert. O depositário

da verdade do discurso da área é uma pessoa geralmente externa às coletividades as quais vem

estudar, sendo problemática sua frequente incapacidade de participar do cotidiano e de

perceber, sem preconcepções, os seus funcionamentos (Santos, 1996). A observação acurada

de Santos pode ser aplicada a praticamente todas as áreas afins, que se refiram ao estudo e

intervenção a respeito da vida do homem no contexto do mundo que o circunda.

Uma proposta de atenuação desse problema no campo da saúde onde reina a Clínica

tem sido proposta no âmbito da Saúde Coletiva como clínica ampliada. Uma tentativa de

convergir o raciocínio e a prática do cuidado integral em saúde no qual a Clínica, representada

pelo conjunto de conhecimentos e práticas prioritárias da medicina, seja assessorado e


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dialogue com outros saberes e práticas convidadas a participar de uma discussão de caso e

construção de projetos terapêuticos singulares. Entretanto, a racionalidade e a construção do

caso, mesmo no contexto de uma tentativa de clínica ampliada, costumam operar segundo a

estrutura clássica do exame, diagnóstico e intervenção. A racionalidade médica segue

paradigmática, em que pese o concurso de outros olhares e dos efeitos de equipe

multiprofissional.

No entanto, como prescindir de um dispositivo ao qual não se pode negar a potência

como disparador de processos de mudança, cura ou experiência? Além das clínicas curativas

da medicina, há a clínica terapêutica da psicologia, a clínica analítica da psicanálise, entre

outras. Pergunta-se: é o melhor caminho para o campo da saúde, compreendido como tudo

aquilo que reforça e potencializa a vida e as singularidades no processo de viver consigo e

com o outro, prescindir da Clínica? Como operar no campo da saúde sem dialogar com a

Clínica? É possível imaginar outra clínica como dispositivo potencializador de experiência e

de reconhecimento dos sujeitos do sofrimento em seus mais diversos e mutantes surgimentos

e expressões? Como recuar disso, sendo um pesquisador, gestor, professor, agente,

funcionário ou usuário da saúde?

1.1.2 A clínica

Uma barata é a narradora em A Metamorfose, novela publicada pelo escritor tcheco

Franz Kafka em 1915. No entanto, nem a barata ou qualquer outro animal a que Kafka

concede voz e pensamento, em sua literatura, o faz a exemplo de um ser humano. O lugar

enunciativo é deslocado daquilo que esperamos e esse efeito é desconcertante e belo. Deleuze

e Guattari (1975) analisam esse fato estilístico na obra de Kafka como produto de potência

criativa tributária de sua posição estrangeira no contexto da grande língua alemã. Kafka cria-

se em Praga onde o alemão e o tcheco convivem em tensão. Os que se expressam em alemão


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não o fazem, decerto, na forma culta. Ao optar por escrever em alemão, insere-se e serve-se

da língua de um modo que escapa aos cânones da literatura de Goethe. Contudo, não pode

recuar do desejo de escrever e nem de fazê-lo em alemão, mesmo não o dominando como um

herdeiro genuíno daquela cultura. Porém, ao não recuar, recria estilos, palavras e produz

novos lugares enunciativos com sua literatura menor (Deleuze & Guattari, 1975).

Deleuze e Guattari consideram menor a literatura que escape do cânone. A

expressividade que rompe as formas tradicionais, desterritorializa o campo e desconstrói

instituídos é o fator decisivo para o conceito. A impossibilidade de não poder deixar de fazê-

lo e, ainda, no contexto de um campo maior, tradicional e que lhe é estrangeiro, seriam

condicionantes da novidade da literatura de Kafka. Paradoxalmente, o aparente impossível é

de onde parte toda a condição de possibilidade da sua obra.

Ora, é impossível que um profissional ou pesquisador que entenda a saúde como

produto de condicionantes os mais diversos, além dos biológicos, recue de pensar e agir no

sentido de uma prática e uma lógica que contemple essas condições. Entretanto, é impossível

que queira fazê-lo sem o diálogo com a estrutura da Clínica tradicional. Em compensação,

levando o intento à radicalidade da materialização de seu potencial, é impossível que não

produza uma clínica estrangeira a esse contexto.

2. Razão

No Brasil, desde a Reforma Sanitária, o desenvolvimento conceitual e a integração de

práticas populares e científicas para o cuidado da saúde - o que acabou compondo o campo da

Saúde Coletiva - redesenharam modos de gestão e atenção em relação aos princípios da

Clínica. O espaço privilegiado de implementação das experiências inovadoras foi o Sistema

Único de Saúde (SUS), objetivando a reconfiguração da saúde pública. Na iniciativa privada


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os planos de saúde, a seu turno, inovaram as formas de capitalização dos processos da Clínica

tradicional. Com efeito, ambos a alteraram.

