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Regime Jurídico E Principais Características

1. Juiz Federal e Procurador da República

 Direito Administrativo

5. Organização Administrativa

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Regime Jurídico E Principais Características

DIREITO ADMINISTRATIVO
ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA

Regime jurídico e principais características


1. O regime jurídico administrativo

Ao estudar direito administrativo aprendemos que ele sofre influência de alguns


institutos que são relevantes para o direito público, mas não são tão relevantes assim
para o direito privado. 

Mesmo considerando a crítica modernamente feita à separação de ramos dos direitos


público e privado, voltada a uma maior integração destas grandes áreas do Direito, o
fato é que alguns princípios influenciam o direito administrativo com maior intensidade
do que incidem, por exemplo, sobre o direito civil.

Os princípios estudados no direito administrativo acabam dando as características


nucleares deste ramo do Direito, constituindo o que se reconhece como regime jurídico
administrativo – conjunto de princípios expressos e implícitos que conduzem a atuação
da Administração Pública em busca do interesse público, conferindo, para o exercício
deste poder-dever, de um lado, prerrogativas e, de outro, sujeições.

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello (MELLO, 2016), o direito administrativo


possui uma disciplina normativa peculiar que, fundamentalmente, se delineia em função
da consagração de dois princípios: o princípio da supremacia do interesse público sobre
o privado e o princípio da indisponibilidade, pela Administração, dos interesses
públicos, os quais serão aprofundados a seguir. 
2. Princípio da supremacia do interesse público

Este princípio é tradicionalmente considerado o fundamento para o exercício das 


prerrogativas  conferidas  à  Administração  Pública  em  busca do interesse público. Por
ele, quando houver conflito entre o interesse público e o privado, aquele deve
prevalecer.

A Administração Pública, em seu sentido material, designa a atividade administrativa


propriamente dita. Essa atividade compreende a prestação do serviço público, a polícia
administrativa, o fomento e a intervenção.

Imagine como seria se a Administração Pública fosse interditar um restaurante que não
atende aos mínimos requisitos sanitários e que, mesmo preenchidos os requisitos para a
interdição do estabelecimento, os proprietários pudessem se opor dizendo que não
gostariam que o estabelecimento fosse fechado?

O interesse privado estaria se sobrepondo ao interesse público e, no exemplo, colocando


em risco a saúde pública.

O mesmo ocorre quando o setor responsável de um município não concede a licença


para construir um imóvel porque o projeto não atende às normas municipais de
planejamento e utilização do solo urbano.

O objetivo é buscar o interesse público. Se não foi concedida a licença para construir, é
porque, em tese, a fiscalização entendeu que esse projeto não cumpre as condições
necessárias estabelecidas pela administração com a finalidade de atender ao interesse
público e que o atendimento ao interesse do particular (neste caso) violaria esse
princípio, já que a ordenação do solo urbano ocorre justamente em benefício da
coletividade.

Assim, conflitando o interesse público com o interesse privado, aquele há de prevalecer.


Por isso, quando do desempenho de suas atividades é regido pelo direito público, a
Administração Pública está em uma posição superior em relação ao particular. Trata-se
de uma relação vertical, de modo que falamos em prerrogativas da Administração
Pública.

A seguir, vamos arrolar algumas dessas prerrogativas conferidas à Administração


Pública (CARVALHO, 2016):

