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QUESTÕES INTRODUTÓRIAS

Professor (a) :

Me. Flávio Henrique de Oliveira Silva

Objetivos de aprendizagem
• conhecer os principais caminhos que levaram Saulo a se tornar Paulo, o apóstolo de Jesus Cristo;

• compreender algumas das principais características do contexto de atuação de Paulo;

• conhecer os principais aspectos da atuação e da produção literária de Paulo;

Plano de estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• De Saulo a Paulo

• Contexto em que atuou Paulo

• O Ministério do Paulo

Introdução
Neste estudo, conheceremos alguns passos da trajetória de conversão do apóstolo Paulo. Até então chamado Saulo, o futuro apóstolo dos gentios possuía uma formação invejável.
Passou pela catequese da tradição judaica e teve acesso à teologia rabínica, além de à filosofia grega. Em certo momento de sua vida, foi para Jerusalém estudar em uma das escolas
judaicas, tendo a oportunidade de ser aluno de Gamaliel, um dos mais importantes mestres do judaísmo da época. Foi neste período que começou a perseguir os cristãos, conforme
Boring (2015, p. 205) “convencido de que estava fazendo a vontade de Deus”. Daí em diante, sua história é conhecida: Saulo passa pela famosa experiência da estrada de Damasco e
de perseguidor passa a ser um dos mais expoentes apóstolos de Jesus Cristo.

Em seguida, veremos que o contexto de atuação de Paulo foi extremamente desfavorável. Ele viveu e atuou no primeiro século da era cristã, período marcado, já anteriormente,
pelas políticas dos grandes impérios. O ministério do apóstolo foi desenvolvido em meio à dominação e colonização de um dos maiores, mais cruéis e incompassivos impérios de
todos os tempos, o Império Romano. Além da pressão imperial, havia uma clara perseguição imposta aos cristãos gentios pela religião judaica, que usava de todos os artifícios
possíveis para coagir o movimento nascente. Notaremos, em estudos posteriores, os diversos embates de Paulo com esse grupo.

Ainda neste estudo, discutiremos algumas características da atuação de Paulo. Uma das tônicas do ministério do apóstolo segue em uma de suas identificações: “Paulo, apóstolo dos
gentios”. Uma boa referência para a compreensão da atuação de Paulo entre os gentios é a comunidade de Antioquia, considerada por alguns estudiosos como a pioneira da missão
entre os gentios. Becker (2007, p. 128-129), entende que Barnabé “tenha levado Paulo a Antioquia, exatamente para, com sua colaboração, seguir orientando a comunidade para
uma atitude de maior liberdade diante da Lei”. Fruto desta bandeira em prol do alcance do evangelho, até aos gentios, a atuação de Paulo se destacou, claro, pela sua produção
literária, conforme veremos durante todo o curso.

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DE SAULO a Paulo
Saulo, que depois virou Paulo, nasceu em Giscálhia (província da Galiléia), entre os anos 5 e 10 d.C. Ainda criança, contam os historiadores, mudou-se para Társis, hoje região da
Turquia. Do nascimento aos 28 anos, recebeu a formação básica de todo o judeu, conhecida como catequese da tradição judaica. Boring conta que Saulo “pertencia a uma
tradicional família judaica, na qual as línguas e as tradições antigas foram preservadas. [...] Ele conhecia um pouco da teologia dos rabinos e escribas, bem como a interpretação
bíblica” (2015, p. 302). Convém destacar o fato de Saulo ter sido um fariseu, cujo zelo pelas tradições ancestrais o levou a superar muitos de seus contemporâneos. Além da tradição
judaica, Saulo conhecia também o berço da cultura grega. Na época, Társis era um grande centro de conhecimento: lá estavam instaladas grandes escolas de filosofia. Até aos 18
anos, Saulo estudou nestas escolas, obtendo um alto nível de formação. Estoicismo, epicurismo e diversas correntes do gnosticismo, certamente, fizeram parte de seu currículo.

Antes de seguir com outras informações sobre a trajetória de Saulo/Paulo, vale a pena abrirmos um pequeno parêntese e vermos um pouco sobre cada uma destas
doutrinas/correntes, conforme o texto O mundo do Novo Testamento: correntes filosóficas nos dias do Novo Testamento (SILVA; PROENÇA, 2014). Antes, porém, é preciso destacar que
o pensamento teológico de Paulo certamente passou pelo contraponto desses modelos, que outrora lhe foram comuns e, por isso mesmo, merecem nossa atenção.

Boa parte das anotações que seguem nestes tópicos (Estoicismo; Epicurismo; Gnosticismo) são parte do texto O mundo do Novo Testamento: correntes
filosóficas nos dias do Novo Testamento.

Fonte: SILVA (2014).

Estoicismo: doutrina organizada inicialmente por Zeno (336–263 a. C.).


Rejeitava a busca do prazer como o que dá sentido à vida. No decorrer dos séculos, a escola estoica sofreu várias transformações. O novo estoicismo do 1º e 2º séculos d. C. dava
primazia à ética. A doutrina estoica vê o mundo inteiro como uma grande unidade: o logos divino, chamado tradicionalmente de Zeus, governa o cosmos, enviando a razão para guiar
os homens. Os estoicos têm uma cosmovisão panteísta, de acordo com a qual o homem deve observar a ordem da natureza, conhecendo suas leis e seguindo-as (o homem é visto
como membro da natureza). As distinções sociais não têm valor para o Estoicismo. Todos participam da ordem cósmica. Deve-se buscar uma vida modesta e despojada. Nesse
equilíbrio com a natureza, tudo o que se tem a fazer é aguardar serenamente a morte.

Epicurismo: corrente que deve a sua origem a Epicuro (342-270 a.C.).


Epicuro aconselhava as pessoas a se retirarem da vida pública e se recolherem aos valores da vida privada/individual, ao contrário das filosofias centralizadas na pólis ou na vida
política. Dizia-se que a verdadeira sabedoria se adquire quando o indivíduo encontra o que é correto para as diferentes circunstâncias da sua vida. A alma humana se realiza
espiritualmente nessa vida, não no além. Epicuro não negava a existência dos deuses, mas não esperava deles intervenção alguma na vida humana. Por isso, os homens não deveriam
se preocupar com os deuses e buscar o prazer nesta vida. No judaísmo, a designação “epicureu” equivalia a um insulto, dirigido a pessoas que como os saduceus, não acreditavam na
vida além, mas na realização na existência terrestre.

Gnosticismo: vem da palavra Gnosis que se refere ao conhecimento.


Além de uma corrente filosófica, o gnosticismo pode ser entendido como um modelo de pensamento religioso da época, carregado de sincretismos com elementos judeus e cristãos.
Conforme Brown. “o que atraía no gnosticismo era o fato de ele oferecer respostas para questões importantes: de onde viemos? Aonde vamos? Como chegaremos lá?” (2004, p.
163). A Ásia Menor era fortemente marcada pela presença desse movimento. O gnosticismo construía parte de sua tese a partir das influências recebidas do pensamento de Platão,
que afirmava ser a matéria má e pecaminosa. Dessa forma, negavam que Jesus tivesse vindo em carne, ou seja, que tivesse assumido um corpo material igual ao nosso. Afirmavam
que Jesus teria tido apenas uma “aparência” de corpo, para não se contaminar com a matéria. Além disso, conforme escreve Bultmann, o gnosticismo pregava a alienação do ser
humano frente ao mundo: “o gnóstico se sente solitário e preso no mundo, acossado e assustado pelo mesmo, perdido e entregue. Ele está tomado de terrível medo no mundo”
(1946, p.180).

Seguindo-se pela trajetória do futuro apóstolo, sabe-se que, ao completar 18 anos, ele deixou Társis e foi para Jerusalém com a finalidade de receber uma formação superior de
estudos religiosos em uma das escolas judaicas, tendo oportunidade de ser aluno do mais importante mestre do judaísmo da época: Gamaliel. Ele dedicou-se aos estudos, em tempo
integral, até aos 28 anos. Mazzarolo conta que Saulo

[...]ainda jovem é enviado pelos pais para Jerusalém, onde deveria aprofundar seus conhecimentos na cultura judaica. Suas capacidades e zelo pelas
tradições dos antepassados tornaram-no um defensor ferrenho da Lei e dos princípios mosaicos. Como jovem inteligente e moldado nos ditames das
leis mais rígidas, aos pés de Gamaliel, segue rigorosamente os princípios dos mestres (At 22,3-7) - (MAZZAROLO, 2011, p.14).

Foi nesse período, até por volta dos 33 anos de idade, que Saulo exerceu sua função de perseguidor dos cristãos. Boring menciona o texto bíblico de Atos (9,1-2) que “indica que
Paulo era um representante autorizado do judaísmo de Jerusalém, e enviado para erradicar o novo movimento messiânico” (2015, p.304). Em outras palavras, Atos descreve Paulo
como um zeloso oponente dos primeiros cristãos e que buscava destruir o novo movimento. Vejamos os textos mencionados pelo autor: At 8,1-3; 9,1-2; 22,4-5; 26,9-11. Boring
destaca ainda que “Paulo confirma esse quadro, descrevendo a si mesmo com um zelote na antiga fé, disposto a destruir a igreja (1 Co 15,9; Fp 3,6; Gl 1,13)”. O zelo de Paulo pela lei,
conforme o autor:

• Foi “modelada sobre o zelo de Finéias, que matou aqueles que violaram a aliança e encorajaram outros a fazê-lo”;

• Fez com que “o próprio Paulo defendesse violência e mesmo pena de morte para aqueles que estavam profanando a aliança”;

• Fez com que “o próprio Paulo impedisse “a missão do povo santo de Deus (At 26,10)”;

Sigo com Boring, que explica que as motivações de Saulo para agir da forma que agia era o fato de estar “convencido de que estava fazendo a vontade de Deus” (2015, p.205). Nesse
contexto, próximo a Damasco, por volta do ano 33, Saulo, “o zeloso perseguidor dos judeus que criam em Jesus e estavam minando a lei e os limites da tradição judaica, foi
confrontado pelo Cristo ressurreto (1 Co 9,1; 15,8; Gl 1-15-16; At 9,1-18; 22,6-11; 26,9-18)”.

Para Mazzarolo (2011, p.14-16), o processo entre a conversão de Saulo e o ministério de Paulo se deu em quatro etapas: (1) A morte de Estevão; (2) Damasco; (3) A Arábia; (4) Tarso.
Vejamos os detalhes na fala do autor.

Primeira etapa – Morte de Estevão:


No apedrejamento de Estevão, Saulo (seu nome hebraico) recebe os espólios deste, colocados por testemunhas do assassinato (At 7,58). Ele estava de acordo com a perseguição aos
cristãos e a sua execução (At 8,1).

Alguns estudiosos afirmam que Estevão e Paulo eram amigos. Para aprovar, deliberadamente, era preciso ter autoridade e, possivelmente, ambos
seriam membros do Sinédrio. Ao receber os espólios de Estevão, começa a crise do perseguidor dos cristãos. [...] A morte de Estevão abala as
convicções de Saulo e, mesmo em seu ardor farisaico, entra em crise e busca afastar-se de Jerusalém (MAZZAROLO, 2011, p.14-16).
Segunda etapa – Damasco.
A carta para Damasco não pode ser outra coisa que a estratégia de buscar distanciamento de Jerusalém.

Ele foi tocado pela morte de Estevão, mas caso desistisse de perseguir seria morto também. Muito inteligente e sábio, Saulo cria uma situação
demonstrando seu zelo pela lei e intenção de buscar hereges (os cristãos eram tratados como tal pelos judeus) que estavam em Damasco. O
cristianismo mal havia chegado na capital Síria, mas foi o suficiente para que ele tivesse a aprovação para deixar Jerusalém e se afastar do centro do
perigo. A crise foi aumentando à medida que ele se aproximava da cidade e, no seu auge, Deus o chama para o serviço de seu Filho, o Caminho (At 9,1-
5). Na crise acontece a cegueira. Esta é a metáfora da escuridão. [...] A luz vem do céu, depois de o prostrar por terra, o conduz a um discípulo
(Ananias) que, não obstante o conhecimento do perseguidor, acredita que pode transformá-lo em aliado. Esse discípulo vai ao seu encontro e inicia o
seu processo de conversão. Assim que os judeus de Damasco passam a saber do seu ato traidor, resolvem matá-lo, a qualquer custo. Os discípulos
precisam fazer uma aventura singular e perigosa: de noite, colocaram-no num cesto e o desceram pela muralha, para que fugisse (At 9,23-25) -
(MAZZAROLO, 2011, p.14-16).

Terceira etapa – A Arábia.


Como não poderia voltar para Jerusalém sem que levasse consigo um bom número de cristãos aprisionados para o flagelo, pois do contrário sofreria o apedrejamento, necessita
encontrar um lugar no ‘exílio’.

Para Tarso, sua terra natal, seria complicado, porque fora enviado para voltar rico e nobre e, agora, estava fracassado. Ainda que o relato dos Atos
dos Apóstolos não mencione este tempo de silêncio, a referência de Gl 1,13-18 e os estudos arqueológicos atuais sustentam que ele não apenas
busca refúgio na Arábia, mas é o primeiro evangelizador dessas terras (MAZZAROLO, 2011, p.14-16).

Quarta etapa – Tarso.


Depois de três anos na Arábia (Gl 1,17-18), Saulo retorna a Jerusalém, acreditando que o fracasso de sua missão em Damasco não seria julgado.

Chegando lá, encontra apenas Tiago (Gl 1,18-19), com quem fica quinze dias. Mas o ódio contra ele se acende de imediato, e os discípulos precisam
conduzi-lo para a Cesareia e de lá para Tarso (At 9,26-30). Levando em consideração a sua chegada na Antioquia, para auxiliar Barnabé, Saulo teria
trabalhado no silêncio, mas com grande eficácia, durante cinco anos em Tarso. Assim, o tempo da conversão e o da manifestação em público, desde
Damasco até a missão na Antioquia da Síria, somariam oito anos (MAZZAROLO, 2011, p.14-16).

Muito bem, pessoal, para encerrar nossa primeira aula, sigo ainda com Mazzarolo (2011, p.16-19) que seleciona alguns textos bíblicos extraídos das cartas de Paulo, os quais o autor
batiza de “relatos autobiográficos”. São textos muito interessantes e didáticos, que devem ser lidos atentamente, já que nos ajudarão a compreender melhor a trajetória de Saulo até
os dias em que se tornou Paulo e começou, então, sua marcante caminhada apostólica. São estes: Fp 3,5-7; Gl 1,13-24; 1Co 4,9-13; 2Co 11,21-33; At 22,3-5; At 26,1-23.

Paulo como cidadão romano: Segundo seu status legal, Paulo era um judeu privilegiado da diáspora. Segundo At 16,37s; 22,25; 23,27, ele possuía a
cidadania romana, que podia ser adquirida por nascimento, libertação concedida ou comprada da escravidão, libertação da prisão de guerra,
dispensa de serviço militar prolongado e adoção ou acolhida na associação dos cidadãos. [...] Paulo possuía a cidadania romana provavelmente como
descendente de um escravo judeu liberto (cf. At 22,28). Fílon relata, sobre os judeus que viviam em Roma, que eram em sua maioria libertos e
cidadãos romanos. Além disso, havia um grande número de judeus libertos que voltaram para a Judéia e que possuíam a cidadania romana. [...] O
apóstolo não assumiu o nome Paulo só para facilitar contatos sociais no âmbito de sua missão (cf. At 13,7-12). Ao contrário, Paulo é um nome
romano, que Saulo (cf. At 7,58; 8,1.3; 9,1.8.22.24 etc.) portava como cidadão romano desde o início. Fonte: SCHNELLE (2010, p. 65-68).

CONTEXTO EM QUE atuou Paulo


Paulo viveu e atuou no primeiro século da era cristã, período marcado, já anteriormente, pelas políticas dos grandes impérios. É preciso ressaltar que, na Antiguidade, os grandes
impérios obtinham suas conquistas e estabeleciam suas formas de governo através da força e da impiedade. Eles condenavam os povos dominados e são lembrados pela capacidade
de fazer vítimas. A violação não era apenas um exercício de força física. Quando se leva em consideração a justiça e a igualdade entre semelhantes como referencial, facilmente se
percebem outras formas de abuso. Essas formas se manifestavam em relacionamentos humanos comprometedores, através de práticas econômicas, sociais, políticas, ideológicas e
até mesmo religiosas. Tais práticas podem ser resumidas como manifestação e desencadeamento de um desejo egoísta de ter mais poder do que o outro, transformando-o em sua
vítima.

Os dias do apóstolo foram marcados pela dominação e colonização de um dos maiores, mais cruéis e incompassivos impérios de todos os tempos. O Império Romano é lembrado na
história pelo exercício da impiedade como tática comum em resposta ao anseio pela conquista, exploração e dominação. Conceitos como oiktirmos , por exemplo, cuja finalidade era a
orientação das relações interpessoais a partir do princípio da misericórdia/compaixão, não estavam na pauta dos dominadores.

Era a partir das imposições imperiais que a vida dos povos subjugados deveria ser organizada. Alguns historiadores mencionam cadáveres e um ambiente extremamente
sanguinário, no qual muitos pagaram pelo desenvolvimento romano com a própria vida. O poder romano e suas estratégias de controle eram, conforme Reimer, sinônimo de:

(1) exploração de recursos naturais e humanos;

(2) violência física, sexual e psicológica contra todas as pessoas;

(3) expansão e construção na base do trabalho escravo e da imposição de impostos e tributos (REIMER, 2006, p.74).

Na ampliação de seu domínio em grande parte do mediterrâneo, o Império começava a propagar e trabalhar na afirmação de uma nova ordem mundial, aparentemente de
pacificação, mas que se estabelecia (1) através da exploração sistemática dos povos conquistados e (2) com imposições de controles sociais arbitrários. Á medida que se consolidava,
a nova ordem mundial provava que suas bases eram incompatíveis com o valor da vida. Isso ganha notoriedade com a negligência de medidas de misericórdia/compaixão para com
aqueles que não possuíam condições mínimas de subsistência. Pelo contrário, além da omissão, a nova ordem mundial sufocava os que não atendiam as imposições imperiais,
sujeitando-os a toda forma de injustiça.

Para justificar os caminhos da nova ordem mundial, os detentores do poder tentavam convencer os povos vencidos através de argumentos em favor da civilização e do
desenvolvimento ou através da divulgação de valores nobres; como a pax romana , por exemplo. Todavia, a ação imperial desenvolvida pelos romanos em nome dessa pax não fazia
jus ao real sentido do termo. É difícil imaginar uma paz que se impõe através de armas e autoritarismo, ou seja, o discurso era contraditório, já que o poder romano, conforme explica
Wengst, “causava terror e insegurança, para então se oferecer e agir como refúgio e paz. [...] A paz estabelecida e mantida com meios militares é acompanhada de rios de sangue e
lágrimas, cuja dimensão não se pode imaginar” (1991, p.25). Além disso, um ambiente incompassivo, no qual reinava a impiedade, não pode ser considerado um espaço de paz. Em
oposição à pax romana , segundo Bingemer, “a dinâmica da paz neotestamentária é inseparável da dinâmica do amor” (2001, p.68) e propõe a superação da incapacidade de olhar e
agir com misericórdia.

Mas de que forma esses argumentos, tão claramente contraditórios, conseguiam se sustentar? Entre os motivos pesquisados, além da imposição armada, encontra- -se o motivo da
“vontade do destino divino”, conforme explica Wengst. O autor cita o exemplo do historiador judaico-romano Flávio Josefo para demonstrar a força de tal hipótese: “Flávio Josefo
deixou-se impressionar tanto pelo poder de Roma, que até coloca Deus a favor do direito do mais forte, agora mesmo proclamando. Por conseguinte, os revoltosos judeus fazem
guerra não só contra os romanos, mas também contra Deus” (1991, p.28).

No alicerce desse discurso estava o argumento de que o domínio que os romanos exerciam era um favor divino merecido por Roma por causa de sua piedade e justiça, isto é, os
romanos tentavam ludibriar os povos subjugados legitimando suas ações e conquistas com base no desejo dos deuses e no bem que isso poderia gerar. Com base nessa tese, não é
difícil concluir que, além da insensibilidade e impiedade, havia uma estratégia para se usurpar a consciência e o coração dos povos vencidos, fragilizados pela situação vigente.

As comunidades urbanas em que o apóstolo Paulo trabalhou não estavam imunes àquele mundo de hostilidades. Pelo contrário! Sofriam diretamente as consequências de um
modelo governamental incompassivo e ímpio. Vejamos alguns exemplos:

• (1) Em Tessalônica, capital da Macedônia e província romana, o regime escravagista, opressor, era uma forte realidade. Havia muitos trabalhadores escravos em estado de miséria.
Ao que tudo indica, qualquer discurso com indícios de misericórdia repercutia como utópico ou como esperança apocalíptica;

• (2) A realidade de Corinto era bem parecida. A cidade, conforme Hoefelmann, “era um reflexo da realidade contraditória do Império Romano: de um lado, minorias opulentas a
explorar o trabalho alheio, de outro, massas marginalizadas e desorientadas a lutar pela sobrevivência, sem dispor do próprio corpo, no caso dos escravos” (1996, p.25).

• (3) A situação em Roma não era diferente. Fruto do modelo administrativo imperial, havia uma acentuada divisão de classes (cf. Rm 12,16), muitos escravos em condições
subumanas e famílias da comunidade vivendo de forma precária entre os estratos mais baixos da sociedade.

• (4) A comunidade de Filipos estava localizada na Macedônia. Uma região saqueada pelo Império, caracterizada pela miséria e pela “profunda pobreza”. Entretanto, chama atenção
a postura misericordiosa e o desprendimento generoso na participação da assistência aos necessitados em Corinto (2Cor 8,1-15). Essa atitude, seguramente, autenticava e
viabilizava o desafio paulino quanto à compaixão, mesmo em um contexto contrastante.

Além da impiedade advinda do Império Romano, os povos conquistados estavam à mercê da violência promovida pela religião institucionalizada. O agravante, neste caso, era a
figura divina atrelada aos detentores do poder já que, desde a Antiguidade, o oriente considerava os soberanos como filhos dos deuses. Homens importantes podiam ser elevados
da condição humana à divina e ser venerados como tais. Eles recebiam poder, honra e leis de proteção para governar o povo. Suas ações eram, então, legitimadas pela função que
assumiram, tornando-os intocáveis e inquestionáveis.

Essa tática alcançava sucesso graças ao poder simbólico da religião para a vida do povo. Ainda que atrocidades fossem cometidas, eram cometidas em nome da vontade de uma
divindade, formulada no discurso de um Imperador. Certos disso, os poderes religiosos e políticos usavam desse tipo de artifício para alcançar seus objetivos, isto é, ludibriavam o
povo e encontravam espaço para a manutenção de suas práticas usando o sagrado como referencial.

De maneira geral, as divindades assumidas pelo Império Romano eram retratadas como impiedosas; característica que autenticava, portanto, o comportamento incompassivo dos
imperadores, especialmente com aqueles que eram, injustamente, rotulados como insubmissos, como era o caso dos cristãos, por exemplo. Esse detalhe nos indica que a
perseguição que sofriam os cristãos não era apenas religiosa, conforme nossa compreensão de religião na atualidade, mas sim sócio-política-religiosa. A opção de vida dos cristãos
era uma ameaça a toda estrutura vigente. Soava ao Império como um movimento de resistência ameaçadora, já que não se tratava de uma fé sem implicações para todas as
dimensões da vida, no cotidiano. Funari explica que:

a tolerância que os romanos tiveram para com diversas religiões do mundo por eles conquistadas não existiu, entretanto, para com a religião
[...]

cristã. Os motivos da intensa perseguição sofrida pelos cristãos no período imperial não são somente de caráter religioso, mas também e
principalmente político (FUNARI, 2011, p.130).

Além das relações com a religião já mencionadas, os romanos estabeleceram uma espécie de religião oficial baseada no Culto ao Imperador. Eram os interesses políticos que
determinavam a relevância, a necessidade de afirmação e a prática desta religião em cada região conquistada. O fundamento desta religião era a lealdade dos súditos ao Imperador
e, consequentemente, às imposições do Império. É preciso salientar que essa lealdade não se afirmava com mero discurso.

Antes, se concretizava em:

• (1) Opções concretas pelas opções de seu Senhor;

• (2) Obediência/submissão irrestrita a Ele;

Um dos momentos mais significativos nas celebrações dedicadas ao Imperador era a afirmação de seu senhorio: “César é o Kyrios” (Senhor). Tal afirmação era o reconhecimento de
sua identidade divina e, por isso mesmo, de sua autorização para governar/legislar da forma que lhe convinha. Funari (2011, p. 130) destaca que os cristãos “se recusavam mostrar
respeito pelos deuses romanos” (2011, p. 130) e “não reconheciam a divindade do Imperador e não aceitavam o culto a ele e ao Estado, sendo uma ameaça à segurança do Estado
romano” “Não reconheciam a divindade do Imperador e não aceitavam o culto a ele e ao Estado, sendo uma ameaça à segurança do Estado romano” (2011, p. 130).

Não era apenas uma questão de confissão, mas de submissão aos valores do verdadeiro Kyrios . Neste sentido, a afirmação de Rubeaux (1987, p. 66-67) é precisa: negar a divindade
de César era negar o sistema religioso que legitimava o poder imperial. Os cristãos se tornavam subversivos, afirmando que há um outro rei. O autor destaca, ainda, que os cristãos
não apenas afirmavam que César não era Deus,

mas proclamavam que seu Deus era Pai de todos e que todos eram chamados a formar uma grande família de irmãos e irmãs, frustrando assim o
[...]

projeto de César de se apresentar como Pai do Império (título dado ao Imperador César Augusto em 2 a. C.). Afinal, tinham pretensões políticas ao
confessar um Deus único e Pai de todos (RUBEAUX, 1987, p. 66-67).

Ainda sobre o contexto religioso em que atuou Paulo, vale mencionar o protagonismo do judaísmo (e até mesmo dos judeu-cristãos) e sua oposição/pressão ao apóstolo e aos
cristãos primitivos. Todavia, trataremos do assunto em outro momento, na medida em que abordarmos cada comunidade com a qual se relacionou o apóstolo.

A missão paulina aos gentios realizou-se em condições básicas políticas e religiosas extremamente complexas e acelerou consideravelmente a
separação do cristianismo do judaísmo. A situação de concorrência, efetivamente presente desde o início, agravou-se consideravelmente em virtude
dos sucessos da missão livre da circuncisão entre os gentios. A reação de defesa e rejeição que isso provocou no judaísmo acelerou o processo da
auto definição do novo movimento e, com isso, também a desvinculação do judaísmo. [...] As perseguições mostram que os crentes em Cristo eram
percebidos também pelo judaísmo como alheios e ameaçadores. [...] O judaísmo não podia estar interessado em ser relacionado diretamente com um
movimento que venerava como Filho de Deus um revoltoso executado pelos romanos.

Fonte: Schnelle (2010, p. 65-68).


O MINISTÉRIO de Paulo

A atuação de Paulo
Um bom ponto de partida para a compreensão da atuação ministerial de Paulo é a leitura cronológica indicada pelo próprio apóstolo nas cartas que escreveu ao longo de sua
jornada. Dentre os estudiosos que se dedicaram a essa tarefa, destaco o trabalho de Vouga (2015, p. 171-174), que escreve em sete passos a possível “cronologia da missão paulina”,
à luz de suas cartas. Minha sugestão é que você não apenas leia a descrição de cada passo, mas que os acompanhe lendo também os textos bíblicos indicados pelo autor.

• (1) “O relato autobiográfico de Gálatas 1,13-2,21; ele fornece um calendário contínuo, começando com a vocação de Paulo e terminando com o Concílio de Jerusalém e o
incidente de Antioquia”.

• (2) “A notícia das etapas sucessivas (Filipo, Tessalônica, Atenas) que procederam à primeira chegada do apóstolo a Corinto (1Ts 2,2; 3,1-6)”.

• (3) “A intenção de Paulo de permanecer em Éfeso até Pentecostes (1Cor 16,8)”.

• (4) “Os planos de viagem de Éfeso a Corinto, passando pela Macedônia (1Cor 16,5-7); esses planos provavelmente substituem os de 2 Coríntios 1,15-16, modificados pelas razões
indicadas em 2 Coríntios 1,17-2,11”.

• (5) “Os relatos de viagem em 2 Coríntios 2,12-13 e 7,5-7 (Paulo em Trôade e na Macedônia [Filipos] a caminho de Corinto)”.

• (6) “Os anúncios da visita a Corinto (2Cor 9,4; 10,2; 12,14; 13,1.10)”.

• (7) “Os planos de viagem a Jerusalém, a Roma e na Espanha (Rm 15,14-32)”.

Sigo com Vouga (2015, p. 171-173) que além de selecionar os textos que vimos acima como indicativos cronológicos da missão paulina, faz alguns comentários que nos auxiliam
ainda mais em nosso objetivo aqui - que é compreender, ainda que de forma introdutória, os principais pontos da trajetória ministerial de Paulo. Vejamos:

“Da vocação de Paulo à segunda viagem missionária”:


O conjunto dessas informações permite reconstruir de maneira relativamente precisa o desenrolar dos quinze primeiros anos do apostolado paulino. Vouga (2015, p. 171- 173)
entende que, de fato, “esses anos são abrangidos pelo relato de Gálatas 1,13-2,21, referente ao período que vai desde sua vocação até sua segunda viagem a Jerusalém”.

“Paulo na Ásia, na Macedônia e na Grécia”:


Os dados concernentes às viagens à Ásia, à Macedônia e à Grécia, isto é, o período de grande produtividade literária do apóstolo, reduzem-se a alguns elementos fragmentados
(1Ts; 1 e 2Cor; Rm); seria difícil ordená-las sem o contexto fornecido pelos Atos dos Apóstolos. Essas informações fragmentadas são, todavia, muito preciosas; concernem
essencialmente ao presente imediato e permitem-nos, por essa razão, datar com certa precisão as cartas que as contêm (VOUGA, 2015, p. 171-173)

“Da última estadia em Corinto aos projetos da Espanha”:


A partir da última estadia em Corinto, diz Vouga (2015, p. 174), “as cartas (essencialmente: Rm 15,14-32) só nos informam dos projetos de viagem a Jerusalém e, depois, à Espanha,
passando por Roma”.

Além das cartas, é possível estudar a missão paulina através de uma cronologia no livro dos Atos dos Apóstolos. Estudiosos entendem que, ainda que Atos não faça menção à
produção literária, existe certo complemento entre as duas cronologias e que, nesse caso, é fundamental estudar ambas. Para Vouga, “diferentemente das epístolas, os Atos nos
oferecem um relato contínuo da atividade apostólica” (2015, p.174). Ele conta que “os descontos da história lucana se tornam, aliás, particularmente precisos para todo o período
que começa com a grande estadia em Éfeso e termina como os dois anos que se seguem à chegada do apóstolo a Roma”. Para o autor “esse lapso de tempo cobre os dez últimos anos
conhecidos do apostolado paulino”.