A crise econômica mundial que inicia em meados dos anos 70, após as duas grandes

guerras e o esgotamento dos Glorieuses Trente - os 30 anos de retomada do crescimento após

1945 - impõe aos governos dos países economicamente mais desenvolvidos a necessidade de

reformar seus sistemas de proteção social, o que incluía a saúde como carro-chefe. A partir

dos efeitos do Relatório Lalonde (Lalonde, 1974), no Canadá, surgem conferências

internacionais que reúnem gestores de grandes nações para discutir novas ideias, como os

cuidados primários e a promoção da saúde. Buscava-se alternativas para manter a qualidade

de vida da população do primeiro mundo, de modo sustentável aos seus governos (Buss,

2000).

Talvez seja possível afirmar que as bases da proposta da Atenção Primária à Saúde

(APS) (OMS/UNICEF, 1979), estabelecidas na Conferência de Alma Ata em 1978, tenham

sido responsáveis por uma pequena alteração na Clínica contemporânea com o passar dos

anos. Além do acesso universal aos sistemas de saúde, a descentralização do cuidado, com

foco nos territórios, coloca para a Clínica a necessidade de acompanhar os modos de adoecer

e produzir saúde ao longo do tempo e em acordo aos determinantes sociais específicos de

cada local. O território passa a ser o elemento organizador desta nova orientação.

No Brasil, a partir da metade da década de 80 a saúde coletiva encontra seu

fundamento quando inscreve a determinação social no campo biológico da saúde. A noção

ampliada de território influenciará a reorganização dos sistemas de saúde e alterará práticas de

atenção e formação (Teixeira e Solla, 2006). A Clínica seguiu seu processo cada vez maior de

especialização e de uso da tecnologia no setor dos exames, dos diagnósticos e dos fármacos.

Concomitantemente, no contexto da APS - Atenção Básica (AB), como ficou conhecida no

país – o médico de família e comunidade (MFC) surge como a especialidade de uma Clínica
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cuja natureza é a generalidade. Trata-se de um profissional que deve conhecer, desde a clínica

geral dos agravos agudos e crônicos mais recorrentes nos diversos ciclos vitais, até as técnicas

de controle epidemiológico e a construção de fossas sépticas, passando pela consideração dos

modos de vida e condições socioeconômicas dos pacientes, em seu raciocínio clínico. Um

médico que deveria conhecer o território.

Assim como o MFC, os demais integrantes das equipes multiprofissionais da

Estratégia da Saúde da Família (Brasil, 2012) devem conhecer o território. Conhecê-lo

significa algo mais complexo do que ter acesso à informação sobre os limites geopolíticos, os

dados estatísticos e epidemiológicos a respeito da população que nele reside. É necessária a

compreensão profunda sobre um mosaico de determinações físicas, psíquicas, sociais,

culturais e as condições de vida que possibilitarão à equipe reconhecer as necessidades

prioritárias de saúde daquele território.

As mudanças no campo da saúde patrocinadas pelo processo histórico dos últimos 40

anos, desde Alma Ata, proporcionaram em nosso país um acumulado de experiências

riquíssimas nos registros da gestão, da formação e da cidadania. No registro da atenção à

saúde, a primazia do território produziu um deslocamento da tradicional clínica médica

especializada, individual e biologicista, que nos inspira a perguntar: afinal, não haveria a

potencialidade da estruturação de uma clínica de território?

3. Método

A pergunta pela possibilidade de uma clínica de território estabeleceu o recorte

topológico de um ponto de não saber necessário para o apoio de um plano de investigação e

experiência que pudesse indicar caminhos e primeiras respostas. A linha que estruturou esse

plano, em conjunção com o ponto do não saber, fora um projeto de extensão universitária,
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iniciado em 2016, por meio do qual, professores e alunos de diversos cursos de áreas afins à

saúde ou que se ocupam do espaço e dos modos de vida nos territórios, propuseram-se o

exercício de tentar conhecer um território e seus problemas, procurando evitar ao máximo

mediações instrumentais ou conceituais. Assim, o objetivo do grupo, que inicialmente contava

com acadêmicos da saúde coletiva, educação física, psicologia, enfermagem, arquitetura e

urbanismo e que mais tarde ganharia geógrafos e assistentes sociais, era produzir uma

experiência crítica e inovadora de aproximação das formas de vida no espaço urbano sem os

recursos já estruturados pelo saber de alguma área do conhecimento científico ou pelo poder

de alguma instituição atuante no território.

O que se desejava como horizonte alternativo aos procedimentos acadêmicos e

científicos tradicionais não deveria ser de nenhuma das áreas que, inclusive, estavam

representadas em nosso grupo. O que se buscava era tomar o território como fundamento e

não como objeto de diagnóstico, classificação ou intervenção. Arriscamos que nosso intento

até poderia ser a busca por uma clínica feita de território. Eis a pré posição de nosso ato e o

sentido que a preposição confere à expressão clínica de território. Uma homologia relativa ao

conceito de vontade de potência de Nietzsche (1988), a saber, uma vontade que se insurge

contra aquilo que resiste a ela. Desse modo, a clínica de território seria aquela que se

manifesta no momento em que algo reage, resiste ou se insurge contra seus agenciamentos no

território.

