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NITERÓI
2013
1
Niterói
2013
2
306 f. ; il.
Bibliografia: f. 261-289.
À minha família
Chão de minha realidade e céu de minhas utopias
Com vocês eu posso tudo
Sem vocês não sou eu
Para Antônio Tadeu, Bruno e Beatriz
Wilson e Barbara
Meus irmãos, sobrinhos e prima
Aos amigos e profissionais de DEGASE
Companheiros de lutas e
Aspirações de novos tempos
Para adolescentes em conflito com lei
6
Agradecimentos
Resumo
ABSTRACT
This thesis presents and analyzes the paradoxes of public policies on human rights in
socio-education and the daily practices focused on teenagers in conflict with the law.
We start from the historical analysis of educational institutions for teenagers involved in
unlawful acts. We seek to reveal the daily life of a socio-educational institution of
detention, the “Centro de Atendimento Intensivo de Belford Roxo- CAI BR”, through
the discourses of juvenile detainees, the focus of this research, of the professionals and
the media that are part of the institution. We also analyze the prospects that lie ahead in
the plans, projects and regulations of the “Departamento Geral de Ações
Socioeducativas – DEGASE” (General Department for Socio-Educational Actions), an
agency of the Department of Education of the State of Rio de Janeiro responsible for the
implementation of educational measures of restriction and deprivation of liberty. A
qualitative study was conducted in three parts: a) historical documentary research of the
institutions responsible for receiving, assisting and socio-educating teenagers involved
in unlawful acts and violence (1920-2010); b) field research in CAI BR through
participant observation, groups of adolescents and semi-structured interviews with
professionals who work on site c) statistical analysis and documentary of DEGASE and
CAI BR (2008-2012). The analyzes undertaken were made in the intersection of
theoretical contributions from encounters between Michel Foucault, Gilles Deleuze and
Michael de Certeau, mainly. We conclude that the punitive practices of sanction and
socio-education articulate themselves with the historical tensions observed daily,
generating disciplinary actions of incarceration/control and, at the same time, producing
resistances and creating processes of subjectivity of the teenagers: “under
age/thug”, "teenager offender" or “teenager in conflict with the law/socio-educating".
The (auto)liability of the teenager for unlawful acts and the expected socio-educational
intervention due to the legal support in the doctrine of integral protection is still
incipient and a challenge for the State Socio-Educational System. We highlight the
necessary institutional and professional incompleteness in the strengthening of the
intersection between education, health, justice and public safety. As well as the
approach of the human rights education as a guide for the policy of this area, therefore,
investment in research and training of educators and multidisciplinary teams that make
up the system.
Résumé
Cette thèse présente et analyse les paradoxes des politiques publiques sur les droits de
l'homme dans socio-éducation et les pratiques quotidiennes pour adolescents en conflit
avec la loi. Nous partons de l'analyse historique des institutions éducatives pour les
adolescents impliqués dans des actes illégaux. Nous cherchons à révéler la vie
quotidienne d'une institution socio-éducative de détention « Centre d’Accueil Intensifs »
Belford Roxo-CAI BR, à travers les discours des adolescents hospitalisés, ces derniers
aux centre de cette recherche, encore des professionnels et des médias qui concernent
l'institution et nous analysons les perspectives qui ont été annoncées dans les plans, les
projets et les règlements du Département général pour le développement socioéducatif-
le DEGASE, soumis à la Secrétariat de l'Éducation de l'État de Rio de Janeiro (Brésil),
celle ci responsable de la mise en œuvre des mesures éducatives de restriction et de
privation de liberté. La recherche, d’inspiration aux méthodes qualitatives, a été réalisée
en trois parties: a) recherche documentaire historique des institutions chargé de recevoir,
soutenir et socio-élever les adolescents impliqués dans des actes illégaux et la violence
(1920-2010) ; b) travail de terrain dans le CAI BR par observation participante, des
groupes de discussion avec les adolescents et des interviews semi-directifs avec des
professionnels qui travaillent sur le site ; c) l'analyse statistique et documentaire
concernant au DEGASE et au CAI BR (2008-2012). Les étudies menées ont été faites
dans l'intersection théorique entre les travaux de Michel Foucault, Gilles Deleuze et de
Michel de Certeau. Nous avons conclu que les pratiques punitives, de sanction et socio-
éducation s'articulent avec les tensions historiques dans le quotidien, générant
dispositifs disciplinaires d’incarcération / contrôle et, au même temps, de production des
résistances en fabricant un processus de subjectivation des adolescents: "mineur /
bandit" , "adolescent délinquant»ou« adolescents en conflit avec la loi / socio-élève ".
L’auto « prise » de responsabilité par les adolescents est une réalité. De plus
l'intervention socio-éducative prévue par la loi ou la doctrine de la protection intégrale
est encore insuffisante et, en conséquence, un défi pour le système socio-éducatif de
l'Etat du Rio de Janeiro. Nous soulignons le caractère institutionnel et professionnel
incomplet pour la solidification nécessaire de l'intersection entre l'éducation, la santé, la
justice et la sécurité publique et encore le traitement de l'éducation aux droits de
l'homme comme une politique d'orientation pour le secteur, par conséquent, les
investissements dans la recherche et la formation des éducateurs et des équipes
multidisciplinaires qui composent le système.
Lista de Figuras
Lista de Gráficos
Gráfico 01: Crescimento percentual das taxas de homicídio por idade simples BRASIL:
1994/ 2004…………………………………………………….....................................172
Gráfico 02: Comparação entre população total de adolescentes entre 12 e 18 anos e
aqueles em conflito com a lei………………………………………………………....173
Gráfico 03: Adolescentes cumprindo medidas de internação, segundo o sexo e país
………………………………………………………………………………………...173
Gráfico 04: Medidas Socioeducativas ……………………………………….……….174
Gráfico 05:Proporção de crianças e adolescentes vítimas e adolescentes em conflito com
a lei …………………………………………………………………..………….........178
Gráfico 06: Perfil das crianças e adolescentes vítimas no estado do Rio de Janeiro
2011……………………………………………………………………………..…….180
Gráfico 07: Perfil dos adolescentes em conflito com a lei no estado do Rio de Janeiro –
2011……………………………………………………………………………...…....182
Gráfico 08 :Tipo de envolvimento que levou a apreensão dos adolescentes no estado do
Rio de Janeiro – 2011………………...…....................................................................183
Gráfico 09: Detalhamento do envolvimento com drogas – 2011………………….....183
Lista de Tabelas
SUMÁRIO:
INTRODUÇÃO…………………….............................................................................16
APORTES METODOLÓGICOS………………………………………………........25
PARTE I
MEMÓRIA DA INSTITUIÇÃO E MARCAS NO CORPO
ADOLESCENTE........................................................................................................37
CAPÍTULO 1:
Do menor infrator ao adolescente em conflito com a lei............................................38
A construção social do menor infrator: aprisionando para “regenerar”..........................42
As primeiras instituições especializadas no menor abandonado e delinquente:
“o anormal”....................................................................................................................56
SAM e a FUNABEM: propagadores da lógica da instituição total.................................60
Poder, Estado e menores infratores…………………………………………………….67
O Estatuto da Criança e do Adolescente e o adolescente em conflito com a
lei.....................................................................................................................................68
Das medidas socioeducativas..........................................................................................69
Legalidade da internação como medida socioeducativa no ECA...................................72
Infância, adolescência e práticas de privação de liberdade………………………….…74
CAPÍTULO 2:
ECA e DEGASE – início da política estadual.............................................................78
Sobre a situação das unidades de execução das medidas socioeducativas no Estado do
Rio de Janeiro e os adolescentes: 2006-2010..................................................................93
Dados comparativos 2006 (SEDH) 2008 e 2010 (DEGASE) ........................................94
Capacidade e lotação das unidades socioeducativas – DEGASE....................................96
Princípios pedagógicos das medidas socioeducativas e privação de liberdade
DEGASE.......................................................................................................................100
Sistema socioeducativo do Estado do Rio de Janeiro: paradoxos entre a socioeducação e
o sistema prisional-2010................................................................................................106
14
PARTE II
O DEGASE E O CENTRO DE ATENDIMENTO INTENSIVO DE
BELFORD ROXO.................................................................................. 117
CAPÍTULO 3:
O Centro de Atendimento Intensivo de Belford Roxo como instituição de sequestro
e instituição total .........................................................................................................120
O espaço arquitetônico do CAI BR – o panoptismo.....................................................122
Atividades e rotinas institucionais: socioeducação ou “bom adestramento”? ..............129
Educação e socioeducação: punição ou libertação?......................................................141
Educação, escolarização e socioeducação.....................................................................142
A lógica do discurso do encarceramento na produção de subjetividade.......................153
Cartas produzidas no espaço escolar: individualidade como resistência......................154
Subjetividade e resistência: poesia................................................................................160
Equipe de socioeducadores técnicos: olhos e ouvidos do judiciário ou vigias do
corpo?............................................................................................................................162
CAPÍTULO 4:
Adolescentes em conflito com a lei, violência e direitos humanos ..........................168
O quadro de insegurança pública brasileira e os adolescentes .....................................171
Perfil dos adolescente do CAI BR e medida socioeducativa de
internação.......................................................................................................................184
Os adolescentes do CAI BR, quem são?.......................................................................188
CAPÍTULO 5:
Mídia, violência e adolescentes ..................................................................................196
Violência urbana e adolescentes autores de atos infracionais ......................................197
Agência Nacional dos Direitos da Infância-ANDI.......................................................198
15
PARTE III
PERSPECTIVAS: LEGISLAÇÃO, PLANOS E PROJETOS...............221
CAPÍTULO 6:
Plano Estadual de Atendimento Socieducativo do Estado do Rio de Janeiro e Plano
Político Institucional do DEGASE na interface com a legislação .........................222
Socioeducação e segurança pública ..............................................................................224
Diretrizes e princípios socioeducativos – SINASE 2006 e 2012..................................233
Lei SINASE – 2012.......................................................................................................234
CAPÍTULO 7:
O Novo DEGASE e as suas perspectivas ..................................................................238
O DEGASE e o processo de municipalização das medidas em meio aberto ...............238
Da descentralização e (re) estruturação física do DEGASE .........................................244
A visão, a missão e os valores do DEGASE ...............................................................248
CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................251
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................261
APÊNDICES ...............................................................................................................290
ANEXOS ......................................................................................................................296
16
Introdução
A violência praticada por jovens e seu envolvimento no uso e tráfico de drogas
têm, gradativamente, se transformado em um grave problema para a sociedade
brasileira, especialmente nos seus centros urbanos. Destaca-se na mídia a violência
cometida por jovens, enquanto poucos são os que divulgam os altos índices de violência
sofrida por crianças e adolescentes e, muitas vezes, sofrida pelos próprios adolescentes
em conflito com a lei ou autores de atos infracionais1. Esse paradoxo entre vítimas e
vitimadores só encontra amparo nas leis que não se materializam nas práticas
cotidianas.
As instituições que, ao longo da história, foram responsáveis por recolher,
assistir e, atualmente, educar – socioeducar crianças e adolescentes envolvidos em atos
ilícitos – sempre foram alvo de denúncias sobre maus-tratos, violência, tortura, que
fazem parte dessa história e mapeiam de forma contundente o cotidiano desses sujeitos.
Contudo, há grupos de intelectuais, gestores e operadores que, preocupados com esses
jovens, reivindicaram e reivindicam maior atenção do poder público para essa parte da
população e produziram, ao longo da história, um grupo de leis e normas reconhecidas
mundialmente como as mais avançadas nas garantias de direitos para as crianças e
jovens do Brasil.
Apesar de a legislação e de o Sistema de Garantia de Direitos compreenderem e
atuarem em prol dos adolescentes infratores como sujeitos de direitos, paradoxalmente,
as diretrizes da doutrina da proteção integral ainda não se efetivaram no interior das
instituições criadas para esse fim – assim como a sociedade que, muitas vezes
potencializada pela mídia, clama por retrocessos legais, como a diminuição da
maioridade penal e o “endurecimento” das sanções/punições aplicadas a esses jovens.
Entretanto, o nível de compreensão e pesquisas acerca do entrelaçamento entre o
processo de construção-produção do adolescente infrator, das instituições
socioeducativas, dos aparatos legais e da mídia, não está acompanhando os múltiplos
dispositivos disciplinares e de controle que essas instituições produzem, acelerando o
ritmo de crescimento da violência. A supremacia com que esta questão tem alcançado
os meios de comunicação nacional e internacional estimulou a realização deste trabalho,
que propõe estabelecer uma reflexão sobre as políticas de execução das medidas
socioeducativas no Estado do Rio de Janeiro no campo da educação – socioeducação,
1
Nomeiam-se adolescentes em conflito com a lei durante a apuração da autoria de atos infracionais e
adolescentes infratores aqueles que, sob determinação judicial, cumprem medida socioeducativa.
17
2
ECA TÍTULO III Da Prática de Ato Infracional Capítulo IV “Das Medidas Sócio-Educativas” Art.112 a
128: advertência; obrigação de reparar dano; prestação de serviço à comunidade; liberdade assistida;
semiliberdade e internação.
21
3
Deleuze estrutura sua teoria do sentido em uma série de paradoxos que estão intimamente ligados. “O
sentido é o exprimível ou o expresso da proposição e o atributo do estado de coisas”. Assim, “o
acontecimento é o próprio sentido” e ele “pertence essencialmente à linguagem” (DELEUZE, 1974, p.
25.) Para Deleuze, sentido e não-sentido têm uma relação específica que não pode ser extraída de uma
relação de exclusão, de verdadeiro-falso (DELEUZE, 1974). Ao elencarmos os discursos como
possibilidade de análise da instituição, deparamo-nos com os paradoxos que constituem a própria
linguagem, dão sentido e estão implícitos no acontecimento.
23
4
As duas principais técnicas utilizadas para coletar informações qualitativas no âmbito da metodologia
são a observação participante e as entrevistas. Os grupos focais têm elementos de ambas as técnicas,
embora eles mantenham a sua singularidade e distinção como método de pesquisa, e são como uma forma
de ouvir as pessoas e aprender com eles. A amostra do estudo não responde a critérios estatísticos, mas
estruturais, ou seja, a representação de certas relações sociais na vida real (LOPES, 2008).
5
No CAI BR, os adolescentes são distribuídos para o atendimento técnico em cinco equipes
multidisciplinares (constituídas de pedagogo, assistente social e psicólogo) denominadas de “módulos”:
A, B, C, D e E. Solicitamos, para a realização dos grupos focais, a indicação aleatória de três adolescentes
por módulos. A participação no grupo focal foi opcional ao adolescente.
6
No CAIB R, há quatro plantões de agentes socioeducadores que atuam em turnos de 24h de trabalho por
72 horas: plantões A, B, C e D; em cada plantão, há um coordenador que atua com os demais agentes
socioeducadores para “garantir a segurança da unidade”.
24
7
A partir de 2008, há um reordenamento da política de atendimento ao adolescente pelo governo do
Estado do Rio de Janeiro: esse grupo de ações administrativas, normativas e filosóficas passa a ser
denominado de Novo DEGASE.
25
Aportes metodológicos
A pesquisa realizada para esta tese foi eminentemente qualitativa, sem desprezar
os dados quantitativos para análises estatísticas.
Como o tema seria desenvolvido na articulação entre memória, paradoxos e
perspectivas do Sistema Socioeducativo do Estado do Rio de Janeiro, a solução
encontrada foi a de trabalhar com três abordagens que se complementariam: 1) análise
histórica: construção social das instituições socioeducativas; 2) pesquisa de campo
(empírica): compreender e analisar, mediante estudo/pesquisa do/no cotidiano, os
discursos constituidores de um lugar de subjetivação dos adolescentes em conflito com
a lei; e 3) análise bibliográfica e documental: análise de produções bibliográficas
especializadas e de documentos: leis, relatórios, planos, projeto, normas, entre outros.
O recorte metodológico se deu pela experiência anterior que a pesquisadora
havia adquirido ao longo de sua trajetória acadêmica e profissional com o objeto de
estudo8.
A observação está sempre impregnada de teoria. Isto quer dizer que ao
realizar o teste empírico de uma teoria, esta influencia o “fato” a ser
obervado, na medida em que se dá o recorte, definindo as categorias
relevantes e selecionando os aspectos e relações a serem observados. Mas
não só a teoria que está sendo testada impregna a observação, também os
instrumentos utilizados nesse processo (ALVES-MASSOTTI, 2004, p. 112)
8
Apresento, na introdução, meu histórico acadêmico e profissional. Atualmente, atuo como Diretora da
Escola de Gestão Socioeducativa Paulo Freire ESGSE - DEGASE, responsável pela formação
/capacitação dos profissionais que atuam no DEGASE e os operadores do Sistema Socioeducativo
Estadual.
9
A atitude crítica que Foucault desenvolve na sua investigação é inseparável da filosofia como atividade,
como prática. Designa o exercício contínuo de “saída” das filosofias do sujeito, da neutralidade da
verdade, da legitimidade intrínseca do poder, do pensamento daquilo que antes se pensava, a fim de
pensar diferentemente (CANDIOTTO, 2006).
26
10
Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069/90: Capítulo IV trata "Das Medidas Sócio-
Educativas", assim dispondo: "Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente
poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III -
prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. § 1º
A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a
gravidade da infração. § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de
trabalho forçado. § 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento
individual e especializado, em local adequado às suas condições.. Atualmente o DEGASE atende a
adolescentes em semiliberdade e internação. O CAI BR atende os adolescentes em medida socioeducativa
de internação e durante a apuração do ato ilícito em internação provisória.
11
Optou-se por unidade do sexo masculino por ser este o de maior número de internos no DEGASE: em
2012, 95% em medidas socioeducativas de internação e internação provisória. E as instituições de
atendimento a meninas diferencia substancialmente no perfil institucional, não sendo possível neste
estudo aprofundar sobre este recorte.
