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INTRODUGAO A PARASITOLOGIA oe ca Cris ma 4 DESCRICAO Conceitos gerais da parasitologia: relacdes parasita-hospedeiro, ciclos parasitérios, habitats dos parasitos e politicas publicas de satide contra as parasitoses PROPOSITO Compreender os conceitos da parasitologia para o entendimento de diferentes formas de relagdes parasito-hospedeiro e de doengas parasitarias, assim como de politicas publicas na Area da saiide, a fim de criar melhores agdes de prevengao e combate as parasitoses. OBJETIVOS MODULO 1 Descrever o parasitismo, os principais grupos de parasitas, seus vetores, as politicas puiblicas de Satide e o papel do SUS no combate as parasitoses MODULO 2 Reconhecer os ciclos parasitarios, os principais tipos de habitat dos parasitos e os processos patolégicos relacionados ao parasitismo INTRODUGAO A grande diversidade de seres vivos e as relagées que eles estabelecem sempre foram motivo de fascinio pela humanidade. Se pararmos para pensar, até alguns séculos atras, os estudiosos ainda discutiam a origem de muitos organismos pela teoria da geragao espontanea, Os defensores dessa teoria se baseavam na observagao do surgimento de larvas na matéria organica em decomposigao e acreditavam que os organismos eram gerados a partir de matéria organica, inorganica ou da combinagao de ambas. Atualmente, sabemos que as larvas so colocadas por moscas adultas que encontram na matéria organica uma boa fonte de nutrientes para a sua progénie. Essa teoria foi derrubada pelas incriveis descobertas de Louis Pasteur. Felizmente, as teorias ¢ hipoteses avangaram e hoje podemos compreender melhor os mecanismos evolutivos dos microrganismos em seus diferentes hospedeiros e ambientes. Por exemplo, no inicio do século XX, mais precisamente em 1909, que o médico brasileiro Carlos Chagas identificou o parasito responsdvel pela tripanossomiase americana ou, como ficou conhecida depois, doenga de Chagas. Atualmente, muito se conhece sobre a doenga, a transmissao, 0 parasita, o diagnéstico, a prevengao e 0 tratamento. Entretanto, ainda sabemos muito pouco sobre outras doengas parasitarias, como a angiostrongiliase e a oncorcercose. Muito além da visdo antropocéntrica ou voltada apenas para a doenca, as relagées parasito- hospedeiro definem aspectos das interagdes entre todos os seres vivos, do mais simples ao mais complexo. Dos milhares de seres unicelulares e multicelulares, alguns encontram no homem as condigées ideais para sua sobrevivéncia e podem ser capazes de gerar ou nao doenga. Assim, vamos iniciar 0 nosso estudo sobre a parasitologia, uma ciéncia que estuda os parasitas e suas relagdes com o hospedeiro, vamos 14? MODULO 1 © Descrever o parasitismo, os principais grupos de parasitas do homem, seus vetores, as politicas publicas de saiide e o papel do SUS no combate as parasitoses INTRODUGAO AO CONCEITO DE PARASITISMO Conceitualmente, podemos chamar de parasito todo aquele ser vivo que encontra no outro 0 seu nicho ecolégico. Entretanto, para entendermos o conceito de parasitismo, precisamos compreender 0 complexo e equilibrado ambiente ecoldgico e evolutivo das relagdes parasite hospedeiro e alguns conceitos ecolégicos que serdo importantes, so eles: Foto: Shutterstock.com. Habitat: 4rea geografica e ecolégica em que determinada espécie é encontrada e pode exercer suas caracteristicas comportamentais, se alimentar e reproduzir. Existem diferentes tipos de habitat, entre eles terrestre, marinho, urbano, extremos, artificiais etc., onde cada um abriga uma ou mais espécies vivendo em comunidade. Foto: Hanson$9 / Wikimedia commons / CC BY SA 3.0 Unported. Ecossistema: meio em que os elementos fisicos (Agua, luz solar, temperatura) interagem com 0s seres vivos, formando uma complexa rede de interagées, associagées e de sobrevivéncia. Existem desde microecossistemas, como o encontrado na agua acumulada nas bromélias, até macroecossistemas, como florestas e ecossistemas marinhos. Foto: Shutterstock.com. Nicho ecolégico: tem relacdo com 0 papel ou com 0 modo de vida daquele organismo na comunidade em que ele vive ECOLOGIA iéncia que estuda as interagdes entre os seres vivos. Dentro de uma mesma comunidade, existem diferentes espécies que possuem caracteristicas préprias e que, por habitarem o mesmo espago, acabam estabelecendo interagées ecolégicas que sao complexas e delicadas. Muitos fatores podem desequilibrar essa balanga ecolégica e afetar a harmonia entre as espécies, como 0 desmatamento, a introdugdo de espécies exdticas, as mudangas climaticas ete Uma forte corrente de estudiosos da Ecologia defende que estudar um organismo sem considerar 0 meio em que ele vive e as interagdes que ele estabelece é falho e pode levar a interpretagdes ecolégicas equivocadas ‘A questéo do desequilibrio ecolégico se tornou fundamental para a satide do planeta, principalmente desde o final do século XVIII, quando a Revolugao Industrial provocou profundas mudangas no estilo de vida da humanidade. Mas qual a relagao disso com o parasitismo? ANTROPICA E a ciéncia que estuda a ago ou resultado da aco do ser humano sobre o meio ambiente. Os animais interagem com outros animais e com 0 meio em que habitam, entao qualquer interferéncia antrépi a, OU Seja, de agao humana, nesse harménico ambiente pode ter consequéncias graves. Por exemplo, varias pragas agricolas s4o também resultantes do desequilibrio ambiental e climatico. Foto: Shutterstock.com. Estudos indicam que o coronavirus, conhecido pela sigla SARS-CoV-2, tem sua origem muito provavelmente relacionada a morcegos e que o local dos primeiros relatos de casos, a provincia de Wuhan, na China, é um territério com grande agao antrépica. Sérias alteragdes ambientais na regido so provocadas pelo desmatamento, pela caga e pelo consumo de animais silvestres. Imagem: Shutterstock.com 1 ATENGAO Acredita-se que 0 coronavirus emergiu dos morcegos, passou por um hospedeiro intermediario e depois encontrou os humanos. Esse é um excelente exemplo para pensamos nas relagdes e intervenges entre o homem e o ambiente e seus reflexos para a satide individual e coletiva. FORMAS DE ASSOCIAGAO ENTRE OS SERES VIVOS Na natureza, os organismos estabelecem relacées entre si que podem ser intraespecificas ou interespecificas. No primeiro caso, individuos de uma mesma espécie interagem uns com os outros, para garantir a sua sobrevivéncia. S40 muitos os exemplos, porém é mais facil de entendermos citando o caso das abelhas e formigas. Foto: Shutterstock.com. Esses seres vivos vivem em intensa intrarrelagao com uma organizagao social bem definida Ja as relagées interespecificas séo mais complexas, existindo muitas tentativas de classificar e estabelecer os limites entre os beneficios e maleficios das relagdes entre os seres vivos. Didaticamente, os estudiosos da Ecologia dividiram essas relagdes em varios tipos, a depender do grau de vinculo metabélico. Antes, é preciso esclarecer que toda forma de associagao entre espécies ¢ uma simbiose. Posto isso, classificou-se a simbiose em variadas formas que veremos a seguir: PARASITISMO O parasitismo é uma associag4o de unilateralidade, onde somente o parasito é beneficiado. O nivel de dependéncia pode ser tanto que alguns parasitos sé encontram as condigées ideais de sobrevivéncia em uma tinica espécie de hospedeiro. A Entamoeba histolytica é um exemplo classico, pois obtém seus nutrientes a partir da digestao enzimatica das células epiteliais da mucosa intestinal do hospedeiro, 0 que pode provocar necrose, apoptose e inflamagao local. MUTUALISMO No mutualismo, hd o convivio mittuo e benéfico de duas espécies diferentes. Entretanto, apesar de vantajosa para os dois lados, essa relacdo nao é de dependéncia, podendo o hospedeiro sobreviver sem o parasito. Podemos citar, como exemplo, a microbiota rica de bactéria e protozoarios presentes no nimen, um dos quatro compartimentos gastricos dos ruminantes, que auxiliam na digestao da celulose. Do mesmo modo que o animal se beneficia da quebra da celulose, os microrganismos ganham alimento e um excelente habitat para a sua sobrevivéncia. COMENSALISMO O comensalismo ¢ caracterizado pela associagao entre duas espécies, onde apenas uma delas é beneficiada, entretanto, sem que a outra saia prejudicada desta relagao. O parasitismo comensal da Entamoeba coli no intestino grosso é um exemplo. A seguir, vemos um resumo dessas interagées: eA i Associagio entre duas espécies, % Y onde apenas uma delas & beneficiada, entretanto, sem que a outta saia prejudicada desta pS relacdo Moen Convivio mituo e benéfico de ruminantes: fatamoeba ‘onde somente o parasita é beneficiado, trazendo prejulzo para o hospedeiro Imagem: Shutterstock.com, adaptado por Leandro Souteiro. @ Principais formas de associagao entre parasitos e seus hospedeiros, Por meio do seu modo de vida, os parasites influenciam no desenvolvimento, na produgao de horménios, na reprodugao, no estado nutricional e até mesmo no comportamento de seus hospedeiros. Vejamos um exemplo: we EXEMPLO Imagem: Shutterstock.com Os parasitos que habitam cavidades ou tecidos internos necessitam exclusivamente dos nutrientes fornecidos pelo hospedeiro. CESTOIDES \Vermes em forma de fita que se caracterizam pela auséncia do sistema digestivo e captam seus alimentos a partir da absorgao direta do meio. S40 exemplos a Taenia solium e Taenia saginata causadoras da teniase. Muitos cestéides perderam, ao longo de sua evolugdo, a capacidade de sintetizar enzimas, fato que os mantém na dependéncia do suco gastrico e das enzimas digestivas dos animais que sao parasitados. Vamos a um outro exemplo, dessa vez nao relacionado a nutrigao, mas ao metabolismo endoécrino. we EXEMPLO Foto: Shutterstock.com. protozoario ciliado Opalina ranarum, parasito de anfibios, consegue sincronizar o seu ciclo biolégico com o ciclo sexual do hospedeiro. Desse modo, o protozoério produz os seus cistos. no periodo reprodutivo dos anfibios, quando esses procuram a agua, assegurando aos ciliados uma grande chance infectar as geragées de girinos (filhotes de sapos). Em laboratério, pesquisadores descobriram que os elevados niveis de horménios sexuais dos anfibios induzem © pracesso de encistamento do parasito. impacto do parasitismo pode ser positivo, negativo ou neutro, dependendo da relacao que estabelecem. A capacidade de um parasito em proliferar é dependente de seu sucesso em também encontrar um equilibrio vantajoso entre o custo energético e o nutricional, vinculado a