O desamparo de não querer contar com as bússolas do conhecimento instituído fez

com que nossas primeiras navegações em territórios de bairros periféricos de uma grande

cidade, escolhidos intencionalmente pelo cenário de desigualdade social que representa bem o

contexto sócio histórico do nosso país, fossem ancoradas em uma unidade de saúde e

timoneadas por uma de suas trabalhadoras: a agente comunitária de saúde (ACS). Veio daí a

origem da pré (dis)posição de tentar escapar dos discursos instituídos: estarmos


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acompanhados por uma pessoa reconhecida por trabalhar no posto de saúde local nos

colocava naturalmente na posição de agentes do Estado, a quem se demanda melhores

serviços, entre outros. Assim, nossa disposição no território já estava capturada pelo discurso

da saúde e nossas interações iniciais se tornaram restritas a esse enquadre.

Num território, qualquer elemento estranho rapidamente acaba sendo percebido. Um

grupo itinerante não permaneceria muito tempo sem precisar revelar sua procedência. Foi

assim que escapamos do enquadre da saúde ao nos apresentarmos em um armazém como

professores e alunos da Universidade, quando procuramos refresco à sombra depois de uma

longa caminhada. Nossa indisposição para sustentar o discurso da saúde em nosso

experimento foi logo atendida. Contudo, passamos a sustentar imediatamente o discurso da

universidade. O lugar de ensino, pesquisa e extensão universitária nos investiu de tal potência

que até mesmo um emprego nos foi solicitado durante uma conversa, fazendo com que

refletíssemos sobre o tipo de relação que ali estávamos estabelecendo com aquela população,

bem como sua dificuldade de acesso à universidade.

Logo encontramos nosso primeiro complexo problemático para uma clínica de

território: como escapar das capturas que premeditam e conformam relações? Como modular

os efeitos dos lugares instituídos do saber/poder nos territórios? Por fim, como dispormo-nos

ao lado povo para escutar narrativas de seu ponto de vista, se, mesmo tendo sucesso em

escapar do lugar de agente da Ciência ou do Estado, estas narrativas já parecem estar

atravessadas pela linguagem das ciências, pelo desejo do mercado ou pelo trabalho do

Estado?

O primeiro movimento de reflexão sobre essas questões, ainda como grande grupo de

professores e alunos, foi promovido pela literatura. Uma colega sugeriu um conto para servir

de substrato de nossas discussões iniciais: A arte de andar nas ruas... (Fonseca, 1992),

mencionado no início deste capítulo; afinal, andar nas ruas era tudo o que fazíamos até ali. A
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aposta talvez tenha sido conhecer e significar o mundo por outra forma que não pela lente da

ciência, como a arte nos possibilita. No entanto, foi apenas no segundo ano do projeto que a

prática da errância pelas ruas daquele bairro periférico de uma capital encontrou um conceito.

O paralelo do procedimento do personagem do conto para escrever seu livro com a

nossa errância inicial - e a própria linha narrativa errante do conto - de algum modo nos levou

ao encontro da teoria da deriva, produzida pelo movimento Internacional Situacionista em

meados do séc. XX (Debord, 2003). Como um ato de rompimento com as coerções do modo

de reprodução capitalista da vida nas cidades, a deriva constitui um comportamento em que o

percurso em um determinado espaço urbano é conduzido pelo inesperado, pelo afetivo, ao

invés do intencional. Os derivantes devem renunciar aos motivos premeditados para deslocar-

se e se deixarem levar pelas solicitações do terreno e pelos encontros que a ele correspondem.

O campo espacial da deriva é mais ou menos preciso ou vago se esta atividade visa o estudo

de um terreno ou obter resultados surpreendentes (Debord, 2003a). O conceito de deriva

remete a uma psicogeografia - os efeitos do meio geográfico que agem diretamente sobre a

dimensão psíquica dos indivíduos - e a afirmação de um comportamento lúdico e construtivo -

diferente de uma viagem ou passeio - ao invés de monótono e repetitivo.

O modo como a cidade funciona para o cidadão é programado a exemplo das

passagens de um shopping que lhe levam inexoravelmente à frente do local de consumo e o

afastam do local de lazer ou descanso. O traçado das vias urbanas e a estrutura estática com

que se apresenta a cidade ao espectador são frutos de uma racionalidade que tende a manter os

comportamentos tais quais estão, tanto quanto os comportamentos mantêm a racionalidade

(Lima, 2011). A apropriação da cidade começa pela apropriação de seus cidadãos.

O método da deriva e da criação de situações que subvertem os fluxos e os usos

automáticos dos espaços urbanos, passou a ser o modo para produzir os encontros inesperados

no território que servia de cenário de nossas práticas. Foi nossa epifania. O personagem
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Epifânio do conto também desejava constituir um saber a partir do território e escrevê-lo com

o território e não sobre ele. Seu procedimento, sua ética e seu lema, solvitur ambulando –

resolver caminhando -, passaram, em alguma medida, a ser os nossos.