12
RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Justiça e Interior do Estado do Rio de Janeiro-
Departamento Geral de Ações Socioeducativas - Projeto Excelência (1993). Cooperação Técnica
UERJ/DEGASE: 1998.
13
O primeiro concurso público para o DEGASE aconteceu em 1994; em 1998 houve uma grande chamada
de profissionais, todos os vide bibliografia.
28
Participantes
1) Adolescentes (Grupo Focal)
Três grupos de adolescentes em medida socioeducativa de internação há mais de
três meses. Grupo aleatório indicado pelos socioeducadores I14 (equipe técnica).
Esta pesquisa realizou entrevistas com:
2) Socioeducadores I (equipe técnica):
• 3 pedagogos, responsáveis pela implementação dos processos de escolarização,
educação para o trabalho e as interfaces: educação formal e instituição socioeducativa,
cabendo ao pedagogo o acompanhamento e registro do cumprimento das medidas dos
adolescentes determinadas pelos Juizados da Infância e Adolescência através de
relatórios técnicos no campo específico da educação – pareceres pedagógicos;
• 1 psicólogo, responsável por acolher o adolescente desde seu ingresso em
qualquer unidade do DEGASE, bem como orientá-lo, assisti-lo e acompanhá-lo no
decorrer do período do cumprimento de sua medida socioeducativa, mantendo o foco na
promoção da Saúde Mental Realizar, atendimento psicológico individual e em grupo
com os adolescentes e as famílias, e efetuando os devidos registros nos respectivos
prontuários (LEI Nº 5933 /2011 - RJ);
• 1 assistente social, responsável por atender e prestar acompanhamento técnico-
social aos adolescentes, familiares e responsáveis durante a internação provisória bem
como durante o cumprimento de medida socioeducativa de internação; e elaborar
pareceres e relatórios sociais para subsidiar o judiciário, projetos de intervenção e de
outra natureza pertinentes ao Serviço Social e de caráter multidisciplinar e
interdisciplinar (LEI Nº 5933/2011 - RJ).
3) Socioeducadores II:
• Coordenadores de plantão - agentes socioeducadores, responsáveis pela
disciplina, controle das atividades dos adolescentes e rotinas institucionais, visando à
segurança da instituição e dos adolescentes.
14
Governo do Estado do Rio de Janeiro , LEI Nº 5933, DE 29 DE MARÇO DE 2011. ALTERA A LEI
Nº 4802, DE 29 DE JUNHO DE 2006, QUE DISPÕE SOBRE A REESTRUTURAÇÃO DO QUADRO
DE PESSOAL DO DEPARTAMENTO GERAL DE AÇÕES SÓCIOEDUCATIVAS – DEGASE, E DÁ
OUTRAS PROVIDÊNCIAS Art. 2° O Quadro Permanente de Pessoal do DEGASE fica alterado e
organizado nas seguintes partes:I - PARTE PERMANENTE - integrada por Grupos Ocupacionais,
divididos em subgrupos compostos por cargos efetivos, organizados em:A) GRUPO OCUPACIONAL I:
1) Subgrupo I – Nível Superior – Categoria Socioeducador I ( incluindo Equipe Técnica : Psicólogos ,
pedagogos e assistentes sociais); 2) Subgrupo II – Nível Médio – Categoria Socioeducador II ( incluindo
os agentes socioeducativos feminino e masculinos )
29
4) Diretor da Unidade:
Gestor da unidade socioeducativa: cargo de confiança, indicado pelo diretor
geral do DEGASE, responde pela administração dos recursos humanos e materiais,
coordenação das diretrizes pedagógicas e normativas da medida socioeducativa aplicada
aos adolescentes sob a tutela do Estado. Este diretor também é responsável pelo
cumprimento da política da ação socioeducativa indicada no PASE - Plano de
Atendimento Socioeducativo do Governo do Estado do Rio de Janeiro (decreto nº
42.715 de 23 de novembro de 2010), no PPI - Projeto Pedagógico Institucional
(DEGASE) e registrado no Projeto Pedagógico de cada unidade.
Observação participante
A observação participante pressupõe que o pesquisador possui um grau de
interação com a instituição, afetando-a com sua presença e sendo por ela afetada.
Buscamos, na observação participante, registrar/descrever como os sujeitos
pesquisados (adolescentes, socioeducadores e gestores) veem suas próprias situações e
como constroem a realidade da instituição de internação (MOREIRA, 2004).
Assim, no período de imersão no campo, cerca de nove meses, acordamos com a
gestão e com os entrevistados:
• Data e local das entrevistas com os socioeducadores I (membros da equipe
técnica) e socieoeducadores II (agentes coordenadores de plantões);
• Dias das semanas para a observação participante a partir das diferentes
atividades que acontecem semanalmente, possibilitando ao pesquisador atuar como
observador participante.
• Datas e local dos Grupos Focais - GF com adolescentes e indicação aleatória
dos adolescentes que participariam dos grupos pelas miniequipes de socioeducadores
técnicos. Detalharemos a seguir essa metodologia e a sua realização junto aos
adolescentes.
• Data e local da entrevista com o gestor. Porém, durante o período de pesquisa o
diretor geral da unidade foi exonerado e, como o novo diretor encontrava-se em período
de adaptação, indicou o diretor adjunto para participar desta pesquisa, uma vez que este
profissional apresentava vasta experiência no CAI BR e atuava no mesmo cargo com o
antigo diretor.
30
identificação de temas, que vão emergindo das falas dos entrevistados, de forma que
eles sejam uma primeira organização das falas.
Martins & Bicudo (1989) utilizam a análise qualitativa buscando não os fatos em
si, mas os significados desses fatos para os sujeitos:
A preocupação se dirige para aquilo que os sujeitos da pesquisa vivenciam
como um caso concreto do fenômeno investigado. As descrições e os
agrupamentos dos fenômenos estão diretamente baseados nas descrições dos
sujeitos, e os dados são tratados como manifestações dos fenômenos
estudados (1989, p.30).
PARTE I
15
Institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), regulamenta a execução das
medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional; e altera as leis nºs 8.069,
de 13 de julho de 1990 (estatuto da criança e do adolescente); 7.560, de 19 de dezembro de 1986, 7.998,
de 11 de janeiro de 1990, 5.537, de 21 de novembro de 1968, 8.315, de 23 de dezembro de 1991, 8.706,
de 14 de setembro de 1993, os decretos-leis nºs 4.048, de 22 de janeiro de 1942, 8.621, de 10 de janeiro
de 1946, e a consolidação das leis do trabalho (clt), aprovada pelo decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de
1943.
39
externo. Assim, essas instituições totais proíbem explicitamente o contato físico dos
aprisionados com o exterior. Portas fechadas, paredes altas, arames farpados fazem
parte do aparato real criado para possibilitar o seu êxito.
No Brasil, essas instituições passaram por mudanças, impostas pelas leis
dirigidas à criança e ao adolescente e pelas pressões da sociedade diante do quadro de
descaso e negligência do Estado. Atualmente, o Estatuto da Criança e do Adolescente
(Lei 8069/90) garante ao adolescente que cumpre medida socioeducativa de internação
(art. 122), entre outros, o direito à escolarização, à profissionalização, a ter acesso aos
meios de comunicação e a se corresponder. A Lei do Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo (SINASE), vinte dois anos após a promulgação do ECA, estabelece a
estrutura filosófica, física e humana das instituições de atendimento ao adolescente
infrator, porém está longe de se concretizar no cotidiano.
Para Bazílio (1985), se, por um lado, tais estabelecimentos possuem um
conjunto de normas e modelos oficiais aceitos e divulgados, que lhes conferem imagem
de eficiência e bom desempenho, por outro é o sistema oficioso, paralelo, de regras e
valores, que determina as práticas institucionais.
Os paradoxos existentes entre os discursos e as práticas desafiam-nos a cada
período da história das instituições responsáveis pelo acolhimento-assistência,
recolhimento-punição ou educação-sanção de crianças e adolescentes envolvidos em
atos ilícitos. Seriam as práticas institucionais de encarceramento o verdadeiro fim da
instituição escola-prisão? Então, por que os discursos se refazem a cada período
histórico, clamando por um atendimento dos princípios dos direitos humanos, no
sentido da construção de uma escola-socioeducativa, da presença pedagógica nos
processos de educação-sanção de adolescentes infratores na configuração de uma
escola-socioeducativa? Compreender esses paradoxos, através do desvelar da
história/memória das instituições, é um desafio desta primeira parte da tese.
No Estado do Rio de Janeiro, as unidades de atendimento são mantidas e
administradas pelo Departamento Geral de Ações Socioeducativas, DEGASE, órgão
vinculado à Secretaria de Estado de Educação.
Esse sistema tem sido objeto de sucessivos programas de investimentos para
melhoria progressiva de infraestrutura. Tais programas, com recursos do Ministério da
Justiça, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, do Governo do
Estado do Rio de Janeiro, do Conselho Nacional de Direitos da Criança e do
Adolescente, da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, de alguns gestores
41
16
O conceito de paradigma repressor-punitivo surge a partir da visão do “menor abandonado e
delinquente” e do “menor em situação irregular”, caracterizado no período do Código de Menores (1927e
atualizado em 1979). Segundo o paradigma assistencialista, o adolescente infrator é visto apenas como
vítima social. O paradigma assistencialista, institucionalizante e autoritário de atendimento a crianças e
adolescentes considerados, ainda, como pessoas em situação irregular surgiu durante a Ditadura Militar,
contrapondo-se aos princípios de segurança nacional no atendimento ao “menor infrator” – décadas de 80
e 90. Há uma negação da sanção imposta pela medida socioeducativa. Retornaremos a essa temática na
análise da legislação e das instituições: Serviço de Assistência ao Menor (SAM) e Fundação Nacional de
Assistência do Bem-Estar do Menor (FUNABEM).
42
17
Roda dos Expostos: “de forma cilíndrica e com uma divisória no meio, esse dispositivo era fixado no
muro ou na janela da instituição. No tabuleiro inferior da parte externa, o expositor colocava a criança que
enjeitava, girava a Roda e puxava um cordão com uma sineta para avisar à vigilante - ou Rodeira - que
um bebê acabara de ser abandonado, retirando-se furtivamente do local, sem ser reconhecido”
(MARCILIO, 2006. p 57). “A roda dos expostos foi uma das instituições brasileiras de mais longa vida,
sobrevivendo aos três grandes regimes de nossa história. Criada na Colônia, perpassou e multiplicou-se
no período imperial, conseguiu manter-se durante a República e só foi extinta definitivamente na década
de 1950! Sendo o Brasil o último país a abolir a chaga da escravidão, foi ele igualmente o último a acabar
com o triste sistema da roda dos enjeitados”(FREITAS, 2004).
44
18
GONDRA, José., Estudo das teses da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro no livro: Artes de
civilizar: medicina, higiene e educação escolar na Corte Imperial. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2004.
45
19
A bibliografia específica sobre a emergência dos discursos e ações jurídicas preocupados com os
problemas da infância, desde o final do século XIX, já é expressiva. No que se refere aos processos de
diferenciação e embates entre os conceitos criança e menor, ver, entre outros: LONDOÑO, Fernando
Torres. "A origem do conceito menor" e PASSETTI, Edson. "O menor no Brasil Republicano", ambos
em DEL PRIORE, Mary (org.). História das Crianças no Brasil. São Paulo, Ed. Contexto, 2004;
RIZZINI, Irene. O século perdido. Raízes históricas das políticas para a infância no Brasil. Rio de
Janeiro, Ed. Amais Universidade Santa Úrsula, 1997.
47
20
“Se se provar que os menores de quatorze anos, que tiverem cometido crimes obraram com
discernimento, deverão ser recolhidos às casas de correção, pelo tempo que ao Juiz parecer, com tanto
que o recolhimento não exceda à idade de dezessete anos.” CLB. Lei de 16 de dezembro de 1830.
Código Criminal do Império do Brasil. Fls. 144.
48
21
DECRETO N. 847 – DE 11 DE OUTUBRO DE 1890 Promulga o Código Penal. Art. 27. Não são
criminosos:§ 1º Os menores de 9 annos completos;§ 2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem
sem discernimento; (...) Art. 30. Os maiores de 9 annos e menores de 14, que tiverem obrado com
discernimento, serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriaes, pelo tempo que ao juiz
parecer, comtanto que o recolhimento não exceda a idade de 17 annos.
22
DECRETO N. 145 DE 11 DE JULHO DE 1893. Autorisa o Governo a fundar uma colonia correccional
no proprio nacional Fazenda da Boa Vista, existente na Parahyba do Sul, ou onde melhor lhe parecer, e dá
outras providencias.
49
Nos fins do século XIX, outra ordem de motivos veio a influir na matéria –
motivos de natureza criminológica e de política criminal, segundo os novos
conhecimentos sobre a gênese da criminalidade e a ideia da defesa social, que impunha
deter os menores na carreira do crime. Daí nasceu o “impulso” que iria transformar
radicalmente a maneira de considerar e tratar a criminalidade infantil e juvenil,
conduzindo-a a um ponto de vista educativo e reformador.
Segundo Foucault (2000c), a natureza do crime, ao longo dos séculos, foi se
modificando, deixando de ser objeto da punição apenas os atos considerados como
crimes, sua definição como infração, sua hierarquia de gravidade, deslocando-se para a
origem do comportamento criminoso:
Sob o nome de crimes e delitos, são julgados corretamente os objetos
jurídicos definidos pelo código. Porem julgam-se também as paixões, os
instintos, as anômalas, as enfermidades, as inadaptações, os efeitos de meio
ambiente ou de hereditariedade. (p. 19)
A infância tornou-se objeto dos juristas, sendo que nesse período o termo
“menor” foi incorporado ao vocabulário corrente (BULCÃO, 2002; RIZZINI &
PILOTTI, 1995). Para Rizzini e Pilotti (1995), não houve nenhum tipo de
problematização no que se refere à categoria “menor”, a qual incluía as seguintes
classificações: abandonado, delinquente e viciado.
O aparato legal da República diferencia a criança desassistida dos menores
pobres, abandonados, vadios, libertinos e menores delinquentes. O Juiz de Menores23
passa a ter amplos poderes para decidir pelo destino das crianças e adolescentes em
situação de abandono e delinquência, como veremos a seguir, no texto da lei:
DAS CREANÇAS DA PRIMEIRA IDADE
23
Art. 146. E' creado no Districto Federal um Juizo de Menores, para assistencia, protecção, defesa,
processo e julgamento dos menores abandonados e delinquentes, que tenham menos de 18 annos ( Código
de Menores -1927).
51
Art. 29. São mendigos os menores que habitualmente pedem esmola para si
ou para outrem, ainda que este seja seu pae ou sua mãe, ou pedem donativo
sob pretexto de venda ou offerecimento de objectos.
24
A denominação dada pode representar um elemento de retórica patriótica impingida pelo movimento de
reconciliação da República com o Império. Cf, Schwarcz, 1998
57
Causa certa estranheza que se possa pensar que a mudança de nomeação, sem
que se alterem os fins da instituição, por si só possa trazer melhoria na qualidade do
atendimento oferecido, embora possa representar uma tentativa de demarcar novos
tempos.
Contradizendo o Código de Menores e a própria finalidade da instituição,
estabelecida em seu regulamento, o Abrigo nada tinha de provisório, visto que os
menores abandonados poderiam ficar internados permanentemente no instituto (art.5º).
Cabe aqui destacar que, conforme previa o regulamento, o menor que entrava no
Instituto era alojado primeiramente “num pavilhão de observação, em aposentos de
isolamento”, sendo que, segundo o art. 8º, durante oito dias prorrogáveis até quinze, o
menor ficaria separado de toda a comunidade, sendo assiduamente visitado e
interrogado pelo Juiz de Menores, diretor, médico e professor primário, a fim de se lhe
conhecer, quanto possível, o caráter e as inclinações, o grau de instrução e aptidões e o
mais que convier.
§1º Em caso especial, mediante expressa autorização do Juiz de Menores, em
vista de representação escrita e fundamentada do diretor, o isolamento poderá
exceder de 15 dias.
§ 2º Não será permitido ao internado, durante o tempo da observação, receber
visitas exceto em caso de doença grave, quanto aos pais, tutor ou pessoa em
cuja companhia ou sob cuja guarda viva.
§ 3. Os resultados finais dos exames do médico e do professor serão
reduzidos a um boletim médico-pedagógico, dentro de 48 horas, para ser
remetido ao Juízo de Menores. (...)
Art. 10 Depois de serem convenientemente observados, os menores serão
classificados pelo médico (Decreto 21.518, de 13/06/1932).
podendo excluir do convívio social tudo que parecesse estranho à norma e que pudesse
romper com a ordem e impedir o progresso.
A Escola XV de Novembro, criada em 1898, “inaugurou a entrada do Estado na
área da educação dos desvalidos, que até então era de responsabilidade da filantropia e
da Igreja” (LEITE, 1998, p.55), e recebeu esse nome em homenagem à nova situação da
Nação, representando “um exemplo de modelo educacional brasileiro”, ou seja, onde se
tentou “desenvolver toda uma pedagogia diferenciada e experimental para a época”
(ibidem). Em 1903, passou a chamar-se Escola Correcional XV de Novembro, cujo
nome vem explicitar a sua finalidade: a correção dos comportamentos inadequados dos
cidadãos dessa República recém-implantada. Em 1910, passou a denominar-se Escola
Premonitória XV de Novembro, como defendia seu antigo diretor Franco Vaz: a única
instituição oficial que a União possui para a educação e assistência de menores
abandonados, órfãos, vadios, etc, e que há alguns anos tem o qualificativo, talvez
desnecessário, mas gramatical e tecnicamente acertado, de premonitória; recebeu, na
sua fundação, em 1903, a denominação de correcional que, como se sabe, é uma
instituição de natureza diversa (1922, p. 137).