sua presenga no organismo do hospedeiro. Nos casos do parasitismo acidental, onde a viruléncia e a patogenicidade sao elevadas, o hospedeiro geralmente morre antes do parasito completar o seu ciclo. A relagdo evolutiva ideal é aquela em que ambos sao beneficiados, como é o caso das bactérias da nossa microbiota. FATORES LIMITANTES PARA O CRESCIMENTO DOS ORGANISMOS Para que uma espécie possa se manter e gerar descendentes, é preciso que condigées ideais ‘sejam encontradas para a sua sobrevivéncia. Existem elementos que sao limitantes para crescimento e a reprodugao das espécies. Determinadas bactérias nao crescem no meio de cultura se alguns nutrientes e as condigées ambientais necessérias nao forem encontrados, por @e oO mes Ja as bactérias anaerébias estritas sé conseguem sobreviver em ambientes com pouca ou exemplo. Imagem: Shutterstock.com. nenhuma concentragao de oxigénio, pois este é extremamente t6xico para elas. Além disso, um mesmo organismo pode precisar de uma alta temperatura para o crescimento, mas também baixa concentragao de oxigénio. Pode-se dizer que um organismo tolera de modo qualitativo e quantitative uma série de elementos necessarios para seu desenvolvimento, Os organismos podem tolerar mais ou menos determinado elemento e, nas espécies que sao mais tolerantes, as variagdes conseguem habitar espagos diferentes. Os principais elementos fisicos limitantes sao: temperatura, disponibilidade de agua, umidade — relacionada com a agua e a temperatura — e a biodisponibilidade de elementos quimicos fundamentais, como 0 ferro e 0 zinco. Nas regides tropicais do planeta, onde existe maior biodiversidade, a temperatura oscila dentro de uma faixa maior. Foto: Shutterstock.com. No bioma Pantanal, existem dois periodos bioclimaticos bem definidos: seca e chuva. Os animais sao bem adaptados as enchentes e secas anuais e essa variagao é importante para a manutengao daquele ecossistema. Se a temperatura e o nivel de precipitagao (de chuvas) ficassem constantes ao longo do tempo, certas espécies de plantas e animais teriam suas populages drasticamente diminuidas, o chamado efeito depressor. Muitas bactérias e muitos protozoatios sao sensivels a variagao de umidade e temperatura podem dessecar no ambiente externo. ww EXEMPLO As bactérias anaerébias e os fungos que podem passar por um processo de esporulagao em condigées ambientais adversas ao seu crescimento e, assim, resistir as dificuldades nutricionais e ambientais. Caso encontrem um estado de étimas condigées, podem retomar ao estado vegetative. Alguns protozodrios passam por um processo semelhante, denominado de encistamento. ESPORULAGAO E 0 processo pelo qual alguns microrganismos formam esporos — estruturas de resisténcia — frente a condicbes ambientais adversas a sua sobrevivéncia. PRINCIPAIS GRUPOS DE PROTOZOARIOS E METAZOARIOS PARASITOS DO HOMEM E SEUS VETORES Os principais parasitas estudados pela Parasitologia s4o os protozoarios (organismos eucariotos, unicelulares e heterotréficos) do reino Protista e os metazoarios (organismos eucariotos, multicelulares e heterotréficos) Nematoda e Platyhelminthes (platelmintos), além de Arthropoda (artrépodes), do reino Animalia, todos contidos no dominio Eukarya. A classificagao taxonémica, uma importante ferramenta de identificagao, dos parasitas 6 baseada em fatores morfolégicos, genéticos, bioquimicos e fenotipicos, tendo sido alterada ao longo dos anos, principalmente, pelo avango das técnicas moleculares e de sequenciamento genético. Nessa classificagao, so adotadas algumas terminologias que tém importancia na descrigao e localizagao zoolégica do parasito. Vamos adotar a classificagao recomendada pelo Comité de Sistemdtica e Evolugao da Sociedade de Protozoologia, conforme 0 quadro a seguir. EXEMPLOS: ber selel ry PROTOZOARIOS HELMINTOS Reino wee Protista Animalia Sub-reino a Protozoa Metazoa Filo -a Sarcomastigophora : Subfilo Superclasse Classe Subclasse Superordem Ordem Subordem Superfamilia Familia Subfamilia Género Espécie ‘idea -ida -ina -oidea -idae -inae Sarcodina Rhizopoda Lobosea Gymnamoebia Amoebida Tubulina Entamoebidae Entamoeba E. histolytica Platoda Acercomermorpha Digenea Fasciolidea Schistosomatida Schistosomatina Schistosomatoidea Schistosomatidae Schistosomatinae Schistosoma S. mansoni Atengdol Para visualizagao completa da tabela utilize a rolagem horizontal €B Quadro: Categorias taxonémicas de protozoarios ¢ helmintos. Extraida de Rey, L., 2008. p. 133. Podemos encontrar algumas terminologias que nao seguem o proposto no quadro acima, pois a classificagao atual pode entrar em conflto com denominagées utilizadas ha muito tempo pelos estudiosos da area. © SAIBA MAIS Na taxonomia, todas as categorias, como reino, filo, familia, género e espécie, sdo escritas em latim, Para os protozodrios, género e espécie sao as tinicas categorias que devem ser escritas em itdlico ou em texto corrido sublinhado. As bactérias fogem a regra e as categorias acima de género (familia, ordem etc.) também sao escritas em itdlico. O género deve ser sempre escrito com a primeira letra em maitisculo e, para designar a espécie, basta escrever o epiteto especifico em mintisculo (exemplo: Entamoeba histolytica). Se vocé quiser abreviar uma espécie, basta escrever a primeira letra do género ¢ o ponto de abreviagao, seguido do epiteto por extenso (exemplo: E. histolytica) Quando a espécie nao for identificada, o nome do género serd seguido de sp. (para uma espécie) ou de spp. (para mais de uma espécie) Tome cuidado, sp. e spp. nao sdo grafados em italico! SUBGRUPOS Pode ser utilizado também “clados” ou até mesmo “super-reinos’, O dominio Eukarya é dividido em seis subclassificagdes chamadas de supergrupos. Dentro desses subgrupos apenas Amoebozoa, Chromalveolata, Excavata e Opisthokonta possuem parasitas capazes de infectar os humanos. A seguir vamos conhecer cada um deles. velados mores fl comics DG e an eineamaen e a Coanoagelades Imagem: Shutterstock.com / Servier Medical Art / Wikimedia Commons / licenga (CC-BY-2.0), adaptado por Leandro Souteiro, @ Relacées filogenéticas gerais entre os grupos de parasitos de humanos. O supergrupo Excavata é dividido em quatro subgrupos: Fornicata (subdiviséo Eopharyngia), Parabasalia (subdiviséo Trichomonadida), Heterolobosea (subdivisdo Vahlkampfiidae) & Euglenozoa (subdivisdo Kinetoplastea). Imagem: Wikimedia Commons / Dominio puiblico. @ Excavata: Giardia duodenalis. GIARDIA DUODENALIS Alguns autores chamam de G. Jamblia ou Giardia intestinalis. CERATITE E a inflamagao da cornea, a camada mais externa do olho, podendo ser desencadeada por uma infeceao ou por qualquer agente irritante da mucosa ocular. EOPHARYNGIA A subdivisao Eopharyngia é caracterizada por apresentar individuos com um ou dois nicleos, cada um com seu sistema locomotor. A principal espécie de interesse médico dessa subdivisao 6 a Giardia duodenalis, que pode causar quadros de diarreia sanguinolenta (giardiase). A transmissao ocorre quando cistos sao ingeridos a partir de agua ou alimentos contaminados. Outros parasitos comensais esofaringeos podem ser encontrados no intestino, como Chilomastix mesnili e Retortamonas intestinalis. TRICHOMONADIDA Os flagelados da subdivisdo Trichomonadida (tricomonadideos ou parabasilideos), géneros Dientamoeba, Pentatrichomonas e Trichomonas, parasitam a luz intestinal humana. Este ultimo género tem importancia médica, pois nele esta presente a Trichomonas vaginalis. A infecgao por T. vaginalis é assintomatica em cerca de 20 a 50% das mulheres, mas pode evoluir para um quadro de corrimento e prurido vaginal (tricomoniase). A grande maioria dos casos tem prognéstico favoravel, se seguidas as recomendagées de higiene e tratamento, geralmente metronidazol ou secnidazol. Assim como qualquer outra infecgao sexualmente transmissivel, a melhor maneira de prevenir a tricomoniase é usando preservativos. VAHLKAMPFIIDAE A subdivisao Vahlkampfiidae retine protozoarios de nticleo tinico que podem ter flagelos ou forma ameboide, a maioria de vida livre. Dois géneros s4o associados a doengas em humanos: Vahikampfia e Naegleria. Até recentemente acreditava-se que 0 primeiro no era um patégeno humano, entretanto pesquisadores conseguiram identificar uma espécie (Allovahikampfia spelaea) causando ceratite. Naegleria é 0 agente etiolégico da meningoencefalite amebiana primdria, doenga do sistema nervoso central (SNC), de alta letalidade e incidente no hemisfério norte. EUGLENOZOA A Ultima diviséo do supergrupo Excavata ¢ a Euglenozoa, que, por sua vez, ¢ subdividida em Kinetoplastea. As espécies desse grupo sao parasitos obrigatérios com um flagelo localizado anterior ou lateralmente. Trypanosoma e Leishmania so os géneros de maior importancia em satide publica, responsaveis pela tripanossomiase americana (doenga de Chagas) e africana (doenga do sono), e pelas leishmaniases (tegumentar e visceral), respectivamente Ambas sao doengas incidentes no Brasil, ainda endémicas em algumas regides do pais e transmitidas por vetores. A doenga de Chagas é transmitida a partir da picada de triatomineos, jd a leishmaniose pela picada de flebotomineos. Do supergrupo Amebozoa derivam quatro divisées sistematicas: Foto: dr.Tsukii Yuuji / Protist.i.osei.ac,jp / CC BY-SA 2.5. @ Amebozoa. TUBILINEA © género Hartmannelia (divisao Tubilinea) tem como principal representante a Hartmannella veriformis, causadora de meningoencefalite e broncopneumonia de evolugao rapida e alta letalidade. A transmissao esta associada ao contato com agua poluida ACANTHAMOEBIDAE O género Acanthamoeba pertence a divisdo Acanthamoel jae e reine alguns protozoarios associados a doenga em humanos. A. polyphaga, A. castellani , A. divionensis, A. lugdunensis so associados com lesées granulomatosas na pele, conjuntiva ocular (conjuntivite) e cémea (ceratoconjuntivite), podendo invadir 0 SNC. Individuos imunodeprimidos podem evoluir rapidamente para um quadro de meningite amebiana. A contaminagao geralmente ocorre durante o contato com fonte de aguas contaminadas com cistos ou trofozoitos. ENTAMOEBIDAE A divisdo Entamoebidae possui como principal representante patogénico a Entamoeba histolytica, Estima-se que cerca de 40 mil a 100 mil dbitos anuais em todo o mundo sejam relacionados com a amebiase por E. histolytica, principalmente em criangas e individuos malnutridos ou imunodeprimidos. A contaminagdo ocorre pela ingesto de cistos a partir de alimentos e agua impréprios para consumo, Apesar de morfologicamente semelhante