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Análise Matemática III

Séries Numéricas
Séries de Funções
Equações Diferenciais
Transformadas de Lapplace

2022-2023

Amílcar Branquinho
Conteúdo

Prólogo 7

Capítulo 1. Sucessões e séries numéricas 9


1. Conceitos fundamentais 9
1.1. Princípio de indução 9
1.2. Desigualdades e valor absoluto 9
1.3. Limites inferiores e superiores. Ínfimos e supremos 10
1.4. Conhecimentos de base 13
2. Noção de sucessão 14
2.1. Sucessões monótonas e limitadas 14
2.2. Progressões como exemplo de sucessões 16
2.3. Noção de limite de uma sucessão 17
2.4. Cálculo de limites 19
3. Técnicas de cálculo de limites 19
4. Limites fundamentais 22
5. Séries de números reais 25
5.1. Noção de série numérica 25
5.2. Sucessão e série associada 26
5.3. Sobre a natureza das séries 26
5.4. Questões acessórias 27
5.5. Séries standard 28
5.6. Critério geral de convergência de uma série 29
6. Exemplos fundamentais 30
6.1. Série de Mengoli ou telescópica 30
6.2. Série geométrica 32
6.3. Séries de Dirichlet 34
7. Critérios de convergência 35
7.1. Operações admissíveis sobre séries 35
7.2. Critério de comparação de Gauss 36
7.3. Critério de comparação de Gauss ‘no limite’ 37
3
4 CONTEÚDO

7.4. Critérios de Cauchy–Hadamard e de D’Alembert 39


8. Dois critérios gerais 40
9. Discussão sobre a natureza de séries 42
10. Convergência absoluta e simples 43
10.1. Série de valores absolutos 43
10.2. Séries alternadas 44
11. Questões miscelâneas 46
12. Exercícios de avaliação 55

Capítulo 2. Sucessões e séries de funções 57


1. Séries de potências 57
2. Critérios de convergência 59
3. Resolução de exercícios 64
4. Operações com séries de potências 69
5. Séries de Taylor 79
6. Convergência pontual e uniforme 82
6.1. Convergência pontual 82
6.2. Convergência uniforme 84
6.3. Aplicações do Teorema M-Weierstrass 87
6.4. Análise da continuidade, diferenciabilidade e integrabilidade da função
limite uniforme 88
6.5. Regularidade da soma de uma série de potências 90
7. Exercícios vários 90
8. Séries de Fourier 92
9. Série de Fourier de co-senos ou de senos 97
10. Exercícios vários 99
11. Transformadas de Fourier 102
12. Exercícios de avaliação 104

Capítulo 3. Equações Diferenciais 107


1. Motivação e definições básicas 107
2. Warm up 109
3. Equações diferenciais lineares de primeira ordem 114
4. Equações diferenciais de variáveis separáveis 116
5. Equação diferencial de Bernoulli 118
6. Equações diferenciais exactas 119
7. Teorema de existência e unicidade 123
8. Equações diferenciais de segunda ordem 124
CONTEÚDO 5

9. Equações diferenciais lineares homogéneas de segunda ordem


com coeficientes constantes 126
9.1. O polinómio característico tem duas raízes reais distintas 127
9.2. O polinómio característico tem um raíz dupla 128
9.3. O polinómio característico tem duas raízes complexas conjugadas 129
10. Equações diferenciais lineares homogéneas de segunda ordem
com coeficientes variáveis 131
11. Equações diferenciais lineares completas de segunda ordem de
coeficientes variáveis 138
11.1. Método do polinómio anulador 139
11.2. Método da variação dos parâmetros de Lagrange 143
11.3. Método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem) 146
12. Equações diferenciais lineares de ordem superior a dois 148
Exercícios de avaliação 152

Capítulo 4. Transformadas de Laplace e sistemas de equações diferenciais 159


1. Introdução ao estudo da transformada de Laplace 159
2. Propriedades da transformada de Laplace 163
3. Transformada Inversa de Laplace 166
4. Função de Heaviside 168
5. Transformada de Laplace da função delta de Dirac 171
6. Aplicações da transformada de Laplace 174
7. Sistemas de equações diferenciais lineares de primeira ordem com
coeficientes constantes 179
7.1. Método de Álgebra Linear intuition 180
7.2. Interpretação dos exemplos 4.35 e 4.36 183
7.3. Resolução alternativa aplicando transformadas de Laplace 185
8. Sistemas de equações diferenciais lineares de primeira ordem com
coeficientes variáveis 186
9. Exponencial de uma matriz 190
Exercícios de avaliação 199
Prólogo

Nestas notas encontra-se o material que preparei sobre a disciplina de Análise Mate-
mática III para as Licenciaturas de Física e para as Engenharias Biomédica e de Física
no primeiro semestre de 2022 2023.

As notas estão estruturadas em quatro capítulos, cada um dos quais se subdivide em


secções. Cada secção contém uma parte teórica e uma colecção de problemas apresen-
tados em jeito de exemplos.

A exposição reflete a forma como os temas são leccionados no curso de

Séries numéricas e de funções | Equações diferenciais


e transformadas de Laplace.

Ao escrever este texto, gostaria de partilhar o meu entusiasmo pelos assuntos aqui trata-
dos esperando que os alunos sintam alguma emoção ao lê-lo. Embora algum material
teórico seja apresentado sem demonstração, os temas ficam devidamente discutidos
nos exemplos que apresentamos.

Estamos convencidos, como dizia o professor Miguel de Guzmán, que

os teoremas importantes não são mais do que métodos e técnicas con-


sagrados pela sua utilidade, versatilidade e potência, na resolução de
problemas.

Tentei usar uma linguagem simples e pouco prolixa. Acredito que uma palavra a mais
na explicação de um conceito ou resultado tem, frequentemente, igual potencial para
ajudar como para confundir.

O cálculo é uma colecção de ferramentas incrivelmente eficazes para tratar uma ampla
variedade de problemas matemáticos. A sustentar estas ferramentas está uma estrutura
matemática que conforma a Análise Matemática.

Este texto representa uma introdução elementar à Análise Matemática, apresentando


as técnicas de cálculo, abrindo assim uma janela para um estudo de um ponto de vista
mais conceptual.

Esta não é uma introdução ‘light’ do Cálculo!


7
8 PRÓLOGO

Optei por um texto que apresenta as ferramentas do cálculo de uma forma coerente e
auto-contida, numa perspectiva matemática, onde o rigor está presente, e os temas se
encontram devidamente enquadrados na sua história.

Vale a pena ter presente:

If people do not believe that mathematics is simple,


it is only because they do not realize how complicated life is.
John Von Neumann

Este texto não tem qualquer pretensão e a sua utilidade principal será a de facilitar uma
revisão rápida da disciplina, através de exemplos, e que o estudante possa verificar os
seus conhecimentos ao analisar alguns dos problemas resolvidos.
CAPíTULO 1

Sucessões e séries numéricas

1. Conceitos fundamentais

1.1. Princípio de indução. É um método utilizado para demonstrar propriedades


que envolvam números naturais N = 1, 2, 3, . . . . Provar uma propriedade, Pn , para
todo o n 2 N requer, segundo este princípio, analisar se:

(1) P1 se verifica;
(2) Supondo que se tem Pn , então também se verifica Pn+1 .

Duas variantes deste princípio consistem em substituir a primeira propriedade por Pn0 se
verifique para um certo n0 , passando Pn a ser válido para n n0 ; ou supor na segunda
propriedade que P1 , P2 , P3 , . . ., Pn , se verificam (indução completa).
n (n + 1)
Exemplo 1.1. Mostrar que 1 + 2 + 3 + · · · + n = .
2

Designando esta propriedade por Pn , vemos que P1 se tem, pois 1 = 1 (1 + 1) 2. Su-


pondo agora que Pn se verifica, e somando a ambos os membros dessa propriedade
n + 1, obtemos

1 + 2 + 3 + · · · + n + (n + 1) = n(n + 1) 2 + (n + 1)
Ä ä
(n + 1) n/2 + 1 = (n + 1)(n + 2) 2,

que é a propriedade Pn+1 .

1.2. Desigualdades e valor absoluto. As desigualdades entre números reais con-


servam-se sempre que a ambos os membros somarmos os subtrairmos um mesmo nú-
mero real, ou se multiplicarmos ou dividirmos por um mesmo número real positivo,
mas mudam de sentido se multiplicadas por um mesmo número real negativo.
6x 9
Exemplo 1.2. Diga para que valores de x 2 R se tem  1?
x +2

Para fazer desaparecer o denominador, temos de analisar dois casos:

a) Se x + 2 > 0, então 6x 9  x + 2, ou ainda 5x  11, i.e. x  11/5;


b) Se x + 2 < 0, então 6x 9 x + 2, ou ainda 5x 11, i.e. x 11/5
9
10 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Assim,
ó ó
ou temos que x > 2 e x  11/5, i.e. x 2 2, 11/5 ;
ou então x < 2 e x 11/5, o que é obviamente impossível.
p
O valor absoluto de x, é um número que denotamos por |x| = x 2 , que é x se x 0,
e x, se x < 0. Assim, o valor absoluto de x, é o número despido de sinal.

Teorema (Propriedades do valor absoluto).

(1) |x| > 0 para todo o x 6= 0; além disso, |0| = 0.


(2) A relação |x| < " lê-se " < x < ".
1 1
(3) |x y| = |x| | y| e |x | = |x| se x 6= 0.
(4) |x + y|  |x| + | y| e |x y| |x| | y| .

Designamos por vizinhança de a 2 R a qualquer intervalo não vazio que tenha a como
centro. Dizemos assim que, ]a ", a + "[= x 2 R : |x a| < " , é uma vizinhança
de a de raio ".

Exemplo 1.3. Estudar para que valores de x se tem |2x + 5| > 1?

Como anteriormente, vamos distinguir dois casos:

• 2x + 5 0, tendo-se 2x + 5 > 1, i.e. x > 2;


• ou 2x + 5 < 0, tendo-se 2x + 5 < 1, i.e. x < 3.

Então, x 2 ] 1, 3[ [ ] 2, +1[.

1.3. Limites inferiores e superiores. Ínfimos e supremos. Dado um conjunto A


de números reais, dizemos que M é um limite superior de A , se x  M , para todo o
x 2 A . Da mesma forma dizemos que m é um limite inferior de A , se m  x, para
todo o x 2 A .

Se um conjunto admite um limite superior e um limite inferior, diz-se limitado. Se


somente admite um dos limites superior ou inferior, dizemos que está limitado su-
periormente ou inferiormente, respectivamente.

Para um conjunto de números reais limitado superiormente, existe sempre um limite


superior mínimo, que designamos por supremo. Da mesma forma, para um conjunto
de números reais limitado inferiormente, existe sempre um limite inferior máximo, que
designamos por ínfimo.

O ínfimo e o supremo de um conjunto A costuma denotar-se por inf A e sup A , res-


pectivamente. Nem sempre pertencem ao conjunto, mas quando pertencem, por vezes
são designados por mínimo e máximo, e denotados por min A e max A .
1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS 11

1
Exemplo 1.4. Considere-se o conjunto A = ( 1)n n + + n + 1 : n 2 N . Estude
n
se é limitado inferior ou superiormente, e em caso afirmativo, determine o ínfimo ou
o máximo.

Os elementos com n par são da forma


1 1
n+ + n + 1 = 2n + 1 + ;
n n
e os elementos com n ímpar, são da forma
1 1
n+ +n+1=1+ .
n n
Os primeiros podem ser arbitrariamente grandes tomando n grande, pelo que A não é
limitado superiormente. Por outro lado, em qualquer dos casos, vê-se facilmente que os
elementos são maiores do que 1, então A está limitado inferiormente por 1, que é um
seu limite inferior. De facto, é o ínfimo, pois para outro qualquer c > 1, a desigualdade
1
1 + > c não seria válida para n par suficientemente grande.
n
Exercício.

(1) Indique os valores de x 2 R que satisfazem as seguintes desigualdades:


x 1
a) > 0; b) |x + 1| + |x + 3| < 5.
(x + 2)(x 3)
(2) Diga se as seguintes desigualdades são válidas para todo x, y 2 R+ :
p x+y
a) |x y|  |x| | y| com x, y 2 R; b) x y  ;
2
(3) Demonstre por indução que
n(n + 1)(2n + 1)
12 + 22 + 32 + · · · + n2 = , n 2 N.
6
(4) Indique se os seguintes conjuntos estão limitados inferior e superiormente, e
nesse caso determine o ínfimo e o supremo:
a) x 2 R : x 4 < 9 ; b) x 2 R : x 5 < 9 ; c) ( 1)n n 1
: n 2 Z+ .

1. a) Observe-se que ou, o denominador e o numerador são positivos, ou são ambos


negativos. Assim, no primeiro caso, temos
⇤ ⇥
x <1 e (x + 2)(x 3) < 0, i.e. x2 2, 1 .

No segundo caso, temos


⇤ ⇥
x >1 e (x + 2)(x 3) > 0, i.e. x 2 3, +1 .
⇤ ⇥ ⇤ ⇥
Logo, a solução procurada é 2, 1 [ 3, +1 .

1. b) Se x 1, a equação lê-se

(x + 1) + (x + 3) < 5, que é equivalente a x < 1/2.


12 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Se 3  x  1, a equação lê-se

(x + 1) + (x + 3) < 5, que é uma condição universal.

Finalmente, se x  3, então a equação lê-se

(x + 1) (x + 3) < 5, que é equivalente a x > 9/2.

Combinando estes três resultados obtemos que a solução é dada por

⇤ ⇤ ⇥ ⇤ ⇥ ⇥ ⇤ ⇥
9/2, 3 [ 3, 1 [ 1, 1/2 , i.e. 9/2, 1/2 .

2. a) É falsa; tome-se por exemplo, x = 1, y = 2.


p x+y p
2. b) x y  é equivalente a 2 x y  x + y, ou ainda,
2

4x y  x 2 + 2x y + y 2 , i.e. (x y)2 0,

que é uma condição universal.

3. Vê-se facilmente que para n = 1 a identidade se verifica. De facto, 12 = 1 (1 +


1) (2 + 1)/6. Agora, partindo da identidade do enunciado temos de chegar à mesma
trocando n por n+1. Desta forma, comecemos por somar (n+1)2 a ambos os membros.
No primeiro membro fica o que queríamos, e ao manipular o segundo, obtemos

n (n + 1) (2n + 1) n(2n + 1) + 6(n + 1)


+ (n + 1)2 = (n + 1)
6 6
2
2n + 7n + 6
= (n + 1) .
6

Factorizando, 2n2 + 7n + 6 = (n + 2) (2n + 3), obtemos

(n + 1) (n + 1) + 1 (2(n + 1) + 1)
12 + 22 + · · · + (n + 1)2 = .
6
p
4. a) A condição x 4 < 9 é equivalente a x 2 < 3 e portanto, |x| < 3, i.e. temos o
⇤ p p ⇥ p p
intervalo 3, 3 , logo o ínfimo é igual a 3 e o supremo é 3;
p ⇤ p ⇥
4. b) A condição x 5 < 9 é equivalente a x < 9, i.e. temos o intervalo
5 5
1, 9 ,
p5
logo não tem ínfimo e o supremo é 9;
1
4. c) Os elementos negativos do conjunto são da forma 1 se n ímpar, logo o seu
n
ínfimo é o elemento que corresponde a n = 1, i.e. inf = 2. O resto dos elementos são
1
da forma 1 com n par, pelo que o supremo é 1.
n
1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS 13

1.4. Conhecimentos de base. Vamos apresentamos algumas questões de carácter


geral que convém saber antes de começar o curso:

a: Indique o declive da recta de equação 3 y + 4x = 2, bem como os pontos de


intersecção com os eixos coordenados (represente-a graficamente);
b: para que valores de x 2 R se tem 3x + 2 > 0;
c: determine x 2 R tal que 3x 2 2x 1 > 0;
d: resolva em R a equação quadrática 2x 2 + 8x 11 = 0;
e: represente o gráfico da função f (x) = x 2 x 2;
3x 2 + 2x 8
f: Indique o domínio de definição da função g(x) = ;
2x 2 x
g: Determine os pontos de intersecção dos gráficos das funções f (x) = x 2 e
g(x) = 3x 2 (faça a representação gráfica do problema);
h: represente a curva de equação x 2 + y 2 2x 4 y + 1 = 0;
i: determine a distância de (1, 1) ao ponto de intersecção das rectas de equação
y = 2x + 1 e y = 4x 5;
j: determine x 2 R tal que 3x + 2 > 2x 8.
2
k: Simplifique (a b)(a + b) + b ;
3
l: expanda (a + b) ;
m: factorize 2x 2 + 4x 6;
n: resolva, completando quadrados, a equação x 2 5x + 3 = 0;
o: racionalize (i.e. remova as raízes quadradas do denominador)
1
p p ;
x a x b
p: sabendo que uma dívida aumenta para o dobro em cada período de 6 anos,
determine o factor pelo qual ela vem multiplicada ao fim de 3, 12, 18
ou 20 anos;
q: indique a fórmula da distância entre os pontos A = (a, b) e B = (c, d), e
calcule a distância entre os pontos (1, 1) e ( 2, 3);
r: determine as equações vectorial e cartesiana da recta que passa pelos pontos
(1, 1) e (2, 3);
s: Determine as equações vectorial e cartesiana da recta que passa pela origem
e é perpendicular à recta 3 y 2x + 8 = 0;
t: indique a equação da circunferência centrada em (1, 1) e raio 5;
u: mostre que o lugar geométrico dos pontos (x, y) 2 R2 tais que x 2 + y 2 6x
16 y + 9 = 0 é uma circunferência e determine o seu centro e raio;
v: determine a equação da parábola que tem vértice na origem e que passa pelo
ponto (2, 8);
x: determine a intersecção da recta de equação x + y = 1 e a parábola de
equação y = 2x 2 + 4x + 1;
14 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

y: determine x 2 R tal que 8x 2 < 3x + 4;


z: represente no plano cartesiano as regiões definidas pelas condições x + y < 2,
Ä x + |x| ä2
x y  1, y = .
2

2. Noção de sucessão

Descrevemos uma sucessão como

a1 , a2 , a3 , . . . , an , . . .

de forma que para cada n, existe um elemento da sucessão que denotamos por an , e
designamos por termo geral da sucessão.

Formalizemos, então esta noção:

Uma sucessão é uma função cujo domínio é o conjunto N dos


números naturais.

Vamos considerar apenas sucessões de números reais, isto é (i.e.) funções, f , de N em R.

A notação usual para uma sucessão é a1 , a2 , . . . , an , . . . que abreviamos em an n2N


ou mesmo an .

Dada uma sucessão (an )n2N de números reais, definimos uma subsucessão de an como
a restrição da função f a um subconjunto infinito N ⇢ N, i.e.

N = {n1 < n2 < · · · < n j < · · · } subconjunto de N.

Denotamo-la assim por an j N


n j 2N
ou ainda an j j2N
ou, mais simplesmente, por an j .

2.1. Sucessões monótonas e limitadas. Comecemos por apresentar alguns


exemplos de sucessões

1, 2, 3, 4, 5, . . . f : N ! R, com f (n) = n

2, 4, 6, 8, 10, . . . f : N ! R, com f (n) = 2n


1 1 1 1 1 1
, , , , ,... f : N ! R, com f (n) =
2 4 8 16 32 2n
1, 1, 1, 1, 1, . . . f :N!R com f (n) = ( 1)n
1 2 3 4 5 n
, , , , ,... f : N ! R, com f (n) =
2 3 4 5 6 n+1
Descreva em linguagem corrente a sucessão

3, 3.1, 3.14, 3.141, 3.1415, . . ..

Uma sucessão de números reais, x n , diz-se monótona se:

x 1  x 2  · · ·  x n  x n+1  · · · monótona não-decrescente


2. NOÇÃO DE SUCESSÃO 15

x1 x2 ··· xn x n+1 ··· monótona não-crescente

Já quando x n < x n+1 para todo n 2 N, a sucessão diz-se crescente e quando x n > x n+1
para todo n 2 N, a sucessão diz-se decrescente.

Exemplo 1.5. Caracterize quanto à monotonicidade estas sucessões.

A sucessão n é obviamente crescente; de facto,

(n + 1) n = 1 > 0, n 2 N.

Do mesmo modo para a sucessão 2n

2(n + 1) 2n = 2 > 0, n2N pelo que a sucessão é monótona crescente.


1
Já a sucessão 2n é monótona decrescente pois
1 1 1 Ä1 ä 1
= 1 = < 0, n 2 N.
2 n+1 2 n 2 2
n 2 n+1

n
A sucessão ( 1)n é oscilante pelo que não é monótona. Mas a sucessão n+1 é
monótona crescente pois
n+1 n 1 1
= (n + 1)2 n(n + 2) = > 0, n 2 N.
n+2 n+1 (n + 2)(n + 1) (n + 2)(n + 1)
A última sucessão é crescente para ⇡.

Se existir um número real L, tal que

xn  L para todo n 2 N, a sucessão diz-se limitada superiormente.

Se existir um número real `, tal que

xn ` para todo n 2 N, a sucessão diz-se limitada inferiormente.

Uma sucessão diz-se limitada se o for inferior e superiormente. Uma sucessão que não
é limitada diz-se ilimitada.

Exemplo 1.6. Caracterize quanto à limitação estas sucessões.

As duas primeiras sucessões são obviamente ilimitadas. Tal é consequência do princípio


de Arquimedes:

dado um número real positivo ↵, existe n 2 N tal que n > ↵.


1
Já a sucessão 2n é limitada inferiormente por 0 e superiormente por 12 .

A sucessão ( 1)n é limitada inferiormente por 1 e superiormente por 1.


n
Para analisar a sucessão n+1 basta ver que
1 n n+1 1 n+1 1 1
 = = + =1 < 1, n 2 N.
2 n+1 n+1 n+1 n+1 n+1
16 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Já a sucessão que define ⇡ é limitada inferiormente por 3 e superiormente por ⇡.

Exemplo 1.7. Identifique o termo geral da sucessão


2 3 4 5
1, , , , ,...
2 4 8 16
Analise ainda se se trata de uma sucessão monótona ou limitada.

Comecemos por verificar que


( 1)n 1 n
an = , n 2 N.
2n 1
Não é monótona pois é oscilante. No entanto está limitada inferiormente por 1e
superiormente por 1. De facto,
2n
a subsucessão dos termos pares, a2n = , n 2 N;
22n 1
2n 1
a subsucessão dos termos ímpares, a2n 1 = , n 2 N.
22n 2
Agora, a2n é crescente, limitada inferiormente por 1 e superiormente por 0; do
mesmo modo, a2n 1 é decrescente, limitada inferiormente por 0 e superiormente
por 1.

2.2. Progressões como exemplo de sucessões.

Exemplo 1.8 (Progressão aritmética). Um progressão aritmética é uma sucessão


a1 , a2 , . . . , an , . . . onde cada termo, a partir do segundo, é dado por

an+1 = an + r, n 2 N,

onde r designa a razão de progressão. Na progressão aritmética an tem-se

a2 = a1 + r,

a3 = a2 + r = a1 + 2r,

a4 = a3 + r = a1 + 3r, ...

e, mais geralmente,

an+1 = a1 + nr, n 2 N.

A razão de uma progressão aritmética pode ser um número positivo, negativo ou nulo.

No primeiro caso a sucessão é crescente, i.e. m < n implica am < an .

Quando a razão é negativa, a progressão aritmética é uma sucessão decrescente, i.e.


m < n implica an < am .

Já se a razão é nula, a progressão aritmética é constante: a1 , a1 , . . .


2. NOÇÃO DE SUCESSÃO 17

Exemplo 1.9 (Progressão geométrica). Uma progressão geométrica é uma sucessão


x n onde cada termo, a partir do segundo, é o produto do anterior por uma constante,
que designamos por razão de progressão, i.e. x n+1 = r x n , n 2 N.

Considere-se sem perda de generalidade (s.p.g.) a sucessão r n .

Se r = 0 ou r = 1, tem-se evidentemente uma sucessão constante.

Se 0 < r < 1, a sucessão é decrescente e limitada. Com efeito, multiplicando ambos os


membros da desigualdade r < 1 pelo número positivo r n obtemos

r n+1 < r n , n2N

logo a sucessão é decrescente.

Como todos os seus termos são positivos, temos

0 < rn < 1 para todo n 2 N,

e a sucessão é limitada.

Consideremos agora o caso 1 < r < 0. Então a sucessão r n já não é monótona


(os seus termos são alternadamente positivos e negativos), no entanto é limitada pois
|r n | = |r|n , com 0 < |r| < 1.

O caso r = 1 é trivial: a sucessão r n é 1, +1, 1, +1, . . . .

Quando r > 1 obtém-se uma sucessão crescente: basta multiplicar ambos os membros
desta desigualdade pelo número positivo r n obtendo r n+1 > r n .

2.3. Noção de limite de uma sucessão. Um sucessão an tem limite x se

fixando um erro " > 0, existe um índice n0 tal que todos os


termos an da sucessão que têm índice n maior do que n0 são
valores aproximados de x com erro inferior a ".

Simbolicamente dizemos que o número real x é limite da sucessão an de números


reais, e escreve-se

x = lim an ou x = lim an , ou ainda x = lim an ,


n!1 n2N

se 8" > 0, 9n0 2 N : n > n0 =) |an x| < ".

Como conhecimento prévio a qualquer estudo sobre limite de sucessões notemos que
o limite de uma sucessão a existir é único, i.e.

Se lim x n = a e lim x n = b então a = b.


18 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Caso exista o limite de uma sucessão, dizemos que a sucessão converge a ou para, esse
valor limite. Além disso,

Se lim x n = a então toda subsucessão de x n converge para a.

1
Exemplo 1.10. A sucessão n tem limite 0.

Considere " > 0; temos de encontrar m 2 N tal que para todo n 2 N com n m se
tenha | 1n 0| = 1
n < ". Como 1
n  1
m sempre que n m, basta tomar m tal que m > 1
"
qualquer que seja " > 0 (que é o que nos diz o princípio de Arquimedes).

Como resultado geral de convergência de sucessões temos o teorema de Bolzano–Weier-


strass (versão fraca):

Toda a sucessão monótona e limitada é convergente.

n
Vimos já que a sucessão, n+1 é monótona e limitada; donde por este teorema é con-
vergente. Pode ver-se que o seu limite é 1.

No caso da progressão geométrica, mostrámos que a sucessão |r|n era monótona e


limitada se r 2] 1, 1[, logo trata-se de uma sucessão convergente.

Exemplo (número de Neper). Pode demonstrar-se (ainda que não seja demasiado fá-
Ä 1 än
cil) que 1 + é uma sucessão monótona crescente e limitada por 3. O teorema
n
anterior diz-nos que a sucessão dada tem limite. Ao limite desta sucessão designamos
por número de Neper, e = 2, 71828 . . ..
∆ « ∆
p p p
Exemplo 1.11. Justifique que a sucessão 2, 2+ 2, 2+ 2+ 2, . . . é conver-
gente, e determinar o seu limite.

Por indução prova-se que

p
an  2 (a1  2 ; e usando, an+1 = 2 + an , an  2 =) an+1  2).

Vemos também que é monótona crescente, pois

p
an+1 an () 2 + an an () 2 + an an2 () 0 (an + 1)(an 2),

pelo que 0  an  2, e temos a última desigualdade. Agora, o teorema de Bolzano-


Weierstrass diz-nos que existe lim an = `. Da definição de limite temos também que
p p
lim an+1 = `, pelo que tomando limite na identidade 2 + an = an+1 obtemos 2+`=
`; logo ` = 2 (justifique!).
3. TÉCNICAS DE CÁLCULO DE LIMITES 19

2.4. Cálculo de limites. A base teórica do cálculo de limites diz-nos que se an


e bn são sucessões convergentes, então:

lim an ± bn = lim an ± lim bn ,

lim an ⇥ bn = lim an ⇥ lim bn ,


an lim an
lim = ,
bn lim bn
onde para a última identidade necessitamos que lim bn 6= 0 (e bn 6= 0 se queremos que
todos os termos an /bn tenham sentido).

Existe uma espécie de “álgebra do infinito” que é fácil de intuir:

1 ± k = 1, 1 ⇥ k = 1 se k 6= 0 e k/1 = 0.

Aqui, 1, k e 0 significam sucessões que tendem para esses valores. Da última identi-
dade deduzimos também que k/0 = 1 . Mas há outras “operações” com o infinito que
não têm valor definido, dependem por isso de cada caso concreto. Costumam ser de-
signadas por indeterminações; as indeterminações ligadas a operações elementares são:
1 0
+1 1, 0 ⇥ 1, e .
1 0
Existem outras indeterminações ligadas a potências: 11 , 10 , 00 .

O procedimento habitual para calcular limites consiste em fazer manipulações algébri-


cas que eliminem as indeterminações.
p p p
n2 + 3 + n n2 + 3 /n + 1 1 + 3/n2 + 1 1+1 2
lim = lim = lim = = .
3n + 1 3 + 1/n 3 + 1/n 3 3
1
Dividir por n permite remover os infinitos e a indeterminação desaparece.
1
p p
p n2 + 1 n n2 + 1 + n 1
lim n2 + 1 n = lim p = lim p = 0.
n2 + 1 + n n2 + 1 + n
Ao racionalizar, a ausência de raízes elimina a indeterminação 1 1 .

3. Técnicas de cálculo de limites

Comecemos com alguns exemplos que discutiremos de seguida.


Ä1ä
tem limite 0;
2n
a n , com |a| < 1 tem limite 0;
Ä ( 1)n ä
tem limite 0;
n
Ä ln n ä
tem limite 0;
n
20 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

n1/n tem limite 1;

an
e também = 0, lim a 2 R.
n!1 n!

Vejamos como aplicar o teorema das sucessões enquadradas:

Sejam x n  zn  yn , n 2 N. Se lim x n = lim yn = a então


lim zn = a;

1
mostrando que lim = 0. Comecemos por escrever
2n
Å ã
n n n(n 1) n
2 = (1 + 1) = 1 + n + + ··· + + ··· + 1 pelo binómio de Newton
2 k
Agora como
Å ã
n(n 1) n
1+ + ··· + + ··· 0, n 2 N,
2 k
concluímos que
1 1
2n n, n 2 N, i.e.  , n 2 N;
2 n n
logo
1 1
0  , n 2 N,
2 n n
e do teorema das sucessões enquadradas temos o que queríamos demonstrar.

Vejamos agora que lim a n = 0, |a| < 1.

Para tal comece por escrever


1
|a| = , para algum p 2 R+ .
1+p
1
Assim, |a|n = (1+p)n , com
Å ã
n n(n 1) 2 n k
(1 + p) = 1 + np + p + ··· + p + ··· binómio de Newton
2 k
logo (1 + p)n np, n 2 N e, portanto,
1 1
0  |a|n =  , n 2 N.
(1 + p) n np
Aplicando o teorema das sucessões enquadradas temos o que queríamos demonstrar.

Observe-se que na discussão anterior aplicámos implicitamente o seguinte resultado:

A sucessão |an | tem limite 0 se, e somente se, lim an = 0.


( 1)n
Isto diz-nos, por exemplo, que lim = 0.
n
Note-se que o teorema das sucessões enquadradas diz-nos também que:
3. TÉCNICAS DE CÁLCULO DE LIMITES 21

o produto de uma sucessão limitada por uma convergente a 0,


converge a 0.

Como aplicação deste resultado pode provar-se que

sin(n) cos(n) tan(n)


lim = 0, lim =0 ou ainda lim = 0.
n n n
ln n
Mostremos agora que lim = 0. Neste caso vamos começar por enunciar a definição
n
de limite segundo Heine (equivalente à de Cauchy):

Sejam f : X ! R e a um ponto de acumulação de X . Para que


lim f (x) = L é necessário e suficiente que, para toda a sucessão
x!a
(x n ) ⇢ X \ {a} com lim x n = a, se tenha lim f (x n ) = L.
n!1

Considerem-se as funções f (x) = ln(x) e g(x) = x, que são deriváveis em R+ .


Mais ainda,

lim f (x) = +1 e também lim g(x) = +1.


x!+1 x!+1

Aplicando a Regra de L’Hôpital, atendendo a que


1
f 0 (x) = e também g 0 (x) = 1,
x
f (x) ln x
concluímos que o limite quando x ! +1 de g(x) = x é 0. Agora, como a sucessão
n é um caso particular de sucessão que diverge para +1 concluímos do Teorema de
f (n) ln(n)
Heine que lim = lim = 0.
n!1 g(n) n!1 n
Como a funções exp é contínua, tem-se também, como corolário do limite anterior que,
Ä ln n ä
exp = exp ln n1/n = n1/n , n 2 N;
n
logo lim n1/n = 1.

Para o último exemplo vamos usar o seguinte teorema válido para sucessões an de
números positivos:
an+1
Seja ` = lim an ; se ` 2 [0, 1[, então lim an = 0. Além disso, se
` > 1 (ainda que +1) tem-se que (an ) diverge para +1.

Observe-se que se ` = 1 o teorema fica inconclusivo.


an
Tome-se então x n = n! . Assim,

x n+1 a n+1 n! |a|


= ⇥ n = ! 0, logo lim x n = 0, a 2 R.
xn (n + 1)! a n+1
22 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Agora, como a sucessão (x n ) converge a 0, concluímos que


an
também tem limite 0.
n!

4. Limites fundamentais

Como primeiro exemplo temos

sin x
lim = 1,
x!0 x

cuja leitura em termos do teorema de Heine é


sin(un )
lim = 1, onde (un ) é uma qualquer sucessão com limite 0.
n!1 un
Como casos particulares temos

lim n sin(n 1 ) = 1, lim n2 sin(n 2 ) = 1, ou ainda lim e n sin(e n ) = 1.


n!1 n!1 n!1

Note-se que a sucessão un é dada, respectivamente, por

un = n 1 , un = n 2 , ou ainda un = e n , n 2 N.

Da definição de número de Neper


Ä 1 än
lim 1 + = e,
n!1 n
podemos, em particular, concluir que
Ä 1 än
lim 1 = e 1.
n!1 n
De facto,
Ä 1 än Ä n 1 än Ä 1 än Ä 1 äm+1
1 = = = com m=n 1,
n n 1 + 1/(n 1) 1 + 1/m
pelo que
Ä 1 än Ä 1 äm Ä 1 ä
lim 1 = lim = e 1.
n!1 n m!1 1 + 1/m 1 + 1/m
Assim, tem-se o resultado geral,
Ä a än
lim 1 + = ea , a 2 R.
n

Note-se que poderíamos ter provado ainda que


Ä a äu n 1/"n
lim 1 + = lim 1 + a"n = ea , a 2 R,
un
onde un ⇢ R é uma qualquer sucessão divergente para 1 e "n ⇢ R \ {0} é uma
qualquer sucessão convergente para 0.

Terminamos esta secção com o seguinte teorema:


4. LIMITES FUNDAMENTAIS 23

Considere uma sucessão an de números positivos. Seja L =


p
lim n an ; se L 2 [0, 1[, então lim an = 0. Além disso, se L > 1
(ainda que +1) tem-se que (an ) diverge para +1.

Observe-se que se L = 1 o teorema fica inconclusivo.


Ä 1 ä n2
Como aplicação mostremos que lim 1 = 0. De facto, tomando
n
Ä 1 än2 p Ä 1 än 1
an = 1 , então n
an = 1 , cujo limite é e 2 [0, 1[.
n n
Por aplicação directa do teorema anterior temos o que queríamos demonstrar.

Exemplo 1.12. Diga, justificando convenientemente, se são verdadeiras ou falsas as


seguintes afirmações:

a) Uma sucessão é convergente se e só se for monótona e limitada.


b) Se x n e yn são duas sucessões divergentes então a sucessão x n yn tam-
bém é divergente.

a) Falsa. A sucessão ( 1)n /n é convergente para 0 mas não é monótona.

b) Falsa. A sucessão ( 1)n é divergente, mas ( 1)n ( 1)n é convergente.

Exercício (de revisão).

(1) Estude se as sucessões seguintes são convergentes, e em caso afirmativo cal-


cule o seu limite:
3n4 2 6n p
a) an = 4 ; b) b n = ; c) c n = n n2 + 1 n2 .
n + 2n2 + 2 p 5 n + ( 6)n

(2) Considere-se a sucessão an+1 = 2 an com a1 = 1.


(a) Mostre por indução que an < 2.
(b) Justifique que an é monótona crescente e determine o seu limite.
(3) Seja t 2 ]1, 4] e considere-se a sucessão definida por recorrência,
1Ä t ä
x1 = 2 e x n+1 = xn + , n 2 N.
2 xn
p
(a) Mostre que esta sucessão está limitada inferiormente por t e supe-
riormente por 2. (Tenha em atenção que (a + b)2 4ab, a, b 0.)
(b) Justifique que an é monótona decrescente.
p
(c) Deduzir que lim x n = t.
(4) Analisar se a seguinte sucessão é monótona, limitada e convergente:
p
a1 = 1, an+1 = 1 + an , n 2 N.

4 3 2/n4
1. a) Dividindo por n , temos an = que obviamente converge para 3.
1 + 2/n2 + 2/n4
24 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

1
1. b) Dividindo por 6n , temos an = Note-se que (5/6)n ! 0, pelo que
(5/6)n + ( 1)n
lim a2n = 1 enquanto que lim a2n+1 = 1, portanto não existe lim an e a sucessão não
converge.

1. c) Colocando em evidência n, multiplicando e dividindo pelo conjugado e, final-


mente, dividindo por n, temos
p n2 + 1 n2 1
an = n n2 + 1 1 =np =p ,
n2 + 1 + n 1 + 1/n2 + 1
1
que obviamente converge, tendo-se lim an = .
2
2. a) A desigualdade an < 2 verifica-se para n = 1. Suponhamos que se verifica para
p p
um n, então an+1 = 2an < 2 ⇥ 2 = 2, que é a desigualdade para n + 1 .

2. b) Consideramos as implicaciones
p
an  an+1 () an  2 an () an2  2 an

e a última desigualdade é verdadeira porque 0 < an < 2 (coloque an em evidência e


justifique que pode cancelar termos). Pelo teorema de Bolzano-Weierstrass a sucessão
p
é convergente. Denotemos ` = lim an . Tomando limites na recorrência an+1 = 2 an
p
obtemos ` = 2 ` pelo que ` = 0 ou ` = 2. A primeira é obviamente impossível, já que
a1 = 1 e a sucessão é crescente.
2
3. a) Da desigualdade indicada no enunciado com a = x n , b = t/x n temos que x n+1 t
p
pelo que t é um limite inferior para a sucessão. Por outro lado, o limite superior 2
obtém-se aplicando indução: primeiro, x n  2 é verdadeira para n = 1 e supondo-a
verdadeira para algum n, deduz-se também para n + 1, pois
1Ä t ä 1Ä t ä1 p
x n+1 = xn +  xn + p 2 + t  2.
2 xn 2 t 2
3. b) Têm-se ainda as seguintes implicações
1Ä t ä t
x n+1  x n () xn +  x n ()  x n () t  x n2 ,
2 xn xn
e esta última desigualdade é verdadeira como provamos anteriormente.

3.c) O teorema de Bolzano-Weierstrass diz-nos que existe o limite. Designemo-lo por


` = lim x n , então ` = lim x n+1 e tomando limites na fórmula que define a sucessão
Ä tä
deduz-se que ` = ` + /2. Resolvendo esta equação em ordem a ` concluímos que
p p `
` = t ou ` = t. A segunda possibilidade não se tem pois x n > 0.
p ∆ p
4. Atribuindo valores a n obtemos a sucessão: 1, 2 = 1.41 . . . , 1 + 2 = 1.55 . . .;
então se é monótona deve ser crescente. Para o verificar basta seguir as implicações
p p
an+1 an () 1 + an an () 1 + an an2 0 () an  1 + 5 /2.
5. SÉRIES DE NÚMEROS REAIS 25

Na demonstração das equivalências usamos que an 0 e que x 2 + x + 1 = 0 tem


x = (1 ± 5)/2 como soluções. Então é monótona crescente se, e somente se, está
p
limitada superiormente por 1 + 5. Provemos este facto por indução: Vê-se facilmente
p p
que a1 = 1  (1 + 5)/2, e supondo an  (1 + 5)/2 deduzimos
v p v p v p p
t
p 1 + 5 t 6 + 2 5 t (1 + 5)2 1+ 5
an+1 = 1 + an  1 + = = = .
2 4 4 2
p
Assim, an é monótona crescente, está limitada superiormente por (1 + 5)/2 e inferi-
ormente por a1 = 1. O teorema de Bolzano-Weierstrass diz-nos que a sucessão dada
p
converge. Designamos ` = lim an , então ao
p tomarmos limites em an+1 = 1 + an ob-
p 1+ 5
temos ` = 1 + `, que nos leva a ` = .
2

5. Séries de números reais

5.1. Noção de série numérica. Comecemos com algumas questões básicas sobre
séries numéricas.
Uma série numérica é uma soma infinita de números reais.
• Como deve ser entendida?
• É diferente de uma soma finita?

Uma soma finita de números reais como, por exemplo,

2 p X
n
2
1+4 +⇡+ + 0, 8 + 13, ak = a1 + a2 + · · · + an ,
e k=1

tem sempre significado e representa um número real. Conhecendo os somandos

a1 , a2 , . . . , an ,

o valor da soma finita pode ser calculada, usando as regras básicas da álgebra dos
números reais. Já uma soma infinita ou série:
X
1
an = a1 + a2 + a3 + · · · + am + · · · ,
n=1

formada a partir de uma sucessão de números reais

a1 , a2 , . . . , am , . . .

é, apenas uma expressão formal, que pode ter ou não significado. O seu significado
depende directamente da sucessão an .

Apresentamos aqui dois exemplos de séries, i.e. somas formais infinitas:


X
1
1 1 1 1 1
= + + + + ··· ,
n=1
n2 +1 2 5 10 17
26 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

X
1
1 1 1 1 1
= + + + + ··· .
n=1
3n + 1 4 7 10 13
Veremos que à primeira podemos atribuir como valor um número real e à segunda não.
Temos então que saber analisar se uma dada série tem significado (digamos, se é con-
vergente ou divergente) e só depois concluir se lhe podemos atribuir um valor real
(i.e., calcular a sua soma).

5.2. Sucessão e série associada. O nosso objectivo aqui vai ser o de distinguir
X
1
a série an da sucessão an .
n=1

Assim, devemos distinguir entre


1 1 1 1
1+ + + + + ··· soma infinita,
4 9 16 25
1 1 1 1
1, , , , , ... sucessão associada;
4 9 16 25
esta última é uma lista ordenada e infinita de números reais.

Vemos assim que estamos em presença de dois objectos bem diferentes.

Os números an são designados por termos da série (que formam a sucessão termo
geral da série). Aqui n (percorre {1, 2, 3, . . .}) é designado por índice.

5.3. Sobre a natureza das séries. Vamos apelar, em jeito de SOS, aos nossos
conhecimentos sobre sucessões, para as quais temos os conceitos de convergência e
divergência.

Primeiro, formamos a sucessão somas parciais da série:


X
n
sn = a1 + a2 + · · · + an = ak , n 2 N.
k=1

Essas somas são finitas e, portanto, aplicamos-lhes as leis da Álgebra. Construímos,


desta forma, uma nova sucessão (sn ) sendo

s1 = a1 , s2 = a1 + a2 , s3 = a1 + a2 + a3 , s4 = a1 + a2 + a3 + a4 , ...

À medida que n aumenta, adicionamos mais e mais termos à soma, aproximando-nos,


no limite, daquilo que podemos designar por soma infinita.

Faz então sentido perguntar, se a nova sucessão sn tem limite (finito ou não).
X
1
Diremos que a série an converge (ou é somável)
n=1

X
1 X
n
se ak = lim sn = lim ak .
n!1 n!1
k=1 k=1
5. SÉRIES DE NÚMEROS REAIS 27

Se lim sn não existe ou diverge para 1 (note que 1 não representa um


n!1
X
1
número real), diremos que a série an é divergente.
n=1
No entanto, se lim sn = +1 ou lim sn = 1, diremos que a soma da série é +1
n!1 n!1
ou 1.

5.4. Questões acessórias. Comecemos por ver que

a letra que representa o índice numa série infinita não interfere na


natureza da série!

Do mesmo modo que no integral definido, a variável de integração não tem qualquer
importância, aqui é irrelevante se o índice de soma é denotado por n, m, k ou j, desde
que a notação seja consistente e não exista perigo de confusão. Desta forma, tem sen-
tido escrever:
X
1 X
1 X
1
a1 + a2 + a3 + · · · = an = ak = aj,
n=1 k=1 j=1

1 1 1 1 X
1
1 X
1
1
1+ + + + + ··· = = .
4 9 16 25 n=1
n2
k=1
k 2

X1
1 1
Mas, é errado escrever a soma anterior como, . Pelo que an = 2
n =1
k 2 k
para todo n 2 N, considerando que n varia, enquanto k é um valor fixo. Ou seja, nesse
caso, a soma é interpretada como
X
1
1 1 1 1
= + + + ··· que é divergente para +1.
n=1
k 2 k 2 k 2 k 2

X
1
Convém ter presente que dada uma constante c 6= 0, a série c = c + c + ···
n=1
é divergente, uma vez que a sucessão das somas parciais é dada por

sN = c + c + · · · + c = N c;

trata-se pois de uma série divergente para +1 se c > 0 ou para 1 se c < 0.

Se an = 0, n 2 N (neste caso c = 0), então é óbvio que as somas parciais são nulas,
sN = 0, pelo que a série é convergente e a sua soma é zero, i.e.

X
1 X
N
0 = lim 0 = lim 0 = 0.
N !1 N !1
n=1 n=1

Vejamos agora que


28 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

é permitido somar a partir de um índice qualquer, não necessaria-


X
1
mente igual a 1, como em an .
n=1

Por vezes podemos considerar somas do tipo


X
1
an = a0 + a1 + a2 + a3 + · · · ,
n=0
X
1
a j = a3 + a4 + a5 + · · · .
j=3

As seguintes séries fazem sentido


X
1
1 1 1 1 1
=1+1+ + + + + ··· ,
n=0
n! 2 6 24 120
X
1
1 1 1 1
= + + + ··· .
n=3
(n 1)(n 2) 2⇥1 3⇥2 4⇥3

Note que, na última série, o termo an não existe se n = 1, 2 (o que não tem qual-
quer importância pois a sucessão termo geral está definida para os índices da série, i.e.
para n 3).

Isto é o que realmente importa:

a sucessão an deve existir para todo n, a partir de um determinado


índice N .

Dada uma série cujo índice não começa em n = 1, podemos ajustar as somas parciais.
X
1
Por exemplo, para série an podemos definir
n=0

X
N
sN = an 1 = a0 + a1 + a2 + · · · + aN 1,
n=1

X
1
enquanto que para an podemos definir
n=3

X
N
sN = an+2 = a3 + a4 + a5 + · · · + aN +2 , N 1.
n=1

5.5. Séries standard. Agora a questão mais importante:

Como concluir se uma série arbitrária converge ou diverge?

Em geral, nada podemos dizer à priori sobre a convergência ou divergência de uma


série se não conhecermos a sucessão termo geral da série.
5. SÉRIES DE NÚMEROS REAIS 29

Para além do exemplo trivial visto acima (soma de uma constante), existem outras sé-
ries cujas somas parciais e respectivos limites podem ser determinados explicitamente.
Vamos aprender a reconhecê-las.

Como exemplos destas séries temos as chamadas


X
1
geométricas an,
n=0
X
1
Mengoli (ou telescópicas) (an an+s ), para algum s 2 N.
n=1

Na maior parte das séries, veremos como aplicar alguns critérios de convergência.

Neste estudo vão ter um papel de destaque as séries de Dirichlet


X
1
1
, para algum p 2 R.
n=0
np

A seguinte questão surge naturalmente:

O que é um critério (ou teste) de convergência?

É um teorema que nos permite concluir se uma série dada converge ou diverge.

Devemos notar que não há um critério universal que sirva para a análise da convergên-
cia ou divergência de todas as séries. Cada critério dá-nos respostas conclusivas apenas
para uma determinada classe de séries (com características comuns).

5.6. Critério geral de convergência de uma série. O critério do termo general


diz-nos que:

X
1
Se a série an é convergente, então lim an = 0.
n!1
n=1

Dito de uma forma menos formal, para que a série seja convergente, o seu termo
geral deve ser pequeno, embora seja impossível especificar, em geral, quão pequeno
deva ser. . .

Se a série converge, então sn converge para S 2 R, quando n ! 1. Desta forma,


tem-se que t n := sn 1 ! S. Portanto,

an = a1 + a2 + · · · + an 1 + an a1 + a2 + · · · + an 1

= sn tn ! S S = 0. (n ! 1)

Logo, lim an = 0 e o resultado fica demonstrado.


n!1
30 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Em que situações se pode aplicar o critério do termo geral?

Este critério é útil para mostrar que uma série é divergente. De facto dá-nos uma
condição ‘forte’ ou suficiente de divergência de uma série dada:

Se an não converge a zero (ou seja, ou diverge, incluindo o caso


infinito, ou tem limite finito mas diferente de zero), então a série
X
an é divergente.

