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UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE

FACULDADE DE DIREITO
DELEGAÇÃO DA BEIRA

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DO TESTE ESCRITO DE DIREITO DO


TRABALHO

[Teste escrito de 17 de Outubro de 2008]

Grupo I
A hipótese prevista no Grupo I abordava a temática da validade do objecto dos contratos
de trabalho.

Nos termos do artigo 280.º do Código Civil, a cláusula do contrato que dispunha que
Aimar poderia intimar e utilizar a força física para executar o contrato era nula, pois era
contrária à Lei penal e aos bons costumes.

Pelo exposto, e também nos termos do artigo 51.º/1 da LT, a disposição seria nula.
Dado que se tratava de apenas uma cláusula, o contrato subsistiria se ficasse
demonstrado que a referida cláusula não tinha sido determinante para a celebração do
mesmo, sendo que a cláusula nula deveria ser suprida com as disposições legais
adequadas (cfr. 51.º n.º 1 e 2 da LT).

Na ausência de matéria de facto que permitisse retirar mais conclusões acerca da


hipótese, deveriam ser os aspectos abordados.

Grupo II

A hipótese abordava a temática da remuneração, em particular pretendia-se que aqui se


aferisse se a utilização da viatura da empresa para efeitos profissionais e particulares
bem como a cobertura de despesas de combustível integravam o conceito de
remuneração.
Da análise do artigo 108º n.º 1 das LT retiram-se os elementos que permitem
caracterizam como remuneração aquilo que o trabalhador receba, e que são os
seguintes:
- Contrapartida do trabalho
- Prestação regular e periódica
- Carácter patrimonial

Em relação aos dois primeiros elementos não se suscitavam grandes dúvidas, pois era
evidente que a utilização do veículo da empresa e as despesas de combustível eram uma
contrapartida do trabalho (decorriam da execução do contrato de trabalho) e que eram
atribuídas de um modo regular e periódico (estavam atribuídas desde o inicio do
contrato). A questão colocava-se sobretudo em relação ao seu carácter patrimonial.

Quanto ao carácter patrimonial, dado que estava em causa uma prestação em espécie
significava que a mesma teria de ser avaliável patrimonialmente. Ou seja, aquilo que o
trabalhador receberia teria de implicar directa ou indirectamente uma vantagem
patrimonial para o trabalhador.

A repercussão no património pessoal dos trabalhadores é essencial para se qualificar


qualquer contrapartida recepcionada por estes como estando subsumida na
remuneração.

No que se refere ao veículo da empresa, tendo em conta que o mesmo era utilizado para
fins pessoais e profissionais significava que o mesmo tinha uma repercussão no
património pessoal do trabalhador, na medida em que com a sua utilização o trabalhador
auferia uma vantagem pessoal -atribuída deliberadamente pela entidade empregadora -
que extravasava o próprio desenvolvimento da prestação laboral do trabalhador.

A vantagem pessoal que se repercutia no património do trabalhador advinha o facto do


mesmo beneficiar a título pessoal da utilização de um veículo pertencente à empresa e
daí retirar vantagens (vg. poupança de despesas) que de outra forma não conseguiria
retirar.

Caso o automóvel se destinasse exclusivamente ao uso profissional o mesmo não


integrava o conceito de retribuição, pois não decorria daí qualquer benefício patrimonial
na esfera do trabalhador, sendo que o montante atribuído a título de despesas de
combustível deveria ser considerado como ajudas de custo e não como remuneração.

Pelo exposto, e dado que o veículo automóvel atribuído a Makukula para uso pessoal e
profissional integrava o conceito de remuneração, deveria entender-se que a retirada do
mesmo deveria ser compensada, sob pena de se estar a violar um direito adquirido, e em
particular de se estar ilicitamente a diminuir a remuneração (cfr. art. 114º/1 da LT).

Grupo III

A hipótese descrita no Grupo III requeria a abordagem de duas matérias distintas: i) A


cessão da posição contratual; ii) transmissão do estabelecimento

Em relação à cessão da posição contratual cumpria dizer o seguinte:

Embora não esteja prevista na Lei do Trabalho (LT), a cessão da posição contratual
segue as regras gerais previstas nos artigos 424º e ss do Código Civil (CC). A cessão da
posição contratual tanto pode acontecer pelo lado do trabalhador, como do empregador.