Vejamos os detalhes:

• “A estadia em Éfeso (At 19, 1-40)”;

• “A viagem por Trôade e pela Macedônia a caminho de Corinto (At 20,1-3a)”

• “Depois a partida para Jerusalém, passando pela Macedônia (At 20,3b-16)”;

• “A despedida dos anciãos de Éfeso em Mileto (At 20,17-38)”;

• “A chegada e a prisão em Jerusalém (At 21,1-23,10)”;

• “Os dois anos em Cesaréia (At 23,11-26,32)”;

• “O embarque para Roma e a chegada à Itália (At 27,1-28,31)”;

Pois bem, depois de passar pelas cronologias, é interessante notar que uma das tônicas do ministério do apóstolo segue em uma de suas identificações: “Paulo, apóstolo dos
gentios”. Esta marca inegável significou para o apóstolo uma série de controvérsias que aparecem em vários de seus escritos, apontando, assim, sua importância. Nesta aula,
faremos breves comentários a respeito, já que o tema deve surgir novamente mais adiante.

Uma boa referência para a compreensão da atuação de Paulo entre os gentios é a comunidade de Antioquia, considerada por Becker, por exemplo, como “pioneira da missão entre
os gentios à margem da Lei” (2007, p. 128-129). O autor entende que Barnabé “tenha levado Paulo a Antioquia, exatamente para, com sua colaboração, seguir orientando a
comunidade para uma atitude de maior liberdade diante da Lei (BECKER, 2007, p. 128-129)”.

Becker (2007) cita o livro de Atos para indicar algumas características desta importante comunidade. Vejamos:

• “Os cristãos antioquenos passaram a evangelizar a população grega de Antioquia, que nada tinha a ver até então com a sinagoga. Alcançam êxito nessa empreitada (11.20s)”.

• “Em Antioquia, pela primeira vez, os “discípulos” são chamados de “cristãos” (11.26)”.

• “A comunidade envia Barnabé e Paulo para a assim chamada primeira viagem missionária (13s). Ela é exemplar para a missão junto aos gentios (14.27) que estão à margem da lei
(13.38s) e para a fundação de comunidades gentio-cristãs (13.44-52; 14.21-23)”.

As três indicações possuem um sentido razoável. [...] Delas, deve-se deduzir o seguinte: uma vez que a fronteira entre os simpatizantes (tementes a
Deus) e os que estavam distantes da sinagoga era fluida, produziu-se em Antioquia – certamente pela primeira vez dentro do cristianismo primitivo –
o fenômeno de que os membros da comunidade cristã, que eram até então um grupo dentro da federação de sinagogas, começaram a anunciar a fé
cristã para aqueles habitantes da cidade que haviam mantido uma relação distante com o judaísmo (BECKER, 2007, p.128-129).

Uma leitura atenta da história sintetiza-se na conclusão de Becker (2007, p. 128-129) de que “se os simpatizantes ‘tementes a Deus’ podiam ser batizados sem serem circuncidados,
então incircuncisos também podiam ser batizados, uma vez que abraçassem a parte da mensagem cristã que os judeus já professavam” (2007, p.130). Essa mensagem, nas palavras
do autor, resume-se em: (1) abandono do culto pagão; (2) adoção do monoteísmo judeu-cristão. Agindo dessa forma, os incircuncisos estariam “equiparando-se, assim, aos
simpatizantes “tementes a Deus” conhecidos pela sinagoga”.

Não é difícil imaginar a possibilidade de algumas tensões/crises que daí surgiram, até chegar a uma ruptura com a federação de sinagogas. Sigo com Becker, que cita dois exemplos
que podem ter suscitado tais crises e seus desdobramentos.

• (1) Esta novidade constituiu uma ruptura com a Lei. [...] A pureza ritual da sinagoga corria perigo de modo permanente e radical;

• (2) Como um judeu, por exemplo, não podia sentar-se à mesa como um gentio – e nem sequer entrar na casa de um gentio – sem tornar-se ritualmente impuro (At 11.2s);

Para os cristãos, inversamente, esta missão constituiu um grande êxito, porque aumentou o número de cristãos de origem “grega”, cidadãos não
judeus que utilizavam o grego como língua corrente. Evidentemente essa missão entre os gentios alcançou melhores resultados do que a missão feita
entre os judeus, que se retraíram cada vez mais. Em resumo: a comunidade cristã decidiu abandonar a federação das sinagogas. Assim, estava livre
dos problemas com a Lei e também com a sinagoga. Podia, desse modo, seguir evangelizando sem problemas onde havia conseguido alcançar êxito.
Sinal desta ruptura é o nome que recebeu a jovem comunidade: “cristãos”. É um nome que sugere a autonomia do grupo e que foi aplicado à
comunidade (BECKER, 2007, p.130).

Em suma, como apontou Becker (2007, p. 131-132), “Cristianismo e missão expansiva eram, inicialmente, termos afins. [...] A esta missão, os cristãos de Antioquia deveram sua fé”.
Era uma reação natural, portanto, “que eles também se somassem à atividade missionária. Assim, a comunidade enviou Barnabé e Paulo. Eles se dirigiram a Chipre e foram para
Derbe, passando por Perge, Antioquia da Pisídia, Icônio e Listra”.
Dessa forma, justamente a crescente missão junto aos gentios e o surgimento de comunidades gentio-cristãs tornaram-se um problema para os
judeu-cristãos que tinham seu centro em Jerusalém. O fato de, em Antioquia, ter-se desenvolvido um pequeno centro de missão gentio-cristão, com
a fundação das primeiras comunidades livres em relação à Lei, fez que surgissem controvérsias no centro missionário judeu-cristão, ligado à
sinagoga, que era Jerusalém (BECKER, 2007, p. 131-132).

Esse ambiente de crise motivou o “Concílio Apostólico”, conhecido também como “Concílio de Jerusalém” (cf. At 15). A pauta principal, conforme Becker, era “se o cristianismo podia
basear-se exclusivamente na fé em Cristo fora da sinagoga e sem o respaldo da Lei, bem como se esta comunidade podia ser reconhecida da mesma maneira que as comunidades
judeu-cristãs existentes no interior da sinagoga” (2007, pp.132-134). Em linhas gerais a oposição era:

• Posição de Paulo: “a ação de Deus é patente no campo missionário. Deus aí age sem acepção de pessoas (Gl 2.6). Ele mesmo, mediante o Evangelho, produz a fé e proporciona o
Espírito, sem a necessidade de que os gentios sejam circuncidados (cf. 1 Ts 1s)”.

• Posição judeu-cristã: “para poder salvar-se, é preciso circuncidar-se e observar a Lei. Tratava-se, portanto, da importância essencial da lei judaica para a salvação”. Além disso,
“somente o povo judeu é eleito”. Por isso, um gentio só pode esperar a salvação tornando-se judeu mediante a circuncisão.

A posição contrária estava representada por alguns “falsos irmãos infiltrados” (Gl 2.4), como os qualifica Paulo em tom polêmico. Eles acolhiam
“liberdade... em Cristo Jesus” conforme uma fórmula antioquiana da época (Gl 2.4) e pretendiam “escravizar” os antioquenos, isto é, obrigá-los a se
submeterem à Lei judaica (2.4s). Para Paulo a “verdade do evangelho” estava em jogo (BECKER, 2007, p. 132-134).

O desfecho destas controvérsias, se é que assim podemos dizer, está no capítulo 15 de Atos; conforme já mencionamos, naquele que ficou conhecido como “Concílio de Jerusalém”.
Na prática, entretanto, a perseguição continuou e o tema ganhou evidência em alguns textos do apóstolo, tornando-se, inclusive, chave de leitura para vários deles. Voltaremos ao
assunto em outro momento.

Cartas Paulinas
Não poderíamos encerrar esta aula sem pelo menos fazer breves comentários sobre a produção literária de Paulo. O cânon do Novo Testamento indica 13 cartas atribuídas a Paulo.
Seis delas são classificadas como (1) “cartas maiores”: duas cartas aos tessalonicenses; duas cartas aos coríntios, carta aos gálatas; carta aos romanos. Outras quatro são
identificadas como (2) “cartas da prisão”: Carta aos efésios, carta aos filipenses, carta aos colossenses e carta a Filemom. Por fim, restam três cartas e estas são classificadas como
(3) “cartas pastorais”: duas delas a Timóteo e uma a Tito.

Na atualidade, boa parte da pesquisa bíblica propõe a organização da coleção de cartas paulinas da seguinte forma: (1) Sete cartas são consideradas autênticas - quer dizer,
ditadas/escritas e enviadas pessoalmente pelo apóstolo: a epístola aos Romanos; as duas epístolas aos Coríntios a epístola aos Gálatas; a epístola aos Filipenses; a primeira epístola
aos Tessalonicenses a epístola a Filemom. Estas passaram a ser chamadas de “protopaulinas”. (2) Três cartas são consideradas como obra de seus discípulos: a segunda epístola aos
Tessalonicenses, Efésios e Colossenses. Estas são chamadas de “deuteropaulinas”. (3) Três cartas mais tardias: as chamadas cartas pastorais, escritas a Timóteo (duas) e a Tito. Estas
são chamadas de “tritopaulinas”. Para efeitos didáticos, usaremos a estrutura do parágrafo anterior, que organiza as cartas em três blocos, como você deve ter percebido: cartas
maiores; cartas da prisão; cartas pastorais.

Nesta introdução, é preciso considerar com atenção a prerrogativa de Vouga (2015, p. 183), de que “Paulo, certamente, dirigiu suas cartas a comunidades particulares que tinham
sua própria história e suas próprias particularidades”. A questão está na tendência atual de ler seus textos de forma universal, desconsiderando, portanto, aquilo que o autor chama
de “particularidades”. Sem esta percepção, e compreensão de tais particularidades, corremos o risco de uma leitura precipitada e, consequentemente, inadequada das cartas do
apóstolo.

Quando estamos diante de um texto bíblico, uma boa pergunta introdutória é pelos motivos que levaram seu autor a escrever o texto em questão. Quando se trata de textos
paulinos, sigo com Vouga que assim trabalha com esta pergunta: “alguns escrevem por prazer, a maioria o faz por necessidade. As cartas paulinas, quer sejam proto, dêutero, ou
tritopaulinas, não escapam à regra” (2015, p.186). Note bem a sua conclusão: “isso significa que a argumentação que desenvolvem não se constrói no vazio, mas é em grande parte
determinada pelas contingências históricas” (2015, p.186). Vouga, então, cita pelo menos três motivos, “necessidades”, que provocaram os escritos de Paulo:

• “Por um lado, o apóstolo deve deixar clara sua compreensão do Evangelho em nome do qual fundou suas Igrejas”.

• “Por outro lado, ele desfaz mal-entendidos que possam ter surgido entre ele e seus destinatários”.

• “Finalmente, ele toma distância em relação a outros ensinamentos ou a outros apóstolos que, conforme sua própria convicção, deformam ou traem a força libertadora do
Evangelho de Deus”.

Quanto ao gênero literário da carta antiga e sua caracterização, Vouga menciona a função primária da carta, que é “substituir uma visita e um diálogo direto que não podem ser
realizados. Seu primeiro papel é assegurar certa presença do parente, do amigo ou do interlocutor ausente” (2015, p.196). É por essa razão, diz o autor, “que o anúncio de uma
próxima visita e o desejo de reencontrar, que pode exprimir sentimentos verdadeiros, fazem parte do próprio gênero da carta para a família ou para os amigos (VOUGA, 2015, p.
196)”.

Por fim, antes de terminarmos esta aula, vale mencionar que quanto ao processo de coleção de cartas, Vouga explica a semelhança com outras coleções “como as das cartas de
Platão ou de Epicuro” (2015, p.184). Note bem a função destas coleções, ao final do texto do autor, pois elas se aplicam à hipótese paulina.

São cartas de filósofos, de chefes de escola e de mestres do pensar. Foram lidas, conservadas, reunidas e transmitidas pela comunidade de seus
alunos, que a elas se referem como a textos fundadores. Quer dizer que essas cartas não são consideradas e tratadas somente como documentos
históricos, mas também como os testemunhos, para a vida atual, da verdade ensinada por seu autor (VOUGA, 2015, p. 196).

Escola Paulina

Que houve uma escola paulina, uma tradição paulina, feita de discípulos fiéis durante várias gerações, fica fora de qualquer dúvida. Quem teria
reunido um corpus de epístolas paulinas se não fosse essa escola? A escola paulina assumiu duas tarefas. A primeira consistiu em continuar e
prolongar a mensagem de Paulo, adaptando-a a circunstâncias novas para que não perdesse atualidade, abrindo-a para novos problemas. Os
discípulos de Paulo foram os redatores de várias epístolas escritas, às vezes, muitos anos depois da morte do apóstolo. Que um discípulo se coloque
no lugar do mestre para redigir e assinar em nome dele uma carta ou um tratado não era coisa estranha na Antiguidade [...] A segunda tarefa dos
discípulos consistiu em reunir os escritos do mestre para poder constituir um corpus, separá-los de escritos espúrios que pessoas bem intencionadas,
mas desequilibradas queriam misturar com a obra autêntica. Depois disso a tarefa consistiu em integrar a obra paulina dentro do corpus ou cânon da
Igreja Universal. Os discípulos conseguiram que os escritos de Paulo fossem reconhecidos e aceitos pelas outras igrejas não paulinas e fizessem parte
do cânon.

Fonte: COMBLIN (1993, p.171).

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ATIVIDADES
1. Conforme a descrição de Boring,

a) “Paulo descreve a si mesmo com um zelote na antiga fé, disposto a destruir a igreja”.

b) O zelo de Paulo pela lei foi “modelada sobre o zelo de Finéias, que matou aqueles que violaram a aliança e encorajaram outros a fazê-lo”.

c) O zelo de Paulo pela lei, fez com que “o próprio Paulo defendesse violência e mesmo pena de morte para aqueles que estavam profanando a aliança”.

d) O zelo de Paulo pela lei, fez com que “o próprio Paulo impedisse a missão do povo santo de Deus (At 26,10)”.

e) Todas as alternativas estão corretas.

2. No contexto de atuação de Paulo, um dos momentos mais significativos nas celebrações dedicadas ao Imperador era a afirmação de seu senhorio: “César é o Kyrios” (Senhor).

a) Tal afirmação, para os romanos, era o reconhecimento de sua identidade divina.

b) Tal afirmação, para os romanos, era o reconhecimento de sua autorização para governar/legislar da forma que lhe convinha.

c) Os cristãos recusavam-se a mostrar respeito pelos deuses romanos.

d) Os cristãos não reconheciam a divindade do Imperador e não aceitavam o culto a ele e ao Estado, sendo uma ameaça à segurança do Estado romano.

e) Todas as alternativas estão corretas.

3. Segundo o argumento de Vouga, “Paulo, certamente, dirigiu suas cartas a comunidades particulares que tinham sua própria história e suas próprias particularidades” (2015,
p.183). A questão está na tendência atual de ler seus textos de forma universal, desconsiderando, portanto, aquilo que o autor chama de “particularidades”. Sem esta percepção e
sem a compreensão de tais particularidades, corremos o risco de uma leitura precipitada e, consequentemente, inadequada das cartas do apóstolo.

a) [ ] Verdadeiro

b) [ ] Falso

Resolução das atividades

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RESUMO
Neste estudo, destacamos alguns passos que conduziram Saulo, o perseguidor da igreja, a se tornar Paulo, apóstolo de Jesus Cristo. Vimos que este processo, segundo Mazzarolo
(2011, p. 14-16), se deu em quatro etapas: (1) A morte de Estevão: “Alguns estudiosos afirmam que Estevão e Paulo eram amigos. [Portanto] A morte de Estevão abala as convicções
de Saulo”; (2) Damasco: “A crise foi aumentando à medida que ele se aproximava da cidade e, no seu auge, Deus o chama para o serviço de seu Filho, o Caminho (At 9,1-5)”; (3) A
Arábia: “a referência de Gl 1,13-18 e os estudos arqueológicos atuais sustentam que ele não apenas busca refúgio na Arábia, mas é o primeiro evangelizador dessas terras”; (4)
Tarso: “Levando em consideração a sua chegada na Antioquia, para auxiliar Barnabé, Saulo teria trabalhado no silêncio, mas com grande eficácia, durante cinco anos em Tarso”.

Vimos também que o contexto de atuação de Paulo era extremamente adverso e que as comunidades urbanas em que o apóstolo trabalhou não estavam imunes àquele mundo de
hostilidades. (1) Em Tessalônica, capital da Macedônia e província romana, por exemplo, haviam muitos trabalhadores escravos em um estado de miséria. (2) A realidade de Corinto
era bem parecida. A cidade, conforme Hoefelmann, “era um reflexo da realidade contraditória do Império Romano: de um lado, minorias opulentes a explorar o trabalho alheio, de
outro, massas marginalizadas e desorientadas a lutar pela sobrevivência” (1996, p.25), (3) A situação em Roma não era diferente. Fruto do modelo administrativo imperial, havia
uma acentuada divisão de e famílias da comunidade vivendo de forma precária. (4) A comunidade de Filipos estava localizada na Macedônia. Uma região saqueada pelo Império,
caracterizada pela miséria e pela “profunda pobreza”.

Além das dificuldades advindas das táticas administrativas do Império Romano, o avanço do evangelho sofria várias retaliações, especialmente por parte do judaísmo. Nesse caso, a
pressão sobre Paulo era grande, já que abertamente se constituiu no apóstolo dos gentios, preocupado em esclarecer que a boa nova do evangelho se materializava na inclusão de
todos os povos. A relação com as comunidades cristãs nascentes obrigou o apóstolo a se comunicar com estes a quem chamava de irmãos através de cartas. Seus conteúdos,
conforme vimos neste estudo, não eram universais; antes, porém, tratavam de questões bem particulares que respondiam as possíveis crises e dúvidas da comunidade.

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Material Complementar

Leitura
Paulo: vida e pensamento

Autor: Udo Schnelle

Editora: Academia Cristã

Sinopse : Esta obra de Udo Schnelle condensa os elementos fundamentais da vida, dos escritos e
teologia de Paulo de uma forma didaticamente clara. Ao estudante que deseja se encontrar de uma
forma ordenada e progressiva com a literatura e o pensamento paulino, o livro servirá de alicerce.
Àquele que deseja uma síntese sistemática da vida e do pensamento teológico do apóstolo, o livro
servirá de compêndio.

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REFERÊNCIAS
BECKER, Jürgen. Apóstolo Paulo, vida, obra e teologia. São Paulo: Academia Cristã, 2007.

BÍBLIA. Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri: Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.

BINGEMER, Maria Clara Lucchetti (org.). Violência e religião: Cristianismo, Islamismo, Judaísmo: três religiões em confronto e diálogo. Rio de Janeiro: PUC-Rio;
São Paulo: Loyola, 2001.

BORING, Eugene. Questões Introdutórias do Novo Testamento e Escritos Paulinos. In: BORING, Eugene. Introdução ao Novo Testamento: história, literatura,
teologia. v. 1. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2015.

BROWN, Raymond. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2004.

BULTMANN, Rudolf. O que o Jesus Histórico significou para a Teologia de Paulo. In: Crer e Compreender. São Leopoldo: Sinodal, 1946.

COMBLIN, José. Paulo apóstolo de Jesus Cristo. Petrópolis: Vozes, 1993.

FUNARI, Pedro Paulo. Grécia e Roma. São Paulo: Contexto, 2011.

HOEFELMANN, Verner. Sociologia das comunidades de Paulo: Corinto, contradições e conflitos de uma comunidade urbana. Estudos Bíblicos, n. 25. Petrópolis:
Vozes, 1996.

KOESTER, Helmut. História, cultura e religião do período helenístico. In: KOESTER, Helmut. Introdução ao Novo Testamento. v. 1. São Paulo: Paulus, 2005.

MAZZAROLO, Isidoro. O Apóstolo Paulo: o Grego, o Judeu e o Cristão. Rio de Janeiro, Mazzarolo, 2011.

REIMER, Ivoni Richter. Economia no mundo bíblico: enfoques sociais, históricos e teológicos. São Leopoldo: CEBI/Sinodal, 2006.

RUBEAUX, Francisco. A violência dos opressores e o direito dos pobres à vida na Bíblia: a luta per manente. In: Estudos Bíblicos , n. 6, Petrópolis: Vozes, 1987,
p.65-77.

SCHNELLE, Udo. Paulo: vida e pensamento. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2010.

SILVA, Flávio Henrique de Oliveira. PROENÇA, Wander de Lara. Introdução ao Novo Testamento. Londrina: FTSA, 2014.

VOUGA, François. Cronologia paulina. In: MARGUERAT, Daniel (Org.). Novo Testamento: história, escritura e teologia. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2015. p.171-180.

_______________. O corpus paulino. In MARGUERAT, Daniel (Org.). Novo Testamento: história, escritura e teologia. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2015, p.181-203.

WENGST, Klaus. Pax Romana: pretensão e realidade. São Paulo: Paulinas, 1991.

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APROFUNDANDO

Viagens e Método Missionário de Paulo

Um ponto de partida interessante para a compreensão do ministério de Paulo são as viagens que o apóstolo realizou, conhecidas como viagens missionárias. A primeira delas teve
seu início por volta do ano 46 d. C. (At. 13,1-3), quando Paulo tinha aproximadamente 41 anos; o fim da terceira viagem foi por volta do ano 58. Na oportunidade o apóstolo foi preso
na praça do templo (At. 21. 27- 54). Ao todo, conforme indicam alguns estudiosos, e pelos cálculos acima, foram aproximadamente 12 anos viajando, levando o evangelho para os
mais diversos lugares (2Co 11, 25-26). Entre os pesquisadores existe certa dúvida sobre a quantidade de viagens realizadas. Alguns defendem três e outros defendem quatro. Entre
os que defendem quatro, cito a Bíblia de Genebra e suas notas introdutórias (1999, pp.1290-1310), que assim organiza e comenta cada uma das viagens.

Primeira viagem missionária – Galácia (At 13; 14)

Paulo e Barnabé foram enviados pela igreja de Antioquia (At 13.1-3) e se dirigiram às cidades da Galácia, na Ásia Menor. As sinagogas judaicas, nessas cidades, providenciaram a
Paulo uma plataforma para a pregação do evangelho. Em certas ocasiões, entretanto, ele encontrou oposição nas próprias sinagogas (BÍBLIA, 1999, p.1290-1310).

Segunda viagem missionária – Grécia (At 15, 9-18,22)

Iniciando a viagem em Jerusalém, Paulo levou consigo a Silas para visitar mais uma vez as igrejas da Galácia. O jovem Timóteo uniu-se a eles em Listra. Juntos partiram para a
Macedônia e para Acáia (atualmente, Grécia). Nessa viagem o carcereiro filipense foi salvo, os de Beréia “pesquisaram diariamente as escrituras” (At 17.11) e Paulo pregou em
Atenas, no Areópago (BÍBLIA, 1999, p.1290-1310).

Terceira viagem missionária – Novas visitas à Ásia e à Grécia (At 18;23-21;16)

Paulo visitou as igrejas da Galácia pela terceira vez e então se estabeleceu em Éfeso por mais de dois anos. Quando saiu de Éfeso, Paulo viajou mais uma vez à Macedônia e à Acáia
(Grécia) onde permaneceu durante três meses. Ele retornou para a Ásia passando pela Macedônia. Nessa terceira viagem Paulo escreveu de Éfeso 1 Coríntios e, da Macedônia, 2
Coríntios. De Corinto ele escreveu a carta aos Romanos (BÍBLIA, 1999, p. 1290-1310).

Quarta Viagem Missionária – A caminho de Roma (At 27,1-28,16)

Em Jerusalém após a sua terceira viagem missionária, Paulo teve um conflito com os judeus que o acusavam de haver profanado o templo (At 21.26-34). Ele foi colocado sob
custódia dos romanos, em Cesaréia, durante dois anos. Depois de apelar à César, foi enviado de navio a Roma. Depois da partida da ilha de Creta, o navio de Paulo naufragou na ilha
de Malta, por causa de uma grande tempestade. Três meses depois ele finalmente chegou à cidade imperial (BÍBLIA, 1999, pp.1290-1310).

O método básico de atuação de Paulo, cha - mado por Mazzarolo de “método paulino de evangelização” (2011, p.20-21), era: (a) Vi - sitar; (b) Instituir e formar lideranças ime -

diatas; (c) Escrever e manter contatos; (d) Revisitar; (e) Enviar mensageiros e solidifi - car a mensagem. Vejamos cada um deles, conforme descreve o autor.

a.Visitar – O primeiro passo, para Mazzarolo, foi “aproximar-se, conhecer, aprender e depois inculturar”. O autor destaca que “as viagens incansáveis, cheias de peripécias,
desventuras e perigos permitiram que o Evangelho chegasse com rapidez aos longínquos pagos do Império romano e da Europa”;

b. Instituir e formar lideranças imediatas – “Paulo sabia que precisava descobrir, despertar e conscientizar pessoas capazes, homens e mulheres inteligentes e influentes para
deixar nos lugares onde o Evangelho havia sido anunciado”. Essas lideranças, escreve o autor, “eram também os “anjos” da comunidade, os quais serviam de ponto de contato e
pediam informações e orientações ao Apóstolo para depois instruir e construir a igreja local”;

c.Escrever e manter contatos – “A escrita de Paulo é abundante. Com certeza muitos escritos foram queimados, destruídos ou perdidos”, defende Mazzarolo. “Paulo escrevia
bilhetes de orientação e respostas às questões que aqueles líderes formulavam; algumas vezes eram dúvidas deles mesmos, outras questões coletivas”. Escrever, conforme explica o
autor “era para conservar, manter e fortalecer os contatos estabelecidos pelas visitas ou para preparar os futuros encontros com os novos cristãos (2011, p.20-21)”;

d. Revisitar – “Rever é uma parte sólida do processo. [...] Era mister voltar às igrejas, reencontrar e reconfortar os irmãos; muitas vezes, em situações de perigo, outras, em
ambientes de perseguição; ou ainda, com dificuldades de solucionar conflitos internos”;

e. Enviar mensageiros e solidificar a mensagem – “Depois de ter anunciado o Evangelho em muitos lugares, cidades, regiões e povos, Paulo já não tinha condições de animar
sozinho tantos ambientes e pessoas”.

Assim, ele se servia dos seus embaixadores para estar no seu lugar e transmitir, em seu nome, as orientações, exortações e propostas de continuidade no caminho do
Evangelho. Esses líderes se mostravam sempre muito assíduos e fiéis no exercício das responsabilidades recebidas (MAZZAROLO, 2011, p.20-21).

REFERÊNCIAS

BÍBLIA. Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri, Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.

MAZZAROLO, Isidoro. O Apóstolo Paulo: o Grego, o Judeu e o Cristão. Rio de Janeiro: Mazzarolo, 2011.

PARABÉNS!

Você aprofundou ainda mais seus estudos!

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EDITORIAL

DIREÇÃO UNICESUMAR

Reitor Wilson de Matos Silva

Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho

Pró-Reitor de Administração Wilson de Matos Silva Filho

Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva

Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin

Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi

C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ . Núcleo de Educação

a Distância; SILVA , Flávio Henrique de.

Cartas Paulinas. Flávio Henrique de Oliveira Silva

Maringá-Pr.: UniCesumar, 2017.

37 p.

“Pós-graduação Universo - EaD”.

1. Cartas. 2. Paulinas. 3. EaD. I. Título.

CDD - 22 ed. 200

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CARTAS MAIORES: CARTAS


AOS TESSALONICENSES

Professor (a) :

Me. Flávio Henrique de Oliveira Silva

Objetivos de aprendizagem
• compreender os principais aspectos do contexto que justificam a carta de Paulo aos tessalonicenses;

• analisar a mensagem do apóstolo de encorajamento em meio as provações em 1Ts 3,1-5;

• analisar a mensagem de fé e amor em meio as tribulações, escrita por Paulo em 1Ts 3,6-13;

• analisar a mensagem de exortação à santidade, escrita pelo apóstolo em 1Ts 4,1-12;

Plano de estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Contexto das Cartas

• Fortalecimento e encorajamento em meio às provações - 1Ts 3,1-5

• Fé e amor em meio às tribulações – 1Ts 3,6-13

• Exortação à santidade - 1 Ts 4,1-12

Introdução
Uma boa leitura das cartas de Paulo aos tessalonicenses passa, necessariamente, pela compreensão do protagonismo do Império Romano – e também do judaísmo, conforme
veremos mais à frente – em suas várias facetas, bem como a reflexão sobre as suas influências e relações nos escritos do apóstolo e em outros textos, bíblicos ou não, da época. O
Império Romano, no primeiro século, não é uma instituição neutra. É, pelo contrário, conforme Miguez, “um ator principal, pois constitui a estrutura social básica, “os poderes e
principados deste mundo, com os quais a nascente comunidade se confronta” (1990, p. 80). Portanto, antes de tudo, é importante sublinhar alguns detalhes que retratam qual era a
identidade do Império e a sua forma de atuação. Esses detalhes, certamente, trarão luz sobre os textos analisados em seguida.

Além da perseguição causada pelo modelo administrativo romano, veremos neste estudo que a perseguição que sobrevinha sobre os cristãos era causada também pelos judeus,
aliados do poder romano. Estudiosos defendem, inclusive, que estes eram os primeiros perseguidores. Diante deste ambiente, veremos que a resposta de Paulo resume-se em três
perícopes centrais na primeira carta que escreveu aos tessalonicenses: (1) fortalecimento e encorajamento em meio as provações – 1 Ts 3,1-5; (2) fé e amor em meio as tribulações –
1 Ts 3,6-13]; (3) exortação à santidade – 1 Ts 4,1-12]. Força, coragem, fé, amor e santidade. Estes eram os fundamentos para que a comunidade, então, resistisse e continuasse a
trilhar um caminho alternativo - um estilo de vida alternativo à luz do evangelho - ainda que isso lhes custasse a própria vida. Esta escolha colocaria a comunidade na mesma rota de
seu Senhor: o servo sofredor. Exposta ao sofrimento, portanto, mas reagindo a partir dos paradigmas do evangelho de Jesus Cristo (paradigmas = força, coragem, fé, amor e
santidade), encontraria na imitação de seu Senhor (discipulado) sua identidade e significado para sua própria jornada.

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CONTEXTO das Cartas


O desejo incontrolável por expandir seus territórios, aliado ao desejo de dominação e grandiosidade, estiveram presentes em toda a trajetória do Império Romano. Imperadores
desta grande potência da época estavam convencidos da força e grandeza do Império, e por isso a sede pelo poder e pela conquista nortearam suas motivações. Os caminhos da
colonização romana, no auge do Império, se traduzem por um movimento desumano de normatizações de políticas de exploração e violência generalizada contra os povos
subjugados. Eles condenavam os povos dominados e são lembrados na história pela sua capacidade de fazer vítimas. Tácito ( apud Reimer, 2006, p. 73-74), historiador romano, faz
menção à situação vivida pelos povos dominados e dá um testemunho na perspectiva dos mesmos:

Mais perigosos do que todos são os romanos. [...] Esses ladrões do mundo, depois de não mais existir nenhum país para ser devastado por eles,
revolvem até o próprio mar. [...] Saquear, matar, roubar – isto é o que os romanos falsamente chamam de domínio, e ali onde, através da guerra, criam
um deserto, isto eles chamam de paz. [...] As casas são transformadas em ruínas, os jovens são recrutados para a construção de estradas. Mulheres,
quando conseguem escapar das mãos dos inimigos, são violentadas por aqueles que se dizem amigos e hóspedes. Bens e propriedades transformam-
se em impostos; a colheita anual dos campos torna-se tributo em forma de cereais, sob espancamentos e insultos, nossos corpos e mãos são
massacrados na construção de estradas através de florestas e pântanos.