Por exemplo, este enunciado equivalente permite dizer imediatamente que as seguin-
tes séries
X
1
p p p X
1
n=1+ 2+ 3 + ··· , ( 1)n = 1 + 1 1+1 1 + ··· ,
n=1 n=1

são divergentes.
p
De facto, a primeira tem termo geral an = n, que é uma sucessão diverge para +1,
e a segunda, tem termo geral an = ( 1)n , cujo limite não existe.

É muito importante notar que o critério do termo geral é útil apenas para estabelecer
a divergência, ou seja, não permite concluir a convergência de série alguma.
X
Este critério não nos diz que se lim an = 0 então a série an converge.
n!1

Isto é, em geral, falso!

De facto, existem exemplos de séries convergentes e outras divergentes, para as quais


se tem que lim an = 0.
n!1

Por exemplo, é bem sabido que as sucessões termo geral das seguintes séries
X
1
1 1 1 1 1
= 1 + 2 + 2 + ··· + 2 + ··· an = , n2N
n=1
n2 2 3 n n2
X
1
1 1 1 1 1
=1+ + + ··· + + ··· an = , n2N
n=1
n 2 3 n n

convergem para zero; no entanto, veremos que a primeira série é convergente (a sua
⇡2
soma é exactamente 6 , e a segunda é divergente.

Portanto, se a sucessão termo geral de uma série tende a zero, o critério do termo geral,
é inconclusivo quanto à convergência ou divergência da série.

6. Exemplos fundamentais

6.1. Série de Mengoli ou telescópica. Este termo costuma usar-se para designar
uma série cujas somas parciais têm apagamentos vários e que, portanto, são fáceis de
6. EXEMPLOS FUNDAMENTAIS 31

calcular. Por exemplo, a série


X
1 Ä n ä
ln ,
n=1
n+1

é telescópica porque
Ä n ä
ln = ln(n) ln(n + 1),
n+1
logo
X
N Ä n ä X N
ln = (ln(n) ln(n + 1))
n=1
n+1 n=1

= (ln 1 ln 2) + (ln 2 ln 3) + · · · + (ln(N 1) ln(N )) + (ln(N ) ln(N + 1))

= ln 1 ln(N + 1) = ln(N + 1) ! 1, N ! 1.

Agora, como a sucessão soma parcial é divergente para +1 concluímos que a série
X
1 Ä n ä
ln
n=1
n+1

é divergente.

Observe-se que neste exemplo o critério do termo geral não seria útil para concluir a
divergência da série pois,
n Ä n ä
lim = 1, logo lim ln = ln 1 = 0,
n+1 n+1
i.e. o critério do termo geral é inconclusivo.

Esta foi a razão porque recorremos a outro método.

Temos o seguinte critério de convergência das séries de Mengoli:


X
1
A série (an an+p ) é convergente quando, e só quando,
n=1

existe lim an+1 + · · · + an+p .


n!1

Neste caso
X
1
an an+p = a1 + · · · + a p lim an+1 + · · · + an+p .
n!1
n=1

X
1
No caso particular em que existe lim an = a, então a série (an an+p ) é convergente;
n!1
n=1
e tem-se
X
1
(an an+p ) = a1 + · · · + a p pa.
n=1
32 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Vejamos como aplicar este resultado às seguintes séries:


X
1
1 X
1
1
ou, mais geralmente, .
n=1
n(n + 1) n=1
n(n + p)

Comecemos por considerar,


1 1Ä1 1 ä Ä1ä
= e a sucessão converge para 0.
n(n + p) p n n+p n
De facto, usando o método de Hermite, que consiste em multiplicar por x a seguinte
identidade
1 A B 1 Bx 1
= + i.e. = A+ e tomando x ! 0, A= ;
x(x + p) x x+p x+p x+p p
já se multiplicarmos a identidade anterior por x + p, ou seja,
1 A B 1 A(x + p) 1
= + i.e. = +B e tomando x ! p, B= .
x(x + p) x x+p x x p
Assim, a sucessão das somas parciais toma a forma,
X
n
1 XÄ1 n
1 ä 1
sn = = =1 ;
k=1
k(k + 1) k=1 k k+1 n+1
X
1
1
e tomando limite quando n tende para 1 temos que = 1.
n=1
n(n + 1)
Para a segunda série vê-se que a sucessão das somas parciais é dada por
X
n
1
sn =
k=1
k(k + p)

1 X ÄÄ 1 1 ä Ä 1 1 ä Ä ää
n
1 1
= + + ··· +
p k=1 k k + 1 k+1 k+2 k+p 1 k+p+1
1Ä 1 1ä 1Ä 1 1 1 ä
= 1 + + ··· + + + ··· + ;
p 2 p p n+1 n+2 n+p+1
e tomando limite quando n tende para 1 temos que
X
1
1 1Ä 1 1ä
= 1 + + ··· + .
n=1
n(n + p) p 2 p

X
1
6.2. Série geométrica. Uma série an em que o seu termo geral
n=1
an+1
= q, n = 1, 2, 3, . . .
an
para certo número (fixo) q denominado razão da série, diz-se uma série geométrica.

Desta forma uma série geométrica pode escrever-se como


X
1
aq n = a + aq + aq2 + aq3 + · · · ,
n=0
6. EXEMPLOS FUNDAMENTAIS 33

onde a é o primeiro termo da série.

Por exemplo, dada a série


X
1
1 n 1 1 1 1 1
=1 + + + ··· ,
n=0
2 2 4 8 16 32
1
vemos que o quociente de cada termo com o termo anterior é exactamente igual a 2 , i.e.
1 1 1 1
2 4 8 16 8 1
= 1
= 1
= 1
= = .
1 2 4 8
16 2
1
Para n = 0, temos a0 = 1, para n = 1, temos a1 = 2; para n = 2, temos a2 = 14 ; e
assim sucessivamente.
1
Logo, a série é geométrica com primeiro termo a = 1 e razão q = 2.

Vejamos agora

quando é que podemos dizer que uma série geométrica con-


verge e se, neste caso, podemos calcular a sua soma.

Embora não exista um critério universal para todas as séries possíveis, na classe das sé-
ries geométricas existe uma forma simples de determinar a convergência ou divergência
da série. Isto é uma consequência de podermos calcular explicitamente a sucessão soma
parcial da série.
X
1
Teorema 1.1 (séries geométricas). A série aq n converge se, e somente se, |q| < 1,
n=0
X
1
a
i.e., quando e só quando 1 < q < 1. Neste caso, a soma vale aq n = .
n=0
1 q

De facto, dentificando as somas parciais da série por


X
N
sN = aq n = a + aq + aq2 + · · · + aq N , N 2 N,
n=0

vemos que, se q = 1, as somas parciais são sN = (N + 1)a e, portanto, elas divergem,


excepto quando a = 0, que é desinteressante.

Já se q 6= 1, e observando que a multiplicação por (1 q) produz muitos apagamen-


tos; i.e.,

(1 q) sN = (1 q) a + aq + aq2 + · · · + aq N

= a + aq + aq2 + · · · + aq N aq + aq2 + · · · + aq N + aq N +1

=a aq N +1 ,

1 q N +1
e dividindo por 1 q, concluímos que sN = a .
1 q
34 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Agora, a sucessão q N +1 diverge se |q| > 1 e, também se q = 1; já se |q| < 1,


N +1
então lim q = 0. Donde se conclui que as somas parciais, sN , da série geométrica
convergem se, e somente se, |q| < 1 e que neste caso o seu limite é
q N +1 a 1
lim sN = lim a = .
N !1 N !1 1 q 1 q

Um exemplo concreto. Para a série geométrica mencionada acima:


X
1 Ä
1 än 1 1 1
=1 + + ··· ,
n=0
2 2 4 8
1 1 1
temos q = 2. Agora como | 2| = 2 < 1, a série converge e a sua soma é
X
1 Ä
1 än 1 1 2
= 1
= 3
= .
n=0
2 1 2 2
3

6.3. Séries de Dirichlet. Vejamos mais uma família ‘fundamental’ de séries, de-
signadas por
X
1
1
série de Dirichlet de parâmetro p 2 R, .
n=1
n p

X
1
1
A série é dita série harmónica, pelo que a designação p-harmónica é também
n=1
n
X
1
1
usado para designar a série de Dirichlet .
n=1
np
Usando o critério do integral podemos demonstrar o seguinte teorema (série de Diri-
chlet):
X
1
1
A série p-harmónica converge se, e somente se, p > 1.
n=1
np

Portanto, as séries como


X
1
1 X
1
1 X
1
1
, ,
n=1
n2 n=1
n⇡ n=1
n1,0001

são convergentes enquanto as séries


X
1
1 X
1
1 X
1 X
1
1
, = n2 , ,
n=1
n n=1
n 2
n=1 n=1
n0,9999

são divergentes.

A utilidade dessas séries é enorme, como veremos na aplicação do critério de compa-


ração de Gauss.

Enunciemos agora o critério do integral:


7. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA 35

X
1
Seja an uma série de termos positivos e decrescentes,
n=1
i.e. a1 > a2 > · · · > an > · · · > 0. Se a função real de variável
real, f , definida em [1, +1[ é monótona decrescente e
X
+1 ˆ +1
f (n) = an , n 2 N, então, an e f (x) d x são da
n=1 1
mesma natureza.

Note-se que, se p 6= 1

1 x1 p
ˆ
d x = + c, c2R
xp 1 p
1
e se p = 1, d x = ln x + c, c 2 R. Donde se conclui que o integral
´
x

+1
1
ˆ
d x, é convergente () p > 1.
1 xp
X 1
Aplicando o critério do integral concluímos de imediato que a série é conver-
np
gente se, e somente se, p > 1.

Analisemos o critério do integral. Em cada intervalo [k, k + 1[, k 2 N, como f é decres-


cente, é aí integrável e tem-se

ak = f (k) f (t) f (k + 1) = ak+1 ,

então
ˆ k+1 ˆ k+1 ˆ k+1
ak = f (k) d t f (t) d t f (k + 1) d t = ak+1 , k 2 N.
k k k

Agora, somando com k = 1, . . . , n 1 temos

X
n 1 ˆ n X
n
ak f (t) d t a1 + ak .
k=1 1 k=1

Tomando limite quando n tende para +1 obtemos


X
1 ˆ 1 X
1
an f (t) d t a1 + an .
n=1 1 n=1

7. Critérios de convergência

7.1. Operações admissíveis sobre séries. A álgebra das séries convergentes se-
gue os mesmos princípios das sucessões convergentes, i.e. podemos multiplicar séries
convergentes por uma constante e adicionar duas séries convergentes. Assim, dada
X
uma uma série convergente, an , podemos multiplicá-la por uma constante c 2 R,
36 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

X
formando uma nova série, can . Esta série é convergente e a sua soma segue a
seguinte regra
X X
can = c an .

Isto pode ser verificado comparando as somas parciais da série em ambos os membros
da igualdade e aplicando as regras usuais de limites:

lim ca1 + · · · + can = c lim a1 + · · · + an .


n!1 n!1
X
Da mesma forma, supondo c 6= 0 e que a série an é divergente então também é
X
divergente a série can , e vice-versa.
X X
Sejam agora duas séries convergentes, an e bn , então a sua soma define-se
X
como a série an + bn . Esta série também é convergente e podemos calcular a
soma de acordo com a fórmula
X X X
an + bn = an + bn .

Podemos então perguntar-nos:


X
O que acontece se adicionarmos uma série convergente, an , a
X
uma divergente, bn ?
X
Naturalmente a soma é também formalmente definida como an + bn , no entanto
trata-se de uma série divergente. Isto pode verificar-se considerando as somas parciais.

No entanto, se tivermos duas séries divergentes (especialmente se os seus termos mu-


darem de sinal) é possível obter tanto uma série convergente como uma divergente.
X X
Por exemplo, se an divergir, sabemos que também será divergente an .
No entanto, sua soma será
X X
an + ( an ) = 0 = 0.

Portanto, em geral, não podemos efectuar operações com séries divergentes.

7.2. Critério de comparação de Gauss. O enunciado do teorema de compara-


ção é o seguinte:

Suponhamos que as sucessões são tais que 0  an  bn para


todo n 2 N (ou para todo n N para um certo N fixo).
P P
• Se bn converge, então an converge.
7. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA 37

P P
• Se an diverge, então bn diverge.

As conclusões do teorema são naturais; para tal basta comparar as somas parciais:

a1 + a2 + · · · + an  b1 + b2 + · · · + bn ,

e recordar que as sucessões somas parciais são crescentes em qualquer dos casos, pelo
que serão convergentes se, e somente se, forem limitadas (cf. teorema de Bolzano-
-Weierstrass).

Este teste é útil quando podemos comparar a sucessão termo geral da série dada com
o termo geral de outra série, cuja convergência ou divergência já conhecemos.
X 1
Exemplo 1.13. Sabendo que a série geométrica converge, podemos deduzir
X 1 2n
que a série también converge.
2n + n
1 1
De facto, é óbvio que 2n  2n + n e portanto 0 < 2n +n  2n , e do teorema anterior
concluímos o que queríamos provar.
X1
Exemplo 1.14. Recordando que a série harmónica diverge, e tendo em
n
atenção que
1 ln n
0<  , n 3 pois n 3>e implica que ln n > ln e = 1
n n
X ln n
e aplicando o teorema anterior, concluímos que a série é divergente.
n

7.3. Critério de comparação de Gauss ‘no limite’. Comecemos por analisar a


aplicabilidade do teorema de comparação de Gauss .
X 1
Exemplo 1.15. Analisemos a natureza da série .
2n n

Pode ver-se, por indução, que

2n n > 0, n 2 N,
1
pelo que a fracção está bem definida. Se pretendermos compará-la, como anterior-
2n n
P 1
mente, com a série geométrica, 2n encontramo-nos com o seguinte problema:
1 1
2n n < 2n , pelo que < n , n 2 N;
2 n 2 n
logo não conseguimos aplicar nenhuma das versões do teorema de comparação.

Como resolver este problema?

Quando a comparação falha por pouco, como no exemplo anterior, costuma aplicar-se
o critério de comparação no limite ou o critério de comparação assimptótico:
38 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Sejam (an ) e (bn ) duas sucessões de números positivos


(pelo menos, para n > N ) assimptoticamente comparáveis, i.e.
an
lim = ` 2 R+ . Então, as séries
b
X n X
an e bn convergem ou divergem conjuntamente.

A hipótese do teorema diz-nos que


an an
lim =` i.e. 8 " > 0, 9 n0 2 N : ` < ", sempre que n n0 .
n!1 bn bn
Assim, (` ")bn < an < (` + ")bn . Caso ` 6= 0, 1, escolhendo um " > 0 tal que
` ± " > 0 temos que existe n0 tal que (` ")bn < an < (` + ")bn , n n0 . Agora do
X
1 X
1
critério de comparação de Gauss tiramos que an e bn têm a mesma natureza.
n=1 n=1
Vejamos agora o que se pode dizer se ` = 0: temos para algum " > 0, an < " bn ,
n n0 ; logo

se ` = 0, então:
X X
a convergência de bn implica a convergência de an .

Vejamos agora o se pode dizer se ` = +1, então temos que para algum M > 0,
an > M bn , n n0 ; logo

se ` = +1, então:
X X
a divergência de bn implica a divergência de an .

1 1
Exemplo 1.16. As sucessões 2n e 2n n são assimptoticamente comparáveis.

De facto,
1
2n 2n n n n
lim 1
= lim = lim 1 =1 (a sucessão converge a 0)
2n n
2n 2n 2n
Logo as séries
X 1 X 1
e ,
2n 2n n
1
são da mesma natureza e como a primeira é geométrica de razão 2 é convergente, logo
a segunda também é convergente.
X 1 X 1
Exemplo 1.17. As séries p e p são da mesma natureza.
1+ n n
1p p1
De facto as sucessões 1+ n
e são assimptoticamente equivalentes, i.e.
n
p p
1/(1 + n) n
lim p = lim p = 1.
1/ n 1+ n
7. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA 39

Concluímos assim que a segunda série é divergente pois a primeira é uma série de
Dirichlet de parâmetro p = 12 .

7.4. Critérios de Cauchy–Hadamard e de D’Alembert. São muitos os critérios


de convergência, sendo os mais utilizados os de Cauchy–Hadarmard ou da raiz e o de
D’Alembert ou da razão.

Como se aplicam estes critérios?

Em qualquer dos casos a sucessão termo geral da série é de termos positivos.

Para aplicar o critério da raiz ou de Cauchy–Hadamard, considera-se a existência do


p
limite r = lim n an .
an+1
Já no caso do critério da razão ou de D’Alembert r = lim .
an
X
Em qualquer dos casos, se 0  r < 1 então a série an é
X
convergente; e se r > 1 então a série an é divergente.

Já quando r =1 o teorema é inconclusivo.

Observe-se o que para as séries


X1 X 1
, ,
n n2

o valor de r = 1; no entanto, a primeira é divergente e a segunda convergente. Logo


estes critérios são inconclusivos para estas séries.

Comecemos por analisar primeiro o critério de Cauchy–Hadamard cuja hipótese nos


p
diz que, lim n an = `, i.e.
n!1

p
8 " > 0, 9 n0 2 N : | n an `| < " (= n n0 .

p
Como, | n an `| < " se lê, de forma equivalente, como

p
` "< n
an < ` + " ou ainda (` ")n < an < (` + ")n ,

Agora, considere-se primeiro que ` < 1, então tomando " 2 R+ tal que ` + " < 1 (por
1 `
exemplo, " = ) temos que, para todo o n n0 , an < (` + ")n . Assim, pelo teorema
2 X
de comparação de Gauss concluímos que a série an é convergente.
` 1
Já se ` > 1, então tomando " 2 R+ tal que ` " > 1 (por exemplo, " =
) temos
2
que, para todo o n n0 , an > (` + ")n . Então pelo teorema de comparação de Gauss
X
concluímos que a série an é divergente.
40 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Para demonstrar o critério de D’Alembert começamos por considerar que se tem,


an+1 an+1
lim =` i.e. 8 " 2 R + , 9 n0 2 N : ` "< < ` + " (= n n0 .
n!1 a an
n

1 `
Se ` 2 [0, 1[, então existe " > 0, tal que 0 < ` + " < 1 (por exemplo " = );
2
an+1
e, portanto, < ` + " < 1, n n0 , logo do teorema de comparação de Gauss
an X
concluímos que a série an é convergente.
` 1 an+1
Se ` > 1, existe " > 0, tal que ` " > 1 (por exemplo " = ); e, portanto, > 1,
X2 an
n n0 , logo do teorema anterior concluímos que a série an é divergente.

Quando é que devemos aplicar o critério da raiz e quando é


que devemos aplicar o da razão?

Se a sucessão termo geral da série estiver formada por factoriais, na maior parte dos
casos convém aplicar o critério da razão. Já se a sucessão termo geral da série estiver
formada por potências de índice n convém aplicar o critério da raiz.
X 1
Exemplo 1.18. Vamos ver que a série é convergente (veremos mais à frente
n!
que o seu valor é o número de Neper, e).

1
Aplicando o critério da razão com an = tem-se
n!
an+1 1/(n + 1)! n! n! 1
= = = = ! 0 = r. (n ! 1)
an 1/n! (n + 1)! (n + 1)n! n+1
X nn/2
Já para estudar a convergência ou divergência da série é conveniente aplicar
2n
n/2
n
o critério da raiz a an =
2n
Ä nn/2 ä1/n p
p n
r = lim n
an = lim = lim = +1;
2n 2
logo, a série dada é divergente.

8. Dois critérios gerais

Teorema 1.2 (Critério de Kummer). Sejam an e Dn duas sucessões de números posi-


tivos. Defina-se a sucessão, An , por
an
An = Dn Dn+1 , n 2 N;
an+1
então:
8. DOIS CRITÉRIOS GERAIS 41

a) Se An k > 0, n = 1, 2, . . . (que se tem sempre que exista lim An e seja > 0)


n!1
X
1
então an é convergente;
n=1
X
1
1 X
1
b) Se a série é divergente, e An < 0 então an é divergente.
D
n=1 n n=1

Para a) basta ver que se An k, então

k an+1  Dn an Dn+1 an+1 , n 2 N.

Agora, somando as desigualdade que se obtêm para k = 1, . . . , n (aplicado a proprie-


dade telescópica) temos

k(a1 + · · · + an )  D1 a1 Dn an < D1 a1 , n 2 N.

Pelo que a sucessão das somas parciais, sn ,

sn = a1 + · · · + an , n 2 N,

é crescente (pois trata-se de uma série de termos positivos) limitada superiormente por
X
D1 a1 , i.e. a série an é convergente.

Para b), da desigualdade An  0, concluímos que Dn an  Dn+1 an+1 ; e, portanto,


D1 a1 X
1
1
D1 a1  an Dn , i.e. an , n 2 N, pelo que como a série é divergente,
Dn D
n=1 n
X
an também é divergente.
X
1
Teorema 1.3 (Critério de Raabe). Seja an uma série de termos positivos.
n=1
Ä a ä X
n
• Se lim n 1 = ` > 1 então an é convergente.
n!1 a
Ä an+1 ä X
n
• Se lim n 1 = ` < 1 então an é divergente.
n!1 an+1

Tomemos no critério de Kummer a sucessão de termo geral Dn = n, n = 1, 2, . . .


X
1
1
(isto pode ser feito porque, é divergente).
n=1
n
Agora, a sucessão An do teorema de Kummer escreve-se como
Ä a ä
n
An = n 1 1, n 2 N.
an+1
Assim, a condição An k > 0 (respectivamente, An  0) é equivalente a
Ä a ä Ä a ä
n n
n 1 k>1 (respectivamente, n 1  1),
an+1 an+1
X
1
e pelo critério de Kummer temos que an é uma série convergente (respectivamente,
n=1
é uma série divergente).
42 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Reinterpretação do Teorema de D’Alembert. Tomando Dn ⌘ 1 no teorema de Kum-


X1
an
mer (note-se que 1 é divergente), vemos que An = 1. Assim, a condição
n=1
an+1
an+1 1
An k > 0 (respectivamente, An  0) é equivalente a  < 1, para al-
an k+1
1 an+1
gum k 0, logo 2 [0, 1[ (respectivamente, 1). Desta forma vê-se que o
k+1 an
teorema de D’Alembert é um caso particular do Teorema de Kummer.
X
1
n!
Exemplo 1.19. Estudar a natureza da série , a > 0.
n=1
a(a + 1) · · · (a + n 1)

Como se trata de uma série de termos positivos, pelo critério de D’Alembert, temos
n+1
lim = 1,
n!1 a+n
logo nada podemos concluir quanto à natureza da série dada.
(a 1) n
Analisemos então a condição do critério de Raabe, i.e. lim = a 1. Concluí-
n!1 n + 1
mos assim que para a > 2 a série dada é convergente e se 0 < a < 2 a série é divergente.

9. Discussão sobre a natureza de séries

Não existe uma ordem exacta para aplicar os diferentes critérios estudados, mas sim
algumas ideias práticas. Primeiro, vamos supor que estamos em presença de uma série
de termos positivos (excepto possivelmente para um número finito de termos):

1) Se a sucessão termo geral contém factoriais, é conveniente começar pelo cri-


tério de quociente. Se conseguir provar que 0  r < 1 ou r > 1 o pro-
cesso terminou.
2) Se tal não for o caso, ou se obtivermos r = 1 deve pensar-se noutras estra-
tégias. Neste momento talvez seja conveniente verificar se se trata de uma
soma de um tipo especial de séries: geométrica ou telescópica.
3) Se não for geométrica mas contiver potências de índice n este é o momento
de aplicar o critério da raiz.
4) Se a nossa série não encaixar nos tipos anteriores ou se o critério da raiz der
r = 1, deve verificar se o termo geral tende a zero; se tal não for o caso,
sabemos que a série é divergente.
5) Se o termo geral tiver limite zero, nada podemos concluir. Então é conveni-
ente ver se a sucessão termo geral da série se pode comparar com alguma su-
cessão relativamente simples (como as de potências de n ou variações delas).
Recorde que esta comparação pode realizar-se por meio de desigualdades ou
por passagem ao limite (i.e. de forma assimptótica).
10. CONVERGÊNCIA ABSOLUTA E SIMPLES 43

10. Convergência absoluta e simples

10.1. Série de valores absolutos. Vamos explicar como estudar a natureza de sé-
ries que mudam de sinal (i.e., aquelas que têm infinitos termos positivos e também
infinitos termos negativos).
X
Devemos comparar a série dada, an , com a série que tem como termo geral, os
X
valores absolutos do seus termos, i.e. |an |.

Observe que os termos desta série são todos não-negativos (e, portanto, pode ser estu-
dada aplicando os métodos descritos anteriormente).

Aqui, assume particular importância o seguinte teorema:


X X
Se a série |an | converge, então também converge a série an .

Neste momento, convém observar que o recíproco é, em geral, falso


X X
existem séries an convergentes, em que |an | é divergente.

No entanto, o teorema anterior pode ler-se


X X
Se a série an diverge, então a série |an | diverge.

Portanto, em geral, podem dar-se os seguintes casos:


X X
(↵) A série |an | é convergente (e, portanto, também é convergente an );
X X
( ) A série a é convergente, mas |an | é divergente;
X n X
( ) A série an é divergente (e, portanto, também é divergente |an |).

A seguinte terminologia é standard.


X
No caso (↵), diremos que a série an converge absolutamente.
X
No caso ( ), diremos que a série an converge condicionalmente ou que é simples-
mente convergente (sendo esta última designação a que prevalece na literatura portu-
guesa).
X
Já no caso ( ), diremos que a série an diverge.

Desta forma vemos que existem três tipos de séries. A saber:

absolutamente convergentes, simplesmente convergentes e as


divergentes.

Obviamente, que estas designações só fazem sentido para as séries com um número
infinito de termos positivos e negativos. De facto, para a séries de termos positivos
44 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

(respectivamente, de termos negativos) tem-se sempre que


X X X X
|an | = an respectivamente, |an | = an .

Donde se conclui que estas séries ou são absolutamente convergentes ou divergente.

X
1
Teorema 1.4 (de Riemann). Se a série an é simplesmente convergente, então, dado
n=1
um número real, S, é possível reordenar os termos da série de forma a obter uma nova
série convergente com soma S.

X
1
O teorema de Riemann diz-nos que dada uma série an convergente que não con-
n=1
verge absolutamente, então

X
1
existe uma bijecção : N ! N, tal que a (n) = S.
n=1

Também se pode provar que existe uma reordenação dos termos da série, de modo a
obter uma série divergente.

10.2. Séries alternadas. As séries alternadas como nos seguintes exemplos

1 1 1 1 1 1 1
1 + + ··· , ou + + + ··· ,
2 3 4 2 4 8 16

são séries em que os termos positivos e negativos vão alternando de forma consecutiva.
Diremos, assim que uma série é alternada se

X
1 X
1
n
( 1) cn , ( 1)n 1 cn , onde cn > 0, n 2 N.
n=1 n=1
P
Como ( 1)n+1 = ( 1)n 1 ( 1)2 = ( 1)n 1 , temos que ( 1)n 1 cn coincide
X
com ( 1)n+1 cn .

Vejamos como estudar a natureza de séries alternadas.

Se pudermos concluir que converge absolutamente aplicando algum método conhe-


cido, o estudo fica terminado. Mas se tal não for o caso, a série pode ainda assim ser
convergente aplicando seguinte teorema.

Teorema 1.5 (Critério de Leibniz). Se a sucessão cn é tal que:

(1) cn > 0 para todo n 2 N;


(2) a sucessão cn é decrescente;
(3) lim cn = 0,
10. CONVERGÊNCIA ABSOLUTA E SIMPLES 45

então as séries alternadas


X X
( 1)n cn e ( 1)n 1 cn .

são convergentes

Observação. Aplicando o critério de Leibniz somente se pode deduzir que uma série
converge; não podendo deduzir-se daí se converge absolutamente ou não. Assim, de-
vemos usar este critério para demostrar a convergência simples de uma série numérica
(i.e. depois de termos demonstrado que a série dada não é absolutamente convergente).

Analisemos agora o teorema de Leibniz. Considere-se a sucessão das somas parciais,


X X
sn , associadas à série ( 1)n 1 cn (procede-se de igual forma no caso ( 1)n 1 cn ).
Vê-se facilmente que a sucessão s2n é monótona crescente e a sucessão s2n+1 é mo-
nótona decrescente:

s2n+2 s2n = c2n+1 c2n+2 > 0 e s2n+1 s2n 1 = c2n + c2n+1 < 0,

n 2 N, pois a sucessão cn é monótona decrescente.

Vemos também que a sucessão s2n está limitada superiormente por s1 , pois,

s1 > s2n+1 = s2n + c2n+1 > s2n

e a sucessão s2n+1 está limitada inferiormente por s2 , pois,

s2 < s2n+2 = s2n+1 c2n+2 < s2n+1 .

Assim, s2n e s2n+1 têm limite `1 e `2 , respectivamente, e de s2n+1 = s2n + c2n+1 , n 2 N


concluímos que

`1 = `2 se, e somente se, lim cn = 0.


n!1

X ( 1)n
Exemplo 1.20. Estudar a natureza da série .
n ln n

1
Neste caso cn = . Para n 2 vemos que
n ln n

ln n ln 2 > ln 1 = 0, logo cn > 0, n 2.

A condição (3) também se verifica. Já a condição (2) é consequência de que a função


logaritmo é monótona crescente, logo a sucessão n ln n é monótona crescente; pelo
que a sucessão cn é monótona decrescente.
46 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Agora pelo critério de Leibniz, a série dada é simplesmente convergente (pois não con-
verge absolutamente). De facto, aplicando critério do integral com a função de com-
1
paração f (x) = , e como
x ln x
(ln x)0
ˆ ˆ
f (x) d x = d x = ln(ln x) + c, x 2 [2, +1[,
ln x
temos que,
X 1
ˆ +1
a série e o integral impróprio f (x) d x,
n ln n 2

são da mesma natureza. Agora, como


ˆ +1
f (x) d x = lim ln(ln ↵) ln(ln 2) = +1,
2 ↵!+1
X ( 1)n
concluímos que a série dada, , não é absolutamente convergente.
n ln n

11. Questões miscelâneas


X cos(3 + n!)
Exemplo 1.21. Estudar a natureza da série .
n4/3

cos(3+n!) 1 1 4
Vê-se facilmente que n4/3
 n4/3
, e como a série n4/3
é de Dirichlet com p = 3 >1
é convergente, do critério de Gauss concluímos que a série dada é absolutamente con-
vergente.
X ( 1)n
Exemplo 1.22. Estudar a natureza da série .
n

Comece por verificar que o critério geral de convergência é inconclusivo. De facto


( 1)n X1
lim = 0. Por outro lado a série não é absolutamente convergente, pois é
n n
uma série de Dirichlet com p = 1 logo divergente.
1
No entanto a sucessão n ⇢ R+ está nas condições do critério de Leibniz, i.e. trata-se
de uma sucessão de termos positivos, decrescente e convergente para 0, logo a série
X ( 1)n
é simplesmente convergente.
n
X ( 1)n n
Exemplo 1.23. Estudar a natureza da série .
9n + 3

Neste caso a condição necessária de convergência permite-nos concluir que a série é


( 1)n n
divergente. De facto, não existe limite da sucessão termo geral da série 9n+3 .

Exemplo 1.24. Estudar a natureza das séries, e caso seja convergente determine a
sua soma
X
+1 X
+1
n 3 X
+1
2 X
+1
2n+1 X
+1
( 1)n ln n, , , , ⇡n/2 e n .
n=1 n=1
5n + 8 n=1
n(n + 2) n=1
3n 1 n=1
11. QUESTÕES MISCELÂNEAS 47

Comece por ver que nos dois primeiros casos


n 3 1
não existe lim( 1)n ln n e que lim = ,
5n + 8 5
logo pelo critério geral de convergência (i.e. condição necessária de convergência) as
X X n 3
séries ( 1)n ln n e são divergentes.
5n + 8
Já terceira trata-se de uma série absolutamente convergente. De facto podemos aplicar
o critério de comparação de Gauss da seguinte forma:
2 2
 2, n 2 N,
n(n + 2) n
X 1
e como a série é de Dirichlet com p = 2 é convergente, concluímos que a série
X n2
2
é convergente.
n(n + 2)
Vejamos que se trata de uma série de Mengoli. De facto,
2 A B
= + , com A=1 e B = 1,
n(n + 2) n n+2
pelo que
2 Ä1 1 ä Ä 1 1 ä
= + .
n(n + 2) n n+1 n+1 n+2
Assim, a sucessão das somas parciais é para todo n 2 N
X
n
2 Xn ¶Ä
1 1 ä Ä 1 1 ä©
sn = = +
k=1
k(k + 2) k=1 k k + 1 k+1 k+2
1 Ä 1 1 ä
=1+ + ,
2 n+1 n+2
X 2 3
e tomando limite quando n tende para +1 obtemos que a série = .
n(n + 2) 2
p
2 ⇡
A quarta e quinta série são geométricas de razão r = 3 er= e , logo convergentes
(pois em qualquer dos casos a razão está em [0, 1[).

Calculemos a sua soma. Formamos a sucessão das somas parciais


X
n Ä ä
2 n 4
sn1 =4 cujo limite é = 12,
k=0
3 1 2/3
p X n Äp ä p p
⇡ ⇡ n ⇡ 1 ⇡
sn2 = cujo limite é p = p .
e k=0 e e 1 ⇡/e e ⇡
X X p

Concluímos assim que 2n+1 3 n+1
= 12 e que n/2
⇡ e = n
p .
e ⇡

+1
5x 1 än
Exemplo 1.25. Para que valores de x 2 R a série converge absoluta-
n=0
2
mente.
48 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Por aplicação directa do critério de Cauchy–Hadamard tem-se que a série é absoluta-


mente convergente
|5x 1|
x 2R tal que < 1, i.e. |5x 1| < 2,
2
1
ou ainda, x 2 R tal que x 5 < 25 . Assim, para x 2] 1 3
5, 5[ a série dada é absolu-
1 3
tamente convergente. Para x = ou x = a série dada é divergente (observe que
5 5
P P n
nestes casos a série transforma-se em ( 1) ou em 1, respectivamente).

Exemplo 1.26. Estudar a natureza das séries,


X
+1
n X
+1
1 X
+1
n+7 X
+1
n X
+1
(n!)2
, p , p , , .
n=1
n +1
3
n=2
n n n=1
n +3 n+1
2
n=2
(ln n)n/4 n=1
2 n2

As três primeiras devem analisar-se por aplicação do teorema de Gauss no limite, pois
n 1 1 1
= 2 é comparável com ,
n3
+1 n 1 + 1/n 3 n2
1 1 1 1
p = é comparável com ,
n n n1 n 1/2 n
n+7 1 1 + 7/n 1
p = é comparável com .
n2 + 3 n + 1 n 1 + 3n 3/2 + 1/n2 n
X1 X 1
Como as séries de Dirichlet e são, respectivamente divergente e conver-
n n2
gente, concluímos que a primeira série é convergente e a segunda e terceira divergente.
Para tal basta observar que, das simplificações apresentadas
n 1 n+7
lim ⇥ n2 = 1, lim p ⇥n=1 e lim p ⇥ n = 1;
n3 +1 n n n2 +3 n+1
e, portanto, as séries
X n X 1 X 1 X n+7 X1
e bem como p , p e ,
n3 + 1 n2 n n n +3 n+1
2 n
são da mesma natureza.

Exemplo 1.27. Indique a natureza nas séries


X
+1
cos(n!) + 2 sin n + e n X
+1
( 1)n
, p .
n=1
n2 + 3n + 2 n=1 n2 1

No primeiro caso a sucessão termo geral da série


n
cos(n!) + 2 sin n + e 4 4
0  , e como lim = 0,
n2 + 3n + 2 n2 + 3n + 2 n2 + 3n + 2
n
cos(n!)+2 sin n+e
e do teorema das sucessões enquadradas temos lim n2 +3n+2 = 0. Logo o critério
geral de convergência é inconclusivo.

No entanto a majoração que apresentamos permite-nos concluir que a série é conver-


gente.
11. QUESTÕES MISCELÂNEAS 49

De facto, usando a majoração indicada anteriormente, do critério de Gauss, concluímos


que as séries
X cos(n!) + 2 sin n + e n X 4
e ,
n2 + 3n + 2 n2 + 3n + 2
são da mesma natureza. Agora como,
4 2 4
lim ⇥ n = lim = 4,
n2 + 3n + 2 1 + 3/n + 2/n2
o critério de Gauss no limite diz-nos que as séries
X 4 X 1
e , são da mesma natureza.
n2 + 3n + 2 n2
X 1
Como a série é de Dirichlet com parâmetro p = 2 > 1, temos que a série dada,
n2
X cos(n!) + 2 sin n + e n
, é convergente.
n2 + 3n + 2
No segundo caso, vê-se facilmente que a sucessão termo geral da série converge a 0.
De facto,
( 1)n 1 ( 1)n
lim p = lim p = 0.
n2 1 n 1 1/n2

Por aplicação do critério de comparação de Gauss no limite, vemos que a série


X ( 1)n
p não é absolutamente convergente. De facto
n2 1
1 1
|an | = p é comparável a bn = ,
n2 1 n
pois
|an | n 1 |an |
= p =p , donde lim = 1.
bn n 1 1/n2 1 1/n2 bn
X X X1
Logo as séries |an | e bn são da mesma natureza. Agora, como é de Dirichlet
X n
1
com parâmetro p = 1 é divergente, concluímos que a série p é divergente.
n 2 1
Vejamos agora, por aplicação do critério de Leibniz, que se trata de uma série conver-
gente. De facto a sucessão |an | é positiva por definição e decrescente com limite 0
(esta última afirmação é trivial). Podemos ver que se trata de uma sucessão decres-
cente, tomando por exemplo a função f (x) = p 1 , definida em [2, +1[ e tal que
x2 1
f (n) = |an |, n 2 N \ {1}.
x
Agora, como f (x) = p < 0, x 2, concluímos que a função f é decrescente;
(x 2 1)3
e portanto |an | é decrescente.
X
Assim, o critério de Leibniz diz-nos que é a série ( 1)n |an | é convergente; trata-se
pois de uma série simplesmente convergente.
50 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Exemplo 1.28. Analisar a natureza das seguintes séries e caso sejam convergentes
calcular o seu valor:
X
1
2 X
1
en 1 X
1 Ä
1 än
, e 1+ .
n=1
3 n 1
n=1
⇡n+3 n=1
n

Relativamente à terceira, basta aplicar a condição necessária de convergência para con-


XÄ 1 än Ä 1 än
cluir que a série 1+ é divergente, pois lim 1 + = e 6= 0.
n n!1 n
Quanto às duas primeiras, começamos por observar que a sucessão dos seus termos
gerais converge para zero (verifique!). Pode ver-se ainda que se tratam de séries geo-
métricas de razão a 2 [0, 1[, pois
X
1
2 X
1
1 X
1 Ä ä
1 n 2
= 2 = 2 = = 3,
n=1
3 n 1
n=0
3 n
n=0
3 1 1/3

e também
X
1
en 1 1 X Ä e än
1
1 1 1 1/⇡3
= 4 = = .
n=1
⇡n+3 ⇡ n=1 ⇡ ⇡4 1 e/⇡ ⇡ e

X
1
2 X
1
en 1
São pois convergentes as séries e .
n=1
3 1
n
n=1
⇡n+3

Exemplo 1.29. Determine a natureza das seguintes séries:


X1 X1 Ä ä X
1 p
2n + 1 2 1 n3 + 1
, sin , .
n=1
n2 (n + 1)2 n=1
n n=1
3n3 + 4n2 + 2

Comece por verificar que as séries são todas de termos positivos. Para a primeira,
começamos por analisar

2n + 1 1 2 + 1/n 2n + 1
= logo lim =0
n2 (n + 1)2 n3 (1 + 1/n)2 n!1 n2 (n + 1)2

P 1
com ordem de convergência 1/n3 . Comparando com a série n3 que é convergente
por se tratar de uma série de Dirichlet de parâmetro p = 3; temos

(2n + 1)/(n2 (n + 1)2 ) 2n + 1 n3 n4 2 + 1/n


lim = lim = lim = 2 6= 0, 1;
n!1 1/n3 n!1 n2 (n + 1)2 1 n!1 n4 (1 + 1/n)2

X
2n + 1 X 1
e, portanto, as séries e são da mesma natureza.
n2 (n + 1)2 n3
Para a segunda série começamos por observar que a sucessão termo geral da série, i.e.
Ä Ä ää
sin2 1n , converge para zero. Mais ainda, como

sin x sin2 un Ä sin u ä2


n
lim =1 pela definição de Heine lim = lim = 1,
x!0 x n!0 un2 n!0 un
11. QUESTÕES MISCELÂNEAS 51

onde (un ) é uma qualquer sucessão de números reais tal que lim un = 0. Em particular,
n!1
tomando un = 1/n tem-se
Ä sin(1/n) ä2 sin2 (1/n)
lim = lim = 1;
n!1 1/n n!1 1/n2

e do teorema de Gauss concluímos que as séries


X Ä1ä X 1
sin2 e são da mesma natureza,
n n2
X 1
e como a série e convergente (justifique!) concluímos que a série dada é con-
n2
vergente.

Para a terceira série comecemos por analisar a sucessão termo geral da série, i.e.
p p p p
n3 + 1 n3 1 + 1/n3 1 1 + 1/n3
= =
3n3 + 4n2 + 2 n3 3 + 4/n + 2/n3 n3/2 3 + 4/n + 2/n3

logo
p
n3 + 1
lim = 0,
n!1 3n3 + 4n2 + 2

e da condição necessária de convergência nada se pode concluir.


X 1
Justifique (exercício!) agora que pode usar a série de comparação para con-
n3/2
X p n3 + 1
cluir sobre a convergência da série .
3n3 + 4n2 + 2
X
1 Ä
n + 1 än2
Exemplo 1.30. Estudar a natureza da série .
n=1
n+3

Estudemos a existência de limite da sucessão termo geral da série, i.e.


Ä n + 1 ä n2 Än+3 2 än2 Ä 2 ä 2
n+3 n /(n+3)
an := = = 1 ,
n+3 n+3 n+3

logo lim an = 0, e da condição necessária de convergência nada podemos concluir.


n!1

Agora, como se trata de uma série de termos positivos, aplicando o critério de Cauchy-
-Hadamard, temos
v
t
n n+1 n2 2 n+3 2 3
lim = lim 1 1 = e 2.
n!1 n+3 n!1 n+3 n+3
2
Como e 2 [0, 1[, concluímos que a série dada é convergente.

X
1
8n n! X
1
2n
Exemplo 1.31. Determine a natureza das séries e .
n=1
nn n=1
n!
52 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Tratam-se de séries de termos positivos an = 8n n!/nn e bn = 2n /n!. Por outro lado não
é ‘imediata’ a determinação dos limites lim an e lim bn ; aplicando o critério da razão
n!1 n!1
ou de D’Alembert, i.e.
an+1 8n+1 (n + 1)! nn Ä n än 1 8
lim = lim = 8 lim = 8 lim = > 1;
an (n + 1)(n + 1) 8 n!
n n n+1 (1 + 1/n) n e
n
bn+1 2 ⇥ 2 n! 2
lim = lim = lim = 0 2 [0, 1[;
bn (n + 1)n! 2n n+1
X 8n n! X 2n
concluímos que é divergente e que é convergente.
nn n!
Exemplo 1.32. Determine a natureza das seguintes séries e, caso sejam convergentes,
calcule a sua soma:
X
1 Ä
( 1)n+1 ( e)n ä X
1 Ä
1 ä ˆ 1X
1
e x+n
n
+ n+1 ; + ( 1) ; dx.
n=1
3n+2 3 n=1
(2 + n)n 0 n=1
3n

A primeira série é uma soma algébrica de séries geométricas de razão, r 2 ] 1, 1[, pelo
X ( 1)n+1 X Ä 1 än+2
que a série é absolutamente convergente. De facto, = tem
3n+2 3
X1
( e)n 1 X Ä e än
1
razão 3 e = tem razão 3e . A e a sua soma é igual a 36(e+3)
3 11e
.
n=1
3 n+1 3 3
A segunda série é divergente pois trata-se da soma algébrica de uma série absoluta-
X
1
mente convergente (justificar) com uma divergente, ( 1)n .
n=1
Para a terceira vemos facilmente que
e 1 x X ⇣ e ⌘n
ˆ 1X 1 1 ˆ 1
e x+n e e 1
ˆ
x
dx = e dx = e dx = .
0 n=1 3
n 3 0 n=0
3 3 e 0 3 e

Exemplo 1.33. Classifique, justificando devidamente, em absolutamente convergen-


tes, simplesmente convergentes ou divergentes, as seguintes séries:
3 Ä 7 ä2 Ä 11 ä3 Ä 15 ä4 Ä 19 ä5 X
1 Ä
1 Ä 2 än ä X
1
( 1)n
a) + + + + + ··· ; b) ; c) .
2 3 4 5 6 n=1
n 3 n=2
ln n

Ä 4n
1 än
(a) A sucessão termo geral da série é dada por an = , n 2 N.
n+1
Aplicando directamente o critério de Cauchy–Hadamard concluímos que a série é di-
4n 1 4 1/n
vergente. De facto, lim(an )1/n = lim = lim = 4 > 1.
n+1 1 + 1/n
X
(b) A série 1/n é divergente por ser de Dirichlet com parâmetro 1; além disso, a
X n
série 2/3 é geométrica de razão 2/3 2 [0, 1[, logo é convergente. Assim, a série
dada é divergente.
X
(c) Como ln n < n, concluímos que 1/ln n > 1/n, n = 2, 3, . . . e como a série 1/n
é divergente, obtemos que a série é absolutamente divergente. Mas como a sucessão
11. QUESTÕES MISCELÂNEAS 53

1/ln n é decrescente para 0, do teorema de Leibniz tem-se que a série é convergente,


i.e. diz-se simplesmente convergente.

Exemplo 1.34. Determine a natureza das seguintes séries numéricas e, caso sejam
convergentes, calcule a sua soma:
X
1 Ä
1 1 ä X
1
( 1)n+1 7n 102 103 104
a) p p ; b) ; c) 10 + + + + ···
n=1
n n+2 n=0
e2n 2! 3! 4!
X p
a) Trata-se de uma série de Mengoli, do tipo an
an+2 , com an = 1/ n. Agora,
p
como lim an = 0, concluímos que a série dada converge para a1 + a2 = 1 + 1/ 2.

b) As séries
X ( 1)n+1 X 1 n
X 7 n
= e
e2n e2 e2
1 7
são geométricas de razão e 2] 1, 1[, logo são absolutamente convergentes para
e2 e2
e2 e2
e . Logo uma qualquer combinação linear delas é ainda absolutamente
1 + e2 e2 7
convergente.

c) Pode ver-se, aplicando o critério de D’Alembert, que a série é absolutamente conver-


X
1
xn
x
gente. Além disso, como e = , x 2 R, temos que a soma procurada é e10 1.
n=0
n!
Exemplo 1.35. Analisar se as seguintes séries são convergentes (os somatórios são
tomados com n 1): p
X n2 + 1 X2 n X n2 + n 6 X p p 2
n
a) ; b) ; c) ( 1) ; d) n+1 n .
n 2n nn n4 + 1
Em cada caso designamos por an a la expressão que aparece dentro do somatório.

a) Como lim an /(n 2 n ) = 1 temos, pelo critério de comparação no limite que basta
X
analisar a natureza da série bn com bn = n 2 n que é convergente (aplique-se, por
exemplo, o critério do quociente: lim bn+1 /bn = 1/2 < 1).
p p
b) Converge pelo critério da raiz já que lim n an = lim 21/ n /n = 0 < 1.

c) Vejamos que a série de termo geral |an | converge (é absolutamente convergente),


pelo que a inicial também converge. Por comparação |an | e 1/n2 têm a mesma natureza,
e esta última série é convergente (justifique).

d) Transformando o termo geral da série, multiplicando e dividindo pelo conjugado,


2
p p 2 n+1 n 1
an = n+1 n = p p 2.
p 2
= p
n+1+
n+1+ n n
X
Agora, pode ver-se que lim an /(1/n) = 1, pelo que a série an tem a mesma natureza
X
que a série 1/n, que não converge.
54 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Exemplo 1.36. Analisar para que valores do parâmetro a ↵ as seguintes séries são
convergentes:
X e↵ n X p p X Å2n + 1ã↵
a) ; b) n2 ↵ +2 n↵ ; c) .
n2 + 1 n+1

5. a) Se ↵ > 0 então lim an = 1 e a série não é convergente. Se ↵ = 0, an =


(n2 + 1) 1
que podemos comparar com 1/n2 ou aplicar o critério do integral, pelo que
é convergente. Finalmente, para ↵ < 0, an  (n2 + 1) 1
e é também convergente (por
comparação).

b) Multiplicando e dividindo pelo conjugado obtemos que lim an /n ↵ = 1. Assim, a


X
série tem a mesma natureza que n↵ que é convergente, somente quando ↵ > 1.

c) Aplicando o critério do quociente temos


Å ã Å ã
an+1 (2n + 3)!/ (n + 2)! (n + 1) ↵ (2n + 3) (2n + 2) ↵
lim = lim = lim = 4↵ .
an (2n + 1)!/ (n + 1)! n! (n + 2) (n + 1)
Então a série é convergente se ↵ < 0 e é divergente se ↵ > 0. Além disso, é divergente
caso ↵ = 0, pois nesse caso lim an = 1 (em contradição com a condição necessária de
convergência).