Da matéria de facto da hipótese decorria que Yebda havia cedido a sua posição de
trabalhador da “Vai haver sangue, S.A.” a Binya.
Mediante os mecanismos da cessão da posição contratual, previstos no artigo 424º e ss
do CC, Yebda transmitiu a Binya a sua posição no contrato de trabalho que havia
celebrado com a “Vai haver sangue, S.A.” No entanto, da hipótese não resultava que
tivesse existido consentimento da “Vai haver sangue, S.A.” (ou da após a aquisição do
capital da “Direito do Trabalho não é fácil, S.A” - embora nesta situação o
consentimento continuasse a ser formalmente da “Vai haver sangue, S.A” ) na
transmissão da posição contratual, facto que nos termos do número 1 do artigo 424º do
CC é essencial.
A consequência do não consentimento da “Vai haver sangue, S.A.” é a não produção de
efeitos da cessão da posição contratual, ou seja, Yebda não havia transmitido a sua
posição contratual a Binya, e por conseguinte, este não era trabalhador da “Vai haver
sangue, S.A.”.
Em relação à questão da transmissão do estabelecimento, e embora a constatação das
contingências da inválida cessão da posição contratual esvaziassem um pouco esta
questão, deveria ser necessariamente referido o seguinte:

A matéria da transmissão do estabelecimento está prevista no artigo 76º da LT, no


entanto facilmente se percebia que não estava em causa uma transmissão do
estabelecimento nos termos que resultam da lei, mas sim uma situação de alteração na
titularidade do capital da empresa.

A transmissão de acções representativas do capital da sociedade não consubstancia uma


transmissão de estabelecimento, pelo menos tal como esta é prevista no artigo 76º da
LT, pelo que os requisitos e os princípios aí previstos não são aplicáveis a este tipo de
situações.

Nestes termos, a alegação de Binya de existência de uma eventual justa causa para a
rescisão do contrato de trabalho com base na transmissão do contrato era totalmente
infundada por três razões: 1) Não tinha havido transmissão do estabelecimento; 2)
Como se constatou, em virtude da ineficácia da cessão da posição contratual, Binya não
tinha qualquer relação laboral com a “Vai haver sangue, S.A.”; 3) A justa causa
invocada por Binya era apenas assente no receio da repetição do despedimento a que
tinha sido submetida aquando da sua passagem pela “Direito do Trabalho não é fácil,
S.A.”.

Grupo IV

A hipótese tratava a matéria da alteração do objecto do contrato, em particular da figura


do ius variandi.

No âmbito do poder de direcção, o empregador pode em caso de força maior ou


necessidade excepcional atribuir ao trabalhador funções que não constem do objecto do
contrato de trabalho (cfr. art. 72 da LT).

No caso em apreço, verificava-se que ao trabalhador tinham sido atribuídas funções que
não constavam do objecto do seu contrato, o que implicava que se os requisitos legais
do ius variandi estivessem preenchidos o cumprimentos dessas funções seria obrigatório
para o trabalhador.

A hipótese não continha elementos de facto que permitissem concluir sobre a validade
da ordem dada pela empresa, pelo que deveriam assumir-se dois pressupostos: i) a
validade da ordem, i.e. a verificação dos requisitos do ius variandi; ii) a não verificação
dos requisitos do ius variandi.

No primeiro cenário e sendo a ordem válida, independentemente de ser emitida por


escrito – a lei não impõe essa formalidade – deveria assumir-se que o seu não
cumprimento correspondia à violação do dever laboral de obediência que correspondia a
uma infracção disciplinar, passível de sancionamento.

Faz-se notar que decorria que hipótese que a remuneração não era diminuída, o que
indiciava que a alteração ao objecto do contrato seria válida.

Assumindo, o cenário da não verificação dos requisitos do ius variandi, o trabalhador


estaria legitimado ao não cumprimento da ordem que seria ilegal. Poder-se-ia sustentar
esta ideia pelo facto, da ordem não ter sido fundada em nenhum dos motivos apostos no
artigo 72.º/2 da LT e ainda pelo facto de não ter sido indicado o prazo de duração da
alteração do contrato.

Pelo exposto, verificava-se que qualquer um dos cenários era válido à luz da matéria de
facto da hipótese, sendo essencial referir ambos.

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