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Dignidade não significa perfeição

Bradley R. Wilcox
Segundo conselheiro na presidência geral dos Rapazes

Quando sentirem que falharam muitas vezes em continuar tentando,


lembrem-se de que a Expiação de Cristo e a graça que é possível por
meio dela são reais.

Certa vez, enviei uma mensagem para minha filha e meu genro usando
o recurso de conversor de voz para texto do celular. Eu disse: “Ei, vocês
dois. Amo demais vocês”. Eles receberam: “Odeio vocês dois. Devia
amar vocês”. Não é impressionante o quanto é fácil uma mensagem
positiva e bem-intencionada ser mal-entendida? Isso é o que acontece às
vezes com as mensagens de Deus a respeito do arrependimento e da
dignidade.

Algumas pessoas, erroneamente, acreditam que o arrependimento e a


mudança sejam desnecessários. Contudo, Deus afirma que eles são
essenciais. 1 Deus deixa de nos amar por causa de nossas falhas? Com
certeza não! Ele nos ama perfeitamente. Amo meus netos, inclusive suas
imperfeições, mas isso não significa que não quero que eles progridam e
se tornem tudo o que eles podem se tornar. Deus nos ama como nós
somos, mas Ele também nos ama demais para nos deixar dessa forma. 2
Crescer no Senhor é a essência da mortalidade. 3 A mudança é a essência
da Expiação de Jesus Cristo. Cristo pode não apenas nos ressuscitar,
limpar, consolar e curar; mas, por meio de tudo isso, Ele pode nos
transformar para sermos mais semelhantes a Ele. 4

Algumas pessoas, erroneamente, acreditam que o arrependimento seja


um evento único. Contudo, Deus afirma que, assim como o presidente
Russell M. Nelson nos ensinou, “o arrependimento (…) é um
processo”. 5 O arrependimento pode exigir tempo e esforço constante, 6
assim como exige abandonar o pecado 7, e “não [ter] mais disposição
para praticar o mal, mas, sim, de fazer o bem continuamente” 8 são
objetivos para toda a vida. 9

A vida é como uma viagem de carro cruzando o país. Não


conseguiremos alcançar nosso destino com apenas um tanque de
combustível. Precisamos reabastecer o tanque constantemente. Partilhar
do sacramento é como parar no posto de gasolina. À medida que nos
arrependemos e renovamos nossos convênios, reafirmamos nossa
disposição de guardar os mandamentos, e Deus e Cristo nos abençoam
com o Espírito Santo. 10 Em resumo, prometemos seguir adiante em
nossa jornada, e Deus e Cristo prometem encher o tanque.

Algumas pessoas, erroneamente, acreditam que não sejam dignas de


participar plenamente no evangelho porque não estão completamente
livres de hábitos ruins. Contudo, Deus afirma que dignidade não
significa perfeição. 11 Dignidade é ser honesto e se esforçar. Precisamos
ser honestos com Deus, com os líderes do sacerdócio e com as outras
pessoas que nos amam, 12 e precisamos nos esforçar para guardar os
mandamentos de Deus e nunca desistir somente porque
escorregamos. 13 O élder Bruce C. Hafen disse que desenvolver um
caráter semelhante ao caráter de Cristo “exige paciência e persistência,
mais do que perfeição”. 14 O Senhor disse que os dons do Espírito são
“dados em benefício daqueles que [O] amam e guardam todos os [Seus]
mandamentos e daqueles que procuram assim fazer”. 15
Um jovem rapaz, que chamarei de Damon, escreveu: “Conforme crescia,
lutei contra a pornografia. Sempre me senti muito envergonhado
porque não conseguia fazer as coisas certas”. Cada vez que Damon
tinha uma recaída, a dor do pesar se tornava tão intensa que ele, de
maneira dura, julgava-se indigno de qualquer tipo de graça, perdão ou
de chances adicionais de Deus. Ele disse: “Decidi que só merecia me
sentir péssimo o tempo todo. Deduzi que Deus provavelmente me
odiava, porque eu não estava disposto a trabalhar arduamente e superar
isso de uma vez por todas. Eu ficava uma semana e às vezes até um mês,
mas então eu tinha uma recaída e pensava: ‘Nunca serei bom o
suficiente, então de que adianta tentar?’”

Em um desses momentos, Damon disse a seu líder do sacerdócio:


“Talvez eu deva simplesmente parar de vir à igreja. Estou cansado de
ser hipócrita”.