Exemplo 1.37. Para que valores do parâmetro r > 0 a seguinte série é convergente:
X
1
( 1)n r n
n.
n=1 n n + 1/n

X
1
n
Reescrevamos a série na forma ( 1)n an com an = r n ⇥ 1 + 1/n ⇥ (1/n); temos
n=1
p 1 1/n
lim n
an = lim r ⇥ 1 + 1/n ⇥n = r,

pois

lim n1/n = lim e(log n)/n = e0 = 1.


X
Do critério da raiz concluímos que a série an é convergente se 0 < r < 1, pelo que
X
n
( 1) an é absolutamente convergente se 0 < r < 1. Se r > 1, vê-se facilmente que
lim an = 1 (note-se que 1 + 1/n ! e), logo a série inicial é divergente. Finalmente,
se r = 1, por aplicação do critério de Leibniz, concluímos que a série converge (pois,
lim an = 0 e a sucessão an é decrescente).

Note-se que a última afirmação exige o conhecimento de que a sucessão que define o
número e, i.e. (1 + 1/n)n é monótona crescente.
p p
n X
1
n+2
Exemplo 1.38. Considere-se an = e an . Para que valores de ↵ se
n↵ n=2
pode dizer que a sucessão e a série associada convergem?
12. EXERCÍCIOS DE AVALIAÇÃO 55

Vamos reescrever a sucessão an na forma:


p p p p
n+2 n 2 n+2+ n 2 4
an = p p = p p .
n↵ n + 2 + n 2 n↵ n+2+ n 2

O denominador tende a 1 se ↵ > 1/2, tende a zero se ↵ < 1/2 e tende a 2 se


↵ = 1/2.

Portanto a sucessão converge se e só se ↵ 1/2; em qualquer outro caso lim an = 1.


X X
Tendo em atenção que lim n↵+1/2 an = 2, deduzimos que as séries an e n ↵ 1/2
têm a mesma natureza. A segunda série converge se, e somente se, ↵ + 1/2 > 1 (por
exemplo, aplicando o critério do integral), i.e., para ↵ > 1/2.

12. Exercícios de avaliação

Exercício (Frequência, 28/03/12). Calcula o limite das seguintes sucessões:

ln(n2 + 1) sin(n2 + 1) X
n
a) un = ; b) vn = ; c) w n = e k.
1 + ln(3n3 + 2) en k=1

a) Aplicando o teorema de L’Hôpital obtemos

lim ln(x 2 + 1)/(1 + ln(3 x 3 + 2)) = 2/3.


x!+1

Agora pelo teorema de Heine concluímos que lim un = 2/3.


n!1

b) Trata-se de uma sucessão produto de uma sucessão limitada, (sin(n2 + 1)), por uma
infinitesimal, (e n ), logo lim vn = 0.
n!1
1
e e (n+1) 1
c) Pode ver-se que w n = , pelo que lim w n = .
1 e 1 n!1 e 1
Exercício (Exame, 26/06/2019). Classifique, justificando devidamente, em absoluta-
mente convergentes, simplesmente convergentes ou divergentes, as seguintes séries:
X
1
1 X
1 Ä 1 ä X
1
n2 + 1
a) ; b) cos 2 ; c) ( 1)n .
n=1
n +1
3
n=2
n +1 n=3
n!

a) A série dada é convergente por aplicação directa do critério de comparação de Gauss.


De facto, a sucessão termo geral da série, 1/(n3 + 1) , é de termos positivos e majorada
Ä ä
por 1/n3 que é de Dirichlet de parâmetro p = 3, logo convergente.

b) A série é divergente por aplicação da condição necessária de convergência pois


lim cos(1/(n2 + 1)) = 1 6= 0. c) Trata-se de uma série absolutamente convergente. De
facto, aplicando o critério de D’Alembert à sucessão termo geral da série dos módulos,
(n + 1)2 + 1 n! (n + 1)2 + 1 1
i.e. lim = lim = 0 < 1.
(n + 1)n! n2 + 1 n2 + 1 n + 1
56 1. SUCESSÕES E SÉRIES NUMÉRICAS

Exercício (Exame, 17/07/2019). Classifique, justificando devidamente, em absoluta-


mente convergentes, simplesmente convergentes ou divergentes, as seguintes séries:
X
1
2n/2 X
1 Ä 1 ä X
+1
( 3)n (n + 2)
a) ; b) sin 2 ; c) .
n=1
3 + 2n n=10
n +1 n=1
n!

Exercício (Exame, 26/06/2019). Determine a natureza das seguintes séries numéricas


e, caso sejam convergentes, calcule a sua soma:
X
1 Ä Ä1ä Ä 1 ää X
1
( 1)n 4n+1 X
+1
3n + ( 2)n 1
a) sin sin ; b) ; c) .
n=1
n n+1 n=0
32n+1 n=1
4n+1
X
a) Trata-se de uma série de Mengoli, do tipo an an+1 , com an = sin 1/n . Agora,
como lim an = 0, concluímos que a série dada converge para a1 = sin(1).
X 1X n 4X n
b) As séries ( 1)n /32n+1 = 1/32 e 4/32 são geométricas de razão
3 3
1/32 e 4/32 2] 1, 1[, logo são absolutamente convergentes para 3/10 e 36/15. Logo
uma qualquer combinação linear delas é ainda absolutamente convergente.

c) Segue os mesmos passos da anterior alínea.


CAPíTULO 2

Sucessões e séries de funções

As séries que agora nos vamos ocupar têm como termos funções reais de variável real.
O estudo que vamos fazer será de certa forma pouco usual, pois começaremos com as
séries de potências e deixaremos para o final o caso das séries de funções em geral, i.e.
X
f n . Tem, no entanto, a virtude de começarmos pelo caso mais fácil das séries de
funções, i.e. o caso em que f n (x) = an x n , n 2 N.

1. Séries de potências

Vamos agora considerar um tipo especial de séries conhecida como séries de potências.
Os conhecimentos adquiridos sobre séries numéricas permitir-nos-ão avançar sobre este
novo objecto de estudo.

Seja an uma sucessão de números reais. Para cada x 2 R podemos considerar a série
X
+1
an x n .
n=0

Diremos que estamos em presença de uma série de potências gerada por an , ou mais
geralmente, uma série de potências.

Observe-se que podemos olhar esta série como um ‘polinómio de grau infinito’, e para
cada x considerá-la como uma série numérica.
X
Dada uma série de potências an x n , podemos ver que ela converge para alguns va-
lores de x, como série numérica (por exemplo ela converge se x = 0).

Numa primeira fase, o nosso objectivo vai ser o de determinar conjuntos de pontos onde
uma série de potências dada, é convergente, e também caracterizar esse conjunto.
X
+1
Exemplo 2.1. Considere-se a série geométrica x n. Verifiquemos que ela é
n=0
convergente se x 2] 1, 1[ e que é divergente se x 2 R\] 1, 1[. Mais ainda,
X
+1
1
xn = , x 2] 1, 1[.
n=0
1 x

Esta série de potências é gerada pela sucessão an com an = 1, n 2 N.


57
58 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Relembremos o que estudámos sobre séries geométricas. Considere-se assim,

1 + x + x 2 + x 3 + · · · + x n = Sn (x), (sucessão das somas parciais)

e multipliquemos por x ambos membros desta identidade, i.e.

x + x 2 + · · · + x n + x n+1 = xSn (x)

Subtraindo estas duas identidades, obtemos que


1 x n+1
1 x n+1 = Sn (x) xSn (x) , = Sn (x)
1 x
ou seja
1 x n+1
1 + x + x2 + x3 + · · · + xn = .
1 x
Tendo em atenção que por definição de série

1 + x + x 2 + x 3 + · · · + x n + · · · = lim 1 + x + x2 + x3 + · · · + xn
n!+1

e também que
1 x n+1 1
lim = , se, e somente se, |x| < 1,
n!+1 1 x 1 x
obtemos finalmente que
X
+1
1
xn = , |x| < 1.
n=0
1 x

Em conclusão:

• A série é convergente num intervalo centrado em c = 0 de raio 1.


• Obtivemos a soma da série para cada x neste intervalo.
X
+1
Regressemos à nossa série de potências an x n e definimos a sucessão das somas par-
n=0
ciais, sn (x), n 2 N, da série de potências, como

sn (x) = a0 + a1 x + a2 x 2 + · · · + an x n . (somas parciais)

Diremos ainda que a série dada é convergente se existir lim sn (x), e neste caso, es-
n!+1
crevemos
X
+1
an x n = lim sn (x). (soma da série)
n!+1
n=0

Obviamente que este limite depende de cada x considerado.

De uma forma geral diremos que


X
+1
an (x c)n
n=0
2. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA 59

é uma série de potências centrada em c.

O teorema seguinte está implícito no Cours D’Analyse de Cau-


chy 1821, mas foi explicitamente estabelecido por Abel em
1826. Já a expressão explícita do raio de convergência é de-
vida a Hadamard 1892.

X
+1
Teorema 2.1 (de Cauchy–Abel–Hadamard). Considere-se a série de potências, an x n ;
n=0
então, existe r 2 [0, +1] que designamos por raio de convergência tal que:
X
+1
• A série an x n é absolutamente convergente em |x| < r;
n=0
X
+1
• A série an x n é divergente em |x| > r;
n=0

Caso x = r ou r a série pode ou não ser convergente! O intervalo ] r, r[ será


designado por intervalo de convergência. O domínio de convergência da série, conjunto
dos pontos onde a série é convergente, será por isso um dos intervalos

] r, r[, ] r, r], [ r, r[, [ r, r].

X
+1
Por exemplo, a série geométrica x n é absolutamente convergente em ] 1, 1[ e
n=0
divergente em ±1.
X xn
+1
A série é é absolutamente convergente em ] 1, 1[ e divergente em 1 mas é
n=1
n
simplesmente convergente para x = 1.
X xn
+1
Já a série é absolutamente convergente em [ 1, 1].
n=1
n 2

Observação . De forma análoga, podemos enunciar este teorema para as séries de


potências
X
+1
an (x c)n ,
n=0

pois estas reduzem-se às anteriores fazendo a mudança de variável x 7! x c, e tendo


em atenção que o intervalo de convergência passa a ser |x c| < r.

2. Critérios de convergência

Vamos relembrar alguns critérios que nos ajudam a encontrar o intervalo de conver-
gência de uma série de potências.
60 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Teorema 2.2 (Condição necessária de convergência). Seja (bn ) ⇢ R . Se lim bn , é


n!+1
X
+1
diferente de 0 ou não existe, então bn é divergente.
n=0

X
+1
Exemplo 2.2. A série de potências (nx)n , somente converge em x = 0.
n=0

De facto, lim |nx|n = 1, x 2 R \ {0}, pelo que da condição necessária de convergên-


n!+1
cia sabemos se x 6= 0 a série é divergente. Logo, r = 0, e o único ponto onde a série
converge é x = 0.

Teorema 2.3 (Critério de Cauchy–Hadamard ou da raiz). Seja (bn ) ⇢ R .


∆ X
+1
n
• Se lim |bn | = ` < 1, então bn é absolutamente convergente.
n!+1
n=0
∆ X
+1
n
• Se lim |bn | = ` > 1 ou + 1, então bn é divergente.
n!+1
n=0

X
+1
n+1 n
Exemplo 2.3. Discuta a convergência ou divergência da série 2 (x 1)n .
n=0
n2

n+1 n
Identificamos bn = 2 (x 1)n , e calculamos
n2
v
∆ u Å ã 1n
n t
n n+1 n n+1 n n
lim |bn | = lim 2 (x 1) = lim
n 2 |x 1|
n!+1 n!+1 n 2 n!+1 n2
Å ã1
n+1 n
= 2|x 1| lim .
n!+1 n2
pn
Agora, como lim n = 1 obtemos
n!+1
Å ã 1n Å Å ãã 1n Å ã1
n+1 1 p
n 1 n
lim = lim n 1 + = lim n lim 1 + = 1.
n!+1 n2 n!+1 n n!+1 n!+1 n
Em geral, podemos afirmar que para todo o polinómio p, q, se tem que

∆ Å ã 1n
n p(n)
lim p(n) = 1 e também lim = 1.
n!+1 n!+1 q(n)

Regressemos ao nosso exemplo:


∆ Å ã 1n
n n+1
lim |bn | = 2|x 1| lim = 2|x 1|.
n!+1 n!+1 n2
Aplicamos o critério de Cauchy–Hadamard, obtemos que para os valores de x tais que

x 2R: 2|x 1| < 1, a série dada é absolutamente convergente

x 2R: 2|x 1| > 1, a série dada é divergente


2. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA 61

Concluímos assim que a a série dada é absolutamente convergente para x no intervalo


ó 1 1î ó1 3î î1 3ó
1 ,1 + = , , e é divergente em R \ , .
2 2 2 2 2 2
1 3
Vamos agora discutir a natureza da série nos pontos x = e x = . Por exemplo, em
2 2
x = 12 obtemos a série
X
+1
n + 1 nÄ 1 än X
+1
n+1 1 1
2 = ( 1)n cn com cn = = + 2.
n=0
n2 2 n=0
n 2 n n

Esta série não é absolutamente convergente (justifique que pode aplicar o critério de
Gauss no limite, com a série de comparação de Dirichlet para p = 1).

No entanto, como (cn ) é uma sucessão decrescente com limite 0, o critério de Leibniz
diz-nos que esta série é convergente, logo é simplesmente convergente. Podemos então
1
afirmar que no ponto x = a série é simplesmente convergente.
2
3
Substituindo x = na série, obtemos
2
X n+1
+1 X n+1
+1
n 1 n
2 = .
n=0
n2 2 n=0
n2

Trata-se de uma série de termos positivos, divergente (porquê?).


X
+1
2n2 + 1
Exemplo 2.4. Discuta a convergência ou divergência da série (3x 1)n .
n=0
3n + 1

2n2 + 1
Identificamos bn = n (3x 1)n , e calculamos
3 +1
✓ ◆ 1n ✓ 2 ◆ 1n
∆ 2n2 + 1 2n + 1
n n n
lim |bn | = lim (3x 1) = lim |3x 1|
n!+1 n!+1 3n + 1 n!+1 3n + 1
✓ 2 ◆1
2n + 1 n
= |3x 1| lim .
n!+1 3n + 1
Agora, tendo em atenção que
p Å ã 1n Å ã 1n
n 1 2
p
n 2 1
lim 2n2 + 1 = lim n (2 + 2 ) = lim ( n) 2 + 2 =1
n!+1 n!+1 n n!+1 n
Å Ä äã 1n Å ã 1n
p
n n 1 1
lim 3n + 1 = lim 3 1 + n = lim 3 1 + n = 3.
n!+1 n!+1 3 n!+1 3
obtemos finalmente que
✓ ◆ 1n
2n2 + 1 1
|3x 1| lim = |3x 1|.
n!+1 3n + 1 3
O critério de Cauchy ou da raiz diz-nos que
1
x tais que |3x 1| < 1, a série dada é absolutamente convergente
3
62 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

1
x tais que |3x 1| > 1, a série dada é divergente
3
Assim, o intervalo de convergência absoluta é dado por
1 1 1 1
|3x 1| < 1 , 3(x ) <1 , x < 1.
3 3 3 3
X
+1
2n2 + 1 4
Para completar o estudo da série (3x 1)n , substituímos x por 3 na série,
n=0
3n + 1
X
+1
(2n2 + 1)3n
obtendo . Vê-se facilmente que
n=0
3n + 1

2n2 + 1 n X
+1
(2n2 + 1)3n
lim 3 = +1 pelo que é divergente.
n!+1 3n + 1 3n + 1
n=0

X
+1
2n2 + 1
2
Substituindo agora x = 3 na série (3x 1)n , obtemos finamente que a
n=0
3n + 1
X
+1
2n2 + 1 X 2n2 + 1
+1
n
série ( 3) = 3n ( 1)n é divergente.
n=0
3n + 1 n=0
3 n+1

Teorema 2.4 (Critério de D’Alembert ou da razão). Seja (bn ) ⇢ R.

bn+1 X +1
• Se lim = ` < 1, então bn é absolutamente convergente.
n!+1 bn n=0
bn+1 X
+1
• Se lim = ` > 1, ou + 1, então bn é divergente.
n!+1 bn n=0

X
+1 p
n
Exemplo 2.5. Aplique este critério à série (2x 1)n .
n=0
3n + 2

p
n
Tomando bn = (2x 1)n , n 2 N, calculamos
3n +2
p v
bn+1
n+1
(2x 1)n+1 t n + 1 3n + 2
3n+1 +2
lim = lim p = lim |2x 1|
n!+1 bn n!+1 n
(2x 1)n n!+1 n 3n+1 + 2
3n +2
v
u
t n(1 + 1n ) 2
3n (1 +
3n )
= lim 2
|2x 1|
n!+1 n 3n+1 (1 + 3n+1 )
v
t 1 1 + 3n
2
1
= lim 1+ 2
|2x 1| = |2x 1|.
n!+1 n 3(1 + 3n+1 ) 3

Aplicamos o critério do quociente ou de D’Alembert, obtemos que


1
x tais que |2x 1| < 1, a série dada é absolutamente convergente
3
1
x tais que |2x 1| > 1, a série dada é divergente
3
2. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA 63

Vemos assim que o intervalo de convergência absoluta da série dada é


1 1 1 2 1 1 3
|2x 1| < 1 , 2(x ) <1 , (x ) <1 , x < .
3 3 2 3 2 2 2
Para esta série diremos que existe um intervalo de convergência, centrado no ponto
ó î
c = 12 e de raio 32 , ou seja 12 32 , 12 + 32 , ou seja, ] 1, 2[.

Estudemos agora a natureza da série no ponto x = 2, i.e.


X pn
+1
3n que é divergente (pela condição necessária de convergência)
n=0
3 n+2

Verifique que a série é divergente no ponto x = 1.


X
+1
n! n
Exemplo 2.6. Aplique este critério à série x .
n=0
(2n)!

n! n
Neste caso bn = x , n 2 N. Assim,
(2n)!
bn+1 x n+1 (n + 1)! (2n)! (n + 1)! (2n)!
lim = lim = |x| lim
n!+1 bn n!+1 x n (2n + 2)! n! n!+1 n! (2n + 2)!
n+1
= |x| lim = 0 < 1.
n!+1 (2n + 2)(2n + 1)

Do critério do quociente ou de D’Alembert obtemos que a série é absolutamente con-


vergente em R. Diremos neste caso que o seu raio de convergência é +1 e o intervalo
de convergência é R.
X
+1
xn
Exemplo 2.7. A série de potências , é absolutamente convergente em x 2 R.
n=1
nn

Aplicando o critério de Cauchy


s
n x n |x|
lim = lim = 0 < 1, x 2 R.
n!+1 n n!+1 n

X
+1
( 1)n 2n
Exemplo 2.8. A série de potências x , é absolutamente convergente em R.
n=0
(2n)!

( 1)n 2n
Aplicamos o critério de D’Alembert com bn = x , tem-se
(2n)!
|bn+1 | (2n)! 1
lim = |x|2 lim = |x|2 lim = 0 < 1, x 2 R.
n!+1 |b | n!+1 (2n + 2)! n!+1 (2n + 2)(2n + 1)
n

Neste curso veremos ainda que a série de potências


X
+1
( 1)n 2n 1 2 1 4 1 6
x =1 x + x x + ···
n=0
(2n)! 2 4! 6!

representa a função cos x.


64 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Teorema (do raio de convergência). Usando os critérios de Cauchy e ou de D’Alembert


e, caso existam os limites aí indicados, temos
1 1
r= p ou r= .
lim n
|an | lim |an+1 /an |

Note-se que caso algum dos limites indicados seja +1 (respectivamente, 0) devemos
tomar r = 0 (respectivamente, r = +1).
X
+1
Para deduzir a primeira identidade relativamente à série an x n .
n=0
n
Identificando bn = an x , calculamos

n
∆n

n
lim |bn | = lim |an ||x n | = |x|A com A = lim |an |.
n!+1 n!+1 n!+1

Aplicando o critério de Cauchy ou da raiz, concluímos que


1
para x tal que A|x| < 1 , |x| <
A
a série é absolutamente convergente. Identificando o raio de convergência, r, por
1 1
r= = p .
A lim n |an |

Para provar a segunda identidade usamos o mesmo tipo de argumentos, e aplicamos o


critério do quociente ou de D’Alembert.

3. Resolução de exercícios

X
+1
Exemplo 2.9. Determinar o domínio de convergência da série n(n + 1)x n .
n=1

Para tal basta aplicar o critério de Cauchy ou da raiz com bn = n(n + 1)x n , n 2 N,
tendo-se

n

n

n
lim |bn | = lim |n(n + 1)x n | = lim n(n + 1)|x|n
n!+1 n!+1 n!+1
∆n
= |x| lim n(n + 1) = |x|.
n!+1

Assim, se |x| < 1 esta série é absolutamente convergente e se |x| > 1 esta série é
divergente. Observe-se que a condição |x| < 1 é equivalente a dizer que x 2] 1, 1[,
que é o designado intervalo de convergência absoluta da série. Podemos então dizer
que a série está centrada em 0 e tem raio de convergência 1.

O comportamento da série nos pontos x = 1 e x = 1 vem dado por


X
+1
n(n + 1) = 1(2) + 2(3) + 3(4) + · · · + n(n + 1) + · · · ,
n=1
3. RESOLUÇÃO DE EXERCÍCIOS 65

e respectivamente por
X
+1
n(n + 1)( 1)n = 1(2) + 2(3) 3(4) + · · · + n(n + 1)( 1)n + · · ·
n=1

Estas séries são claramente divergentes, pois o limite do seu termo geral não é 0.

Em conclusão: a série dada é absolutamente convergente em ] 1, 1[ e é divergente


em R\] 1, 1[.

X
+1
(2x)n
Exemplo 2.10. Determinar o domínio de convergência da série .
n=1
(n 1)!

(2x)n
Apliquemos o critério de D’Alembert ou da razão com bn = e x 6= 0:
(n 1)!

bn+1 (2x)n+1 (n 1)! |2x|n+1 (n 1)! 1


lim = lim = lim = |2x| lim = 0.
n!+1 bn n!+1 n! (2x) n n!+1 |2x| n n! n!+1 n

Uma vez que o limite obtido é 0, verifica-se que para qualquer x 6= 0 esta série é
absolutamente convergente. O ponto x = 0 não causa preocupações, uma vez que
(por definição) a série de potências é convergente nesse ponto. Diremos finalmente
que a série converge absolutamente em R. Esta série está centrada em 0 e tem raio de
convergência +1.

X
+1
x n+1
Exemplo 2.11. Determinar o domínio de convergência da série ( 1)n .
n=1
n+1

x n+1
Apliquemos o critério de Cauchy ou da raiz, identificando bn = ( 1)n , n 2 N:
n+1
1 ✓ ◆ 1n
∆ x n+1 n
|x|n+1
( 1)n
n
lim |bn | = lim = lim = |x|.
n!+1 n!+1 n+1 n!+1 n+1

Agora, se |x| < 1 a série é absolutamente convergente; se |x| > 1 a série é divergente.
A condição |x| < 1 é equivalente a x 2] 1, 1[, pelo que ] 1, 1[ é o designado intervalo
de convergência absoluta da série.

Nos pontos x = 1 e x = 1 nada sabemos por aplicação ‘cega’ do critério de Cauchy


(pois neste caso o limite anterior vale 1). Para estudar o comportamento nestes pontos
devemos substituir x = 1 e x = 1:
X 1
+1 Å ã
1 1 1 1
= ( 1) + + ··· + + ··· ,
n=1
n + 1 2 3 4 n+1
X
+1
( 1)n 1 1 1 ( 1)n
= + + ··· + + ···
n=1
n+1 2 3 4 n+1
66 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

A primeira série é divergente, pois (por aplicação do critério de Gauss no limite) é na


X1
+1
mesma natureza da série , que é de Dirichlet com p = 1. Já a segunda série é alter-
n=1
n
Ä ä
1
nada. Pelo critério de Leibniz, uma vez que n+1 converge, decrescendo para 0, pelo
que é simplesmente convergente (justifique que não é absolutamente convergente).

Em conclusão: esta série é absolutamente convergente em ] 1, 1[, simplesmente


convergente em x = 1 e é divergente em R\] 1, 1]. Esta série está centrada em 0 e
tem raio de convergência 1.

X
+1
(2x 3)n
Exemplo 2.12. Determinar o domínio de convergência da série .
n=1
2n + 4

Aplicando o critério de Cauchy ou da raiz, começamos por identificar


(2x 3)n
bn = 2n+4 , n 2 N, pelo que
v p
∆ u n
n t
n (2x 3)n |2x 3|n
lim |bn | = lim = lim p
n!+1 n!+1 2n + 4 n!+1 n
2n + 4
1
= |2x 3| lim p
n
= |2x 3|.
n!+1 2n + 4
Se |2x 3| < 1 podemos afirmar que esta série é absolutamente convergente; já se
|2x 3| > 1 esta série é divergente. Como a condição |2x 3| < 1 é equivalente
3 3 1
a 2(x 2) < 1 ou ainda x 2 < 2, concluímos que o intervalo de convergência
ó î
absoluta é dado por x 2 32 1 3
2, 2 + 1
2 =]1, 2[. Diremos então, que esta série está
3
centrada em 2 com raio de convergência 12 .

Para estudar o comportamento da série nos pontos fronteiros do intervalo de conver-


gência, devemos substituir x = 1 e x = 2 na série dada, e estudar, aplicando outros
critérios, a convergência ou divergência da série numérica resultante. No ponto x = 2
obtemos a série
X
+1 Å ã
1 1 1 1
= + + ··· + + ··· ,
n=1
2n + 4 6 8 2n + 4

que é divergente (justifique!).

Já no ponto x = 1 a série transforma-se em


X
+1
( 1)n 1 1 ( 1)n
= + + ··· + ···
n=1
2n + 4 6 8 2n + 4

que não é absolutamente convergente (porquê). No entanto, aplicando o teorema de


( 1)n
Leibniz (observe que esta é uma série alternada, de termo geral 2n+4 , decrescente
para 0), vemos que a série é simplesmente convergente.
3. RESOLUÇÃO DE EXERCÍCIOS 67

X
+1
n2 n
Exemplo 2.13. Determinar o domínio de convergência da série x .
n=1
n!

n2
Consideramos x 6= 0, identificamos bn = n! x n , n 2 N, e calculamos

(n+1)2
bn+1 (n+1)! x n+1 n! (n + 1)2 |x|n+1
lim = lim = lim
n!+1 bn n!+1 n2
xn n!+1 (n + 1)! n2 |x|n
n!

(n + 1)
= |x| lim = 0.
n!+1 n2
Uma vez que o limite obtido é 0, verifica-se que para qualquer x 6= 0 esta série converge
absolutamente. Diremos finalmente que a série converge absolutamente em R e que o
raio de convergência da série é +1.

X
+1
n!(x 2)n
Exemplo 2.14. Determinar o domínio de convergência da série .
n=2
n 1

n!(x 2)n
Apliquemos uma vez mais o critério de D’Alembert. Identificamos bn = ,
n 1
n 2 N com x 6= 2 e calculamos
bn+1 (n + 1)!(x 2)n+1 n 1
lim = lim
n!+1 bn n!+1 n n!(x 2)n
(n + 1)! (n 1)
= |x 2| lim
n!+1 n! n
(n + 1)(n 1)
= |x 2| lim = +1
n!+1 n
Uma vez que o limite obtido é +1, temos que o raio de convergência da série é zero.

X
+1
ln n
Exemplo 2.15. Determinar o domínio de convergência da série (x + 2)n .
n=1
n

ln n
Consideramos x 6= 2. Identificamos bn = n (x + 2)n e calculamos

bn+1 ln(n + 1) n ln(n + 1) n + 1


lim = |x + 2| lim = |x + 2| lim .
n!+1 bn n!+1 n + 1 ln n n!+1 ln n n + 2

Para analisar este limite, considere-se a função real de variável real f (x) = ln x, defi-
nida para x > 0, e calculamos
ln(x + 1)
lim .
x!+1 ln x
+1
Uma vez que temos uma indeterminação do tipo +1 , aplicamos a regra de Cauchy

ln(x + 1) (ln(x + 1))0


lim = lim ,
x!+1 ln x x!+1 (ln x)0
68 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

se este último limite existir. Calculamos


1
(ln(x + 1))0 x+1 x
lim = lim 1
= lim =1
x!+1 (ln x)0 x!+1
x
x!+1 x +1
pelo que
ln(n + 1)
lim = 1.
n!+1 ln n
Vemos então que
bn+1 ln(n + 1) n + 1
lim = |x + 2| lim = |x + 2|.
n!+1 bn n!+1 ln n n + 2
Assim, se |x + 2| < 1 a série dada é absolutamente convergente. A série está centrada
em x = 2 e tem raio de convergência 1. O intervalo de convergência absoluta é
] 2 1, 2 + 1[=] 3, 1[. Estudemos agora a convergência da série de potências no
ponto x = 1:
X
+1
ln n X ln n
+1
ln 2 ln n
n
( 1 + 2) = =0+ + ··· + + ···
n=1
n n=1
n 2 n

Observe-se que o termo geral desta série verifica a desigualdade


1 ln n
< , n = 3, 4, . . .
n n
pelo que se usamos o critério de comparação para séries de termos positivos, concluímos
que a série
X
+1
ln n
é divergente.
n=1
n

Já no ponto x = 3, a série dada lê-se


X
+1
ln n ln 2 ln 3 ( 1)n ln n
( 1)n = 0 + ··· + + ···
n=1
n 2 3 n

Da análise efectuada anteriormente, sabemos que a série não converge absolutamente.


ln n
Como a sucessão n , n = 3, 4, . . . é decrescente e converge para 0, o critério de Leibniz
diz-nos que se trata de uma série simplesmente convergente.

A série converge absolutamente no intervalo ] 3, 1[. O domínio de convergência da


série é o intervalo [ 3, 1[.
X
+1
3n
Exemplo 2.16. Determinar o domínio de convergência da série x n.
n=0
2 + n3

Identificamos bn = n(n + 1)x n , e analisamos


v
∆ u
n tn 3n 1
lim |bn | = lim x n = 3|x| lim p = 3|x|.
n!+1 n!+1 2 + n3 n!+1 n n(n + 1)
4. OPERAÇÕES COM SÉRIES DE POTÊNCIAS 69

Se 3|x| < 1 a série dada é absolutamente convergente; se 3|x| > 1 esta série é diver-
ó î
gente. A condição 3|x| < 1 é equivalente à |x| < 13 , pelo que 1 1
3 3 , é o designado
,
intervalo de convergência. Esta série está centrada em 0 e tem raio de convergência 13 .

Substituindo x = 13 , respectivamente por x = 1


3, na série obtemos
X
+1
3n 1 n X 1
+1
1 1 1
( ) = = + + ··· + + ···
n=0
2+n 3
3
n=0
2+n 3 2 2+1 3 2 + n3
X
+1
3n 1 n X ( 1)n
+1
1 1 1
( ) = = + ··· + + ···
n=0
2+n 3 3 n=0
2+n 3 2 2+1 3 2 + n3

Tratam-se de séries absolutamente convergentes, já que pelo critério de Gauss no limite


as séries
X
+1
1 X
+1
1
e são da mesma natureza.
n=1
2 + n3 n=1
n3

Como a segunda é de Dirichlet com parâmetro p = 3, é convergente, concluímos que o


î ó
1 1
domínio de convergência absoluta da série dada é 3 3 .
,

4. Operações com séries de potências

Nesta secção devemos ter presente que:

As operações algébricas que realizamos com polinómios per-


manecem válidas para séries de potências, quando considera-
das no intervalo de convergência.

Continuando a explorar as propriedades das séries de potências e tendo em atenção que


o teorema de Cauchy–Abel–Hadamard nos dá um intervalo de convergência absoluta,
podemos manipular séries de potências como fazíamos com polinómios. . .

O próximos resultados, consideramos séries de potências centradas em 0. Para obter os


resultados análogos para séries centradas num ponto c, deve substituir-se x por x c.

Teorema 2.5 (operações algébricas). Para todo o x 2] r, r[ e r = min{r1 , r2 }, onde


X
+1 X
+1
r1 , r2 são os raios de convergência das séries an x n e bn x n , respectivamente, temos:
n=0 n=0

X
+1 X
+1 X
+1
n n
• an x ± bn x = (an ± bn )x n ,
n=0 n=0 n=0

X
+1 X
+1 X
+1
n n
• ( an x )( bn x ) = (a0 bn + a1 bn 1 + · · · + an b0 )x n , ou seja
n=0 n=0 n=0

(a0 + a1 x + a2 x 2 + · · · )(b0 + b1 x + b2 x 2 + · · · )
70 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

= a0 b0 + (a1 b0 + a0 b1 )x + (a0 b2 + a1 b1 + a2 b0 ) + · · ·

X
+1
• Se a série de potências an x n verifica que a0 6= 0, então existe (cn ) ⇢ R tal que
n=0

1 X
+1 X
+1 X
+1
n n
= cn x , i.e. an x cn x n = 1,
X
+1
n=0 n=0 n=0
an x n
n=0

ou a0 c0 = 1, a0 c1 + a1 c0 = 0, ..., a0 cn + · · · + an c0 = 0, ...

X
Dada série de potências, an x n = a0 + a1 x + a2 x 2 + · · · + an x n + · · · , definimos:

X
+1
nan x n 1
= a1 + 2a2 x + · · · + nan x n 1
+ ··· série derivada
n=1
X
+1
an n+1 a1 2 an n+1
x = a0 x + x + ··· + x + ··· série primitiva
n=0
n+1 2 n+1

Observe-se que as séries derivada (respectivamente, primitiva) resultam da derivação


(respectivamente, integração) termo a termo, da série inicial.

Teorema 2.6 (séries derivada e primitiva). Os raios de convergência das séries derivada
e primitiva coincidem com o da série de potências dada, já o domínio de convergência tem
de ser estudado caso a caso.
X
+1 X
+1
n
Teorema 2.7 (de unicidade). Se as séries de potências an x e bn x n coincidem
n=0 n=0
para todo o x 2] r, r[, e r > 0, então an = bn , n = 0, 1, . . ..

X
+1
Teorema 2.8 (de regularidade). Seja f (x) = an x n , definida no intervalo de conver-
n=0
gência da série de potências. Então, f é contínua e f (0) = a0 . Mais ainda, f é C1 ( f
admite derivada contínua de qualquer ordem), tendo-se f (n) (0) = n!an , n 2 N.

Nas condições do teorema anterior, tem-se que


X
+1
0
X
+1
f 0 (x) = an x n = nan x n 1

n=0 n=1
X
+1
n!
f (k) (x) = an x n k
n=k
(n k)!
ˆ x X
ˆ x +1 X a
+1
n
F (x) = f (t) d t = an t n d t = x n+1
0 0 n=0 n=0
n+1
4. OPERAÇÕES COM SÉRIES DE POTÊNCIAS 71

A função f é integrável em qualquer subintervalo [a, b] do domínio de convergência


da série, tendo-se que
ˆ b ˆ X
b +1 Xˆ b
+1
n
f (x) d x = an x d x = an x n d x.
a a n=0 n=0 a

Vejamos como aplicar os teoremas anteriores para obter a representação explícita de


novas séries de potências a partir de séries já conhecidas. Começaremos o nosso tra-
balho com a série geométrica.

1 X
+1
Exemplo 2.17. Tendo em atenção que, = x n, |x| < 1, mostre que:
1 x n=0

1 X +1
i) = ( 1)n x 2n , |x| < 1;
1 + x 2 n=0

1 X ( 1)n +1
ii) = x n, |x| < 2;
2+ x n=0
2 n+1

1 X
+1
iii) = nx n 1 , |x| < 1;
(1 x)2 n=1
X
+1
( 1)n+1 n
iv) ln(1 + x) = x , x 2] 1, 1];
n=1
n
X
+1
( 1)n 2n+1
v) arctan x = x , x 2 [ 1, 1].
n=0
2n + 1

i) Efectuando a mudança de variável x 7! x 2 em

1 X
+1
1 X +1
= x n, |x| < 1 obtemos = ( x 2 )n , | x 2| < 1
1 x n=0
1 + x 2 n=0

ou de forma equivalente, tendo em atenção que |x 2 | < 1 ⌘ |x| < 1,

1 X +1
= ( 1)n x 2n , |x| < 1.
1 + x 2 n=0

1 1 1
ii) Tendo em atenção que = , efectuando a mudança de variável
2+ x 2 1 + x/2
x x
x 7! obtemos a representação procurada, no intervalo de convergência <1
2 2
⌘ |x| < 2, i.e.

1 XÄ x än X ( 1)n n
+1 +1
1 1 1
= = = x , |x| < 2.
2+ x 2 1 + x/2 2 n=0 2 n=0
2n+1

iii) Aplicando o teorema anterior (para a série derivada) à série geométrica obtemos
1
directamente a primeira identidade, i.e. a representação em série para a função (1 x)2 .
72 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

iv) Para a representação em série da função logaritmo, podemos determinar a série


integral da função

1 X +1
= ( 1)n x n , |x| < 1,
1+ x n=0

(pois, basta efectuar a mudança de variável x 7! x na representação em série de


1
potências da função 1 x ). Neste caso podemos afirmar que

X
+1
( 1)n+1 n
ln(1 + x) = x + k, |x| < 1,
n=1
n

onde k é uma constante real (a determinar). Fazendo x = 0 nesta identidade concluí-


mos que k = 0.

O domínio de convergência desta série é ] 1, 1], uma vez que em x = 1 a série obtida
X ( 1)n+1
+1
é dada por , que é convergente (usando o critério de Leibniz) e no ponto
n=1
n
X ( 1)n+1 ( 1)n +1
+1 X ( 1)
x = 1 obtemos a série = que é uma série divergente.
n=1
n n=1
n
X
+1
( 1)n+1
Podemos ainda dizer (sem demonstração) que ln 2 = lim ln(1 + x) = .
x!1
n=1
n
v) Para a representação em série da função arco-tangente, podemos determinar a série
1
integral da função 1+x 2 uma vez que

1 X +1
= ( 1)n x 2n , |x| < 1
1 + x 2 n=0

(basta para tal efectuar a mudança de variável x 7! x 2 na representação em série de


1
potências da função 1 x ), e o domínio de convergência desta série integral não sofre
alteração, pelo que

X
+1
( 1)n 2n+1
arctan x = x + k, x 2] 1, 1[,
n=0
2n + 1

onde k é uma constante real (a determinar). Tomando x = 0 obtemos que k = 0.

Agora, em x = ±1 a série obtida é dada por

X
+1
( 1)n
4 , que é simplesmente convergente.
n=0
2n + 1

Logo, o domínio de convergência desta série de potências é [ 1, 1].


⇡ X ( 1)n
+1
Podemos ainda dizer que = arctan(1) = lim arctan x = .
4 x!1
n=0
2n + 1
4. OPERAÇÕES COM SÉRIES DE POTÊNCIAS 73

Exemplo 2.18. Determine uma representação em série de potências, centrada em x =


0, para cada uma das seguintes funções, indicando o intervalo de convergência em cada
1 X
+1
uma de elas. Considere como ponto de partida a identidade = x n , |x| < 1.
1 x n=0

1 2 x +2 1
(a) ; (b) ; (c) ; (d) .
3+ x 1 x2 x +1 x2 x 2

Consideramos
1 1 1
= Ä ä= Ä ä
3+ x 3 1 + 3x 3 1 x
3

x
e usamos a identidade proposta para < 1, obtemos
3
1 X Ä x än 1 X Ä 1 än n
+1 +1
1 x 1
= , < 1, ou = x , |x| < 3.
3+ x 3 n=0 3 3 3+ x 3 n=0 3
Agora, para
2 1 1
= +
1 x2 1 x 1+ x
usamos a identidade proposta para |x 2 | < 1 ou de forma equivalente para |x| < 1
obtendo
2 X
+1 X
+1
=2 (x 2 )n = 2x 2n , |x| < 1.
1 x2 n=0 n=0

Para o caso
x +2 1 X
+1
=1+ =1+ ( x)n , |x| < 1
x +1 x +1 n=0

ou ainda
x +2 X
+1
=2+ ( 1)n x n , |x| < 1.
x +1 n=1

Escrevemos agora
1 1 1/3 1/3
= = + ,
x2 x 2 (x + 1)(x 2) x +1 x 2
e procuramos a representação em série de potências para cada uma destas funções,

1X X ( 1)n+1
1 +1 +1
3
= ( x)n = x n, |x| < 1
x +1 3 n=0 n=0
3

1 X Ä x än
1 +1
3 1 1 1 x
= x = , < 1 ou ainda |x| < 2.
x 2 3 ( 2) 1 2 6 n=0 2 2
Finalmente obtemos para |x| < 1:
X +1 ✓ ◆
1 X Ä x än X ( 1)n+1 ( 1) 1
+1 +1
1 ( 1)n+1 n
= x + = + x n.
x2 x 2 n=0
3 6 n=0 2 n=0
3 6 2 n
74 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Exemplo 2.19. Determine uma representação em série de potências, centrada em x =


1, para cada uma das seguintes funções (indicando o intervalo onde tal é válida):
1 1 x2 + 2 1
(a) ; (b) ; (c) ; (d) .
3+ x 2 3x x +1 x2 + 2x

(a) Basta ver que

1 XÄ 1 än
+1
1 1 1 1 x x 1
= = = , < 1 ou |x 1| < 4.
3+ x 4+ x 1 4 1 + x41 4 n=0 4 4

(b) Neste caso reescrevemos


1 1 1
= =
2 3x 2 3(x 1) 3 1 3(x 1)
1 X
+1
1
= = ( 1) ( 3(x 1))n , | 3(x 1)| < 1 ou |x 1| < .
1 + 3(x 1) n=0
3

(c) Partindo de
x2 + 2 3 3 3 1
=x 1+ =x 1+ = (x 1) +
x +1 x +1 2 + (x 1) 2 1 + (x 1)
2

obtemos que

3 XÄ 1 än
+1
x2 + 2 x x 1
= (x 1) + , <1 ou |x 1| < 2.
x +1 2 n=0 2 2

(d) Comecemos por ver que


1 1 1/2 1/2
= = .
x 2 + 2x x(x + 2) x x +2
Agora procuramos a representação em série de potências centrada em x = 1 para cada
um dos termos anteriores:
1X 1X
1 1 +1 +1
2 2 n
= = ( (x 1)) = ( 1)n (x 1)n , |x 1| < 1.
x 1+ x 1 2 n=0 2 n=0

1X
1 1 +1
2 2 1 1 n (x 1)n
= = = ( 1) , |x 1| < 3,
x +2 3+ x 1 6 (1 + x 3 1 ) 6 n=0 3n

1 X Å ( 1)n
+1
( 1)n
ã
pelo que finalmente obtemos 2 = (x 1)n , |x 1| < 1.
x + 2x n=0
2 63n

X
+1
n2 ( x)n
Exemplo 2.20. Considere a série de potências f (x) = .
n=1
3n
(1) Calcule o seu raio de convergência.
X n2
+1
(2) Explicite f (x) e calcule .
n=1
3 n

(3) Analise se domínio de convergência da série coincide com o domínio da fun-


ção f ?
4. OPERAÇÕES COM SÉRIES DE POTÊNCIAS 75

X
+1
Vamos simplificar o problema e determinar a função g tal que g(x) = n2 x n . Sabe-
n=1
mos que

1 X
+1
= x n, |x| < 1
1 x n=0

pelo que podemos derivar ambos membros desta identidade, obtendo

1 X
+1
= nx n 1 , |x| < 1.
(1 x)2 n=1

Multiplicamos agora ambos membros desta identidade por x, i.e.

x X
+1
= nx n , |x| < 1,
(1 x)2 n=1

e voltamos a derivar ambos membros da identidade


1+ x X
+1
= n2 x n 1 , |x| < 1
(1 x)3 n=1

(reparamos que o somatório novamente começa em n = 1, porque neste caso cor-


responde a derivar o termo x que não é uma constante, logo não desaparece).

Voltamos a multiplicar ambos membros por x concluímos que

x + x2 X +1
= n2 x n , |x| < 1.
(1 x)3 n=1
X
+1
n2 ( x)n
No problema proposto devemos encontrar a função f tal que f (x) = , pelo
n=1
3n
x
que efectuando a mudança de variável x 7! 3 vem que

3x(x 3) X n2 ( x)n
x x 2 +1
3 +( 3 ) x x
f (x) = x 3 = = , = < 1.
(1 3 )
(x + 3)3 n=1
3 n 3 3
X
+1
n2 X n2
+1
Para calcular , tenha em atenção que f ( 1) = , pelo que a soma desta
n=1
3n n=1
3n
série é dada por f ( 1) = 32 .
O domínio de existência de f é R \ { 3} que não coincide com o domínio de conver-
gência da série ] 3, 3[.
X
+1
( 1)n x 2n+1
Exemplo 2.21. Sabendo que sin x = para todo x 2 R:
n=0
(2n + 1)!
(1) obtenha uma representação em série de potências para a função f (x) =
x sin(x 3 ) e indique o maior subconjunto de R em que esta representação
é válida; ˆ 1
(2) obtenha uma representação em série numérica do integral x sin(x 3 ) d x.
0
76 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Como nos foi dito no enunciado sin x admite uma representação em série de potências
para todo x 2 R, pelo que efectuando a mudança de variável x 7! x 3 obtemos
X
+1
( 1)n (x 3 )2n+1 X ( 1)n x 6n+3
+1
3
sin x = = , x 2 R,
n=0
(2n + 1)! n=0
(2n + 1)!

que multiplicada por x nos dá


X
+1
( 1)n x 6n+4
3
x sin x = , x 2 R.
n=0
(2n + 1)!
ˆ 1
Se queremos obter uma representação em série numérica do integral x sin(x 3 ) d x,
0
substituímos no integral a função pela sua representação em série de potências e a
seguir podemos trocar a ordem de integração com o somatório (como acontece no
caso das somas finitas) quando o intervalo de integração esteja contido no domínio de
convergência da série de potências considerada,
ˆ 1 ˆ X
1 +1
( 1)n x 6n+4 X +1 ˆ 1
( 1)n x 6n+4
3
x sin(x ) d x = dx = dx
0 0 n=0
(2n + 1)! n=0 0 (2n + 1)!
X
+1
( 1)n
= , x 2 R.
n=0
(2n + 1)!(6n + 5)

Exemplo 2.22 (Determinação da solução de uma equação diferencial). Determinar o


desenvolvimento em série de potências da função exponencial, o seu raio e intervalo
de convergência absoluta.

Consideremos a equação diferencial y 0 = y, com valores iniciais y(0) = 1. Esta equa-


ção diferencial tem como única solução a função exponencial, y = e x . Procuremos
X
+1
agora uma solução y desta equação diferencial na forma y = an x n , com raio de
n=0
convergência r > 0. Do teorema da série derivada, obtemos que
X
+1 X
+1
y = y0 () an x n = nan x n 1 , x 2] r, r[.
n=0 n=1

Tendo em atenção que


X
+1 X
+1
nan x n 1
= (n + 1)an+1 x n ,
n=1 n=0

e usando o teorema de unicidade da representação de uma função em série de potên-


cias, concluímos que
an
an = (n + 1)an+1 ou equivalentemente an+1 = , n = 0, 1, . . . .
n+1
4. OPERAÇÕES COM SÉRIES DE POTÊNCIAS 77

Usando a condição inicial y(0) = 1, temos que


1
a0 = 1 e também que an = , n = 0, . . . .
n!
Aplicando o critério de D’Alembert a esta série de potências vemos que o raio de con-
vergência é
1/(n)!
r = lim = lim (n + 1) = +1.
n!+1 1/(n + 1)! n!+1
X
+1
xn
x
Pela unicidade da solução da equação diferencial dada obtemos que e = , x 2 R.
n=0
n!

Exemplo 2.23. Determinar o desenvolvimento em série de potências da função bino-


mial, f (x) = (1 + x)↵ , ↵ 6= 0, 1, . . . bem como o raio e intervalo de convergência
absoluta.

0
Tendo em atenção que (1 + x) (1 + x)↵ = ↵(1 + x)↵ e f (0) = 1, obtemos que a função
binomial é solução única da equação diferencial

(1 + x) y 0 = ↵ y, x > 1, y(0) = 1.

X
+1
Procuremos agora uma solução y desta equação diferencial da forma y = an x n ,
n=0
com raio de convergência r > 0. Do teorema da série derivada, obtemos que
X
+1 X
+1
n 1
0
(1 + x) y = ↵ y () (1 + x) nan x =↵ an x n , x 2] r, r[,
n=1 n=0

ou equivalentemente,

(1 + x)(a1 + 2a2 x + · · · ) = a1 + (a1 + 2a2 )x + (2a2 + 3a3 )x 2 + · · ·

= ↵(a0 + a1 x + a2 x 2 + · · · )

Assim, do teorema de unicidade da representação de uma função em série de potências,


concluímos que
(↵ (n 1)) · · · (↵ 1)↵
an = a0 , n = 1, 2, . . . ,
n!
e usando a condição inicial y(0) = 1, temos que a0 = 1.