A violação a que se refere o historiador não era apenas um exercício de força física - muito embora, conforme destacou Wengst (1991, p.25), a expansão romana fosse sinônimo de
“sangue e cadáveres”. Quando se avaliam as circunstâncias pelas lentes da justiça e da igualdade entre semelhantes, facilmente se percebem outras formas de abuso. Por violência
entende-se qualquer ação, originada por uma pessoa ou estrutura que, porventura, cause sujeição à liberdade, dignidade ou integridade de uma pessoa ou grupo. Em outros termos,
conforme sintetizou Horsley, trata-se do “uso ilegítimo ou não autorizado de poder contra a vontade ou o desejo de outros” (2010, p.19). Esta afirmação está baseada na origem
etimológica da própria palavra violência e no entendimento do tema a partir de um sentido básico de valores.

Com os avanços de Roma, a violação do outro – em sua dimensão mais ampla, conforme as definições acima - era facilmente verificada em todas as relações interpessoais e em
todas as estruturas que cercavam a vida humana, fossem elas sociais, políticas, econômicas, artísticas, literárias, legislativas, ideológicas e religiosas. É o que alguns estudiosos
costumam chamar de violência estrutural.

A violência estrutural foi construída e inserida na própria estrutura da sociedade e manifesta-se como um poder desigual e, consequentemente,
como chances desiguais na vida. [...] Essa compreensão de violência estrutural tem suas raízes naturalmente na atenção para condições históricas
concretas. Se pessoas morrem de fome quando isso é claramente evitável, então a violência é cometida, e se essas mortes são o efeito do sistema
social e financeiro existente, então temos violência estrutural, ou respectivamente, estruturas violentas (HORSLEY, 2010, p. 21).

Em terras alheias, as elites locais compravam o discurso legitimador dos romanos para suas táticas habituais. Entre as justificativas mais comuns estava o argumento do progresso e
o argumento da riqueza através do desenvolvimento da capacidade comercial de cada região. É o que explica Edward Said ( apud ELLIOT, 2010, p.71) ao se referir aos modelos
imperialistas na antiguidade e a esse tipo de discurso – que sempre esteve presente na pauta dos poderosos. Para ele, “a retórica do poder produz com demasiada facilidade uma
ilusão de benevolência”. Por outro lado, a história precisa ser contada também pela ótica dos vencidos. No caso de Tessalônica, mais especificamente pela ótica dos trabalhadores
que viabilizaram as idealizações dos romanos através do pagamento de altas taxas de impostos e mão de obra escrava. Proporcionando, assim, os meios necessários para a execução
dos projetos de desenvolvimento dos conquistadores. Nesse sentido, as perspectivas de Wengst merecem destaque. Para ele, “olhar a partir de cima sobre o brilho de Roma não faz
perceber toda a realidade” (1991, p.19). Por isso a necessidade de “inverter a perspectiva numa percepção a partir de baixo, para que a realidade experimentada como sofrimento
não seja entregue ao esquecimento através da glorificação e para que os vencedores da história não triunfem novamente sobre suas vítimas”.

A aparente benevolência a que se refere Edward Said ganha força graças às condições de Tessalônica. Uma cidade promissora, que se encaixava perfeitamente no discurso imperial
de progresso e, por isso, levou os romanos a potencializarem seu interesse pela exploração da mesma. Além de ser uma cidade portuária, parte das estradas mais importantes da
região passava por lá. Isso sem contar o solo fértil para mineração e o forte esquema de “cunhagem de moedas”, conforme explica Ferreira (1991, p. 10-14). Tudo isso colocava
Tessalônica sob o status de uma cidade próspera e com boas perspectivas de avanço, assim como pregavam os dominadores. Todavia, é preciso enfatizar, como fez Ferreira, que se
“por um lado, havia desenvolvimento devido à localização da cidade, por outro, havia a exploração e a especulação, o que favoreceu o aparecimento de classes, onde a desigualdade
era gritante (1991, p. 10- 14)”. Nesse cenário, as pessoas mais vulneráveis da sociedade - a igreja de Tessalônica, ao que tudo indica, era composta por essas pessoas - eram a força
motora para que a roda do poder continuasse girando e favorecendo aqueles que se beneficiavam dessa situação.

Entre os principais favorecidos do sistema estavam as elites. Elas se beneficiavam com as condições propícias de Tessalônica e com as políticas de exploração e extorsão dos
romanos. Por uma questão de conveniência e pensando em sua própria sobrevivência, sem negar o domínio imperial e seus desdobramentos nocivos, as elites locais conformavam-
se a situação, aliando-se aos dominadores. Portanto, essa camada da sociedade deve ser analisada como parte integrante e reprodutora do sistema sócio-político romano.

Como as garantias legais em prol do povo eram cada vez mais insignificantes e ineficientes e havia uma espécie de normatização quanto à negação do direito e da justiça para todos,
as elites se favoreciam e consolidavam seus caminhos de exploração. O método utilizado para o seu monopólio se assemelhava ao modelo administrativo romano. Isto é, de forma
organizada, além de manipulação ideológica, abusavam da força física explorando a classe trabalhadora e servindo-se da mão de obra escrava. Os benefícios deste grupo podem ser
traduzidos pela concentração de recursos e riquezas.

Em contrapartida, as elites estavam a serviço do Império e cabia a elas parte do controle sobre os povos dominados. Entre as táticas de coerção estava o vigilantismo, mecanismo
capaz de impor limites comportamentais que visava manter o equilíbrio, a lei e a ordem na sociedade, mesmo que se necessário fosse usasse métodos violentos. Surgiu para manter
o status quo contra rebeldes, criminosos e pecadores e para reforçar as bases estruturais, além de apoiar as regras instituídas a fim de manter os privilégios e a paz para os
detentores do poder e sustentar o fluxo administrativo deliberado pelo Império. Em outras palavras, conforme Malina: “Consiste em atos ou ameaças de coerção na violação dos
limites formais de uma ordem sociopolítica instituída com os quais, entretanto, os violadores pretendem defender essa ordem de alguma forma de subversão” (2004, p. 49-60). O
autor explica que:

O vigilantismo quase sempre tinha o respaldo dos reivindicadores da elite para a manutenção do status quo, isso porque era somente a elite que
podia prontamente processar os desviantes. [...] O vigilantismo sempre revelará uma orientação conservadora. Ele persegue o fraco, o humilde, o
impopular, pessoas menos capazes de resistir ou de retaliar.

Em alguns lugares o vigilantismo era desnecessário, já que não havia resistência e muitos povos conquistados entendiam a dominação como algo, até certo ponto, benéfico. Ou seja,
não entendiam a invasão estrangeira como algo negativo e nem se sentiam subjugados. Miguez explica que “a classe fundamental conseguia impor seu domínio como legítimo, ou ao
menos como necessário, conveniente ou inevitável, e articular esta concepção dentro da sociedade política sem necessidade de recorrer continuamente à força militar” (1990,
p.88).

De que forma, todavia, argumentos, tão claramente contraditórios conseguiam legitimação? Além da imposição militar/armada e da divulgação da pax romana , havia a premissa da
“vontade do destino divino”, conforme explica Wengst (1991, p.28). Entre os fundamentos deste discurso, conforme Brunt, estava a justificativa de que “o domínio que os romanos
exerciam era determinado pelos deuses, cujo favor Roma merecera por causa de sua piedade e justiça, sendo praticado em favor dos interesses de seus súditos” (2004, p.33).

Através desse enunciado, conforme mencionamos na unidade anterior, os romanos tentavam ludibriar os povos conquistados, legitimando suas ações e conquistas com base no
desejo dos deuses e no bem que isso poderia gerar, inclusive para os que estavam sendo subjugados. A partir desta tese, não é difícil concluir que, além da imposição, como diz Elliot,
“a ideologia do Império romano, não menos que a ideologia imperial contemporânea, estava preocupada com o desafio de ganhar os corações e as mentes dos povos conquistados”
(2010, p.63).

Acatar de forma submissa as imposições dos poderosos, portanto, se tornava legítimo uma vez que os deuses estavam ao lado deles. Ou seja, entrava em jogo uma espécie de
ideologia religiosa capaz de conduzir os subjugados por um caminho de alienação. Tal discurso se construía segundo os interesses de Roma, que se associava à religião oficial local
de cada província, usando-a como instrumento de manipulação.
A religião dos romanos era politeísta e sofria influência de várias crenças gregas. Quanto à religião dos povos conquistados, os romanos se apropriavam de crenças e rituais quando
estes lhes serviam para manipulação ideológica - conforme vimos nos parágrafos anteriores. Além disso, havia liberdade de culto e até mesmo respeito desde que,

• (1) de alguma forma, contribuísse com as estratégias do Império;

• (2) não houvesse qualquer movimento deslegitimador do discurso imperial.

O Judaísmo se serviu desta lacuna e, em Tessalônica, chegou a implantar uma sinagoga (cf. At 17,1). Não era uma relação sem interesses. Os judeus que imigraram para a cidade o
fizeram, segundo Ferreira, “com a intenção de enriquecerem” (1991, p.10) e, para isso, claro, serviam-se dos meios que lhes interessavam. Ao que tudo indica, logo se estabeleceram
na cidade, ocupando posições de destaque e com boas condições econômicas e sociais. Em contrapartida, se conformaram, em vários aspectos, com os valores do Império e
denunciavam quem a estes valores não aderisse ou quem os negasse – uma espécie de vigilantismo -, como era o caso dos cristãos.

Em Tessalônica, além do rótulo de subversivos, a posição adotada pelos cristãos, lhes custou um caminho de perseguição, sofrimentos e, em muitos casos, a própria vida. Ao
mencionar a perseguição que sofriam os cristãos, Ferreira defende que “os judeus aliados ao poder romano, eram os primeiros perseguidores” (1991, p.19); e que, além disso,
“criavam dificuldades aos cristãos na defesa de seus interesses” (1991, p.19). Neste ponto, é preciso lembrar que no mundo antigo não havia separação entre questões sócio-
políticas e questões religiosas – posição comumente adotada pela mentalidade ocidental moderna. A fé e as práticas religiosas não estavam alienadas das demais áreas da vida,
antes, lançavam luz sobre elas. Saldarini explica que, no Império, “a religião achava-se incrustada na estrutura política e social da comunidade. [...] Assim, o envolvimento com a
religião é, em si mesmo, compromisso político e social no sentido amplo de tais termos” (2005, p.17). Esse detalhe nos indica, conforme já mencionei na unidade anterior, que a
perseguição que sofriam os cristãos não era apenas religiosa, conforme nossa compreensão de religião na atualidade, mas sim sócio-política-religiosa.

Para encerrar nossa primeira aula desta unidade, vale citar que a passagem do apóstolo Paulo por Tessalônica (cf. At 17, 1-15), anunciando o Senhorio de Cristo (v.3), é uma amostra
dessa realidade de perseguição. Vejamos algumas indicações do texto a respeito da reação dos judeus diante do fato:

• (1) Inflamaram a multidão - segundo alguns estudiosos, trata-se de um grupo utilizado como massa de manobra para os interesses dos detentores do poder e daqueles que se
privilegiavam dele - contra Paulo e Silas (v.5 e v.8);

• (2) Acusaram os cristãos de procederem contra os decretos de César, dizendo haver outro rei, Jesus (v.7); • (3) Recorreram/provocaram as autoridades (composta pelas elites) da
cidade (v.8).

Tessalônica era a capital da Macedônia, e aí residia o governador romano. A cidade gozava de autonomia administrativa e tinha seus magistrados
próprios. Era centro comercial importante, concentrando grande população e abrigando, como em toda grande cidade, a mistura de culturas e
opções religiosas. A colônia judaica devia ser numerosa, visto que possuía até uma sinagoga. A sinagoga era ponto de partida da ação evangelizadora.
[...] O que Paulo pregava? [no texto de Atos 17, 1-15] Lucas é muito sucinto: o Messias dos judeus devia morrer e ressuscitar; Jesus é esse Messias.

Ora, Messias em grego Cristo, soava como “príncipe” ou “rei”, e Senhor, em grego Kyrios, soava como “imperador”. [...] Os judeus, certamente, reagem
negativamente. [...] Qual o teor da acusação? Transtorno social e subversão política. [...] Em outras palavras, o título Messias-Rei é posto em confronto
com a autoridade romana, e a prática cristã é vista como sublevação da ordem social.

Fonte: STORNIOLO (2008, pp.146-147).

FORTALECIMENTO E ENCORAJAMENTO EM MEIO AS


PROVAÇÕES – 1 TS 3,1-5
Na aula de hoje, e nas duas próximas deste estudo, vamos tentar compreender a mensagem de Paulo aos Tessalonicenses, lendo e comentando alguns textos (todos na primeira
carta) que sintetizam os dilemas enfrentados por essa comunidade. Vamos começar pelo texto de 1 Ts 3,1-5 que diz:

1 Por isso, não podendo mais esperar, pensamos que o melhor seria ficar sós em Atenas; 2 e vos enviar Timóteo nosso irmão, colaborador de Deus na
pregação do Evangelho de Cristo, 3 a fim de vos fortalecer e encorajar na fé, para que ninguém seja abalado em meio às provações presentes, pois
bem sabeis que a isso somos destinados. 4 Quando estávamos entre vós, vos preveníamos de que seria necessário sofrer provações e foi o que
aconteceu, como sabeis. 5 Foi por isso que, não podendo mais esperar, mandei saber notícias da vossa fé, temendo que o Tentador já vos tenha
tentado e que nosso trabalho tenha sido inútil.

Para a compreensão da primeira perícope estudada, é necessário voltar a alguns versículos (1 Ts 2, 17-20) em que o apóstolo Paulo demonstra seu desejo em estar com irmãos da
comunidade em Tessalônica, mas se diz impedido por Satanás. Satanás é “sinônimo de adversário”, é a “personificação do mal” e não se trata de “uma força abstrata”. Ferreira
esclarece que “concretamente, na carta aos tessalonicenses, o satanás (2,18) e o peirázon (tentador: 3,15) são claramente os ‘judeus’ e, de modo velado, o ‘Império romano’ que
fazem o mal crescer e alastrar-se, criando uma situação irremediável para os cristãos de Tessalônica” (1991, p.73). O autor explica que, “sejam os judeus (raça política e
religiosamente forte), sejam os romanos (o Kyrios não é o Imperador), quem é adversário de Deus é literalmente chamado de satanás. É uma palavra de conotação ideológica muito
forte”.

Estando, portanto, nessas condições e não podendo mais esperar, conforme inicia o capítulo 3, Paulo envia e recomenda Timóteo. A apresentação de Timóteo e de suas credencias é
uma autenticação de que a mensagem será proferida por alguém cujo adjetivo é: um colaborador (que cumpre uma tarefa em nome de) de Deus – “servo de Deus” em alguns
manuscritos antigos -, e cujo teor da mensagem é o evangelho de Cristo. Nota-se em outras cartas em que Paulo se refere a Timóteo como sendo seu colaborador (Rm 16,21 p. ex.).
Aqui ele vai além: Timóteo é colaborador do próprio Deus, isto é, cumpre sua missão em nome do próprio Deus – missão: pregar o evangelho de Cristo “a fim de vos fortalecer e
encorajar na fé, para que ninguém seja abalado em meio às provações presentes”.

Vale também mencionar a discussão a respeito da expressão evangelho (“evangelho de Deus”, em alguns textos paulinos, “evangelho de Cristo”), pois alguns estudiosos levantam
dúvidas gramaticais a seu respeito. Trata-se de um genitivo objetivo ou um genitivo subjetivo? Para Hawthorne (2008, p.520).

• “Se considerada genitivo objetivo, Deus e Cristo são o conteúdo da mensagem evangélica (‘o evangelho a respeito de Deus/Cristo’)”;

• “Se considerada subjetiva, a ênfase está na variação da autoria ou fonte (e.g., ‘o evangelho oriundo de Deus/Cristo’)”.

Parece-me mais coerente com a teologia paulina considerar a expressão como sendo um genitivo objetivo (por meio de). Aplicando ao nosso texto, a referência paulina é de que o
evangelho de Cristo seja uma menção à pessoa de Cristo como sendo o próprio conteúdo do evangelho. Em outros termos, a encarnação da própria mensagem. Este detalhe é
extremamente significativo. A trajetória de Cristo (nascimento-vida-morte-ressurreição), sendo ele, portanto, o próprio conteúdo do evangelho, diante da realidade que assolava a
igreja em Tessalônica, deveria lançar luz à comunidade a respeito:

• (1) Da identidade de Jesus Cristo;

• (2) Das posições que ele assumiu;

• (3) De suas ações-reações frente aos desafios que enfrentou.


É preciso destacar que Paulo, já no início da carta (1 Ts 1,6), afirma que a vocação da comunidade é justamente a imitação. Haviam muitas semelhanças entre o contexto onde viveu
e atuou o homem de Nazaré e o contexto da comunidade nascente, uma vez que ambos estavam minados pelo poder imperial romano – e seus aliados: elite imperial e a religião
judaica. Isto, portanto, deveria facilitar a correlação entre o modelo de Jesus e a comunidade cristã em Tessalônica, no seu modo de agir.

Nesse sentido, são muitas as questões a serem abordadas, e a maioria delas foge do escopo desta aula. Para exemplificar, vale citar a identificação da comunidade com os
sofrimentos de seu Senhor, em nome das opções que assumiu em defesa da vida. Em outras palavras, a comunidade exposta ao sofrimento encontrava no exemplo do servo sofredor
um modelo (modelo regulador). Isso, de alguma forma, certamente os animou. É possível avaliar outros exemplos mencionados por Horsley (2004, p. 111-131). Ele apresenta uma
séria de ações de Jesus que muito provavelmente serviram de norte para a trajetória das comunidades. Jesus:

• (1) “Atuava no sentido de sanar os efeitos do Império”;

• (2) “Atuava no sentido de conclamar o povo à reconstrução da sua vida comunitária”;

• (3) “Propôs insistentemente um programa de revolução social para restabelecer relações econômico-sociais igualitárias justas e de apoio mútuo nas comunidades”;

• (4) “Lançou uma missão não somente para curar os efeitos debilitantes da violência militar romana e da exploração econômica, mas também para revitalizar e reconstruir o
espírito cultural e a vitalidade comunitária do povo”.

Outra consideração importante a respeito da expressão “evangelho de Cristo”, e de seu possível impacto na comunidade de Tessalônica é o fato de que evangelion era um termo
contraditoriamente tomado pela religião imperial. Havia uma tentativa de relacionar o conceito à identidade-ação do Imperador. Estudiosos, como Brown e Coenen, por exemplo,
explicam que “as notícias do nascimento do soberano divino, da sua maioridade, ou sua entronização, bem como dos seus discursos, decretos e atos são boas novas que trazem o
cumprimento, há tanto tempo almejado, aos anseios do mundo pela felicidade e a paz” (2000, p. 758-761). Sendo assim, segundo os autores, seria “razoável supor que nas igrejas
primitivas, esta terminologia se desenvolvera por analogia com aquela, que se associava com o evangelho do culto ao Imperador, embora esteja em oposição consciente àquele”. A
atribuição desse substantivo a Cristo seria, portanto, uma indicação do verdadeiro soberano divino, de quem se poderia esperar a verdadeira boa nova, cujos fundamentos são, de
fato, amor, fraternidade e paz.

Pois bem, seguindo pelo texto, nota-se que a questão central é o cuidado de Paulo com a comunidade, levando-se em conta que ela estava exposta ao “Tentador” e
consequentemente às “provações presentes”. Diante de tal possibilidade o intuito do apóstolo ao enviar Timóteo, “colaborador de Deus na pregação do evangelho de Cristo”, era
“fortalecer” e “encorajar” seus irmãos em Tessalônica, para que permanecessem na fé, ainda que em meio aos sofrimentos.

Por volta do ano 50-51, Paulo, Silvano e Timóteo fundaram a igreja em Tessalônica (cf. At 17). Os cristãos convertidos, que começaram a fazer parte da comunidade em Tessalônica,
eram, em grande parte, pertencentes à classe dominada. Nas palavras de Ferreira, “era uma Igreja revolucionária. [...] Surgida dos pobres explorados e oprimidos, que viviam num
contexto econômico, social, político e ideológico massacrantes” (1991, p. 11-25). Uma Igreja que nasce através de uma mensagem de esperança e automaticamente se torna
sinalizadora de esperança para todos que estão à margem

• Do sistema imperialista romano;

• De uma sociedade injusta e discriminadora;

• De uma religião opressora.

Fiel à sua vocação, essa igreja, nas palavras de Ferreira, “questionava as estruturas de poder da época” (1991, pp.11-25) e assumia uma postura de resistência não-violenta, mas de
valores. Por esta razão, conforme o autor, “começava a ser, aos olhos dos dominantes, uma organização de cunho subversivo”. Conforme explica Ferreira: “A perseguição aos
tessalonicenses aconteceu porque a pequenina Igreja que surgia estava subvertendo o esquema reacionário e opressivo do Império romano”. Em contrapartida, para os romanos,
permitir qualquer contestação seria relativizar o próprio poder. O Império (e seus aliados), então, fazia questão de tornar evidente sua autoridade, respondendo através de medidas
que intensificavam a perseguição.

A resposta de Paulo não é alienante quanto á realidade. Isso fica evidente em duas frases do apóstolo, ao se referir as provações/tribulações (a angústia causada por circunstâncias
adversas, como a guerra ou perseguição):

• (v.3) “... bem sabeis que a isso somos destinados...”;

• (v.4) “... seria necessário sofrer provações...”.

Paulo reconheceu que o sofrimento seria uma experiência inerente aos cristãos, visto que viviam em um mundo hostil aos valores que norteavam suas vidas, e que acompanharia os
que com fidelidade seguissem trilhando os passos de seu Senhor. O apóstolo, então, envia Timóteo com o intuito de fortalecê-los (estabilizar para permanecer na mesma direção) e
encorajá-los (consolar, fortalecer, exortar, instruir, ensinar, confortar) a permanecerem na fé.

Não se trata apenas de ajudá-los a manter suas convicções (teorias, crenças e discursos), mas principalmente de encorajá-los a permanecerem fiéis em suas aflições. Entre os
estudiosos existem os que defendem que o sentido mais adequado para a palavra fé seria “lealdade” ou ainda “resistência”. Essa hipótese de tradução parece bem razoável, levando-
se em consideração que o contexto em que estavam inseridos os destinatários da carta exigia exatamente isso. Na próxima aula, na sequência do texto, veremos as reações da
comunidade diante do quadro até aqui descrito.

Fortalecer e Exortar

O trabalho dos três evangelistas não era só o de ajudar a comunidade a nascer na fé, mas também de sustentá-la firmemente para se tornar madura.
A maturidade é “testada” nas provas. Aqui, no caso, a ekklesia tem sofrido duras adversidades. Corria o risco de ser esmagada pelas forças
repressoras de Tessalônica ou do império romano. No perigo para a fé engajada desta comunidade perseguida, aparece a “Palavra” que fortifica e
exorta. É Timóteo, o colaborador de Deus, o portador. Ele é enviado a Tessalônica para ajudar os novos cristãos a serem fortes nas “tribulações”
(thlipsis) por causa do evangelho. Esta palavra “thlipsis”, que é utilizada nas cartas paulinas mais que em todo o Novo Testamento, é a força cristã de
vida. [...] A thlipsis (tribulação, perseguição) aconteceu porque o sistema opressivo do império estava sendo subvertido.

Fonte: FERREIRA (1991, p.30).

FÉ E AMOR EM MEIO AS TRIBULAÇÕES – 1 TS 3,6-13


6 Agora, Timóteo acaba de chegar da vossa comunidade e nos trazer a boa notícia da vossa fé e do vosso amor; ele diz que guardais sempre boa
lembrança de nós e que desejais nos rever tanto quanto nós desejamos vos rever. 7 Assim, irmãos, encontramos em vós um consolo, graças à vossa fé,
no meio de todas as nossas angústias e provações, 8 e agora revivemos, pois vos mantendes firmes no Senhor. 9 Que ação de graças poderíamos
render a Deus a vosso respeito, por toda a alegria que experimentamos por causa de vós diante do nosso Deus, 10 quando noite e dia rogamos com
insistência, para que nos seja dado rever-vos e completar o que falta à vossa fé? 11 Queira o mesmo Deus, nosso Pai, e nosso Senhor Jesus dirigir
nosso caminho para vós. 12 Que o Senhor faça crescer e abundar o amor que tendes uns para com os outros e para com todos, à imagem de nosso
amor para convosco. 13 Que ele fortaleça assim vossos corações numa santidade irrepreensível diante de Deus, nosso Pai, por ocasião da vinda de
nosso Senhor Jesus com todos os seus santos.
Nota-se no texto que a reação da comunidade diante das adversidades é a fé. Paulo celebra as boas notícias que recebe de Timóteo em seu retorno, constatando que, “apesar de
privações e tribulação”, os alicerces da fé estavam nos seus devidos lugares, ainda que houvesse deficiências (v.10). Fé, como vimos anteriormente, é sinônimo de resistência e
lealdade. Lealdade ao verdadeiro Senhor e, consequentemente, à sua proposta de vida que lhes fora anunciada e que lhes servia como paradigma para a construção de sua própria
caminhada. Manter-se fiel exigia perseverança-resistência em reação às hostilidades a que estavam sujeitos. A fé da comunidade nascente imediatamente mostrou seus efeitos ao
animar o apóstolo em sua jornada. “Nós fomos encorajados/consolados por você através de sua fé” (v.7). Isto é, a notícia da fé e fidelidade dos tessalonicenses, apesar das
adversidades, encorajou Paulo em sua própria experiência de angústia e aflição.

Indivisíveis, a fé e a esperança estavam presentes no discurso paulino, ainda que não apareçam literalmente no texto – fé, esperança e amor fazem parte de uma tríade bem
conhecida nos escritos de Paulo; é inclusive mencionada na própria carta aos tessalonicenses (1,3). A mensagem cristã de fé e seu modo de propor uma nova vida, através de uma
comunidade de iguais e responsáveis uns pelos outros, gerava no coração do povo a esperança de um modelo alternativo de vida.

A assimilação da fé como resposta a situação da sócio-política-religiosa da comunidade ganhou ainda mais vigor graças à tônica apocalíptica, compreendida pelas lentes de uma
mensagem de esperança. Alguns estudiosos, como Hawthorne, por exemplo, defendem que “o estudo sociológico de grupos concentrados na escatologia enfatiza que uma nova
experiência de privação relativa, originada de mudanças nas estruturas e nos padrões de relações da sociedade, em geral, está por trás desse tipo de interesse escatológico” (2008,
p. 1193). Essa ideia está em harmonia com a realidade em Tessalônica e, portanto, “o anúncio paulino do evangelho oferecia exatamente essa fé escatológica”. Para Ferreira, “a
literatura apocalíptica foi escrita como expressão de uma consciência crítica intensa. Diante do poderio dos impérios da terra, os apocalípticos, como muita fé e compromisso,
apresentavam alternativas de sobrevivência para resistir à violência” (1991, p.93). Ferreira entende que,

com os baixos salários, a fome aumentando e a falta de recursos dos proletários urbanos, o anúncio do cristianismo, especialmente do
apocalipticismo, se torna fácil de ser assimilado. [...] O evangelho apocalíptico passava a ser uma esperança para as massas exploradas. [...] Uma legião
de trabalhadores e marginalizados, pela primeira vez, em séculos, começou a sentir que a novidade do evangelho era endereçada a eles. A apatia deu
lugar a esperança (FERREIRA, 1991, p. 19-25).

De fato, a orientação escatológica-apocalíptica é inegável na literatura paulina – embora, na atualidade, seu significado sofra uma série de distorções e reducionismo. Para ilustrar,
verifica-se em nossa perícope o uso da expressão “vinda de nosso Senhor Jesus” (v.13). Uma expressão carregada de significado político e que, por isso, descarta a tentativa de
algumas correntes teológicas em minimizar aspectos centrais deste gênero literário. Vejamos outros termos nas palavras de Stroher, que explica que Paulo, “toma termos políticos
usados oficialmente e os ressignifica teologicamente; reafirmando que parusia, como paz e segurança é direcionada a Cristo, não às ordens imperiais” (2007, pg. 63).

• Parusia (vinda, chegada): “relacionada à vinda ou à visita de personagem ilustre, do rei ou de um dirigente, e na linguagem da corte refere-se à chegada de César”.

• Kyrios (Senhor): “usado de forma ampla para o senhor da casa (oikos), na parte oriental do Mediterrâneo, no entanto, refere-se aos imperadores romanos”.

Em outros textos (cartas) o tom escatológico-apocalíptico aparece como resposta ao sofrimento e visivelmente conclamam à esperança:

• (1) “Considero que os nossos sofrimentos atuais não podem ser comparados com a glória que em nós será revelada” (Rm 8,18);

• (2) “Pois os nossos sofrimentos leves e momentâneos estão produzindo para nós uma glória eterna que pesa mais do que todos eles (2 Cor, 4,17). É bem provável que essa
dimensão escatológica-apocalíptica da fé, conforme entende Hawthorne, “fosse grande o bastante para motivar acusações de subversão política” (2008, p. 1193), uma vez que, além
da ressignificação de termos políticos, fomentava temas como o da justiça, por exemplo. A dimensão da justiça era semeada através do discurso de uma intervenção de Deus no
mundo, na construção de um sistema justo em oposição à injustiça intrínseca ao sistema instituído e aos seus desdobramentos de poder violento. É importante salientar que um dos
fundamentos desse discurso era o de que essa ação divina já havia irrompido na história: o Deus justo liberta dos poderes opressores e de falsos deuses, e forma uma nova
comunidade à luz dos termos da justiça, segundo seus próprios desígnios - amor, igualdade, solidariedade, serviço e fraternidade.

Uma das marcas essenciais da fé – de uma fé viva/substancial - é o amor. O amor, nas palavras de Hawthorne, “representa a fortificação ética da justiça. [...] Desse modo, há uma
correlação necessária entre a fé em Cristo e o amor pelos outros” (2008, p.68). Nota-se no texto que é exatamente o amor o outro caminho encontrado pela comunidade, em reação
a perseguição e as tribulações a que estavam vulneráveis – “Timóteo acaba de chegar da vossa comunidade e nos trouxe a boa notícia da vossa fé e do vosso amor” (v.6). Paulo já
havia reconhecido que o amor fazia parte da comunidade em Tessalônica (1: 3). Agora, além de reconhecer o amor como resposta ao ambiente desfavorável, intercede para que o
amor de uns para com os outros possa “crescer” e “abundar” (v.12). É interessante notar no texto que a oração do apóstolo é para que o amor não seja restrito à própria comunidade
cristã, mas para que a comunidade tenha também uma disposição caridosa e a devida preocupação com o bem-estar de todos.