O andar a pé constitui uma estética de posicionamento frente ao mundo (Thoreau,

2003; Careri, 2003). E a estética do caminhar, articulada à prática da deriva, nos brindou com

um procedimento que respeitava a ética a que nos propusemos no início da experiência.

Passamos contar com um recurso prático que permitia a aproximação e o reconhecimento do

território com o mínimo de mediação por teorias, instrumentos e demais dispositivos

produzidos por um específico campo de saber – como, por exemplo, a entrevista estruturada

da psicologia, a anamnese da medicina o georreferenciamento, da geografia. E que, desse

modo, possibilitou a atenuação de certas capturas que acabam por conformar e esterilizar

relações com a população ou seu território vivido. Numa consulta médica, num levantamento

topográfico ou na abordagem policial, os desfechos não ocorrem muito além do que esse

recorte de relação sugere. A deriva modifica a forma científica ou institucional de abordar o

território e tem a possibilidade de contornar as predisposições que gostaríamos de evitar.

A constituição moderna da experiência humana, a partir da orquestração entre os

discursos do capital e da ciência, parece ter organizado um laço social no qual, entre outros

aspectos, a produção de índices quantitativos a partir de métodos experimentais de fazer

ciência seja privilegiada como a forma verdadeira de avaliar e descrever fenômenos das mais

variadas ordens. Consequentemente, isso influenciou as formas de vida desde a modernidade

até nossos dias, bem como os modos pelos quais os sujeitos sociais endereçam-se aos

elementos organizadores da cultura em que se inserem.

No campo da gestão pública e da iniciativa privada, são mapas topográficos,

demográficos, socioeconômicos, epidemiológicos, entre outros, os que figuram como as

fontes confiáveis de informações e que servem como base comum para políticas, ações e
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intervenções práticas sobre os supostos problemas dos diversos territórios onde acontece a

vida de relação. Esses mapeamentos trazem indicadores relevantes e traçam um perfil inicial

bastante acurado, constituindo bancos de dados e sistemas de informações.

No entanto, o relevo, a demografia, o nível socioeconômico, o poder de compra, a cor

da pele, a religião ou as doenças específicas presentes em determinado território que se tome

como objeto de estudo situacional, trazem um possível, mas pálido, desenho para a construção

compreensiva dos modos complexos de existência e reprodução da vida em coletividade ali

existente. Os indivíduos perdem sua singularidade e se tornam sujeitos de pesquisa,

beneficiários, usuários, clientes, consumidores, colaboradores etc. Os principais problemas

das cidades de médio e grande porte do país, dizem respeito à violência e à mobilidade

urbanas, aos salários e contratos precários de trabalho, ao difícil acesso à educação e à saúde e

à falta de tempo e espaços para o lazer, entre os mais presentes antes da pandemia da

COVID19. A compreensão acerca de como operam essas dificuldades na vida de relação nas

comunidades, bairros e nas cidades como um todo, e das estratégias de enfrentamento

singulares de cada grupo populacional, entretanto, se torna superficial se não há um método

de aproximação das narrativas e dos discursos circulantes nas famílias e na comunidade que

se deseja mapear e conhecer.

Os efeitos no agir e no pensar, nas diferentes formas como indivíduos e grupos de

culturas familiares e sociais diferentes se relacionam com as instituições, entre tantos fatores

complexos, constituem determinantes psicossociais que geram sofrimentos das mais variadas

ordens no tempo de uma vida. Sofrimentos conscientes e, alguns, inconscientes. Nesse

contexto, parece claro que os mapas tradicionais apresentam limites em promover um tipo de

análise ou recurso que transcenda a descrição de perfis populacionais informativos,

constituídos a partir de dados avaliados por indicadores quantitativos. Contudo, entre outros

usos, são estes tipos de dados que alimentam a já mencionada Clínica. Parece lógico assumir
18

que a complexidade dos modos de viver e de experimentar o sofrimento, assim como as

formas de lidar e significá-lo, coletiva e individualmente, nos territórios urbanos, requeiram

dois tipos de parcimônia: com a determinação a priori do recorte da investigação das

situações e com o uso de recursos interpretativos predeterminados para compreendê-los.

Esse foi o campo problemático para o qual a deriva promoveu a primeira resposta. As

derivas no território promovidas pela atividade de extensão universitária geraram situações de

resistência, de choques, de encontros ou desencontros. Esses fenômenos, ao invés de serem

reconhecidos diretamente como objetos de intervenção, precisam ser tratados com a dignidade

de uma escuta, de uma leitura demorada, de uma construção que se faça lentamente com o

território.

A segunda etapa da experiência acadêmica se constituiu quando espaços de fala e de

escuta começaram a se estabelecer. A entrada em uma escola gerou o encontro com um grupo

de alunos, por meio dos quais foi possível tomar conhecimento de questões trazidas sob a

ótica do jovem naquele local. A chegada de derivantes de nosso projeto a um bar rendeu

narrativas da perspectiva do homem aposentado, idoso, que conhecera um outro lugar que não

mais existia naquele pedaço de chão. A escuta dos recantos precários e das pichações

evidenciaram uma poética do espaço (Bachelard, 1978) e uma escrevivência (Evaristo, 2006)

nada óbvias ao olhar apressado do transeunte. As memórias da moradia de infância

atualizaram narrativas soterradas pelas camadas discursivas recentes, que emudecem a

dimensão humana do tempo da vida no território.