O raio de convergência desta série vem dado por

(↵ (n 1)) · · · (↵ 1)↵ (n + 1)!


r = lim
n!+1 n! (↵ n)(↵ (n 1)) · · · (↵ 1)↵
n+1
= lim = 1.
n!+1 ↵ n
78 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Pela unicidade na solução da equação diferencial obtemos


(↵ 1)↵ (↵ (n 1)) · · · (↵ 1)↵
(1 + x)↵ = 1 + ↵x + x + ··· + xn + ···
2 n!
x 2] 1, 1[.

Exemplo 2.24. Determine, indicando o domínio de convergência, o desenvolvimento


1 1
em série de potências das funções p e p .
1 x2 1 + x2

Basta fazer a mudança de variável x 7! x 2 (respectivamente, x 7! x 2 ) e tomar ↵ =


1/2 no desenvolvimento em série de potências da função binomial para obter,

1 x2 1 ⇥ 3 4 1 ⇥ 3 ⇥ · · · ⇥ (2n 1)
p =1+ + x + ··· + ⇥ x 2n + · · · ;
1 x 2 2 2⇥4 2 ⇥ 4 ⇥ · · · ⇥ (2n)
2
1 x 1⇥3 4 1 ⇥ 3 ⇥ · · · ⇥ (2n 1) 2n
p =1 + x + · · · + ( 1)n x + ···
1 + x2 2 2⇥4 2 ⇥ 4 ⇥ · · · ⇥ (2n)
x 2] 1, 1[.

Exemplo 2.25. Determine o desenvolvimento em série de potências e domínio de con-


vergência para as funções arcsin(x) e arg sinh(x).

Basta fazer aplicar o teorema


ˆ x da série primitiva às ˆséries de potências do problema
x
1 1
anterior, uma vez que p d t = arcsin x e p d t = arg sinh x.
0 1 t 2 0 1 + t2
Exemplo 2.26 (Séries de Mac-Laurin ou de Taylor de funções hiperbólicas). Determine
o desenvolvimento em série de potências e domínio de convergência para as funções
co-seno e seno hiperbólico.

É sabido que

ex + e x
ex e x X
+1
xn
x
cosh(x) = , sinh(x) = e e = , x 2 R.
2 2 n=0
n!

Efectuando a mudança de variável x 7! x obtemos


X
+1
xn
x
e = ( 1)n , x 2 R;
n=0
n!

e, portanto,
X
+1
(1 + ( 1)n )x n X x 2n
+1
cosh(x) = = , x 2 R,
n=0
n! n=0
(2n)!
X
+1
(1 ( 1)n )x n X x 2n+1
+1
sinh(x) = = , x 2 R.
n=0
n! n=0
(2n + 1)!
5. SÉRIES DE TAYLOR 79

Exemplo 2.27 (Séries de Mac-Laurin ou de Taylor de funções trigonométricas). De-


termine o desenvolvimento em série de potências das funções co-seno e da função
seno, bem como os raios e intervalo de convergência absoluta.

Note que

cos00 (x) = cos(x), cos(0) = 1, cos0 (0) = 0 e também

sin00 (x) = sin(x), sin(0) = 0, sin0 (0) = 1.

Consideremos o problema da valor inicial

y 00 = y, y(0) = 1, y 0 (0) = 0,

que admite como solução única em R a função y = cos x.


X
+1
Procuremos agora y da forma y = an x n , de raio de convergência r.
n=0
Temos, aplicando o teorema da série derivada, que
X
Ä +1 ä0 X
+1 X
+1
n n 2
00
y = y () an x = n(n 1)an x = an x n ;
n=0 n=2 n=0

e do teorema de unicidade obtemos

(n + 2)(n + 1)an+2 = an , n = 0, 1, . . . .

Usando a condição inicial y(0) = 1, y 0 (0) = 0 obtemos a0 = 1, a1 = 0 pelo que

( 1)n X
+1
( 1)n x 2n
a2n+1 = 0 e a2n = , n = 0, 1, . . . ; e portanto, y= .
(2n)! n=0
(2n)!

Aplicando o critério de D’Alembert podemos concluir que o raio de convergência da


série de potências encontrada é +1.
Pela unicidade de solução da equação diferencial concluímos que
X
+1
( 1)n x 2n
cos x = , x 2 R.
n=0
(2n)!

Se queremos obter a representação em série de potências da função sin x, derivamos


X ( 1)n x 2n+1
+1
ambos membros desta identidade obtendo sin x = , x 2 R.
n=0
(2n + 1)!

5. Séries de Taylor

Comecemos relembrar o teorema de regularidade, que se f admite um desenvolvi-


mento em série de potências, i.e.
X
+1
f (x) = an x n , x 2] r, r[,
n=0
80 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

então

f (0) = a0 , f 0 (0) = a1 , f 00 (0) = 2a2 , f (n) (0) = n!an , ...,

f (n) (0)
pelo que, do teorema de unicidade, , n 2 N.
an =
n!
Dada uma função f , designamos por série de Taylor no ponto 0 (respectivamente, c) a

X
+1
f (n) (0) n f 00 (0) 2 f (n) (0) n
x = f (0) + f 0 (0)x + x + ··· + x + ···
n=0
n! 2 n!

respectivamente,

X
+1
f (n) (c) f (n) (c)
(x c)n = f (c) + f 0 (c)(x c) + · · · + (x c)n + · · ·
n=0
n! n!

Desta forma a série de Taylor como o polinómio de Taylor de grau infinito.

Para calcularmos a série de Taylor da função f no ponto c é


necessário que a função f e as suas derivadas existam e este-
jam definidas no ponto c.

Exemplo 2.28 (de Cauchy). Seja f : R ! R a função de expressão analitica f (x) =


1/x 2
e , x 6= 0 e f (0) = 0. Esta função é C+1 (R) e f (n) (0) = 0, n 2 N, pelo que a série
de Taylor de f é dada por

X
+1
f (n) (0) n
x = 0 + 0x + 0x 2 + · · · + 0x n + · · · = 0 ;
n=0
n!

assim, a série de Taylor não representa f , mas sim a função nula.

Ainda que a série de Taylor duma função, f , exista, esta série


pode não representar f .

Teorema 2.9 (Condição suficiente de convergência da série de Taylor). Seja f uma


função real de variável real C1 (] r, r[), com r > 0. Se 9M 2 R+ tal que

| f (n) (x)|  M , n 2 N, x 2] r, r[;

então f admite desenvolvimento em série de potências em ] r, r[, i.e.

X
+1
f (n) (0) n
f (x) = x , x 2] r, r[.
n=0
n!

Exemplo 2.29. Consideremos a função f (x) = e x , x 2 R. Determinar a sua série de


Taylor centrada em x = 0.
5. SÉRIES DE TAYLOR 81

Esta função é C1 (R). Mais ainda, como f 0 (x) = e x , tem-se que

f (n) (x) = e x , n2N e também f (n) (0) = 1, n 2 N.

A série de Taylor da função f (x), centrada no ponto x = 0 é dada por


X
+1
1 n 1 1
x = 1 + x + x2 + · · · + xn + · · ·
n=0
n! 2! n!

Podemos calcular o intervalo de convergência desta série, concluindo que é R (neste


caso diremos que o raio de convergência é +1).

Exemplo 2.30. Uma vez obtida a representação da função exponencial como série de
potências, por manipulação algébrica obtemos as representações das funções seno e
co-seno hiperbólicas:

ex + e x X
+1
x 2n ex e x X
+1
x 2n+1
cosh x = = , sinh x = = , x 2 R.
2 n=0
(2n)! 2 n=0
(2n + 1)!

Exemplo 2.31. Tendo em atenção este resultado mostre que se têm os seguintes de-
senvolvimentos em série de Taylor:
X
+1
( 1)n X
+1
( 1)n 2n
sin x = x 2n+1 e cos x = x , x 2 R.
n=0
(2n + 1)! n=0
(2n)!

Consideramos a função f (x) = sin x e calculamos sucessivamente

f (x) = sin x ! f (0) = 0;

f 0 (x) = cos x ! f 0 (0) = 1;

f 00 (x) = sin x ! f 00 (0) = 0;

f 000 (x) = cos x ! f 000 (0) = 1;

f (4) (x) = sin x ! f (4) (0) = 0;

f (5) (x) = cos x ! f (5) (0) = 1;

f (6) (x) = sin x ! f (6) (0) = 0;

f (7) (x) = cos x ! f (7) (0) = 1;

em geral observamos que os coeficientes das potências pares, x 2n+1 , são zero e os coefi-
( 1)n
cientes da potências ímpares, x 2n+1 , são da forma (2n+1)! , pelo que a série de Taylor da
função sin x é dada por
X
+1
( 1)n
x 2n+1 .
n=0
(2n + 1)!
82 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Tendo em conta que, | sin(n) (x)|  1, da condição suficiente de convergência, vemos


que a série de Taylor da função sin(x) converge para a função sin(x) qualquer que seja
x 2 R, i.e.
X
+1
( 1)n
sin(x) = x 2n+1 , x 2 R.
n=0
(2n + 1)!
Para obter a representação em série da função cos x procedemos de igual forma:
X
+1
( 1)n (2n + 1) 2n+1 X ( 1)n 2n+1
+1
cos(x) = x = x , x 2 R.
n=0
(2n + 1)! n=0
(2n)!
1
Exemplo 2.32. Considere novamente a função x, e determine a sua série de Taylor
centrada em 1.

Relembremos a identidade
1 X
+1
= x n, |x| < 1.
1 x n=0

Aplicando esta identidade, obtemos que

1 1 1 1 X
+1
= = = = ( (x 1))n
x x 1+1 1+ x 1 1 ( (x 1)) n=0
X
+1
= ( 1)n (x 1)n , | (x 1)| < 1.
n=0

A condição | (x 1)| < 1 é equivalente à |x 1| < 1, pelo que o intervalo de conver-


gência da série é ]0, 2[.

6. Convergência pontual e uniforme

6.1. Convergência pontual. Seja f n uma sucessão de funções reais definidas


num conjunto E ⇢ R. Suponhamos que para cada x 2 E a sucessão numérica, f n (x) ,
é convergente. Podemos definir a função real f : E ! R como f (x) := lim f n (x),
n!1
x 2 E.

Dizemos assim que a sucessão de funções, f n , converge pon-


tualmente para f em E.

X
n
Analogamente, dizemos que a sucessão de funções sn com sn = f k converge pontu-
X X n=1
almente para s := f k em E, ou ainda, a série f k converge pontualmente em E, se a
X
série f k (x) é convergente qualquer que seja x 2 E. Designamos a função s : E ! R,
X
1 X
com s(x) := f n (x) como soma da série f k em E.
n=1
6. CONVERGÊNCIA PONTUAL E UNIFORME 83

Pretendemos dar resposta às seguintes questões:

• Se f n for uma sucessão de funções contínuas, diferenciáveis ou integráveis,


será que podemos dizer o mesmo da função limite pontual, f ?
• Que relação existe entre os limites da sucessão f n0 e f 0 ou entre o limite da
sucessão definida pelos integrais de f n e o integral de f ?

Observação. Dizer que f é contínua em x significa que lim f (t) = f (x); assim, analisar
t!x
se o limite pontual de uma sucessão, f n , de funções contínuas é contínua é equiva-
lente a verificar que se tem a seguinte identidade

lim lim f n (t) = lim lim f n (t).


t!x n!1 n!1 t!x

Vamos ver que, em geral, não se pode trocar a ordem dos limites.
m
Exemplo 2.33. Para m 2 N e n 2 N seja sm,n = . Para cada n temos lim sm,n = 1;
m+n m!1
pelo que lim lim sm,n = 1. Por outro lado, fixando m temos lim sm,n = 0; pelo que
n!1 m!1 n!1
lim lim sm,n = 0.
m!1 n!1

x2
Exemplo 2.34. Seja agora f n (x) = , x 2 R, n = 0, 1, . . ., e considere-se
(1 + x 2 )n
X
1 X
1
x2
f (x) = f n (x) = .
n=0 n=0
(1 + x 2 )n

Como f n (0) = 0, n = 0, 1, . . ., temos que f (0) = 0; para x 6= 0, a sére considerada é


1
geométrica de razão 2 ]0, 1[, pelo que
1 + x2
8
<0, x = 0
f (x) = 1 + x 2 , x 6= 0, i.e. f (x) =
:1 + x 2 , x 6= 0

donde se conclui que uma série de funções contínuas pontualmente convergente pode
ter como soma uma função descontínua.

sin(nx)
Exemplo 2.35. Seja f n (x) = p , x 2 R e n 2 N. Vemos facilmente que f (x) =
n p
lim f n (x) = 0; logo f 0 (x) = 0 e f n0 (x) = n cos(nx), pelo que f n0 não converge
n!1 p
para f 0 . Para tal basta analisar f n (0) = n ! +1! (Note que f 0 (0) = 0.)

Exemplo 2.36. Seja, f n (x) = n2 x(1 x 2 )n , x 2 [0, 1], n 2 N. Para x 2]0, 1] temos
lim f n (x) = 0, pois se x 2]0, 1], então 1 x 2 2 [0, 1[, e lim n2 a n = 0, sempre que
n!1 n!1
|a| < 1 (basta agora tomar a = 1 x 2 para termos o pretendido). Mais ainda, como
f n (0) = 0, n 2 N, vemos que f (x) = lim f n (x) = 0, x 2 [0, 1].
n!1
84 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Agora, como
1
1 (1 x 2 )n+1 ó1 1
ˆ
x(1 x 2 )n d x = = ,
0 2 n+1 0 2(n + 1)
temos que
ˆ 1 1
n2
ˆ
f n (x) d x = , e portanto, lim f n (x) d x = +1,
0 2(n + 1) n!1 0
ˆ 1
no entanto lim f n (x) d x = 0!
0 n!1

Note-se que para a sucessão de funções, g n (x) = nx(1 x 2 )n , x 2 [0, 1], n 2 N, se tem
que, g(x) = lim g n (x) = 0, x 2 [0, 1] e também
n!1
1 1
1
ˆ ˆ
lim g n (x) d x = 0 6= = lim g n (x) d x.
0 n!1 2 n!1 0

Vemos, desta forma, que o limite do integral não é igual ao integral do limite de uma
sucessão de funções, ainda que esses limites existam e sejam finitos.

6.2. Convergência uniforme. Dizemos que a sucessão de funções reais f n con-


verge uniformemente para f em E ⇢ R se

8" > 09n0 2 N : | f n (x) f (x)| < " sempre que n n0 , x 2 E.

Uma sucessão uniformemente convergente é também pontu-


almente convergente.

Relembre-se que f n converge pontualmente para f em E se para cada x 2 E

8" > 0 9n0 2 N : | f n (x) f (x)| < " sempre que n n0 .

Assim, temos que a existência de n0 está garantida para cada x 2 E (e " > 0), en-
quanto que na convergência uniforme a existência de n0 é garantida para cada " > 0
(e “globalmente” para todo o x 2 E).
X
Dizemos ainda que série f n (x) converge uniformemente em E se a sucessão de somas
X n
parciais definida por sn (x) = f k converge uniformemente em E, i.e.
k=1

X
1
8" > 0 9n0 2 N : |sn (x) s(x)| := f k (x) < " (= n n0 , x 2 E.
k=n+1

sin(nx)
Exemplo 2.37. Seja f n a sucessão de funções definida por f n (x) = , x 2 R.
n
Como para cada x 2 R, lim f n (x) = 0, dizemos que a sucessão de funções f n con-
n!1
verge pontualmente para a função nula, f ⌘ 0, em R. Verifiquemos que f n também
converge uniformemente para f ⌘ 0, em R.
6. CONVERGÊNCIA PONTUAL E UNIFORME 85

ö1ù
De facto, dado " > 0, tomando n0 = + 1 2 N, temos para todo o x 2 R e n n0 ,
"
sin(nx) 1 1
| f n (x) f (x)| = <  < ".
n n n0

Teorema 2.10 (caracterização de Cauchy). A sucessão de funções f n definida num


conjunto E ⇢ R converge uniformemente em E se, e somente se, para cada " > 0, existe
um inteiro positivo n0 tal que

| f n (x)
f m (x)| < ", sempre que n n0 , m n0 e x 2 E.
X
Analogamente, a série f n , converge uniformemente em E se, e somente se,

X
1
8" > 0 9n0 : f m (x) < ", m>n n0 e x 2 E.
k=n+1

Teorema 2.11 (caracterização do supremo). A sucessão de funções reais de variável real,


definidas em E ⇢ R, f n , converge uniformemente para f em E se, e somente se,

lim n =0 onde n = sup f n (x) f (x) .


n!1 x2E
X
Analogamente, a série f n , converge uniformemente em E se, e somente se,

X
1
lim n =0 onde n = sup f k (x) .
n!1 x2E k=n+1

Exemplo 2.38. Considere as seguintes sucessões de funções reais definidas em [0, +1[:

nx nx
f n (x) = x e e 'n (x) = nx e , n 2 N.

Para cada x 2 [0, +1[, temos que

lim f n (x) = 0 e também lim 'n (x) = 0;


n!1 n!1

pelo que as sucessões de funções f n e 'n convergem pontualmente para f ⌘ 0


em [0, +1[. Verifiquemos que f n converge uniformemente para a função nula em
[0, +1[.

Comece por ver que a função f n é crescente em [0, 1/n] e decrescente em ]1/n, +1[
(para tal basta derivar a função f n !). Conclua que f n alcança o seu valor máximo
em 1/n, i.e. f n (1/n) = (e n) 1 . Temos assim que
1
n = sup f n (x) f (0) = , n 2 N.
x2[0,+1[ en

Assim, do teorema anterior, concluímos que f n converge uniformemente para a fun-


ção nula em [0, +1[ (pois, n conerge para 0).
86 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Vejamos agora que 'n não converge uniformemente para a função nula em [0, +1[.
De igual modo verificamos que a sucessão 'n atinge o seu valor máximo em 1/n, i.e.
'n (x) = e 1 , logo

n = sup 'n (x) = e 1 , n 2 N.


x2[0,+1[

Agora, como ( n) não converge para 0, temos o que queríamos demonstrar.

No entanto, 'n converge uniformemente para a função nula em [a, +1[ qualquer
que seja a > 0.

Pois para n > 1/a a função 'n é decrescente em [a, +1[ (note que 'n é decrescente
para x > 1/n, pelo que também é decrescente para x > a); assim, para todo o n >
1/a, tem-se
na
n = sup 'n (x) = 'n (a) = na e ,
x2[a,+1[

que é uma sucessão infinitesimal.


X
Teorema 2.12 (M-Weierstrass). Sejam f n uma série de funções, com f n : E ⇢ R ! R,
X
n2Ne Mn uma série de termos reais positivos. Se
X
• | f n (x)|  Mn , para todo o x 2 E e cada n 2 N, i.e. a série Mn é majorante
X
da f n em E,
X
• Mn é convergente,
X
então a série f n é absoluta e uniformemente convergente em E.
X xe 2n2 x 2
Exemplo 2.39. A série de funções f n , com f n (x) = é uniformemente con-
n
vergente em R.

Para cada n 2 N, a função f n está limita entre


1 1
p e p .
2n 2 e 2n2 e
2n2 x 2
e 1
De facto, f n0 (x) = (1 2n2 x 2 ), pelo que os seus pontos críticos são ±
. Con-
n 2n
1 1
clua (como exercício) que f atinge os seus valores máximo e mínimo em e ,
2n 2n
respectivamente, i.e.
1 1 1 1
max f n = f = 2p e min f n = f = p .
2n 2n e 2n 2n2 e
Agora, pelo teorema M-Weierstrass, como
1 X 1
| f n (x)|  p , x 2 R, n2N e p é convergente
2n e
2 2n2 e
X
concluímos que a série f n é uniformemente convergente em R.
6. CONVERGÊNCIA PONTUAL E UNIFORME 87

6.3. Aplicações do Teorema M-Weierstrass.

Exemplo 2.40. Para cada n 2 N, considere f n : [0, 2⇡] ! R definida por f n (x) =
(1 + sin(x/n)) ln n X
1
. Mostre que a série de funções f n , é uniformemente conver-
n3 n=1
gente.

Aplicação directa do teorema M-Weierstrass, pois

2 ln n
| f n (x)|  , x 2 [0, 2⇡]
n3
X 2 ln n
e a série é convergente.
n3
X
1
1
Exemplo 2.41. Mostre que a série de funções , x 2 [1, 100] é uniforme-
n=1
n(1 + nx)
mente convergente.

Aplicação directa do teorema M-Weierstrass, pois

1
| f n (x)|  , x 2 [1, 100]
n(n + 1)
X 1
e a série é convergente.
n(n + 1)

X
1
ln n
Exemplo 2.42. Use o critério de Weierstrass para concluir que a série cos(nx)
n=1
n2 + 1
é uniformemente convergente em [0, 2⇡].

X1
ln n
Mostremos que a série cos(nx) é uniformemente convergente em R. Como
n=2
n2 + 1
ln n ln n
| cos t|  1, t 2 R, temos que 2 cos(nx)  2 , x 2 R. A convergência
n +1 n +1
uniforme em R da série dada é uma consequência do teorema M-Weierstrass pois a
X ln n
série é convergente. De facto, podemos usar o critério de comparação de
n2 + 1
Gauss no limite, i.e.
p
ln n/(n2 + 1) ln n n2 2 ln n n2
lim = lim p 2 = lim p = 0,
n!1 1/n3/2 n!1 n n + 1 n!1 n n2 + 1

ln x p
(tenha em atenção que lim = 0 e lim n = +1 — justifique, usando o
x
x!+1 n!+1
n 2 X
teorema de Heine — e lim 2 = 1. Assim, a convergência da série n 3/2
n!+1 n + 1
X ln n
(pois é de Dirichlet com ↵ = 3/2) implica a convergência da série .
n2 + 1
88 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

Teorema 2.13. Seja f n uma sucessão de funções reais limitadas definidas num intervalo
E ⇢ R. Mostre que se existe 0 < c < 1 tal que
f n+1 (x)
sup c ou sup | f n (x)|1/n  c, n > n0 ,
x2E f n (x) x2E
X
então a série f k é uniformemente convergente em E.

X
1
1 nx
Exemplo 2.43. Mostre que a série e é uniformemente convergente em [0, 100].
n=1
n!

X
1 nx
e
Mostremos que a série , é uniformemente convergente sobre intervalos limitados
n!
n=1
e fechados de R. Comecemos por calcular o limite quando n tende para infinito de
f n+1 (x) e(n+1)x n! ex
= = .
f n (x) (n + 1)n! e nx n+1
f n+1 (x)
Vemos assim que lim = 0, x 2 R logo
n!1 f (x)
n
f n+1 (x)
8" > 0 9n0 2 N: < ", sempre que n n0 e x 2 R.
f n (x)
Então do teorema anterior temos o que queríamos demonstrar.

6.4. Análise da continuidade, diferenciabilidade e integrabilidade da função


limite uniforme.

Teorema 2.14 (limite). Sejam f n uma sucessão de funções reais definidas no intervalo
E ⇢ R e a 2 E. Então:

• Se a sucessão de funções f n converge uniformemente para f em E, e se para


cada n 2 N existe o limite `n := lim f n (x), então existe o limite lim f (x) e é
x!a x!a
igual ao limite da sucessão `n , tendo-se

lim lim f n (x) = lim lim f n (x) .


x!a n!1 n!1 x!a
X
• Se a série f n converge uniformemente para a soma, s, em E, e se para cada
n 2 N existe o limite `n := lim f n (x), então existe o limite lim s(x) e é igual à
X x!a x!a
soma da série `n , tendo-se
X
1 X
1
lim f n (x) = lim f n (x).
x!a x!a
n=1 n=1

Teorema 2.15 (continuidade). Seja f n uma sucessão de funções reais contínuas defi-
nidas no intervalo E ⇢ R. Então:

• Se a sucessão de funções f n converge uniformemente para f em E, então f é


contínua em E.
6. CONVERGÊNCIA PONTUAL E UNIFORME 89

X
• Se a série f n converge uniformemente para a soma, s, em E, então s é con-
tínua em E.

Este teorema é um corolário do teorema anterior. Para tal basta notar que como as
funções f n são contínuas, para a 2 E, existe o limite `n = lim f n (x) = f n (a), n 2 N.
x!a
Então, também existe lim f (x) tendo-se
x!a

lim f (x) = lim lim f n (x) = lim lim f n (x) = lim f n (a) = f (a);
x!a x!a n!1 n!1 x!a n!1

logo f é contínua em a 2 E.

Deixamos como exercício a demonstração da segunda afirmação.

Exemplo 2.44. A sucessão de funções reais fn definidas em [0, ⇡] por f n (x) =


n
(sin x) , converge pontualmente para a função f : [0, ⇡] ! R, com f (⇡/2) = 1 e
f (x) = 0, se x 2 [0, ⇡] \ {⇡/2}.

Como as funções, f n , n 2 N são contínuas em [0, ⇡] e a função limite pontual, f , não é


contínua em [0, ⇡], temos do teorema anterior que f n não converge uniformemente
para f em [0, ⇡].

Teorema 2.16 (integrabilidade). Seja f n uma sucessão de funções reais integráveis


definidas no intervalo fechado [a, b] ⇢ R. Então:

• Se a sucessão de funções f n converge uniformemente para f em [a, b], então f


é também integrável, e tem-se
ˆ x ˆ x
lim f n (t) d t = lim f n (t) d t,
a n!1 n!1 a

uniformemente para x 2 [a, b].


X
• Se a série f n converge uniformemente para a soma, s, em [a, b], então s é
integrável, tendo-se
ˆ xX1 X
1 ˆ x
f n (t) d t = f n (t) d t,
a n=1 n=1 a

uniformemente para x 2 [a, b].

Teorema 2.17 (derivabilidade). Seja f n uma sucessão de funções reais deriváveis de-
finidas no intervalo limitado E ⇢ R. Então:

• Se a sucessão de funções f n0 converge uniformemente para g em E e existe


a 2 E tal que f n (a) é convergente, então f n converge uniformemente para
uma função derivável em E, f , e tem-se
Ä ä0
f0⌘ g em E, i.e. lim f n (x) = lim f n0 (x).
n!1 n!1
90 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

X
• Se a série f n0 converge uniformemente para a soma, h, em E e existe a 2 E
X X
tal que a série numérica f n (a) é convergente, então a série f n converge
uniformemente para uma função derivável em E, s, e tem-se
ÅX1 ã0 X 1
0
s ⌘h em E, i.e. f n (x) = f n0 (x).
n=0 n=0

6.5. Regularidade da soma de uma série de potências. Este assunto foi já es-
tudado anteriormente, no entanto vamos abordar este tema considerando as séries de
potências como um caso particular de séries de funções. No que se segue far-se-á uso
do que sabemos sobre o raio de convergência de uma série.
X
Teorema 2.18. Seja an x n uma série de potências com raio de convergência r > 0.
X
Para x 2] r, r[ a função soma da série, s(x) = an x n , é contínua, derivável e integrá-
vel tendo-se
ÅX
1 ã0 X1 xX
1 X
1
an n+1
ˆ
n
an x = nan x n 1
e n
an t d t = x d t.
n=0 n=1 0 n=1 n=1
n+1
X
Comecemos por mostra que a série f n converge uniformemente em [a, b] ⇢] r, r[.
X
Para tal, tome-se ⇢ = max{|a|, |b|} 2] r, r[, pelo que a série an ⇢ n é absolutamente
convergente. Por outro lado,

|an x n |  |an |⇢ n , x 2 [a, b] (pois |x| < ⇢)

pelo que do Teorema M-Weierstrass temos o que queríamos provar.

Para demonstrarmos a continuidade, derivabilidade e integrabilidade da função


X
1
s(x) = an x n em ] r, r[,
n=0

comecemos por ver que para cada x 2] r, r[, existem a, b 2 R tais que r<a<x<
b < r, e como a série é uniformemente convergente assim como a série derivada, em
[a, b], e as funções an x n são contínuas, deriváveis e integráveis em [a, b], então dos
teorema anteriores concluímos que a função s é contínua, derivável e integrável em
] r, r[, tendo-se as relações indicadas no teorema.

7. Exercícios vários

Exemplo 2.45. Diga, justificando devidamente, se são verdadeiras ou falsas as seguin-


tes afirmações:
p X
1
a) Seja an ⇢ R ; se lim+
n an = 0 , então an é divergente.
n!1
n=1
7. EXERCÍCIOS VÁRIOS 91

X
1
p
b) Considere a série de potências, an x n . Se o seu raio de convergência é 2,
n=0
então lim an = 0.
n!1

p
1 p n
a) Falsa. Por exemplo, para an = , tem-se lim nan = lim 2 = 0, e no entanto,
n 2 n!1 n!1 n
X1
1
é convergente (pois trata-se de uma série de Dirichlet com ↵ = 2).
n=1
n 2
p
b) Verdadeira, pois se o raio de convergência é 2 a série de potências é absolutamente
p p X
1
convergente em ] 2, 2[. Logo, em particular, em x = 1, i.e. a série numérica an
n=0
é absolutamente convergente. Agora pela condição necessária de convergência temos
que lim an = 0.
n!1
X
Exemplo 2.46. Seja an ⇢ R+ ; se an é convergente, o que pode concluir quanto à
X
natureza da série ln(1 + an )?

X
A condição necessária de convergência da série an diz-nos que lim an = 0. Sabe-
n!1
ln(1 + x)
mos também que lim+ = 1, pelo que do teorema de Heine concluímos que
x!0 x
ln(1 + an )
lim = 1. Agora, do critério de comparação no limite de Gauss, temos que
n!1
X an
ln(1 + an ) é uma série convergente.

Exemplo 2.47. Mostre que a sucessão de funções definida em R por

x 2x nx
Sn (x) = x e +xe + ··· + x e , n 2 N,

converge pontualmente em [0, +1[ para uma função S devidamente identificada. Jus-
tifique que {Sn } não converge uniformemente para S em [0, +1[.

Exemplo 2.48. Diga, justificando devidamente, se são verdadeiras ou falsas as seguin-


tes afirmações:
X X
a) Seja (an ) ⇢ R+ ; se an é convergente então (an + 1/an ) é convergente.
X
n
b) Considere a série de potências, an x . Se o raio de convergência é 2, então
lim an = 0.

Exemplo 2.49. Considere a sucessão de funções, {Sn }, definida em R por

x2 x2
Sn (x) = x 2 + + · · · + , n 2 N.
1 + x2 (1 + x 2 )n

a) Determina a função S limite pontual de {Sn } em R.


92 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

FIGURA 1. Funções periódicas

b) Calcule
⇣ ⌘ ⇣ ⌘
lim lim Sn (x) e lim lim Sn (x) .
x!0 n!1 n!1 x!0

Analise se a sucessão de funções {Sn } converge uniformemente para S em [ 2, 3].

8. Séries de Fourier

As séries de potências permitem representar, em intervalos apropriados, um vasto con-


junto de funções, mas apresentam uma limitação evidente: as funções têm de ser pelo
menos C1 . A descoberta de Fourier, de que para uma classe de funções, incluindo
algumas funções descontínuas, era válida uma representação em série trigonométrica
na forma

a0 X Ä n⇡x ä
+1
n⇡x
f (x) ⇠ + an cos + bn sin , série de Fourier
2 n=1
L L

teve, uma enorme importância em Matemática e nas suas aplicações. Verifica-se facil-
mente que as funções cos n⇡x n⇡x
L e sin L são periódicas de período (positivo mínimo)
igual a 2L/n. Um período comum a todas elas é, pois, 2L, e a validade do desenvolvi-
mento anterior, implica naturalmente a periodicidade de f .

Esta restrição não traz problemas, já que uma função definida num intervalo limitado
pode ser estendida a toda a recta de forma a ser periódica.

Exemplo 2.50. A função sin x tem períodos 2⇡, 4⇡, 6⇡,. . ., pois sin(x + 2⇡), sin(x +
4⇡), sin(x + 6⇡),. . . são iguais a sin x.

No entanto, 2⇡ é o menor dos períodos, pelo que dizemos que é o período da fun-
ção sin x.

Exemplo 2.51. Verifique que o período das funções sin(nx) e cos(nx) é 2⇡/n.

Exemplo 2.52. Alguns gráficos de funções periódicas podem ser vistos na próxima
figura 1. Como desafio tente encontrar a expressão analítica de funções que exibem tal
comportamento.
8. SÉRIES DE FOURIER 93

Admitindo a validade do desenvolvimento em série de Fourier, e que se pode integrar


termo a termo a série trigonométrica, ao multiplicá-la por cos m⇡x m⇡x
L ou sin L e integrar
termo a termo obtemos, tendo em atenção as seguintes relações de ortogonalidade
ˆ L
n⇡x m⇡x
cos sin dx = 0,
L L L
ˆ L
n⇡x m⇡x
cos cos dx = L n,m ,
L L L
ˆ L
n⇡x m⇡x
sin sin dx = L n,m ,
L L L
onde n,m é a função Delta de Kronecker, definida como n,m = 0 se n 6= m e n,n =
1, válidas para quaisquer n, m 2 N, as expressões para os coeficientes an e bn dados
na definição seguinte.

Definição 2.1. Seja f : R ! R uma função periódica, de período 2L, integrável em


cada intervalo limitado. Os coeficientes de Fourier de f são os números reais
1 L
ˆ
a0 = f (x)dx,
L L
1 L n⇡x
ˆ
an = f (x) cos dx, n 2 N, coeficiente do co-seno
L L L
1 L n⇡x
ˆ
bn = f (x) sin dx, n 2 N. coeficiente do seno
L L L

A presença do factor 1/2 no termo independente do desenvolvimento de Fourier justifica-


-se por tornar válida a fórmula dos an quando n = 0.

Exemplo 2.53. Determine a série de Fourier da função f (x) = 1 + x, no intervalo


[ 1, 1].

Comecemos por calcular os coeficientes an e bn do desenvolvimento em série de Fourier.


Observe-se que L = 1, pelo que:
ˆ 1 1
x2 12 ( 1)2
a0 = (1 + x) d x = x + = (1 + ) (( 1) + ) = 2.
1 2 1
2 2
Para n = 1, 2, . . ., calculamos
ò
sin(n⇡x) 1
ˆ 1 1
sin(n⇡x)
ˆ
an = (1 + x) cos(n⇡x)d x = (1 + x) dx
1 n⇡ 1 1 n⇡
ò1
cos(n⇡x) cos(n⇡) cos( n⇡)
= = = 0.
(n⇡)2 1 (n⇡)2 (n⇡)2
Calculamos agora os coeficientes bn , n = 1, 2, . . .,
ò
cos(n⇡x) 1
ˆ 1 1
cos(n⇡x)
ˆ
bn = (1 + x) sin(n⇡x)d x = (1 + x) + dx
1 n⇡ 1 1 n⇡
94 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

FIGURA 2. Aproximações ao gráfico de f em [ 1, 1]

ò1
cos(n⇡) sin(n⇡x) ( 1)n sin(n⇡) sin( n⇡) 2( 1)n+1
= 2 + = 2 + =
n⇡ (n⇡)2 1 n⇡ (n⇡)2 (n⇡)2 n⇡
(para a última identidade usamos que cos n⇡ = ( 1)n ).

Agora, a série de Fourier da função 1 + x no intervalo [ 1, 1] é dada por


X
+1
2( 1)n+1
1+ sin(n⇡x).
n=1
n⇡

Incluímos os gráficos (construídos com o programa Mathematica a partir das instruções


indicadas) das somas parciais desta série

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 5}], {x, 1, 1}, PlotStyle ! Red]

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 10}], {x, 1, 1}, PlotStyle ! Blue]

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 20}], {x, 1, 1}, PlotStyle ! Green]

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 100}], {x, 1, 1}, PlotStyle ! Black]

Pela observação destes gráficos parece que a série reproduz a função f (x) = 1 + x no
intervalo [ 1, 1]. Além disso, há um comportamento estranho ‘próximo’ dos extremos
do intervalo [ 1, 1]. Representando estas somas parciais no intervalo [ 5, 5].

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 5}], {x, 5, 5}, PlotStyle ! Red]

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 10}], {x, 5, 5}, PlotStyle ! Blue]

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 20}], {x, 5, 5}, PlotStyle ! Green]
8. SÉRIES DE FOURIER 95

FIGURA 3. Aproximações ao gráfico de f em [ 5, 5]

Plot[1 + Sum[2 ⇤ ( 1)(n+1) Sin[n Pi x]/(n Pi), {n, 1, 100}], {x, 5, 5}, PlotStyle ! Black]

O principal resultado relativo a séries de Fourier estabelece as condições que uma fun-
ção periódica deve satisfazer para que admita representação em série de Fourier.

Definição 2.2. Uma função f : I ! R diz-se seccionalmente contínua se, em cada in-
tervalo limitado, tiver apenas um número finito de descontinuidades, todas de primeira
espécie. Se ↵ for uma descontinuidade, define-se

f (↵ + 0) = lim+ f (x) e f (↵ 0) = lim f (x).


x!↵ x!↵

A função diz-se seccionalmente derivável se for seccionalmente contínua e a sua deri-


vada também.

Observação. Uma função seccionalmente derivável não precisa estar definida nos seus
pontos de descontinuidade. Nesses pontos, toma-se
1
f (x) = f (x 0) + f (x + 0) ,
2
ou seja, a função nesse ponto é igual à média aritmética dos limites laterais de f no
ponto considerado. O mesmo se tem para a sua derivada.

Exemplo 2.54. A função definida por

f (x) = 0 se ⇡< x <0 e f (x) = 1 se 0 < x < ⇡.


96 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

é seccionalmente derivável. O valor de f no ponto de descontinuidade x = 0 pode


tomar--se f (x) = 1/2.

Teorema (Dirichlet). Seja f : R ! R uma função seccionalmente derivável e


periódica, de período 2L. Então a sua série de Fourier converge em cada ponto
x 2 R, tendo-se
a0 X Ä n⇡x ä
+1
1 n⇡x
f (x 0) + f (x + 0) = + an cos + bn sin .
2 2 n=1
L L

Exemplo 2.55. Seja f : R ! R a função periódica, de período 2⇡, definida em


[ ⇡, ⇡[ por

f (x) = 0 se ⇡ x <0 e f (x) = 1 se 0  x < ⇡.

Os coeficientes de Fourier de f são


1 ⇡
ˆ
a0 = 1dx = 1,
⇡ 0
1 ⇡
ˆ
an = cos(nx)dx = 0, n 1,
⇡ 0
1 ⇡
ˆ
bn = sin(nx)dx = 0 se n é par ,
⇡ 0
2
bn = se n é ímpar n 1;
n⇡
logo, como a função é seccionalmente derivável,

1 X
+1
1 2
f (x 0) + f (x + 0) = + sin((2n 1)x).
2 2 n=1 (2n 1)⇡
1 1 1
Fazendo x = ⇡2 , obtemos a fórmula de Leibniz ⇡
4 =1 3 + 5 7 + ···.

Exemplo 2.56. Determine os coeficientes de Fourier da função f : R ! R definida por


f (x) = 1/2, se x 2] 1, 0[ e f (x) = 1, se x 2]0, 1[ e periódica de período 2.

Comecemos por representar o gráfico da função f (cf. figura 4). Os coeficientes de


Fourier de f são dados por
ˆ 1 0 1
1 1
ˆ ˆ
a0 = f (x)dx = 1dx + 1dx =
1 2 1 0 2
e para n 2 N por
ˆ 1 0 1
1 sin(n⇡)
ˆ ˆ
an = cos(n⇡x) f (x)dx = cos(n⇡x)dx + cos(n⇡x)dx = = 0,
1 2 1 0 2n⇡
1
1 0 1 3 1 cos(n⇡)
ˆ ˆ ˆ
bn = sin(n⇡x) f (x)dx = sin(n⇡x)dx + sin(n⇡x)dx = ;
1 2 1 0 2n⇡
9. SÉRIE DE FOURIER DE CO-SENOS OU DE SENOS 97

FIGURA 4. Gráfico de f

assim, como b2n = 0 e b2n 1 = 3/(n⇡), n 2 N, do teorema de Dirichlet temos

1 3 X sin (2n 1)⇡x


+1
1
f (x 0) + f (x + 0) = + .
2 4 ⇡ n=1 2n 1

9. Série de Fourier de co-senos ou de senos

Se uma função periódica f : R ! R, de período 2L, for par (i.e. f (x) = f ( x), x 2 R)
então a sua série de Fourier é uma série de co-senos. Na verdade, os seus coeficientes
de Fourier são
L L
1 n⇡x 2 n⇡x
ˆ ˆ
an = f (x) cos dx = f (x) cos dx, n 0,
L L L L 0 L
bn = 0, n 1

pois as funções f (x) cos n⇡x


L e f (x) sin n⇡x
L são, respectivamente, par e ímpar.
De facto, o produto de uma função par por uma ímpar é ímpar e o produto de funções
pares (respectivamente, ímpares) é par. Note que f é ímpar se f (x) = f ( x),
x 2 R.

Exemplo 2.57. Classifique quanto à paridade as funções representadas pelos seus grá-
ficos na figura 1.

Relembre que a primitiva de uma função par é uma função ímpar e reciprocamente.
Além disso, se f é uma função par integrável no intervalo [ a, a], então
ˆ a ˆ a
f (t) d t = 2 f (t) d t;
a 0

já se f é uma função ímpar integrável no intervalo [ a, a], então


ˆ a
f (t) d t = 0.
a

Analogamente, a série de Fourier de uma função ímpar é uma série de senos.

Exemplo 2.58. Seja f (x) = x em [0, ⇡]. Se quisermos desenvolver f em série de


co-senos, temos que prolongar a função por paridade ao intervalo [ ⇡, 0] (ou seja,
f (x) = x em [ ⇡, 0]) e, de seguida, estendê-la, de forma periódica (com período
98 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

2⇡) a toda a recta. Os coeficientes de Fourier (dos co-senos) são para todo n 1
dados por,
2 ⇡
ˆ
a0 = xdx = ⇡,
⇡ 0
2 ⇡
ˆ
an = x cos(nx)dx = 0 se n é par
⇡ 0
4
an = se n é ímpar.
n ⇡
2

Justifique que os coeficientes dos senos, bn , são nulos!

Como a função é contínua e seccionalmente derivável, vem

4X
+1
⇡ 1
x= cos((2n 1)x).
2 ⇡ n=1 (2n 1)2

Se quisermos desenvolver f em série de senos, prolongamo-la como função ímpar


(ou seja, f (x) = x em [ ⇡, 0]). Os coeficientes de Fourier dos senos são então
2 ⇡ 2( 1)n+1
ˆ
bn = x sin(nx)dx = , n 1
⇡ 0 n
pelo que
X
+1
2( 1)n+1
x= sin(nx).
n=1
n

Terminamos com uma importante fórmula, a denominada por identidade de Parseval.

Teorema (de Parseval). Seja f : R ! R uma função seccionalmente contínua e periódica,


de período 2L, e de quadrado integrável, i.e. f 2 é integrável. Então os seus coeficientes de
Fourier verificam a identidade

1 2 XÄ 2 ä 1ˆ L
+1
2 2
a + a + bn = f (x) dx.
2 0 n=1 n L L

Exemplo 2.59. Tendo em conta o resultado do exercício anterior, i.e.


X
+1
2( 1)n+1
x= sin(nx),
n=1
n

e utilizando a fórmula de Parseval, obtém-se (justifique!)


X 4
+1
1 ⇡ 2
ˆ
2⇡2
= x dx = ;
n=1
n 2 ⇡ ⇡ 3
e portanto
X
+1
1 ⇡2
= .
n=1
n2 6
10. EXERCÍCIOS VÁRIOS 99

FIGURA 5. Extensão par (4-periódica)

FIGURA 6. Aproximação de Fourier

10. Exercícios vários

Exemplo 2.60. Determine as séries de Fourier de senos (respectivamente, de co-senos)


da função

f (x) = 2, se 0< x <1 e f (x) = 0, se 1 < x < 2.

Vamos considerar primeiro a extensão par da função f ao intervalo ] 2, 0[, de forma


periódica de período 4 como na figura 5. A função f assim definida é seccionalmente
derivável em R. Os coeficientes de Fourier vêm dados por
1 2
ˆ ˆ 2 ˆ 1
a0 = f (x)dx = f (x)dx = 2dx = 2,
2 2 0 0

1 2 n⇡x ó1
ˆ 1
n⇡x n⇡x 4
ˆ
an = f (x) cos dx = 2 cos dx = sin
2 2 2 0 2 n⇡ 2 0

4 sin(n⇡/2)
= ,
n⇡
bn = 0, n 2 N.

Assim, pelo teorema de Dirichlet a série de Fourier de co-senos da função f vem


dada por

1 X
+1
4 sin(n⇡/2) n⇡x
f (x 0) + f (x + 0) = 1 + cos ,
2 n=1
n⇡ 2
e uma sua aproximação está representada na figura 6.

Considere-se agora a extensão ímpar da função f ao intervalo ] 2, 0[, de forma pe-


riódica de período 4 como na figura 7. A função f assim definida é seccionalmente
derivável em R. Os coeficientes de Fourier vêm dados por, an = 0, n = 0, 1, . . . e
100 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

FIGURA 7. Extensão ímpar (4-periódica)

FIGURA 8. Aproximação de Fourier

2 ˆ 1
1 n⇡x n⇡x
ˆ
bn = f (x) sin dx = 2 sin dx
2 2 2 0 2
4 n⇡x ó1 8 n⇡
= cos = sin2 n 2 N;
n⇡ 2 0 n⇡ 4
assim, pelo teorema de Dirichlet a série de Fourier de senos da função f vem dada por

8 X 2 n⇡
+1
1 n⇡x
f (x 0) + f (x + 0) = sin sin ,
2 ⇡ n=1 4 2

e uma sua aproximação está representada na figura 8.

Exemplo 2.61. Determinar a série de Fourier da função 2⇡-periódica de expressão


analítica, f (x) = x 2 , x 2 [ ⇡, ⇡].

Calculamos os coeficientes da sua série de Fourier,



1 ⇡ 2 2 ⇡ 2 2 x3 2⇡2
ˆ ˆ
a0 = x dx = x dx = = .
⇡ ⇡ ⇡ 0 ⇡ 3 0
3
e para n = 1, 2, . . .
1 ⇡ 2 2 ⇡ 2
ˆ ˆ
an = x cos(nx) d x = x cos(nx) d x
⇡ ⇡ ⇡ 0
Å ò⇡ ˆ ⇡ ã
2 2 sin(nx) sin(nx)
= x 2x dx
⇡ n 0 0 n
Å ò ã
cos(nx) ⇡ ( 1)n 4( 1)n
ˆ ⇡
2 cos(nx) 2
= 2x + 2 dx = 2⇡ = .
⇡ n2 0 0 n2 ⇡ n2 n2
Como f é par, os coeficientes bn são nulos, i.e.
1 ⇡ 2
ˆ
bn = x sin(nx) d x = 0, n2N
⇡ ⇡
10. EXERCÍCIOS VÁRIOS 101

FIGURA 9. Aproximações com n = 5, 10, 15, 100

A série de Fourier da função f (x) = x 2 , no intervalo [ ⇡, ⇡] é dada por

⇡2 X 4( 1)n
+1
+ cos(nx).
3 n=0
n2

Incluímos os gráficos para 5, 10, 15 e 100 (cf. figura 9) termos nos somatórios

Pelo teorema de Dirichlet a série de Fourier (observe que f está nas condições do teo-
rema, pois é seccionalmente derivável em ] ⇡, ⇡[ e 2⇡-periódica)

⇡2 X 4( 1)n
+1
f (x 0) + f (x + 0)
= + cos(nx).
2 3 n=0
n2

Observe-se que
f (x 0) + f (x + 0)
= x 2, x 2 R. (justifique)
2
Exemplo 2.62. Seja f a função 2⇡-periódica dada em [ ⇡, ⇡[ por
8
>
> 0, ⇡  x < 0,
>
<

f (x) = 1, 0  x  ,
>
> 2
>
:0, ⇡ < x < ⇡.
2
(1) Determine os coeficientes de Fourier de f .
(2) Esboce, justificadamente, o gráfico da soma da série de Fourier de f no
intervalo [ 2⇡, 2⇡].
102 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

FIGURA 10. representação em série de Fourier

Determinação dos coeficientes de Fourier de f :

1 ⇡/2 1
ˆ
a0 = dx = ,
⇡ 0 2
ˆ ⇡/2
1 sin(n⇡/2)
an = cos(nx) d x = ,
⇡ 0 n⇡
1 ⇡/2 2 sin2 (n⇡/4)
ˆ
bn = sin(nx) d x = , n 2 N.
⇡ 0 n⇡
Pode ver-se que
Ä 2n⇡ ä Ä (2n 1)⇡ ä
sin =0 e que sin = ( 1)n+1 , n 2 N;
2 2
Å ã Ä ä Ä ä Ä ä
4n⇡ 1
2
= 0, sin2 2 (4n+2)⇡ 2 (4n+3)⇡
= 12 ,
(4n+1)⇡
além disso, sin 4 = 2 , sin 4 = 1, sin 4
4
n 2 N.

Isto permite-nos escrever explicitamente os coeficientes de Fourier an , bn (exercício).

Como a função é seccionalmente derivável em R o teorema de Dirichlet diz-nos que a


representação da série de Fourier de f é dada pela figura 10.

11. Transformadas de Fourier

Nesta secção apresentamos o conceito de transformada de Fourier. Esta é uma ferra-


menta muito importante no estudo teórico de equações diferenciais em variáveis par-
ciais. São também muitas as suas aplicações a problemas físicos em domínios infinitos.