Em 1923, volta a chamar-se apenas Escola XV de Novembro, tendo como
finalidade “ministrar educação física, profissional e moral aos menores abandonados e
recolhidos ao estabelecimento, por ordem das autoridades competentes” (Decreto.
16.037), a mesma finalidade estabelecida nos regulamentos anteriores (1903 e 1910).
Embora a Escola tenha passado por diversas denominações e administrações, “nunca
teve o privilégio de ser subordinada à área educacional, demonstração clara de que os
jovens desvalidos não eram objeto de educação mas de repressão, correção e punição
das condutas e comportamentos culturais diferenciados” (LEITE, 1998, p.56).
A Escola João Luiz Alves – assim denominada em homenagem ao ex-Ministro
da Justiça, que regulamentou a assistência e proteção aos menores – destinava-se, nos
termos dos artigos 1º e 2º do Decreto 17.508, de 4 de novembro de 1926, a:
Art 1º E denominada «Escola João Luiz Alves» a escola de reforma creada
no Districto Federal pelo art. 74 do decreto n. 16.272, de 20 de dezembro de
1923, modificado pelo art. 4º da lei n. 4.983 A, de 30 de dezembro de 1925.
Art. 2º Essa escola destina-se a receber, para regenerar pelo trabalho,
educação e instrução, os menores do sexo masculino, de mais de 14 e menos
da 18 anos de idade, que forem julgados pelo juiz de menores, e por este
mandados internar.
necessário segregar da sociedade até que se curem e se façam elementos úteis” (BRITO,
1959, p.552 apud BAZÍLIO e MULLER, 2006).
Bazílio e Müller (2006) fazem uma análise do período e da construção da
identidade social do “menor” a partir do Código de Menores:
a criança pobre foi travestida em menor, estigmatizando-a. Ao ser
transformada em menor, se tornou um componente da sociedade que não quis
(ou não pode) integrá-la aos valores sociais hierarquicamente estabelecidos –
inclusive aos educacionais; pois o termo menor retira a criança de um meio
social específico e a transfere para as fronteiras da desumanização. Ao deixar
de ser criança, e ao ser tratada como se realmente não o fosse, passou-se a
temer o menor por ser algo desconhecido das relações pessoais e familiares.
Em consequência, entre a sociedade e o menor deveria existir a Lei,
funcionando simultaneamente como uma barreira de punição e proteção.
(2006, pp. 548-5485)
25
Decreto-Lei n. 3.799 Federal - de 5 de novembro de 1941
61
26
1954-1955.
64
Como salientam Irma e Irene Rizzini (2004), a imprensa teve um papel relevante
na construção dessa imagem, pois não só denunciava os abusos contra os menores, mas
também colocava cada vez mais ênfase na periculosidade destes. Às vozes da imprensa,
juntavam-se autoridades públicas, políticos e juristas, que condenavam o órgão e
propunham a criação de uma nova instituição.
Os jornais diários da época iniciaram campanhas denunciando o “famigerado
SAM” e nomeando-o “Universidade do Crime”.
Um grupo de trabalho, formado por pessoas do governo, da sociedade civil, e
por religiosos, foi aos poucos indicando o caminho para o surgimento da FUNABEM
(Fundação Nacional de Bem-Estar do Menor)27, novo modelo de atendimento à criança
e ao adolescente, que substituiu o SAM, logo após o golpe de 1964.
Com o golpe militar, a “questão do menor” passou a ser tratada com
especificidades, pautada na “Doutrina da Segurança Nacional” que serviu de alicerce
para as ações militares.
Nesse sentido, o Código de Menores de 1927 somente será substituído em 1979,
ao final da Ditadura Militar – Código de Menores – Lei 6.697 de 10/10/79, sendo
novamente elaborado exclusivamente por juristas, em continuidade com uma visão
assistencialista e repressiva, embasado na doutrina jurídica da “situação irregular”. A lei
se dirigia exclusivamente para a categoria indefinida de “menores considerados em
situação irregular”.
O artigo 1º do Código de 1979 estabelecia como objetivo central “prestar a
assistência, proteção e vigilância a menores que se encontravam em situação irregular”.
Na construção histórica do Direito de Crianças e Adolescentes no Brasil, observa-se a
utilização da doutrina jurídica da “situação irregular” nos dois primeiros Códigos
(Mello Matos - 1927 e Alyrio Cavalliere - 1979).
Conforme assinala Xaud (1999), o discurso de “proteção” a esses “irregulares”
misturou em um mesmo espaço físico todos os tipos de menores e, além disso, passou a
tratar como caso de Justiça os abandonados, os vitimizados, os carentes etc.
As unidades de atendimento, na época, FUNABEM, e as correlatas estaduais
Fundação Estadual de Bem-estar de Menores – FEBEM’s funcionavam como depósitos
de crianças e adolescentes encarcerados em nome de uma Política de Bem-Estar do
27
Foi criada a lei nº 4.513/ 1964 para a implantação da Fundação Nacional de Bem-Estar do Menor –
FUNABEM, responsável pela elaboração e execução da Política Nacional de Bem-Estar do Menor
(PNBEM), em substituição ao antigo SAM.
66
Menor, que tinha como ideologia o controle social e a segurança nacional, discursos que
prevaleciam durante os governos militares.
A visão do adolescente como “delinquente nato”, de “má índole”, modificava-se.
Ele era agora o “menor carente”, privado das condições mínimas de seu pleno
desenvolvimento.
Costa (1998) sinaliza:
Junto com os prédios reformados, a nova lei, a nova missão, as novas
concepções de atendimento, o novo corpo técnico da FUNABEM herdou os
menores, boa parte dos funcionários e, principalmente, a cultura
organizacional do SAM, que, como brasa em fogo sob cinzas, permanecia
ardente e viva sob os escombros da sucursal do inferno (p.19).
criança e do adolescente, movimento de luta pelos direitos humanos, entre outros). Com
a liberdade de imprensa e o vigor dos movimentos sociais ligados ao tema da infância e
juventude, houve inúmeras denúncias sobre os maus tratos, as rebeliões, incêndios e
condições degradantes dos estabelecimentos da FUNABEM.
Os resultados da FUNABEM/ FEBEM produziram o esfacelamento do modelo
logo após a chamada redemocratização.
Com a promulgação da Constituição denominada “Cidadã”, em 1988, e o
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei 8069/90), baseado na doutrina da
“Proteção Integral”, houve uma verdadeira transformação no plano jurídico-legal, para a
infância e a juventude, que se caracterizou por uma nova perspectiva em relação à
formulação e implementação de políticas públicas voltadas para todas as crianças e
adolescentes brasileiros, os quais passaram à condição de sujeitos de direito e a ter
prioridade absoluta, sendo a família, a comunidade, a sociedade em geral e o poder
público responsabilizados pela efetivação dos direitos fundamentais.
O Estatuto da Criança e do Adolescente não almejou apenas uma mudança na
gestão do atendimento do adolescente a quem se atribui autoria de ato infracional, mas
também uma mudança jurídico-legal, conceitual e ética para a assistência aos jovens em
conflito com a lei.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) exigiu uma grande reestruturação
do sistema de administração e execução da Justiça voltada para a infância e a juventude.
Na dimensão institucional, foram criados órgãos especializados, tais como: Delegacias
de Proteção à Criança e ao Adolescente, Promotorias, Juizados e Centros de Atenção
Socioeducativos.
Segundo Xaud (1999):
28
Quarenta por cento (40%) da população carcerária do sistema penal do Rio de Janeiro - DESIPE é
oriunda do DEGASE, e a reincidência em algumas unidades de internação chega a 50%. Cf. Censo
Penitenciário, 2001 e Pesquisa DEGASE, 2010.
69
defesa. Por isso, tal forma de internação só pode ser aplicada pela autoridade judicial,
nos estritos limites estabelecidos na lei.
O inciso I não exige que o ato infracional seja grave: basta que seja cometido
com grave ameaça ou violência à pessoa. Já o inciso II pressupõe o cometimento de
uma infração grave após a prática de pelo menos duas outras infrações graves anteriores
(“duas”, porque a lei fala em “outras infrações graves” e não “outra infração grave”).
Surge, porém, a indagação: quando o ato infracional é considerado grave?
O conceito de gravidade da infração é bastante polêmico: uma corrente sustenta
que o ato infracional grave é aquele a que a lei penal impõe pena de reclusão; outra
sustenta que o ato infracional grave é o praticado com violência contra a pessoa ou
grave ameaça; e outra sustenta que a gravidade deve ser aquilatada em relação ao
próprio agente, havendo posicionamentos intermediários ou ecléticos que combinam
essas posições.
Aos que sustentam que a gravidade da infração não deva ser aprimorada por
critério jurídico, mas levando em conta suas consequências em relação à vítima, à
sociedade e ao próprio adolescente, pode-se responder que, se tal tivesse sido a intenção
do legislador, ele teria omitido a expressão “gravidade da infração” no §1º do art. 112.
Ademais, tal interpretação não explicaria o disposto no § 2º do art. 186, a menos que se
chegasse ao absurdo de entender que ficaria ao livre arbítrio do juiz apreciar a gravidade
da infração em relação ao adolescente, para nomeá-lo ou não defensor. Além disso,
como poderia a autoridade policial (art.174 do ECA) ou Juiz (art. 107, parágrafo único)
apreciar liminarmente a gravidade da infração em relação ao adolescente?
Aos que sustentam que ato grave é aquele que comporta medida de internação,
pode-se indagar quais são os casos que comportam internação, e a resposta quase
sempre aponta o art. 122 do ECA, que prevê tal medida quando houver reiteração no
cometimento de infrações graves. Acaba-se na retória: fato grave é aquele que justifica a
internação e esta é medida cabível quando o fato é grave.
Também não satisfaz a conceituação de fato grave como aquele em que é
empregada violência ou grave ameaça. Pode-se observar que existem muitos crimes
praticados com violência ou grave ameaça à pessoa, sem que a lei faça menção à
violência física ou “moral”. Outros há, de menor gravidade, em que a lei prevê, ora
como requisito próprio, ora como causa de aumento de pena, a violência ou grave
ameaça.
74
No crime de “matar alguém” (homicídio doloso - art. 121 do CP), por exemplo,
ninguém negaria a violência contra a pessoa, por isso um ato grave.
Um exemplo sobre gravidade ou não gravidade:
No caso do crime da injúria (art.140 §2º do CP.), consiste em violência ou
vias de fato que por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem
aviltantes = Pena detenção, de seis meses a um ano e multa de injúria real
apesar da violência, a lei ainda não capitula a infração como grave, pois,
prevê uma branda pena de detenção. (MENDEZ, 1992, p. 13)
melhores intenções – com práticas sociais (não jurídicas, não judiciais) de privação de
liberdade.
O novo caráter jurídico-restritivo da privação de liberdade implica a necessidade
do desenvolvimento de uma nova cultura: uma cultura de tolerância, que não significa
outra coisa que não o duro aprendizado (nosso) de conviver com a diversidade.
Os comportamentos socialmente indesejáveis, mas não antijurídicos, podem e,
em muitos casos, devem ser objetos de políticas específicas: mas isso, sim,
absolutamente despojadas de conteúdos de caráter coercitivo.
O Estatuto, abarcando o melhor da normativa e da doutrina internacional,
consagra o princípio do “incompleto institucional”; ou seja: colocar a instituição
responsável pela privação de liberdade em uma situação mais dependente possível do
mundo real. Entretanto, o princípio do “incompleto institucional” só poderá ser
realizado se implantado, simultaneamente, o princípio do “incompleto profissional”.
Os órgãos deliberativos e gestores do Sistema Socioeducativo, em especial as
instituições executoras das medidas socioeducativas de privação de liberdade, devem
promover a articulação da atuação de diferentes áreas da política social. Nesse papel de
articulador, a incompletude institucional é um princípio fundamental e norteador de
todo o direito da adolescência, que deve permear a prática dos programas
socioeducativos e da rede de serviços. Demanda a efetiva participação dos sistemas e
políticas de educação, saúde, trabalho, previdência social, assistência social, cultura,
esporte, lazer, segurança pública, entre outras, para a efetivação da proteção integral de
que são destinatários todos adolescentes. Portanto, a instituição de privação de liberdade
deverá ser “dependente” dos demais aparelhos sociais e dos profissionais que compõem
a rede de serviços na incompletude profissional, sendo indispensável à articulação das
várias áreas para maior efetividade das ações a participação da sociedade civil.
Nessa perspectiva, rompe-se com o paradigma da completude institucional ou
instituição completa através do qual se aprisionam e excluem os adolescentes em
conflito com a lei, justificando o “bom e necessário atendimento” pela instituição total
(GOFFMAM, 1996).
A medida de privação de liberdade encerra em si mesma uma contradição
profunda, mas não indecifrável ou irresolúvel. O grau de sua eficiência está
dado pelo grau de sua “não necessidade”. Liberar-se da cultura de sua
necessidade e transformá-la num meio contingente e aleatório constitui o
melhor caminho de sua construção-reconstrução. (COSTA, 2004, p. 37)
77
29
Através do Decreto nº 18.493, de 26 de janeiro de 1993.
79
30
Instituto Padre Severino, Educandário Santos Dumont e Escola João Luiz Alves.
80
Fui mandado para a Escola João Luiz Alves, para uma ala com mais de trinta
adolescentes, depois de passar mais de sete horas com eles num espaço
mínimo, sujo e com pouca iluminação, cercado por grades. Um agente se
aproximou de mim e me perguntou o que eu estava fazendo ali, eu disse que
era o meu posto. Então ele disse que ali era terra de ninguém, e que eu
poderia ter sido morto. Era área dos meninos. (Agente de disciplina 2)
31
A Execução de Medida Socioeducativa por determinação dos Juizados da Infância e Juventude prevista
no Estatuto da Criança e do Adolescente define, no artigo 120, a Semiliberdade: “O regime de semi-
liberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto,
82
Reforma da Escola João Luiz Alves, com divisão física em quatro módulos para
atendimento a quarenta adolescentes em cada um, compartilhando os
equipamentos comuns (refeitório, escola, campo de futebol, quadras de esporte,
piscina, teatro e ginásio coberto);
melhorar as condições de vida dos adolescentes, personagens que deveriam ser centrais
nesta história, mas não são.
A nova administração do DEGASE deu continuidade ao Plano de Excelência.
O Programa de Cooperação Técnica UERJ e DEGASE, com o apoio do
Ministério da Justiça, através da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e por meio
de convênio com a Secretaria de Estado de Justiça, iniciou novas ações socioeducativas
nas instituições do DEGASE.
Em 1998, foram convocados funcionários concursados, reduzindo o número de
contratados. A UERJ realizou um curso de atualização, envolvendo técnicos e agentes
educacionais.
As unidades sofreram reformas estruturais. Foram estabelecidas parcerias com
as secretarias de Educação e de Trabalho e com Organizações Não Governamentais.
Descentralizou-se o atendimento, e novas unidades e projetos foram inaugurados.
A superlotação das unidades agravava as condições de atendimento aos
adolescentes, a centralidade das unidades de internação e internação provisória, todas
localizadas na cidade do Rio de Janeiro, e inviabilizava um trabalho articulado com as
famílias e as comunidades de origem dos adolescentes. Visando atender as demandas da
baixada fluminense, região metropolitana ao Rio de Janeiro, foi criado, em setembro de
1998, o Centro de Atendimento Intensivo de Belford Roxo, para atender os adolescentes
em conflito com a lei em regime de internação da baixada e dos demais municípios do
estado.
As rebeliões e denúncias de um sistema violento intensificaram-se na mídia
impressa e televisiva.
Kathie Njaine e Maria Cecília de Souza Minayo (2002) realizaram uma pesquisa
sobre o discurso da imprensa sobre rebeliões de jovens infratores em regime de privação
de liberdade no DEGASE, no período de 1997-1998 nos jornais de grande circulação: O
Globo, Jornal do Brasil e O Dia.
A pesquisa faz um levantamento dos discursos apresentados pela mídia para
identificar e nomear o adolescente em conflito com a lei e aqueles, por determinação
judicial, considerados adolescentes infratores. Nas reportagens do jornal O dia (12
matérias, seção policial), o termo “menores” aparece 53 vezes (42,4 %) e “meninos”, 32
vezes (25,6 %); em O Globo, o termo “menores infratores” aparece 85 vezes (35,3 %),
muito próximo do termo “menores”, 81 vezes (33,8 %); e no Jornal do Brasil, “menores
infratores” aparece 69 vezes (39,6 %) e “menores”, apenas 27 vezes (15,5 %).
87
34
Em 2008, com a publicação do Decreto nº 41.144, de 24 de janeiro, que alterou a estrutura
organizacional do DEGASE e deu outras providências, ela passou a ser denominada “Escola de Gestão
Socioeducativa Paulo Freire - ESGSE”.
90
35
O CTR é um centro de internação provisória e triagem para menores encaminhados pela Delegacia
Especial da Criança e do Adolescente e pelo Juizado da Infância e Juventude da Capital.
91
36
A vice-governadora Benedita da Silva, do PT, assumiu o Governo do Estado para que o então
Governador Anthony Garotinho pudesse para concorrer à Presidência da República.
92
Total de
DEGASE/ MSE Porcentagem
adolescentes
Internação 288 42%
Internação Provisória 215 31%
Semiliberdade 197 27%
TOTAL 688 100%
Fonte: ABDALLA, 2010
No DEGASE, há 503 adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa
de internação e internação provisória. Desses, 94% são do sexo masculino; 72% se
declararam pretos e pardos; 91% possuíam idade entre 16 e 18 anos; e 84 % não tinham
concluído o Ensino Fundamental.