Estas experiências fundantes de nossas práticas de deriva e escutas de narrativas -

entre outras, a de sentirmo-nos mais seguros e livres na caminhada pela parte pobre do

território e vigiados na parte rica, sermos abordados por seguranças em espaço público, nos

surpreendermos cansados e irritados numa região barulhenta e de alto fluxo viário, e

impressionados com a mudança repentina de paisagem e intensidade sonora ao dobrarmos


19

uma simples esquina - nos trouxeram uma nova problemática. Como dar expressão a essas

experiências imediatas do território? Com que formas, com que linguagem, com que estilo

que escapasse de uma representação ou tradução em alguma linguagem acadêmica

privilegiada?

A necessidade desta segunda etapa em nossa busca por uma clínica feita de território,

nos levou ao estudo do conceito de narrativa. Benjamin (1994; 1994a) foi o primeiro guia e,

em seguida, Ricoeur (2010), pois a experiência não nos deixava crer que a narrativa pudesse

ter desaparecido. O ocaso da narrativa como decorrência do empobrecimento da experiência

humana a partir do séc. XX, é relativizado posteriormente por Ricoeur quando este propõe

que o resgate do tempo e da história como elementos humanos só pode ser realizado pelo ato

narrativo. O estudo e a prática com as narrativas do território, que começavam a se multiplicar

em formas e conteúdos a cada deriva, acabou nos levando a outra posição ética que se

constituiu na última etapa da investigação, até o momento.

Um critério de coerência nos impôs que o modo de transpor o mosaico de elementos

que produzimos com o território para o contexto da formalização não pudesse ser descritivo,

analógico ou por um efeito de representação. Se a tentativa até então fora de habitar

temporariamente um território, despido o quanto possível de armaduras institucionais para

gerar um encontro menos capturado pelos sentidos que o senso comum produz sobre seu

objeto de conhecimento, como capitular frente a algum saber acadêmico e produzir um mapa

descritivo, informativo ou desenhado através da lente específica de um campo disciplinar

privilegiado?

A solução veio pela ideia de produzir um mapa expressivo do território. Um mapa que

se expresse, que fale, é mais vivo do que um mapa que apenas mostre. Concedendo-lhe, pela

expressão, a qualidade de manter alguma vida própria, poderemos, talvez, constituir uma
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clínica que defenda essa vida em seus modos de ser imponderáveis, incontáveis, não

capitalizáveis. Uma clínica cujo sentido do pathos seja a paixão (Caon, 1994) e não a doença.

Um mapa é uma escrita. Qual o traço desse mapa? Ainda não o sabemos. Apenas

intuímos até aqui que um mapa narrativo do território não terá a aparência do mapa

geopolítico, do Atlas, do Google Earth, do GPS. Assim como o livro de Epifânio não será um

guia turístico, com dicas de restaurantes e locais históricos para se visitar, nosso mapa será

expressivo e não representativo do território através de uma escala que emula o real do

espaço. Buscávamos, como o personagem do conto A arte de andar nas ruas..., uma escrita

que atenuasse representações pré-fixadas, que revelassem além do aparente e, talvez, se

aproximasse mais de elementos da arte.

Estamos advertidos de que acabamos ocupando um lugar de difícil sustentação como

pesquisadores, cujos pressupostos não são os paradigmáticos da grande Clínica e que usam

com parcimônia quase abstinente os cânones conceituais e instrumentais das ciências. Em

nossa manifestação ética metodológica, optamos por habitar os territórios desde o lugar do

estrangeiro, que a tudo estranha e que causa estranhamento a todos, por estarmos vestidos

com o mínimo de insígnias institucionais e de não carregarmos muitos instrumentos. E

acabamos nos sentindo estrangeiros também de volta à Universidade.

4. Derivar, escutar e escrever

Foi a clínica psicanalítica que produziu a primeira desvinculação com a racionalidade

médica operando um desvio do ver para o ouvir. Como anedotário, produziu muitas histórias

interessantes, desde os escritos clínicos de Freud terem sido acusados de reles ficções

literárias pelos homens da ciência, até as inúmeras em que o protagonista fora o inquieto

psicanalista francês Jacques Lacan. Numa delas ficamos sabendo que um incrédulo candidato

a analisante questiona Lacan, logo na primeira sessão, sobre a utilidade da psicanálise para
21

seu caso. Embora uma análise não se constitua pelo utilitarismo e nenhum analista, por mais

experiente, possa prever o desfecho de um caso na primeira sessão, Lacan responde de modo

certeiro e sedutor sobre seus efeitos. Disse ao analisante: a psicanálise realiza algo

comparável à relação entre o conto e o romance. A contração do tempo, que o conto

possibilita, produz efeitos de estilo (Laurent, 2016).