Antes de avançar com o estudo, ainda que introdutório, sobre as transformadas de


Fourier, vamos apresentar a forma complexa da representação em série de Fourier de
uma função, f , definida em ] L, L[,
X
+1
n⇡
x
f (x) = cn ei L .
n= 1

Esta fórmula é uma consequência da identidade de Euler que será apresentada na sec-
ção 9.3 do capítulo 3, i.e.

ei x = cos(x) + i sin(x), t 2 R.
11. TRANSFORMADAS DE FOURIER 103

Daqui se obtém a representação complexa das funções trigonométricas

ei x + e ix
ei x e ix
cos(x) = , sin(x) = , t 2 R.
2 2ii
Agora,
n⇡ n⇡ n⇡ n⇡
an cos x + bn sin x = cn ei L x + c n e i L x
L L
onde

2cn = an i bn , 2c n = an + i bn ,

pelo que temos a identidade

X
+1 Ä n⇡ n⇡ ä
an cos x + bn sin x
n= 1
L L
2⇡ ⇡ ⇡ 2⇡
= · · · + c 2e L i + c 1e i L + c0 + c1 ei L + c 2 ei L + ···

Fica então explicada a representação complexa anterior. Mais ainda, os coeficientes cn


determinam-se a partir da fórmula

1 L
ˆ
2c0 = 2a0 = f (t) d t
L L
1 L
ˆ
n⇡
2cn = f (t) e i L t d t, n 2 N,
L L
1 L
ˆ
n⇡
2c n = f (t) ei L t d t, n 2 N,
L L
ou, de forma mais compacta,
ˆ L
1 i n⇡
t
cn = f (t) e L d t, n 2 Z.
2L L
Substituindo na expressão complexa da série de Fourier para f , obtemos
X 1 ˆ L
+1
n⇡
f (x) = f (t) ei L (x t) d t,
n= 1
2L L

Considerando agora uma partição do intervalo R (que designamos por eixo Os) nos
n⇡
pontos sn = , em intervalos de amplitude s = ⇡L , reescrevemos
L
1 X
+1 ˆ L
f (x) = f (t) ei sn (x t) d t s.
2⇡ n= 1 L

Desta forma f é a soma de Riemann de uma certa função na variável s sobre R. To-
mando L ! +1, temos que s ! 0, e a soma de Riemann converge para
ˆ +1 ˆ +1
1
f (x) = f (t) ei s(x t) d t d s,
2⇡ 1 1
104 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

que é um integral de Fourier. Reescrevamos este integral na forma


ˆ +1 Å ˆ +1 ã
1 i sx 1 i st
f (x) = p e p f (t) e d t d s.
2⇡ 1 2⇡ 1
Definimos a transformada de Fourier de f ,
+1
1
ˆ
i st
F ( f )(s) = p f (t) e d t,
2⇡ 1

e a transformada inversa de Fourier de f ,


ˆ +1
1
f (x) = p ei s x F ( f )(s) d s.
2⇡ 1
Assumindo que f (x) ! 0 e f 0 (x) ! 0 quando x ! ±1, integrando por partes tem-se
ˆ +1 ˆ +1
1 i st is
0
F ( f )(s) = p 0
f (t) e dt = p f (t) e i st d t = i sF ( f )(s).
2⇡ 1 2⇡ 1
Da mesma forma pode ver-se que

F ( f 00 )(s) = i sF ( f 0 )(s) = s2 F ( f )(s).

Estas propriedades tornam as transformadas de Fourier instrumentos fundamentais no


estudo de equações diferencias.

12. Exercícios de avaliação


X
1
3n
Exercício (Frequência, 18-03-2019). Considere a série de potências (2x 1)n .
n=1
5n

a) Determine o raio de convergência e o intervalo de convergência da série de


potências.
b) Observando que a série dada é também, para cada x, uma série geométrica,
determine a expressão para a sua soma no intervalo de convergência.

X 3(2x 1) X
(a) A série dada pode escrever-se como y n onde y = . A série yn é
5
absolutamente convergente em ] 1, 1[. Assim, a série dada é absolutamente conver-
gente para x 2 R tal que 1 < 3(2x 1)/5 < 1, i.e. 5/6 < x 1/2 < 5/6 ou ainda
⇤ ⇥
x 2 1/3, 4/3 , que é a região de convergência absoluta da série dada. O raio de
convergência da série é 5/6.
X1
y
(b) Tendo em atenção que yn = , | y| < 1, concluímos que
n=1
1 y

X
1
3n 3 2x 1 ⇤ 1 4⇥
(2x 1)n = , x2 , .
n=1
5 n 2 3x 4 3 3
12. EXERCÍCIOS DE AVALIAÇÃO 105

Exercício(Frequência, 18-03-2019). Seja f a função 2⇡-periódica dada em [ ⇡, ⇡[ por


8
>
> 0, ⇡  x < 0,
>
<

f (x) = 1, 0  x  ,
>
> 2
>
:0, ⇡ < x < ⇡.
2
a) Determine os coeficientes de Fourier de f .
b) Esboce, justificadamente, o gráfico da soma da série de Fourier de f no
intervalo [ 2⇡, 2⇡].

(a) Determinação dos coeficientes de Fourier de f : a0 =


1 ⇡/2 1 1 ⇡/2 sin(n⇡/2)
ˆ ˆ
d x = , an = cos(nx) d x = e bn =
⇡ 0 2 ⇡ 0 n⇡
1 ⇡/2 2 sin2 (n⇡/4)
ˆ
sin(nx) d x = , n 2 N.
⇡ 0 n⇡
(b) Como a função é seccionalmente derivável em R o teorema de Dirichlet diz-nos que
a representação da série de Fourier de f é dada pela figura.

Exercício (Exame, 26/06/2019). Determine o desenvolvimento em série de potências


numa vizinhança da origem, da função real de variável real, f , de expressão analítica
3
f (x) = , indicando o raio e intervalo de convergência.
(1 x)(1 + 2x)
X X
(a) A série dada pode escrever-se como y n onde y = 3(2x 1)/5. A série yn é
absolutamente convergente em ] 1, 1[. Assim, a série dada é absolutamente conver-
gente para x 2 R tal que 1 < 3(2x 1)/5 < 1, i.e. 5/6 < x 1/2 < 5/6 ou ainda
⇤ ⇥
x 2 1/3, 4/3 , que é a região de convergência absoluta da série dada. O raio de
convergência da série é 5/6.
X1
y
(b) Tendo em atenção que yn = , | y| < 1, concluímos que
n=1
1 y
X
1
3n 3 2x 1 ⇤ 1 4⇥
(2x 1)n = , x2 , .
n=1
5n 2 3x 4 3 3

Exercício (Exame, 26/06/2019). Seja f a função 2⇡-periódica dada em [ ⇡, ⇡] por


8
>
> ⇡ x, ⇡  x < 0,
>
<
f (x) = 0, x = 0,
>
>
>
:⇡ x, 0 < x  ⇡.

• Esboce, justificadamente, o gráfico da soma da série de Fourier de f no


intervalo [ 2⇡, 2⇡].
X
1
2 sin(nx)
• Mostre que a série de Fourier de f é dada por .
n=1
n
106 2. SUCESSÕES E SÉRIES DE FUNÇÕES

X
1
( 1)n 1
• Calcule a soma da série .
n=1
2n 1

(a) Determinação dos coeficientes de Fourier de f :


1 ⇡/2 1 1 ⇡/2 sin(n⇡/2)
ˆ ˆ
a0 = d x = , an = cos(nx) d x =
⇡ 0 2 ⇡ 0 n⇡
1 ⇡/2 2 sin2 (n⇡/4)
ˆ
e bn = sin(nx) d x = , n 2 N.
⇡ 0 n⇡
(b) Como a função é seccionalmente derivável em R o teorema de Dirichlet diz-nos que
a representação da série de Fourier de f é dada pela figura.
CAPíTULO 3

Equações Diferenciais

1. Motivação e definições básicas

Uma equação diferencial é uma relação em que intervêm uma ou mais derivadas de
uma função, i.e.

F x, y, y 0 (x), . . . , y (n) (x) = 0,

onde x representará a variável independente e y representará uma função real de va-


riável real y = y(x). A maior ordem da derivada que aparece designa-se por ordem
da equação diferencial. A função (que a partir de agora designaremos por solução da
equação diferencial) fica, em muitos casos, determinada por uns valores iniciais. Como
regra geral, se uma equação diferencial é de ordem k, então deve especificar-se o valor
da função solução e das suas derivadas até à ordem k 1 num ponto.

Como veremos, em geral, a existência de solução de uma equação diferencial não é um


acontecimento certo. Caso existam, estas classificam-se como

solução geral: é uma função que, para além da variável independente, inter-
vêm n parâmetros ou constantes arbitrárias;
soluções particulares: são as que se obtêm da solução geral por particulariza-
ção dos parâmetros;
soluções singulares: são aquelas que não se podem deduzir da solução geral
atribuindo valores aos parâmetros.

Facilmente se vê que

y = ex é uma solução da equação diferencial y 0 = y.

Também é solução y = 0; e, pensando um pouco mais, não é difícil dar-se conta que
y = C e x é também solução da equação, para qualquer constante C 2 R.

De facto, esta é a solução geral.

Se especificamos o valor de y = y(x) num ponto x, então a solução fica totalmente


determinada. Assim, por exemplo, a solução de

107
108 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

y0 = y com y(0) = 2 é y = 2e x .

De facto, ao substituímos na solução geral x por 0, temos que y = 2, logo 2 = C e0 ,


i.e. C = 2.

Contrariamente ao que acontece no exemplo anterior, a variável x pode aparecer na


equação diferencial.

Por exemplo y0 = x y é uma variante da equação anterior


onde é um pouco mais difícil conjecturar a solução geral.

Mas, reescrevendo-a, tendo em atenção que y 6= 0, como

y0 x2
=x pode ver-se que ln y = + const, const 2 R,
y 2

ou ainda
x2
y = Ce 2 , C 2 R+ , é a solução geral.

Note que, a função y = 0 (que eliminámos no início da resolução do problema) é,


obviamente, uma solução da equação, pois 00 = x ⇥ 0, é uma proposição verda-
deira. Esta é uma solução particular da equação. De facto, ela pode obter-se da solução
geral tomando C = 0.

Considere-se ainda a equação

2
Ä x + C ä2
y0 =y que tem como solução geral y= ,
2

x2
C 2 R. Tomando C = 0, vemos que y = é uma solução particular da equação. Já
4
y = 0, é uma solução da equação que é singular, pois não se obtém por particularização
do parâmetro C, na expressão da solução geral.

Da análise destes exemplos, poder-se-ia pensar, que as solu-


ções de equações diferenciais se determinam por tentativa e
erro. . .
ˆ
0
Como y = f (x) tem como solução y = f (x) d x, podemos, desde já enunciar que

resolver equações diferenciais é pelo menos tão difícil como inte-


grar!

A importância das equações diferenciais advém de participarem em muitos modelos


matemáticos. Por exemplo, se dissermos que o crescimento de uma população, p, é
2. WARM UP 109

proporcional ao número de indivíduos (porque se reproduzem), então o modelo natural


seria p0 = ↵p, onde ↵ é uma constante.

Este é um bom modelo para intervalos de tempo pequenos e em populações redu-


zidas (em número) que se reproduzem rapidamente (por exemplo, colónias de bacté-
rias), mas quando as populações começam a competir por alimento ou se tem em conta
outros factores, a equação diferencial começa a complicar-se.

Em Física, a aceleração é descrita por uma derivada de segunda ordem e a velocidade


por uma derivada de primeira ordem, o que nos leva a considerar, com muita frequên-
cia, equações diferenciais de primeira e segunda ordem para resolver problemas em
Mecânica.

Apesar de que as não estudaremos neste curso, convém mencionar que, em muitas
equações diferenciais que governam modelos matemáticos, intervêm várias variáveis
independentes, pelo que as equações passam a designar-se de equações com deriva-
das parciais.

Por exemplo, em cursos de Física en Engenharia aparecem diferentes equações que


regulam o electromagnetismo, e que explicam fenómenos tão importantes na nossa
vida quotidiana como as ondas usadas em telecomunicações. Na ausência de cargas e
correntes, temos as equações de Maxwell para a intensidade do campo eléctrico E~ e para
a indução magnética B
~:

@B
~ 1 @ E~
div E~ = 0, div B
~ = 0, rot E~ = , rot B
~= .
@t c2 @ t

Só as escrevemos aqui, por curiosidade e para que fique enquadrado o estudo que agora
iniciamos em licenciaturas de Física e áreas afins.

No entanto, devemos realçar, que o “Tratado de Electricidade e Magnetismo”, publi-


cado por Maxwell em 1873 é um hino à Física Teórica. Nele se enunciam as equações
que levam o seu nome, e que expressam matematicamente o que já se conhecia por
experimentação.

2. Warm up

Um denominador comum no estudo das equações diferenciais é a resolução de inte-


grais. Por exemplo é comum designar-se a solução geral de uma dada equação diferen-
cial como o seu integral geral. Assim, começamos este texto com o cálculo de alguns
integrais e técnicas de integração com as quais se cruzará ao longo deste curso.

Vimos já que
110 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

ˆ
x 0 x
e =e , pelo que e x d x = e x + c, c 2 R.

ˆ
Exemplo 3.1. Calcular x 3 e x d x.

Neste caso podemos procurar uma função f de expressão analítica

f (x) = (a x 3 + b x 2 + c x + d)e x

de forma que

f 0 (x) = a x 3 + (3a + b)x 2 + (2b + c)x + (c + d) e x = x 3 e x ,

logo

a = 1, b = 3, c = 6, d = 6,

ou seja
ˆ
x 3 e x d x = (x 3 3x 2 + 6x 6)e x + const, const 2 R.

Note que podíamos ter usado integração por partes para determinar o anterior integral.
De facto, da derivada do produto de duas funções diferenciáveis, f , g, num mesmo
intervalo, I ⇢ R é dada por ( f ⇥ g)0 = f 0 ⇥ g + f ⇥ g 0 pelo que
ˆ ˆ
0
f ⇥gdx = f ⇥g f ⇥ g 0 d x,

que é conhecida como fórmula de integração por partes. Da mesma forma, usando a
du dv
notação de Leibniz (que é amplamente usada em Física), u0 = e v0 =
dx dx
e cancelando termos (i.e. d x), escrevemos a fórmula anterior como
ˆ ˆ
u d v = uv v d u.
ˆ
Exemplo 3.2. Calcular x e x d x.

Note-se que (x e x )0 = x e x + e x , pelo que integrando


ˆ ˆ
x x
xe d x = xe e x d x = x e x e x + const, const 2 R.
ˆ
Exemplo 3.3. Calcular x cos(3x) d x.

Supondo que o integral procurado é da forma


ˆ
x cos(3x) d x = Ax sin(3x) + B cos(3x) + const, const 2 R,
2. WARM UP 111

obtemos

x cos(3x) = (Ax sin(3x) + B cos(3x) + const)0 = 3Ax cos(3x) + (A 3B) sin(3x)

1 1
logo A = , B = e, portanto
3 9
1 1
ˆ
x cos(3x) d x = x sin(3x) + cos(3x) + const, const 2 R.
3 9
Exemplo 3.4. Teste o que aprendeu calculando os integrais
ˆ ˆ ˆ
5x 2
xe d x, x sin(3x) d x e (x 1) sin(x) + (2x + 3) cos(x) d x.

Note que deverão ser, respectivamente, da forma

5x
(Ax + B)e + const, C x 2 cos(3x) + D x sin(3x) + E cos(3x) + const

e também, (↵1 x + 1 ) cos(3x) + (↵2 x + 2 ) sin(3x) + const, const 2 R.

Tem agora que determinar as constantes reais A, B, C, D, E, ↵1 , ↵2 , 1, 2 que tornam


verdadeiras as identidades. Para tal, derive estas últimas expressões e compare-as com
as funções integrandas de onde partiu.
ˆ
Exemplo 3.5. Calcular e x cos x d x.

Aplicando o método de primitivação por partes


ˆ ˆ
x x x
I := e cos x d x = e cos x e sin x d x
ˆ
x x x
= e cos x + e sin x e cos x d x.

Logo

x x x x
I= e cos x + e sin x I, i.e. 2II = e cos x + e sin x,

ou ainda
x
e
ˆ
x
e cos x d x = cos x sin x + c, c 2 R.
2

Como consequência da derivada da composta, temos


ˆ
h 0 g (x) g 0 (x) d x = h g (x) + ,  constante real.

Substituindo, à la mode de Newton, h por uma sua primitiva, f , temos que


ˆ ˆ
0
f g (x) g (x) d x = f (t) d t mudança de variável t = g (x).
112 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Aqui também podemos aplicar a notação de Leibniz, afirmando que a mudança de variá-
vel t = g (x) implica d t = g 0 (x) d x, ou escrevendo d x em função de d t, obtendo-se
uma vez mais
ˆ ˆ
0
f g (x) g (x) d x = f (t) d t com t = g (x).

Não nos devemos esquecer de desfazer a mudança efectuada para obter uma função
em x. Para integrais definidos a integração de mudança de variável lê-se
ˆ b ˆ g (b)
0
f g (x) g (x) d x = f (t) d t.
a g (a)
ˆ p
Exemplo 3.6. Calcular x x 2 + 4 d x.

Neste caso, fazendo u = x 2 +4 e tendo em atenção que d u = 2x d x o integral reescreve-


-se na forma,
1Ä ä 1 3ó
ˆ p
1
ˆ
1 3
x x + 4d x =
2 u2 du = u2 + const = (x 2 + 4) 2 + const,
2 u=x +4
2
3 u=x +4
2
3
const 2 R.
1
ˆ
Exemplo 3.7. Calcular d x.
(x 2 + 1)(x 2 + 4)

Neste caso, deve começar por reescrever, por aplicação do método de Hermite a função
integranda na forma
1 A B
= + ,
(x 2 + 1)(x 2 + 4) x2 + 1 x2 + 4
onde
1 ó 1 1 ó 1
A= = e B= = ,
x + 4 x!ii 3
2 x 2 + 1 x!2ii 3
e usar a linearidade do integral; assim,
1 1 1 1 1/2
ˆ ˆ ˆ
dx = dx dx
(x + 1)(x + 4)
2 2 3 x +1
2 6 (x/2)2 + 1
donde se conclui que o integral procurado é
1 1 1 x
ˆ
d x = arctan(x) + arctan + const, const 2 R.
(x 2 + 1)(x 2 + 4) 3 6 2
1
ˆ
Exemplo 3.8. Calcular d x.
(x 1)(x + 4)

Comece por escrever


1 1 1 ↵
= + = ,
(x 1)(x + 4) x 1 x +4 x 1 x +1
2. WARM UP 113

onde
1 ó 1 1 ó 1
↵= = e = = .
x +4 x!1 5 x 1 x! 4 5
Assim,
1 1Ä 1 1 ä
ˆ ˆ ˆ
dx = dx dx
(x 1)(x + 4) 5 x 1 x +4
1
= ln(x 1) ln(x + 4) + c, c2R se x > 1.
5
Pode ver-se ainda que
8
>
> 1
ln 1x x4 + c1 se x < 4,
>
<5
1
ˆ
d x = 51 ln 1x+4x + c2 se 4 < x < 1, c1 , c2 , c3 2 R.
(x 1)(x + 4) >
>
>
: 1 ln x 1 + c
5 x+4 3 se x > 1,

1
ˆ
Exemplo 3.9. Calcular d x.
x 2 (1 x 2)

Comece por ver que


1 1 1 1 1Ä 1 1 ä
= + = + + ,
x 2 (1 x 2 ) x2 1 x2 x2 2 1 x 1 + x
assim, para |x| < 1 tem-se para toda const 2 R,
1 1 1 1
ˆ
dx = ln(1 x) + ln(1 + x) + const
x (1 x )
2 2 x 2 2
1 1 Ä 1+ x ä
= + ln + const .
x 2 1 x
1 1
ˆ ˆ
Exemplo 3.10. Calcular dx e d x.
sin x cos x

Comecemos por notar que


1 cos2 (x/2) + sin2 (x/2) 1 cos(x/2) 1 sin(x/2)
= = + ;
sin x 2 cos(x/2) sin(x/2) 2 sin(x/2) 2 cos(x/2)
logo
ˆ
1 Ä x ä Ä x ä
d x = ln sin ln cos + c, c 2 R,
sin x 2 2
ou ainda, para todo x 2]0, ⇡[, temos
ˆ
1 Ä x ä
d x = ln tan + const .
sin x 2

Para o segundo integral basta ter em conta que


Ä ⇡ä
cos(x) = sin x + .
2
114 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Assim sendo,
ˆ
1 Ä Ä x ⇡ ää ⇤ ⇡ ⇡⇥
d x = ln tan + + const, x2 , .
cos(x) 2 4 2 2

3. Equações diferenciais lineares de primeira ordem

Estamos em presença de uma equação diferencial de primeira ordem, quando preten-


demos determinar uma função,

y tal que y 0 (x) = x.

A solução deste problema é obviamente


x2
y(x) = + const, onde const é uma constante real.
2
Esta é a forma geral das soluções que satisfazem a equação diferencial dada, pelo que
será denotada por solução geral da equação diferencial. Mas se o problema for o de
determinar

y tal que y 0 (x) = x com y(0) = 5,

x2
começamos por considerar a solução geral y(x) = + const e determinamos const de
2
forma que a condição inicial se verifique, i.e. y(0) = 5. Assim, const = 5 e, portanto, a
x2
solução do nosso problema é y(x) = + 5.
2
Considere-se agora o problema de valor (condição) inicial:

determinar y tal que y 0 (x) = y(x) e y(1) = 2e,

onde e ⇡ 2.718 representa o número de Euler.

Procuramos assim funções cuja derivada coincide com a função dada. Esta é uma
propriedade das funções exponenciais. A solução geral da equação diferencial é pois
y(x) = ce x . A condição inicial diz-nos que

y(1) = ce = 2e logo c = 2;

A solução do problema de condição inicial é y(x) = 2e x .

Relembremos agora a seguinte identidade


d g(x)
e = g 0 (x)e g(x) .
dx
Quandoˆg é um integral indefinido, i.e. existe uma função p tal que g 0 (x) = p(x), i.e.
g(x) = p(x) d x, podemos dizer que

d
´ ´
p(x) d x p(x) d x
e = p(x)e .
dx
3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE PRIMEIRA ORDEM 115

Exemplo 3.11 (equação diferencial linear de primeira ordem). Determinar a solução


geral da equação

y 0 + p(x) y = g(x).

Multiplicando ambos os membros da equação por


Ĉ ä
exp p(x) d x

obtemos
´ ´
p(x) d x 0 p(x) d x
ye = g(x)e ,

cuja solução é imediata. De facto,


´ ˆ ´
p(x) d x p(x) d x
y=e g(x)e d x.

Exemplo 3.12. Determine a solução do problema

y 0 + 2x y = x, y(0) = 2.

Neste´caso p(x) = 2x e g(x) = x. Assim, multiplicando ambos os membros da equação


2
2x d x
por e = e x a equação toma a forma,
1
ˆ
x2 0 x2 x2 2
x2
e y = xe pelo que y = e x e x d x = + const e , const 2 R.
2
Tendo em atenção a condição inicial obtemos
1 3
+ const = 2 logo const = .
2 2
1 3 x2
A solução procurada é y(x) = + e .
2 2
Exemplo 3.13. Determine a solução do problema
1 ⇡
y0 + y = cos(2t), y = 1.
t 2

1
Neste caso p(t) = e g(t) = cos(2t). Assim, multiplicando ambos os membros da
´ t
1 0
equação por e t d t = t, se t > 0 a equação toma a forma t y = t cos(2t), pelo que
1 1 1 const
ˆ
y= t cos(2t) d t = sin(2t) + cos(2t) + , const 2 R.
t 2 4t t
Tendo em atenção a condição inicial obtemos
1 2 const ⇡ 1
+ =1 logo const = + .
2⇡ ⇡ 2 4
1 1 ⇡/2 + 1/4
A solução procurada é y(t) = sin(2t) + cos(2t) + .
2 4t t
116 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Qual o intervalo máximo de definição da solução encontrada?


Neste caso é ]0, +1[.

Exemplo 3.14. Determine a solução do problema

x y 0 + 2 y = sin(x), y( ⇡) = 2.

2 sin(x)
Neste caso p(x) = e g(x) = (não se esqueça que o coeficiente da derivada de
x x
maior ordem deve ser 1 para poder aplicar o método
´ de resolução indicado). Assim,
2
dx
multiplicando ambos os membros da equação por e x = x 2 , se x < 0 a equação
toma a forma
0
x2 y = x sin(x),

pelo que
1 cos(x) sin(x) const
ˆ
y= 2 x sin(x) d x = + + , const 2 R.
x x x2 x2
Tendo em atenção a condição inicial obtemos
1 const
+ = 2 logo const = 2⇡2 + ⇡.
⇡ ⇡2
cos(x) sin(x) 2⇡2 + ⇡
A solução procurada é y(t) = + + , x 2] 1, 0[.
x x2 x2

4. Equações diferenciais de variáveis separáveis

Suponhamos dada uma função real F na variável y, com y dependente da variável x,


i.e. y = y(x), tendo-se assim que F depende em última análise de x, ou seja F y(x) .
Aplicando a regra da cadeia, derivando em ordem a x, F y(x) , obtemos
d dy
F y(x) = F 0 y(x) .
dx dx
Considere agora duas funções reais F ( y) e G(x), com derivadas

F 0 ( y) = f ( y), G 0 (x) = g(x),


ˆ ˆ
i.e. f ( y) d y = F ( y) + c, g(x) d x = G(x) + d, c, d 2 R.

O nosso objectivo é resolver a equação


dy
(?) f ( y) = g(x), que é uma equação diferencial não linear.
dx
Reescrevendo a equação anterior em termos das funções F e G tem-se que
dy
F 0 ( y) = G 0 (x).
dx
4. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS DE VARIÁVEIS SEPARÁVEIS 117

Aplicando agora regra da cadeia (acima indicada) encontramos a seguinte identidade


d d
F y(x) = G(x).
dx dx
Assim, se as derivadas de duas funções coincidem, elas diferem numa constante, i.e.

(??) F ( y) = G(x) + c, c 2 R.

Acabamos de obter a solução geral da equação (?). A solução está definida por meio
de uma equação (??), que pode ser definida implicitamente como função de x ou de y
na vizinhança de algum ponto que a verifique.

Descrevemos, de seguida, um procedimento que nos leva directamente à solução de (?).


dy
Olhemos para não como a notação de derivada, mas como quociente entre dois
dx
números, d y e d x, i.e.

f ( y) d y = g(x) d x.

Desta forma separamos as variáveis, ficando tudo o que diz respeito a y no primeiro
membro, enquanto que a variável x fica no segundo membro. Integrando em ambos
os membros tem-se que
ˆ ˆ
f ( y) d y = g(x) d x i.e. F ( y) = G(x) + c, c2R ou seja (??).

dy
Exemplo 3.15. Resolva a equação diferencial = x( y 2 + 9).
dx

Separando as variáveis, i.e. multiplicando por d x e dividindo por y 2 + 9, obtemos


ˆ
dy
ˆ
1 Äyä 1
= x d x cuja solução é arctan = x 2 + c, c 2 R.
y2 + 9 3 3 2
Neste caso podemos obter y como função de x:
Ä3 ä
y(x) = 3 tan x 2 + 3c , c 2 R.
2
Exemplo 3.16. Determine a solução geral da equação diferencial

x y 2 + x d x + e x d y = 0.

A equação diferencial encontra-se escrita em notação de diferenciais. Reescreva-mo-la


na forma
1 x x x
dy= xe dx cuja solução é arctan( y) = x e +e + c, c 2 R.
y2 +1
Podemos determinar y como função de x:

x x
y(x) = tan x e +e +c , c 2 R.
118 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

dy
Exemplo 3.17. Determine todas as solução da equação diferencial = y 2.
dx

Separando as variáveis obtemos que


dy 1
ˆ ˆ
= d x, ou ainda, = x + c, c 2 R.
y2 y
1
Obtemos assim que y = , c 2 R é um conjunto de soluções.
x+c
No entanto, na separação das variáveis, dividimos por y 2 , o que só é admissível se
y 2 6= 0. Observe agora que y 2 = 0 leva-nos à solução y = 0 que não figura no conjunto
de soluções anteriormente encontrado. Dizemos que esta solução da equação inicial
é singular.

5. Equação diferencial de Bernoulli

Vejamos como resolver a equação

y 0 (t) = p(t) y(t) + g(t) y n (t),

onde p, g são funções dadas e n um número real dado diferente de 0 e de 1.

Observe-se que, quando n = 0, a equação anterior toma a forma

y 0 (t) = p(t) y(t) + g(t),

que é uma equação diferencial linear de primeira ordem (estudada na secção 3).
Já quando n = 1, a equação anterior toma a forma
y 0 (t)
y 0 (t) = p(t) + g(t) y(t), i.e. = p(t) + g(t),
y(t)
que é uma equação diferencial linear de variáveis separadas (estudada na secção 4),
cuja solução é dada, para t tal que y(t) > 0, como
ˆ ´
p(t)+g(t) d t
ln y(t) = p(t) + g(t) d t ou ainda y(t) = e .

Retornando à equação y 0 (t) = p(t) y(t) + g(t) y n (t), considerando n 2 R \ {0, 1}, e
dividindo por y n obtemos

n
y y 0 (t) = p(t) y 1 n (t) + g(t).
0
Tomando = y 1 n (t), e calculando 0
= (1 n) y n
y 0 , i.e. =y n
y 0 , a equação
1 n
anterior toma a forma

0
(t) = (1 n)p(t) (t) + (1 n)g(t), com = y 1 n (t),
6. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EXACTAS 119

que é linear em . Depois de a resolver, calculamos y a partir de


1
y(t) = 1 n (t).

t
Exemplo 3.18. Determine a solução geral de y 0 = y + p .
y
1
Multiplicando a equação por y 2 obtemos
1 3
y 2 y 0 = y 2 + t,
3
0 3 1 0
e tomando = y 2 , vemos que = y 2 y , pelo que
2
2 0 0 3 3 3
t 0 3 3
t
= +t ou ainda = t i.e. e 2 = te 2 .
3 2 2 2
Integrando em ordem a t obtemos sucessivamente
3 2 3t 2
ˆ
3 3 3 3
t
e 2 = te 2 t d t = te 2 t e 2 + const logo = t + const e 2 t .
2 3 3
2 3 2
Voltando a y, tem-se y(t) = t + const e 2 t 3
, const 2 R.
3
Exemplo 3.19. Determine a solução geral de y 0 = 3 y 2 + 4 y.

Comecemos por observar que y = 0 é solução da equação. Multiplicando a equação


2
por y obtemos
2 1
y y0 = 3 + 4 y , y 6= 0,
1 0 2
e tomando =y , vemos que = y y 0 , pelo que
0
0
=4 +3 ou ainda 0
+4 = 3 i.e. e4t = 3 e4t .

Integrando em ordem a t obtemos sucessivamente


3 3 4t 3
ˆ
4t
e = 4e4t d t = e + const logo = + const e 4t
.
4 4 4
1 3 4t
Voltando a y, tem-se que se y 6= 0, = + const e , const 2 R.
y 4

6. Equações diferenciais exactas

Nesta seção trataremos das equações diferenciais exatas. Embora esta classe de equa-
ções seja bastante especial, ela ocorre em geral nas aplicações.

Comecemos por relembrar a noção de derivada parcial. Dada uma função real de va-
riável real dependendo de um parâmetro a 2 R, por exemplo f (x) = x 2 + a, então
dg
f 0 (x) = 2x. Já para a função g(x) = x 2 + y 3 , de parâmetro y, = 2x.
dx
Outra notação para o mesmo objecto é, g 0x = 2x.
120 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Podemos ainda ‘olhar’ para g como uma função de duas variáveis, i.e. g ⌘ g(x, y) =
x 2 + y 3 . Neste caso a derivada parcial de g relativamente a x é calculada conside-
@g
rando y um parâmetro, i.e. g 0x = 2x, ou em notação equivalente, = 2x. Temos
@x
@g
ainda a derivada parcial de g relativamente a y dada por g 0y = = 3 y 2 . A deri-
@y
vada g 0y dá-nos a taxa de variação em y para cada x fixo.

A equação

y 2 + 2x y y 0 = 0 aqui tomamos y = y(x)

pode resolver-se se a reescrevermos na forma


d
x y 2 = 0, então x y 2 = c, c 2 R+
dx
c
e a solução é y(x) = ± p , c 2 R+ .
x
Vejamos como levar este tipo de argumento a equações gerais na forma

(*) M (x, y) + N (x, y) y 0 (x) = 0, M e N funções dadas.

Note que no exemplo anterior M (x, y) = y 2 e N (x, y) = 2x y.

Diremos que a equação diferencial (*) é exacta se existir uma função ' com derivadas
parciais de segunda ordem contínuas tal que
d
M (x, y) + N (x, y) y 0 (x) = '(x, y) = 0.
dx
A solução de (*) virá dada por '(x, y) = c, c 2 R.

Temos então duas questões a considerar:

• Que condições devem satisfazer M e N para que a equa-


ção (*) seja exacta?
• Se a equação (*) é exacta, como determinar '?

Teorema 3.1. Sejam M , N , M y0 e Nx0 funções contínuas no círculo D = (x, y) 2 R2 :


(x x 0 )2 + ( y y0 )2 < r 2 centrado num ponto (x 0 , y0 ) 2 R2 . Então, a equação (*) é
exacta em D se, e somente se,

M y0 (x, y) = Nx0 (x, y), (x, y) 2 D.

Analisemos o que nos diz este teorema. Assumindo que a equação (*) é exacta, então
existe ' tal que
d
M (x, y) + N (x, y) y 0 (x) = '(x, y),
dx
6. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS EXACTAS 121

i.e.

M (x, y) + N (x, y) y 0 (x) = ' 0x + ' 0y y 0 , (x, y) 2 D.

Logo ' 0x = M e ' 0y = N . Calculando a derivada rectangular

M y0 = ' 00x y = Nx0 Teorema de Clairaut

Vejamos que também se tem o recíproco. Comecemos por supor que M y0 = Nx0 e cons-
truimos ' de forma que

' 0x = M (x, y), ' 0y = N (x, y).

Primitivando a primeira equação em ordem a x tem-se


ˆ x
(•) '(x, y) = M (t, y) d t + h( y), h é uma função arbitrária e x 0 é dado.
x0

Para determinar h, derivemos em ordem a y esta expressão de ' e igualamos a N , i.e.


ˆ x
' 0y (x, y) = M y0 (t, y) d t + h0 ( y) = N (x, y)
x0

ou ainda,
ˆ x
0
(••) h ( y) = N (x, y) M y0 (t, y) d t ⌘ p(x, y).
x0

Mostremos que p assim definido não depende de x:


@
p(x, y) = Nx0 M y0 = 0 por hipótese.
@x
Logo p é função somente de y e a equação (••) toma a forma

h0 ( y) = p( y).

Determinamos agora ' integrando em ordem a y esta última identidade e substituindo


h assim encontrado em (•).

Relembremos que a equação (com diferenciais)

M (x, y) d x + N (x, y) d y = 0,

é uma forma equivalente de escrever (*), logo é exacta se, e somente se, M y0 = Nx0 ,
x, y 2 D.

Exemplo 3.20. Considere a equação diferencial


dy
e x sin( y) + y 3 3x e x cos( y) = 0.
dx
Verifique se se trata de uma equação diferencial exacta.
122 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Neste caso M (x, y) = e x sin( y) + y 3 e N (x, y) = 3x + e x cos( y). Calculemos

M y0 (x, y) = e x cos( y) + 3 y 2 , Nx0 (x, y) = 3 + e x cos( y).

Logo a equação não é exacta.

Exemplo 3.21. Determine a solução da equação diferencial


Äy ä
+ 6x d x + ln(x) 2 d y = 0, x > 0.
x
y
Neste caso M (x, y) = x + 6x e N (x, y) = ln(x) 2 e tem-se
Äy ä0 1 0 1
M y0 = + 6x = , Nx0 = ln(x) 2 = , x > 0.
x x x
Determinamos ' a partir das identidades
y
' 0x = + 6x, ' 0y = ln(x) 2.
x
Da primeira, obtemos

' = y ln(x) + 3x 2 + h( y), h é uma função arbitrária em y.

Tomando a derivada parcial em ordem a y e comparando com a expressão anterior


temos

' 0y = ln(x) + h0 ( y) = ln(x) 2, i.e. h0 ( y) = 2,

logo h( y) = 2 y e, portanto, '(x, y) = y ln(x) + 3x 2 2 y, pelo que a solução geral


da equação é dada por

y ln(x) + 3x 2 2 y = c, c 2 R.

Podemos ainda trabalhar um pouco mais esta equação, obtendo y como função de x

c 3x 2
y= , x > 0.
ln(x) 2

Exemplo 3.22. Determine b 2 R tal que a equação diferencial

2x 3 e2x y + x 4 y e2x y + x d x + bx 5 e2x y d y = 0,

é exacta, e determine, para o b encontrado, a solução geral.

Neste caso M (x, y) = 2x 3 e2x y + x 4 y e2x y + x e N (x, y) = bx 5 e2x y . Assim, para que a
equação dada seja exacta, b 2 R é tal que

M y0 (x, y) = 4x 4 e2x y + 2x 5 y e2x y + x 4 y e2x y = b 5x 4 + 2 y x 5 )e2x y = Nx0 (x, y).


7. TEOREMA DE EXISTÊNCIA E UNICIDADE 123

Logo b = 1 torna a equação 2x 3 e2x y + x 4 y e2x y + x d x + x 5 e2x y d y = 0 exacta.


Determinemos ' tal que

' 0x = 2x 3 e2x y + x 4 y e2x y + x, ' 0y = x 5 e2x y .

Neste caso começamos por integrar a segunda equação em ordem a y, obtendo


1 4 2x y
'(x, y) = x e + h(x), h é uma função arbitrária em y.
2
Substituindo ' que acabamos de determinar na primeira equação

' 0x = 2x 3 + x 4 y e2x y + h0 (x) = 2x 3 e2x y + x 4 y e2x y + x,


x2
i.e. h0 (x) = x e, portanto h(x) = 2 e, portanto,
1 4 2x y x 2
'(x, y) = x e + ,
2 2
e a solução geral é dada por
1 4 2x y x 2 1 Ä 2c x 2 ä
x e + = c, ou y= ln , c 2 R.
2 2 2x x4
As equações diferenciais exactas aparecem quando se estudam campos de vectores con-
servativos. Relembre que um campo de vectores

F (x, y) = M (x, y), N (x, y) ,

diz-se conservativo se existir uma função ' tal que F (x, y) = grad '. Tendo em conta que
î ó
grad ' = ' 0x ' 0y ,

temos que

' é tal que ' 0x = M e ' 0y = N ,

que são as mesmas relações que encontramos no estudo das equações diferenciais
exactas.

7. Teorema de existência e unicidade

Considere-se o problema de condição inicial

y 0 = f (x, y), y(x 0 ) = y0 ,

onde f é uma função dada e x 0 , y0 são dois números dados.

Teorema (existência e unicidade). Seja f uma função real de variável real definida
numa vizinhança de (x 0 , y0 ). Se f e f y0 são contínuas nessa vizinhança, então o problema
enunciado tem uma e uma só solução. Além disso, a solução y = y(x) está definida num
intervalo ]x 1 , x 2 [ contendo x 0 no seu interior.
124 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Estas condições são facilmente verificáveis e não são muito restritivas como veremos
nos seguintes exemplos.

Exemplo 3.23. Resolva o seguinte problema de condição inicial


p
y0 = y, y(0) = 0.

p
A função f (x, y) = y é contínua para y 0 mas a sua derivada parcial em ordem a

@f 1
=p , que nem sequer está definida em (0, 0).
@y y

Logo a função f não está nas condições do teorema.


x2
Pode ver-se que a função y(x) = é solução do problema; no entanto existe uma
4
outra solução, y(x) = 0 (pelo que não se tem unicidade da solução do problema).

Exemplo 3.24. Resolva o seguinte problema de condição inicial

y 0 = y 2, y(0) = 1.

@f
A função f (x, y) = y 2 , = 2 y, são contínuas em R2 . Podemos então aplicar o
@y
1
teorema anterior e concluir que a função y(x) = é a solução do problema em
1 x
] 1, 1[.

8. Equações diferenciais de segunda ordem

O tópico principal deste capítulo é o estudo das equações diferenciais lineares de se-
gunda ordem com coeficientes constantes. Essas equações, embora relativamente fá-
ceis de resolver, são de grande importância, na modelização de problemas de oscilações
mecânicas e elétricas.

Vamos começar por considerar alguns exemplos de equações diferenciais de segunda


ordem. Começamos pela que tem aparência mais simples,

y 00 (x) = 0.

Integrando duas vezes, obtemos sucessivamente

y 0 (x) = c1 , y(x) = c1 x + c2 , c1 , c2 2 R.

Este exemplo sugere que a solução geral de uma equação diferencial de segunda ordem
depende de duas constantes reais.
8. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 125

Uma equação diferencial de segunda ordem em y pode escrever-se como

y 00 (x) = f x, y(x), y 0 (x) ,

onde f é uma função real de três variáveis reais.

Vamos analisar alguns casos especiais destas equações diferenciais cujo estudo se pode
reduzir a uma equação diferencial de primeira ordem.

Exemplo 3.25 ( y não está presente na equação). Resolver em y a equação diferencial


de segunda ordem t y 00 y 0 = t 2.

Como se pode ver as derivadas de y estão presentes na equação enquanto y não. To-
mando (t) = y 0 (t), tem-se 0
(t) = y 00 (t) e a equação diferencial toma a forma
0 1
= t, (t) = y 0 (t).
t
Trata-se de uma equação diferencial de primeira ordem linear em . Multiplicando a
equação por
1
´
1
dt
e t = , t 2 R+ ,
t
transformamo-la noutra equivalente à primeira, na forma
Ä 1 ä0
= 1, i.e. = t 2 + c1 t, c1 2 R.
t
Assim,
t3 t2
y 0 = t 2 + c1 t e, portanto, y(t) = + c1 + c2 , c1 , c2 2 R, t 2 R+ .
3 2
Exemplo 3.26 (x não está presente na equação). Resolva a equação diferencial de
3
segunda ordem y 00 + y y 0 = 0.

A variável x não aparece explicitamente na equação. Assim, ao dizermos que

y 0 = ( y) vemos que y 00 = 0
( y) y 0 i.e. y 00 = 0
.

Substituindo na equação obtemos


0 3 0 2
+y =0 ou ainda +y = 0.

Se o primeiro termo é zero, tem-se y 0 = = 0, pelo que y = c é uma solução da


equação. Já se o segundo termo for nulo tem-se
d d
ˆ ˆ
2
+y =0 ou ainda = y d y.
dy 2

Concluímos assim que


1 y2 y 2 + 2c1 dy 2
= + c1 = i.e. = = .
2 2 dx y 2 + 2c1
126 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Para resolver esta última equação separamos as variáveis

y3
ˆ ˆ
2
( y + 2c1 ) d y = 2 d x logo + 2c1 y = 2x + c2 , c1 , c2 2 R,
3
obtendo assim uma segunda família de soluções da equação inicial.

9. Equações diferenciais lineares homogéneas de segunda ordem


com coeficientes constantes

O nosso objectivo é o de determinar

y = y(t) tal que a y 00 (t) + b y 0 (t) + c y(t) = 0,

onde a, b, c são constantes reais dadas. Esta é uma equação diferencial linear de se-
gunda ordem, homogénea, de coeficientes constantes.

Esta equação é linear pois está expressa como combinação linear de y, y 0 e y 00 e, é


homogénea, pois o segundo membro da equação é 0.

Vejamos que se y é solução, também é solução da equação dada a função 2 y. De facto,

a(2 y)00 + b(2 y)0 + c(2 y) = 2(a y 00 + b y 0 + c y) = 0.

Da mesma forma provamos que c1 y, com c1 2 R é também solução.

Já se y1 , y2 são duas soluções da equação dada então c1 y1 + c2 y2 , c1 , c2 2 R é ainda


uma solução.

Para tal basta verificar que a soma algébrica y1 + y2 ou y1 y2 é solução:

a( y1 ± y2 )00 + b( y1 ± y2 )0 + c( y1 ± y2 ) = (a y100 + b y10 + c y1 )±(a y200 + b y20 + c y2 ) = 0.

Acabamos de provar que se tem o princípio da sobreposição linear de soluções.


t
Exemplo 3.27. As funções y1 = e2t e y2 = e 3 são soluções da equação diferencial

3 y 00 5 y0 2 y = 0.

De facto,

3 y100 5 y10 2 y1 = 3 ⇥ 22 5 ⇥ 2 2 e2t = 0,


Ä Ä 1 ä2 Ä 1ä ä t
3 y200 5 y20 2 y2 = 3 ⇥ 5⇥ 2 e 3 = 0,
3 3
Assim,
t
y(t) = c1 e2t + c2 e 3 , c1 , c2 2 R, é solução da equação.
9. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE COEFICIENTES CONSTANTES 127

Mais geralmente, a resolução destas equações passa pela procura de r 2 C tal que e r t
é solução da equação, i.e.

a r 2 e r t + b r e r t + ce r t = ar 2 + br + c e r t = 0

Temos assim que determinar r 2 C tal que ar 2 + br +c = 0, que designamos por equação
característica. Da mesma forma dizemos que ar 2 + br + c é o polinómio característico
da equação diferencial dada.

Note que

se r é uma raiz do polinómio característico, então e r t é solução


da equação diferencial.

Observe que um polinómio do segundo grau, pode ter duas raízes reais e distintas, uma
raiz real de multiplicidade 2 (ou raiz dupla) ou duas raízes complexas conjugadas.

9.1. O polinómio característico tem duas raízes reais distintas. Suponhamos


que r1 6= r2 são duas raízes do polinómio característico. Então e r1 t e e r2 t são duas
soluções da equação diferencial, e a combinação linear delas,

y(t) = c1 e r1 t + c2 e r2 t , c1 , c2 2 R

é a solução geral da equação diferencial.

Exemplo 3.28. Determina a solução do problema de condições iniciais governado pela


equação diferencial linear homogénea de coeficientes constantes

y 00 + 4 y 0 + 3 y = 0, y(0) = 2, y 0 (0) = 1.

Considerando que y(t) nos dá o espaço percorrido, y(0) = 2, y 0 (0) = 1 diz-nos que
no momento inicial a partícula se encontra na posição 2 com velocidade 1. Estas
são conhecidas como condições iniciais do problema, pelo que o problema em questão
diz-se de condições iniciais ou de Cauchy.

Neste caso o polinómio característico é

r 2 + 4r + 3 = (r + 1)(r + 3), pelo que as suas raízes são 3e 1.

Assim, a solução geral da equação diferencial é dada por

y(t) = c1 e 3t
+ c2 e t , c1 , c2 2 R.

Determinemos c1 , c2 de forma que se verifiquem as condições iniciais:

y(0) = c1 + c2 , y 0 (0) = 3c1 c2 pelo que c1 + c2 = 2, 3c1 c2 = 1


128 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

1 5
logo c1 = e c2 = e, portanto a solução do problema vem dada por
2 2
1 3t 5 t
y(t) = e + e .
2 2
Exemplo 3.29. Determina a solução geral da equação diferencial linear homogénea
de coeficientes constantes y 00 4 y = 0.

Neste caso o polinómio característico é

r2 4 = (r + 2)(r 2) pelo que as suas raízes são 2 e 2.

Assim, a solução geral da equação diferencial é dada por


2t
y(t) = c1 e + c2 e2t , c1 , c2 2 R.

9.2. O polinómio característico tem um raíz dupla. Quando r1 = r2 , então


y(t) = e r1 t é solução da equação diferencial, bem como y(t) = c1 e r1 t , c1 2 R.

Mas isto não chega!

Será preciso encontrar uma nova solução realmente diferente da anterior. Neste caso,
pode provar-se que a função y2 (t) = t e r1 t é ainda solução da equação, pelo que a
solução geral da equação será

y(t) = c1 e r1 t + c2 t e r1 t , c1 , c2 2 R.

Vejamos como justificar esta escolha: comece por escrever o polinómio característico

ar 2 + br + c = a(r r1 ) 2 pelo que ar 2 + br + c = ar 2 2ar1 r + ar12 ;

logo b = 2ar1 ; Substituindo y2 (t) = t e r1 t na equação, atendendo a que

y20 (t) = (1 + r1 t) e r1 t e também y200 (t) = (2r1 + r12 t) e r1 t ,

tem-se sucessivamente

a y200 (t) + b y20 + c y2 = ae r1 t 2r1 + r12 t + be r1 t 1 + r1 t + c t e r1 t ,

= e r1 t 2ar1 + b + t e r1 t ar12 + br1 + c = 0

Observe que r1 é raiz do polinómio característico e que b = 2ar1 .

Exemplo 3.30. Determine a solução geral da equação diferencial linear homogénea


de coeficientes constantes 9 y 00 + 6 y 0 + y = 0.