a E. histolytica, E. dispar é um organismo nao patogénico e comum na microbiota intestinal. MASTIGAMOEBIDAE A diviséo Mastigamoebidae engloba muitas amebas de vida livre ou endobidticas, algumas comensais de humanos, outros mamiferos, além de aves e anfibios. Endolimax nana é parasito comensal do célon, mas pode ser encontrado em outras partes do intestino. E.nana se alimenta de bactérias da microbiota, sem agredir a mucosa intestinal. O supergrupo Chromalveolata é um dos maiores grupos de protozoarios da natureza, tendo representante com ou sem flagelos e com ou sem cilio. Duas subdivisées sao de interesse médico: Imagem: Shutterstock.com © Chromalveolata: Plasmodium spp. APICOMPLEXA filo Apicomplexa recebe esse nome pela presenga nos parasitos, em pelo menos um estagio de sua vida, de um complexo apical anterior composto por organelas especializadas. A malaria & provocada pela infeccao dos apicomplexos do género Plasmodium - P. falciparum, P. ovale, P. vivax e P. simium —a partir da picada de mosquitos do género Anopheles. A babesiose (Babesia spp.), sarcocistose (Sarcocystis hominis), isosporiase (Isospora bel) e toxoplasmose (Toxoplasma gondii) também sao doengas provocas por apicomplexos. CILIOPHORA Os organismos ciliados tém como principal caracteristica a presenga de cilios que recobrem todo 0 corpo do protozoario e séo utilizados principalmente para a locomogao. A unica espécie de ciliado conhecida por causar doengas em humanos é Balantidium coli. A balantidiose, como & chamada a doenga, é transmitida pela ingestdo de cistos presentes em alimentos e agua contaminada. © quadro clinico ¢ marcado por uma diarreia intensa semelhante & amebiase por E. histolytica. © supergrupo Opisthokonta, que inclui os Reinos Animalia e Fungi, além de outros grupos de metazoarios, ¢ muito importante em Satide Publica e engloba varias doengas humanas. Alguns metazoarios podem ser parasitos comensais ou oportunistas, como o fungo Rhinosporidium seeberi, A rinosporidiose é incidente na América do Sul e em outras regides do mundo e manifesta-se pelo aparecimento de pélipos na cavidade nasal e faringe ou na pele (forma cutanea) Foto: Shutterstock.com. © Reinos Fungi No reino Animalia, os parasitos do homem e seus vetores apresentam como principais filos de interesse médico os Platyhelminthes, Nemathelminthes, Arthropoda e Mollusca, que so ivididos em varias Ordens e Familias, conforme observamos no esquema a seguir: (Oieene) |e Ss Patyelmintes| mai Somer gitnteine oyu ny ceoides —| tl et gant settee) secaeeven os Es marae Erenent vermis: antheiaes —— Nene — nee ov a [ttetnise Aagcemnseocsas ‘ee noes Coe second = oa ation uote tes ——cropesa —|a—S Imagem: Helver Gongalves Dias, adaptado por Leandro Souteiro. © Alguns parasitos do homem e seus vetores compreendidos no Reino Animalia. Filo Platyhelminthes Composto por organismos com corpo achatado dorso-ventralmente, habitando ambientes aquaticos, solo ou interior de outros animais, como o homem. Os trematédeos digenéticos (classe Trematoda) possuem estruturas de fixagao chamadas ventosas e sistema digestorio incompleto (ndo ha nus). O representante mais conhecido por causar doenga em humanos é Schistosoma mansoni, agente etiolégico da esquistossomose. © homem pode se infectar ao entrar em contato com a agua contaminada pelas cercdrias, que sao a forma infectante que penetra na pele. Fasciola hepatica também ganha importancia, principalmente pelo impacto econémico na ovinocultura, sendo o homem hospedeiro infectado quando ingere acidentalmente agua e verduras contaminadas com as formas larvais do parasito, as metacercarias. 1 ATENCAO Outros parasitos também encontram no homem ambiente propicio, mesmo que eventualmente acidental, para o parasitismo, como Paragonimus westermani, Heterophyes heterophyes & Gastrodiscoides hominis. Os cestédeos (classe Cestoidea) nao tém sistema digestério, possuem ventosas e corpo segmentado em trés partes: escélex, colo e proglotes. Quatro familias sao importantes por causarem doengas distribuidas mundialmente: Diphyllobothriidae, Taeniidae, Hymenolepididae, Dilepididae Imagem: Shutterstock.com. @ Taenia saginata aderida a mucosa intestinal. A escélex apresenta cinco ventosas A difilobotriase ocorre apés 0 consumo de peixe cru ou malcozido que esteja contaminado com a forma infectante do Diphyllobothrium latum. © homem é hospedeiro definitive por propiciar a maturidade sexual do parasito no trato intestinal. Taenia solium e Taenia saginata infectam 0 homem (hospedeiro definitive) apés o consumo de carne suina ou bovina malpassada, respectivamente, contaminada com ovos do parasito. A teniase 6 uma doenga bastante incidente e negligenciada que ainda apresenta quadros graves, principalmente em criangas malnutridas e imunodeprimidos. Hymenolepis nana 6 uma espécie cosmopolita, parasitando com maior prevaléncia criangas em 4reas sem saneamento basico. As infecgées so, em sua maioria, assintomaticas. A dipilidiose 6 uma doenga majoritariamente de ces ¢ gatos, entretanto o homem pode ser infectado pela ingestao acidental de pulgas contendo cisticercoides. Os casos humanos sao raros, mas tm sido reportados em todos os continentes Os nematelmintos (filo NematheIminthes) Sdo organismos de corpo cilindrico e afilado nas duas pontas. Sao amplamente distribuidos e prevalentes na populagao em geral. Dentre as doengas causadas por nematédeos e transmitidas pela ingestao de ovos, podemos citar: ascaridiase (Ascaris lumbricoides), toxocariase (Toxocara canis), oxiuriase (Enterobius vermicularis) e tricuriase (Trichuris trichiura) «1 ATENCAO Outro grupo de doengas causadas por nematédeos sao aquelas transmitidas pela larva infectante, como a estrongiloidiase (Strongyloides stercoralis), ancilostomiase ou amareléo (Ancylostoma duodenale) e a angiostrongiliase (Angiostrongylus costaricensis). Com excegao dessa ultima, todas as demais so doengas associadas a falta de habitos de higiene e de saneamento basico. Apesar de rara, a angiostrongiliase tem sido relatada no Brasil, sendo transmitida pela ingestao de larvas infectantes que sao liberadas por moluscos (hospedeiro intermediario). A filariose (Wuchereria bancrofti) e a oncorcerciase (Oncocerca vulvulus) sao as Unicas transmitidas por vetores, o Culex quinquefasciatus e Simulium sp., respectivamente. Imagem: Shutterstock.com G Perna de uma pessoa com filariose linfética, conhecida popularmente como elefantiase. Filo Arthropoda Retine uma grande diversidade de organismos, que compartilham a caracteristica principal de possuir o corpo protegido por um exoesqueleto de quitina. Seis familias de insetos hematéfagos sao extremamente importantes para a transmissao de parasitos e virus aos humanos. Os géneros Triatoma, Rhodnius e Panstrongylus s4o compostos por triatomineos conhecidos popularmente por barbeiros ¢ estao envolvidos na transmissao do T. cruzi. Diferentemente dos mosquitos, os triatomineos nao inoculam o parasito através do aparelho sugador. O parasito é eliminado pelas fezes do vetor durante o repasto sanguineo Os flebotomineos so os transmissores das leishmanioses tegumentar e visceral e apresentam ampla distribuigdo geografia. Aedes e Culex estdo implicados na transmissdo de diversas arboviroses endémicas no Brasil e s4o mosquitos muito bem adaptados ao ambiente urbano. Coma citado anteriormente, Culex também é 0 vetor do agente da filariose linfatica. Os ceratopogonideos (género Culicoides) séo mosquitos bem pequenos transmissores de algumas filarias (Mansonella) e do virus Oropouche. Algumas espécies do género Chrysops ‘so transmissoras da filaria Loa loa na Africa. Imagem: mogrzewalska / Shutterstock.com, @ O carrapato Amblyomma cajennense é principal transmissor da febre maculosa no Brasil. A febre maculosa é uma importante zoonose transmitida pelo carrapato-estrela (Amblyomma) no Brasil. O ultimo género de artrépodes associados a doenga em humanos é composto por caros causadores da escabiose, conhecida como sarna. ilo Mollusca Retine animais de corpo mole, em geral protegido por uma concha calearia rigida. Os géneros Oncomelania, Biomphalaria, Lymnaea e Sarasinula possuem importancia médica por serem hospedeiros de alguns parasitos de humanos. Espécies do género Biomphalaria sao hospedeiras intermediarias do parasito causador da esquistossomose. Lymnaea columella € Sarasinula marginata sao hospedeiros intermediarios do trematédeo Fasciola hepatica e nematédeo Angiostrongylus costaricensis, respectivamente. O HOMEM E SEUS PARASITOS Assista ao video em que o especialista ird Helver Dias falard sobre a relagao entre 0 parasitismo e os principais grupos de protozoarios do homem. =") INQUERITOS COPROPARASITOLOGICOS Para assistir a um video sobre o assunto, acesse a verso online deste conteudo Grandes estudos onde se verifica a prevaléncia de uma ou mais doenga enteroparasitaria por meio de exames de fezes ou coprolégico. POLITICAS PUBLICAS DE SAUDE E O PAPEL DO SUS NO COMBATE AS PARASITOSES Os parasitos intestinais estéo entre os patégenos mais frequentes em humanos, constituindo importante agravo a satide. O Brasil ¢ endémico para diversas doengas parasitarias e muitas delas sdo consideradas negligenciadas. Séo escassos os inquéritos coproparasitolégicos que investigam a real amplitude e distribuigdo geogréfica das infecgdes parasitérias no Brasil Os grandes estudos realizados nas décadas passadas nao refletem com fidelidade o cenario. epidemiolégico atual. A incidéncia (novos casos) de doengas parasitarias esta relacionada a pobreza e as péssimas condigdes sanitarias, como auséncia de esgotamento sanitario, condigées de moradia, auséncia de agua encanada e potdvel, além de solos contaminados. Nesse contexto, as populagées mais afetadas sao as mais carentes, como individuos de quilombos, assentamentos, favelas, areas rurais e indigenas. A desigualdade social no Brasil favorece a marginalizagao dessas pessoas e adia a consolidagao de politicas publicas necessérias para o enfrentamento das parasitoses. Foto: arindambanerjee / Shutterstock.com. Atualmente, os parasitas, como Ascaris lumbricoides, Toxoplasma gondii, Entamoeba histolytica, Giardia duodenalis, Trypanosoma cruzi, Leishmania spp. e Schistosoma spp. contribuem enormemente para o quantitativo global de doengas. Entretanto, parasitos intestinais, como a enterobiose, so negligenciados, mesmo tendo contribuigao para o déficit de crescimento e aprendizagem de criangas nos paises mais pobres. Imagem: Shutterstock.com 1 ATENCAO E