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Graduação em Letras
Belo Horizonte
2022
O objetivo dessa presente resenha se baseia em analisar determinados aspectos do nono capítulo do
livro “Marxismo e Filosofia da Linguagem” de Bakhtin (2006): “O Discurso de Outrem”. Este
trabalho também tentará analisar alguns questionamentos como por exemplo: Como se dá a
presença do discurso alheio no texto e como podemos perceber, discursivamente, essa presença.
É importante também ressaltar que introdutoriamente, aparecerá alguns conceitos de Eni Orlandi
trazidos em seu artigo “Texto e discurso” (2012) pois acredita-se ser necessário para
compreendermos alguns conceitos trazidos por Bakhtin (2006).
Para começarmos, é preciso pautar algumas noções que estaremos em contato durante o texto.
Noções essas que nos orientam em quais abordagens estarão sendo aliadas. Sendo assim,
precisamos entender que durante essa resenha, “enunciação” e “discurso” estarão sendo abordados
sem nenhuma distinção, como acontece em outras áreas da língua. É preciso estar ciente também
que a palavra “sintaxe” estará vinculada com o sentido de “teia” e/ou “rede” de discursos, aliás,
essas redes de discursos estão intrinsecamente ligadas ao conceito de formações discursivas.
Sendo assim, entende-se por formações discursivas, como o nome já explica, uma rede constituída
por outros discursos, não necessariamente agrupados de forma coesa e coerente, visto que em cada
ponte discursiva encontra-se vários outros que interligam de um mesmo ponto, mesmo que se
encontram em caminhos distintos. (ORLANDI, 2012).
Voltando-se agora, para Bakhtin (2006), já no início do capítulo, nos deparamos com uma definição
de discurso citado. O autor nos apresenta essa definição como “o discurso no discurso, a
enunciação na enunciação, mas é, ao mesmo tempo, um discurso sobre o discurso, uma enunciação
sobre a enunciação.” (BAKHTIN, 2006, p. 147). Ou seja. É nos mostrado que o discurso citado
nada mais é do que uma enunciação (de outro) dentro de outra enunciação de um indivíduo que
enuncia. Ou melhor, podemos dizer que é um diálogo daquele que está citando com aquele que foi
citado.
Além disso, esse discurso alheio é mais do que o tema do discurso, ele pode entrar no discurso e na
sua construção sintática como uma unidade integrada à construção. Dessa forma, o discurso citado
consegue conservar sua autonomia estrutural e semântica, não alterando a trama linguística que o
integrou. Com isso, podemos afirmar que é possível citar o discurso de outra pessoa preservando a
sua estrutura e significação (mas não preservando o tema, visto que não é possível resgatá-lo pois
considera fatores extralinguísticos no contexto em que ele foi produzido) (BAKHTIN, 2006).
É possível, com essa introdução apresentada no capítulo nove, trazer essa discussão em nosso
contexto acadêmico para exemplificar esses conceitos. Como acontece em trabalhos como esse em
que está sendo trabalhado neste momento, redigido por nós, estudantes. Ao escrevermos tais
conteúdos, entramos despercebidos em determinadas redes teóricas de outros autores. Pelos textos
já serem bastante alicerçados em outros diversos discursos. E a entrada ocorre seja por citações
diretas quando conservamos as estruturas originais de nossos referenciais teóricos, ou por citações
indiretas, quando conseguimos assimilar tais enunciações e reproduzimos o mesmo discurso mas
em outras camadas linguísticas.
Seguindo essa linha de raciocínio, quando nos deparamos com o discurso alheio, esse discurso
torna-se independente, como se ele fosse autônomo. Consequentemente, a partir dessa autonomia o
discurso é transportado para o contexto narrativo de produção do discurso de outro indivíduo.
Portanto, manifesta-se assim, nas formas de transmissão de discurso alheio, uma relação ativa de
uma enunciação à outra, estando isso fora do plano temático, mas através de construções estáveis na
própria língua (BAKHTIN, 2006).
Outro ponto que devemos abordar aqui é em relação às diferenças essenciais entre a recepção ativa
da enunciação de outrem e a sua transmissão no interior de um contexto. Quando nos deparamos
com um texto de um sujeito conseguimos compreendê-lo, teremos assim uma recepção ativa, ou
seja, teremos uma compreensão responsiva do que o outro está dizendo. E a diferença desse nosso
diálogo com o texto, ou melhor, desse diálogo com a enunciação do sujeito acontece em relação à
transmissão que fazemos do texto com o qual tivemos contato (BAKHTIN, 2006).