O polinómio característico é dado por


1
9r 2 + 6r + 1, cuja raiz é (raiz dupla)
3
1 1
t t
A solução geral vem dada por y(t) = c1 e 3 + c2 t e 3 , c1 , c2 2 R.
9. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE COEFICIENTES CONSTANTES 129

Exemplo 3.31. Determine a solução do seguinte problema de Cauchy

y 00 4 y 0 + 4 y = 0, y(0) = 1, y 0 (0) = 2.

O polinómio característico é dado por

r2 4r + 4, cuja raiz é 2 (raiz dupla)

A solução geral vem dada por y(t) = c1 e2t + c2 t e2t , c1 , c2 2 R.

Observe que y 0 (t) = (2c1 + c2 ) e2t + 2c2 t e2t , pelo que as condições iniciais, determi-
nam c1 e c2

y(0) = 1, y 0 (0) = 2, isto é c1 = 1, 2c1 + c2 = 2, logo c1 = 1, c2 = 4.

A solução do problema é y(t) = (1 4t)e2t .

9.3. O polinómio característico tem duas raízes complexas conjugadas. Antes


de começarmos a discussão deste último caso, vamos relembrar a fórmula de Euler

ei # = cos(#) + i sin(#), # 2 R.
p
Tomando z = i #, onde i = 1 é a unidade imaginária, na representação de Taylor
da função exponencial,
z2 z3 z4 z5
ez = 1 + z + + + + + ··· , z 2 C,
2 3! 4! 5!
obtemos
i# (ii #)2 (ii #)3 (ii #)4 (ii #)5
e = 1+i# + + + + + ···
2 3! 4! 5!
#2 #4 #3 #5
= 1 + + ··· +i # + + ···
2! 4! 3! 5!
= cos(#) + i sin(#), # 2 R. c.q.d.

Na resolução anterior tivemos em atenção a representação de Taylor das funções seno


e co-seno
#2 #4
cos(#) = 1 + + ··· , t 2R
2! 4!
#3 #5
sin(#) = # + + ··· , t 2 R.
3! 5!
Se na fórmula de Euler substituirmos, sucessivamente # por t e por t obtemos, da
paridade das funções seno e co-seno, que

ei t = cos(t) + i sin(t) e também


it
e = cos(t) i sin(t), t 2 R.
130 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Agora, somando algebricamente as duas expressões, chegamos às seguintes represen-


tações das funções seno e co-seno

ei t + e it
ei t e it
cos(t) = e sin(t) = , t 2 R.
2 2ii
Relembremos que para resolver a equação diferencial

a y 00 + b y 0 + c y = 0, onde a, b, c são constantes reais dadas,

temos de determinar as raízes do polinómio característico

ar 2 + br + c.

Assumamos que estas raízes são dois números complexos conjugados. A saber

p +iq e p i q, com q>0 e p 2 R.

Estas raízes são obviamente distintas, pelo que

z1 (t) = e(p+ii q)t = e pt cos(qt) + i sin(qt) ,


i q) t
z1 (t) = e(p = e pt cos(qt) i sin(qt) , t 2 R,

são soluções da equação dada.

Observe que se tratam de funções complexas de variável real!

Somando algebricamente estas duas soluções encontramos duas novas soluções da


equação diferencial dada
z1 + z2 z1 z2
y1 (t) = = e pt cos(qt) e y2 (t) = = e pt sin(qt), t 2 R.
2 2i
No entanto y1 e y2 são duas funções reais de variável real. Podemos então dizer que

y(t) = c1 e pt cos(qt) + c1 e pt sin(qt), c1 , c2 2 R,

é a solução geral da equação diferencial dada.

Exemplo 3.32. Determine a solução geral da equação diferencial linear homogénea


de segunda ordem y 00 + 4 y 0 + 5 y = 0.

Observe que o polinómio característico é

r 2 + 4r + 5 = (r 2 + 4r + 4) + 1 = (r + 2)2 + 1,

pelo que as suas raízes são 2 ± i. A solução geral da equação toma a forma

2t 2t
y(t) = c1 e cos(t) + c2 e sin(t), c1 , c2 2 R, t 2 R.
10. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES HOMOGÉNEAS DE SEGUNDA ORDEM 131

Exemplo 3.33. Determine a solução do problema de condições iniciais (ou de Cauchy)


⇡ ⇡
y 00 + 4 y = 0, y = 2, y0 = 4.
3 3

Observe que o polinómio característico é

r 2 + 4, pelo que as suas raízes são ± 2ii.

Vemos assim que a solução geral da equação toma a forma

y(t) = c1 cos(2 t) + c2 sin(2t), c1 , c2 2 R, t 2 R.

Tendo em atenção que

y 0 (t) = 2c2 cos(2t) 2c1 sin(2 t), t 2 R,

e aplicando as condições iniciais tem-se


⇡ 2⇡ 2⇡
y = c1 cos + c2 sin = 2,
3 3 3
⇡ 2⇡ 2⇡
y0 = 2c2 cos 2c1 sin = 4,
3 3 3
ou equivalentemente,
8 8
< c + p3c = 4, <c = p3 1,
1 2 1
p então
: 3c1 c2 = 4, :c = p3 + 1.
2

Em conclusão, a solução do problema é


p p
y(t) = ( 3 1) cos(2t) + ( 3 + 1) sin(2t), t 2 R.

10. Equações diferenciais lineares homogéneas de segunda ordem


com coeficientes variáveis

Nesta secção, apresentamos uma introdução à teoria das equações diferenciais lineares
homogéneas de segunda ordem com coeficientes variáveis. O estudo que agora vamos
iniciar inclui o que acabámos de ver para as equações diferenciais lineares homogéneas
de segunda ordem com coeficientes constantes.

Considere-se o seguinte problema de condições iniciais ou de Cauchy, governado por


uma equação diferencial de segunda ordem com coeficientes variáveis,

y 00 + p(t) y 0 + g(t) y = f (t), y(t 0 ) = ↵, y 0 (t 0 ) = .

As funções p, g e f são dados do problema, bem como as constantes ↵, .

Vamos começar por apresentar uma resposta às seguintes questões.


132 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Terá este problema solução? Se sim, será única? Onde?

Teorema 3.2. Sejam p, g, f funções reais de variável real definidas e contínuas num
mesmo intervalo ]a, b[ contendo t 0 no seu interior. Então o problema anterior tem uma
e uma só solução. Esta solução pode ser estendida para a esquerda e para a direita de t 0
sempre que t permaneça em ]a, b[.

Caso as funções reais de variável real p, g, f estejam definidas e contínuas em R, então


a solução do problema está definida em R.

Corolário 3.1. Seja z uma solução do problema de Cauchy satisfazendo as mesmas con-
dições iniciais. Então z(t) = y(t) para todo t. Em particular, se y(t 0 ) = y 0 (t 0 ) = 0,
então y(t) = 0, para todo t.

Passemos agora ao estudo da equação homogénea,

(*) y 00 + p(t) y 0 + g(t) y = 0 com p, g funções dadas.

Ainda que esta equação tenha uma aparência simples a sua


solução analítica não é fácil de obter.

Nesta secção, vamos estudar alguns aspectos teóricos da teoria da equações diferenciais
lineares. Em particular, vamos provar que uma combinação linear de duas soluções que
não são múltiplas uma da outra, nos dá a solução geral da equação.

Este facto foi já por nós intuitivamente utilizado, aquando do estudo realizado para as
equações diferenciais lineares homogéneas de coeficientes constantes.

Uma equação diferencial linear homogénea tem sempre a solução y(t) = 0, para todo t,
que designaremos por trivial. Assim sendo, o estudo que vamos começar refere-se às
soluções não triviais destas equações.

Comecemos por introduzir a noção de wronskiano ou determinante da matriz de Wronski


(em homenagem ao matemático Polaco J.M. Wronski) de duas funções y1 e y2

y1 (t) y2 (t)
!(t) = = y1 (t) y20 (t) y10 (t) y2 (t).
y10 (t) y20 (t)
Por vezes denotaremos o wronskiano de y1 e y2 como

!( y1 , y2 )(t) identificando as funções y1 e y2 .

Por exemplo, o wronskiano das funções cos(2t), sin(2t) é

cos(2t) sin(2t)
! cos(2t), sin(2t) (t) = = 2 cos2 (2t) + 2 sin2 (2t) = 2.
2 sin(2t) 2 cos(2t)
10. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES HOMOGÉNEAS DE SEGUNDA ORDEM 133

Conhecido o wronskiano de duas funções e uma das funções que o compõem, podemos
determinar a função que falta.

Exemplo 3.34. Sejam f (t) = t e !( f , g)(t) = t 2 e t . Determine g.

Vê-se facilmente que f 0 (t) = 1, pelo que

t g(t)
! f , g (t) = 0
= t g 0 (t) g(t) = t 2 e t ,
1 g (t)
que é uma equação diferencial linear de primeira ordem em g. Resolvendo-a, obtemos
a expressão analítica de g em R+ , i.e. g(t) = t e t + c t, c 2 R.

Observação . Se g(t) = c f (t), então o wronskiano de f , g é 0 para todo t. Mas o


recíproco não é verdadeiro. Por exemplo, as funções
8
<t 2, t 0
f (t) = t 2 e g(t) =
: t 2, t <0

não são múltiplas uma da outra e no entanto o wronskiano do conjunto de funções


f , g é 0. Basta, para tal, calcular o wronskiano quando t 0 e também quando
t < 0. Tenha em atenção que g é uma função diferenciável com g 0 (0) = 0.

Teorema 3.3 (de Liouville). Sejam y1 , y2 duas soluções de (*), e ! o seu wronskiano;
então,
´
p(t) d t
(**) !(t) = const e onde const é uma constante real.

Mesmo que não se conheçam as soluções y1 e y2 de uma dada equação diferencial


linear homogénea, podemos calcular o seu wronskiano a partir de (**).

Este é um resultado notável!

A demonstração deste teorema é bastante simples. Começamos por escrever o wrons-


kiano de duas soluções y1 e y2 de (*), !(t) = y1 (t) y20 (t) y10 (t) y2 (t) e derivando,
obtemos

!0 = y1 (t) y200 (t) + y10 (t) y20 (t) y10 (t) y20 (t) y100 (t) y2 (t) = y1 (t) y200 (t) y100 (t) y2 (t).

Mas y1 e y2 de (*), i.e.

y100 = p(t) y10 g(t) y1 e também y200 = p(t) y20 g(t) y2

que substituído na expressão anterior nos dá

!0 = y1 (t) p(t) y20 + g(t) y2 + p(t) y10 + g(t) y1 y2 (t)

= p(t) y1 (t) y20 (t) y10 (t) y2 (t) = p(t)!.


134 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Acabamos de provar que

! é tal que !0 = p(t)!,


´
p(t) d t
pelo que !(t) = const e , const 2 R. c.q.d.

Corolário 3.2. Sejam y1 e y2 duas soluções de (*), e ! o seu wronskiano; então !(t) = 0
para todo t (quando const = 0) ou ! nunca se anula (quando const 6= 0).

Como consequências destes dois resultados temos que:

para as soluções não triviais de (*), y1 , y2 , o seu wronskiano é


nulo se, e somente se, y1 , y2 forem múltiplas uma da outra.

Definição 3.1. Dizemos que o conjunto de soluções, y1 , y2 , de (*) é um seu sis-


tema fundamental de soluções (ou abreviadamente s.f.s) se dada uma qualquer solução
de (*), z, existirem constantes c1 , c2 2 R tais que z(t) = c1 y1 (t) + c2 y2 (t).

Teorema 3.4. Sejam y1 e y2 duas soluções de (*) que não são múltiplas uma da outra;
então formam um sistema fundamental de soluções de (*).

Seja y uma solução de (*). A demonstração passa por determinar constantes reais c1 , c2
tais que z(t) = c1 y1 (t) + c2 y2 (t) satisfaz as mesmas condições iniciais que y. A saber

z(t 0 ) = c1 y1 (t 0 ) + c2 y2 (t 0 ) = y(t 0 ), z 0 (t 0 ) = c1 y10 (t 0 ) + c2 y20 (t 0 ) = y 0 (t 0 ).

Matricialmente podemos escrever


2 32 3 2 3
y (t ) y2 (t 0 ) c y(t 0 ) y1 (t 0 ) y2 (t 0 )
4 1 0 5 4 15 = 4 5 onde 6= 0
0 0 0
y1 (t 0 ) y2 (t 0 ) c2 y (t 0 ) y10 (t 0 ) y20 (t 0 )

Assim, este sistema tem uma única solução c1 , c2 e a função z(t) = c1 y1 (t) + c2 y2 (t) é
solução de (*). Agora, do corolário 3.1 concluímos que y(t) = z(t) para todo t.

Podemos então dizer que qualquer solução da equação (*) é descrita por uma combi-
nação linear linear de y1 , y2 . c.q.d.

Exemplo 3.35 (sobre a forma de s.f.s.). Vimos já que a equação diferencial linear ho-
mogénea de segunda ordem

y 00 ↵2 y = 0, ↵ 2 R é dado

tem e ↵t
, e↵t como s.f.s. e a solução geral é dada por

y(t) = c1 e ↵t
+ c2 e↵t , t 2 R.
10. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES HOMOGÉNEAS DE SEGUNDA ORDEM 135

Justifique que

sinh(↵t), cosh(↵t) é um s.f.s. da mesma equação.

Relembre que

et + e t
et e t
cosh(t) = e que sinh(t) = , t 2 R,
2 2
com representação gráfica

Também se tem a fórmula fundamental da geometria hiperbólica


Ä et + e t ä2 Ä et e t ä2
cosh2 (t) sinh2 (t) = = 1, t 2 R,
2 2
bem como
et + e t
et e t
sinh0 (t) = = cosh(t) e cosh0 (t) = = sinh(t), t 2 R.
2 2
Agora, como sinh(↵t) e cosh(↵t) são combinações lineares das funções e ↵t
, e↵t , tam-
bém são solução da mesma equação diferencial. De facto,

sinh00 (↵t) = ↵2 sinh(↵t) e cosh00 (↵t) = ↵2 cosh(↵t), t 2 R.

Mais ainda, estas funções não são um múltiplo escalar uma da outra, pois

cosh(↵t) sinh(↵t)
!(t) = = ↵ cosh2 (↵t) ↵ sinh2 (↵t) = ↵ 6= 0, t 2 R.
↵ sinh(↵t) ↵ cosh(↵t)

A solução geral pode então escrever-se como

y(t) = c1 cosh(↵t) + c2 sinh(↵t), c1 , c2 2 R, t 2 R.

É importante notar que esta não é uma nova solução geral, é somente uma nova forma
de a expressar que tem certa utilidade prática.

Exemplo 3.36. Determine a solução do seguinte problema de Cauchy

y 00 9 y = 0, y(2) = 1, y 0 (2) = 9.
136 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

3(t t 0 ) t0 )
Podemos escrever a solução geral na forma y(t) = c1 e + c2 e3(t , com t 0 = 2.
0 3(t 2) 3(t 2)
Assim, y (t) = 3c1 e + 3c2 e e das condições iniciais y(2) = 1, y 0 (2) = 9,
obtemos

c1 + c2 = 1, 3c1 + 3c2 = 9, i.e. c1 = 2, c2 = 1.

3(t 2)
A solução vem então dada por y(t) = 2e + e3(t 2)
, t 2 R.

Descreva (como exercício) a solução em termos das funções seno e co-seno hiperbólicos.

Exemplo 3.37 (Determinação de uma segunda solução – a partir do wronskiano).


Considere--se a equação de Legendre

(1 t 2 ) y 00 2t y 0 + 2 y = 0, t 2] 1, 1[.

A função y(t) = t é uma solução. Determine outra solução, z(t), de forma que y, z
seja um s.f.s. da equação dada.

Multiplicando esta equação por (1 t 2) 1


obtemos

2t 2
y 00 y 0
+ y = 0.
1 t2 1 t2
Denotando a segunda solução por z(t) temos de (**)

t z(t)
´
2t
dt
!(t) = 0
= ce 1 t2 .
1 z (t)

(Aqui tomamos c = 1, pois queremos somente uma solução.)

Assim,
1 1 1
´
2t
0 dt ln(1 t 2 )
tz z=e 1 t2 i.e. z0 z= e = .
t t t(1 t 2)

Esta equação pode reescrever-se numa forma simplificada como


Ä 1 ä0 1
´
1 1
dt
z = 2 por multiplicação de e t = , t > 0.
t t (1 t 2 ) t

Em conclusão,

1 t t t Ä1 + t ä
ˆ
z=t dt = 1 ln(1 t) + ln(1 + t) = 1 + ln .
t (1 t 2 )
2 2 2 2 1 t

(Uma vez mais, como queremos somente uma solução, tomamos c = 0.)

A solução geral da equação vem dada por


Ä t 1+ t ä
y(t) = c1 t + c2 1+ ln , t 2]0, 1[, c1 , c2 2 R+ .
2 1 t
10. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES HOMOGÉNEAS DE SEGUNDA ORDEM 137

Exemplo 3.38 (Determinação de uma segunda solução – método de D’Alembert ou


do abaixamento de ordem). Considere-se uma vez mais a equação de Legendre

(1 t 2 ) y 00 2t y 0 + 2 y = 0, t 2] 1, 1[.

Suponhamos conhecida uma solução y(t) = y1 (t) desta equação. Mostremos que a
mudança de variável, y(t) = y1 (t) (t), permite determinar a solução geral da equa-
ção.

De facto, de y(t) = y1 (t) (t), tem-se

y 0 (t) = y10 (t) (t) + y1 (t) 0 (t),

y 00 (t) = y100 (t) (t) + 2 y10 (t) 0 (t) + y1 (t) 00


(t)

que substituída na equação de Legendre nos dá

(1 t 2 ) y100 2t y10 + 2 y1 + (1 t 2 )(2 y10 0


+ y1 00
) 2t y1 0
= 0,

ou ainda, como (1 t 2 ) y100 2t y10 + 2 y1 = 0 (note que y1 é solução), tem-se

(1 t 2 ) y1 00
+ (2(1 t 2 ) y10 2t y1 ) 0
= 0,

que é uma equação diferencial linear de segunda ordem sem termo em . Assim,
0
efectuando a mudança de variável z = obtemos uma equação diferencial de va-
riáveis separáveis,

z0 2t y1 2(1 t 2 ) y10
(1 t 2 ) y1 z 0 + (2(1 t 2 ) y10 2t y1 )z = 0 i.e. =
z (1 t 2 ) y1

Agora como y1 (t) = t, obtemos

2t 2 1
ˆ ˆ
ln z(t) = dt dt logo z(t) = .
1 t2 t (1 t 2 )t 2

Agora temos somente que desfazer a mudança de variável

1 1 1 1 Ä1 + t ä 1
ˆ ˆ ˆ
= dt = dt + d t = ln ;
(1 t 2 )t 2 1 t2 t2 2 1 t t

t Ä1 + t ä
logo y(t) = y1 (t) (t) = 1+ ln , t 2]0, 1[, que coincide com a solução
2 1 t
determinada pelo método do wronskiano.
138 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

11. Equações diferenciais lineares completas de segunda ordem de


coeficientes variáveis

Nesta secção, vamos trabalhar o objecto

(***) y 00 + p(t) y 0 + g(t) y = f (t).

Assumimos conhecido um s.f.s, y1 , y2 , para a equação homogénea associada,

y 00 + p(t) y 0 + g(t) y = 0;

pelo que yh (t) = c1 y1 (t) + c2 y2 (t), c1 , c2 2 R é a solução geral da equação homogénea


associada.

O nosso objectivo é o de determinar a solução geral da equa-


ção completa.

Suponhamos conhecida uma solução Y da equação completa, i.e.

Y 00 + p(t) Y 0 + g(t)Y = f (t);

Agora a diferença entre duas soluções da completa, y(t) Y (t) é uma solução da
equação homogénea associada. De facto, =y Y é tal que

00 0
+ p(t) + g(t) = ( y Y )00 + p(t) ( y Y )0 + g(t)( y Y)

= ( y 00 + p(t) y 0 + g(t) y) (Y 00 + p(t) Y 0 + g(t)Y )

= f (t) f (t) = 0;

pelo que =y Y é solução da equação homogénea associada, i.e.

(t) = c1 y1 (t) + c2 y2 (t), para constantes c1 , c2 2 R.

Em conclusão, a solução geral da equação (***) vem dada por y(t) = yh (t) + Y (t), i.e.

y(t) = c1 y1 (t) + c2 y2 (t) + Y (t), c1 , c2 2 R.

Por outras palavras:

a solução geral da equação completa é a soma de uma solução


particular da equação com a solução geral da equação homogé-
nea associada.
11. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES COMPLETAS DE SEGUNDA ORDEM 139

11.1. Método do polinómio anulador.

Exemplo 3.39. Determine a solução geral da equação y 00 + 9 y = 4 cos(2t).

Como o polinómio característico da equação homogénea associada é r 2 + 9, que tem


raízes ±3ii, a solução geral da equação homogénea associada é dada por

yh (t) = c1 cos(3t) + c2 sin(3t), c1 , c2 2 R, t 2 R.

Como a função cos(2t) é solução da equação diferencial de segunda ordem y 00 +4 y = 0,


cuja solução geral é dada por ↵ cos(2t) + sin(2t), ↵, 2 R, determinemos ↵ e 2 R,
de forma que

y p (t) = ↵ cos(2t) + sin(2t) seja uma solução de y p00 + 9 y p = 4 cos(2t).

Assim, de

⇥9 y p (t) = ↵ cos(2t) + sin(2t) solução particular

⇥0 y p0 (t) = 2 cos(2t) 2↵ sin(2t) primeira derivada

⇥1 y p00 (t) = 4↵ cos(2t) 4 sin(2t) segunda derivada

4 cos(2t) = 5↵ cos(2t) + 5 sin(2t),

4
logo ↵ = e = 0 e, portanto,
5
4
y p (t) = cos(2t) é solução particular da equação completa.
5
Podemos então dizer que a solução geral da equação completa é
4
y(t) = c1 cos(3t) + c2 sin(3t) cos(2t), c1 , c2 2 R, t 2 R.
5
Propriedade 1. Se o termo independente da equação diferencial linear de coeficientes
constantes for da forma

ae↵t cos( t) + be↵t sin( t),

e ↵ ±i não for raiz do polinómio característico da equação homogénea associada, então

9A, B 2 R tais que y p (t) = Ae↵t cos( t) + Be↵t sin( t),

é solução particular da equação completa.

Já se o termo independente da equação diferencial linear de coeficientes constantes for


da forma

(a1 t + a1 )e↵t cos( t) + (b1 t + b2 )e↵t sin( t),


140 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

ou, mais geralmente,

pol1 (t)e↵t cos( t) + pol2 (t)e↵t sin( t), com max grau pol1 , grau pol2 = s,

e ↵ ±i não for raiz do polinómio característico da equação homogénea associada, então


existe A1 , A2 , B1 , B2 2 R, tal que

y p (t) = (A1 t + A2 )e↵t cos( t) + (B1 t + B2 )e↵t sin( t),

ou, mais geralmente, polinómios p1 , p2 de grau s, tais que

y p (t) = p1 (t)e↵t cos( t) + p2 (t)e↵t sin( t),

é solução particular da equação completa.

Exemplo 3.40. Determine a solução geral da equação y 00 + 2 y 0 + y = t 1.

Como o polinómio característico da equação homogénea associada é (r + 1)2 , que


tem 1 como raíz de multiplicidade dois, a solução geral da equação homogénea asso-
ciada é

t
yh (t) = c1 e + c2 t e t , c1 , c2 2 R, t 2 R.

Na determinação de uma solução particular, y p , da equação completa vamos aplicar a


propriedade 1 com ↵ = 1, = 0 e pol1 (t) = t 1.

Procuramos então, y p na forma

⇥1 y p (t) = (A + Bt)e0t solução particular

⇥2 y p0 (t) = B primeira derivada

⇥1 y p00 (t) = 0 segunda derivada

t 1 = (A + 2B) + Bt,

logo B = 1 e A = 3 e, portanto,

y p (t) = 3 + t é solução particular da equação completa.

Podemos então dizer que a solução geral da equação completa é

t
y(t) = c1 + c2 t)e +t 3, c1 , c2 2 R, t 2 R.

Exemplo 3.41. Determine a solução geral da equação

y 00 4 y = t2 3e t , y(0) = 0, y 0 (0) = 2.
11. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES COMPLETAS DE SEGUNDA ORDEM 141

Como o polinómio característico da equação homogénea associada é (r 2)(r + 2), que


tem raízes 2, 2, a solução geral da equação homogénea associada é dada por
2t
yh (t) = c1 e + c2 e2t , c1 , c2 2 R, t 2 R.

Uma solução particular, y p = Y1 + Y2 , onde

Y100 4Y1 = t 2 e Y200 4Y2 = 3e t .

Aplicando a propriedade 1 com ↵ = 0, = 0 e pol1 (t) = t 2 , obtemos como candidato Y1

⇥( 4) Y1 (t) = (A + Bt + C t 2 )e0t solução particular

⇥0 Y10 (t) = B + 2C t primeira derivada

⇥1 Y100 (t) = 2C segunda derivada

t 2 = ( 4A + 2C) 4Bt 4C t 2 ,
1 1
logo C = , B =0 e A= e, portanto,
4 8
1 1 2
Y1 (t) = t é solução particular procurada.
8 4
Aplicando a propriedade 1 com ↵ = 1, = 0 e pol1 (t) = 3, obtemos como candidato Y2

⇥( 4) Y2 (t) = Ae t solução particular

⇥0 Y20 (t) = Ae t primeira derivada

⇥1 Y200 (t) = Ae t segunda derivada

3e t = 3Ae t ,

logo A = 1 e, portanto,

Y2 (t) = e t é solução particular procurada.

Podemos então dizer que a solução geral da equação completa é


1 1 2
y(t) = c1 e 2t
+ c2 e2t t et , c1 , c2 2 R, t 2 R.
8 4
Agora temos de determinar c1 , c2 2 R, tais que y(0) = 0, y 0 (0) = 2, i.e.
1
c1 + c2 1 = 0, 2c1 + 2c2 1 = 2,
8
21 3
logo c2 = e c1 = e a solução do problema vem dada por
16 16
3 2t 21 2t 1 1 2
y(t) = e + e t et , c1 , c2 2 R, t 2 R.
16 16 8 4
Exemplo 3.42. Determinar a solução geral da equação diferencial de segunda ordem
completa, de coeficientes constantes y 00 + y = sin(t).
142 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

A solução geral da equação homogénea associada, y 00 + y = 0 é

yh (t) = c1 cos(t) + c2 sin(t), c1 , c2 2 R.

Seguindo a ideia contida na propriedade 1, procuremos uma solução particular da


equação dada na forma

y p (t) = Acos(t) + B sin(t) com A, B a determinar.

Isto levar-nos-ía a 0 = sin(t) (o que é absurdo!).

Este resultado é natural, pois as funções sin(t) e cos(t) são solução da equação homo-
génea associada.

Procuremos então uma solução particular da equação dada na forma

y p (t) = t Acos(t) + B sin(t) com ↵, a determinar.

Derivando duas vezes obtemos

y p00 (t) + y p (t) = sin(t) = 2B cos(t) 2Asin(t)

1
logo, A = e B = 0, e a solução geral da equação vem dada por
2
t
y p (t) = c1 cos(t) + c2 sin(t) cos(t) c1 , c2 2 R.
2
Este exemplo diz-nos que a propriedade 1 tem de ser melhorada de forma a dar resposta
a este caso. Neste ponto assume particular importância a frase retirada do livro de
Boyce e DiPrima sobre equações diferenciais:

Se alguma das funções que compõem a candidata a solução par-


ticular dada pela propriedade 1 são solução da equação homo-
génea associada, multiplique-a por t e compare as novas funções
com as soluções da homogénea. Se alguma delas for ainda solu-
ção da equação homogénea associada, multiplique-a por t 2 . . .

Podemos enunciar a propriedade geral de construção de soluções particulares de uma


equação diferencial linear completa de coeficientes constantes.

Propriedade 2. Se o termo independente da equação diferencial linear de coeficientes


constantes for da forma

pol1 (t)e↵t cos( t) + pol2 (t)e↵t sin( t), com max grau pol1 , grau pol2 = s,
11. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES COMPLETAS DE SEGUNDA ORDEM 143

ou qualquer combinação linear de termos desta forma, e ↵±ii for raiz do polinómio carac-
terístico da equação homogénea associada com multiplicidade #, então existe, polinómios
p1 , p2 de grau s, tais que

y p (t) = p1 (t)e↵t cos( t) + p2 (t)e↵t sin( t) t # ,

é solução particular da equação completa.

Observe que quando # = 0 a propriedade 2 coincide com a propriedade 1.

Exemplo 3.43. Determinar a solução geral da equação diferencial de segunda ordem


completa, de coeficientes constantes y 00 + 4 y 0 = 2t 5.

A solução geral da equação homogénea associada, y 00 + 4 y 0 = 0 é

4t
yh (t) = c1 + c2 e , c1 , c2 2 R.

Seguindo a ideia contida na propriedade 2, procuremos uma solução particular da


equação dada na forma

y p (t) = (A + B t)t # com A, B a determinar.

Note que, neste caso, # = 1, pois 0 é raíz do polinómio característico, r(r + 4), com
multiplicidade um. Derivando duas vezes obtemos

y p00 (t) + 4 y p0 (t) = 2t 5 = (2A + 4B) + (8B)t

1 11
logo, B = e A= , e a solução geral da equação vem dada por
4 8

4t t2 11
y p (t) = c1 + c2 e + t c1 , c2 2 R.
4 8
Exercício. Determine, aplicando o método do polinómio anulador, a solução geral da
equação diferencial linear de coeficientes constantes y 00 + 2 y 0 + y = t e t .

11.2. Método da variação dos parâmetros de Lagrange. Vejamos como deter-


minar uma solução particular da equação (***),

y 00 + p(t) y 0 + g(t) y = f (t),

que denotamos por Y , aplicando o método da variação dos parâmetros de Lagrange.

Assumindo conhecido um s.f.s., y1 , y2 , da equação homogénea associada,

y 00 + p(t) y 0 + g(t) y = 0,
144 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

procuramos uma solução particular, Y , na forma

Y (t) = u1 (t) y1 (t) + u2 (t) y2 (t),

para alguma função real de variável real u1 , u2 . Vamos escolher u1 , u2 de forma que

(*v) u01 (t) y1 (t) + u02 (t) y2 (t) = 0, u01 (t) y10 (t) + u02 (t) y20 (t) = f (t),

ou matricialmente,
2 32 3 2 3
0
y1 y2 u 0
4 5 4 15 = 4 5
y10 0
y2 0
u2 f (t)

Agora como o determinante da matriz do sistema é não nulo (observe que se trata
do wronskiano das funções y1 , y2 que formam um s.f.s.), aplicando a regra de Cramer
obtemos
f (t) y2 (t) f (t) y1 (t)
u01 (t) = , u02 (t) = ,
!( y1 , y2 )(t) !( y1 , y2 )(t)
onde !( y1 , y2 )(t) designa o wronskiano de y1 , y2 .

Integrando obtemos u1 , u2 .

Mostremos que Y (t) = u1 (t) y1 (t) + u2 (t) y2 (t), sujeita à con-


dição (*v), é uma solução de y 00 + p(t) y 0 + g(t) y = f (t).

Calculando a primeira derivada

Y 0 (t) = u01 (t) y1 (t) + u02 (t) y2 (t) + u1 (t) y10 (t) + u2 (t) y20 (t)

= u1 (t) y10 (t) + u2 (t) y20 (t) H: u01 (t) y1 (t) + u02 (t) y2 (t) = 0.

Derivando uma vez mais, obtemos

Y 00 (t) = u1 (t) y100 (t) + u2 (t) y200 (t) + u01 (t) y10 (t) + u02 (t) y20 (t).

Analisemos agora

Y 00 (t) + p(t)Y 0 (t) + g(t)Y (t) = u01 (t) y10 (t) + u02 (t) y20 (t)

+ u1 (t) y100 (t) + p(t) y10 (t) + g(t) y1 (t) + u2 (t) y200 (t) + p(t) y20 (t) + g(t) y2 (t) .

Agora, como

f (t) = u01 (t) y10 (t) + u02 (t) y20 (t) e y1 , y2 soluções da homogénea

temos o que pretendíamos provar, i.e. Y 00 (t) + p(t)Y 0 (t) + g(t)Y (t) = f (t).

Exemplo 3.44. Determine a solução geral da equação diferencial linear de coeficientes


constantes, y 00 + y = tan(t).
11. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES COMPLETAS DE SEGUNDA ORDEM 145

Um s.f.s. da equação homogénea associada é dado por {cos(t), sin(t)}. Como o seu
wronskiano é
cos(t) sin(t)
!(t) = = cos2 (t) + sin2 (t) = 1,
sin(t) cos(t)
temos que
sin2 (t)
u01 (t) = tan(t) sin(t) = , u02 (t) = tan(t) cos(t) = sin(t);
cos(t)
e, portanto,
1 cos2 (t) 1
ˆ ˆ
u1 (t) = d t = sin(t) d t, u2 (t) = cos(t) + c2 .
cos(t) cos(t)
Atendendo a que
ˆ
1 Ä t ⇡ ä ⇡ ⇡
d t = ln tan + + c, t 2] , [, c 2 R,
cos(t) 2 4 2 2
concluímos que a solução geral da equação é
Ä x ⇡ ä
sin(t) ln tan + + c1 cos(t) cos(t) c2 sin(t), c1 , c2 2 R.
2 4
ou ainda
Ä x ⇡ ä
cos(t) ln tan + + c1 cos(t) + c2 sin(t), c1 , c2 2 R.
2 4
Ä x ⇡ ä
A função Y (t) = cos(t) ln tan + é solução particular da equação completa.
2 4
Exemplo 3.45. Aplicando o método da variação dos parâmetros de Lagrange, deter-
mine a solução geral da equação diferencial linear de coeficientes constantes

y 00 + 2 y 0 + y = t e t .

Este problema foi deixado como exercício na secção anterior. Vê-se facilmente que
um s.f.s. é e t , t e t
, pois a equação homogénea associada tem polinómio caracterís-
tico (r + 1)2 . Calculemos o wronskiano das funções que compõem este s.f.s.
t t
e te 2t
!(t) = t t
=e , t 2 R.
e (1 t)e
Então, a solução geral da equação vem dada por,
t
y(t) = u1 (t)e + u2 (t)t e t , t 2 R,

onde u1 , u2 são tais que


t 2 e 2t te 2t
u01 (t) = = t 2, u02 (t) = = t.
e 2t e 2t

t3 t2
Assim, u1 (t) = + c1 e u2 (t) = + c2 , c1 , c2 2 R.
3 2
146 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Em conclusão, a solução geral da equação diferencial dada é


t3 t t2 t 1 3 t
y(t) = + c1 e + + c2 t e = t e + (c1 + c2 t)e t , c1 , c2 2 R.
3 2 6
11.3. Método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem). Caso se conheça
uma solução particular, y1 , da equação homogénea associada a (***), i.e.

y1 : y1 00 + p(t) y1 0 + g(t) y1 = 0,

podemos determinar a sua solução geral, efectuando a mudança de variável

y = y1 z , y 0 = y1 0 z + y1 z 0 , y 00 = y1 00 z + 2 y1 0 z 0 + y1 z 00 .

Reescrevemos a equação (***) em termos de z

g(t) y1 (t) + p(t) y10 (t) + y100 (t) z + p(t) y1 (t) + 2 y10 (t) z 0 + y1 (t)z 00 = f (t),

e tendo em atenção a hipótese tiramos que


Ä y10 (t) ä f (t)
0
u + p(t) + 2 u= , u = z0,
y1 (t) y1 (t)
que é uma equação diferencial linear de primeira ordem (que foram analisadas na sec-
Ĉ ä ´
2 2 p(t) d t
ção 3). Multiplicando a equação por exp p(t) d t +ln y1 = y1 e temos que
Ä ´ ä0 ´
p(t) d t p(t) d t
y12 e u = y1 f (t)e ;

ˆ a t determinamos u, e desfazendo a mudança de variável inicial


Integrando em ordem
obtemos que y = y1 u d t é a solução geral da equação.

Observe que ao efectuar duas primitivas vai obter uma solução explícita em termos de
duas constantes reais, i.e.

y(t) = c1 y1 (t) + c2 y2 (t) + y p (t), c1 , c2 2 R,

onde y1 , y2 são duas soluções linearmente independentes da equação homogénea asso-


ciada (i.e. yh = c1 y1 (t) + c2 y2 (t) é a solução geral da equação homogénea associada)
e y p é uma solução particular da equação completa.

Exemplo 3.46. Determine a solução geral da equação diferencial linear de coeficientes


constantes t 2 y 00 2t y 0 + 2 y = 2t + 1, t 2 R+ , sabendo que y = t é solução da
equação homogénea associada.

Aplicando o método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem) temos que

⇥2 y = tz

⇥( 2t) y 0 = tz 0 + z
11. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES COMPLETAS DE SEGUNDA ORDEM 147

⇥t 2 y 00 = tz 00 + 2z 0
2t + 1 = t 3 z 00 + (2t 2 2t 2 )z 0 + ( 2t + 2t)z.

Temos então que t 3 z 00 = 2t + 1, i.e. z 00 = 2t 2


+t 3
. Integrando sucessivamente
obtemos

1 1 2 1
z 0 = 2t t + c1 , z = 2 ln(t) + + c1 t + c2 , c1 , c2 2 R.
2 2t

Desfazendo a mudança de variável inicial (i.e. y = tz), concluímos que a solução geral
da equação é dada por,
1
y = 2t ln(t) + + c1 t 2 + c2 t, c1 , c2 2 R.
2
Exemplo 3.47. Determine a solução geral da equação diferencial linear de coeficientes
2e t
constantes y 00 y = t , t 2 R+ .
e 1

Como a equação é de coeficientes constantes, sabemos que a solução geral da homo-


génea se escreve como

yh (t) = c1 e r+ t + c2 e r t , c1 , c2 2 R,

com r± = ±1, pois o polinómio característico da equação homogénea associada é r 2


1 = (r 1)(r + 1), cujas raízes são 1, 1. Logo

yh (t) = c1 e t + c2 e t , c1 , c2 2 R.

Determinemos agora uma solução particular da equação completa aplicando o método


do abaixamento de ordem ou de D’Alembert. Para tal, considere a seguinte mudança
de variável y = e t z, com z a determinar como solução da seguinte equação diferencial
2e t 2
e t z 00 + (2e t )z 0 = , ou seja z 00 + 2z 0 = ,
et 1 et 1
ou ainda, tomando u = z 0
2 0 2e2t
u0 + 2u = , i.e. e2t u = ,
et 1 et 1
2e2t
ˆ
pelo que e2t u = d t = 2 e t + log(e t 1) , i.e. u = 2 e t + e 2t log(e t 1) .
et 1
Desta forma vemos que
ˆ
z=2 e t + e 2t log(e t 1) d t = e 2t (e2t 1) log(e t 1) e t (t e t + 1) .

Já como solução particular da equação completa obtemos

t
y p (t) = e (e2t 1) log(1 et ) e t (t e t + 1) ;
148 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

e a solução geral da equação inicial é

y(t) = yh (t) + y p (t), t 2 R+ .

Exemplo 3.48. Determine a solução geral da equação diferencial linear de coeficientes


1
constantes y 00 + y 0 = t , t 2 R+ .
e +1

Como a equação é de coeficientes constantes, sabemos que a solução geral da homo-


génea se escreve como

yh (t) = c1 + c2 e t , c1 , c2 2 R,

pois o polinómio característico da equação homogénea associada é r 2 + r = r(r + 1),


cujas raízes são 0, 1.

Determinemos agora uma solução particular da equação completa aplicando o método


do abaixamento de ordem ou de D’Alembert. Para tal, considere a seguinte mudança
de variável y 0 = z, com z a determinar como solução da seguinte equação diferencial
1 0 et
z0 + z = , ou seja et z = ,
e +1
t et + 1
t
logo z = e ln(e t + 1), pelo que,
ˆ
y p = e t ln(e t + 1) d t = t + ( e t
1) log(e t + 1),

é uma solução particular da equação completa. A solução geral da equação inicial é


dada por

y(t) = yh (t) + y p (t),

onde

t t
yh (t) = c1 + c2 e e yp = t + ( e 1) log(e t + 1).

12. Equações diferenciais lineares de ordem superior a dois

Antes de avançarmos com o estudo, façamos algumas considerações sobre números


complexos. Podemos usar o par ordenado (x, y) 2 R ⇥ R para representar o número
complexo x + i y.

Esta transformação leva o plano usual ao plano complexo. Um ponto (x, y) no plano
R ⇥ R pode identificar-se em coordenadas polares (r, ✓ ). Vamos tomar r > 0. Então,

z = x + i y = r cos(✓ ) + i r sin(✓ ) = r cos(✓ ) + i sin(✓ )

dá-nos a representação polar do número complexo z.


12. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE ORDEM SUPERIOR A DOIS 149

3⇡
Usando a fórmula de Euler, podemos escrever z = r ei ✓ . Por exemplo, 2ii = 2ei 2 , pois
3⇡ p ⇡
o ponto (0, 2) tem coordenadas polares 2, . Da mesma forma, 1 + i = 2ei 4
2
e também 1 = ei ⇡ (os números reais podem ser vistos como casos particulares dos
números complexos).

É sabido que não existe unicidade na representação em coordenadas polares de um


número complexo, pois

z = r ei (✓ +2⇡m) , com m 2 Z.

Seja agora, n um número inteiro positivo, e calculemos as raízes de índice n de z:


1 1 i ✓
+ 2⇡m
z n = r n ei n n
, m = 0, 1, . . . , n 1.
1 n
Note que z n = z.

As raízes de índice n de um número complexo situam-se na circunferência centrada


1
na origem e de raio r n . Mais ainda, a diferença entre dois ângulos consecutivos é
2⇡
constante e igual a .
n
Exemplo 3.49. Resolva a equação z 4 + 16 = 0.

Procuramos as raízes de índice 4 de 16 = 16ei (⇡+2⇡m) , m 2 Z, i.e.


1 i ⇡ ⇡m
( 16) 4 = 2ei 4+ 2
, m = 0, 1, 2, 3.
⇡ ⇡ ⇡ p p
Quando m = 0, a raiz é 2ei 4 = 2 cos( ) + i sin( ) = 2 + i 2. As demais raízes
4 4
i 3⇡ i 5⇡ i 7⇡
são, 2e , 2e
4 4 e 2e 4 e podem ser calculadas de forma análoga. As raízes aparecem
em pares conjugadas
p p p p
2±i 2 e 2 ± i 2,

e situam-se na circunferência centrada na origem e de raio 2, cuja diferença entre dois



ângulos consecutivos é constante igual a .
2
Exemplo 3.50. Resolva a equação z 3 + 8 = 0.

Procuramos as raízes cúbicas de 8 = 8ei (⇡+2⇡m) , m 2 Z, i.e.


1 ⇡ 2⇡m
i
( 8) 3 = 2ei 3+ 3
, m = 0, 1, 2.

Para m = 1 obtemos uma raíz real igual a 2 = 2ei ⇡ . As restantes encontram-se na


⇡ ⇡ p
circunferência centrada na origem e de raio 2 com ângulos e 2⇡ , i.e. 1 ± i 3.
3 3
Exemplo 3.51. Determinar a solução geral da equação diferencial linear homogénea
de coeficientes constantes y 0000 y = 0.
150 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

O polinómio característico é

r4 1 = (r 2 1)(r 2 + 1) = (r + 1)(r 1)(r 2 + 1) com raízes 1, 1, i, i.

Assim, um s.f.s. é dado por e t , e t , cos(t), sin(t) e a solução geral é


t
y(t) = c1 e + c2 e t + c3 cos(t) + c4 sin(t), c1 , c2 , c3 , c4 2 R.

Exemplo 3.52. Determinar a solução geral da equação diferencial linear homogénea


de coeficientes constantes y 000 3 y 00 + 3 y 0 y = 0.

O polinómio característico é

r3 3 r 2 + 3r 1 = (r 1)3 com raiz 1 de multiplicidade 3.

Assim, um s.f.s. é dado por e t , t e t , t 2 e t e a solução geral é

y(t) = c1 e t + c2 t e t + c3 t 2 e t , c1 , c2 , c3 2 R.

Exemplo 3.53. Determinar a solução geral da equação diferencial linear homogénea


de coeficientes constantes y 000 y 00 + 3 y 0 + 5 y = 0.

O polinómio característico é

r3 r 2 + 3r + 5.

As possíveis raízes inteiras deste polinómio são

±5 e ±1.

Verifiquemos

r =1: (1)3 (1)2 + 3(1) + 5 = 8 6= 0,

r = 1: ( 1)3 ( 1)2 + 3( 1) + 5 = 0,

Logo o polinómio característico tem 1 como raiz e, portanto,

r3 r 2 + 3r + 5 = (r + 1)(r 2 2r + 5) = (r + 1) (r 2 2r + 1) + 4

= (r + 1) (r 1)2 + 22 .

Assim, o polinómio característico tem raízes 1, 1 ± i 2. Concluímos que um s.f.s. é


dado por e t , e t cos(2t), e t sin(2t) , pelo que a solução geral é
t
y(t) = c1 e + c2 e t cos(2t) + c3 e t sin(2t), c1 , c2 , c3 2 R.

Exemplo 3.54. Determinar a solução geral da equação diferencial linear homogénea


de coeficientes constantes y 0000 + 2 y 00 + y = 0.
12. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE ORDEM SUPERIOR A DOIS 151

O polinómio característico é

r 4 + 2r 2 + 1 = (r 2 + 1)2 ,

pelo que as raízes são ±ii com multiplicidade dois. Um s.f.s. é dado por

cos(t), sin(t), t cos(t), t sin(t) ,

pelo que a solução geral é

y(t) = c1 cos(t) + c2 sin(t) + c3 t cos(t) + c4 t sin(t), c1 , c2 , c3 , c4 2 R.

Exemplo 3.55. Determinar a solução geral da equação diferencial linear homogénea


de coeficientes constantes y (5) + 9 y 000 = 0.

O polinómio característico é

r 5 + r 3 = r 3 (r 2 + 1),

pelo que as raízes são ±ii e 0 com multiplicidade três. Vemos assim que um s.f.s. é dado
por cos(t), sin(t), 1, t, t 2 , e a solução geral é

y(t) = c1 cos(t) + c2 sin(t) + c3 + c4 t + c5 t 2 , c1 , c2 , c3 , c4 , c5 2 R.

Analisemos agora alguns casos de equações diferenciais lineares não homogéneas.

Exemplo 3.56. Determinar a solução geral da equação diferencial linear homogénea


de coeficientes constantes y (5) + 9 y 000 = 3t sin(2t).

Do exemplo anterior sabemos já que a solução geral da equação homogénea associada é

yh (t) = c1 cos(t) + c2 sin(t) + c3 + c4 t + c5 t 2 , c1 , c2 , c3 , c4 , c5 2 R,

pelo que a solução geral é dada por

y(t) = yh (t) + Y (t), onde Y é solução particular da completa.

Procuremos Y na forma Y (t) = Y1 (t) + Y2 (t) de forma que

Y1 + 9Y1000 = 3t,
(5)
Y1 :

Y2 + 9Y2000 =
(5)
Y2 : sin(2t).

O método do polinómio anulador (cf. propriedade 2) diz-nos que Y1 é da forma

Y1 (t) = (A1 + B1 t)t 3 e também que Y2 (t) = A2 cos(2t) + B2 sin(2t).

Isto porque 3t é um polinómio de grau um e 0 é raiz do polinómio característico de


multiplicidade três. Já ±2ii não é raiz do polinómio característico, pelo que a sua re-
presentação se encontra justificada.
152 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Determinação de A1 , B1 :
1
Y1 + 9Y1000 = 0 + 9(6A1 + 24B1 t)
(5)
logo A1 = 0, B1 = .
72
Determinação de A2 , B2 :

Y1 + 9Y1000 = 25 (B2 cos(2t) + A2 sin(2t)) + 32 ⇥ 23 ( B2 cos(2t)


(5)
A2 sin(2t)).

1
logo B2 = 0, A2 = . Podemos então escrever a solução geral da equação diferencial
40
1 4 1
y(t) = c1 cos(t) + c2 sin(t) + c3 + c4 t + c5 t 2 + t cos(2t), c1 , c2 , c3 , c4 , c5 2 R.
72 40

Exercícios de avaliação

Exercício (Frequência, 20-10-2020). Considere a equação diferencial

(1 + t 2 ) y 00 2t y 0 + 2 y = 1 + t 2 ,

e seja y(t) = t uma solução da equação homogénea associada.

a) Determine, pelo método do wronskiano um sistema fundamental de soluções


da equação homogénea associada.
b) Aplicando o método da variação dos parâmetros de Lagrange, ou pelo método
de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem), calcule a solução geral da
equação inicial.

Reescrevendo a equação na forma


2t 2
y 00 y0 + y = 1,
1+ t 2 1 + t2
vemos que o wronskiano de uma sistema fundamental de soluções da equação é dado
a menos de uma constante por

t y 2t
dt
y = 1 + t 2.
´
!(t, y) = 0
=e 1+t 2 , i.e. t y0
1 y

1 1
Dividindo ambos os membros da equação por t obtemos y 0 y = + t, que pode
t t
reescrever-se como
Ä 1 ä0 1
y = 2 + 1, pelo que y(t) = 1 + t 2
t t
é solução da equação homogénea associada com t > 0.