A palavra “amor” (ágape) mencionada pelo apóstolo no texto, indica caridade a partir de uma iniciativa (ação) nem sempre subordinada ao que se sente – conforme tende-se a
pensar na atualidade. Paulo, portanto, não estava fazendo referência a categorias subjetivas/abstratas. Pelo contrário, referia-se a um conteúdo concreto, visível e com ações
verificáveis na história. A compreensão mais adequada para o termo era de um movimento que reagia a opressão, convidando as pessoas a assumirem um novo compromisso umas
com as outras para a construção de um ambiente comunitário baseado no cuidado mútuo. Nesse sentido, a prática do amor foi se tornando um testemunho de resistência não
armada, visto em ações de solidariedade. Em outros termos, o amor que movia a comunidade se traduzia em experiências de partilha despertando muitos a compartilharem seus
recursos uns com os outros.

Se o Império Romano e seus aliados articulavam um ambiente opressor, responsável pela multiplicação de vítimas, a comunidade que nascia, tendo como paradigma fundamental a
própria vida de seu Senhor, ainda que ameaçada, respondia com expressões de amor, à luz das instruções que receberá. Para, Stroher, isso significava “viver em paz uns com os
outros, consolar os desanimados, amparar os fracos, ser generosa com todas as pessoas, não retribuir mal por mal” (2007, p.61).

Pois bem, a temática do amor segue pela perícope seguinte e vamos observá-la na próxima aula, na qual outras observações nos ajudarão a compreender melhor sua relevância para
o contexto em que estavam inseridos os cristãos de Tessalônica.

A relação dos missionários com os tessalonicenses retoma força. Timóteo foi em missão a fim de averiguar, animar e confortar a Igreja perseguida.
Ele retorna trazendo alegres notícias sobre a fé e a prática perseverante da comunidade. A carta agora é expressão do entusiasmo, usando até o
verbo “evangelizo” (pregar o Evangelho) – palavra do Novo Testamento, reservada para anunciar a boa-nova de salvação – expressando a união dos
remetentes com os tessalonicenses e vice-versa. [...] Num segundo momento, os missionários pedem crescimento e riqueza no amor aos
tessalonicenses. O Senhor pode aumentar este amor, o qual Timóteo testemunhou, de modo que esta agápe (amor) seja não só um laço que os une
em uma fraternidade comum, mas também com todos os homens. Se existem falhas na comunidade (3,10), é no amor que ela deve superar as
dificuldades. O amor é, primeiramente, fraterno (4,9). Isto gera na comunidade comunhão, unidade, capacidade de organização e resistência contra o
mal. Fonte: FERREIRA (1991, p. 77-79).

EXORTAÇÃO À SANTIDADE – 1 TS 4,1-12


1 Do resto, irmãos, eis nossos pedidos e nossas exortações no Senhor Jesus: vós aprendestes de nós como proceder para agradar a Deus, e é assim
que procedeis; fazei ainda novos progressos. 2 Sabeis, de fato, as instruções que vos demos da parte do Senhor Jesus. 3 A vontade de Deus é a vossa
santificação, que vos abstenhais da imoralidade, 4 que cada um de vós saiba casar-se para viver com santidade e honestidade, 5 sem se deixar levar
pela paixão, como fazem os pagãos que não conhecem a Deus; 6 que ninguém prejudique seu irmão, nem lhe cause dano nesta matéria, pois o Senhor
se vinga de tudo isso, como já dissemos e testemunhamos. 7 De fato, Deus não nos chamou para viver na impureza, mas nos chamou para a
santidade. 8 Assim, pois, aquele que rejeita esses ensinamentos não é um homem que rejeita, mas o próprio Deus que vos dá o seu Espírito Santo. 9
Sobre o amor fraternal, não tende necessidade de que se vos escreva, pois vós mesmos aprendestes de Deus a vos amardes uns aos outros; 10 aliás, é
o que fazeis, a respeito de todos os irmãos, na Macedônia inteira; nós vos exortamos, irmãos, a que façais ainda novos progressos: 11 tomai a peito
viver uma vida tranquila, ocupar-vos com vossos negócios e trabalhar com vossas próprias mãos, como ordenamos, 12 para que vossa conduta seja
decorosa aos olhos dos estranhos e não tenhais precisão de ninguém.

O texto acima, a terceira perícope analisada, indica alguns caminhos e reforça outros para um estilo de vida alternativo e de resistência. Para Boring, um estilo de vida “resumido
como santidade e amor” (2015, p. 357). Ao longo das reflexões até aqui propostas, ficou evidente que a comunidade cristã em Tessalônica nasceu em um ambiente hostil (composto
por instituições de poder injustas e por relações desumanas) diametralmente oposto àquilo que estava sendo desafiada a construir, tendo como paradigma o modelo de vida de seu
Senhor.

Na construção de seu argumento, o apóstolo menciona a vontade de Deus, e esta como sendo a santificação da comunidade (v.3). A partir daí, associa o conceito de santificação com
algumas relações comunitárias, que serviriam como testemunho e identificariam a comunidade cristã como um movimento singular, distinto de qualquer grupo naquele contexto.
Boring reforça a tese da relação intrínseca entre santidade e vida comunitária – contrapondo várias escolas de interpretação que desassociam uma coisa da outra, tratando o tema
como uma questão privada. Ele explica que “como é o caso da ética bíblica em geral, a ética de Paulo é explicada como fazendo a vontade de Deus. Quanto a Jesus, bem como quanto
a Paulo, o viver correto é uma questão de responsabilidade para com Deus e cuidado para com os outros” (2015, p. 357). Esse também é o argumento de Ferreira. Para o autor: “a
santidade acontece quando os homens e mulheres se inter-relacionam numa linha de respeito, convivência e transformação, para um mundo novo, sendo conduzidos pelo Espírito
da vida” (1991, p.86).

No texto, a primeira relação a ser revisitada, à luz de uma vida “santa”, é a relação conjugal – “que cada um de vós saiba casar-se” (v.4). Ao que tudo indica, esta exortação é reflexo da
desigualdade entre homem e mulher naqueles dias. As mulheres, no contexto imperial do primeiro século, sofriam toda espécie de discriminação e abuso e buscavam sobrevivência
em um mundo marcado pelo modelo patriarcal hierarquizado, onde a subordinação da mulher ao homem era uma realidade construída através da ideia de que esses eram seres
superiores. Na relação conjugal, o homem estava amparado pela lei, a ponto de repudiar a sua mulher, isto é, deixá-la à margem em condições indignas, sem qualquer prova que a
desqualificasse. Para Ferreira, o discurso exortativo de Paulo, pela santificação nas relações matrimoniais, denunciava que “a violação dos direitos matrimoniais é injustiça que pede
a Deus vingança” (1991, p.84). O autor lembra que “a palavra vingador é atribuída nos salmos sempre ao Deus que toma partido dos oprimidos (Sl 99,8 e 94,1) contra os opressores
(ímpio) para fazer justiça”. Ele entende que no contexto da comunidade em Tessalônica, o uso do termo “é semelhante ao dos salmos”; e que, portanto, ninguém “pode ser violado ou
desrespeitado”.

Seguindo pelo texto, o ponto seguinte ressaltado por Paulo é a relação entre irmãos: “que ninguém prejudique seu irmão, nem lhe cause dano nesta matéria” (v.6). Aqui o apóstolo,
segundo Ferreira, está “condenando energicamente a apropriação dos bens materiais alheios, ou seja, a ganância, a ambição ou ganho” (1991, p. 84-85). Ao que tudo indica, “isto era
típico da vida comercial do Império romano e, aqui, no caso de Tessalônica. Este tipo de vida leva ao individualismo egoísta, destruidor de qualquer possibilidade de organização
comunitária”.

É preciso destacar o uso da palavra “irmão” no texto. Sigo com Ferreira, que explica que “é na ótica do irmão, da vida comunitária, que os cristãos precisam agir e viver” (1991, p. 84-
85), levando-se em conta que no Império Romano as relações estavam marcadas por hierarquias, traduzidas por toda sorte de violação do mais forte contra o mais fraco. Trilhar
caminhos de santidade significava a reconsideração do outro, olhando-o como igual. Para o autor:

Em todos os ângulos da vida, em qualquer situação adversa ou não, os cristãos têm que mudar o modo de ver as coisas. Sua visão é bem diferente da
visão do Império romano e das religiões que faziam o seu jogo. Os cristãos têm diante de si o Ressuscitado que os anima, e têm uma tarefa
importante pela qual lutar: o empenho por um mundo de irmãos (FERREIRA, 1991, p. 84-85).

Por fim, na sequência do texto, reaparece a temática do amor. O que não é de se estranhar já que, para estudiosos como Hawthorne, por exemplo, “todo conceito paulino de vida
santa é dominado pelo amor” (2008, p.67). Santidade e amor andam de mãos dadas, o que torna inadequada a ideia de uma vida santa que seja solitária, fria, desumana e alienada
das vivências do amor. O texto bíblico diz:

Sobre o amor fraternal, não tende necessidade de que se vos escreva, pois vós mesmos aprendestes de Deus a vos amardes uns aos outros; aliás, é o
que fazeis, a respeito de todos os irmãos, na Macedônia inteira; nós vos exortamos, irmãos, a que façais ainda novos progressos (1Ts 4, 9-10).

Note que ainda que o apóstolo julgue desnecessário aprofundar-se na questão, uma vez que o amor já era uma realidade na comunidade, ele reafirma a necessidade de progressos.
Entretanto, o que enxergou Paulo a ponto de reconhecer a realidade do amor fraterno na vida da comunidade? Bem, na perícope anterior vimos que o amor foi uma das
respostas/reações dadas pela comunidade ao sistema imperial romano e suas práticas de desamor. Para Ferreira, sem amor fraterno não existe comunidade, daí sua afirmação: “é da
vida de amor fraterno que surge a Igreja. É a grande experiência de solidariedade, de unidade. Ninguém vive isolado, porque existe comunidade” (1991, p. 86-88). Além disso, é o
sinal visível que identifica e legitima o pressuposto de ser uma “comunidade cristã”, em razão de ser o “amor fraterno o que concretiza a adesão da comunidade a Jesus Cristo”.

Além de testemunhar estes sinais na vida da comunidade, o apóstolo presenciou o cuidado e o compromisso da mesma com os mais vulneráveis, àqueles (as) a quem estavam
aprendendo a chamar de “próximo”. Theissen (2009, p. 99) lembra que o conceito de amor ao próximo já se encontrava no Antigo Testamento (prescrito na lei de santidade – Lv 19).
O autor entende que esse amor liga-se a um “etos-de-misericórdia oriental comum, que vale para fracos, as viúvas e os órfãos, portanto, para pessoas que possuem condições ou
marginais”. Schillebeeckx (2008, p. 242) reforça a tese de Theissen de que o “próximo” se referia ao compatriota pobre ou mais humilde, o socialmente mais fraco, o menor que
precisa de proteção.

A comunidade de Tessalônica compreendia e experimentava essa dinâmica e, por isso, tornou-se um ambiente de resistência, esperança e paz. Uma paz, claro, em oposição à ilusão
da pax romana . Paz, segundo Bingemer (2001, p.68), conforme a dinâmica da paz neotestamentária, isto é, “inseparável da dinâmica do amor”.

A comunidade de Tessalônica foi chamada a “viver de maneira digna de Deus, que os chama ao seu reino e à sua glória”. É o “andar” e o “agradar” a
Deus. [...] Andara para agradar a Deus, significa dirigir-se sob o olhar de Deus, para um alvo certo (o próprio Deus). O “agradar a Deus” completa esta
imagem, sugerindo que os cristãos tessalonicenses, em todo o seu agir, precisam procurar a face de Deus. Os tessalonicenses receberam “instruções”,
ou seja, as orientações ou as diretrizes, para a sua vida comunitária “em nome do Senhor Jesus”. [...] A base para a vida comunitária é a santificação
dos tessalonicenses. Já no Antigo Testamento, em Lv 11,44s, Deus disse: “... Vocês serão santos porque eu sou santo”. É exatamente esta a vontade de
Deus”. Deus sendo santo, partilha sua santidade com os membros do seu povo. Isto que aconteceu no Antigo Testamento, acontece agora com os
cristãos. A santificação vem de Deus (5,23), de Cristo (3,13), é ação do Espírito Santo (4,8). Nessa comunhão, é tarefa da ekklesia (4,7) ser santa. É a
santidade que fará a comunidade cristã ser diferente dos outros grupos da época (4,5.12; 5,6).

Fonte: FERREIRA (1991, p.82).

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ATIVIDADES
1. Sobre o Império romano, é correto afirmar que

a) A inclinação expansionista e o desejo pelo domínio e magnitude certamente estiveram presentes em toda a história do Império romano.

b) Convencido de sua força e aptidão à grandeza, brotava no coração do Império o anseio pelo poder e pela conquista, centro de suas motivações e ambições.

c) Os caminhos da colonização romana, no auge do Império, se traduzem por um movimento desumano de normatizações de políticas de exploração e violência generalizada contra
os povos subjugados.

d) Eles condenavam os povos dominados e são lembrados na história pela sua capacidade de fazer vítimas.

e) Todas as alternativas estão corretas

2. Sobre a comunidade em Tessalônica, é correto afirmar que

a) Diferente da maioria das comunidades com as quais Paulo se comunicou, não foi fundando pelo apóstolo, mas por Silvano e Timóteo.

b) Os cristãos convertidos, que começaram a fazer parte daquela comunidade eram, em grande parte, pertencentes a elite de Tessalônica.

c) Era uma comunidade revolucionária, surgida dos pobres explorados e oprimidos, que viviam num contexto econômico, social, político e ideológico massacrantes.

d) Era uma comunidade apática e pessimista, sem qualquer esperança. Sendo assim, também não sinaliza a esperança para os que estavam a sua volta.

e) Todas as alternativas estão corretas

3. Segundo nossos estudos nos textos da primeira Carta aos Tessalonicenses, santidade e amor andam de mãos dadas, o que torna inadequada a ideia de uma vida santa que seja
solitária, fria, desumana e alienada das vivências do amor.

[ ] Verdadeiro

[ ] Falso

4. À luz de nossos estudos podemos afirmar que a comunidade de Tessalônica tornou-se um ambiente de paz graças ao modelo de pacificação da pax romana.

[ ] Verdadeiro

[ ] Falso

Resolução das atividades

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RESUMO
Neste estudo, vimos que a comunidade cristã em Tessalônica passava por um momento delicado, de grande tribulação, por conta da perseguição que estavam sofrendo do Império
Romano e, principalmente, do judaísmo. O texto bíblico de At 17, 1-15 é uma boa amostra para essa realidade. Conforme vimos, os judeus acusavam os cristãos de subversivos e
inflamavam a ira dos romanos para que estes também se voltassem, ainda mais, contra os cristãos. No texto que acabamos de mencionar, a estratégia dos judeus, em resposta ao
anúncio de Jesus Cristo feito por Paulo em Tessalônica, pode ser notada em três partes: (1) Inflamaram a multidão contra Paulo e Silas (v.5 e v.8); (2) Acusaram os cristãos de
procederem contra os decretos de César, dizendo haver outro rei, Jesus (v.7); (3) Recorreram/ provocaram as autoridades (composta pelas elites) da cidade (v.8).

A reação dos judeus contra Paulo foi uma amostra daquilo que a comunidade estava experimentando. Diante deste quadro, vimos que o intuito do apóstolo ao enviar Timóteo,
“colaborador de Deus na pregação do evangelho de Cristo”, era “fortalecer” e “encorajar” seus irmãos em Tessalônica, para que permanecessem na fé, ainda que em meio aos
sofrimentos. A resposta de Paulo, todavia, não era alienante quanto à realidade. Isso fica evidente em duas frases do apóstolo, ao se referir as provações/tribulações: (1) v.3 - “... bem
sabeis que a isso somos destinados...”; (2) v.4 - “... seria necessário sofrer provações...”. Conforme afirmamos antes, nota-se no texto bíblico que o reconhecimento do apóstolo de que
o sofrimento seria uma experiência própria aos cristãos, visto que viviam em um mundo hostil aos valores que norteavam suas vidas, e que acompanharia os que com fidelidade
seguissem trilhando os passos de seu Senhor. Para tanto, sugere o apóstolo, era necessário, conforme vimos desde a introdução deste estudo, força, coragem, fé, amor e santidade.

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Material Complementar

Leitura
Primeira Epístola aos Tessalonicenses: a Igreja surge como esperança dos oprimidos.

Autor: Joel Antônio Ferreira

Editora: Vozes

Sinopse : Este é um comentário latino-americano do Proto-Isaías. Nasceu de uma leitura nova da


Bíblia feita pelo próprio povo cristão. Um grupo de biblistas católicos e protestantes, sem abdicar de
uma leitura cientificamente embasada, perguntou pelo lugar-problema daqueles que acessam estes
textos na atualidade. Estas questões, sem dúvida, lançaram luz sobre aqueles que trabalharam na
análise, comentário e interpretação dos textos bíblicos, conforme o resultado apresentado em cada
livro da coleção. Apresentam, assim, um comentário sobretudo prático-pastoral.

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REFERÊNCIAS
BINGEMER, Maria C. L. (org.). Violência e religião: Cristianismo, Islamismo, Judaísmo: três religiões em confronto e diálogo. Rio de Janeiro: PUC-Rio; São Paulo:
Loyola, 2001.

BORING, Eugene. Questões Introdutórias do Novo Testamento e Escritos Paulinos. In: BORING, Eugene. Introdução ao Novo Testamento: história, literatura,
teologia. v. 1. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2015.

BROWN, Colin; COENEN, Lothar (orgs.). Dicionário internacional de teologia do Novo Testamento. 2.ed. São Paulo: Vida Nova, 2000.

BRUNT, P. A. Laus imperii. In: HORSLEY, R. A. (org.). Paulo e o império: religião e poder na sociedade imperial romana. São Paulo: Paulus, 2004, p. 33-42.

ELLIOT, Neil. A arrogância das nações: a Carta aos Romanos à sombra do Império. São Paulo: Paulus, 2010.

FERREIRA, Joel Antônio. Primeira Epístola aos Tessalonicenses: a Igreja surge como esperança dos oprimidos. Petrópolis: Vozes, 1991.

HAWTHORNE, Gerald et al. (orgs.). Dicionário de Paulo e suas Cartas. São Paulo: Vida Nova, Paulus, Loyola, 2008.

HORSLEY, Richard A. Jesus e a espiral da violência: resistência judaica popular na Palestina romana. São Paulo: Paulus, 2010.

MALINA, Bruce. O Evangelho Social de Jesus: o reino de Deus em perspectiva mediterrânea. São Paulo: Paulus, 2004.

MIGUEZ, Néstor. Perdoa-nos as nossas dívidas: O Império e os pobres no tempo neotestamentário. RIBLA, n. 5-6, Petrópolis: Vozes, 1990, p. 80-92.

REIMER, Ivoni Richter. Economia no mundo bíblico: Enfoques sociais, históricos e teológicos. São Leopoldo: CEBI/Sinodal, 2006.

SALDARINI, Anthony. Fariseus, escribas e saduceus na sociedade palestinense. São Paulo: Paulinas, 2005.

SCHILLEBEECKX, Edward. Jesus, a história de um vivente. São Paulo: Paulus, 2008.

STORNIOLO, Ivo. Como ler Os Atos dos Apóstolos: o Caminho do evangelho. 2. Ed. São Paulo: Paulus, 2008.

STROHER, Marga. Cuidado com os que proclamam paz e segurança in Escatologia: morte e vida na Bíblia. Estudos Bíblicos, nº 93, Petrópolis: Vozes, 2007, p. 59-
64.

THEISSEN, Gerd. A religião dos primeiros cristãos: uma teoria do cristianismo primitivo. São Paulo: Paulinas, 2009.

WENGST, Klaus. Pax Romana: pretensão e realidade. São Paulo: Paulinas, 1991.

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APROFUNDANDO
Estudiosos defendem a tese de que algumas temáticas teológicas da primeira carta de Paulo aos tessalonicenses devem ser lidas a partir dos elogios do apóstolo à comunidade, bem
como aos desafios que apresenta à mesma. Vejamos uma breve síntese.

1. Elogios
No início da primeira carta que escreveu aos tessalonicenses, Paulo faz questão de destacar a fidelidade da comunidade, mesmo em meio à perseguição e as tribulações. A atitude
dos cristãos em Tessalônica servia, portanto, de exemplo para os demais cristãos na Macedônia e na Grécia. Para destacar a atitude da comunidade, Paulo usou uma conhecida
tríade de virtudes: fé; amor e esperança (I Ts 1:3). Vejamos uma breve síntese dos desdobramentos teológicos dessa afirmação:

Fé que gera Obras

A fé não é conceitual. Antes, pressupõe um comprometimento que se traduz na construção de estruturas e relacionamentos baseados na ação em direção ao próximo. Infelizmente,
para muitos, em nossos dias a fé se tornou sinônimo de confissão de crenças. Trata-se apenas uma área da vida (ligada à religião) e, por isso, não se constitui como fundamento que
determina os movimentos da vida. Para a comunidade em Tessalônica, entretanto, a fé era dinâmica, estava em movimento, gerava algo de produtivo à luz dos paradigmas do reino
de Deus (fé encarnada).

Amor que gera Sacrifícios

Quando falamos em amor, nossa tendência imediata é pensálo a partir daquilo que se sente (sinônimo de sentimentos). Na Bíblia, entretanto, quando se menciona a caridade (amor),
o “sentimento” não é a palavra de ordem e os textos paulinos confirmam esta tese. Ao se referir ao amor (caridade), Paulo pressupõe uma ação concreta que passa pela ideia de
sacrifício. Sacrifício, todavia, não segundo o modelo ritualista do judaísmo, conforme o Antigo Testamento, nem nos moldes de uma negação piedosa de si mesmo sem relação com
“o outro”. Antes, porém, segue o modelo de sacrifício de Jesus Cristo. Aquele que se sacrificou para que “o outro” não precisasse mais ser sacrificado. No cotidiano da comunidade,
este princípio relacional era fundamental. O exercício mútuo do amor sacrificial sugeria o sacrifício próprio nas relações (que até então eram relações de poder que terminavam no
sacrifício do outro) para que o outro, então, não fosse mais sacrificado.

Esperança que gera Responsabilidade

Lembre-se, o elogio de Paulo nasce em um contexto de sofrimento, tribulação e perseguição. Ao fazer referência à esperança, o apóstolo menciona uma energia que fundamentava a
vida daquela igreja. Não se tratava de mero futurismo, ou de uma esperança alimentada pela fuga da realidade (embora alguns assim a entendiam) para um mundo de sonhos. A
esperança no amanhã era a base para a construção da vida no presente da comunidade. Vida com responsabilidade diante de tantos desafios. Esperança, portanto, em algo concreto
e que luta pela transformação do presente pautado em categorias do futuro.

2. Desafios
Além dos elogios, essa carta destaca algumas instruções práticas de Paulo frente aos desafios que enfrentava a Igreja no cotidiano. Vejamos: (1) Moral Sexual e Matrimonial: 1Ts
4:3-8; (2) Amor Fraterno: 1Ts 4:9-12; (3) Vida Comunitária: 1Ts 5:12-22. Os desdobramentos da vida comunitária no texto são:

• Reconheçam e respeitem seus líderes

• Vivam em Paz! (Paz não é um sentimento ou uma sensação de ausência de guerra. Antes, o desafio da construção de uma vida pautada pela justiça como direito de todos); (c)
Advirtam os ociosos, confortem os desanimados, auxiliem os fracos, sejam pacientes com todos, não retribuam o mal com o mal, sejam bondosos.

• Alegrem-se sempre (mesmo com as tribulações);

• Orem sempre (como exercício de relação com Deus e não de interesse pelos seus favores);

• Deem graças em todas as circunstâncias (gratidão deve ser a superação de toda e qualquer circunstância contraditória);

• Não apaguem o Espírito (não permitam que os movimentos da vida sejam dados sem o fôlego da vida, que é o Espírito).

REFERÊNCIAS

SILVA, Flávio Henrique de Oliveira; PROENÇA, Wander de Lara. Introdução ao Novo Testamento. Londrina: FTSA, 2014.

PARABÉNS!

Você aprofundou ainda mais seus estudos!

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EDITORIAL

DIREÇÃO UNICESUMAR

Reitor Wilson de Matos Silva

Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho

Pró-Reitor de Administração Wilson de Matos Silva Filho

Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva

Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin

Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi

C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ . Núcleo de Educação

a Distância; SILVA , Flávio Henrique de.

Cartas Paulinas. Flávio Henrique de Oliveira Silva

Maringá-Pr.: UniCesumar, 2017.

36 p.

“Pós-graduação Universo - EaD”.

1. Cartas. 2. Paulinas. 3. EaD. I. Título.

CDD - 22 ed. 200

CIP - NBR 12899 - AACR/2

Pró Reitoria de Ensino EAD Unicesumar

Diretoria de Design Educacional

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CARTAS MAIORES: CARTAS


AOS CORÍNTIOS, GÁLATAS E
ROMANOS

Professor (a) :

Me. Flávio Henrique de Oliveira Silva

Objetivos de aprendizagem
• Compreender alguns dos principais aspectos contextuais e teológicos das cartas de Paulo aos Coríntios;

• Compreender alguns dos principais aspectos contextuais e teológicos da carta de Paulo aos Gálatas;

• Compreender alguns dos principais aspectos contextuais e teológicos da carta de Paulo aos Romanos.

Plano de estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Cartas de Paulo aos Coríntios

• Carta aos Gálatas

• Carta aos Romanos

Introdução
Neste estudo daremos sequência ao estudo das cartas de Paulo, classificadas como cartas maiores: cartas aos coríntios, aos gálatas e aos romanos. Na primeira carta aos coríntios
notaremos que problemas contextuais concretos, enfrentados pela comunidade, determinaram os escritos do apóstolo. Tratava-se de uma comunidade dividida - existiam
diferenças partidárias e sociais: ricos e pobres; senhores, escravos e homens livres; intelectuais e os que não tinham instrução; judeus e gentios - e incapaz de lidar com suas
diferenças. A segunda carta sugere a tentativa do apóstolo em se reconciliar com os irmãos em Corinto e defender seu ministério apostólico. Além disso, veremos a atenção especial
do apóstolo com os necessitados que estavam em Jerusalém (caps. 8 e 9), movimento que ficou conhecido como coleta para os pobres da Igreja em Jerusalém. Ao escrever aos
coríntios e mencionar o assunto, nota-se um tom de encorajamento para que a comunidade então participasse efetivamente das causas de seus irmãos.

A semelhança entre as cartas aos coríntios e a carta aos gálatas está nos motivos que levaram Paulo a escrever. Em ambas, questões contextuais palpáveis foram determinantes. Na
Galácia, a questão geradora de todo o conflito, e que provocou a carta, era o lugar da Lei na leitura/interpretação dos judeu-cristãos, especialmente quanto à circuncisão e as obras
da lei (ambas como meio de justificação), e sua relação com o Evangelho de Cristo. A obrigação da Lei, como meio para justificação, era defendida e propagada, ao que tudo indica,
por um grupo de judeu-cristãos infiltrados na comunidade. Estes ficaram conhecidos como “opositores”.

Por fim, veremos a carta de Paulo aos romanos. Diferente das cartas aos coríntios e da carta aos gálatas – e, na verdade, diferente de todas as outras cartas paulinas – esta carta é
classificada como uma carta doutrinária, ou, como preferem alguns estudiosos, como o tratado teológico-doutrinário de Paulo. Nesse caso, a motivação da carta não teriam sido as
perguntas (contextualmente localizadas) da comunidade, mas o desejo do apóstolo em sistematizar seu pensamento a respeito do Evangelho de Jesus Cristo.

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CARTA DE PAULO aos Coríntios


A cidade de Corinto era uma cidade portuária e estava localizada entre os mares Egeu e Adriático. Capital da Acaia, Corinto era governada pelo procônsul de Roma e o sistema de
governo, conforme conta Mazzarolo (2013, p.17), “era uma miniatura do poder romano”. Graças a sua localização, Corinto era uma cidade ideal para a navegação e para o comércio.
Sendo cidade portuária, era um grande centro urbano e, portanto, atraía pessoas de todos as regiões. Templos, santuários e altares eram comuns na cidade. A prostituição era um
grande negócio e fonte de atração para os turistas. Havia, inclusive, uma espécie de prostituição sagrada atrelada ao templo da deusa grega Afrodite.

O movimento comercial, como era de se esperar, trouxe muita riqueza para a cidade e muitas pessoas enriqueceram. Essa realidade trouxe para Corinto o rótulo de cidade próspera.
Todavia, é preciso ressaltar que nem todos desfrutavam de tal prosperidade. Pelo contrário, entre o povo havia muitos pobres, escravos e até miseráveis. A riqueza da cidade estava
concentrada nas mãos de poucos. Entre estes: “os comerciantes, industriais, latifundiários, banqueiros, militares e os representantes do imperialismo e da ideologia dominante”
(SILVA, 2014, p.118). Enfim, este breve retrato nos leva à conclusão de que havia uma forte crise social instalada em Corinto.

A Igreja nascente não estava imune à crise e a realidade social e econômica trouxe consequências para a comunidade. Faziam parte da comunidade desde miseráveis e escravos até
os mais abastados. Os fortes contrastes sociais da cidade, significaram uma grande ameaçava a unidade da Igreja que não estava sabendo lidar bem com a situação. Daí as
intervenções de Paulo, na construção de uma teologia da unidade e da solidariedade. Para Mazzarolo (2013, p.20), “a comunidade havia mudado muito seu aspecto original. A
fundação e alicerces colocados por Paulo pareciam estar sendo removidos”. O autor destaca o fato de o “ambiente ser hostil ao apóstolo, revelando uma rejeição a sua autoridade
(1Cor 9,1), com alguns afirmando que Paulo não visitaria mais a comunidade (1Cor 4,18); mas estes ele vai desafiar asseverando sua nova visita (1Cor 4,19; 11,34; 16,5-7)”.