Sendo assim, podemos analisar tal diferença utilizando três posições: o citante (eu); o citado (ele) e
o ouvinte, ou leitor (tu). É fundamental, inclusive, considerarmos essa última para a apreensão de
todo o discurso. Com base nisso, Bakhtin (2006) nos leva a pensar que a compreensão deste
discurso que é citado e está presente em outro discurso deverá levar em consideração que “aquele
que apreende a enunciação de outrem não é um ser mudo, privado da palavra, mas ao contrário, um
ser cheio de palavras interiores.” (BAKHTIN, 2006, p. 151).
Com isso, ao nos encontrarmos frente à um discurso, conseguimos proporcionar uma réplica
interior (no quadro do discurso interno, isto é, como interpretamos, compreendemos e agimos no
mundo discursivamente). Sendo assim, efetua-se a apreensão da enunciação alheia (ou
compreensão, apreciação etc.), que se apresenta como resultado dessa interação com o texto
(discurso) do sujeito com o discurso citado (BAKHTIN, 2006).
Criando-se assim uma interação dinâmica que ocorre diante dessas dimensões: o discurso que vai
ser transmitido e o discurso que serve para transmiti-lo. Ou seja, é transmitido um discurso alheio
dentro de uma narrativa enunciativa, onde o discurso citado e o contexto de transmissão são
somente os termos de uma inter-relação dinâmica, que por sua vez reflete a dinâmica da inter-
relação social dos indivíduos na comunicação ideológica verbal (BAKHTIN, 2006).
Em relação a essas discussões, podemos afirmar que quando nos deparamos com o discurso de
outro a tendencia fundamental dessa reação ativa pode visar a conservação da sua integridade e sua
autenticidade. Então pode-se ter um esforço para delimitar o discurso citado com fronteiras nítidas e
estáveis. Ou seja, fazer com que esse discurso citado não perca a sua significação após o contato
com a narrativa enunciativa. Por exemplo, quando citamos um texto, buscamos preservar a sua
integridade significativa (BAKHTIN, 2005).
Sendo assim, os esquemas linguísticos e suas variantes têm a função de isolar mais clara e mais
estreitamente o discurso citado, de protegê-lo de infiltrações pelas entoações próprias do sujeito,
simplificando e consolidando suas características linguísticas individuais (BAKHTIN, 2006).
Bakhtin nos mostra então que esse caso não possui um grau autoritário, visto que “quanto mais
dogmática for a palavra, menos apreensão apreciativa admirá a passagem do verdadeiro ao falso, do
bem ao mal, e mais impessoais serão as formas de transmissão de outrem.” (BAKHTIN, 2006, p.
153). Em contra partida, ele nos apresenta que “O narrador pode deliberadamente apagar as
fronteiras do discurso citado, a fim de colori-lo com as suas entoações, o seu humor, a sua ironia, o
seu ódio, com o seu encantamento ou o seu desprezo.” (BAKHTIN, 2006 p. 154). E com isso, ele
ainda nos confirma dizendo que:
Sendo assim, podemos concluir que é possível ter fronteiras mais fluídas entre o discurso citado e a
própria enunciação que vai citar esse discurso e esse discurso pode se confundir com a própria
variante, tendo assim, variantes do discurso direto e indireto.
E essa fluidez, ocorrerá de acordo com os critérios de cada contexto narrativo. O discurso literário
se comportará diferentemente do discurso retórico. Pois o discurso retórico não é livre na maneira
de tratar as palavras de outrem. Podemos explicar por exemplo os próprios textos acadêmicos, a
forma utilizada para realizar a citação do discurso de outros sujeitos não é tão livre, pois temos
regras pré estabelecidas para citar esses discursos. Retomando a fala de Bakhtin (2006), quanto
mais forte for o sentimento de eminência hierárquica na enunciação de outrem mais definidas serão
suas fronteiras e menos acessíveis serão elas à penetração por tendências exteriores de réplica e
comentário.
Por fim, podemos afirmar também, com base às discussões trazidas nessa resenha, que a língua
existe não por si mesma, mas somente em conjunção com a estrutura individual de uma enunciação
concreta e é apenas através da enunciação que a língua toma contato com a comunicação. As
condições da comunicação verbal, suas formas e seus métodos de diferenciação são determinados
pelas condições sociais e econômicas de determinada época, condições essas que são ligadas
diretamente pela própria infraestrutura que consequentemente vão se refletir na própria ideologia
(BAKHTIN, 2006).
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, Mikhail. O Discurso de Outrem. Marxismo e Filosofia da Linguagem. HUCITEC, ed. 12, 2006. p. 147 -
157.
ORLANDI, Eni Puccinelli. Texto e Discurso. Organon, Porto Alegre, v. 9, n. 23, 2012. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/index.php/organon/article/view/29365. Acesso em: 07 out. 2022.