 Autotutela administrativa: pela autotutela, pode a Administração Pública


revogar seus próprios atos, quando não mais for conveniente e oportuno ao
interesse público; deve também anular seus atos, quando ilegais.
 Autoexecutoriedade, coercibilidade e presunção de legitimidade dos atos
administrativos: ou seja, a Administração Pública, em regra, pode executar seus
próprios atos, sem que, para isso, precise se socorrer ao Judiciário; tais atos,
inclusive, têm cunho coercitivo, motivo pelo qual devem ser cumpridos pelos
administrados independentemente de sua aceitação; e têm presunção de que são
legítimos e verdadeiros, de modo que produzem efeitos até que sejam extintos.
Ainda, se houver discussão judicial a seu respeito, caberá ao administrado
desconstituir essa presunção que favorece o ato.
 Alteração e rescisão unilateral de contratos administrativos: a
Administração pode, sem a concordância do contratado, modificar ou rescindir o
contrato, nos limites legais.
 Privilégios tributários: as entidades públicas de direito público gozam de
imunidade tributária.
 Prazo em dobro: para as manifestações da Fazenda Pública (União, estados,
Distrito Federal, municípios, fundações públicas de direito público e autarquias).
 Reexame necessário: para as condenações em valor certo e líquido superior a
mil salários-mínimos (quando a condenada for a União e as respectivas
autarquias e fundações de direito público), 500 salários-mínimos (quando os
condenados forem os estados e o distrito federal, as respectivas autarquias e
fundações de direito público e municípios que constituam capitais) e 100
salários-mínimos, para os demais municípios e respectivas autarquias e
fundações de direito público, nos termos do art. 496 do Código de Processo
Civil de 2015 (CPC/2015).
 Regime jurídico dos bens públicos: garante a impenhorabilidade,
imprescritibilidade, não onerabilidade e alienabilidade condicionada dos bens
públicos.
 Pagamento de débitos através de precatórios (decorre da impenhorabilidade).

Novamente, destaca-se que o interesse público justificador das prerrogativas conferidas


à Administração é o interesse público primário (aquele interesse público propriamente
dito), e não o interesse público secundário. Este somente justifica prerrogativas à
Administração caso nele esteja compreendido também o interesse público primário.
Caso contrário, ou mesmo havendo conflito entre o interesse público primário e o
secundário, o interesse público primário é que deve prevalecer.

Por fim, deve haver a ressalva de que a supremacia do interesse público sobre o privado
não confere “carta branca” à Administração, que está sujeita a uma série de restrições,
as quais devem ser respeitadas, sob pena de ilegalidade ou ilegitimidade em sua
atuação.

Cumpre salientar que, hoje em dia, há uma doutrina no sentido da não existência de
supremacia do interesse público sobre o privado. No Rio de Janeiro, autores como
Gustavo Binenbojm, Alexandre Aragão e Daniel Sarmento têm defendido que não faz
sentido sustentar a supremacia de um princípio. Com efeito, o princípio comporta uma
ponderação de modo que é inerente à sua estrutura em alguns casos.

Por essa razão, não se pode dizer que toda vez que o interesse público estiver em jogo
ele prevalecerá sobre o interesse privado. Atente-se que o interesse privado faz parte do
interesse da coletividade.

Peter Häberle, em sua obra Öffentliches Interesse als juristisches Problem (1970),


reflete o interesse público como um problema jurídico, defendendo que, na realidade,
não existe um conflito entre interesses público e privado. O que existe é um conflito
interno; não há dois lutadores, cada um de um lado do ringue. O interesse privado é uma
parte de um todo. Por exemplo, se um sequestrador escondeu uma criança em algum
lugar e só ele sabe onde ela está, a polícia não pode, sob tortura, obrigar o criminoso a
revelar o esconderijo. Se houvesse uma supremacia do interesse público, não teríamos
dúvidas que seria legítimo torturar o sequestrador para revelar o local onde deixou a
vítima.

Entretanto, ao observarmos a conjuntura atual de nosso ordenamento brasileiro, em que


os direitos fundamentais desempenham um papel que antes não tinham, fica difícil falar
de supremacia do interesse público. Primeiramente, porque não se sabe ao certo o que é
de interesse público ou privado. Por exemplo, quando se limita a desapropriação por
reforma agrária em propriedade produtiva, não sabemos dizer com precisão se o que
está em jogo é interesse público ou privado. Ou ainda, quando se prevê justa e prévia
indenização na desapropriação, pode-se perguntar se a desapropriação não é interesse do
particular.

Na ponderação desses fatores, já se indica um ponto de vista da reconstrução do que se


entende pelo princípio do interesse público, alinhado com a doutrina de Humberto
Ávila, Daniel Sarmento, Alexandre Aragão e outros. Contudo, tal doutrina não é
pacífica, tendo, de outro lado, vozes como a de Maria Sylvia Di Pietro, que defendem a
prevalência do interesse público sobre o particular.

Esse ainda é um tema que levanta muita polêmica. Também é de extrema importância
ao direito administrativo, pois serve de fundamento para diversos institutos como
desapropriação, poder de polícia etc. Portanto, não é raro ainda encontrarmos a
aplicação de um instituto da seara administrativista com base na supremacia do interesse
público sobre o interesse do particular.