A primeira carta aos Coríntios aborda as condições e aflições concretas dessa Igreja. A epístola foi escrita em Éfeso, por volta de 54 ou 55 d.C. Os textos nasceram com o intuito de
instruir a comunidade quanto as incoerências entre suas práticas e os fundamentos da mensagem cristã. Entre os problemas da comunidade, como exemplo, cito mais uma vez
Mazzarolo (2013, pp.20-25) que indica “os conflitos gerados pela falta de ética, pobreza social e religiosa”. Nesse caso, lembra o autor, o desafio de Paulo era indicar que a “a vida
cristã se pauta na solidariedade e na justiça, de tal forma que todo o proceder construa o amor”. Estudiosos defendem que a carta foi endereçada, principalmente, aos responsáveis
por tais incoerências. Ou seja, àqueles (as) que:

• (1) Fomentavam o partidarismo e causavam divisões;

• (2) Lutavam por status na comunidade e, com isso, criavam hierarquias a partir da lógica do poder;

• (3) Valiam-se dos tribunais para resolver questões que poderiam ser tratadas à luz do Evangelho;

• (4) Ofereciam festas e banquetes inacessíveis aos menos favorecidos da comunidade, acentuando ainda mais a divisão e falta de compromisso comunitário;

Portanto, os destinatários e leitores da carta são, por excelência e de forma primeira, os ricos e dominantes, os quais haviam assumido o comando da
comunidade. Ao se dirigir a esse grupo Paulo defende com coragem a causa dos empobrecidos e marginalizados da comunidade, tomando-se a “voz”
dos mesmos (SILVA, 2014, p.119).

A reação de Paulo a este estado de coisas é notada nos temas que tratou nas cartas que enviou aos coríntios. Aponto aqui apenas alguns destes temas já que nosso espaço é
limitado. Vamos começar pela primeira carta, cujas temáticas selecionadas são: (1) Divisão na Igreja - 1:10-17; (2) Ceia do Senhor - 11:17-34; (3) Dons Espirituais - 12:1-11; (4)
Amor: Um caminho excelente - 13:1-13.

Divisão na Igreja - 1 Coríntios 1:10-17


Um dos temas abordados logo no início da carta, e que chama nossa atenção, é a divisão. Existiam diferenças partidárias e sociais - ricos e pobres; senhores, escravos e homens
livres; intelectuais e os que não tinham instrução; judeus e gentios; etc. Paulo, então, identificou que as diferenças não estavam sendo tratadas à luz do Evangelho. E que, portanto,
suas consequências estavam comprometendo a identidade da Igreja de Cristo e os fundamentos da fé cristã.

Ceia do Senhor - 1 Coríntios 11:17-34


No período apostólico, que corresponde ao nascimento da Igreja, a ceia era também conhecida como festa de amor (cf. Jd v.12). O nome referenciava o propósito daquela
celebração e a mesa carregava em si o significado de intimidade e comunhão. A referência ao corpo, portanto, apontava para o desafio da unidade e da partilha.

A Igreja primitiva entendia muito bem esse princípio e buscava colocá-lo em prática. Todos os cristãos participavam e cada família levava à festa os alimentos conforme suas
condições. Juntavam, então, as contribuições, sentavam-se e tinham uma refeição em comum. A Igreja de Corinto, por sua vez, não seguia esse modelo e tornou-se uma exceção à
regra. A ceia (festa do amor) estava comprometida exatamente em sua essência. Na Igreja, conforme já mencionamos, haviam ricos e pobres. Os ricos levavam grandes quantias; já
os escravos, com muita dificuldade, colaboravam com muito pouco. Os ricos, então, não compartilhavam seus mantimentos, antes, os comiam em pequenos grupos fechados,
negando o princípio da partilha (do compartilhar o pão). Dessa forma, o partir do pão, que simbolizava uma resposta às diferenças sociais serviu para agravá-las.

Dons Espirituais - 1 Coríntios 12:1-11


Conforme Silva (2014, p.121), “o objetivo de Paulo nesta seção é enfatizar a unidade essencial da Igreja”. Todavia, o tema da unidade não deve ser interpretado como uniformidade,
antes, porém, unidade em meio a diversidade. Diversidade, portanto, “deve ser considerada e valorizada, sem que isso cause problemas e divisões”. O autor enfatiza que “a Igreja é o
corpo de Cristo e, por característica, cada parte do mesmo deve realizar sua função para o bem do todo”. Ele prossegue: “dentro de uma comunidade de fé existem diferentes dons e
funções; mas cada um(a) deles(as) provém do mesmo Espírito, e cada um(a) deles(as) está a serviço do corpo para sua edificação”. Para Silva

A Igreja em Corinto não estava sabendo lidar bem com esses princípios. Haviam disputas, ciúmes, contendas e divisões. Alguns, por falta de
conhecimento, acreditavam que certos dons eram mais importantes do que os outros. Essa crença procedia da lógica humana de avaliar os dons a
partir do status (poder) produzido pela manifestação deste o daquele dom. Havia o desejo por alguns dons que evidenciavam as pessoas, colocando-
as em posições de superioridade sobre os demais. A busca pelos dons se tornou, portanto, um exercício de busca pelos próprios interesses (glória
para si mesmo ) pelo anseio do poder, da influência e do controle sobre a vida da comunidade. Paulo, então, afirma que os dons são diversos, mas que
todos servem para o mesmo propósito. Lembra ainda que o Espírito é o mesmo, e é este mesmo Espírito quem distribui os dons (SILVA, 2014, p.121).

Amor: Um Caminho Excelente - 1 Coríntios 13:1-13


Diante de tantos desencontros, o amor se tornou o centro da mensagem dessa carta. O amor deveria ser observado como forma de organizar e modelar a vida comunitária e, assim,
corrigir todo tipo de divisão, hierarquias desumanizadas, partidarismos e discórdias. Esse tema aparece no capítulo 13 e está assim organizado:

• (1) Amor é: Paciente, benigno, altruísta, verdadeiro, cheio de esperança, duradouro (v.4-7);

• (2) Amor não é: Invejoso, orgulhoso, egoísta ou rude, nem aceita provocação (v.4-5);

• (3) Sem o Amor: As línguas são apenas barulho (v.1); profecias, mistérios, ciência e fé nada valem (v.2); boas obras são inúteis, porque são fruto de interesses (v.3);

• (4) Amor é maior que: Profecias, que desaparecerão (v.8); línguas, que cessarão (v.8); ciência, que passará (v.8)

Muito bem, nosso foco agora será na segunda carta do apóstolo aos coríntios, onde a atenção com os necessitados (pobres em Jerusalém) é um dos temas em destaque e, portanto,
merece nossa atenção. Paulo escreveu a segunda carta aos Coríntios da Macedônia, por volta de 55 d.C. Além de uma carta de defesa e reconciliação, o apóstolo tinha como
objetivo, ao escrever novamente aos Coríntios, conforme indicam as notas introdutórias da Bíblia de estudo de Genebra (1999, p.1370), entre outras coisas, justamente “Encorajá-
los a completar a sua coleta em favor dos cristãos pobres de Jerusalém”. Esse tema aparece nos capítulos 8 e 9 da carta. A tradição deu a esse serviço o nome de coleta: “coleta para
os pobres”. Todavia, como bem pontua Comblin (1991, p. 115), “Paulo deu a esse serviço uma importância muito maior do que nós damos na atualidade a uma coleta. O nome coleta
restringe muito o alcance do serviço aos pobres que Paulo aqui salienta”.

Sigo com Comblin e entendo que a proposta paulina transcende a coleta em si. A necessidade, claro, existia, e a arrecadação sanaria problemas concretos da comunidade carente
em Jerusalém. Todavia, por se tratar de um dos temas teológicos centrais da carta, é possível compreender que a coleta tornou-se um mecanismo pedagógico para, então, despertar
os coríntios a continuarem desenvolvendo a construção de sua identidade a partir do serviço, especialmente em favor dos pobres e necessitados. Vejamos duas questões
complementares a esta perspectiva e que devem, portanto, ocupar nossa reflexão:

[1] O serviço aos pobres está intimamente ligado à proclamação do Evangelho do Reino, expressa na vida e obra de Jesus de Nazaré. Portanto, ao
desafiar a Igreja de Corinto à prática do cuidado com os pobres, Paulo está lhes convocando a obediência e a essência da vida cristã. Eles teriam a
oportunidade de dar continuidade ao movimento de Jesus priorizando aqueles que estavam à margem da sociedade.

[2] Eles deveriam se sentir privilegiados em partilhar seus bens em sinal da presença do corpo vivo de Cristo (sua Igreja) que continua pisando essa
terra. Porém, eles não deveriam entender essa prática como atividade isolada ou um projeto de ação social com dia e hora para acontecer. Cuidar dos
necessitados deveria ser um gesto natural de solidariedade que brotava de uma fé encarnada, visível, e em movimento. Partilhar seus bens com os
pobres deveria ser a verdadeira liturgia da Igreja de Corinto (SILVA, 2014, p.124).

A partir da leitura destes textos, Comblin (1991, p.121) entende que estamos diante da “doutrina social de Paulo”. Doutrina esta que está subdividida em 7 temas desenvolvidos
pelo autor: (1) Necessidade e Excedente; (2) Pobreza e Riqueza; (3) Igualdade; (4) Suficiência; (5) Comunidade; (6) Caridade; (7) Disponibilidade. Cada um destes temas será tratado
no “aprofundando” desta unidade.

Para os gregos, a religião não dizia respeito aos bens materiais dos ricos e dos pobres, nem se importava com as relações sociais. Não havia, na
cultura grega, ponto de partida para dar a entender por que os habitantes de Corinto deveriam ajudar materialmente os habitantes de Jerusalém,
cidade de outra raça e outra cultura, e muito menos por que deveriam criar uma certa igualdade com eles. [...] Para os judeus, a lei ensina a
solidariedade entre todos os filhos de Israel. Não ensina, porém, a solidariedade com povos estranhos, muito menos como povos pecadores, pagãos,
que invocam deuses falsos e praticam toda sorte de imoralidade. Em relação a Israel, Paulo amplia a solidariedade do povo, para estendê-la além das
fronteiras da lei. Em relação aos gregos, Paulo leva-os a entrar numa história. Para os gregos, a história nada vale. Agora estão entrando numa
história que vale, porque a fé em Cristo é entrar na história de um povo novo, um Israel estendido ao mundo inteiro. [...] O desafio de Paulo era pôr os
coríntios e os povos gregos em movimento, no sentido do Evangelho.

Fonte: COMBLIN (1991, p.119).

CARTA DE PAULO aos Gálatas


Na carta que escreveu aos gálatas, Paulo é comparado a um profeta, bem ao estilo dos profetas de Israel, graças ao fervor com que denunciou seus destinatários, a ponto de
classificá-los como insensatos (cf. Gl, 3,1) e de tratar dos temas que tratou de forma aberta e intensa. Ao comentar a postura do apóstolo, Brown (2004, p.621) defende que “esse
tem sido o mais paulino dos escritos paulinos, aquele no qual a raiva leva Paulo a dizer o que realmente pensava”. Para o autor, “apenas partes de 2 Coríntios igualam-se a Gálatas em
intensidade e emoção. [...] Paulo deixa de lado a diplomacia ao questionar os gálatas”, diz ele.

Mas quem eram os gálatas? Como bem ressaltou Vouga (2015, p.283) há uma “dificuldade da identificação exata dos destinatários da epístola”. O motivo, explica o autor, “decorre
do fato que “Galácia” designa, no tempo de Paulo, duas áreas geográficas diferentes”. As duas opções, conforme indica Brown (2004, p.622), são: (1) “Igrejas na região da Ancira, no
território étnico da Galácia, ou seja, região centro- -norte da província da Galácia, na Ásia Menor (evangelizadas em 50 e 54)”; (2) Menos provavelmente”, nas palavras do autor, “às
Igrejas de Antioquia, Listra e Derbe, no sul da província (evangelizadas em 47-48 e 50)”. Alguns autores destacam que a Galácia fazia parte do Império Romano e que foi
estabelecida em 25a.C. Becker (2007, p.385) nos apresenta breves detalhes a respeito desta relação:

O que é possível conhecer a respeito de uma região tão a nordeste do Império Romano, onde o governador ocupava seu cargo a contragosto? Essa
província certamente não estava entre os lugares diplomáticos mais cobiçados do Império. A região era árida e inóspita, seus habitantes eram vistos
pelos romanos e gregos como estranhos e bárbaros.

Entre os pesquisadores há certa divergência, também, a respeito da data e local da carta. Alguns defendem a produção/envio no ano 57 d.C., na Macedônia. Outros, porém,
defendem que a data provável seja 54-55 d.C., em Éfeso. A maioria aposta que a carta aos Gálatas surgiu durante a terceira viagem missionária de Paulo e o apóstolo estava no auge
de sua atividade. Seguindo as suposições mais frequentes acredita-se que a redação se deu por volta de 54-55 d.C; quatro ou cinco anos após a fundação da Igreja naquela região.
Além dos recursos elementares da retórica, é importante mencionar, conforme explica Becker (2007, p.388), que em alguns momentos Paulo usa uma linguagem judiciária. Nas
palavras do autor: “Gálatas é a única carta que embora de maneira fragmentada, imita um discurso judiciário, proporcionando um caso único de fusão entre estilo epistolar e
discurso de defesa”. Este detalhe é importante, já que harmoniza o estilo da carta com sua temática central, conforme veremos mais à frente.

Ao que tudo indica não temos “a Igreja da Galácia”, mas “as Igrejas da Galácia”. Estas eram formadas por gentios, antigos celtas pagãos e, que até então, cultuavam a algum deus
pagão. Além deles, cristãos de origem judaica (Gl 6,13) se juntaram a Igreja depois que apóstolo já havia partido. As hipóteses sobre a identidade destes, que ficaram conhecidos
como “opositores” (pregadores), são muitas, conforme conta Mazzarolo (2013, p.15): (a) “Judeus cristãos de Jerusalém, visto que o esquema de evangelização entre a Galácia e
Jerusalém se tornara objeto de fortes disputas”; (b) “Judeus cristãos e pagãos da própria Galácia”; (c) “Gnósticos e judeus cristãos sincretistas da Galácia”; (d) “Grupos legalistas e
pneumáticos com tendências à libertinagem”.

Chama nossa atenção a postura adotada por esse grupo: [1] pregando outro Evangelho (1,6); [2] pervertendo o Evangelho (1,7). Tal atitude, sem dúvida, justifica, em grande parte, a
carta enviada por Paulo. Sua reação aparece em vários pontos da carta. Entre eles, por exemplo, Gl 1,8-9: “8 Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue
Evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema. 9 Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega Evangelho que vá além daquele que recebestes, seja
anátema”. Outras atitudes desse grupo são mencionadas no decorrer da carta.

• Fascinam (seduzem, enfeitiçam) os gálatas (3,1);

• “Cuidam deles, mas a fim de os prender a si e de os isolar de outras influências (4,17-18)” – Vouga (2015, p.285);

• Impedem (cortam os passos) de obedecer a verdade (5,7)

Cito as palavras de Vouga (2015, p.286) que resume “os resultados empreendidos” por eles. Os gálatas, nas palavras do autor, estão prestes a: (1) “voltar as costas para o Evangelho
paulino (3,1-5)”; (2) “se submeter a novas prescrições (4,8-11)”; (3) “trair sua lealdade para com o apóstolo (4,12-20)”; (4) se fazer circuncidar (5,2-4); (5)“exercer pressões sobre os
outros membros da comunidade (6,13)”.
Você já deve ter notado que a grande questão, geradora de todo o conflito, e que move o apóstolo a escrever da forma que o fez, era o lugar da Lei na leitura/interpretação dos
judeu-cristãos, especialmente quanto à circuncisão e as obras da lei (ambas como meio de justificação), e sua relação com o Evangelho de Cristo. Além de seguirem tais práticas,
começaram a impô-las à Igreja nascente, indicando meios humanos de justificação. Voltaremos a este assunto mais à frente. Antes, vamos ver o que disse Mazzarolo(b) (2013, p.10)
sobre “esse conflito central, de fundo” e “seus diversos desdobramentos na carta”.

• (1) “Paulo faz uma saudação diferente, quase brusca, e depois faz a primeira crítica-espanto sobre o retrocesso dos Gálatas”;

• (2) “Faz um relato um relato histórico de dois problemas: o conflito com Pedro na Antioquia e os falsos mestres que se infiltravam na sua missão”;

• (3) “Rejeita e refuta os feiticeiros e todos os anunciadores da circuncisão e justificação pelas obras da Lei”;

• (4) “A partir de Abraão se estabelecem os critérios de filiação e se complementam no Espírito de Jesus, através do qual podemos clamar Abba”;

• (5) “A Liberdade radical e inegociável em Cristo supera todos os critérios culturais e raciais de religiosidade ou salvação. Os que creem em Cristo são novas criaturas que se
relacionam no amor e na justiça”.

Pois bem, caminharemos agora pela síntese teológica da carta, começando pela saudação/apresentação de Paulo. Isso mesmo, já o início da carta traz um tema significativo para a
interpretação da mesma. Isto porque a autoridade do apóstolo estava sendo questionada por aqueles pregadores judeu-cristãos, infiltrados na comunidade - denegrir a imagem de
Paulo, certamente, era uma estratégia para o cumprimento de seus objetivos. As palavras de Paulos são uma espécie de credencial. Conforme Mazzarolo(b) (2013, p.35), esta
saudação não é apenas uma saudação, mas uma justificativa das motivações e razões da carta. [...] o tom da saudação indica um clima não muito amistoso, tendendo mais para a
apologese: defesa e refutação. Note no texto bíblico abaixo (Gl 1,1; 1,10-16a) a resposta do apóstolo, reiterando sua autoridade, seu chamado, suas motivações e o conteúdo de sua
mensagem:

1 Paulo, apóstolo, não da parte de homens, nem por intermédio de homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os
mortos. [...]10Porventura, procuro eu, agora, o favor dos homens ou o de Deus? Ou procuro agradar a homens? Se agradasse ainda a homens, não
seria servo de Cristo. 11Faço-vos, porém, saber, irmãos, que o Evangelho por mim anunciado não é segundo o homem, 12 porque eu não o recebi,
nem o aprendi de homem algum, mas mediante revelação de Jesus Cristo. 13 Porque ouvistes qual foi o meu proceder outrora no judaísmo, como
sobremaneira perseguia eu a Igreja de Deus e a devastava. 14 E, na minha nação, quanto ao judaísmo, avantajava-me a muitos da minha idade, sendo
extremamente zeloso das tradições de meus pais. 15Quando, porém, ao que me separou antes de eu nascer e me chamou pela sua graça, aprouve 16
revelar seu Filho em mim, para que eu o pregasse entre os gentios…

Para muitos estudiosos o centro das controvérsias que motivaram a carta é a Lei. Ou melhor: o lugar da Lei na leitura/interpretação dos judeu-cristãos, especialmente quanto à
circuncisão e as obras da Lei, conforme dissemos antes. Vouga (2015, p.291) explica que “a afirmação central de Gálatas sobre a Lei é que ninguém será justificado pelas obras da Lei,
mas pela fé de (ou em) Jesus Cristo (2,16)”. Ao desenvolver seus argumentos, defende que “essa confiança na confiança de Jesus Cristo é a atitude existencial pela qual a existência
se vê transformada em nova criatura”. Para o autor “um pressuposto dessa afirmação consiste na concepção apocalíptica da história desenvolvida pela epístola. A revelação de Deus
em Jesus Cristo, na interpretação dada em Gálatas dividiu a história em dois”. Significa, diz ele:

• “Uma mudança de época, o fim do tempo antigo no qual reinava a Lei (3,19)”;

• “O início dos novos tempos que são os tempos do Espírito (4,6-7)”.

Sigo ainda com Vouga (2015, p.291) que agora comenta que “a consequência é que os crentes não estão mais sob a Lei, mas no Espírito, e que são chamados a se deixar conduzir
pelo Espírito e a produzir o fruto do Espírito (5,16-24; 6,8)”. Ele então defende que “esse esquema histórico deixa em aberto duas questões”: (1) “o que fez da existência sob a Lei
uma existência sob a maldição (3,10-14)?”. (2) “O que vem ser a Lei na nova época (5,13-15)”. Vejamos sua conclusão:

A existência sob a Lei está condenada ao desespero porque ela supervaloriza a Lei: se tivesse sido dado à Lei o poder de dar a vida, então a Lei teria o
poder justificador (3,21). Ora, a Lei foi dada por um tempo limitado e para ordenar a cidade (3,19). A existência sob a Lei se vê, por conseguinte,
diante da alternativa infeliz de se ver maldita, seja porque não consegue cumprir toda Lei, seja porque consegue cumprir toda a Lei, pois nem por isso
ela é justificada, visto que só Deus, e não a Lei, tem o poder de dar a vida e de justificá-la.

Muito bem, por fim, antes de terminarmos esta aula, dialogaremos com Brown (2004, pp.627-628) que comenta os textos de Gl 3,1-4,31, entendendo ser este o núcleo da carta.
Destes textos, o autor “elenca seis argumentos tiradas da experiência e da Escritura para convencer os insensatos gálatas que se deixaram enfeitiçar”. Note que todas as vezes que
Brown usar “ele”, está se referindo ao apóstolo. Além disso, quero desafiá-lo (a) a acompanhar as questões abaixo verificando os textos bíblicos indicados.

(1) Gl 3,1-5: Proclamação do Cristo crucificado:


“Quando ele proclamou Cristo crucificado” os gálatas receberam o Espírito sem a observância das obras da Lei; assim, como tais obras podem ser necessárias?”

(2) Gl 3,6-14: A circuncisão de Abraão:


Brown detecta que “contra a insistência dos pregadores sobre a circuncisão de Abraão (Gn 17,10.14), ele [Paulo] cita a promessa de Deus de que em Abraão todas as nações seriam
abençoadas (Gn 12,3)”. Uma promessa, conforme defende o autor, “independente da circuncisão”. A partir desta compreensão, conclui-se que, “ao doar o Espírito, por meio da fé, aos
gentios incircuncisos, Deus cumpre a promessa feita a Abraão, um homem cuja fé foi tida em conta de justiça (Gn 15,6)”

(3) Gl 3,15-25: Anulação de um testamento:

Um testamento que foi ratificado não pode ser anulado por uma tradição posterior. A Lei veio quatrocentos e trinta anos depois das promessas a
Abraão; como pode a herança daquelas promessas depender da observância da Lei? A Lei era apenas uma guardiã temporária, até que o Cristo
viesse.

(4) Gl 3,26-4,11: Escravidão e Liberdade

Os gálatas, que eram escravos dos espíritos elementares do universo, experimentaram, pela redenção do Filho de Deus e por adoção divina, a
liberdade dos “filhos” (crianças) de Deus; por que desejam agora torna-se novamente escravos, desta vez das exigências da Lei?

(5) Gl 4,12-20: Paulo e os Gálatas


“Os gálatas trataram Paulo extremamente bem, como a um anjo; como poderia ela tornar-se inimigo deles, como os pregadores desejavam?”

(6) Gl 4,21-31: Apelo ao passado


Brown comenta o fato dos “pregadores apelaram para Abraão, Agar e Sara”, conforme o autor “tiraram a lição errada”.

• “Agar, a mulher escrava , não representa a descendência dos gentios, mas a Jerusalém atual, e a aliança escravizante da Lei dada no Monte Sinai”;

• “Sara, a mulher livre, representa a Jerusalém celeste e a aliança da promessa de Deus a Abraão - ela é a mãe de todos os que foram libertados em Cristo”.

A oposição antitética carne/Espírito equivale à oposição homem/Deus que domina a argumentação desde Gálatas 1,1; 1,6-9 e 1,10-12. O homem e a
carne são passageiros e pertencem ao mundo da criação, ao passo que Deus e o Espírito têm a força de fazer viver (3,21), de justificar e de dar a vida
eterna (6,8-9). Conforme uma primeira perspectiva, a carne e o Espírito aparecem como duas forças contraditórias que determinam duas atitudes
existenciais contrárias (3,1-5). A existência que recebe sua justiça pela fé encontra-se sob o poder do Espírito, ao passo que viver sob o poder da
carne é sinônimo de procurar se justificar pelas obras da Lei. Conforme uma segunda perspectiva, a carne e o Espírito caracterizam duas épocas da
história da salvação (4,1-7): a carne é o poder deste mundo que passa, ao ponto que o Espírito é o da nova criação.

Fonte: VOUGA (2015, pp.292-293).


CARTA DE PAULO aos Romanos
Diferente da maioria dos textos paulinos, a carta aos romanos - ao que tudo indica a última escrita por Paulo -, conforme destaca Vielhauer (2005, pp.205-206), ocupa-se “apenas
em pequena parte com perguntas da comunidade destinatária, e desdobra, em vez disso, temática e sistematicamente a compreensão paulina do Evangelho”. O autor observa que “o
conteúdo doutrinário supera a correspondência a tal ponto que, frequentemente, se tratou Romanos mais como tratado doutrinário do que como carta”. Sigo com Vielhauer (2005,
p.206) que chama nossa atenção para o “momento crítico” na vida do apóstolo na época em que escreveu aos romanos. O autor, então, pontua algumas “observações de Paulo sobre
seus próximos planos” eu que estes “informam sobre a situação em que a carta foi escrita”. Vejamos:

• “De acordo com Rm 15.19-24, o apóstolo encontra-se no fim de sua atividade no oriente; terminou de anunciar o Evangelho desde Jerusalém, seu ponto de partida, até Ilírico, sua
área missionária mais ocidental”;

• Ele “não tem mais espaço nessas regiões; por isso quer ir a Roma e daí para a Espanha. De momento, porém, está de partida para Jerusalém, a fim de entregar à comunidade
primitiva a coleta da Macedônia e Acaia (15.25-29)”;

A redação de Romanos localiza-se, portanto, no final da chamada terceira viagem missionária, que é esboçada em At 20.1-5. Normalmente se supõe
como local da redação a cidade de Corinto [...] Também seria possível como local da redação uma cidade da Macedônia, Tessalônica ou Filipos, no
entanto, ao que parece, foi somente em “Helas” que Paulo se demorou por mais tempo; e a redação de Romanos tomou um bom tempo. Portanto,
Paulo redigiu Romanos muito provavelmente durante sua terceira estada em Corinto, antes da Páscoa (At 20.6) do ano de sua prisão (não antes de
56, não depois de 59 d.C.) - (VIELHAUER, 2005, pp.205-206).

Ainda que o argumento de Vielhauer (2005, pp.205-206), sobre uma carta de cunho mais doutrinário e que ocupa-se “apenas em pequena parte com perguntas da comunidade
destinatária”, pareça adequado, não é possível se aproximar da carta sem compreender algumas questões fundamentais a respeito da comunidade/Igreja em Roma. Esta será nosso
trabalho nos próximos parágrafos.

Quando Paulo escreveu aos romanos a Igreja (ou Igrejas domésticas), que não havia sido fundada por ele, já existia conforme dão a entender alguns textos bíblicos da própria carta
(cf. 1,13; 15,22-23). Uma leitura de Rm 16,3-20, no faz pensar em pelo menos cinco Igrejas domésticas na região. O que indica que a carta teria sido destinada a todas elas. No
mesmo texto, conforme os comentários de Boring (2015, p.485) “ele saúda 26 pessoas por nome, as quais ele encontrou em outro lugar, mas que agora estão em Roma”.

São poucos os detalhes históricos a respeito das comunidades romanas. Quanto a composição das mesmas, as informações também não são muitas. Sabe-se, através de alguns
pesquisadores, como Boring (pp.485-486), por exemplo, que a “comunidade cristã começou com crentes messiânicos dentro das sinagogas. Eles seriam judeus étnicos e prosélitos,
mas também tementes a Deus que se identificavam com a comunidade judaica e participavam da sinagoga”. O autor conta que “por gerações, houve uma grande comunidade judaica
em Roma que, por vezes, viveu uma existência precária”. A maioria das pessoas, diz ele, “pertencia às classes sociais mais baixas, vivia e trabalhava nas camadas mais pobres da
capital, e mais de uma vez havia sido forçada a deixar a cidade”. Boring (2015, p.485) explica que

Eles tinham empreendido grandes esforços, típicos do judaísmo da Diáspora nos centros urbanos, a fim de ajustar-se ao seu ambiente social e
político, em particular para demonstrar que era leais súditos de Roma, sem compreender sua fé ou sua identidade. O mais impressionante neste
aspecto é que algumas sinagogas que podem ser datadas do primeiro século são nomeadas como nomes de líderes romanos, incluindo o próprio
imperador. [...] Isso não poderia ter sido feito sem a aprovação oficial, e demonstra os esforços da comunidade judaica de integra-se na sociedade
romana e garantir seu status jurídico.

Sigo com Boring que assim narra a sequência dessa história: “Apesar desses esforços, mais uma vez os judeus foram forçados a deixar a cidade sob o imperador Cláudio, em 49 d.C.
(cf. o caso de Priscila e Áquila, At 18,2)”. Isso significou, “que o elemento judaico-cristão na liderança das Igrejas, presumivelmente um contingente considerável, foi forçado a sair, e
que as congregações cristãs seriam compostas principalmente de cristãos gentios”. Nesse meio tempo, conta o autor, “o número de membros das Igrejas romanas seria aumentado
por cristãos gentios de outros lugares, que tinham se mudado para a capital, conforme evidenciado pela lista de nomes em Romanos 16”. Por fim, descreve Boring (2015, p.486):

Quando o decreto de Cláudio foi rescindido após sua morte, em 54 d.C., muitos desses judeus cristãos (incluindo Priscila e Áquila), retornaram a
Roma, achando que as congregações a que pertenciam agora tinham um caráter cristão gentio predominante. Mesmo assim, as congregações
romanas permaneceram enraizadas nas tradições judaicas de suas origens. [...] Esta história, e essas tensões, se refletem na carta de Paulo. Em Roma,
a relação entre judeus e cristãos, judeus cristãos e cristãos gentios, não é apenas uma questão teológica profunda e complexa, mas uma questão
prática da vida da Igreja.

Quanto aos desafios da comunidade em Roma, alguns autores apostam em algumas hipóteses de abordagem. Vejamos, como exemplo, a proposta de Wegner (1996, p.55- 57). O
autor destaca alguns textos bíblicos e os interpreta à luz daquilo que classificou como “desafios sociais” enfrentados pelos destinatários da carta.

(1) “Paulo, escravo de Jesus Cristo, chamado para ser apóstolo...”: assim começa a carta (Rm 1,1). Wegner lembra do modelo escravagista romano (cidade e império como um todo).
Nesse sistema, diz ele, “escravos não representavam senão coisas, posses, o apóstolo deixa claro logo de início que a perspectiva a partir da qual escreve é a dos mais humilhados e
despojados do império: os escravos”. Nesse contexto, portanto, “dizer-se “escravo de Jesus Cristo” é solidarizar-se com o lugar social dos escravos. O uso da linguagem “escravagista”
é, no caso, a maneira que Paulo tem para expressar- -se ligado e irmão dos que a sociedade anatematizou”. Para o autor:

A carta vai ainda um passo adiante: afirma que os cristãos – e, portanto, também os não-livres da comunidade – são, simultaneamente, escravos de
um outro Senhor, Deus, devendo prestar serviços a uma nova causa, a da justiça: 6,16-22. Os escravos são interpelados a terem compromisso com a
justiça; Paulo propõe que eles participem na reconstrução de um mundo diferente. Os escravos são, pois, convidados a serem sujeitos da história e
oponentes do pecado: O Evangelho do apóstolo procura elevá-los à categoria de “defensores da vida” (6,21-23) - (WEGNER, 1996, pp.55-57).