preciso destacar que o conceito de satide nao é aquele apenas relacionado a auséncia de doenga, mas também a manutengéo e melhora do préprio estado de satide fisica e psicossocial do individuo. Nesse sentido, faz-se necessaria a implementagao de politicas publicas que integrem universalizagao da satide, habitagao, saneamento basico, planejamento urbano e promogao da satide, O enfrentamento parte de um olhar holistico da questao. E vocé, sabe o que sao as Politicas Publicas de Satie? Politicas pUiblicas de satide podem ser entendidas como um conjunto de disposigdes que fazem parte do campo de ago social do Estado, orientado para organizar e nortear a promogao, recuperacao e protegao da sade da populagao. Com a redemocratizaco do pais no final da década de 1980, a promulgagao da Constituicao Federal trouxe um novo horizonte para as politicas publicas em Satide no Brasil A Constituigéo adota um modelo de seguridade social para a satide norteada por trés diretrizes: Descentralizagao Atendimento integral Participagao da comunidade «1 ATENGAO Todas as demais leis e politicas publicas tém agdo infraconstitucional, ou seja, esto hierarquicamente abaixo do texto constitucional. As conquistas do povo em relagao a satide foram asseguradas na Constituigao por meio de uma intensa luta e movimentacdo social ocorridas nos anos anteriores. O Movimento Sanitario ¢ outros movimentos politicos e sociais debateram profundamente as tematicas da saude a partir de um olhar amplo e voltado para a construgao de uma politica de satide includente para toda a populagao brasileira. Foto: Nana Moraes / Fiocruz / CC BY-NC. No Artigo 196, a Constituigao define “a satide como um direito de todos e dever do Estado” eo Artigo 198 dispde sobre a criagao do Sistema Unico de Satide (SUS). 0 SUS é a materializagao da vontade e esforgo nacional para assegurar 0 acesso universal de seus cidadaos aos cuidados em Satide. Muitos autores definem o SUS como a prépria politica de satide brasileira. OU) etic Pratt Are rnd Foto: Shutterstock.com. A seguir vamos entender um pouco do histérico das Politicas Publicas em Satide no Brasil. POLITICAS PUBLICAS EM SAUDE Ainda que 0 SUS tenha sido criado em 1988, sua regulamentacao e operacionalizagao efetiva- se apenas com a aprovacao da Lei Organica (LO) n° 8.080, de 19 de setembro de 1990, e da LO n? 8.142, de 28 de dezembro de 1990. A primeira LO do SUS normatiza em seu texto: os objetivos e as atribuigdes; os principios e diretrizes; a organizagao, diregdo, gestdo, competéncias e atribuigdes de cada esfera de governo (federal, estadual e municipal); a participagao complementar da iniciativa privada; financiamento e a gesto financeira dos recursos. ALO n° 8.142/90 dispée sobre a participago popular na prépria gestdo do SUS e sobre as transferéncias intergovernamentais de recursos financeiros. O Artigo 1 democratiza e institucionaliza a participagao popular na satide, a partir da composigao dos Conselhos de Satide e das Conferéncias de Satide. A instituigéo do Conselho Nacional de Secretarios de Satide (Conass) e o Conselho Nacional de Secretérios Municipais de Satide (Conasems) tem importante papel na formulagao de estratégias no controle de execugao da politica de satide no pais. A Constituigéo Federal em sua segao II, juntamente com as LO n° 8.080/90 e n° 8.142/90, compée o arcabougo juridico do SUS. Em 1993, foi publicada a Norma Operacional Basica do SUS (NOB-SUS 93), que definiu estratégias operacionais que assegurassem 0 compromisso de implementagao do sistema Unico, De modo simulténeo, a NOB-SUS-93 aperfeigoou a gestao do SUS e reafirmou a descentralizagao politico-administrativa na satide publica, A definigao do papel dos estados e municipios, saindo da légica de prestadores de servicos e passando a assumir o papel de gestores, é importante para o pleno exercicio da gestéo em Satide. ‘Os mecanismos criados pelas Leis Organicas e pelas NOB's permitiram a sistematizagao da implementagao do SUS em suas esferas administrativas ¢ incorporaram a participagao do usuario no processo decisério de formulagao da politica de satide Em 1994, é criado pelo Governo Federal o Programa Satide da Familia (PSF), hoje conhecido como Estratégia Satide da Familia (ESF), que consistia na proposta de implementagao da ‘Atengdo Primaria nos municipios. © programa tinha como estratégia central a substituigo da visdo assistencial vigente a época — ou seja, voltada para o doente e ao atendimento hospitalar de emergéncia -, a incorporagao da légica de promogao da satide e a participagdo popular. A implementagao do PSF é facilitada pela existéncia do Programa de Agentes Comunitarios de Satide (PACS), oficializado em 1991, pelo Ministério da Satide. Ao longo das ultimas trs décadas, o PACS se consolidou como o maior programa de Atengao Primaria 4 Satide do Brasil, englobando atualmente mais de 260 mil Agentes Comunitarios de Satide (ACS). Por ser membro da comunidade em que atua, o ACS é 0 vinculo indispensavel entre 0 cidaddo ea equipe da unidade de satide A Atengo Basica fortaleceu um aspecto fundamental da politica de satide brasileira, a descentralizagao. A capilaridade alcangada pelas Unidades Basicas de Satide (UBS), presentes no préprio territério, permitiu a obtengao de dados sobre as condigdes de vida e satide das populagées. No Rio de Janeiro, por exemplo, as UBS alcangam territérios marginalizados dentro de favelas ¢ em locais historicamente negligenciados pelo poder publico. A adogao de um modelo de territorialidade permite methorar o planejamento com base na identificagao de vulnerabilidades e selecdo de problemas prioritérios para a populagao daquele determinado territério. ASF (Estratégia de Saude da Familial) tem papel central no combate e na prevengao das doengas parasitarias, principalmente por proporcionar facil acesso a satide, pelos aspectos de promogao e educagao em satide e prevengao de agravos. Diferentes municipios tm adotado estratégias de enfrentamento das parasitoses com base no conhecimento da dindmica territorial e sanitaria aliada a educagao em satide. Campanhas de educagao sanitaria em escolas e conscientizagao realizada pelos ACS (Agentes comunitarios de saudel) , durante visitas domiciliares, resultam na incorporagao de habitos de higiene, tais como o simples habito de lavar as mos e higienizagao correta dos alimentos, e a consequente redugao da incidéncia das parasitoses. A Secretaria de Vigilancia em Satide, érgao do Ministério da Satide, langou em 2005 o Plano Nacional de Vigilncia e Controle das Enteroparasitoses, tendo como objetivo geral a definicao de estratégias para a redugao da prevaléncia, morbidade e mortalidade por enteroparasitoses no pais. A partir da analise epidemiolégica de cada localidade, pode-se criar estratégias de controle para serem adotadas nos diferentes niveis administrativos. O Plano integrava agdes da vigilancia epidemiolégica, educagao em satide, diagnéstico e assisténcia e saneamento basico. Esse ponto é importante, pois no contexto brasileiro as politicas de sauide so indissociaveis das politicas ambientais e de saneamento. Foto: Brunocaput / Wikimedia Commons. 1988 Promulgagao da Constituigao 1990 Lei Organica da Satide 8.142/90. Imagem: Portal da Satide - Ministério da Saude / Saude.gov / Dominio public. Imagem: Shutterstock.com. 1990 Lei Organica da Satide 8.080/90. 1991 Programa de Agentes Comunitarios de Satide. ACS Imagem: Shutterstock.com, adaptada por Leandro Souteiro. TALS a8 Imagem: Shutterstock.com 1994 Programa Satide da Familia. 2005 Plano Nacional de Vigilancia e Controle das Enteroparasitoses. Imagem: Shutterstock.com O Ministério da Satide determina que algumas doengas ou agravos sejam notificados compulsoriamente, ou seja, quando feito o diagnéstico clinico e/ou laboratorial ou identificada a situagéio-problema, o profissional da unidade de sauide deve obrigatoriamente notificar 0 sistema de vigilncia em satide sobre a ocorréncia. t ATENGAO sistema nao é apenas para a notificagao de doengas, mas também para agravos a satide, como tentativas de suicidio, violencia domestica e acidente de trabalho. Dentre as doengas listadas, apenas a doenga de Chagas, esquistossomose, toxoplasmose gestacional e congénita, maldria e leishmaniose cutanea e visceral sao causadas por parasitos. Todas as. enteroparasitoses nao sao listadas, portanto nao sdo de notificagao compulséria. Assim, 0 SUS tem, por meio da ESF, o papel central no controle das parasitoses enquanto doengas negligenciadas. A rede de atengao priméria ainda é muito deficiente em alguns estados, principalmente nas regides Nordeste e Norte do pais. A falta de infraestrutura, de profissionais qualificados e de recursos compromete a consolidagao da ESF e pe em xeque politicas de controle de doengas endémicas. MIF Mercurocromo ou mertiolate + iodo + formol. © SAIBA MAIS O diagnéstico de parasitoses intestinais é feito pelo exame parasitolégico de fezes (EPF), a partir da coleta de uma amostra de fezes frescas ou amostras consecutivas coletadas em frascos contendo solugdes conservantes, como o MIF. Para as parasitoses sanguineas, como a malaria e doenga de Chagas, o exame parasitolégico de sangue ¢ 0 recomendado. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. APRENDEMOS QUE EXISTEM DIFERENTES TIPOS DE INTERAGAO ENTRE OS SERES VIVOS, COMO O MUTUALISMO, O COMENSALISMO E O PARASITISMO. ABAIXO CITAMOS ALGUMAS CARACTERISTICAS DESSAS INTERAGOES. ASSINALE A ALTERNATIVA QUE APRESENTA UMA CARACTERISTICA CORRETA DESSA INTERAGAO. ‘A) No comensalismo, ha o convivio miituo e benéfico do parasita e seu hospedeiro. B) O comensalismo é caracterizado pela ndo dependéncia metabdlica do parasita C) O mutualismo ¢ uma associagao de unilateralidade, onde somente 0 hospedeiro beneficiado, D) No parasitismo, o parasito procura apenas abrigo, protegao e locomogao. E) No comensalismo, apenas uma delas é beneficiada, mas sem prejudicar a outra. 2. O SUS TENTA OLHAR O PACIENTE NAO SOMENTE PELO LADO DA DOENGA, MAS ENTENDER QUE AQUELE INDIVIDUO E INSERIDO DENTRO DE UM CONTEXTO SOCIAL. NESSE SENTIDO, QUAL ALTERNATIVA CONTEMPLA UM FATOR ASSOCIADO A OCORRENCIA DE ENTEROPARASITOSES E QUAL DOENGA E DE NOTIFICAGAO COMPULSORIA NO BRASIL? A) Diminuigdo da desigualdade social e giardiase B) Diminuigdo das condigdes de higiene da populagao e enterobiose C) Diminuigdo da desigualdade social e ascaridiase D) Baixo indice de esgotamento sanitario e toxoplasmose E) Diminuigdo das condigdes de higiene da populagao e ascaridiase GABARITO 1. Aprendemos que existem diferentes tipos de interagao entre os seres vivos, como 0 mutualismo, o comensalismo e o parasitismo. Abaixo citamos algumas caracteristicas dessas interagées. Assinale a alternativa que apresenta uma caracteristica correta dessa interagao. Aaltemativa "E " esta correta. A interagao entre espécies em que apenas uma é beneficiada sem prejudicar a outra & conhecida como comensalismo. Podemos citar, como exemplo, a Entamoeba coli no intestino grosso, um parasita comensal que obtém seus nutrientes, sem causar doenga no hospedeiro. 