Literatura, conto e estilo, são significantes que nos acompanharam em nossa

experiência inicial na busca por uma clínica de território. É impressionante perceber agora

que nosso método acabou formalizando alguns elementos já presentes no conto de Rubem

Fonseca (1992). Encontrar soluções no ato de caminhar e a ética em rejeitar a produção de um

manual ou um protocolo, são exemplos. Cabe afirmar que, afinal, nosso Bildungsroman

também teve a estrutura de um conto.

Habitar o território com uma mínima marca institucional, desejando permanecer

estrangeiros em relação aos instituídos, foi nosso primeiro campo problemático. Posicionar o

olhar e, posteriormente, privilegiar a escuta de narrativas desde um lugar descentrado ao

nosso próprio saber não tem sido tarefa cômoda. Experimentar a produção de fundamentos

práticos e teóricos para uma clínica que não se deixa capturar facilmente pelos cânones da

grande Clínica traz em si os percalços do rompimento com tradições e poderes.

A arte, pela via da literatura, vem novamente nos acolher quando tomamos o que

Deleuze e Guattari (1975) produziram a respeito da literatura estrangeira de Kafka,

mencionada anteriormente. Diziam os autores que a impossibilidade do escritor tcheco de se

valer de outra língua que não a alemã lhe permitiu escapar aos cânones da grande língua,

desterritorializá-la. O alemão falado em Praga, língua desterritorializada a exemplo do inglês

de que se servem os negros, se presta a usos menores (Idem, p.26). É, como dizia-se, o que

levou os autores a designar a impressionante obra de Kafka como uma literatura menor.
22

O termo menor em Deleuze e Guattari, entretanto, não é valorativo. Diz respeito a

certas obras literárias surgidas no século XX que revolucionaram uma grande literatura já

estabelecida como maior. Não é a literatura de uma língua menor, mas o que uma minoria

consegue fazer em uma língua maior (Deleuze & Guattari, 1975, p.25). Em Kafka, assim

como em outros autores que subverteram campos hegemônicos com suas literaturas no último

século, o registro das relações ou dos talentos individuais da personagem é ampliado de tal

modo que passam a revelar sua estreita articulação a contextos maiores - econômicos,

burocráticos, jurídicos - fazendo com que o individual dê lugar ao coletivo e tudo nela se

torne, antes, político. A literatura menor tem mais a ver com o povo (Idem, p.27).

Epifânio, o escritor que desejava escapar da literatura prosaica e utilitária que enfoca a

cidade, como o guia turístico, o compêndio arquitetônico ou o manual que nomeia e localiza

logradouros, também quer romper com algo maior e já estabelecido. Anda a pé para

aproximar-se da vida em coletividade e encontrar uma arte e uma filosofia que lhe permita

maior comunhão com a cidade (Fonseca, 1992, p.17). É clara sua preocupação em preservar a

dimensão política de seu intento literário. É justo que seu maior problema, fonte de suas

procrastinações e détours frente ao seu objetivo, seja o de conseguir transpor suas

experiências existenciais por meio de uma escrita genuína.

Uma clínica feita de território também se alinha ao político. Construir um saber a

partir do território significa a recusa da narrativa da grande Clínica que não enxerga mais a

articulação do sintoma individual com contextos econômicos, jurídicos e burocráticos, que

não escuta o espaço coletivo que conforma modos de viver e morrer e que, evidentemente,

não mais responde tão bem ao que há de humano e subjetivo nos contextos que a Clínica deve

se debruçar. Outro campo problemático surge nesse contexto. A deriva engendra o encontro

quase imediato com o território, mas não garante que a escuta não seja mediada. Assim sendo,

foi preciso perguntar o que passamos a escutar e como devíamos nos posicionar em nosso
23

tempo de escuta? Em seguida, como transmitir uma experiência do território quando se

retorna dele? Qual é o traçado, a escrita, que pode expressar esse mapeamento?

Foucault (2004) reconstrói a história da clínica médica mostrando que ela encontra seu

ponto de mutação quando define um conjunto de práticas e técnicas, que conjugam em um

mesmo fazer os métodos de investigação e os procedimentos clínicos modernos. Comentando

sobre as especificidades distintas da clínica psicanalítica, Dunker (2017) observa que o corte

freudiano fora com a medicina e não com a clínica. Por conseguinte, até mesmo outros tipos

de clínica não prescindem de uma semiologia. Não há clínica sem registro de quais são os

signos privilegiados para apreensão dos fenômenos patológicos. E não há clínica sem uma

possibilidade diagnóstica. Frente a tanto, parece claro que a clínica de território precisa ainda

posicionar-se sobre o conceito de pathos e a ética que orientará o fazer a partir de sua

diagnóstica.