(2) Wegner entende que em 12,8 “o exercício da misericórdia e a partilha dos bens são interpretados como carismas, dons de Deus”. Para o autor, daí surge “o interesse de Paulo em
frisar, com Jesus, que “mais bem-aventurado é dar do que receber” (At 20,35). Como dom do Espírito, a partilha de bens será expressão da ação de Deus”.

Esta abordagem é bastante coerente se lida a partir do contexto de privação em que vivia a comunidade em Roma. Daí a proposta do apóstolo seria, então, uma espécie de reação e
prol da sobrevivência, mas também uma mensagem de contraponto ao modelo estabelecido.

(3) Na sequência, Wegner aponta que “uma clara oposição à discriminação social reinante no império aparece em 12,10: “amai-vos cordialmente uns aos outros com amor fraternal,
preferindo-se em honra uns aos outros”.

(4) Por fim, destaca Wegner, “a direção norteadora daquilo que, segundo Paulo, pede o Evangelho é exposta de forma mais clara em 12,16: “Tende mútua estima, sem pretensões de
grandeza, mas sentindo-vos solidários com os humildes”.
A versão da Almeida traduz a 2ª parte da frase assim: “Condescendei com o que é humilde”. O verbo no original significa exatamente isto: deixar-se
arrastar em direção de algo, deixar-se determinar por algo, ser levado em direção de algo ou alguém. Os humildes ocupam na teologia de Paulo o
papel de uma bússola: é na direção deles que devemos caminhar, pensar, agir e teologizar (WEGNER, 1996, pp.55-57).

Muito bem, nossa tentativa agora será indicar um ou mais “temas teológicos centrais”, encontrados na carta. Os desafios acima apontados por Wegner, além de desafios em si, nos
dão boas pistas para a compreensão de alguns aspectos da mensagem paulina, mas precisamos avançar já que estamos diante de uma carta extensa e complexa. Para tanto, é
necessário retomar a história da formação da comunidade. O último capítulo que vimos foi o fim do decreto de Cláudio e o retorno dos judeus cristãos para Roma. Lembra? Quanto
ao próximo capítulo dessa história, Mazzarolo (2006, pp.14-15) chama a nossa atenção para o fato das “comunidades cristãs abrigarem muitos judeus, além dos que já estavam
integrados, e isto originou uma série conflitos, não apenas de caráter individual, mas de correntes de pensamento e ideologia”. O resultado desse conflito foi “uma oposição
sistemática entre judeus e cristãos dentro das comunidades”. A partir deste pano de fundo, dialogaremos com Brown (2004, pp.744-756) que organiza as temáticas em seções,
doutrinais e exortativas, que assim seguem:

Fórmula introdutória
(Rm 1,1-7):
Na concepção de Brown, destaca-se aqui “O Evangelho que diz respeito ao “Filho de Deus, nascido da estirpe de Davi segundo a carne, estabelecido Filho de Deus com poder por
ressurreição dos mortos, segundo o Espírito de santidade (Rm 1,3-4)””. A conclusão do autor é de que estamos diante de uma “formulação judaico-cristã do Evangelho –
presumivelmente porque tal formulação seria familiar e aceitável aos cristãos romanos”.

Seção doutrinal do corpo


(Rm 1,16-4,25):
O primeiro destaque do autor é de que “a justificação/justiça de Deus é revelada por meio do Evangelho. Paulo avança na parte central de sua carta acentuando que esse Evangelho
é o poder de Deus para a salvação, primeiro do judeu, depois do grego”. Na sequência, Brown comenta que “em uma seção memorável (Rm 2,17-24), Paulo ridiculariza a orgulhosa
pretensão da superioridade judaica”. A afirmação do apóstolo, é de que “a circuncisão tem valor, mas somente se se observa a Lei. De fato, uma pessoa incircuncisa, que vive segundo
as exigências da Lei, condenará o circunciso violador desta (Rm 2,25-29)”. Em seguida, o autor afirma:

Todos os seres humanos são culpados perante Deus. Qual, então, é a vantagem dos judeus circuncisos, se eles também estão sob a ira de Deus (Rm
3,1-9) e se ninguém é justo? Em Rm 3,21-26 Paulo responde: aos judeus foram dadas as palavras da promessa de Deus, e Deus é fiel. O apóstolo
menciona o que foi prometido ou prefigurado na Lei e nos profetas, a saber, a justiça de Deus mediante a fé de/em Jesus Cristo, que justificou judeu e
grego, sem distinção. [...] Ninguém tem o direito de orgulhar-se, visto que Deus gratuitamente justificou o circunciso e o incircunciso da mesma
maneira, pela fé, independente das obras/ações da Lei (Rm 3,27-31) - (BROWN, 2004, pp.744-756).

Seção doutrinal do corpo: segunda parte


(Rm 5,1-8,39):
rown batiza esta seção de “reconciliação com Deus em Cristo e seus benefícios”, e conclui: “se as pessoas são justificadas por intermédio de Cristo, estão reconciliadas com Deus”.
Daí os benefícios: “paz com Deus, esperança de partilhar a glória dele e uma infusão do amor divino (Rm 5,1-5)”. Em seguida, conforme o autor, vem a explicação sobre como “a
morte de Cristo realizou a justificação, a salvação e a reconciliação (Rm 5,6-11)”. Para Brown, aí está “uma das maiores explanações neotestamentárias do que envolve o amor
divino: a disposição de morrer pelos pecadores que não merecem tal graciosidade”.

Vejamos outras temáticas nos capítulos que seguem nesta seção: (1) Rm 6,1-11: “nosso velho ser foi crucificado com Cristo; fomos batizados em sua morte e sepultados com ele,
para que, assim como ele ressuscitou dos mortos, nós possamos caminhar na novidade da vida”. (2) Rm 7: ao comentar esse capítulo, Brown cita o paralelo entre Paulo e os
manuscritos do mar morto. Tanto um quanto o outro, diz Brown, referem-se “a humanidade pecadora” de uma perspectiva judaica, “mas para o autor dos manuscritos do mar morto,
a libertação provém de um Deus gracioso, por meio da Lei ou Torá, enquanto, para Paulo, ela provém de um Deus gracioso mediante a fé em Jesus Cristo”. (3) Rm 8: O texto Rm 8,31-
39 é para Brown “uma das declarações mais eloquentes de todos os escritos cristãos”. Diz assim o texto:

Se Deus está conosco, quem estará contra nós? [...] Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o
presente nem o futuro, nem os poderes, nem a altura [...] poderá nos separar do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor.

Seção doutrinal do corpo: terceira parte


(Rm 9,1-11,36):
A questão discutida nesta seção é: “como a justificação por intermédio de Cristo se coaduna com as promessas de Deus a Israel?”. Paulo acusa de “mentirosos todos aqueles que
dizem que ele menospreza o judaísmo”. Em seguida, “enumera, com orgulho, os privilégios maravilhosos dos israelitas (9,4-5)”. Indo em frente, conforme bem destacou Brown, Paulo
defende que “Israel falhou porque procurou a justificação pelas obras, não pela fé. [...] Não reconheceu que Deus manifestou sua justiça àqueles que acreditam em Cristo e que, de
fato, Cristo é o fim da Lei (Rm 9,30-10,4).

Na continuação, Paulo enfatiza a futilidade de buscar ser justo diante de Deus com base nas obras, pois, se confessares com tua boca que “Jesus é
Senhor” e creres em teu coração que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo (Rm 10,9). Nesse versículo não há distinção entre judeu e
grego (Rm 10,12); tudo isso realiza a profecia de Jl 2,32: “todo aquele que invocar o nome de Iahweh, será salvo”. Em Rm 10,14-21, Paulo deixa pouco
espaço para Israel desculpar-se: o Evangelho já fora anunciado pelos profetas, mas os israelitas não acreditaram. [A partir do capítulo 11] O tropeço
de Israel e o endurecimento parcial de seu coração foram providenciais, pois ensejaram a salvação dos gentios. [...] Os crentes gentios [por sua vez]
não devem orgulhar-se; são apenas um ramo de oliveira silvestre que foi enxertado. [...] Paulo conclui esse quadro com um hino de louvor à
profundeza da riqueza e da sabedoria de Deus: “A ele a glória pelos séculos. Amém!” (Rm 11,33-36) - (BROWN, 2004, pp.744-756).

Seção exortativa do corpo: primeira parte


( Rm 12,1-13,14):
A esta seção Brown chama de “conselhos imperativos para a vida cristã”. Nas palavras do autor, “agora Paulo apresenta aos cristãos romanos sugestões sobre o modo como eles
podem viver em resposta à misericórdia de Deus. [...] Ele oferece uma série de conselhos com acento especial na harmonia, autocontrole e perdão”. Na leitura de Brown, tudo isso é
“parte do não conformar-se com este tempo/mundo (Rm 12,2) e do renovar-se num novo tempo e éon inaugurados por Cristo”. Na sequência, o autor entende como apropriado o
conselho do apóstolo em relação a submissão às autoridades constituídas (Rm 13, 1-7). O motivo é o momento político em que se encontra o Império e a visão que este tem sobre os
cristãos em Roma. “Em Rm 13,8- 10, em que “não devais nada a ninguém a não ser o amor mútuo, pois quem ama o outro cumpre a Lei”, vem acompanhado da afirmação de que os
mandamentos se resumem em “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”.

Seção exortativa do corpo: segunda parte


( Rm 14,1-15,13):
Nesta seção, a temática em destaque é: “aquele que é forte deve amor ao fraco”. Ao comentar o texto Brown cita que “os fortes estão convencidos de que podem comer qualquer
coisa e não precisam levar em consideração dia algum especial; os fracos são cautelosos no comer. [...] Observando certos dias santos”. Você já deve ter notado que “o problema
reflete, provavelmente, costumes provenientes da pureza e das exigências cúlticas da Lei mosaica”. Ao que tudo indica, gentios e judeus estão mais uma vez em tensão. “Os fortes
consideram tais preceitos irrelevantes, enquanto os fracos acreditam que as leis são determinantes. [...] Paulo deseja que os dois grupos não se julguem nem se desprezem
mutuamente (Rm 14,3-4.10.13). Por fim, o apóstolo declara: “Nós, os fortes, devemos carregar as fragilidades dos fracos e não buscar a nossa própria satisfação” (Rm 15,1).

Submissão às Autoridades.

A situação política de Roma, sob o comando de Nero, causava perplexidade, assombros e receios. [...] A comunidade cristã era formada por alguns
judeus, mas sua maior parte por romanos e estrangeiros residentes, muitos escravos. Os cristãos, pelo seu método e doutrina de partilhar o pouco ou
quase nada que tinham, eram vistos como suspeitos, vigiados e considerados os últimos da sociedade romana, vivendo entre os mais pobres. Em
Roma estava o símbolo do poder despótico na figura de Nero, o qual, não raro, era acometido de convulsões mentais, e quando isso acontecia, as
camadas mais pobres “pagavam a conta”. [...] Os cristãos passam pela experiência da rejeição e da perseguição, gerando um ambiente caótico e
trágico para os inocentes e indefesos adeptos na nova religião. Conhecendo todos esses perigos, Paulo parece assumir uma postura sábia e
estratégica, mesmo que ele pensasse diferente; mas, no momento, não havia outra alternativa a não ser submeter-se à autoridade constituída, a fim
de preservar as famílias e a sobrevivência das comunidades (Rm 13,1-7).
Fonte: (MAZZAROLO, 2006, pp.15-17).

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ATIVIDADES
1. A primeira carta aos Coríntios nasceu com o intuito de instruir a comunidade quanto as incoerências entre suas práticas e os fundamentos da mensagem cristã. Estudiosos
defendem que a carta foi endereçada, principalmente, aos responsáveis por tais incoerências. Ou seja, àqueles (as) que:

a) Fomentavam o partidarismo e causavam divisões.

b) Lutavam por status na comunidade e, com isso, criavam hierarquias a partir da lógica do poder.

c) Valiam-se dos tribunais para resolver questões que poderiam ser tratadas à luz do Evangelho.

d) Ofereciam festas e banquetes inacessíveis aos menos favorecidos da comunidade, acentuando ainda mais a divisão e falta de compromisso comunitário.

e) Todas as alternativas estão corretas.

2. Na carta aos gálatas, os opositores são acusados de: pregar outro Evangelho (1,6); perverter o Evangelho (1,7); fascinar (seduzir, enfeitiçar) os gálatas (3,1); impedir (cortam os
passos) de obedecer a verdade (5,7)

[ ] Verdadeiro

[ ] Falso

3. Quanto à comunidade em Roma, a partir das informações de Boring, é correto afirmar que:

a) A comunidade cristã começou com crentes messiânicos em lugares subterrâneos, longe das sinagogas.

b) Havia uma forte tensão entre este grupo e os judeus étnicos e prosélitos.

c) No início, a maioria das pessoas não eram tementes a Deus, mas se identificavam com a comunidade judaica, ainda que não participassem da sinagoga.

d) A maioria das pessoas pertenciam às classes sociais mais baixas, vivia e trabalhava nas camadas mais pobres da capital.

e) Todas as alternativas estão corretas.

Resolução das atividades

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RESUMO
Neste estudo vimos alguns dos principais aspectos contextuais e teológicos das cartas de Paulo aos coríntios, da carta ao gálatas e da carta aos romanos. Na carta primeira carta aos
coríntios, chamou nossa atenção os vários problemas enfrentados pela comunidade e as temáticas abordadas pelo apóstolo para tentar, então, lidar tais dilemas. Havia um sério
problema de divisão na Igreja, fruto de diferenças entre os irmãos. Paulo entendia que aquele ambiente estava comprometendo a identidade da Igreja de Cristo e os fundamentos
da fé cristã e que as diferenças não estavam sendo tratadas à luz do Evangelho. O apóstolo tratou diretamente do tema (1,10-17), mas também à luz de outras temáticas como a ceia
do Senhor (11,17-34); os dons do Espírito (12,1- 11); o amor (13,1-13). Amor, aliás, visto de forma prática na segunda carta aos coríntios, quando Paulo encoraja a comunidade à
servir os necessitados da Igreja em Jerusalém.

Vimos que na carta aos gálatas o desafio principal consistia em alertar a comunidade a respeito da mensagem controversa, anunciada por um grupo de judeu-cristãos conhecidos
como “opositores” do Evangelho de Cristo. Paulo os acusa de perverter o Evangelho (1,7) e pregar outro Evangelho (1,6). Além disso, de seduzirem/enfeitiçarem os gálatas (3,1). No
centro do discurso desse grupo estava a obrigatoriedade da circuncisão e das obras da lei, ambas como meio de justificação.

Já na carta aos romanos, o tratado teológico-doutrinário de Paulo, vimos, através dos estudos de Brown, a possibilidade de organizá-la a partir de duas grandes seções: seção
doutrinal do corpo e seção exortativa do corpo. A seção doutrinal está dividida em três blocos: (1) Rm 1,16-4,25 – “a justificação/justiça de Deus é revelada por meio do Evangelho”;
(2) Rm 5,1-8,39 - “reconciliação com Deus em Cristo e seus benefícios (paz com Deus, esperança de partilhar a glória dele e uma infusão do amor divino (Rm 5,1-5)”; (3) Rm 9,1-
11,36 - “como a justificação por intermédio de Cristo se coaduna com as promessas de Deus a Israel?”. A seção exortativa, por sua vez, está dividida em dois blocos: (1) Rm 12,1-
13,14 - “conselhos imperativos para a vida cristã”. (2) Rm 14,1-15,13) – “aquele que é forte deve amor ao fraco.

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Material Complementar

Leitura
Dicionário de Paulo e suas Cartas.

Autor: Gerald Hawthorne, et al. (orgs.).

Editora: Vida Nova, Paulus, Loyola.

Sinopse : Este dicionário aborda os principais temas teológicos desenvolvidos por Paulo em suas
cartas. Os autores, em geral, entendem que o ministério e legado à história da Igreja se dá em três
partes: a formação judeu-rabínica, o cenário da vida de Paulo e toda a sua obra missionária no
ambiente greco-romano e o ponto mais decisivo do seu chamado, quando se tornou apóstolo. Esta
obra baseia-se principalmente na nova avaliação da atitude de Paulo em relação à Lei, à Aliança e ao
povo de Israel e transmite sua reação ao “novo modo de contemplar” o Evangelho de Paulo de justiça
pela fé e aos elementos de continuidade com a fé dos antepassados.

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REFERÊNCIAS
BECKER, Jürgen. Apóstolo Paulo, vida, obra e teologia. São Paulo: Ed. Acad. Cristã, 2007.

BÍBLIA. Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri, Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.

BORING, Eugene. Introdução ao Novo Testamento: história, literatura, teologia - Volume I: Questões Introdutórias do Novo Testamento e Escritos Paulinos. Santo
André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2015.

BROWN, Raymond E. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2004.

COMBLIN, José. Segunda epístola aos Coríntios. Petrópolis: Vozes, 1991.

MAZZAROLO, Isidoro. Primeira Carta aos Coríntios: exegese e comentário. 3. Ed. Rio de Janeiro: Mazzarolo editor, 2013.

MAZZAROLO(b), Isidoro. Carta de Paulo aos Gálatas: da libertação da Lei à filiação em Jesus Cristo. Rio de Janeiro: Mazzarolo editor, 2013.

MAZZAROLO, Isidoro. A Carta de Paulo aos Romanos: Educar para a maturidade e o amor. Rio de Janeiro: Mazzarolo editor, 2006.

SILVA, Flávio Henrique de Oliveira. In SILVA, Flávio Henrique de Oliveira; PROENÇA, Wander de Lara. Introdução ao Novo Testamento. Londrina: FTSA, 2014.

VIELHAUER, Philipp. História da literatura cristã primitiva: introdução ao Novo Testamento, aos apócrifos e aos pais apostólicos. Santo André: Academia Cristã,
2005.

VOUGA, François. A epístola aos Gálatas. In MARGUERAT, Daniel (Org.). Novo Testamento: histó ria, escritura e teologia. 3. Ed. São Paulo: Loyola, 2015, pp.277-
295.

WEGNER, Uwe. Sociologia das Comunidades Paulinas: Aspectos socioeconômicos na carta aos romanos. Estudos Bíblicos, nº 25, Petrópolis: Vozes, 1996, p.43-57.

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APROFUNDANDO

A doutrina social de Paulo

Vimos na primeira aula deste estudo (“cartas de Paulo aos coríntios”) que, a partir da leitura da segunda carta de Paulo aos coríntios (mas especificamente sobre a coleta para os
pobres da Igreja em Jerusalém) José Comblin desenvolveu uma tese a qual é conhecida em seus escritos como “doutrina social de Paulo”. Nela, o autor aponta sete questões as quais
veremos a partir de agora.

Necessidade e Excedente:
Conforme Silva (2014, p.124), “a sociedade na qual Paulo e todo o movimento cristão do primeiro século estão inseridos apresenta um alto índice de desigualdade”. O autor explica
que “existem pessoas na miséria passando por toda sorte de necessidade (para sobrevivência). Do outro lado existem pessoas vivendo com fartura e abundância de recursos, ou
seja, possuem mais do que o necessário”. Comblin (1991, p.121) entende que:

[1 ] “Estes termos são correlativos. Uns estão na necessidade, na penúria, em comparação com outros que estão na abundância, com excessos ou excedente, isto é, têm supérfluo.
Paulo não diz que uns tem supérfluo porque outros passam necessidade”;

[ 2 ] “Uns estão na penúria, não têm os bens necessários e sofrem por isso no seu corpo. Outros têm mais do que o necessário”;

[3 ] “O necessário é o que faz falta, os bens de que se sente a falta (“hysterema”), o excedente é aquilo de que não se sente a falta (“perisseuma”). Paulo apresenta os temas como
correlativos (cf 8,13.14; 9,12)”.

Pobreza e Riqueza:
Silva (2014, p.124) comenta que “ricos e pobres são a concretização do que passa necessidade (pobre) e do que tem em excesso (rico). Pobreza e Riqueza não devem ser
espiritualizadas, se trata de algo material”. Para o autor, “os pobres carecem do mínimo necessário para sobrevivência. A pobreza material é o grande desafio da prática e da
mensagem cristã. Os ricos, por sua vez, têm em excesso e são desafiados a partilhar” Comblin (1991, pp.122-125) lembra que:

[1 ] “O conceito de direito dos pobres vem do judaísmo. As leis de Israel contêm, nos seus diversos códigos, medidas para proteger os pobres contra a voracidade dos ricos. [...] O
sentido fundamental da pobreza é material”;

[2 ] “Os pobres são os que carecem do necessário. [...] Longe de ser indiferente ao cristianismo, a condição de pobreza material desempenha um papel central. A pobreza é o grande
desafio ao responde a mensagem cristã”;

3 ] “Não se trata apenas de uma pobreza de virtudes ou de boas ações. Os macedônios são pobres de bens materiais e não de bens espirituais. Da mesma maneira os apóstolos, aos
[

quais Paulo se refere em 6,10, são pobres materialmente”;

Igualdade:
Para Silva (2014, p.124) “o desafio da coleta e do serviço aos pobres é pela igualdade”. O autor entende que

Paulo traz esse tema à tona baseado nas raízes tribais (período de entrada do povo de Deus na terra prometida). Esse período histórico entre o povo de Deus é uma
resposta obediente ao que previa o código da aliança. Com o advento da monarquia esse princípio se perdeu em meio às imposições políticas do palácio. Os profetas
entraram, então, em cena denunciando a desigualdade que se estabelecia rapidamente entre o povo de Deus. Paulo, então, assume nesses textos sua identidade
profética reivindicando que os termos da aliança (também vistos na mensagem do reino de Deus) fossem retomados e a desigualdade amenizada.

Para Comblin (1991, pp.125-128):

[1 ] “Recorrendo à palavra grega “igualdade” (“isotes”), Paulo ia ao encontro do pensamento grego naquilo que tinha de mais original. [...] O conceito grego, porém, era bastante
limitado”;

[2 ] “Os gregos defendiam a igualdade dos cidadãos dentro da cidade. [...] Não havia igualdade para os estrangeiros, nem para os escravos, nem para as mulheres, nem para as
crianças. A igualdade favorecia uma minoria dos habitantes”;

[3 ] “Paulo parte do conceito bíblico de igualdade. Na Bíblia, não se acha formulado de modo abstrato o princípio de igualdade. [...] A igualdade bíblica era antes de mais nada uma
igualdade econômica, uma igualdade na distribuição dos bens e no gozo dos bens materiais”;

[ 4 ] “A igualdade de Israel estava estreitamente ligada a uma fraternidade: esta fraternidade vinha da consciência de pertencer a uma só família”;

[5 ] “A ideia de Paulo seria estender a igualdade e a fraternidade a todas as comunidades cristãs. [...] Ao introduzir a famosa palavra grega “igualdade”, Paulo está bem consciente de
que lhe está dando um conteúdo novo”;

[6 ] “Como inculcar nos coríntios a capacidade de sentir uma necessidade de igualdade entre todos os cristãos, gregos ou judeus, simplesmente pelo fato de viverem uma fé comum
em Cristo?”;

Suficiência:
Para Silva (2014, p.125) a pergunta que deve ser considerada é: “Qual é a referência de igualdade proposta por Paulo?” O autor prossegue: “O fim da pobreza e o desafio da
igualdade não significam assumir metas e discursos de prosperidade. Antes, de proporcionar o mínimo suficiente para uma vida digna”. Silva defende que “nesse ponto, Paulo é o
próprio referencial. Ele abriu mão de qualquer recurso excedente ao mínimo necessário para sua própria sobrevivência, sem precisar se tornar um peso para os que contribuíam
com seu ministério”. Comblin (1991, pp.128-129) explica que:

[1 ] “Recorrendo à palavra grega “igualdade” (“isotes”), Paulo ia ao encontro do pensamento grego naquilo que tinha de mais original. [...] O conceito grego, porém, era bastante
limitado”;

[2 ] “Há, porém, muita diferença entre a autarkeia dos filósofos e o ideal de Paulo. Na mente dos filósofos gregos, a suficiência consiste em não depender de nada e de ninguém. Ser
suficiente ou auto-suficiente é ter tudo em si mesmo”;

[3 ] “O conceito paulino de suficiência é bem diferente. [...] O ideal de suficiência é visto do ponto de vista do sujeito. O sujeito que se contenta com a suficiência estará disposto a
colocar todo o seu supérfluo à disposição da igualdade”.

Comunidade:
Silva (2014, p.125) lembra que “através da obra de Cristo vivemos agora em comunhão uns com os outros. Ou seja, através do estabelecimento da Igreja surge necessariamente a
vida comunitária”. Isso indica que “a vida do próximo passa a ter repercussões diretas em minha própria vida. Isso se aplica em todas as áreas da vida em comunidade, inclusive nas
questões materiais”. Para o autor, portanto, “o desafio que Paulo lança à Igreja de Corinto está baseado em um princípio chave da própria identidade da Igreja: a vida comunitária. A
coleta é a manifestação de uma forma concreta de comunhão”. Comblin (1991, pp.129-130) destaca que:

[ 1 ] “Comunidade ou comunhão (“koinonia”) é outro conceito paulino fundamental. Também procede da cultura grega”;

[2 ] “De novo Paulo coloca numa palavra grega, carregada de sentido e de cultura, um conceito novo, inspirado na tradição bíblica e na própria experiência da vida das
comunidades”;

[3 ] “A “koinonia” tornou-se, no pensamento de Paulo, um elemento chave. Paulo adotou esse conceito tão significativo da filosofia grega, dando-lhe outro conteúdo. Os filósofos
falam de uma comunidade ideal, mas não entram na prática”;

[4 ] “O que interessa a Paulo é a prática. Ora, a prática não pode ser um ideal. [...] A palavra tem esse sentido nas epístolas, pois a comunidade visada por Paulo não é apenas
comunidade de pensamentos ou de sentimentos, mas comunidade material”.

Caridade:
Conforme Silva (2014, p.125) “a comunidade é a expressão visível da caridade (amor)”. Portanto, prossegue ele,

A caridade é a ação que moveu o coração de Deus em nossa direção. Paulo, então, desafia a Igreja de Corinto a firmar um tipo de relação com o próximo a ponto de
mover suas próprias vidas em direção ao outro com gestos concretos de solidariedade. A caridade é a resposta mais coerente de alguém que foi alcançado, também, por
caridade.

Comblin (1991, p.132) ressalta que:

[ 1 ] [1] “A comunidade manifesta a presença ativa da “caridade”. Esta palavra caridade é a tradução tradicional do grego “ágape”;

[2 ] [2] “Esta palavra grega expressa ao mesmo tempo o amor de misericórdia, de perdão e de fidelidade de Deus para com seu povo, o amor do povo para com Deus e o amor de
solidariedade que une como irmãos os membros do povo”;

Disponibilidade
Para Silva (2014, p.125), “disponibilidade é uma condição recomendado por Jesus para que alguém se torne um discípulo. A disponibilidade no conceito paulino se aproxima muito
do desprendimento e desprendimento material”. O autor explica que: “trata-se da capacidade – daqueles que já superaram as coisas desse mundo – de colocar os recursos recebidos
a disposição dos necessitados. Sem disponibilidade/desprendimento tudo que vimos anteriormente pode ficar comprometido”. Comblin (1991, p.133) ressalta que:

[1 ] “O sétimo conceito paulino referido à doutrina social é a “disponibilidade” (“haplotes”). O sentido fundamental da palavra grega é a simplicidade, autenticidade, pureza de
coração”;

[ 2 ] “A sabedoria do Antigo Testamento exalta esta disposição. Nos Evangelhos, Jesus recomenda-a como condição para ser um discípulo (Mt 6,22)”;

[ 3 ] “Os conceitos paulinos referem-se aos sujeitos comprometidos com uma sociedade nova, sem separar o modelo de sociedade dos sujeitos que são chamados a realizá-la”;

[4 ] “Paulo também não procura apenas fabricar almas bonitas e virtuosas, sem mudança na sociedade. Ele quer promover sujeitos históricos, autores de um mundo novo, onde
sujeito e objeto são uma só força em movimento”.

REFERÊNCIAS

COMBLIN, José. Segunda epístola aos Coríntios. Petrópolis: Vozes, 1991.

SILVA, Flávio Henrique de Oliveira. In SILVA, Flávio Henrique de Oliveira; PROENÇA, Wander de Lara. Introdução ao Novo Testamento. Londrina: FTSA, 2014.

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Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi

C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ . Núcleo de Educação

a Distância; SILVA , Flávio Henrique de.

Cartas Paulinas. Flávio Henrique de Oliveira Silva

Maringá-Pr.: UniCesumar, 2017.

34 p.

“Pós-graduação Universo - EaD”.

1. Cartas. 2. Paulinas. 3. EaD. I. Título.

CDD - 22 ed. 200

CIP - NBR 12899 - AACR/2

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CARTAS DA PRISÃO E CARTAS


PASTORAIS

Professor (a) :

Me. Flávio Henrique de Oliveira Silva

Objetivos de aprendizagem
• Compreender alguns dos principais aspectos contextuais e teológicos das cartas de Paulo aos Filipenses e a Filemon;

• Compreender alguns dos principais aspectos contextuais e teológicos das cartas de Paulo aos Colossenses e aos Efésios;

• Compreender alguns dos principais aspectos contextuais e teológicos das cartas pastorais, com ênfase na primeira carta a Timóteo;

Plano de estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Cartas da Prisão: Filipenses e Filemon

• Cartas da Prisão: Colossense e Efésios

• Cartas Pastorais: Tito e Timóteo

Introdução
Neste estudo trataremos das cartas de Paulo conhecidas como “cartas da prisão”. Entre estas, começaremos com a carta aos filipenses, escrita de uma prisão em Éfeso ou Roma.
Ainda que escrita em um contexto desfavorável a carta ficou conhecida como carta da alegria. Veremos no decorrer de nossos estudos que as circunstâncias que motivaram Paulo a
escrever a carta passavam pela legitimação de sua autoridade e pelo cuidado do apóstolo com a comunidade que estava exposta a “outros pregadores”, pregando um evangelho
falso. Em seguida, nossa atenção se voltará para a carta de Paulo a Filemon. Nesta carta, o apóstolo precisou lidar com a tensão entre Filemon, líder de uma Igreja doméstica, e
Onésimo, um escravo de Filemon que havia sido evangelizado por Paulo.

Na sequência, observando ainda as cartas que foram escritas da prisão, veremos que a carta aos colossenses foi escrita a partir de uma situação de conflito gerada por uma corrente
de pensamento, ou filosofia, da época. A comunidade corria sérios riscos de ser influenciada por esse movimento e de colocar a perder o que já havia aprendido acerca do
Evangelho. Já a carta aos efésios, última do bloco de cartas conhecidas como cartas da prisão, nota-se uma atenção especial de Paulo com as questões eclesiológicas. Por isso, então,
sua ênfase em temas como: A unidade da Igreja; o mistério da Igreja; a Igreja como corpo único; a Igreja como um edifício, cuja pedra angular é Cristo; a Igreja como sinal de uma
humanidade renovada; a Igreja como esposa de Cristo; a Igreja e o Espírito.