Esses dados preliminares indicam que os adolescentes em conflito com a lei no
Estado do Rio de Janeiro não diferem da realidade dos jovens de classes sociais
empobrecidas no contexto brasileiro, exigindo atenção do Estado, com necessidade
urgente de uma agenda efetiva de políticas públicas e sociais, sobretudo que ampliem as
perspectivas de implementação de atendimento socioeducativo.
Em 2010, havia 42% de adolescentes na internação, seguidos de 31% na
internação provisória e 27% no regime de semiliberdade. Em total restrição de
liberdade, isto é, em internação e internação provisória, havia um total de 73% de
jovens em cumprimento de medida socioeducativa, doravante MSE. O regime de
semiliberdade, em comparação à internação, vem sendo menos aplicado.
Porém, na comparação dos dados entre 2008 e 2010, houve um decréscimo de
7% no quantitativo de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de
internação. Na época (março de 2008), havia 51% em internação, 24% em internação
provisória e 25% em semiliberdade. Identificou-se também um aumento de 2% no
96
08 (oito) leitos. Atividades coletivas como escolarização e formação para o trabalho são
realizadas em grupos de 10 (dez) a 15 (quinze) adolescentes em áreas específicas,
fazendo parte do complexo das unidades.
A unidade de internação e internação provisória que atende à proposta do
SINASE é a unidade de internação feminina (CENSE Professor Antônio Carlos Gomes
da Costa) com capacidade para o atendimento de 44 (quarenta e quatro) adolescentes.
As unidades de internação do sexo masculino apresentam um decréscimo de
58% de utilização de sua capacidade no período de 04 anos, significando a diminuição
na determinação de MSE de internação pelos Juizados da Infância e Juventude do
Estado do Rio de Janeiro, o fortalecimento do processo de municipalização das medidas
em meio aberto e o investimento na estrutura de atendimento das medidas restritivas e
privativas de liberdade. Nos anos anteriores (2006 e 2008), essas unidades
apresentavam quadro de excesso de lotação, chegando a ultrapassar a sua capacidade de
atendimento em 51%, evidenciando a precariedade do atendimento.
Atualmente, apenas a unidade de internação provisória masculina (Instituto
Padre Severino) apresenta déficit em sua capacidade de atendimento, apresentando uma
variável de lotação superior a sua capacidade de 12% a 26%, nos últimos anos.
Com relação à distribuição das unidades de internação e internação provisória no
Estado do Rio de Janeiro, com exceção do Centro de Atendimento Intensivo de Belford
Roxo, localizado no Município de Belford Roxo, as demais unidades encontram-se
localizadas na capital, demonstrando a necessidade de investimento do Estado no
processo de regionalização dessas medidas. A localização das unidades de internação e
internação provisória, concentradas na cidade do Rio de Janeiro, impede a efetivação da
garantia de direito à convivência familiar e comunitária dos adolescentes internados e o
princípio da incompletude institucional, devido à distância do local de residência
familiar e à não utilização dos recursos comunitários para a formação de redes externas
as unidades de internação.
Quanto às unidades de execução de medida socioeducativa em regime de
semiliberdade, os Centros de Recursos Integrados de Atendimento ao Adolescente
(CRIAAD), todas estão dentro das determinações do SINASE, atendendo a, no máximo,
32 adolescentes.
98
Internação
Masculino
Ano Capacidade Lotação % de Lotação
2006 406 615 151%
2008 430 648 151%
2010 408 275 67%
Internação
Feminino
Ano Capacidade Lotação % de Lotação
2006 40 0 Não registrado
2008 45 16 36%
2010 22 13 59%
Internação Provisória
Masculino
Ano Capacidade Lotação % de Lotação
2006 202 226 112%
2008 160 179 112%
2010 160 202 126%
Feminino
Ano Capacidade Lotação % de Lotação
2006 0 0 Não registrado
2008 22 17 77%
2010 22 13 59%
Semiliberdade
Masculino
Ano Capacidade Lotação % de Lotação
2006 512 289 56%
2008 512 236 46%
2010 477 185 39%
Nos
Feminino
Ano Capacidade Lotação % de Lotação
2006 32 29 91%
2008 32 11 34%
2010 32 12 38%
Fonte: ABDALLA, 2010
99
QUADRO DE PESSOAL
No que diz respeito ao atual quadro de pessoal no Estado do Rio de Janeiro para
a área de execução das medidas socioeducativas, 79% é composto por agentes
socioeducadores; 15%, por técnicos; e 5%, por funcionários administrativos. Em
comparação aos dados divulgados no levantamento de 2006, evidencia-se um
significativo investimento do Estado no seu quadro, com um crescimento de 629% no
número de socioeducadores (agentes de disciplina, agentes educacionais e auxiliares de
disciplina) e 59% na equipe técnica (pedagogos, assistentes sociais e psicólogos).
Porém, em relação à equipe de funcionários administrativos, houve um decréscimo de
28% no seu quadro nos últimos quatro anos. Cabe ressaltar que o DEGASE possui 1472
profissionais39 em seu quadro de pessoal, atendendo diretamente aos 688 adolescentes
em cumprimento de MSE (internação, internação provisória e semiliberdade) e mais 66
adolescentes em suspensão de medida para tratamento de dependência química em
unidade de triagem, perfazendo um total de 754 adolescentes (setembro de 2010). A
média nacional, segundo o SINASE, é de 1,2 funcionários por adolescente em meio
fechado. No Rio de Janeiro, em 2010, o Estado possuía 3,5 funcionários por
adolescente.
39
195 técnicos; 1012 socioeducadores; 67 administrativos; 65 profissionais da saúde (médicos, dentistas,
farmacêuticos, enfermeiros e técnicos de enfermagem); 48 profissionais da educação; e 85 outros
funcionários (técnicos em segurança no trabalho, motoristas etc).;
101
social, de forma que atuem como cidadãos e futuros profissionais, que não reincidam na
prática de atos infracionais (crimes e contravenções), assegurando-se, ao mesmo tempo,
o respeito aos seus direitos fundamentais e à segurança dos demais cidadãos (COSTA,
2006).
No último quinquênio, o governo estadual e o DEGASE vêm produzindo
inúmeros documentos que indicam uma mudança significativa na política de
atendimento ao adolescente em conflito com a lei no Estado do Rio de Janeiro.
Para o Plano de Atendimento Socioeducativo do Estado do Rio de Janeiro -
PASE/RJ - 2010, a socioeducação diz respeito a educar para o convívio social, no
sentido de criar espaços e condições para que adolescentes e jovens em conflito com a
lei, em razão do cometimento de ato infracional, possam desenvolver as competências
pessoais, relacionais, produtivas e cognitivas que lhes permitam, como pessoas,
cidadãos e futuros profissionais, desempenhar no convívio social sem reincidir na
quebra de normas tipificadas pela Lei Penal como crimes ou contravenções (Artigo 10.
Missão Institucional).
O Projeto Pedagógico Institucional do DEGASE (PPI 2010) prevê os “métodos e
técnicas de atendimento socioeducativo”, de que, entre outros, destacamos: estudo de
caso, plano personalizado de atendimento, educação para valores e protagonismo
juvenil.
Medidas concretas, como o investimento na formação dos profissionais;
reformas nas unidades socioeducativas; construções de unidades descentralizadas;
diminuição do percentual de internação; normatização dos procedimentos e abertura
para a realização de pesquisas acadêmicas nas unidades; convênios com instituições
públicas, privadas e do terceiro setor; e o processo de municipalização das medidas em
meio aberto (ABDALLA, 2010b), são apresentadas e registradas nos documentos
institucionais. Órgãos de controle do sistema, representantes da sociedade civil e do
sistema jurídico e do sistema de garantia de direitos vêm acompanhando essa mudança.
Assim, em seus documentos oficiais, o DEGASE apresenta como diretriz a
socioeducação e destaca como tarefa primordial dos Centros de Socioeducação para
adolescentes em conflito com a lei a proteção integral.
O trabalho socioeducativo é uma resposta às premissas legais do Estatuto da
Criança e do Adolescente e do SINASE (Lei de 2012), bem como às demandas sociais
do mundo atual.
104
Para Costa (2004), é sob essa óptica e ética que devemos ver, entender, sentir,
agir e interagir com o adolescente em conflito com a lei.
A ação pedagógica para com os adolescentes em conflito com a lei ou autores de
atos infracionais no Sistema Socioeducativo, natureza jurídica, necessita acontecer em
“sua inteireza e complexidade: se esse educando é visto como um ‘marginal’ é porque
ele ficou à margem dos acontecimentos” (Costa, 2004, p. 59) (grifo nosso). Esses
adolescentes, em sua maioria, permaneceram à margem da educação, da saúde, da
profissionalização, da saudável convivência familiar e comunitária, enfim, estamos
falando de um educando que não teve acesso – ou o teve, de forma muito incipiente –
aos serviços básicos de responsabilidade do Estado e da sociedade e estiveram excluídos
do Sistema de Garantia de Direitos.
Para tanto, o atendimento socioeducativo realizado por seus gestores, técnicos e
educadores que atuam nessa área deve apostar em cada adolescente-educando, em seu
potencial a ser desenvolvido dentro dos princípios humanos e solidários. Percebemos,
muitas vezes, que os socieducadores que atuam com esses jovens não se fazem
presentes nas vidas dos adolescentes de maneira positiva.
Antônio Carlos Gomes da Costa, em sua vasta publicação, indica alguns
princípios que devem ser observados na ação socioeducativa com criança e jovens em
situação de risco social e, no caso específico, com adolescentes em conflito com a lei
nas instituições socioeducativas:
A Pedagogia da Presença gera o exercício de uma influência construtiva,
criativa e solidária do educador sobre a vida do educando, gerando a este a
106
40
Autor: José Bernardo Toro, 1997 – Colômbia. Tradução e adaptação: Prof. Antonio Carlos Gomes da
Costa. Fonte: Site do Modus Faciendi: http://www.modusfaciendi.com.br/: Capacidades e competências
mínimas para participação produtiva no século XXI: 1 - Domínio da Leitura e da escrita; 2 - Capacidade
de fazer cálculos e de resolver problemas; 3 - Capacidade de analisar, sintetizar e interpretar dados, fatos
e situações; 4 - Capacidade de compreender e atuar em seu entorno social; 5 - Receber criticamente os
meios de comunicação; 6 - Capacidade para localizar, acessar e usar melhor a informação acumulada.; 7 -
Capacidade de planejar, trabalhar e decidir em grupo..
107
41
Departamento Geral de Ações Socioeducativa, responsável pela execução da medida socieducativa de
internação e semiliberdade e pelo acautelamento de adolescentes em conflito com a lei em internação
provisória como de termina o ECA, apresentado no capitulo anterior.
108
o que a instituição realmente faz com os adolescentes em conflito com a lei e aquilo que
oficialmente deveria fazer constitui a face mais perversa de atuação do Estado contra
esses sujeitos excluídos de sua própria existência.
Desde 2007, o DEGASE vem produzindo inúmeros documentos que indicam
uma mudança significativa na política que direciona o atendimento em suas unidades
socioeducativas e no atendimento aos adolescentes. A estrutura física das unidades vem
adquirindo novos contornos estéticos e funcionais; o investimento em recursos humanos
também faz parte dessa política de gestão estatal.
Iniciaremos esta discussão a partir de uma visão geral do Sistema
Socioeducativo do Estado do Rio de Janeiro – DEGASE; para isso, torna-se
fundamental a compreensão do fluxo de atendimento ao adolescente em conflito com a
lei no Rio de Janeiro, desde a sua apreensão até o atendimento de internação no
DEGASE
Internação Provisória42
A internação provisória e a aplicação de medidas socioeducativas, no Estado
do Rio de Janeiro, estão previstas em sintonia com a legislação em vigor, cabendo ao
DEGASE o atendimento inicial e a triagem, internação provisória e execução das
medidas de semiliberdade e internação. Tal fluxo inicia-se com a apreensão do
adolescente em conflito com a lei por unidade policial em situação de flagrante de ato
infracional e/ou por determinação judicial (mandado de busca e apreensão por
descumprimento de medidas impostas anteriormente e/ou por denúncias previamente
apuradas, indicando cometimento de ato infracional). O adolescente apreendido é
encaminhado à delegacia especializada – Delegacia de Polícia da Criança e do
Adolescente - DPCA. No Estado do Rio de Janeiro, existem apenas duas delegacias
especializadas, uma na cidade do Rio de Janeiro e outra em Niterói. Os demais
municípios do estado não possuem delegacias especializadas, prejudicando as
determinações legais na apreensão e encaminhamento do adolescente em conflito com a
lei.
No caso de indícios de cometimento de ato ilícito grave ou de risco da
comunidade e do adolescente (integridade física e moral), o adolescente é encaminhado
ao DEGASE para os primeiros atendimentos no Centro de Socioeducação Gelso de
Carvalho Amaral (CENSE-GCA), onde geralmente permanece em período inferior a 24
horas, sendo encaminhado para a internação provisória.
As unidades do DEGASE responsáveis por atender aos adolescentes em medidas
de internação provisória são: CENSE Professor Antonio Carlos Gomes da Costa, para
adolescentes do sexo feminino; para adolescentes do sexo masculino, a internação
provisória concentra-se no Centro de Socioeducação Dom Bosco (CENSE DB) e os
anexos das unidades Escola João Luiz Alves (para adolescentes de 12 a 14 anos da
Capital) e Centro de Atendimento Intensivo de Belford Roxo inaugurados em 2012
(adolescentes da Baixada Fluminense).
Apesar de a internação provisória não ser, de fato, uma medida socioeducativa, e
sim uma medida processual de natureza cautelar, alguns aspectos referentes a ela
precisam ser esclarecidos.
42
A internação provisória é um procedimento aplicado antes da sentença julgada, quando há indícios
suficientes de autoria e materialidade do ato infracional cometido pelo adolescente ou quando há um
descumprimento de ordem anteriormente aplicada pelo Poder Judiciário. Conforme prevê o artigo 183 do
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a internação provisória caracteriza-se pela privação de
liberdade com duração máxima de 45 dias, período em que são realizados os estudos técnicos que
subsidiam a aplicação da medida socioeducativa determinada pelo Poder Judiciário
110
43
Segundo estabelece o artigo 227, da Constituição Federal, “§3º: O direito à proteção especial abrangerá
os seguintes aspectos: V- obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição
peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa de liberdade”.
44
Ver artigos 124 e 94 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.
111
45
ECA - Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de
transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de
autorização judicial. § 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que
possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade. § 2º A medida não comporta prazo
determinado aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação.
46
ECA - Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de
brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento .
47
No DEGASE, existem 17 unidades de medidas socioeducativas de semiliberdade, os Centros de
Recursos Integrados de Atendimento ao Adolescente ( CRIAAD), localizados em vários municípios do
estado do Rio de Janeiro.
48
Ao completar 21 anos, a medida socioeducativa se extingue. O adolescente é posto em liberdade.
112
de atos infracionais, do sexo feminino, com idade entre 12 e 21 anos incompletos, antes
ou depois de proferida a determinação judicial de internação.
Os documentos pesquisados, produzidos pelo DEGASE, e as unidades de
internação, internação provisória e as de semiliberdade construídas e reformadas ao
longo dos últimos três anos demonstram uma reestruturação do departamento, sendo
apresentado nos discursos oficiais como um Novo DEGASE e com uma nova diretriz:
a socioeducação – educação para a sociedade49.
O trabalho socioeducativo passa a ser visto como uma resposta às premissas
legais do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como às demandas sociais do
mundo atual.
Segundo Costa (2006), a socioeducação decorre de um pressuposto básico de
que o desenvolvimento humano deve se dar de forma integral, contemplando as
múltiplas dimensões do ser. A opção por uma educação que vai além da escolar e
profissional está intimamente ligada a uma nova forma de pensar e abordar o trabalho
com o adolescente.
A unidade educativa deve ser capaz de oferecer um leque, um cardápio, uma
pluralidade de modalidades educativas ao educando, que lhe possibilite
desenvolver sua autonomia (capacidade de decidir segundo suas crenças,
valores, pontos de vista e interesses); sua solidariedade (capacidade de atuar
como solução e não como problema em questões relativas ao bem comum);
sua competência(desenvolvimento de competências pessoais, relacionais,
produtivas e cognitivas). (COSTA, 2006, p. 67)
49
O conceito de socioeducação apresentado pelo Novo Degase se inspira nas obras de Antônio Carlos
Gomes da Costa (2004, 2005, 2006 e 2010).
113
A disciplina é uma tecnologia específica do poder, ela é “um tipo de poder, uma
modalidade para exercê-lo, que comporta todo um conjunto de instrumentos, de
técnicas, de procedimentos, de níveis de aplicação, de alvos; ela é uma física ou uma
anatomia do poder, uma tecnologia” (FOUCAULT, 2000c, p. 177).
50
Nas unidades socioeducativas do Novo DEGASE, foram instaladas câmeras de filmagem em locais
estratégicos que transmitem e gravam imagens constantes para setores de segurança do Sistema
Socioeducativo Estadual.
114
Parte II
51
Deleuze estrutura sua teoria do sentido em uma série de paradoxos que estão intimamente ligados. “O
sentido é o exprimível ou o expresso da proposição e o atributo do estado de coisas”. Assim, “o
acontecimento é o próprio sentido” e ele “pertence essencialmente à linguagem” (DELEUZE, 1974, p.
25.) Para Deleuze, sentido e não-sentido têm uma relação específica que não pode ser extraída de uma
relação de exclusão, de verdadeiro-falso (DELEUZE, 1974). Ao elencarmos os discursos como
118
Capital da cidade do Rio de Janeiro. Para isso, houve inúmeras reuniões e solicitações
de documentos, entre a pesquisadora e os Juízes ou seus representantes, levando cerca
de nove meses para a plena liberação da pesquisa.