Na altura em que se encontram nossos desenvolvimentos, apenas é possível propor

que a noção de pathos deva ser mesmo a que se aproxima dos sentidos do provar e do

passivar (Caon, 1994), ao invés do signo de uma doença ou inadequação, e,

consequentemente, a noção de diagnóstico é a que estrutura e esclarece as dimensões

discursivas do mal-estar individual ou coletivo no território, em lugar da determinação de um

sintoma biopsicossocial. Parece razoável afirmar, por conseguinte, que a clínica que

buscamos seja também uma clínica menor, tomando de empréstimo a acepção de Deleuze e

Guattari a respeito da literatura de Kafka. Há uma impossibilidade de não fazer esta clínica

onde tudo deve tomar a dimensão do político, especialmente no tempo em que vivemos.

Numa inspiração livre a respeito da literatura menor, diríamos que a clínica menor não é a que

vem de um campo de saber menor, mas, antes, é toda clínica que uma minoria faz em um

campo de saber maior. É, certamente, o que muitos profissionais do campo da saúde já

realizam em interface com a clínica médica em seus processos de trabalho em equipe. Este é o
24

argumento que também nos permite deduzir hipoteticamente que a clínica de território não

seja apenas uma.

A estrutura mínima inicial da clínica de território, que temos buscado formalizar nos

últimos anos - e que é objeto deste artigo -, parte da deriva, estabelece uma escuta, mas sua

produção precisaria ser transmitida também sem o filtro de um campo privilegiado do saber.

Tal é o terceiro complexo problemático que devemos enfrentar e que envolve uma articulação

entre os tempos da escuta e de sua transmissão. As tentativas de trazer relatos orais das

escutas estabelecidas a partir do procedimento da deriva, de recortarmos significantes e

tentarmos associá-los coletivamente por meio de diferentes modos expressivos, se mostraram

pouco potentes, num primeiro momento.

Um avanço promissor se deu quando nos propusemos a expressar por meio de um

outro texto autoral o que cada um de nós experimentava a partir da deriva e da escuta. Esses

textos poderiam ser em qualquer forma literária ou mesmo uma composição de palavras e

imagens, de acordo com o estilo ou condições de cada um. O compartilhamento de cada texto,

no grupo que chamamos Roda de Narrativas Escritas, permitiu a circulação das palavras e a

atenção concentrada do grupo em torno de suas experiências singulares com o território. Em

seguida, um novo texto segue sendo tecido a partir daqueles produzidos pelos escritos: trata-

se da circulação, agora, da palavra falada. E nessa trama, algo se transmite do discurso que

opera naquele tempo do território em questão. Neste ponto de nossos desenvolvimentos é o

caminho que estamos trilhando para produzir expressões da experiência com os territórios.

A busca, nesse terceiro tempo, a saber, de uma escrita, de um traço para o

mapeamento não representacional do território, segue na linha da transliteração do que se

produz nesse tempo que vai da escuta até a determinação do traço do caso da clínica de

território. A transliteração não opera no registro da analogia - como a tradução ou a

transcrição -, que nos levaria aos mesmos processos do mapeamento representacional de um


25

território já capturado por um campo de saber. A transliteração, por sua vez, pode produzir

uma homologia entre elementos discursivos do território e da construção do traço do caso: o

traço para o mapeamento do território, que constituiria a base mínima necessária para o

recorte diagnóstico e o raciocínio clínico. Traço, aqui, deve ser entendido em sua polissemia,

que vai do sentido de marca, cifra, que identifica um elemento singular do caso, juntamente

com o sentido de escrita, risco, traçado, que pode desenhar um mapa.

O procedimento expressivo com as narrativas do território, realizado nas Roda de

Narrativas Escritas, ambiciona a transliteração. Um princípio conceitual, mas também ético,

coerente com o fundamento desta clínica: preservar em nosso procedimento a noção de que

jamais é possível traduzir em nossos termos – de um específico campo de saber – a

experiência singular da alteridade. O que separa duas instâncias heterogêneas é um litoral, não

uma fronteira que se pode atravessar inadvertidamente sem que as diferenças sejam

observadas e respeitadas. É um litoral que separa nossos melhores e mais estabelecidos

conhecimentos clínicos ou científicos, da experiência singular do outro a quem nosso saber se

remete com a pretensão de tradutor ou representante. Com a vida do outro, nosso mais

avançado conhecimento é, no máximo, simplório. Eis outro axioma possível de uma clínica

de território.

Derivar, escutar e escrever acabou constituindo, afinal, os elementos estruturantes que

tem organizado iniciativas e pesquisas a respeito da existência e da formalização ética e

política de uma clínica de território, segundo nossos termos. E que, ao mesmo tempo, tem o

potencial de organizar distintas práticas para operar no campo da saúde a partir dos territórios.

A formação inicial do suposto clínico de território, até segunda ordem, baseia-se num convite

a experimentar-se durante o tempo que puder sustentar estes três movimentos,

individualmente ou em equipe. Independentemente de sua formação prévia ou em processo,

aquele que deseja provar e passar pela experiência com a deriva, a escuta e a escrita, além de
26

precisar colocar algo de si, também é convidado a teorizar sobre a clínica de território. Ao

mesmo tempo em que contribui para seu avanço, poderá avaliar como ela pode constituir para

si uma nova concepção em sua prática maior, já estabelecida, ou, quem sabe, a encontrar

novos sentidos que a formalize manifestamente como ato clínico.