2. 0 SUS tenta olhar o paciente nao somente pelo lado da doenga, mas entender que aquele individuo é inserido dentro de um contexto social. Nesse sentido, qual alternativa contempla um fator associado a ocorréncia de enteroparasitoses e qual doenga é de notificagao compulséria no Brasil? Aalternativa "D “ esta correta. As parasitoses so doengas, na maioria das vezes, relacionadas a questées como falta de higiene no momento da manipulagao dos alimentos, falta de um saneamento basico de qualidade, auséncia de agua potavel e encanada, acometendo assim as areas mais pobres do pais. A toxoplasmose gestacional e congénita é uma doenga de notificagaio compulséria. MODULO 2 © Reconhecer os ciclos parasitarios, os principais tipos de habitat dos parasitos e os processos patolégicos relacionados ao parasitismo CICLOS PARASITARIOS 0 cielo biolégico de um parasito compreende os mecanismos, as etapas e os fenémenos aos quais ele ¢ submetido ao longo de suas fases de vida, passando por um ou mais hospedeiros (nome dado ao organismo que habita o parasita em seu interior). A complexa série de acontecimentos fisicos, quimicos e bioquimicos é ordenada por fatores ambientais e genéticos, dependendo das caracteristicas fisiolégicas e biolégicas de cada grupo de parasito. Imagem: Shutterstock.com Grande parte do conhecimento adquirido sobre os ciclos parasitarios vem de estudos com parasitos que causam doencas de importancia em satide publica e satide animal. O carater negativo ou patogénico do parasitismo é muito baseado na concepgao de doenga e pode levar a interpretagées cientificas prematuras. Isso também gera uma grande lacuna no conhecimento de aspectos do ciclo de intimeros parasitos que nao tém o homem como hospedeiro. ‘A amebiase enquanto doenga é causada pela Entamoeba histolytica ou por variedades semelhantes. Entretanto, existem outras espécies, como a E. coli, E. hartmani, Endolimax nana que nao parecem causar nenhum processo patogénico. Conhecemos muito mais da E. histolytica do que das demais espécies simbiontes do nosso intestino. Como veremos a seguir, © intestino humano é um excelente habitat para diferentes grupos de parasitos, como os nematelmintos, platelmintos e as amebas. at Ce oe Foto: CDC - Centers for disease control and prevention. ® Parasito intestinal Entamoeba histolytica presente nas fezes humanas. DOENGA PARASITARIA E uma doenga infecciosa causada por um protozoario, helminto ou metazoario. 1 ATENGAO E preciso destacar que infecgao parasitaria nado é o mesmo que doenga parasitaria. Sao fendmenos diferentes. A infeccao por um parasito nao leva necessariamente ao aparecimento de sinais e sintomas que caracterizam 0 estado de doenga. A interagao entre o parasito, 0 hospedeiro e o ambiente definem condigdes evolutivas e biolégicas dinamicas que podem passar por momentos de equilibrio e desequilibrio. Ainda nao sao claros os mecanismos, mas em alguns casos o parasitismo intestinal por E. histolytica pode desencadear uma forte ago patogénica, levando ao quadro de amebiase - doenga. Na fase aguda de algumas infecgdes parasitarias, o organismo do hospedeiro consegue tolerar ¢ controlar a carga parasitaria, principalmente a partir de mecanismos imunolégicos e celulares. Deste modo, a infecgao torna-se contida e assintomatica. O retorno dos sintomas clinicos pode ocorrer em casos de estados transitérios ou crénicos de diminuigao da imunidade no hospedeiro, como no caso da AIDS ou em pacientes que tomam altas doses de corticoides. Em seu ciclo de vida, os parasitos podem infectar mais de um hospedeiro, causando ou nao dano ao mesmo. Em geral, quanto mais branda e harménica é a relagao de parasitismo, maior € 0 tempo decorrido de evolugao biolégica. Do ponto de vista evolutivo, nao é interessante para © parasito levar 0 seu hospedeiro a morte. Relagdes de parasitismo que resultam em infecgao grave so, em sua maioria, provocadas por relagées evolutivas mais recentes. Os hospedeiros se dividem em 5 caracteristicas. Veja a diferenga entre eles. Hospedeiro natural O hospedeiro que nao sofre com o parasitismo e garante a multiplicagao e dispersdo do parasito, Hospedeiro terminal Ja os hospedeiros que adoecem com o parasitismo, podendo até mesmo evoluir para a morte, so denominados de hospedeiros anormais. Esses animais também sao conhecidos como hospedeiros terminais, pois interrompem o ciclo de transmissao do parasito. Hospedeiro definitivo E aquele que habita o parasita na sua forma sexuada, como é 0 caso do S. mansoni com o homem. Hospedeiro intermediario E aquele que habita o hospedeiro em sua fase larvaria ou assexuada, relagdo do S. mansoni com o caramujo. Hospedeiro de transporte E aquele que serve de ponte a um novo hospedeiro definitivo, mas o parasito nao sofre desenvolvimento ou reprodugao e permanece vidvel. Esses conceitos sdo importantes para o estudo das doengas transmitidas ao homem por animais. O termo zoonose refere-se exatamente a esse grupo de doengas, como a raiva, a febre maculosa e a toxoplasmose. Alguns animais s4o hospedeiros naturais, contudo, por também manterem uma alta carga parasitéria, acabam atuando como fonte de infecgao para outros animais, incluindo o homem. Os morcegos sao reservatérios de diversos parasitos, como virus, bactérias, fungos e protozoérios (como novas espécies de Leishmania e Trypanosoma), dai o grande interesse em estudé-los para o entendimento da ecologia de algumas doengas infecciosas. Foto: Shutterstock.com. CLASSIFICAGAO DOS PARASITAS Imagem: Shutterstok.com. Os parasitos podem ser clasificados de acordo com diferentes caracteristicas, entre elas a quantidade de hospedeiros que infectam (especificidade parasitaria) em relagao ao tipo de ciclo biolégico. Entenda a diferenga dessas caracteristicas. Eurixenos Ha parasitos que apresentam uma especificidade parasitaria ampla, podendo parasitar diferentes espécies de animais, como 0 Toxoplasma gondii e a Leishmania spp. Estenoxenos Por outro lado, também hd um grupo de especificidade reduzida que admite apenas uma unica espécie de hospedeiro ou espécies préximas. E 0 caso do Ascaris lumbricoides e do Enterobius vermicularis, os quais ttm o homem como hospedeiro definitive. Monoxenos Existem ainda os parasitos que necessitam de apenas um hospedeiro para completar o seu ciclo biolégico, Heteroxenos Por fim, existem os parasitos heteroxenos que necessitam de mais de um hospedeiro para completar o seu ciclo, como a Taenia sollum. ATENCAO Tome cuidado para nao confundir os conceitos, alguns parasitos, apesar de exigirem ou necessitarem de apenas um tinico hospedeiro para completar o seu ciclo, podem também infectar outras espécies, mas ndo concluindo nelas seu ciclo. Veja a seguir a classificagao de acordo com o grau de especificidade parasitaria. Imagem: Helver Dias. Parasito que apresenta especificidade parasitaria ampla, parasitando diferentes hospedeiros. Imagem: Helver Dias. Parasito que apresenta especificidade parasitaria reduzida ou estrita, parasitando uma Unica espécie ou espécies préximas do hospedeiro. Imagem: Helver Dias. Parasito que necessita/exige apenas um hospedeiro para completar o seu ciclo biolégico. Imagem: Helver Dias. Parasito que necessita/exige mais de um hospedeiro para completar 0 seu ciclo biolégico, De acordo com as suas caracteristicas biolégicas alguns parasitos podem pertencer a mais de uma classificagdo. Eles admitem infectar varias espécies, mas necessitam de apenas um hospedeiro para completar o seu ciclo biolégico, Toxoplasma gondii é eurixeno e monoxeno, pois pode parasitar diferentes grupos de animais, mas apenas nos felinos consegue completar seu ciclo. Trypanosoma cruzi é um exemplo de grande adaptabilidade parasitaria, dada a sua capacidade de infectar diferentes hospedeiros. O seu ciclo biolégico é classificado como heteroxeno e eurixeno, tendo a participagao de hospedeiros intermedidrios e definitivos. T. cruzi desenvolve-se no tubo digestivo de triatomineos (pode ser em mais de uma espécie— ex.: géneros Rhodnius e Triatoma) e no sangue e nos tecidos de varias espécies de mamiferos. Em cada um desses hospedeiros, completa uma etapa do seu ciclo biolégico. Portanto, 0 parasitismo em mais de um hospedeiro é requerido para a sua sobrevivéncia. Trypanosoma cruzi Parasita heteroxeno e eurixeno Hospedeiros Hospederos defnivoe A ah ia me, & Imagem: Shutterstock.com, adaptado por Leandro Souteiro Ciclo biolégico do Trypanosoma cruzi. Caso parecido é o da Taenia solium que apresenta um ciclo heteroxeno e estenoxeno, isto 6, necesita de somente um hospedeiro intermedidrio (porcos) e um outro definitivo (homem) para completar seu ciclo, Diferente do T. cruzi, neste exemplo sé é requerida uma unica espécie de hospedeiro para cada etapa do ciclo. Os parasitos intestinais Ascaris lumbricoides e Enterobius vermicularis sao monoxenos, pois necessitam de somente um hospedeiro para completar seu ciclo (os humanos) € estenoxenos, pois sé conseguem parasitar os préprios humanos ou espécies muito proximas. Enteroblus vermicularis Parasito monoxeno eestenoxeno Imagem: Shutterstock.com, adaptado por Leandro Souteiro. © Ciclo biolégico do Enterobius vermicularis. ‘A seguir entenda as classificagées dos parasitos. RASITISMO FACULTATIVO Os parasitos acidentais, também chamados de parasitos facultativos sao aqueles microrganismos que podem eventualmente infectar hospedeiros que nao pertencem ao seu ciclo biolégico, podendo ou nao causar doenga, por exemplo, o adulto de Dipylidium caninum parasitando humanos. A partir de 2010, 0 Centro de Controle e Prevengao de Doengas dos Estados Unidos comegou a identificar casos raros de meningoencefalite relacionados a infecgao acidental por um parasito de vida livre, a ameba Naegleria fowleri. Esse microrganismo é facilmente encontrado habitando fontes termais e a infecgdo ocorre quando banhistas entram na agua, A ameba consegue penetrar pela mucosa nasal ¢ invadir o sistema nervoso central