Por fim, depois de passar pelas cartas da prisão, nosso foco recairá sobre as cartas pastorais: Tito e Timóteo. Elas são assim conhecidas por conta de seus destinatários e também
por seu conteúdo. Neste estudo, daremos um pouco mais de ênfase a primeira carta a Timóteo. Assim como na carta aos efésios, nota-se nesta carta certo destaque para as
questões da Igreja (eclesiologia). Em 1Tm 3,14-15, um dos textos centrais da carta segundo indicam alguns estudiosos, três características/qualificações foram determinantes: (1)
casa de Deus; (2) Igreja do Deus vivo; (3) coluna e baluarte da verdade.

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CARTAS DA PRISÃO: Filipensese Filemom

Carta de Paulo aos Filipenses


Filipos estava situada na Macedônia e havia sido fundada por volta de 358 a.C., por Filipe II (rei da Macedônia naquela época), pai de Alexandre, o Grande. A cidade era reconhecida
por sua localização privilegiada: terras férteis, minas de ouro e prata e estradas que facilitavam o comércio são algumas de suas características. Tudo isso despertou o interesse do
Império romano na época de sua expansão; o que os levou a conquistarem a Macedônia por volta de 168 d.C., e, claro, explorarem toda a riqueza da região. Historiadores contam
que uma das primeiras ações dos novos proprietários foi dividir o território em quatro distritos políticos. Filipos, conforme conta Mazzarolo (2011, p.10), “que décadas antes
ocupava um lugar destacado em virtude de suas jazidas de ouro, agora, com as minas exauridas, não passava de um simples vilarejo”. Com o passar dos anos Filipos se tornou colônia
romana, abrigando soldados aposentados. Em certo sentido esse novo status garantiu alguns privilégios à região, por outro lado, para os antigos moradores, o ambiente continuava
desfavorável. Quanto ao aspecto religioso, Proença (2011, p.16) destaca a presença do sincretismo e conta que

Pelo fato de possuir uma população heterogênea, os cultos eram diversos: culto imperial, cultos indígenas (trácios), gregos, itálicos, anatólios, sírios,
egípcios, dentre outros. Também estava presente ali um pequeno núcleo judeu, que, com seu monoteísmo estrito, desempenhava modesto papel.

A Igreja em Filipos foi a primeira comunidade cristã em solos Europeus. Boring (2015, p.363) conta que “a história de sua fundação é anedótica, mas fidedignamente recontada em
At 16,16-40: Paulo, Silas e Timóteo são guiados pelo Espírito a Filipos, onde eles pregam, batizam e fundam uma nova comunidade cristã”. O autor destaca ainda que “Lídia, uma
temente a Deus (ou talvez uma judia), torna-se a primeira conversa e a líder de uma Igreja doméstica (At 16, 14-15,40). Paulo e Silas entram em conflito com as autoridades, são
açoitados e aprisionados”. Na prisão, conforme relatam alguns textos bíblicos citados por Boring, “acontece um terremoto e a conversão do carcereiro romano juntamente com sua
família (At 16,25-34). [...] Durante a visita que Paulo fez para fundar a Igreja e depois de sua partida, a Igreja desenvolveu diversos líderes”. Daí, ao que tudo indica, os primeiros
passos da comunidade.

Ainda sobre a Igreja, é interessante notar sua condição socioeconômica. Para Proença (2001, p.17) “o texto de 2 Cor. 8:2-4 pode oferecer, de forma indireta, algumas informações”.
Vejamos os comentários do autor sobre o texto: “falando sobre a contribuição das Igrejas da Macedônia aos cristãos necessitados de Jerusalém, Paulo diz que assim fizeram apesar
de sua “extrema pobreza”. Entre tais Igrejas estava, certamente, a de Filipos”. Seguindo pela argumentação de Proença encontramos a contribuição de Comblin, “acrescentando que
a expressão “segundo os seus meios” (v.3), poderia insinuar que os meios eram limitados”. A conclusão de Comblin, portanto, é de que “deram generosamente, mas a generosidade
deles era generosidade de pobres. O que deram era muita coisa para eles, ainda que objetivamente poderia parecer pouco, por exemplo, comparado com as possibilidades dos
coríntios”. Por fim, para Proença

É digna de nota esta generosidade da comunidade de Filipos. Com outros macedônios os filipenses se anteciparam aos coríntios, por exemplo, na
entrega da contribuição aos necessitados da Judéia (2Cor. 9:2-4). Também manifestaram sua generosidade para com o próprio Apóstolo Paulo (Fp.
4:16). Tais atitudes demonstram que mesmo não possuindo grande abastança, os filipenses eram solidários e ajudavam frequentemente aos
necessitados (PROENÇA, 2001, p.17).

Houveram momentos em que estes valores, próprios da identidade da comunidade, estavam sendo negligenciados. Proença (2001, p.28) explica que eles estavam “deixando de lado
os valores do serviço, da humildade e do amor fraternal”. Nesse caso, justifica-se as exortações feitas por Paulo em Fp. 2,3-7a.

• “Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo” (v.3);

• “Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros” (v.4);

• “Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus (v.5): não julgou como usurpação o ser igual a Deus (v.6); a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de
servo” (v.7a).

Ao comentar o tema Proença (2001, p.28) entende que “é objetivo do apóstolo mostrar que não se chega à glória sem o serviço, sem a humildade e a obediência. Foi este o caminho
percorrido por Cristo”. Ele destaca ainda que “a igreja deveria caminhar, segundo o apóstolo, dentro dos parâmetros de tal caminho, para que realize de maneira fidedigna a tarefa
de continuação que lhe fora confiada”. Por fim, destaca o autor, “a igreja é ao mesmo tempo fruto e instrumento da missão de Cristo. Em síntese, Paulo deseja mostrar à igreja que o
caminho que conduz à glória e à vida passa necessariamente pela cruz”. A cruz, aliás, é o centro da mensagem da carta, conforme veremos mais a frente.

Quanto à carta, conforme explica Boring (2015, p.363), “tradicionalmente, Filipenses tem sido incluída nas quatro Epístolas da Prisão, escrita em Roma, no último período da vida de
Paulo (At 28)”. Para alguns estudiosos, Paulo teria escrito a carta da prisão, mas em Éfeso e não em Roma. Existem bons argumentos tanto de um lado como do outro, mas
preferimos apenas mencionar a existência da discussão sem entrar em seus detalhes. Outra hipótese interessante é a de que outras cartas foram escritas aos Filipenses antes da
carta que temos em nossas bíblias. Um dos argumentos em favor desta suposição é, segundo o próprio Boring (2015, p.371), a “referência em 3,1 a “escrevendo as mesmas coisas””.
Há certo consenso entre os estudiosos de que dois temas, amizade e alegria, dão certo tom à carta. Para Mazzarolo (2011, p.13),

A amizade marca profundamente o texto de Filipenses por conferir aos cristãos de Filipos um lugar de proximidade com o Apóstolo. Eles não apenas
são parceiros de jornada, mas estão em situação semelhante de sofrimento, de marginalização e dificuldade para continuar como cristãos.

A alegria é outra nota marcante, pois, não obstante o sofrimento gerado pelo constrangimento da prisão, havia ainda o “sorriso sarcástico” dos seus
opositores. Com isso, ele insiste na alegria para superar toda a tentação de ódio ou rancor contra os rivais. Alegrai-vos no Senhor, todos, novamente
eu digo, alegrai-vos (4,4)!

A carta nasceu, entre outros motivos, como reação ao problema de autoridade e liderança que Paulo estava enfrentando, especialmente com os “outros pregadores”. Isto é, Paulo
estava preocupado com os filipenses, segundo Comblin (1992, p.15), achando que “poderiam ser perturbados por pregadores vindos de outras regiões pregando um Evangelho que
ele acha falso”. Proença (2001, p.19) explica que:

Em Filipos Paulo possui adversários. São provavelmente missionários judeu- -cristãos. Paulo os denomina como “inimigos da cruz de Cristo” (3:18).
São cristãos judaizantes que querem manter uma parte do sistema judaico, e desse modo destroem o sentido total e absoluto da salvação por meio
da graça em Jesus Cristo. São cristãos peregrinos que andam percorrendo as comunidades, como que defendendo ainda os privilégios dos judeus,
buscando apoio na antiga Lei de Israel como se ela fosse também necessária, e como se Cristo não bastasse.

Daí, então, a proposição de Comblin (1992, p.15) de que o tema da epístola é “o problema da autoridade apostólica”. O autor argumenta que a “tese de Paulo é que o fundamento da
autoridade do evangelizador está no próprio Evangelho. [...] Se o apóstolo prega um Evangelho falso, não é verdadeiro apóstolo, mas um “cão”, um “mau operário” (3,2)””. Já que o
Evangelho é, então, o paradigma para o ministério apostólico, coube a Paulo trabalhar na carta o significado do “verdadeiro Evangelho”. Desse modo, diz Comblin, “o tema da
epístola é a definição do verdadeiro Evangelho”. O Evangelho é, portanto, “o tema da epístola, a palavra-chave (1,5.7.12.16.18.27b; 2,22; 4,3.15)”. Sigo com Comblin, para quem “o
sinal fundamental do Evangelho, o que permite fazer a distinção entre falso e verdadeiro Evangelho, é a cruz”. Em síntese, diz ele: (1) “o Evangelho de Jesus Cristo está centrado na
cruz”; (2) “o Evangelho que não coloca a cruz no seu centro, não é o Evangelho de Jesus Cristo”; (3) “Os evangelizadores que Paulo recusa são os que não põem a cruz no centro de
sua mensagem”. À luz da carta aos Filipenses, Comblin (1992, pp.16-18) propõe quatro elementos que nos ajudam na compreensão (sentido e conteúdo) deste “Evangelho da cruz
de Cristo”. Vejamos:
a.“Em primeiro lugar, o Evangelho da cruz proclama que não existe outro meio de salvação a não ser a cruz de Cristo”. Portanto, diz o autor, “anunciar a cruz nega todos os outros
meios de salvação. [...] Por exemplo, anunciar a cruz de Cristo é excluir a necessidade da Lei dos judeus ou da circuncisão.

b. “Em segundo lugar a cruz simboliza o caminho da libertação”. A crítica de Paulo aos inimigos da cruz, neste ponto, é porque buscam meios de valorização da força, espaços de
poder, confiança nas promessas de segurança terrena, visibilidade e afirmação, posses e bens. Na contramão, defende Comblin,

Jesus renunciou a todos os privilégios e a todos os poderes que lhe davam uma superioridade. Não quis nada para si próprio e tornou-se o servidor
radical. Jesus renunciou aos direitos de Deus, aos direitos de um homem livre, ao direito à vida e até ao direito de morrer como membro do seu povo.
A cruz significa tudo isso, o esvaziamento de todo valor e de todo poder. A cruz significa a condição de escravo condenado injustamente e expulso do
seu povo para morrer como um reprovado, visivelmente rejeitado. [...] O caminho de Cristo é o caminho da pobreza, do sentimento de incapacidade,
da ausência de poder. A cruz quer dizer não ter apego a nenhuma superioridade pessoal, aceitar o esvaziamento de si próprio que o Apóstolo quis
assumir seguindo Jesus (COMBLIN, 1992, pp. 16-18).

c. “O Evangelho da cruz é o esvaziamento da perseguição, da prisão, da morte, e até do opróbrio da morte crucificada, que é a morte de um herege, de um excomungado”.

• “Paulo prega a cruz de Cristo, porque está sendo perseguido, preso, sob ameaça de morte, mas está disposto a aceitar essa morte por Cristo e com Cristo (1,7.20-23; 3,10)”;

• “Quem prega um Evangelho que não inclui o perigo de prisão e de morte, não prega o Evangelho da cruz. Um Evangelho que encontra o favor dos homens e o bom acolhimento das
autoridades não pode ser o Evangelho da cruz”;

d. “Por fim, a cruz de Cristo significa também o serviço aos homens”.

Jesus escolheu a condição de escravo, isto é, de homem obediente que serve os outros, não trabalha pelo seu bem e sim pelo bem dos outros. O
Evangelho da cruz é a pregação que pede o serviço aos homens, a aceitação da condição de escravo voluntário pelo bem dos outros. [...] Por isso
Paulo não quer nada para si mesmo. Somente quer o bem da comunidade. Está a serviço da unidade da comunidade porque nada quer para si próprio
(1,1; 2,1-4; 1,7; 4,2-3).

CARTA DE PAULO a Filemom


Não é difícil imaginar que a carta de Paulo a Filemom é a menor carta escrita pelo apóstolo (aproximadamente 340 palavras). Filemon (“amoroso”) era líder de uma Igreja doméstica
que se reunia em sua própria casa (Fm 2) em Colossos (ou em seus arredores), cidade onde residia. Paulo se refere a Filemon como Koinonós , “irmão na fé”, e pelas informações do
texto da carta, é possível imaginar que Filemon ouviu o Evangelho através da pregação do próprio apóstolo: “É claro que não preciso fazer você se lembrar de que também você me
deve a própria vida” (Fm 19).

Entre os estudiosos existe certa divergência a respeito do local da composição: Roma, Cesaréia ou Éfeso. Sabe-se que foi escrita ao mesmo tempo que a carta ao Colossenses, isto
por volta de 56,57 d.C. O motivo da carta, chamada por alguns de bilhete, é Onésimo. Escravo de Filemon, Onésimo havia causado prejuízos; alguns estudiosos defendem que ele
roubou seu senhor e depois fugiu. Onésimo, teve contato com Paulo, de quem ouviu a respeito do Evangelho (Fm 10). Pela leitura da carta nota-se que ele passou a servir o apóstolo
Paulo,

mas este o persuadiu a realizar o perigoso ato de voltar, voluntariamente para a casa do seu senhor. Paulo, então, escreve a Filemon com a finalidade
de rogar perdão para o escravo, e ao mesmo tempo assegurar-lhe de que seria recebido como irmão de fé. Paulo também recomenda Onésimo a toda
a igreja (Cl 4:9) – (SILVA, 2014, p. 135).

Brown (2004, p.666) destaca o fato de que Paulo “escreveu como prisioneiro, ou seja, alguém que sacrificou sua liberdade por Cristo”. Daí, então, seu apelo “para a liberdade de
outrem, e em cada linha, bem abaixo da superfície, está o questionamento fundamental do status social de senhor e escravo apresentado pela mudança de relacionamento
introduzida pelo Evangelho”. Perondi (pp.43-44), por sua vez, aponta o versículo 11 e tenta nos mostrar que “Paulo joga com o nome Onésimo (do grego “útil”) e alude aos serviços
que Onésimo lhe tinha prestado”. Para o autor, “Paulo não pede explicitamente a alforria de Onésimo, mas que Filemon perdoe a Onésimo por qualquer ofensa que ele tenha feito e
que o receba como irmão, não como escravo”. O apelo, portanto, diz Perondi, “não ataca diretamente a instituição da escravatura, mas cria uma atmosfera em que seria difícil a
sobrevivência da mesma. É uma carta que levanta muitas perguntas, algumas das quais ficam sem resposta”.

Antes de seguirmos em frente, vale a pena abrir um parêntese para algumas breves anotações sobre o contexto escravagista, já que o tema está posto como pano de fundo na carta.
Sabe-se que nos dias de Paulo, conforme explica Guarinello (1994, p.47), “desenvolveu-se em Roma a produção mercantil, baseada na utilização de mão-de-obra escrava em larga
escala. O modo de produção escravista como sistema produtivo dominante foi possibilitado e favorecido pela expansão imperialista”. Funari (2011, p.96) conta que

Com o desenrolar das conquistas, Roma passou a basear grande parte de sua economia no trabalho escravo. Os escravos eram fundamentalmente
prisioneiros de guerra, o que obrigava os governantes a se empenharem, constantemente, na conquista de novos territórios e povos. [...] Os cidadãos
ricos passaram a possuir centenas e por vezes milhares de escravos. Os grandes proprietários exploravam o trabalho escravo em seus domínios.

Além da escravidão em si, os que estavam nessa situação sofriam toda sorte de rejeição e discriminação por parte da sociedade e da religião. Wegner (1988, p.59), comenta que
“para os judeus o termo escravo consistia numa das piores infâmias que alguém podia falar a outra pessoa; havia até um ditado que dizia: ‘mais honrado que um escravo é um
cachorro’”. Qual seria, então, a resposta cristã a esta situação? Perondi (pp.43-44) defende a tese de que “Paulo seguramente sabia que as comunidades cristãs ainda eram pequenas
dentro do grande império. Elas ainda não tinham força para derrotar um sistema. Se não se podia mudar o grande, devia-se atuar no micro”. Para o autor é “aqui que a carta a
Filemon tem sua grande mensagem. Não importa ainda a mudança social, mas a maneira do relacionamento entre os membros da comunidade”. Depois da carta, diz ele, “torna-se
difícil que duas pessoas possam ser verdadeiramente irmãos se existe entre eles a divisão “patrão-escravo”. Paulo pede a Filemon que receba Onésimo “não mais como escravo...
mas como um irmão caríssimo” (vv.15-16)”.

Muito bem, para terminar nossa aula, a primeira desta unidade, é importante notar alguns breves apontamentos a respeito da relevância e dos aspectos teológicos da carta (SILVA,
2014). Relevância da Epístola: (1) “Consiste num magnífico testemunho do que o Evangelho faz”; (2) “Revela a prática pastoral e a doutrina de Paulo”; (3) “Averigua a verdade e a
força do Evangelho”; (4) “Mostra a preocupação da Igreja quanto à escravidão que imperava no mundo antigo”. Aspectos Teológicos Doutrinários: (1) “Proclamação da liberdade em
Cristo”; (2) “Criação de um mundo novo, de uma nova sociedade (novas relações, não mais de dominação)”; (3) “A igualdade em Cristo (não há mais distinções...”; (4) “O perdão das
dívidas”.
O Hino Cristológico - Fp 2,5-11

Na comunidade de Filipos estava ocorrendo a penetração de ensinos religiosos opostos ao ensino de Paulo. Tais ensinos, do tipo judaico, falavam
provavelmente sobre os poderes do mundo. A comunidade é, portanto, estimulada a enfrentar com perseverança e com júbilo os poderes da
dominação (= poderes da ideologia religiosa e do poder político imperialista). Diante desta realidade, o conteúdo do hino exerce função social na
comunidade. Impulsiona os cristãos a celebrarem publicamente o senhorio de Jesus Cristo sobre as forças do mundo e da sociedade. O Kyrios não é
o imperador. É Jesus de Nazaré, morto e ressuscitado. O hino, portanto, exprime e traduz o conteúdo teológico da fé cristã. Jesus Cristo é o único
Senhor. Ele está acima de todos os poderes cósmicos e políticos. Assim, a fé no ressuscitado exerce um fator de dessacralização e demitização deste
aspecto cósmico misterioso das forças do mundo e da história. Esta fé mostra de maneira aguda e radical a relatividade dos poderes políticos,
colocando em evidência a oposição entre Jesus ressuscitado e o imperador, e entre Jesus ressuscitado e os poderes políticos dominantes.

Fonte: PROENÇA (2001, p.20).

CARTAS DA PRISÃO: Colossenses e Eféseos

Carta de Paulo aos Colossenses


Relatos históricos descrevem Colossos como uma cidade da Frígia, vizinha de Laodicéia e Hierápolis. Ela se destacava pela sua beleza e riqueza, graças ao comércio forte e a sua
localização privilegiada. Por lá passavam rotas comerciais importantes ligando Colossos a Éfeso e Tarso, por exemplo. Todavia, com o passar dos anos, a cidade passou por um sério
declínio. Nos dias do apóstolo Paulo, Laodicéia assumiu o posto de cidade mais importante da região. A realidade de Colossos era oposta e um de seus adjetivos mais comuns, entres
os estudiosos, passou a ser a insignificância (referência ao seu tamanho, capacidade comercial e importância em relação às cidades vizinhas). Por volta de 61 d.C. Colossos foi
assolada por um terremoto e os relatos desta catástrofe indicam que a cidade foi praticamente destruída.

Entre a população, tanto de Colossos como também das cidades vizinhas, havia uma colônia de judeus. Eles gozavam de certos privilégios, entre estes, claro, o de guardar o sábado e
o de seguir outros preceitos de sua religião. Esse grupo, certamente tinha contato com os novos convertidos ao Evangelho, um grupo composto principalmente por ex-pagãos e
talvez por poucos antigos seguidores do judaísmo. Essa possível relação parece estar confirmada na carta, pois, conforme Comblin (1986, p.10), “parece insinuar que algumas ideias
procedentes de grupos judaicos circulavam na comunidade”.

A sugestão de uma comunidade composta predominantemente por gentios aparece ao longo da carta (1,21; 1,27; 2,13). Vielhauer (2005, p.223) chama nossa atenção para o
“estado de fé” da comunidade e este foi elogiado por Paulo. Aliás, não apenas a fé, mas também amor e esperança. Já no início da carta (Cl 1,3-6a) o apóstolo destaca esta tríade já
conhecida nas cartas aos tessalonicenses e aos coríntios. Estou de acordo com Dettwiler (2015, p.339), para quem começar a carta destacando tais virtudes é “lembrar à
comunidade destinatária os seus inícios e o fundamento teológico de sua identidade cristã”. Mas quais seriam os motivos para essa lembrança? Conforme percebeu Vielhauer (2005,
p.223), “eles, como também os irmãos na fé em Laodicéia e Hierápolis, estão ameaçados por falsa doutrina que Epafras tentara combater com energia (4.13), mas que acabou
apelando ao apóstolo, pedindo ajuda (1.7s; 4.12s)”.

Entre as questões que envolvem a carta aos Colossenses, uma das principais discussões diz respeito à sua autoria. Não temos tempo suficiente para abordar cada hipótese e, por
isso, optamos pela suposição mais comum. Para esta escola, conforme Boring (2015, p.14), Paulo escreveu aos Colossenses. Trata-se de “uma igreja que ele não fundou diretamente,
mas que começou a partir da atividade missionária Epafras, um cooperador. Paulo escreveu como prisioneiro (4,3.10), mas não está claro se a prisão é em Roma, Éfeso ou outro
lugar”. Dettwiler (2015, p.339) explica que “Colossenses é uma carta de circunstância que, muito provavelmente, revela uma situação conflituosa específica. O escrito tem por
finalidade imunizar a comunidade destinatária contra uma corrente de pensamento, ou filosofia da época (Cl 2,8).

Para a maioria dos estudiosos não é tarefa fácil identificar o conteúdo da chamada filosofia. Em linhas gerais, conforme descreve Perondi (pp.29-30), “se entendia por filosofia
qualquer doutrina, mesmo religiosa, sobre o mundo e a vida”. O autor destaca, ainda, o fato de não termos informações “se Paulo tinha ou não elementos suficientes para saber
exatamente o conteúdo dessa doutrina”, já que “as alusões na carta são muito vagas”. Ainda assim, Perondi propõe três características sobre a tal “filosofia” e destaca a maneira
como Paulo teria reagido a ela. Vejamos:

• “Em primeiro lugar, nota-se um certo influxo de correntes judaizantes. Não se trata do judaísmo que Paulo combate energicamente em Gálatas e Romanos. Mas um resquício de
judaísmo misturado com ideias de outras religiões pagãs”;

Paulo faz apenas uma menção à circuncisão (2,11-13). Talvez esses “filósofos” pregassem a circuncisão, porém sem dar-lhe importância para a
salvação como faziam os judaizantes. Pregavam a observância de festas anuais, mensais e dos sábados (2,16); a rígida abstinência de alimentos
(2,16.20-22) - (PERONDI, pp.29-30).

• “Davam grande importância às “potências”, isto é, a seres celestes que estariam associados aos astros e que exerciam um certo papel sobre o mundo”;

Paulo fala de “elementos do mundo” (Cl 2,8) de culto dos anjos (2,18), de “tronos, dominações, principados e potestades” (2,10.15). Esses seres
aparecem como mediadores entre Deus e os homens, religando a segundo plano a mediação de Cristo. Nesses elementos todos, vislumbra-se uma
clara influência das religiões de mistério, tão em voga na época - (PERONDI, pp.29-30).

• “Um terceiro elemento parece provir de uma espécie de “gnosis”, pois se ressalta a importância do “conhecimento”. Não se sabe qual o conteúdo desse conhecimento. Porém,
através dele, se tinha acesso a um mundo superior”.

Sigo em diálogo com Perondi (pp.32-33), na tentativa, agora, de perceber alguns aspectos teológicos centrais na carta – muito embora alguns destes aspectos já estejam presentes
nos parágrafos anteriores. Já vimos anteriormente que Colossenses é uma carta circunstancial, preocupada com questões pontuais que estavam tomando a comunidade e, em certo
sentido, distorcendo o que já haviam aprendido acerca do Evangelho.

• (1) “Uma excessiva importância era dada ao culto das potências angelicais”. O autor de Colossenses lembra que Deus, no seu plano salvífico, assegurou a Cristo uma tarefa
importante”: Perondi aponta três características do “ser-agir” de Cristo:

• “Ele é o mediador da criação (1,15); mediante o seu sangue derramado reconciliou toda a humanidade com Deus”;

• “Cristo é a “cabeça do corpo que é a Igreja” (1,18.24), e em modo diverso é também o chefe das potências celestes (2,10)”;

• “Aprouve a Deus, em Cristo, fazer habitar toda a Plenitude (1,19) para poder comunicar aos fiéis “a Plenitude da divindade” que habita em Cristo plenamente (2,9-10), garantindo
assim plena dignidade a todos os batizados”.

• (2) “Através da obra de Cristo os fiéis são libertados do poder das trevas e obtém a remissão dos pecados (1,13-14). Assim os fiéis são reconciliados com Deus e com todo o
universo (1,20)”. A partir de então, destaca Perondi, é possível, por meio do batismo, “despojar-se do homem velho e revestir- -se do homem novo”.

• (3) “Os batizados passam a fazer parte da Igreja “corpo de Cristo”, onde não há mais divisões (3,11)”. A Igreja é, portanto, “a unidade de todos os seus membros”. Além disso, afirma
Perondi, “ela continua a ser de caráter local (4,15), mas assumindo uma dimensão universal, pois através dela e por meio dela Cristo realiza desde agora seu senhorio cósmico”.

• (4) “A adesão a Cristo e a Igreja dá origem ao conhecimento da vontade Deus e de levar uma vida santa, que se distingue pela prática do amor fraterno e das virtudes (3,12-15)”. À
luz deste princípio, “seja nos deveres familiares ou sociais, maridos, mulheres, pais, filhos, patrões, servos... todos são chamados a um relacionamento novo e fraterno”, diz o autor.
Você notou a centralidade de Cristo em cada um dos aspectos abordados? Muito bem! Como destacou Zuck (2008, p.336), “a cristologia é o cerne teológico de Colossenses”. Para o
autor é o que “leva à formação de uma nova comunidade, cujo compromisso de amor, de conhecimento, de sabedoria e união deve permitir que os seguidores de Cristo ajam contra
a falsa doutrina”. A “falsa doutrina” a que se refere o autor é “a filosofia” que estudamos nos parágrafos anteriores.

CARTA DE PAULO aos Efésios


Por volta de 129 a.C. Éfeso foi conquistada pelos romanos e tornando-se a capital e a principal cidade da Ásia menor. Era identificada como uma cidade próspera cujas principais
fontes de renda eram o comércio e o turismo. Destacava-se também por ser uma cidade extremamente religiosa, aliando, inclusive, religião-turismo-comércio. Como exemplo, vale
mencionar o santuário dedicado à uma divindade feminina, simbolizada pela lua. Esse era um dos santuários mais rentáveis, já que recebia turistas e adoradores de várias regiões.
Outro exemplo era o templo da deusa Diana (grande mãe Diana, conhecida também como Artêmis), identificada como deusa da fertilidade. “O templo atraía pessoas de diferentes
lugares do mundo antigo, e movimentava intenso comércio de objetos de veneração” (SILVA, 2014, p.128).

Conforme Mazzarolo (2013, p.20) “o ambiente de Éfeso se reveste de forte influência helenística e, na ótica religiosa, da mitologia e da gnose”. O autor explica que “muitas correntes
filosóficas e teosóficas disputavam espaços nessas regiões, dentre elas os estoicos, os epicureus e os cínicos. E que “no meio desse ambiente, também estavam os judeus com a sua
sinagoga e sua doutrina”. Não foi por acaso, como bem lembrou Comblin (1987, p.18), que “Éfeso foi o centro da missão paulina” e onde o apóstolo permaneceu por mais tempo.

Os destinatários da carta são identificados com os “santos” e “fiéis” que estão em Éfeso (1,1). Stott (2001, pp.6-7) destaca que os “santos” não é uma referência aos piedosos, “mas,
sim, à totalidade do povo de Deus. Eram chamados de santos por terem sido separados para pertencer a Deus”. Já “os fiéis” é uma expressão de confiança, fidelidade-resistência e,
também, de pertencimento a Cristo. Comblin (1987, p.18) explica que “os destinatários não eram neófitos. Eram cristãos de longa trajetória. Não eram neoconvertidos. Eram
famílias já instaladas no cristianismo que procuravam um status estável no mundo e na Igreja.

Como indicam alguns textos da própria carta, Paulo escreveu aos Efésios quando esteve na prisão (Ef 3,1; 4,1; 6,20). Entre os estudiosos, as discussões em torno da carta vão desde
a autoria até sua universalidade. Comblin (1987, pp. 9-11) enfatiza que a “epístola aos Efésios não parece responder a problemas particulares criados por circunstâncias
específicas”. Isto é: “não responde a situações de perseguição, nem à infiltração de erros na Igreja. Não polemiza, ainda que alguns autores procuraram explicá-la a partir de tais
situações. Não há, porém, sinais evidentes de tais problemas”. Ao mesmo tempo, diz o autor, “a epístola não se dirige a nenhuma comunidade particular. [...] A epístola não se
destinava especificamente aos Efésios. Por isso não alude a nenhum problema da comunidade de Éfeso”. A tese do Comblin, portanto, é de que a epístola trata de “problemas globais
das comunidades”. Mas que problemas eram esses?

• (1) “Em primeiro lugar a epístola responde a um problema de identidade ou de pertença. Pretende confirmar os cristãos, fortalecendo-os pela afirmação da Igreja como realidade
global”;

• (2) “A epístola procura oferecer uma estrutura, sobretudo em matéria de doutrina, a uma Igreja que agora se interessa pela “conservação””;

• (3) “Na segunda parte, que é uma paraclese (exortação), o autor define regras de comportamento que permitam distinguir claramente os cristãos do mundo pagão que os rodeia”;

No entanto, a epístola não exige uma ruptura total que marginalizaria totalmente os cristãos. [...] O que se propõe é uma correção do patriarcalismo
romano por um paternalismo que trata de encarnar a solidariedade cristã. [...] A Igreja pretendeu corrigir vícios estruturais da sociedade. [...] O
mundo cristão rompeu com o paganismo e caminha na Igreja, associada intimamente a Cristo, longe da corrupção do sistema romano. A Igreja
separa-se por uma vida santa que admite as estruturas fundamentais da sociedade, mas confia em que pode santificá-las pelo modo de vivê-las
(COMBLIN, 1987, pp. 9-11).