4.1 Manifesto conclusivo da clínicaS de Território em seus princípios.

A clínicaS de Território em seus princípios é um Manifesto inaugural que segue nos

orientando em nossos avanços recentes, além de explicitar princípios e formalizar nossa grafia

pouco usual da denominação que passamos a nos reconhecer. Diz ele:

A clínicaS de Território (cST) está do lado da população: dos grupos e dos indivíduos.

Não se faz como agente ou representante do Estado, do Mercado, da Ciência ou como

portadora privilegiada de algum dos discursos que organizam o setor da Saúde. Mas, é

agenciadora possível de enunciações singulares de modos de viver.

A cST é uma clínica menor: opera com a resistência aos grandes discursos que

formalizam e naturalizam modos de viver em coletividade nas cidades e reforça a diversidade

e o potencial subversivo do desejo.

Não é uma medicina, pois embora goze de recursos diagnósticos, não impõe

terapêuticas, mas análises e encontros. Não é uma psicanálise, embora possa promover a

interpretação do desejo pelo modo de vida nos territórios. Não é um urbanismo, embora se

pergunte pelo viver nos espaços coletivos das cidades. Não é uma antropologia, embora tenha

uma hipótese sobre o humano. Não é um serviço social, embora seu potencial seja o

agenciamento e a colaboração. Não é uma geografia, embora se pergunte pelo espaço, a

paisagem e a vida que neles podem ocorrer. Não é uma sociologia, embora opere com as

relações e os discursos que organizam laços sociais. Não é, enfim, um tratamento, mas tem

efeitos terapêuticos. Porém, é uma clínica, pois resgata a escuta das narrativas do sofrimento,
27

a análise, a responsabilização e a autonomia do sujeito (individual ou coletivo). E é feita de

território, pois esse é o seu elemento epistemológico.

A cST procura compreender o desejo e suas denegações pelos modos de viver em

determinado espaço urbano a partir de sua construção coletiva e interpretativa. Não é voltada

a nenhuma especificidade de classe social ou tipo de território, tendo em vista que não há

grupo populacional que se sinta plenamente contemplado em suas potencialidades e

demandas no contexto coercivo em que vive.

O clínicoS de Território é antes de tudo um pesquisador. Sustenta-se pela pergunta e

pela problematização daquilo que se faz objeto de sua clínica: os modos de viver nos

territórios. O levantamento de problemas se dá a partir da escuta, do diálogo, da suspensão de

seu saber e da análise narrativo-discursiva que opera em dado momento nos territórios, bem

como da provocação, o pro-vocare, os atos que fazem falar como antítese aos atos que fazem

calar um território.

A formação desses clínicos não é acadêmica, não fornece certificado e nem é garantida

por diplomação. A formação se dá no campo de práticas e na pesquisa e pode ser identificada

quando da construção/invenção pessoal de um estilo: o saber provocar o território.

Os fundamentos elementares da cST são: o território e as narrativas.

Os elementos fundamentais da cST são: a escuta e o diálogo.

Os conceitos que organizam a construção de sua práxis podem ser a hospitalidade

como em Derrida por seu aspecto de irrestrita abertura solidária ao outro, ao estrangeiro, ao

estranho, ao familiar, ao estranho familiar. A noção ampla de território e territorialidades, pela

abrangência aos modos singulares de ocupar e significar os espaços. A lógica da promoção e

da educação em saúde, diferenciadas, respectivamente, da medicalização do viver e da

transmissão experta de informações.


28

Os métodos que integram uma caixa de ferramentas do cST, sempre em composição,

podem ser a deriva dos situacionistas franceses ou a flânerie benjaminiana; o diálogo, a

conversa, a cartografia, o mapa falante, a análise de discurso, o registro coletivo do diário de

bord(a), entre outros que se mostrem potentes à experiência.

Os operadores e práticas adjuvantes à cST podem ser a amizade como em Montaigne

(o grau máximo das relações humanas), animação territorial, os itinerários terapêuticos, a

ocupação, os movimentos sociais e afins.

A missão da cST é a (re)tomada da cidade como espaço de vida, de com-vivência, a

preservação da diversidade dos modos de vida, a construção do desejo advertido pelos modos

de vida presentes e o agenciamento de novas enunciações coletivas.

clínicaS de território se grafa em minúscula por ser uma clínica menor. O plural e o

singular jogam insistentemente na compreensão e na prática da cST. Por conta disso é que a

flexão da expressão que a denomina apenas aparentemente é equivocada: a clínicaS de

território. Essa grafia evoca a pluralidade de uma clínica específica, além do S, maiúsculo,

também indicar os encontros que estabelecem um litoral: marca indeterminada que divide

simbolicamente, ao mesmo tempo que integra, espaços heterogêneos, físicos ou imateriais.

A clínicaS de Território não é, se manifesta.


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