e, por isso, ficou conhecida como "ameba comedora de cérebros” Imagem: Shutterstock.com © Meningoencefalite associada ao parasitismo acidental por Naegleria fowler. PARASITISMO OBRIGATORIO E aquele em que o parasito depende integralmente de sua relagao com 0 hospedeiro, seja para nutrigéo, replicagao ou reprodugao. A maioria dos helmintos mantém seu ciclo de vida dividido em uma fase sapréfita e outra de parasitismo obrigatério. Um exemplo é 0 Ancylostoma duodenal que causa a ancilostomose. Ao atingirem 0 solo, os ovos desse parasita eclodem, liberando pequenas larvas que depois vao adquirir a capacidade de penetrar ativamente a pele do pé de individuos que andam descalgos. Apés a penetragao, as larvas se estabelecem definitivamente no intestino e atingem a maturidade sexual, concluindo o seu ciclo de vida. Nesse caso, as larvas adultas precisam obrigatoriamente do hospedeiro para completar o seu ciclo sexual e eliminar seus ovos nas fezes iniciando um novo ciclo, PARASITISMO PROTELIANO Por outro lado, existem espécies que sdo essencialmente parasitos na fase larvaria i suas vidas. Vocé jé deve ter ouvido falar na mosca do berne ou nas larvas causadoras da mifase, esta ultima comum em animais com feridas abertas. A mosca deposita as larvas jovens na pele lesionada e estas Ultimas se alimentam do tecido necrosado. Esse tipo de parasitismo, obrigatoriamente da fase larvaria, ¢ conhecido como parasitismo proteliano. PARASITISMO ERRATICO Jao parasitismo erratico 6 quando um parasita se encontra fora do habitat natural, como o isolamento de Enterobius vermicularis na cavidade vaginal. ENDOPARASITISMO Parasitam as cavidades naturais ou tecidos. ECTOPARASITISMO Quando se instalam fora do corpo do hospedeiro, como é 0 caso de piolhos, acaro, pulgas ete. Imagem: Shuttertock.com. PRINCIPAIS TIPOS DE HABITAT DOS PARASITOS Os animais vertebrados superiores apresentam uma enorme diversidade estrutural, histolégica, funcional e fisiolégica. As propriedades funcionais do figado so completamente diferentes do intestino, o que também confere aos parasitos que ali residem caracteristicas distintas de adaptabilidade ao meio. sistema digestivo abriga grande parte dos parasitos que costumamos estudar, mas outros 6rgéios podem ser parasitados transitoriamente ou definitivamente, como as glandulas anexas, 0 sistema vascular sanguineo, 0 sistema linfatico e outros tecidos. Vejamos agora as espécies de parasitos que habitam cada parte do sistema digestivo ‘Ao longo da evolugao da espécie humana, é possivel que nossos ancestrais tenham entrado em contato com muitos parasitos por meio da alimentagao. Essa talvez seja a provavel rota de contaminagao e de origem adaptativa da maioria dos parasites intestinais. Aqueles que conseguiram resistir as adversidades do ambiente intestinal, foram se instalando, adaptando e reproduzindo. A relagao parasito-hospedeiro provavelmente levou centenas de anos para encontrar o equilibrio necessério para ambas as espécies coevoluirem harmonicamente. O grau de adaptagao ¢ tanto que para alguns parasitos a especificidade de habitat se dé por segmentos estritos do intestino, como 0 duodeno, 0 {leo ou o reto. Determinadas espécies podem viver nesses ambientes temporariamente ou indefinidamente, levando, inclusive, a quadros de gastroenterite no hospedeiro, Essa preferéncia por ambientes nao € por acaso, cada parasito tem interesse por condigées fisico-quimicas especificas. w EXEMPLO A concentragao de oxigénio é maior na porgao mais superior do sistema digestivo e diminui conforme se aproxima do estmago, entao as espécies que parasitam a cavidade oral so bem adaptadas a exposigao ao oxigénio e demais gases presentes no ar. De forma diferente, 0 intestino delgado ¢ altamente anaerébio, abundante em gas carbénico e metano, estando presentes ali apenas as espécies capazes de sobreviver a essas condigées. Além disso, as. espécies tém que conseguir sobreviver e suportar o pH do trato gastrointestinal e obter seus nutrientes. No esquema a seguir, vemos a enorme diversidade de protozoarios e helmintos que encontraram no trato digestivo um ambiente étimo para a sua sobrevivéncia. 1-Cavidade eal 3 - Babine Bibliinigetaigiagiifsiegéion) Biatiiaiitaigtentionstessp Sto) edlbbdsiegicsionennssritoS Enpisteteritiona ‘etcions abctéleritroci) Botattiaiamedianus Brteriblusibeimitiadtaris Habngisaitihiteacoralis Isospora belli 3-Duodeno —_ 4-Célon ascendente — 5- Intestino defado 6 - Célon descendente 7-- Reto © 0s diferentes parasitas no sistema digestivo. Vejamos as espécies de parasitas que habita em cada parte do sistema digestivo. CAVIDADE BUCAL Encontramos duas espécies principais de protozodrios: Entamoeba gengivalis e Trichomonas tenax. A primeira é uma ameba nao patogénica de distribuigéo cosmopolita e que pode ser transmitida pelo beijo. Ja T. tenax também apresenta ampla distribuigao e estd associada a infecgdes periodontais em individuos com precaria higiene bucal. ESOFAGO E ESTOMAGO Nenhuma espécie de parasita permanentemente é encontrada, principalmente em virtude do baixo pH e das condigées hostis a sua sobrevivéncia. No estémago, o pH pode chegar a 1,5, condigao ndo tolerada pela maioria das larvas e vermes adultos. No entanto, devido a protegao conferida pela resistente casca ou cuticula, os ovos de parasitos conseguem resistir a0 ambiente Acido. INTESTINO DELGADO - DUODENO Posterior ao estémago, é 0 primeiro segmento do intestino delgado e serve de importante sitio de desencistamento de protozoarios e eclosao de ovos de helmintos. Dois importantes fluidos digestivos so langados no duodeno, a bile e 0 suco pancredtico 0 que torna o meio mais basico. Além disso, as enzimas presentes em ambos podem modificar a permeabilidade da membrana dos cistos e ovos e estimular a movimentagao das larvas. Nesse ambiente 6 que sao encontrados Ancilostoma duodenale, Giardia dudenalis e Necator americanus. Saiba mais: No intestino, o valor de pH varia em cada segmento. Por exemplo, o pH no duodeno esta atrelado a abertura do piloro — esfincter localizado na porgao final do estémago — que permite a passagem do suco gastrico e deixa o meio mais acide em relagdo a porgées mais terminais do intestino. INTESTINO DELGADO - JEJUNO E iLEO Nos dois segmentos consecutivos do intestino delgado, 0 jejuno € 0 ileo, encontram-se Giardia duodenalis, Taenia solium, Taenia saginata, Necator americanus, Ascaris lumbricoides, Strongyloides stercoralis, entre outros. A intensa atividade mecnica provocada pelos movimentos peristalticos pode dificultar a fixagao inicial de alguns helmintos. INTESTINO GROSSO Na porgao descendente do intestino grosso, ha intensa absorgao de agua e eletrdlitos pela mucosa, 0 que diminui significativamente a concentragao osmética. Ademais, outras condigdes ambientais também sao encontradas, o peristaltismo é reduzido e a mucosa apresenta pregas, muco e células especializadas na reabsorgao. Ao longo dos segmentos, é possivel encontrar helmintos e protozoérios fixados na mucosa. Os ancilostomideos sugam sangue dos pequenos vasos ¢ as gidrdias ficam aderidas 4 mucosa por meio do disco suctorial. As amebas e alguns protistas ciliados tendem a invadir a mucosa e submucosa, provocando sangramentos e inflamagao local. Por fim, em sua porgao mais terminal, o intestino grosso pode abrigar no sigmoide e no reto espécies como Entamoeba histolytica, Schistosoma mansoni, Schistosoma japonicum, além de ovos e cistos que serao eliminados nas fezes. Figado e vias biliares figado é considerado a maior gléndula do corpo humano e desempenha fungées vitais para a homeostase. Pode-se destacar a secregao de bile — importante fungao digestiva, a degradagao © excregao de horménios, regulagao do metabolismo de carboidratos, proteinas e lipidios, e metabolizagao de drogas e bilirrubina. Por ser um ambiente altamente vascularizado e rico em nutrientes, 0 figado é frequentemente parasitado por algumas espécies, como: As formas esporozotticas do género Plasmodium spp. infectam as células do figado (hepatécitos), dando inicio ao ciclo pré-eritrocitico. O P. ovale eo P. vivax podem apresentar formas dormentes, chamadas de hipnozoitos, que podem ficar latentes por meses ou até anos no érgao. Ao completar a fase tecidual, os esquizontes provocam intensa lise dos hepatécitos, liberando milhares de parasitos na corrente sanguinea que irdo invadir as hemdcias e iniciar 0 ciclo eritrocitico. Imagem: Shutterstock.com BILIAR Interrupgao ou diminuigao do fluxo de bile da vesicula biliar para a luz intestinal. ICTERICIA Coloragao amarelada da pele e/ou olhos causados por um aumento na concentragao de bilirrubina na corrente sanguinea. Outro exemplo é a forma larval do cestoide Echinococcus granulosus responsdvel pela hidatidose cistica. Imagem: Shutterstock.com. | Cisto hidatico de Echinococcus granulosus no figado. O ciclo biolégico é mantido entre ces (hospedeiro definitive), suinos, ovinos, caprinos & bovinos (hospedeiros intermedidrios), mas o homem pode ser acidentalmente contaminado pela ingestao de ovos do parasito. A grande maioria dos casos é assintomdtico, mas alguns individuos podem apresentar sintomas e complicagées decorrentes. Em humanos, as localizagdes mais frequentes dos cistos sao figado e pulmées, além de cérebro, musculos e rins. O acometimento hepatico dependeré de alguns fatores, como tamanho e niimero de cistos, e da localizacao dentro do érgao. Cistos grandes e profundos podem levar a obstrugao porta, estase biliar e ictericia Ascaris Lumbricoides geralmente habita a luz intestinal, mas as larvas podem ser encontradas em locais atipicos, como as vias biliares e pancredticas. A invasdo desses locais pode provocar quadros graves e agudos de colangite, abcesso hepatico, pancreatite e apendicite. © SAIBA MAIS Dezenas de outros parasitos podem habitar o figado, como Fasciola hepatica, Clonorchis sinensis, Opisthorchis viverrini, Schistossoma mansoni e Leishmanis donovani Sistema fagocitico mononuclear As células do Sistema Fagocitico Mononuclear (SFM) tém origem nas células hematopoiéticas mieloides e apresentam caracteristicas em comum, tais como presenga de enzimas no citoplasma e forte capacidade de realizar fagocitose. Séo os componentes da imunidade inata responsaveis pela primeira linha de defesa do organismo. O SFM compreende promonécitos, monécitos, histiécitos e macréfagos residentes dos tecidos. © SAIBA MAIS Fagocitose ¢ 0 proceso pelo qual uma célula usa sua membrana plasmatica para englobar particulas