Seu líder respondeu: “Você não é hipócrita porque tem um mau hábito
que está tentando abandonar. Você só seria hipócrita se escondesse,
mentisse ou tentasse se convencer de que o problema é da Igreja por
manter padrões tão elevados. Ser honesto sobre suas ações e dar os
passos para seguir em frente não é ser hipócrita. É ser um discípulo”. 16
Esse líder citou o élder Richard G. Scott, que ensinou: “O Senhor
encara de modo diferente a fraqueza e a rebelião. (…) Quando Ele fala
de fraquezas, é sempre com misericórdia”. 17

Essa perspectiva deu esperança a Damon. Ele percebeu que Deus não
estava dizendo: “Damon fez besteira novamente”. Em vez disso, Ele
provavelmente estava dizendo: “Veja o quanto Damon conseguiu
progredir”. Esse jovem finalmente parou de abaixar a cabeça com
vergonha ou de buscar desculpas e racionalizações. Ele olhou para o
alto buscando ajuda divina e a encontrou. 18

Damon disse: “A única vez em que eu tinha me voltado para Deus no


passado foi para pedir perdão, mas agora também pedi graça — Seu
‘poder capacitador’ [Guia para Estudo das Escrituras, “Graça”]. Nunca
havia feito isso antes. Hoje, passo muito menos tempo me odiando pelo
que fiz e muito mais tempo amando Jesus pelo que Ele fez”.

Considerando o tempo que Damon lutava com esse problema, era inútil
e irreal para os pais e líderes ajudá-lo a dizer “nunca mais” tão
rapidamente ou a definir arbitrariamente algum padrão de abstinência
para ser considerado “digno”. Em vez disso, eles começaram com metas
pequenas e alcançáveis. Eles se livraram das expectativas do tudo ou
nada e se concentraram no crescimento gradativo, o que permitiu a
Damon construir uma série de sucessos em vez de uma série de
fracassos. 19 Ele, como o povo escravizado de Lími, aprendeu que
poderia “aos poucos (…) prosperar”. 20

O élder D. Todd Christofferson aconselhou: “Quando lidamos com algo


demasiadamente grande, talvez tenhamos de trabalhar nele em porções
pequenas e diárias. (…) A incorporação de hábitos novos e saudáveis
em nosso caráter, ou a superação de maus hábitos ou vícios, muito
frequentemente significa um esforço diário seguido de outro no dia
seguinte, e depois outro e mais outro, talvez por muitos dias, ou até por
meses e anos. (…) Mas podemos fazê-lo, porque podemos recorrer a
Deus (…) para (…) a ajuda necessária a cada dia”. 21

Agora, irmãos e irmãs, a pandemia da Covid-19 não tem sido fácil para
ninguém, mas o isolamento associado às restrições de quarentena
tornou a vida especialmente difícil para aqueles que lutam contra os
maus hábitos. Lembrem-se de que a mudança é possível, o
arrependimento é um processo, e a dignidade não significa perfeição. E,
o mais importante, lembrem-se de que Deus e Cristo estão dispostos a
nos ajudar aqui e agora. 22
Algumas pessoas, erroneamente, acreditam que Deus esteja esperando
para nos ajudar depois que nos arrependermos. Contudo, Deus afirma
que Ele nos ajudará à medida que nos arrependermos. Sua graça está
disponível para nós “não importa onde estejamos no caminho da
obediência”. 23 O élder Dieter F. Uchtdorf disse: “Deus não precisa de
pessoas que sejam perfeitas. Ele busca aqueles que oferecem o ‘coração
e uma mente solícita’ [Doutrina e Convênios 64:34], e Ele os tornará
‘perfeitos em Cristo’ [Morôni 10:32–33]”. 24

Muitas pessoas têm sofrido devido a relacionamentos complexos e, por


esse motivo, acreditar na compaixão e longanimidade de Deus se torna
difícil. Elas lutam para ver Deus como Ele é — um Pai amoroso que
atende às nossas necessidades 25 e sabe como “[dar] boas coisas aos que
lhe pedirem”. 26 Sua graça não é apenas um prêmio para os dignos. É o
“auxílio divino” que Ele dá para nos ajudar a nos tornarmos dignos.
Não é apenas uma recompensa para os justos. É a “investidura de
poder” que Ele dá para nos ajudar a nos tornamos justos. 27 Não
estamos apenas andando em direção a Deus e Cristo. Estamos andando
com Eles. 28

Em toda a Igreja, os jovens recitam o tema das Moças e o tema dos


quóruns do Sacerdócio Aarônico. Da Nova Zelândia à Espanha, da
Etiópia ao Japão, as moças dizem: “Dou valor à dádiva do
arrependimento”. Do Chile à Guatemala, à cidade de Moroni, Utah, os
rapazes dizem: “Ao me esforçar para servir, exercer fé, arrepender-me e
melhorar a cada dia, vou me qualificar para receber as bênçãos do
templo e a alegria eterna do evangelho”.

Prometo que essas bênçãos e essa alegria são reais e estão ao alcance
daqueles que guardam todos os mandamentos e “daqueles que
procuram assim fazer”. 29 Quando sentirem que falharam muitas vezes
em continuar tentando, lembrem-se de que a Expiação de Cristo e a
graça que é possível por meio dela são reais. 30 Seu “braço de
misericórdia está estendido” em sua direção. 31 Você é amado — hoje,
daqui a 20 anos e para sempre. Em nome de Jesus Cristo, amém.