Fazendo parte desta pesquisa, dados estatísticos da própria instituição e do
DEGASE, relatórios, projeto pedagógico, entre outros documentos administrativos,
foram analisados para desvelar os gestos e tentar reconstruir a realidade dos
adolescentes que hoje estão sendo, segundo o discurso construído pelos agentes do
poder, atendidos pelas medidas socioeducativas de internação e internação provisória do
Estado do Rio de Janeiro.
Os adolescentes pobres, negros, excluídos da saúde, da educação, são, também,
em princípio, excluídos do consumo. A forma de se tornar participante desta sociedade
é através do submundo do crime, levando-os à escola-prisão, em um círculo vicioso de
vulnerabilidade, violência e exclusão. Porém, a exclusão começa bem antes, como
teremos a oportunidade de observar, lendo os depoimentos que reproduzimos a seguir.
120
55
Os adolescentes do sexo masculino da capital são atendidos em medidas de internação nas seguintes
unidades: Escola João Luiz Alves (Bairro Ilha do Governador) e Educandário Santo Expedito (Bairro
Bangu).
121
(...) nós já tivemos aqui 90, 60, num módulo fica impossível você trabalhar
do ponto de vista técnico, o agente também, ele (agente socioeducativo de
plantão) com uma relação per capta de muitos adolescentes para atender, a
unidade fica tensa, os conflitos eclodem com mais facilidade e eles também
vão acabar se estressando. (Socioeducador técnico - psicólogo)
56
Entende-se que o sofrimento psíquico pode se manifestar em articulações entre a singularidade dos
afetos individuais e a coletividade, no caso específico, no espaço social da ação produtiva, isto é, a ação
originária do trabalho em privação de liberdade. Nessa perspectiva, as instituições de internação/ privação
de liberdade reúnem situações adversas que expõem os trabalhadores ao acirramento do sofrimento
psíquico, tais como “relações hierárquicas rígidas, contato cotidiano com a violência, trabalho em espaços
confinados, divisão em turnos e prejuízos à percepção de ressonância simbólica no trabalho” (RUMIN et
alli, 2011).
122
57
A resolução de 29 de outubro de 1996, publicada no DOU Seção 1 de 08/01/97, regulamenta a execução
da medida socioeducativa de internação prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n°
8.069/90.
123
No período de 2010 a 2012, foi construída uma nova edificação junto à quadra
esportiva, nos moldes do SINASE, para atender a adolescentes na recepção inicial e
internação provisória, com capacidade para atender a 25 adolescentes.
A capacidade de atendimento de todo o complexo é de 130 adolescentes em
internação e 20 adolescentes em internação provisória.
Cabe destacar que o CAI BR foi construído anteriormente às determinações do
SINASE, apresentando inadequações a seus parâmetros:
(...) situação esta que impõe um esforço em construções de unidades
socioeducativas, especialmente para superar tais violações de direitos. Em
que pese o esforço da Secretaria de Direitos Humanos nos últimos anos em
apoiar mais de 80 obras nos Estados para a adequação e, sobretudo, a
construção de novas unidades socioeducativas que viessem a minimizar as
condições inadequadas destas e a falta de vagas para suprir a demanda.
(Levantamento Nacional Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em
Conflito com a Lei 2010, Brasília 2012, p.32)
Não há porta de saída. Há apenas uma entrada lateral, por meio de um portão de
ferro. Para entrar no complexo, é necessário se identificar. E, quando a entrada é
permitida, através de autorização prévia da equipe técnica ou da direção, o visitante é
revistado, precisando, algumas vezes, despir-se na presença dos responsáveis pela
segurança do local, os agentes socioeducadores58.
O prédio principal do CAI BR, local da execução de medida socieoeducativa de
internação, abriga e irradia as diretrizes administrativas, socioeducativas e de segurança
para todo o complexo de atendimento ao adolescente: recepção inicial, internação
provisória e internação.
Após ultrapassar os muros do CAI Belford Roxo, deparamo-nos com um grande
terreno com a edificação de dois prédios separados por uma quadra esportiva e
contornados por estacionamentos e espaços vazios.
Figura 11: Imagem do CAI BR (1 - prédio principal, 2 - quadra esportiva e 3 -
unidade de recepção e internação provisória)
58
No CAI Belford Roxo, há procedimentos de rotina institucional na autorização de visita aos
adolescentes através de revistas minuciosas (Plano de Segurança Socioeducativa do Departamento Geral
de Ações Socieducativa, 2012), quando os visitantes são orientados a despir-se para verificação de porte
de objetos proibidos de entrada na instituição. Tal procedimento é relatado por funcionários entrevistados
para “garantir a segurança da instituição”.
125
A sua estrutura também se semelha ao prédio principal: entrada com duas salas
para os primeiros atendimentos e triagem, que abrem passagem para um pátio interno
127
coberto, de onde não é mais possível ver a parte externa. Nesse pátio, distribuem-se à
direita e à esquerda os alojamentos, o solário e a sala de jogos. O pátio é polivalente,
pois nesse espaço, onde são servidas as refeições e lanches, acontecem a visita das
famílias e as atividades em grupos de educação, TV e jogos. Todos os espaços
estruturados se remetem para o pátio interno.
Figura 16: Solário Prédio Internação Provisória
A quadra que liga um prédio ao outro serve para separar dois mundos: o da
internação e o de sua “porta de entrada” – a internação provisória.
O espaço praticado pelas rotinas institucionais prevê essa separação de corpos
para a visibilidade constante, o controle do espaço e da atividade.
Já viu a câmera, filmando a gente? La no corredor e na rampa tem
No refeitório também, na visita...É na enfermaria, na quadra também ! Na
escola?, só no corredor , eu acho...
Tem vezis que eu vejo o seu mexendo, acho que vira pra dento do
alojamento
Nos não sabe onde fica a TV pra vê a gente , acho que fica na sala do diretor
(Grupo Focal 3 Adolescentes )
Em resumo, para Foucault, a disciplina produz, a partir dos corpos que controla,
quatro tipos de individualidade ou, antes, uma individualidade dotada de quatro
características:
É celular (pelo jogo da repartição espacial), é orgânica (pela codificação das
atividades), é genética (pela acumulação do tempo), é combinatória (pela
composição das forças). E, para tanto, utiliza-se de quatro grandes técnicas:
constrói quadros; prescreve manobras; impõe exercícios, enfim, para realizar
a combinação das forças, organiza “táticas”. (2000c, p.150)
O domínio sobre os corpos é apenas uma das táticas da disciplina e, no caso das
instituições socioeducativas, CAI Belford Roxo, a intervenção sobre o corpo
adolescente constitui uma das grandes preocupações, como já vimos. Dos aspectos
apontados por Foucault, destacamos aquilo que ele designou de “recurso para o bom
adestramento” e, mais especificamente, aquilo que nomeou de “sanção normalizadora”
(ibidem, p.162). Para o autor, os mecanismos de sanção supõem pelo menos cinco
aspectos. O primeiro (1) é que, na origem de todos os sistemas disciplinares, funciona
um pequeno mecanismo penal na oficina, na escola ou no exército, atuando como
repressora uma micropenalidade do tempo, da atividade, da maneira de ser, dos
discursos, do corpo e da sexualidade. Para Foucault, toda uma série de processos sutis –
que vão do castigo físico leve a privações ligeiras e pequenas humilhações – é utilizada
a título de punição:
130
avalia os indivíduos “com verdade”; a penalidade que ela põe em execução se integra no
ciclo de conhecimento dos indivíduos (FOUCAULT, 2000c).
A bipolaridade instituída pelo modelo da premiação-sanção, ao lado da
identificação dos “bons” e “maus”, permite legitimar procedimentos de reforço dos
primeiros e de intimidação dos outros, naturalizando, assim, uma tecnologia da punição.
Finalmente, Foucault assinala que esse sistema de classificação/hierarquização
(5) não é fixo, pois os indivíduos pertencentes às últimas classes poderão se deslocar
para as primeiras e vice-versa. Nenhuma das posições adquiridas deve ser considerada
fixa, podendo flutuar em virtude do maior ou menor atendimento às normas e
exigências estabelecidas. Para Foucault, a penalidade hierarquizante apresenta um duplo
efeito: distribuir os adolescentes segundo suas aptidões e exercer sobre eles uma pressão
constante, para que todos se submetam ao mesmo modelo, para que sejam obrigados,
todos juntos, à subordinação, à docilidade, à atenção nos estudos e nos exercícios e à
exata prática dos deveres e de todas as partes da disciplina, “para que todos se
pareçam”.
Em suma, a arte de punir, no regime do poder disciplinar, não visa nem à
expiação, nem mesmo exatamente à repressão. Põe em funcionamento operações bem
distintas: relacionar os atos, os desempenhos, os comportamentos singulares a um
conjunto, que é ao mesmo tempo campo de comparação, espaço de diferenciação e
princípio de uma regra a seguir. Diferenciar os indivíduos em relação uns aos outros e
em função dessa regra de conjunto; [...] medir em termos quantitativos e hierarquizar
em termos de valor as capacidades, o nível, a “natureza” dos indivíduos; fazer
funcionar, através dessa medida “valorizada”, a coação de uma conformidade a realizar;
enfim, traçar o limite que definirá a fronteira externa do anormal [...]. A penalidade
perpétua que atravessa todos os pontos, e contra todos os pontos, e contra todos os
instantes das instituições disciplinares, diferencia, hierarquiza, homogeneíza, exclui, em
uma palavra, ela normaliza. (FOCAULT, 2000c).
Erving Goffman (1999) define como instituições totais aquelas que se
caracterizam pelo fechamento em si mesmo. Na sua teorização, propõe cinco tipos de
instituições dessa natureza. A primeira seria constituída para cuidar de pessoas
consideradas incapazes e inofensivas (casas para velhos, órfãos e indigentes). Há ainda
locais para os incapazes de cuidar de si mesmos e que são também uma ameaça à
comunidade, embora de maneira não-intencional (sanatórios). Outras instituições totais
podem ser aquelas organizadas para proteger a comunidade contra perigosos
132
passam a receber, em grupo, o estigma pelo qual são conhecidos na sociedade: menores
infratores. Todos iguais, sem rostos, uniformizados, instalados em um espaço limpo,
higienizado, coletivo.
Figuras 19, 20 e 21: Foto dos Alojamentos Superiores
Ao ser internado, a instituição define um novo status jurídico, social e civil para
o adolescente: infrator, bandido e menor. Assim, a priori, atribui-se um rótulo/estigma
ao adolescente e passa-se a tratá-lo como tal.
135
59
Quando solicitamos a visita aos alojamentos, houve uma comunicação via rádio e ouvimos os agentes
socioeducadores solicitando que os adolescentes vestissem o uniforme. Não foi entregue aos adolescentes
tal vestimenta, eles permaneceram nos alojamentos. Assim, supomos que estavam de posse dos
uniformes.
60
Comarca – cama de alvenaria.
136
A descrição que eles mesmos fazem dos alojamentos expõe sem subterfúgios a
forma como são tratados na escola-prisão.
O cotidiano desses adolescentes indica que a sua ligação com o mundo exterior
se faz através dos artefatos comunicacionais. O rádio, a televisão, ao lado das
brincadeiras agressivas entre eles, mostram o universo, muitas vezes desconhecido,
existente nessas prisões-alojamentos.
Tem vezes que a gente, pra acender o cigarro, faz curto, aí pifa a TV ou o
ventilador, aí todo o alojamento paga, e o seu descobre, todo mundo fica sem
sucata, é o maior oprimissão.
A gente vê jornal, pra tê notícia da pista, novela e filme 62. (Grupo Focal 2 -
Adolescentes)
61
Quadrado – área próxima ao alojamento, espaço livre com grades e banheiro, não há moveis e sua
localização possibilita a vigilância constante dos agentes de disciplina - socioeducativos.
62
Faz curto – causar propositalmente um curto-circuito na rede elétrica causando faíscas; sucata –
alimentos, material para higiene pessoal (barbeador, desodorante, escova de dente ) e cigarros.
137
Um conjunto de bens individuais tem uma relação muito grande com o “eu”. A
pessoa geralmente espera ter certo controle da maneira de apresentar-se diante dos
outros. Para isso, precisa de cosméticos e roupas, instrumentos para usá-los, ou
“concertá-los”, bem como de um local seguro para guardar esses objetos. Em resumo, o
indivíduo precisa de um “estojo de identidade” (GOFFMAM, 1999, p. 28) para controle
de sua aparência pessoal.
O adolescente do CAI BR, ao entrar na instituição total, é despido de sua
aparência usual, bem como dos equipamentos e serviços que os mantêm, vinculados ao
mundo, provocando uma desconfiguração pessoal, uma aniquilação da subjetividade.
Diante de tudo isso, um tipo de resposta defensiva precisa ser construída. Assim,
os adolescentes procuram ressignificar a realidade através de seus próprios atos
comunicacionais, rompendo a barreira colocada entre eles, como indivíduos, e o mundo
lá fora: ouvem música, veem televisão, desenham nas paredes, escrevem e registram em
seus próprios corpos, elementos de sustentação da sua subjetividade: “nós fez na marra.
Nós dá nosso jeito. Nós dá nosso jeito, nós não é quadrado, nós é redondo” (Grupo focal 1 -
Adolescentes).
Os gestores indicam a falta de estrutura para um trabalho socioeducativo
individualizado, previsto em lei:
138
Eles acham que eles têm que botar uma havaiana no pé e a gente acha que
havaiana não é importante. Eles acham que têm que cortar o pé do cabelo e
ficar bonitinho, tem unidades ai que se preocupam com isso, mas com a
gente aqui não, acho que tem que cortar o cabelo normal e deixar pra cortar o
cabelo lá fora, até porque a gente não tem estrutura pra poder cortar o cabelo
de todo mundo bonitinho e quando eles vão cortar o cabelo, eles cortam com
a lâmpada. Caco de lâmpada, eles vão e fazem o pé do cabelo deles, isso a
gente não quer. Como a gente não tem estrutura, não tem uma estrutura ainda
de ter um curso e quem venha aqui, um profissional, que corte o cabelo deles,
tudo certo, mas se não tem isso, tem que cortar o cabelo daquele padrão.
(Diretor adjunto)
A perda do estojo de identidade pode impedir que o adolescente apresente, aos outros,
a imagem usual de si mesmo. Na internação, a imagem que apresenta de si mesmo é
descaracterizada, é substituída e padronizada: o corte do cabelo, a sandália fornecida pela
unidade, o uniforme, entre outros.
A vigilância constante faz parte desse lugar disciplinar. É preciso multiplicar os
olhos para vigiar todas as ações desses sujeitos. A existência, durante as 24 horas do
dia, de agentes de vigilância mostra que a lógica disciplinar não apenas cerceia a
liberdade, como também instaura uma vigilância ininterrupta, que não é somente
exercida pelos agentes socioeducativos de plantões, mas por todos que fazem parte da
instituição. A perda da possibilidade de ir e vir, mesmo intramuros, evidencia que a
estratégia disciplinar tenta instaurar também o controle do corpo.
Uma citação de Foucault (2000c, p233.) fala explicitamente desse olhar que
paira na instituição: “(...) o olho do gênio que tudo sabe acender abarca o conjunto desta
vasta máquina, sem que o mínimo detalhe lhe possa escapar”63.
Trata-se da máquina panóptica a que Foucault faz referência, utilizando-se do
modelo do Panóptico de Bentham para falar da sociedade disciplinar e de seus
instrumentos. O panóptico dissocia o par ver-ser visto, sustentando uma relação de
poder independente daquele que o exerce, um poder que se presentifica como não
localizado, mas que se pauta “numa certa distribuição dos corpos, das superfícies, das
luzes, dos olhares”. Pauta-se também “numa aparelhagem cujos mecanismos internos
produzem a relação na qual se encontram presos os indivíduos”. Foucault ainda
completa: “quanto mais numerosos esses observadores anônimos e passageiros, tanto
mais aumenta para o prisioneiro o risco de ser surpreendido e a consciência inquieta de
ser observado” (2000c, p. 167).
Há uma rotina de atividades a serem cumpridas, criando procedimentos e
posturas de corpo e gestos, assim como diálogos. Os agentes socioeducativos de plantão
63
THEILLRD, J. B. apud FOUCAULT, 2000c, p. 179.
139
são trocados pela manhã. Quando um novo agente assume, os adolescentes são
contados. São chamados por grupos para o café da manhã. Nesse instante, são
“obrigados” a se sentarem com as pernas juntas em fileira no chão do pátio interno. A
chamada é feita pelo número da matrícula. Essa rotina se repete para qualquer atividade
em grupo.
Os adolescentes são obrigados a manter o corpo em posição humilhante e a dar
respostas verbais também humilhantes. Assim, só podem chamar os agentes por
“senhor”. Devem pedir para realizar as menores tarefas, mesmo as mais rotineiras,
como, por exemplo, ir ao banheiro ou acender um cigarro. Nas instituições totais, há
múltiplas formas de mortificação.
Segundo Goffmam, “nas instituições totais esses territórios o eu são violados; a
fronteira que o indivíduo estabelece entre seu ser e o ambiente é invadida e as
encarnações do eu são profanadas” (1999, p. 31).
Todos os horários do dia são rigorosamente preenchidos e controlados em uma
rotina que se repete diariamente. A rotina estabelece horários rígidos para as atividades
escolares, para as refeições e para a prática esportiva. Uma forma de castigo comumente
usada é a interdição aos esportes.
Os adolescentes são divididos em grupos: Escola64, Oficinas pedagógicas65,
Atividades esportivas na quadra e Atividades de iniciação para o trabalho66. As rotinas
na instituição foram criadas pela direção e suas duas equipes gestoras: equipe técnica e
equipe de plantões. Frente a essas equipes, temos a coordenação técnica, a coordenação
das oficinas e as coordenações de plantões. As rotinas institucionais podem ser alteradas
conforme as demandas desse grupo gestor.