grandes, dando origem a um compartimento interno chamado fagossoma. No sistema imunolégico de organismos multicelulares, a fagocitose & um dos principais mecanismos usados para remover patégenos e restos celulares. Imagem: Shutterstock.com @ Fagocitose. CELULAS FAGOCITICAS As células fagociticas profissionais incluem os neutréfilos, monécitos, macréfagos e células dendriticas. A intemalizagao de alguns parasitos ocorre através da fagocitose mediada por células do SFM. © habitat das formas amastigotas de Leishmania spp. no homem sao as células do SFM, principalmente os macréfagos. Alguns parasitos conseguem modular e resistir as defesas do organismo, escapando eficientemente do sistema imune. Nesse caso, as células fagociticas profissionais conseguem fagocitar os parasitos, mas no conseguem destrui-los nos fagolisossomos. Mecanismo similar de interagao do parasito com as células fagociticas ocorre na infecgao por Trypanosoma cruzi e Toxoplasma gondii Sangue e linfa Os protozoarios parasitos podem viver livres no plasma, como o Trypanosoma cruzi ou instalados no interior das hemacias como o Plasmodium spp. Entre os helmintos de habitat sanguineo estao o Schistosoma mansoni e as microfilarias de varios filarideos. wat O : Sage Se a) 8 1% 82 Coew % % be - : ) @a & oo - a. Foto: Shutterstock,com. Os parasitos da malaria durante a fase em que evoluem no interior dos eritrécitos, digerem a hemoglobina, assimilando os aminodcidos da frago globina e deixando um residuo insoltivel de hemossiderina, rico em ferro, que se conhece também como pigmento malarico. A linfa é 0 habitat de filarias, como a Wuchereria bancrofti PARASITISMO E PROCESSOS PATOLOGICOS As miltiplas interagées entre parasitos e hospedeiros, baseadas nas relacées ecolégicas e metablicas, podem resultar no desenvolvimento de mecanismos nocivos para um ou para ambos os organismos. Assim, para entender um pouco mais sobre os processos patolégicos desenvolvidos pelos parasitas, estudaremos alguns mecanismos de agressao e leséo provocadas pelos parasitas Normaimente, essas desordens sao provocadas pela ago direta do parasito, como o processo de invasao tecidual, ou por ago protetiva do sistema imune do hospedeiro, como as respostas inflamatérias agudas e granulomatosa que podem ser desencadeadas durante as infecgdes parasitarias. Patogenicidade x viruléncia Denomina-se de patogénicos os parasitos capazes de estimular ou causar dano (doenga) no hospedeiro, Esse prejuizo pode ser local ou sistémico, levando a disfungées fisiolégicas importantes para o hospedeiro. A patogenicidade nao é sempre presente, sendo determinada por fatores como carga parasitaria, estado imune do hospedeiro e sitio anatémico de parasitismo. Convencionalmente, chama-se de nao patogénicos os parasitos que nao causam doengas. © conceito de viruléncia relaciona-se com o grau de dano que o parasito pode provocar em determinado hospedeiro, Parasitos muito virulentos provocam doengas graves, geralmente com alta mortalidade, Acredita-se que a alta viruléncia seja um estagio primitivo do parasitismo, sem 0 tempo evolutivo decorrido para a adaptagao de ambos. A viruléncia pode variar em fungdo das condigées ambientais do hospedeiro, como imunidade e estado nutricional, de caracteristicas genéticas e fenotipicas do parasito, como tipo de linhagem e cepa, e da capacidade invasiva. FOMITES Objeto inanimado capaz de absorver, reter e transportar um organismo contaminante de um individuo para o outro. MECANISMOS PARASITARIOS DE INVASAO DO HOSPEDEIRO Cada parasito possui um mecanismo préprio de invasdo ou penetragao do hospedeiro, mas podemos dividi-los em ativos ou passivos. Os ovos ¢ cistos, tais como de Ascaris lumbricoides, Taenia solium e Tania saginata, entram no organismo a partir da ingestao de gua ou alimentos contaminados, portanto, passivamente. Também penetram de modo passivo os parasitos inoculados por intermédio de insetos vetores hematéfagos, como Leishmania spp., Trypanosoma sp. e Plasmodium spp. A transmissao passiva também pode ocorrer de forma congénita (transplacentaria) ou transmaméria, ou ainda por transfuséo de sangue. Além disso, um individuo parasitado pode alurar como o seu préprio veiculo de contaminagdo, de forma direta, quando ele mesmo leva as mos ao anus e depois a boca (principalmente criangas e idosos), ou indireta, quando os ovos presentes na poeira, fémites ou alimentos atingem o mesmo hospedeiro que os eliminou A penetragao ativa é aquela observada na infeccdo por esquistossomos, estrongiloides e ancilostomideos. As cercarias de Schistosoma mansoni langam mao de mecanismos mecénicos ¢ liticos (como secregao de enzimas proteoliticas), para penetrar na pele e ganhar a corrente sanguinea, No caso da esquistossomose, apés concluidas as primeiras horas da penetracdo das cercérias, 6 possivel observar a presenga de forte infiltrado inflamatério, composto principalmente por células mononucleares e polimorfonucleares. ‘A manifestagao cutanea associada é chamada de dermatite cercariana e apresenta erupgdes pruriginosas: Foto: Comellier / Wikimedia commons / CC BY SA 3.0 Unported. © Dermatite provocada pela penetragao de cercdrias de Schistosoma mansoni na pele. €t ATENGAO E importante ressaltar que, para entrar no organismo, os parasitas tem que ser capazes de passar por todos os mecanismos de defesa inicial do organismo, como as barreias epiteliais {epiderme), presenga da microbiota, de substancias microbicidas etc. Os danos gerados podem ser diretos, ou seja, pela presenca dos parasitas ou por substancias secretadas por eles, ou indiretos, quando acarretados pela a reacdo no hospedeiro. Podem ainda causar uma série de prejuizos, tendo diferentes agdes, como: Obstrutivas Compressivas Destrutivas Toxicas Pungitiva (causa dor) Alergizante Espoliativas (ocorre perda de substancias nutritivas pelo hospedeiro, caso que ocorre na teniase, por exemplo) Enzimaticas (liberagdo de secregées enzimaticas que geram uma destruigao tecidual, caso comum nas infecgées por e. Hystolitica) Todos esses mecanismos levam a uma inflamagao, que constitui o principal mecanismo de lesdo tecidual observado nas doengas parasitarias. Inicialmente, a inflamagao tem papel importante para o controle da disseminagao do parasito, mas seus efeitos adversos podem representar disfungées locais e sistémicas para o organismo. Podemos definir inflamagao como a reagdo fisiolégica protetora do tecide conjuntivo de algum mecanismo de lesdo ou agressao. Observa-se nos animais vertebrados, complexos mecanismos inflamatérios, com reagdes em cascata com a participagao de diferentes moléculas e tipos celulares. Entretanto, a inflamagao. também ocorre em organismos invertebrados e avasculares, com mecanismos mais simples de migragao de células e fagocitose. ARTERIOLAS Pequenos vasos sanguineos resultantes das ramificagées das artérias. FIBRINOGENESE Produgo e formagao de fibrina que vai originar o tecido de cicatrizagao ‘Agora veremos resumidamente as etapas da resposta inflamatéria contra parasitos e suas consequéncias locais e sistémicas. Vamos la? ETAPA 1 ETAPA 2 ETAPA 3 ETAPA 4 ETAPA 5 ETAPA 6 ETAPA 7 ETAPA 1 Apés a entrada dos parasitas, como no caso das cercarias de S. mansoni através da pele, ocorre a liberagao de histamina e moléculas vasodilatadoras, que levam ao aumento do calibre das arteriolas e do fluxo de sangue local. Consequentemente, hd uma diminuigao da presséo intravascular e o aumento da permeabilidade endotelial, resultando no extravasamento plasmatico e no actimulo de liquido no tecido (exsudato inflamatorio). A partir desse momento, ocorre a liberagao de mediadores que tém por fungao a atragao e migragao de células fagociticas do sangue por quimiotaxia ao tecido. ETAPA 2 As células endoteliais comegam a expressar receptores de membranas que servirdo de Ancora para os leucécitos durante o processo de migragdo dos vasos sanguineos para o tecido parasitado. Os macréfagos residentes e células dendriticas atuam fagocitando e apresentando antigenos para os linfécitos, liberando citocinas que atrairao outros tipos celulares Nas infecges por protozodrios, os macréfagos assumem papel importante pela alta capacidade fagocitica, mesmo que alguns parasitos consigam fugir dos mecanismos de defesa. ETAPA 3 Apés a fagocitose, os macréfagos liberam a interleucina 12 (IL-12) que permite a ativagao e migragao de células natural killer (NK) que possuem forte ago citotéxica, induzindo a apoptose das células infectadas. Na infecgao por helmintos, a presenga de eosinéfilos ¢ acentuada, sendo marca importante das lesdes imunopatolégicas. ETAPA 4 Os antigenos parasitarios estimulam a produgao de IL-4 e IL-5, que induzem a sintese de imunoglobulinas da classe IgE e forte ativagao de eosinéfilos. A eosinofilia é detectada em iduos com quadros de parasitoses agudos e crénicos, tendo por fungao 0 controle da infecgdo pela liberacdo de espécies reativas de oxigénio e liberagao de seus granulos citoplasmaticos — processo conhecido como degranulagao. E frequente encontrarmos infiltrado eosinofilico ao redor de ovos e larvas nos tecidos e no plasma de individuos infectados. A secregdo de IL-4 e IL-13 estimula a produgdo de muco na mucosa do intestino grosso ¢ 0 aumento do peristaltismo na tentativa de expulsar os parasitos da luz intestinal ETAPA 5 A inflamagao aguda é limitada e deve resolver-se dentro de um curto periodo, porém, podem evoluir para um quadro crénico com eventos longos que podem persistir por toda a vida do hospedeiro. Na inflamagdo crénica, misturam-se mecanismos vasculares, de reparo (fibrose) e formagao de exsudato. O exsudato da inflamagao aguda é composto principalmente por fagécitos e liquido extravasado Janna inflamagao crénica, predomina o infiltrado mononuclear (linfécitos, plasmécitos macréfagos). A inflamagdo crénica granulomatosa é um importante mecanismo imunopatogénico presente nas infecges por alguns protozoarios e helmintos, com destaque para a esquistossomose, ETAPA 6 A deposigao dos ovos maduros do S. mansoni no parénquima hepatico desencadeia um proceso inflamatério importante e organizado. A reagdo inflamatéria granulomatosa é considerada uma reagdo de hipersensibilidade tardia mediada principalmente por linfécitos TCD4, As células TCD4 podem ser divididas em duas populagées (Th1 e Th2), de acordo com © tipo de citocinas e respostas que desencadearam. ETAPA 7 s linfécitos do subgrupo Th1 secretam as citocinas (IL-2 e fator de necrose tumoral e interferon) que induzem a ativagao