Notas
1. Ver João 3:3–6; Mosias 27:25.

2. Ver Neal A. Maxwell, “I Will Arise and Go to My Father”,


Ensign, setembro de 1993, p. 65.

3. Ver Helamã 3:21.

4. Ver 2 Coríntios 5:17; Mosias 3:19.

5. Russell M. Nelson, “Podemos agir melhor e ser melhores”,


Liahona, maio de 2019, p. 67.

6. Ver Mosias 26:30; Morôni 6:8; Doutrina e Convênios 1:31–32.

7. Ver Doutrina e Convênios 58:43.

8. Mosias 5:2.

9. Ver Jacó 6:11; Alma 15:17.

10. Ver 2 Néfi 31:20; Mosias 18:10; Doutrina e Convênios 20:77.


11. Ver Lucas 15:11–32; Romanos 3:23–25. O élder Gerrit W.
Gong disse: “Ser digno não significa ser perfeito” (“Recordá-
Lo sempre”, A Liahona, maio de 2016, p. 109). Dirigindo-se
aos alunos da Universidade Brigham Young, o presidente
Cecil O. Samuelson explicou: “Uma pessoa pode ser
totalmente digna no sentido do evangelho e ainda assim
estar se desenvolvendo enquanto lida com imperfeições
pessoais. (…) A dignidade é essencial, mas não é o mesmo
que perfeição” (“Be Ye Therefore Perfect”, Devocional da
Universidade Brigham Young, 6 de setembro de 2011, p. 1,
speeches.byu.edu). O élder Marvin J. Ashton disse:
“Dignidade é um processo, e a perfeição uma jornada eterna.
Podemos ser dignos de certos privilégios sem sermos
perfeitos” (“A respeito de dignidade”, A Liahona, julho de
1989, p. 21).

12. O élder Neil L. Andersen clamou por “honestidade


inflexível” e ensinou: “A honestidade é o cerne da
espiritualidade e deve estar no centro do arrependimento
verdadeiro e duradouro”, The Divine Gift of Forgiveness, 2019,
pp. 193, 248.

13. O élder Neil L. Andersen escreveu: “Podemos recuar às


vezes, mas vamos rápida e humildemente ajoelhar-nos e
seguir na direção certa”, The Divine Gift of Forgiveness, p. 208.

14. Bruce C. Hafen, The Broken Heart, 1989, p. 186.

15. Doutrina e Convênios 46:9; grifo do autor.

16. Ver Doutrina e Convênios 10:67.

17. Richard G. Scott, “Força pessoal por meio da Expiação de


Jesus Cristo”, A Liahona, novembro de 2013, p. 82.

18. Ver Doutrina e Convênios 6:35–37.

19. O presidente Russell M. Nelson disse: “O Senhor não espera


que sejamos perfeitos neste período de nosso progresso
eterno. Entretanto, ele espera que nos tornemos cada vez mais
puros” (“Podemos agir melhor e ser melhores”, p. 69; grifo do
autor).

20. Mosias 21:16.

21. D. Todd Christofferson, “Reconhecer a mão de Deus em


nossas bênçãos diárias”, A Liahona, janeiro de 2012, p. 25; ver
também D. Todd Christofferson, “A divina dádiva do
arrependimento”, A Liahona, novembro de 2011, p. 38.

22. Ver Josué 1:5, 9; Isaías 41:10; Mateus 11:28–30; 2 Néfi 28:32;
Doutrina e Convênios 24:8.

23. D. Todd Christofferson, “Livres para sempre, para agirem


por si mesmos”, A Liahona, novembro de 2014, p. 19.

24. Dieter F. Uchtdorf, “Five Messages That All of God’s


Children Need to Hear”, Devocional da Universidade
Brigham Young, 17 de agosto de 2021, p. 3,
speeches.byu.edu.

25. Ver Éter 1:42–43.

26. 3 Néfi 14:11.


27. Dieter F. Uchtdorf, “O dom da graça”, A Liahona, maio de
2015, p. 107; ver também 2 Néfi 2:3; Jacó 4:7. O presidente
Russell M. Nelson disse: “O Senhor não exige uma fé perfeita
para termos acesso a Seu poder perfeito” (“Cristo ressuscitou;
a fé que temos Nele moverá montanhas”, Liahona, maio de
2021, p. 101).

28. Ver Deuteronômio 2:7; Mateus 1:23; Doutrina e Convênios


100:12. O élder Robert E. Wells escreveu: “Nosso Pai
Celestial não é um Deus ausente, nem Jesus está morto. Eles
são relevantes hoje como nunca antes”, The Mount and the
Master, 1991, p. 26.

29. Doutrina e Convênios 46:9.

30. Ver Sheri Dew, Amazed by Grace, 2015, p. 4.

31. 3 Néfi 9:14.

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