As atividades diárias são acompanhadas pelos agentes socioeducativos de
plantão que vigiam todos os deslocamentos dos adolescentes. Esse grupo de
funcionários do plantão é responsável pela segurança disciplinar na Unidade. Para isso,
são autorizados a aplicar sanções aos adolescentes indisciplinados. As
institucionalizadas são a perda da “sucata”67 (cigarros, refrigerantes, biscoitos recebidos
durante as visitas dos familiares) e o isolamento no “quadrado”. Outras, como agressões
64
O Colégio Estadual Barbosa Lima Sobrinho, convênio DEGASE / Secretaria de Educação do Estado do
Rio de Janeiro, atende ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio, no Espaço Centro Pedagógico: salas
de aulas adaptadas no CAI Belford Roxo.
65
Teatro, artes, assistência religiosa, informática, capoeira.
66
Mercado, tingimento de camisas, silk screem,
67
Sucata – termo utilizado pelos funcionários da unidade no CAI BR e em outras unidades do DEGASE.
140
físicas e verbais, são passíveis de sanções funcionais, apesar de ainda aparecerem nos
relatos de adolescentes e socioeducadores (técnicos e agentes).
Todas as rotinas e ações diárias realizadas na instituição são registradas nos
livros de ocorrências dos agentes socioeducadores do plantão, da secretaria técnica e
dos técnicos.
Figura 24: Rotina do CAI
8 às 8:45 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
8:45 às 9:31 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
Intervalo: 9:30 às 9:45 (Escola) ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
9:45 às 10:31 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
10:30 às 11:16 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
10:30 às 11:17 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
11:20 Almoço
12 às 13:00 descanso nos alojamentos des ca ns o nos a l oja mentos
13 às 13:45 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
13:45 às 14:30 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
Intervalo: 14:30 às 14:45 (Escola) ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
14:45 às 15:30 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
15:30 às 16:15 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
16:15 às 17:00 ESCOLA ou Ati vi da des de profi s s i ona l i za çã o, ou educa çã o fi s i ca ou a tivi da de peda gógi ca
17:00 jantar
17:20 recolher - Alojamento
68
“Cara”: agente socioeducativo; “comédia”: pessoa ou pessoas que se comportam fora do esperado.
141
- Juiz fala que como, que nossa mãe não pode encostar em nós, se nossa mãe
encosta em nós eles fala que tá errado, por que eles pode encostar? Como é
que é isso? Nossa família não pode e eles pode. (Grupo Focal 1 –
Adolescentes, grifo nosso)
69
“Sucata”: objetos e alimentos trazidos pelas famílias para os adolescentes nos dias de visita: biscoitos,
cigarro, refrigerantes; “X9”: delatores; “fecha com o plantão” – pactuam com os socioeducadores.
70
O poder disciplinar é com efeito um poder que, em vez de se apropriar e retirar, tem a função maior de
“adestrar” ou adestrar para retirar e se apropriar de forma ainda mais eficaz. (FOCAULT, 2000c)
142
71
ECA, Artigo 57, “novas experiências e propostas relativas a calendário, seriação, currículo,
metodologia, didática e avaliação com vista à inserção de crianças e adolescentes excluídos do Ensino
Fundamental obrigatório”.
143
72
ECA e SINASE – internação provisória não poderá ultrapassar o período de 45 dias.
73
DECRETO Nº 42.837 DE 04 DE FEVEREIRO DE 2011. Diário Oficial do Estado do RJ. 7 de fevereiro
de 2011. Art. 2º - Fica renomeada a Coordenadoria Especial de Unidades Escolares Prisionais e
Socioeducativas para Regional Pedagógico-Administrativa que, na estrutura básica da Secretaria de
Estado de Educação, fica vinculada à Subsecretaria de Gestão de Rede e de Ensino. E cria-se a diretoria
especial de unidades escolares prisionais e socioeducativas – DIESP SEDE: RIO DE JANEIRO Área de
Abrangência: 18 unidades escolares prisionais e socioeducativas.
74
Decreto 29218, publicado no Diário Oficial no dia 17 de setembro de 2001.
145
75
Segundo a Secretaria de Estado de Educação encontra-se em processo de elaboração o novo Plano
que irá atender às Diretrizes Nacionais de Educação em Prisões, em parceria com o Ministério da Justiça
e a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, criando atividades adequadas a esse ensino
diferenciado e integrando as práticas pedagógicas à rotina das unidades prisionais e socioeducativas de
internação. O novo Plano vai atender às Diretrizes Nacionais de Educação em Prisões.
76
“ atrasar” Ser prejudicado no andamento do processo socioeducativo , não cumprir as normas o que
levaria ao aumento de período de internação
77
“Cadeia” – refere-se a unidade de internação , portanto, o CAI BR; “sucata” objetos e alimentos
trazidos por familiares durante as visitas para os adolescentes internados do CAI BR
147
Estadual de 100% dos adolescentes internados em março de 2013, o que difere essa
unidade de outras unidades socioeducativas do Sistema DEGASE. Isso porque o direito
à escolarização estabelecido pelo ECA, LDB e CF é exceção dentro do próprio sistema.
Os adolescentes compreendem os dispositivos disciplinares, envolvendo o
processo de escolarização: “porque é cadeia mesmo”, “vigiando 24 horas”, “aqui é
obrigado a estudar”; e a sanção normalizadora: “se não quiser ir pra escola, nós perde
sucata” e aqui nós “faz uma atividade, senão nós vai se ‘atrasar’”. (FOUCAULT,
2000c).
Tal discurso apresenta várias faces do processo de escolarização. A interface
medida socioeducativa e escolarização: “aqui nós faz uma atividade, senão nós vai se
‘atrasar’” indica a escolarização como parte do processo socioeducativo, no
comportamento esperado-determinado do adolescente cumprindo a medida de
internação e o registro desse comportamento, a ser relatado pelos olhares dos técnicos
ao Juizado.
No relatório técnico nós colocamos que o adolescente está estudando e
fazendo as atividades profissionais. Às vezes a gente até pede para eles
ficarem um pouco mais para terminar o ano ( série escolar). E aí, a gente
encaminha para uma escola na comunidade que eles irão, para o CRIAAD
ou próxima à residência. A escola é muito importante, muitos deles só voltam
a estudar aqui no CAI BR, a maioria está sem estudar há muito tempo.
Quando o relatório é enviado para o juiz ou quando o adolescente é entregue
à família nós encaminhamos junto a declaração de escolaridade. (Entrevista
com pedagogo)
79
“Já é” - Confirmação, algo positivo; “batique” - estamparia em camisa
152
Há, portanto, muitas lacunas, pontos de fuga, resistência e astúcia dos sujeitos
ordinários (CERTEAU, 2000) na escolarização dos adolescentes precisando ser
analisadas e avaliadas no âmbito das políticas públicas e das práticas das cotidianas. O
poder e a liberdade são internos um ao outro. Localizam-se em um plano em que estão
confinados em uma incessante provocação, promovida por uma trama de reformulações
e redefinições contínuas das estratégias que se estabelecem na teia das relações de
poder.
Como pontua Goffman (1999, p.8) em seus estudos sobre as “instituições
totais”, faz-se necessário “tentar conhecer o mundo social do internado [...] na medida
em que esse mundo é subjetivamente vivido por ele”. Conhecer esse mundo requer
aproximações dos educadores/socieducadores preocupados com a inclusão social e com
os sujeitos que dele fazem parte: os adolescentes, os professores, os agentes
socioeducativos e os gestores das políticas públicas para a adolescência.
Essas questões resultam da conexão entre o questionamento do próprio sujeito por outro
ou por ele mesmo e pela vida.
Quando se analisa a prática de poder, o problema se torna saber o modo como se
dá a interferência no processo de subjetivação.
Essa descrição abstrata do poder e saber disciplinar como interferência torna-se
concreta ao situar historicamente a instituição de internação do adolescente infrator e
sua implementação na produção de subjetividade dos encarcerados.
Foucault (2000c) nos possibilita a compreensão do sistema prisional –
penitenciário – enquanto elemento do corpo social revestido de toda autoridade e
especificidade para falar sobre aquele que se torna “delinquente”. O sujeito que opta
pela via da transgressão criminosa se faz reconhecido pelo registro da delinquência.
Sendo o aprisionamento viabilizador de toda uma sistematização de saberes, acaba
também por nomeá-lo como um de fora de toda a lógica vigente, colocando-o no lugar
da exclusão e da diferença pela ruptura que produz.
A delinquência é tratada por Foucault a partir de uma leitura que a concebe
como lugar produzido social e historicamente.
O autor esclarece que, embora haja uma contradição na própria estruturação das
instituições de internação fundada no discurso humanista, como doutrina de
ressocializar e, assim, devolver para a sociedade um sujeito normal, na verdade essas
produzem, através de seus dispositivos e técnicas disciplinares, a delinquência. E não
poderia ser de outra forma, já que o objetivo último da relação com a diferença
provocada pela delinquência é a manutenção das relações de poder. Daí a necessidade
de separar, recolocando cada um no seu lugar a todo o momento. Interior e exterior têm
que estar bem demarcados.
Aquele que está fora deve ser mantido nessa situação e, sobretudo, contido. É
dessa forma que as instituições de internação dos adolescentes em conflito com a lei
ganham lugar de primazia, na medida em que se instauram como estruturas falantes, as
quais se articulam na própria lógica de funcionamento discursivo, que imprime no
sujeito falado a incorporação da delinquência enquanto subjetivação.
80
Optamos , nesta parte da pesquisa por utilizar nomes fictícios dos adolescentes .
81
Optou-se por conservar o original tal como foi construído pelos autores, não operando reescrita que
eliminasse os erros de português. O nome dos adolescentes foram alterados para garantia do sigilo
determinados legalmente.
82
A problematização de Foucault centra-se nas formas de compreensão que o sujeito cria acerca de si
próprio.
157
Eu espero que esta carta seja um tipo de ajuda para vocês e pra mim. (...)
George, minha mãe falou que você está com um cavalo, e está muito metido.
Peço muito a Deus por você também, que você nunca vem parar aqui, porque
aqui é um verdadeiro inferno (...) Eu quero pedir a vocês, orem por mim, que
eu estou orando também para todos vocês, um dia a gente vai poder
comemorar juntos (...). (Carta de Tiago)
que esse lugar produz para aquele que transgride. Ao mesmo tempo, coloca no outro, no
caso representado pela avó e pela mãe, a possibilidade de mudança: “só você e minha
mãe pra fazer eu mudar”.
Ao simplificar a inquietação da situação em que se encontra, propõe, ao mesmo
tempo, um sentido para a sua vida, evitando a marca do radicalismo. Nesses dois
procedimentos – simplificação e (des)complexificação situação –, aparece também
como problemática presente no discurso a ambiguidade do cuidado de si83.
Certamente, para se constituir como sujeito, há a necessidade de constituição de
si como objeto de cuidado. Inversamente, cada cultura irá designar o que precisa ser
cuidado a partir de um jogo de ameaça com o descuido e, simultaneamente, irá instaurar
alguns indivíduos ou instituições como responsáveis por cuidar dos outros. Promete-se
o bálsamo na condição de curar a ferida e dar legitimidade a alguns que nos conduzirão
pelo resto do caminho.
Por último, o processo de subjetivação supõe a capacidade de o indivíduo não
apenas mudar a si mesmo, mas também intervir no espaço que o produz. As relações de
poder também interferem nesse processo, ao suscitar no indivíduo o sentimento de
impotência. Diego afirma no final da carta: “eu estou na cadeia mas ainda tenho um
pouco de amor para todos”. Trata-se da necessidade de resgate de laços afetivos como
estratégia de resistência.
Foucault procurou entender como o sujeito humano se constitui ao entrar nos
jogos de verdade-saber e nas relações de poder. Ao entrar nas instituições disciplinares,
regidas pelas práticas de disciplinas do tempo e do espaço, o sujeito humano vai se
definindo como indivíduo, ao viver e ao produzir atos de fala.
Na realidade, Foucault (1997) afirmou que nas relações de poder os sujeitos
estão sempre, uns em relação aos outros, em uma situação estratégica. Ao se sobrepor
ao outro, determina-se a rigor a conduta a ser seguida.
Os adolescentes do CAI Belford Roxo se constituem enquanto sujeitos em um
dilema inquietante: ao mesmo tempo em que se esforçam por pertencer ao grupo dos
designados como normais, no sentido de tornarem-se cidadãos e por isso reintegrados à
sociedade, são sobredeterminados por um discurso que mais parece (des)sujeitá-los.
Esse discurso fixa-os, no nível identificatório, como aqueles que produzem atos
83
Cuidado de si (Foucault, 1982), conceito cunhado a partir da hermenêutica do sujeito na compreensão
das práticas de si e na problematização das relações entre o sujeito e os jogos de verdade.
159
A luta travada no interior do texto que Thales produziu é entre a inclusão nos
padrões considerados aceitáveis e a realização de seus desejos individuais. Assim, ele
mesmo já não se considera “aquele que todo mundo diz que sou”. As estratégias de
inclusão colocam em destaque o fato de que vai trabalhar e a mudança na sorte
demarcada previamente a partir do milagre possibilitado pela oração de alguém, no caso
a namorada, que deveria na igreja “pensar sempre em mim” e “orar por mim”. Dessa
forma, quase milagrosamente, ele passaria a ter também “bons pensamentos”.
Assim, os adolescentes aprisionados se constituem a si mesmos como sujeitos
delinquentes ou como sujeitos não delinquentes, através de certas práticas que são jogos
de verdade, práticas de poder em relação e em face daquele que os declara delinquentes.
O adolescente Thales afirma “não sou aquele que todo mundo diz que eu sou”.
Reconhecendo que o lugar onde está “é o maior massacre", ao mesmo tempo busca
estratégias para nomear-se – “vou trabalhar”, “ter bons pensamentos” – e, em
consequência, constituir-se na relação com o de fora. “(...) quando eu... nossa estória de
amor seja muito grande”.
Assim sendo, o sujeito se constitui de modo ativo, pelas práticas de si, e essas,
entretanto, não são algo que o indivíduo inventa. São esquemas que ele encontra em sua
cultura e que lhe são propostas, sugeridas, impostas pela sociedade e por seu grupo
social. O adolescente infrator se constitui sendo implicado nas relações de poder e na
produção de resistência.
Foucault (1982) reafirma que nas relações de poder há sempre resistência. O
poder não é somente força negativa, mas também produtiva. Uma vez que o poder está
sempre presente, a resistência também está, pois onde há poder há resistência, sendo
que essa não está em uma posição de exterioridade em relação ao poder.
Para ele, a palavra-chave da dinâmica das relações de poder é resistência. Nesse
sentido, há sempre a possibilidade de mudar uma situação, de dentro dela, já que em
nenhum lugar se está livre das amarras do poder. É preciso, então, construir novas
160
A letra da música “Torturado pela vida”, criada pelo adolescente Edson, 16 anos,
durante as aulas de teatro no CAI Belford Roxo, mostra, além da miséria a que esses
jovens estão submetidos, a consciência da situação de exclusão em que se encontram.
Nessa letra, podemos visualizar a história de vida do adolescente e suas
estratégias de sobrevivência física e psicológica, a presença do sujeito que fala e é
falado, o cuidado de si, as lutas nas relações de poder e de resistência e, finalmente, a
constituição do sujeito demarcado por esses conflitos internos e externos.
Depois de expor sua situação individual – a mãe trabalhando e o pai bebendo –,
a fome real a que estava submetido, começa a descrever sua estratégia de sobrevivência,
que se configura, desde o primeiro instante, como resistência. Em função do desamparo,
vai para a rua, como tantos outros, e sofre novamente a exclusão: no epíteto que a
sociedade lhe destina se transforma no “pivete”, no “mendiguinho”, no garoto de
84
“travecos”: homossexuais.
161
Assim, à medida que desenvolviam o trabalho aprendiam com ele, o que deu a
essa equipe nuances diferenciadas das demais unidades do sistema DEGASE.
Eu havia feito o concurso há bastante tempo e não tinha mais esperança de
ser chamada. Quando fui escolher o local para ser lotada me perguntaram se
eu tinha carro e dirigia. Confirmei e fui encaminhada para a Baixada
Fluminense. Era uma das primeiras colocadas no concurso e não pude
escolher. No caminho para a instituição me perdi e fui parar dentro de uma
favela. Fui recepcionada por um grupo armado e perguntei onde era o
presídio de adolescentes. Ao chegar na instituição chorei de desespero e disse
que nunca mais iria voltar ali. (Socioeducadora técnica - Pedagoga)
somente exercendo parte de si mesmo, pois poder é tolerado e produzido nas relações de
saber/poder/resistência .
Porém, onde há poder, há resistência: “é o técnico da medida”, “nós não somos
técnicos” e “é um conflito muito grande”.
A resistência faz parte da relação do poder. Está em seu bojo. Não existem em
separado o local do poder nem o local das resistências. Resistir em Foucault significa
plural. Implica dizer resistências. Nem o maior de todos os totalitaristas irá conseguir
acabar com as resistências. É o interlocutor irredutível.
Enfocaremos, portanto, neste item, as implicações dos técnicos nesse processo
correcional e/ou adaptativo, muitas vezes não explícito, mas que permeia as práticas dos
especialistas. Cabe mencionar, sobretudo, os dilemas éticos que surgem das relações
ambíguas e excludentes próprias da atividade socioeducativa, expressas nos pares ajuda
e castigo, disciplina e libertação.