da resposta inflamatéria e a formagao e deposicao de coldgeno no local da lesdo, contribuindo para a formagao da fibrose, caracteristica nos granulomas. Ja 0s linfécitos do subgrupo Th2 secretam IL-4, IL-5, IL-10 e IL-13 que medeia a produgao de anticorpos IgE e aumenta a proliferagao dos eosinéfilos. O equilibrio entre a resposta do tipo Th1 e Th2 determina a evolucdo da lesdo tecidual. Pesquisas ja demonstraram que na esquistossomose, a IL-13 estimula os fibroblastos hepaticos a sintetizarem proteinas da matriz extracelular, aumentando a fibrinogénese ea disfungao hepatica. A fibrose, também chamada de cicatrizagao patolégica, é caracterizada pela abundante geragao de tecido conjuntivo cicatricial, em detrimento da regeneragao do tecido parenquimatoso — no caso da esquistossomose, o hepatico. Em estado de homeostase, a destruigao das células do parénquima é seguida da regeneragao celular que resulta na volta integral das fungdes daquele érgao. Entretanto, dependendo da extensdo da lesdo e dos estimulos (antigenos ¢ liberacdo de citocinas), a formagao do tecido cicatricial pode ser muito intensa e difusa, resultando em alteragées organicas do érgao. A biépsia de uma lesdo granulomatosa na esquistossomose, observada no microscépio éptico, revela arcos concéntricos de tipos celulares diferentes ao redor do ovo do parasito. Confuso? Calma vamos entender melhor! Mais préximos aos ovos podem ser observados eosinéfilos, seguidos de macréfagos & fibroblastos produtores de colageno. Marginalmente estao localizados os linfécitos B— produtores de anticorpos — ¢ os linfécitos TCD4. Hepatécito Fibroblasto Eosinéfilo Macréfago Linfécito 8 Linfécito T Ovo de Schistosoma &eeoeexs Colageno Imagem: feito no BioRender pelo Helver Dias. (@ Esquema de inflamagdo crénica granulomatosa induzida por ovos de S. mansoni A quantidade e intensidade dos granulomas no parénquima hepatico determinam a gravidade e © comprometimento do figado. Casos avangados podem resultar em graves disfungdes hepaticas irreversiveis, como cirrose e consequente hipertensdo portal. Vamos agora pensar em outra doenga parasitaria: a doenga de Chagas. Foto: Shutterstock.com. Essa doenga pode seguir dois cursos clinicos possiveis: aguda e crénica. A fase aguda geralmente ¢ assintomatica e pode durar de 4 a 8 semanas, Cerca de 60 a 70% dos individuos infectados evoluem para um quadro benigno, sem manifestagées clinicas. No entanto, em alguns casos, eles podem evoluir para a forma crénica, com manifestagdes digestivas ou cardiacas que aparecem depois de alguns anos ou décadas. Para os individuos crénicos, a cardiomiopatia é a manifestagao mais incidente, seguido do megaes6fago ou megacélon. © megacélon é caracterizado pela destruigdo dos plexos nervosos da musculatura entérica, aumento do tamanho e do numero de células 0 que leva a perda ou diminuigao do peristaltismo, desregulagao dos esfincteres e constipagao. CARDIOMIOCITOS Células da musculatura do coragao, também sao conhecidas como fibras musculares cardiacas. QUIMIOCINAS Moléculas parecidas com as citocinas que t8m a fungdo de controlar a migragao e a permanéncia de células imunes em locais determinados. Os mecanismos imunopatogénicos da cardiomiopatia chagasica so complexos e tém relagdo com a resposta inflamatéria. Ainda durante a fase aguda, os cardiomiécitos sao infectados pela forma amastigota do parasito, o que induz a formagao de forte infiltrado inflamatério, Além disso, a apoptose das células infectadas gera mais estimulos de migragao celular para 0 tecido cardiaco. As citocinas e quimiocinas liberadas recrutam primeiramente macréfagos € neutréfilos e, em seguida, linfécitos T e B. infittrado inflamatério, dependendo de sua extensdo, pode gerar disfungées como a hipertrofia dos cardiomiécitos (aumento do volume ou tamanho celular), que caracteriza 0 coragao chagasico, também chamado de “coragao grande” Imagem: Patrick J. Lynch, 2006 / Wikimedia commons / CC BY 2.5. @ Corte transversal de um coragao chagésico, evidenciando a hipertrofia do ventriculo esquerdo Em estagios mais avangados, denominados clinicamente de cardiomiopatia chagasica crénica, além do infiltrado inflamatério, ha aparente destruigao de fibras miocardicas com redugao da quantidade de parasitos e deposigao de coldgeno. A formagao da fibrose tecidual pode levar ao. comprometimento contratil do musculo e disfungées sistdlicas e/ou ventriculares. DIARREIA E PARASITOS: QUAL A RELAGAO? Assista ao video em que 0 especialista Helver Dias falara sobre os principais parasitos causadores de diarreia e as modificagées fisioldgicas que desencadeiam esse quadro. Para assistir a um video D, sobre o assunto, acesse a ° vers&o online deste conteudo —o— VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. OS PARASITOS APRESENTAM DIFERENTES ESTRATEGIAS PARA PENETRAR NO HOSPEDEIRO, ALGUNS POSSUEM MECANISMOS. ATIVOS, OUTROS PASSIVOS. ACERCA DESSE ASSUNTO, ANALISE AS. AFIRMATIVAS A SEGUIR: |. ASCARIS LUMBRICOIDES E TAENIA SAGINATA PENETRAM NO ORGANISMO ATIVAMENTE. Il. PARASITOS DOS GENEROS LEISHMANIA, TRYPANOSOMA E PLASMODIUM PENETRAM NO ORGANISMO PASSIVAMENTE. Ill. AS CERCARIAS DE SCHISTOSOMA MANSONI PENETRAM NA PELE ATIVAMENTE. ESTA CORRETO O QUE SE AFIRMA EM: A)! B) Il yi D)lell E)llelll 2. OS ANIMAIS PODEM ASSUMIR DIFERENTES PAPEIS NO CICLO DE VIDA DOS PARASITOS. ALGUNS HOSPEDEIROS, APESAR DE PARASITADOS, NAO SOFREM NENHUM DANO OU PREJUIZO, OUTROS, ENTRETANTO, PODEM MANIFESTAR SINTOMAS LEVES E GRAVES. ACERCA DESSE ASSUNTO, ASSINALE A ALTERNATIVA QUE TRAZ A CORRETA RELAGAO DOS HOSPEDEIROS NOS CICLOS DOS PARASITAS. A) Hospedeiro natural nao sofre com o parasitismo e garante a multiplicagao e dispersdo do parasito, B) Hospedeiro natural sofre profundamente com o parasitismo, resultando na morte dele antes do parasito completar o seu ciclo. C) Hospedeiro anormal é aquele que no sofre com o parasitismo e garante a multiplicagao e disperso do parasito. D) Hospedeiros naturais so aqueles em que a relacao parasito-hospedeiro tem, do ponto de vista evolutivo, pouco tempo decorrido. E) Zoonoses so doengas que o homem transmite para os animais. GABARITO 1. Os parasitos apresentam diferentes estratégias para penetrar no hospedeiro, alguns possuem mecanismos ativos, outros passivos. Acerca desse assunto, analise as afirmativas a seguir: |. Ascaris lumbricoides e Taenia saginata penetram no organismo ativamente. Il, Parasitos dos géneros Leishmania, Trypanosoma e Plasmodium penetram no organismo passivamente. Il. As cercarias de Schistosoma mansoni penetram na pele ativamente. Esta correto o que se afirma em: Aalternativa "E " esta correta. Os parasitas que penetram passivamente séo aqueles inoculados por um vetor, como ocorre com os géneros Leishmania, Trypanosoma e Plasmodium, ou pela ingestao de agua e alimentos contaminados, como ocorre com o Ascaris lumbricoides e Taenia saginata. A penetracdo ativa é quando o parasita penetra por mecanismos que rompem a barreira epitelial do organismo, como as cercérias do S. mansoni 2. Os animais podem assumir diferentes papéis no ciclo de vida dos parasitos. Alguns hospedeiros, apesar de parasitados, nao sofrem nenhum dano ou prejuizo, outros, entretanto, podem manifestar sintomas leves e graves. Acerca desse assunto, assinale a alternativa que traz a correta relagao dos hospedeiros nos ciclos dos parasitas. Aalternativa "A" esta correta. Os hospedeiros naturais so aqueles que nao sofrem com o parasitismo, mas sao essenciais, para a dispersao e multiplicagao dos organismos. Os que sofrem com o parasitismo podendo levar a morte so chamados de hospedeiros anormais. Do ponto de vista ecolégico, relages com menor tempo decorrido sao fatais ao hospedeiro. Zoonose é o nome dado as doengas que so transmitidas pelos animais aos homens, como a raiva. CONCLUSAO CONSIDERAGOES FINAIS Ao longo desse tema, aprendemos os conceitos gerais do parasitismo, visitando os principais parasitas, os tipos de habitat, os ciclos parasitarios e os processos patolégicos associados ao parasitismo em humanos, que levam ao desenvolvimento de doengas e agdes preventivas adotadas pelo SUS. Com posse desses conceitos, conseguiremos avangar na Parasitologia, entendendo a partir daqui, de forma isolada, cada grupo de parasita, suas doengas, manifestagées clinicas e, principalmente, que medidas tomar para evitar as parasitoses. Assim, como futuros profissionais da area de Satide, ofereceremos & populagao uma assisténcia adequada, seja no tratamento e acompanhamento dos pacientes seja com orientagées sobre as agées educativas e preventivas, Bem-vindo a Parasitologia! Para ouvir um podcast sobre o assunto, acesse a versao online deste conteudo. REFERENCIAS ANTUNES, R-F ef al. Parasitoses intestinais: prevaléncia e aspectos epidemiolégicos em moradores de rua. In: RBAC, 2020. Consultado em meio eletrénico em: 19 fev. 2021 NEVES, D.P. Parasitologia Humana. 11. ed. Sao Paulo: Atheneu, 2005. REY, L. Bases da Parasitologia Médica. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011 REY, L. Parasitologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. SECRETARIA DE VIGILANCIA EM SAUDE. Ministério da Satide. Brasil. Guia de Vigilancia Epidemiolégica. Brasilia (DF), 2009. EXPLORE+ Para aprofundar os conhecimentos sobre 0 tema: LEIA O livro O tapete de Penélope, do escritor Walter Boeger, que mostra como as associagées podem influenciar intensamente a evolugao das espécies que habitam o planeta. Sobre os fundamentos do sistema imunolégico, no artigo “Sistema Imunitario — Parte | Fundamentos da imunidade” inata com énfase nos mecanismos moleculares e celulares da resposta inflamatoria, ASSISTA ‘Ao video “O SUS do Brasil”, do canal Fiocruz, que levanta discussdes sobre a conquista de direitos na sauide, no contexto de redemocratizacao do Brasil, além de ressaltar a atuago do sanitarista Sergio Arouca. Ao video “Doengas negligenciadas”, do canal Fiocruz, revisita alguns contetidos importantes sobre as doengas negligenciadas. ‘Ao video “Amebas de Vida Livre: Naegleria fowleri, Acanthamoeba e Balamuthia mandrillaris’ e aprenda mais sobre as amebas de vida livre e sobre as doengas causadas por elas, PESQUISE Sobre a ecologia da doenga de Chagas, no site da Fiocruz. Sobre os testes parasitolégicos, visite Norma Brasileira: “Iaboratérios clinicos - Exame parasitolégico de fezes” e “Técnicas basicas: Exame parasitolégico de fezes". CONTEUDISTA Helver Gongaives Dias @& CURRICULO LATTES

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