Mais ainda, t, t 2 1 é, por construção, um sistema fundamental de soluções da equa-


ção diferencial homogénea associada.
EXERCÍCIOS DE AVALIAÇÃO 153

Para determinar a solução geral da equação, vamos aplicar o método da variação dos
parâmetros de Lagrange, i.e. procuramos a solução na forma

y(t) = u1 (t)t + u2 (t)(t 2 1),

com u1 , u2 satisfazendo
2 32 3 2 3 8 2
t t 2
1 u0 0 <u0 = 1 t = 1 + 2 ,
1
4 5 4 15 = 4 5 e, por Cramer, t2 + 1 t2 + 1
1 2t 0
u2 1 :u0 = t ,
2
t2 + 1
1
donde se conclui que u1 (t) = t + 2 arctan(t) + c1 , u2 (t) = ln(t 2 + 1) + c2 , c1 , c2 2 R.
2
A solução geral vem dada por
t2 1
y(t) = c1 t + c2 (t 2 1) + 2 arctan(t) t t+ ln(t 2 + 1), c1 , c2 2 R, t 2 R+ .
2
Alternativamente, apliquemos o método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem):
Efectuemos a mudança de variável y = tz, e reescrevendo a equação completa como

(1 + t 2 )(tz 00 + 2z 0 ) 2t(tz 0 + z) + 2tz = 1 + t 2 ,

(1 + t 2 )tz 00 + 2(1 + t 2 ) 2t 2 z 0 + ( 2t + 2t) z = 1 + t 2 ,


2 1
u0 + u= , t 2 R+ , u = z0.
(1 + t )t
2 t
Multipliquemos a equação por
´Ä ä
t2
´ 2 2t
2
dt dt 2
) ln(1+t 2 )
e (1+t 2 )t =e t 1+t 2
= eln(t = ,
1 + t2
obtendo
Ä t2 ä0 t 1 + t2
u = i.e. u= ln(1 + t 2 ).
1 + t2 1 + t2 2t 2
Como z 0 = u, integrando em ordem a t
1 + t2 1Ä 1 ä t2 1
ˆ ˆ
2
z= ln(1 + t ) d t = + t ln(1 + t 2 ) dt
2t 2 2 t 1 + t2
ˆ Ä
1 t2 1 2 2 ä
= ln(1 + t ) 1 dt
2 t 1 + t2
t2 1
= ln(1 + t 2 ) 2 arctan(x).
2t
Concluímos assim, que uma solução particular da equação diferencial dada é
t2 1
yp = ln(1 + t 2 ) 2t arctan(x),
2
e que a solução geral da equação, para t 2 R+ , é dada por

y = yh + y p , com yh = c1 t + c2 (t 2 1), c1 , c2 2 R+ .
154 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Exercício (Frequência, 20-10-2020). Considere a equação diferencial linear de coefi-


cientes constantes

y 000 + a y 00 + b y 0 + c y = f (t), t 2 R.

a) Sabendo que 2 e i são raízes do polinómio característico e que y(t) = e3t é


uma solução da equação diferencial dada, determine a, b, c e f .
b) Indique a solução geral da equação.

O polinómio característico da equação homogénea dada na alínea a) é (r +2)(r 2 +1) =


r 3 + 2r 2 + r + 2; pelo que a equação diferencial procurada é

y 000 + 2 y 00 + y 0 + 2 y = (33 + 232 + 3 + 2)e3t = 50e3t .

Um sistema fundamental de soluções da equação homogénea associada é


2t
e , cos(t), sin(t) , logo a solução geral da equação é dada por
2t
y(t) = c1 e + c2 cos(t) + c3 sin(t) + e3t , c1 , c2 , c3 2 R, t 2 R.

Exercício (Frequência, 17-11-2020). Considere a equação diferencial linear

(t 1) y 00 (t) t y 0 (t) + y(t) = 0.

Sabendo que y(t) = e t é uma sua solução, determine, pelo método do wronskiano ou
pelo método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem), um sistema fundamental
de soluções da equação diferencial.

Reescrevendo a equação na forma


t 1
y 00 y0 + y = 0,
t 1 t 1
vemos que o wronskiano de uma sistema fundamental de soluções da equação é dado
a menos de uma constante por

et y t
dt
y0
´
!(t, y) = t 0
=e t 1 , i.e. y=t 1.
e y
Ä ä0
t
Assim e y = (t 1)e t , pelo que y(t) = t é solução da equação com t > 1.

Mais ainda, t, e t é, por construção, um sistema fundamental de soluções da equação


diferencial homogénea associada.

Alternativamente, usando o método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem):


escrevendo y = e t z, temos que a equação dada se pode reescrever como

(t 1)e t (z + 2z 0 + z 00 ) t e t (z + z 0 ) + e t z = 0,

(t 1)z 00 + (2t 2 t)z 0 + (t 1 t + 1)z = 0, (e t 6= 0)


EXERCÍCIOS DE AVALIAÇÃO 155

(t 1)u0 + (t 2)u = 0, u = z0.

u0 t 2 u0 1
Assim, = , ou ainda = 1+ , logo ln(u) = t + ln(t 1), t > 1,
u t 1 u t 1 ˆ
pelo que u = (t 1)e , t > 1. Agora, z = u, obtemos z = (t 1)e t d t = e t t.
t 0

Portanto, y = t. Concluímos assim que um sistema fundamental de soluções é dado


por t, e t .

Exercício (Frequência, 17-11-2020). Considere a equação diferencial linear de coefi-


cientes constantes y 00 (t) + 4 y(t) = 0, t 2 R.

a) Determine um sistema fundamental de soluções para a equação dada.


b) Determine, usando o método da variação dos parâmetros de Lagrange ou
pelo método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem), uma solução
particular da equação y 00 (t) + 4 y(t) = sec(2t).
c) Indique, justificadamente, a solução geral de y 00 (t) + 4 y(t) = 1 + sec(2t).

O polinómio característico da equação homogénea dada na alínea a) é r 2 + 4; pelo que


um sistema fundamental de soluções da equação homogénea associada é
cos(2t), sin(2t) . Procuramos a solução na forma

y(t) = u1 (t) cos(2t) + u2 (t) sin(2t),

com u1 , u2 satisfazendo
2 32 3 2 3 8
<u0 = tan(2t)
cos(2t) sin(2t) u 0
0 1 ,
4 5 4 15 = 4 5 e, por Cramer, 2
2 sin(2t) 2 cos(2t) u02 sec(2t) :u0 = 1 ,
2
2
donde se conclui que
ln(cos(2t)) t
u1 (t) = + c1 , u2 (t) = + c2 , c1 , c2 2 R.
4 2
A solução geral vem dada por
ln(cos(2t)) t
y(t) = c1 cos(2t) + c2 sin(2t) + cos(2t) + sin(2t),
4 2
c1 , c2 2 R, t 2 R.

Por outro lado, vê-se facilmente que


1
y(t) = é solução da equação y 00 + 4 y = 1;
4
e, portanto, do princípio da sobreposição concluímos que,
ln(cos(2t)) t 1
y(t) = c1 cos(2t) + c2 sin(2t) + cos(2t) + sin(2t) + ,
4 2 4
c1 , c2 2 R, t 2 R, é a solução geral da equação na alínea c).
156 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

Alternativamente, vamos resolver a alínea b) usando o método de D’Alembert (ou do


abaixamento de ordem). Pode observar-se que determinando uma solução particular da
equação completa o problema fica resolvido (pois da alínea a) conhecemos já a solução
geral da homogénea). Efectuamos a mudança de variável y = z sin(2t) e tendo em
conta que

y 0 = 2z cos(2t) + z 0 sin(2t), y 00 = 4z sin(2t) + 4z 0 cos(2t) + z 00 sin(2t),

verificamos que a equação toma a forma

sin(2t)z 00 (t) + 4 cos(2t)z 0 = sec(t),

ou ainda,
cos(2t) sec(2t)
u0 (t) + 4 u= , u = z0.
sin(2t) sin(2t)
´
cos(2t)
4 sin(2t) d t
Multiplicando a equação por e = e2 ln(sin(2t)) = sin2 (2t), tem-se
0 sin(2t) 1
sin2 (2t)u = i.e. sin2 (2t) u = ln(cos(2t)).
cos(2t) 2
Vemos então que
Å ã
0 cos(t) 1 1
z =u= 2 , pelo que z= t + cot(2t) log(cos(2t)) .
sin2 (2t) 2 2
Vemos assim, que uma solução particular da equação dada na alínea b) é
Å ã
1 1
yp = t + cot(2t) log(cos(2t)) sin(2t).
2 2
Exercício (Exame, 21-01-2021). Verifique que a função f (t) = t 2 é solução da equação

t 2 y 00 (t) 2t y 0 (t) + 2 y(t) = 0

e determine, pelo método do wronskiano ou pelo método de D’Alembert (ou do abai-


xamento de ordem), a solução geral da equação.

Exercício (Exame, 21-01-2021). Considere a equação diferencial

00 0 et
y (t) 2 y (t) + 10 y(t) = .
cos(3t)
a) Determine um sistema fundamental de soluções da equação homogénea as-
sociada.
b) Aplicando o método da variação dos parâmetros de Lagrange ou pelo método
de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem), calcule a solução geral da
equação inicial.

Exercício (Frequência, 12-10-2021). Considere a equação diferencial linear de coefi-


cientes constantes y 00 + y = 5t e2t .
EXERCÍCIOS DE AVALIAÇÃO 157

a) Determine um sistema fundamental de soluções da equação diferencial ho-


mogénea associada.
b) Aplicando o método do polinómio anulador determine uma solução particu-
lar da equação dada.
1 0
c) Determine a solução da equação da equação inicial tal que y(0) = , y (0) =
5
2
. (Comece por indicar a solução geral da equação dada. . . )
5

(a) O polinómio característico da equação homogénea dada na alínea (a) é r 2 + 1, pelo


que um sistema fundamental de soluções é dado por cos(t), sin(t) .
(b) Como 2 não é raiz do polinómio característico procuramos uma solução particular
na forma y p = (A + B t)e2t . Assim,

1⇥ yp = A + Bt e2t
0⇥ y p0 = (B + 2A) + 2Bt e2t 4
Logo, B=1 e A= .
1⇥ y p00 = 4(B + A) + 4Bt e2t 5
5t e2t = (4B + 5A) + 5Bt e2t

4
Vemos assim que uma solução particular é + t e2t .
y p (t) =
5
4
(c) A solução geral da equação dada é y(t) = ↵ cos(t) + sin(t) + + t e2t . As-
5
sim, como
4 8
y(0) = ↵ , y 0 (0) = + 1 tendo em conta a hipótese
5 5
1 4 2 3
=↵ , = i.e. ↵ = 1, = 1.
5 5 5 5
4
Logo, a solução do problema dado é y(t) = cos(t) + sin(t) + + t e2t .
5
Exercício (Frequência, 12-10-2021). Considere a equação diferencial
t y 00 + 2(1 + t) y 0 + 2 y = 8e2t .
1
a) Mostre que y(t) = é uma solução da equação diferencial homogénea as-
t
sociada.
¶ 1 e 2t ©
b) Mostre que , é um sistema fundamental de soluções da equação
t t
diferencial homogénea associada.
c) Aplicando o método da variação dos parâmetros de Lagrange ou pelo método
de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem), calcule a solução geral da
equação inicial.
Ä 1 ä00 Ä1ä 2 Ä 1 ä0
2 2 2
(a) Basta verificar que t + 2(1 + t)
+2 = 2 + = 0.
t t t t t2 t t
(b) Tendo em conta o Teorema de Liouville, o wronskiano de um sistema fundamental
158 3. EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

de soluções da equação homogénea associada é, a menos de uma constante multipli-


cativa dada por
Ä1 ä 1
y Ä ˆ Ä
1 ä ä e 2t
t
! ,y = 1
= exp 2 1+ dt = 2
t t2 y0 t t

1 e 2t
Assim, y é tal que y0 + y = , i.e. (t y)0 = e 2t , ou ainda y(t) =
t t
e 2t ¶ 1 e 2t ©
, ficando provado que , é um s.f.s. da equação homogénea associada.
2t t t
(c) Para determinar a solução geral da equação, vamos aplicar o método da variação
1
dos parâmetros de Lagrange, i.e. procuramos a solução na forma y(t) = u1 (t) +
t
e 2t
u2 (t) , com u1 , u2 , satisfazendo
t
2 32 3 2 3 8
1 e 2t 0
u1 0 <u0 = 4e2t ,
4 t t 5 4 5 4 5 1
1 e 2t (2t+1) 0
= 8e2t e, por Cramer,
t2 t2 u2 t
:u0 = 4e4t ,
2

donde se conclui que u1 (t) = 2e2t + c1 e u2 (t) = e4t + c2 , c1 , c2 2 R. A


solução geral vem dada por
1 e 2t e2t
y(t) = c1 + c2 + , c1 , c2 2 R, t 2 R+ .
t t t
Já aplicando o método de D’Alembert (ou do abaixamento de ordem), efectuando a
1
mudança de variável y = z, e reescrevendo a equação inicial em termos de z, tem-
t
-se que
0
z 00 + 2z 0 = 8e2t , i.e. e2t z 0 = 8e4t .

Integrando em ordem a t

e2t z 0 = 2e4t , logo z 0 = 2e2t e, portanto, z = e2t .

Desfazendo a mudança de variável, concluímos que uma solução particular da equação


e2t
dada é y p = , e a solução geral vem dada por
t
1 e 2t e2t
y(t) = c1 + c2 + , c1 , c2 2 R, t 2 R+ .
t t t
CAPíTULO 4

Transformadas de Laplace e sistemas de equações


diferenciais

1. Introdução ao estudo da transformada de Laplace

O método das transformadas de Laplace é de grande importância nas ciências e en-


genharia. A teoria geral foi estabelecida por O. Heaviside (1850-1925). Vamos fazer
uma exposição no sentido da aplicação prática destas transformadas.

O cálculo de integrais com limites de integração infinita é semelhante ao caso dos inte-
grais com limites de integração finitos. Por exemplo
ˆ +1 ˆ ↵
1 ó↵ 1 1
2t
e d t = lim e 2t d t = lim e 2t = lim e 2↵

1 = .
0 ↵ !+1 0 2 ↵!+1 0 2 ↵!+1 2

Trata-se pois de um exemplo de um integral impróprio convergente. Já o integral


ˆ +1
1
ˆ ↵
1 ó↵
d t = lim d t = lim ln(t) ,
1 t ↵ !+1 1 t ↵ !+1 1

é divergente, pois lim ln(↵


↵) diverge para +1.
↵ !+1

Vemos assim, que no cálculo de integrais impróprios usamos as mesmas técnicas de


integração. Por exemplo
ˆ +1
1 Ä 1 ó↵ 1 Ä 1 1ä 1
t e 2t d t = lim t e 2t
+ e 2t
= lim e 2↵

+ e 2↵

= .
0 2 ↵!+1 2 0 2 ↵!+1 2 2 4

Consideremos a função f : [0, +1[! C e s>0 um parâmetro real (positivo).


Definimos transformada de Laplace de f , L { f }, como
ˆ +1
st
L { f } (s) = f (t)e d t,
0

sendo o domínio desta função constituído pelos valores de s que tornam convergente
o integral dado.

Outra notação comum de transformada de Laplace de f é L { f } ⌘ F . No entanto, não


será esta a notação que aqui vamos usar, e sim a primeira, por nos aproximar do cálculo
operacional que queremos estudar.
159
160 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Vamos começar por introduzir uma colecção de transformadas de Laplace de funções,


ditas fundamentais (neste estudo).

Exemplo 4.1. Considere-se a função ˆf (t) = 1, definida em R+ , e calculemos a sua


+1
transformada de Laplace, L { f } (s) = e st d t.
0

Analisemos a convergência do integral da transformada de Laplace de 1 com s > 0


ˆ +1 ˆ ↵
1 ó↵
st
L {1} (s) = e d t = lim e st d t = lim e st
0 ↵ !+1 0 s ↵!+1 0

1 1
= lim e s↵↵ 1 = ;
s ↵!+1 s
1
pelo que L {1} (s) = , s > 0.
s
Exemplo 4.2. Considere-se a função ˆf (t) = t, definida em R+ , e calculemos a sua
+1
transformada de Laplace, L { f } (s) = t e st d t.
0

Analisemos a convergência do integral da transformada de Laplace de t com s > 0


ˆ +1 ˆ ↵
1 Ä e st ó↵
st
L {t} (s) = t e d t = lim t e st d t = lim e st t +
0 ↵ !+1 0 s ↵!+1 s 0
1 Ä e s↵↵ 1 ä 1
= lim ↵ e s↵↵ + = 2;
s ↵!+1 s s s
1
pelo que L {t} (s) = , s > 0.
s2
Exemplo 4.3. Usando integração por partes (com n 2 N) vemos que
e st t n ó↵ n
ˆ +1
n n
L {t } (s) = t n e st d t = lim + L t n 1 (s) = L t n 1
(s).
0 ↵ !+1 s 0 s s
s↵
e ↵
↵n
Note que, por aplicação da regra de L’Hôpital tem-se que lim = 0. Desta
↵ !+1 s
n!
forma concluímos que L {t n } (s) = , n 2 N.
s n+1
Exemplo 4.4. Consideremos a função f (t) = e at , onde
ˆ +1 ˆ a 2 R. Calculemos a sua
+1
transformada de Laplace, L { f } (s) = e at e st d t = e (s a)t d t.
0 0

Para s  a, observamos que este integral é divergente. Já se s > a, analisamos o integral


ˆ +1 ˆ ↵
1 ó↵
(s a)t
e d t = lim e (s a)t d t = lim e (s a)t
0 ↵ !+1 0 s a ↵!+1 0

1 1
= lim e (s a)↵↵ 1 =
s a ↵ !+1 s a
1
pelo que L e at (s) = , s > a.
s a
1. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TRANSFORMADA DE LAPLACE 161

Exemplo 4.5. Consideremos a funçãoˆ f (t) = cos(at), a 6= 0, e determinemos a sua


+1
transformada de Laplace, L { f } (s) = cos(at)e st d t.
0

Para os valores s > 0 obtemos, integrando por partes,


ˆ +1 ˆ ↵
st
cos(at)e d t = lim cos(at)e st d t
0 ↵ !+1 0
s cos(at) + a sin(at) ó↵
= lim
↵ !+1 est (a2 + s2 ) 0

1 Ä s cos(a↵ ↵) + a sin(a↵
↵) ä
= lim 2 + s
↵ !+1 a + s 2 es↵↵
s
= 2 ;
a + s2
s
pelo que L {cos(at)} (s) = 2 , s > 0.
a + s2
Exemplo 4.6. Consideremos f (t) ˆ= sin(at), a 6= 0, e determinemos a sua trans-
+1
formada de Laplace, L { f } (s) = sin(at)e st d t.
0

Para os valores s > 0 obtemos, aplicando integração por partes,


ˆ +1 ˆ ↵
st
sin(at)e d t = lim sin(at)e st d t
0 ↵ !+1 0
a cos(at) s sin(at) ó↵
= lim
↵ !+1 est (a2 + s2 ) 0

1 Ä a cos(a↵ ↵) s sin(a↵
↵) ä
= lim 2 + a
↵ !+1 a + s 2 es↵↵
a
= 2 ;
a + s2
a
pelo que L {sin(at)} (s) = 2 , s > 0.
a + s2
Mas, nem todas as funções têm transformada de Laplace. Vejamos alguns exemplos.
1
Exemplo 4.7. Não existe transformada de Laplace da função f (t) = , pois o integral
ˆ +1 st t
e
impróprio d t não é convergente para nenhum valor do parâmetro s.
0 t

Comece por escrever


+1 st 1 st +1 st
e e e
ˆ ˆ ˆ
dt = dt + d t.
0 t 0 t 1 t
Para concluir que este integral é divergente, é suficiente comparar os seguintes integrais
ˆ 1 st ˆ 1
e 1
d t, dt (este último é divergente, porquê?).
0 t 0 t
2
Exemplo 4.8. Mostre que não existe transformada de Laplace da função f (t) = e t .
162 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

ˆ +1
2
A divergência do integral L { f } (s) = et e st
dt é consequência de que
0
2
lim e t e st
= +1, para qualquer s 2 R+ .
t!+1

Dos exemplos anteriores podemos intuir que:

existem as transformadas de Laplace de funções de tipo expo-


nencial, seno ou co-seno, bem como de funções polinomiais.

Diremos que uma função f definida no intervalo [0, +1[ é de tipo exponencial
c > 0, se

existem M , T 2 R+ tais que | f (t)|  M e c t , para t > T .

Uma condição suficiente para que a função f definida no intervalo [0, +1[ seja de
tipo exponencial é que exista e seja finito, o limite

at
lim | f (t)|e , para um certo valor do parâmetro real a > 0.
t!+1

As funções t ↵ , com ↵ 0 são de tipo exponencial, pois

at
lim t ↵ e = 0, para qualquer valor a > 0.
t!+1

Também podemos afirmar que


bt
se para todo valor real b > 0, o limite lim | f (t)|e = +1,
t!+1
então a função f não é de tipo exponencial.
2
A função f (t) = e t exemplifica o que acabamos de afirmar, i.e. não é de tipo exponen-
2
cial. De facto, para qualquer b > 0 temos que lim e t e bt
= +1.
t!+1

Enunciemos, sem demonstração, um teorema de geração de funções de tipo exponen-


cial:

Uma qualquer combinação linear de funções de tipo exponencial


é de tipo exponencial. O mesmo se tem para o produto de funções
de tipo exponencial.

Podemos enunciar o seguinte teorema de existência de transformada de Laplace:

Se a função f : [0, +1[! C é contínua e de tipo exponencial


c > 0, então existe a transformada de Laplace L { f } (s), para
s > c. Além disso, lim L { f } (s) = 0.
s!+1

1
Exemplo 4.9. A função f (t) = t não pertence à classe de funções de tipo exponen-
2
¶ 1© p 1
cial. De facto, não existe lim+ f (t). No entanto, existe L t 2 (s) = ⇡s 2 .
t!0
2. PROPRIEDADES DA TRANSFORMADA DE LAPLACE 163

Comece por observar que


¶ 1
© ˆ 1
1
ˆ +1
1
st st
L t 2 (s) = t 2 e dt + t 2 e d t.
0 1
1/2 st
Se s > 0 segundo integral é convergente, pois lim t e = 0. Analisemos então
t!+1
1 1
a convergência do primeiro integral. Assim, em 0 < t < 1, tem-se que t 2 e st < t 2 ,
ˆ 1
1
s > 0; e como t 2 d t é convergente temos o que queríamos provar.
0
¶ 1©
Para o cálculo de L t 2 (s), comece por ver que

d ¶ 1© ˆ +1
1
Ä 1 1 ó↵ 1
ˆ +1
1
st s↵
L t 2 (s) = t 2 e d t = lim ↵2e ↵
+ t 2 e st d t
ds 0 ↵ !+1 s 0 2s 0
1 ¶ 1
©
= L t 2 (s).
2s
¶ 1© 1
¶ 1©
Desta identidade concluímos que existe L t 2 (s) = s 2 L t 2 (1), onde
¶ 1© ˆ +1
1
ˆ +1 ˆ +1
t v2 2
L t 2 (1) = t e dt =
2 1
v e (2v) d v = 2 e v d v,
0 0 0

efectuando a mudança de variável t = v 2 .


ˆ +1 p
v2 ⇡
Como e dv = ,
0 2

este é um resultado surpreendente! pois estamos em presença


x2
de um integral de uma função, e , que não é elementar-
mente primitivável. . .
¶ 1
© p ¶ 1
© p 1
concluímos que L t 2 (1) = ⇡ e, portanto, L t 2 (s) = ⇡s 2 .

2. Propriedades da transformada de Laplace

Propriedade (Linearidade da transformada de Laplace).

L {↵ f + g} (s) = ↵L { f } (s) + L {g} (s), ↵, 2 R.

Esta identidade é válida para os valores de s em que cada uma das transformadas exista,
e é consequência da linearidade do integral.

Exemplo 4.10. A transformada do seno, respectivamente, do co-seno hiperbólico é


dada por
s
L {cosh(at)} (s) = , s > |a|,
s2 a2
respectivamente,
a
L {sinh(at)} (s) = , s > |a|.
s2 a2
164 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Tendo em conta que


e at + e at
e at e at
cosh(at) = , sinh(at) =
2 2
obtemos
1 1Ä 1 1 ä s
L {cosh(at)} (s) = (L e at (s) + L e at
(s)) = + = 2 ,
2 2 s a s+a s a2
e também,
1 1Ä 1 1 ä a
L {sinh(at)} (s) = (L e at (s) L e at
(s)) = = 2 ,
2 2 s a s+a s a2
para os valores s > a e s > a ou, equivalentemente, para s > |a|.

Exemplo 4.11. Vê-se facilmente, da linearidade da transformada de Laplace e do exem-


plo 4.3, que
240 6 5
L 2t 5 3t 2 + 5 (s) = 2L t 5 3L t 2 + 5L {1} = + .
s6 s3 s
Propriedade (deslocamento da transformada de Laplace).

L e at f (t) (s) = L { f (t)} (s a),

para os valores s e s a que tornam convergentes os integrais anteriores.

Esta propriedade é consequência directa da definição de transformada de Laplace


ˆ +1 ˆ +1
at at st
L e f (t) (s) = e f (t)e d t = f (t)e (s a)t d t = L { f (t)} (s a).
0 0

t 2
Exemplo 4.12. L e sin(2t) (s) = L {sin(2t)} (s + 1) = .
(s + 1)2 + 4
s 5
Exemplo 4.13. L e5t cosh(3t) (s) = L {cosh(3t)} (s 5) = .
(s 5)2 9
5!
Exemplo 4.14. L e t t 5 (s) = .
(s 1)6
Propriedade (derivada da transformada de Laplace). A transformada de Laplace, L { f },
de funções de tipo exponencial, f , é indefinidamente diferenciável, tendo-se
dn
L { f (t)} (s) = L {( t)n f (t)} (s).
d sn

De facto, derivando em ordem a s ambos os membros da identidade


ˆ +1
L { f (t)} (s) = f (t)e st d t;
0

obtemos, da diferenciabiliade da transformada de Laplace de f de tipo exponencial, que


ˆ +1
d
L { f (t)} (s) = f (t)e st ( t) d t = L {t f (t)} (s)
ds 0

Aplicando esta identidade sucessivamente obtemos a propriedade pretendida.


2. PROPRIEDADES DA TRANSFORMADA DE LAPLACE 165

Exemplo 4.15. Determinar a transformada de Laplace das funções

f (t) = 5t 2 + t 2 cos(2t), g(t) = t e t , h(t) = t e2t cos(3t).

Da linearidade da transformada de Laplace

L { f (t)} (s) = L 5t 2 + t 2 cos(2t) (s) = 5L t 2 (s) + L t 2 cos(2t) (s)

Agora usamos o exemplo 4.3 e a propriedade do deslocamento obtemos

2! Ä s ä00 10 2s(s2 12)


2
L { f (t)} (s) = 5 + ( 1) = 3 + .
s3 s2 + 4 s (s2 + 4)3

t 1
Para a função g, L {g(t)} (s) = L t e (s) = L {t} (s + 1) = . Já para a
(s + 1)2
função h,

L {h(t)} (s) = L t e2t cos(3t) (s) = L {t cos(3t)} (s 2).

Aplicando a propriedade da derivada da transformada de Laplace


Ä s ä0 s2 9
L {t cos(3t)} (s) = = 2
s2 + 9 s2 + 9

obtendo-se finalmente
(s 2)2 9
L {h(t)} (s) = L t e2t cos(3t) (s) = 2
.
(s 2)2 + 9

Como consequência da fórmula de primitivação por partes temos a seguinte proprie-


dade.

Propriedade (transformada de Laplace de derivadas sucessivas). Para funções de tipo


exponencial indefinidamente diferenciáveis, são válidas as seguintes igualdades:
ˆ +1
0
L f (s) = f 0 (t)e st d t = sL { f } (s) f (0),
0

L f 00
(s) = sL f 0 (s) f 0 (0) = s2 L { f } (s) s f (0) f 0 (0)

e, mais geralmente, para todo n 2 N,

L f (n) (s) = s n L { f } (s) sn 1


f (0) sn 2
f 0 (0) ··· s f (n 2)
(0) f (n 1)
(0).

Exemplo 4.16. Determinar a transformada de Laplace da solução do problema de con-


dições iniciais, ou de Cauchy,

2 y 00 + y 0 y = t, y(0) = 1, y 0 (0) = 2.
166 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Ainda que não conheçamos a função y, podemos assumir que existe a sua transformada
de Laplace e também a das funções y 0 e y 00 , para certos valores de s. Uma vez assumida
a existência, podemos usar as propriedades deduzidas anteriormente, pelo que

L 2 y 00 + y 0 y (s) = L {t} (s).

Usando a linearidade, obtém-se

2L y 00 (s) + L y 0 (s) L { y} (s) = L {t} (s).

Agora, da propriedade das derivadas sucessivas concluímos que


1
2(s2 L { y} (s) s 2) + (sL { y} (s) 1) L { y} (s) = ,
s2
ou seja
1
(2s2 + s 1)L { y} (s) = + 2s + 5.
s2
2s3 + 5s2 + 1
Assim, L { y} (s) = é a transformada de Laplace da solução.
s2 (2s2 + s 1)

3. Transformada Inversa de Laplace

Da mesma forma que podemos calcular a transformada de Laplace de uma dada fun-
ção f , também podemos colocar o problema recíproco, i.e. dada uma certa função F ,
vamos tentar identificar uma função f , de forma que L { f } (s) = F (s). Caso o pro-
blema não tenha solução única, existiriam f1 , f2 tais que

L { f1 } (s) = F (s), L { f2 } (s) = F (s);

pelo que da linearidade da transformada de Laplace

L { f1 f2 } (s) = 0, para qualquer valor de s.

O seguinte teorema permite concluir que f1 ⌘ f2 , caso estas funções sejam contínuas e
de tipo exponencial:

Se f é contínua e de tipo exponencial a tal que L { f } (s) = 0,


s > a, então f (t) = 0 para todo t 0.

Dada uma função F , designamos transformada inversa de Laplace à função f , contínua


e de tipo exponencial, tal que

1
L { f } (s) = F (s), que denotaremos como L {F } ⌘ f .

A transformada inversa de Laplace é linear, i.e.


3. TRANSFORMADA INVERSA DE LAPLACE 167

1 1 1
L {↵F + G} = ↵L {F } + L {F }, ↵, 2 R.

Algumas transformadas inversas de Laplace:


ß ™ n s o
1 tn
L 1 n+1 (t) = , L 1 2 (t) = cos(at),
s n! s + a2
ß ™ ß ™
1 1 sin(at)
L 1 (t) = e at , L 1 2 (t) = .
s a s + a2 a
ß ™ ß ™ ß ™
2 3 1 1
Exemplo 4.17. L 1 + 2 (t) = 2L 1 (t) + 3L 1 2 (t) = 2 +
s s +1 s s +1
3 sin(t).

A propriedade do deslocamento para a transformada inversa de Laplace é descrita por

L 1
{F (s a)} (t) = e at L 1
{F (s)} (t).

Vejamos algumas aplicações desta propriedade.


ß ™ ß ™ ß ™
1 1 3 2t 1 1 t 1 1
Exemplo 4.18. L + (t) = e L (t) + 3e L (t) =
s 2 (s + 1) 2 s s2
e2t + 3e t t.
ß ™ n s o ß ™
1 3s 5 1 1 1
Exemplo 4.19. L (t) = 3L (t) 5L (t) = 3 cos(2t)
s2 + 4 s2 + 4 s2 + 4
5
sin(2t).
2
ß ™
1 s+7
Exemplo 4.20. Determine L (t).
s2 s 6

Comecemos por ver que


s+7 ↵
= + ,
s 6 s2 s 3 s+2
s + 7ó s + 7ó
onde ↵ = =2e = = 1. Assim,
s + 2 s!3 s 3 s! 2
ß ™
1 s+7
L (t) = 2e3t e 2t
.
s2 s 6
⇢ 3 2
1 s + 2s s + 12
Exemplo 4.21. Determine L (t).
s + 10s + 9
4 2

Comecemos por ver que


s3 + 2s2 s + 12 ↵1 s + ↵2 1s + 2
= 2 + 2 ,
s + 10s + 9
4 2 s +1 s +9
onde
s3 + 2s2 s + 12 ó 1 5
↵1 i + ↵2 = = i+ ,
s2 + 9 s!ii 4 4
s3 + 2s2 s + 12 ó 15 3
3 1i + 2 = = i+ ,
s2 + 1 s!3ii 4 4
168 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

logo

1 5 5 3
↵1 = , ↵2 = , 1 = , 2 = .
4 4 4 4
Assim,

1 s3 + 2s2 s + 12 1
L (t) = cos(t) + 5 sin(t) + 5 cos(3t) + sin(3t) .
s4 + 10s2 + 9 4

4. Função de Heaviside

A função de Heaviside (ou função degrau) fica definida por

8
<0, 0t <c
uc (t) =
:1, t c

Usando a função de Heaviside podemos descrever funções por ramos. Por exemplo,
u1 (t) u3 (t) é igual a 1 se 1  t < 3 e 0 nos demais pontos. De facto,
8
>
> 0 0 = 0, 0  t < 1,
>
<
u1 (t) u3 (t) = 1 0 = 1, 1  t < 3,
>
>
>
:1 1 = 0, 0  t 3.

Exemplo 4.22. Consideremos a função


8
>
> 1, t < 1,
>
< Neste caso,
f (t) = 1 1  t < 2,
>
>
>
:t f (t) = 1 2u1 (t) + (t + 1)u2 (t).
2  t.

Exemplo 4.23 (Transformada de Laplace da função de Heaviside).


ˆ +1 ˆ +1 cs
st e
L {uc (t)} (s) = e uc (t) d t = e st d t = .
0 c s
ß cs ™
1 e
Da mesma forma L (t) = uc (t).
s

Por exemplo, se f é igual a 3 se 2  t < 7 e 0 para os demais pontos tais que t 0;


então, f (t) = 3 u2 (t) u7 (t) . Assim,
2s 7s
e e
L { f (t)} (s) = 3L {u2 (t)} (s) 3L u7 (t) (s) = 3 3 .
s s
4. FUNÇÃO DE HEAVISIDE 169

Calculamos ainda a transformada de Laplace de função deslocamento, começando em


t = c, i.e. é 0 para t 2]0, c[:
ˆ +1 ˆ +1
st st
L {uc (t) f (t c)} (s) = e uc (t) f (t c) d t = e f (t c) d t
0 c
ˆ +1
s(c+z)
= e f (z) d z mudança de variável t c=z
0
ˆ +1
cs sz cs
=e e f (z) d z = e L { f (t)} (s).
0

Acabamos de deduzir a segunda fórmula do deslocamento,


cs
L {uc (t) f (t c)} (s) = e L { f (t)} (s),

que termos da transformada inversa de Laplace se lê como


1 cs
L e F (s) (t) = uc (t) f (t c).

Por exemplo,
e s
L {u1 (t)(t 1)} (s) = e s L {t} (s) = .
s2
Tendo em conta que
ß ™
1 1
L (t) = sin(t)
1 + s2
obtemos
ß ™
1 e ⇡s
L (t) = u⇡ (t) sin(t ⇡) = u⇡ (t) sin(t).
1 + s2
Graficamente, a operação de deslocamento significa, que para as funções f (t) = t e
g(t) = u1 (t) f (t 1):

ou, mais geralmente, para uma função f , definida em R, tem-se


170 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Exemplo 4.24. Considere as funções


8
<0, t <1
f (t) = t e g(t) =
:t 1, t 1

A função g é o deslocamento da função f ao ponto t = 1, i.e. g(t) = (t 1)u1 (t), logo


1
L {g(t)} (s) = L {(t 1)u1 (t)} (s) = e s L {t} (s) = e s
.
s2
Exemplo 4.25. Consideremos a função
8
<1, t < 1
f (t) = i.e. f (t) = 1 + (t 1)u1 (t).
: t, t 1,

Assim,
1 1
L { f (t)} (s) = L {1 + (t 1)u1 (t)} (s) = L {1} (s) + e s L {t} (s) = +e s 2.
s s
Exemplo 4.26. Consideremos a função
8
< t, t <2
f (t) = i.e. f (t) = t + (t + 1)u2 (t) = t + (t 2)u2 (t) + 3u2 (t).
:2t + 1, t 2,

Assim

L { f (t)} (s) = L {t + (t 2) u2 (t) + 3 u2 (t)} (s)


2s 2s
= L {t} + e L {t} (s) + 3e L {1} (s)
1 2s 1 2s 1
= +e + 3e .
s s2 s
Exemplo 4.27. Pretendemos determinar uma função f tal que
8 8
< f 0 + 2 f = g, <0, 0  t < ⇡2 ,
onde g(t) =
: f (0) = 1 :2 sin t, t ⇡ .
2

Aplicando a transformada de Laplace à equação diferencial

L f 0 + 2L { f } = L {g} i.e. (s + 2)L { f } (s) f (0) = L {g} (s)

Reescrevendo a função g na forma


⇡ ⇡ ⇡
g(t) = 2 sin(t)u⇡/2 (t), onde sin t = sin t + = cos t ,
2 2 2
obtemos
n ⇡ o
L {g} (s) = L 2 sin(t)u⇡/2 (t) (s) = L 2 cos(t )u⇡/2 (t) (s)
2
⇡ ⇡ s
= 2e 2s L {cos(t)} (s) = 2e 2s .
s2 +1
5. TRANSFORMADA DE LAPLACE DA FUNÇÃO DELTA DE DIRAC 171

Substituindo na equação anterior obtemos


⇡ s
(s + 2)L { f } (s) = 1 + 2e 2s
s2 +1
1 ⇡ s
ou L { f } (s) = + 2e 2s .
s+2 (s + 2)(s2 + 1)
Agora como
4 4 2
s 5 5s + 5
= +
(s + 2)(s2 + 1) s + 2 s2 + 1
e, tendo em conta que,
ß ™
1 ⇡ ⇡
L 1
e 2s(t) = e 2(t 2 ) u⇡/2 (t),
(s + 2)
ß ™
1 ⇡
s s ⇡
L e 2 (t) = cos t u⇡/2 (t),
(s + 1)
2 2
ß ™
1 ⇡
s 1 ⇡
L e 2 (t) = sin t u⇡/2 (t),
(s + 1)
2 2
obtemos

2t 4 2(t ⇡ 4 ⇡ 2 ⇡
f (t) = e e 2) u⇡/2 (t) + cos t u⇡/2 (t) + sin t u⇡/2 (t)
5 5 2 5 2
8
<e 2t
, 0  t < ⇡2 ,
i.e. f (t) =
:e 2t 4 2(t ⇡
+ 45 cos(t ⇡ 2 ⇡ ⇡
5e sin(t t 2;
2)
2)+ 5 2 ),

⇡ ⇡
ou ainda, como cos t 2 = sin t e também que sin t 2 = cos t, concluímos que
8
<e 2t
,0  t < ⇡
2
f (t) =
:e 2t 4 2(t ⇡
+ 45 sin t 2 ⇡
5e cos t, t 2,
2)
5

é a solução da equação diferencial dada.

5. Transformada de Laplace da função delta de Dirac

Imaginemos uma vara tão fina que a possamos considerar como uma linha (dimen-
são um), e tão longa que a possamos estender de menos a mais infinito, i.e. t 2 R =
] 1, +1[. Consideremo-la com densidade ⇢(t) — peso por unidade de compri-
mento — em cada ponto (da vara). Para cada intervalo ] N , N [, com N > 0, construí-
mos, usando pontos igualmente espaçados t 1 , t 2 , . . . , t n , uma partição de amplitude
2N
t= . Então, o peso de cada parte i da vara pode tomar-se aproximadamente como
n
X
n
⇢(t i ) t e ⇢(t i ) t
i=1
172 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

dá-nos aproximadamente o peso total da vara. Tomando limite quando t ! 0 e


N ! +1, obtemos que o peso ! (da vara) é dado por:
Xn ˆ +1
! = lim ⇢(t i ) t = ⇢(t) d t.
!0 1
i=1

Assumindo agora que a vara passa a uma nova posição no plano (t, y) de forma que
cada ponto desta linha, (t, 0) é transformado num ponto t, f (t) , onde f é uma função
dada. A pergunta natural que aqui se coloca é:

Qual o trabalho que é preciso efectuar para que este movimento


tenha lugar?

Para cada peça i, o trabalho é aproximadamente f (t i )⇢(t i ) t. Pelo que o trabalho


total vem dado por
ˆ +1
trabalho = ⇢(t) f (t) d t.
1

Considere-se agora que a vara (ou linha) tem peso unitário, i.e. ! = 1 e que o peso
total está concentrado num único ponto t = 0. A distribuição do peso ao longo da vara,
para cada t, é designada de distribuição delta, ou função delta, e denotada por (t).

Da discussão anterior, temos que a função delta, satisfaz as seguintes propriedades:

i: ˆ(t) = 0, t 6= 0,
+1
ii: (t) d t = 1 (peso unitário),
ˆ1+1
iii: (t) f (t) d t = f (0).
1

Podemos considerar que é o limite quando " ! 0 da seguinte sucessão de funções


( f1/" ), que designaremos por sucessão delta (cf. figura seguinte):
8
< 1 se "  t  ", ˆ +1
2"
f1/" (t) = observe que f1/" (t) d t = 1.
:0 para outro t. 1

Da mesma forma, para qualquer t 0 a função (t t 0 ), translacção da (t), com massa


total (unitária) concentrada em t 0 , está definida pelas propriedades:
5. TRANSFORMADA DE LAPLACE DA FUNÇÃO DELTA DE DIRAC 173

i’: ˆ(t t 0 ) = 0, t 6= t 0 ,
+1
ii’: (t t 0 ) d t = 1 (peso unitário),
ˆ1+1
iii’: (t t 0 ) f (t) d t = f (t 0 ).
1

Estas propriedades permitem-nos determinar a transformada de Laplace de , i.e. para


todo t 0 0,
ˆ +1 ˆ +1
st st st 0
L { (t t 0 )} (s) = (t t 0 )e dt = (t t 0 )e dt = e .
0 1

Em particular, L { (t)} = 1; e também,


1 st 0 1
L e (t) = (t t0) e L {1} (t) = (t).

Por exemplo,
ß ™ ß ™
1 s+1 1 2 3t
L =L 1 = (t) 2e .
s+3 s+3
Exemplo 4.28. Resolva o seguinte problema com condições iniciais,

y 00 + 2 y 0 + 5 y = 6 (t 2), y(0) = 0, y 0 (0) = 0.

Aplicando transformada de Laplace, obtemos


6e 2s 1
(s2 + 2s + 5)L { y} (s) = 6e 2s
i.e. L { y} (s) = = 6e 2s
.
s2 + 2s + 5 (s + 1)2 + 4
Tendo em conta que
( )
ß ™
1 1 1 1 1/2 1 t
L (t) = L 2
(t) = e sin(2t),
(s + 1) + 4
2 2 (s + 1)/2 +1 2

e aplicando a segunda fórmula do deslocamento, obtemos finalmente que


(t 2)
y(t) = 3 u2 (t)e sin 2(t 2) .

Geometricamente falando, tem-se: Atendendo a que até ao instante t = 2 a força ex-


terna é nula e que as condições iniciais do problema são nulas, vemos que a solução
permanece em equilíbrio. A força do impulso em t = 2 provoca vibrações que rapida-
mente são amortecidas (cf. figura seguinte).
174 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

6. Aplicações da transformada de Laplace

Para resolver uma dada equação diferencial, apesar de não conhecer propriedades da
função solução, podemos transformar a equação dada por aplicação da transformada
de Laplace, obtendo uma equação algébrica para a transformada da função solução que
procuramos.

Exemplo 4.29. Consideremos o problema de Cauchy

f 00 (t) f (t) = 1, f (0) = 1, f 0 (0) = 1.

Aplicando transformada de Laplace a ambos membros desta equação,

L f 00 f (s) = L {1} (s);

e usando a propriedade da linearidade, tem-se

L f 00 (s) L { f } (s) = L {1} (s).

Da transformada da derivada, obtemos

s2 L { f } (s) L { f } (s) = L {1} (s) + s f (0) + f 0 (0);

e, tendo em conta as condições iniciais do problema, tem-se que


1 1 1 1 3 1
(s2 1)L { f } (s) = +s 1, ou ainda L { f } (s) = + + ;
s s 2 s 1 2 s+1
pelo que, usando a linearidade da transformada inversa, concluímos que
ß ™ ß ™ ß ™
1 1 1 3 1 1 3
f (t) = L 1 (t) + L 1 (t) + L 1 (t) = 1 + e t + e t .
s 2 s 1 2 s+1 2 2
Exemplo 4.30. Determine a solução do seguinte problema de Cauchy

f 00 + f = t, f (0) = 1, f 0 (0) = 2.

Aplicamos a transformada de Laplace a ambos membros desta equação,

L f 00 + f (s) = L {t} (s);

usando a propriedade da linearidade

L f 00 (s) + L { f } (s) = L {t} (s);

e a transformada da derivada (supondo que estas transformadas existem para s > a,


onde a é um certo valor real),

s2 L { f } (s) s f (0) f 0 (0) + L { f } (s) = L {t} (s);


6. APLICAÇÕES DA TRANSFORMADA DE LAPLACE 175

agora, tendo em conta as condições iniciais do problema, temos


1
(s2 + 1)L { f } (s) + s 2= ,
s2
ou ainda,
s3 + 2s2 + 1
(s2 + 1)L { f } (s) = ,
s2
pelo que
s3 + 2s2 + 1
L { f } (s) = ,
(s2 + 1)s2
s3 + 2s2 + 1
Usamos a decomposição de Hermite em fracções simples para , i.e.
(s2 + 1)s2
s3 + 2s2 + 1 A B Cs + D
= + 2+ 2
(s + 1)s
2 2 s s s +1
onde A = 0, B = 1, C = 1, D = 1. Logo
s3 + 2s2 + 1 1 s+1
L { f } (s) = = + ;
(s2 + 1)s2 s2 s2 + 1
usando a linearidade da transformada inversa, finalmente obtemos
ß ™ n s o ß ™
1 1 1 1 1
f (t) = L (t) L (t) + L (t) = t cos t + sin t.
s2 s2 + 1 s2 + 1
Exemplo 4.31. Determinar a solução do problema de Cauchy

f 0 (t) + f (t) = t, f (1) = 2.

Se queremos aplicar a transformada de Laplace precisamos der ter as condições iniciais


do problema dadas no ponto t = 0. Para adaptar a nosso problema, observamos que a
equação diferencial pode reescrever-se como

f 0 (t + 1) + f (t + 1) = t + 1, f (1) = 2.

Efectuando a mudança de variável, z(t) = f (t+1), transformamos o nosso problema em

z 0 (t) + z(t) = t + 1, z(0) = 2.

Aplicamos a transformada de Laplace a ambos membros desta equação,

L z 0 + z (s) = L {t + 1} (s);

e tendo em conta a linearidade da transformada de Laplace

L z 0 (s) + L {z} (s) = L {t} (s) + L {1} (s);

e a transformada da derivada,

sL {z} (s) + L {z} (s) = L {t} (s) + L {1} (s) + z(0).


176 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Agora, das condições iniciais do problema, obtemos


1 1 1 + s + 2s2
(s + 1)L {z} (s) = + + 2, ou ainda, .
s2 s s2 (s + 1)
1 + s + 2s2
Usamos a decomposição de em fracções simples
s2 (s + 1)
1 + s + 2s2 A B C
= + 2+
s (s + 1)
2 s s s+1
com A = 0, B = 1 e C = 2; assim,
1 + s + 2s2 1 2
L {z} (s) = = 2+ .
s (s + 1)
2 s s+1
Da linearidade da transformada inversa de Laplace, obtemos
ß ™ ß ™
1 1
1
z(t) = L {F } (t) = L 1
(t) + 2L 1
(t) = t + 2e t .
s2 s+1
Concluímos assim que a solução do problema inicial é dada por
(t 1)
f (t) = z(t 1) = (t 1) + 2e .

Antes de continuarmos com a resolução de problemas de condição inicial, relembre


algumas transformadas de Laplace. Por exemplo:
s 3
L e3t cos t (s) = L {cos t} (s 3) = ,
(s 3)2+1
ß ™ ß ™
1 1
L 1
(t) = e t L 1
(t) = t e t ,
(s + 1)2 s2
e analise a resolução dos seguintes problemas.

Exemplo 4.32. Calcule a transformada inversa de Laplace das seguintes funções


3 12 2s + 11 1
G(s) = , M (s) = , N (s) = .
s 2 (s + 1)3 s((s 3)2 + 2) s4 +4

Para o cálculo da primeira transformada inversa vamos usar a propriedade

L e at f (t) (s) = L { f (t)} (s a),

ou de forma equivalente,

L 1
{F (s a)} (t) = e at L 1
{F (s)} (t).