É complicado atender o adolescente. O tempo todo ele pergunta sobre o
relatório para o Juizado e sobre o seu processo . Então, às vezes eu não sei se
ele está falando a verdade comigo ou se está representando para o juiz. Que
atendimento técnico é esse? (Socioeducador técnico - Psicólogo)
Romper com a barreira entre o que está sendo dito e visto e o que isso representa
para o adolescente e o Juizado no processo socioeducativo requer tempo e confiança
mútua, pois a presença do “juiz” permeia toda a instituição.
Nos relatos sobre a relação socioeducador técnico e adolescente, faz-se presente
a figura do juiz. A fala dos adolescentes/técnicos explicita a máquina disciplinar de
Foucault (2000c).
A gente se envolve, não consigo deixar de ser afetado quando atendo os meus
adolescentes, passo a conhecer cada um, as histórias, o adolescente , às vezes
167
a gente pede progressão, ele sai e depois quando passa um tempo e ele volta é
difícil pra mim, ele está mais forte, mais velho e endurecido, é difícil ...às
vezes a gente acompanha um adolescente complicado que todo mundo quer se
livrar dele, os diretores das unidades , até transferem para outra unidade . Ora,
é nosso trabalho acompanhar este adolescente! Quando ele é transferido, eu
tenho que fazer um relatório, tudo é relatório; mas não dá pra botar tudo né?!
(Socioeducador técnico - Psicólogo, grifos nossos)
com a presença de um Estado penal muito mais preocupado em reprimir o crime do que
em manter políticas públicas voltadas para a manutenção do bem-estar social.
Outro ponto importante é a compreensão da necessidade do envolvimento de
diferentes áreas na gestão da segurança, que deixa de ser competência exclusiva da
polícia para converter-se em tema transversal do conjunto de políticas públicas (Kahn &
Zanetic, 2009), buscando o enfrentamento das violências a partir do conjunto dessas
políticas públicas e ações sociais. Segundo Miraglia (2008, p. 90), “a interface dos
problemas se reproduz na interface das soluções”, ou seja, as violências são produzidas
por uma multiplicidade de fatores, o que demanda uma multiplicidade de estratégias de
enfrentamento.
Nessa mesma direção, caminham as resoluções da 11ª Conferência Nacional de
Direitos Humanos, realizada em 2008, que define quanto à garantia de direitos
relacionados à violência e à segurança:
Apoiar a criação de mecanismos que atuem na prevenção à violência nas
comunidades e regiões mais precárias do País, por meio de: a) efetivação dos
serviços públicos, como importantes estruturas universais, b) fortalecimento
de programas e projetos de saúde, educação, segurança, cultura e habitação,
entre outros serviços essenciais, c) impedimento da crescente privatização e
precariedade dos serviços fundamentais e recursos humanos, nas políticas
públicas de segurança penitenciária e d) efetivação de políticas públicas de
enfrentamento à violência sexual no sentido de garantir os direitos do
segmento infanto-juvenil. (p. 43)
No Brasil, em média, para cada 100 mil adolescentes entre 12 e 17 anos, há 8,8
cumprindo medida de privação e restrição de liberdade. A maior proporção de internos
em relação à população adolescente é no Distrito Federal, com 29,6 adolescentes para
cada 100 mil, seguido pelos estados do Acre (19,7), São Paulo (17,8) Pernambuco
(14,8) e Espírito Santo (13,4). As menores proporções foram encontradas nos
estados do Maranhão (1,2), Amapá (1,5) e Piauí (1,6) (SDH/PR, 2010).
A proporção entre adolescentes em cumprimento de medidas em meio aberto e
fechado (internação, internação provisória e semiliberdade) se apresenta na média
brasileira de 1 interno para cada 2 em meio aberto. As maiores proporções foram
encontradas nos estados de Roraima (1/15), Goiás (1/12), Santa Catarina (1/6), Paraná e
Mato Grosso do Sul (1/5). As menores proporções (1/1) foram encontradas nos
estados do Acre, Amapá, Rondônia, Tocantins, Alagoas, Bahia, Paraíba, Pernambuco,
Sergipe, Rio de Janeiro e São Paulo.
Se, por um lado, estamos internando mais adolescentes infratores, por outro a
vitimação de jovens por homicídio e violência causa-nos alarde.
No mesmo ano, os homicídios dolosos no estado do Rio, entre os jovens,
correspondiam a 76,2 por cem mil jovens. Enquanto as mortes por homicídio não
ultrapassam 4% das mortes no universo da população brasileira, entre os jovens o
número se eleva a 39%.
Os homicídios, em geral, e os de crianças, adolescentes e jovens, em particular,
têm se convertido em um problema fundamental dos direitos humanos no país, por sua
pesada incidência nos setores considerados vulneráveis ou de proteção específica:
crianças, adolescentes, jovens, idosos, mulheres, negros etc. Essa grande
vulnerabilidade se verifica, no caso das crianças e adolescentes, não só pelo preocupante
4º lugar que o país ostenta no contexto de 99 países do mundo, mas também pelo
177
vertiginoso crescimento desses índices nas últimas décadas. As taxas cresceram 346%
entre 1980 e 2010, vitimando 176.044 crianças e adolescentes nos trinta anos entre 1981
e 2010. Só em 2010, foram 8.686 crianças assassinadas: 24 a cada dia desse ano
(Mapa da Violência das Crianças e Adolescentes, 2012, p.47)
Violências físicas representaram 40,5% do total de atendimentos, especialmente
concentrados na faixa dos 15 aos 19 anos de idade, mas relevantes em todas as faixas.
Os principais agressores são os pais, até os 14 anos de idade. No final da adolescência,
esse papel é assumido por amigos ou conhecidos e também por desconhecidos (ibidem,
p. 82).
Destacamos o índice alarmante, que pode ser visto na tabela abaixo, pela enorme
concentração de mortalidade por arma de fogo nas idades jovens, com pico nos 21 anos
de idade, quando os óbitos atingem a impressionante marca de 56,4 mortes por 100 mil
jovens nessa idade, no Brasil.
: Homicídio por arma de fogo
Idade Homicídio –AF
12 1,5
13 3,5
14 7,6
15 18,3
16 31,1
17 43,9
18 49,5
19 49,8
20 56,3
21 56,4
Fonte: Mapa da Violência – 2013 - Mortes Matadas por Armas de Fogo, Julio Jacobo Waiselfis (p.20)
A maioria das vítimas é do sexo feminino, com mais de 58% do total, com
idades entre 16 e 17 anos (30,7%) e de cor/raça parda, com mais de 42% do total de
vítimas, porcentagens relacionadas ao ano de 2011.
Paradoxalmente, é a Baixada Fluminense onde se concentram os maiores índices
de criança e jovens vítimas de violência e são, também, as regiões de maiores índices de
atos infracionais.
Segundo o Dossiê/2012, a distribuição espacial dos adolescentes em conflito
com a lei apreendidos teve maior concentração na Baixada Fluminense, com cerca
181
de 1.011 jovens, representando 29,2% do total, diferentemente do que foi visto no total
de vítimas contra crianças e adolescentes, quando a maior incidência ocorreu na capital
do estado – Cidade do Rio de Janeiro. Na Capital, ocorreram 955 casos de envovimento
em atos infracionais ou, ainda, 27,6% do total. O interior representou cerca de 27,5% do
total ou 953 casos, quase o mesmo número registrado na capital do estado. A região da
Grande Niterói representou cerca de 15,8% dos adolescentes apreendidos ou, ainda, 547
jovens, sobre o total do estado.
Figura 28: Distribuição dos adolescentes em conflito com a lei segundo municípios
do estado do Rio de Janeiro - 2011
Gráfico 07: Perfil dos adolescentes em conflito com a lei no estado do Rio de
Janeiro - 2011
85
Vide tese JULIÂO, 2009; e dissertação de MACEDO, 2013.
188
De acordo com Jean Baudrillard (1993), o consumo não pode ser definido
somente pela capacidade de aquisição ou como mera satisfação de uma necessidade, e
sim como um modo ativo de relação (não apenas com os objetos, mas com a
coletividade e com o mundo), um modo de atividade sistemática e de resposta global no
qual se funda o nosso sistema cultural.
Os adolescentes em conflito com a lei muitas vezes são seduzidos pelo mundo
do tráfico de entorpecentes por esse representar a satisfação de desejo de consumo, a
realização do sonho de possuir determinados objetos que povoam simbólica e
culturalmente o universo nos centros urbanos.
- Nós, nun compra ropa do Calçadão de Caxias!
- Agente compra roupa de marca, chinelo havaiana,
- É chinelo Kener, blusa Lacosti, tênis Adidas e Nike, na WKS, Sport West.
Uma beca nova! Nós num fica esculachado!
- Nós ganha dinheiro! Fica tranquilo! (Grupo Focal 2 – Adolescentes)
189
A juventude pode ser entendida como uma fase em que o jovem “é igual a todos
como espécie, igual a alguns como parte de um determinado grupo social e diferente de
todos como um ser singular” (DAVRELL, 2003, p. 43). Ao mesmo tempo em que se
busca seguir um padrão imposto pela mídia, tenta-se encontrar uma singularidade dentro
de um todo. “Para o grupo, ser específico é, também, conseguir se reconhecer no
191
outro.” (ROCHA & PEREIRA, 2009, p. 55). É no grupo ou tribo a que pertence o
jovem que irão ser estabelecidas as regras do que é estar na moda, do que é legal de se
fazer, do que é permitido. E como na adolescência está implícita a necessidade de
inclusão social, de pertencimento, de gregarismo, ele se submete a essas condições
(ROCHA & PEREIRA, 2009).
Não só os adolescentes em conflito com lei, mas também os grupos
empobrecidos do Rio de Janeiro tornam-se membros do mesmo sistema simbólico.
Segundo recente pesquisa do Teenage Research Unlimited - TRU feita no
Brasil em 2010, através da contratação da TNS Research International, foram
entrevistados 1,5 mil adolescentes e jovens, de 12 a 19 anos, das classes A, B, C e D
de nove regiões metropolitanas, além das principais cidades do interior
de São Paulo, compondo a pesquisa internacional anual feita em 24 países, incluindo o
Brasil. Os adolescentes brasileiros (de 12 a 19 anos) possuem um potencial de consumo
próximo de R$ 75 bilhões. Isso se deve aos adolescentes de classe alta, média e baixa,
tendo como base principal as mesadas que recebem. Em média, cada jovem brasileiro
ganha R$ 102 por semana. Na classe média alta, esse valor sobe para R$180 e, na baixa,
não passa dos R$ 80 por semana. Somente 27% dos entrevistados possuem renda do
próprio trabalho (aprendizes ou trabalho formal). Ainda segundo o estudo da TRU, 37%
de todas as despesas dos adolescentes são com roupas e acessórios. Depois, vêm os
lanches e refrigerantes, que cosomem 10% de toda a renda deles. Em terceiro lugar,
aparecem os aparelhos eletrônicos e produtos tecnológicos, que acabam levando outros
8% do orçamento.
A pesquisa também mostrou o baixo interesse pelo consumo de bens culturais
como teatro e livros. Nada menos que 80% dos jovens brasileiros nunca vão ao teatro e
75% não leram nenhum livro em 2010 por iniciativa própria.
Quanto aos “objetos de consumo”, 83% dos adolescentes do nosso país
possuem celular, 44% já têm seu próprio computador e 33% navegam na internet em
banda larga. Porém, a maioria desses consumidores não possui conta no banco (apenas
9%) ou cartão de crédito (18%).
Segundo pesquisas do Instituto IPSOS, realizada em 2004, com 4,3 milhões de
brasileiros, garotos e garotas de 13 a 17 anos, em nove centros urbanos, os shoppings e
a internet são os espaços sociais mais concorridos por este público: 62% deles
frequentam shopping e 82% elegem os centros de compras como o local preferido para
consumo e lazer.
192
marcas e relacionam grife à qualidade, são volúveis, buscam sempre produtos novos e
sonham com celulares da moda, moto, videogame mais moderno, laptop, roupas e
sapatos de marca. A reportagem não faz alusão aos adolescentes pobres e que não
possuem os objetos de consumo para inclusão social ou inclusão pelo consumo.
A posição que os jovens pobres ocupam na cidade, suas condições materiais e
culturais, como afirma Castro (2007), colocam-nos sob dois ângulos: vítimas ou agentes
da violência. A cotidianidade da violência na vida dos jovens nos leva a compreender o
destaque dado nas falas dos mesmos em relação à questão do consumo.
Como consumidores, os adolescentes infratores adquirem um tipo de cidadania
que os faz iguais aos demais adolescentes consumidores, apesar de esses serem apenas
consumidores em potencial, por dependerem de seus pais. Dessa forma, a dinâmica
social do consumo promove os adolescentes infratores a consumidores, fornecendo-lhes
uma base estatutária de reconhecimento social.
Em pesquisa realizada por Araujo (2006), sobre os motivos que levam ao ato
infracional, “a compra de roupas de marca” (22,3%) aparece como a principal causa do
envolvimento, uma vez que, em primeiro lugar, os adolescentes alegam a própria
“negação do envolvimento”.
Gráfico 10: Detalhamento do Envolvimento com Drogas - 2011
0% 2% 4% 6% 8% 10% 12% 14% 16% 18% 20% 22% 24% 26% 28% 30% 32% 34% 36% 38% 40%
Os roubos e furtos são vistos pelos jovens como atos fortuitos e sem
consequências, “aprontações”, formas de conseguirem dinheiro rápido.
O envolvimento com o tráfico de drogas é visto como um “trabalho”. Dá status,
dinheiro e garante o sucesso com as mulheres:
- Nós compra ué, nós tem dinheiro.
- Nós compra, nós faz. Isso é o de menos
- Nós faz é dinheiro. Dinheiro faz dinheiro. (Grupo focal 1 - Adolescentes)
196
86
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA - Título III, Da Prática de Ato Infracional: Capítulo IV
“Das Medidas Sócio-Educativas”, Art.112 a 128: advertência; obrigação de reparar dano; prestação de
serviço à comunidade; liberdade assistida; semiberdade e internação.
198
livre e consciente), mas também de estar amarrado a seu delito por um feixe
de fios complexos (instintos, pulsões, tendências, temperamento). O
delinquente, manifestação singular de um fenômeno global de criminalidade,
se distribui em classes quase naturais, dotadas cada uma de suas
características definidas e a cada uma cabendo um tratamento específico (...)
Os condenados são... outro povo num mesmo povo: que tem seus hábitos,
seus instintos, seus costumes à parte. (p. 210)
de punir os que condena, é ela que se faz presente agora nos tribunais serenos
e na majestade das leis; ela é que tem que ser conhecida, avaliada, medida,
diagnosticada, tratada, quando se proferem sentenças, é ela agora, essa
anomalia, esse desvio, esse perigo inexorável, essa doença, essa forma de
existência, que deverão ser considerados ao se reelaborarem os códigos.
(FOUCAULT, 2000c, p. 213)
Ações socioeducativas87 que rompem com essa lógica foram apresentadas como
pontuais, centradas nos próprios sujeitos vítimas ou heróis: o adolescente e o policial.
Ele tinha 17 anos quando tramou um assalto. Só que a vítima era um
experiente policial da Polícia Militar, que reagiu dando três tiros na perna do
rapaz. “Ele pegou, me virou, e não sei o que ele olhou nos meus olhos, botou
a arma na minha boca, foi para me matar eu acho, não sei o que falaram na
cabeça dele, eu sei que fechei os olhos, pensei na minha mãe, e não, não foi”
(...) O adolescente ficou oito meses cumprindo medida socioeducativa. “Uma
lição de vida. Eu achei uma lição” (sic ex-interno). Mas ele nunca imaginou
que ficaria frente a frente com o policial que poupou a sua vida.(...) “Não
existe a mínima mágoa. Eu gostaria muito que o teu pai e a tua avó, até a tua
madrasta, olhassem pra ti com orgulho, que nem eu olho pro meu filho”,
afirma o ex-policial.88 (Fantástico , 22/07/2012)
87
Ações socioeducativas como princípio da educação social preveem a reconstrução e um projeto de
vida cidadã pelo adolescente: desenvolvimento psicossocial, cultural e afetivo, através de um Plano
Individual de Atendimento (SINASE, 2006) construído pelo próprio adolescente, sua família e os
socioeducadores que o acompanharão (equipes multidisciplinares e técnico de referência) durante o
cumprimento da medida e em rede com o sistema de garantia de direito, possibilitando e
instrumentalizando esse sujeito, responsável pelos seus atos infracionais (não vítimas ou heróis), a
convivências sociais dignas e a não reincidências.
88
Os nomes dos envolvidos na reportagem foram omitidos.
205
Ela ficou internada por mais de um ano por envolvimento com o tráfico. Mas
um projeto do Degase, o órgão responsável pela aplicação de medidas
socioeducativas no Rio de Janeiro, a transformou em apresentadora.
“Participei da primeira turma da TV Novo Degase. É a primeira TV
socioeducativa do mundo” conta.(...) E usou os ensinamentos da TV Novo
Degase para se convencer de que podia mudar. “A gente é prova disso. A
gente passou pelo sistema, e hoje a gente está aí trabalhando e ganhando
dinheiro com isso. Por que não pode?”, questiona a jovem. (Fantástico,
22/07/2012)
89
“Pista”: imagens de territórios da cidade; “amigos presos”: imagens das facções criminosas do tráfico
de entorpecentes; “eles”: socioeducadores agentes responsáveis pela segurança; “tela”: televisão; “na de
maior”: na prisão de adultos; “tela”: tv; “mandam apagar”: mandam desligar a TV.
209
ocasiões e delas depende, sem base para estocar benefícios, aumentar a propriedade e
prever saídas. Retomamos o relato dos adolescentes: “E a gente liga o rádio e fica
sabendo das paradas da pista”. São saídas momentâneas.