3. Princípio da indisponibilidade do interesse público

Compondo o outro lado do regime jurídico administrativo, lado este das sujeições, está
o princípio da indisponibilidade do interesse público.

Quando o interesse público surgir, a atuação do administrador será imperativa. É claro


que, em determinados casos, haverá análise de conveniência e oportunidade da
administração, mas disso jamais pode decorrer eventual disponibilidade do interesse
público, pois este é indisponível.

O administrador não é titular da máquina administrativa e muito menos do interesse


público.

Quando estudamos a indisponibilidade do interesse público, devemos entendê-la de


maneira bastante ampla. Não somente no sentido monetário. Aquele exemplo de licença
para construir é também exemplo da indisponibilidade do interesse público.

Essa faceta do regime jurídico administrativo traz as sujeições da Administração


Pública. Ser impessoal, moral, eficiente, transparente e agir conforme autorizado em lei
são algumas das várias limitações impostas à Administração.

O gestor público administra bens de todos, da coletividade e, assim, não pode, por
exemplo, alienar um imóvel público sem que haja autorização em lei (a exigência de
autorização está, inclusive, expressa no art. 17 da Lei nº 8.666/1993 – Lei de
Licitações).

O princípio da indisponibilidade do interesse público já foi interpretado de maneira mais


rígida, proibindo-se, por exemplo, a celebração de acordo pelo Poder Público em juízo.
Porém, atualmente, podem ser apontadas algumas ponderações a esse princípio,
permitindo um alcance mais flexível de seu conteúdo.

Veja, por exemplo, o parágrafo único do art. 10 da Lei nº 10.259/2001 (Lei dos Juizados
Especiais Federais – JEF), que assim dispõe:

Os representantes judiciais da União, autarquias, fundações e empresas públicas


federais, bem como os indicados na forma do caput, ficam autorizados a conciliar,
transigir ou desistir, nos processos da competência dos Juizados Especiais Federais.

Muitos podem interpretar tal dispositivo como uma mitigação do princípio da


indisponibilidade do interesse público. Ora, o dispositivo não autoriza renúncia. Permite
conciliar, transigir ou desistir. Veja que a conciliação e a transação facilmente podem
atender ao interesse público. Estando em juízo o advogado público e verificando que a
Administração agiu de maneira imperita, por exemplo, não seria mais interessante uma
conciliação, cujo resultado poderia ser muito melhor do que aquele esperado na
condenação? Ou mesmo a desistência, que está no plano processual e não impede nova
propositura da demanda. Dela difere a renúncia da ação, que afeta o plano material e
impede nova propositura da ação. A lei não permite renúncia.

Há alguns anos têm despontado, também, acaloradas discussões sobre a possibilidade de


arbitragem no âmbito da Administração Pública, havendo vigorosa doutrina no sentido
de que tal instituto violaria a indisponibilidade do interesse público, já que entre seus
pressupostos está a disponibilidade do Direito.

Gradativamente, o legislador foi inserindo a técnica da arbitragem para a Administração


Pública, a exemplo da Lei nº 11.079/2004 (arbitragem para os contratos das parcerias
público-privadas) e  da  Lei  nº  11.196/2005,  que  acrescentou  o  art.  23-A à Lei nº
8.987/1995 e passou a prever arbitragem para os contratos de concessões comuns.

Veja que as previsões eram específicas para os contratos de parceria público-privada e


concessões comuns.

Todavia, em 2015, a Lei nº 13.129 alterou a Lei nº 9.307/1996 (que dispõe sobre
arbitragem) e foi adicionada ao art. 1º, § 1º, de maneira genérica, a possibilidade de as
Administrações Públicas direta e indireta utilizarem-se da arbitragem para dirimir
conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis, desde que seja de direito, não
permitindo a arbitragem de equidade para a Administração Pública.

Enfim, a Lei nº 13.140/2015 dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de
solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da
Administração Pública.

O Novo Código de Processo Civil (NCPC) segue a linha e trata sobre a solução
consensual de conflitos no âmbito administrativo (art. 174 do CPC).
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