Você já deve ter notado que a tónica teológica de Efésios está na eclesiologia. É o que admite a maioria dos estudiosos da carta. Alguns temas sobre a Igreja não são uma novidade
de Efésios, aparecem também em outras cartas, mas talvez aqui ganhem maior visibilidade. Mazzarolo (2013, pp.25-26) organizou vários aspectos da Igreja, anotou suas referências
bíblicas (inclusive de outras cartas) e fez breves comentários sobre cada um deles. Vejamos:

A unidade da Igreja:

“A imagem reconstrói o sentido da unidade em torno de uma mesma realidade”. Mazzarolo, cita, então, os textos bíblicos que fundamentam sua
proposição: “um só povo (2,14); um só homem novo (2,15); um só corpo (2,16; 4,4.16); um só espírito (2,18; 4,3.4); um só Senhor (4,4); uma só fé (4,4);
um só batismo (4,4); uma só esperança (4,4); um só Deus (4,6)”;

A Igreja mistério:

“O mistério designa a vocação dos gentios chamados a fazer parte do povo da eleição e salvação de Deus, juntamente com Israel e todas as nações
(1Cor 2,1.17; 15,51; Rm 11,25; 16,25). Cristo congrega todos os povos e nações em sua Igreja”

A Igreja é um corpo único:

“A diversidade de membros, dons e carismas forma a unidade do corpo (1Cor 12,4-30), mas a cabeça desse corpo é Cristo (1,10; 2,16)”;

A Igreja é um edifício cuja pedra angular é Cristo:

“Os alicerces dessa Igreja remontam aos profetas e aos apóstolos, mas a pedra angular é Cristo (2,20-22; cf. 1Pe 2,4-8)”;

A Igreja é o homem novo – a humanidade renovada:

“Em Cristo todas as coisas são novas. [...] Tudo é transformado no evento Jesus Cristo (2,15; 4,22-24)”;
A Igreja é a esposa de Cristo:

“A metáfora do casamento é importante para gerar um pensamento de parceria, pertença e compromisso. O matrimônio não se alicerça na Lei, mas
no amor; assim, os cristãos assumem com Cristo um pacto no amor, na fidelidade e na missão (5,23-24.27.29)”;

A Igreja é o plêrôma:

“Em Cl 1,19; 2,9, já encontramos essa imagem de plêrôma (plenitude) em Cristo. Em Efésios a plenitude chega a integrar a Igreja (1,23), mas, de modo
análogo a Colossenses, em Efésios Cristo é a plenitude na integração do cosmos”;

Igreja e o Espírito:

“O Espírito Santo é o selo do batismo que constitui o povo adquirido por Cristo (1,13-14). Um só Espírito forma um só corpo (2,18; 4,4). O Espírito é a
força dessa unidade dirigindo a Igreja nas pegadas dos profetas e dos apóstolos (3,5)”.

A partir ainda de uma perspectiva eclesiológica de leitura de Efésios, Stott (2001) apresenta uma interessante estrutura temática, organizada à luz do tema geral de seu livro
(comentário da carta): “a nova sociedade de Deus”. O autor, então, organiza e comenta os textos de Efésios a partir de quatro aspectos: (1) Vida nova: 1,1 – 2,10; (2) Uma nova
sociedade: 2,11 – 3,21; (3) Novos padrões: 4,1 – 5,21; (4) Novos relacionamentos: 5,21 – 6,20. Veremos alguns apontamentos de cada um destes aspectos no “aprofundando” deste
estudo.

O hino cristológico de Colossenses 1,15-20

Embora haja alguma diferença em várias reconstruções, a estrutura bipartida básica é clara. Cristo é aquele através de quem Deus criou o universo;
Cristo é aquele através de quem Deus reconciliou o universo. Assim, como não há nada independente da criação de Deus, assim também nada está
fora do ato reconciliador de Deus. [...] O hino representa o Cristo cósmico como supremo sobre todos os poderes cósmicos. Não é um mero interesse
especulativo que gera tais afirmações; o autor responde à “filosofia” atraente aos leitores, ao afirmar que a fé em Cristo não precisa ser
complementada por outros poderes cósmicos – eles foram todos criados, sustentados, subjugados e reconciliados “nele”. Toda a plenitude de Deus
habita nele. Que o próprio cosmos está “nele” é uma ênfase distinta de Colossenses – ele não está panteisticamente “em todas as coisas”, mas como
aquele “em” quem todas as coisas são criadas e sustentadas: “todas as coisas” são “nele”.

Fonte: BORING (2015, pp.569-571).

CARTAS PASTORAIS: Tito e Timóteo

As cartas pastorais
As cartas pastorais são assim conhecidas em primeiro lugar por conta de seus destinatários. Na opinião de alguns estudiosos, Timóteo e Tito foram os mais importantes
colaboradores/discípulos de Paulo e trabalharam como pastores nas comunidades nascentes. Além dos destinatários, estas cartas receberam esse nome graças ao seu conteúdo.
Elas apresentam, indiretamente, instruções sobre a relação da comunidade com seus líderes-pastores e, principalmente, de forma direta, como tais líderes-pastores deveriam
proceder no exercício de seus ministérios. Ao que tudo indica conforme conta Boring (2015, p.656) “as pastorais sempre circularam juntas e ainda não sabemos em que ordem elas
foram organizadas. Os títulos canônicos são, é claro, secundários, e estão baseados na extensão relativa dos documentos”. Para o autor

2Timóteo foi obviamente escrita por último, como a declaração final de Paulo. Visto que Tito pressupõe congregações que estão apenas começando
a ter anciãos escolhidos, enquanto 1 Timóteo assume uma situação mais desenvolvida considerando a liderança da igreja, pode ser que as cartas
tenham sido compostas para ser lidas na seguinte ordem: Tito, 1 Timóteo e 2 Timóteo. Tito introduz o corpus e prepara o leitor para o todo. O leitor
de 1 Timóteo já conhece a carta de Tito, e 2 Timóteo é escrita para leitores que olham para trás, não apenas para a vida e cartas de Paulo, mas
também para as cartas Pastorais anteriores (BORING, 2015, p. 656).

Em comum, conforme explica Mazzarolo (2014, p.15), as três cartas manifestam as “preocupações com Timóteo e Tito diante dos problemas da comunidade, dos falsos mestres, dos
perigos que rondam a fé dos cristãos e das providências que eles, como embaixadores do Evangelho, devem tomar”. Os falsos mestres citados por Mazzarolo são assunto também
para Redalié (2015, p.404). O autor explica que “a polêmica contra os adversários atravessa as três epístolas”. Para ele, “é a prática do conjunto das instruções que responde à
ameaça dos desvios”. Por “conjunto de instruções” o autor entende: “a organização eclesiástica, o comportamento dos ministros e dos diversos grupos da comunidade, a
conservação da sã doutrina”. Redalié entende que “diferentemente das outras epístolas, as pastorais não entram em debate com os argumentos dos adversários. Já codificado, o
conflito se expressa nas fórmulas”:

• “Outra doutrina” (1Tm 1,3; 6,3);

• “Contra a sã doutrina” (1Tm 1,10; 6,3);

• Trata-se de corrigir os que “se desviaram” da verdade ou da fé (1Tm 1,9s.; 4,1; 6,5; 2Tm 2,17s.; 3,8; Tt 1,10s.);

Sigo com Redalié (2015, p.404) que defende a tese de que “Aos rótulos positivos que designam a doutrina da Igreja: “na fé”, “conforme a piedade”, “conforme o conhecimento da
verdade”, “segundo o evangelho””. Para o autor, tudo isso responde “as etiquetas coladas às heresias, aliás muitas vezes emprestadas da filosofia popular”: “fábulas ou falatórios
ímpios (1Tm 4,7; 6,20; 2Tm 2,16);

• “Falsa ciência” (1Tm 6,20);

• “Controvérsias vãs e estúpidas” (2Tm 2,23; Tt 3,9);

• “Rixas inúteis” (2Tm 2,14; Tt 3,9);


• “Bisbilhotices da mulher velha” (1Tm 4,7);

• “Palavreado oco” (1Tm 1,6; Tt 1,10).

Além da “desqualificação do ensinamento”, para Redalié (2015, pp.404-405) “se acrescenta a do docente”: (1) cupidez (1Tm 6,5; 2Tm 3,2; Tt 1,11); (2) intenção enganosa (2Tm 3,13);
(3) inautenticidade (1Tm 1,19; 4,3; 2Tm 3,5; Tt 1,16; 3,8s.); (4) imoralidade (1Tm 1,9s. 2Tm 3,2ss.). O autor cita ainda três traços nos textos das cartas pastorais e que nelas foram
tratados: (1) traços espiritualistas (2) traços ascéticos (3) traços judaizantes. Vejamos:

• Traços espiritualistas: “o conflito como problema de docentes e de doutrina, de conhecimento (1 Tm 6,20; 2Tm 3,7; Tt 1,16)”;

• Traços ascéticos discutidos: “(1Tm 4,1-5), a afirmação de que a ressurreição já aconteceu (2Tm 2,18), as genealogias (1Tm 1,4 e Tt 3,9)”;

• Traços judaizantes: “os oponentes como “doutores da Lei” (1Tm 1,7ss.), as “controvérsias sobre a Lei” (Tt 3,9), “eles vêm da circuncisão” (Tt 1,10), os mitos judaicos (Tt 1,14), as
prescrições alimentares (1Tm 4,3), o puro e o impuro (Tt 1,15)”.

Muito bem, antes de seguirmos em frente não esqueça de reler esta introdução conferindo cada um dos textos bíblicos mencionados. Assim, sem dúvida, sua compreensão e
assimilação dos temas serão mais amplas. Na sequência, por uma questão de tempo/espaço, faremos breves considerações sobre a primeira carta a Timóteo, deixando de lado a
carta a Tito e a segunda carta a Timóteo. Minha sugestão é para que você leia as duas cartas e, se possível, alguma das bibliografias indicadas.

Primeira carta de Paulo a Timóteo


Entre os estudiosos da primeira carta de Paulo a Timóteo, existem várias divergências sobre os detalhes que cercam a carta. A maioria sugere a tese de que foi escrita na Macedônia,
por volta do ano 65 d.C. Defende-se ainda que o motivo principal que levou Paulo a escrevê-la, (há uma série de discussões a respeito da autoria paulina) era alertar Timóteo, líder
da Igreja em Éfeso na ocasião, sobre os falsos ensinos proferidos por falsos mestres que estavam infiltrados na comunidade. “Além da defesa da fé a carta apresenta uma série de
exortações a Timóteo e, também, aos líderes que ocupam cargos e assumem funções na comunidade” (SILVA, 2014, p.139).

Entre as três cartas pastorais, a primeira escrita a Timóteo é considerada por muitos como a mais “eclesiástica”. Note que na estrutura indicada por Mazzarolo (2014, p.27) os temas
gravitam, de fato, em torno desse tema: (1) “o papel e as preocupações do pastor”; (2) “Os perigos dos falsos doutores e pastores”; (3) “a estrutura da comunidade: epíscopo,
presbítero e diácono”; (4) “a conservação da ordem: mulheres, viúvas e escravos”; (5) vida de oração na comunidade”. O autor destaca que “a igreja da 1Tm se revela já bastante
estruturada e não espelha os passos das comunidades iniciantes, mas de grupos já consolidados e com um esqueleto quase solidificado”. Para ele, “nas dimensões da conjuntura
funcional, já se percebe que havia não só lideranças, mas funções bastante determinadas para cada grau da ordem do poder”. Mazzarolo cita, então, o epíscopo, o presbítero e o
diácono.

• O epíscopo ocupava o topo da hierarquia ou da responsabilidade. Esse epíscopo tinha a missão de supervisionar uma ou mais comunidades e manter com os fiéis e com os seus
líderes um vínculo com os primeiros anunciadores do Evangelho, que eram os apóstolos;

• “O presbítero era geralmente um ou mais anciãos escolhidos dentre o povo ou pelo povo para tomar conta das funções na comunidade. Normalmente, ao presbítero cabia a
execução das tarefas locais”;

• “O diácono era o responsável por coordenar e fazer acontecer todas as tarefas concretas e zelar por todas as pessoas necessitadas (At 6,1-7)”.

Seguindo ainda pela tese de que a primeira escrita a Timóteo é considerada a mais eclesiástica das três cartas pastorais, é importante darmos atenção para o texto de 1Tm 3,14-15:
“14Escrevo-te estas coisas, esperando ir ver-te em breve; 15para que, se eu tardar, fiques ciente de como se deve proceder na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e
baluarte da verdade”. Note as referências feitas pelo autor da carta à Igreja: (1) Casa de Deus; (2) Igreja do Deus vivo; (3) Coluna e baluarte da verdade. Estas
características/qualificações têm redundado em boas discussões sobre a eclesiologia de Timóteo. Não há tempo/espaço suficiente para nos aprofundarmos e, por isso,
apresentaremos breves anotações sobre o tema.

(1) Casa de Deus : A palavra casa (oikos) pode indicar “um edifício ou uma família que ocupa o edifício”, conforme explica Stott (2004, p.103). Para o autor, “as escrituras nos dizem que
a igreja é a casa de Deus nesses dois sentidos”. Discordamos do autor nesse ponto, entendendo que oikos se aplica apenas ao segundo sentido dado, isto é, a “família que ocupa o
edifício”. Meu argumento se baseia nos escritos paulinos em outras cartas, e naquilo que reconhece o próprio Stott na sequência. “Como nesse capítulo, a palavra oikos foi
empregada por três vezes com o sentido de casa como família (v.4,5,12), o que parece ser provável é que essa palavra tenha a mesma conotação do versículo 15”.

(2) Igreja do Deus vivo : Stott (2004, p.104) nos lembra que “diversas vezes, no Antigo Testamento, Iahweh é chamado de “o Deus vivo”, num deliberado contraste com relação aos
ídolos dos pagãos”. O que deve chamar mais nossa atenção, nas palavras do próprio Stott, é o fato de que “a consciência do povo de Israel quanto ao fato de que o Deus vivo andava
entre eles foi algo que afetou profundamente sua vida comunitária”, referindo-se à comunidade em Éfeso. Portanto, o Deus vivo, que anda com seu povo, não é um Deus estático,
limitado a geografia de um edifício.

(3) Coluna e baluarte da verdade : Conforme explica Mazzarolo (2014, pp.86-87), “a metáfora da coluna, na literatura grega, aplicada ao homem indica que este deve estar firme e
sólido, de tal forma que, sobre ele, os outros possam apoiar-se”. Portanto, conforme bem destacou o autor, “a imagem da coluna aplicada à igreja é porque esta deve servir de
baluarte para a verdade. [...] não está dito que a igreja é a verdade, mas apenas a coluna e fundamento da verdade”. O autor conclui que:

• “A Verdade é Palavra de Deus revelada por Jesus Cristo (Jo 17,17)”;

• “Assim sendo, a igreja é responsável pelo legado recebido e está incumbida de dá-lo a conhecer ao mundo, como Verdade que é o próprio Cristo (Jo 14,6)”;

Timóteo: provavelmente conheceu Paulo por ocasião da segunda viagem missionária. Tornou-se conhecido da comunidade cristã e gozava de grande
estima. Foi durante a segunda viagem missionária, ao passar novamente por Listra que Paulo batizou-o e o tomou como seu colaborador. Para
facilitar seu contato com os judeus, Paulo fez com que Timóteo fosse circuncidado (At 16,1). Tito: era filho de pais gregos (Gl 2,3) e foi convertido ao
cristianismo através da vida de Paulo que o chama de “filho”. Sua conversão deve ter ocorrido na primeira viagem missionária, pois esteve com Paulo
e Barnabé em Jerusalém para a famosa assembléia lá realizada (At 15,2). Tito acompanhou Paulo em Éfeso durante a terceira viagem missionária. Foi
enviado por Paulo para Corinto e mais tarde, outra vez para organizar a coleta em Corinto e nas Igrejas da Acaia. Foi provavelmente ele que levou a
perdida “Carta em lágrimas” até Corinto.

Fonte: SILVA, Flávio Henrique de Oliveira. In SILVA, Flávio Henrique de Oliveira; PROENÇA, Wander de Lara. Introdução ao Novo Testamento.
Londrina: FTSA, 2014.

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ATIVIDADES
1. Sobre Filipos, é correto afirmar que

a) Filipos estava situada na Macedônia e havia sido fundada por volta de 358 a.C., por Filipe II (rei da Macedônia naquela época), pai de Alexandre, o Grande.

b) A cidade era reconhecida por sua localização privilegiada: terras férteis, minas de ouro e prata e estradas que facilitavam o comércio

c) A situação privilegiada da cidade despertou o interesse do Império romano na época de sua expansão; o que os levou a conquistarem a Macedônia por volta de 168 d.C., e, claro,
explorarem toda a riqueza da região.

d) Com o passar dos anos Filipos se tornou colônia romana, abrigando soldados aposentados. Em certo sentido esse novo status garantiu alguns privilégios à região, por outro lado,
para os antigos moradores, o ambiente continuava desfavorável.

e) Todas as alternativas estão corretas

2. Colossos era uma cidade da Frígia, vizinha de Laodicéia e Hierápolis. Nos dias do apóstolo Paulo ela se destacava pela sua beleza e riqueza, graças ao comércio forte e a sua
localização privilegiada.

[ ] Verdadeiro

[ ] Falso

3. Sobre as lideranças estabelecidas na comunidade a quem se destinou a primeira carta a Timóteo, é correto afirmar que:

a) O epíscopo ocupava a posição mais baixa na hierarquia e possuía poucas responsabilidades

b) Esse epíscopo tinha a missão de supervisionar uma ou mais comunidades e manter com os fiéis e com os seus líderes um vínculo com os primeiros anunciadores do Evangelho,
que eram os apóstolos;

c) O presbítero era geralmente um ou mais anciãos. Ele era escolhido por imposição dos apóstolos, ou dos pastores. Sua função era tomar conta da comunidade.

d) Ao diácono, normalmente, cabia a execução das tarefas locais. Ele era o responsável por coordenar e fazer acontecer todas as tarefas concretas. Dentre as tarefas concretas, não
era sua responsabilidade zelar pelos necessitadas.

e) Nenhuma das alternativas estão corretas

Resolução das atividades

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RESUMO
Neste estudo, vimos alguns do dos principais aspectos contextuais e teológicos das cartas de Paulo escritas da prisão: Filipenses, Filemon, Colossenses e Efésios.

Vimos que as condições socioeconômicas da comunidade de Filipos não foram um empecilho para seu envolvimento com os necessitados da Igreja em Jerusalém, destacando-se,
assim, por sua generosidade. Todavia, houveram momentos em que estes valores, próprios da identidade da comunidade, estavam sendo negligenciados. Nesse caso, justifica-se as
exortações feitas por Paulo em Fp. 2,3-7a. Já em Filemon, destaca-se o tema do perdão e da irmandade, temas próprios ao novo modo de vida orientado pelo Evangelho. O apelo de
Paulo a Filemon é que este reveja seus direitos como dono do escravo, e à luz do Evangelho, que instrui ao perdão, estabeleça uma relação de irmão com Onésimo, ainda que este
tenha lhe causado sérios problemas.

A carta aos Colossenses aponta a preocupação de Paulo com uma corrente de pensamento, ou filosofia da época, que comprometia a mensagem do Evangelho e o bom andamento
da comunidade. Ao que tudo indica, tal filosofia, segundo os estudiosos pesquisados, carregava alguns traços de correntes judaizantes, misturados com aspectos do gnosticismo,
além de certo apego as religiões de mistério, preocupada com questões sobrenaturais. A carta aos Efésios tem um forte apelo eclesiológico e trata, na opinião de alguns
comentaristas, de temas universais ligados à comunidade cristã. Em Comblin, por exemplo, você deve ter notado três características na mensagem da carta: (1) identidade/pertença;
(2) estrutura e conservação doutrinária; (3) exortação para um novo modo de vida que deveria distinguir qualitativamente a comunidade, à luz do Evangelho.

Por fim, vimos neste estudo que as cartas a Timóteo, e a carta a Tito, juntas, formam um bloco literário conhecido como cartas pastorais. Em comum, conforme vimos nos escritos de
Mazzarolo (2014), as três cartas manifestam preocupações pessoais com os pastores, Timóteo e Tito. Preocupações também com os problemas que as respectivas comunidades
destes pastores estavam enfrentando. Especialmente com alguns falsos mestres que deturpavam a verdade do Evangelho. Vimos a atenção especial que a primeira carta a Timóteo
deu a Igreja. Caracterizando-a como: casa de Deus; Igreja do Deus vivo; coluna e baluarte da verdade.

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Material Complementar

Leitura
1 & 2 Timóteo e Tito

Autor: Isidoro Mazzarolo

Editora: Mazzarolo Editor

Sinopse : As preocupações das pastorais têm uma grande pertinência com as exigências eclesiais e
missionárias nos dias atuais. Os pastores devem saber o seu lugar no campo de missão, conhecer a
realidade e ter bastante clareza nas linhas a serem adotadas. As comunidades são como um rebanho
frágil e sem defesas: do mesmo modo que um rebanho pode ser vítima de lobos vorazes ou cães, uma
comunidade ingênua pode ser destroçada por ideologias ou religiosidades falsas e manipuladas. Aos
pastores cabe defender as suas ovelhas e conduzi-las a salvo com muita sabedoria e firmeza.

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REFERÊNCIAS
BORING, Eugene. Introdução ao Novo Testamento: história, literatura, teologia - Volume I: Questões Introdutórias do Novo Testamento e Escritos Paulinos.
Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2015.

BROWN, Raymond E. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2004.

COMBLIN, José. Epístola aos colossense e Epístola a Filemon. Petrópolis: Vozes; São Leopoldo: Sinodal, 1986.

COMBLIN, José. Epístola aos Efésios. Petrópolis: Vozes; São Leopoldo: Sinodal, 1987.

COMBLIN, José. Epístola aos filipenses. 2. Ed. Petrópolis: Vozes; São Leopoldo: Sinodal, 1992.

DETTWILER, Andreas. A epístola aos Colossenses. In MARGUERAT, Daniel (Org.). Novo Testamento: história, escritura e teologia. 3. Ed. São Paulo: Loyola,
2015, pp.339-355.

FUNARI, Pedro Paulo. Grécia e Roma. São Paulo: Contexto, 2011.

GUARINELLO, Norberto Luiz. Imperialismo Greco-Romano. São Paulo: Ática, 1994.

MAZZAROLO, Isidoro. 1 & 2 Timóteo e Tito. Rio de Janeiro: Mazzarolo Editor, 2014.

MAZZAROLO, Isidoro. Carta aos Efésios: Cristo é a pedra angular. Rio de Janeiro: Mazzarolo Editor, 2013.

MAZZAROLO, Isidoro. Carta de Paulo aos Filipenses. 2. Ed. Rio de Janeiro: Mazzarolo Editor, 2011.

PERONDI, Ildo. Cartas Paulinas - apostila digital. Disponível em: < http://docslide.com.br/documents/-cartas-paulinas.html >. Acesso em junho de 2017.

PROENÇA, Wander de Lara. Cruz e Ressurreição: a identidade de Jesus para os nossos dias. Londrina: Descoberta, 2001.

REDALIÉ, Yann. As epístolas pastorais. In MARGUERAT, Daniel (Org.). Novo Testamento: história, escritura e teologia. 3. Ed. São Paulo: Loyola, 2015, pp.393-
416.

SILVA, Flávio Henrique de Oliveira. In SILVA, Flávio Henrique de Oliveira; PROENÇA, Wander de Lara. Introdução ao Novo Testamento. Londrina: FTSA, 2014.

STOTT, John. A mensagem 1 Timóteo e Tito: a vida da igreja local: a doutrina e o dever. São Paulo: ABU Editora, 2004.

STOTT, John. A mensagem de Efésios: a nova sociedade de Deus. 6. Ed. São Paulo: ABU Editora, 2001.

VIELHAUER, Philipp. História da literatura cristã primitiva: introdução ao Novo Testamento, aos apócrifos e aos pais apostólicos. Santo André: Academia
Cristã, 2005.

WEGNER, Uwe. Escravidão e escravos na Bíblia: Os Evangelhos, Jesus, os escravos. Estudos Bíblicos, nº 18, Petrópolis: Vozes, 1988, p.53-72.

ZUCK, Roy B. Teologia do Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2008.

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APROFUNDANDO
Conforme havíamos anunciado, veremos uma perspectiva eclesiológica de leitura de Efésios apresenta por Stott (2001) organizada à luz do tema geral de seu livro: “a nova
sociedade de Deus”. Ele organiza e comenta os textos de Efésios a partir de quatro aspectos: (1) Vida nova: 1,1 – 2,10; (2) Uma nova sociedade: 2,11 – 3,21; (3) Novos padrões: 4,1 –
5,21; (4) Novos relacionamentos: 5,21 – 6,20. Vejamos uma brevíssima síntese de alguns destes aspectos descritos pelo autor. Minha sugestão é que acompanhe cada enunciado
lendo os textos bíblicos indicados.

1- Vida nova (STOTT, 2001, pp.12-57):


• Toda bênção espiritual (1,3-14): “Quais são estas bênçãos com que Deus nos abençoou em Cristo?” Stott percebe no texto bíblico que a resposta de Paulo baseia-se nas três
dimensões do tempo: “Têm relação com o passado (antes da fundação do mundo, v. 4), com o presente (o que temos em Cristo agora, v. 7) e com o futuro (a plenitude dos tempos, v.

10)”

• Ressurretos em Cristo (2,1-10): “Deus deu uma demonstração histórica suprema deste poder ao ressuscitar Cristo dentre os mortos e ao exaltá-lo sobre todos os poderes do
mal”. Além disso, conforme Stott, “deu uma demonstração adicionai dele ao nos ressuscitar e exaltar juntamente com Cristo, livrandonos, assim, da escravidão, da morte, e do mal”.
Para o autor, as primeiras palavras de Paulo enfatizam este fato: ““estando vós mortos...”. [...] Jesus Cristo estava morto, mas Deus o ressuscitou e o exaltou. E vós também estáveis
mortos, mas Deus vos ressuscitou e exaltou com Cristo!”.

2- Uma nova sociedade (STOTT, 2001, pp.58-101):


• Uma única nova humanidade (2,11-22): A Bíblia menciona dois tipos de alienação: “Uma delas é a alienação de Deus, nosso Criador, e a outra alienação é a de nós mesmos em
relação a nosso próximo. [...] Ora, esta dupla alienação, ou melhor, sua substituição pela reconciliação, é o tema de Efésios 2”. Stott explica que “Na primeira metade do capítulo (vs.
1-10) os seres humanos são retratados como estando alienados de Deus. Na segunda metade de Efésios 2 (vs. 11-22), os seres humanos são retratados como estando alienados uns
dos outros”, especialmente judeus e gentios.

Desta dupla alienação a assim chamada “parede de separação” (v. 14) era o símbolo permanente. [...] O grande tema de Efésios 2 é que Jesus Cristo destruiu as duas
inimizades. [...] Lado a lado com a destruição dessas duas inimizades, Jesus conseguiu criar, de fato, uma nova sociedade, uma nova humanidade, em que a alienação
cedeu lugar à reconciliação, e a hostilidade à paz. E esta nova união humana em Cristo é o penhor e uma antevisão daquela união final sob a soberania de Cristo, que
Paulo já predissera em 1:10.

• Confiança no poder de Deus (3,14- 21): “A oração de Paulo está ligada com o cumprimento da sua visão da nova sociedade de Deus, a do amor”. Sendo assim, diz Stott, “pede que
seus membros sejam fortalecidos para amar e para conhecer o amor de Cristo, embora este exceda todo entendimento”. Em seguida, Paulo, então, “volta-se do amor de Deus que
ultrapassa o conhecimento para o poder de Deus que ultrapassa a imaginação, do amor ilimitado para o poder ilimitado”. Stott argumenta que Paulo “está, pois, convencido assim
como nós devemos ficar convencidos, de que somente o poder divino pode gerar o amor divino”.

3- Novos padrões (STOTT, 2001, pp.102-157):


• Unidade e diversidade na Igreja (4,1-16): “Paulo elabora quatro verdades quanto ao tipo de unidade que Deus pretende para a sua nova sociedade”. Estas, conforme Stott, podem
ser declaradas nas quatro proposições seguintes: (a) “Depende da caridade do nosso caráter e a nossa conduta (v. 2)”; (b) “Surge da unidade do nosso Deus (vs. 3-6)”; (c) “É
enriquecida pela diversidade dos nossos dons (vs. 7-12)”; (d) “Exige a maturidade em nosso crescimento (vs. 13-16)”.

• Uma nova roupagem (4,17-5,4): “O apóstolo continua descrevendo os novos padrões que se esperam da nova sociedade de Deus [...] Chamados para sermos um povo santo,
argumenta agora, devemos também cultivar a pureza”.

A pureza é uma característica do povo de Deus tão indispensável quanto a unidade. [...] Seis exemplos concretos (4:25-5:4). [...] A santidade não é uma condição mística
experimentada com relação a Deus, isolada dos seres humanos. Ninguém pode ser bom “teoricamente”; tem que sêlo no mundo real das pessoas.

4- Novos relacionamentos (STOTT, 2001, pp.158- 221):


• Maridos e esposas (5,21-33): Paulo passa agora “para os novos relacionamentos em que o novo povo de Deus inevitavelmente se encontra e, ao fazer isso, concentra-se, no
restante da carta, em mais duas dimensões do viver cristão”

A primeira diz respeito aos relacionamentos práticos e rotineiros do lar, já que família divina deixa de ser um conceito aceitável se ela mesma não se subdividir em
famílias humanas que revelem o amor de Deus. [...] Não há melhor exemplo disso do que o discurso de Paulo aos maridos e às esposas em Efésios, que é baseado na
doutrina de Cristo e sua igreja.

• Pais e filhos (6,1-9): “O fato de os filhos terem sido incluídos nas instruções, recebendo uma seção dedicada a eles, é um indício da aceitação já universal na igreja daquele que
dissera”: (1) “Deixai vir a mim os pequeninos, não os embaraceis, porque dos tais é o reino de Deus”; (2) “E quem receber uma criança, tal como esta, em meu nome, a mim me
recebe!”. Para Stott, “Era uma mudança da crueldade empedernida que prevalecia no império romano”. Naquele contexto, lembra-nos Stott, “as crianças não desejadas eram
abandonadas, as fracas e deformadas eram sacrificadas, e até mesmo as saudáveis eram consideradas por muitos como um empecilho parcial, porque inibiam a promiscuidade
sexual e complicavam o divórcio fácil”.

REFERÊNCIAS

STOTT, John. A mensagem de Efésios: a nova sociedade de Deus. 6. Ed. São Paulo: ABU Editora, 2001.

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Cartas Paulinas. Flávio Henrique de Oliveira Silva

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38 p.

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1. Cartas. 2. Paulinas. 3. EaD. I. Título.

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