Assim,
ß ™
1 1 3 12
L {G} (t) = L (t)
2 s (s + 1)3
™ ß ß ™
1 1 1 1
= 3L (t) 12L (t)
s 2 (s + 1)3
ß ™ ß ™
2t 1 1 t 1 1
= 3e L (t) 12e L (t)
s s3
6. APLICAÇÕES DA TRANSFORMADA DE LAPLACE 177

ß ™
t 2
= 3e 2t
6e L 1
(t) = 3e2t 6e t t 2 .
s3
Para a segunda, começamos por escrever
2s + 11 A B(s 3) + C
= +
s((s 3) + 2)
2 s (s 3)2 + 2
onde A = 1, B = 1, C = 5. Assim,
ß ™
1 1 2s + 11
L {M } (t) = L (t)
s((s 3)2 + 2)
ß ™ ß ™ ß ™
1 s 3 1
= AL 1 (t) + BL 1 (t) + CL 1
(t)
s (s 3)2 + 2 (s 3)2 + 2
n s o ⇢ p
C 2
= A + Be3t L 1 2 (t) + p e3t L 1 2 (t)
s +2 2 s +2
p C p
= A + Be3t cos( 2t) + p e3t sin( 2t)
2
p 5 p
= 1 e3t cos( 2t) + p e3t sin( 2t).
2
Para o determinação da transformada inversa de Laplace de N , comecemos por ver que

s4 + 4 = (s2 + 2)2 (2s)2 = ((s 1)2 + 1)((s + 1)2 + 1);

assim,
1 ↵1 s + 1 ↵2 s + 2
= + ,
s4 +4 (s 1) + 1 (s + 1)2 + 1
2

onde
1 1 1
↵1 (1 + i ) + = (1 i )
1 =
4 1+i 8
1 1 1
↵2 ( 1 + i ) + 2 = = (1 + i ).
41 i 8
Concluímos que,
1 1 1 1
↵1 = , 1 = , ↵2 = , 2 =
8 4 8 4
e, portanto,
1 1 1 1
1 8s + 4 8s + 4
= + ,
s4 + 4 (s 1)2 + 1 (s + 1)2 + 1
ou ainda,
1 1Ä s 1 s+1 ä 1Ä 1 1 ä
= + + + .
s4 + 4 8 (s 1)2 + 1 (s + 1)2 + 1 8 (s 1)2 + 1 (s + 1)2 + 1
Daqui concluímos que a transformada inversa de N é dada por

1 1 et e t
1 et + e t
L {N } (t) = cos(t) + sin(t)
4 2 4 2
1
= sin(t) cosh(t) cos(t) sinh(t) .
4
178 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Exemplo 4.33. Determine a solução do problema de condições iniciais ou de Cauchy

27 y + 3 y 00 = 9, y(0) = 8, y 0 (0) = 1.

Aplicando a transformada de Laplace a ambos os membros da equação diferencial vem:

3L y 00 (s) 27L { y} (t) = L {9} (s)

Atendendo à propriedade da transformada de Laplace das derivadas, obtemos

L y 00 (s) = s2 L { y} (s) 8s + 1 e L y 0 (s) = sL { y} (s) 8

9
Como a transformada de Laplace de 9 é , reescrevemos a equação na forma
s
9
9 24s + s 3
(3s2 27)L { y} (s) = 24s + 3 ou ainda L { y} (s) = ;
s 3s2 27
e, portanto,
24s2 3s + 9
L { y} (s) =
s(3s2 27)
Procuremos a decomposição de Hermite para esta função racional. Comecemos por
notar que 3s2 27 = 3(s + 3)(s 3), pelo que
24s2 3s + 9 24s2 3s + 9 24s2 3s + 9 A B C
= = = + + ,
(3s 2 27)s 3s(s + 3)(s 3) 3s(s + 3)(s 3) 3s s + 3 s 3
onde
24s2 3s + 9 ó 24s2 3s + 9 ó 24s2 3s + 9 ó
A= , B= , C= .
3(s + 3)(s 3) s!0 3s(s 3) s! 3 3s(s + 3) s!3

13
Logo, A = 1, B = , C = 4. Assim,
3
13
24s2 3s + 9 1 3 4
= + +
3s(s + 3)(s 3) 3s s+3 s 3
Aplicando a transformada inversa de Laplace, temos
ß ™ ⇢ 13 ß ™
1 1 1 3 1 4
y(t) = L (t) + L (t) + L (t).
3s s+3 s 3
Agora, como
ß ™ ⇢ 13 ß ™
1 1 1 1 3 13 3t 1 4
L (t) = , L (t) = e , L (t) = 4e3t ,
3s 3 s+3 3 s 3
13 3t 1
concluímos que a solução da equação diferencial é y(t) = e + 4e3t .
3 3
Exercício. Determine a transformada inversa das seguintes funções:
1 1 s s2 s+2
F (s) = , G(s) = , H(s) = 2 , J(s) = .
(s 2)(s + 4) (s 2)(s + 3)2 (s + 1)2 (s 1)2 (s + 1)
7. SISTEMAS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE PRIMEIRA ORDEM 179

Exercício. Considere o seguinte problema de Cauchy

2t
y 00 + 3 y 0 = e , y(0) = 0, y 0 (0) = 1.

a) Determine a transformada de Laplace, L { y}, da função real de variável real


solução do problema de Cauchy dado.
s+1
b) Determine a função real de variável real, y, tal que L { y} (s) = .
s3 + s2 6s
Exercício. Considere o seguinte problema de Cauchy

t
y 00 + y 0 2 y = 5e sin 2t, y(0) = 1, y 0 (0) = 0.

a) Determine a transformada de Laplace, L { y}, da função real de variável real


solução do problema de Cauchy dado.
s2 s + 1
b) Determine a função real de variável real, y, tal que L { y} (s) = .
(s2 + 1)2

7. Sistemas de equações diferenciais lineares de primeira ordem com


coeficientes constantes

Analisemos alguns exemplos de aplicação das transformadas de Laplace à resolução de


sistemas de equações diferenciais de coeficientes constantes, com condições iniciais.

Exemplo 4.34. Determinar a solução do seguinte problema de Cauchy,


2 3 2 32 3 2 3 2 3
0
x (t) 2 1 x(t) x(0) 4
4 5=4 54 5, 4 5 = 4 5.
y 0 (t) 1 2 y(t) y(0) 2

Aplicando transformadas de Laplace

(s 2)L {x} (s) + L { y} (s) = 4, linha 1

L {x} (s) + (s 2)L { y} (s) = 2, linha 2

que em notação matricial se lê como


2 32 3 2 3
s 2 1 L {x} (s) 4
4 54 5 = 4 5.
1 s 2 L { y} (s) 2

Aplicando a regra de Cramer, atendendo a que o determinante da matriz do sistema é


igual a (s 2)2 1 = (s 3)(s 1), tem-se

4 1
2 s 2 4s 6 ↵1 ↵
L {x} (s) = = = + 2 ,
(s 3)(s 1) (s 3)(s 1) s 3 s 1
180 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

s 2 4
1 2 2s 1 2
L { y} (s) = = = + ,
(s 3)(s 1) (s 3)(s 1) s 3 s 1
com
4s 6 ó 4s 6 ó
↵1 = = 3, ↵2 = = 1,
s 1 s!3 s 3 s!1
2s ó 2s ó
1 = = 3, 2 = = 1.
s 1 s!3 s 3 s!1
Concluímos assim que

x(t) = 3e3t + e t , y(t) = 3e3t + e t ,

ou seja
2 3 22 3 3
x(t) 3 1
(*) 4 5 = 4 5 e3t + 4 5 e t .
y(t) 3 1

7.1. Método de Álgebra Linear intuition. Acabamos de ver que a solução do


problema inicial
2 3 2 3 2 3
0
x (t) x(t) 2 1
4 5=A4 5 onde A=4 5,
0
y (t) y(t) 1 2

se escreve na forma
2 3 2 3 2 3 2 3
0
x(t) ↵ x (t) x(t)
4 5 = er t 4 5 , i.e. 4 5 = r er t 4 5
y(t) y 0 (t) y(t)

ou seja
2 3 2 3 2 3 2 3
↵ ↵ ↵ 0
r er t 4 5 = A 4 5 er t , i.e. A r I 4 5 = 4 5.
0

î ó>
Concluímos assim, que r é valor próprio de A com vector próprio associado ↵ .

Note que, um valor próprio de A, é uma raiz, r, do polinómio característico de A, i.e.

det(A r I) = (2 r)2 1 = r2 tr(A)r + det(A),

onde tr(A), designa o traço da matriz A, que é a soma dos elementos da diagonal de A,
i.e. 4, e det(A) é o determinante da matriz A, que neste caso é 3. Concluímos assim
que os valores próprios de A são r1 = 3 e r2 = 1.
7. SISTEMAS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE PRIMEIRA ORDEM 181

Determinação do espaço próprio de A associado a r1 = 3:


02 3 2 31 2 3 2 3 2 32 3 2 3
2 1 1 0 ↵ 0 1 1 ↵ 0
@4 5 34 5A 4 5 = 4 5 ou, equivalentemente, 4 54 5 = 4 5,
1 2 0 1 0 1 1 0

donde se conclui que ↵ = .


î ó>
Assim, o espaço próprio de A associado a 3 é gerado por 1 1 .

Determinação do espaço próprio de A associado a r2 = 1:


02 3 2 31 2 3 2 3 2 32 3 2 3
2 1 1 0 ↵ 0 1 1 ↵ 0
@4 5 4 5A 4 5 = 4 5 ou, equivalentemente, 4 54 5 = 4 5,
1 2 0 1 0 1 1 0

donde se conclui que ↵ = .


î ó>
Assim, o espaço próprio de A associado a 1 é gerado por 1 1 .
Podemos então dizer que a solução geral do sistema (sem considerar as condições ini-
ciais do problema) é dada por
2 3 2 3 2 3
x(t) 1 1
4 5 = ↵ 4 5 e3t + 4 5 et .
y(t) 1 1

Agora, tomando t = 0,
2 3 2 3 2 3 2 3 8
x(0) 4 1 1 <↵ + = 4,
4 5 = 4 5 = ↵4 5 + 4 5 ou seja
y(t) 2 1 1 : ↵+ = 2.

Logo ↵ = 3 e = 1. Donde se conclui finalmente que a solução do problema inicial é


a apresentada no início, i.e. (*).

Exemplo 4.35. Determinar a solução do seguinte problema de Cauchy,


2 3 2 32 3 2 3 2 3
0
x (t) 1 1 x(t) x(0) 1
4 5=4 54 5, 4 5 = 4 5.
0
y (t) 1 3 y(t) y(0) 1

Aplicando transformadas de Laplace

(s 1)L {x} (s) + L { y} (s) = 1, linha 1

L {x} (s) + (s 3)L { y} (s) = 1, linha 2

que em notação matricial se lê como


2 32 3 2 3
s 1 1 L {x} (s) 1
4 54 5 = 4 5.
1 s 3 L { y} (s) 1
182 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Aplicando a regra de Cramer, atendendo a que o determinante da matriz do sistema é


igual a (s 1)(s 3) + 1 = (s 2)2 , tem-se

1 1 s 1 1
1 s 3 1 1 1 1
L {x} (s) = = , L { y} (s) = = ,
(s 2)2 s 2 (s 2)2 s 2

logo
2 3 2 3
x(t) 1
x(t) = e2t , y(t) = e2t , ou seja 4 5=4 5 e2t .
y(t) 1

Exemplo 4.36. Determinar a solução do seguinte problema de Cauchy,


2 3 2 32 3 2 3 2 3
0
x (t) 1 1 x(t) x(0) 0
4 5=4 54 5, 4 5 = 4 5.
0
y (t) 1 3 y(t) y(0) 1

Aplicando transformadas de Laplace

(s 1)L {x} (s) + L { y} (s) = 0, linha 1

L {x} (s) + (s 3)L { y} (s) = 1, linha 2

que em notação matricial se lê como


2 32 3 2 3
s 1 1 L {x} (s) 0
4 54 5 = 4 5.
1 s 3 L { y} (s) 1

Aplicando a regra de Cramer, atendendo a que o determinante da matriz do sistema é


igual a (s 1)(s 3) + 1 = (s 2)2 , tem-se

0 1
1 s 3 1
L {x} (s) = = ,
(s 2)2 (s 2)2
s 1 0
1 1 s 1 1 1
L { y} = = (s) = + ,
(s 2)2 (s 2) 2 s 2 (s 2)2

logo
2 3 2 3 2 3
x(t) 0 1
x(t) = t e2t , y(t) = e2t + t e2t , ou seja 4 5 = 4 5 e2t + 4 5 t e2t .
y(t) 1 1
7. SISTEMAS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE PRIMEIRA ORDEM 183

7.2. Interpretação dos exemplos 4.35 e 4.36. Pode ver-se que 2 é raiz dupla
(i.e. de multiplicidade dois) do polinómio característico da matriz do sistema
2 3 2 3 2 3
0
x (t) x(t) 1 1
4 5 = A4 5 com A = 4 5.
y 0 (t) y(t) 1 3

De facto, o polinómio característico de A é

1 r 1
det(A r I) = = (1 r)(3 r) + 1 = r 2 4r + 4 = (r 2)2 .
1 3 r
Uma vez mais, da expressão da solução do nosso problema, procuramos soluções na forma
2 3 2 3 2 3 2 3 2 3
0
x(t) ↵ ↵ x (t) x(t)
4 5 = e2t 4 1 5 + e2t t 4 2 5 com 4 5 = A4 5.
y(t) 1 2 y 0 (t) y(t)

ou seja,
0 2 3 2 3 2 31 2 32 3
↵1 ↵2 ↵2 1 1 ↵1 + t↵2
e2t @2 4 5+4 5 + 2t 4 5A = 4 54 5 e2t ,
1 2 2 1 3 1 +t 2

ou ainda,
2 3 2 3
2↵1 + ↵2 + 2t↵2 ↵1 1 + t(↵2 2)
4 5=4 5.
2 1+ 2 + 2t 2 ↵1 + 3 1 + t(↵2 + 3 2)

Assim,

↵1 + ↵2 + 1 + t(↵2 + 2) = 0, 1 + 2 ↵1 t( 2 + ↵2 ) = 0,

logo

↵2 = 2, ↵1 = 2 1.

Concluímos assim que a solução geral vem dada por


2 3 02 3 2 31
x(t) 1
4 5 = @4 2 15
+ t 2 4 5A e2t .
y(t) 1 1

Tomando t = 0, do exemplo 4.35 temos


2 3 2 3 2 3
x(0) 1
4 5=4 5=4 2 15
logo 1 = 1, 2 =0
y(0) 1 1

e, portanto, a solução é dada por


2 3 2 3
x(t) 1
4 5=4 5 e2t .
y(t) 1
184 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Tomando t = 0, do exemplo 4.36 temos


2 3 2 3 2 3
x(0) 0
4 5=4 5=4 2 15
logo 1 = 1, 2 =1
y(0) 1 1

2 3 2 3 2 3
x(t) 0 1
e, portanto, a solução é dada por 4 5 = 4 5 e2t + 4 5 t e2t .
y(t) 1 1
î ó>
Pode provar que 1 1 é vector de A associado ao valor próprio 2.

Exemplo 4.37. Determinar a solução do seguinte problema de Cauchy,


8 8
< x 0 (t) = x + 2 y, < x(0) = 0,

: y 0 (t) = 2x + y + 1, : y(0) = 5.

Aplicando transformadas de Laplace

(s 1)L {x} (s) 2L { y} (s) = 0, linha 1


1
2L {x} (s) + (s 1)L { y} (s) = 5 + , linha 2
s
que em notação matricial se lê como
2 32 3 2 3
s 1 2 L {x} (s) 0
4 54 5=4 5.
5s+1
2 s 1 L { y} (s) s

Aplicando a regra de Cramer, atendendo a que o determinante da matriz do sistema é


igual a (s 1)2 2 = (s 3)(s + 1), tem-se

0 2
5s+1
s s 1 10s + 2 A1 B1 C1
L {x} (s) = = = + + ,
(s 3)(s + 1) s(s 3)(s + 1) s s 3 s+1
s 1 0
5s+1
2 s (s 1)(5s + 1) A B C
L { y} (s) = = = 2+ 2 + 2 ,
(s 2)2 s(s 3)(s + 1) s s 3 s+1
2 8 1 8
com A1 = , B1 = , C1 = 2, A2 = , B2 = , C2 = 2
3 3 3 3
2 8 3t 1 8
x(t) = + e 2e t , y(t) = + e3t + 2e t ,
3 3 3 3
ou seja
2 3 2 2 3 3 2 3
x(t) 2 1 1
4 5 = 1 4 5 + 8 4 5 e3t + 2 4 5 e t , t 2 R.
y(t) 3 1 3 1 1

Pode ver-se que:


7. SISTEMAS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE PRIMEIRA ORDEM 185

î ó>
• 1 1 é vector próprio de A associado ao valor próprio 1;
î ó>
• 1 1 é vector próprio de A associado ao valor próprio 3.
î ó>
2 1
• 3 3
é solução particular do sistema.

Exemplo 4.38. Determinar a solução do seguinte problema de Cauchy,


8 8
< x 0 = y + 1, < x(0) = 0,

: y 0 = x + t, : y(0) = 3.

Repare que, derivando a primeira equação e tendo em conta a segunda obtemos,

x 00 = y0 = x t,

pelo que x é solução de uma equação diferencial de segunda ordem, completa, de


coeficientes constantes, cuja solução geral é dada por

x(t) = t + c1 cos(t) + c2 sin(t). (justifique!)

Voltando à primeira equação concluímos que

y(t) = 2 + c1 sin(t) c2 cos(t).

Assim,
2 3 2 3 2 3 2 3
x(t) c c t
4 5 = cos(t) 4 1 5 + sin(t) 4 2 5 + 4 5 .
y(t) c2 c1 2

Tendo em atenção as condições iniciais obtemos c1 = 0, c2 + 2 = 3, e a solução do


problema é dada por
2 3 2 3 2 3 2 3
x(t) 0 1 t
4 5 = cos(t) 4 5 + sin(t) 4 5 + 4 5 , t 2 R+ .
y(t) 1 0 2

7.3. Resolução alternativa aplicando transformadas de Laplace. Aplicando trans-


formada de Laplace a cada uma das linhas do sistema

L x 0 (s) = L { y} (s) + L {1} (s), L y 0 (s) = L {x} (s) + L {t} (s).

Agora tendo em atenção a propriedade da transformada da derivada e as condições


iniciais obtemos
1 1
sL {x} (s) + L { y} (s) = , L {x} (s) + sL { y} (s) = + 3,
s s2
186 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

logo

1
s 1
3s2 +1
s2 s 2s2 + 1 1 1
L {x} (s) = = = ,
s2 +1 s2 (s2 + 1) s2 s2 +1
1
s s
3s2 +1
1 s2 3s2 + 2 s 2
L { y} (s) = = = 2 + .
s2 + 1 s(1 + s )
2 s +1 s

Agora, a solução do problema vem dada por

x(t) = t sin(t) e y(t) = 2 + cos(t), t 2 R,

cuja leitura matricial é


2 3 2 3 2 3 2 3
x(t) 0 1 t
4 5 = cos(t) 4 5 + sin(t) 4 5 + 4 5 , t 2 R+ .
y(t) 1 0 2

8. Sistemas de equações diferenciais lineares de primeira ordem com


coeficientes variáveis

Vamos fazer uma abordagem, tão geral quanto possível, à teoria dos sistemas de equa-
ções diferenciais lineares de primeira ordem. Note que, o caso particular dos sistemas
de equações diferenciais com coeficientes constantes, foi já por nós abordado na secção
anterior de uma forma eminentemente prática.

As equações diferenciais
8
>
> y10 (t) = a11 y1 (t) + a12 y2 (t) + · · · + a1n yn (t) + b1 (t),
>
>
>
>
< y 0 (t) = a y (t) + a y (t) + · · · + a y (t) + b (t),
2 21 1 22 2 2n n 2

> ..
>
> .
>
>
>
: y 0 (t) = a y (t) + a y (t) + · · · + a y (t) + b (t),
n n1 1 n2 2 nn n n

onde a j,k , bk , para j, k = 1, . . . , n, são funções reais (ou complexas) dadas, contínuas
num intervalo J da recta real, definem um sistema de equações diferenciais de primeira
ordem, de n equações nas incógnitas y1 , y2 ,. . ., yn .

Em notação matricial escrevemos

Y 0 (t) = A (t)Y
Y (t) + b (t),
8. SISTEMAS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE PRIMEIRA ORDEM 187

onde
2 3 2 3 2 3
a11 a12 ··· a1n y1 b1
6 7 6 7 6 7
6 a21 a22 ··· a2n 7 6 y2 7 6 b2 7
A (t) = 6
6 .. .. ..
7
.. 7 , Y (t) = 6 7
6 .. 7 e b (t) = 6 7
6 .. 7
4 . . . . 5 4.5 4.5
an1 an2 ··· ann yn bn
î ó>
Se b (t) = 0 0 ··· 0 , t 2 I, o sistema diz-se homogéneo.

î ó>
Teorema (de existência e unicidade). Dados t 0 2 J ⇢ R, e um vector y10 ··· yn0
em R, existe Y : J ! Rn , solução do sistema de equações diferencias anterior, satisfazendo
î ó
Y (t 0 ) = y10 · · · yn0 .

Tendo em conta que, o conjunto das funções reais de n variáveis (reais ou complexas)
de classe C1 (i.e. com derivadas parciais de primeira ordem contínuas), é um espaço
vectorial para a adição de funções e multiplicação por um escalar, e da linearidade da
equação Y 0 (t) = A (t)Y
Y (t), obtemos o seguinte resultado.

Teorema (solução do sistema). O conjunto das soluções do sistema de equações diferen-


ciais de primeira ordem Y 0 (t) = A (t)Y
Y (t), é um espaço vectorial de dimensão n.

Sendo Y 1 , Y 2 , . . . , Y n uma base do espaço das soluções, a solução geral do sistema


homogéneo vem dado por

Y (t) = c1 Y 1 (t) + c2 Y 2 (t) + · · · + cn Y n (t), c1 , c2 , . . . , cn 2 R, t 2 J ⇢ R.

Além disso, se h é uma solução particular do sistema completo

Y 0 (t) = A (t)Y
Y (t) + b (t), i.e. h 0 (t) = A (t)h
h(t) + b (t),

temos que a solução geral da equação completa é dada por

Y (t) = c1 Y 1 (t) + c2 Y 2 (t) + · · · + cn Y n (t) + h (t), c1 , c2 , . . . , cn 2 R, t 2 J ⇢ R.

Um conjunto de funções linearmente independente de funções solução do sistema de


equações diferenciais, homogéneo, de primeira ordem diz-se um sistema fundamental
de soluções do sistema.

Teorema. O determinate da matriz formada por n soluções do sistema Y 0 (t) = A(t)Y


Y (t),
conhecida como matriz fundamental, ou é identicamente nulo, ou não se anula em nenhum
ponto do intervalo J.
188 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Pode provar-se, ainda que só o façamos para n = 2, que o determinante da matriz


formado por um sistema fundamental de soluções, Y1 , Y2 , . . . , Yn , da equação

Y 0 (t) = A (t)Y
Y (t)

é, a menos de uma constante multiplicativa, igual à exponencial do integral indefinido


do traço de A (t), i.e.
Ĉ ä
Y1 Y2 ··· Yn = c exp tr A (t) d t fórmula de Liouville

Este teorema é consequência de dois factos:


î ó
Y (t) = Y 1 Y 2 · · · Y n é solução de Y 0 (t) = A(t)Y (t),

f (t) = det Y (t) é solução de f 0 (t) = tr A (t) f (t).

A primeira identidade é trivialmente verificada, pois cada uma das colunas que com-
põem a matriz Y é solução do sistema Y 0 (t) = A (t)Y
Y (t).

Já a segunda, conhecida como equação de Jacobi, só a vamos demonstrar no caso


n = 2. De facto denotando
2 3 2 3 2 3
y11 y12 a11 a12
Y 1 = 4 5, Y2 =4 5 e A (t) = 4 5,
y21 y22 a21 a22

vemos que

y11 y12
det(Y ) = Y 1 Y2 = = y11 y22 y12 y21 ,
y21 y22
d 0 0 0 0
det(Y ) = y11 y22 + y11 y22 y12 y21 y12 y21 .
dt
Agora como Y j é tal que Y 0j = AY j , j = 1, 2, concluímos que

0 0
y11 = a11 y11 + a12 y21 , y21 = a21 y11 + a22 y21 ,
0 0
y12 = a11 y12 + a12 y22 , y22 = a21 y12 + a22 y22 ,

que substituída na expressão anterior nos dá

d
det Y (t) = a11 + a22 y11 y22 y12 y21 = tr A (t) det Y (t) .
dt

Vamos agora procurar à la mode de Lagrange a solução geral de um sistema, completo,


de equações diferenciais linear

Y 0 (t) = A (t)Y
Y (t) + b (t), na forma U(t),
Y (t) = Y (t)U
8. SISTEMAS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE PRIMEIRA ORDEM 189

onde Y é a matriz dum sistema fundamental de soluções (ou, como indicámos an-
teriormente, uma matriz fundamental) e U é uma função de matriz a determinar a
partir de

Y 0 (t)U U0 (t) = A (t)Y (t)U


U(t) + Y (t)U U(t) + b (t).

Agora como Y 0 (t) = A (t)Y (t), a identidade anterior toma a forma

1
U0 (t) = b (t),
Y (t)U i.e U 0 (t) = Y (t) b (t),

ou seja
ˆ t
1
U(t) = U(t 0 ) + Y (t) b (t) d t, com t 0 um qualquer ponto de J.
t0
î ó
A solução, que verifica a condição Y (t 0 ) = y10 y20 ··· yn0 vem então dada por

Ä ˆ t
1
ä
1
y(t) = Y (t) (Y (t 0 )) Y (t 0 ) + Y (s) b (s) d s .
t0

Os resultado que acabamos de estabelecer podem aplicar-se a equações diferenciais


lineares de ordem n. De facto, resolver a equação diferencial

1)
y (n) (t) + an 1 (t) y (n (t) + · · · + a1 (t) y 0 (t) + a0 (t) y(t) = b(t),

é equivalente a resolver o seguinte sistema


8
>
> y10 (t) = y2 (t),
>
>
>
>
>
> y 0 (t) = y3 (t),
>
< 2
..
.
>
>
>
>
>
> yn0 1 (t) = yn (t),
>
>
>
: y 0 (t) = a (t) y (t) a (t) y (t)
n 0 1 1 2 ··· an 1 (t) yn (t) + b(t),

tomando y1 (t) = y(t). Matricialmente, lê-se


2 3 2 32 3 2 3
y10 (t) 0 1 0 ··· 0 y1 (t) 0
6 0 7 6 76 7 6 7
6 y2 (t) 7 6 0 0 1 ··· 0 7 6 y2 (t) 7 6 0 7
6 7 6 76 7 6 7
6 .. 7 6 .. .. .. .. .. 7 6 .. 7 6 ..7
6 . 7=6 . . . . . 7 6 . 7+6 .7.
6 7 6 76 7 6 7
6 0 7 6 76 7 6 7
4 yn 1 (t)5 4 0 0 0 ··· 1 5 4 yn 1 (t)5 4 0 5
yn0 (t) a0 (t) a1 (t) a2 (t) ··· an 1 (t) yn (t) b(t)

Esta equivalência diz-nos que


190 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

a teoria das equações diferenciais lineares de ordem n é para-


lela à dos sistemas de equações diferenciais lineares de primeira
ordem.

Por exemplo, este paralelismo permite estabelecer a fórmula de Liouville para equações
diferencias lineares, homogéneas, de ordem n, em termos do wronskiano de um sistema
fundamental de soluções,
ˆ
!(t) = c exp A(t)) d t ,
tr(A para alguma constante c 2 R,

onde
2 3
0 1 0 ··· 0
6 7
6 0 0 1 ··· 0 7
6 7
6 .. .. .. .. .. 7
A (t) = 6 . . . . . 7.
6 7
6 7
4 0 0 0 ··· 1 5
a0 (t) a1 (t) a2 (t) ··· an 1 (t)
A(t)) = an 1 (t), donde se conclui
Note que tr(A
ˆ
!(t) = exp an 1 (t) d t ,

que é uma generalização para qualquer n 2 N da representação por nós demonstrada


para n = 2, no capítulo sobre Equações Diferenciais.

9. Exponencial de uma matriz

Considere-se agora um sistema linear de coeficientes constantes, homogéneo, de pri-


meira ordem,

Y 0 (t) = AY (t),

onde A é uma matriz quadrada de ordem n de coeficientes constantes.

Dado um vector (de condições iniciais), z 0 2 Rn , queremos determinar a solução deste


sistema que satisfaz Y (0) = z 0 .

Se a matriz A for um escalar (caso 1 ⇥ 1) e z 0 é um número real dado, sabemos que a


equação diferencial linear Y 0 (t) = AY (t) tem como solução Y (t) = eA t z 0 .

Podemos afirmar, ainda que uma forma naive, que a solução do nosso problema ini-
cial (caso matricial) se descreve como Y (t) = eA t z 0 .

Esta representação encerra dois problemas:

por um lado temos de definir exponencial de uma matriz, e por


outro verificar que eA t z 0 é solução do problema.
9. EXPONENCIAL DE UMA MATRIZ 191

Veremos ainda que a função eA t é uma matriz fundamental do sistema.

Para definirmos a noção de exponencial de uma matriz, vamos começar por relembrar
a representação em série de potências da função exponencial,

x x2 x3 xk
e =1+ x + + + ··· + + ··· , x 2 R.
2 3! k!
Trata-se de uma série de potências que converge absoluta e uniformemente em R (e
em C se interpretarmos x como número complexo).

Como as matrizes quadradas se podem multiplicar e somar, dada uma matriz, A , n ⇥ n,


podemos considerar as sucessões de matrizes

A2 A3 Ak
i +A + + + ··· + , k 2 N.
2 3! k!
Tem sentido considerar a convergência desta sucessão no espaço das matrizes quadra-
das n ⇥ n. Note que o espaço das matrizes quadradas n ⇥ n coincide com R p com
p = n2 . Definimos, função exponencial de uma matriz A , como o limite da sucessão
anterior, i.e. a série

A2 A3 Ak X
1
An
A
e =i +A+ + + ··· + + ··· = .
2 3! k! n=0
n!

Exemplo 4.39. eO = I ; eI = i e.

A primeira identidade é consequência de que a potência da matriz nula é a matriz


nula. Para a segunda identidade temos somente que substituir as potências da matriz
identidade pela matriz identidade obtendo-se

I I I
eI = i + i +
+ + ··· + + ···
2 3! k!
1 1 1
=i 1+1+ + + ··· + + ···
2 3! k!
= i e.
2 3
1 0
Exemplo 4.40. Determinar a exponencial da matriz A = 4 5.
0 1

Comece por calcular


2 3
1 0
A2 = I, A3 = A, logo Ak = 4 k
5, k 2 N.
0 ( 1)
192 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Assim,
2 3 2 3
1 1 1
1+1+ + + ··· + + ··· 0 e 0
eA = 4 2 3! k!
1 1 ( 1)k
5=4
1
5.
0 1 1+ 2 3! + ··· + k! + ··· 0 e
2 3
↵ 0
Exemplo 4.41. Determinar a exponencial da matriz A = 4 5.
0

Comece por calcular


2 3
k
↵ 0
Ak = 4 k
5, k 2 N.
0

Assim,
2 3 2 3
↵2 ↵3 ↵k
1+↵+ + + ··· + + ··· 0 e ↵
0
eA = 4 2 3! k!
2 3 k
5=4 5.
0 1+ + 2 + 3! + ··· + k! + ··· 0 e
2 3
0 1
Exemplo 4.42. Determinar a exponencial da matriz A = 4 5.
0 0

Comece por calcular


2 3 2 3
0 0 0 0
A2 = 4 5, logo A k+1 = 4 5, k 2 N.
0 0 0 0

Assim,
2 3
1 1
eA = i + A = 4 5.
0 1
2 3
0 1
Exemplo 4.43. Determinar a exponencial da matriz A = 4 5.
1 0

Comece por calcular

A2 = i, logo A 2k+1 = A e A 2k = i , k 2 N.

Assim,
2 3
1 + 12 + 4!
1
+ ··· 1
1 + 3! 1
+ 5! + ···
eA = 4 5.
1 1 1 1
1 + 3! + 5! + · · · 1 + 2 + 4! + · · ·
9. EXPONENCIAL DE UMA MATRIZ 193

Agora dos desenvolvimentos em série de potências das funções


x2 x3 xn
ex = 1 + x + + + ··· + + ··· , x 2R
2 3! n!
x x2 x3 ( x)n
e =1 x+ + ··· + + ··· , x 2R
2 3! n!

concluímos que
x2 x4 x 2k
cosh(x) = 1 + + + ··· + + ··· , x 2R
2 4! (2k)!
x3 x5 x 2k 1
sinh(x) = x + + + ··· + + ··· , x 2 R.
3! 5! (2k 1)!
Pelo que,
2 3
cosh(1) sinh(1)
eA = 4 5.
sinh(1) cosh(1)

Exemplo 4.44. Caso A seja uma matriz diagonalizável, i.e.


1
existir P invertível tal que A = P⇤ P onde ⇤ matriz diagonal,

a exponencial da matriz A escreve-se como

eA = P e⇤ P 1 .

Para verificar esta identidade temos somente que calcular as potências de A em termos
das potências de ⇤ :

A 2 = P⇤ P 1
P⇤ P 1
= P⇤ P 1P ⇤P 1
= P⇤ 2 P 1 ;

e, mais geralmente,

A k = P⇤ k P 1 , k 2 N.

Assim,
A2 A3 Ak
eA = i + A + + + ··· + + ···
2 3! k!
⇤2 ⇤3 ⇤k 1
= P i ⇤
+ + + + ··· + + ··· P
2 3! k!
= P e⇤ P 1 .

Analisemos quando é que podemos assegurar que uma matriz é diagonalizável. Para
tal reescrevemos a condição de diagonalização na forma
2 3 2 3
p11 p12 p11 p12
AP = P⇤ leitura por colunas 4A A 5=4 1 2
5,
p21 p22 p21 p22
194 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

isto para matrizes 2 ⇥ 2 (a leitura para matrizes n ⇥ n é análoga). Assim,


2 3 2 3 2 3 2 3
p11 p11 p12 p12
A 4 5= 14 5 e A 4 5 = 2 4 5,
p21 p21 p22 p22

î ó> î ó>
ou seja, p11 p21 , p12 p22 são, respectivamente, vectores próprios linearmente
independentes associados aos valores próprios 1, 2.
2 3
1 2
Exemplo 4.45. Determine a exponencial da matriz A = 4 5.
2 1

Comecemos por determinar os valores próprios de A :


2 3
r 1 2
rii A = 4 5 pelo que det rii A = (r 1)2 4 = (r 3)(r + 1).
2 r 1

Determinação do espaço próprio associado aos valores próprios r = 1 e r = 3:


2 3 2 3
2 2 1
1ii A = 4 5 logo o espaço próprio é gerado por 4 5
2 2 1
2 3 2 3
2 2 1
3ii A = 4 5 logo o espaço próprio é gerado por 4 5
2 2 1

Assim,
2 3 2 3
1 0 1 1
A =P4 5P 1
com P=4 5
0 3 1 1

e a exponencial de A é dada por


2 32 32 3 1 2 32 3 2 3
1 1
1 1 e 0 1 1 1 1 e 0 1 1
4 54 54 5 =4 54 5 14 5
1 1 0 e3 1 1 1 1 0 e3 2 1 1
2 3
1 e3 1 e3
2e + 2 2e + 2 5
=4 1 e3 1 e3
2e + 2 2e + 2

Vejamos agora que

a exponencial de uma matriz, considerada como função de t,


dá-nos a matriz fundamental de um sistema de equações dife-
renciais lineares de primeira ordem com coeficientes constantes.
9. EXPONENCIAL DE UMA MATRIZ 195

Considere-se agora a função y : R ! Rn dada por

y (t) = eA t z 0
t2 t3 tk
= i + A t + A2 + A3 + · · · + A k + · · · z 0 .
2 3! k!
Derivando em ordem a t, obtemos
t2 tk 1
y 0 (t) = A + A 2 t + A 3 + · · · + Ak + · · · z0
2! (k 1)!
t2 tk 1
= A i + A t + A2 + · · · + Ak 1
+ · · · z0
2! (k 1)!
= A eA t z 0 = A y (t).

Acabamos de provar que y (t) = eA t z 0 é solução do sistema de equações diferencias


linear homogéneo de primeira ordem, y 0 (t) = A y (t), e tem-se y (0) = eA 0 z 0 = i z 0 =
z 0.

Chegados aqui, pode pensar-se que não ganhámos grande coisa com a interpretação
da solução de um sistema de equações diferenciais em termos da exponencial de uma
matriz, pois o seu cálculo não parece uma tarefa fácil.

No entanto, permite reescrever a matriz fundamental de um sistema numa forma con-


densada, i.e. Y (t) = eA t , pelo que a solução do problema completo

Y 0 (t) = AY (t) + b (t), Y (t 0 ) = z 0 ,

vem dada por


ˆ t
A (t t 0 ) s)
Y (t) = e z0 + eA(t b (s) d s.
t0

Esta fórmula é consequência de aplicar a ideia de Lagrange, e procurar a solução deste


problema na forma

Y (t) = eA t U (t) onde eA t U 0 (t) = b (t).

Observe que

eA eB = eA+BB se, e somente se, A B = BA .

De facto, aplicando a definição de exponencial de uma matriz temos


t2 t2
eA t = i + A t + A 2 + ··· e eB t = i + B t + B 2 + ···
2 2
Ao efectuar o produto e expandindo em potências de t obtemos
t2
eA t eB t = i + (A A2 + 2A
A + B )t + (A AB + B 2 ) + ··· ;
2
196 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

no entanto se efectuarmos o cálculo de

e(AA+BB)t = I + (A A + B )2 t 2 /2 + · · ·
A + B )t + (A
t2
= i + (A A 2 + A B + BA + B 2 )
A + B )t + (A + ···
2
vemos que as duas fórmulas coincidem se, e somente se, AB = BA .

Observe que, em geral,

A 2 + 2A
AB + B 2 não coincide com A 2 + A B + BA + B 2 .

Como consequência desta identidade, e da comutatividade de A com A , tem-se

e(AA A )t
= eO = i e também e(AA A )t
= eA t ⇥ e At

i.e. eA t ⇥ e At
= i , ou ainda, e At
é matriz inversa de eA t .
ˆ
At
Regressando à fórmula de Lagrange, e tendo em atenção que U (t) = e b (t) d t,
concluímos que a solução do problema de Cauchy é dada por
ˆ
At
Y (t) = e e A t b (t) d t com Y (t 0 ) = z 0 ,

ou seja,
Ä ˆ t ä
At As A t0
Y (t) = e c + e b (s) d s onde c=e c.q.d.
t0

Vejamos como calcular a exponencial de uma matriz usando transformada de Laplace:



At t2 t3 tk
L e (s) = L i + A t + A 2 + A 3 + · · · + A k + · · · (s)
2 3! k!
1 1 1 1 1
=i + A 2 + A 2 3 + A 3 4 + · · · + A k k+1 + · · ·
s s s s s
Multiplicando ambos os membros da última identidade, à esquerda (respectivamente
à direita), por sii A obtemos
Ä 1 1 1 1 1 ä
sii A L eA t (s) = sii A i + A 2 + A 2 3 + A 3 4 + · · · + A k k+1 + · · · = i ;
s s s s s
respectivamente,
Ä 1 1 1 1 1 ä
L eA t (s) sii A = i + A 2 + A 2 3 + A 3 4 + · · · + A k k+1 + · · · sii A = i.
s s s s s
Concluímos assim, que
1
¶ 1
©
L eA t (s) = sii A =) eA t = L 1
sii A (t).

Para calcular a transformada de Laplace de uma matriz, calculamos a transformada de


Laplace de cada um dos elementos da matriz.
9. EXPONENCIAL DE UMA MATRIZ 197

2 3
0 1
Exemplo 4.46. Seja A = 4 5 e calculemos eA t .
1 0

Comecemos por calcular


2 3 2 3
s 1
s 1 1
sii A = 4 5, logo sii A =4 s2 +1
1
s2 +1 5
s
.
1 s s2 +1 s2 +1

Tomando transformada inversa de Laplace, obtemos finalmente


2 3
cos(t) sin(t)
eA t = 4 5.
sin(t) cos(t)
2 3
1 4 0
6 7
Exemplo 4.47. Seja A = 4 4 7 05 e calculemos eA t .
0 0 5

Comecemos por calcular


2 3
s 1 4 0
6 7 1 1
sii A = 4 4 s+7 0 5, logo sii A = adj sii A .
det sii A
0 0 s 5

onde det sii A = (s 5)(s + 3)2 e também


2 3>
(s + 7)(s 5) 4(s 5) 0
6 7
adj sii A =4 4(s 5) (s 1)(s 5) 0 5 .
0 0 (s + 3)2
Assim,
2 3> 2 3
s+7 4 1 4 4
(s+3)2 (s+3)2 0 s+3 + (s+3)2 (s+3)2 0
6 4 7 6 7
L eA t (s) = 4 (s+3)2
s 1
(s+3)2 0 5 =4 4
(s+3)2
1
s+3
4
(s+3)2 0 5.
1 1
0 0 s 5 0 0 s 5

Tomando transformada inversa de Laplace, obtemos finalmente


2 3
e 3t (1 + 4t) 4e 3t t 0
6 7
eA t = 4 4e 3t t e 3t (1 4t) 0 5 .
0 0 e5t

Exemplo 4.48. Determine, pelo método da matriz exponencial, a solução do problema


de Cauchy,
2 3 2 3 2 3
1 1 1 4
Y 0 (t) = 4 5 Y (t) + 4 5 , Y (0) = 4 5
1 1 0 1
198 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Comecemos por determinar a matriz exponencial da matriz


2 3 82 3 19
1 1 ¶ © < s 1 1 =
1
A= 4 5 , i.e. L 1
sii A (t) = L 1 4 5 (t).
1 1 : 1 s 1 ;

Agora como
2 3>
1 1 s 1 1
sii A = 4 5 ,
(s 1)2 + 1 1 s 1

obtemos
2 3
t t
e cos(t) e sin(t)
eA t = 4 t
5.
e sin(t) e t cos(t)

Procuremos, ao estilo de Lagrange, a função vectorial de variável real, U de forma que


î ó>
Y (t) := x(t) y(t) = eA t U (t) seja solução do problema de Cauchy, i.e.
2 3 2 32 3 2 3
t t t
1 e cos(t) e sin(t) 1 e cos(t)
U 0 (t) = e A t 4 5 = 4 54 5 = 4 5.
0 e t sin(t) e t cos(t) 0 e t sin(t)

Vemos então que precisamos conhecer


ˆ ˆ
e t cos(t) d t e também e t
sin(t) d t.

Para tal, calculamos


1 e t
ˆ
1+ii)t
e t ei t d t = e( +c = 1+i cos(t) + i sin(t) + c, c 2 C,
1+i 2
pelo que
ˆ ˆ
t t
e cos(t) d t + i e sin(t) d t
Äe t ä Äe t ä
= sin(t) cos(t) + c1 i cos(t) + sin(t) + c2 , c1 , c2 2 R,
2 2
ou seja
e t
ˆ
t
e cos(t) d t =
sin(t) cos(t) + c1 , c1 2 R,
2
e t
ˆ
e t sin(t) d t = cos(t) + sin(t) + c2 , c2 2 R.
2
Desta forma concluímos que
2 3 2 3
e t
sin(t) cos(t) + c1 4
U (t) = 4 e2 t 5 com U (0) = 4 5 .
2 sin(t) + cos(t) + c2 1
EXERCÍCIOS DE AVALIAÇÃO 199

1 1 9 1
Logo + c1 = 4 e + c2 = 1, i.e. c1 = e c2 = e, portanto, a solução do problema
2 2 2 2
de Cauchy vem dada por
2 32 3
t t e t 9
e cos(t) e sin(t) sin(t) cos(t) +
Y (t) = eA t U (t) = 4 5 4 2t
e
25
1
e t sin(t) e t cos(t) 2 sin(t) + cos(t) + 2
2 3
et 1
9 cos(t) sin(t)
= 4 2t 25
.
e 1
2 cos(t) + 9 sin(t) + 2

Exercícios de avaliação

Exercício (Frequência, 20-10-2020). Considere o seguinte problema de Cauchy


2 3 2 32 3 2 3 2 3
0
x (t) 5 4 x(t) x(0) 1
4 5=4 54 5, 4 5=4 5
y 0 (t) 8 7 y(t) y(0) 1

Determine, usando transformada de Laplace, a solução do problema.

Aplicando transformada de Laplace e tendo em atenção as condições iniciais obte-


mos que
2 32 3 2 3
s+5 4 L {x} 1
4 54 5=4 5;
8 s 7 L { y} 1

logo,
8
> s 11 2 3
<L {x} = = + ,
(s 3)(s 2) s 3 s+1
> s + 13 4 3
:L { y} = = + .
(s 3)(s 2) s 3 s+1

Aplicando a transformada inversa de Laplace obtemos finalmente


î ó> î ó>
t t
x(t) y(t) = 2e3t + 3e 4e3t + 3e , t 2 R.

Exercício (Frequência, 17-11-2020). Considere o seguinte problema de Cauchy


2 3 2 32 3 2 3 2 3
0
x (t) 2 4 x(t) x(0) 1
4 5=4 54 5, 4 5=4 5
y 0 (t) 1 1 y(t) y(0) 1

Determine, usando transformada de Laplace, a solução do problema.


200 4. TRANSFORMADAS DE LAPLACE

Aplicando transformada de Laplace e tendo em atenção as condições iniciais obte-


mos que
2 32 3 2 3 8
<L {x} = 1
s+2 4 L {x} 1 ,
4 54 5=4 5; pelo que s 2
1 s 1 L { y} 1 :L { y} = 1
.
s 2
Aplicando a transformada inversa de Laplace obtemos finalmente
2 3 2 3
2t
x(t) e
4 5=4 5, t 2 R.
y(t) e2t

Exercício (Frequência, 17-11-2020). a) Determine a matriz fundamental do sis-


tema de equações diferenciais lineares de primeira ordem
2 3
1 1
Y 0 (t) = 4 5 Y (t), Y (0) = I .
2 1

b) Mostre que A eA t = eA t A , onde A é uma qualquer matriz quadrada


de ordem n.
Ä ä ⇥ ⇤
A matriz fundamental do sistema é Y (t) = exp tAA , onde A = 12 11 . Vamos determiná-
¶ 1
©
la usando transformadas de Laplace Y (t) = L 1 sii A (t), onde
2 3 2 3
s+1 1
1 sin(t) + cos(t) sin(t)
= 4 s 2+1 s2 +1 5
Y (t) = 4 5.
2
sii A s 1
logo
s +1
2 s +1
2 2 sin(t) cos(t) sin(t)
Para a alínea b) temos somente que aplicar a definição de exponencial de uma ma-
triz; assim
t2 tn
A eA t = A i + A t + A 2 + · · · + An + · · ·
2 2
t 2
tn
= A + A 2 t + A 3 + · · · + A n+1 + · · ·
2 2
2 n
t t
= i + A t + A 2 + · · · + A n + · · · A = eA t A .
2 2
Exercício (Frequência, 09-12-2020). a) Mostre, usando a definição de expo-
nencial de uma matriz, que
d At
e = A eA t , A onde é uma matriz quadrada n ⇥ n.
dt
b) Determine a matriz fundamental do sistema de equações diferenciais lineares
de primeira ordem
2 3
6 2
Y 0 (t) = 4 5 Y (t), Y (0) = I .
5 1
EXERCÍCIOS DE AVALIAÇÃO 201

a) Definimos exponencial de uma matriz quadrada n ⇥ n, A como


t2 t3
eA t = i + A t + A 2 + A3 + · · · ,
2! 3!
pelo que derivando em ordem a t, obtemos
Ä ä0 t2 t3
eA t = A + A 2 t + A 3 + A 4 + · · ·
t 2! 3!
2
t t3
= A i + A t + A 2 + A 3 + · · · = A eA t .
2! 3!
2 3
Ä ä 6 2
b) A matriz fundamental do sistema é A ,
Y (t) = exp tA onde A=4 5.
5 1
¶ 1
©
1
Vamos determiná-la usando transformadas de Laplace Y (t) = L sii A (t),
onde
2 3 2 3
s+1 2 2 t
1 3e + 53 e4t 2 t
3e + 23 e4t
sii A =4 (s 1)(s 4)
5
(s 1)(s 4) 5
s 6
logo Y (t) = 4 5 t 5 4t 5 t 2 4t
5.
(s 1)(s 4) (s 1)(s 4) 3e 3e 3e 3 e

Exercício (Exame, 21-01-2021). Determine, usando transformada de Laplace, a solu-


ção do problema de Cauchy
8 8
< x 0 (t) 2x(t) 3 y(t) = 0, < x(0) = 2,

: y 0 (t) + x(t) + 2 y(t) = 0, : y(0) = 0.

Exercício (Exame, 21-01-2021). a) Determine a matriz fundamental do sistema


de equações diferenciais lineares de primeira ordem
2 3
3 2
Y 0 (t) = 4 5 Y (t), Y (0) = I .
2 3
Ä ä> >
b) Mostre que eA t = eA t , onde A é uma qualquer matriz quadrada de or-
dem n.

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