O que as táticas ganham não se conserva. Esse “não lugar” lhe permite, sem
dúvida, mobilidade, mas seguindo o acaso, os azares do tempo, para captar no voo as
possibilidades oferecidas por um instante. “Os sujeitos têm atentos, as falhas que as
conjunturas particulares vão abrindo na vigilância do poder panóptico. Criam ali
surpresas. Conseguem estar onde ninguém espera. É astúcia.(CERTEAU, 2000, pp.
100-101).
Usando os espaços, ocasiões e possibilidades encontradas nas lacunas das
estratégias dos poderosos, os “fracos”, ao utilizarem taticamente os produtos do sistema,
estão realizando práticas de resistência. Ainda que estando inscritos nas redes de
relações de força existentes, nem por isso são por elas determinadas. O uso se dá em um
nó de circunstâncias, uma nodosidade inseparável do contexto. Indissociável do instante
presente, de circunstâncias particulares e de um fazer. (CERTEAU, 2000, pp. 96-97).
Entendemos as práticas cotidianas dos consumidores/adolescentes em conflito
com a lei como ações do tipo tático e que se modificam e se ampliam em relação ao
tempo e ao espaço, provocando, com isso, modificações também no sistema estratégico
da instituição. Ampliamos a discussão em torno da questão das relações de poder
presentes na distinção entre táticas e estratégias, a partir da explicação de Certeau: “sem
lugar próprio, sem visão globalizante, cega e perspicaz como se fica no corpo a corpo
sem distância, comandada pelos acasos do tempo” (2000, p. 101), a tática é determinada
pela astúcia pela qual reverte, desvia e cria resistência, utilizando-se das “lacunas” de
um poder disciplinar-soberano, assim como a estratégia é organizada pelo postulado
desse poder “soberano”.
Desse modo, redefinem-se as noções de estratégias e táticas, articulando-as à
questão da prática cotidiana de saber-poder-resistência. Torna-se precisa, também, a
oposição espaço/tempo colocada anteriormente.
- A gente vê Novela.
- Futebol.
- Novela, filme.
- Eu gosto de Salve Jorge. Salve Jorge é o bicho.
- Balaco Baco.
-Tá vendo Salve Jorge?
- Tem plantão que deixa nós vê TV, filme, de madrugada cine prive (risos).
- Dez horas tem que abaixar a televisão, quase que não dá pra ouvir, não pode
falar alto.
212
- É. Tipo assim, vamos supor, eu e ele torce pra tal time, aí nosso time
jogando pá, aí nós tá vendo pá, sabe como é que é, na pista como, nós vê o
gol, nós bate na parede, sai gritando, coisa e tal, aí aqui, a nossa diversão é
bater com o colchão na comarca, faz um barulho, faz um barulhinho, mas não
um barulho grande, ai eles já vem querendo cortar sucata, coisa e tal.90
(Grupo Focal 2 - Adolescentes)
90
Procuramos conservar a fala original dos adolescentes, transcrevendo literalmente a sua maneira de
dizer. Os erros de concordância, regência e outros foram mantidos tal como no momento da interlocução.
“Comarca”: cama de alvenaria; “eles/ele” : socioeducadores agentes de plantões.
213
A fala dos adolescentes mostra muito mais do que a forma como produzem
entendimento das imagens divulgadas pela televisão. A novela do canal televisivo
adquire uma significação próxima daquela que, no cotidiano da escola-prisão, observa
as cenas de outro lugar, daquele construído ficcionalmente. Embora “não é igual não”,
as cenas do cotidiano da “comunidade”, mesmo ficcionais, induzem à reflexão. A
realidade da “comunidade” real não é igual à da tela da TV: “nos morre, nós mata”.
Entretanto, mesmo nesse universo de violência, consumo e miséria, o homem
ordinário – no caso desta pesquisa, o adolescente infrator –, através das artes de fazer,
produz resistência e constrói subjetividade. A rigor, a arte de fazer representa a sua
capacidade de resistência – uma resistência que se manifesta por ações que querem
fazer valer o seu querer nas determinações mais imediatas de sua vida diária.
Não quer dizer que seu livre arbítrio consiga emudecer as evidentes
determinações históricas, sociais e dos contextos que o cercam. Não se trata de uma
formulação ingênua da onipotência do homem cotidiano e muito menos de uma
enganosa operação de libertação das culturas minoritárias/ populares. Trata-se de operar
uma revanche dos fracos, que avança quando e onde as estratégias de poder tornam
possíveis.
Para os adolescentes do CAI Belford Roxo, que buscam incessantemente via TV
utilizar-se de maneira criativa da leitura veiculada pelos filmes-novelas, é nesse hiato
entre a realidade (a vida e a representação da reportagem jornalística) e a fantasia (a
novela/o filme) que procuram construir táticas de resistência, arte de fazer e de
sobreviver às estratégias da disciplina.
Esses procedimentos de criatividade cotidiana – que se transformam em
comunicação em atos – são apresentados por Certeau (2000) como uma galeria de
diagramas que tem uma dupla função: delimitar práticas e instaurar um discurso sobre
essas práticas. São os sistemas que exercem o poder, os dispositivos que vampirizam as
instituições e reorganizam sofisticadamente o poder disciplinar em todo o espaço social.
Nos estudos de Foucault, há sempre, por trás da vigilância, a resistência, o que
Cereteau afirma ser um “contra-poder”.
Ao estudarmos as práticas cotidianas dos adolescentes aprisionados, sabendo a
teoria de Michel de Certeau (2000), que dobra e desvia em resistências cotidianas do
caráter disciplinador que contempla o processo panóptico de Foucault (2000c), partimos
da suposição de que há um quadro de politeísmo de práticas disseminadas, escondidas e
214
91
“Boca”: Local onde efetua-se o tráfico de entorpecente; “caveirão”: espécie de tanque de guerra, pintado
de preto e utilizado pelo CORE.
216
92
Como vimos no capítulo anterior, nos poemas produzidos na escola com os professores e cartas
enviadas às famílias e namoradas .
221
PARTE III
93
Decreto Nº 42.715 de 23 de novembro de 2010 – PASE/RJ.
225
94
O programa GPAE (Grupo de Policiamento em Áreas Especiais) foi aplicado pela primeira vez na
favela Pavão-Pavãozinho-Cantagalo em 2000 e, posteriormente, estendido a outras três comunidades
pobres da cidade. Substituindo a estratégia tradicional de invasões periódicas com tiroteios, a polícia
permanece na comunidade de forma estável, tenta desenvolver uma relação de proximidade com os
habitantes locais e prioriza em sua atividade a redução de incidentes armados, não a luta contra o crime
em geral. Além disso, a polícia se esforça para ajudar a comunidade a ser incluída em programas sociais,
especialmente para a juventude, que possam contribuir à prevenção da violência. Trata-se de uma
iniciativa de redução de danos, parcialmente inspirada na experiência Cease Fire de Boston. Seus
resultados mostraram que, respeitadas certas condições, é possível reduzir os tiroteios e a insegurança nas
comunidades afetadas. Apesar disso, a experiência não foi considerada um novo modelo de polícia para
comunidades marginais, mas apenas um caso especial (CANO, 2006).
95
Segundo Cano, “existe um projeto de lei que propõe a ‘desconstitucionalização’ do modelo policial, ou
seja, retirar a menção existente na Constituição, para que cada estado escolha o modelo que lhe pareça
melhor”.
228
96
disponível em:
http://amaivos.uol.com.br/amaivos09/noticia/noticia.asp?cod_canal=41&cod_noticia=19978; acesso em
maio de 2013.
230
97
GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, Antonio; OLIVEIRA, William Terra de Polícia e criminalidade no
estado de direito. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v., fasc.17, jan-mar, p.257-276,
1997, p.262.
232
adolescentes em conflito com a lei refletir sobre os atos infracionais e repensar novos
caminhos.
A Segurança Pública estadual faz parte do PASE/RJ, que afirma e reafirma o
compromisso do Governo do Estado do Rio de Janeiro com as bases filosóficas,
jurídicas, políticas, éticas e técnicas que presidem a estrutura e o funcionamento do
SINASE (2006 e 2012).
Fonte: ANDI
98
A Escola foi criada em 31 de Agosto de 2001 pelo Decreto n° 29.113, com o nome de “Escola
Socioeducativa”. Em 2008, com a publicação do Decreto n° 41.144, de 24 de janeiro, que alterou a
Estrutura Organizacional do DEGASE e deu outras providências, passou a ser denominada Escola de
Gestão Socioeducativa Paulo Freire – ESGSE.
241
das medidas socioeducativas restritivas e privativas de liberdade, em que pese aqui uma
defesa da execução direta das medidas socioeducativas pelo poder público (Municipal:
Liberdade Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade; Estadual: Semiliberdade e
Internação), isso justificado pela possibilidade de consolidação de uma política
pública, com garantia de continuidade de financiamento, formação específica e, ainda,
responsabilidade do Estado e do gestor institucional.
Para o DEGASE e, no desdobramento, para o governo estadual:
A discordância acerca da execução das medidas socioeducativas de restrição
de liberdade (Semiliberdade) e privação de liberdade (Internação), por
ONGs, se deve considerando a responsabilidade das medidas de contenção e
segurança como atribuição única e exclusiva do Estado. Ou seja, todas as
ações que envolvam a perda ou restrição de direitos (no caso a liberdade),
deverão ser executadas diretamente pelo Governo Estadual. (DEGASE,
2013)
reforma geral e mudança de layout. Também os CRIAADs Penha e Cabo Frio passaram
por reformas.
O ano de 2009 foi marcado pelo investimento de construção da primeira unidade
planejada com a participação dos servidores e dentro do que recomenda o SINASE. O
Centro de Socioeducação Professor Gelso de Carvalho Amaral, o CENSE GCA, foi
inaugurado em junho de 2010. A unidade, que é o novo portal de ingresso do
adolescente no sistema socioeducativo, veio para substituir o arcaico CTR (Centro de
Triagem e Recepção), herança de um passado destinado ao esquecimento.
Nesse ano de 2010, foi também reformado o CRIAAD da Ilha do Governador,
que teve mudança de layout e acréscimo, sendo reinaugurado no mesmo dia do CENSE
GCA; os CRIAADs Esperança, em Teresópolis, e Nova Iguaçu também passaram por
reforma geral. Foram ainda reformados, geral ou parcialmente, o Centro Intensivo de
Tratamento ao Uso e Abuso de Drogas (CITUAD), o Centro de Recuperação de
Dependentes Químicos (CREDQ) e o CRIAAD Santa Cruz.
Em 2010, entraram em reforma geral e, em alguns casos, com acréscimo de
alojamentos os CRIAADs Niterói, Ricardo de Albuquerque, Barra Mansa e Bangu –
este com construção de um novo alojamento com 16 vagas, já que a implantação em sua
área de um Centro Vocacional Tecnológico acabou por absorver um dos alojamentos.
Outro marco desse ano foi a reforma por que passou a Escola João Luiz Alves. Lá, os
alojamentos eram para oito e não havia banheiros neles. Na reforma, foram
reconstruídos os alojamentos das alas A, B, C e D, que tiveram capacidade reduzida à
metade, mas ganharam sanitários, lavatórios e chuveiros. Em 2011, foram recuperadas e
colocadas em funcionamento as piscinas da EJLA e do CENSE Dom Bosco.
Em 2011, as reformas foram nos CRIAADs Duque de Caxias, Barra Mansa e
Nova Friburgo; este último foi atingido duramente pela tragédia das enchentes em 2010,
na Região Serrana, que destruiu áreas de nove municípios, causando muitas mortes.
Segundo levantamento do Escritório de Arquitetura, há previsão para ainda este ano
(2013) do início de reforma geral, com mudança de layout e também acréscimo, nos
CRIAADs da Penha, Santa Cruz, Ricardo de Albuquerque e Nova Iguaçu.
A unidade do CENSE Campos dos Goytacazes, inaugurada recentemente, e a
unidade de Volta Redonda, em fase de conclusão de obras, atenderão a 25 municípios
cada uma em suas áreas de abrangência, que abrigam populações de 1.332.968 e
1.387.162 habitantes, respectivamente, segundo dados do Censo IBGE/2010.
247
Eu passei no concurso, mas acho que não tenho perfil para trabalhar em
unidade de internação, tem colega que qualquer coisa se estressa e agride o
adolescente, eu entendo que é uma fase e que é natural da adolescência, mas
tem que ter um equilíbrio. (Socioeducador agente)
Quando eu cheguei aqui, eu vi que tinha muita gente boa, que trabalha muito
para ter um trabalho de qualidade, eu fiquei surpreso, pensava que aqui era
diferente , era uma cadeia e eu seria mais um, iria passar um tempo e depois
saia. Mas sabe como é? Passei para um “emprego público”. Depois eu vi que
dava pra trabalhar e que o pessoal aqui logo me ajudou. (Socioeducador
técnico - Pedagogo)
O pessoal está ajudando os novos, mas tem gente que não passou no
concurso, que o contrato tá acabando, tem muita gente doente, não sabe que
vai fazer, o diretor não quer saber, ele só diz que vai chegar gente do
concurso, essa gente não vai segurar a casa. (Socioeducador agente)
Gestão participativa;
Respeito à peculiaridade do adolescente;
Participação social. (DEGASE, 2011)
Considerações Finais
O propósito principal deste estudo foi apresentar e analisar os paradoxos entre
as políticas públicas em direitos humanos, as diretrizes e a legislação para os
adolescentes em conflito com a lei inseridas nos planos e projetos do governo do Estado
do Rio de Janeiro, assim como nos documentos oficiais do DEGASE, e as práticas
cotidianas de disciplina e controle que constituem um lugar/espaço de aprisionamento
para educar-disciplinar adolescentes no CAI Belford Roxo. Ao mesmo tempo em que
procuramos desvelar essas práticas discursivas e o panorama sociocultural que as
constituem, tentamos compreender os sentidos produzidos por essas narrativas no
processo de subjetivação dos adolescentes que por vezes se autointitulam “menores
infratores” ou “adolescentes infratores”. Esses sujeitos são nomeados pelos
profissionais que os atendem como “educando-aluno”, “adolescentes em conflito com a
lei”, “adolescentes em situação especial de desenvolvimento”, “adolescentes”,
“menores”, “bandido”, “bebel” ou destituídos de um nome, tomados apenas como
um número.
Tomando como base os discursos/linguagem dos adolescentes como processos
de troca, ação partilhada, práticas concretas, estabelecidas no cotidiano do CAI Belford
Roxo e além-muro da instituição, pela mídia, procuramos visualizar esses adolescentes
enquanto sujeitos sociais desempenhando papéis, envolvidos em processos de produção
e interpretação de sentidos, de subjetivação, revertendo e subvertendo o processo de
coisificação a que são submetidos constantemente através dos dispositivos disciplinares
que edificam a instituição total, construída historicamente para este fim: aprisionar para
disciplinar e disciplinar para ressocializar.
Ao estudarmos a história das instituições responsáveis por (re)acolher, assistir e
educar crianças e jovens, atualmente adolescentes envolvidos em atos ilícitos,
deparamo-nos com a criminalização da infância e juventude pobre que nasce com a
própria modernização brasileira. No início da República, a docilização do corpo
infantojuvenil tinha o objetivo de higienização social e eugenia da sociedade brasileira,
portanto, sendo interpretados como um caso de polícia. Com a industrialização, foi
necessária a regularização do trabalho infantil. Os menores delinquentes e transviados
deveriam ser educados, docilizados pelo trabalho-produção, pois as famílias pobres não
possuíam condições para cuidar moral e financeiramente dessa “nova nação”.
252
mentais). Nos casos de saúde mental, não houve consenso quanto à legitimidade da
medida socioeducativa de internação estabelecida no ECA e no SINASE;
Os profissionais e parte dos adolescentes indicaram a precariedade da formação
para o trabalho como um dificultador de empregabilidade após a internação. Dos 10
profissionais entrevistados, somente 01 foi a favor da maioridade penal (10 ou 11 anos);
Os adolescentes indicaram o consumo como a sua principal motivação para a
infração e o tráfico como a maior possibilidade de ganhos para o consumo e auxílio da
família;
Para os adolescentes, a violência e a corrupção policial, seguidos da violência
institucional, são os destaques em relação ao tema violência. Já para os profissionais, o
destaque foi dado à violência cometida pelos adolescentes, à violência doméstica, à
violência dos grupos rivais das facções criminosas;
Quanto aos dados estatísticos, não há padronização e dados confiáveis no DEGASE
em relação aos dados institucionais apresentados pelo CAI BR, havendo lacunas e
alteração de dados;
Merece ser sublinhada a falta de conhecimento dos profissionais sobre Plano de
Atendimento Socioeducativo do Estado do Rio de janeiro, o Plano Político Institucional
(PASE) e o próprio Projeto Político Institucional (PPI) do CAI BR, assim como o
desconhecimento da estrutura administrativa do DEGASE e do Sistema de Garantia de
Direitos.
Tais indicativos, confrontados com as legislações e as perspectivas dos planos e
projetos do DEGASE, possibilitam-nos refletir sobre as políticas públicas do Estado do
Rio de Janeiro.
Apesar de a atual gestão do DEGASE ter realizado ao longo dos últimos cinco
anos os planejamentos intersetoriais, com gestores de todas as unidades
socioeducativas, coordenadores e operadores de setores estratégicos, registrando em
documentos procedimentos, normas, metas e estratégias, atenderam-se os principais
aspectos necessários para uma prática socioeducativa:
com a cultura do silêncio, expressão que Paulo Freire utilizou para designar o destino de
se seguir sempre as prescrições daqueles que falam e impõem uma voz.
É necessário identificar os mecanismos de construção dos discursos dominados e
se as suas falas são reconhecidas como legítimas. É a partir da apropriação da
capacidade de enunciar que se pode romper com a cultura do silêncio.
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